
Esta foi a pior época da história do Benfica. Sim, bem escrito e melhor lido: a pior época futebolísitica da História do Sport Lisboa e Benfica. Nem mesmo naquela em que acabámos em sexto a coisa foi tão má: entre crises directivas e financeiras e jogadores de inegável falta de qualidade era previsível que a coisa fosse acabar assim. Agora, este ano não, fosse ele isoladamente considerado ou enquadrado como continuação da época anterior. Pretende este texto explicar porquê, sem graça nenhuma porque o melão é grande e a frieza ainda maior. Comecemos:
a) O Benfica perdeu dois jogadores no início da época. Um deles, Di Maria, tinha a saída planeada desde Janeiro de 2010, seis meses antes da sua consumação. Por muito que o seu peso - e o de Ramires - na equipa fosse indiscutível, que era, não saber preparar as suas saídas e utilizá-las, até à náusea, como desculpa de grande parte dos males do clube demonstra um cocktail explosivo de sobranceria e falta de competência.
b) O Benfica demitiu um guarda redes bem acima da média e contratou, por um preço estupidamente absurdo, o pior guarda redes da sua história. Graças a este último, o Benfica perdeu pontos atrás de pontos, a defesa desconfiou dele quase naturalmente e a equipa tremeu como nunca o houvera feito o ano passado. Se a contratação pode ter saído ao engano, (ora aqui vai bis) a insistência na fórmula demonstra um cocktail explosivo de sobranceria e falta de competência. E chega, calmamente, ao mais descabido ridículo.
c) O Benfica não soube planear o físico da época. A equipa andou de rastos no início do ano e rebentou outra vez há dois meses e meio. O ano é duro, o Mundial foi desculpa durante meio ano (absurda, mas desculpa), mas o tempo passou e a equipa não deu um único indicador de melhora. Como é possível passar dois terços de uma época em agonia física? E pior: o final do ano passado já indiciava esta fortíssima quebra e tal indício não foi levado em conta de forma eficaz, como facilmente se verificou.
d) O Benfica não encantou mais do que meia dúzia de jogos. Foi uma equipa frágil, desaprendeu a jogar e deixou de empolgar. Ninguém a soube motivar. Mais gravosa e levianamente, conseguiu a proeza absolutamente ignóbil e indigna de deixar virar dois resultados favoráveis em duas meias finais. Repare-se: não se trata de perder de cabeça erguida, de não conseguir correr atrás de um resultado. Trata-se, sim, de um incompetentíssimo modo de não conseguir segurar vantagens. Uma vez, duas vezes. Tudo no espaço de, pasmemo-nos, de quinze dias.
e) O mesmo se diz a propósito da proeza de perder quatro vezes com o arqui-rival F. C. do Porto: as duas primeiras vezes ainda dá para admitir dentro dos cânones normais do futebol; as duas seguintes – sublinhando a importância capital em não perder, seja pelos troféus em causa, seja pelo facto de já termos perdido duas vezes - só mesmo por uma inscrição genética de um complexo de inferioridade e ou de uma enorme falta de vistas na estruturação da estratégia. Não havia, até à data, memória de um Benfica
saco de pancada fosse de quem fosse. Tudo no espaço de, pasmemo-nos, de quinze dias (bis).
Aqui chegados, um denominador comum unifica todo o falhanço do Benfica: a insistência patética no erro. Não se trata dos desaires, do azar, da inépcia e do cansaço: este é o pior Benfica da História porque insistiu em e repetiu a insistência em erros atrás de erros atrás de erros. Desta forma, foi também o menos inteligente Benfica de todos os tempos.
Ora, quando isto acontece é inevitável uma de duas conclusões: ou há motivos que transcendem o comum dos analistas para que tal suceda (a metafísica nem sempre é clara, venham daí essas explicações) ou estamos na presença de um caso de estudo de casmurrice e sobranceria, aplicadas com profunda impunidade.
O Benfica deste ano desencontrou-se com a sua dignidade, com a sua grandeza e com a sua História. Não foi humilde nem no início nem no fim. Não soube nem quis aprender com os seus enganos. Atirou areia para os seus próprios olhos, distribuindo culpas por toda a gente, ignorando as suas próprias falhas. Resultado: foi literalmente esmagado.
As consequências desta calamidade podem ser de dois níveis: numa primeira hipótese, tudo se mantém como se nada fosse, a tendência actual, e o Benfica perderá milhares e milhares de adeptos – a geração que aí vem comprovará a tendência - viverá apático em descendo, empatar em casa com o Braga há-de ser um resultado aceitável, ouvindo e aceitando as desculpas ridículas e as propostas anedóticas do seu treinador (leia-se o que se escreveu na adenda
deste texto) e dos seus dirigentes – não acompanhar a equipa nos jogos fora é insultuoso para os adeptos de um clube com a dimensão nacional do Benfica.
Numa segunda possibilidade, mais utópica e profundamente mais Benfiquista, há lugar a uma responsabilização hierárquica profunda – repare-se que ao nível do balneário os jogadores são quase os mesmos do ano transacto – compreendendo direcção e treinador que um ciclo chegou ao fim e que esse ciclo que termina não é tão significativo do ponto de vista desportivo quanto nos querem fazer crer. Muito pelo contrário.
É nesta esteira que me detenho e que escrevo: demissão da equipa técnica mal termine a época, demissão da direcção no dia imediatamente a seguir à primeira. Tudo na dentro da maior dignidade, relevando os sucessos alcançados sim, mas assumindo o mais que natural fim de linha, a óbvia falta de condições para prosseguir. E que venha uma direcção que pense e que sirva o Benfica cuidadosamente, não esquecendo o seu passado cada vez mais remoto, mas não por isso cada vez mais esquecível. Uma direcção que pacifique, que eleve o nível e a capacidade competitiva. Uma direcção que saiba escolher quem comunica, quando e como. Uma direcção que saiba escolher um treinador que compreenda o que é o Benfica e que caminhos deve o Benfica trilhar.
Pela utopia eu vou andando, coleccionando melancolias atrás de melancolias. Ser Benfiquista, afinal, deve ser mesmo só isto e nada mais.