Apostila Hidrologia
Apostila Hidrologia
Apostila Hidrologia
Agosto 2008
Versão
6
Introduzindo hidrologia
1
Introdução
O conceito de Hidrologia o estudo da Hidrologia nas Engenharias.
A Hidrologia pode ser tanto uma ciência como um ramo da engenharia e tem muitos
aspectos em comum com a meteorologia, geologia, geografia, agronomia, engenharia
ambiental e a ecologia. A Hidrologia utiliza como base os conhecimentos de hidráulica,
física e estatística.
1
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
As preocupações com o uso da água aumentam a cada dia porque a demanda por água
cresce à medida que a população cresce e as aspirações dos indivíduos aumentam.
Estima-se que no ano 2000 o mundo todo usou duas vezes mais água do que em 1960.
Enquanto as demandas sobem, o volume de água doce na superfície da terra é
relativamente fixo. Isto faz com que certas regiões do mundo já enfrentem situações de
escassez. O Brasil é um dos países mais ricos em água, embora existam problemas
diversos.
É possível que no futuro a água venha a ter um papel cada vez mais importante, num
mundo em que a energia renovável vai ser fundamental: no caso de produção
(hidroelétrica, energia de ondas e marés); no caso de armazenamento (para
complementar energia de vento ou solar); e no caso de produção de biocombustíveis
(irrigação).
Usos da água
Os usos da água são normalmente classificados em consuntivos e não consuntivos.
Usos consuntivos alteram substancialmente a quantidade de água disponível para
outros usuários. Usos não-consuntivos alteram pouco a quantidade de água, mas
podem alterar sua qualidade. O uso de água para a geração de energia hidrelétrica, por
exemplo, é um uso não-consuntivo, uma vez que a água é utilizada para movimentar as
turbinas de uma usina, mas sua quantidade não é alterada. Da mesma forma a
navegação é um uso não-consuntivo, porque não altera a quantidade de água
disponível no rio ou lago. Por outro lado, o uso da água para irrigação é um uso
consuntivo, porque apenas uma pequena parte da água aplicada na lavoura retorna na
forma de escoamento. A maior parte da água utilizada na irrigação volta para a
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
atmosfera na forma de evapotranspiração. Esta água não está perdida para o ciclo
hidrológico global, podendo retornar na forma de precipitação em outro local do
planeta, no entanto não está mais disponível para outros usuários de água na mesma
região em que estão as lavouras irrigadas.
Os usos de água também podem ser divididos de acordo com a necessidade ou não de
retirar a água do rio ou lago para que possa ser utilizada. Alguns usos da água que
podem ser feitos sem retirar a água de um rio ou lago são a navegação, a geração de
energia hidrelétrica, a recreação e os usos paisagísticos. Alguns usos da água que exigem
a retirada de água, ainda que parte dela retorne, são o abastecimento humano e
industrial, a irrigação e a dessedentação de animais.
Os parágrafos que seguem descrevem com um pouco mais de detalhe alguns dos
principais usos de água.
Abastecimento humano
O uso da água para abastecimento humano é considerado o mais nobre, uma vez que
o homem depende da água para sua sobrevivência. A água para abastecimento humano
é utilizada diretamente como bebida, para o preparo dos alimentos, para a higiene
pessoal e para a lavagem de roupas e utensílios. No ambiente doméstico a água
também é usada para irrigar jardins, lavar veículos e para recreação.
Abastecimento industrial
O uso industrial da água está relacionado aos processos de fabricação, ao uso no
produto final, a processos de refrigeração, à produção de vapor e à limpeza. A
fabricação de diferentes produtos tem diferentes consumos de água. Assim, a indústria
de produção de papel, por exemplo, é reconhecidamente uma das que mais consomem
água.
Irrigação
A irrigação é o uso de água mais importante do mundo em termos de quantidade
utilizada. A irrigação é utilizada na agricultura para obter melhor produtividade e para
que a atividade agrícola esteja menos sujeita aos riscos climáticos. Em algumas regiões
áridas, semi-aridas, ou com uma estação seca muito longa, a irrigação é essencial para
que possa existir a agricultura. No Brasil o uso de água para irrigação vem aumentando
a cada ano.
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 1. 1: Proporção aproximada dos usos da água em ambiente doméstico (Clarke e King, 2005).
Navegação
A navegação é um uso não-consuntivo que pode ser bastante atrativo do ponto de
vista econômico, principalmente para cargas com baixo valor por tonelada, como
minérios e grãos. A navegação requer uma profundidade adequada do corpo d’água e
não pode ser praticada em rios com velocidade de água excessiva.
Recreação
Um uso de água não consuntivo realizado no próprio curso d’água é a recreação. Este
uso é bastante freqüente em rios com qualidade de água relativamente boa, e inclui
atividades de contato direto, como natação e esportes aquáticos como a vela e a
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Preservação de ecossistemas
Além de todos os usos humanos mais diretos, é do interesse das sociedades que os rios
e lagos mantenham sua flora e fauna relativamente bem preservadas. A manutenção
dos ecossistemas aquáticos implica na necessidade de que uma parcela da água
permaneça no rio, e que a qualidade desta água seja suficiente para a vida aquática.
Geração de energia
A água é utilizada para a geração de energia elétrica em usinas hidrelétricas que
aproveitam a energia potencial existente quando a água passa por um desnível do
terreno. A potência de uma usina hidrelétrica é proporcional ao produto da descarga
(ou vazão) pela queda. A queda é definida pela diferença de altitude do nível da água a
montante (acima) e a jusante (abaixo) da turbina. A descarga em um rio depende das
características da bacia hidrográfica, como o clima, a geologia, os solos, a vegetação.
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Tabela 1. 1: Os dez países maiores produtores de energia hidrelétrica do mundo e a importância relativa da hidreletricidade na energia
total produzida (Gleick, 2000).
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Capítulo
2
Propriedades da água e o
ciclo hidrológico
Os conceitos fundamentais do ciclo hidrológico.
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γ = ρ⋅g
A massa específica da água líquida a diferentes temperaturas pode ser estimada pela
equação abaixo (Dingman, 2002):
1, 68
ρ = 1000 − 0,019549 ⋅ T − 3,98
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λ = 2,501 − 0,002361 ⋅ T
A hidrosfera
O termo hidrosfera refere-se a toda a água do mundo, que é estimada em
aproximadamente 1,4 . 1015 metros cúbicos. Cerca de 97 % da água do mundo está nos
oceanos. Dos 3% restantes, a metade (1,5% do total) está armazenada na forma de
geleiras ou bancadas de gelo nas calotas polares. A água doce de rios, lagos e aqüíferos
(reservatórios de água no subsolo) corresponde a menos de 1% do total.
Em valores totais a água doce existente na Terra e a água que atinge a superfície dos
continentes na forma de chuva é suficiente para atender todas as necessidades
humanas. Entretanto, grandes problemas surgem com a grande variabilidade temporal
e espacial da disponibilidade de água. A América do Sul é, de longe, o continente com a
maior disponibilidade de água, porém a precipitação que atinge nosso continente é
altamente variável, apresentando na Amazônia altíssimas taxas de precipitação
enquanto o deserto de Atacama é conhecido como o lugar mais seco do mundo.
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O ciclo hidrológico
O ciclo hidrológico é o conceito central da hidrologia. O ciclo hidrológico está
ilustrado na Figura 1. 1. A energia do sol resulta no aquecimento do ar, do solo e da
água superficial e resulta na evaporação da água e no movimento das massas de ar. O
vapor de ar é transportado pelo ar e pode condensar no ar formando nuvens. Em
circunstâncias específicas o vapor do ar condensado nas nuvens pode voltar à
superfície da Terra na forma de precipitação. A evaporação dos oceanos é a maior
fonte de vapor para a atmosfera e para a posterior precipitação, mas a evaporação de
água dos solos, dos rios e lagos e a transpiração da vegetação também contribuem. A
precipitação que atinge a superfície pode infiltrar no solo ou
A energia que escoar por sobre o solo até atingir um curso d’água. A água que
movimenta o ciclo infiltra umedece o solo, alimenta os aqüíferos e cria o fluxo de
hidrológico é água subterrânea.
fornecida pelo sol.
O ciclo hidrológico é fechado se considerado em escala global.
Em escala regional podem existir alguns sub-ciclos. Por exemplo, a água precipitada
que está escoando em um rio pode evaporar, condensar e novamente precipitar antes
de retornar ao oceano.
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
A água também sofre alterações de qualidade ao longo das diferentes fases do ciclo
hidrológico. A água salgada do mar é transformada em água doce pelo processo de
evaporação. A água doce que infiltra no solo dissolve os sais aí encontrados e a água
que escoa pelos rios carrega estes sais para os oceanos, bem como um grande número
de outras substâncias dissolvidas e em suspensão.
Exercícios
1) Mostre que o calor latente de vaporização da água a 100 oC corresponde a mais
de cinco vezes a energia necessária para aquecer a água de 0 a 100 oC.
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Capítulo
3
Bacia hidrográfica e
balanço hídrico
O
ciclo hidrológico é normalmente estudado com maior interesse na fase
terrestre, onde o elemento fundamental da análise é a bacia hidrográfica. A
bacia hidrográfica é a área de captação natural dos fluxos de água originados
a partir da precipitação, que faz convergir os escoamentos para um único
ponto de saída, seu exutório. A definição de uma bacia hidrográfica requer a definição
de um curso d’água, de um ponto ou seção de referência ao longo deste curso d’água e
de informações sobre o relevo da região.
Uma bacia hidrográfica pode ser dividida em sub-bacias e cada uma das sub-bacias
pode ser considerada uma bacia hidrográfica.
A bacia hidrográfica pode ser considerada como um sistema físico sujeito a entradas de
água (eventos de precipitação) que gera saídas de água (escoamento e
evapotranspiração). A bacia hidrográfica transforma uma entrada concentrada no
tempo (precipitação) em uma saída relativamente distribuída no tempo (escoamento).
• Área
• Declividade
A área é um dado fundamental para definir a potencialidade hídrica de uma bacia, uma
vez que a bacia é a região de captação da água da chuva. Assim, a área da bacia
multiplicada pela lâmina precipitada ao longo de um intervalo de tempo define o
volume de água recebido ao longo deste intervalo de tempo. A área de uma bacia
hidrográfica pode ser estimada a partir da delimitação dos divisores da bacia em um
mapa topográfico.
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
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A equação de Kirpich, apresentada abaixo, pode ser utilizada para estimativa do tempo
de concentração de pequenas bacias:
0 ,385
L3
t c = 57 ⋅
∆h
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Figura 3. 3: Representação do relevo na forma de uma matriz (MDE) com sobreposição de curvas de nível de separadas por 10 m.
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cálculo é repetido para todas as células de uma matriz. O resultado é uma nova matriz
em que cada célula recebe um valor que é um código de direção de escoamento.
Figura 3. 4: Determinação das direções de escoamento sobre o relevo representado na forma de uma grade (Modelo Digital de
Elevação): a) altitudes; b) códigos utilizados para definir as direções de fluxo; c) grade com direções de fluxo codificadas; d) grade com
direções de fluxo indicadas por setas.
Supondo que o objetivo da análise seja determinar a área da bacia a montante da célula
localizada na penúltima linha e na penúltima coluna, conforme indicado na Figura 3. 5,
seria fácil identificar as células que conduzem a água até este local, simplesmente
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
analisado as direções das setas. Este tipo de procedimento pode ser automatizado em
um programa de computador, permitindo a análise de bacias muito mais complexas.
a) b)
Figura 3. 5: Delimitação de uma bacia hidrográfica sobre uma grade com direções de fluxo calculadas a partir do MDE. A figura da
esquerda mostra a célula definida como o exutório da bacia. A figura da direita mostra a área da bacia até este exutório.
Figura 3. 6: Aproximação do contorno real de uma bacia hidrográfica sobre uma grade de (a) baixa resolu;cão e (b) alta resolução
espacial. (a região hachurada é a área da bacia real e a linha escura apresenta o contorno aproximado sobre a grade regular).
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Exemplo
1) Determine as direções de escoamento para as células do MDE da figura
abaixo, considerando que a resolução espacial é de, aproximadamente, 90 x 90
m e que as altitudes estão em metros.
Começamos considerando que as células do contorno drenam para o interior da figura. Assim, para a
primeira célula (canto superior esquerdo) é necessário definir qual é a direção de maior declividade. A
altitude da primeira célula é de 355 m. A altitude da célula localizada ao leste é de 359m, o que
significa que a água não pode escoar para o leste. As duas células localizadas ao sul e a sudeste
apresentam altitudes mais baixas. A declividade a partir da primeira célula para o sul pode ser
calculada por:
355 − 348
S= = 0,0778
90
A declividade a partir da primeira célula para o sudeste pode ser calculada por (considera-se que a
distância no sentido diagonal é igual à resolução vezes a raiz de 2):
355 − 344
S= = 0,0864
90 ⋅ 2
Portanto a direção de fluxo na primeira célula (canto superior esquerdo) é para sudeste.
Este procedimento é repetido para cada uma das células. Para as células centrais é preciso calcular a
declividade para um número maior de vizinhas antes de escolher a direção de maior declividade. A
figura abaixo mostra o MDE original e as direções de fluxo determinadas para todas as células.
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
dV
= P − E −Q
dt
∆V
= P −E −Q
∆t
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Figura 3. 7: Relevo de uma bacia hidrográfica e as entradas e saídas de água: P é a precipitação; ET é a evapotranspiração e Rs é o
escoamento (adaptado de Hornberger et al., 1998).
P= E+Q
Q
C=
P
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Tabela 3. 1: Características de balanço hídrico das grandes regiões hidrográficas do Brasil (valores em mm correspondem às laminas
médias precipitadas, escoadas e evaporadas ao longo de um ano).
A tabela mostra que a evapotranspiração tende a ser maior nas bacias mais próximas
do Equador. Observa-se também que a disponibilidade de água (vazão em mm por
ano) é menor na bacia do rio São Francisco e na bacia Atlântico Leste (1) que inclui as
regiões mais secas da região Nordeste do Brasil.
Leituras adicionais
A representação de bacias hidrográficas em ambiente computacional é um assunto
muito explorado em livros sobre Sistemas de Informação Geográfica (SIG). Alguns
softwares de SIG apresentam ferramentas poderosas para analisar e extrair
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Exemplos
2) Qual seria a vazão de saída de uma bacia completamente impermeável, com
área de 60km2, sob uma chuva constante à taxa de 10 mm.hora-1?
Cada mm de chuva sobre a bacia de 60km2 corresponde a um volume total de 60.000 m3 lançados
sobre a bacia, o que significa que em uma hora são lançados 600.000 m3 de água sobre esta bacia.
Como a bacia é impermeável toda a água deve sair pelo exutório a uma vazão constante de 167 m3.s-1.
A vazão média de 340 m3.s-1 em uma bacia de 15.000 km2 corresponde ao escoamento anual de uma
lâmina dada por:
ou
3,6 ⋅ 24 ⋅ 365
Q( mm / ano ) = Q( m 3 .s −1 )
A( km 2 )
3,6 ⋅ 24 ⋅ 365
Q( mm / ano ) = 340 ⋅ ≅ 715 mm.ano −1
15000
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Exercícios
1) Uma bacia de 100 km2 recebe 1300 mm de chuva anualmente. Qual é o
volume de chuva (em m3) que atinge a bacia por ano?
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I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
4
Água e energia na
atmosfera
A
fase atmosférica do ciclo hidrológico é responsável pela redistribuição da
água em termos globais. A presença de vapor de água na atmosfera também
influencia e é influenciada pela radiação solar.
O ar atmosférico
O ar atmosférico é uma mistura de gases em que predomina o nitrogênio (78%) e o
oxigênio (21%). O vapor de água no ar atmosférico varia até um máximo próximo de
4%. Em percentagens menores o ar atmosférico também contém partículas orgânicas e
inorgânicas, que têm um papel fundamental no ciclo hidrológico, pois formam os
núcleos de condensação do vapor de água nas nuvens.
17,27 ⋅ T
e s = 611 ⋅ exp (4.1)
237,3 + T
w
UR = 100 ⋅ em % (4.2)
ws
26
Figura 4. 2: Relação entre o conteúdo de água no ar no ponto de saturação e a temperatura do ar.
A umidade relativa também pode ser expressa em termos de pressão parcial de vapor.
No ponto de saturação a pressão parcial do vapor corresponde à pressão de saturação
do vapor no ar, e a equação 4.3 pode ser reescrita como:
e
UR = 100 ⋅ em % (4.3)
es
A concentração máxima de
Considere o ar a temperatura (T) de pouco mais
vapor de água no ar a 20 oC é de 25 oC e com pressão de vapor (e) próxima de 2
de, aproximadamente, 20 g.m-3. KPa (ponto A na Figura 4. 3). A pressão de
saturação do ar nesta situação é identificada pelo
ponto B, que mantém a mesma temperatura que o ponto A, e mostra a situação em
que o ar estaria saturado de vapor de água. A pressão de vapor no ponto B é es, que é a
pressão de saturação de vapor para a temperatura T.
27
Figura 4. 3: Identificação dos pontos que correspondem à temperatura de ponto de orvalho e à pressão de saturação de vapor no ar
para uma dada situação de temperatura e umidade (veja texto).
Para uma dada pressão de vapor (e) inferior à pressão de saturação (es), a temperatura
de ponto de orvalho pode ser calculada pela equação 4.4 (Dingman, 2002):
ln (e ) + 0,4926
Td = (4.4)
0,0708 − 0,00421 ⋅ ln (e )
A pressão de saturação pode ser calculada pela equação 4.1 usando a informação da temperatura do
ar.
17,27 ⋅ T 17,27 ⋅ 25
e s = 611 ⋅ exp = 611 ⋅ exp = 3,17 KPa
237,3 + T 237,3 + 25
28
e UR ⋅ e s 60 ⋅ e s
UR = 100 ⋅ →e= = = 1,90 KPa
es 100 100
Portanto a pressão parcial de vapor a esta temperatura e umidade relativa é de 1,9 KPa. Observe que
esta situação é parecida com a do ponto A na Figura 4. 3.
A radiação solar que atinge o topo da atmosfera dividida pela área do círculo definido
pela projeção da Terra no plano (1,28.1014 m2) é de cerca de 1367 W.m-2. Em um
balanço de energia médio em toda a atmosfera, parte da energia incidente é refletida
pelo ar e pelas nuvens (26%) e parte é absorvida pela poeira, pelo ar e pelas nuvens
(19%). Parte da energia que chega a superfície é refletida de volta para o espaço ainda
sob a forma de ondas curtas (4% do total de enegia incidente no topo da atmosfera).
A energia absorvida pela terra e pelos oceanos contribui para o aquecimento destas
superfícies que emitem radiação de ondas longas. Além disso, o aquecimento das
superfícies contribui para o aquecimento do ar que está em contato, gerando o fluxo de
calor sensível (ar quente). A vaporização da água líquida no solo, nas plantas ou na
superfície e a transferência deste vapor para a atmosfera é o chamado fluxo de calor
latente (evaporação).
Finalmente, a energia absorvida pelo ar, pelas nuvens e a energia dos fluxos de calor
latente e sensível pode retornar ao espaço na forma de radiação de onda longa,
fechando o balanço de energia. A Figura 4. 5 apresenta, qualitativamente, a radiação
que chega e a que deixa a Terra, de acordo com o comprimento de onda.
29
ondas ondas
incidente
Radiação Solar
curtas longas
Espaço
100
6 20 4 6 38 26
Atmosfera
l o da
Emitida pelas
p e fl e ti
ar
nuvens
re
ens
v
pe letida
nu
Absorvida pelo Emitida pelo
las
ar e poeira 16 vapor de H2O
r ef
e CO2
ie
erfíc
s up
Absorvida pelas Absorvida pelo
pela
nuvens vapor de H2O
Fluxo de calor
tida
e CO2
latente
refle
3 15
Fluxo de calor
sensível
Absorvida na
Emitida pela
superfície
superfície
51 21 7 23
Superfície (Terra + Oceanos)
5 10 15 20 25
Comprimento de onda (µm)
30
Radiação no topo da atmosfera
Devido ao ângulo relativo entre a radiação solar e o plano tangente à Terra, a energia
por unidade de área que atinge o topo da atmosfera varia com a latitude e com a época
do ano. A Figura 4. 6 apresenta valores de energia recebida por radiação no topo da
atmosfera de acordo com a época do ano e a latitude. Os valores são dados em MJ por
m2 de área na superfície da Terra, recebidos ao longo de um dia. Observa-se que a
energia recebida por unidade de área é maior na região equatorial (latitudes baixas) e
menor nas regiões polares (latitudes altas). As regiões escuras mostram a situação em
que a Terra não recebe radiação (inverno nas regiões polares).
24
N= ⋅ ωs (4.5)
π
2⋅π
δ = 0,4093 ⋅ sin ⋅ J − 1,405 (4.7)
365
ρW ⋅ λ
S TOP = 15,392 ⋅ ⋅ d r ⋅ (ωs ⋅ sen ϕ ⋅ sen δ + cos ϕ ⋅ cos δ ⋅ sen ωs ) (4.8)
1000
2⋅π
d r = 1 + 0,033 ⋅ cos ⋅ J (4.9)
365
31
onde J é o dia do calendário Juliano.
EXEMPLO
Na figura anterior pode-se observar que a energia recebida por radiação incidente no topo da atmosfera
ao longo de um dia, num local a 30oS, no mês de agosto é de aproximadamente 25 MJ.m-2. Não há
uma informação sobre a temperatura em que a água está antes de evaporar, assim, podemos assumir
um calor latente de vaporização de 2,53 MJ.Kg-1. Considerando que toda a energia é utilizada para
evaporar a água, a taxa de evaporação pode ser calculada por:
25MJ .m −2
E= −1
= 9,9 Kg .m − 2
2,53MJ .Kg
Considerando que a massa específica da água é de, aproximadamente, 1 Kg para cada litro, e que 1
litro distribuído sobre 1 m2 corresponde a uma lâmina de 1 mm, a evaporação é de 9,9 mm.dia-1.
32
Figura 4. 6: Energia recebida ao longo de um dia por radiação solar no topo da atmosfera (MJ.m-2) em função da latitude e da época
do ano (Dingman, 2002)
n
SSUP = a s + b s ⋅ ⋅ STOP (4.10)
N
33
onde N [horas] é a insolação máxima possível numa latitude em certa época do ano; n
[horas] é a insolação medida; STOP [MJ.m-2.dia-1] é a radiação no topo da atmosfera; SSUP
[MJ.m-2.dia-1] é a radiação na superfície terrestre; as [-] é a fração da radiação que atinge a
superfície em dias encobertos (quando n=0); e as + bs [-] é a fração da radiação que
atinge a superfície em dias sem nuvens (n=N).
Quando não existem dados locais medidos que permitam estimativas mais precisas, são
recomendados os valores de 0,25 e 0,50, respectivamente, para os parâmetros as e bs
(Shuttleworth, 1993).
Rn
H λE
Ao Ai
S
Figura 4. 7: Balanço de energia na superfície Terrestre. A energia solar recebida na forma de radiação (Rn) deve ser igual à soma das
energias que deixam o volume de controle e à variação da energia armazenada.
34
A radiação líquida Rn envolve um balanço de radiação de ondas curtas e ondas longas.
Nas ondas curtas o balanço é definido pela energia incidente menos refletida, e é
normalmente positiva (mais energia entrando do que saindo do volume de controle).
Na faixa de ondas longas o balanço de energia é definido pela radiação emitida pela
superfície para a atmosfera e pela radiação emitida pela atmosfera para a superfície, e é
normalmente negativa (mais energia deixando o volume de controle).
onde Rnc [MJ.m-2.s-1] é a radiação líquida de ondas curtas líquida na superfície; SSUP
[MJ.m-2.s-1] é a radiação de ondas curtas que atinge a superfície (valor medido ou
estimado pela equação 4.10); e α [-] é o albedo, que é a parcela da radiação incidente
que é refletida (parâmetro que depende da cobertura vegetal e uso do solo).
35
Tabela 4. 1: Valores aproximados de albedo de superficies (Brutsaert, 2005).
Uma parte da radiação que atinge a superfície terrestre (SSUP) é refletida, conforme já
descrito. A maior parte da energia irradiada pelo sol está na faixa de ondas curtas, de
0,3 a 3 µm. O balanço de energia, porém, também inclui uma pequena parcela de
radiação de ondas longas, de 3 a 100 µm.
onde Rnl [MJ.m-2.dia-1] é a radiação líquida de ondas longas que deixa a superfície; f [-] é
um fator de correção devido à cobertura de nuvens; T [ºC] é a temperatura média do ar
a 2 m do solo; ε [-] é a emissividade da superfície; σ [MJ.m-2.ºK-4.dia-1] é uma constante
(σ=4,903.10-9 MJ.m-2.ºK-4.dia-1).
36
A emissividade da superfície pode ser estimada pela equação abaixo.
O fator de correção da radiação de ondas longas devido à cobertura de nuvens (f) pode
ser estimado com base na equação a seguir:
n
f = 0,1 + 0,9 ⋅ (5.23)
N
onde N [horas] é a insolação máxima possível numa latitude em certa época do ano; n
[horas] é a insolação medida.
