A Epistemologia de Weber
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A Epistemologia de Weber
SOCIOLOGIA
301114 SOCIOLOGIA DAS ORGANIZAES
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Artigos e Textos Selecionados
UFS - CCSA-DAD
Prof MSc. Vera L. N. Provinciali
Mestre em Sociologia Organizacional pela ISU/USA . Professora Adjunto do Departamento de Administrao/UFS
(Unid. 2)
A EPISTEMOLOGIA WEBERIANA
A epistemologia weberiana pode ser compreendida como resultando da articulao de duas premissas
com uma afirmao aparentemente antittica. As premissas so: 1) o conhecimento s possvel a partir
da referncia a valores e interesses; 2) valores e interesses no podem ser validados ou hierarquizados
segundo critrios objetivos. A afirmao a seguinte: possvel alcanar um conhecimento objetivo,
universalmente vlido, cientfico, no sentido mais forte da palavra.
A questo, ento, entender como possvel para Weber, partindo das duas premissas indicadas,
chegar a essa ltima afirmao. Talvez a melhor estratgia seja considerar, inicialmente, as prprias
premissas.
O que est sendo chamado aqui de premissas da epistemologia weberiana, so, na verdade, as duas
perspectivas bsicas que definem a concepo de Weber no que se refere relao entre
conhecimento, realidade e valores. Seguindo uma orientao claramente neokantiana, Weber assume,
de forma radical e com todas as implicaes da decorrentes, o postulado da existncia de uma
separao clara entre os planos do conhecimento e da realidade, cuja transposio sempre parcial,
provisria e, sobretudo, mediada por uma srie de categorias e construes conceituais definidas
conforme os valores e interesses de quem busca o conhecimento.
A realidade entendida como algo infinito, que pode ser apreendido a partir de inmeros ngulos, mas
jamais na sua totalidade ou essncia. A conhecimento seria sempre fruto de um recorte particular, da
seleo de um conjunto especfico de problemas e de fenmenos. Essa seleo ou recorte particular
seria, necessariamente, feita a partir das referncias pessoais dos sujeitos cognoscentes. Weber nega,
assim, a possibilidade de um conhecimento absoluto, livre de quaisquer pressupostos, capaz de definir
de modo completamente neutro qual a verdade absoluta das coisas. No existiria, segundo ele, um
ponto privilegiado a partir do qual o investigador pudesse atingir uma viso isenta e global da realidade.
Ao contrrio, todo e qualquer conhecimento estaria referido a valores e interesses subjetivos . Seriam a
partir dessas referncias que os sujeitos atribuiriam relevncia e selecionariam, dentro da realidade
infinita, os problemas e objetos que, do seu ponto de vista, mereceriam ser investigados.
A primeira premissa do modelo epistemolgico weberiano , portanto, a do carter inexorvel da
referncia do conhecimento a valores e interesses. No existiriam problemas ou objetos que seriam
intrinsicamente relevantes para o conhecimento humano. De uma forma ou de outra, o sujeito
cognoscente sempre partiria de um conjunto especfico de referncias e pressupostos culturalmente
definidos. uma questo secundria, o fato de que se trate de um sistema tico, de um conjunto de
postulados metafsicos, de um modelo terico ou de um conjunto de crenas e interesses religiosos ou
econmicos. Em todos esses casos, a situao seria, basicamente, a mesma. Tratar-se-ia de conjuntos
de perspectivas ou referenciais subjetivos que orientariam os investigadores nas atividades do
conhecimento.
A segunda premissa fundamental seria a de que essas referncias no poderiam jamais ser validadas e
nem mesmo hierarquizadas segundo critrios que pudessem ser chamados de objetivos. A adeso a
determinados valores ou a uma viso de mundo especfica seria, em ltima instncia, uma questo de f
( Weber, 1993 ). No existiriam parmetros objetivos a partir dos quais se pudesse decidir sobre o
melhor valor ou a viso de mundo mais verdadeira. A adeso a qualquer desses pontos de vista seria
sempre dependente de uma convico pessoal, subjetiva. Todos os valores, as vises de mundo, os
sistemas metafsicos, as normas e princpios ticos que conduzem os homens em seus assuntos
prticos e que so referncias do conhecimento seriam incomensurveis e teriam, em princpio, que ser
tomados como equivalentes.
