Cap. Passarelli (2012)
Cap. Passarelli (2012)
Cap. Passarelli (2012)
CAPTULO
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Gnero
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Passar o tempo, ter momen- poemas, pichaes em muros, cadernos pestos de lazer
soais
Produzir literatura
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[...] no s como forma de interao, mas como processo interacional entre sujeitos que usam a lngua em suas variedades
para se comunicar, para exteriorizar pensamentos, infonnaes, e, sobretudo, para realizar aes com o outro, sobre o
outro. Nesse sentido, a linguagem atividade constitutiva
histrica e social, realizada por sujeitos que interatuam a partir de lugares sociais estabelecidos pela sociedade em questo,
o que no descarta a liberdade de cada sujeito, pois cada sujeito se constitui diferente do outro (Passarel1i, 28b, p. 221-2).
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.,
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imprescindvel enfatizar vigorosamente que a apropriao do sistema da lngua visa ao uso. Portanto, no
trabalho com a linguagem em uso na perspectiva textual,
a gramtica leva em conta um raciocnio textual cujas ideias
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Entendendo que
diz respeito aos aspectos fsicos e lingusticos, mais propriamente aos elementos
estruturais que podem ser observados e qu,e, em conjunto,
possibilitam caracterizar um gnero e distingui-lo em meio
a outros (Shepherd e Watters, 1999), nessa linha de pensamento, concebe-se , .
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como realizao
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lingustica concreta definida por propriedades sociocomunicativas. Trata-se do texto, cuja modalidade de realizao
pode ser oral ou escrita, empiricamente realizado, cumprindo funes em situaes comunicativas recorrentes.
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Quanto variante lingustica empregada, vale retomar do Captulo 2 que a variao lingustica implica as
variedades de uso da lngua em relao a marcas de uso
decorrentes de fatores geogrficos, socioculturais e estilsticos, a escolhas adequadas do registro formal ou informal de acordo com a situao de uso pelo grau de
formalidade ou pela finalidade. Implica, pois, a diferena
de comportamento lingustico nos processos de interao
como um fato normal na lngua com traos caractersticos
de cada situao de uso, bem como as perspectivas ligadas
heterogeneidade lingustica em suas variedades de regio, gnero, gerao, profisso, classe social, s escolhas
de unidades lexicais estrangeiras e s criaes neolgicas
em funo das necessidadf;i;s dos falantes.
Para a operacionalizao dos contedos relativos aos
gneros, apresento o quadro a seguir, com algumas alteraes do j proposto anteriormente. 2 Este organiza aspectos
inerentes ao conjunto de elementos constitutivos dos gneros. Observe-se que a coluna da direita oferece especificaes tericas para, na coluna da esquerda, serem aplicadas em relao ao texto selecionado para anlise.
2. A primeira verso desse quadro foi elaborada em 2003, quando das aulas na
graduao de Letras na pue-sp, e vem sofrendo alteraes (Passarelli, 2004a, p. 63-:;
PassareIli 2008a, p, 120; Passarelli, 2008b, p. 233), Conforme o utilizo e quanto maIS
estudo, mais alteraes e ajustes ele sofre.
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Forma textual materializada em situao(es) comunicativa(s), cuja modalidade de realizao pode s.er oral ou escrita.
Funda-se em critrios externos: sociocomunicativos e discursivos. Um texto se organiza dentro de determinado gnero
em funo das intenes comunicativas.
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o que ou pode
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...-. 28/08/2010
Crack assassino
Que o consumo de crack est associado prtica
de delitos, j se sabia. O chocante que uma pesquisa
realizada em Belo Horizonte mostrou que os homicdios ligados a uso de drogas na cidade explodiram com
a chegada das "pedras".
At 1996, quando o crack apenas comeava a ser
consumido na capital mineira, as mortes ligadas a
conflitos gerados por drogas ilcitas ficavam em 8,3 %
do total.
Dez anos depois, o ndice de 33,3 %. Enquanto
os homicdios de uma maneira geral esto caindo em
Belo Horizonte, aqueles associados ao uso do crack no
param de crescer.
