A Escrita Da História de Um Lado A Outro Do Atlântico
A Escrita Da História de Um Lado A Outro Do Atlântico
A Escrita Da História de Um Lado A Outro Do Atlântico
A escrita da história
de um lado a outro do Atlântico
© 2018 Maria Eurydice de Barros Ribeiro
& Susani Silveira Lemos França
Cultura Acadêmica
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Ribeiro, Maria Eurydice de Barros.
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico / Maria
Eurydice de Barros Ribeiro e Susani Silveira Lemos França
(organizadoras). – São Paulo : Cultura Acadêmica, 2018.
292 p.
ISBN: 978‐85‐7983‐925‐2
1. Portugal ‐ História. 2. Brasil ‐ História. 3. Historiografia.
I. Título. II. França, Susani Silveira Lemos.
CDD – 946.9
Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Andreia Beatriz Pereira – CRB8/8773
Sumário
Introdução 11
Maria Eurydice de Barros Ribeiro
Susani Silveira Lemos França
Operários do evangelho:
construindo a espiritualidade franciscana no Brasil 123
Maria Eurydice de Barros Ribeiro
O elogio do contraditório.
Reflexões sobre a cronística de Zurara 143
Margarida Garcez Ventura
Introdução
C
om a recente pulverização e acirramento das discussões
sobre as identidades de grupos, certas categorias, que
outrora serviram para o reconhecimento dos povos e dos
indivíduos, vêm sendo por vezes esquecidas e tornadas obsoletas em
favor de outras que, nascidas sob o argumento da diversidade, têm,
ao contrário e lamentavelmente, ganhado força de universais. O
presente livro, visando resgatar e mensurar as faces de um processo
de identificação construído ao longo de séculos, envolvendo os dois
lados do Atlântico e os diálogos entre duas sociedades assemelhadas,
traz algumas discussões de pesquisadores experientes sobre as
histórias que delas se quis lembrar na forma escrita. Com foco no que
o mar uniu, mais do que no que separou – para lembrar a feliz síntese
de Fernando Pessoa –,1 os estudos deste livro retomam discussões e
lançam novas a propósito de uma questão que esteve na origem da
formação do grupo de pesquisa “Raízes Medievais do Brasil
1
PESSOA, Fernando. Mensagem. Segunda Parte - Mar Portuguez. In: Arquivo Pessoa. Obra édita.
Disponível em: <http://arquivopessoa.net/textos>. Consultado em: 01 dez. 2017.
11
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
2
Pelos sentimentos que temos ou devamos ter em relação aos produtos do trabalho realizado. Cf.
ANKERSMIT, Frank R. Commemoration and national identity. Memória, identidade e
historiografia. Org. de Estevão de Rezende Martins. Textos de História, 10, p. 15-37, 2002, p. 15.
Disponível em: <http://periodicos.unb.br/index.php/textos/article/viewFile/5931/4907>.
Consultado em: 02 dez. 2017.
12
Introdução
3
VEYNE, Paul. Foucault: seu pensamento, sua pessoa. Trad. Marcelo Jacques de Morais. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p. 113.
13
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
4
MENDONÇA, Manuela. Prefácio. In: MENDONÇA, Manuela; REIS, Maria de Fátima.
Raízes medievais do Brasil Moderno – Do Reino de Portugal ao Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarves. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 2016, p. 13.
5
GOMES, Francisco José Silva. Cristandade medieval e cristandade colonial: permanências e
rupturas. In: MACEDO, José Rivair (Org.). A Idade Média Portuguesa e o Brasil: reminiscências,
transformação, ressignificações. Porto Alegre: Vidráguas, 2011. p. 169-176.
6
SANTOS, Dulce O. Amarante dos. A medicina monástica em Portugal na Idade Média
(Aproximações). In: MENDONÇA, Manuela; SANTOS, João Marinho dos. Raízes medievais
do Brasil Moderno – Ordens religiosas entre Portugal e o Brasil. Lisboa: Academia Portuguesa da
História, 2012. p. 131-156, p. 145.
14
Introdução
7
SANTOS, Dulce O. Amarante dos. A medicina monástica em Portugal na Idade Média
(Aproximações). In: MENDONÇA, Manuela; SANTOS, João Marinho dos. Raízes medievais
do Brasil Moderno – Ordens religiosas entre Portugal e o Brasil, p. 155.
8
SANTOS, Dulce O. Amarante dos. Políticas de saúde para o Brasil Colonial e Reino Unido. In:
MENDONÇA, Manuela; REIS, Maria de Fátima. Raízes medievais do Brasil Moderno – Do
Reino de Portugal ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, p. 247.
9
MARTINS, Armando. Saberes e sabedoria: A potencialidade das circunstâncias num manual de
educação do século XII. História Revista, Goiânia, v. 18, n. 1, p. 9-35, jan./jun. 2013, p. 9.
Disponível em: <https://www.revistas.ufg.br/historia/issue/view/1495/showToc>.
Consultado em: 02 dez. 2017.
10
MENDONÇA, Manuela. O espelho de Cristina (séc. XV). História Revista, Goiânia, v. 18, n. 1, p.
53-68, jan./jun. 2013, p. 53-55. Disponível em:
<https://www.revistas.ufg.br/historia/issue/view/1495/showToc>. Consultado em: 02 dez. 2017.
11
RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros. Entre saberes e crenças: o mundo animal na Idade Média.
História Revista, v. 18, n. 1, p. 135-150, jan./jun. 2013, p. 141. Disponível em:
<https://www.revistas.ufg.br/historia/issue/view/1495/showToc>. Consultado em: 02 dez. 2017.
12
SANTOS, João Marinho. A missão jesuíta para o Brasil na estratégia imperial de D. João III.
In: MACEDO, José Rivair (Org.). A Idade Média Portuguesa e o Brasil.
15
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
13
SANTOS, João Marinho. A escrita e as suas funções na missão jesuítica do Brasil quinhentista. História
(São Paulo), v. 34, n. 1, p. 109-127, jan./jun. 2015. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0101907420150001&lng=pt&nrm=iso.
Consultado em: 03 dez. 2017.
14
MACEDO, José Rivair. Escrita e conversão na África central do século XVII: o catecismo Kikongo de
1624. História Revista, v. 18, n. 1, p. 69-90, jan./jun. 2013. Disponível em:
<https://www.revistas.ufg.br/historia/issue/view/1495/showToc>. Consultado em: 02 dez. 2017.
15
MARTINS, Armando. Saberes e sabedoria: A potencialidade das circunstâncias num manual
de educação do século XII. História Revista, p. 10.
16
MENDONÇA, Manuela. O espelho de Cristina (séc. XV). História Revista, p. 53.
17
COELHO, Maria Helena da Cruz. A escrita no mundo urbano. História (São Paulo), v. 34, n.
1, 2015, p. 16-34. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/his/v34n1/0101-9074-his-34-01-
00016.pdf>. Consultado em: 02 dez. 2017.
18
ZIERER, Adriana. A construçnao da Identidade Portuguesa atrav´s de D. João I. O da Boa
Memória. In: MENDONÇA, Manuela; REIS, Maria de Fátima. Raízes medievais do Brasil
Moderno – Do Reino de Portugal ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, p. 185.
19
FRANÇA, Susani Silveira Lemos. A seiva do passado no saber histórico português e castelhano
(XIV-XV). História Revista, História Revista, v. 18, n. 1, p. 151-166, jan./jun. 2013. Disponível
em: <https://www.revistas.ufg.br/historia/issue/view/1495/showToc>. Consultado em: 02
dez. 2017.
16
Introdução
20
ESTEVES, Julieta Araújo. Fontes de “saber” nas crónicas medievais: Fernão Lopes.
História Revista, História Revista, v. 18, n. 1, p. 167-169, jan./jun. 2013. Disponível em:
<https://www.revistas.ufg.br/historia/issue/view/1495/showToc>. Consultado em: 02
dez. 2017.
21
FRÓES, Vânia Leite. O Atlântico e o além-mar no discurso poético-dramatúrgico de Gil
Vicente e de Garcia de Resende. In: PINTO, Alexandre. S.; AIRES-BARROS, Luís;
MENDONÇA, Manuela; MATIAS, Nuno Vieira. Brasil e Portugal: unindo as duas margens do
Atlântico. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 2013. p. 285-302.
22
SILVA, Manuela. Tendências e agentes espirituais na capela régia de D. Filipa de Lencastre.
In: In: MENDONÇA, Manuela; SANTOS, João Marinho dos. Raízes medievais do Brasil
Moderno – Ordens religiosas entre Portugal e o Brasil, p. 71-81
23
VENTURA, Margarida Garcez. A justiça no quotidiano: os corregedores do reino. História
(São Paulo), v.34, n.1, p. 60-74, jan./jun. 2015. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/his/v34n1/0101-9074-his-34-01-00060.pdf>. Consultado em: 02
dez. 2017.
24
MENDONÇA, Manuela. O Regimento da Casa da Suplicação. O primeiro instrumento
regulador da justiça em Portugal. História (São Paulo), v.34, n.1, p. 35-59, jan./jun. 2015.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/his/v34n1/0101-9074-his-34-01-00035.pdf>.
Consultado em: 02 dez. 2017.
17
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
18
A história:
saber e discursos correlatos
Manuela Mendonça
N
a linha do surto erudito seiscentista, onde já há algum
tempo se apresentavam trabalhos de História, surgiu a
Academia Real da História Portuguesa. Se a sua
integração neste movimento foi continuidade, o seu sentido era plena
novidade. O seu projecto assentou na promoção da “História
Eclesiástica do Reino, e depois, tudo o que pertencer a toda a História
dele e suas conquistas”. Aos intelectuais de elite caberia a
concretização deste ideário, cujo método e investigação se foi
aperfeiçoando e ampliando. A prioridade da História Eclesiástica,
enunciada como objectivo primeiro no Decreto de Instituição,
derivaria num programa de acção bem mais vasto, em que a História
Secular ocuparia lugar paritário.
