Criminologia e Feminismo Um Casamento Necessário PDF
Criminologia e Feminismo Um Casamento Necessário PDF
Criminologia e Feminismo Um Casamento Necessário PDF
PIMENTEL, Elaine.
Mestra em Sociologia
elainepimentelcosta@yahoo.com.br
Resumo
Sem a pretenso de estabelecer uma etiologia do crime feminino ou do crime praticado contra
mulheres, propomos um olhar sobre o lugar que a mulher ocupa em prticas delituosas. Na esteira do
pensamento feminista contemporneo, questionamos a lacuna de estudos sociolgicos sobre a relao
entre crime e gnero, sobretudo quando observamos a disparidade entre a freqncia de delitos
praticados por mulheres e por homens, o que aponta para a necessidade de pesquisas empricas no
campo da Sociologia.
2 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
1. Apresentando o tema
A criminalidade contempornea tem como uma de suas principais marcas a complexidade de
motivaes e circunstncias que levam os sujeitos ao cometimento de delitos. Por isso mesmo, a prpria
noo de criminalidade se impe como um problema metodolgico, revelando a necessidade de
determinados recortes que permitam a anlise de aspectos especficos das condutas desviantes
caracterizadas como crime. Criminalidade urbana, criminalidade juvenil, crimes de colarinho branco,
criminalidade domstica (contra idosos, crianas e mulheres) e criminalidade feminina so alguns exemplos
desses recortes, que devem ser estudados luz de tendncias tericas voltadas tanto para os aspectos
estruturais quanto para as dimenses subjetivas que fazem do crime um fenmeno plural.
Muito embora o crime possua uma definio jurdico-normativa muito clara fato tpico e
antijurdico, que tem a culpabilidade como pressuposto de aplicao de pena, de acordo com a teoria
finalista do direito penal do ponto de vista sociolgico trata-se de fenmeno mais amplo, englobando
inclusive comportamentos desviantes que no se enquadram na definio apresentada pelo direito, a
exemplo de delitos cometidos por crianas e adolescentes que, no Brasil, so denominados atos
infracionais. Esse preciosismo lgico da ordem jurdica tanto esconde a amplitude de um conceito
sociolgico de crime como no revela o lugar que o crime ocupa na dinmica das relaes sociais
cotidianas. Tratar de crime e criminalidade, portanto, significa no somente estar atento s definies
oferecidas pelo Estado atravs da legislao que mesmo tentando abranger todas as formas de violao a
bens jurdicos ainda possui lacunas resultantes das constantes transformaes sociais , mas considerar
uma gama de comportamentos desviantes que esto para alm da definio legal e que contracenam com
outras dimenses da sociabilidade humana. Isso demonstra que o crime tem uma importante dimenso
poltica concretizada atravs das normas jurdicas , porm antecedida por uma inegvel dimenso social.
Atentando para o carter complexo dos estudos sobre as diversas expresses de criminalidade,
bem como para a impossibilidade de se pensar o crime a partir de uma teoria geral de carter universal,
este texto tem por objetivo apresentar algumas reflexes acerca das mulheres como protagonistas de
determinadas formas de criminalidade, seja como autoras ou como vtimas de delitos. Sem a pretenso de
estabelecer uma etiologia do crime feminino ou do crime praticado contra mulheres, as reflexes aqui
levadas a efeito propem um olhar sobre o lugar que a mulher ocupa em prticas delituosas, bem como
uma anlise do reflexo das sombras do patriarcado, ainda fortemente presente nas relaes de gnero.
Por outro lado, essa problemtica ecoa em conflitos metodolgicos que se estabelecem entre a
criminologia e o pensamento feminista. Juntos, esses dois campos do saber compem uma dimenso da
3 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
realidade social ainda pouco explorada pelas cincias sociais, seja terica ou empiricamente. Embora a
criminologia tenha surgido como uma esfera de estudos do direito penal, entendemos que hoje ela ocupa
um cenrio mais amplo de perspectivas e debates, abrindo franco dilogo com as cincias humanas e
sociais, como a psicologia, a psicanlise e a sociologia, sendo esta ltima central para o enfoque que
pretendemos dar ao tema.
