Arte e Ceramica Marajoara
Arte e Ceramica Marajoara
Arte e Ceramica Marajoara
A Linguagem Iconogrfica da
Cermica Marajoara
Um estudo da arte pr-histrica na Ilha de Maraj - Brasil (400-1300 AD)
Pode ser que
nas particularidades
culturais dos povos sejam
encontradas algumas das
revelaes mais
instrutivas sobre o que
ser, genericamente,
humano.
(GEERTZ, 1978:55)
Para Ni,
Gaysita,
Lucas e
Ana Paula
Agradecimentos
Muito obrigado.
ndice
Introduo ................................................................................................ 7
Captulo I
Arte Indgena e significado ................................................................ 17
Concluses do captulo...................................................................... 40
Captulo II
Registro arqueolgico e etnohistrico da Fase Marajoara................. 47
Utilizao arqueolgica do modelo analtico cacicado ................... 72
Concluses do captulo ..................................................................... 81
Captulo III
O estudo da coleo Tom Wildi ..................................................... 89
Anlise das representaes antropozoomrficas
e dos motivos decorativos ..................................................................105
Concluses do captulo ......................................................................121
Captulo IV
A linguagem iconogrfica da cermica Marajoara .............................130
Concluses do captulo.......................................................................138
Obras consultadas.......................................................................................144
Introduo
O estudo da arte nas sociedades indgenas, resultou, nos ltimos anos,
em um grande nmero de trabalhos antropolgicos extremamente importantes
para uma adequada compreenso do universo cultural nessas sociedades. As
pesquisas realizadas em campo, com a convivncia por vrios meses com as
comunidades indgenas, tm demonstrado ser, sem dvida, momentos
privilegiados para que o cientista observe os processos artesanais de maneira
integrada, uma vez que h a possibilidade de desfrutar do mesmo meio
ecolgico e social, estabelecer dilogos com informantes, participar das
atividades do grupo e, desta forma, poder apreender os aspectos simblicos e
cosmolgicos da cultura.
Ainda que a analogia etnogrfica seja importante para o trabalho do
arquelogo, o estudo da arte em sociedades indgenas arqueolgicas
desenvolve-se segundo mtodos e possibilidades bastante diversas. Os objetos
artsticos, no contexto arqueolgico, no so encontrados no momento de sua
produo e uso, mas no instante de seu descarte ou enterramento. Dessa
maneira, v-se o arquelogo na contingncia de registr-los quanto sua
posio estratigrfica e relao com os demais resduos, e descrev-los em
suas dimenses plstica e esttica, classificando-os em tipologias estilsticas.
As possibilidades de compreenso sobre as motivaes que impulsionaram o
desenvolvimento artstico em sociedades arqueolgicas ficam restritas, na
melhor das hipteses, s analogias etnogrficas, isso quando o pesquisador
no d poderes interpretativos sua prpria subjetividade. Na realidade, ele
geralmente no v possibilidades de explicao a partir do leque de teorias
cientficas a seu alcance.
Dentro desse contexto, a arte passa a fazer parte do conjunto de
fenmenos para os quais no h explicao plausvel, porque no h
regularidades, universalidades. Vemos que, apesar das manifestaes
artsticas estarem presentes em todas as sociedades humanas, em maior ou
menor grau, desde o paleoltico, estas se externam de tantas maneiras
diferentes quantos so seus autores. No so poucos os pesquisadores que
tendem, por todos esses motivos, a desprezar os objetos artsticos enquanto
fonte importante de informaes a respeito do comportamento cultural dos
povos pr-histricos. Se por um lado parece haver um desconhecimento sobre
a real amplitude do significado da arte para as sociedades indgenas, por outro
lado, a preocupao da arqueologia em construir um corpo terico enquanto
disciplina autnoma tem feito seus tericos e pesquisadores se afastarem dos
temas terico-metodolgicos mais polmicos, com cuidado de mover-se to-
somente em terreno seguro. Enquanto que a segunda preocupao
compreensvel e podemos dizer que, em certa medida, dela compartilhamos, a
primeira revela, na melhor das hipteses, descaso em relao a trabalhos
etnogrficos importantes que vm sendo desenvolvidos nos ltimos anos por
antroplogos entre sociedades indgenas contemporneas ainda no totalmente
aculturadas ou em processo de aculturao.
Estudos etnolgicos recentes (COSTA, 1987; DORTA 1981; ILLIUS, 1988;
MLLER, 1992a, 1992b; RIBEIRO, 1987b,1992; SILVA e FARIAS, 1992; VELTHEM,
1992; VIDAL e SILVA, 1995) tm demonstrado que a arte para as sociedades
indgenas tem um status totalmente diverso da arte como a conhecemos em
nossa sociedade.
Nas comunidades indgenas, a arte se expressa invariavelmente em
objetos que possuem utilidade: em utenslios, artefatos ou ainda adornos
pessoais carregados de significado para o grupo. No existe o objeto artstico
sem funo social. O arteso decora plasticamente objetos que possuiro
utilidade para o grupo e a decorao ocorre em funo dessa utilizao. Essa
relao entre arte e funo se d logicamente num contexto cultural em que
no h tambm separao entre indivduo e grupo social, entre lazer e trabalho,
entre direitos e obrigaes e, principalmente, onde no existe a propriedade
privada. A esttica do artista a esttica do grupo. Os padres estticos do
grupo, que se perpetuam pelas tradies, devem ser preservados e difundidos,
uma vez que comunicam sobre a cosmologia e mitologia do grupo, sobre sua
organizao social e sobre seu status de grupo social diferenciado em relao
ao universo das outras comunidades e seres da natureza.
Na arte dos tempos modernos, h uma individualizao da produo
artstica, ligada a conceitos de liberdade, criatividade e originalidade. Segundo
LVI-STRAUSS (1989) essa individualizao crescente no se refere figura do
criador, mas da clientela. Assim, em vez do grupo esperar que o artista produza
os objetos necessrios s atividades coletivas, o indivduo adquire o objeto
artstico segundo necessidades estticas no ligadas diretamente ao significado
do objeto, mas capacidade de possu-lo. Ao perder sua funo significativa na
medida em que no produzida para a sociedade-cliente, mas para o indivduo,
a arte no funciona mais como linguagem, uma vez que esta um fenmeno
essencialmente coletivo.
Nas sociedades que no conhecem a escrita, a pintura e os grafismos
so parte de um poderoso sistema de comunicao, como j salientamos, a
respeito das tradies, dos mitos, da histria do grupo. Os desenhos muitas
vezes representam momentos de uma epopia mtica e as figuras
antropozoomrficas modeladas na cermica, pintadas em tecidos, esculpidas
em madeira ou trabalhadas nos tranados so personagens que de alguma
forma se ligam ao repertrio mtico. Esses mitos, invariavelmente, se referem
ao tempo em que o homem era igual aos animais e explica porque as coisas se
tornaram como so e devem continuar assim.
Dentre os meios materiais utilizados pelo artista indgena como veculo
de sua mensagem visual, a cermica e o ltico so os mais estudados
arqueologicamente por causa de sua durabilidade. No caso da cermica, seu
estudo reveste-se de grande importncia para a arqueologia porque sua
utilizao est ligada a comportamentos culturais e sociais que caracterizam e
diferenciam os diversos grupos culturais. As formas dos utenslios e sua
decorao esto intimamente ligados aos contextos sociais em que esses
objetos foram produzidos e utilizados.
1
A noo de abstrato deriva de uma conceitualizao culturalmente determinada. Por isso a utilizao
desse termo no texto feita sempre entre aspas, uma vez que os motivos geometrizantes que consideramos
comumente como abstratos certamente no so vistos dessa maneira pela sociedade indgena que deles se
utiliza ou utilizou.
2
A obra de Lvi-Strauss sobre essa questo bastante mais ampla e foi estudada tambm atravs de obras
de outros autores, que constam da bibliografia.
bibliogrfica dos trabalhos etnogrficos e etnolgicos ligados s manifestaes
artsticas indgenas e discute os conceitos tericos da semitica e sua relao
com a arte. No segundo captulo realizamos um levantamento sobre o trabalho
arqueolgico em Maraj relativo Fase Marajoara e discutimos as teorias e
mtodos analticos empregados nos diversos estudos publicados. O terceiro
captulo traz um relatrio do trabalho emprico realizado junto coleo Tom
Wildi, com as conseqentes anlises e concluses. O quarto captulo apresenta
nossa proposta de anlise da arte cermica Marajoara como uma linguagem
iconogrfica, fazendo parte de um sistema de organizao social eficaz,
complexo e coerente. As pranchas com desenhos dos utenslios da coleo
esto no captulo III3. Cada captulo possui tambm uma concluso referente s
principais questes levantadas, de modo que a concluso final foi elaborada
com carter de fechamento e possui um sentido mais abrangente.
Ficar claro nas prximas pginas, ainda que no completamente
manifesto, que defendemos - parafraseando GEERTZ (1978) - um conceito
semitico de cultura. E se esse trabalho no se atm unicamente aos dados
fornecidos pela coleo trabalhada foi porque a utilizamos tambm como um
exerccio de reflexo sobre as possibilidades interpretativas do trabalho
arqueolgico.
Captulo I
3
Na Dissertao de Mestrado que originou essa publicao reproduzimos 102 utenslios da coleo que
foram desenhados, alm de fotos feitas por Luiz Carlos dos Santos, distribudos em 66 pranchas. No texto
atual houve a necessidade de condensar esse material e so apresentados apenas os desenhos necessrios
boa compreenso do texto e seus objetivos.
Arte indgena e significado
4
Mito Shipibo, traduzido e reescrito a partir da verso de BERTRAND-ROUSSEAU (1983).
Alm do que o mito representa aos Shipibo e outras tribos, outro fato de
extrema importncia que chama nossa ateno o de que os desenhos que
ento passam a ser caractersticos do estilo de cada tribo no foram por eles
inventados, e sim recebidos por meio de um acontecimento mtico. Os
desenhos, portanto, no so aleatrios ou produto da criatividade do artista. Ao
contrrio, quando cada grupo se apodera de uma parte do vestido da moa
morta, apropria-se tambm de um estilo esttico que passa a ser identificado,
a partir daquele momento, enquanto estilo tnico, estreitamente ligado
personalidade do grupo.
Visto de forma genrica, o mito sempre narra uma histria que teria
acontecido realmente, em um passado remoto. Torna-se uma histria sagrada
que, recontada por sucessivas geraes, muitas vezes reinventada, sem
perder o contedo original. A recorrncia de histrias mticas semelhantes em
povos to diferentes quanto distantes geogrfica e historicamente um fato que
levou estudiosos a analisarem os mitos em busca de seu carter universal.