Por simplicidade, o fluxo de calor para o solo (G) pode ser considerado nulo. Assim, o
balanço de energia na superfície de um dia para outro pode ser dado por :
∆S = RL − H − E (5.24)
A radiação líquida total é dada pela radiação líquida de ondas curtas menos a radiação
líquida de ondas longas, conforme a equação abaixo:
O fluxo de calor sensível é o fluxo de calor por convecção, que ocorre porque a
superfície se aquece e, assim, aquece o ar atmosférico em contato direto com a
superfície. A turbulência provocada pelo vento se encarrega de redistribuir o ar
aquecido para camadas mais altas da atmosfera, resultando num fluxo de energia. O
fluxo de calor sensível recebe este nome porque está relacionado à temperatura do ar,
que pode ser “sentida” (Hornberger et al., 1998).
O calor latente é a parte da energia interna que não pode ser “sentida”, ou seja, não
está relacionada à temperatura, mas sim ao calor latente de vaporização. O fluxo de
calor latente é o fluxo de energia associado ao fluxo de água para camadas mais altas da
atmosfera, a partir da superfície. O fluxo de calor latente está, portanto, relacionado ao
fluxo de água da superfície para a atmosfera por evapotranspiração.
37
Circulação atmosférica
Em conseqüência do aquecimento desigual das diferentes regiões da Terra, gradientes
de energia são gerados e provocam o aquecimento diferencial das massas de ar. A ar
aquecido tem uma densidade menor e tende a ascender na atmosfera, provocando a
circulação das massas de ar (vento).
Leituras adicionais
Os capítulos 2 e 3 do livro Handbook of Hydrology apresentam uma visão mais
completa sobre a circulação de água e o balanço de energia na atmosfera e na superfície
da Terra. A apostila da disciplina de Climatologia, de autoria de Julio Sanchez também
aprofunda os processos descritos neste capítulo. O capítulo 3 do livro Physical
Hydrology de Dingman (2002) também é excelente.
Exercícios
1) Estime a taxa de evaporação da água em mm por dia num local sobre a linha
do Equador, no mês de junho, se toda a radiação incidente no topo da
atmosfera estivesse disponível para produzir evaporação.
38
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
5
Precipitação
Importância da precipitação
Conforme mencionado quando abordado o assunto balanço hídrico, a precipitação é a
única forma de entrada de água em uma bacia hidrográfica. Assim sendo, ela fornece
subsídios para a quantificação do abastecimento de água, irrigação, controle de
inundações, erosão do solo, etc., e é fundamental para o adequado dimensionamento
de obras hidráulicas, entre outros.
quente pode conter mais vapor do que ar frio. A figura a seguir apresenta a variação da
concentração de saturação de vapor no ar com a temperatura. Observa-se que o ar a
10º C pode conter duas vezes mais vapor do que o ar a 0º C.
Chuvas frontais
As chuvas frontais ocorrem quando se encontram duas grandes massas de ar, de
diferente temperatura e umidade. Na frente de contato entre as duas massas o ar mais
quente (mais leve e, normalmente, mais úmido) é empurrado para cima, onde atinge
40
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Chuvas frontais têm uma intensidade relativamente baixa e uma duração relativamente
longa. Am alguns casos as frentes podem ficar estacionárias, e a chuva pode atingir o
mesmo local por vários dias seguidos.
Chuvas orográficas
As chuvas orográficas ocorrem em regiões em que um grande obstáculo do relevo,
como uma cordilheira ou serra muito alta, impede a passagem de ventos quentes e
úmidos, que sopram do mar, obrigando o ar a subir. Em maiores altitudes a umidade
do ar se condensa, formando nuvens junto aos picos da serra, onde chove com muita
freqüência. As chuvas orográficas ocorrem em muitas regiões do Mundo, e no Brasil
são especialmente importantes ao longo da Serra do Mar.
41
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Chuvas convectivas
As chuvas convectivas ocorrem pelo aquecimento de massas de ar, relativamente
pequenas, que estão em contato direto com a superfície quente dos continentes e
oceanos. O aquecimento do ar pode resultar na sua subida para níveis mais altos da
atmosfera onde as baixas temperaturas condensam o vapor, formando nuvens. Este
processo pode ou não resultar em chuva, e as chuvas convectivas são caracterizadas
pela alta intensidade e pela curta duração. Normalmente, porém, as chuvas convectivas
ocorrem de forma concentrada sobre áreas relativamente pequenas. No Brasil há uma
predominância de chuvas convectivas, especialmente nas regiões tropicais.
Medição da chuva
A chuva é medida utilizando instrumentos chamados pluviômetros que nada mais são
do que recipientes para coletar a água precipitada com algumas dimensões
padronizadas. O pluviômetro mais utilizado no Brasil tem uma forma cilíndrica com
uma área superior de captação da chuva de 400 cm2, de modo que um volume de 40
ml de água acumulado no pluviômetro corresponda a 1 mm de chuva. O pluviômetro
é instalado a uma altura padrão de 1,50 m do solo (Figura 5. 3) e a uma certa distância
de casas, árvores e outros obstáculos que podem interferir na quantidade de chuva
captada.
42
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
No Brasil são poucos os radares para uso meteorológico, com a exceção do Estado de
São Paulo em que existem alguns em operação. Em alguns países, como os EUA, a
Inglaterra e a Alemanha, já existe uma cobertura completa com sensores de radar para
estimativa de chuva.
43
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
A altura é a espessura média da lâmina de água que cobriria a região atingida se esta
região fosse plana e impermeável. A unidade de medição da altura de chuva é o
milímetro de chuva. Um milímetro de chuva corresponde a 1 litro de água distribuído
em um metro quadrado.
44
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Tabela 5. 1: Freqüência de ocorrência de chuvas diárias de diferentes alturas em um posto pluviométrico no interior do Paraná ao
longo de um período de, aproximadamente, 23 anos.
Bloco Freqüência
P = zero 5597
P < 10 mm 1464
10 < P < 20 mm 459
20 < P < 30 mm 289
30 < P < 40 mm 177
40 < P < 50 mm 111
50 < P < 60 mm 66
60 < P < 70 mm 38
70 < P < 80 mm 28
80 < P < 90 mm 20
90 < P < 100 mm 8
100 < P < 110 mm 7
110 < P < 120 mm 2
120 < P < 130 mm 5
130 < P < 140 mm 2
140 < P < 150 mm 1
150 < P < 160 mm 1
160 < P < 170 mm 1
170 < P < 180 mm 2
180 < P < 190 mm 1
190 < P < 200 mm 0
P > 200 mm 0
Total 8279
1
TR =
Pr obabilidade
45
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
46
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 5. 5: Variabilidade sazonal da chuva em Porto Alegre e Cuiabá, representada pelas chuvas médias mensais no período de 1961 a
1990.
47
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
O cálculo da chuva média em uma bacia pode ser realizado utilizando o método da
média aritmética; das Isoietas; dos polígonos de Thiessen ou através de interpolação
em Sistemas de Informação Geográfica (SIGs).
O método mais simples é o da média aritmética, em que se calcula a média das chuvas
ocorridas em todos os pluviômetros localizados no interior de uma bacia.
EXEMPLO
Utilizando o método da média aritmética considera-se os pluviômetros que estão no interior da bacia. A
média da chuva é Pm = (66+50+44+40)/4 = 50 mm.
48
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Utilizando o método dos polígonos de Thiessen o primeiro passo é traçar linhas que
unem os postos pluviométricos mais próximos entre si. A seguir é determinado o
ponto médio em cada uma destas linhas e, a partir desse ponto é traçada uma linha
perpendicular. A interceptação das linhas médias entre si e com os limites da bacia
definem a área de influência de cada um dos postos. A chuva média é uma média
ponderada utilizando as áreas de influência como ponderador. Este método pode ser
melhor compreendido através de um exemplo, como o que segue.
Figura 5. 7: Mapa da bacia com chuvas nos postos pluviométricos para o exemplo 2.
EXEMPLO
Utilizando o método dos polígonos de Thiessen o primeiro passo é traçar linhas que unem os postos
pluviométricos mais próximos. A seguir é determinado o ponto médio em cada uma destas linhas e
traçada uma linha perpendicular. A interceptação das linhas médias entre si e com os limites da bacia
vão definir a área de influência de cada um dos postos. A seqüência é apresentada na próxima página.
49
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Pm = 120x0,15+70x0,40+50x0,30+75x0,05+82x0,10 = 73 mm.
Se fosse utilizado o método da média aritmética haveria apenas dois postos no interior da bacia, com
uma média de 60 mm. Se fosse calculada uma média incluindo os postos que estão fora da bacia
chegaríamos a 79,5 mm.
50
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
51
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
yi
d ij
yj
x
xi xj
52
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
2 2
d ij = (x i − x j ) + (yi − y j )
Havendo mais de um posto pluviométrico, a precipitação média numa célula i pode ser
calculada pela equação a seguir:
NP Pj
∑ (d )
j =1
b
ij
Pmi = NP
1
∑ (d )
j =1
b
ij
Este método de interpolação pode ser aplicado para todas as NC células que
representam uma bacia, obtendo-se o valor da chuva média para cada uma delas. A
chuva média da bacia é calculada como a média de todas as células que compõe a
bacia, de acordo com a equação que segue:
NC
∑ Pm
i =1
i
Pm =
NC
53
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Após esta análise as séries poderão apresentar falhas, que devem ser preenchidas por
alguns dos métodos indicados a seguir.
Preenchimento de falhas
Em alguns casos pode haver falha na leitura ou no arquivamento de dados
pluviométricos, resultando em falha de informação para alguns períodos. Em alguns
casos é possível fazer o preenchimento destas falhas, utilizando dados de postos
pluviométricos da vizinhança. Este tipo de preenchimento não substitui os dados
originais, e somente pode ser aplicado para dados em intervalo de tempo mensal ou
anual.
Os postos vizinhos escolhidos devem estar numa região climática semelhante ao posto
a ser preenchido. O preenchimento efetuado por esta metodologia é simples e
apresenta algumas limitações, quando cada valor é visto isoladamente. Para o
preenchimento de valores diários de precipitação não se deve utilizar esta metodologia,
pois os resultados podem ser muito ruins. Normalmente valores diários são de difícil
54
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Para o ajuste da regressão linear simples, correlaciona-se o posto com falhas (Y) com
outro vizinho (X). A correlação produz uma equação, cujos parâmetros podem ser
estimados por métodos como o de mínimos quadrados, ou graficamente através da
plotagem cartesiana dos pares de valores (X, Y), traçando-se a reta que melhor
representa os pares de pontos. Uma vez definida a equação semelhante à apresentada
abaixo, as falhas podem ser preenchidas.
Y = a + b. X
Por exemplo, considerando as duas séries de precipitação dos postos P1 (código ANA
03252006) e P2 (código ANA 03252008), ambos localizados próximos à Estação
Ecológica do Taim/RS, apresentadas na Tabela 5. 2. O preenchimento das falhas dos
meses de Abril e Maio no posto P1 pode ser feito com base na regressão linear
simples. A equação obtida é apresentada no gráfico da Figura 5. 10.
Tabela 5. 2: Dados de chuva mensal de dois postos pluviométricos no Sul do RS para exemplo de preenchimento de falhas.
55
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
200
150
P1
100
50
0
0 50 100 150 200 250
P2
Figura 5. 10: Relação linear entre as precipitações mensais de dois postos pluviométricos no Sul do RS, para preenchimento de falhas.
Com base na equação ajustada por mínimos quadrados (Figura 5. 10), os valores de
chuva dos meses de Abril e Maio no posto P1 seriam 108,7 e 112,1 mm,
respectivamente.
Y = a + b. X 1 + c. X 2 + d . X 3 + e. X 4 + ...
Método Dupla-massa
Um dos métodos mais conhecidos para a análise de consistência dos dados de
precipitação é o Método da Dupla-Massa, desenvolvido pelo Geological Survey (USA).
A principal finalidade da aplicação do método é identificar se ocorreram mudanças no
comportamento da precipitação ao longo do tempo, ou mesmo no local de
observação.
56
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Especificamente, devem ser selecionados os postos de uma região, acumular para cada
um deles os valores mensais (ou anuais), e plotar num gráfico cartesiano os valores
acumulados correspondentes ao posto a consistir (nas ordenadas) e de um outro posto
confiável adotado como base de comparação (nas abscissas). Pode-se também
modificar o método, considerando valores médios das precipitações mensais
acumuladas em vários postos da região, e plotar esses valores no eixo das abscissas.
Quando não se observa o alinhamento dos dados segundo uma única reta, podem ter
ocorrido as seguintes situações: alterações de condições climáticas ou condições físicas
do local, mudança de observador, ou erros sistemáticos de leitura.
Tendo sido constatada uma inconsistência nos dados é necessário identificar o fator
causador da mudança de declividade na curva de Dupla-Massa. A seguir é possível
tentar corrigir os dados suspeitos, usando um método semelhante ao de
preenchimento de falhas, mas fazendo uso dos dados suspeitos. Estes métodos são
explicados de forma mais completa em livros como o de Tucci (1993).
Na região de Porto Alegre, por exemplo, chove aproximadamente 1300 mm por ano,
em média. Em muitas regiões da Amazônia chove mais do que 2000 mm por ano,
enquanto na região do Semi-Árido do Nordeste há áreas com menos de 600 mm de
chuva por ano.
57
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 5. 11: Histograma de freqüência de chuvas anuais no posto 02045005, no município de Lamounier (MG).
EXEMPLO
A faixa de chuva entre a média menos duas vezes o desvio padrão e a média mais duas vezes o desvio
padrão inclui 95% dos anos em média, e 2,5 % dos anos tem precipitação inferior à média menos duas
vezes o desvio padrão, enquanto 2,5% tem precipitação superior à média mais duas vezes o desvio
padrão, o que corresponde a 5 anos a cada 200, em média. Assim, a chuva anual que é superada ou
igualada apenas 5 vezes a cada 200 anos é:
58
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Chuvas máximas
As chuvas intensas são as causas das cheias e as cheias são causas de grandes prejuízos
quando os rios transbordam e inundam casas, ruas, estradas, escolas, podendo destruir
plantações, edifícios, pontes etc. e interrompendo o tráfego. As cheias também podem
trazer sérios prejuízos à saúde pública ao disseminar doenças de veiculação hídrica.
Por estes motivos existe o interesse pelo conhecimento detalhado de chuvas máximas
no projeto de estruturas hidráulicas como bueiros, pontes, canais e vertedores.
A Figura 5. 12 apresenta uma curva IDF obtida a partir da análise dos dados de um
pluviógrafo que esteve localizado no Parque da Redenção, em Porto Alegre. Cada uma
das linhas representa um Tempo de Retorno; no eixo horizontal estão as durações e no
eixo vertical estão as intensidades. Observa-se que quanto menor a duração maior a
intensidade da chuva. Da mesma forma, quanto maior o Tempo de Retorno, maior a
intensidade da chuva. Por exemplo, a chuva de 1 hora de duração com tempo de
retorno de 20 anos tem uma intensidade de 60 mm.hora-1.
59
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 5. 12: Curva IDF para a cidade de Porto Alegre, com base nos dados coletados pelo pluviógrafo do DMAE localizado no
Parque da Redenção, publicada pelo DMAE em 1972 (adaptado de Tucci, 1993).
Evidentemente as curvas IDF são diferentes em diferentes locais. Assim, a curva IDF
do Parque da Redenção em Porto Alegre vale para a região próxima a esta cidade.
Infelizmente não existem séries de dados de pluviógrafos longas em todas as cidades,
assim, muitas vezes, é necessário considerar que a curva IDF de um local é válida para
uma grande região do entorno. No Brasil existem estudos de chuvas intensas com
curvas IDF para a maioria das capitais dos Estados e para algumas cidades do interior,
apenas.
60
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Uma curva IDF também pode ser resumida na forma de uma equação. De maneira
geral as equações IDF tem a forma apresentada a seguir:
a ⋅ TR b
I=
(t d + c )d
onde I é a intensidade da chuva (mm.hora-1); a, b, c e d são parâmetros característicos
da IDF de cada local; TR é o tempo de retorno em anos; td é a duração da precipitação
em minutos.
61
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
para diferentes durações. Observa-se que existem regiões da China em que já ocorreu
em 10 horas a chuva de 1400 mm, que é equivalente ao total anual médio de
precipitação em Porto Alegre.
Tabela 5. 4: Chuvas mais intensas já registradas no Mundo (adaptado de Ward e Trimble, 2003).
Chuvas de projeto
Em projetos de drenagem urbana freqüentemente são geradas estimativas de vazão a
partir de informações de chuvas intensas. Para isto são gerados cenários com eventos
de chuva idealizados, denominados “eventos de chuva de projeto” ou “chuvas de
projeto”. As curvas IDF podem ser utilizadas para gerar chuvas de projeto, a partir da
obtenção de valores de precipitação em intervalos de tempo menores do que a duração
total da chuva.
62
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Leituras adicionais
Análise da aplicabilidade de padrões de chuva de projeto a Porto Alegre – Dissertação
de mestrado de Daniela da Costa Bemfica, IPH-UFRGS, 1999.
Exercícios
1) Qual é a diferença entre um pluviômetro e um pluviógrafo?
63
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
64
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
10) Mostre que o cálculo de chuva média numa bacia usando o método de
interpolação ponderado pelo inverso da distância se o expoente b for igual a
zero é equivalente ao método da média aritmética.
11) Qual é a chuva média na bacia da figura abaixo considerando que a chuva
observada em A é de 1300 mm, a chuva observada em B é de 900 mm e a
chuva observada em C é de 1100 mm? Utilize o método dos polígonos de
Thiessen. Depois utilize o método da interpolação pelo inverso da distância ao
quadrado, aproximando a forma da bacia com células de 10 x 10 km, sendo
que a grade sobreposta ao desenho tem resolução de 1 x 1 km.
65
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
6
Interceptação
A
interceptação é a retenção de água da chuva antes que esta atinja o solo. A
interceptação é produzida pela cobertura vegetal e armazenamento em
depressões. O volume de água retido por interceptação fica disponível para a
evaporação, e, portanto, o principal efeito da interceptação em uma bacia é
aumentar a evaporação e reduzir o escoamento.
Alguns valores estimados para perdas por interceptação de acordo com o tipo de
vegetação são:
Alguns autores sugerem que se a chuva total de um evento for inferior a 1 mm, ela será
interceptada em sua totalidade, e se for superior a 1 mm, a interceptação pode variar
entre 10 e 40%.
Dados obtidos na literatura sugerem que o IAF tem valores em torno de 2 e 3 para
campo e pastagem, valores em torno de 6 a 9 para florestas, e valores de 0 (durante o
preparo de solo) a 6 (no mês de desenvolvimento máximo) em cultivos anuais. As
variações não são muito grandes e estes valores são relativamente confiáveis, dada a sua
repetição em diversas medições e estimativas apresentadas na literatura.
A lâmina interceptada durante um evento de chuva pode ser estimada com base no
valor de IAF para uma dada vegetação através da equação a seguir:
S IL = Fi ⋅ IAF (6.1)
67
EXEMPLO
Utilizando a relação entre o índice de área foliar e o volume interceptado (equação 6.1), e considerando
que o IAF da floresta é igual a 6 (ver tabela acima) a lâmina interceptada é calculada como:
Armazenamento em depressões
Em áreas urbanas uma parcela grande da chuva é retida em depressões do terreno, e
não produz escoamento. As áreas das depressões normalmente são impermeáveis e,
portanto, também não existe infiltração significativa no solo. A água retida nestas
depressões, como poças da água, fica disponível para evaporar.
Leituras adicionais
A interceptação tem um papel importante quando se analisa as conseqüências da
mudança de cobertura vegetal em uma bacia sobre a hidrologia. Textos que revisam o
impacto do desmatamento ou do reflorestamento sobre a vazão dos rios podem ser
uma excelente fonte de informações adicionais. Recomenda-se aqui um artigo
publicado por Tucci e Clarke (Tucci, C. E. M.; Clarke, R. T. 1997 Impacto das
mudanças de cobertura vegetal no escoamento: Revisão. Revista Brasileira de Recursos
Hídricos. Vol 2. No.1. pp. 135-152.). Outra fonte adicional mais recente é o artigo de
Andréassian, V. (2004) Waters and forests: from historical controversy to scientific
debate, publicado no Journal of Hydrology Vol. 291 (1-27).
Exercícios
1) Qual é o impacto esperado do reflorestamento de uma bacia sobre a
interceptação? E sobre o escoamento?
68
Capítulo
7
Infiltração e água no
solo
I
nfiltração é definida como a passagem da água através da superfície do solo,
passando pelos poros e atingindo o interior, ou perfil, do solo. A infiltração de
água no solo é importante para o crescimento da vegetação, para o
abastecimento dos aquíferos (reservatórios de água subterrânea), para
armazenar a água que mantém o fluxo nos rios durante as estiagens, para reduzir o
escoamento superficial, reduzir as cheias e diminuir a erosão.
Composição do solo
A água infiltrada no solo preenche os poros originalmente ocupados pelo ar.
Assim, o solo é uma mistura de
materiais sólidos, líquidos e gasosos.
Na mistura também encontram-se
muitos organismos vivos (bactérias,
fungos, raízes, insetos, vermes) e
matéria orgânica, especialmente nas
camadas superiores, mais próximas
da superfície. A Figura 7. 1
apresenta a proporção das partes
mineral, água, ar e matéria orgância
tipicamente encontradas na camada
superficial do solo (horizonte A).
Aproximadamente 50% do solo é
composto de material sólido,
enquanto o restante são poros que
podem ser ocupados por água ou
Figura 7. 1: Composição típica do solo (Lepsch, 2004). pelo ar. O conteúdo de ar e de água
é variável.
A parte sólida mineral do solo normalmente é analisada do ponto de vista do
diâmetro das partículas. De acordo com o diâmetro as partículas são classificadas
como argila, silte, areia fina, areia grossa, e cascalhos ou seixos. A Tabela 7. 1
apresenta a classificação das partículas adotada pela Sociedade Internacional de
Ciência do Solo, de acordo com seu diâmetro.
Geralmente, os solos são formados por misturas de materiais das diferentes classes.
As características do solo e a forma com que a água se movimenta e é armazenada
no solo dependem do tipo de partículas encontradas na sua composição. Cinco
tipos de textura de solo são definidas com base na proporção de materiais de
diferentes diâmetros, conforme a Figura 7. 2.
Tabela 7. 1: Classificação das partículas que compõe o solo de acordo com o diâmetro.
Figura 7. 2: Os cinco tipos de textura do solo, de acordo com a proporção de argila, areia e silte (Lepsch, 2004).
70
estrutura do solo (resultante da combinação das partículas finas em agregados
maiores) e da quantidade de material orgânico e vivo.
Água no solo
Quando um solo tem seus poros completamente ocupados por água, diz se que
está saturado. Ao contrário, quando está completamente seco, seus poros estão
completamente ocupados por ar. É desta forma que normalmente é medido o
grau de umidade do solo. Uma amostra de solo é coletada e pesada na condição de
umidade encontrada no campo. A seguir
esta amostra é seca em um forno a 105
o
C por 24 horas para que toda a
umidade seja retirada e a amostra é
pesada novamente. A umidade do solo é
calculada a partir da diferença de peso
encontrada.
71
A curva de retenção de água no solo é diferente para diferentes texturas de solo.
Solos argilosos tendem a ter maior conteúdo de umidade na condição de saturação
e de capacidade de campo, o que é positivo para as plantas. Mas, da mesma forma,
apresentam maior umidade no ponto de murcha. Observa-se na curva relativa à
argila que a umidade do solo argiloso no ponto de murcha permanente é de quase
20%, o que significa que nesta condição ainda há muita água no solo, entretanto
esta água está tão fortemente ligada às partículas de argila que as plantas não
conseguem retirá-la do solo, e morrem.
∆V = P − Q − G − ET
∂h ∂h
q=K⋅ e Q = K ⋅ A⋅
∂x ∂x
72
dependente do tipo de material poroso. Assim, o valor de K para solos arenosos é
próximo de 20 cm.hora-1. Para solos siltosos este valor cai para 1,3 cm.hora-1 e em
solos argilosos este valor cai ainda mais para 0,06 cm.hora-1. Portanto os solos
arenosos conduzem mais facilmente a água do que os solos argilosos, e a infiltração
e a percolação da água no solo são mais intensas e rápidas nos solos arenosos do
que nos solos argilosos.
Uma chuva que atinge um solo inicialmente seco será inicialmente absorvida quase
totalmente pelo solo, enquanto o solo apresenta muitos poros vazios (com ar). À
medida que os poros vão sendo preenchidos, a infiltração tende a diminuir, estando
limitada pela capacidade do solo de transferir a água para as camadas mais
profundas (percolação). Esta capacidade é dada pela condutividade hidráulica. A
partir deste limite, quando o solo está próximo da saturação, a capacidade de
infiltração permanece constante e aproximadamente igual à condutividade
hidráulica.
f = fc + ( fo − fc ) ⋅ e − βt
Figura 7. 5: Curvas de infiltração de acordo com a equação de Horton, para solos argilosos e arenosos.
