Gestão do esporte: Discussões introdutórias e essenciais

PREFÁCIO

Os últimos quinze anos foram marcados por intensas mudanças no cenário esportivo brasileiro, a partir, principalmente, dos megaeventos realizados no país. Tais acontecimentos trouxeram uma nova conformação à indústria esportiva local e afetaram, sobretudo, o consumo do produto esportivo. Certamente, tal cenário causou impacto de diferentes ordens e magnitudes para todos os envolvidos na cadeia produtiva esportiva brasileira. Em suma, nós vivemos um período de intensa cobrança por melhorias associadas a boas práticas de gestão esportiva e formação de mão de obra qualificada.

Nesta linha, a gestão do esporte é, enquanto área de conhecimento científico e campo acadêmico, relativamente nova no Brasil e ainda caminha para a sua consolidação frente a outros países, por exemplo. No entanto, existe outro ponto do qual vale chamar a atenção e que também impacta neste processo de consolidação: o distanciamento e a falta de diálogo entre o campo acadêmico/científico e o dia a dia do mercado, da prática em si.

É comum ouvirmos de profissionais do mercado frases como: as pesquisas de gestão do esporte são muito utópicas ou estão muito fora da nossa realidade, e até mesmo são muito teóricas. Por outro lado, pesquisadores de gestão do esporte comumente se queixam que simplesmente o mercado não os ouve. A realidade é que essa barreira foi construída e imposta pelos dois lados, por uma infinidade de fatores dos quais deixarei a reflexão a partir dos ensaios desta obra. O ponto central é que este problema já foi detectado e uma mudança gradativa vem ocorrendo na medida em que as partes passaram a entender que podem e devem dialogar entre si, em prol do desenvolvimento da gestão do esporte brasileiro.

Diversas iniciativas têm sido capitaneadas por instituições, empresas e projetos no que tange uma aproximação das discussões sobre gestão do esporte enquanto campo acadêmico científico e prática de mercado. Seria impossível listar aqui todas estas iniciativas, sob pena de deixar alguma injustamente de fora. De todo modo, gostaria de ressaltar, sobretudo, o papel fundamental da Associação Brasileira de Gestão do Esporte (Abragesp) como uma instituição pioneira, respeitada e de referência. Evidentemente, considerando também a origem desta obra, é preciso falar sobre a plataforma Gestão em Jogo, que embora não possa ser comparada à Abragesp, desenvolve trabalho fundamental na composição dos esforços para a aproximação entre o ambiente acadêmico e mercadológico.

Oficialmente criada no começo de abril de 2020 a plataforma Gestão em Jogo tem a missão de promover a união entre ciência e o mercado, na discussão da gestão esportiva por meio da produção de conteúdo. Mais do que gerar conteúdo, a Gestão em Jogo visa ser referência em relação ao seu nível de qualidade, rigor científico e comprometimento com os dados e fatos. Fundada por Eduardo Carlassara e Renan Barabanov, a plataforma conta hoje com um time de cinco estudantes colaboradores, entre graduandos e pós-graduandos das áreas de Educação Física, Administração e Design, que produzem diferentes tipos e formatos de conteúdo que podem ser acessados nas principais redes sociais disponíveis. Dentre os mais diversos conteúdos produzidos, como entrevistas, podcasts, rankings, guias, pesquisas e infográficos, é preciso destacar a produção de ensaios que versam sobre aspectos acadêmicos e profissionais da gestão do esporte em diferentes âmbitos e contextos.

Tais ensaios são quinzenalmente produzidos pelo escritor, professor, mestre e amigo Roger Luiz Brinkmann, cuja formação em Bacharelado e Licenciatura em Educação Física, pela Universidade Estácio de Sá, lhe confere visão profunda do fenômeno esportivo. Roger, autor desta obra, também é mestre em Ciências pela Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE/USP), sob orientação do respeitado professor doutor Ary José Rocco Júnior, e autor do livro Personagens históricos da Copa Libertadores, o qual eu recomendo fortemente a leitura. Minha história com o autor começou justamente na EEFE/USP, como colegas do programa de pós-graduação, e em pouco tempo fui capaz de notar a enorme capacidade, o profundo conhecimento, a sensibilidade e o comprometimento ético deste pesquisador.