Essa droga, como se sabe, causa uma dependncia
ainda mais profunda do que outras, como a cocana.
A "fissura" incontrolvel e pode levar o viciado a
cometer atos brbaros.
O que tambm acontece muitas vezes o endividamento do usurio, que depois acaba sendo assassinado por traficantes.
Lamentavelmente, a cidade de So Paulo foi uma
das primeiras a conhecer os problemas do crack. Aqui
surgiu a tristemente famosa cracolndia.
No faz muito, a prefeitura anunciou uma ofensiva contra o acmulo de viciados em reas centrais da
cidade. um espetculo deplorvel, que lembra o videoclipe "Thriller", de MichaelJackson.
Mas pouco mudou. Agora, com as eleies, polticos voltam a fazer promessas.
O problema mesmo difcil de resolver.
No bastam aes policiais. preciso acompanhamento mdico e assistncia sociaL E tambm perseverana - uma virtude muitas vezes ausente do poder
pblico.
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Identificadas as caractersticas mais propriamente atinentes superfcie lingustica do texto e s condies discursivas que orientam a materializao textual, associando
o querer dizer do locutor, que reporta naturalmente "
relao com seus interlocutores e o estilo prprio do sujeito que fala, isto , suas escolhas dentre as estratgias de
dizer disponveis, ou suas elaboraes de estratgias novas
resultantes da articulao que realiza entre o disponvel e
o novo", um ensino diferenciado pressupe, conforme Geraldi (2010b, p.168) adverte, refletir sobre a linguagem e
sobre o funcionamen to da lngua portuguesa para alm do
desenvolvimento da competncia lingustica. Esse tipo de
abordagem propicia desenvolver tambm atividades de
reflexo sobre recursos expressivos e seus efeitos de sentido em funcionamento no gnero em anlise. No se trata
de atividade meramente metalingustica, resultante de uma
teoria lingustica, mas de atividade epilingustica, que
mais produtiva para desenvolver "competncias no uso
/ (perspectiva instrumental) e na conscincia dos modos de
funcionamento da linguagem (perspectiva cognitiva)",
tambm de acordo com Geraldi (2010b, p. 186).
Retomando o texto "Crack assassino", reconhecer o
gnero a que pertence, por meio de aspectos estruturais el
ou de suas caractersticas composicionais remete a consider-lo um editorial, uma vez que, com a predominncia
da tipologia argumentativa, o texto defende um ponto de
vista sobre o assunto, sustentado por argumentos convincentes, alm de no se apresentar "fisicamente" assinado,
outra evidente caracterstica desse gnero textual. Ateno
para o advrbio entre aspas, pois, de acordo com o Professor
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Geraldi,3 O fato de no constar no editorial o registro fsico da autoria significa que ele assinado pela instituio
jornalstica. Por tratar-se do gnero de opinio do jornal
e, por isso mesmo, assumido corno institucional, muito
mais do que as reportagens ou notcias no assinadas, em
que aparecem fontes e s vezes as agncias noticiosas,
talvez o editorial seja o mais assinado de todos os textos
veiculados nessa esfera de atividade discursiva.
Tambm a ttulo de exemplificao dos recursos expressivos empregados no texto, no 7 0 pargrafo, com base
no repertrio social, possvel interpretar a relao estabelecida entre o que acontece nas reas centrais da cidade,
e o videoclipe de Michael]ackson serve para descrever o
estado horroroso e lamentvel em que se encontram os
usurios de crack.
Outra atividade significativa em relao aos recursos
expressivos a de identificar a funo de ocorrncias de
natureza lxico-semntica, como a criao de termos novos.
Em "Aqui surgiu a tristemente famosa cracolndia", a palavra grifada, um neologismo, isto , uma rfova palavra criada
para atender necessidade de expresso dos falantes, foi
composta para dar nome a uma regio onde muito grande
o consumo da droga e tem o significado de terra do crack.
O efeito de sentido produzido pelo uso intencional de
mecanismos de notao tambm contribui para o que pode
se constituir em bom exerccio de natureza epilingustica.