LVI-STRAUSS (1975) observou que a estrutura dos mitos se mantm a mesma
em culturas distintas, variando apenas os elementos bsicos a partir dos quais
se estabelecem as relaes que formam o corpo da narrativa. Portanto, apesar
da histria mtica ser irreal e aparentemente sem lgica, pois nela tudo pode
acontecer, ela encerra um sentido que reside na maneira pela qual os
elementos encontram-se combinados entre si.
A nosso ver, um mito estruturalmente semelhante ao dos Shipibo o
que trata da origem da obteno da pintura corporal utilizada pelos Wayana5: o
mito da lagarta Kurupak. Vale a pena transcrev-lo, assim como foi ouvido
por VELTHEM (1992:53):
Havia um tempo em que Wayana no se pintava. Certo dia,
uma jovem ao se banhar viu boiando na gua vrios frutos
de jenipapo recobertos de figuras. - Ah! Para eu me pintar -
exclamou. Nessa mesma noite, um rapaz procurou-a na
aldeia at a encontrar. Tornaram-se amantes, dormindo
juntos noite aps noite. Entretanto, ao alvorecer, o jovem
sempre desaparecia. Uma noite, contudo, o pai da moa
rogou-lhe que permanecesse. E ele ficou. Quando clareou
perceberam que seu corpo era inteiramente decorado com
meandros negros. Como o acharam belo, pintou a todos,
ensinado-lhes esta arte. Um dia o jenipapo terminou. O
jovem desconhecido chamou a amante e foram sua
procura. Prximo ao jenipapeiro, pediu-lhe que o
aguardasse, enquanto colhia os frutos. Ela no obedeceu, foi
v-lo subir na rvore. O que viu, entretanto, no foi o amante,
5
Grupo indgena de lngua Carib, que habita a regio norte do Par, Guiana Francesa e Suriname.
mas uma imensa lagarta, toda pintada com os mesmos
motivos. Enfurecida, disse-lhe para nunca mais voltar sua
aldeia, pois seus irmos iriam mat-lo. Arrecadou os frutos
que estavam cados no cho e regressou, sozinha.6
7
Koch-Grnberg registrou em papel desenhos feitos em petroglifos e pinturas corporais entre ndios do
noroeste brasileiro. Steinen recolheu desenhos entre os ndios do Alto Xingu. (Conforme KOCH-
GRNBERG, 1910 e STEINEN, 1940, apud RIBEIRO, 1992:44).
servieron como codificacin a los diseos, y que en algunos
casos se utilizan as en la actualidad. (ILLIUS, 1988:2).
8
Os Siona hoje esto divididos em pequenos grupos, ao sul da Colmbia e norte do Equador, quase que
completamente aculturados.
Tambm nas vises Siona so identificados os fosfenos de Knoll, e
ainda nesse caso essa caracterstica universal proporcionada pela droga
interpretada de acordo com padres culturais. Nesse contexto, a arte
no apenas um mecanismo instigador da experincia
qualitativa pela qual a pessoa passou, mas tambm uma
criadora da experincia real. Eles recriaram as formas
geomtricas experimentadas nas vises de maneira
estilizada e padronizada. Desse modo, quando esto sob os
efeitos do Yaj, percebem os efeitos dos fosfenos de acordo
com formas culturalmente reconhecidas. (LANGDON,
1992:86).
9
Povo de lngua J, espalhados por vrias reservas no Mato Grosso.
10
Povo de lngua J que habita o norte do Estado de Gois.
11
ndios da famlia lingstica Tupi-Guarani, que habitam a Reserva do Trocar, nas margens do Tocantins,
prxima a Tucuru.
12
Entre os Wayana estudados por VELTHEM (1992), a pintura corporal lisacom urucum tem o sentido de
socializao e estabelece uma base sobre a qual sero feitos os desenhos. Entre os Kayap (VIDAL, 1992)
tambm o recm-nascido pintado com jenipapo aps a queda do coto umbilical, como marca de status de
pessoa humana.
so combinados entre si. O fato de esta tribo estar em processo de aculturao
impediu que se colhessem informaes mais precisas sobre o significado e
origem dos desenhos. No entanto ntida a tendncia de perpetuar-se a
tradio e esta determina o que certo ou errado no uso dos padres
decorativos.
13
Os Suy so uma tribo de lngua J que habita o Parque Nacional do Xingu, ao norte do Mato Grosso. O
autor realizou trabalho de campo junto a essa tribo entre os anos de 1971 e 1973.
Os ornamentos corporais, acima de tudo, tornam os
conceitos intangveis, tangveis e visveis. Os discos
auriculares e os discos labiais dos Suy so smbolos com
uma variedade de referentes que unem os plos dos
fenmenos naturais (os rgos e os sentidos) com os
componentes da ordem social e moral. Podemos dizer que
os Suy internalizam os seus valores literalmente
corporificando-os atravs das manifestaes simblicas
que so seus artefatos corporais. (SEEGER, 1980:55).
16
Povo da Nova Guin.
referente - e tem o seu significado - sua referncia - culturalmente determinado.
Esse significado , portanto, extrnseco e convencional.
O cone - vocbulo de origem grega que se traduz por imagem - ao
contrrio, guarda uma relao de semelhana com o objeto que representa,
com parte ou qualidade deste, e assim pode ser identificado, apesar de sua
insero cultural. Por isso, PEIRCE (1974) considera a metfora um tipo de
cone, mesmo que se relacione com o objeto apenas atravs de uma
comparao subentendida. Uma figura icnica muitas vezes reproduzida e
levada simplificao pode finalmente tornar-se um smbolo, na medida em
que seu grau de iconicidade torna-se fraco, ou mesmo nulo, e no mais
compreendida fora de seu contexto cultural. De toda a maneira, um signo pode
ser ao mesmo tempo cone e smbolo e isso vai depender do contexto no qual
ele se apresenta.
A linguagem visual construda a partir de grafismos ou figuras abstratas
em sociedades indgenas, como entre os Walbiri e Wayana, foi considerada,
por alguns autores como MUNN (1973) e VELTHEM (1992) como iconogrfica,
apesar de ela no se apresentar assim para um observador no-culturalmente
inserido. Isso se deve ao fato de que as representaes grficas so
simplificadas e analgicas em relao ao objeto, o que torna seu grau de
iconicidade fraco, mas perfeitamente eficaz dentro daqueles contextos culturais.
O smbolo freqentemente possui mais de um referente, uma vez que
ele uma condensao de sentido, uma representao de um conceito. Alm
disso ele possui a propriedade de evocar sentimentos que no seriam
adequadamente expressos por palavras. Por isso, no dizer de URBAN (1952) o
smbolo autntico est ligado ao intuitivo e no pode separar-se dele. JUNG
(1964) pondera que as religies empregam os smbolos para representar
conceitos que esto alm do entendimento humano. Provavelmente as religies
esperam que estes conceitos permaneam ininteligveis, o que confere aos
seus smbolos um carter sagrado. Tendo em vista a fora de sua ao
persuasiva, EPSTEIN (1986) alerta para o fato de que os smbolos podem ser
usados para desencadear determinado tipo de situaes.
O exemplo que usamos dos discos auriculares e labiais dos Suy
mostra a capacidade dos smbolos em serem concisamente eloqentes.
Encerram tanto significado que Seeger precisou escrever vrias pginas para
explan-lo. Entretanto, para aquele povo, no preciso verbalizar esse
significado; bastam o uso dos discos e todo ritual que envolve sua utilizao.
Os rituais so momentos privilegiados para se observar como so
simbolizadas as relaes que se estabelecem, no seio de cada cultura, entre os
humanos e o sobrenatural. Eles expressam a viso que o grupo tem do
universo, pela teatralizao de seus mitos, e geralmente traduzem
preocupaes de natureza universal, observveis em todas as culturas. Sendo
para marcar situaes de passagem de um ciclo vital a outro, ou relacionado
com as atividades de subsistncia, os rituais envolvem no s a transmutao
dos atores sociais em personagens das narrativas mticas como a utilizao de
objetos de grande importncia para o relacionamento dos homens com os
mundos natural e sobrenatural. Assim, esses objetos carregam grande
significado simblico, como parte de um processo que envolve a matria-prima,
as tcnicas e concepes cosmolgicas expressas na decorao.
Concluses do Captulo
Esse primeiro captulo foi elaborado tendo como objetivo a construo
de um substrato terico, e at certo ponto tambm etnogrfico, para toda a
anlise que se desenvolve a partir do captulo III sobre a arte cermica
Marajoara. A idia era estabelecer um conceito de arte indgena para, a partir
desse conceito, entender as motivaes e propsitos que impulsionaram o
desenvolvimento de to elaborada arte. Alm disso buscvamos meios para a
construo de uma metodologia apropriada para o estudo da decorao
cermica em uma sociedade arqueolgica.
As informaes que se possui sobre a populao que habitou os tesos
em Maraj durante cerca de novecentos anos se restringem praticamente ao
que se pode depreender dos vestgios da cultura material, constituindo-se, a
maior parte dessa, de utenslios cermicos. uma cermica requintada, que
demonstra o desenvolvimento de um alto nvel tcnico e artstico. Trata-se de
uma arte em alguns momentos figurativa, mas predominantemente abstrata.
Outra caracterstica importante a padronizao da decorao, de maneira que
muitos utenslios carregam os mesmos padres decorativos, s vezes com
desenhos praticamente iguais.
Buscamos levantar dados sobre manifestaes artsticas em outras
culturas indgenas, com o intuito de conhecer mais sobre as relaes que esses
povos estabelecem com a produo artstica, para poder ento criar uma base
etnogrfica a partir da qual pudessem ser avaliadas as possibilidades de uso do
mtodo comparativo. Alguns estudos etnogrficos tocam, via de regra, no
problema terico. Portanto, a preocupao em recolher esses dados
etnogrficos tinha o objetivo de tambm trabalhar modelos tericos.
17
Consideraes feitas a partir de leituras sobre mitos constantes nas diversas obras citadas na bibliografia.
18
No prefcio de Lvi-Strauss para Teoria Generale della Magia, de Mauss, citado por ECO (1976).
A pesquisa etnogrfica tem a possibilidade de registrar as narrativas
mticas nas ocasies em que estas so contadas aos mais jovens. Alm disso,
o investigador tem a oportunidade de observar os rituais, que so momentos
em que os mitos so revividos atravs de uma dramatizao, sendo essa
tambm uma forma de arte. Ento a arte permeia todas as esferas do social: se
manifesta no drama, na pintura corporal, na decorao dos objetos. Tudo isso
est ligado a um sentimento a que chamamos cosmolgico, que remete
insero do ser humano no mundo onde ele vive. Essa viso cosmolgica trata
da origem do homem e de como ele deve viver nesse mundo, como deve se
relacionar com o mundo natural e seus semelhantes.