A associao entre essas duas premissas, ou seja, o reconhecimento de que as referncias valorativas
so inevitveis e de que no possvel selecion-las segundo critrios objetivos, poderia ter conduzido
Weber a uma postura ctica e relativista. Partindo dessas premissas, a concluso aparentemente mais
lgica seria a que afirmasse que no possvel um conhecimento objetivamente vlido da realidade,
sobretudo, no que se refere aos fenmenos culturais. A concluso de Weber, no entanto, exatamente a
contrria. A objetividade do conhecimento possvel, inclusive, nas Cincias da Cultura.
importante lembrar que dentro do contexto intelectual alemo do final do sculo passado, no qual
Weber se inseria, existiam pelo menos duas respostas disponveis questo da validao do
conhecimento das Cincias da Cultura. Ambas, no entanto, foram rejeitadas por Weber. Dilthey, em
linhas gerais, acreditava que o conhecimento dos fenmenos culturais se fundamentava na estratgia da
compreenso introspectiva, mtodo pretensamente capaz de resgatar o mundo tal como subjetivamente
vivido pelos indivduos. A possibilidade desse resgate estaria, em princpio, garantida pela identidade
humana e histrica que une, nas Cincias da Cultura, o sujeito e o objeto. Como sujeito humano o
observador poderia compreender de modo relativamente fcil outros universos humanos. Weber rejeita a
soluo de Dilthey, fundamentalmente, argumentando que o acesso a esse universo subjetivo no nem
direto, nem completo e nem imparcial. Tratar-se-ia, alm disso, de um mtodo de difcil controle
intersubjetivo, que como tal no poderia ser posto como garantia de objetividade.
A outra soluo para o problema da validade do conhecimento presente no contexto intelectual de Weber
era sustentada principalmente por Rickert e Windelband. Para estes, existiriam certos valores universais
e necessrios, supostamente compartilhados pela humanidade e pelo cientista, que orientariam, de
modo unvoco, o trabalho de seleo dos problemas e objetos nas Cincias da Cultura. A observao
desses valores universais seria a garantia da relevncia e pertinncia do conhecimento produzido. Como
observa Saint-Pierre a relao com os valores seria, particularmente para Rickert, no apenas um
princpio de seleo do material de estudo, mas, e principalmente, constitua o fundamento da validade
do conhecimento histrico-social ( 1994, pg. 24 ). Weber rechaa esse alternativa acentuando,
sobretudo, o fato de que os valores no so universais, mas, ao contrrio, mltiplos e contraditrios. No
existiria um sistema de valores privilegiado, fundado numa base transcendental, com relao ao qual as
Cincias da Cultura pudessem se orientar, mas, apenas, o eterno confronto histrico entre diversos
valores inconciliveis.
Em contraposio a essas duas alternativas, Weber busca uma soluo para o problema da objetividade
do conhecimento que, como observa Saint-Pierre, se situa no plano metodolgico. O conhecimento
objetivo possvel desde que os sujeitos cognoscentes se comprometam a observar certas regras
prprias atividade cientfica. A objetividade no seria alcanada pela extirpao de toda e qualquer
referncia a valores e pela busca de um olhar imparcial, como talvez sonhassem os positivistas. Weber
se mantm fiel a sua primeira premissa. Tambm no seria obtida por meio da hierarquizao das vrias
referncias e da escolha, entre essas, daquela mais verdadeira - talvez, algum sistema terico ou
metafsico ou, ainda, um conjunto de valores superiores, como queria Rickert - a partir do qual se
pudesse proceder a uma abordagem unvoca da realidade. Weber, tambm, no abandona a sua
segunda premissa; no possvel selecionar segundo critrios cientificamente vlidos qual a referncia
melhor ou mais verdadeira.