São justamente tais características que Roger Luiz Brinkmann traz para os ensaios que compõe esta obra. Com o propósito de compilar todo o conteúdo produzido durante quase um ano para a plataforma Gestão em Jogo, o autor se aproxima de diferentes temas da gestão do esporte através de uma abordagem leve, descomplicada e atual.

Aos prezados leitores a minha recomendação é de que aproveitem sem moderação e se permitam ser conduzidos através de boas reflexões, que certamente os provocarão a acompanhar e contribuir para as discussões sobre gestão do esporte no Brasil.

Prof. Me. Eduardo Carlassara

INTRODUÇÃO

O esporte é um dos fenômenos culturais mais impactantes do século XXI. Milhões de pessoas trabalham de alguma maneira com o esporte ao redor do mundo, outras bilhões são influenciadas por ele. Camisas de clubes europeus são comuns de serem vistas na Ásia e na África. Camisas de clubes da NBA são vistas em todos os lugares do mundo. Estima-se que, aproximadamente, quatro bilhões de pessoas assistem à Copa do Mundo de futebol. Nenhum outro evento cultural tem esse poder de atingir tantas pessoas de forma global.

A indústria do esporte vinha numa crescente econômica exponencial nos últimos vinte anos. A pandemia da Covid-19 desacelerou esse crescimento, como fez com vários setores da sociedade. Embora o fator econômico seja muito importante para o desenvolvimento do esporte de alto rendimento, não é só essa manifestação esportiva que é importante.

Consta na Constituição Brasileira de 1988 que o esporte é manifestado de quatro formas distintas: 1) esporte escolar; 2) esporte de formação; 3) esporte de participação; 4) esporte de alto rendimento. Muitas vezes nos esquecemos de discutir e debater sobre todas essas manifestações esportivas, e focamos apenas no alto rendimento, e aqui no Brasil, mais especificamente, somente no futebol.

Para quem estuda o esporte, é importante entender a diferença que essas manifestações esportivas possuem entre si. Todas elas são essenciais e têm seus objetivos específicos e profissionais com diferentes perfis, para desenvolverem da melhor maneira essas manifestações esportivas. Aqui entra a função da gestão do esporte. Um gestor de esporte escolar tem habilidades diferentes de um gestor do esporte de alto rendimento.

A gestão do esporte como área de conhecimento surgiu nos anos 1960, nos Estados Unidos da América. Depois de alguns anos, a área se consolidou na América do Norte e Europa nos anos 1980, com o surgimento de cursos específicos de graduação e pós-graduação em sport management, além da criação de associações que começaram a organizar congressos acadêmicos e, mais tarde, a criação de revistas acadêmicas específicas de gestão do esporte.

Apesar de a área da gestão do esporte estar consolidada na América do Norte, Europa, Oceania e boa parte da Ásia, essa ainda não é a realidade do Brasil e da América Latina. A gestão do esporte como área de conhecimento está em um período de desenvolvimento e consolidação no Brasil. Ainda não existem cursos de pós-graduação (stricto sensu) e nem a nível de bacharelado. Porém, existem cursos tecnológicos (graduação), MBAs, de aperfeiçoamento e de especialização. Também já foram criados vários grupos de pesquisa na área, além da Associação Brasileira de Gestão do Esporte (Abragesp), fundada em 2009, e que organiza anualmente o Congresso Brasileiro de Gestão do Esporte, que já está na sua 11ª edição.

Um dos problemas de a área ser nova é que há pouca interação entre o conhecimento acadêmico e o mercado profissional. De maneira geral, os pesquisadores interagem apenas com pesquisadores, e profissionais interagem apenas com profissionais. Nos grupos de pesquisa, esse