Insuficência Cardíaca
Insuficência Cardíaca
Insuficência Cardíaca
Prognóstico: Estudos de base comunitária indicam que 30 a 40% dos pacientes morrem
um ano após o diagnóstico, e 60 a 70% no prazo de cinco anos, principalmente pela
piora da IC ou por morte súbita (provavelmente causada por arritmia ventricular).
A taxa de mortalidade anual aumenta com a Classe de IC.
Patogênese:
- IC com FE reduzida:
A IC pode ser vista como um distúrbio progressivo iniciado quando um evento-índice
que lesa o músculo cardíaco, resultando em perda da função dos cardiomiócitos ou,
alternativamente, diminuição da capacidade do miocárdio de gerar força, impedindo,
assim, que o coração se contraia normalmente. Esse evento-índice pode ter instalação
súbita, como no caso de IAM; início gradual ou insidioso, como nos casos de
sobrecarga de pressão ou de volume crônicas; ou ser hereditário, como nos casos das
diversas miocardiopatias genéticas.
Independentemente da natureza do evento desencadeante, o resultado é a redução
da capacidade de bombeamento do coração.
Após esse declínio inicial, diversos mecanismos compensatórios são ativados, como o
(1) sistema nervoso adrenérgico (responsável por aumentar a contratilidade
miocárdica), (2) o sistema renina-angiotensina-aldosterona (mantem o débito
cardíaco com aumento na retenção de sal e água) e (3) o sistema das citocinas (há
ativação de uma família de moléculas vasodilatadoras compensatórias, incluindo os
peptídeos natriuréticos atrial e cerebral - ANP e BNP, as prostaglandinas - PGI2 e o
óxido nítrico - NO, os quais compensam a vasoconstrição vascular periférica excessiva).
Em curto prazo, esses sistemas são capazes de manter a função cardiovascular dentro
do limite da homeostase normal, fazendo o paciente se manter assintomático.
Entretanto, com o passar do tempo, a ativação mantida de tais sistemas causa dano
secundário no ventrículo, com agravamento do remodelamento ventricular e
subsequente descompensação cardíaca, o que resulta em grande aumento nas taxas
de morbidade e de mortalidade. Remodelamento cardíaco refere-se às alterações na
massa, no volume, na forma e na composição do VE que ocorrem após lesão cardíaca
e/ou em condições com sobrecarga hemodinâmica. As catecolaminas têm muita
influência nesse processo.
A diminuição do débito cardíaco (pela disfunção da contratilidade) nos pacientes com
IC produz uma “descarga” dos barorreceptores de alta pressão localizados em VE, seio
carotídeo e arco aórtico. Essa descarga dos barorreceptores periféricos leva à perda do
tônus parassimpático inibitório para o sistema nervoso central (SNC), resultando em
aumento generalizado no tônus simpático eferente e em liberação não osmótica de
ADH pela hipófise.
Esses sinais também ativam vias eferentes do sistema nervoso simpático que inervam
coração, rins, vasculatura periférica e músculos esqueléticos. A estimulação simpática
dos rins leva à liberação de renina, produzindo aumento nos níveis circulantes de
angiotensina II e aldosterona. A ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona
promove retenção de água e sal e leva à vasoconstrição periférica, hipertrofia dos
miócitos, morte celular de miócitos e fibrose miocárdica. Embora os mecanismos
neuro-hormonais facilitem a adaptação em curto prazo, mantendo a pressão arterial e
perfusão dos órgãos vitais, acredita-se que também contribuam para as alterações
observadas nos órgãos-alvo, no coração e na circulação, bem como para a retenção
excessiva de água e sal nos casos avançados de IC.
- IC com FE preservada:
Na IC com FE preservada, acreditava-se que a disfunção diastólica fosse o único
mecanismo responsável pelo desenvolvimento da IC com FE preservada, estudos de
base comunitária sugerem que outros mecanismos extracardíacos possam ser
importantes, como aumento da rigidez vascular e deterioração da função renal, mas
os estudos ainda não são muito desenvolvidos.
Ao exame físico:
Na IC leve a moderada, o paciente não aparenta desconforto em repouso, exceto
quando estiver deitado sem inclinação por alguns minutos. Nos casos mais graves de
IC, o paciente deve sentar ereto e pode encontrar-se ofegante somente ao falar.
- A pressão sistólica pode estar normal ou elevada na IC inicial, mas geralmente
encontra-se reduzida nos casos avançados com disfunção grave de VE.
- A pressão de pulso pode se mostrar reduzida, refletindo redução do volume
sistólico.