Ao final, apresentaremos notas conclusivas que, sem a pretenso de apontar solues para os
impasses apresentados, buscam indicar quais os principais desafios para a criminologia diante das novas
demandas oriundas das transformaes no campo dos estudos feministas.
O crime, em Durkheim, definido como uma transgresso norma que, por sua vez, fruto de
um consenso da sociedade, cujo fundamento se encontra nas idias de solidariedade mecnica e orgnica.
Enquanto a solidariedade mecnica enseja um alto grau de semelhana entre os indivduos, de forma que a
personalidade individual absorvida na personalidade coletiva, a orgnica implica que eles diferem uns dos
outros, tendo esferas de ao prprias, diretamente relacionadas com a sua personalidade (DURKHEIM,
1999: 108).
A diferenciao feita por Durkheim sobre esses dois tipos de solidariedade estabelece uma
importante distino entre os vnculos que criam as leis penais e aqueles que abrem espao para a
formao de normas civis. Por demandar um nvel menor de diferenciao entre os indivduos, na
solidariedade mecnica que se fundamentam as normas definidoras de crime, que renem os valores
morais elevados categoria de jurdicos pela fora da conscincia coletiva. Assim, na perspectiva
durkheimiana, crime tudo aquilo que os indivduos coletivamente definem como ofensa aos sentimentos
coletivos, estabelecendo as respectivas penalidades.
No entanto, no contexto da discusso sobre o crime, o que imprime certo destaque na obra de
Durkheim a distino entre fenmenos normais e patolgicos, acompanhada da afirmao de que o crime
um fato social normal. O ponto de partida de Durkheim a tentativa de demonstrar a fragilidade da
afirmao de que os estados de morbidez social so necessariamente patolgicos. Para tanto, destaca o
4 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
fato de que o crime existe em todas as sociedades, desde as mais simples at aquelas que alcanaram
certo grau de complexidade (DURKHEIM, 2003a: .82). Em outras palavras, no existe sociedade sem
comportamentos desviantes. Mesmo sendo distintos os atos qualificados como crimes o que estabelece
considerveis diferenas entre as diversas ordens jurdicas em tempo e espao sempre existiram
indivduos que realizam condutas desviantes e foram submetidos represso penal. Ainda que a sociedade
seja composta por laos de solidariedade que resultam de sentimentos comuns, preciso reconhecer e
Durkheim o faz que nem todos os membros da coletividade compartilham dos mesmos sentimentos.
Assim, natural que existam condutas desviantes que podem permanecer na esfera das normas morais ou
podem coincidir com as normas penais.
A partir da constatao de que o crime algo que faz parte da prpria vida coletiva, Durkheim
afirma a sua normalidade e vai alm: entende o crime como algo inevitvel, um fator da sade pblica, uma
parte integrante de qualquer sociedade s (DURKHEIM, 2003a: 83). Essa idia leva Durkheim a defender
que o crime, alm de normal, necessrio e til vida social, pois se torna indispensvel para a evoluo
da moral e do direito ao conferir certa maleabilidade aos sentimentos coletivos, permitindo, inclusive, a
mudana social. No se trata, de fato, de uma espcie de apologia ao crime ou ao comportamento
desviante, mas, sim, da constatao de que, no contexto da dinmica das sociedades, o crime tem um
papel especfico de colaborar com o fortalecimento de laos de solidariedade mecnica, neste caso e,
portanto, reafirmar o carter coletivo das prticas sociais.
No entanto, possvel pensar, a partir dos conceitos durkheimianos em especial com a idia
de solidariedade mecnica e orgnica , outras dimenses da vida social que foram constitudas a partir dos
sentimentos coletivos e que, mesmo no sendo elevados categoria de normas de direito, ganham um
sentido de normalidade, assim como o crime, pois compem as prticas sociais cotidianas, embora com
fora normativa de bases morais e no jurdicas. Nesse sentido, apesar de no haver na obra de Durkheim
qualquer discusso expressa a respeito das questes de gnero o que, de fato, no era seu objetivo ,
pensamos a construo social das diferenas entre mulheres e homens como resultado do peso dos
sentimentos sociais que forjaram as sociedades patriarcais e todas as suas conseqncias de ordem
prtica, a exemplo da opresso, da dominao e da violncia.