No editorial em tela, as aspas so empregadas ao longo do
texto com diferentes finalidades, quais sejam: 1Q pargrafo
3. Essa preciosa advertncia [e outras tantas._.] me foi dada pelo Professor Joo
Wanderley Geraldi por ocasio da leitura que fez deste livro para prefaci-lo.
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,, ,
Alm do tradicional gnero redao escolar, tambm conhe
cido por texto dissertativoargumentativo e texto narrativo, tem
sido solicitados na escola outros gneros, tais como artigo de
opinio, carta de leitor, receita, crnica, notcia, currculo, poe
Gnero textual
Que forma
ter o texto?
e-mail..
Visto que um mesmo tema pode ser materializado sob dife
rentes formas, como os gneros que constam no pargrafo ante
rior, o aluno precisa dessa informao para, em funo das in
tenes comunicativas, organizar o gnero que lhe solicitado
dentro de suas caractersticas mais peculiarmente estveis e para
llla,
Tipo textual em
predominncia:
argumentativo
Veiculao:
situao
comunicativa
pblica
Onde ci rcular
o texto?
Onde ser
publicado?
Funo social
ou propsito
comunicativo
O que se pretende?
Discutir um tema?
Contar uma
histria?
Organizar
informaes?
Convencer algum
sobre algo?
Entreter/divertir?
Relao entre
participantes
da situao
comunicativa
Quem ler?
O professor?
A turma?
A comunidade
escolar?
Algum de
fora da escola?
sempre no professor.
O papel de quem escreve depende do objetivo e do gnero
do texto. Se o objetivo do texto, por exemplo, for discutir um
tema polmico, espera-se que o redator argumente de forma
convincente e persuasiva. Para tanto, poder assumir a primeira pessoa (do singular ou do plural) ou esconder-se por detrs
da pretensa neutralidade, expressa pela terceira pessoa do
Por se tratar de propsito comunicativo destinado a manifestar opinio, configurando-se, assim, em funo utilitria, a
construo da argumentao tambm pode se basear em proce
dimentos que elogiem a presidente pelo fato de ser a primeira
mulher a galgar esse posto, alm de sensibiliz-la para que aceite os argumentos apresentados, o que tem a ver com a funo
es t tica que tambm compe o propsi to com unica tivo da carta.
O assunto sobre o qual o texto ser produzido a matria-priina. Quanto mais o produtor do texto conhece o assunto, mais
Natureza
d a informao
ou contedo
Qual o assunto
do texto?
Registro
lingustico em
uso na situao
interlocutiva
Com qual
registro deve
ser construdo
o texto?
Critrios de
correo
Como a produo
textual ser
corrigida?
Que tamanho
o texto deve
apresentar?
Se os alunos tiverem acesso aos critrios de avaliao adotados pelo professor, eles podero canalizar suas energias produtivamente. Tais critrios esto diretamente relacionados aos
elemen tos anteriores e variam de proposta para proposta, podendo variar, tambm, conforme o gnero de texto solicitado.
Estabelecidos com bastante clareza pelo professor, devem servir
como norteadores tanto para ele prprio como para o aluno.
Observ2-los papel do professor que deseja criar um clima favorvel de trabalho, compatvel com a natureza complexa da
tarefa de escrever.
Em funo dos elementos anteriores esti a extenso do
texto. Aqui entra a questo relacionada ao equilbrio quantidade/
qualidade. Nem sempre escrever muito resulta em bom texto. A
definio de um dado nmero de linhas pode estar relacionada
aos objetivos e ao tempo disponvel.
Exemplificando ainda com base no exemplo do Vestibular
da PUC-SP, alm de haver novamente instruo sobre o nome a
ser adotado pelo candidato - "Use um pseudnimo para assinar
sua carta" -, constava o seguinte: "Seu trabalho ser avaliado
de acordo com os seguintes critrios: esprito crtico, clareza e
coerncia compatveis com o gnero textual solicit:ado e com a
situao comunicativa."
Obviamente o que se espera que o texto apresente a estrutura e os elementos composicionais tpicos do gnero carta
formal, alm da relevncia do que o candidato eleg:e para apontar como prioridade no governo Dilma.
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