1
Este texto inclui algumas partes já publicadas em Introdução à História Genealógica da Casa Real
Portuguesa, APH, Lisboa 2007, edição facsimil da nova edição revista por M. Lopes de Almeida,
de António Caetano de Sousa, Historia Genealogica da Casa Real Portugueza desde a sua origem
até ao presente, Lisboa Ocidental, Academia Real, 1735.
21
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
22
História Genealogica...
23
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
2
SERRÃO, Vitor. A Pintura Protobarroca em Portugal (1612-1657). O Triunfo do Naturalismo e
do Tenebrismo. Lisboa: Edições Colibri, 2000, p. 20 e 24.
3
LOURENÇO, Maria Paula Marçal. D. Pedro II. Lisboa: Círculo de Leitores, 2006, p. 280.
4
Estrangeirados. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História de Portugal: de “Castanhoso” a
“Fez”. Porto: Livraria Figueirinhas; Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1965. v. II, p. 124.
24
História Genealogica...
5
SERRÃO, Joaquim Veríssimo. A Historiografia Portuguesa: doutrina e crítica. Lisboa: Editorial
Verbo, 1972(4). v III, p. 62.
25
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
6
LOURENÇO, Maria Paula Marçal. D. Pedro II, p. 279.
26
História Genealogica...
27
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
7
Teatinos (Caetanos). In: AZEVEDO, Carlos A. Moreira. Dicionário de História Religiosa de
Portugal. Lisboa: Círculo de Leitores, 2001. v. P-V, p. 273.
28
História Genealogica...
29
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
8
SOUSA, António Caetano de. Agiologio lusitano dos santos, e varões illustres em virtude do reino
de Portugal, e suas conquistas; consagrado à imaculada Conceição da Virgem Maria Senhora Nossa
Padroeira do Reino [...]. Lisboa: Na Regia Officina Sylviana, e da Academia Real, 1744. t. IV.
30
História Genealogica...
9
SERRÃO, Joaquim Veríssimo. A Historiografia Portuguesa: doutrina e crítica.
31
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
aniversários régios. Este aspecto que, por motivos óbvios, aqui não
podemos desenvolver, constitui um interessantíssimo tema de
trabalho.
O projecto que deu corpo à Instituição trazia consigo o desejo
objectivo de juntar um grupo de eruditos para escreverem uma
história religiosa de Portugal, que se designaria Lusitania Sacra. A
esta proposta inicial foi posteriormente acrescida a decisão de se
escrever também a história secular do reino, na qual “[...] se
observará quasi o mesmo methodo e nomeará a Academia hum só
historiador, que a escreva em português e depois que a imprimir se
comporá em latim [...]”.10 Nestas circunstâncias, os académicos
deveriam comprometer-se a elaborar em conjunto a história de
Portugal, tanto eclesiástica como secular. Para o conseguir reuniriam
periodicamente, sendo cada um obrigado à apresentação da
investigação efectuada, que seria sujeita a discussão entre todos.
Demonstrando bem a eficácia de objectivos do novo Instituto, foram
distribuídos os “empregos dos Académicos”, que o mesmo é dizer,
foram atribuídas as tarefas científicas que cada um se obrigava a
desempenhar. A D. António Caetano de Sousa foi pedido que
elaborasse, na língua portuguesa, a Historia Ecclesiastica do
Ultramar. Para a História Secular não foi solicitado.
Que o novo académico se dedicou com entusiasmo ao
trabalho que lhe foi distribuído prova a sua intervenção sistemática
na Academia, sendo certo que logo na sessão de 5 de janeiro de 1721
apresentou uma série de perguntas relativas ao tema a desenvolver e
ao método a seguir. E na sessão de 18 de março de 1721, já o Director
da Academia mandava distribuir “[...] hum Catalogo impresso dos
Bispos, e Arcebispos de Goa, ordenado pelo Padre D. Antonio
Caetano de Sousa, Clerigo Regular”. Nesta mesma reunião ficou
marcada a intervenção de D. António Caetano de Sousa para dia 1 de
abril. Assim aconteceu, tendo também sido entregues nesse dia mais
dois catálogos feitos pelo nosso autor – o dos Arcebispos da Bahia e
o dos Bispos de Cabo Verde. D. António deu ainda conta do estado
das suas investigações, permitindo-se fazer algumas sugestões
10
Collecçam dos Documentos, estatutos e Memorias da Academia Real da Historia Portugueza [...].
Lisboa Occidental: Officina de Pascoal da Sylva, 1721. t. I, p. 53.
32
História Genealogica...
11
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza: desde a sua origem até o
presente, com as Familias illustres, que procedem dos Reys, e dos Serenissimos Duques de Bragança:
justificada com instrumentos, e escritores de inviolavel fé e offerecida a El Rey D. João V. Lisboa: na
Officina de Joseph Antonio da Sylva, impressor da Academia Real, 1735-1749. t. I, p. III-IV.
33
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
12
MOTA, Isabel Ferreira da. A Academia Real da História: os intelectuais, o poder cultural e o
poder monárquico no século XVIII. Lisboa: Minerva Coimbra, 2003, p. 48-49.
34
História Genealogica...
13
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, Licenças, [s/p].
14
Cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo. A Historiografia Portuguesa, p. 84.
15
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, p. VIII.
35
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
16
SERRÃO, Joaquim Veríssimo. A Historiografia Portuguesa, p. 82.
36
História Genealogica...
17
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, p. XVI-XVII.
18
MACEDO, Jorge Borges de. Introdução ao Guia da Exposição. In: Da história ao documento:
do documento à história. Lisboa: Divisão de Publicações, 1995, p. xx.
37
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
19
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, p. CCXXVI-
CCXXVII.
20
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, p. VI.
38
História Genealogica...
D. João V VIII
VIII “os que descendem desta Condes de: Oropesa, Lemos, IX
serenissima casa por Faro, Odemira e Vimieiro
baronia”
IX e X Idem Marqueses de Ferreira, X
Duques de Cadaval;
Marqueses de Vilhescas;
Condes de Gelves e Duques
de Veragua
XI “os que tratão das Casas Duques de Aveiro; XI
que descendem e tiverão Marqueses de Porto Seguro;
principio nos Reys Duques de Abrantes;
antigos” Comendadores mores de
Avis; Condes de Villa-Nova;
Comendadores de Coruche
XII Idem Condes da Atalaya; XI
Comedadores da Arrifana;
Comendadores da Idanha
XIII (1ª. e Idem O Infante D. João; D. XI
2ª. Parte) Fernando, Senhor de
Eça;Alcaides-mores de Vila
Viçosa; Alcaides-mores de
Muja; D. Afonso, Senhor de
Cascais; Condes de
Monsanto.
3ª. Parte Idem Condes de Miranda; XI
do lv.13 e Marqueses de Arronches;
1ª. E 2ª. Comendador de Alcáçova de
Parte do Santarém; Condes de XII – parte
Lv.XIV Arenales; Marqueses de I
Guadalcaçar; Senhores de
Mortágua
3ª. parte Idem XII – parte
do livro II
XIV
Tabela 1 – Elaborada pela autora.
39
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
21
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, t. VIII,
Advertencias e addicçoens, p. I.
22
SOUSA, António Caetano de. Historia genealogica da Casa Real Portugueza, t. XII, p. I.
40
História Genealogica...
41
A
s Cortes apesentam-se como uma instituição que, como
tantas mais, têm origem noutras que as antecederam, sendo
por isso difícil atribuir uma data para a sua génese. Acresce
que entre os historiadores não há um pleno consenso sobre a sua
caracterização, formulando uns uma definição ampla e outros uma
mais estrita.
Parece inegável que se pode afirmar que existem Cortes
quando nesta assembleia política estão representados os corpos sociais
do reino – nobreza, clero e concelhos – que colaboram com o monarca
garantindo-lhe os meios para a sua acção governativa, do mesmo modo
que apresentam agravos e reivindicações para pedir respeito pelos
privilégios e manutenção dos direitos fundamentais próprios ou da
terra.
Mas tendo tais assembleias nascido por dentro do feudalismo,
ou melhor, por dentro dos diversos regimes feudais que existiram nos
43
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
1
Veja-se a síntese que apresenta José Luis Martín para Inglaterra, destacando a revolta de Londres
de 1191, na ausência de Ricardo I, e o papel da Magna Carta e ulterior evolução do Conselho
Comum; para a França, assinalando as assembleias condais ou ducais, as provinciais e as de
Estado; e para a Alemanha, referindo as assembleias que os príncipes se obrigaram a ter em conta
desde o século XIII. MARTÍN, José Luis. Las Cortes Medievales. Madrid: Historia 16, 1989, p.
16-19. Também Jean Dunbain aborda no seu estudo as similitudes e diferenças entre as cortes
portuguesas e as dos reinos peninsulares e o Parlamento inglês. DUNBABIN, Jean. The origins
of the English Parliament. In: As cortes e o Parlamento em Portugal. 750 anos das Cortes de Leiria
de 1254. 26 a 28 set. 2004. Lisboa. Actas do congresso internacional. Lisboa: Assembleia da
República, 2006, p. 73-83.
2
MARTÍN, José Luis. Las Cortes Medievales, p. 21-25.
3
MARTÍN, José Luis. Las Cortes Medievales, p. 25-27.