A objetividade do conhecimento possvel, no entanto, desde que, em primeiro lugar, sejam claramente
separadas as esferas do conhecimento emprico e da ao prtica, particularmente, a de natureza
poltica ou religiosa. Weber se dedica exaustivamente ( Por ex.: 1982 e 1993 ) ao estabelecimento de
uma delimitao clara entre essas duas esferas. Os objetivos que a cincia deve se colocar e que ela
capaz de alcanar so radicalmente distintos dos que cabem, por exemplo, poltica. Embora se sirva
da relao com valores para selecionar seus objetos e ngulos de investigao, a cincia no deve,
como tal, fazer julgamentos de valor. Ela deve se restringir a fazer julgamentos cientficos sobre a
realidade tal como esta empricamente, no sobre como ela supostamene deveria ser. At mesmo
porque a cincia no capaz de fazer julgamentos objetivos sobre valores, sobre como as coisas devem
ser. Esses julgamentos so necessariamente subjetivos.
O primeiro passo para se garantir a objetividade do conhecimento cientfico , portanto, separar
claramente julgamentos de valor e julgamentos de fato e excluir os primeiros do mbito da cincia. Essa,
de certa forma, uma atitude que depende de uma deciso individual dos pesquisadores, mas que, para
Weber ( 1993 ), poderia ser incentivada e cobrada pelas associaes e revistas cientficas. importante
observar que a objetividade do conhecimento possvel, na perspectiva weberiana, na medida exata em
que os cientistas estejam deliberadamente dispostos a se comprometer com a busca dessa objetividade.
Esse compromisso tem como eixo principal a renncia aos julgamentos de valor, mas algo mais amplo.
Weber espera, na verdade, que o cientista esteja disposto a se curvar frente ao imperativo das
proposies empricas, factuais, que no se apegue s suas referncias tericas e filosficas de modo
dogmtico, que esteja aberto ao dilogo e crtica e que saiba correr o risco constante da refutao
emprica de suas idias.
Uma maneira interessante de se interpretar a concepo weberiana do conhecimento cientfico
recorrendo separao entre Contexto da Descoberta e Contexto da validao . Weber sabe que o
interesse pelo conhecimento e a seleo do problema, do objeto e do ngulo especfico das
investigaes so definidos necessariamente atravs de uma relao com valores subjetivos essa ,
justamente, uma de suas premissas. Essa relao com valores no alcanaria, no entanto, o plano da
verificao emprica das hipteses. Uma vez proposto, o conhecimento poderia e deveria ser julgado,
objetivamente, do ponto de vista de sua lgica interna e validade emprica. A relao com os valores
dominaria apenas o Contexto da Descoberta. O Contexto da Validao deveria ser consciente e
deliberadamente liberto das influncias subjetivas . Neste contexto deveria imperar o esprito crtico e
antidogmtico. Os resultados do conhecimento, para serem considerados cientificamente vlidos, teriam
que se submeter ao controle intersubjetivo e ser universalmente aceitos.
Weber nos fala, portanto, particularmente, no caso das Cincias da Cultura, de duas dimenses claras
do trabalho cientfico. Uma primeira dimenso, em que nenhuma forma de controle possvel. As
referncias subjetivas que orientam o conhecimento so mltiplas, inconciliveis e no so passveis de
nenhum tipo de julgamento ou hierarquizao segundo critrios objetivos. Partindo de referncias
variadas, os sujeitos selecionariam problemas e objetos e construiriam conceitos e hipteses. Uma vez
formuladas as hipteses, passaria-se para a segunda dimenso, na qual imperaria o controle
intersubjetivo, tendo na validao emprica seu critrio fundamental.
Do ponto de vista deste artigo, o que mais importante sublinhar o compromisso de Weber com a
busca da objetividade nas Cincias Sociais. Toda sua reflexo epistemolgica est voltada para a
construo de uma estratgia capaz de conciliar a referncia a valores mltiplos e contraditrios com a
conquista da objetividade. Sua afirmao de que a Cincia Social que ele pretende praticar uma
cincia da realidade s pode ser entendida luz desse compromisso.
bem sucedida quando feita a partir do conhecimento de regularidades empricas. Somente a partir do
conhecimento do que o comportamento provvel em cada tipo de situao que possvel ao cientista
analisar o caso concreto e definir as causas provveis.
A solidariedade entre Sociologia e Histria, de que nos fala Aron ( 1990, pg. 482 ), estaria baseada
nessa dependncia mtua entre o conhecimento do geral e do particular nas Cincias Sociais. A
sociologia estaria voltada para a formulao das regras gerais dos acontecimentos. A histria
interessaria-se pela anlise e imputao causal de aes, formaes e personalidades individuais
culturalmente importantes ( Weber, 1991, pg. 12). Uma, no entanto, dependeria imensamente da outra.