Por ocasio dos rituais, os atores vivem, eles prprios, a histria mtica
que, ao narrar um acontecimento do passado, atravs da dramatizao, adquire
existncia no presente, numa perspectiva atemporal.
Alguns dos trabalhos citados, principalmente, de Lcia van Velthem,
sobre os Wayana, e de Nancy Munn, sobre os Walbiri, mostraram que a
mitologia desses povos se expressava nos rituais, na decorao plstica, nas
pinturas, nos grafismos, na pintura corporal e nos objetos; tornar visuais esses
conceitos e tornar visual o mito uma maneira de perpetu-los. No podemos
esquecer que o conceito advm primeiramente de um processo mental - e
quando falamos de conceitos, no estamos considerando o referente, que no
tem importncia para essa anlise, mas a referncia -; para que ele seja
compartilhado existe a necessidade de que ele seja visvel, audvel, ou
verbalizvel. As sociedades indgenas, geralmente, no levam em alto grau a
verbalizao. Pelo contrrio, a forma de percepo preponderantemente
visual. Existe, portanto, uma necessidade de tornar esses conceitos e a prpria
histria visuais, o que se d atravs da arte. Enquanto sistema de signos
identificados e socialmente compartilhados, a arte confunde-se com a prpria
cultura.
A maneira como os conceitos so expressos plasticamente remete
existncia de referentes identificveis pelo grupo. O grupo compartilha as
mesmas referncias, ou pelo menos referncias similares. A questo que se
coloca a de como o observador de fora pode perceber essas referncias ou
chegar a apreender os conceitos. Na verdade ele no pode apreend-los em
sua totalidade, por no estar culturalmente inserido naquele contexto. Os
pesquisadores costumam buscar o sentido literal do smbolo para que ele se
traduza cientificamente em termos de assertivas e em termos analticos como
o pensamento cientfico. Pretendem defini-lo, conceitu-lo; no entanto, no
momento em que se verbaliza o contedo do smbolo ele j no existe
enquanto tal, e ao mesmo tempo esse significado no seria verbalizvel em sua
totalidade. O que existe, ento, uma tentativa de uma aproximao da
compreenso do que seriam as malhas de significado que a sociedade em
estudo compartilha.
O estudo entre os Walbiri mostrou que aquelas figuras aparentemente
abstratas representavam, na verdade, uma linguagem visual iconogrfica; quer
dizer, os grafismos se referenciavam ao objeto real - ou a uma parte dele - ou
lembravam alguma qualidade desse referente. Munn isolou unidades de
significado que se combinavam de maneiras diferentes mostrando que essas
combinaes possuam um sentido semntico prprio. Na verdade essa
estrutura que a autora percebeu que existia na arte Walbiri a mesma estrutura
que Lvi-Strauus identificou nos mitos: unidades de significado que se
combinam, que se relacionam para expressar um contedo. O mito expressa o
contedo de diversas formas nas diferentes sociedades. As unidades de
significado podem ser diferentes; o que permanece a maneira como elas se
relacionam para poder originar determinados contedos semnticos. Como a
linguagem visual dos Walbiri estava estreitamente ligada sua mitologia, Munn
usou a mesma metodologia com resultado bastante fecundo.
Nancy Munn teve a possibilidade de identificar a existncia da
linguagem iconogrfica e isolar as unidades de significado na arte, uma vez que
podia referenci-las s unidades de significado no mito ou no ritual. A
dificuldade para o arquelogo reside justamente em isolar unidades de
significado de forma no arbitrria, uma vez que no se conhece o conjunto da
cultura, nem sua histria mitolgica. HODDER (1988) considera que perceber
uma marca em uma vasilha como uma unidade de anlise ou motivo decorativo
supe dar um sentido, interpretar um contedo e pretender ver aquilo da
maneira como a sociedade o via. De qualquer maneira, toda anlise est
carregada de subjetividade. Outro problema que se coloca o de como
entender essa iconografia e a dinmica dessas relaes sem uma base
etnogrfica.
A maneira que nos parece possvel para enfrentar essas dificuldades
a de apostar numa certa analogia etnogrfica e numa metodologia que tenha
conscincia dessa dificuldade e que avance at onde for possvel apesar da
falta de dados referenciais. No h um mtodo infalvel para trabalhar com uma
sociedade arqueolgica da qual no se tem nenhuma referncia etnogrfica. A
maneira de trabalhar a iconografia depender das condies encontradas. O
pesquisador tem que, ao mesmo tempo em que se referencia numa teoria e
metologia conhecidas, criar seus prprios passos dentro dessa metologia e, at
certo ponto, pensar ou repensar a teoria de acordo com sua realidade.
De qualquer maneira, algumas questes levantadas nesse captulo so
fundamentais e o auxlio que a antropologia tem prestado atravs dos trabalhos
etnogrficos imprescindvel. A conscincia desse papel to importante e
inequvoco da arte para as sociedades indgenas algo que tem que se fazer
presente no trabalho arqueolgico e que remete a uma outra maneira de
encarar a cultura material dessas sociedades. Geralmente o arquelogo releva
a um segundo plano os objetos artsticos, porque considera que no pode, a
partir deles, inferir significados. Entretanto, todos os exemplos levantados
mostram que existem preocupaes comuns s sociedades indgenas e que
arte cumpre uma funo social determinada, apesar de possuir expresses e
contedos diferentes de uma cultura para outra. Pode-se dizer, por exemplo,
que a necessidade da pintura corporal para diferenciar os seres humanos dos
animais, ou para diferenciar uma tribo de outra, uma caracterstica universal.
Mesmo uma sociedade que no utilize a pintura corporal, de alguma forma, nas
suas vestimentas, nos seus adornos, procurar marcar uma caracterstica
tnica, como resultado de uma necessidade intrnseca ao ser humano.
So essas caractersticas peculiares de cada cultura que, na
diversidade das manifestaes humanas, nos mostram elementos a respeito do
que seria uma natureza humana comum. Segundo GEERTZ (1978) a natureza
humana no um denominador comum em que todas as culturas se incluem,
mas deve ser buscada nas diferenas que enriquecem a viso de uma natureza
comum. Essa natureza comum, observvel atravs das manifestaes
culturais, no se encontra, para usarmos os termos da teoria semitica, nos
signos, referentes ou referncias, mas no cerne das relaes que se
estabelecem entre estes trs plos do processo da comunicao. Em outras
palavras, apesar da imensa diversidade de formas que assumiram as respostas
adaptativas do homem ao meio, elas tm-se dado sempre no sentido de
demostrar uma lgica interna, a partir da qual se revelam similaridades em
sociedades aparentemente diferentes.
Captulo II
Registro Arqueolgico e Etnohistrico da Fase Marajoara
20
PORRO (1993:115).
21
Data de PORRO, op. cit. e LA CONDAMINE (1992); no relato de ACUA (1946), h a data de 1639.
22
Porro, op. cit.
Tupinambs do Maranho, so contribuies importantes, pois foram
produzidos em um momento em que o objetivo era o de conhecer o modo de
vida indgena para catequizar e dominar politicamente as comunidades.
Apesar da impreciso geogrfica e da forte carga emocional que
caracterizam muitas das descries, uma vez que os viajantes viam-se na
contingncia de enaltecer as riquezas da terra recm-conquistada e estavam
afeitos a todo o tipo de perigos, uma leitura atenta e um estudo comparativo
entre as mesmas levam os estudiosos hoje a chegarem a concluses
importantes sobre os padres de assentamento e prticas culturais das
populaes que habitavam a vrzea amaznica alguns anos antes da chegada
dos europeus. Observa-se que a margem dos grandes rios - o Amazonas e
seus principais afluentes - era densamente povoada e, segundo notcias dos
ndios, o interior tambm o era:
(...) en el espacio de casi cuatro mil leguas de contorno
encierra ms de ciento cincuenta naciones de lenguas
diferentes(...)(ACUA, 1946:11).
Todo este rio das Amazonas, nas ilhas, nas margens e terra
adentro, est povoado de ndios e tantos em nmero que
para dar uma idia da sua multido disse o piloto-mor desta
armada, Bento da Costa, homem prtico nestes
descobrimentos, que navegou o rio e todos os que nele
entram at chegar a Quito, marcando a terra e anotando
suas propriedades, que so tantos e sem nmero os ndios,
que se do ar deixassem cair uma agulha, h de dar em
cabea de ndio e no no solo. Tal a sua quantidade que
no podendo cair em terra firme, se arrojaram para as ilhas.
No s o rio das Amazonas est to povoado de ndios, mas
tambm os rios que nele desaguam (...)(ALONSO DE ROJAS,
1941:107/108)
23
As citaes do Padre Carvajal se referem traduo feita por Melo-Leito, edio de 1941.
Os portugueses encontraram uma aldeia to grande de uma
e outra banda do rio que, navegando o dia todo a sua vista,
comeando a navegao trs horas antes do amanhecer at
ao pr-do-sol, no puderam dar fim aos edifcios nem achar
lugar em que alojar-se que no estivesse ocupado com
casas, e umas seguidas s outras (ALONSO DE ROJAS,
1941:121)24.
24
As citaes de Alonso de Rojas foram tiradas da edio de 1941, traduzida por Melo-Leito.
25
Se refere a uma aldeia prxima ao rio Purs.
porque a ela nem a de Mlaga se iguala. toda vidrada e
esmaltada de todas as cores, to vivas que espantam,
apresentando, alm disso, desenhos e figuras to
compassadas, que naturalmente eles trabalham e desenham
como o romano. Disseram-nos ali os ndios que tudo o que
havia naquela casa, feito de barro, se encontrava terra
adentro, feito de ouro e prata, e que eles nos levaria l, que
era perto. Encontramos nessa casa dois dolos, tecidos de
palha, de diversos modos: eram de estatura de gigantes e
tinham metidas no molejo dos braos umas rodas, a modo de
braceletes e outras nas panturrilhas, perto dos joelhos; as
orelhas eram perfuradas e muitos grandes, parecendo a dos
ndios de Cuzco, porm maiores.(CARVAJAL, 1941:47). 26
26
Trancrio de nota do editor, pgina 47: O tradutor reescreveu a narrativa por ser demasiados longos
os perodos e muito repetitivos, tentando, nas suas palavras, amenizar o texto, sem moderniz-lo. As
notcias do Frei Carvajal freqentemente mencionam a existncia de ouro e muitas riquezas terra
adentro, certamente influenciado que estava pela idia de encontrar o Eldorado, assim como a Terra das
Amazonas, com as quais ele diz ter combatido. Entretanto nada disso ficou provado e a confrontao com
outros relatos faz com que no se lhe d crdito.
unos ni en otros fan tanto, que no reconozcan pueda haber otro
mayor. (ACUA, 1942: 55).
