65P - Impacto Da Crise Financeira em Moçambique
65P - Impacto Da Crise Financeira em Moçambique
65P - Impacto Da Crise Financeira em Moçambique
por
Félix Simione
1
num plano teórico; na secção 4 é discutido o potencial impacto da crise em Moçambique
à luz de algumas características económicas do país; na secção 5 é apresentado o impacto
da crise sobre a economia nacional no primeiro semestre de 2009; na secção 6 é discutida
a perspectiva de crescimento no médio prazo face a crise mundial. O trabalho termina
com conclusões e implicações para o papel do governo, na secção 7.
2. Quadro analítico
Neste trabalho assume-se que a crise económica mundial afectará todos os sectores
produtivos, com a magnitude do impacto em cada sector dependendo de (i) exposição do
sector ao ciclo de negócios global e (ii) correlação entre o ciclo de negócios do sector e o
ciclo de negócios global. O indicador adoptado para captar a exposição de determinado
sector ao ciclo de negócios global é o peso das exportações do sector no total da
produção sectorial, excepto para os sectores do turismo, transportes de passageiros e
serviços financeiros. Para o sector do turismo, o indicador usado é a proporção de turistas
estrangeiros no total de turistas que visitam o país e, para o sector de transporte de
passageiros, a proporção de passageiros internacionais no total de passageiros
transportados no país. Para o sector dos serviços financeiros, o indicador resulta da média
de dois rácios: o crédito em USD no total do crédito à economia e os depósitos em USD
no total dos depósitos na economia.
O indicador adoptado para captar a correlação entre os ciclos de negócios dos sectores e o
ciclo de negócios global foi o coeficiente de correlação (simples) entre as exportações
dos sectores e o rendimento mundial, excepto para os sectores do turismo, transportes de
passageiros e serviços financeiros. Para estes sectores, os indicadores usados foram,
respectivamente, as correlações entre (i) o número de turistas estrangeiros em
Moçambique e o rendimento mundial, (ii) o número de passageiros internacionais em
Moçambique e o rendimento mundial e (iii) a taxa de juro para crédito em USD em
Moçambique e a taxa LIBOR.
2
quatro quadrantes, onde são identificadas três zonas: (i) zona de alta probabilidade de
choque, caracterizada por alta exposição sectorial e alta correlação com o ciclo de
negócios mundial, (ii) zona de baixa probabilidade de choque, caracterizada por baixa
exposição sectorial e baixa correlação com o ciclo de negócios mundial e (iii) zona de
moderada probabilidade de choque, caracterizada por alta (baixa) exposição sectorial e
baixa (alta) correlação com o ciclo de negócios mundial. Tais zonas, apesar de não
indicarem a probabilidade exacta com que a crise mundial afectará determinando sector,
permitem identificar sectores mais vulneráveis a crises económicas externas. Jones et al.
(2008) discutem vulnerabilidade a crise económica mundial, baseando-se na estimação de
probabilidades. No entanto, devido a constrangimentos nos dados disponíveis, neste
trabalho não são estimadas probabilidades de impacto sectorial.
A identificação dos sectores mais vulneráveis permitiu estimar o impacto da crise sobre o
PIB considerando três cenários: (i) se a crise afectar todos os sectores, sem medidas de
mitigação, (ii) se a crise afectar apenas os sectores mais vulneráveis, sem medidas de
mitigação e (iii) se a crise afectar apenas os sectores mais vulneráveis, com medidas de
mitigação. Para estimar tal impacto começou-se por definir a taxa de crescimento do PIB
como uma soma ponderada do produto das taxas de crescimento sectoriais e o peso dos
respectivos sectores no PIB, ou seja,
1
1 , 1 , 1, 1
PIB 1 1
1 1
3
Seja hi um choque exógeno sobre o crescimento do sector i (ex., oriundo da crise
económica mundial) e θ a magnitude do choque. Então, o impacto da crise mundial sobre
o PIB pode ser estimado fazendo
Como em muitos outros países, nenhum dos valores extremos de θ adequa-se a economia
moçambicana porque (i) o grau de abertura da economia moçambicana é relativamente
alto, pelo que θ > 0; e (ii) apesar de (i), o mercado financeiro nacional está pouco
integrado no mercado internacional, pelo que θ < 1. Isso implica que o valor de θ está
1
1991-2008 é o período para o qual as taxas de crescimento anuais do PIB estão disponíveis em
Moçambique.
4
entre zero e um, sendo o seu valor exacto uma questão empírica. Usando o trabalho
empírico de Akin e Kose (2007), assumiu-se que θ = 0.45, ou seja, 45% dos choques
sobre o crescimento da economia mundial serão repassados para o crescimento da
economia moçambicana2. Akin e Kose (2007) constataram que 35% a 45% dos choques
que ocorrem no ciclo de negócios das economias desenvolvidas são repassados para as
economias em desenvolvimento. Por forma a proceder a uma estimativa mais
conservadora do impacto, adoptou-se o limite superior, 45%.
Com base nas perspectivas de crescimento do PIB no médio prazo, procurou-se prever o
potencial impacto sobre o sector fiscal. Para prever o impacto da desaceleração do PIB
sobre a arrecadação de receitas fiscais no médio prazo foi adoptado o critério da taxa
marginal efectiva. Este critério permite estimar a variação da receita decorrente da
variação do PIB, dada a taxa marginal efectiva. A taxa marginal efectiva foi computada
usando os dados do PIB e da receita do estado para o período 2002-2008. Com recurso a
ferramenta Quadro Macro do Ministério da Planificação e Desenvolvimento, simulou-se
o impacto da desaceleração do PIB sobre as exportações, importações e balança
comercial moçambicanas no médio prazo, dadas as taxas de crescimento da economia
nacional e mundial, a taxa de câmbio MT/USD e o índice de preços mundial. A previsão
dos indicadores do sistema bancário no médio prazo esta fora do escopo deste trabalho.