5 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
preciso reconhecer que os caminhos abertos por Durkheim nos estudos sobre o crime foram
de extrema importncia para a Criminologia e, em especial, para os delineamentos de uma sociologia
criminal. Depois dele outras perspectivas surgiram, dando maior autonomia ao indivduo diante da
coletividade, com amparo, inclusive, em teorias notadamente subjetivistas, como a prpria psicanlise. No
entanto, essas perspectivas no deixam de dialogar com algumas chaves conceituais durkheimianas que
ainda iluminam a reflexo criminolgica contempornea. No prximo tpico trataremos da relao entre a
criminologia e o feminismo, tendo como base terico-analtica as reflexes aqui apresentadas.
3. A criminologia e o feminismo
Um primeiro aspecto que deve ser levado em conta quando analisamos a relao entre a
criminologia e o feminismo diz respeito pluralidade de concepes e perspectivas que compem cada um
desses campos de estudo, tendo em vista, sobretudo, a inevitvel historicidade desses movimentos tericos
que acompanharam as transformaes sociais mais marcantes do sculo XX. Estamos diante, portanto, de
vrias tendncias criminolgicas e de vrias perspectivas feministas.
A criminologia, originariamente, surge como cincia marcada por forte influncia positivista,
expressada principalmente atravs dos estudos de Lombroso, que no sculo XIX enfatiza o carter
naturalstico do cometimento de crimes, atravs de um reducionismo psicolgico e biolgico que aponta
para a idia de criminoso atvico, cujas caractersticas fenotpicas fazem dele um criminoso nato. J na
transio do sculo XIX para o sculo XX surgem os primeiros estudos sobre a conduta feminina desviante,
com duas fortes tendncias: uma criminologia prtica e estudos tericos, que ainda encontram em
Lombroso e Ferrero o suporte para engendrar pesquisas dessa natureza (Heidensohn, 2002: 492).
6 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
Entendemos que a negao das peculiaridades das diferenas de gnero, cujo principal efeito
consiste na sedimentao de profundas desigualdades entre mulheres e homens construdas
historicamente por fora dos vnculos sociais de solidariedade, consiste em grave ameaa compreenso
da dinmica da prpria criminalidade e tende a agravar a lacuna de estudos sobre o crime feminino. Assim,
torna-se necessrio um corte epistemolgico especfico quando lidamos com crimes que envolvem
mulheres, sob pena de ofuscarmos os aspectos ideolgicos mais amplos que concorrem para o
cometimento de um determinado tipo de delito ou, at mesmo, para a forma como esse crime praticado.
Loraine Gelsthorpe (2002: 118) problematiza, por um lado, a negligncia quanto criminalidade
feminina e aponta como diagnstico o fato de que a criminologia se desenvolve como uma profisso
predominantemente masculina, onde homens estudam homens. Por outro lado, afirma que, quando a
presena da mulher lembrada na criminologia, o debate gira em torno tanto da base biolgica feminina,
quanto de uma idia acrtica de dominao sexual preocupada com esteretipos femininos, como a
passividade, o domstico e a maternidade.
Nesse sentido, tambm Brbara Soares (2002), em trabalho que teve por escopo analisar a
dinmica de um presdio feminino no Rio de Janeiro, resgata as teorias da criminalidade feminina,
ressaltando as limitaes dos primeiros estudos sobre a mulher criminosa:
certo que o grau de complexidade dos estudos criminolgicos, atualmente abertos para
dilogo com outras cincias, no pode negar aspectos biolgicos e psicolgicos como fatores de influncia
no cometimento de crimes, seja com relao a mulheres e homens adultos, ou com crianas e
adolescentes. O problema que aqui se apresenta tem delimitaes muito claras: trata-se da tendncia de se
pensar os crimes praticados por mulheres apenas pelo vis biopsquico, negando-se as dimenses
sociocultrais. Assim, ao invs de compor o quadro geral de condutas desviantes socialmente normais, no
sentido durkheimiano, o crime feminino, segundo Gelsthorpe (2002: 118), aparece tanto na teoria como na
poltica criminal como uma anormalidade, sobretudo porque no possvel simplesmente aplicar ao
feminino as teorias que pensam os comportamentos socialmente aceitos como tipicamente masculinos.