A compreenso dos eventos historicamente circunscritos s poderia ser feita por meio do conhecimento
das regularidades sociologicamente definidas e essas s poderiam ser sustentadas atravs da
demonstrao de sua validade em situaes historicamente definidas.
fundamental perceber que o projeto weberiano para as Cincias Sociais a includas a Sociologia e a
Histria - supe muito mais do que a simples coleta e descrio de dados definidos em sua singularidade
emprica. Sem dvida, na medida mesmo em que se afasta das definies fixas dos fenmenos sociais,
Weber se aproxima das manifestaes sociais concretas, marcadas por um contexto histrico e cultural
singular. Essa aproximao, no entanto, mediada por todo um instrumental analtico que transforma os
fenmenos concretos em objetos cientficos. Os fenmenos empricos so recortados conceitualmente.
Seus elementos e conexes internas so comparados com formas tpicas construdas artificialmente pelo
observador. So avaliadas as vrias causas possveis que explicariam sua configurao atual e atribudo
um peso relativo a cada uma delas.
Uma das preocupaes de Weber foi, justamente, com a formulao de certos instrumentos
metodolgicos que permitissem que o cientista investigasse os fenmenos particulares sem se perder na
infinidade disforme dos seus aspectos concretos. O principal desses instrumentos o tipo ideal. Os tipos
ideais cumpririam duas funes principais: selecionar explicitamente a dimenso do objeto que ser
analisada e apresentar essa dimenso de uma forma pura, despida de suas nuanas concretas. Nas
palavras de Weber, a construo de tipos permitiria operar uma espcie de abstrao que converteria a
realidade em objeto categorialmente construdo ( 1993-b, pg. 203 ). Os tipos seriam elaborados
mediante acentuao mental de determinados elementos da realidade( 1993, pg.137) considerados,
do ponto de vista do investigador, relevantes para a pesquisa. O cientista social criaria definies
exageradas, unilaterais, das dimenses da realidade que pretendesse conhecer. Essas definies
poderiam ento ser utilizadas, num segundo momento, para uma espcie de comparao com o mundo
real. Elas auxiliariam no trabalho de compreenso e de imputao causal realizado pela Sociologia e
pela Histria. Cada aspecto concreto da realidade emprica poderia ser compreendido em funo da sua
maior ou menor distncia em relao definio tpico ideal.
O tipo ideal mais importante da Sociologia weberiana o de ao racional com referencia a fins . Este
tipo de ao se caracterizaria pelo fato do ator escolher de modo ponderado seus fins, considerando as
conseqncias previsveis, e por adequar do modo que lhe parece mais eficaz, dadas as condies, os
meios aos fins. Seria um tipo de ao social no qual o sujeito agiria desapegado de vnculos afetivos ou
tradicionais. O que prevaleceria seria a anlise objetiva da eficincia e da eficcia, dos custos e
benefcios de cada alternativa. A ao racional com referncia a valores possuiria, basicamente, as
mesmas caractersticas. A diferena que os fins da ao, neste caso, seriam perseguidos de modo
absoluto, independentemente das conseqncias previsveis que possam estar associadas a eles. A
idia de Weber de que a ao racional, nas suas duas modalidades, seria a forma mais previsvel,
compreensvel, de comportamento humano. Quando desapegados de suas tradies e afetos, os
homens agiriam diante das situaes de modo muito regular. Suas ponderaes sobre os custos e
benefcios de cada alternativa de ao so feitas segundo regras que seriam mais ou menos universais
de raciocnio. Suas decises, ou seja, os cursos efetivos da ao seriam, portanto, muito regulares.
Seria, justamente, essa previsibilidade ou compreensividade mxima que faria com que o tipo ideal de
ao racional desempenhasse o papel de um recurso metodolgico to central na Sociologia weberiana .
Os fenmenos poderiam, num primeiro momento, ser interpretados como baseados em aes racionais.
Essa interpretao seria, num segundo momento, comparada com a realidade concreta. Os
comportamentos divergentes seriam compreendidos como desvios, afetivos ou tradicionais, em relao
s aes racionais previstas.