Pe. Acua comenta a notcia de que havia um ndio que se dizia filho do
Sol e possua poderes divinos; ele observa ainda a grande estima que os
ndios tm por seus feiticeiros, no tanto por amor, mas por receio, por esses
poderem lhes causar mal, o que faz com que guardem ossos dos feiticeiros em
uma casa destinada s para isso e para onde recorrem quando necessitam. As
prticas funerrias no so padronizadas; alguns enterram os mortos em suas
prprias casas, outros os queimam em fogueiras com seus pertences e
celebram esse ato com cantos e bebedeiras.27
28
Obras completas de Domingos Soares Ferreira Penna. Volume II. Belm, Conselho Estadual de Cultura,
1971. P. 239.
que se possui que tenham tido um modo de vida semelhante ao dos povos que
habitavam a vrzea.
Observa-se que no continente, nas proximidades dos rios, parece ter
havido em algum momento o estilo de habitao em aterros artificiais
caracterstico dos stios em Maraj que podem ter sido construdos com
objetivos defensivos:
Fomos assim costeando: vimos povoaes onde no nos
podamos aproveitar delas, que mais pareciam fortalezas no
alto de morros, a umas duas ou trs lguas do rio. No
soubemos quem era o senhor que dominava esta terra,
dizendo-nos apenas o ndio que naquelas fortalezas
resistiam, quando lhes faziam guerra.
***
29
No lemos esses trabalhos no original. Nomes e datas de publicao foram retirados de PALMATARY
(1949)
construssem hipteses sobre a origem daquela cultura, mas a partir do estudo
estilstico da cermica comeou a buscar-se afiliaes em outros pontos do
continente.
Ao final da dcada de 40, Meggers e Evans realizam escavaes no
s na Ilha de Maraj como tambm no territrio do Amap e nas Ilhas Caviana
e Mexiana, o que atesta a preocupao em contextualizar e estabelecer
relaes entre as diversas ocupaes humanas na regio. Escavam nos stios
J-14, Monte Carmelo, com trs mounds e no stio J-15, Os Camutins, com 20
mounds. Em relatrio publicado em 1957, h um cuidadoso inventrio de todos
os stios encontrados, alm da reunio dos dados produzidos pelas
investigaes anteriores. A partir dos resultados obtidos, so traadas, ento,
hipteses sobre a origem e desenvolvimento das culturas que habitaram a Ilha.
Desse segundo momento de pesquisas na Ilha podemos citar tambm
Peter Paul Hilbert que, tendo j participado da expedio de Meggers e Evans,
realiza prospeces nos Camutins e Pacoval em 1950. Em 1951 escava a leste
do Lago Arari, em Caratatua, Pacoval dos Mello, Teso dos China e Teso do
Severino.
Meggers e Evans, baseados na etnografia de populaes amaznicas
modernas e utilizando o mtodo comparativo, inferiram os padres de
assentamento que seriam caractersticos da Ilha de Maraj. Pretenderam
demonstrar que, por causa da geografia da regio amaznica, a nica forma de
subsistncia humana seria a da vida em pequenas comunidades, baseada na
pesca, caa e coleta e agricultura de subsistncia; que, portanto, esse tipo de
economia no poderia sustentar grandes contingentes populacionais e suportar
o desenvolvimento de uma sociedade mais complexa.
30
Apud MEGGERS e EVANS, 1957.
explicaes para o fato de essa migrao no ter deixado vestgios em sua
passagem -
The trip downriver must have been a rapid one, because no
Marajoara Phase sites have come to light along the main
course of the Amazon, which is better know archaeologically
than other parts of the lowland.(MEGGERS e EVANS,
1957:419)-,
31
No h comprovao de que os fragmentos encontrados nas diversas regies sejam originrios de
Maraj, podem ser apenas cermica policrmica. Em nota de rodap, MEGGERS e EVANS (1957:419)
comentam que Toledo (1942) teria achado fragmentos de cermica marajoara na regio do Rio Trombetas,
que incluam 2 cabeas de figurines e um apndice, que os autores identificaram como sendo
indiscutivelmente de origem Marajoara.
1.000 anos, at aproximadamente o ano de 1300 A.D. E no s esta populao
no decaiu sob as agruras do clima e da geografia da Ilha como nela se
desenvolveu, florescendo ali uma das civilizaes mais complexas da pr-
histria recente das Amricas.
Anna Roosevelt no pesquisa as fases anteriores, mas apresenta datas
mais antigas para a Fase Ananatuba, entre 1.500 a 1.000 A.D., da qual alguns
fragmentos cermicos foram encontrados na superfcie de diversos mounds da
Fase Marajoara, como Teso dos Bichos e Teso do Stio. A autora considera
que peas de cermica encontradas em stios ou prxima a stios Marajoara e
atribudas s fases Mangueiras e Formiga, podem no ter sido objeto de
comrcio, mas sim cermica rstica Marajoara, constituindo-se em resduos de
ocupao sazonal:
32
Conforme artigo do New York Times sobre as escavaes de Roosevelt. 13/12/91,
Maraj, faremos um levantamento do conjunto dos dados fornecidos pelo
registro arqueolgico de forma a podermos melhor entender e discutir as
hipteses e teorias que se apresentam.
Os stios da Fase Marajoara se encontram sobre colinas ou aterros
artificiais, tambm conhecidos como tesos ou mounds33, construdos
paralelamente ao longo de rios e lagos. Alguns teriam sido construdos no leito
mesmo de rios, quando na poca de drenagem das guas, como atestam
testes de refrao ssmica em Guajar. (ROOSEVELT 1991).
O tamanho dos mounds tanto em rea quanto em altura varia muito;
Meggers e Evans relacionaram essas diferenas com a funo que pensaram
que cumpririam os dois tipos de stios. Os stios-cemitrios seriam grandes,
enquanto que os de habitao seriam bem menores e apresentariam somente
cermica no-decorada. Eles so bastante enfticos quando afirmam que suas
escavaes, em 1949, no comprovam o uso simultneo para moradia e
sepultamentos.
Entre os stios de habitao, o menor stio medido por Meggers e Evans
Mound 14, J-15, do grupo Camutins, com 51 x 35m de extenso e 6,25m de
altura. Fortaleza o maior, com 91m de comprimento e 2m de altura. Observa-
se que no h relao necessria entre altura e extenso. Nesses stios de
habitao os cacos de cermica no-decorada apresentam-se em
porcentagens bastante altas, de 92 a 100% (MEGGERS e EVANS 1957: 398).
33
Teso a denominao local para pequenas elevaes de terra, sejam naturais ou artificiais
(PALMATARY 1949). A denominao mound, em ingls, parece estar mais relacionada aos montculos
construdos pela ao do homem, motivo pelo qual consideramos apropriado utiliz-la com essa acepo.
cronolgico. Alguns assentamentos so compostos de vrios mounds, em
grupos de 3 a 5 ou at mais, com diferentes tamanhos.
Alguns autores associam a forma dos stios-aterros com a forma de
animais, como o jabuti, comparao feita por LADISLAU NETTO (1882 apud
PALMATARY 1949) com relao forma de Pacoval do Arari, mas essa hiptese
parece estar descartada; muitos so mais arredondados, enquanto que o
formato padro parece ser o ovalado, mais comprido do que largo. Meggers e
Evans concluram que, se alguns mounds tm aparncia zoomrfica, isso no
intencional; tampouco existe orientao cardial - a orientao depende dos
contornos geogrficos dos rios e lagos.
Anna Roosevelt identificou stios planos, prximos aos aterros, que
podem ter servido de moradias para os provveis trabalhadores agrcolas no
caso de ter havido uma diferenciao social nesse sentido. Esse tipo de stio
plano foi constatado em corredores de floresta atravs de prticas de survey.
Assim como os mounds pequenos, estes stios planos parecem ser bastante
freqentes e mais numerosos que os grandes mounds; no entanto,
praticamente no so mencionados na literatura.
Fazendo uma reviso bibliogrfica e contando os stios conhecidos
separadamente, Roosevelt identifica a existncia de mais de 400 stios, e
pondera que esse ainda seria um nmero pequeno perto do que realmente
existe:
My own experience has been that each documented
Marajoara mound has near it three ou four unreported sites,
many of them modest habitation mounds of lesser elevation.
Sighting from each substantial Marajoara mound, a person
can see in the distance in a 5-km radius around the site three
or four other substantial cemetery and habitation mounds,
many of them not recorded but known to the landowners and
tenant ranchers.(ROOSEVELT, 1991:33).
34
STEERE (1877), citado por PALMATARY, 1949.
35
Magalis, em Tese de Doutorado defendida em 1975 (MAGALIS, Joanne Evelyn. A Seriation of some
Marajoara painted anthropomorphic urns) trabalha a seriao em urnas antropomrficas a partir de
colees de museus. No foi possvel obter o original para leitura, e conhecemos seu trabalho atravs de
BROCHADO (1980) e ROOSEVELT (1989, 1991).
36
Apud MEGGERS e EVANS (1957:401).
37
Apud BROCHADO, 1980.
Foram encontrados diversos objetos e vasilhas cermicas associadas
aos enterramentos, como pratos, vasos menores, cachimbos, fusos, estatuetas,
miniaturas, instrumentos musicais, tinteiros, alm de adornos e das
conhecidas pedras verdes (muiraquits). A quantidade e qualidade dos objetos
variam nos enterramentos. As tigelas dispostas ao lado das urnas podem ter
contido oferendas. Meggers e Evans observam que os ossos de animais como
mamferos, pssaros e jacars encontrados tambm podem ter ligao com
essas oferendas.
As tangas podem estar presentes junto ou sob os ossos, na base da
urna ou ainda do lado de fora. Grandes urnas no decoradas podem estar
presentes abrigando urnas menores e decoradas. Muitas urnas so cobertas
com pratos ou tigelas invertidos, podendo estes estar sobre a borda ou
introduzidos no gargalo do vaso. Varia entre os stios o tipo de material
associado com os enterramentos.