4
MARTÍN, José Luis. Las Cortes Medievales, p. 27-29.
5
A bibliografia sobre as Cortes nos reinos peninsulares é abundantíssima, remetendo-se para as
obras clássica de PEREZ-PRENDES, J. M. Cortes de Castilla. Barcelona: Ariel, 1974;
PROCTER, Evelyn Stefanos. Curia and Cortes in Léon and Castilla, 1072-1295. Cambridge-
New York: Cambridge University Press, 1980; e para uma síntese no estudo de QUESADA,
Miguel Angel Ladero. Las Cortes Medievales en Castilla y León. In: As cortes e o Parlamento em
Portugal. 750 anos das Cortes de Leiria de 1254. 26 a 28 set. 2004, p. 85-105.
6
Alguns estudiosos defendem que já teria havido representantes dos concelhos nas assembleias de
San Esteban de Gormaz em 1187 e Carrión em 1188. Sobre estas reuniões, seus antecedentes e
assembleias posteriores até 1252, Joseph F. O’Callaghan aponta como as primeiras Cortes em
Castela as de 1214, em Aragão e Catalunha as de Lérida de 1214, em Navarra as de 1231.
O’CALLAGHAN, Joseph F. Las Cortes de Castilla y Leon. 1188-1350. Valladolid: Ambito,1989,
p. 21-31; PROCTER, Evelyn Stefanos. Curia and Cortes in Léon and Castilla, 1072-1295, p. 105-
151. Quanto à discussão dos historiadores sobre as mesmas consulte-se: MARTÍN, José Luis. Las
Cortes Medievales, p. 29-31.
44
As cortes no reino de Portugal
7
Sobre a génese, constituição e funções da cúria portuguesa, que se desenvolve à semelhança da
cúria do reino de Leão e Castela, veja-se MENDUÑA, Claudio Sanchez Albornoz. La curia regia
portuguesa siglos XII y XIII. Madrid: Centro de Estudos Históricos, 1920.
8
Leiam-se as sínteses sobre este órgão: CAETANO, Marcello. História do Direito Português
[1140-1495]. 2ª ed. Lisboa; São Paulo:Verbo, 1985, p. 122-124 e 212-213; HOMEM, Armando
Luís de Carvalho. A corte e o governo central. In: SERRÃO, Joel; OLIVEIRA MARQUES, A.
H. (dir). Nova História de Portugal. Portugal em definição de fronteiras. Do condado portucalense
à crise do século XIV. Coord. de Maria Helena da Cruz Coelho e Armando Luís de Carvalho
Homem. Lisboa: Editorial Presença, 1996. v. III, p. 532-533. Também alude ao tema Leontina
Ventura: VENTURA, Leontina. A nobreza de corte de Afonso III. Tese (Doutorado). Faculdade
de Letras. Coimbra, 1992. v. I, p. 66, 68-69.
9
VENTURA, Leontina. A nobreza de corte de Afonso III. v. I, p. 72-73.
45
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
10
Leia-se HOMEM, Armando Luís de Carvalho. A corte e o governo central. In: SERRÃO, Joel;
OLIVEIRA MARQUES, A. H. (dir). Nova História de Portugal. Portugal em definição de
fronteiras, p. 538-539; VENTURA, Leontina. A nobreza de corte de Afonso III. v. I, p. 62, 65-70,
116-118; CAETANO, Marcello. As cortes de Leiria de 1254. Lisboa: Academia Portuguesa da
História, 1954, p.17-21.
11
Ao estudar as origens do Conselho Real, David Torres Sanz defende que, enquanto a cúria foi um
órgão político-social e representativo da comunidade social, o conselho foi um órgão de administração
e governo integrado por verdadeiros oficiais régios, dotados de competência técnica, que
secundariamente podiam representar ou ser expressão de forças sociais. SANZ, David Torres. La
administracion central castellana en la Baja Eda Media. Valladolid: Secretariado de Publicaciones.
Departamento de Historia del Derecho. Universidad de Valladolid, 1982, p. 181-186.
12
Cf. HOMEM, Armando Luís de Carvalho. A corte e o governo central. In: SERRÃO, Joel;
OLIVEIRA MARQUES, A. H. (dir). Nova História de Portugal. Portugal em definição de
fronteiras, p. 533-536.
46
As cortes no reino de Portugal
13
Tema abordado por MENDUÑA, Claudio Sánchez Albornoz. La curia regia portuguesa siglos
XII y XIII, p. 49-56.
14
Ao tratar das Cortes, José Mattoso defende justamente que os representantes dos concelhos eram
os únicos que representavam alguma coisa, os seus municípios. MATTOSO, José. Identificação
de um país: ensaio sobre as origens de Portugal, 1096-1325. Lisboa: Editorial Estampa, 1985. v.
II, p. 115-118.
15
António Hespanha, ao tratar das cúrias extraordinárias, defende que a distinção entre a Cúria e as
Cortes assenta no facto de que a Cúria tem um papel passivo, apenas discutindo os assuntos que lhe
são propostos pelo rei, enquanto as Cortes podem tomar a iniciativa de propor outros. Algumas
páginas depois, ao estudar as Cortes na época medieval, refere a historiografia desta problemática e,
quanto à génese das Cortes, acentua a entrada dos representantes dos concelhos e a capacidade de
nestas reuniões se apresentarem agravos e pedidos. HESPANHA, António. História das Instituições.
Épocas medieval e moderna. Coimbra: Livraria Almedina, 1982, p. 148-149, 367-382.
16
Sobre a evolução da Cúria para as Cortes e sobre as características das Cortes portuguesas e seu
confronto com o parlamento inglês, leia-se: MERÊA, Manuel Paulo. O poder real e as cortes.
Coimbra: Coimbra Editora, 1923, p. 26-50. Uma síntese sobre a origem das Cortes se encontra
em CARVALHO, Alberto Martins. Cortes. Origens. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de
História de Portugal. Porto: Livraria Figueirinhas, 1971. v. IV, p. 711-715. E sobre as Cortes,
ainda que analisadas essencialmente para tempos posteriores, veja-se: BARROS, Henrique da
Gama. História da Administração Pública em Portugal nos séculos XII a XV. Dir. Torquato de
Sousa Soares. 2ª ed. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1946, t. III, p. 125-195; SOUSA,
Armindo de. As Cortes Medievais Portuguesas (1385-1490). Porto: Instituto Nacional de
Investigação Científica. Centro de História da Universidade do Porto, 1990. v. I e II.
47
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
17
Assim o afirma SOARES, Torquato de Sousa. Antecedentes das cortes reunidas em Guimarães
em 1250. Revista Portuguesa de História, Coimbra, v. 20, p. 141-154. 1983, p. 146-147; SOARES,
Torquato de Sousa. As primeiras Cortes Gerais da Monarquia Portuguesa, realizadas em
Guimarães em 1250. Revista Guimarães, Guimarães, v. 93, p. 345-349. 1984, p. 4. O mesmo
defende José Mattoso ao afirmar que esta é a primeira notícia de uma reunião extraordinária e
deliberativa da Cúria régia. MATTOSO, José. Identificação de um país, v. II, p. 114.
18
BRANCO, Maria João Violante. D. Sancho I. O filho do rei Fundador. Lisboa: Círculo de
Leitores, 2006, p. 232-238.
19
ANTUNES, José; OLIVEIRA, António Resende de; MONTEIRO, João Gouveia. Conflitos
políticos no reino de Portugal entre a Reconquista e a Expansão. Estado da questão. Revista de
História das Ideias, Coimbra, v. 6, p. 29-47, 1984; BRANCO, Maria João Violante. D. Sancho I,
p. 238- 249.
20
Esta problemática da sucessão é abordada por BRANCO, Maria João Violante. D. Sancho I, p.
252-266 e VILAR, Hermínia Vasconcelos. D. Afonso II. Um rei sem tempo. Lisboa: Círculo de
Leitores, 2005, p. 45-56.
21
Assim afirma Damião Peres, lembrando que D. Sancho I falecera em Coimbra, a 26 de março
de 1211, e na corte estavam, portanto, todos estes altos dignitários. Depois de julho D. Afonso II
já andava por terras da Beira. PERES, Damião. As cortes de 1211. Separata da Revista Portuguesa
de História, Coimbra, t. IV. 1949, p. 3.
22
“dom Pedro eleyto de Braga e de todos os bispos do rreyno e dos homens de rreligiom e dos ricos
homens e dos seus vasallos”. Portugaliae Monumenta Historica. Leges et Consuetudines.
Olisipone: Typis Academicis,1856. v. I, p. 163-179. (doravante designadas Leges).
23
Nuno José Pizarro Pinto Dias e Hermínia Vasconcellos Vilar identificam concretamente os que
estiveram presentes nesta cúria. Cf: DIAS, Nuno José Pizarro Pinto. Cortes Portuguesas (1211 a
48
As cortes no reino de Portugal
27
DIAS, Nuno José Pizarro Pinto. Cortes Portuguesas (1211 a 1383), p. 45.
28
Leges, p. 182; SOUSA COSTA, A. D. de. Mestre Silvestre e Mestre Vicente, juristas da contenda
entre D. Afonso II e suas irmãs. Braga: Editorial Franciscana, 1963, p. 166-167, nota 289.
29
Sobre estes conflitos iniciais do governo de D. Sancho II, leia-se ANTUNES, José; OLIVEIRA,
António Resende de; MONTEIRO, João Gouveia. Conflitos políticos no reino de Portugal entre
a Reconquista e a Expansão. Estado da questão. Revista de História das Ideias, p. 78-82.
30
Embora Maria Teresa Campos Rodrigues intitule o seu artigo como Cortes, defende que esta
reunião não é de Cortes, mas antes uma Cúria plena. RODRIGUES, Maria Teresa Campos.