73
Os parâmetros de uma equação de infiltração, como a de Horton, podem ser
estimados a partir de experimentos no campo, sendo o mais comum o de medição
de capacidade de infiltração com o método dos anéis concêntricos.
Figura 7. 6: Medição de infiltração utilizando o infiltrômetro de anéis concêntricos, e esquema do fluxo de água no solo.
Exercícios
1) Qual é o efeito esperado do pisoteamento do solo pelo gado sobre a
capacidade de infiltração?
74
4) Uma medição de infiltração utilizando o método dos anéis concêntricos
apresentou o seguinte resultado. Utilize estes dados para estimar os
parâmetros fc, fo e β da equação de Horton.
75
Capítulo
8
Evapotranspiração
O
retorno da água precipitada para a atmosfera, fechando o ciclo
hidrológico, ocorre através do processo da evapotranspiração. A
importância do processo de evapotranspiração permaneceu mal-
compreendido até o início do século 18, quando Edmond Halley provou
que a água que evaporava da terra era suficiente para abastecer os rios,
posteriormente, como precipitação.
1. que a água líquida esteja recebendo energia para prover o calor latente de
evaporação – esta energia (calor) pode ser recebida por radiação ou por
convecção (transferência de calor do ar para a água)
Além disso, quanto maior a energia recebida pela água líquida, tanto maior é a taxa
de evaporação. Da mesma forma, quanto mais baixa a concentração de vapor no ar
acima da superfície, maior a taxa de evaporação.
Radiação solar
A quantidade de energia solar que atinge a Terra no topo da atmosfera está na faixa
das ondas curtas. Na atmosfera e na superfície terrestre a radiação solar é refletida e
sofre transformações, como apresentado no capítulo 4.
77
refletida pelas nuvens, e nem chega a superfície, reduzindo a energia disponível para
a evapotranspiração.
Temperatura
A quantidade de vapor de água que o ar pode conter varia com a temperatura. Ar
mais quente pode conter mais vapor, portanto o ar mais quente favorece a
evaporação.
Umidade do ar
Quanto menor a umidade do ar, mais fácil é o fluxo de vapor da superfície que está
evaporando. O efeito é semelhante ao da temperatura. Se o ar da atmosfera
próxima à superfície estiver com umidade relativa próxima a 100% a evaporação
diminui porque o ar já está praticamente saturado de vapor.
Velocidade do vento
O vento é uma variável importante no processo de evaporação porque remove o ar
úmido diretamente do contato da superfície que está evaporando ou transpirando.
O processo de fluxo de vapor na atmosfera próxima à superfície ocorre por
difusão, isto é, de uma região de alta concentração (umidade relativa) próxima à
superfície para uma região de baixa concentração afastada da superfície. Este
processo pode ocorrer pela própria ascensão do ar quente como pela turbulência
causada pelo vento.
Medição de evaporação
A evaporação é medida de forma semelhante à precipitação, utilizando unidades de
mm para caracterizar a lâmina evaporada ao longo de um determinado intervalo de
tempo. As formas mais comuns de medir a evaporação são o Tanque Classe A e o
Evaporímetro de Piche.
78
Figura 8. 1: Tanque Classe A para medição de evaporação.
Transpiração
A transpiração é a retirada da água do solo pelas raízes das plantas, o transporte da
água através das plantas até as folhas e a passagem da água para a atmosfera através
dos estômatos da folha.
79
Para um determinado tipo de cobertura vegetal a taxa de evapotranspiração que
ocorre em condições ideais de umidade do solo é chamada a Evapotranspiração
Potencial, enquanto a taxa que ocorre para condições reais de umidade do solo é a
Evapotranspiração Real. A evapotranspiração real é sempre igual ou inferior à
evapotranspiração potencial.
Medição da evapotranspiração
A medição da evapotranspiração é relativamente mais complicada do que a
medição da evaporação. Existem dois métodos principais de medição de
evapotranspiração: os lisímetros e as medições micrometeorológicas.
E = P - Qs – Qb - ∆V (8.2)
80
A umidade do ar também tem um valor médio (q) e uma flutuação em torno deste
valor médio (q’). O valor de q’ positivo significa ar com umidade ligeiramente
superior à média q, enquanto o valor q’ negativo significa umidade ligeiramente
inferior à média. Se num instante qualquer tanto w’ como q’ são positivos então ar
mais úmido do que a média está sendo afastado da superfície, e se w’ e q’ são, ao
mesmo tempo, negativos, então ar mais seco do que o normal está sendo trazido
para próximo da superfície.
E=P–Q (8.3)
EXEMPLO
A evapotranspiração pode ser calculada por balanço hídrico da bacia desprezando a variação do
armazenamento na bacia E = 1600 – 700 = 900 mm.
81
Equação de Thornthwaite
Uma equação muito utilizada para a estimativa da evapotranspiração potencial
quando se dispõe de poucos dados é a equação de Thornthwaite. Esta equação
serve para calcular a evapotranspiração em intervalo de tempo mensal, a partir de
dados de temperatura.
a
10 ⋅ T
E = 16 ⋅ (8.4)
I
EXEMPLO
Mês Temperatura
Janeiro 24,6
Fevereiro 24,8
Março 23,0
Abril 20,0
Maio 16,8
Junho 14,4
82
Julho 14,6
Agosto 15,3
Setembro 16,5
Outubro 17,5
Novembro 21,4
Dezembro 25,5
O primeiro passo é o cálculo do coeficiente I a partir das temperaturas médias mensais obtidas da
tabela. O valor de I é 96. A partir de I é possível obter a = 2,1. Com estes coeficientes, a
evapotranspiração potencial é:
2 ,1
10 ⋅ 16,5
E = 16 ⋅ =53,1 mm/mês
96
Equação de Penman-Monteith
As equações para cálculo da evapotranspiração são do tipo empírico ou de base
física. A principal equação de evapotranspiração de base física é a equação de
Penman-Monteith (equação 8.6).
∆ ⋅ (R L − G ) + ρ A ⋅ c p ⋅ (e s − e d )
ra 1
E= ⋅ (8.6)
rs λ ⋅ρW
∆ + γ ⋅ 1 +
ra
PA
ρ A = 3,486 ⋅ (8.8)
275 + T
83
4098 ⋅ e s
∆= (8.9)
(237,3 + T )2
17,27 ⋅ T
e s = 0,6108 ⋅ exp (8.10)
237,3 + T
UR
e d = es ⋅ (8.11)
100
PA
γ = 0,0016286 ⋅ (8.12)
λ
Há uma analogia de parte da equação 8.6 com um circuito elétrico, em que o fluxo
evaporativo é a corrente, a diferença de potencial é o déficit de pressão de vapor no
ar (pressão de saturação do vapor menos pressão parcial real: es-ed) e a resistência é
uma combinação de resistência superficial e resistência aerodinâmica. A resistência
superficial é a combinação, para o conjunto da vegetação, da resistência estomática
das folhas. Mudanças na temperatura do ar e velocidade do vento vão afetar a
resistência aerodinâmica. Mudanças na umidade do solo são enfrentadas pelas
plantas com mudanças na transpiração, que afetam a resistência estomática ou
superficial.
O valor de E, calculado pela 8.6, é convertido para as unidades de lâmina diária pela
equação a seguir.
E a = E ⋅ fc (8.13)
84
RL da equação de Penman-Monteith pode ser obtido da equação a seguir, que
desconta a parte da radiação refletida.
R L = SSUP ⋅ (1 − α ) (8.14)
24
N= ⋅ ωs (8.15)
π
2⋅π
δ = 0,4093 ⋅ sin ⋅ J − 1,405 (8.17)
365
ρW ⋅ λ
S TOP = 15,392 ⋅ ⋅ d r ⋅ (ωs ⋅ sen ϕ ⋅ sen δ + cos ϕ ⋅ cos δ ⋅ sen ω s ) (8.18)
1000
85
2⋅π
d r = 1 + 0,033 ⋅ cos ⋅ J (8.19)
365
n
SSUP = a s + b s ⋅ ⋅ S TOP (8.20)
N
Quando não existem dados locais medidos que permitam estimativas mais precisas,
são recomendados os valores de 0,25 e 0,50, respectivamente, para os parâmetros as
e bs (Shuttleworth, 1993).
Uma parte da radiação que atinge a superfície terrestre (SSUP) é refletida, conforme
já descrito. A maior parte da energia irradiada pelo sol está na faixa de ondas curtas,
de 0,3 a 3 µm. O balanço de energia, porém, também inclui uma pequena parcela
de radiação de ondas longas, de 3 a 100 µm.
86
ε = 0,34 − 0,14 ⋅ (e d ) (8.22)
n
f = 0,1 + 0,9 ⋅ (8.23)
N
94
ra = para h > 10 metros (8.25)
u m ,10
87
10
ln
z
u m ,10 = u m,2 ⋅ 0 (8.26)
ln 2
z
0
Durante períodos de estiagem mais longos, a umidade do solo vai sendo retirada
por evapotranspiração e, à medida que o solo vai perdendo umidade, a
evapotranspiração diminui. A redução da evapotranspiração não ocorre
imediatamente. Para valores de umidade do solo entre a capacidade de campo e um
limite, que vai de 50 a 80 % da capacidade de campo, a evapotranspiração não é
afetada pela umidade do solo. A partir deste limite a evapotranspiração é diminuída,
atingindo o mínimo – normalmente zero – no ponto de murcha permanente.
Neste ponto a resistência superficial atinge valores altíssimos (teoricamente deve
tender ao infinito).
88
Evapotranspiração real e potencial
A evapotranspiração real é o fluxo de calor latente para atmosfera que realmente
ocorre em uma dada situação. A evapotranspiração real depende dos fatores
atmosféricos, de características do solo e das plantas e da disponibilidade de água.
Em uma área com a vegetação bem suprida de água a evapotranspiração real é igual
à potencial. Porém a evapotranspiração potencial é diferente para cada tipo de
vegetação. Para simplificar a análise freqüentemente se utiliza o conceito da
evapotranspiração potencial da vegetação de referência. E, a partir desta, são
calculados os valores de evapotranspiração potencial de outros tipos de vegetação,
utilizando um ponderador denominado “coeficiente de cultivo” (Kc), como mostra
a equação 8.27:
EV = E R ⋅ K c (8.27)
Evaporação em reservatórios
A evaporação da água de reservatórios é de especial interesse para a engenharia,
porque afeta o rendimento de reservatórios para abastecimento, irrigação e geração
de energia. Reservatórios são criados para regularizar a vazão dos rios, aumentando
a disponibilidade de água e de energia nos períodos de escassez. A criação de um
reservatório, entretanto, cria uma vasta superfície líquida que disponibiliza água
para evaporação, o que pode ser considerado uma perda de água e de energia.
89
Assim, para estimar a evaporação em reservatórios e lagos costuma-se considerar
que esta tem um valor de aproximadamente 60 a 80% da evaporação medida em
Tanque Classe A na mesma região, isto é:
Elago = Etanque . Ft
Leituras adicionais
Uma boa fonte de referência para ampliar os conhecimentos sobre o processo de
evapotranspiração e sobre a estimativa da evapotranspiração para diferentes tipos
de vegetação, especialmente os cultivos agrícolas, é o FAO Irrigation and Drainage
Paper no. 56, de autoria de Richard G. Allen; Luis S. Pereira; Dirk Raes; e Martin
Smith, que pode ser encontrado em formato PDF na Internet.
Exercícios
1) Um rio cuja vazão média é de 34 m3.s-1 foi represado por uma barragem
para geração de energia elétrica. A área superficial do lago criado é de 5000
hectares. Considerando que a evaporação direta do lago corresponde a 970
mm por ano, qual é a nova vazão média a jusante da barragem?
90
em uma floresta no RS é de 36,6 mil litros de água por ano. Faça um
comentário sobre esta estimativa, considerando:
91
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
9
Água subterrânea
Uma formação geológica que é pouco porosa, contém pouca água e, principalmente,
que impede a passagem da água, é denominada aqüitardo.
Vvazios
φ=
Vtotal
A pressão, ou carga hidráulica em um determinado ponto de um aqüífero depende do
tipo de aqüífero e da posição em que está sendo medida. A carga hidráulica é medida
através de piezômetros, que são poços estreitos para medição do nível da água. Em
aqüíferos livres a carga hidráulica pode ser considerada igual à cota do lençol freático,
como mostra a Figura 9. 1. Em aqüíferos confinados, a carga hidráulica pode ser maior
do que a altura da água. Isto ocorre quando a água no aqüífero está sob pressão (ver
figura do exemplo a seguir).
∂h ∂h
q=K⋅ e Q = K ⋅ A⋅
∂x ∂x
onde Q é o fluxo de água (m3.s-1); A é a área (m2) q é o fluxo de água por unidade de
área (m.s-1); K é a condutividade hidráulica (m.s-1); h é a carga hidráulica e x a distância.
93
solos argilosos, e a infiltração e a percolação da água no solo são mais intensas e rápidas
nos solos arenosos do que nos solos argilosos.
A condutividade hidráulica das rochas também depende do tipo de rocha, sendo maior
em rochas sedimentares, como o arenito , e menor em rochas ígneas ou metamórficas,
exceto quando estas são muito fraturadas, neste caso sua condutividade pode ser
relativamente alta.
EXEMPLO
94
O gradiente de pressão no aqüífero é
dh
Q = A⋅ K ⋅
dL
Considerando a área A como o produto da espessura m e da largura (B) a vazão é calculada por
dh dh 42.1 − 38.3
Q = B⋅m⋅ K ⋅ = B ⋅T ⋅ = B ⋅ 879 ⋅ = B ⋅ 3,34 m3.dia-1
dL dL 1000
Equação de continuidade
Considerando um volume de controle em um aqüífero como o ilustrado na figura a
seguir, a massa de água que entra no volume de controle menos a quantidade de água
que deixa um volume de controle ao longo de um intervalo de tempo deve ser igual à
variação da massa de água armazenada no volume de controle durante este intervalo de
tempo.
95
Figura 9. 2: Princípio da conservação de massa em um volume de controle de um aqüífero.
∂
(ρV )
∂t
∂
ρ ⋅ q x − ρ ⋅ q x + ∆x = − (ρV )
∂t
∂q ∂
= − (ρV )
∂x ∂t
∂q ∂q ∂q ∂
+ + = − ( ρV )
∂x ∂y ∂z ∂t
∂ ∂h ∂ ∂h ∂ ∂h ∂
K x ⋅ + K y ⋅ + K z ⋅ = − ( ρV )
∂x ∂x ∂y ∂y ∂z ∂z ∂t
96
Considerando o escoamento em regime permanente, não há variação de volume
armazenado, por isso o lado direito da equação acima é nulo. Além disso,
considerando um meio saturado e isotrópico, isto é, em que a condutividade hidráulica
é constante e igual em todas as direções, a equação acima pode ser reescrita como:
∂2h ∂2h
+ =0
∂x 2 ∂y 2
As equações acima podem ser resolvidas para algumas situações típicas de muito
interesse na hidrologia, como o fluxo de água entre dois canais, e o fluxo de água para
um poço.
Figura 9. 3: Aquífero livre entre dois cursos de água, com recarga constante (w).
97
O nível da água h, em um ponto qualquer x, a partir do canal da esquerda, como
mostra a figura, pode ser calculado a partir da equação:
2
(h − h22 ⋅ x w
)
h 2 = h12 − 1
+ ⋅ (L − x ) ⋅ x
L K
onde h é o nível da água do aqüífero livre num ponto qualquer x; h1 é o nível da água
constante no canal da esquerda da figura; h2 é o nível constante no canal a direita da
figura; x é a distância a partir do canal da esquerda; L é a distância total entre os canais;
w é a taxa de recarga (m.s-1); e K é a condutividade hidráulica (m.s-1).
A distância d onde ocorre o máximo nível da água no aqüífero pode ser estimada por:
L K h12 − h22
( )
d= −
2 w 2⋅L
A vazão por unidade de largura do aqüífero (q) em um ponto qualquer x pode ser
calculada por:
K ⋅ h12 − h22
( ) L
q= − w ⋅ − x
2⋅L 2
e a vazão total do aqüífero, considerando uma largura B, pode ser estimada por:
Q = q.B
EXEMPLO
A condutividade hidráulica do arenito consolidado varia entre 10-5 e 10-2 m.dia-1. Assumindo o valor
de 10-4 m.dia-1 e transformando para mm.dia-1 temos K = 0.1 mm.dia-1.
98
A recarga w corresponde a 0.3 mm.dia-1.
Neste tipo de problema é possível calcular o nível da água em qualquer ponto pela equação
2
(h − h22 ⋅ x w
)
h 2 = h12 − 1
+ ⋅ (L − x ) ⋅ x
L K
O nível da água máximo nesta situação vai ocorrer a uma distância d igual a L/2. Substituindo x por
L/2 na equação acima, e resolvendo para h, encontramos
L
(10 2
)
− 10 2 ⋅
2 + 0,3 ⋅ L − L ⋅ L = 100 + 0,3 ⋅ (100 )2 = 400
h 2 = 10 2 −
L 10 2 2 10
e h=20 m.
Ou seja, o nível da água máximo no aqüífero é de 20 m. Já se a recarga for zero, o nível da água
máximo é igual ao nível da água nos canais.
2 ⋅ π ⋅ T ⋅ (h2 − h1 )
Q=
r
ln 2
r1
A equação anterior pode ser utilizada, entre outras coisas, para estimar o rebaixamento
do nível piezométrico em função da extração de água de um poço.
99
Figura 9. 4: Esquema do impacto de retirada de água de um aqüífero confinado.
EXEMPLO
A vazão retirada do poço equivale a 0,001667 m3.s-1. A transmissividade T pode ser calculada pelo
produto da espessura (30 m) e da condutividade hidráulica (10-6 m.s-1). O rebaixamento do aqüífero
pode ser encontrado reorganizando a equação de Theim, considerando que o rebaixamento é a diferença
entre h2 e h1, e considerando que r1 é o raio do poço e que r2 é o raio do poço (R).
Q R
(h2 − h1 ) = ⋅ ln
2 ⋅ π ⋅ T r1
0,001667 500
(h2 − h1 ) = −6
⋅ ln = 69,2 m
2 ⋅ π ⋅ 30 ⋅ 10 0 ,2
100
Fluxo de água em regime permanente para um poço – aqüífero livre
Uma solução semelhante pode ser encontrada para o fluxo de água em regime
permanente para um poço que retira água de um aqüífero livre. Neste caso a equação a
seguir descreve a relação entre a vazão do poço (Q) e as outras variáveis:
π ⋅ K ⋅ (h22 − h12 )
Q=
r
ln 2
r1
101
contínua, mas depende dos eventos de chuva. Durante os períodos de mais chuva e ou
menos evapotranspiração é que ocorre a recarga mais significativa dos aqüíferos.
A recarga de um aqüífero pode ser estimada por cálculos de balanço hídrico da camada
superior do solo, entretanto este método não é muito preciso em função do grande
número de variáveis que precisam ser estimadas.
Para valores médios de longo prazo, um método indireto de estimar a recarga dos
aqüíferos de uma bacia hidrográfica é baseado na separação de escoamento superficial
e subterrâneo nos hidrogramas observados.
Interação rio-aquífero
As águas superficiais e subterrâneas são parte de um único ciclo hidrológico. Sua
interface, normalmente ocorre na forma de infiltração e percolação e na ocorrência de
nascentes, ou fontes.
(a) (b)
Figura 9. 6: Rio recebendo água do aqüífero durante uma estiagem (a); e rio abastecendo o aquífero de água.
Considerando que toda a água, superficial e subterrânea, faz parte do mesmo ciclo
hidrológico, pode-se imaginar que a extração de água em poços deve causar impactos
sobre a disponibilidade de água superficial.
102
A Figura 9. 7 apresenta situações em que a presença de um poço diminui o aporte de
água do aqüífero para um rio. Na situação da Figura 9. 7a não existe extração de água
superficial e o aqüífero descarrega para o rio, mantendo a vazão do rio na estiagem. Na
situação da Figura 9. 7b a extração de água do poço ocorre e influencia o fluxo de água
subterrânea. Parte do fluxo que seguiria para o rio é desviado para o poço, mas não há
fluxo do rio para dentro do aqüífero. Já na situação da Figura 9. 7c a vazão retirada
pelo poço é tão alta que além de modificar o fluxo subterrâneo, a extração de água gera
uma recarga induzida do aqüífero.
Figura 9. 7: Interação entre um rio e um aquífero que descarrega para um rio na ausência de poços (a); na presença de um poço que elimina parte do
aporte do aqüífero para o rio (b); e na presença de um poço que induz recarga do aqüífero (c).
Exercícios
1) Um fazendeiro A acusa o seu vizinho B de que a extração de água de um novo
poço de B afetou a vazão do poço de A. Os dois poços estão distantes cerca
de 1 Km em uma região relativamente plana. Os dois poços tem raio de 30
cm, e estão retirando água do mesmo aqüífero livre, cuja condutividade
hidráulica é de 10-2 m.dia-1. O vizinho B retira 40 m3.dia-1 do seu novo poço e o
nível da água se estabilizou 10 m abaixo do original. Verifique se a acusação
pode ter fundamento utilizando a equação da vazão para um poço em aqüífero
livre.
103
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
10
Geração de escoamento
V azão é o volume de água que passa por uma determinada seção de um rio
dividido por um intervalo de tempo. Assim, se o volume é dado em litros, e o
tempo é medido em segundos, a vazão pode ser expressa em unidades de
litros por segundo (l.s-1). No caso de vazão de rios, entretanto, é mais usual
expressar a vazão em metros cúbicos por segundo (m3.s-1), sendo que 1 m3.s-1
corresponde a 1000 l.s-1 (litros por segundo).
Durante as chuvas intensas, a maior parte da vazão que passa por um rio é a água da
própria chuva que não consegue penetrar no solo e escoa
Escoamento superficial imediatamente, atingindo os cursos d’água e aumentando a vazão. É
ocorre durante e desta forma que são formados os picos de vazão e as cheias ou
imediatamente após a chuva. enchentes. O escoamento rápido que ocorre em conseqüência direta
Escoamento subterrâneo é o das chuvas é chamado de escoamento superficial (figura 10.1).
que mantém a vazão dos rios
durante as estiagens. Nos períodos secos entre a ocorrência de eventos de chuva a vazão
de um rio é mantida pelo esvaziamento lento da água armazenada na
bacia, especialmente da água subterrânea. Assim, o escoamento lento que ocorre
durante as estiagens pode ser chamado de escoamento subterrâneo, porque a maior
parte da água está chegando ao rio via fluxo de água através do subsolo.
Figura 10.1: Hidrograma de um rio como resposta a um evento de chuva: durante e imediatamente após a chuva predomina
o escoamento superficial, enquanto durante a estiagem predomina o escoamento subterrâneo.
105
Se uma chuva com intensidade de 30 mm.h-1 atinge um solo cuja capacidade de
infiltração é de 20 mm.h-1, uma parte da chuva (10 mm.h-1) se transforma em
escoamento superficial. Este é o processo de geração de escoamento por excesso de
chuva em relação à capacidade de infiltração, também conhecido como processo
Hortoniano, porque foi primeiramente reconhecido por Horton (1934).
De acordo com este método, a lâmina escoada durante uma chuva é dada por:
Q=
(P − Ia )2 quando P > Ia e Q = 0 quando P ≤ Ia
(P − Ia + S )
25400
S= − 254
CN
onde Q é a lâmina escoada ou volume de escoamento dividido pela área da bacia (mm)
também chamada “chuva efetiva”; P é a precipitação durante o evento (mm); S é um
parâmetro que depende da capacidade de infiltração e armazenamento do solo
(parâmetro adimensional CN – veja tabela 10.1); e Ia é uma estimativa das perdas
iniciais de água, dado por Ia=S/5.
106
Tabela 10.1: Valores aproximados do parâmetro CN para diferentes condições de
cobertura vegetal, uso do solo e tipos de solos (A: solos arenosos e de alta capacidade
de infiltração; B: solos de média capacidade de infiltração; C solos com baixa
capacidade de infiltração; D solos com capacidade muito baixa de infiltração).
Condição A B C D
Florestas 41 63 74 80
Campos 65 75 83 85
Plantações 62 74 82 87
Zonas comerciais 89 92 94 95
Zonas industriais 81 88 91 93
Zonas residenciais 77 85 90 92
(adaptado de Tucci et al., 1993)
EXEMPLO
A bacia tem solos do tipo B e está coberta por florestas. Conforme a tabela anterior o valor do
parâmetro CN é 63 para esta combinação. A partir deste valor de CN obtém-se o valor de S:
25400
S= − 254 = 149,2 mm
CN
S
Ia = = 29,8
5
Q=
(P − Ia )2 = 8,5 mm.
(P − Ia + S )
Portanto, a chuva de 70 mm provoca um escoamento de 8,5 mm.
O método do SCS também pode ser utilizado para calcular o escoamento superficial
de uma bacia durante um evento de chuva complexo, em que existem informações de
107
precipitação para vários intervalos de tempo. Esta alternativa é interessante quando se
deseja saber, além do valor do escoamento total, como foi sua distribuição temporal.