38
A prtica desse tipo de deformao craniana bastante difundido em diversas regies, tendo sido
identificada etnograficamente entre os Quijo, os Awishira, tribos do Ucayali, (Steward e Mtraux, 1948),
os Omgua, os Tiatinagua (Mtraux, 1948), os Peban e tribos Tupian da Montaa (Steward, 1948), tribos
ao norte do Orinoco (Kirchhoff, 1948), certas tribos das Guianas (Gillian, 1948), os Pijao, na Colmbia
(Hernndez de Alba, 1946) e tribos da costa do Equador, como os Palta e Esmeralda (Murra, 1946). Apud
MEGGERS e EVANS, 1957.
relacionados com a cermica cerimonial e devem ter sido usados apenas em
banquetes especiais. Com razo, o projeto Radam (BROCHADO, 1980:44)
concluiu que apenas a caa e a coleta no seriam suficientes para sustentar
uma cultura no nvel alcanado pela Marajoara, e que portanto deve ter havido
alguma espcie de agricultura produtiva. Os pesquisadores observaram a
existncia de arroz selvagem na Ilha, que pode ter sido consumido nos tempos
pr-histricos. Entretanto, no h indicao de que o milho ou a mandioca
tenham sido cultivados em grande escala. Roosevelt identifica a presena de
algo que seriam sementes de milho junto aos resduos carbonizados de plantas,
mas pondera que s estudos sseos qumicos futuros podero determinar sua
importncia na dieta:
The rarity of maize and the human bone chemistry suggest
that maize was only and acessory crop, perhaps used for
making beer for cerimonies. (ROOSEVELT, 1991:379)
39
O autor conclui isso a partir de imagens de SLAR, mas considera que o relevo efetivo parece muito
pequeno para o controle hidrulico imaginado por Roosevelt.
pedra verde-acinzentada, chamada jadete, amuletos caractersticos dos
Tapajs, na regio de Santarm, foram encontrados por Carlos Quadrone em
Panellas, 1929. Outros autores tambm citam as pedras verdes. Helosa
Alberto Torres encontra, em 1930, machados de diorite, material que no existe
em Maraj; tambm reporta que cermica semelhante a de Maraj teria sido
achada nas vizinhanas do domnio Tapaj.40 Alm das evidncias
proporcionadas pela arqueologia, os relatos etnohistricos so prdigos em
citaes ao intenso comrcio existente entre as tribos amaznicas poca da
conquista, havendo referncias quanto existncia de caminhos e pousadas
construdos especialmente para os viajantes que se deslocavam
periodicamente de uma regio outra. (PORRO, 1987:2)
Algumas evidncias arqueolgicas nos parecem hoje incontestveis: de
que uma populao bastante numerosa, responsvel provavelmente pela
construo dos gigantescos aterros, teria habitado a parte centro-leste da Ilha
por mais de novecentos anos; que teria havido alguma espcie de hierarquia
social tendo em vista a diversidade verificada nos sepultamentos; que essa
populao utilizava-se de prticas rituais diversas e que essas prticas tinham
grande importncia na vida social; que haveria especializao do trabalho; que
h uma continuidade no desenvolvimento diacrnico na Fase Marajoara, ainda
que tenham havido mudanas significativas com relao s prticas culturais.
40
Ambos autores mencionados por PALMATARY, op. cit.
os dados existentes no so suficientes para comprovar a existncia do modelo
cacicado em Maraj:
We have observed in the Marajoara domain apparent site
size hierarchies and functional differences between sites that
would tend to accord with chiefly organization, as would the
physiological variability of Marajoara people. However, as
discussed, there is as yet no specific evidence that there
were socioeconomic strata or paramount chiefs.
(...)
Thought the Marajoara society shows considerable evidence
of socioeconomic differentiation of some kind, as yet there is
no clear evidence for the existence of central political roles.
(ROOSEVELT, 1991:95).
41
HAYS, Kelley Ann. When is a symbol archaeologically meaningful?: meaning, function and prehistoric
visual arts. In: YOFFE, NORMAN e SHERRATT, Andrew (eds.) Archaeological theory: who sets the
agenda? New York, Cambridge University Press, 1993.
5.700 a.C. e Pueblo IV, no Arizona e Novo Mxico, entre 1.300 e 1.500 A.D.)
apresentavam em comum o fato de habitarem stios agregados, maiores em
tamanho do que os antecedentes nas regies, implicando tambm em uma
populao de propores no conhecidas antes; estava presente o comrcio a
longas distncias, um crescimento qualitativo e quantitativo da decorao
artstica e complexificao das atividades rituais. Apesar de haver evidncia de
especializao do trabalho, no que tange s atividades artsticas, indcios de um
acesso diferenciado aos produtos trazidos pelo comrcio e existncia de
lideranas religiosas, em nenhum dos casos h boas evidncias de
estratificao social. A autora apresenta os exemplos acima com o intuito de
discutir em que medida as mudanas na organizao social e poltica se
refletem na atividade artstica e que condies determinam, em cada
sociedade, um crescimento do investimento nas atividades artstico-simblicas.
Nos trs exemplos, temos grandes comunidades agrcolas, onde
existem estruturas de estocagem associadas a contextos domsticos, no
havendo evidncias de estocagem central e pagamento de tributo a autoridade
central. Os objetos rituais no esto concentrados em templos nem evidenciam
um controle centralizado da religio, assim como os enterramentos no esto
associados com cemitrios formais. Hays observa que, apesar de alguns
enterramentos apresentarem mais oferendas do que outros, essas oferendas
so principalmente ferramentas ou objetos de cermica, em propores
reduzidas, apenas relativas ao indivduo enterrado. Alm disso, em
enterramentos mais modestos tambm existem oferendas.
JOHNSON (1982, apud HAYS 1993) apresenta uma teoria a respeito do
desenvolvimento de hierarquias sociais, denominada scalar stress theory.
Segundo Johnson, o aumento populacional e conseqentemente a necessidade
da tomada de decises que envolvam uma grande comunidade causa stress
nos indivduos envolvidos. Pode desenvolver-se, ento, uma hierarquia vertical,
quando um dos grupos, provavelmente de uma linhagem mais antiga, consolida
seu poder atravs de um controle de recursos, matrimnio ou por desempenhar
funes de liderana em algum episdio particular. Se essa estrutura no se
desenvolve, o grupo pode se fracionar em pequenas comunidades, onde o
consenso mais facilmente obtido. A partir dessas pequenas comunidades se
estabelece o que o autor chama de sequential or horizontal hierarchies, onde,
atravs de representantes das comunidades, pode-se estabelecer a unio do
grupo maior em nome de interesses comuns. Os rituais cumpririam um papel
importante na organizao dessa hierarquia horizontal.
fcil de entender que as atividades artsticas so importantes nesse
tipo de organizao social, uma vez que a decorao dos objetos estabelece
identidades e papis entre os membros do grupo, que se expressa nas suas
roupas, utenslios de caa, vestimentas e paramentos rituais etc. No s essa
arte e a atividade ritual so importantes no processo de constituio dessa nova
organizao social, mas tambm so fundamentais para mant-la durante o
tempo em que for necessrio. Os rituais vo cumprir o papel regulador das
relaes entre os diferentes grupos tnicos ou clnicos.
No primeiro caso estudado por Hays, buscado no estudo feito por
SHERRATT (1982)42 sobre a seqncia entre o sexto e o quinto milnio a.C. na
Plancie Hngara, nos Crpatos, h trs perodos, onde o segundo, o apontado
acima, apresenta um florescimento das atividades artsticas e rituais em
contraste com a decadncia observada no perodo seguinte. O autor prope
que isso no significa necessariamente uma involuo, mas simplesmente que
no haveria mais necessidade ou interesse em investir tanto tempo na
produo de objetos artsticos e rituais, devido a mudanas na orientao
econmica, que no demandariam mais uma centralizao ou organizao de
foras intercomunidades.
Hays conclui que nem todas as sociedades experimentam um aumento
na diferenciao das instituies e um desenvolvimento de hierarquias verticais
relacionada com aumento populacional e conseqente aumento do tamanho do
assentamento. Existem provavelmente diversas outras trajetrias evolutivas
possveis e que a diversidade na organizao humana maior do que as
categorias utilizadas na classificao tradicional evolucionista, como bandos,
tribos, cacicados e estados.
O determinismo ecolgico por muito tempo impediu que se percebesse
para a Amaznia a possibilidade do desenvolvimento e manuteno de
sociedades complexas. No final da dcada de 70, vrios autores (LATHRAP,
1972, 1974; DENEVAN, 1976, HEMMING, 1978 apud BROCHADO 1980) passaram
a questionar a idia de que os solos amaznicos seriam pobres em nutrientes
por causa das pesadas chuvas e o forte calor, uma vez que sabia-se dos
grandes assentamentos populacionais que existiram poca da conquista e
concluram que alguma espcie de agricultura produtiva deveria ter-se
desenvolvido; por outro lado, comeava-se a pensar na Amaznia como o
42
SHERRATT, Andrew. Mobile Resources: Settlement and Exchange in Early Agricultural Europe. In
Ranking, Resource and Exchange: Aspects of the Archaeology of Early European Society. edited by C.
Renfrew and A. Seherratt, pp. 13-26. Cambridge: Cambridge University Press, 1982.
bero das culturas cermicas na Amrica. Com relao a Maraj, a semelhana
com os solos da Bacia Amaznica foi salientada por Brochado (1980: 50/54):
In some measure, the quite unique environment of Maraj,
specially the kind found east of lake Arari, can be compared
to an enormously enlarged vrzea, situated not between a
river and the terra firme, but between two rivers - the Amazon
and the Rio Par.
Popenoe (1966:13) says that the best soils in the tropics are
new soils - those in areas of recent volcanic activity or those
of the large river deltas, including the vrzea soils. Since the
largest expanse of vrzea in all the Amazon basin is
constituted by Maraj, and as the vrzea soils are the most
fertile and easily worked, it is not surprising that Maraj
should have atracted and sustained a large and dense
population, and the Marajoara pottery is the most visible proof
of this.
43
ROOSEVELT (1991) apresenta indcios duvidosos da construes de canais de irrigao, que podem ter
causa natural.
Concluses do Captulo
44
No final do sculo XVII, praticamente todas as famlias Omgua tinham em casa um ou dois escravos,
que em perodos de abundncia ajudavam a armazenar recursos; quando no eram mais necessrios
podiam ser descartados (MEGGERS, 1971). Entre os Tupinambs do Maranho tambm haviam escravos
que eram tratados como membros da famlia. No entanto essa tribo no tinha o costume de enterr-los;
quando chegava a poca certa os matavam e comiam em meio a grandes festividades. (dABBEVILLE,
1975).
observada por Meggers e Evans para o final da fase, se comprovada, no
denota decadncia cultural na acepo vulgar do termo, mas simplesmente que
j no eram to importantes para o grupo as prticas rituais antes
desenvolvidas, uma vez que se aceita que essas prticas cumpririam uma
funo importante ligada organizao social e poltica.
