Jornal Do Brasil - Cultura - O Baú Pornô de Kafka
Jornal Do Brasil - Cultura - O Baú Pornô de Kafka
Jornal Do Brasil - Cultura - O Baú Pornô de Kafka
Cultura
28/08/2008 s 00h50 - Atualizada em 24/10/2011 s 23h50
O ba porn de Kafka
Jornal do Brasil
RIO - Quando se fala em Franz Kafka, o autor tcheco que se tornou smbolo da angstia moderna, logo
vem mente o sujeito plido, melanclico, olhando tristemente para a cmera nas velhas fotos em preto-e-
branco que lhe sobreviveram. Desde sua morte, em 1924, a posteridade tratou de moldar no imaginrio
coletivo as caractersticas bsicas do mito kafkiano: solitrio, atormentado, puritano e alheio glria
literria. Afinal, s um escritor com esse perfil poderia imaginar obras como A metamorfose e O processo.
Disseminados durante dcadas pelos estudiosos, os esteretipos, no entanto, estariam longe de
corresponder realidade. ao menos o que tenta provar o livro Excavating Kafka, do professor, escritor e
arquelogo ingls James Hawes. Lanada este ms na Inglaterra, a obra vem causando polmica por
retratar um Kafka alegre, bomio, extremamente socivel e, ainda por cima, consumidor de pornografia.
A mitologia romntica criou a idia de que o grande artista sempre deve ser o desconhecido, o pobre, o
infeliz, aquele que encontra inspirao apenas em seu corao, em oposio cultural ao seu tempo afirma
Hawes, em entrevista ao Jornal do Brasil. O K-myth , como eu chamo a mitologia kafkiana, corresponde
em cada detalhe a essas caractersticas. Mas no tem relao alguma com a verdadeira vida de Kafka.
Vivendo com os pais (uma famlia judia abastada), tinha um trabalho tranqilo: o expediente durava no
mais do que seis horas por dia, o que lhe deixava tempo de sobra para dedicar-se literatura. Hawes
tambm afirma que Kafka no era um escritor obscuro em seu tempo. Chegou a ganhar um prmio literrio
antes de completar 30 anos, alm de publicar alguns artigos no Dirio de Praga, em 1918.
Outras mentiras, de acordo com Hawes, envolvem os problemas romnticos de Kafka e sua atitude,
digamos, comportada em relao ao sexo. Longe do sacrossanto assexuado que alguns apresentam, teria
sido um vido freqentador de bares e prostitutas em Praga. Alis, o livro do professor britnico revela,
pela primeira vez, um achado recente: o ba porn de Kafka.
Trata-se de uma coleo de revistas erticas das quais o autor era assinante. Descobertas pelo prprio
Hawes entre a British Library de Londres e o Bodleian de Oxford, exibem desenhos explcitos de animais
praticando felao, lsbicas trocando carcias e outras imagens proibidas para menores.
http://www.jb.com.br/cultura/noticias/2008/08/28/o-bau-porno-de-kafka/ 1/2
29/08/2017 Jornal do Brasil - Cultura - O ba porn de Kafka
Quando comecei esse trabalho, no fazia idia da existncia dessas revistas ressalta Hawes. Mas o mais
importante que todos esses dados, as prostitutas, o xito crtico contemporneo e at mesmo a
pornografia, j eram conhecidos pelos estudiosos. S que ningum falava disso com clareza.
Acusaes de anti-semitismo
Para Hawes, a sacralizao de Kafka foi construda progressivamente por diversos agentes, para quem o
escritor deveria soar mais como um horrendo e enfastiante sub-Sartre , e no como o criador de comdias
negras sobre a sociedade muito prximas dos contos de Dostoievski que sempre foi. Ironicamente, o autor
acaba batendo forte no meio acadmico, pelo qual sempre circulou, tanto como pesquisador quanto como
escritor.
O primeiro a tentar construir essa falsa imagem de Kafka foi seu grande amigo e editor Max Brod denuncia.
Mais tarde, foi a vez dos crticos alemes: depois da Segunda Guerra Mundial, era necessrio descobrir
um escritor de lngua alem livre de todas sombras da histria moderna daquele pas. Esses crticos no
queriam saber que Kafka era filho de famlia rica, bem conhecido entre seus colegas artsticos e alto e leal
funcionrio do Estado Habsburgo at o fim! Afinal, quem se importava com isso?
Em sua profanao ao K-myth , Hawes chega a questionar a prpria conscincia judia do artista: Kafka, o
visionrio que, fechado em seu quarto, profetizou o Holocausto, seria um produto da cultura alem, com a
qual se fundia com perfeio. A idia estraga a velha teoria fundada em torno da inadequao cultural,
literria e social de Kafka, o que garantiu uma acusao de anti-semitismo. Acadmicos alemes tambm
atacaram Hawes, reclamando do sensacionalismo de sua tese.
Essa idiotice sobre anti-semitismo foi dita por apenas uma jornalista americana que vive em Berlim. O
jornal alemo onde foi publicada essa mentira, Der Spiegel, chegou a se desculpar e mudar seu website.
Quanto ao resto... Bom, como eu disse no livro, o retrato quase santo de Kafka como um tesouro de
igreja: proibido de tocar, preciso crer!
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