- A taquicardia sinusal é um sinal inespecífico causado por aumento da atividade
adrenérgica.
- A vasoconstrição periférica, que leva ao esfriamento das extremidades e cianose
dos lábios e leitos ungueais, também é causada por atividade adrenérgica excessiva.
- Turgência jugular a 45º
- Exame pulmonar: Ruídos respiratórios adventícios (estertores ou crepitação), que
resultam de transudação de líquido do espaço intravascular para os alvéolos e podem
ser amplamente auscultados em ambos os campos pulmonares. Podem ser
acompanhados por sibilos expiratórios (asma cardíaca). Geralmente, na IC crônica, os
estertores desaparecem. Isso ocorre pois há aumento na drenagem linfática do líquido
alveolar. O derrame pleural é causado por elevação da pressão capilar pleural que
produz transudação para a cavidade pleural. Considerando que as veias pleurais
drenam tanto para as veias sistêmicas quanto para as pulmonares, o derrame pleural
ocorre mais comumente quando há insuficiência biventricular. Embora o derrame
pleural costume ser bilateral na IC, quando unilateral, é mais frequente no espaço
pleural direito.
- Exame cardiológico: Se houver dilatação, o ictus estará deslocado inferiormente para
uma posição abaixo do quinto espaço intercostal e/ou lateralmente à linha clavicular
média, passando o batimento a ser palpável sobre dois espaços.
A hipertrofia grave de VE leva a ictus sustentado (propulsivo).
Os pacientes com ventrículo direito aumentado ou hipertrofiado podem apresentar
um impulso sustentado e prolongado na linha paraesternal esquerda, estendendo-se
durante toda a sístole.
Em alguns pacientes, é possível ouvir e palpar uma terceira bulha (B3) no ápice
cardíaco.
B3 costuma estar mais presente nos pacientes com sobrecarga volumétrica e em geral
implica comprometimento hemodinâmico.
A presença de quarta bulha (B4) não é um indicador específico de IC, mas geralmente
está presente nos pacientes com disfunção diastólica.
Ritmo em galope (B3+B4+Taquicardia).
Os sopros característicos de regurgitação mitral e tricúspide com frequência
encontram-se presentes nos pacientes com IC avançada por dilatação do VE.
- Exame do abdome: A hepatomegalia é um sinal importante nos pacientes com IC.
Quando presente, o fígado aumentado costuma ser doloroso, podendo pulsar durante
a sístole nos casos em que haja regurgitação tricúspide. A ascite, um sinal tardio,
ocorre como consequência de aumento da pressão nas veias hepáticas e nas veias
que drenam o peritônio. A icterícia, também um achado tardio, é causada por
disfunção hepática secundária à congestão do fígado e à hipoxemia hepatocelular,
estando associada a aumento das bilirrubinas direta e indireta.
O edema de mmii é uma das principais manifestações da IC, porém constitui um sinal
inespecífico e em geral está ausente nos pacientes tratados adequadamente com
diuréticos. Costuma ser bilateral, simétrico e postural (piora ao longo do dia),
ocorrendo predominantemente nos tornozelos e na região pré-tibial nos pacientes
ambulatoriais. Nos restritos ao leito, o edema pode ser observado nas regiões sacral
(edema pré-sacral) e escrotal. O edema de longa duração pode estar associado com
pele endurecida e pigmentada (dermatite ocre – causada por insuficiência venosa,
ocorrendo depósito de elementos do sangue no interstício, o radical heme que não é
fagocitado por macrófagos gera sua cor escura, castanha).
Diagnóstico:
Diagnóstico diferencial:
A IC deve ser distinguida de (1) condições nas quais se observa congestão circulatória
secundária à retenção anormal de água e sais, mas sem distúrbios na estrutura ou
função cardíacas (p. ex., insuficiência renal), e (2) causas não cardíacas de edema
pulmonar (p. ex., síndrome da angústia respiratória aguda).
Mesmo clínicos experientes podem ter dificuldade de diferenciar as dispneias de
origem cardíaca das de origem pulmonar. Nesse particular, os exames não invasivos
de imagem cardíaca, biomarcadores, testes para a avaliação da função pulmonar e
radiografia de tórax podem ser úteis. Em tal cenário, níveis muito baixos de BNP ou
de NT-pro-BNP podem ser úteis para excluir uma causa cardíaca para a dispneia.
O edema de tornozelo pode ser secundário à insuficiência venosa, obesidade, doença
renal ou efeitos da gravidade.