45
Claude dAbbeville no claro quanto natureza da deformao craniana que observou entre os
Tupinambs no incio do sculo XVII: O fato de terem, de costume, o nariz achatado, provm da prtica,
comum s mes, de o deformarem j no nascimento. Assim, tambm, entre ns, muitas ajeitam a cabea
dos recm-nascidos para along-la, deturpando a natureza e trocando pela feira e indecncia o que
naturalmente bonito e decente.(dABBEVILLE, 1975:210)
Alm dessas consideraes de ordem terico-metodolgicas, deixamos
nos pargrafos acima registradas nossas sugestes para futuras escavaes,
em que um controle rigoroso da posio estratigrfica dos resduos, aliada
utilizao de uma tipologia cermica adequada, poderiam proporcionar
excelentes resultados no sentido de testar novas hipteses. No captulo
seguinte, veremos como a anlise da cermica em colees de museus pode
servir para trabalhar os aspectos simblicos da cultura e como esses se
relacionam com a organizao social de sociedades arqueolgicas.
Captulo III
46
MEGGERS & EVANS (1957), PALMATARY (1949), TORRES (1940), ROOSEVELT (1991),entre outros.
conhecimento da cermica que havia nos tesos da ilha e cujos padres
decorativos, a ele, como arquiteto, muito interessava. J naturalizado brasileiro,
justificava seu interesse com o argumento de que estava resguardando o
patrimnio nacional, uma vez que a cermica estaria sendo levado para fora do
pas pelos americanos - Os Evans47.
Em sua viagens, Tom Wildi fez amizade tambm com pessoas ligadas
ao Museu Goeldi, que conheceu em 1951, o que fez com que comeasse a
estudar arqueologia com grande interesse. Em carta a um amigo, em 21/06/60,
fala de sua inteno de fazer escavaes obedecendo aos padres cientficos,
com medies e documentao grfica. Se chegou a faz-lo, no tivemos
47
Jornal O Estado. Florianpolis,17/06/84, s/n pgina.
48
Segundo carta pessoal de Tom Wildi famlia. Belm, 25/09/54.
49
Tivemos acesso a vrias cartas que Tom Wildi trocava com amigos em Belm e no Museu Goeldi e as
que escrevia para a famlia durante as viagens, assim como a artigos de jornal, que constam da
bibliografia. O dirio de campo mencionado por Elton deve estar em poder da famlia, com quem no
logramos entrar em contato, ou ento deve ter-se perdido.
50
ROCHA, Elton Batista. Relatrio dos Trabalhos realizados no museu particular do colecionador Tom
Wildi no perodo de agosto de 1983 a maro de 1984. Florianpolis, UFSC, 1984, datilografado.
acesso a esses registros. Sabemos apenas que o material que reuniu proveio
de pelo menos oito stios: Laranjeiras, Guajar, Teso Salitre, Gentil, Matinada,
Macaco, Ilha dos Bichos e Pacoval do Arari. Laranjeiras foi visitado em 1950,
enquanto que Guajar conheceu em 1960. O considervel acervo de cermica
Marajoara que recolheu resultado desses 20 anos de viagens a Maraj,
durante os quais manteve contato permanente com o Museu Goeldi que, por
diversas vezes, mandou representantes para acompanh-lo nas expedies
aos tesos.
Essas consideraes sobre a origem do material so importantes para
dar a exata dimenso do tipo de objetos com que trabalhamos. um material
descontextualizado, tanto no tempo quanto no espao, ou seja, no est
relacionado com outros objetos da cultura material nem com outros vestgios da
presena humana. Por outro lado tambm no uma amostra representativa
da arte Marajoara como um todo, uma vez que no se constitui em uma
amostra criteriosa do universo dos tipos conhecidos. Por essas razes,
determinados resultados do trabalho tm que ser examinados com cuidado.
O trabalho junto coleo escolhida como amostra para nossa
pesquisa aconteceu em um perodo de aproximadamente trinta dias, entre os
meses de julho e agosto de 1995, no Museu de Antropologia da Universidade
Federal de Santa Catarina, em Florianpolis. As peas encontravam-se em dois
depsitos de forma muito dispersa e foram transportadas para um nico lugar,
onde inicialmente separamos as peas inteiras dos fragmentos. Esses, em
seguida, foram organizados em pequenos grupos tendo como critrio a
semelhana aparente, com vistas a uma futura reconstituio das peas.
Registramos as caractersticas dos utenslios em planilhas e realizamos
o cruzamento desses dados com o intuito de estabelecer relaes entre essas
diversas caractersticas. Os itens utilizados para a classificao foram: forma
bsica, localizao da decorao, medidas, tcnicas de tratamento da
superfcie, cor da pintura ou engobo, a existncia de cones, linhas e figuras
geometrizantes, tipo de pasta e tipologia.
A tipologia utilizada no estudo da coleo diz respeito classificao
quanto decorao, e foi elaborada por MEGGERS & EVANS (1957) e aplicada
na anlise dos fragmentos cermicos oriundos de suas escavaes em 1948-
49.
A utilizao de uma tipologia para classificao dos utenslios
cermicos no presente estudo se colocou como um procedimento
absolutamente necessrio, tendo em vista os objetivos a que nos propusemos.
Entendemos que o uso de uma tipologia que levasse em conta o
rigorismo e a perfeio tcnica enquanto fundamentos para a classificao
poderia fornecer informaes sobre a quantidade de tempo despendida na
confeco dos utenslios e sobre a necessidade de terem existido especialistas
para a confeco das peas em todos os perodos. Com isso poderamos
montar o quadro a respeito da importncia das prticas rituais no contexto
social e cultural e levantar hipteses sobre como e em que sentido ocorreram
as mudanas atravs do tempo. Mesmo no sendo possvel testar na coleo
as relaes espao-temporais com a tipologia, consideramos que utiliz-la seria
preparar caminho para pesquisas futuras.
A tipologia de Meggers e Evans foi elaborada com o objetivo de
estabelecer uma cronologia relativa a partir dos fragmentos cermicos, baseada
em uma quantificao desses materiais. A partir do mtodo Ford,
estabeleceram critrios para a construo dessa tipologia que possibilitou a
seriao do material recolhido nas escavaes nos Camutins em 1948-49. As
seqncias seriadas obtidas a partir das populaes de fragmentos recolhidos
no Mound 1 (J-15), Mound 17/Belm (J-15) e Mound 1/Guajar (J-14), levaram
os arquelogos s seguintes concluses: a) Haveria uma freqncia maior de
fragmentos Inaj simples (ncleo acinzentado) nos nveis inferiores, enquanto
que nos superiores cresceria em importncia Camutins simples (ncleo
alaranjado) - os dois tipos, mesmo assim, estariam presentes em todos os
nveis. Segundo os prprios autores, parece no haver relao necessria entre
os tipos de decorao e o tipo de pasta: por exemplo, Pacoval inciso
encontrado principalmente com ncleo acinzentado, no por existir uma
associao intencional entre as caractersticas da decorao e da queima, mas
porque Pacoval inciso um tipo do incio da seqncia, quando Inaj simples
era predominante (MEGGERS e EVANS, 1957:387).
Assim, ao classificar os fragmentos para proceder seriao, foi
privilegiada a cor da pasta. A partir da construo das seqncias seriadas no
levando em conta a decorao, estabeleceu-se uma cronologia relativa entre os
stios J-14 (Mound 1, Guajar), J-15 (Mound 1 -Camutins), Fortaleza e Pacoval.
Nessa seqncia, Pacoval seria o mais antigo. 51
51
Os dados da Tabela 41, pgina 652 do Archaeological investigations at the mouth of the Amazon,
mostram para Pacoval (coleta superficial de Peter Paul Hilbert), 264 cacos Inaj contra 43 Camutins; para
Fortaleza (coleta superficial) 552 cacos Inaj contra 194 Camutins; para J-14 (coleta superficial) 66 Inaj
contra 99 Camutins e para J-15 (coleta superficial), 60 cacos Inaj contra 83 Camutins.
a) Vasilhames mais complexos, apresentando dois ou mais tipos de
tratamento da superfcie so mais antigos;
b) A qualidade tcnica e a quantidade de superfcie trabalhada diminui
com o passar do tempo;
c) A pintura mais comum nos perodos mais antigos, assim como sua
associao com incises e excises. Nos mais recentes, a exciso/inciso
feita diretamente sobre o utenslio.
52
Essa descrio pode ser consultada em MEGGERS e EVANS, 1957:324-370
motivos e formas, mas que na prtica no so preponderantes para a
classificao. Os autores perceberam a dificuldade na aplicao dessa
tipologia, uma vez que, em grande parte dos vasilhames, duas ou mais tcnicas
eram usadas ao mesmo tempo. Assim, a classificao feita levando em conta
uma hierarquia a partir da tcnica mais complexa, que geralmente a do
exterior, na seguinte ordem: excisa com engobo duplo, incisa com engobo
duplo, excisa e retocada, incisa e retocada, excisa, incisa, pintada e raspada.
No tipo Joanes pintado existem muitas diferenas, no s na utilizao
das cores, mas percebe-se haverem dois subtipos: um primeiro que utiliza
apenas linhas desenhadas sobre o engobo de cor clara e um segundo que
utiliza principalmente grandes reas pintadas, s vezes com linhas desenhadas
tambm. Entretanto, Meggers e Evans consideraram que seria difcil trabalhar
com essa distino, pois os fragmentos em geral estavam muito erodidos. Na
coleo tambm enfrentamos esse problema com diversos vasilhames em que
no era possvel a percepo e reconstruo dos desenhos.
Estudamos 208 objetos cermicos da coleo, entre fragmentos, peas
inteiras e semi-inteiras: 18 urnas funerrias, 39 vasos, 38 tigelas, 36 pratos, 21
torradores, 12 miniaturas, 9 vasilhas com pedestal, 2 vasilhas pequenas, 2
banquinhos, 2 vasilhas geminadas, 1 rapezeira, 1 chocalho e 25 fragmentos a
partir dos quais no foi possvel identificar sua forma bsica original. Na
prancha 1 podem ser vistos alguns dos utenslios estudados, onde se observa a
diversidade das formas e tcnicas decorativas empregadas.