EXEMPLO
A bacia tem solos de média capacidade de infiltração, o que corresponde ao tipo B. A cobertura vegetal
é de pastagens. Conforme a tabela anterior o valor do parâmetro CN é 75 para esta combinação. A
partir deste valor de CN obtém-se o valor de S:
25400
S= − 254 = 84,7 mm
CN
A chuva de cada intervalo de tempo é somada à chuva total até o final do intervalo de tempo anterior,
resultando na chuva acumulada, como mostra a tabela a seguir.
108
escoamento acumulado é zero. A partir do intervalo de tempo em que a precipitação acumulada supera
o valor de Ia, o escoamento acumulado é calculado por
Q=
(P − Ia )2
(P − Ia + S )
como mostra a tabela a seguir.
Tempo (min) Precipitação (mm) Precipitação acumulada (mm) Escoamento acumulado (mm)
10 5 5 0,0
20 6 11 0,0
30 14 25 0,7
40 11 36 3,5
Observa-se que o momento de máximo escoamento superficial ocorre entre os 30 e 40 minutos da
duração da chuva. Nestes 10 minutos o escoamento é de 3,5 mm. É interessante observar que este não
é o momento de máxima intensidade de precipitação.
O método do SCS pode ser utilizado quando uma bacia não tem cobertura vegetal
homogênea, ou quando existem dois ou mais tipos de solos na bacia. Neste caso, o
valor do CN é calculado como uma média ponderada dos valores de CN.
EXEMPLO
Solos rasos e muito argilosos normalmente tem capacidade de infiltração baixa ou muito baixa, por isso
pode-se considerar que os solos são do tipo D, de acordo com a classificação do SCS.
Na área rural não está especificado se são plantações (CN=87), campos (CN=85) ou florestas
(CN=80). Considerando que a área rural é coberta por campos, adota-se o CN=85.
Na área urbana não está especificado se são áreas industriais, comerciais ou residenciais, mas os valores
de CN são sempre relativamente próximos de 93, por isso adotamos este valor.
109
Exercícios
1) Como se origina o escoamento superficial em uma bacia durante as chuvas?
110
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
11
O Hidrograma Unitário
Nem toda a chuva efetiva gerada numa bacia chega imediatamente ao curso d’água. A
partir dos locais em que é gerado, o escoamento percorre um caminho, com
velocidades variadas de acordo com características como a declividade e o
comprimento dos trechos percorridos, e a resposta da bacia a uma entrada de chuva
depende destas características.
Figura 11. 1: Imaginando uma bacia hidrográfica como um sistema que transforma um evento de chuva em um hidrograma
distribuído no tempo.
Para simplificar a análise e para simplificar os cálculos, é comum admitir-se que existe
uma relação linear entre a chuva efetiva e a vazão, lembrando que a chuva efetiva é a
parcela da chuva que gera escoamento superficial.
Uma teoria útil, mas não inteiramente correta, baseada na relação linear entre chuva
efetiva e vazão em uma bacia é a teoria do Hidrograma Unitário.
112
unitário considera que a precipitação efetiva e unitária tem intensidade constante ao
longo de sua duração e distribui-se uniformemente sobre toda a área de drenagem.
Proporcionalidade
Para uma chuva efetiva de uma dada duração, o volume de chuva, que é igual ao
volume escoado superficialmente, é proporcional à intensidade dessa chuva. Como os
hidrogramas de escoamento
superficial correspondem a
chuvas efetivas de mesma
duração, têm o mesmo
tempo de base, considera-se
que as ordenadas dos
hidrogramas serão
proporcionais à intensidade
da chuva efetiva, como
mostra a Figura 11. 2.
Superposição
As vazões de um hidrograma de escoamento superficial, produzidas por chuvas
efetivas sucessivas, podem ser encontradas somando as vazões dos hidrogramas de
escoamento superficial correspondentes às chuvas efetivas individuais.
113
A Figura 11. 3 ilustra o princípio da
25 superposição, mostrando como o
P1 P2
hidrograma de resposta de duas chuvas
20 Q1=f (P1)
unitárias sucessivas pode ser obtido
Q2=f (P2)
somando dois hidrogramas unitários
Vazão (l/s)
15 Q total
deslocados no tempo por uma
10 diferença D, que, neste caso, é a
duração da chuva.
5
0
0 0.05 0.1 0.15 0.2 0.25
Tempo (horas)
Convolução
Aplicando os princípios da proporcionalidade e da superposição é possível calcular os
hidrogramas resultantes de eventos complexos, a partir do hidrograma unitário. Este
cálculo é feito através da convolução. Em matemática, particularmente na área de
análise funcional, convolução é um operador que, a partir de duas funções, produz
uma terceira. O conceito de convolução é crucial no estudo de sistemas lineares
invariantes no tempo, como é o caso da teoria do hidrograma unitário (veja definição
na Wikipedia).
t
Q t = ∑ Pef i ht −i +1 para t < k
i =1
t
Qt = ∑ Pef i ht −i +1 para t ≥ k
i =t − k+1
114
A convolução discreta fica mais clara quando colocada na forma matricial.
Considerando uma chuva efetiva formada por 3 blocos de duração D cada um,
ocorrendo em seqüência, e uma bacia cujo hidrograma unitário para a chuva de
duração D é dado por 9 ordenadas de duração D cada uma, a aplicação da convolução
para calcular as vazões Qt no exutório da bacia seria:
Q1 = Pef1.h1
Q2 = Pef2.h1+ Pef1.h2
Q4 = Pef3.h2+ Pef2.h3+Pef1.h4
Q5 = Pef3.h3+Pef2.h4+Pef1.h5
Q6 = Pef3.h4+Pef2.h5+Pef1.h6
Q7 = Pef3.h5+Pef2.h6+Pef1.h7
Q8 = Pef3.h6+Pef2.h7+Pef1.h8
Q9 = Pef3.h7+Pef2.h8+Pef1.h9
Q10 = Pef3.h8+Pef2.h9
Q11= Pef3.h9
Neste caso m=3 porque a chuva é definida por três blocos, k=9 porque o hidrograma
unitário tem 9 ordenadas e n=11 porque a duração total do escoamento resultante é de
11 intervalos de duração D cada um.
EXEMPLO
115
apresentando um hidrograma unitário definido pela tabela A abaixo. Calcule
qual é a resposta da bacia ao evento de chuva definido pela tabela B.
Intervalo de tempo 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Tempo (horas) 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5
H (m3.s-1/10mm) 0,5 2,0 4,0 7,0 5,0 3,0 1,8 1,5 1,0
A resposta da bacia é calculada por convolução da função Pef que é a chuva efetiva e da função H que é
a função que descreve o hidrograma unitário, como mostrado abaixo.
Portanto o hidrograma de saída tem 11 intervalos de tempo de meia hora cada um, e a vazão máxima
ocorre no quinto intervalo, atingindo 31,5 m3.s-1.
116
Obtenção do Hidrograma Unitário em uma bacia
com dados de chuva e vazão
O hidrograma unitário de uma bacia hidrográfica pode ser estimado observando a sua
resposta a chuvas de curta duração. A forma do hidrograma unitário depende da
duração da chuva.
Para cada evento de chuva e vazão com estas características, o hidrograma unitário
para esta duração de chuva pode ser obtido através dos passos descritos a seguir.
1) Calcular o volume de água precipitado sobre uma bacia hidrográfica, que é dado por
Vtot = Ptot . A
2) Fazer a separação do escoamento superficial, onde para cada instante t, a vazão que
escoa superficialmente é a diferença entre a vazão observada e a vazão de base
Qe = Qobs – Qb
Ve = ΣQei . ∆t
Ve
C=
Vtot
117
onde: Ve é o volume escoado superficialmente; Vtot: volume total precipitado sobre a
bacia hidrográfica.
Pef = C . Ptot
6) Determinar as ordenadas do HU
Pu
Qu = × Qe
Pef
Analisando graficamente
vários hidrogramas de
eventos de chuvas intensas e
de duração curta, todos eles
apresentando mais ou menos
a mesma duração de chuva, é
possível identificar as
características do hidrograma
unitário da bacia para esta
duração, como mostra a
Figura 11. 4. Neste caso estão
apresentados 4 hidrogramas
resultantes de chuvas de
curta duração em uma
mesma bacia. Embora a
intensidade das chuvas tenha
sido diferente em cada um
dos eventos, e as vazões
máximas tenham sido
diferentes em cada caso, os
Figura 11. 4: Hidrogramas observados adimensionalizados sobrepostos para gerar o HU de uma bacia com dados hidrogramas foram
(adaptado de Dingman, 2002). adimensionalizados pelo total
de chuva efetiva, conforme
descrito antes, e apresentam
mais ou menos a mesma vazão de pico e o mesmo volume.
118
Outro método para obter o hidrograma unitário em uma bacia com dados de chuva e
vazão é baseado na deconvolução, ou a convolução inversa. Neste caso repete-se o
procedimento descrito no exemplo de aplicação da convolução, porém considerando
como incógnitas as ordenadas do hidrograma unitário, e como conhecidas as vazões de
saída do hidrograma em cada intervalo de tempo.
Os valores das ordenadas do hidrograma unitário podem ser obtidos por otimização,
minimizando as diferenças entre as vazões finais calculadas e observadas. Para eventos
relativamente simples é possível utilizar a ferramenta Solver da planilha Excel para
resolver este problema. Neste caso o objetivo da otimização pode ser minimizar a
soma das diferenças entre as vazões calculadas e observadas elevadas ao quadrado.
Uma planilha Excel disponível na página Web da disciplina ilustra este procedimento.
Existem muitas dificuldades para a obtenção do hidrograma unitário a partir dos dados
de chuva e vazão observados na bacia. Em primeiro lugar, os dados são de chuva
observada não de chuva efetiva. É necessário estimar a chuva efetiva em cada intervalo
de tempo. Em segundo lugar, a vazão observada inclui parte de escoamento
subsuperficial ou subterrâneo (escoamento de base), e por isso o HU obtido vai
depender das hipóteses feitas na separação de escoamento.
Os hidrogramas unitários
sintéticos foram estabelecidos
com base em dados de algumas
bacias e são utilizados quando
não existem dados que permitam
estabelecer o HU, conforme
apresentado no item a seguir. Os
métodos de determinação do HU
baseiam-se na determinação do
valor de algumas características
do hidrograma, como o tempo de
concentração, o tempo de pico, o
tempo de base e a vazão de pico.
Figura 11. 5: Características importantes do hidrograma para a definição de HU sintético.
119
O tempo de concentração é definido como o intervalo de tempo entre o final da
ocorrência de chuva efetiva e o final do escoamento superficial, conforme mostrado na
figura.
O tempo entre picos é definido como o intervalo entre o pico da chuva efetiva e o pico
da vazão superficial.
Com base nestas definições é que pode-se caracterizar o Hidrograma Unitário Sintético
adimensional do SCS.
t p = 0,6 ⋅ t c
120
onde tp é o tempo de pico (veja Figura 11. 6) e tc é o tempo de concentração da bacia,
que pode ser estimado por uma das equações apresentadas no capítulo 3.
D
Tp = t p +
2
t b = T p + 1,67 ⋅ T p
o que significa que o tempo de recessão do hidrograma triangular, a partir do pico até
retornar a zero, é 67% maior do que o tempo de subida.
0,208. A
qp =
Tp
onde Tp é dado em horas, a área da bacia (A) é dada em Km2, e o resultado qp é a vazão
de pico por mm de chuva efetiva.
EXEMPLO
A primeira etapa é calcular o tempo de concentração da bacia. Utilizando a equação de Watt e Chow
(ver capítulo 3) temos:
0 ,79
0 ,79
L 3,1
t c = 7 ,68 ⋅ 0 , 5 = 7 ,68 ⋅ = 1,25 horas
S
0 ,5
93
3100
121
t p = 0,6 ⋅ t c = 0,75 horas
D 10
Tp = t p + = 0,75 + = 0,833horas
2 60 ⋅ 2
0,208. A 0, 208.3,0 m3 1
qp = = = 0,749 ⋅
Tp 0,833 s mm
122
Tempo Vazão
(minutos) (m3/s por mm)
0 0.00
10 0.15
20 0.30
30 0.45
40 0.60
50 0.75
60 0.66
70 0.57
80 0.48
90 0.39
100 0.30
110 0.21
120 0.12
130 0.03
123
Figura 11. 7: Hidrograma unitário sintético adimensional do SCS.
Histograma Tempo-Área
Uma forma de estimar a resposta de uma bacia hidrográfica às chuvas é o Histograma
Tempo-Área. Neste método procura-se definir os tempos de deslocamento do
escoamento superficial desde o local de origem até o exutório da bacia. Como cada
porção da bacia tem um tempo de deslocamento diferente, em função da distância e da
declividade, a resposta da bacia pode ser analisada na forma de um histograma.
124
Uma forma de corrigir os problemas do HU obtido a partir do HTA é combinar o
HTA com um reservatório linear simples. Este procedimento é conhecido como
Hidrograma Unitário de Clark.
Em muitos casos a vazão de base representa apenas uma pequena fração da vazão total
durante um evento de chuva mais intenso. Assim, quando o objetivo do cálculo é
estimar a vazão máxima em uma pequena bacia, a vazão de base pode até mesmo ser
desprezada, especialmente se a bacia for fortemente urbanizada.
EXEMPLO
Intervalo de tempo 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Tempo (horas) 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5
H (m3.s-1/10mm) 0,5 2,0 4,0 7,0 5,0 3,0 1,8 1,5 1,0
125
A resposta da bacia é calculada por convolução da função Pef que é a chuva efetiva e da função H que é
a função que descreve o hidrograma unitário, como no exemplo 1, e ao final é acrescido o valor da vazão
de base.
P efet. P efet. 1 2 3 4 5 6 7 8 9
t mm (mult. 10 mm) 0.5 2.0 4.0 7.0 5.0 3.0 1.8 1.5 1.0 Qsup Qbase Qtotal
1 20 2.0 1.0 1.0 2.0 3.0
2 25 2.5 1.3 4.0 5.3 2.0 7.3
3 10 1.0 0.5 5.0 8.0 13.5 2.0 15.5
4 2.0 10.0 14.0 26.0 2.0 28.0
5 4.0 17.5 10.0 31.5 2.0 33.5
6 7.0 12.5 6.0 25.5 2.0 27.5
7 5.0 7.5 3.6 16.1 2.0 18.1
8 3.0 4.5 3.0 10.5 2.0 12.5
9 1.8 3.8 2.0 7.6 2.0 9.6
10 1.5 2.5 4.0 2.0 6.0
11 1.0 1.0 2.0 3.0
Nos casos gerais o HU para uma duração de chuva qualquer pode ser obtido através
da curva S. A curva S é o HU de resposta de uma bacia a uma precipitação unitária de
duração infinita. A curva S pode ser obtida a partir de um HU conhecido, acumulando
progressivamente as ordenadas do HU original.
A grande utilidade da curva S é que ela permite o cálculo de HUs de qualquer duração;
para isso se desloca a curva S um intervalo de tempo D2, igual à duração do HU
126
desejado. As ordenadas desse HU procurado são calculadas pela diferença entre as
duas curvas S, corrigidas pela relação D1/D2 (onde D1 é a duração da chuva que
originou a curva S e D2 é a duração da chuva do novo HU).
EXEMPLO
Intervalo de tempo 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Tempo (horas) 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5
H (m3.s-1/10mm) 0,5 2,0 4,0 7,0 5,0 3,0 1,8 1,5 1,0
Em construção...
O escoamento ocorre mais rapidamente para eventos maiores do que para eventos
menores. Assim a lineariedade não se mantém.
127
Exercícios
1) Elabore o Histograma Temp-Área para a bacia da figura abaixo, considerando
que o escoamento de cada célula segue a direção das setas e que o tempo de
passagem através de cada célula é de 20 minutos, independentemente da
direção do escoamento. O exutório está identificado pela seta mais escura.
Intervalo de tempo 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Tempo (horas) 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5
3 -1
H (m .s /10mm) 0,5 2,0 4,0 7,0 5,0 3,0 1,8 1,5 1,0
128
3) Construa um hidrograma unitário para a chuva de duração de 15 minutos em
uma bacia de 7,0 Km2 de área de drenagem, comprimento do talvegue de 10
Km, ao longo do qual existe uma diferença de altitude de 200 m.
129
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
12
Escoamento de base
A água subterrânea tem sua origem principal na água da chuva que infiltra no solo e
percola para camadas mais profundas. Ao longo de um período longo de chuvas é
grande a quantidade de água que atinge os aqüíferos, especialmente o aqüífero
superficial. Durante estes períodos o nível da água subterrânea se eleva. Por outro lado,
ao longo de períodos secos, a água armazenada no subsolo vai sendo descarregada para
as nascentes dos rios e o nível da água subterrânea diminui. Entretanto, ao contrário do
escoamento superficial, o fluxo de água subterrânea é, normalmente, muito lento.
Q(t ) = Q0 ⋅ e k (12.1)
onde t é o tempo; Q0 é a vazão num instante t0; Q(t) é a vazão num instante t (por
exemplo: t dias após t0); e é a base dos logaritmos naturais; e k é uma constante (em
unidades de t).
Esta aproximação da
curva de recessão de
vazão utilizando uma
equação exponencial
decrescente é válida para
um grande número de
casos e pode ser utilizada
para prever qual será a
vazão de um rio após
alguns dias, conhecendo a
vazão no tempo atual,
Figura 12. 2: a) Hidrograma do rio dos Bois (GO) durante os meses de estiagem de 1991; b) o mesmo hidrograma considerando que não
representado em escala logarítmica e aproximado por uma linha reta.
ocorra nenhuma chuva.
A maior dificuldade para
resolver este tipo de
131
problema é estimar o valor da constante k, mas isto pode ser feito utilizando dois
valores conhecidos de vazão espaçados por um intervalo de tempo ∆t., e rearranjando
a equação exponencial, como mostra a equação a seguir:
− ∆t
k= (12.2)
Q(t + ∆t )
ln
Q
( t )
EXEMPLO
1) Durante uma longa estiagem de um rio foram feitas duas medições de vazão,
com quatro dias de intervalo entre si, conforme a tabela abaixo. Qual seria a
vazão esperada para o dia 31 de agosto do mesmo ano, considerando que não
ocorre nenhum evento de chuva neste período?
Data Vazão
14/agosto 60.1
15/agosto -
16/agosto -
17/agosto -
18/agosto 57.6
Espera-se que o comportamento do hidrograma na recessão seja bem representado por uma curva
exponencial decrescente. A constante k pode ser estimada considerando os dois valores de vazão
conhecidos (60,1 e 57,6), separados por 4 dias.
−4
k= ≅ 94
57,6
ln
60,1
Portanto, a constante k tem valor de 94 dias. A vazão no dia 31 de agosto pode ser estimada a partir
da vazão do dia 18, considerando a diminuição que ocorre ao longo dos 13 dias que separam estas
duas datas:
132
−13
∆V
= G − E −Q
∆t
dV
= −Q
dt
V
Q= ou V = Q ⋅ k
k
onde V é o volume de água armazenado pelo aqüífero (m3); Q é a vazão que passa pelo
rio durante a estiagem, que é equivalente à descarga do aqüífero (m3.s-1); e k é uma
constate com unidades de tempo (s).
dQ
k =Q
dt
133
A solução desta equação diferencial resulta numa equação exponencial decrescente,
como apresentada na seção anterior deste capítulo:
−t −t
Q(t ) = c ⋅ e k ou Q(t ) = Q0 ⋅ e k
Durante uma estiagem uma bacia Isto significa que, apesar de toda a complexidade existente no
se comporta de forma armazenamento e no fluxo de água subterrânea de uma bacia, a
semelhante a um reservatório relação entre volume de água armazenado e vazão é
linear simples, em que a vazão aproximadamente linear. Esta afirmação é válida para condições de
descarregada é proporcional ao estiagem, na maior parte dos rios do mundo.
volume armazenado.
Separação de escoamento
Hidrogramas observados em postos fluviométricos podem ser analisados com o
objetivo de identificar a parcela do escoamento que tem origem no escoamento
superficial e a parcela do escoamento que tem origem no escoamento subterrâneo.
Esta análise é baseada em métodos de separação de escoamento. Ao longo do tempo
diversos métodos foram propostos para a separação do escoamento.
Em estimativas expeditas, não muito confiáveis, a relação entre a Q90 e a Q50 de uma
curva de permanência de um rio (veja capítulo de estatística) pode ser usada para
estimar a proporção de escoamento de base, ou subterrâneo, em relação ao
escoamento total.
Um método muito utilizado está ilustrado na Figura 12. 3 e supõe que o escoamento
superficial termina D dias após o pico de vazão, sendo que D pode ser estimado por
uma equação empírica proposta por Linsley:
D = 0,827 ⋅ A0 , 2 (12.3)
134
onde A é a área da bacia em Km2
e D é dado em dias.
135
formada por duas componentes: escoamento superficial (f) e escoamento subterrâneo
(b). Isto significa que num intervalo de tempo qualquer:
y i = f i + bi (12.4)
Considerando que existe uma relação linear entre armazenamento de água nos
aqüíferos e vazão, durante os períodos de estiagem, pode-se considerar que, nos
períodos sem recarga do aqüífero a equação abaixo é válida:
− ∆t
bi +1 = bi ⋅ e k
(12.5)
bi +1 = bi ⋅ a (12.6)
onde
− ∆t
a=e k
(12.7)
Uma forma simples de estimar o valor de bi para cada intervalo de tempo i foi proposta
por Lyne e Hollick em 1979 e depois modificada por Chapman, em 1991 (veja
Eckhardt, 2008):
a 1− a
bi = ⋅ bi −1 + ⋅ yi (12.8)
2−a 2−a
onde o termo a está explicado acima no texto. Se a aplicação desta equação resultar em
um valor bi > yi, então bi = yi.
Este tipo de filtro funciona relativamente bem para bacias com relativamente pouca
contribuição de escoamento subterrâneo no escoamento total. No caso de bacias com
contribuição subterrânea maior, um filtro com dois parâmetros foi proposto por
Eckhardt (2005):
bi =
(1 − BFI max ) ⋅ a ⋅ bi −1 + (1 − a ) ⋅ BFI max ⋅ yi (12.9)
1 − a ⋅ BFI max
limitado a valores bi menores ou iguais a yi, como no caso anterior, e onde a está
definido acima e BFImax é o máximo percentual de escoamento subterrâneo que o filtro
permite calcular. Os valores sugeridos para BFImax são:
136
BFImax = 0,80 (rios perenes e aqüíferos porosos);
Uma forma alternativa de estimar BFImax poderia ser obtida estendendo a curva de
recessão, de trás para frente no tempo:
bi +1
bi = (12.10)
a
∑r
i =1
i
BFI max ≈ N
(12.11)
∑y
i =1
i
137
onde ri é o hidrograma obtido a partir da aplicação da recessão (equação 12.10) e N é o
número de intervalos de tempo do hidrograma.
No exemplo da figura anterior o valor de BFImax obtido pela aplicação das equações
12.10 e 12.11 foi de 0,81. A aplicação do filtro da equação 12.9 com BFImax=0,81
resultou num hidrograma de escoamento de base cujo volume total representa 75% do
volume total (BFI = 0,75). Este resultado sugere que 74% da vazão média anual do rio
dos Bois neste local tenha origem no escoamento subterrâneo.
EXEMPLO
A bacia do rio Pelotas apresenta solos e geologia que não favorecem a infiltração da água. Portanto
espera-se um escoamento de base relativemente baixo. Neste caso pode ser utilizado o filtro da equação
12.8. Considerando que k=20 dias, e que o intervalo de tempo entre os dados observados é de 1 dia:
− ∆t −1
a=e k
= e 20 ≅ 0,95
138
Com base neste valor o filtro fica:
a 1− a
bi = ⋅ bi −1 + ⋅ y i = 0,907 ⋅ bi −1 + 0,047 ⋅ y i
2−a 2−a
Considerando que no primeiro intervalo de tempo 100% da vazão tem origem subterrânea a equação
acima pode ser utilizada para estimar a vazão de base nos intervalos de tempo seguintes:
b1 = y1 = 58,8
b2 = 0,907b1+0,047y2 =56,5
O gráfico correspondente está apresentado na figura acima. A soma das duas últimas colunas da tabela
permite calcular o percentual da vazão total que corresponde ao escoamento de base (cerca de 35%). A
subtração da vazão total menos a vazão de base permite estimar o escoamento superficial em cada
intervalo de tempo.
139
Leituras adicionais
O assunto dos filtros para separação de escoamento é clássico em hidrologia e um
texto interessante sobre este assunto é “How to construct recursive digital filters for
baseflow separation” de K. Eckhardt, publicado em Hydrological Processes Vol. 19
pp. 507-515 em 2005.
Exercícios
1) Explique como os filtros para separação de escoamento podem ser utilizados
para estimar recarga de aqüíferos.