Isso demonstra porque, apesar de ganhar certa visibilidade atravs dos escritos lombrosianos
no incio do sculo XX, estudos sobre a presena da mulher no crime, seja como vtima ou como autora,
ficaram fadados ao isolamento no contexto mais amplo da criminologia, empobrecendo-a, em certa medida
(Heidensohn, 2002: 493). Estabeleceu-se, de fato, uma cultura de estudos do crime numa perspectiva
preponderantemente masculina, deixando em segundo plano os aspectos tpicos dos sujeitos femininos,
bem como as dimenses relacionais das questes de gnero.
7 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
Essa omisso resultou em uma lacuna no campo da criminologia que se s tornou visvel com a
emergncia de movimentos feministas nas dcadas de 1960 e 1970, quando a figura feminina passou a ser
projetada para a centralidade de inmeros debates cujo escopo maior era o enfrentamento das diferenas
biolgicas entre mulheres e homens e a luta pelo fim das desigualdades social e historicamente
estabelecidas a partir dessas diferenas biolgicas.
Se as lutas feministas conseguiram abrir espao para um amplo debate terico e poltico sobre
a vitimizao da mulher, seja na esfera domstica ou pblica, no surtiram o mesmo efeito e certamente
no era esse o foco dos movimentos feministas no campo dos estudos das mulheres que cometem
crimes. Assim, as teorias criminolgicas tradicionais e as tentativas de construo de teorias gerais do crime
so permeadas por grandes silncios no que diz respeito mulher autora de crimes. Mesmo os estudos
neutros de criminologia que se propem a abranger as diversas formas de crime e os mais variados
sujeitos como autores de delitos falharam nesse sentido, pois a suposta neutralidade esconde as
diferenas de gnero, raa e classe que no podem ser olvidadas em estudos criminolgicos.
A nfase nas questes de gnero, mais recentemente, levou a uma tendncia terica ainda
pouco explorada: o campo das masculinidades. Essa dimenso dos estudos de gnero ainda incipiente
diante da amplitude e profundidade dos estudos voltados para as questes femininas , tambm tem
importante papel nas anlises criminolgicas contemporneas, especialmente no que diz respeito aos
estudos sobre criminalidade juvenil, notadamente composta por pessoas do sexo masculino.
Atenta a isso, Gelsthorpe (2002: 121) ressalta a propenso de uma hegemonia masculina nos
estudos sobre o crime, dando especial ateno para os movimentos tericos feministas que tentam fugir das
teorias convencionais baseadas em aspectos patolgicos e estruturais da violncia individual e se ancoram
em explicaes de natureza scio-histricas. Em outras palavras, se os estudos de gnero com nfase na
figura feminina se amparam na histria e na cultura para explicar opresso, desigualdade e violncia nas
relaes sociais, as pesquisas sobre as masculinidades tambm seguem o mesmo caminho, buscando
reconhecer elementos socioculturais que contriburam para a hegemonia do masculino nas prticas sociais,
inclusive no crime.
Tambm nesse sentido, Heidensohn (2002: 493-494) analisa, atravs de estudos empricos
realizados nos Estados Unidos e no Reino Unido, como a afirmao de que as mulheres cometem menos
crimes que os homens se tornou uma verdade universalmente reconhecida. No entanto, entende que h
8 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
uma propenso diminuio da razo entre os crimes cometidos por mulheres e homens, principalmente
diante de varireis como idade e raa. Com aparo em Heidensohn (2002) podemos perceber um certo
movimento na dinmica do crime que aponta para a constatao de que, embora ainda hoje o crime seja
preponderantemente masculino, h uma grande demanda de estudos que busquem compreender como e
em que proporo as mulheres passam a desempenhar papis relevantes em prticas delituosas, inclusive
em crimes violentos (homicdios e seqestros, por exemplo) ou que envolvem uma ampla rede de violncia,
como o trfico de drogas.