60
50
40
Pintados
30
20 Excisos
10
0 Incisos
Geometrizante
Antropomorfo
Zoomorfo
Olhos/boca
Uso
Sem uso
No decoradas
Uso
Sem uso
53
Algumas urnas Pacoval inciso mostram a figura humana com uma das mos introduzida na boca, talvez
levando algum alimento (ver PALMATARY (1949), plate 27, p. 385, fig. a)
Como o animal que se interpe entre as orelhas, acima descrito, parece
ter um status sobrenatural54, vemos que, num primeiro momento, o escorpio
parece ser o nico animal conhecido associado com as urnas funerrias
antropomrficas do tipo Joanes pintado, identificadas, segundo ROOSEVELT
(1991:80) com a subfase Camutins.
54
Segundo MCEWAN & SILVA (1979:8), a combinao de elementos humanos e no-humanos a
indicao mais bvia de status sobrenatural. RIBEIRO (1987b) tambm reporta que as anomalias fsicas
so utilizadas, freqentemente, para representar o sobrenatural.
O formato geral da urna tambm se assemelha ao corpo das grandes
aves, que, empoleiradas, apresentam um peito estufado, o que, especialmente
em algumas urnas, bastante visvel. No descartamos, com essas
observaes, a viso da urna Joanes pintado como representando um corpo
humano feminino estilizado55. O tero representado, sem dvida, nos moldes
do corpo feminino, uma vez que nas aves o correspondente seria um oviduto,
com formato longilneo; no caso de se considerar a esfera representada na urna
como sendo um ovo (a coruja tem o formato de seus ovos mais arredondado
em comparao com outras aves) ainda assim este estaria mal posicionado
com relao ao corpo, uma vez que o ovo das aves, para ser chocado, fica
colocado abaixo dos membros inferiores. De qualquer maneira, haveria a
ocorrncia simultnea de atributos de mulher e de ave.
Representaes zoomorfas
56
Ver captulo I, p.23.
Alm das representaes zoomorfas observadas nas urnas,
percebemos que estruturas zoomorfas esto graficamente representadas em
diversos outros utenslios, como vemos na prancha 5. O primeiro desenho
mostra a semelhana entre o padro decorativo na parede da tigela TWSP1
(prancha 5.b), do tipo Joanes pintado, que apresenta linhas que se enrolam
sucessivamente, e o movimento em S das serpentes que circundam todo o
bojo inferior da urna funerria n 034 (prancha 5.a). Sugerimos que nessa tigela
estariam representadas iconicamente as mesmas serpentes.
57
In: NASCIMENTO et alii, 1991.
espcie, o ventre apresenta-se liso e coberto por escamas, que se colocam
numa seqncia paralela. Estas esto muito bem representadas, graficamente,
pelo desenho que aparece no prato referido acima (prancha 5.c), uma vez que
todo ele decorado com o que seria o lado ventral do corpo da serpente. Nos
dois lados desse utenslio h o motivo decorativo encontrado depois em
diversos outros vasilhames que parece representar o entrelaamento de duas
serpentes.
58
Esse vaso, originalmente da coleo, no se encontra hoje no Museu e deve estar em poder da famlia do
colecionador.
Na coleo observamos diversos tipos de apndices, ligados ou no a
parcelas significativas de vasilhas, que permitem identificar o formato original
do utenslio. Dentre os apndices, 5 apresentaram formato zoomrfico, e
algumas espcies animais puderam ser identificadas. No apndice TWSP232
(prancha 6.c), nos olhos da tartaruga, o globo ocular, visto no detalhe (prancha
6.d), possui, alm da crnea representada por uma pequena esfera, duas linhas
paralelas que a circundam, com hachurado interno, da mesma maneira como
representado o lado ventral do corpo das serpentes nos pratos citados
anteriormente. V-se tambm que aparecem os dois tracinhos paralelos que
vamos encontrar em grande quantidade nos motivos decorativos Marajoara.
Representaes antropomorfas
Formas raras
59
Nessa conta se incluem 15 urnas funerrias de formato antropomrfico.
A pea que identificamos como chocalho deve ter sido apndice de um
prato ou tigela, e possui o formato de um rgo sexual masculino, sendo que
este est claramente representado na parte posterior da pea. Os desenhos
mostram as vises ventral (prancha 7.a), dorsal (prancha 7.b) e perfil (prancha
7.c). Esse chocalho, ou apndice, merece um exame mais detalhado. Na sua
base, que est quebrada, percebemos uma banda do tipo Joanes pintado,
comum nos pratos e tigelas (prancha 7.a). Provavelmente seria essa pea uma
parte de uma vasilha maior, mas no h nenhum indcio claro nesse sentido. A
cabea zoomorfa e possui olhos bastante separados. Na parte ventral h uma
figura tambm zoomorfa, com pernas abertas, tendo sobre o corpo trs riscos
incisos semelhantes aos observados no corpo de lagarto nas urnas funerrias.
Esse animal poderia ser um sapo. Em posio de rabo h a figura trpode
semelhante s patas do lagarto. Essa figura se encontra sobre o ventre da
pea, formando duas elevaes que podem significar gravidez. Na parte ventral
est claramente representado o rgo sexual masculino, no apenas com
incises, mas tambm atravs da modelagem da pea. Esto presentes as
linhas duplas, j relacionadas, como vimos acima, com serpentes. Em outras
vasilhas, aparecem relacionadas tambm a seios. Parece que h uma relao
bastante clara entre serpentes e fertilidade/fecundao.
60
MEGGERS e EVANS (1957) referem-se a utenslios de mesmo formato como sendo colheres. Entretanto,
HILBERT (1992) mostra que a morfologia do utenslio, referente aos aspectos da modelagem e decorao,
praticamente no deixa dvidas quanto sua funcionalidade enquanto uma rapezeira.
exemplo, h uma prtica ritual que inclui a ingesto de um leite alucingeno
que teria o poder de proteg-los de doenas e morte causadas por inimigos
(REICHEL-DOLMATOFF, 1975 apud ROOSEVELT, 1991:84).
Concluses do captulo
61
Na documentao que chegou at ns, pertencente a Tom Wildi, observamos a meno dos dois stios
citados, Macaco e Matinados, como tendo sido visitados pelo colecionador. A vasilha acima relatada
possui em seu nmero de catlogo as iniciais Ma, que se referem, segundo ROCHA (1984) s iniciais do
stio de origem, que no temos condies de precisar qual seria.
modelagem. Foram coletados dados a respeito das medidas das paredes, por
exemplo, que podero ser usados, no futuro para uma anlise estatstica da sua
espessura e relacion-la com a forma das vasilhas, se houver interesse. De
qualquer maneira, na coleta de dados pensou-se que seria melhor recolher
tantos dados quanto fosse possvel, mesmo que alguns destes no viessem a
ser utilizados depois, como foi o caso.
62
O prof. Dr. Klaus Hilbert (PUC/RS) nos sugeriu que os significados expressos na decorao dos
vasilhames poderiam ser identificados pela populao a partir de uma composio necessria entre vrios
deles. Ou seja, haveriam certos tipos de utenslios e decoraes que deveriam sempre aparecer juntos para
que tivessem seu contedo devidamente inteligvel, como partes de uma mesma histria.
OBRAS CONSULTADAS
ABBEVILLE, Claude d
1975 Historia da Misso dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranho
e suas circunvizinhanas. Belo Horizonte, Itatiaia; So Paulo,
Edusp.
ANDRADE, Lcia
1992 A marca dos tempos: identidade, estrutura e mudana entre os
Asurini do Trocar. In: VIDAL, Lux (org.). Grafismo indgena:
Estudos de Antropologia esttica. So Paulo, Fapesp.
VILA-PIRES et alii
1990 Rpteis da Ilha de Maraj, Par, Brasil. Levantamento preliminar
de lagartos e ofdios (squamata). Resumo de publicao.
Londrina, Res. XVII, Congresso Brasileiro de Zoologia.
BALDUS, Herbert
1954 Bibliografia Crtica da Etnologia Brasileira. So Paulo, Comisso
do IV Centenrio da Cidade de So Paulo.
BARATA, Frederico
1954 O muiraquit e as contas dos Tapaj. Revista do Museu
Paulista, NS. Vol. VIII. So Paulo.
1970 Antologia da cultura amaznica. Vol. VI (120-131).
BARDI, P.M.
1980 Arte da cermica no Brasil. So Paulo, Banco Sudameris.
BAROUDI, Ricardo
1960 Elementos de zoologia (de mollusca a protochordata). So Paulo,
Nobel.
BARROSO, Antonio Emilio Vieira.
1954 Maraj. Estudo etnogrfico, geolgico, histrico. Rio, Cia ed.
americana.
BARSE, William P.
1993 Review of Moundbuilders of the Amazon: geophysical
Archaeology on Marajo Island Brazil. Anna Curtenius Roosevelt.
American Antiquity. Vol 58, n 2, (373-374).
BERTRAND-ROSSEAU, Pierrette
1983 De como los Shipibo y otras tribus aprendieron a hacer los
dibujos (tipicos) y a adornarse. Amazonia Peruana, vol V, n 9
(79-85). Julio.
BOAS, Franz
1947 El arte primitivo. Mxico, Fondo Cultura Econmica.
BOSCH-EMPERA, P.
1975 El arte rupestre en las distintas regiones del mundo. Ddalo,
ano XI, n 21/22 (9-21). So Paulo, USP.
BOUDON, Raymond
1974 Para que serve a noo de estrutura? Ensaio sobre a significao
da noo de estrutura em cincias humanas. Rio, Eldorado.
BURNIE, David
1990 Aves. Do original Eiewitness Guides: Bird. Rio, ed Globo.
CALDERARI, Milena
1991 El concepto de estilo en ceramologa: la tradicin estilstica
santamariana en los Pucos de la Playa. In: PODEST et alii. El
arte rupestre en la arqueologa contempornea. Buenos Aires.
CARVAJAL,ROJAS E ACUA
1941 Descobrimentos do Rio das Amazonas. Traduzidos e anotados
por C. de Melo-Leito. So Paulo, cia. ed. nacional.
CHARBONNIER, Georges
1989 Arte, linguagem, etnologia. Entrevistas com Claude Lvi-Strauss.
Campinas, Papirus.
CHMYZ, Igor
1969 Terminologia arqueolgica brasileira para a cermica.Manuais
de arqueologia n 1. Curitiba. Centro de Ensino e Pesquisas
Arqueolgicas.
CHOLLOT-VARAGNAC, Marthe
1980 Les origenes du graphisme symbolique. Paris, ditions de la
fondation Singer-Polignac.