2) Durante uma longa estiagem de um rio foram feitas duas medições de vazão,
conforme a tabela abaixo. Qual seria a vazão esperada para o dia 31 de agosto
do mesmo ano, considerando que não ocorre nenhum evento de chuva neste
período?
Vazão
data (m3.s-1)
14/ago 60.4
15/ago -
16/ago -
17/ago -
18/ago -
19/ago 51.7
3) Durante uma longa estiagem de um rio foram feitas seis medições de vazão,
conforme a tabela abaixo. Qual seria a vazão esperada para o dia 31 de agosto
do mesmo ano, considerando que não ocorre nenhum evento de chuva neste
período? Considere que durante a estiagem a bacia se comporte como um
reservatório linear.
Data vazão
14/ago 123.1
15/ago 116.2
16/ago 109.6
17/ago 103.2
18/ago 97.3
19/ago 91.8
140
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
13
Medição de vazão
V azão é o volume de água que passa por uma determinada seção de um rio
dividido por um intervalo de tempo. Assim, se o volume é dado em litros, e o
tempo é medido em segundos, a vazão pode ser expressa em unidades de
litros por segundo (l.s-1). No caso de vazão de rios, entretanto, é mais usual
expressar a vazão em metros cúbicos por segundo (m3.s-1), sendo que 1 m3.s-1
corresponde a 1000 l.s-1 (litros por segundo).
u= h
n
A Figura 13. 2 apresenta uma seção transversal do canal, supondo que o canal tem a
forma retangular. A profundidade de escoamento é y e a largura do canal é B.
P = B + 2y
142
A
Rh =
P
Das equações anteriores se deduz que quanto maior o nível da água y, maior a
velocidade média da água no canal.
A vazão em um canal pode ser calculada pelo produto da velocidade média vezes a
área de escoamento, ou seja:
2 1
R 3 ⋅S 2
Q = u ⋅ A = A⋅ h
n
EXEMPLO
A=
(B + B + 2 ⋅ m ⋅ y ) ⋅ y
2
143
O perímetro molhado é dado por
2
P = B + 2 ⋅ y 2 + (m ⋅ y )
Q = A⋅ h = 18 ⋅ = 16,9 m3.s-1
n 0,020
Medição de vazão
A medição de vazão em cursos d’água é realizada, normalmente, de forma indireta, a
partir da medição de velocidade ou de nível. Os instrumentos mais comuns para
medição de velocidade de água em rios são os molinetes, que são pequenos hélices que
giram impulsionados pela passagem da água. Em situações de medições expeditas, ou
de grande carência de recursos, as medições de velocidade podem ser feitas utilizando
flutuadores, com resultados muito menos precisos.
144
Figura 13. 3: Molinete para medição de velocidade da água.
Para obter uma boa estimativa da velocidade média é necessário medir em várias
verticais, e em vários pontos ao longo das verticais, de acordo com a Figura 13. 4 e a
Figura 13. 5. A Tabela 13. 2, adaptada de Santos et al. (2001), apresenta o número de
pontos de medição em uma vertical de acordo com a profundidade do rio e a Tabela
13. 3 apresenta o número de verticais recomendado para medições de vazão de acordo
com a largura do rio.
A Tabela 13. 2 mostra que são recomendados muitas medições na vertical, porém,
freqüentemente, as medições são feitas com apenas dois pontos na vertical, mesmo em
rios com profundidade maior que 1,20 m.
145
Figura 13. 5: Seção transversal com indicação de verticais onde é medida a velocidade.
Tabela 13. 2: Número e posição de pontos de medição na vertical recomendados de acordo com a profundidade do rio (Santos et al.
2001).
Tabela 13. 3: Distância recomendada entre verticais, de acordo com a largura do rio (Santos et al., 2001).
146
Figura 13. 6: Exemplo de medição de vazão em uma seção de um rio, com a indicação das verticais, distâncias (d) e profundidades (p)
– os pontos indicam as posições em que é medida a velocidade no caso de utilizar apenas dois pontos por vertical.
Figura 13. 7: Detalhe da área da seção do rio para a qual é válida a velocidade média da vertical de número 2.
A área de uma sub-seção, como apresentada na Figura 13. 7 é calculada pela equação
abaixo:
(d + d i +1 ) (d i −1 + d i ) (d − d i −1 )
Ai = pi ⋅ i − = p i ⋅ i +1
2 2 2
147
(d − d 1 )
A2 = p 2 ⋅ 3
2
As pequenas áreas próximas às margens que não são consideradas nas sub-seções da
primeira nem da última vertical (Figura 13. 8) não são consideradas no cálculo da
vazão. Assim, a vazão total do rio é dada por:
N
Q = ∑ vi ⋅ Ai
i =1
Figura 13. 8: As áreas sombreadas junto às margens não são consideradas na integração da vazão.
EXEMPLO
Vertical 1 2 3 4 5
148
Vertical 1 2 3 4 5 Total
A vazão total é de 23,16 m3.s-1. Este valor pode ser arredondado para 23,2 m3.s-1 porque
normalmente os erros das medições de velocidade, distância e profundidade não justificam tanta precisão.
A velocidade média é igual à vazão total dividida pela área total, ou seja,
23 ,16
v= = 0 ,62
37 ,13
A curva-chave
O ciclo hidrológico é um processo dinâmico, governado por processos bastante
aleatórios, como a precipitação. Para caracterizar o comportamento hidrológico de um
curso d’água ou de uma bacia não basta dispor de uma medição de vazão, mas sim de
uma série de medições. É desejável que esta série estenda-se por, pelo menos, alguns
anos, e é necessário que o intervalo de tempo entre medições seja adequado para
acompanhar os principais processos que ocorrem na bacia, isto é, permitam
acompanhar as cheias e estiagens. Em um rio muito grande, de comportamento lento,
isto pode significar uma medição por semana. Por outro lado, em um rio com uma
área de drenagem pequena, em uma região montanhosa, com rápidas respostas durante
as chuvas, pode ser necessária uma medição a cada minuto.
149
Para gerar uma curva-chave representativa é necessário medir a vazão do rio em
situações de vazões baixas, médias e altas. A Figura 13. 9 apresenta, de forma gráfica, o
resultado de 62 medições de vazão realizadas entre 1992 e 2002, no rio do Sono no
posto fluviométrico Cachoeira do Paredão, no Estado de Minas Gerais. Cada ponto no
gráfico corresponde a uma medição de vazão. Observa-se que há mais medições de
vazão na faixa de cotas e vazões baixas. Isto ocorre porque as vazões altas ocorrem
apenas durante as cheias, que podem ser bastante rápidas e raramente coincidem com
os dias programados para as medições de vazão.
A curva chave é uma equação ajustada aos dados de medição de vazão. Normalmente
são utilizadas equações do tipo potência, como a equação a seguir:
Q = a ⋅ (h − h 0 )b
A Figura 13. 10 apresenta uma equação do tipo acima ajustada aos dados do rio do
Sono.
150
Figura 13. 10: Equação do tipo potência ajustada aos dados de medição de vazão do rio do Sono de 1992 a 2002.
A curva chave de uma seção de rio pode se alterar com o tempo, especialmente em
rios de leito arenoso. Modificações artificiais, como aterros e pontes, também podem
modificar a curva chave. Por isto é necessário realizar medições de vazão regulares,
mesmo após a definição da curva.
Em trechos de rios próximos à foz, junto ao mar, lago ou outro rio, a relação entre
cota e vazão pode não ser unívoca, isto é, a mesma vazão pode ocorrer para cotas
diferentes, e cotas iguais podem apresentar vazões diferentes. Nestes casos o
escoamento no rio está sob controle de jusante. O nível do rio, lago ou oceano,
localizado a jusante, controla a vazão do rio e não é possível definir uma única curva-
chave. Este problema pode ser superado gerando uma família de curvas-chave, através
da combinação da vazão, da cota local e da cota de jusante (Santos et al., 2001). É claro
que esta alternativa é bastante trabalhosa e deve ser evitada, dando-se preferência à
instalação de postos fluviométricos em locais livres da influência da maré, ou do nível
de jusante.
Extrapolação da curva-chave
A curva-chave é a forma de obter informações sobre a vazão de um rio em um dado
local com base na observação da cota da superfície da água neste mesmo local, o que
simplifica a medição, já que é mais fácil medir cotas do que vazões.
151
vazão, ou quando as cotas observadas são inferiores às menores cotas medidas
simultaneamente às medições de vazão, como mostra a Figura 13. 11.
Figura 13. 11: Curva chave com extrapolação para cotas acima de, aproximadamente, 670 cm (Sefione, 2002).
Neste método considera-se que existe uma relação constante entre a vazão e o produto
da área da seção vezes a raiz quadrada do raio hidráulico (como na equação de Chezy).
152
Figura 13. 12: Ilustração do princípio utilizado no Método de extrapolação da curva chave de Stevens (Sefione, 2002).
Vertedores e calhas
Em cursos d’água de menor porte é possível construir estruturas no leito do rio que
facilitam a medição de vazão. Este é o caso das calhas Parshal e dos vertedores de
soleira delgada.
153
Figura 13. 13: Vertedor triangular para medição de vazão em pequenos cursos d’água.
Um vertedor triangular de soleira delgada com ângulo de 90º (Figura 13. 14), por
exemplo, tem uma relação entre cota e vazão dada por:
Q = 1,42 ⋅ h 2 ,5
Esta relação pode ser utilizada diretamente, embora na maioria dos casos seja desejável
a verificação em laboratório.
Figura 13. 14: Vertedor triangular com soleira delgada em ângulo de 90º.
A Calha Parshal é um trecho curto de canal com geometria de fundo e paredes que
acelera a velocidade da água e cria uma passagem por escoamento crítico. A medição
de nível é feita a montante da passagem pelo regime crítico, e pode ser relacionada
diretamente à vazão. As calhas Parshal são dimensionadas com diferentes tamanhos,
de forma a permitir a medição em diferentes faixas de vazão.
A principal vantagem das calhas e dos vertedores é que existe uma relação direta e
conhecida, ou facilmente calibrável, entre a vazão e a cota. A calha ou o vertedor tem a
154
desvantagem do custo relativamente alto de instalação. Além disso, durante eventos
extremos estas estruturas podem ser danificadas ou, até mesmo, inutilizadas.
Figura 13. 15: Calha Parshall para medição de vazão em pequenos córregos ou canais.
Um sistema como o apresentado na Figura 13. 16, com um emissor de ultrasom e três
receptores, dispostos da maneira apresentada na figura, permite estimar a velocidade da
água num volume de controle segundo três eixos, perpendiculares aos sensores. A
155
partir destas componentes da velocidade no sistema de eixos do instrumento são
calculadas as componentes transversal, longitudinal e vertical de velocidade na seção do
rio.
O medidor de velocidade pode ser utilizado com uma haste, como o ilutrado na Figura
13. 16, quando se deseja conhecer a velocidade de um ponto específico, ou quando o
curso d’água é pequeno.
Figura 13. 16: Medidor de velocidade Doppler para pequenos cursos d’água, com indicação do transmissor acústico, dos três
receptores acústicos, e do volume de controle para o qual é válida a medida de velocidade.
156
No caso dos medidores perfiladores, a velocidade da água é medida em vários volumes
de controle. A posição do volume de controle é controlada pelo tempo de viagem do
pulso de ondas acústicas. O volume de controle aumenta de tamanho a medida que o
local medido se afasta do instrumento, como mostra a Figura 13. 17.
Figura 13. 17: Perfilador acústico por efeito Doppler para medir velocidade da água em várias posições.
A Figura 13. 18 apresenta uma medição de vazão realizada com um perfilador acústico
Doppler no rio Solimões (Amazonas) no posto fluviométrico de Manacapuru (AM).
Observa-se que uma faixa próxima à superfície não apresenta medições válidas e uma
faixa junto ao fundo (entre as linhas pretas) também não apresenta medições válidas. A
espessura desta faixa depende da freqüência com que trabalha o equipamento. Para
equipamentos de baixa freqüência, adequados para rios profundos, esta faixa é
relativamente grande. Para equipamentos de alta freqüência esta faixa é relativamente
estreita.
A faixa sem medições próxima à superfície deve-se ao fato que o aparelho precisa de
um tempo mínimo para distinguir as respostas, o que exige uma distância mínima até o
primeiro volume de controle. A faixa sem medições junto ao fundo ocorre porque
nesta região começa a haver um efeito forte do eco junto ao fundo do rio. As medições
acústicas são complementadas nestas faixas por estimativas baseadas em perfis teóricos
de velocidade. O impacto destas estimativas na exatidão das vazões medidas é
157
relativamente pequeno se o equipamento utilizado tiver uma freqüência compatível
com a profundidade do rio.
Figura 13. 18: Resultado de medição de vazão com perfilador acústico Doppler no rio Solimões em Manacapuru (AM).
Suponha que é necessário estimar a vazão média em um local sem dados localizado no
rio Camaquã, denominado ponto A. A área de drenagem no ponto A é de 1700 km2.
Dados de um posto fluviométrico localizado no mesmo rio, no ponto B, cuja área de
drenagem é de 1000 km2 indicam uma vazão média de 200 m3.s-1. A vazão média no
ponto A pode ser estimada por
AA
Q A = QB ⋅
AB
158
onde AA é a área de drenagem do ponto A e AB é a área de drenagem do ponto B, e QA
é a vazão média no ponto A e QB é a vazão média no ponto B.
Esta forma de estimativa pode ser aplicada também para estimar vazões mínimas,
como a Q90 e a Q95. Obviamente, este método tem muitas limitações e não pode ser
usado quando a bacia for muito heterogênea quanto às características de relevo, clima,
solo e geologia. Para estimar vazões máximas em locais sem dados este método tende a
superestimar as vazões quando a área de drenagem do ponto sem dados é maior do
que a área de drenagem do ponto com dados.
Qref = a ⋅ A b
onde a e b são constantes para uma região hidrológica homogênea, isto é, que tem
aproximadamente as mesmas características geológicas e climáticas.
Leituras adicionais
Este texto apresenta uma introdução às técnicas de medição de vazão e determinação
da curva chave. Maiores detalhes podem ser encontrados em textos específicos, como
Hidrometria Aplicada, de Santos et al. (2001). A dissertação de mestrado de André
Sefione, intitulada Estudo comparativo de métodos de extrapolação superior de curva-
chave (disponível em http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/3258). No que se
refere à estimativa de vazão em locais sem dados uma leitura adicional interessante é o
livro Regionalização de vazões (Tucci, 1998).
Exercícios
1) O que é a curva-chave?
159
3) Qual é a vazão que escoa em regime permanente e uniforme por um canal de
concreto liso com seção transversal trapezoidal com largura da base B = 2 m e
largura no topo de 5 m, com altura total de 2 m e com profundidade y = 1,5
m, considerando a declividade de 15 cm por km?
Q h (cm)
0.37 54
2.52 73
0.48 58
1.86 75
1.02 67
2.15 73
1.25 68
0.30 44
0.78 64
0.27 49
0.43 58
0.45 59
160
Capítulo
14
Hidrologia Estatística
A média
A vazão ou precipitação média é a média de toda a série de vazões ou precipitações
registradas, e é muito importante na avaliação da disponibilidade hídrica total de uma
bacia.
n
∑x
i =1
i
x=
n
Figura 14. 1 : Vazões médias por mês do ano no rio Cuiabá, em Cuiabá.
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Observa-se nesta figura que há uma sazonalidade marcada, com estiagem no inverno e
vazões altas no verão. As maiores vazões mensais médias ocorrem em Fevereiro e as
menores em Agosto, o que é conseqüência direta da sazonalidade das chuvas, que
ocorrem de forma concentrada no período de verão.
A mediana
A mediana é o valor que é superado em 50% dos pontos da amostra. A média e a
mediana podem ter valores relativamente próximos, porém não iguais.
n −1
Mediana = x p com p = + 1 se n for ímpar;
2
x p + x p +1
e Mediana = se n for par.
2
O desvio padrão
O desvio padrão é uma medida de dispersão dos valores de uma amostra em torno da
média. O desvio padrão é dado por:
∑ (x
2
i −x )
i =1
s=
n −1
O coeficiente de variação
O coeficiente de variação é uma relação entre o desvio padrão e a média. O coeficiente
de variação é uma medida da variabilidade dos valores em torno da média,
relativamente à própria média.
162
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
s
cv =
x
EXEMPLO
A média é de 1645,1 mm por ano, o desvio padrão é de 241,9 mm por ano e o coeficiente de variação
é de 0,15.
O coeficiente de assimetria
O coeficiente de assimetria é um valor que caracteriza o quanto uma amostra de dados
é assimétrica com relação à média. Uma amostra é simétrica com relação à média se o
histograma dos dados revela o mesmo comportamento de ambos os lados da média.
n
∑ (x
i =1
i
3
− x)
G=
n ⋅ s3
163
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Nula 0 ou próximo
de zero
Positiva G>0
Negativa G<0
Quartis e quantis
Quantis separam a amostra de forma semelhante à mediana, porém em intervalos
diferentes. Enquanto a mediana separa a amostra em dois grupos, com 50% dos dados
com valores inferiores e 50% dos dados com valores superiores à mediana, os quartis e
os quantis divdem a amostra em grupos de tamanhos diferentes. O primeiro Quartil é
o valor que separa a amostra em dois grupos em que 25% dos pontos tem valor
inferior ao quartil e 75% tem valor superior ao quartil. O terceiro Quartil é o valor que
separa a amostra em dois grupos em que 75% dos pontos tem valor inferior ao quartil
e 25% tem valor superior ao quartil. Já o segundo quartil é a própria mediana.
Além dos três quartis, que separam a amostra em quatro, podem ser definidos quantis
arbitrários, que dividem a amostra arbitrariamente em frações diferentes. Por exemplo,
164
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
o quantil 90 % divide a amostra em dois grupos. O primeiro (90% dos dados) tem
valores inferiores ao quantil 90% e o segundo (10% dos dados) tem valores superiores
ao quantil 90%.
A curva de permanência
A elaboração da curva de permanência é uma das análises estatísticas mais simples e
mais importantes na hidrologia. A curva de permanência auxilia na análise dos dados
de vazão com relação a perguntas como as destacadas a seguir.
A curva de permanência expressa a relação entre a vazão e a freqüência com que esta
vazão é superada ou igualada. A curva de permanência pode ser elaborada a partir de
dados diários ou dados mensais de vazão.
Para destacar mais a faixa de vazões mais baixas a curva de permanência é apresentada
com eixo vertical logarítmico, como mostra a Figura 14. 3.
165
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 14. 2: Hidrograma de vazões diárias do rio Taquari em Muçum (RS) e a curva de permanência correspondente.
Figura 14. 3: Curva de permanência do rio Taquari em Muçum com eixo das vazões logarítmico para dar destaque à faixa de vazões
mais baixas.
166
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
EXEMPLO
Qmax = 0 ,2 ⋅ 7 = 1,4 m 3 ⋅ s −1
Como o empreendedor solicitou 2,5 m3.s-,1 não é possível atender sua solicitação.
167
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
A Figura 14. 4 apresenta as curvas de permanência dos rios Cuiabá, em Cuiabá (MT), e
Taquari, em Coxim (MS), baseadas nos dados de vazão diária de 1980 a 1984. As duas
bacias tem áreas de drenagem de tamanho semelhante. A bacia do rio Cuiabá tem,
aproximadamente, 22.000 km2, e a do rio Taquari cerca de 27.000 km2. O relevo e a
precipitação média anual são semelhantes. A vazão média do rio Cuiabá é de 438 m3.s-1
neste período, enquanto a vazão média do rio Taquari é de 436 m3.s-1, ou seja, são
praticamente idênticas. Entretanto, observa-se que as vazões mínimas são mais altas no
rio Taquari do que no rio Cuiabá e as vazões máximas são maiores no rio Cuiabá.
O rio Cuiabá apresenta maior variabilidade das vazões, que se alternam rapidamente
entre situações de baixa e de alta vazão, enquanto o rio Taquari permanece mais tempo
com vazões próximas da média. Esta diferença ocorre basicamente porque a geologia
da bacia do rio Taquari favorece mais a infiltração da água no solo, e esta água chega ao
rio apenas após um longo período em que fica armazenada no subsolo. A vazão do rio
Taquari é naturalmente regularizada pelos aqüíferos existentes na bacia, enquanto que
na bacia do rio Cuiabá este efeito não é tão importante.
Figura 14. 4: Comparação entre as curvas de permanência dos rios Taquari (MS) e Cuiabá (MT).
168
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 14. 5: Curvas de permanência de vazão afluente e efluente do reservatório de Três Marias, no rio São Francisco (MG).
Séries temporais
A vazão de um rio é uma variável que se modifica de forma contínua no tempo, e pode
ser representada em um hidrograma, que é o gráfico que relaciona os valores de vazão
com o tempo, como na Figura 14. 6.
As séries discretas que são obtidas a partir da observação de alguns anos de dados de
vazão são tratadas como amostras do comportamento de um rio ou de uma bacia. A
população, neste caso, seriam todos os anos de existência de um rio. A vazão é
considerada uma variável aleatória porque depende de fenômenos climáticos
complexos e de difícil previsibilidade a partir de um certo horizonte.
169
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 14. 6: As vazões variam continuamente no tempo (linha) mas a partir dos dados de vazão é possível gerar séries temporais
discretas, como as médias, máximas (triângulos) e mínimas (círculos) anuais (adaptado de Dingman, 2002).
Figura 14. 7: Gráfico das séries discretas de médias, mínimas e máximas anuais.
170
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Tabela 14. 1: Valores das séries temporais discretas de vazões médias, mínimas e máximas anuais relativos à figura anterior.
Ano Vazão média anual Vazão mínima anual Vazão máxima anual
1990 95 57 132
1991 93 69 126
1992 72 48 100
1993 86 60 113
1994 56 29 80
1995 73 53 88
1996 96 68 132
171
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Tabela 14. 2: Tempo de retorno adotado para diferentes estruturas, de acordo com o risco associado.
Estrutura TR (anos)
Bueiros de estradas pouco movimentadas 5 a 10
Bueiros de estradas muito movimentadas 50 a 100
Pontes 50 a 100
Diques de proteção de cidades 50 a 200
Drenagem pluvial 2 a 10
Grandes barragens (vertedor) 10.000
Pequenas barragens 100
O risco também pode estar relacionado a situações de vazões mínimas. Por exemplo,
considere uma cidade que utilize a água de um rio para abastecimento da população.
Dependendo do tamanho da população e das características do rio, existe um sério
risco de que, num ano qualquer, ocorram alguns dias em que a vazão do rio é inferior à
vazão necessária para abastecer a população.
1
TR = (14.1)
P
172
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Para contornar este problema é comum supor que os dados hidrológicos sejam
aleatórios e que sigam uma determinada distribuição de probabilidade analítica, como a
distribuição normal, por exemplo. Esta metodologia analítica permite explorar melhor
as amostras relativamente pequenas de dados hidrológicos, como se descreve na
seqüência deste capítulo.
1 1 x−µ
2
f x (x ) = ⋅ exp − ⋅ x
(14.2)
2 ⋅π ⋅σ x 2 σ x
173
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
1 z2
f z (z ) = ⋅ exp − (14.3)
2⋅π 2
onde z é uma variável aleatória com média zero e desvio padrão igual a 1.
O gráfico desta última é apresentado na Figura 14. 8. A área total sob a curva é igual a
1. A área hachurada representa a probabilidade de ocorrência de um valor maior do
que z (figura de cima) ou menor do que z (figura de baixo).
A área sob a curva pode ser calculada por integração analítica, mas resulta numa série
infinita. Por este motivo, as aplicações práticas são mais comuns na forma de tabelas
que relacionam o valor de z com a probabilidade de ocorrer um valor maior do que z
ou menor do que z. Existem, também, tabelas que fornecem valores da área entre 0 e
z, ou de –z a z.
Figura 14. 8: Gráfico da distribuição normal (na figura superior é indicada a área hachurada que representa a probabilidade de ocorrer
um valor maior do que z; e na figura inferior é indicada a área hachurada que representa a probabilidade de ocorrer um valor menor do
que z).
174
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Uma variável aleatória x com média µx e desvio padrão σx pode ser transformada em
uma variável aleatória z, com média zero e desvio padrão igual a 1 pela transformação
abaixo:
x − µx
z= (14.4)
σx
Considere, por exemplo, a chuva anual em um determinado local. Anos com chuva
próxima da média são relativamente freqüentes, enquanto anos muito chuvosos ou
muito secos são menos freqüentes. Em muitos locais as chuvas anuais seguem,
aproximadamente uma distribuição normal, como mostra a Figura 14. 9.
Figura 14. 9: Histograma de freqüências de chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, MG.
EXEMPLOS
175
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
normal, com média igual a 1433 mm e desvio padrão igual a 299 mm. Qual é a
probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm?
Considerando que a média e o desvio padrão da amostra disponível sejam boas aproximações da média
e do desvio padrão da população, pode se estimar o valor da variável reduzida z para o valor de 2000
mm:
x − µx x − x 2000 − 1433
z= ≅ = = 1,896
σx s 299
x − µx x − x 550 − 1433
z= ≅ = = −2,95
σx s 299
Vazões máximas
Selecionando apenas as vazões máximas de cada ano em um determinado local, é
obtida a série de vazões máximas deste local e é possível realizar análises estatísticas
relacionando vazão com probabilidade. As séries de vazões disponíveis na maior parte
dos locais (postos fluviométricos) são relativamente curtas, não superando algumas
dezenas de anos.