A idia de quebra de paradigmas socio-histricos que est por trs da constatao de que h
um movimento latente nas prticas criminosas femininas, carecedor de estudos no campo da criminologia,
revela uma dimenso epistemolgica que no pode ser desconsiderada: a prpria existncia desses
paradigmas como um indicativo de que as tentativas de casamento entre a criminologia e o feminismo esto
baseadas em pressupostos universalistas notadamente modernos. Em outras palavras, preciso
reconhecer que enquanto a maior parte das feministas contemporneas que no tm como foco o debate
criminolgico feminino dialogam abertamente com as teorias ps-modernas (Judith Butler e sua obra
Problemas de Gnero emblemtica nesse sentido), as feministas voltadas para os estudos sobre crime e
gnero continuam ancoradas no modo tradicional e, portanto, moderno de lidar com a noo de verdades
universalmente aceitas, a exemplo do que fazem Loraine Gelsthorpe (2002) e Frances Heidensohn (2002).
Ao situar suas reflexes nos paradigmas herdados da modernidade sob influncia do
cartesianismo, as teorias criminolgicas feministas conservam conceitos muito importantes para a
compreenso das relaes entre gnero e criminalidade e, dessa forma, conseguem visualizar, de maneira
mais acurada, a realidade que est por trs da presena de mulheres nos crimes. Todavia, como as teorias
feministas so resultado de movimentos feministas que lutaram historicamente pelo reconhecimento poltico
da figura feminina, seja em espaos pblicos ou privados, no seria equivocado afirmar que na
experincia vivida pelas mulheres que se amparam os principais conceitos de gnero que ainda hoje
iluminam o debate feminista.
4. Concluso
Este texto teve por propsito apresentar uma discusso muito atual, embora pouco explorada
no campo dos estudos sobre o crime: a proposta de um casamento entre a criminologia e o feminismo.
9 de 10
VI CONGRESSO PORTUGUS DE SOCIOLOGIA
Tudo isso, porm, ainda ocupa pouco espao no cenrio da criminologia contempornea,
revelando como os temas de gnero, fundadores de uma teoria feminista, ainda so subteorizados. De fato,
as tentativas isoladas de dar visibilidade perspectiva feminista nos estudos de criminologia tendem a
tomar como ponto de partida a afirmao de que o gnero um princpio central de organizao da vida
social contempornea, sobrepondo-se, inclusive, a raa e classe como categorias analticas centrais.
Embora reconheamos o conceito de gnero como uma varivel fundamental para os estudos
criminolgicos, entendemos que ele no compete com as variveis raa e classe, mas soma-se a elas,
compondo um cenrio analtico mais amplo para as pesquisas sobre o crime.
As cincias sociais formam, de fato, o campo do saber que da melhor forma mapeou um slido
referencial terico voltado para a compreenso da construo histrica do gnero e seus desdobramentos
de ordem prtica: desigualdades, violaes e opresses. Alm disso, amparou todo o desenvolvimento
histrico da teoria feminista fundada na experincia. A criminologia, por sua vez, atingiu um grau elevado de
sofisticao terica e emprica, tornando-se uma cincia amplamente reconhecida, sobretudo diante dos
novos desafios que se colocam com a complexificao da criminalidade.
Os silncios que marcam os estudos criminolgicos quanto figura feminina tendem a se tornar
mais aparentes diante da diminuio das fronteiras entre o masculino e o feminino nas prticas cotidianas,
constatao essa que perpassa os principais embates tericos apresentados pelas feministas em todo o
mundo. Assim, uma unio entre a criminologia e o feminismo se faz imperiosa, j que enseja um outro
casamento, de igual importncia, entre a criminologia e as cincias sociais. Mais do que uma luta isolada,
trata-se de uma realidade que no pode mais ser ignorada.
Referncias
DURKHEIM, mile (2003a) As regras do mtodo sociolgico. So Paulo: Martin Claret.
GELSTHORPE, Loraine (2002). Feminism and criminology. The Oxford handbook of criminology, 3 ed.
Organizado por Mike Maguire, Rod Morgan e Robert Reiner, Oxford: University Press.
HEIDENSOHN, Frances (2002). Gender and crime, in The Oxford handbook of criminology, 3 ed.
Organizado por Mike Maguire, Rod Morgan e Robert Reiner, Oxford: University Press.
SOARES, Brbara Musumeci; ILGENFRITZ, Iara (2002). Prisioneiras: vida e violncia atrs das grades. Rio
de Janeiro: Garamond.
10 de 10