Equipe Multidisciplinar 2018
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TEXTO BASE
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EQUIPE MULTIDISCIPLINAR 2018
CURRÍCULO, MÍDIA E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS:
DESNATURALIZAR REPRESENTAÇÕES NATURALIZADAS
desenvolvimento das ações pedagógicas, considera-se a mídia como segundo um jogo de correlação de forças no qual grupos mais poderosos
produção cultural de massa em diversos meios, como cinema, televisão, [...] atribuem significados aos [destituídos de poder].
literatura, livros didáticos, imprensa e propaganda. A definição de Venício No que se refere ao discurso, Foucault (1997a, p.56) entende como o
“conjunto de saberes e práticas que formam sistematicamente os objetos
Lima, sobre a mídia amplia esse entendimento ao evidenciar a conexão
de que falam”. Nessa mesma linha de pensamento Hall (1997b, p.29) diz que
entre mídia e comunicação, segundo ele mídia pode ser entendida como
o termo discurso refere-se tanto “a produção do conhecimento através da
o conjunto de instituições que utiliza tecnologias específicas para
linguagem [...] quanto ao modo como o conhecimento é institucionalizado,
realizar a comunicação humana. Vale dizer que a mídia implica na modelando práticas sociais e pondo novas em funcionamento”.
existência de um intermediário tecnológico para que a comunicação A definição de currículo escolar abrange distintas concepções
se realize. Concretamente, quando falamos da mídia, estamos teóricas, originárias dos vários modos de como a educação é concebida
nos referindo ao conjunto das emissoras de rádio e de televisão historicamente. Conforme Moreira & Candau (2007, p.18) os fatores sociais,
(aberta e paga), de jornais e de revistas, do cinema e das outras econômicos, políticos e culturais contribuem para que o currículo seja
diversas instituições que utilizam recursos tecnológicos na entendido como:
chamada comunicação de massa (LIMA, 2003, grifo nosso).
(a) os conteúdos a serem ensinados e aprendidos;
(b) as experiências de aprendizagem escolares a serem vividas pelos
O olhar pedagógico para as relações étnico-raciais na mídia significa
alunos;
considerar que a escola é a um só tempo um espaço que aglutina relações (c) os planos pedagógicos elaborados pelos professores, escolas, e
sociais e cognitivas. As relações sociais se consolidam tanto no encontro sistemas educacionais;
entre os estudantes quanto nas relações com a mídia e outros espaços (d) os objetivos a serem alcançados por meio do processo de ensino;
culturais. Isso suscita uma indagação pertinente, sobre qual a relação da (e) os processos de avaliação que terminam por influir nos conteúdos
e nos procedimentos selecionados nos diferentes graus da
escola com outros locais sociais e culturais? Considerar os efeitos produzidos
escolarização.
pela mídia é estar atento aos discursos, representações e significados que
O currículo tal qual a mídia é um artefato produtivo, transmitem para analisar, interpretar, compreender e refletir sobre como a mídia silencia,
visões de mundo interessadas, estão implicados nas relações de poder. produz, reproduz, reforça, mantêm concepções, valores, ideologias, símbolos,
Conforme Apple (2001a, p.68) o currículo não é apenas uma sobreposição representações e discursos sobre as relações étnico-raciais brasileiras. Utilizar
neutra de conhecimentos, e a configuração das relações étnico-raciais anúncios publicitários, reportagens jornalísticas, programas televisivos,
permitem observar essa não neutralidade, pois, enquanto os conhecimentos informações que circulam nas redes sociais, internet, etc, como artefatos que
de um grupo se torna autêntico e oficial, o de outros torna-se visível pelo fazem parte do nosso cotidiano, e não apenas como recursos para “enfeitar”
protagonismo dos sujeitos que o compõem. Ainda segundo o autor em ou “modernizar” as práticas pedagógicas, pode potencializar diferentes
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questões de raça/etnia, identidade, diferença, gênero, cultura e mídia. afirmação positiva da identidade negra.
8 Entende-se que é necessário destacar que currículo e mídia produzem 9
Conforme pesquisas realizadas por (SILVA; ROSEMBERG, 2008), a
e disseminam visões de mundo particulares, que conforme as relações de
população negra está ausente ou sub-representada na mídia brasileira.
poder implicadas ora enaltecem e positivam a diferença, ora reforçam a
Os discursos e representações midiáticas sobre a população negra foram
estereotipia, quando não negam, sub-representam, inferiorizam. Os materiais
sistematizados em quatro pontos por (SILVA; ROCHA; SANTOS, 2011), quais
evidenciam essa dimensão. Mas, também evidenciam de modo enfático o
sejam:
protagonismo, a voz dos sujeitos a partir desses mesmos espaços.