Coimbra, Cortes de (1229). In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História de Portugal, v. IV, p.
399. Assim a considera também Nuno José Pizarro Pinto Dias. Cf. DIAS, Nuno José Pizarro
Pinto. Cortes Portuguesas (1211 a 1383), p. 45. Na carta régia, datado de janeiro de 1229, em que
se encarregava o chanceler Mestre Vicente, recentemente eleito bispo da Guarda, do
repovoamento de Idanha- a-Velha, antiga sede do bispado egitaniense de que o da Guarda era
herdeira, para além de ricos-homens e bispos encontram-se D. Pedro, abade de Alcobaça e Mestre
João, prior de Santa Cruz de Coimbra, que poderiam ter estado presentes na Cúria.
31
DIAS, Nuno José Pizarro Pinto. Cortes Portuguesas (1211 a 1383), p. 45-46.
50
As cortes no reino de Portugal
32
No que respeita aos conflitos do governo de D. Sancho II desde 1233 até à sua deposição, veja-
se: ANTUNES, José; OLIVEIRA, António Resende de; MONTEIRO, João Gouveia. Conflitos
políticos no reino de Portugal entre a Reconquista e a Expansão. Estado da questão. Revista de
História das Ideias, p. 83-105.
33
Esta temática foi estudada por MATTOSO, José. A crise de 1245. Revista de História das Ideias,
Coimbra, n. 6, p. 29-47. 1984 e BRANCO, Maria João Violante. D. Sancho I, p. 7-28.
51
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
autoridade régia já iniciada por seu pai, D. Afonso II, e para a qual
muito podia concorrer a experiência que colhera em França.34
Logo no ano a seguir à sua subida ao trono, em 1249, decide-se
pela guerra no Algarve, onde havia ainda terras a conquistar aos
muçulmanos. Era uma forma de mobilizar os nobres e os clérigos
guerreiros para um inimigo externo, evitando as querelas internas, e
também de obter terras e rendas que servissem para compensar fiéis e
vassalos. Para si mesmo, em caso de vitória, colheria o prestígio de ver
concluída a guerra de reconquista e de conseguir acrescentar o
território do reino e o seu poder sobre ele.
E de facto, completada com êxito a reconquista, o monarca
concentrou-se na consolidação e acréscimo da autoridade e do poder
do rei, que garantia a justiça e a paz, e se assumia como protector dos
membros da sociedade contra possíveis abusos. Com o apoio de
letrados e legistas, defensores do Direito Romano, queria que o poder
real se impusesse a todos os súbditos, laicos ou eclesiásticos, e que as
instituições judiciais do reino e a legislação régia alcançassem todos os
espaços e poderes. Pretendia estabelecer uma organização social de
novas relações, que valorizassem o saber e a técnica e o protagonismo
dos centros concelhios, sobretudo os de maior peso mercantil.
É nesta sequência que reúne, em maio-junho de 1250, em
Guimarães, uma Cúria, “congregata ad plurima negocia regni
expedienda”.35 Nela estariam, segundo alguns estudiosos, para além de
membros da nobreza e do clero, elementos do povo, e a reunião teria
sido convocada para Guimarães por ser este um centro comercial de
relevo e por estar próximo de Braga, a metrópole eclesiástica do reino,
e também da diocese portuense, em que se debatiam com a realeza
34
Sobre este monarca leia-se a síntese: VENTURA, Leontina. Afonso II e o desenvolvimento da
autoridade régia. In: SERRÃO, Joel; OLIVEIRA MARQUES, A. H. (dir). Nova História de
Portugal. Portugal em definição de fronteiras, p. 123 e 144 e VENTURA, Leontina. D. Afonso III.
Lisboa: Círculo de Leitores, 2006.
35
Leges, p 184-189 (citação na página 185). Quanto à ambiência político-social do reinado de D.
Afonso III, em que várias Cortes foram reunidas, leia-se a síntese: VENTURA, Leontina. A
política governativa de Afonso III. In: As Cortes e o Parlamento em Portugal. 750 anos das Cortes
de Leiria de 1254. 26 a 28 set. 2004. Lisboa. Actas do Congresso Internacional, p. 41-57.
52
As cortes no reino de Portugal
36
Torquato de Sousa Soares admite mesmo que os agravos de Coimbra e Montemor-o-Velho, que
não se encontram datados, fossem apresentados nesta assembleia, o que outros defendem, como
veremos, ter apenas acontecido nas Cortes de Leiria de 1254. SOARES, Torquato de Sousa. As
primeiras Cortes Gerais da Monarquia Portuguesa, realizados em Guimarães em 1250. Revista
Guimarães, p. 5.
37
Leges, p. 185.
38
Mas é também com base na palavra “aliorum” que A. H. de Oliveira Marques admite a
possibilidade destas Cortes (assim as designa) terem registado a presença de procuradores do braço
popular. OLIVEIRA MARQUES, A. H. Cortes de (1250). In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário
de História de Portugal, p. 401- 402.
39
Leges, p. 184-190.
53
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
40
Sobre estes agravos e respostas do rei, leia-se VENTURA, Leontina. D. Afonso III, p. 96-101.
41
Leges, p. 190-191.
42
O rei tinha o direito de cunhar moeda e de fixar o seu valor. Assim, como meio de aumentar os
seus rendimentos, o rei podia desvalorizar a moeda, de uma de duas maneiras - acrescentar o valor
nominal das moedas, mantendo o mesmo metal precioso, ou manter o valor nominal das moedas,
mas diminuindo-lhe o quantitativo de metal precioso.
43
CAETANO, Marcello. As cortes de Leiria de 1254, p. 12-13. Nesta ocasião os corpos sociais do
reino teriam proposto ao rei a “compra” da moeda (“emere monetam”), portanto o pagamento de
um tributo equivalente ao que o rei pensava ganhar com a sua desvalorização, ficando o valor da
moeda inalterado, o que não se repercutia nos preços.
54
As cortes no reino de Portugal
44
Leges, p. 192. Aliás nessa lei afirmava-se que os preços tinham encarecido “quod timebant quod
ego frangerem monetam et quia dicebant quod tempus britandi monetam apropinquabat”.
45
Assim refere a lei: “Et ego super hoc habui consilium com riquis hominibus sapientibus de curia mea
et consilio meo et cum prelatiis et militibus et mercatoribus e cum ciuibus et bonis hominibus de consilliis
regni mei...”. Leges, p. 192.
46
Assim afirma Marcelo Caetano e também Evelyn Stefanos Procter. CAETANO, Marcello.
Subsídios para a história das Cortes Medievais portuguesas. Bracara Augusta, Braga, v. XIV-XV,
p. 5-26. 1963, p. 6-7; PROCTER, Evelyn Stefanos. Curia and Cortes in Léon and Castilla, 1072-
1295, p. 255.
47
CAETANO, Marcello. As cortes de Leiria de 1254, p. 14-17; VENTURA, Leontina. D. Afonso
III, p. 102-103.
48
CAETANO, Marcello. As cortes de Leiria de 1254, p. 23-25. Já Alexandre Herculano defendia
que estas haviam sido as primeiras Cortes em que os procuradores dos concelhos intervieram.
HERCULANO, Alexandre. História de Portugal: desde o começo da monarquia até o fim do
reinado de Afonso III. Dir. José Mattoso e Ayala Monteiro. Lisboa: Bertrand, 1980. t. III, p. 51.
55
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
49
AN/TT. Chancelaria de D. Afonso III, f. 6v; Chancelaria de D. Afonso III. Ed. de Leontina
Ventura e António Resende. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2006. Livro I – v.
I, doc. 33, p. 44.
50
A publicação destes documentos encontra-se na obra de Marcello Caetano. Por eles se tem
procurado reconstituir aqueles que pelas três Ordens estiveram presentes nas Cortes.
CAETANO, Marcello. As cortes de Leiria de 1254, p. 57-81 e 27-40.
51
Claudio Sanchez Albornoz Menduña, ao estudar a evolução da Cúria para as Cortes, afirma que
“a entrada dos procuradores das cidades nas Cúrias coincidiu com a discussão nelas das questões
da moeda e dos tributos”. MENDUÑA, Claudio Sánchez Albornoz. La curia regia portuguesa
siglos XII y XIII, p. 154.
52
Chancelaria de D. Afonso III. Livro I-v. 2, de Santarém, 19 de março de 1255.
56
As cortes no reino de Portugal
53
Os prelados, barões, religiosos e povo do reino pediram ao rei para reunir uma cúria a fim de
discutirem a questão da moeda e o rei “ad eorum instanciam feci archiepiscopum et omnes episcopus
baronis religiosos et communi totis regni mei apud Colimbriam conuenire”. Leges, p. 210-213. Teriam
sido convocadas entre fins de março e princípios de abril de 1261. RODRIGUES, Maria Teresa
Campos. Coimbra, Cortes de (1229). In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História de Portugal,
v. IV, p. 339-340.
54
Leges, p. 229-231; “sobresto mandey chamar meus ricos homees e as ordiis e os concelhos do meu
reyno e figi mha corte cum eles en Sanctarem”. Estas Cortes teriam sido convocadas entre dezembro
de 1273 e janeiro de 1274, na sequência da bula enviada por Gregório X, em 28 de maio de 1273,
exigindo ao rei que reparasse os danos causados à Igreja. Cf. ANTUNES, José; OLIVEIRA,
António Resende de; MONTEIRO, João Gouveia. Conflitos políticos no reino de Portugal entre
a Reconquista e a Expansão. Estado da questão. Revista de História das Ideias, p. 109-110;
RODRIGUES, Maria Teresa Campos. Santarém, Cortes de (1273). In: SERRÃO, Joel (dir.).