176
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Distribuição empírica
Analisando as vazões do rio Cuiabá no período de 1984 a 1992, por exemplo,
podemos selecionar de cada ano apenas o valor da maior vazão, e analisar apenas as
vazões máximas (Tabela 14. 3). Reorganizando as vazões máximas para uma ordem
decrescente, podemos atribuir uma probabilidade de excedência empírica a cada uma
das vazões máximas da série, utilizando a fórmula de Weibull:
m
P= (14.5)
N +1
Figura 14. 10: Série de vazões do rio Cuiabá em Cuiabá, de 1984 ao final de 1991, evidenciando a vazão máxima de cada ano.
177
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Ano Q máx
1984 1796.8
1985 1492.0
1986 1565.0
1987 1812.0
1988 2218.0
1989 2190.0
1990 1445.0
1991 1747.0
Tabela 14. 4: Vazões máximas reorganizadas em ordem decrescente, com ordem e probabilidade empírica associada.
Distribuição normal
Para extrapolar as estimativas de vazão máxima é necessário supor que as vazões
máximas anuais seguem uma distribuição de probabilidades conhecida, como no caso
das chuvas anuais.
Vazões máximas segundo uma distribuição normal podem ser estimadas por:
x = x + K ⋅s (14.6)
onde x é a vazão máxima para uma dada probabilidade; x é a média das vazões
máximas anuais; e s é o desvio padrão das vazões máximas anuais. O valor de K é
obtido de tabelas de distribuição normal (equivalente ao z nas tabelas A e B ao final do
capítulo).
178
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Figura 14. 11: Comparação entre um histograma de vazões máximas observadas do rio Cuiabá em Cuiabá entre 1967 e 1999 e a
distribuição normal.
Para superar este problema existem outras distribuições de probabilidade que são,
normalmente, utilizadas para a análise de vazões máximas. A mais simples destas
distribuições é a denominada log-normal. Nesta distribuição a suposição é que os
logaritmos das vazões seguem uma distribuição normal.
Distribuição log-normal
A distribuição normal parte da equação:
onde log(x) é o logaritmo da vazão máxima; log ( x ) é a média dos logaritmos das
vazões máximas anuais observadas; slogx é o desvio padrão dos logaritmos das vazões
máximas anuais observadas. O valor de K é obtido das tabelas A e B do final do
capítulo (K é equivalente a z dado nas tabelas).
179
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
EXEMPLO
Este exemplo apresenta uma situação muito comum na análise de dados hidrológicos: as falhas. As
falhas são períodos em que não houve observação. As falhas são desconsideradas na análise, assim o
tamanho da amostra é N=48. Utilizando logaritmos de base decimal, a média dos logaritmos das
vazoes máximas é 2,831 e o desvio padrão é 0,206. Para o tempo de retorno de 100 anos a
probabilidade de excedência é igual a 0,01. Na tabela B, ao final do capítulo, pode-se obter o valor de
z correspondente (z=2,326). A vazão máxima de TR=100 anos é obtida por:
x−x
z≅
s
x − 2,831
2,326 ≅
0,206
180
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Q = 10 3, 31 = 2041
Este procedimento pode ser repetido para outros valores de TR, e o resultado pode ser apresentado na
forma de um gráfico, relacionando vazão com tempo de retorno, como na figura a seguir. Nesta figura
fica claro, também, que a suposição de uma distribuição log-normal é muito mais adequada do que a
suposição de uma distribuição normal.
As vazões máximas estimadas com as probabilidades empíricas são mostradas pelos pontos, a
distribuioção normal é apresentada como a linha pontilhada e a linha contínua mostra vazões máximas
estimadas com a distribuição log-normal.
A equação utilizada para estimar a vazão máxima é igual à utilizada na distribuição Log-
Normal, entretanto o valor de K é obtido de outra tabela.
181
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
onde K depende do coeficiente de assimetria dos dados e pode ser obtido na tabela C,
no final do capítulo.
Distribuição de Gumbel
A probabilidade de que uma determinada vazão venha a ser igualada ou excedida em
um ano qualquer pode ser estimada usando a distribuição de Gumbel, de acordo com a
equação:
−b
P = 1 − e −e (14.8)
1
b= ⋅ ( x − x + 0,45 ⋅ s ) (14.9)
0,7797 ⋅ s
A vazão para um dado tempo de retorno TR (em anos) pode ser obtida por uma
forma inversa da equação 14.8:
TR
x = x − s ⋅ 0,45 + 0,7797 ⋅ ln ln
TR − 1
Vazões mínimas
A análise de vazões mínimas é semelhante à análise de vazões máximas, exceto pelo
fato que no caso das vazões mínimas o interesse é pela probabilidade de ocorrência de
vazões iguais ou menores do que um determinado limite.
182
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Uma vazão mínima obtida por análise estatística muito utilizada como vazão de
referência mínima é a Q7,10, ou 7Q10, que vem a ser a vazão média de 7 dias de duração
com tempo de retorno de 10 anos.
Distribuição normal
A aplicação da análise estatística usando a distribuição normal para vazões mínimas é
analisada através de um exemplo.
EXEMPLO
183
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
TR Vazão
ano ordem probabilidade empírico mínima
1988 1 0.04 23.0 70
1985 2 0.09 11.5 77.5
1986 3 0.13 7.7 77.5
1999 4 0.17 5.8 101.2
1982 5 0.22 4.6 111.4
1991 6 0.26 3.8 111.4
2000 7 0.30 3.3 118.2
1996 8 0.35 2.9 121.6
1981 9 0.39 2.6 128.6
1995 10 0.43 2.3 130.4
1984 11 0.48 2.1 158.2
1987 12 0.52 1.9 166
1994 13 0.57 1.8 172
1993 14 0.61 1.6 196
1997 15 0.65 1.5 198
1980 16 0.70 1.4 202
1992 17 0.74 1.4 204.2
2001 18 0.78 1.3 213
1989 19 0.83 1.2 219.6
1990 20 0.87 1.2 221.8
1983 21 0.91 1.1 269
1998 22 0.96 1.0 320.6
Média = 163
Desvio padrão = 65.2
Q = Q − SQ ⋅ K
Onde K é o valor da tabela da distribuição normal para as probabilidades (veja tabela B ao final
do capítulo).
Tempo
de
retorno K Q
2 0 163.1
5 0.842 108.2
10 1.282 79.5
50 2.054 29.2
100 2.326 11.5
Na figura abaixo vê-se que o ajuste da distribuição normal não é muito bom para estes dados. A
vazão mínima com tempo de retorno de 5 anos é estimada em 108 m3/s.
184
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
350
300
.
250
Vazão mínima (m3/s)
200
150
100
50
0
1.0 10.0 100.0
Tempo de retorno (anos)
Distribuição Weibull
Uma distribuição de freqüências teórica mais adequada para a estimativa de vazões
mínimas de alto tempo de retorno é a distribuição de Weibull (veja em Naghettini e
Pinto, 2007).
x = x + K ⋅S (14.10)
1
1 λ
K = A(λ ) + B(λ ) ⋅ − ln 1 − − 1 (14.11)
T
onde
1
A(λ ) = 1 − Γ 1 + ⋅ B(λ ) (14.12)
λ
185
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
e
−1
2 1 2
B(λ ) = Γ 1 + − Γ 2 1 + (14.13)
λ λ
onde
1
λ= para − 1,0 ≤ G ≤ 2 (14.14)
H0 + H1 ⋅G + H2 ⋅ G2 + H3 ⋅ G3 + H4 ⋅ G4
onde
H0 = 0,2777757913
H1 = 0,3132617714
H2 = 0,0575670910
H3 = -0,0013038566
H4 = -0,0081523408
EXEMPLO
Média = 163
186
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
TR Kt Vazão Weibull
2 -0.10153 156.5
5 -0.89405 104.8
10 -1.22803 83.0
25 -1.51140 64.6
50 -1.65317 55.3
100 -1.75422 48.7
187
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
A distribuição binomial
A distribuição de probabilidades binomial é adequada para avaliar o número (x) de
ocorrências de um dado evento em N tentativas.
As seguintes condições devem existir para que seja válida a distribuição binomial: 1)
são realizadas N tentativas; 2) em cada tentativa o evento pode ocorrer ou não, sendo
que a probabilidade de que o evento ocorra é dada por P enquanto a probabilidade de
que o evento não ocorra é dada por 1-P ; 3) a probabilidade de ocorrência do evento
numa tentativa qualquer é constante e as tentativas são independentes, isto é, a
ocorrência ou não do evento na tentativa anterior não altera a probabilidade de
ocorrência atual.
N! N −x
Px ( X = x) = ⋅ P x ⋅ (1 − P ) (14.15)
x!⋅( N − x )!
EXEMPLOS
Neste caso x =5 e N=10. A probabilidade de obter “coroa” num lançamento qualquer é de 50%, ou
1/2. A probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” pode ser calculada pela equação 14.15.
5 10 − 5
10! 1 1
Px ( X = 5) = ⋅ ⋅ 1 − = 0,246
5!⋅(10 − 5)! 2 2
188
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Neste caso x =2 e N=2. A probabilidade de ocorrer a cheia num ano qualquer é de 10%, ou 1/10.
A probabilidade de ocorrer exatamente 2 cheias em 2 anos pode ser calculada pela equação 14.15.
2 2− 2 2
2! 1 1 1
Px ( X = 2) = ⋅ ⋅ 1 − = = 0,01
2!⋅(2 − 2 )! 10 10 10
Este problema poderia ser resolvido somando a probabilidade de ocorrência de 1 única vazão com estas
características ao longo dos 5 anos com a probabilidade de ocorrência de 2 vazões, e assim por diante
para 3, 4 e 5 casos. Porém, neste caso, a melhor forma de resolver o problema é pensar qual é a
probabilidade de que não ocorra nenhuma vazão igual ou superior ao longo dos 5 anos, que poderá ser
chamada de P(x=0). A probabilidade de que ocorra pelo menos uma cheia será dada por 1-P(x=0).
Sendo assim, calculamos primeiramente a probabilidade com x =0 e N=5.
0 5 −0
5! 1 1
Px ( X = 0) = ⋅ ⋅ 1 −
0!⋅(5 − 0)! 10 10
5
9
Px ( X = 0) = 1 ⋅ = 0,59
10
Portanto, a probabilidade de não ocorrer nenhuma vazão igual ou superior a vazão com TR=10 anos
ao longo de 5 anos é de 59%. Isto significa que a probabilidade de ocorrer pelo menos uma vazão assim
é de 41%.
189
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Z Probabilidade
0.0 0.5000
0.1 0.4602
0.2 0.4207
0.3 0.3821
0.4 0.3446
0.5 0.3085
0.6 0.2743
0.7 0.2420
0.8 0.2119
0.9 0.1841
1.0 0.1587
1.1 0.1357
1.2 0.1151
1.3 0.0968
1.4 0.0808
1.5 0.0668
1.6 0.0548
1.7 0.0446
1.8 0.0359
1.9 0.0287
2.0 0.0228
2.1 0.0179
2.2 0.0139
2.3 0.0107
2.4 0.0082
2.5 0.0062
2.6 0.0047
2.7 0.0035
2.8 0.0026
2.9 0.0019
3.0 0.0013
190
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Leituras adicionais
Os métodos de estimativa de vazões máximas apresentados neste texto são
relativamente simples e a forma de apresentação é resumida. Para realizar análises de
vazões máximas mais rigorosas normalmente é necessário testar três ou mais
distribuições de probabilidade teóricas, e avaliar qual é a distribuição que melhor se
adequa aos dados. Livros sobre hidrologia estatística existem em grande número,
principalmente em língua inglesa. Um livro dedicado exclusivamente a este tema em
língua portuguesa, denominado Hidrologia Estatística, foi lançado recentemente no
191
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Exercícios
1) Uma análise de 40 anos de dados revelou que a chuva média anual em um
local na bacia do rio Uruguai é de 1800 mm e o desvio padrão é de 350 mm.
Considerando que a chuva anual neste local tem uma distribuição normal, qual
é a chuva anual de um ano muito seco, com tempo de retorno de 10 anos?
5) É correto afirmar que a vazão Q90 é sempre inferior a Q95 em qualquer ponto
de qualquer rio? E o inverso?
6) É correto dizer que a vazão Q95 é igual à soma das vazões Q40 e Q55? Explique.
192
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
10) Calcule a vazão Q7,10 do rio Xingu em Altamira (PA) usando os dados da tabela
abaixo. Use a distribuição de Weibull e compare com a estimativa usando a
distribuição empírica.
193
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
194
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
15
Regularização de vazão
Em geral os reservatórios são formados por meio de barragens implantadas nos cursos
d‘água. Suas características físicas, especialmente a capacidade de armazenamento,
dependem das características topográficas do vale em que estão inseridos, bem como
da altura da barragem.
Vertedores
Os vertedores são o principal tipo de estrutura de saída de água. Destinam-se a liberar
o excesso de água que não pode ser aproveitado para geração de energia elétrica,
abastecimento ou irrigação. Os vertedores são dimensionados para permitir a passagem
de uma cheia rara (alto tempo de retorno) com segurança.
Um vertedor pode ser livre ou controlado por comportas. O tipo mais comum de
vertedor apresenta um perfil de rampa, para que a água escoe em alta velocidade, e a
jusante do vertedor é construída uma estrutura de dissipação de energia, para evitar a
erosão excessiva.
Figura 15. 1: As barragens Norris (Clinch River, Tenessee, EUA) e Itaipu (Rio Paraná, Brasil-Paraguai).
196
Figura 15. 2: Vertedor de soleira livre.
Figura 15. 3: Curva de vazão do vertedor da usina Corumbá III nas situações de comportas completamente ou parcialmente abertas.
Descarregadores de fundo
Descarregadores de fundo podem ser utilizados como estruturas de saída de água de
reservatórios, especialmente para atender usos da água existentes a jusante. Para
estimar a vazão de um descarregador de fundo pode ser utilizada uma equação de
vazão de um orifício, apresentada abaixo:
Q = C ⋅ A⋅ 2 ⋅ g ⋅ h (15.2)
197
onde A é a área da seção transversal do orifício (m2); g é a aceleração da gravidade (m.s-
2
); h é a altura da água desde a superfície até o centro do orifício (m) e C é um
coeficiente empírico com valor próximo a 0,6.
Da mesma forma que a vazão do vertedor, a vazão de um orifício tem uma relação não
linear com o nível da água.
Devido às características topográficas da área inundada, a relação entre cota e área não
é, em geral, linear. Da mesma forma, a relação entre cota e volume também não é
linear.
Tabela 15. 1: Relação cota – área – volume do reservatório Corumbá IV, em Goiás.
198
provoca cavitação nas turbinas (diminuindo sua vida útil), ou porque o controle de
vazão e pressão sobre a turbina começa a ficar muito instável.
Volume útil
A diferença entre o volume máximo de um reservatório e o volume morto é o volume
útil, ou seja, a parcela do volume que pode ser efetivamente utilizada para regularização
de vazão.
Nível meta
Na operação normal de um reservatório costumam ser utilizadas referências de nível
de água que devem ser seguidas para atingir certos objetivos de geração energia e de
segurança da barragem. O nível meta é tal que se o nível da água é superior ao nível
meta, deve ser aumentada o vertimento de vazão, para reduzir o nível da água no
reservatório, que deverá retornar ao nível meta.
199
Curva guia
A curva guia é semelhante ao nível meta, porém indica um nível da água no
reservatório variável ao longo do ano, que serve de base para a tomada de decisão na
operação. Uma curva guia pode indicar, por exemplo, o limite entre o uso normal da
água, quando o nível da água está acima do nível indicado pela curva guia, e o
racionamento, quando o nível da água está abaixo da curva guia.
Volume de espera
O volume de espera, ou volume para controle de cheias, corresponde à parcela do
volume útil destinada ao amortecimento das cheias. O volume de espera é variável ao
longo do ano e é definido pelo volume do reservatório entre o nível da água máximo
operacional e o nível meta.
200
∂S
= I −Q (15.3)
∂t
St + ∆t − S t
= I −Q (15.4)
∆t
St +∆t − St I t + I t +∆t Qt + Qt + ∆t
= − (15.5)
∆t 2 2
onde It ; It+∆t ; Qt ; Qt+∆t são os valores no início e no final do intervalo de tempo. Esta
equação é utilizada quando o intervalo de tempo é relativamente pequeno (1 dia ou
menos), especialmente no caso de análise de propagação de cheias em reservatórios.
Quando o intervalo de tempo é longo (um mês, por exemplo) a equação é simplificada
para:
Dimensionamento de um reservatório
O dimensionamento de um reservatório pode ser realizado com base na equação:
201
sujeita às restrições 0 < St+∆t < Vmax; onde Vmax é o volume útil do reservatório.
Neste caso as entradas são as vazões afluentes estimadas para o local em que se deseja
construir o reservatório e as saídas são incluem a demanda de água e as perdas.
S t + ∆t = S t + I t − Dt − Et − Qt
c) Em um mês qualquer, se St+∆t for menor que zero, a demanda Dt deve ser
reduzida até que St+∆t seja igual a zero, e é computada uma falha de
antendimento.
EXEMPLO
202
mês Vazão (m3/s)
jan 60
fev 20
mar 10
abr 5
mai 12
jun 13
jul 24
ago 58
set 90
out 102
nov 120
dez 78
S t + ∆t = S t + I t − Dt − Et − Qt
com It dado pela tabela acima; Et igual a zero e Qt igual a zero, exceto quando é necessário verter.
A demanda de 55 m3.s-1 é igual a 143 hm3 por mês. No primeiro mês observa-se que sobra água. No
segundo mês a demanda é maior do que a vazão de entrada e o volume no reservatório começa a
diminuir. O volume no início do terceiro mês é dado por S t + ∆t = 500 + 52 − 143 = 409 e assim
por diante.
No início do mês de julho o volume calculado é negativo, o que rompe a restrição, portanto o reservatório
não é capaz de regularizar a vazão de 55 m3.s-1.
Em uma planilha de cálculo ou uma calculadora científica é fácil repetir o cálculo até
que o volume atenda a vazão regularizada desejada.
Da mesma forma é fácil determinar em uma planilha eletrônica qual é a maior vazão
que pode ser regularizada com um dado volume de reservatório.
203
Teoricamente, a máxima vazão que pode ser regularizada é a vazão média do rio no
local em que está a barragem. Este valor máximo é impossível de ser atingido porque a
criação do reservatório aumenta a perda de água por evaporação.
Figura 15. 4: Relação entre o volume do reservatório e a vazão regularizada em uma bacia cuja vazão média é 25,4 m3.s-1, sem
considerar a evaporação do reservatório.
204
portanto, pode dispor de uma vazão substancialmente maior do que a vazão mínima
natural.
Uma usina reversível é utilizada para gerar energia durante o período em que ocorre o
pico da demanda no sistema elétrico, utilizando água previamente bombeada para um
reservatório temporário, aproveitando o excesso de oferta de energia nos períodos que
não coincidem com o pico de demanda.
P = ρ ⋅ g ⋅Q ⋅ H ⋅e (15.7)
Quanto à altura de queda da água (H) as centrais hidrelétricas podem ser classificadas
em:
205
Impactos ambientais de reservatórios
No passado considerava-se que a geração hidrelétrica era uma forma de produção de
eletricidade com mínimos impactos ambientais. Atualmente, essa visão tem sido
questionada, embora em diversos aspectos os impactos ambientais são relativamente
pequenos em relação às formas alternativas normalmente utilizadas: usinas térmicas a
carvão ou nucleares.
Apesar destes impactos, a população muitas vezes vê com bons olhos a construção de
uma usina hidrelétrica na área de seu município. Isto ocorre porque existe uma
compensação financeira obrigatória, em que parte dos rendimentos auferidos na
geração de energia elétrica são pagos ao município, de acordo com o tamanho da área
inundada e com a potência da usina. Entre os impactos ambientais importantes das
usinas hidrelétricas encontram-se impactos sociais; impactos sobre a flora e a fauna do
local inundado; impactos sobre a fauna do rio a jusante; impactos sobre o sistema de
transportes; impactos sobre a geração de gases de efeito estufa.
Impactos sociais
Os impactos sociais mais evidentes da implantação de uma usina hidrelétrica decorrem
da remoção das pessoas que habitam a área inundada pelo reservatório. Os impactos
deste tipo iniciam mesmo antes da construção da obra em si, já que a perspectiva da
inundação futura reprime ou não incentiva o investimento no local. Esta situação pode
se estender por vários anos, em função de indefinições sobre a construção ou não da
obra. Durante este período as localidades sujeitas a inundação experimentam um
estado de estagnação.
Finalmente, quando a obra inicia e a inundação da área habitada passa a ser certa,
surgem dúvidas e discussões sobre o valor da indenização. Embora o valor comercial
da terra possa ser estimado de forma razoável, o apego dos habitantes à terra também é
devido a um valor afetivo, por questões históricas, que é intangível, ou seja, dificilmente
quantificável. Nesta situação é comum o surgimento de especulações e de confrontos
de cunho político.
Entre os impactos sociais também podem ser incluídos impactos culturais, como a
perda, provavelmente para sempre, de sítios arqueológicos, ou eventualmente de
lugares sagrados para culturas indígenas.
206
reservatório a área seca vai se tornando restrita e os animais ficam concentrados em
pequenas ilhas. Campanhas de resgate de fauna são organizadas em que os animais são
capturados e levados para um novo habitat, após um período de adaptação. A sua
sobrevivência neste novo hábitat é incerta, uma vez que o espaço provavelmente já está
ocupado por outros indivíduos da mesma espécie, e os recursos dos quais a espécie
depende são limitados.
A vegetação inundada não apenas é extinta, como também pode provocar sérios
problemas de qualidade de água no lago, durante a sua decomposição. Isto ocorre
porque o oxigênio dissolvido (OD) na água é consumido durante o processo de
decomposição, e a concentração de OD é reduzida para níveis inferiores ao limite para
a sobrevivência dos peixes. Assim, o processo de enchimento pode resultar numa
grande mortandade de peixes e outras espécies aquáticas ou que dependem dos peixes
para sobreviver, como as aves.
Os impactos no rio a jusante decorrem, entre outras causas, do obstáculo imposto pela
barragem à migração dos peixes, o que pode ser apenas parcialmente contornado pela
construção de uma escada de peixes.
207
Tempo de residência e eutrofização
Reservatórios que recebem água com alta concentração de nutrientes podem passar
por um processo denominado eutrofização.
V
Tr = (15.8)
Q
Exercícios
1) Qual é a perda de energia na usina de Sobradinho devida à evaporação direta
do lago? Considere que a altura de queda H = 27,2 m; a eficiência e = 0,90; e
que uma evaporação de 10 mm por dia ocorre sobre a área da superfície do
lago, que corresponde a 4200 km2.
208
Mês Vazão (m3/s)
Jan 55
Fev 27
mar 10
abr 5
mai 12
jun 13
jul 24
ago 51
set 78
Out 102
Nov 128
Dez 73
Mês jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
Vazão 98 45 32 27 24 20 19 18 17 14 78 130
(m3/s)
Evaporação 100 110 120 130 140 135 130 120 110 105 100 100
tanque
classe A
(mm/mês)
209
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
16
Propagação de vazão em
reservatórios
Para calcular o efeito de um reservatório sobre uma cheia podem ser utilizadas as
técnicas de cálculo de propagação de cheias em reservatórios. Em reservatórios
relativamente curtos e profundos, em que a velocidade da água é baixa, pode-se
considerar que a superfície da água ao longo do reservatório é horizontal. Neste caso,
equações semelhantes às utilizadas no capítulo anterior podem ser aplicadas.
dS
= I −Q
dt
St + ∆t − S t
= I −Q
∆t
onde I e Q representam valores médios da vazão afluente e defluente do reservatório
ao longo do intervalo de tempo ∆t.
St +∆t − St I t + I t +∆t Qt + Qt + ∆t
= −
∆t 2 2
Como tanto St+∆t e Qt+∆t são funções não lineares de ht+∆t , a equação de balanço pode
ser resolvida utilizando a técnica iterativa de Newton-Raphson, ou o método de
bissecção, a cada intervalo de tempo.
2 ⋅ St + ∆t 2 ⋅ St
+ Qt + ∆t = I t + I t +∆t + − Qt
∆t ∆t
onde os termos desconhecidos aparecem no lado esquerdo e os termos conhecidos
aparecem no lado direito.
Uma tabela da relação entre Qt+∆t e 2.(St+∆t )/∆t pode ser gerada a partir da relação
cota – área – volume do reservatório e através da relação entre a cota e a vazão, por
exemplo para uma equação de vertedor.
EXEMPLO
211
Tabela 8. 1: Relação cota volume do reservatório do exemplo.