2
Note que o pressuposto subjacente é que o choque na economia mundial equipara-se ao choque histórico
na economia nacional, medido pelo desvio padrão histórico das taxas de crescimento. Embora simplista,
este pressuposto é razoavelmente realista na medida em que baseia-se nos choques históricos da economia
nacional.
5
Indisponibilidade de dados e problemas metodológicos limitam a análise do impacto da
crise económica mundial sobre a economia moçambicana. Por um lado, dados
disponíveis são altamente agregados, o que inviabiliza análises mais profundas e
detalhadas. Por outro lado, a crise económica mundial é um de entre vários eventos
económicos que ocorreram durante o período em análise, o que torna difícil isolar
precisamente o impacto da crise. Ciente destes constrangimentos, o impacto
macroeconómico da crise neste trabalho é discutido comparando agregados
macroeconómicos em dois períodos distintos – o primeiro semestre de 2008 (período
antes da crise financeira se alastrar internacionalmente em Setembro de 2008) e o
segundo semestre de 2009 (período após a crise se alastrar). Portanto, as variações
macroeconómicas entre os dois períodos devem ser interpretadas como “variações em
contexto de crise” e não como “variações resultantes exclusivamente da crise”. Sempre
que factores extra-crise tiverem determinado algumas variações macroeconómicas,
referências serão feitas este facto.
6
3.1. Efeito sobre o financiamento
A crise económica mundial poderá estreitar as fontes de financiamento das EED. Uma
dessas fontes é o investimento directo estrangeiro (IDE), factor impulsionador do
crescimento em muitas EED. A hipótese de retracção do IDE é plausível na medida em
que, em situações de crise, é comum observar mudanças de comportamento dos
investidores no sentido de adoptar abordagens mais aversas ao risco. Esta aversão ao
risco poderá levar a um aumento persistente dos custos de financiamento no mercado
internacional. A evidencia da crise asiática de 1997 sugere que o efeito da crise sobre o
financiamento poderá durar para alem do curto prazo. Após a crise asiática de 1997, o
influxo de capital liquido privado para as economias emergentes e em desenvolvimento
entre 1997 e 2006 permaneceu abaixo dos seus níveis de 1996 (Jones et al., 2008).
Com efeito, as finanças internacionais ainda estão sob pressão e espera-se que assim
persistam pelo menos até 2010 (WEO, Abril 2009). Por conseguinte, as previsões
apontam para a redução do credito ao sector privado nas economias desenvolvidas (ED)
em 2009 e 2010, o que poderá reduzir o acesso das EED ao financiamento externo em
2009 e 2010 (WEO, Abril 2009). A África do Sul e a Índia são exemplos de países onde
alguns investimentos de grande escala não arrancaram devido a dificuldades de
financiamento no mercado internacional (te Velde, 2008). Por outro lado, num contexto
de escassez de capital, as decisões do IDE tornam-se ainda mais sensíveis ao risco
associado aos países receptores. Isto implica que, com a actual crise, o capital poderá
fluir menos ainda para EED com alto risco de retorno, caso de muitos países africanos.
Por outro lado, a escassez de liquidez no mercado financeiro internacional poderá impor
aos bancos comerciais a necessidade de racionalização do crédito. Tipicamente, a
racionalização do credito leva a priorização de crédito a investimentos de curto prazo,
dada a rapidez e previsibilidade com que o mesmo pode ser reavisto. Isso sugere que, os
projectos de investimento público nas EED, por serem tipicamente de longo prazo,
poderão enfrentar constrangimentos na mobilização de financiamento.
7
A grande dependência das EED da ajuda externa é outro factor que as poderá tornar
severamente afectadas pela crise económica mundial. A queda das receitas fiscais
causada pela desaceleração da actividade económica em muitas ED e os pacotes de
estimulo tem estado a aumentar a competição pelos escassos recursos orçamentais e a
afectar a decisão sobre o alocação dos recursos nacionais (Nanto, 2009). Com a actual
crise, há pressão para que as ED reduzam seu orçamento de ajuda devido a deteriorada
posição fiscal em que se encontram e aos problemas de dívida pública que enfrentam. O
Reino Unido, um dos maiores doadores nas EED, é um dos países que tem enfrentado
pressão para reduzir seu orçamento de ajuda (te Velde, 2008).
Evidencias do efeito de crises sobre a ajuda externa são significativas na literatura. Por
exemplo, Roodman (2008) mostra que as crises que afectaram a Finlândia, Japão,
Noruega e Suécia nas décadas 80 e 90 foram seguidas de substancial declínio de ajuda
externa, variando de 10% na Noruega a 62% na Finlândia. Cálculos recentes baseados em
todos os países doadores que sofreram crises bancárias nos últimos trinta anos suportam a
existência de correlação positiva entre ocorrência de crises bancárias e queda de influxos
de ajuda oficial ao desenvolvimento – no ano da crise, a ajuda media declina em 1%, no
ano seguinte a queda cumulativa ascende aos 4% e no quinto ano 30% (UNCTAD,
Março 2009).
8
Por outro lado, a recessão da economia global e a consequente contracção da demanda
têm colocado pressões deflacionárias sobre os preços de commodities no mercado
internacional. Dado que as EED exportadores de commodities são tomadoras de preço,
suas exportações serão valoradas a preços mais baixos, levando a queda do seu valor –
efeito preço. A conjugação dos efeitos volume e preço sobre as exportações poderá
deteriorar o défice da balança comercial em muitas EED.
3
Para a importância das remessas nas EED, veja por exemplo Addison (2004) para o caso do Ghana. Nesse
pais, o influxo de remessas de emigrantes mostrou-se mais estável e maior que a ajuda externa e o IDE
durante o período 1990-2003. Por outro lado, as remessas cresceram mais do que proporcionalmente que o
PIB e as receitas de exportação.