Dicionário de História de Portugal. Porto: Livraria Figueirinhas, 1971. v. III, p. 764.
55
Marcello Caetano chama porém a atenção para os progressos da participação popular desde a
sua consulta na lei de 1253, passando pela presença de procuradores dos concelhos nas Cortes de
Leiria de 1254 e depois pela capacidade reivindicativa desses procuradores nas Cortes de Coimbra
de 1261. CAETANO, Marcello. Subsídios para a história das Cortes Medievais portuguesas.
Bracara Augusta, p. 6-8.
57
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
Em síntese
56
PROCTER, Evelyn Stefanos. Curia and Cortes in Léon and Castilla, 1072-1295, p. 256-257.
57
PROCTER, Evelyn Stefanos. Curia and Cortes in Léon and Castilla, 1072-1295, p. 258-259.
58
As cortes no reino de Portugal
58
PROCTER, Evelyn Stefanos. Curia and Cortes in Léon and Castilla, 1072-1295, p. 260.
59
A
arte da retórica, uma das três disciplinas do trivium junto
com a Gramática e a Dialética, constituiu-se em diretriz
primeira dos autores de textos na Idade Média,
independentemente de qualquer gênero de pertencimento.
A arte do discurso relacionava-se com o percurso de sobrevivência
das obras da Antiguidade greco-romana. A principal dentre elas é a
Retórica de Aristóteles,2 obra da maturidade, escrita em Atenas, que
de alguma forma traduz igualmente os modelos dos retóricos
anteriores e de seus contemporâneos no IV século a. C. Contudo, da
primeira parte da obra voltada para o público externo sobreviveram
1
Esse texto integra a pesquisa, O percurso intelectual de Pedro Hispano: as relações entre a medicina
universitária europeia e a sociedade no século XIII, que conta com apoio do CNPq.
2
RA= ARISTOTELE. Retorica. Ed. bilíngue. Introd. de Franco Montanari. Milano:
Mondadori, 2010. (Série Oscar classici greci et latine).
61
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
3
O tratado aristotélico é composto por três livros. O primeiro e o segundo tratam da persuasão no
discurso público por meio dos argumentos (as provas): deliberativos, epidíticos e judiciais. Aborda
também o receptor da mensagem com suas paixões e as provas morais, subjetivas e lógicas mais
pertinentes para a argumentação; o terceiro livro expõe o estilo e a disposição das partes do
discurso. Ver: MALEVAL, Maria do Amparo T. Fernão Lopes e a retórica medieval. Niterói, RJ:
Ed. da Universidade Federal Fluminense, 2010, p. 73.
4
DI= CÍCERO, M. T. De Inventione. De la invención de la retórica. Ed. bilíngue, introd., trad. e
notas por Bulmaro Reyes Coria. Mexico: Universidad Nacional Autonoma de Mexico, 1997.
5
RH= Retórica a Herenio. Trad. e intr. de Ana Paula C. Faria e Adriana Seabra. São Paulo: Hedra, 2005.
6
As partes da Retórica são cinco: Inventio ou invenção é a descoberta de coisas verdadeiras ou
verossímeis; Dispositio ou disposição é a ordenação e distribuição dessas coisas; Elocutio ou
elocução é a acomodação das palavras e sentenças adequadas à invenção; Memoria é a simples
apreensão, no ânimo, das coisas, das palavras e da disposição; Pronuntiatio ou pronunciação é a
moderação com encanto, da voz, semblante e gesto. RH, p. 55.
7
COX, Virginia; WARD, John O. (Eds). The Rhetoric of Cicero in its Medieval and Early
Renaissance Commentary Tradition. Leiden/Boston: Brill, 2011, p. 03.
62
A retórica nos prólogos...
63
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
8
VANDERPUTTEN, Bernard. From Sermon to Science: Monastic Prologues from the Southern
Low Countries as Witnesses of Historical Consciousness (10th-15th Centuries). In: VERBEKE,
Werner et al. (eds.). Medieval narrative sources: gateway into the medieval mind. Leuven: Leuven
University Press, 2005. p. 37-54.
9
HAMESSE, Jacqueline (Org.). Les prologues médiévaux. Actes du Colloque international
organisé par l´Academia Bélgica et l´École française de Rome avec le concours de la F.I.D.E.M
(Rome, 26- 28 mars 1998). Turnhout: Brepols, 2000.
10
PARAVICINI BAGLIANI, A. Medicina e scienze della natura alla corte dei papi nel duecento.
Spoleto: Centro Italiano di Studi sulló Alto Medioevo, 1991; PARAVICINI BAGLIANI, A. La
cour des papes. Paris: Hachette, 1995.
11
LCS = Líber de conservanda sanitate de Petri Hispani. Ed. Trilingue organizada por Ugo
Carcassi. Roma: Carlo Delfino; Rotary, 1997; TP= Thesaurus pauperum de Pedro Hispano Ed.
crítica por Maria Helena da Rocha Pereira. In: Obras médicas de Pedro Hispano. Coimbra: Por
ordem da Universidade, 1973; LO= De Oculo des Petrus Hispanus. In: BERGER, A. M. Die
OphThalmologie (liber de oculo) des Petrus Hispanus. München:J. F Lehmann, 1899.
64
A retórica nos prólogos...
12
MEIRINHOS, J. F. Petrus Hispanus Portugalensis? Elementos para uma diferenciação de
autores. Revista Española de Filosofia Medieval, 3, p. 51-76, 1996; D`ORS, Angel O.P. Petrus
Hispanus Auctor Summularum. Vivarium, Leiden, XXXV, 1, p. 21-71, 1997; TUGWELL,
Simon 0. P. Petrus Hispanus: comments on some proposed identifications. Vivarium, XXXVII,
2, p.103-113, 1999.
13
MEIRINHOS, J. F. O papa João XXI e a ciência do seu tempo. In: MATOS, M. C. (ed.). A
Apologia do latim. Lisboa: Távola Redonda, 2005. p. 129-170.
14
PARAVICINI BAGLIANI, A. La cour des papes au XIIIe siècle.
15
LE POGAM, Y. De la Cite de Dieu au ‘Palais du Papa’. Rome: École Française de Rome,
1994, p. 77-94.
16
LA= Lapidario. Ed. crítica por Sagrario Rodriguez M. Montalvo. Madrid: Gredos, 1981.
MONTOYA MARTINEZ, J.; DOMINGUEZ RODRIGUEZ, A. (Coords.) El
scriptorium alfonsí: de los Libros de Astrología a las Cantigas de Santa Maria. Madrid: Ed.
Complutense, 1999.
65
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
17
Os ditos dos físicos, cuja matéria está toda nesta obra, receba-os como se visse os originais. Pois
coligindo fielmente de todos os que pude encontrar, nos livros dos antigos físicos e mestres e modernos
experimentadores [...]. TP, p. 78.
18
FRIAÇA, A. a unidade do saber nos céus da astronomia medieval. In: MONGELLI, L. M.
(Coord.) Trivium & quadrivium. Cotia, SP: Ibis, 1999. p. 289- 329.
19
GARCIA AVILEZ, A. Alfonso X y la tradición de la magia astral. In: MONTOYA
MARTINEZ, Jesus; DOMINGUEZ RODRIGUEZ, Ana (Coords.). El scriptorium alfonsí: de los
Libros de Astrología a las Cantigas de Santa Maria. Madrid: Ed. Complutense, 1999. p. 83-103.
20
Temos sete manuscritos datados dos séculos XIII, XIV e XV, com edição crítica bilíngüe de
Maria Helena da Rocha Pereira, que afirmou serem poucas as variações entre os textos.
66
A retórica nos prólogos...
21
SOTRES, P. G. Les regimes de santé. In: GRMEK, M.; FANTINI, B. (eds.). Histoire de la
pensée médicale en Occident. Paris: Seuil.1995, p. 265.
22
Existem por volta de 80 edições impressas em diversas bibliotecas europeias, além das traduções
para as línguas vernáculas arcaicas - 9 para o português, 24 para o espanhol, 17 para o francês, 5
para o inglês e 13 para o italiano.
67
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
68
A retórica nos prólogos...
23
As outras partes são a narração, exposição dos fatos acontecidos ou por acontecer; a divisão, o
anúncio do que será falado e explicitação do que está de acordo e-ou das controvérsias; a
confirmação, apresentação firme dos argumentos, e refutação, destruição dos argumentos
contrários; a conclusão, término do discurso (RH, p. 55).
24
Exordium setentiarum et gravitatais plurimum debet habere et omnino omnia, quae pertinent ad
dignitatem, in se continere, propterea quod id optime faciendum est, quod oratorem auditori máxime
commendat; splendoris et festivitatis et concinnitudinis minimum, propterea quod ex his suspicio
quaedam apparationis atque artificiosae diligentiae nascitur, quae máxime orationi fidem, oratori
adimit auctoritatem.
25
RA, p.249.
26
GRABMANN, M. Romanus de Roma O. P. (f 1273) und der Prolog seines Sentenzen kommentars.
Ein Beitrag zur Geschichte der scholastischen prologi und principia. Munchen: 1956, p. 285.
69
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
27
LO, p. 2.
28
LCS, p. 3. Ego magister p. Yspanus artis medicine (LO, p. 1); Ego Petrus Yspanus, considerans
diuersas egritudinum passionis per negligentiam in corporibus homini generari, quedam utilia et
experta ad salutem humane uite sanitatis conseruandam inueni [...] (LCS, p. 2).
29
GUENÉE, B. Histoire et culture historique dans l´Occident médiéval. Paris: Aubier Montaigne,
1980, p. 211-213.