115 1900
120 2000
121 2008
122 2038
123 2102
124 2208
125 2362
126 2569
127 2834
128 3163
129 3560
130 4029
0 0
1 350
2 720
3 940
4 1090
5 1060
6 930
7 750
8 580
9 470
10 380
11 310
12 270
13 220
14 200
15 180
16 150
17 120
18 100
19 80
20 70
O primeiro passo da solução é criar uma tabela relacionando a vazão de saída com a cota.
Considerando um vertedor livre, com coeficiente C = 1,5 e soleira na cota 120 m, a relação é dada pela
tabela que segue:
212
Tabela A
H (m) Q (m3/s)
120 0.0
121 37.5
122 106.1
123 194.9
124 300.0
125 419.3
126 551.1
127 694.5
128 848.5
129 1012.5
130 1185.9
Esta tabela pode ser combinada à tabela cota – volume, acrescentando uma coluna com o valor do
termo 2.(St+∆t )/∆t , considerando o intervalo de tempo igual a 1 hora:
Tabela B
Volume (S) Q 2.S/∆t+Q
H (m) (104 m3) (m3/s) (m3/s)
120 2000 0.0 11111
121 2008 37.5 11193
122 2038 106.1 11428
123 2102 194.9 11873
124 2208 300.0 12567
125 2362 419.3 13542
126 2569 551.1 14823
127 2834 694.5 16439
128 3163 848.5 18421
129 3560 1012.5 20790
130 4029 1185.9 23569
No primeiro intervalo de tempo o nível da água no reservatório é de 120 m, e a vazão de saída é zero.
O volume acumulado (S) no reservatório é 2000.104 m3. O valor de 2.S-Q para o primeiro intervalo
de tempo é 11111 m3.s-1. Para cada intervalo de tempo seguinte a vazão de saída pode ser calculada
pelos seguintes passos:
a) calcular It + It+∆t
b) com o resultado do passo (a) e com base no valor de 2.(St)/∆t - Qt para o intervalo anterior,
calcular 2.(St+∆t)/∆t + Qt+∆t pela equação
213
2 ⋅ St + ∆t 2 ⋅ St
+ Qt + ∆t = I t + I t +∆t + − Qt
∆t ∆t
c) obter o valor de Qt+∆t pela tabela B, a partir da interpolação com o valor conhecido de
2.(St+∆t)/∆t + Qt+∆t calculado no passo (b)
d) calcular o valor de 2.(St+∆t)/∆t - Qt+∆t a partir da equação abaixo e seguir para o próximo
passo de tempo, repetindo os passos de (a) até (d)
2 ⋅ S t + ∆t 2 ⋅ S t + ∆t
− Qt + ∆t = + Qt + ∆t − 2(Qt + ∆t )
∆t ∆t
214
O exemplo mostra que o reservatório tende a suavizar o hidrograma, reduzindo a
vazão de pico, embora sem alterar o volume total do hidrograma. É interessante
observar que no caso do exemplo, em que o reservatório tem um vertedor livre, a
vazão máxima de saída ocorre no momento em que a vazão de entrada e de saída são
iguais.
Exercícios
1) Em um córrego em área urbana foi construído um reservatório para redução
das vazões máximas durante as cheias. O reservatório ocupa uma área de 2
hectares e uma profundidade máxima de 1,5 m. Os dispositivos de saída de
água do reservatório são um descarregador de fundo, cujo funcionamento
pode ser considerado semelhante a de um orifício, e um vertedor. O orifício é
circular, tem 100 cm de diâmetro e seu eixo está numa altura correspondente
ao fundo do reservatório (h=0). O vertedor tem 10 metros e sua soleira está a
1,3 m do fundo. Considerando as paredes do reservatório verticais, qual é a
máxima vazão de saída deste reservatório para o hidrograma de entrada dado
abaixo?
215
Tempo Q
(min) (m3/s)
0 0.0
20 0.3
40 1.0
60 1.6
80 2.5
100 3.6
120 4.0
140 4.3
160 3.8
180 3.0
200 2.7
220 2.2
240 2.0
260 1.5
280 1.3
300 1.0
320 0.8
340 0.6
360 0.4
380 0.2
400 0.1
216
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
17
Propagação de vazão em
rios
Propagação de
cheias em rios
Os efeitos principais que ocorrem
quando uma cheia se propaga ao
longo de um rio são a translação
e o amortecimento, ilustrados na
Figura 17. 2.
Além da translação e do
amortecimento a onda de
t cheia em geral cresce de
montante para jusante em
Figura 17. 2: Efeitos de translação e amortecimento de uma onda de cheia se propagando ao longo de um rio. função da contribuição que
recebe dos afluentes.
Em rios em regiões muito planas podem ocorrer ainda efeitos de jusante, afetando a
vazão e o nível da água em função do que ocorre a jusante de um determinado local,
como no caso de trechos de rio próximo ao mar, que sofrem o efeito da maré.
218
A velocidade de propagação da onda de cheia é importante para estimar o momento
de ocorrência do pico de vazão em locais a jusante de um ponto em que existe
monitoramento.
A velocidade de propagação das ondas de cheia em rios pode ser estimada pela
celeridade cinemática, que pode ser obtida com base nas características médias das seções
transversais do rio e de sua declividade.
dQ
c= (17.1)
dA
Q = u ⋅ A = A⋅ (17.2)
n
Combinando as equações 17.1 e 17.2 em um rio largo, onde o raio hidráulico pode ser
aproximado pela profundidade média, obtém-se a seguinte aproximação para a
celeridade da onda de cheia:
5
c= ⋅u (17.3)
3
219
Cálculos de propagação de cheias em rios
Historicamente, o objetivo dos cálculos de propagação de cheias ao longo de rios foi
prever a magnitude e o tempo de ocorrência de vazões para que pudessem ser
realizadas ações para proteger as vidas de pessoas e minimizar prejuízos materiais.
Desde o final do século XIX é conhecido um conjunto de equações diferenciais
parciais que descrevem o escoamento em rios, na condição que considera escoamento
unidimensional e baixa declividade, entre outras simplificações. Estas equações são
conhecidas como equações de Saint-Venant, em homenagem ao seu formulador, e são
apresentadas abaixo na forma atualmente mais utilizada.
∂A ∂Q
+ =0
∂t ∂x
∂Q ∂ Q 2 ∂h
+ + g ⋅ A ⋅ + g ⋅ A ⋅ S f = 0
∂t ∂x A ∂x
(17.4)
Não existem soluções analíticas para as equações de Saint-Venant na maior parte das
aplicações úteis. Somente nas décadas mais recentes é que os métodos numéricos e os
computadores digitais permitiram a solução das equações completas de Saint-Venant.
Atualmente existem diversos programas computacionais de modelos matemáticos que
resolvem as equações de Saint-Venant numericamente para resolver problemas de
propagação de vazão em rios e canais.
Método Muskingum
Antes do surgimento dos computadores e das facilidades atuais para solução das
equações de Saint-Venant diversos métodos simplificados foram criados para
representar a propagação de ondas de cheias em rios. Um dos métodos simplificados
mais conhecidos é o método Muskingum, que recebeu este nome porque foi aplicado
inicialmente ao rio Muskingum, nos EUA na década de 1930.
220
O método Muskingum combina a equação da continuidade a uma equação
simplificada que relaciona o armazenamento em um trecho de rio às vazões de entrada
e saída do trecho.
dS
= I −Q (17.5)
dt
St +∆t − St I t + I t +∆t Qt + Qt + ∆t
= − (17.6)
∆t 2 2
S = K ⋅ [ X ⋅ I + (1 − X ) ⋅ Q ] (17.7)
Qt + ∆t = C 1 ⋅ I t + ∆t + C 2 ⋅ I t + C 3 ⋅ Qt (17.8)
onde
∆t − 2 ⋅ K ⋅ X
C1 = (17.9)
2 ⋅ K ⋅ (1 − X ) + ∆t
∆t + 2 ⋅ K ⋅ X
C2 = (17.10)
2 ⋅ K ⋅ (1 − X ) + ∆t
2 ⋅ K ⋅ (1 − X ) − ∆t
C3 = (17.11)
2 ⋅ K ⋅ (1 − X ) + ∆t
221
O parâmetro X é um ponderador adimensional cujo valor deve estar entre 0 e 1, mas
na maior parte dos rios e canais naturais seu valor é próximo a 0,3. Dependendo do
valor de X ocorre mais ou menos amortecimento da onda de cheia. Para um valor de
X igual a 0,5 não ocorre amortecimento. Quando X é igual a zero o amortecimento é
máximo.
O parâmetro K têm unidades de tempo e deve ser expresso nas mesmas unidades de
∆t. O valor de K pode ser estimado pelo tempo de viagem do pico da cheia do início
ao final do trecho de rio, ou seja, a distância dividida pela celeridade. Quanto maior o
valor de K, mais afastados no tempo ficam os picos de vazão na entrada e saída do
trecho de canal.
∆t
X ≤ ≤ (1 − X )
2⋅K
EXEMPLO
O valor de K do método de Muskingum pode ser considerado igual ao tempo de viagem do pico entre o
início e o final do trecho (2,4 horas). O valor do ponderador X pode ser escolhido entre 0,1 e 0,3, que
são valores típicos para os rios. Adotando um valor de X = 0,2, que corresponde ao meio do intervalo,
os valores de C1, C2 e C3 ficam:
222
C1 = 0,008
C2=0,405
C3=0,587
∆t
O valor escolhido de X também satisfaz o critério X ≤ ≤ (1 − X ) .
2⋅K
Considerando que a vazão de saída no primeiro intervalo de tempo é igual à vazão de entrada, a vazão
no segundo intervalo de tempo pode ser calculada por:
Qt + ∆t = C 1 ⋅ I t + ∆t + C 2 ⋅ I t + C 3 ⋅ Qt
ou seja
E as vazões nos intervalos seguintes pode ser calculada de forma semelhante, resultando nos valores
apresentados na tabela que segue.
223
20 1.15 1.60
21 1.10 1.41
22 1.05 1.28
23 1.00 1.19
24 1.00 1.11
Em trechos longos de rios pode ser necessário fazer a divisão do comprimento total
em sub-trechos e realizar a propagação para cada um destes sub-trechos, de montante
para jusante.
Método Muskingum-Cunge
Um problema do método Muskingum para propagação de vazões é que para definir os
valores dos parâmetros K e de X é necessário dispor de dados observados de vazão
nos extremos de montante e jusante do trecho de rio, o que raramente se cumpre.
∆x
K= (17.12)
c
1 Q
X = ⋅ 1 − (17.13)
2 B ⋅ c ⋅ S 0 ⋅ ∆x
224
O intervalo de tempo de cálculo ideal para o método Muskingum-Cunge deve ser
relativamente pequeno se comparado ao tempo de ascensão do hidrograma.
Tr
∆t ≤ (17.14)
5
c ⋅ ∆t 2
1
Q
∆x ≅ 1 + 1 + 1,5 ⋅ (17.15)
2 B ⋅ S 0 ⋅ ∆t ⋅ c 2
225
EXEMPLO
O primeiro passo da solução é estimar a vazão de referência para o cálculo dos parâmetros.
Considerando que a vazão máxima do hidrograma de entrada no trecho de rio é 130 m3.s-1, uma opção
para a vazão de referência é 90 m3.s-1, que é ligeiramente inferior à vazão máxima (cerca de 70% do
pico).
Considerando um rio com seção transversal retangular, e considerando que o raio hidráulico pode ser
considerado igual à profundidade, a vazão de 90 m3.s-1 corresponde ao nível d’água 2,66 m. A
velocidade média na seção, nesta mesma vazão de referência, é de 1,13 m.s-1. A celeridade pode ser
obtida pela equação 17.3, o que resulta em 1,88 m.s-1.
O intervalo de tempo em que existem dados observados é de 40 minutos, o que corresponde a um sexto
do tempo de pico da onda de cheia. Assim, observa-se pela equação 17.14 que o intervalo de tempo de
40 minutos é adequado. Isto corresponde a ∆t=2400 s.
Com base nestes dados a equação 17.15 pode ser utilizada para determinar o ∆x ideal. O resultado é
∆x=5249 m. Com base neste ∆x ideal é necessário decidir como o comprimento total do trecho será
dividido. Uma primeira estimativa é calcular o número de sub-trechos necessários para atingir o ∆x
ideal:
226
L 18000
N= = = 3,43
∆x 5249
Assim, seriam necessários 3,43 sub-trechos. Como não é possível trabalhar com valores não inteiros de
sub-trechos, o número de sub-trechos adotado é N=3. Assim, cada um dos trechos tem ∆x=6000 m.
O valor de K pode ser calculado pelo tempo que uma onda com celeridade c leva para percorrer um ∆x,
isto é:
∆x 6000
K= = = 3190 s
c 1,88
∆t
Observa-se que estes valores de X e K satisfazem o critério X ≤ ≤ (1 − X )
2⋅K
Com base nestes valores de X e K obtém-se C1=0,062; C2=0,644 e C3=0,294 usando as equações
17.9 a 17.11.
Considerando que no primeiro intervalo de tempo a vazão de saída de cada um dos 3 subtrechos é igual
à vazão de entrada do primeiro sub-trecho, pode ser iniciado o cálculo para o segundo intervalo de
tempo:
No primeiro sub-trecho:
Qt + ∆t = C 1 ⋅ I t + ∆t + C 2 ⋅ I t + C 3 ⋅ Qt
ou seja
a vazão de saída deste sub-trecho passa a ser a vazão de entrada do subtrecho seguinte, assim a vazão
de saída do segundo subtrecho no segundo intervalo de tempo é calculada por:
repetindo estes cálculos para cada intervalo de tempo são obtidas as vazões de saída de cada sub-trecho,
como mostra a tabela a seguir:
227
Tempo Vazão montante Vazão Vazão Vazão
Intervalo de tempo (minutos) (m3/s) subt 1 subt 2 subt 3
1 40 20 20.0 20 20
2 80 30 20.6 20.0 20.0
3 120 60 29.1 21.0 20.1
4 160 90 52.8 28.2 21.2
5 200 100 79.7 47.2 27.3
6 240 130 95.9 71.1 42.8
7 280 115 119.0 90.0 64.0
8 320 95 114.9 110.2 83.6
9 360 80 99.9 112.6 102.6
10 400 60 84.6 102.7 109.1
11 440 40 66.0 88.8 103.7
12 480 20 46.4 71.5 92.1
13 520 20 27.8 52.6 76.4
14 560 20 22.3 34.7 58.5
15 600 20 20.7 25.9 41.2
A vazão máxima na entrada do trecho é de 119 m3.s-1 e a vazão máxima na saída é de 109,1 m3.s-1.
O pico na vazão de saída ocorre 160 minutos (2 horas e 40 minutos) depois do pico de vazão na
entrada do trecho.
Leituras adicionais
A propagação de vazões em rios e canis é tema de livros dedicados exclusivamente ao
assunto. Em português uma referência útil é o livro Hidráulica Fluvial, de Rui Vieira da
Silva, Flávio Mascarenhas e Marcelo Miguez; além do livro Modelos Hidrológicos
(Tucci, 199).
Exercícios
228
2) Utilize o método de Muskingum-Cunge para propagar o hidrograma dado pela
equação abaixo, em um rio com 15 km de extensão, largura média de 60 m,
coeficiente de Manning n = 0,030, com declividade de 0,0002. Utilize intervalo
de tempo horário.
β
t t
Q(t ) = Qbase + (Q pico − Qbase ) ⋅ ⋅ exp 1 −
T p T
p
229
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
18
Estimativa de vazões máximas com
base na chuva
Chuvas de projeto
Os métodos de estimativa de vazões máximas a partir das chuvas podem ser aplicados
com eventos de chuva observados, mas é mais freqüente a sua aplicação com eventos
idealizados, denominados chuvas de projeto.
Uma chuva de projeto é um evento chuvoso idealizado, ao qual está associado um
tempo de retorno. Ao utilizar uma chuva de projeto com 10 anos de tempo der
retorno como base para a estimativa da vazão máxima usando um modelo de
transformação de chuva em vazão, supõe-se que a vazão máxima gerada por esta
chuva também tenha um tempo de retorno de 10 anos.
Chuvas de projeto são normalmente obtidas a partir das curvas IDF de pluviógrafos
ou a partir de dados de pluviômetros desagregados para durações menores do que um
dia.
231
Tabela 18. 1: Tempos de retorno adotados para projeto de estruturas.
Estrutura TR (anos)
Bueiros de estradas pouco movimentadas 5 a 10
Bueiros de estradas muito movimentadas 50 a 100
Pontes 50 a 100
Diques de proteção de cidades 50 a 200
Drenagem pluvial 2 a 10
Grandes barragens (vertedor) 10000
Pequenas barragens 100
Micro-drenagem de área residencial 2
Micro-drenagem de área comercial 5
Na ausência de curvas IDF para locais próximos à bacia em análise, pode-se recorrer à
análise estatística de dados de chuva de pluviômetros, coletados em intervalo de tempo
diário. A partir destes dados é possível obter estimativas de chuvas intensas de 1 dia de
duração com tempos de retorno de 2, 5, 10, 50, ... anos usando técnicas semelhantes às
aplicadas para estimativa de vazões máximas apresentadas no capítulo 14. As chuvas
intensas de 1 dia de duração são, posteriormente, desagregadas para durações inferiores
a 1 dia usando relações de altura pluviométrica entre durações consideradas típicas para
uma região. Estas relações são obtidas a partir de dados de pluviógrafos. A tabela a
seguir apresenta valores de relações entre durações que podem ser utilizados caso não
existam dados de curva IDF.
Tabela 18. 2: Relações de altura de chuva entre durações sugeridas pela CETESB para o Brasil, segundo Tucci (1993).
232
A chuva máxima para um dado tempo de retorno e tempo de duração pode ser
estimada usando dados de chuva máxima de 1 dia de duração e a tabela anterior. Por
exemplo, supondo que a chuva máxima anual com tempo de retorno de 10 anos e 1
dia de duração em um determinado local, obtida a partir dos dados de um pluviômetro,
seja 120 mm. Para estimar a chuva máxima com 30 minutos de duração neste local
podemos usar as relações da seguinte forma:
Por outro lado, na geração de chuvas de projeto mais longas, tipicamente utilizadas em
cálculos de vazões baseadas no método do hidrograma unitário, normalmente
considera-se que a intensidade da chuva varia ao longo do evento de projeto. Existem
vários métodos para criar uma distribuição temporal para chuvas de projeto, e nenhum
deles tem uma fundamentação mais profunda. Um método freqüentemente utilizado é
conhecido como método dos blocos alternados (Chow et al., 1988).
O método dos blocos alternados para definir a distribuição temporal das chuvas de
projeto está baseado no uso de uma curva IDF para diferentes durações de chuva,
menores do que a duração total da chuva de projeto. Por exemplo, considere que a
chuva de projeto deve ter uma duração total de 120 minutos, e que será dividida em 6
intervalos de 20 minutos. Se considerarmos o tempo de retorno de 10 anos e a curva
IDF do 8º. Distrito de Meteorologia, em Porto Alegre, cuja equação é dada no capítulo
3, temos a seguinte relação entre duração e intensidade: 20 minutos – 102,2 mm.hora-
1; 40 minutos – 67,4 mm.hora-1; 60 minutos – 51 mm.hora-1; 80 minutos – 41,4
mm.hora-1; 100 minutos – 35,0 mm.hora-1; 120 minutos – 30,4 mm.hora-1.
A altura total de chuva para cada duração é obtida multiplicando a intensidade pela
duração, e a altura incremental para cada intervalo de 20 minutos é dada pela subtração
233
entre a altura total para uma dada duração total menos o total da duração anterior,
como pode ser observado na tabela que segue.
Tabela 18. 3: Exemplo de elaboração de chuva de projeto a partir da curva IDF (primeira parte).
234
Tabela 18. 4: Blocos de chuva de 20 minutos de duração organizados em ordem decrescente.
Tabela 18. 5: Blocos de chuva de 20 minutos de duração reorganizados pelo método dos blocos alternados.
235
Figura 18. 3: Fator de redução da chuva de projeto de acordo com a área da bacia e a duração da chuva – as linhas pretas foram
obtidas em 1958 para algumas regiões dos EUA com base em dados de pluviógrafos e as linhas cinza foram obtidas a partir de dados
de radar.
Em bacias pequenas, com chuvas de curta duração, pode ser adotado o hidrograma
unitário. Já em bacias maiores, com chuvas mais demoradas, ou em casos em que se
deseja, além da vazão máxima, o volume das cheias, é necessário utilizar modelos
baseados no hidrograma unitário.
236
Tabela 18. 6: Métodos de cálculo de vazão máxima, pelo Departamento de Esgotos Pluviais de PORTO ALEGRE.
A (ha) MÉTODO
A ≤ 200 Racional
Os limites de área que definem qual método utilizar não são gerais, de modo que cada
órgão governamental define seus limites de acordo com a aplicação. As duas
metodologias (Racional e do Hidrograma Unitário) estão em detalhes a seguir.
C ⋅i⋅ A
Q= (18.1)
3,6
237
Tabela 18. 7: Valores de C (coeficiente de escoamento do método racional) para diferentes superfícies.
Tabela 18. 8: Valores de C (coeficiente de escoamento do método racional) de acordo com a ocupação da bacia.
Zonas C
Centro da cidade densamente construído 0,70 a 0,95
Partes adjacentes ao centro com menor densidade 0,60 a 0,70
Áreas residenciais com poucas superfícies livres 0,50 a 0,60
Áreas residenciais com muitas superfícies livres 0,25 a 0,50
Subúrbios com alguma edificação 0,10 a 0,25
Matas parques e campos de esportes 0,05 a 0,20
A intensidade da chuva é obtida a partir da curva IDF (veja capítulo 3) mais adequada
ao local da bacia. Para obter a intensidade i é preciso definir a duração da chuva e o
tempo de retorno.
238
Vazões máximas usando o hidrograma unitário
Modelos baseados no hidrograma unitário são utilizados para calcular vazões máximas
e hidrogramas de projeto com base nas chuvas de projeto. Neste caso, uma
metodologia de separação de escoamento, como a do SCS descrita no capítulo 10, e o
método do hidrograma unitário, descrito no capítulo 11, são utilizados considerando
eventos de chuva de projeto.
Os passos para obter a vazão máxima com base no hidrograma unitário são detalhados
a seguir:
5. Com base em na curva IDF define-se a chuva de projeto, com duração igual
ao tempo de concentração da bacia, e organizada em blocos alternados, ou
metodologia semelhante.
Estes passos podem ser repetidos para outros tempos de retorno e para outras
condições de ocupação da bacia. A utilização deste método é comum quando se deseja
saber quais serão as vazões máximas em uma bacia num cenário futuro, em que
aumentou a área urbanizada da bacia.
239
Os cálculos de vazão máxima a partir da chuva e do hidrograma unitário raramente são
realizados de forma manual, ou com base em planilhas e calculadora. A situação mais
normal atualmente é a utilização de modelos hidrológicos para a realização destes
cálculos. Os modelos hidrológicos utilizam técnicas como as descritas nos capítulos
anteriores para calcular as vazões a partir da chuva. Além de separação de escoamento
e hidrograma unitário, os modelos hidrológicos ainda permitem fazer os cálculos de
propagação de escoamento em rios e reservatórios, como os descritos nos capítulos
anteriores.
Exercícios
1) Defina a chuva de projeto de 3 horas de duração e tempo de retorno 5 anos
com base na curva IDF do Aeroporto de Porto Alegre (capítulo 3). Use o
método dos blocos alternados.
2) Estime a vazão máxima de projeto para um galeria de drenagem sob uma rua
numa área comercial de Porto Alegre, densamente construída, cuja bacia tem
área de 35 hectares, comprimento de talvegue de 2 km e diferença de altitude
ao longo do talvegue de 17 m.
240
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
19
Qualidade da água
A
água é um elemento vital para as atividades humanas e para a manutenção da
vida. Para satisfazer as necessidades humanas e ambientais, é necessário que a
água tenha certas características que variam com o seu uso. A água utilizada
para análises clínicas, por exemplo, deve ser tanto quanto possível isenta de
sais e outras substâncias em solução ou suspensão. Já para a navegação e para a geração
de energia, por exemplo, a água deve apenas atender ao requisito de não ser
excessivamente agressiva às estruturas. Para os processos biológicos incluindo a
manutenção dos ecossistemas, a alimentação humana e a dessedentação animal, as
exigências são intermediárias.
Poluição da água
Entende-se por poluição da água a alteração de suas características por quaisquer ações
ou interferências sejam elas ou não provocadas pelo homem (Braga et al., 2005). A
origem da palavra poluição está relacionada à condição estética da água, que parece suja
quando a poluição pode ser percebida a olho nu. Entretanto, a alteração da qualidade
da água não se manifesta apenas em características estéticas. A água aparentemente
limpa pode conter micro-organismos patogênicos e substâncias tóxicas.
Temperatura
A temperatura é uma das características mais importantes da água de um rio ou lago
porque a temperatura da água afeta as características físicas e químicas da água, como,
por exemplo a solubilidade dos gases e a densidade.
Outra fonte de poluição térmica é uma barragem em que a água descarregada para
jusante é retirada de camadas muito profundas do reservatório localizado a montante.