Servindo-se de tipos que recriam, de modo acentuado, vrios aspectos da realidade emprica e valendose do conhecimento de certas regularidades da ao humana - associadas, principalmente, ao seu
carter racional - Weber pode construir, para cada situao social analisada, um quadro das
elementos. Apenas essas seriam tarefas de uma Cincia Social da realidade, no sentido weberiano. a
isso que ele chama de ordenao conceitual da realidade. Qualquer objetivo alm desse seria visto
como inadequado a uma cincia emprica e prprio metafsica ou filosofia social.
igualmente individual que a precede ( pg. 125 ). No caso das Cincias da Cultura, o interesse pela
dimenso individual do fenmeno, incluindo sua significao histrica, seria ainda mais central. Assim,
Weber afirma que mesmo que fosse estabelecida uma imensa casustica de conceitos e regras com a
validade rigorosa de leis ( pag. 126 ), isso constituiria apenas um primeiro passo do conhecimento. O
passo seguinte e, talvez, mais importante, seria a anlise da vigncia dessas leis em casos concretos e
historicamente individualizados.
Este segundo argumento, na verdade, no implica uma rejeio do estabelecimento de referenciais
tericos abrangentes e mesmo unificados nas Cincias Sociais. Ele apenas delimita o papel que poderia
ser desempenhado por esses referenciais. Eles poderiam ser instrumentos utilizados na interpretao
dos fenmenos concretos. No seriam capazes, no entanto, de substituir ou de tornar dispensvel a
anlise emprica dos prprios fenmenos .
O terceiro argumento utilizado por Weber para restringir a importncia dos pressupostos tericos mais
gerais nas Cincias da Cultura na verdade um complemento do argumento anterior. Os objetos das
Cincias Sociais seriam definidos pelo atributo de possurem uma significao cultural, de estarem
relacionados com idias de valor de sujeitos concretos. Como tais, esses objetos teriam, logicamente,
que ser tomados como construes histricas individualizadas. A compreenso dessas construes
particulares e a explicao de suas causas no poderia ser feita a despeito ou em contradio com o seu
carter individual. A proeminncia teria que ser dada ao objeto concreto, com sua significao cultural e
origem histrica especfica. Nos termos de Weber, quando se trata da individualidade de um fenmeno,
o problema da causalidade no incide sobre as leis, mas sobre conexes causais concretas; no se trata
de saber a que frmula se deve subordinar o fenmeno a ttulo de exemplar, mas sim, a que constelao
deve ser imputado como resultado. ( pg. 129 ). Os referenciais tericos gerais ou o conhecimento das
leis da causalidade seriam, assim, apenas um instrumento a ser utilizado no trabalho de imputao
causal. Weber observa ainda que quanto mais gerais, isto , abstratas so as leis, menos contribuem
para as necessidades da imputao causal dos fenmenos ( pg. 129), justamente, por se afastarem
demasiadamente de sua realidade concreta.
Esses trs argumentos juntos compem o essencial da concepo weberiana relativa ao lugar que deve
ser reservado aos pressupostos tericos ou metafsicos nas Cincias Sociais. Na verdade, esse lugar
seria bastante restrito. Esses pressupostos poderiam, no mximo mesmo assim, na medida em que
no fossem abstratos demais auxiliar o socilogo ou o historiador no trabalho prvio de formulao dos
problemas e desenvolvimento inicial das hipteses. De certa forma, essas filosofias sociais so vistas
como sendo apenas um componente a mais do conjunto de vises de mundo, valores e convices
pessoais que constituem as referncias do investigador .
Essas ponderaes de Weber no implicam, no entanto, uma renncia possibilidade do conhecimento
geral nas Cincias Sociais. Como j foi dito nas sees anteriores, Weber acredita na possibilidade e na
relevncia do estabelecimento de regularidades nessas cincias. O conhecimento nomolgico, no
sentido weberiano, , no entanto, algo completamente distinto do que aqui se est chamando de
pressupostos tericos e filosficos gerais. Quando Weber fala da importncia do conhecimento
nomolgico nas Cincias Sociais, refere-se especificamente a conexes regulares entre elementos
tpicos da realidade emprica, nada a mais do que isso. Essas conexes podem ter um carter mais ou
menos abstrato conforme o pesquisador que as formule se oriente numa perspectiva mais sociolgica ou
histrica. De qualquer forma, seriam reconstrues tipificadas puras e exageradas - de aspectos
presentes na realidade concreta
O que Weber exclui do campo das Cincias Sociais, ou pelo menos relega a uma posio bastante
marginal, todo tipo de teorizao que se refira a dimenses, processos ou mecanismos sociais
puramente abstratos, que no possam ser traduzidos em termos de conjuntos tpicos ou concretos de
aes. No existiria espao na Sociologia weberiana para o desenvolvimento de conceitos ou sistemas
de teorias que tenham como objeto dimenses no diretamente empricas dos fenmenos sociais.