70
A retórica nos prólogos...
30
LO, p. 2. “[...] Os ditos dos físicos, cuja matéria está toda nesta obra, receba-os como se visse os
originais. Pois coligindo fielmente de todos os que pude encontrar, nos livros dos antigos físicos e
mestres e modernos experimentadores [...]” (TP, p. 78); […] Dicta autem physicorum, quorum in
hoc opera material tota est ita accipiat ac si originalia uideret. Fideliter enim congregans in omnibus
que inueniri a me potuerunt, in libris antiquorum physicorum et magistrorum et modernorum
experimentatorum […] (TP, p. 79).
31
TP, p. 78. [...] Igitur Ihesu Christi summi médici gratia, qui sanat prout uult omnes infirmitates
nostras, quia ipse est caput fidelium, ab infirmitatibus capitis incipiamus, descendendo usque ad pedes,
et primo de infirmitatibus capilorum, qui aliquando auferuntur, aliquando corroduntur, aliquando in
colore alternantur” (TP, p. 81).
71
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
32
[...] Quod opus uolo Thesaurus Pauperum nominari, illi hoc opus assignans, qui Pater Pauperum
nominatur [...] (TP, p. 79).
33
ne seductus pretio aut amore fátuo (TP, p. 79).
72
A retórica nos prólogos...
34
TP, p. 258-261.
35
TP, p. 262-270.
36
TP, p. 80. [...] Igitur Ihesu Christi summi médici gratia, qui sanat prout uult omnes infirmitates
nostras, quia ipse est caput fidelium, ab infirmitatibus capitis incipiamus, descendendo usque ad pedes,
et primo de infirmitatibus capilorum, qui aliquando auferuntur, aliquando corroduntur, aliquando in
colore alternantur (TP, p. 81).
73
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
37
LCS, p. 3.
38
POUCHELLE, Marie-Christine. Medicina. In: SCHMITT, Jean-Claude; LE GOFF,
Jacques. Dicionário temático do Ocidente medieval. Bauru; São Paulo: Edusc; Imprensa Oficial do
Estado, 2002, p. 151-165.
74
A retórica nos prólogos...
Aristóteles, que fue más cumplido que los otros filósofos [...]
mostro que todas las cosas del mundo están como trabadas y
reciben virtud unas de otras, las más viles de las más nobles,
y que esta virtud aparece em unas más manifiesta, asi como
em los animales y em las plantas, y en otras más escondida,
así como en las piedras y em los metales.40
39
SCHAFFER, Martha E. Los códices de las “Cantigas de Santa Maria: su problemática.
In: MONTOYA MARTINEZ, J.; DOMINGUEZ RODRIGUEZ, A. (Coords.) El
scriptorium alfonsí: de los Libros de Astrología a las Cantigas de Santa Maria. Madrid: Ed.
Complutense, 1999.
40
LA.
41
FRANCO Jr., Hilário. Modelo e imagem: o pensamento analógico medieval. In: LEÃO,
Ângela Vaz; BITTENCOURT, Vanda O. (Orgs.) Anais do IV Encontro Internacional de Estudos
Medievais. 04 a 07/07/ 2001. Belo Horizonte: PUC/ Minas, 2003. p. 39-58.
75
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
76
A retórica nos prólogos...
42
CÁRDENAS, A. J. Alphonso´s scriptorium and chancery: role of the prologue in bonding the
Translation Studii to Translation potestatis. In: BURNS, Robert I (ed.). Emperor of culture:
Alfonso X of Castile, the learned and his thirteenth-century renaissance. Philadelphia: Univesity
of Pennsylvania Press, 1990. (Middle Ages Series). p. 90-108.
43
LA, p. 19.
44
LA, p. 19.
45
GARCIA AVILEZ, A. Alfonso X y la tradición de la magia astral. In: MONTOYA
MARTINEZ, J.; DOMINGUEZ RODRIGUEZ, A. (Coords.) El scriptorium alfonsí: de los
Libros de Astrología a las Cantigas de Santa Maria. p. 83-103.
77
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
46
LA, p. 19.
47
AMASUNO, Marcelino V. La materia médica de Dioscórides en el Lapidario de Alfonso
X. Literatura y ciência en la Castilla del sigolo XIII. Madrid: C.S.I.C., Centro de Estudios
Históricos, 1987.
78
A retórica nos prólogos...
79
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
80
O
s Manuais de Confissão elaborados durante os Séculos
Tridentinos manifestam uma certa uniformidade que
reflete o projeto unanimista da Igreja e do Estado na
reestruturação da Cristandade nos séculos XVI a XVIII. O projeto
tentava impor ao cristão um modelo de cristianismo considerado
como o único autêntico, desqualificando parcialmente o modelo
herdado da Idade Média.1 Os Manuais permitem compreender uma
das dimensões deste projeto, a saber: a confissão auricular.
A Igreja, como instituição, só se torna relevante se se leva em
conta a sua articulação com as outras instituições da totalidade social.
Estamos nos referindo ao sistema de Cristandade. A Cristandade
“constantiniana”, herdada do século IV, era um sistema de poder e
1
GOMES, Francisco José Silva. Cristandade, Reforma tridentina e teologia moral, artigo inédito, p. 1.
81
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
2
GOMES, Francisco José Silva. A Igreja e o Poder: representações e discursos. In: RIBEIRO,
Maria Eurydice de Barros (org.). A vida na Idade Média. Brasília: Ed. UnB, 1997, p. 33-47.
3
GOMES, Francisco José Silva. A Igreja e o Poder: representações e discursos. In: RIBEIRO,
Maria Eurydice de Barros (org.). A vida na Idade Média, p. 48-51.
82
Os Manuais de Confissão...
4
DELUMEAU, Jean. Naissance et affirmation de la Réforme. Paris: PUF, 1975, p. 225-278.
5
CONZEMIUS, Viktor. Movimentos de Reforma Eclesiástica. In: Enciclopédia Teológica.
Barcelona: Herder, 1985. t. V, p. 818-831.
6
GOMES, Francisco José Silva. Le projet de Néo-chrétienté dans le diocèse de Rio de Janeiro de
1869 à 1915. Tolouse: Université de Tolouse-le-Mirail, 1991. t. II, p. 430-432.
83
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
7
VALIN, Pierre. Histoire politique des chrétiens. Paris: Nouvelle Cité, 1988, p. 81-91
8
MARTINA, Giacomo. La Chiesa nell’età dell’assolutismo, del liberalismo, del totalitarismo: a
Lutero ai nostri giorni. Lezioni. Brescia: Morcelliana, 1980. t. II, p. 7-14; 29-42.
84
Os Manuais de Confissão...
9
DULLES, A. A Igreja e seus modelos. São Paulo: Paulinas, 1978, p. 33-47; CONGAR, Yves.
L’Église de Saint Augustin à l’époque moderne. Paris: Cerf, 1970, p. 369-412.
85
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
10
DELUMEAU, Jean. Le péché et la peur. Paris: Fayard, 1983, p. 30; 218-220. RAMOS-
REGIDOR, José. Teologia do sacramento da penitência. São Paulo: Paulinas, 1989, p. 161-221;
LE GOFF, Jacques. Pecado. In: Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da
Moeda, 1987. V. 12, p. 266-286.
11
LIBÂNIO, João; BINGEMER, Maria. Escatologia cristã. Petrópolis: Vozes, 1985, p. 22-31; 57-64.
86
Os Manuais de Confissão...
12
DELUMEAU, Jean. Le péché et la peur, p. 218-221.
13
DELUMEAU, Jean. Le catholicisme entre Luther et Voltaire. Paris: PUF, 1971, p. 48-51.
14
BOSSY, John. The Counter-Reformation and the people of Catholic Europe. Past & Present,
Oxford, n. 47, p. 51-70, maio 1970, p. 63-64.
87
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
15
GOMES, Francisco José Silva. Os Manuais de Confissão e a difusão do catolicismo tridentino
(séculos XVI-XVIII). Mimeo, Rio de Janeiro, IFCS/UFRJ, nov. 1997, p. 3-4.
16
GOMES, Francisco José Silva. Os Manuais de Confissão e a difusão do catolicismo tridentino
(séculos XVI-XVIII). Mimeo, p. 4-10.
88
Os Manuais de Confissão...
17
LIMA, Lana Lage da Gama. Aprisionando o desejo: confissão e sexualidade. In: VAINFAS,
Ronaldo. História e sexualidade no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, 1986, p. 79.
89
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
18
RICÓN ORDUÑA, R; MORA BARTRES, G.; LÓPEZ AZPITARTE, E. Práxis Cristã:
Moral Fundamental. São Paulo: Paulinas, 1983. t. I, p. 83-84.
19
VIDAL, Marciano. Moral de atitudes 1: Moral Fundamental. Aparecida: Ed. Santuário, 1986,
t. I, p. 111-114.
20
PINCKAERS, Servais-Théodore. La morale catholique. Paris: Cerf, 1991, p. 71-72.
90
Os Manuais de Confissão...
21
GOMES, Francisco José Silva. O Manual de Confissão na Colônia. IX Encontro de história
medieval, n. 9, 2014, Franca. Anais do IX Encontro de História Medieval. Franca, 2014, p. 6-7.
22
GOMES, Francisco José Silva. O Manual de Confissão na Colônia. IX Encontro de história
medieval, n. 9, 2014, Franca. Anais do IX Encontro de História Medieval, p. 7-8.
91
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
23
GOMES, Francisco José Silva. Os Manuais de Confissão e a difusão do catolicismo tridentino
(séculos XVI-XVIII). Mimeo, p. 13.