9
4. Implicações económicas para Moçambique
4
O grau de abertura é normalmente calculado como o peso da soma de exportações e importações no PIB.
Os cálculos basearam-se em dados referentes ao ano 2008 (a preços constantes) do Instituto Nacional de
Estatística.
5
EUA - Estados Unidos da América.
10
Gráfico 1 - Moçambique: índice de concentração
das exportações por mercado (HH index),
.5
.4
todos mercados
excluindo paises desenvolvidos
.3
.2
.1
.0
Fonte: Cálculos do autor com base em dados do Anuário
Estatístico de 2007 (INE)
Por outro lado, alguns produtos que Moçambique exporta (casos de camarão, amêndoa e
castanha de cajú, e tabaco) apresentam tipicamente uma alta elasticidade ao rendimento.
6
O Fundo Monetario Internacional prevê para 2009 uma queda de 27.9% e 46.4% nos preços internacionais
de commodities (excluindo o petróleo) e petróleo, respectivamente (World Economic Outlook, April 2009).
11
Com a actual perspectiva de que o rendimento mundial decline em 1.3% em 2009 e o das
ED em 3.8%7, as exportações moçambicanas dos produtos acima referidos poderão ser
substancialmente afectadas. Em particular, com a actual perspectiva de que o rendimento
da Índia (principal importador da castanha de Moçambique) desacelere de 7.2% em 2008
para 4.5% em 20098, é provável que o volume de exportação da castanha de cajú registe
uma desaceleração em 2009.
0.8
agricultura
energia
0.6
manufactura
manufactura sem Mozal
extracção
0.4
extracção sem mega-projectos
pescas
todos
0.2
0.0
Fonte: Cálculos do autor com base em dados do Anuário
Estatístico de 2007 (INE)
A fraca diversificação dos produtos de exportação sugere que, com a queda da demanda e
de preços no mercado internacional, a balança comercial não terá capacidade de absorver
o choque. Isto é particularmente verdade no caso de queda de demanda e preço dos
produtos exportados pelos mega-projectos que representam 69.7% das exportações totais.
7
World Economic Outlook (April, 2009)
8
World Economic Outlook (April, 2009)
12
Exposição ao IDE
Em Moçambique, o IDE continua a desempenhar um papel importante para a
dinamização do crescimento, geração de receita e criação de emprego. Cerca de 38% do
total do investimento autorizado em Moçambique em 2008 foi investimento directo.
Deste, cerca de 89% foi IDE9. Excepto no sector da banca e seguros, o IDE superou o
investimento directo nacional (IDN) em todos os sectores de actividade, representando
90.6% no sector da agricultura e agro-indústria, 93.2% na industria e 99.2% nos
transportes e comunicações. A importância do IDE em Moçambique é tal que seu influxo
determina a posição financeira da balança de pagamentos (Tabela 1).
9
Cifra calculada com base em dados do Centro de Promoção de Investimentos, referentes a projectos de
investimento autorizados no ano 2008.
13
alto peso nos sectores da agricultura, industria e transportes, pode ter impacto
significativo sobre o crescimento do PIB.
Gráfico 3: Fontes de recursos para o orçamento do estado
(%), Moçambique 2008
13.9
Receitas do estado
Empréstimos internos
29.9 55.7 Donativos
Empréstimos externos
0.5
A dependência nos fundos externos é tal que, no orçamento do estado de 2008, previa-se
que os donativos financiassem cerca de 68% do défice global e os empréstimos externos
cerca de 32%. Este facto torna o orçamento do estado vulnerável a conjuntura económica
nos países doadores. Uma vez que alguns países doadores estabelecem os níveis de ajuda
externa como uma percentagem do PIB, a queda do PIB naqueles países pode implicar
uma redução nos níveis de ajuda10. Esta é uma hipótese preocupante para Moçambique na
medida em que todos os seus doadores prevêem para o ano 2009 uma recessão, com
recuperação gradual a partir de 2010.
A recessão esperada nos doadores de Moçambique sugere que suas receitas fiscais
poderão baixar ou desacelerar. Este facto, associado ao custo com os pacotes de estímulo
10
Para discussão sobre o impacto de crises na ajuda externa, veja por exemplo UNCTAD (Março, 2009)
14
a economia que vem sendo desenhados naqueles países, poderá aumentar a pressão para
alocação de recursos a nível nacional, deixando menos recursos disponíveis para ajuda
externa. O Reino Unido, que em Moçambique concentra cerca de 23% do total de
donativos para programas, e a União Europeia (22%), são alguns dos países que têm
enfrentado pressão para reduzir seu orçamento de ajuda (te Velde, 2008).
Por outro lado, a potencial redução dos montantes de ajuda externa pode ser agravada
pela depreciação que tem sido constatada em muitas moedas dos países doadores em
relação ao Dólar americano (USD). O orçamento de ajuda é frequentemente fixado em
moeda doméstica; e se tal moeda se deprecia em relação a moeda do país beneficiário da
ajuda, o valor da ajuda, medido na moeda do país beneficiário, também reduz
(UNCTAD, Março 2009).
11
Cifra calculada com base no Relatório de Execução do Orçamento do Estado de 2008.
15
emprego nos países de destino e (ii) redução do volume de remessas por migrante,
causada pela desaceleração da economia dos países de destino. Contudo, o declínio das
remessas de emigrantes não é susceptível de deteriorar significativamente o défice da
conta corrente em Moçambique. Dados da balança de pagamentos de 2007 sugerem que,
apesar das remessas de trabalhadores constituírem cerca de 35%12 das receitas que
Moçambique capta pela cedência de seus factores produtivos ao exterior, as mesmas
representam apenas 0.8% das transferências correntes, contra 86% para o caso dos
donativos. Isso sugere que as transferências de trabalhadores, embora sejam importantes
para muitas famílias rurais, não constituem um factor de risco para o défice da conta
corrente13.
12
Cifra calcalada com base em dados da Balança de Pagamentos de 2007 (Banco de Moçambique).