COIROLO, Alicia Duran
1990 Les groupes ceramistes de Lile de Maraj (nord du Bresil) de
lepoque prehistorique a nos jours. (Essai danlyse compare de
leurs productions). These de Nouveau Doctorat. Universite de
Paris I - Pantheon - Sorbonne, Atelier National de Reproduction
des Theses, Universite de Lille III.
DEELY, John
1990 Semitica Bsica. So Paulo, tica.
ECO, Humberto
1976 A Estrutura Ausente: introduo pesquisa semiolgica. So
Paulo, perspectiva.
1993 Como se faz uma tese. So Paulo, perspectiva.
ELIADE, Mircea
1985 Mitos, sonhos e mistrios. Lisboa, edies 70.
EPSTEIN, Isaac
1986 O signo. So Paulo, tica.
FREUD, Sigmund
s/d Totem e Tabu e outros trabalhos. Vol. XIII. (1913-1914). Rio,
Imago.
GEERTZ, Clifford
1978 A interpretao das culturas. Rio, Zahar.
1983 Local Knowledge. Further Essays in interpretative anthropology.
New York, Basic Books, Inc.
GOMBRICH, E. H.
1972 Histria da Arte. So Paulo, Crculo do Livro,.
GRENARD, Steve
1991 Handbook of alligators and crocodiles. Florida, Krieger publishing
company.
HILBERT, Klaus
1992 Archologische hinweise zum gebrauch von halluzinogenen
schnupfdrogen in der Marajoara-Kultur, unterer Amazonas.
Baessler-Archiv. Beitrge zur vlkerkunde. Neue Folge, Band XL
(197-220).
HODDER, Ian
1988 Interpretacin en Arqueologia. Barcelona,tica.
ILLIUS, Bruno
1988 La Gran Boa. Arte y Cosmologia de los Shipibo-Conibo.
Traduzido a partir do original Die Grosse Boa. Kunst und
Kosmologie der Shipibo-Conibo. Mnzel (ed.). Die mythen sehen,
vol. 2 (705-728, 732-735). Frankfurt.
KROEBER, A. L.
1987 Arte indgena da Amrica do Sul. In: Suma Etnolgica brasileira
vol. 3. Petrpolis, Vozes/Finep.
LA CONDAMINE, Charles-Marie de
1992 Viagem pelo Amazonas (1735-1745). So Paulo, Nova Fronteira,
Edusp.
LANGDON, Jean
1992 Alucingenos: fonte de inspirao artstica. A cultura Siona e a
experincia alucingena. In: VIDAL, Lux (org.). Grafismo
indgena: Estudos de antropologia esttica. So Paulo, Fapesp
LATHRAP, Donald W.
1970 The Upper Amazon. Ancient peoples and places. Vol. 70. Thames
and Hudson.
LEPARGNEUR, Hubert
1972 Introduo aos estruturalismos. So Paulo, Herder/USP.
LEROI-GOURHAN, Andr.
1985 O gesto e a palavra. 1. Tcnica e Linguagem. So Paulo, Martins
Fontes.
LVI-STRAUSS, Claude.
1975 Antropologia Estrutural 2. Rio, Tempo Brasileiro.
1978 Mito e significado. Lisboa, edies 70.
1987 A oleira ciumenta. Lisboa, edies 70
LOURENO, Wilson R.
1988 Sinopse da fauna escorpinica do Estado do Par,
especialmente as regies de Carajs, Tucuru, Belm e
Trombetas. Boletim do Museu Paraense Emlio Goeldi. Srie
Zoologia. Vol .4(2), dez. (155-173).
MEGGERS, Betty J.
1947 The Beal-Steere collection of pottery from Maraj Island, Brazil.
Reprinted from papers of the Michigan Academy of Science, Arts
and Letters, Vol. XXXI.
1967 The theory and purpose of cermic analysis. Proceedings of the
2nd international congress foi the study of Pre-Columbian
Cultures in the Lesser Antilles. Barbados.
1971 Amaznia, a iluso de um paraso. Rio, Civilizao Brasileira.
MEHRTENS, John M.
1987 Living snakes of the world in color. New York, Sterling publishing
co., Inc.
MUNN, Nancy D.
1962 Walbiri graphic signs: an analysis.American Anthropologist, 64
(972-984).
1966 Visual categories: an approach to the study of representational
systems. American Anthropologist, 68 (936-950).
1973 The spatial presentation of cosmic order in Walbiri Iconography.
Primitive art and society. Forge, Anthony (ed.). London, Oxford
University, 4 (193-220).
NEWTON, Dolores
1987 Introduo - Cultura material e histria cultural. In: RIBEIRO,
Berta (org.) Suma Etnolgica Brasileira. Vol. 2. Petrpolis, Vozes.
NORDENSKILD, Erland
1930 LArchologie du Bassin de LAmazone. Paris, Les ditions G.
Van Oest.
OLEN, Helaine.
1991 Pottery find rocks archeology. Field Museum curators discovery
dates back 7,000 years. Chicago Tribune, Friday, december 13,
Section 2, p.6.
OLIVEIRA, Lizete Dias de
1993 Iconografia Missioneira: um estudo das imagens das redues
jesutico-guaranis. Dissertao de Mestrado em Histria.
PUC/RS.
PALMATARY, Helen
1949 The pottery of Maraj Island. Transactions of the American
Philosophical Society held at Philadelphia for promoting useful
knowledge. N.S. XXXIX, 3.
PANOFSKY, Erwin
1967 Essais diconologie. Paris, NFR Gallimard.
1979 Significado nas Artes Visuais. So Paulo, perspectiva.
PEIRCE, Charles.
1974 La ciencia de la semitica. Buenos Aires.
1977 Semitica. So Paulo, perspectiva.
PEREIRA Jr, Jos Antero
1948 Comentrios em torno da inscrio rupestre de Itaquati.
Revista do Museu Paulista, NS II (275-285).
PIAGET, Jean
1970 O estruturalismo. So Paulo, Difuso Europia do Livro.
PIGNATARI, Dcio
1981 Semitica da Arte e da Arquitetura. So Paulo, Cultrix.
POPENOE, Hugh
1966 Soil of the humid tropics - some concepts. Assoc. from Tropical
Biology Inc. Bol. n 6.
PORRO, Antnio
1987 O antigo comrcio indgena na Amaznia. Leitura. So
Paulo,5(56) jan (2-3).
1992 Histria Indgena do alto e mdio Amazonas. Sculos XVI a
XVIII. In: CUNHA, Manuela Carneiro da (org). Histria dos ndios
no Brasil. So Paulo, Cia das Letras, Fapesp/SMC.
1993 As crnicas do Rio Amazonas: notas etnohistricas sobre as
antigas populaes indgenas da Amaznia.
Petrpolis, Vozes.
PROUS, Andr
1992 Arqueologia brasileira. Braslia, UNB.
REICHEL-DOLMATOFF
1971 Amazonian Cosmos. The sexual and religious symbolism of the
Tukano indians. Chicago, Univ. of Chicago Press.
RIBEIRO, Berta G.
1985 A arte do tranado dos ndios do Brasil. Um estudo taxonmico.
Belm, Museu Paraense Emlio Goeldi. Rio, Inst. Nacional do
Folclore.
1987a A linguagem simblica da cultura material. Introduo. In:
RIBEIRO, Berta. (org.). Suma Etnolgica brasileira vol. 3.
Petrpolis, Vozes/Finep.
1987b Desenhos semnticos e identidade tnica: o caso Kayab. In:
RIBEIRO,Berta (org.). Suma etnolgica brasileira Vol 3.
Petrpolis, Vozes/Finep.
1988 Dicionrio do Artesanato Indgena. So Paulo, Edusp.
1992 Mitologia: verdades fundamentais e expresso grfica. A
mitologia pictrica dos Desna. In: VIDAL, Lux (org.) Grafismo
indgena: Estudos de Antropologia esttica. So Paulo, Fapesp.
SAHLINS, Marshall
1990 Ilhas de Histria. Rio, Zahar.
SANOJA y VARGAS
1987 La Sociedad Cacical del Valle de Qubor (Estado Lara,
Venezuela). In: DRENNAN e URIBE (eds.). Chiefdoms in the
Americas. Boston, University Press of America.
SCHAFF, Adam
1968 Introduo Semitica. Rio, civilizao brasileira.
SEEGER, Anthony.
1987 Novos horizontes na classificao dos instrumentos musicais.
In: RIBEIRO, Berta (org.). Suma etnolgica brasileira.
Petrpolis, Vozes.
1980 Os ndios e ns. Estudos sobre sociedades tribais brasileiras. Rio,
Campus.
SHEPARD, Anna O.
1976 Ceramics for the archaeologist. Washington. Carnegie institution
of Washington.
SICK, Helmut
1988 Ornitologia brasileira, uma introduo. Braslia, UNB, 3 ed.
SIMES, Mrio F.
1967 Resultados Preliminares de uma prospeco arqueolgica na
regio dos rios Goiapi e Camar (Ilha de Maraj). Atas do
Simpsio sobre a Biota Amaznica. Vol. 2 (Antropologia): (207-
224).
SINOPOLI, Carla M.
1991 Approaches to archaeological ceramics. New York and London,
Plenun Press.
STADEN, Hans.
1974 Duas viagens ao Brasil. Belo Horizonte, Itatiaia. So Paulo,
Edusp.
TARBLE, Kay
1982 Comparacin estilstica de dos colecciones cermicas del
noroeste de Venezuela: una nueva metodologa. Caracas.
VIDAL, Lux
1992 Grafismo indgena: Estudos de Antropologia esttica. So Paulo,
Fapesp.
WASSN, Henry.
1934 The frog in Indian Mythology and Imaginative World. Anthropos
XXIX. Wien, (613-658).
WILDI, Tom.
1954 Carta para a famlia. Belm, 25/09/54.
1957 Carta a Mrio Guimares, 31/10/57.
1960 Impresses sobre a Arte Marajoara. Texto datilografado,
dez/1960
1964 Carta a Napoleo Figueiredo. Belm, 04/07/64.
1965 Cartas a Dilermando, 07/08/55, 21/06/60 e 04/07/65.
s/d Recordaes de uma viagem. Palestra.
WILLEY, Gordon R.
1987 Cermica. In: RIBEIRO, Berta (org.). Suma Etnolgica Brasileira.
Vol. 2. Petrpolis, Vozes.
YOFFEE, Norman
1994 Caciques demais? (ou, textos seguros para os anos 90). II
Workshop de Mtodos arqueolgicos e Gerenciamento de Bens
Culturais. Florianpolis, II Coordenadoria Regional do Instituto
Brasileiro do Patrimnio Nacional.