92
C
ruzando diversas especialidades da História, o tema em
foco situa-se numa problemática cuja observação tem
merecido mais o olhar do clínico e do enfermeiro com
interesse histórico, do que do historiador. Assim acontece em
Portugal, seja no despontar da investigação no século XX,
designadamente com Augusto da Silva Carvalho,1 seja na retomada
1
Augusto da Silva Carvalho (1861-1957) foi médico, professor, administrador hospitalar e cultor
da história. Licenciado em Medicina pela Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, produziu muitos
estudos na área da Epidemiologia, da Saúde Pública e da História da Medicina. Foi presidente da
Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa e professor de História da Medicina na Faculdade de
Medicina da Universidade de Lisboa. Em 2 de junho de 1921 foi admitido como Académico na
Academia das Ciências de Lisboa, passando a membro efectivo em 1928. Foi vasta a sua
colaboração em periódicos, como A Medicina Contemporânea e o Diário de Lisboa, designadamente
o publicado em 1933.
93
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
2
Recordo Maximiano de Lemos (1860-1923) que foi médico, docente da cadeira de História da
Medicina da Universidade do Porto e redactor dos Arquivos de História da Medicina Portuguesa,
da Gazeta dos Hospitais do Porto e da Gazeta Médica do Porto. Foi membro da Sociedade de
Medicina Cirúrgica do Porto, a que presidiu, e da Academia das Ciências de Lisboa. Por iniciativa
de Luís de Pina, que lhe sucedeu na cátedra de História da Medicina, o Museu de História da
Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, fundado em 1933, tem o seu
nome. Vide uma nota biográfica em: Museu de História da Medicina. Maximiano Lemos. Porto:
Faculdade de Medicina – Universidade do Porto. Disponível:
<http://museumaximianolemos.med.up.pt/index.php?src=page13.html>. Consultado em: 20
jul. 2016. E refiro-me ainda a: FERREIRA DE MIRA, M. História da Medicina Portuguesa.
Lisboa: Edição da Empresa Nacional de Publicidade, 1947.
3
CARNEIRO, Marinha. Ajudar a Nascer. Parteiras, Saberes Obstétricos e Modelos de Formação
(Século XV-1974). Porto: Editora da Universidade do Porto, 2008.
94
Medicina da mulher em Portugal
4
Vale, por todos, o balanço e elenco bibliográfico de Maria Antónia Lopes: LOPES, Maria
Antónia. Protecção Social em Portugal na Idade Moderna. Guia de Estudo e Investigação.
Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2010.
5
Exemplifico este caminho com uma obra que responde bem ao sentido transatlântico de discussão
e já de referência: ABREU, Jean Luiz Neves. Nos domínios do corpo. O saber médico luso-
brasileiro no século XVIII. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2011.
6
Útil a visão de conjunto fornecida por: MARTINS E SILVA, J. Anotações sobre a história do
ensino da Medicina em Lisboa, desde a criação da Universidade Portuguesa até 1911. Revista da
Faculdade de Medicina de Lisboa, Lisboa, s. III, 7, 5, p. 237-249 / 7, 6, p. 305-314, 2002.
7
Registem-se alguns trajectos analíticos para Portugal, para a época moderna, como o de BRAGA,
Isabel M. R. Mendes Drumond. Nascer nos Cárceres do Santo Ofício. In: Assistência, Saúde
Pública e Prática Médica em Portugal. Séculos XV-XIX. Lisboa: Universitária Editora, 2001, p.
61-74 e BRAGA, Isabel M. R. Mendes Drumond.Viver e Morrer nos Cárceres do Santo Ofício.
Lisboa: A Esfera dos Livros, 2015. E para o Brasil, para um tempo mais tardio, tem-se uma linha
profícua no estudo de MARTINS, Ana Paula Vosne. Visões do Feminino: a medicina da mulher
95
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
nos séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2004; e uma perspectiva analítica de longa
duração em BRENES, Anayansi Correa. Bruxas, Comadres ou Parteiras. A Obscura História das
Mulheres e a Ciência. Belo Horizonte: Coopmed-Pelicano Edições, 2005; BRENES, Anayansi
Correa. Parteiras. Escola de Mulheres. Belo Horizonte: Coopmed Editora, 2009; BRENES,
Anayansi Correa. História da Parturição no Brasil, Século XIX. Cadernos de Saúde Pública, Rio
de Janeiro, 7, 2, p. 135-149, abril-junho de 1991. Ter ainda em conta BARRETO, Maria Renilda
Nery. Assistência ao nascimento na Bahia oitocentista. História, Ciências, Saúde –Manguinhos,
Rio de Janeiro, v. 15, n. 4, p. 901-925, out.-dez. 2008; e mais recentemente, BASTOS, Cristiana;
BARRETO, Renilda (orgs.). A Circulação do Conhecimento: Medicina, Redes e Impérios. Lisboa:
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, 2011.
8
Tal é o percurso nacional que vai de Amato Lusitano, a Rodrigo de Castro e aos autores e
tradutores setecentistas de manuais de obstetrícia, destinados à ilustração de cirurgiões e de
parteiras, como Domingos de Lima e Melo, que traduziu do francês, em 1725, Luz das comadres
ou parteiras: breve tratado de como se deve acudir aos partos perigosos e Manuel José Afonso e José
Francisco de Melo, dois irmãos cirurgiões que publicaram em 1772, Novo método de partejar,
recopilado dos mais famigerados e sábios autores, recopilação de diversas obras que circulavam no
tempo, umas francesas, outras espanholas, até às renovações discursivas oitocentistas, como a de
Jacinto da Costa, que publicou em 1810, Compêndio da arte de partos para uso dos praticantes de
cirurgia, e parteiras e em 1815, Tratado completo da cirurgia obstetrícia, ou ciência da arte de partos
e o de Joaquim da Rocha Mazarém que escreveu o Anuário Clínico da Arte Obstétrica (1825-26) e
a Compilação de doutrinas obstétricas (1833). Uma passagem pela obra de Luís Miguel Bernardo é
expressiva da realidade evidenciada sobre o reduzido número de mulheres que se dedicavam à
ciência em Portugal, até ao século XIX, fundamentando o autor o seu entendimento no adágio
popular: “Mula que faz him/E mulher que falla latim/Raramente há bom fim”. BERNARDO,
Luís Miguel. Cultura Científica em Portugal. Uma Perspectiva Histórica. Porto: U. Porto
editorial, 2013, p. 322, nota.
9
Registo aqui últimas vias, como: REIS, Maria de Fátima. Alfredo da Costa: o Homem e a
Instituição na História da Assistência à Maternidade. In: III Curso de Verão. Quadros da História
de Lisboa. A Freguesia das Avenidas Novas. Lisboa: Academia Portuguesa da História; Centro
de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Grupo de Investigação
Historiografia e Cultura Política, 30 Jun.- 1, 3 e 4 de jul. de 2014; REIS, Maria de Fátima. Rodrigo
de Castro: razão e experiência no «médico perfeito». In: Seminário Os Judeus e a Medicina: tempo
e memória. Organização: Cátedra de Estudos Sefarditas “Alberto Benveniste” e Ordem dos
96
Medicina da mulher em Portugal
Médicos. Coord. Científica de Maria de Fátima Reis em colaboração com a Dr.ª Maria do Sameiro
Barroso. Lisboa: Ordem dos Médicos e Faculdade de Letras de Lisboa, 9 out. 2014 / 13 nov. de
2014; REIS, Maria de Fátima. Tradição e Inovação na prática de partejar: história das
maternidades de Lisboa. In: I Seminário “Políticas Sociais em perspectiva: novas questões, métodos
inovadores, resultados emergentes”. Évora: Universidade de Évora, 10 jul. 2015.
10
Vide LEMOS, Maximiano de. Historia da Medicina em Portugal. Doutrinas e Instituições.
Lisboa: Manoel Gomes, Editor, 1899. v. II, p. 147.
11
De origem judaica e com articulação ao norte da Europa, mais conhecido por Mirandela, por
ter nascido nessa terra de Trás-os-Montes, publicou Medicina lusitana: socorro delphico aos
clamores da natureza humana para total profligação de seus males, Amsterdam, Miguel Diaz,
1710. Vide a nota biográfica de Diogo Barbosa Machadoe Inocêncio Francisco da Silva.
MACHADO, Diogo Barbosa. Bibliotheca Lusitana. Coimbra: Atlântida Editora, 1966. t. II,
p. 148. SILVA, Inocêncio Francisco da. Diccionario Bibliographico Portuguez. Lisboa: Na
Imprensa Nacional, 1859. t. II, pp. 377-378.
12
Vide LEMOS, Maximiano de. Historia da Medicina em Portugal, p. 319-324.
13
Apud VASCONCELOS, José Manuel. Antecedentes da Escola Médico-Cirúrgica do Porto. A
caminho da fusão da Medicina com a Cirurgia. Etapas da afirmação institucional de uma profissão.
História. Revista da FLUP. História, Porto, s. IV, v. 4, 2014, p. 241-269, em especial, p. 249.
97
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
14
Vide FERREIRA DE MIRA, M. História da Medicina Portuguesa, p. 88.
15
Para uma leitura renovada do catolicismo moderno em Portugal, vide PALOMO, Federico. A
Contra-Reforma em Portugal. 1540-1700. Lisboa: Livros Horizonte, 2006.
16
Acompanhe-se esta problemática em: ENES, Maria Fernanda. Reforma Tridentina e Religião
Vivida (Os Açores na Época Moderna). Ponta Delgada: Signo, 1991 e TRINDADE, Ana Cristina
Machado. A Moral e o Pecado Público no Arquipélago da Madeira, na segunda metade do século
XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade da Madeira. Funchal: 1998, exemplar
policopiado.