13
Em países como Ghana, as remessas de emigrantes excedem os fluxos de ajuda externa e de outras
transferências privadas. Addison (2004) apresenta uma discussão extensiva para o caso do Ghana. Neste
país, um choque sobre as transferências de trabalhadores é susceptível de agravar significativamente o
défice da conta corrente.
14
Excepto para os sectores de turismo, transportes e serviços financeiros. Para estes sectores o indicador
usado foi, respectivamente, a proporção de turistas estrangeiros no total de turistas que visitam o país, a
proporção de passageiros internacionais no total de passageiros transportados no país, e o crédito em USD
no total do crédito à economia mais os depósitos em USD no total dos depósitos na economia.
16
exportações sectoriais e o ciclo de negócios internacional, medido pelo coeficiente de
correlação entre as exportações sectoriais e o PIB mundial15.
Gráfico 4: Mapeamento de vulnerabilidade sectorial
1
transp. pass. manufactura
man. exc. Mozal electricidade minas
turismo
agricultura serviços
financeiros
Correlação com o
II I
ciclo de negócios 0.5
mundial
III IV
pescas
0
0 0.5 1
Sectores que caem no quadrante III do diagrama podem ser interpretados como sendo os
mais vulneráveis a choques na demanda externa, dado o peso relativamente elevado das
suas exportações na produção sectorial e a alta correlação entre as suas exportações e o
rendimento mundial. Por razoes contrarias, sectores do quadrante I podem ser
interpretados como sendo os menos vulneráveis. Os quadrantes II e IV denotam uma
vulnerabilidade menor que do quadrante III, dada a sua baixa correlação com o ciclo de
negócios mundial e baixa exposição a choques internacionais, respectivamente.
15
Excepto para os sectores de turismo, transportes e serviços financeiros. Para estes sectores o indicador
usado foi, respectivamente, a correlação entre (i) o número de turistas estrangeiros em Moçambique e o
rendimento mundial, (ii) o número de passageiros internacionais em Moçambique e o rendimento mundial
e (iii) a taxa de juro para crédito em USD em Moçambique e a taxa LIBOR.
17
Os sectores que caem na zona de alta vulnerabilidade são a indústria manufactureira,
industria mineira, turismo e electricidade e água. Estes sectores apresentam altos níveis
de exposição a demanda externa, dado que o peso das suas exportações na produção
sectorial é relativamente alto. Por outro lado, o volume das exportações dos referidos
sectores é altamente pro-cíclico, i.e., cresce em períodos de expansão económica mundial
e decresce em períodos de recessão. Este facto é suportado pelo alto coeficiente de
correlação positivo entre as exportações dos respectivos sectores e o rendimento global.
Este facto, não sendo um mal em si, sugere que qualquer choque que ocorra nos
mercados de exportação poderá ser transmitido aqueles sectores com impacto maior do
que nos restantes sectores.
16
Isso nao implica que os produtos nacionais agrícolas de exportação (algodão, tabaco, castanha de cajú,
etc.) não serão afectados pela queda da demanda mundial.
18
O sector das pescas (quadrante II) também apresenta uma vulnerabilidade reduzida, visto
que, apesar de estar altamente exposto ao ciclo de negócios global, mostra-se pouco
correlacionado com o mesmo.
A soma dos valores das duas variáveis do gráfico 6, exposição e correlação, ponderando
cada uma por 50%, permitiu construir um índice simples de vulnerabilidade dos sectores
(gráfico em Anexo A). Tal índice aponta, uma vez mais, para os sectores da industria
(transformadora e mineira) e turismo como sendo os mais vulneráveis a crise económica
mundial; e os sectores das pescas, agricultura e serviços financeiros como sendo os
menos vulneráveis.
17
Os problemas e dados apresentados nesta secção devem ser interpretados com cautela porque alguns
problemas ocorridos no prineiro semestre de 2009 não são consequências directas da crise mas, de certa
forma, derivam da conturbada conjuntura internacional.
19
2009, registaram-se casos de despedimentos colectivos por motivos estruturais e de
mercado. Tais despedimentos ocorreram não só em mega-projectos, mas também em
empresas de menor escala.
18
Até Abril de 2009, este processo aguardava desfecho do processo negocial em curso naquela empresa, o
qual iria determinar quantos trabalhadores seriam efectivamente despedidos e os demais detalhes do
processo.
20
Table 2: Firmas afectadas pela crise económica mundial, Moçambique,
primeiro semestre de 2009
Empresa Província Sector Problema Despedimentos
Africa Wood Maputo Manufactura Preço de exportação 12
ECL* Maputo Manufactura Queda de demanda 20
Kemp Smelp* Maputo Manufactura Queda de demanda 36
Mozal Maputo Manufactura Preço de exportação 45
Rafia Bagff* Maputo Manufactura Queda de demanda 84
Tipografia ABC Maputo Manufactura ‐‐‐ 80
Highland African Mining Compa Zambézia Minas Financiamento 314
Barra Reef Inhambane Turismo Queda de demanda 42
Montanha Lodge Inhambane Turismo Queda de demanda 3
Marlin Lodge Inhambane Turismo Queda de demanda 33
Vilanculo Madeira Inhambane Turismo Queda de demanda 5
Macolo Bay Inhambane Turismo Queda de demanda 5
Farol da Barra Inhambane Turismo Queda de demanda 5
Sun Set Lodge Inhambane Turismo Queda de demanda 8
Terra Firme Inhambane Turismo Queda de demanda 3
Sociedade Tofo Scuba Inhambane Turismo Queda de demanda 2
Aquapesca ‐‐‐ Pescas ‐‐‐ 10
Mulep Maputo Serviços ‐‐‐ 30
PSI Jeito Maputo Serviços Financiamento 15
Actionad ‐‐‐ Serviços ‐‐‐ 25
Hiefer Internacional ‐‐‐ Serviços ‐‐‐ 9
Sabie Game Park ‐‐‐ Turismo ‐‐‐ 51
Arcelor Mitall Maputo Manufactura Queda de demanda 0
Ferpinta Moçambique Maputo Manufactura Preço de exportação 0
Associação Artes Mondlane Maputo Manufactura Demanda/Financiamento 0
The Maputo Clothing Company Maputo Manufactura Queda de demanda 0
Kanes Maputo Manufactura Queda de demanda 0
Southern Refinary ‐‐‐ Manufactura Risco de Preço 0
Facobol Maputo Manufactura Financiamento 0
Fasorel ‐‐‐ Manufactura Queda de demanda 0
SABIMO Maputo Manufactura Risco de Preço/Financ. 0
Total 837
* indica companhias que prestam serviços a Mozal
Fonte: GASI (n. 2, n. 4)
Cumpre notar que nem todas empresas afectadas pela crise recorreram a diminuição de
sua mão de obra. A empresa metalúrgica Arcelor Mittal South Africa, localizada no
parque industrial de Beleluane, encerrou temporariamente a sua actividade sem despedir
os cerca de 350 trabalhadores. Adicionalmente, esta empresa adiou o seu projecto de
construção de uma nova fabrica metalúrgica no parque industrial de Beluluane devido ao
ambiente de incerteza na economia mundial.