No fundo de um reservatório a temperatura da água pode ser bastante inferior à
temperatura normal da água do rio.
Oxigênio Dissolvido
O Oxigênio Dissolvido (OD) é necessário para manter as condições de vida dos seres
que vivem na água, e, portanto, é um parâmetro importante na análise da poluição de
um rio. O OD é consumido pelos seres vivos, especialmente os organismos
decompositores de matéria orgânica. A concentração de OD na água aumenta por
fotossíntese de plantas e algas aquáticas ou por reareação, no contato com a atmosfera.
242
Tabela 19. 1: Concentração de OD de saturação para diferentes temperaturas da água. Valores correspondem à água doce (salinidade
zero) e pressão atmosférica média ao nível do mar.
pH
O pH expressa o grau de acidez ou alcalinidade da água, em valores de 0 a 14, sendo
que valores inferiores a 7 indicam águas ácidas e valores superiores a 7 indicam águas
alcalinas (Benetti e Bidone, 1993). O pH do meio (água) controla as reações químicas
de muitos outros poluentes. Valores baixos de pH aceleram a decomposição de
materiais potencialmente tóxicos. Valores altos de pH podem levar a um aumento na
concentração de amônia, que é tóxica para os peixes
DBO
A água dos rios e de esgotos cloacais e industriais contém matéria orgânica. Esta
matéria orgânica é decomposta por microorganismos que, em geral, consomem
oxigênio no processo de decomposição. A DBO, ou Demanda Bioquímica de
Oxigênio, representa o consumo potencial de oxigênio para decompor a matéria
orgânica existente na água.
A DBO é medida a partir de uma coleta de amostra que deve ser mantida a 20º. C. A
Concentração inicial de oxigênio na amostra é medida e a amostra fica mantida por
cinco dias em um recipiente de vidro, livre da influência da luz. Ao longo destes cinco
dias o oxigênio vai sendo consumido por bactérias e a concentração de OD é medida
ao final dos cinco dias. A diferença entre a concentração inicial de OD (mais alta) e a
concentração final (mais baixa) é o valor da DBO5, denominada assim porque está
baseada num teste realizado em 5 dias.
243
Coliformes fecais
Obviamente existem inúmeros tipos de micro-organismos nas águas, e alguns destes
podem indicar presença de dejetos de origem animal. A água com micro-organismos
de origem humana é potencialmente nociva, porque muitos tipos de doenças são
transmitidas via a água. Entretanto, testar a água para todos os micro-organismos
potencialmente patogênicos seria muito caro, assim é mais comum a verificação da
presença ou concentração da bactéria Escherichia coli.
Escherichia coli é uma bactéria presente nos sistemas digestivos de animais de sangue
quente, que normalmente não é nociva, mas que é usada como indicativo de
contaminação com fezes humanas (ou mais raramente de outros animais).
Mistura
Aspectos fundamentais da qualidade da água são, normalmente, apresentados em
termos de concentração de substâncias na água. A concentração é expressa como a
massa da substância por volume de água, em mg.l-1, ou g.m-3. Por exemplo, ao
acrescentar e dissolver 12 mg de sal em um litro de água pura, obtém-se água com uma
concentração de 12 mg.l-1.
QR ⋅ C R + Q A ⋅ C A
CF = (19.1)
QR + Q A
EXEMPLO
1) Uma cidade coleta todo o esgoto cloacal, mas não tem estação de tratamento.
Assim, a vazão de esgoto de 0,5 m3.s-1 com uma concentração de 50 mg.l-1 de
Nitrogênio Total é lançada em um rio com uma vazão de 23 m3.s-1 e com uma
concentração de 1 mg.l-1 de Nitrogênio Total. Considerando mistura completa
qual é a concentração final no rio a jusante da entrada do esgoto.
244
QR ⋅ C R + Q A ⋅ C A 23 ⋅ 1 + 0,5 ⋅ 50
CF = ou seja C F = = 2,04
QR + Q A 23,5
m 3 ⋅ mg Kg
WF = QF ⋅ C F = 23,5 ⋅ 2,04 = 23,5 ⋅ 2,04 = 48 Kg .s −1
s ⋅l s
Na realidade, a mistura de um poluente lançado no rio com a água deste rio não é
imediata. Ao longo de um trecho L a jusante do ponto de lançamento a água não pode
ser considerada completamente misturada. Um exemplo clássico deste fenômeno é a
confluência dos rios Amazonas e Negro – o Encontro das Águas – que fluem lado a
lado por vários km até que suas águas se misturem. A rapidez com que um poluente se
mistura à água do rio depende da turbulência e a turbulência depende da velocidade e
da quantidade de obstáculos e curvas. Uma estimativa útil para um lançamento lateral
em um rio pode ser obtida pela equação a seguir (Yotsukara, 1968 apud Chapra, 1997):
B2
Lm = 8,52 ⋅ U ⋅ (19.2)
H
EXEMPLO
A distância a jusante do lançamento onde a mistura pode ser considerada completa pode ser estimada
por:
B2 15 2
Lm = 8,52 ⋅ U ⋅ = 8,52 ⋅ 0,3 ⋅ = 1438 m
H 0,4
245
ou seja, Lm = 1438 m. O tempo para a água percorrer esta distância é:
d t= 1438/0,3 = 4793 s
Assim, a distância é de 1438 m e o tempo para ocorrer mistura completa é de 1 hora e 20 minutos.
Transformação de poluentes
Os poluentes da água podem ser classificados em conservativos e não conservativos,
dependendo da ocorrência ou não de transformações destes poluentes que afetam a
sua concentração na água.
dC
= −k ⋅ C (19.3)
dt
C = C0 ⋅ e − k ⋅t (19.4)
246
representada por equações de primeira ordem, como a equação 19.3. Se uma amostra
de água com uma pequena quantidade de
matéria orgânica degradável for mantida
num frasco sem luz e sem oxigenação, a
concentração de OD ao longo do tempo
normalmente tem um comportamento
como o ilustrado na Figura 19. 1. A
matéria orgânica se degrada e o OD da
água é consumido ao longo deste
processo, como mostra o gráfico.
dL
= −k 1 ⋅ L (19.5)
dt
L = L0 ⋅ e − k1 ⋅t (19.6)
dC
= −k 1 ⋅ L (19.7)
dt
(
C = C0 − L0 ⋅ 1 − e − k1 ⋅t ) (19.8)
247
( (
DBO5, 20 = C0 − C 5 = C0 − C0 − L0 ⋅ 1 − e − k1 ⋅5 ))
(19.9)
(
DBO5, 20 = L0 ⋅ 1 − e − k1 ⋅5 )
onde k1 deve ser utilizado com unidades de dia-1.
Então, ao longo de 5
dias a matéria orgânica
degradável consome
uma quantidade de
OD que é medida pela
DBO5,20. Para saber a
quantidade total de
OD que a matéria
orgânica poderia ter
consumido, se
houvesse tempo para
isso, é necessário
estimar o valor de L0,
que é conhecida como
DBO Última ou DBO
Total.
A DBO Última ou
DBO Total pode ser
Figura 19. 2: Concentração de OD e DBO ao longo do tempo em um frasco com uma pequena quantidade de estimada considerando
matéria orgânica degradável, sem reoxigenação, com indicação da forma como é medida a DBO5,20. que o processo seguiria
a partir do quinto dia
de acordo com um
decaimento de primeira ordem. Utilizando a equação 19.9 podemos encontrar o valor
de L0 a partir do valor da DBO5,20 e de uma estimativa do coeficiente k1:
DBO5 , 20
L0 = (19.10)
(1 − e )− k1 ⋅5
248
EXEMPLO
3) Para uma amostra de esgoto foi medido o valor de DBO5,20 de 300 mg/l.
Estime o valor da DBO total considerando que o coeficiente de decaimento é
de 0,35 dia-1.
DBO5, 20 300
L0 =
(1 − e )
− k1 ⋅5
=
(1 − e −0,35⋅5 ) = 363
Assim, a DBO total é de 363 mg/l..
Autodepuração de rios
Uma característica importante dos rios é que eles podem se recuperar do impacto
causado pelo lançamento de poluentes, desde que respeitados alguns limites de
tolerância e após um certo período de tempo. Uma situação típica é a poluição da água
pelo lançamento de matéria orgânica com alta demanda bioquímica por oxigênio
(DBO), como a que existe no esgoto doméstico e nos efluentes de muitas indústrias
alimentícias e de bebidas.
Considere um rio com água bastante limpa, em que a DBO é próxima de zero e a
concentração de OD está próxima da saturação. Em um ponto é lançado um efluente
com alta concentração de DBO e concentração de OD próxima de zero. Admitindo
mistura completa e imediata, no ponto de lançamento do efluente poluído ocorre um
aumento súbito da concentração de DBO e uma redução da concentração de OD,
como mostra a Figura 19. 3.
249
Na Figura 19. 3 o afluente poluído entra no rio e a mistura imediata faz a concentração
de OD cair do nível de saturação para um valor inferior ao de saturação. Ao mesmo
tempo, a concentração de DBO se eleva e o déficit de OD em relação à concentração
de saturação (D) também aumenta. A partir do ponto de lançamento, a DBO vai
sendo degradada, e o processo consome OD. A concentração de DBO vai diminuindo
de forma contínua, entretanto a concentração de OD inicialmente diminui, mas depois
volta a aumentar, finalmente atingindo os níveis equivalentes à concentração de
saturação a uma certa distância do local de lançamento. Observa-se na figura que é
mantida a relação D = CODsat – COD.
Figura 19. 3: Gráfico de concentrações de OD e DBO num rio : o ponto de entrada de um afluente poluído corresponde ao Km 20
(OD é o Oxigênio Dissolvido; OD sat é a concentração de OD na saturação; D é o déficit de oxigênio dissolvido em relação à
concentração de saturação; e DBO é a concentração de DBO)
250
imediatamente, porém uma demanda associada com sua decomposição por
organismos bentônicos pode ocorrer mais tarde.
Em termos da coluna de água de rios e lagos, a DBO é removida com uma taxa que
depende tanto do decaimento bioquímico como da sedimentação. Pode-se admitir que
existe um coeficiente de remoção (kr) dado pela soma de um coeficiente de decaimento
(kd), que é semelhante ao k1 definido antes, e de um coeficiente de sedimentação (ks),
como mostra a equação 19.11.
kr = kd + ks (19.11)
dL
= −k r ⋅ L (19.12)
dt
L = L0 ⋅ e − k r ⋅t (19.13)
Pode-se considerar que a sedimentação não provoca consumo de OD, mas apenas o
decaimento bioquímico. Assim, o OD é consumido em uma velocidade que depende
da concentração de DBO, e do coeficiente kd:
dC OD
= −k d ⋅ L
dt
(19.14)
251
−0 , 434
h
k d = 0,30 ⋅ (19.15)
2,4
Reoxigenação
A direção e a magnitude do fluxo de oxigênio depende da diferença entre a
concentração real e a concentração de saturação. Esta diferença é chamada déficit de
saturação de OD.
b c d e
C ODsat = exp a + + 2 + 3 + 4 (19.17)
T T T T
a = -139,34411
b = 1,575701 . 105
252
c = -6,642308 . 107
d = 1,243800 . 1010
e = -8,621949 . 1011
dC OD
= k a ⋅ (C ODsat − C OD ) (19.18)
dt
dD
= −k a ⋅ D (19.20)
dt
253
Tabela 19. 2: Equações empíricas para estimative do coeficiente de reoxigenação a partir das características do escoamento (unidades:
ka (dia-1); u (m.s-1); h (m) - fonte: Chapra, 1997).
Uw
k a = 0,864 ⋅ (19.21)
h
Valores do coeficiente a variam de 0,65 para água muito poluída até 1,8 para água
limpa. Valores do coeficiente b variam de valores entre 0,8 e 1,0 para quedas naturais
ou vertedores verticais, até valores inferiores a 0,1 para descarregadores de fundo.
254
(T − 20 )
k a ,T = k a , 20 ⋅ (1,024 ) (19.23)
O modelo de Streeter-Phelps
Um método simplificado para representar matematicamente o processo de
autodepuração de rios foi proposto na década de 1920 por dois pesquisadores
americanos (H. W. Streeter e E. B. Phelps) que analisavam os problemas de qualidade
de água do rio Ohio. Em homenagem a estes autores, o método passou a ser
conhecido como Modelo de Streeter-Phelps.
Figura 19. 5: O escoamento em um rio na versão mais simples do modelo Streeter-Phelps pode ser entendido como uma fila de tanques de água que seguem com
uma velocidade constante.
255
tanque possa se misturar com a água do tanque ao lado, como mostra a Figura 19. 5.
Em cada tanque ocorre decaimento de DBO, consumo de OD e reoxigenação, mas a
água dos tanques não se mistura.
dC OD
= − k d ⋅ C DBO + k a ⋅ (C OD − sat − C OD ) (19.24)
dt
dD
= kr ⋅ L − ka ⋅ D (19.25)
dt
k d ⋅ L0
D = D0 ⋅ e −k a ⋅t +
ka − kr
(
⋅ e −k r ⋅t − e − k a ⋅t ) (19.26)
−ka ⋅
x
k ⋅L − k r ⋅ ux −ka ⋅
x
D = D0 ⋅ e u
+ d 0
⋅ e −e u
(19.27)
ka − kr
A equação 19.26 pode ser utilizada para encontrar o tempo (e a distância a partir do
ponto de lançamento) em que ocorre o maior déficit. Este tempo, denominado tc,
256
pode ser encontrado derivando a equação 19.26 em relação ao tempo, e igualando a
derivada a zero.
1 k D ⋅ (k a − k r )
tc = ⋅ ln a ⋅ 1 − 0 (19.28)
k a −k r kr k d ⋅ L0
− ka
k − k
k d ⋅ L0 k D ⋅ (k a − k r ) a r
Dc = ⋅ a ⋅ 1 − 0 (19.29)
ka kr k d ⋅ L0
As equações 19.28 e 19.29 não podem ser usadas quando COD chega a zero no meio do
trecho. Neste caso o rio está numa condição anaeróbica. O tempo ti em que inicia a
situação anaeróbica é caracterizado pela igualdade D = CODsat. Usando a equação 19.26,
encontrar o valor de ti corresponde a encontrar a raiz da função f(t) dada na equação
19.30, o que pode ser feito numericamente por um método como bissecção ou
Newton, ou usando o Solver do Excel.
kd ⋅ L0
f (t ) = D0 ⋅ e −ka ⋅t +
ka − kr
( )
⋅ e −kr ⋅t − e −ka ⋅t − CODsat (19.30)
dL
= − k a ⋅ CODsat (19.31)
dt
Assim, entre os tempos ti e tf, isto é, enquanto dura a situação anaeróbica, a DBO
pode ser calculada por:
k a ⋅ CODsat = k d ⋅ L (19.33)
257
1 kd ⋅ L0 ⋅ e − kr ⋅ti − k a ⋅ CODsat
t f = ti + ⋅ (19.34)
kd k a ⋅ CODsat
A partir deste ponto, voltam a valer as equações 19.13 para DBO e 19.26 para OD.
Os limites de valores de alguns parâmetros de qualidade de água para cada classe são
apresentados na tabela Tabela 19. 3.
Classe especial
São águas destinadas ao abastecimento para o consumo humano, com desinfecção
simples. Também servem para a preservação do equilíbrio natural das comunidades
aquáticas e para a preservação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação
de proteção integral.
Classe 1
São águas que podem ser destinadas ao à recreação de contato primário, como natação
e vela; à proteção das comunidades aquáticas; à aqüicultura e à atividade de pesca; ao
abastecimento para consumo humano após tratamento convencional ou avançado; e à
irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes
ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película, e à irrigação de parque,
jardins, campos de esportes e lazer, com os quais o público possa vir a ter contato
direto.
Classe 2
São águas que podem servir ao consumo humano após tratamento convencional;
podem ser destinadas à pesca amadora; e à recreação de contato secundário. Também
258
podem ser usadas para irrigação de hortaliças e plantas frutíferas, e de áreas de lazer,
com as quais o público possa vir a ter contato direto.
Classe 3
São águas que podem ser destinadas ao consumo humano após tratamento
convencional ou avançado; podem servir à irrigação de culturas arbóreas ou cereais; e
podem servir à dessedentação de animais.
Classe 4
São águas que podem ser destinadas à navegação e à harmonia paisagística.
Tabela 19. 3: Valores limites de alguns parâmetros de qualidade de água para diferentes classes, de acordo com a resolução CONAMA
de 2005.
Parâmetros Classes
especial 1 2 3 4
DBO5,20 (mg/l) ≤3 ≤5 ≤ 10 -
Oxigênio Dissolvido (mg/l) ≥6 ≥5 ≥4 ≥2
Nitrogênio Total (mg/l)
Fósforo total (ambiente lêntico) ≤ 0,020 ≤ 0,030 ≤ 0,050 -
(mg/l)
Fósforo total (ambiente lótico) ≤ 0,10 ≤ 0,10 ≤ 0,15 -
(mg/l)
Temperatura (oC)
Coliformes fecais (NMP/100 ml)
Leituras adicionais
Aspectos de qualidade de água não são, normalmente, analisados em livros
introdutórios de Hidrologia. Uma boa opção é o capítulo sobre o Meio Aquático, no
livro Introdução à Engenharia Ambiental (Braga et al., 2005).
Um dos livros mais completos sobre o assunto da qualidade de água, com ênfase à
representação matemática da qualidade da água em rios e lagos, é o livro Surface Water
Quality Modeling, de Steven Chapra (1997).
259
Exercícios
1) Considere um rio que recebe um afluente poluído, com as características dadas
na tabela abaixo. Verifique se a concentração de OD no rio permanece acima
de 4 mg/l no trecho a jusante da entrada do afluente. Considere que a
temperatura da água do rio e do afluente é de 20oC.
4) Uma cidade coleta todo o esgoto doméstico, mas não tem estação de
tratamento. Assim, a vazão de esgoto de 0,5 m3.s-1 com uma concentração de
50 mg.l-1 de Nitrogênio Total é lançada em um rio num ponto em que a curva
de permanência é dada pela figura que segue (próximo problema). O órgão
ambiental estadual obrigará a cidade a pagar multas toda vez que a
concentração de Nitrogênio Total no rio ultrapassar o limite de 0,4 mg.l-1.
Considerando que a concentração de Nitrogênio Total no rio a montante da
entrada do esgoto é constante e igual a 0,2 mg.l-1, qual é a porcentagem do
tempo em que o limite será ultrapassado? Considere mistura completa e
imediata das águas do esgoto no rio.
260
5) Uma usina termoelétrica será instalada às margens de um rio, em um local em
que a curva de permanência é apresentada na figura abaixo. A temperatura da
água do rio é de 17oC e uma vazão água utilizada para resfriamento, de 1,3
m3.s-1 será lançada pela usina termelétrica, com temperatura de 43 oC. Qual será
a temperatura final do rio a jusante do lançamento considerando mistura
completa? Considere como referência a Q95.
261
I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A
Capítulo
21
Aspectos da legislação e gestão dos
recursos hídricos
Essa escassez tem acentuado os conflitos pelos diversos usos desse bem, tais como:
abastecimento da população, irrigação de lavouras, dessedentação de animais, pesca,
indústria, navegação, geração de energia, lazer, diluição de esgoto, preservação de
ecossistemas, entre outros.
Esses Sistemas são fruto da criação de modelos de gestão que abrigam entidades
gerenciais organizadas em torno da Bacia Hidrográfica como unidade ideal de
planejamento, gestão e intervenção. No âmbito da União foi aprovada a Lei 9.433/97,
que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de
Gestão de Recursos Hídricos e, mais recentemente, a Lei 9.984/00 criou a Agência
Nacional de Águas (ANA), que tem como atribuição implementar os instrumentos da
política nacional. No que diz respeito ao Rio Grande do Sul, a Constituição Estadual
de 1989 e a Lei 10.350/94 estabeleceram a gestão das águas sob seu domínio.
A Lei 10.350/94 regulamentou o Sistema Estadual de Recursos Hídricos (SERH), que
já era contemplado na Constituição Estadual de 1989. Desde então, o SERH vem
sendo implementado nas 23 bacias hidrográficas do Estado (figura 10.1), através da
criação de comitês de gerenciamento de bacias hidrográficas, e da gradativa
implementação dos instrumentos de planejamento (Planos de Bacia e Plano Estadual)
e gestão (outorga, tarifação e rateio de custos) previstos na legislação. A seguir são
descritos brevemente o SERH e os instrumentos de planejamento e gestão.
2
- Conselho de Recursos Hídricos (CRH);
- Departamento de Recursos Hídricos (DRH);
- Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas (CGBH);
- Agências de Regiões Hidrográficas (ARH);
- Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM).
Os demais órgãos estatais que integram o sistema são: Obras Públicas e Saneamento,
com a vice-presidência do CRH; Agricultura e Abastecimento; Coordenação e
Planejamento; Saúde; Energia, Minas e Comunicações; Ciência e Tecnologia;
Transportes; Casa Civil; e Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos
Internacionais.
3
Ao DRH são atribuídas as seguintes funções:
Fazem parte do CGBH pessoas que têm diferentes interesses com relação ao bem
água: os usuários (são as pessoas que têm interesse “utilitário-econômico-social”); a
população (tem interesses difusos, vinculados ao desenvolvimento sócio-econômico,
aspectos culturais ou políticos e proteção ambiental); o poder público (detentor do
domínio das águas).
4
• Realizar o rateio do custo das obras a serem executadas na bacia;
• Aprovar os programas anuais e plurianuais de investimentos em serviços e obras da
bacia;
• Compatibilizar os interesses dos diferentes usuários e resolver eventuais conflitos
em primeira instância.
5
Fundação Estadual de Proteção Ambiental
A FEPAM é o órgão ambiental do Estado que integra o Sistema Estadual de Recursos
Hídricos com o Sistema Estadual de Meio Ambiente. Cabe à FEPAM a concessão de
outorga quando se trata de um uso d’água que afeta as condições qualitativas dos
recursos hídricos.
Instrumentos de Planejamento
Enquadramento
O enquadramento as águas brasileiras em classes de uso foi estabelecido pela
Resolução nº 020/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA. Assim,
para as águas doces foram definidas cinco classes: especial e de 1 a 4. Para as águas
salobras e salinas foram definidas duas classes: 5 e 6; e 7 e 8, respectivamente. Uma vez
que estabelece o nível de qualidade a ser alcançado e/ou mantido em um determinado
segmento de um corpo de água, ao longo do tempo, o enquadramento é considerado
um instrumento de planejamento do meio ambiente.
6
Dentro do PBH devem ser contemplados os programas de intervenções estruturais e
não-estruturais e sua distribuição espacial., bem como o esquema de financiamento
desses programas.
Instrumentos de Gestão
A Outorga de Uso
A outorga consiste no “consentimento, concessão, aprovação” do direito de uso da
água. Ela representa um instrumento, através do qual o Poder Público autoriza,
concede ou ainda permite ao usuário fazer o uso deste bem público. É através deste
que o Estado exerce, efetivamente, o domínio das águas preconizado pela Constituição
Federal. É através da outorga que é regulando o compartilhamento entre os diversos
usuários, visto que o principal objetivo da outorga é assegurar o controle qualitativo e
quantitativo dos usos da água.
A Lei 10.350, de 30 de dezembro de 1994, em seu artigo 29, explica que qualquer
empreendimento ou atividade que alterar as condições quantitativas e/ou qualitativas
das águas, superficiais ou subterrâneas, tendo como base o Plano Estadual de Recursos
Hídricos e os Planos de Bacia Hidrográfica, dependerá de outorga. Caberá ao
Departamento de Recursos Hídricos a emissão de outorga para os usos que alterem as
condições quantitativas das águas.
7
O Decreto nº 37.033, de 21 de novembro de 1996, regulamentou este instrumento,
estabelecendo os critérios para a concessão, "licença de uso" e "autorização", bem
como para a dispensa. O Decreto nº 42.047, de 26 de dezembro de 2002, regulamenta
disposições da Lei nº 10.350, de 30 de dezembro de 1994, com alterações, relativas ao
gerenciamento e à conservação das águas subterrâneas e dos aqüíferos no Estado do
Rio Grande do Sul.
De forma geral, estão sujeitos à outorga os seguintes usos dos recursos hídricos:
A cobrança pelo uso da água fica sujeita à outorga, pois não pode haver cobrança de
atividades e obras clandestinas ou cujos usos não tenham sido outorgados. A utilização
a cobrança é uma forma de aplicação do princípio usuário-poluidor-pagador, uma vez
que o poluidor, deve assumir os custos de poluição.
8
sendo ponderados na sua caracterização, parâmetros físicos, químicos, biológicos e
toxicidade dos efluentes, a classe de uso preponderante em que estiver enquadrado o
corpo de água receptor, o regime e variação quantitativa e qualitativa do corpo de água
receptor.
9
Bibliografia
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precioso do planeta. Publifolha. São Paulo.
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LEPSCH, I. F. 2002 Formação e conservação dos solos. São Paulo, Oficina de Textos 178p.
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WURBS, R. A.; JAMES, W. P. 2001 Water Resources Engineering. Prentice Hall, Upper
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