1)a evidente sub-representação do negro nas diversas mídias; 2) o Em suma, os materiais escolhidos mostram que existe o papel da mídia
constante silenciamento das mídias sobre as desigualdades raciais, na repetição e manutenção da estereotipia, exclusão, sub-representação da
exercendo um duplo papel: negar os processos de discriminação população negra, mas, existe também na mesma medida um protagonismo
racial, buscando ocultar a racialização das relações sociais, ao e empoderamento de negros que forja espaços de visibilidade e
mesmo tempo em que propõe uma homogeneidade cultural ao
reconhecimento positivo da população negra na mídia.
brasileiro; 3) o branco é tratado como representante “natural”
Assim, parte-se da premissa de que há uma relação muito
da espécie humana (branquidade normativa); 4) a estereotipia
na representação do homem e da mulher negra, próxima entre o trato pedagógico das relações étnico-
adulto ou criança é recorrentemente assinalada nas raciais e a concepção de educação que orienta as práticas
diversas mídias. (SIVA; ROCHA; SANTOS, p.151, 2012) pedagógicas. Para tanto, é fundamental aprender a
olhar pedagogicamente para as relações étnico-raciais
Nessa perspectiva os temas selecionados para debate, veiculadas pela mídia, quebrando as lentes tradicionais
reflexões, multiplicação entre os pares e elaboração das que naturalizam posições hierárquicas, excludentes e
práticas pedagógicas encaminham algumas pistas para que os racistas, passando a usar lentes que vislumbra e textualiza
participantes, possam utilizar outras lentes teóricas/pedagógicas novos saberes, novas posturas e práticas pedagógicas a
partir de informações advindas da mídia, que interpelam nossas realidades Para ele “o fato de inserir o negro de forma positiva na mídia não significa
e fazem parte do nosso cotidiano. que a sociedade o aceitará melhor. Mas é o nosso papel brigar por isso”.
Para dar continuidade nos próximos encontros, deixamos algumas A mídia tem grande poder pedagógico da perspectiva das relações
indagações como fios condutores do trabalho: étnico-raciais, pois impulsiona debates, polêmicas, reflexões e posturas
contra hegemônicas ou conservadoras, assim, torna-se cada vez mais
➢ Como a população negra e indígena têm sido pensadas e apresentadas nos necessário a inserção do tema no currículo escolar dando novos sentidos
diferentes espaços sociais, principalmente, nos discursos e representações a trajetória de aprendizagem. Como o currículo escolar poderá ensejar
midiáticas?
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O autor defende que a importância FREIRE, P. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos.
dos negros ocuparem os veículos midiáticos, Apresentação de Ana Maria Araújo Freire. Carta-prefácio de Balduíno A.
visto que, disseminam arquétipos. Entretanto, Andreola. São Paulo: Editora UNESP, 2000.
ressalta que a mídia não é por excelência
o meio responsável pela construção da HALL. S (1997b). A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções
identidade negra, mas seu poder é inegável. culturais do nosso tempo. Educação & Realidade, v. 22, nº 2, jul./dez, 1997b.
KELLNER, D. A cultura das mídias – estudos culturais: identidade e
política entre o moderno e o pós-moderno. Bauru: EDUSC, 2001 Secretaria de Estado da Educação
Ana Seres Trento Comin
LIMA, V. A. Mídia: Teoria e Política. São Paulo: Editora Fundação
Superintendência da Educação
Perseu Abramo, 2001.
Inês Carniletto
LIMA, V.A. Sete teses sobre a relação Mídia e Política. Mimeo, 2003. Departamento da Diversidade
Marise Ritzmann Loures
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Coordenação da Educação
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na mídia In: VAN DIJK, Teun (Org.). Racismo e Discurso na América Campo e Cigana.
Latina. São Paulo: Contexto, 2008. Mara Rosane Machado
Equipe Pedagógica
12 SILVA, P.V. B; GOMES, N. R; SANTOS, W. O. Negras(os) e brancas(os) Clemilda Santiago Neto
em publicidades de jornais paranaenses. In: Leandro Leonardo Edimara Gonçalves Soares
Batista & Francisco Leite (Orgs.). O negro nos espaços publicitários Galindo Pedro Ramos