21
Os despedimentos de trabalhadores face a retracção da actividade económica ocorreram
também no sector do turismo, resultado da redução do fluxo de turistas. Na Província de
Inhambane, registaram-se casos de despedimentos colectivos em nove estabelecimentos
do sector do turismo, tendo afectado cento e seis trabalhadores (tabela 2). Na província de
Cabo Delgado, o sector do turismo ressentiu-se igualmente da queda da procura.
Informação do Ministério da Agricultura (MINAG) sugere que alguns estabelecimentos
da província têm registado adiamentos e cancelamentos de actividade de safaris por parte
de seus clientes, predominantemente norte-americanos. Por exemplo, a empresa Ntsewa
Lda. teve que baixar em 17% as suas tarifas diárias, por forma a mitigar a redução da
demanda por safaris. Uma outra empresa, a Mozunaf Safaris, registou uma queda de
cerca de 67% na venda de safaris, alegadamente devido a redução da demanda.
22
cuja proposta em Março de 2008 representava uma queda de 18% em relação a campanha
anterior (MINAG).
As taxas de crescimento por sector no primeiro semestre de 2009 permitem ter uma
perspectiva geral da actividade económica nacional no actual ambiente de crise. Com
excepção da agricultura, manufactura, electricidade e água e serviços financeiros, todos
os sectores registaram desaceleração no crescimento durante o primeiro semestre de 2009
(Gráfico 5).
G r á f i c o 5 : C r e s c i m e n t o r e a l d o v a l o r a c r e s c e n ta d o ( % )
25
2 1 .4
1 9 .9
20
15 1 3 .6
1 2 .4
1 1 .0 1 0 .8 1 1 .0
9 .3 9 .3
10 8 .3
7 .1 7 .5
6 .1 7 .2
5 .4 5 .4
5 3 .2 2 .6
3 .1
2 .2
0 .7 0 .3
0
‐5 ‐3 . 8
‐6 . 8
‐1 0 ‐8 . 2
‐1 3 . 0
‐1 5
2008 1o s e m e s tre 2009 1o s e m e s tre
Como seria de esperar, os sectores identificados como sendo mais vulneráveis (os do
quadrante IV no gráfico 4) são os que registaram maior desaceleração. O valor
acrescentado da indústria transformadora caiu em 2.3% no primeiro trimestre, mas a
recuperação verificada no segundo trimestre permitiu que o sector crescesse em 3.2% no
primeiro semestre. Esse performance é, de certa forma, contrário as expectativas, uma
vez que a previsão apontava para a queda da produção da indústria transformadora
devido ao desincentivo dos preços de exportação e a queda da demanda externa. A
23
manutenção dos níveis de produção da Mozal e a entrada em funcionamento de novas
indústrias na área de bebidas podem ter contribuído para tal performance. O sector do
turismo (hotéis e restaurantes) registou uma queda de 8.2%, contra um crescimento de
2.2% registado em 2008. A retracção da demanda por turismo por turistas estrangeiros
contribuiu para tal queda. A indústria extractiva registou uma desaceleração no
crescimento, de 13.6% em 2008 para 8.3% em 2009. O encerramento da empresa
Highland African Mining Company devido a falta de pré-financiamento das suas
exportações no mercado internacional pode ter contribuído significativamente para tal.
19
Halbufeira de Cahora Bassa.
24
que se gerou na África do Sul em 2008; e (ii) a entrada em funcionamento do 4º
gerador da HCB em 2009 acelerou o ritmo de produção;
• O sistema financeiro moçambicano, por estar pouco integrado no sistema
financeiro internacional, é geralmente pouco afectado pelos choques financeiros
internacionais.
25
Gráfico 6: Crescimento real das receitas do estado (%)
25 21.2
20 17.1
15.1 15.7 15.3
13.2 14.1
15
8.7 9.5 9.4
10 6.0
5
0.6
0
Total de Receitas Impostos Impostos Operacoes Operacoes
receitas do fiscais sobre sobre bens internas externas
estado rendimento e servicos
2008 1o semestre 2009 1o semestre
Fonte: REO (Junho, 2009)
26
Gráfico 7: Crescimento real (%) das receitas
arrecadadas dos mega‐projectos no primeiro
semestre de 2009
60
37.9
40
20
0
‐20 Producao de Exploracao de Exploracao de Outros Total
energia petroleo recursos mega‐projectos
‐40 minerais
‐60
‐59.9 ‐60.5
‐80
‐100 ‐89.9 ‐84.6
Por outro lado, contrariando a expectativa de que a crise económica mundial iria
restringir as fontes de financiamento externo para Moçambique, o valor do financiamento
externo do OE no primeiro semestre de 2009 cresceu em 14.3% em termos nominais,
reflectindo o crescimento dos donativos em 6.7% e dos empréstimos externos em 36.9%
(Gráfico 8). Contudo, mesmo que o financiamento externo tenha crescido, seu
crescimento desacelerou de forma acentuada, de 37.9% em 2008 para 14.3% em 2009.