Assim, num plano macrossociolgico, Weber, certamente, desestimularia qualquer esforo no sentido de
estabelecer um conhecimento geral e abstrato, vlido para qualquer configurao histrico-social, sobre
a natureza dos sistemas sociais e de seus mecanismos internos de equilbrio ou mudana. Ao contrrio,
ele est interessado em compreender como em diferentes situaes histricas, passveis de serem
tipificadas, os homens orientaram suas aes de um modo que tornou possvel o estabelecimento de
relaes sociais mais ou menos estveis. Da mesma forma, no plano microssociolgico, Weber, sem
dvida, no apoiaria iniciativas no sentido de estabelecer os mecanismos gerais subjacentes aos
processos de interao social. No lhe interessariam teorias abstratas sobre a universo subjetivo ou
sobre os processos inconscientes envolvidos nas interaes. Restringiria-se a compreender, no caso real
ou em termos tpicos, o sentido visado pelos atores e as conseqncias intencionais ou no de suas
aes.
O ponto fundamental o compromisso de Weber com o plano da ao social: tudo o que se encontra
num plano analtico subjacente ou transcendente em relao ao da ao seria excludo do campo
especfico das Cincias Sociais e reservado ao mbito filosfico. A nica dimenso dos fenmenos
sociais que Weber reconhece como efetivamente real a das aes. Qualquer dimenso desses
fenmenos que no possa ser traduzida em termos de aes afastada do campo cientfico. Definir a
cincia social como uma cincia da realidade significa, portanto, para Weber, o mesmo que defini-la
como uma cincia da ao social. claro que Weber no est pensando em aes isoladas. Partindo da
ao social como unidade elementar, Weber ( 1991 ) reconstroi conceitualmente todo o emaranhado de
relaes sociais em que cada ao encontra-se, possivelmente, envolvida. Parsons ( 1968, pg. 653 )
observa que Weber produz um esquema geral dos tipos objetivamente possveis de estrutura social.
So tipificadas as vrias formas, mais ou menos estveis, de relao social e definidos os modos tpicos
de orientao das aes nessas relaes.
O conceito fundamental, de qualquer forma, o de ao social. Esse conceito marca a especificidade, a
fora, mas, tambm, os limites da perspectiva weberiana. Weber se limita a perguntar como, com que
sentido e com quais conseqncias os sujeitos agem nas situaes histricas concretas, em mdia e no
caso tpico. Essas seriam as nicas questes pertinentes no mbito de uma Cincia Social da
realidade.
Ficam excludas questes centrais da teoria social. A maior delas talvez seja a da determinao do
sentido da ao individual. O que faz com que um agente imprima determinada direo a sua ao?
Como so selecionados os fins das aes? Como os agentes decidem entre cursos alternativos de
ao? O que faz com que diante de uma mesma situao alguns ajam do modo racionalmente mais
previsvel, enquanto outros se desviam e se orientam segundo os mais diversos principios normativos?
Qual o espao de autonomia do sujeito, frente s situaes sociais, na definio do sentido de sua ao?
Weber se recusa a responder questes formuladas nesse nvel de abstrao. Os problemas levantados
por elas s so tratados na medida em que puderem ser traduzidos para o plano da anlise concreta das
aes sociais. Weber no pretende formular uma teoria abstrata da relao entre agentes e situaes,
sujeitos e estruturas. A questo do grau em que a orientao da ao determinada pelas
caractersticas objetivas da situao no colocada. Weber parte de agentes concretos, perseguindo
fins estabelecidos em situaes histricamente dadas. No est disposto a produzir uma teoria geral
sobre os fundamentos da ordem social.
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