Esta desaceleração foi resultado da desaceleração verificada nos donativos para projectos
de investimento. Embora a desaceleração dos donativos não seja somente consequência
da crise económica mundial, os desembolsos de alguns doadores foram afectados pela
crise. Por exemplo, em Março a Irlanda havia adiado seu desembolso mensal por se
encontrar a avaliar o impacto da crise sobre a sua economia.
27
Gráfico 8: Crescimento nominal (% ) do
financiamento externo do OE
50 44.5
37.9 36.9
40
30 21.3
20 14.3
10 6.7
0
Financiamento Donativos Emprestimos
externo total
2008 1o semestre 2009 1o semestre
Em suma, o desempenho do sector fiscal não foi significativamente afectado pela crise
económica mundial em termos de colecta de receitas, uma vez que as fontes de
financiamento do OE permaneceram estáveis até ao final do primeiro semestre de 2009.
A tabela em Anexo D apresenta as taxas de realização do programa orçamental em 2008 e
2009, donde nota-se que o cumprimento do programa fiscal não difere significativamente
entre os dois anos, sugerindo uma estabilidade na performance fiscal.
28
cujo peso sobre as exportações totais ascende aos 62%, foi o maior determinante da
queda das exportações. Do mesmo modo, as importações decresceram em cerca de14%,
determinado pela queda do valor das importações de combustíveis.
5.4
%
0.8
0
Exportações Importações Balanca Conta corrente Saldo global
comercial
‐10 ‐9.5
‐10.7 ‐11.9
‐13.8
‐20
‐18.8
‐30
‐40
‐39.3
2008 1o semestre 2009 1o semestre
20
Para o caso do gráfico 13, o PIB sem mega-projectos foi estimado assumindo que o peso dos mega-
projectos no PIB eh 10.1% (Sonne-Schmidt et al. 2009).
29
A conta corrente também ressentiu-se da redução das transferências correntes. Estas,
apesar do aumento das transferências de trabalhadores e outras transferências privadas,
caíram em 6.0% em termos nominais, devido principalmente a redução do influxo de
ajuda externa sob forma de donativos21 (Gráfico 10). Em comparação com o primeiro
semestre de 2008, os donativos registaram uma queda de 18.4%, influenciado pela
redução dos donativos ao sector privado.
481
452 446
364
82
42
7
0
21
Note que, conforme foi referido na secção anterior, enquanto que os donativos para o OE aumentaram, os
donativos para a economia como um todo (incluindo o sector privado), conforme captado pela BOP,
reduziram.
22
O IDE excluindo mega-projectos manteve-se relativamente estável, com uma ligeira queda de 2.0%.
30
outras transferências, permitiu melhorar o superavit da conta de capital e financeira em
39.7%.
500 440
394
400
315
300
224 216 201
200 172
143
100
0
Conta de Capital e Conta Capital Conta Financeira Investimento
Financeira Directo em
Moçambique
2008 1o semestre 2009 1o semestre
Portanto, apesar do impacto da crise económica mundial sobre a conta corrente, a BOP
como um todo manteve-se sustentável na medida em que o influxo de capitais externos
na conta de capital e financeira permitiu financiar o défice da conta corrente. Como
resultado, o saldo global da BOP permaneceu superavitário no primeiro semestre, apesar
do superavit ter reduzido como percentagem do PIB de 5.4% em 2008 para 0.8% em
2009. Por conseguinte, mesmo com a conta corrente sob stress, a economia continuou
dispondo de um nível adequado de reservas internacionais (Gráfico 12).
2008 Junho
8 2009 Junho
6
4 5.88
4.58
2
0
Todos Sem mega‐projectos
31
Fonte: Banco de Moçambique
Como ilustra o gráfico acima, até ao final do primeiro semestre de 2009 o stock de
reservas internacionais era suficiente para assegurar 4.6 meses de importações de bens e
serviços não factoriais (incluindo mega-projectos), acima dos 3 meses
convencionalmente recomendados como mínimo23. Este facto sugere que, apesar do
impacto da crise mundial sobre a conta corrente, a BOP continua sustentável, ainda que
tal sustentabilidade seja significativamente assegurada pelo fluxo de capitais externos sob
forma de IDE e ajuda externa.
23
Em Moçambique, tal como na generalidade dos países em desenvolvimento com restrição no fluxo
internacional de capitais e reduzido acesso ao mercado mundial de capitais, o défice da conta corrente é
financiado principalmente através de variações nas reservas internacionais. Um critério para avaliar a
vulnerabilidade é que as reservas tem de ser iguais a pelo menos três meses de importações de bens e
serviços (IMF Institute, 2008).
24
Em inglês maturity mismatch risk. Esse risco surge quando os activos do sistema financeiro são de longo
prazo e as obrigações são de curto prazo, o que reduz a capacidade do sistema satisfazer as suas obrigações
junto dos seus credores na eventualidade de uma corrida aos bancos.
25
Em inglês currency mismatch risk. Esse risco é causado pelas disparidades entre as moedas nas quais os
activos e os passivos estão denominados. Os passivos podem estar denominados em moeda estrangeira,
enquanto os activos estão denominados em moeda doméstica, causando severas perdas quando a moeda
doméstica se deprecia.
32
potencial corrida aos bancos era mais alta no primeiro semestre de 2009 do que no
período homologo de 2008.
0 .6
0 .4
0 .2
0 .0
M ar ‐0 8 M ai‐0 8 Ju l‐0 8 Se t‐0 8 No v‐0 8 Jan‐0 9 M ar ‐0 9 M ai‐0 9
Por outro lado, mesmo com a acentuada depreciação que o Metical vem sofrendo face ao
Dólar, a estrutura monetária dos créditos e depósitos continuou estável no primeiro
semestre de 2009 – o peso do crédito a economia e dos depósitos denominados em Dólar
manteve-se relativamente constante (veja Anexo F), sugerindo que a actual depreciação
do Metical face ao Dólar não tem afectado significativamente a confiança no Metical. Por
outro lado, apesar da crise económica mundial ter propiciado a cortes nas taxas de juro
33
em muitos países, as taxas de juro de referencia do Banco de Moçambique mantiveram
uma relativa estabilidade até ao final do primeiro semestre (Gráfico 14), o que tornou o
sistema bancário pouco exposto ao risco da taxa de juro e o sector real menos
constrangido no acesso ao crédito.
15
10
0
M ar‐0 8 M ai‐0 8 Ju l‐0 8 Se t‐0 8 No v‐0 8 Jan ‐0 9 M ar ‐0 9 M ai‐0 9
A estabilidade das taxas de juro, aliada a estabilidade do sector real, permitiu que a
alocação do crédito a economia pelo sector bancário continuasse estável. Até ao final do
primeiro semestre o crédito a economia persistia relativamente constante, quer em termos
de crescimento, quer em termos de estrutura (Gráfico 15).
34
Gráfico 15: Estrutura e crescimento do crédito a economia (%)
100
90 Outros
80 Transportes e com.
70
Comércio
60
Turismo
50
Construção
40
Indústria
30
20 Agricultura
10 Crescimento real do crédito
(Março 2008=100)
0
Mar‐08 Jun‐08 Set‐08 Dez‐08 Mar‐09 Jun‐09
Fonte: Banco de Moçambique
35
face aos potenciais desenvolvimentos impostos pela crise económica mundial. A previsão
abarca os sectores real (crescimento do PIB), fiscal (desempenho das receitas do Estado)
e externo (desempenho da balança comercial).
% 8
6 .8
6 .3 6 .6
5 .8 6 .3
6 5 .6
5 .8
4 .8 4 .4
4
2 2 .0
0
2008 2009 2010 2011
se a c rise afe c tar todos os se c tore s, se m mitigaç ão
se a c rise afe c tar ape nas os se c tore s mais vulne ráve is, se m mitigaç ão
se a c rise afe c tar ape nas os se c tore s mais vulne ráve is, com mitigaç ão
36
se mantiver constante, um choque sobre os sectores mais vulneráveis levaria a uma
desaceleração do crescimento do PIB de 6,7% em 2008 para 4,8% em 2009.
Entretanto, é possível que o governo procure mitigar os efeitos negativos da crise para
minimizar a desaceleração do PIB27. Porém, as medidas de mitigação serão limitadas
porque (i) as causas da desaceleração são exógenas (queda da procura e dos preços no
mercado internacional, redução do fluxo de turistas estrangeiros, etc.) e fora do controle
do governo, (ii) o recurso a uma política fiscal anti-cíclica em Moçambique é limitado
pelo exíguo envelope de recursos disponível, pelo que (iii) ainda não há espaço para que
os chamados “estabilizadores automáticos” funcionem. Isso implica que a desaceleração
pode ser minimizada, entre outras, com medidas que estimulem a realização de
investimentos nos sectores mais vulneráveis mesmo na actual situação de crise28. Com a
implementação de tais medidas, um choque sobre os sectores mais vulneráveis levaria a
desaceleração do crescimento de 6,7% em 2008 para 5,8% em 2009. A previsão de
desaceleração do crescimento é consistente com as previsões de outras instituições. Por
exemplo, o Fundo Monetário Internacional também prevê um crescimento menor em
2009, 4.5%, assim como o Economist Intelligence Unit (4.8%). Ambas as instituições
apontam como principal causa da desaceleração o impacto da crise económica mundial
sobre os sectores mais orientados para as exportações.
27
Note que o governo criou o GASI (Grupo de Acompanhamento da Situação Financeira Internacional)
cujo objectivo é, entre outros, assessorar o governo nas eventuais medidas a tomar face a crise mundial.
28
As medidas tomadas para acelerar o IDE da companhia Pepsi Cola e Companhia Vale do Rio Doce em
2009 são disso exemplo.
37
Gráfico 17: Impacto da crise sobre as Receitas do
Estado (2009‐2011)
20
17.8
16.0 16.1 16.4
15 16.3
13.7
10 11.6
10.5
0
2008 2009 2010 2011
% do PIB Crescimento nominal (%)
Assumindo que o crescimento do PIB desacelere de 6.7% em 2008 para 5.8% em 2009
(cenário consistente com o impacto da crise apenas sobre os sectores mais vulneráveis e
com mitigação), implica que o crescimento nominal da receita do estado desacelere de
13.7% em 2008 para 10.5% em 2009. Isso sugere que a receita do estado irá crescer em
apenas 0.1% do PIB em 2009, significativamente abaixo dos 0.5% estabelecidos como
meta anual para Moçambique.
38
Gráfico 18: Impacto da crise sobre as exportações,
importações e balança comercial (2009‐2011)
5000
m ilhões de
38 3 6
U SD 4000 3 4 58 3 6 40
32 2 1
3000 2 65 3 2 63 2 26 7 6
20 38
2000
1 1 83 10 0 8 1 16 1
8 05
1000
0
2008 2009 2010 2011
Exportaçõe s Importações Défice da balança come rcial
Assumindo que a crise afectará apenas os sectores mais vulneráveis e com mitigação,
espera-se que as exportações e importações registem, respectivamente, uma queda
nominal de 23% e 7.0% em 2009, agravando o défice da balança comercial em 47%. O
agravamento do défice da balança comercial poderá gerar pressões sobre a taxa de
câmbio, levando a depreciação da mesma.
39
7. Conclusões e implicações de política
A crise financeira internacional, tendo rapidamente evoluído para uma crise económica
mundial, constitui sem dúvida um desafio para a economia moçambicana. Até ao final do
primeiro semestre de 2009, os efeitos da crise em Moçambique foram mais visíveis no
sector externo. Embora os principais exportadores tenham mantido seus níveis de
produção, a queda de preços internacionais traduziu-se em queda na receita das
exportações, tendo agravado significativamente o défice da balança comercial. O IDE
excluindo mega-projectos também registou uma queda ligeira de 2%.
No sector fiscal, o efeito da crise foi negligenciável. Apesar da desaceleração verificada
nas receitas do estado, seu crescimento continuou robusto. Por outro lado, o
financiamento externo do OE sob forma de donativos e empréstimos cresceu, o que
aliado ao crescimento das receitas fiscais, resultou no crescimento do envelope de
recursos do estado. O efeito da crise também foi negligenciável sobre a saúde do sistema
financeiro nacional. Até ao final do primeiro semestre de 2009, o sector bancário
mostrava-se robusto, com as taxas de juro relativamente estáveis e o crédito a economia
crescente em termos reais.
40
A desaceleração no crescimento da economia no geral e a queda do comércio externo em
particular afectarão provavelmente a arrecadação de receitas fiscais que, ainda que
cresçam, seu crescimento irá desacelerar. Aliado ao facto de que o influxo de ajuda
externa poderá reduzir devido as pressões fiscais que enfrentam os países doadores, a
desaceleração das receitas fiscais implicará necessariamente uma desaceleração no
crescimento dos recursos do estado comparativamente ao ano 2008.
Uma vez que as crises económicas tendem a desacelerar o crescimento das receitas
fiscais e a desaceleração da economia afecta o ritmo de criação de emprego, será
importante encontrar medidas que acelerem a criação de emprego e expandam as fontes
de receitas fiscais. Uma vez mais, a criação de um ambiente de negócios dinâmico que
41
facilite o estabelecimento de pequenas e médias firmas, aliada a reformas conducentes a
expansão da base tributária, é essencial para esse fim.
Referências
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42
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43
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Fonte de dados
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de 2009
• Banco de Moçambique, 2009, Estatísticas de Crédito, disponível em
www.bancomoc.mz
• Banco de Moçambique, Estatísticas de Taxas de Juros, disponível em
www.bancomoc.mz
• Banco de Moçambique, Síntese Monetária do Sistema, disponível em
www.bancomoc.mz
• Centro de Promoção de Investimentos, Investimentos Aprovados em 2008
• Direcção Nacional do Orçamento, Relatórios de Execução do Orçamento do
Estado de 2008 e do Primeiro Semestre de 2009, disponível em
www.dno.gov.mz
• Instituto Nacional de Estatística, 2008, Anuário Estatístico de 2007
• Instituto Nacional de Estatística, 2009, Contas Nacionais de 2008 e do Primeiro
Semestre de 2009, disponível em www.ine.gov.mz
44
ANEXO A
Manufactura
Indústria extractiva
Turismo
Energia
Transp. Passageiros
Serv. financeiros
Man. Sem Mozal
Agricultura
Pescas
ANEXO B
45
ANEXO C
400
300 247
224
200
107 108 122
100 77 59
32
6 13
0
To tal D o nativos D o nativo s D o nativos e m D o n ativos D o nativos
para para p r o j. e spe c ie para p ar a pro g.
p r o gr am as in ve stim e n to me d ic am e ntos e spe c iais
Ajuda externa em creditos (milhoes de USD)
400 352
350
300
250
200 182 181 171
140
150
100
42
50
0
Total Sector publico Sector privado
1o semestre 2008 1o semestre 2009
ANEXO D
T a x a d e r e a l i z a c a o d o p r o g r a m a o r c a m e n ta l (% )
I se m . 2 0 0 8 I se m . 2 0 0 9
R e c u rs o s i n t e rn o s 46.8 4 6.0
R e c e it a s d o e s t a d o 47.2 4 5.6
E m p re s t i m o s in t e rn o s 0.0 10 0.0
R e c u rs o s e x t e rn o s 30.4 3 3.5
D o n a t ivo s 33.4 3 3.0
E m p re s t i m o s 23.9 3 4.8
T o t a l d e re c u rs o s 37.6 3 9.4
D e s p e s a s d e fu n c io n a m e n t o 49.5 4 9.6
D e s p e s a s d e i n ve s t i m e n t o 22.8 2 6.2
C o m p o n e n t e in t e rn a 35.3 3 9.0
C o m p o n e n t e e x t e rn a 18.3 2 1.1
O p e ra c o e s fi n a n c e ira s 21.6 2 2.3
To ta l d e d e s p e s a 34.1 3 6.4
F o n te : R E O Ju n h o d e 2 0 0 9
46
ANEXO E
-40
-41.8
-50
Fonte: Cálculos do autor com base em dados da BOP e INE
47
ANEXO F
Estrutura do crédito a economia (%)
100
80
60
40
20
0
em MT em USD
Fonte: cálculos do autor com base em dados da síntese monetária do sistema (Banco de Moçambique)
Estrutura dos depósitos (%)
100
80
60
40
20
0
em MT em USD
Fonte: cálculos do autor com base em dados da síntese monetária do sistema (Banco de Moçambique)
48
ANEXO G
Cenário 2: Se a crise afectar apenas os sectores de risco e o Governo não tomar medidas de
contenção
Pressupostos:
• 45% dos choques que ocorrem nas economias desenvolvidas são repassados para as
economias em desenvolvimento (Akin e Kose, 2007);
• A crise afectara apenas os sectores de risco;
• A transmissão dos choques diminuirá com o tempo: 45% em 2009, 22.5% em 2010 e
11.25% em 2011.
49