17
Vide OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município de Lisboa. Lisboa:
Typographia Universal, 1885. t. II, p. 78, nota.
18
Vide OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município de Lisboa, p. 78.
98
Medicina da mulher em Portugal
19
Vide OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município de Lisboa, p. 78.
20
Vide OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município de Lisboa, p. 78-
79, nota.
21
Vide OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município de Lisboa, p. 78.
99
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
22
Regimento do antigo Cirurgião-mor do reino. In: Gazeta Médica do Porto, Porto, n. 244, 1850, p. 409.
100
Medicina da mulher em Portugal
23
O que dificulta um conhecimento sólido das praticantes em exercício, como se pode ter, por
exemplo, para os boticários. Vide BRAGA, Isabel M. R. Mendes Drumond. A Saúde Pública e
os seus Agentes em Portugal: o Caso dos Boticários (1521-1557). In: Assistência, Saúde Pública e
Prática Médica em Portugal. Séculos XV-XIX. Lisboa: Universitária Editora, 2001, p. 41-59.
24
Num estudo que fiz para Santarém para uma análise de vinte anos, apenas localizei dois registos
de “cartas de examinação” do século XVII, nos livros de registo da câmara, para, diz-se, usar do
“officio de comadre a que comummente chamão parteira”. Vide REIS, Maria de Fátima. Os
Expostos em Santarém. A Acção Social da Misericórdia (1691-1710). Prefácio de Joaquim
Veríssimo Serrão. Lisboa: Edições Cosmos, 2001, p. 41.
25
Esta realidade está bem documentada e devidamente discutida por CARNEIRO, Marinha
Fernandes. A Parteira no contexto das Artes de Curar (Séculos XV-XVIII). População e Sociedade,
Porto, n. 4, p. 123-144, 1998, invocando o autor as medidas preconizadas por D. Luís Ferrari de
Mordau, Intendente Geral da Agricultura, no tempo de Pombal, que, no Despertador da
Agricultura de Portugal, apela à existência de parteiras “examinadas nos campos, que não há, e
pelas não haver; ou não prestarem, morrem neste acto muitas mulheres, e muitas crianças, pois
assim como ha Medicos pagos, deve haver parteiras pagas, com o maior fundamento de que das
mãos dos Medicos, vai se da vida para a morte, que não tem remedio, e das mãos das parteiras vem
o Homem do nada para a vida, que se facilita com a boa assistência”. Neste estudo encontra-se um
entendimento pertinente da parteira examinada como uma realidade urbana, na linha do
verificado para outros espaços como França, tal como é dito por GÉLIS, Jacques. La sage-femme
ou le médecin. Une nouvelle conception de vie. Paris: Fayard, 1988, p. 23.
101
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
26
Vide Collecção cronológica de várias provisões e regimentos de El-Rey D. Sebastião. Coimbra: Real
Imprensa da Universidade, 1819, p. 22. Vide o entendimento de Isabel dos Guimarães Sá sobre o
“não dar conta” que poderá significar tanto a “falta de participação às autoridades”, como “não
dar parte à comunidade da gravidez e do parto”, em GUIMARÃES SÁ, Isabel dos. A Circulação
de Crianças na Europa do Sul: o Caso dos Expostos do Porto no Século XVIII. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian; Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, 1995, p. 80-82.
27
Ordenações Filipinas. Livro I, título LXXIII, § 4.
28
Para o entendimento deste fenómeno, vide REIS, Maria de Fátima. Os Expostos em Santarém.
A Acção Social da Misericórdia (1691-1710), por exemplo, p. 50.
29
Vide SILVA CARVALHO, Augusto. História da Medicina Portuguesa. Lisboa: separata de
Portugal. Exposição Portuguesa em Sevilha, 1929, p. 8-9.
30
Vide REIS, Maria de Fátima. Os Expostos em Santarém. A Acção Social da Misericórdia (1691-
1710), p. 42.
102
Medicina da mulher em Portugal
31
Constituições Synodaes do Arcebispado de Lisboa […]. Lisboa: Na Officina de Filippe de Sousa
Villela, 1737, p. 23.
32
O “baptismo de precaução”, recomendado pelo Concílio Tridentino, deveria ser complementado
pelo pároco na igreja. Partindo destes casos, indicativos de nascimentos de risco, ligados a problemas
intra-uterinos, consegui estimar, para Santarém, para fins do século XVII e princípios do século
XVIII, uma média de 3,5 a 4% de crianças baptizadas em casa “por necessidade” e “risco de vida”.
Vide REIS, Maria de Fátima. Os Expostos em Santarém. A Acção Social da Misericórdia (1691-1710),
p. 141.
33
OLIVEIRA, Cristóvão Rodrigues de. Lisboa m 1551. Sumário […]. Lisboa: Livros Horizonte,
1987, p. 99.
34
Vide SILVA CARVALHO, Augusto da. Subsídios para a História das Parteiras Portuguesas.
A Medicina Contemporânea, Lisboa, ano XLIX, n. 29, 19 jul. 1931, p. 256.
103
105
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
D
om Manuel I, cognominado “O Venturoso”, teve seu
reino considerado a fase mais gloriosa de Portugal.
Assumiu a coroa em 1495, e durante seu reinado foram
consolidadas as Grandes Navegações Portuguesas que tornaram
Portugal uma nação rica com a Descoberta do caminho marítimo
para as Índias e consequente estabelecimento de colônias e comércio
de especiarias na Ásia e na África. Dom Manuel foi também o
patrocinador da Descoberta do Brasil por Cabral. Biografias de Dom
Manuel I não hão de faltar na historiografia portuguesa, inclusive
Damião de Góis, humanista português e historiador, escreveu a
crônica oficial do rei D. Manuel I, completada em 1567 por
encomenda do Cardeal Dom Henrique.
Entre as realizações arquitetônicas de Dom Manuel estão a
construção da Torre de Belém, de onde partiu Cabral com sua
esquadra até chegar às costas do Brasil, e o Mosteiro dos Jerônimos,
duas grandes obras da arquitetura portuguesa cujo estilo foi
denominado “Manuelino”, em homenagem ao soberano português.
Este estilo procurava evocar o movimento das ondas do mar. Dom
Manuel I também nos legou um Livro de Horas, um pergaminho
iluminado. Um Livro de Horas é um livro de veneração criado por
devotos no final da Idade Média. Em geral, continha o calendário das
festas e dos santos, as Horas da Virgem, as Horas da Cruz, as Horas
do Espírito Santo e o Ofício dos mortos (Liturgia das Horas), as
orações comuns e os salmos penitenciais. Costumeiramente eram
ricamente ilustrados com iluminuras.
O livro de Horas de D. Manuel levou 34 anos para ser
completado, e quem o fez foi D. João III, seu filho e sucessor no
trono. Por isso o livro também é conhecido como o livro de Horas de
D. João III. Nosso objeto de estudo é um de seus fólios que está
classificado na ficha de inventário do Matriznet português como
Pergaminho 14/87v. ilum. Este verso do fólio 87 representa uma
cena da Natividade do Cristo, a da Adoração dos Magos; o
pergaminho encontra-se hoje no Museu Nacional de Arte Antiga.
Segundo consta, o livro foi iniciado no ano de 1517 e traz em seu
interior a informação de que sua execução teria sido encerrada no ano
de 1551. Atribuído a Antônio de Holanda, iluminador ativo em
106
A Adoração dos Magos...
107
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
1
BAXANDALL, Michel. O Olhar Renascente: pintura e experiência social na Itália da
Renascença. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
108
A Adoração dos Magos...
2
VERMES, Geza. Natividade. Rio de Janeiro: Record, 2007.
109
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
Figura 4: à esquerda: cão denominado de rafeiro no site Matriznet na iluminura da Adoração dos
Magos de 1517 do pergaminho de Dom Manuel I. À direita, cão rafeiro do Alentejo da
atualidade.
110
A Adoração dos Magos...
3
Esta ovelha era o resultado do cruzamento da ovelha autóctone com carneiros das zonas conquistadas
aos muçulmanos no norte da África. Animal de constituição delicada e muito sensível ao clima extremo
do norte do País, levou os pastores a praticar e desenvolver um regime de transumância. CUTILEIRO,
Evaristo. Nobreza, Dignidade, Tranquilidade. In: Almanaque Alentejano. Disponível em:
<http://www.prof2000.pt/users/avcultur/luisjordao/almanaque/Numero01/page33.htm>. Acesso
em: 27 jul. 2016.
4
Molossos são um grupo de cães de físico forte. A palavra deriva de Molóssia, uma área do Épiro
antigo, hoje a Grécia ocidental, onde o grande cão pastor era conhecido como um Molossus. Cf.
VASCONCELLOS, José Leite; GUERREIRO, Manuel Viegas; SOROMENHO, Alda da
Silva; SOROMENHO, Paulo Caratão. Etnografia portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa
da Moeda, 1994. v. II, p. 139.
5
CUTILEIRO, Evaristo. Nobreza, Dignidade, Tranquilidade. In: Almanaque Alentejano. Disponível em:
<http://www.prof2000.pt/users/avcultur/luisjordao/almanaque/Numero01/page33.htm>. Acesso em:
26 jul. 2016.
111
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
6
MatrizNet. Consultado em:
<http://www.matriznet.dgpc.pt/MatrizNet/Objectos/ObjectosConsultar.aspx?IdReg=26455
4>. Acesso em: 26 jul. 2016.
112
A Adoração dos Magos...
Figura 5 - Detalhe da Adoração dos Magos. Tarja com a pintura das moedas, parte esquerda da
moldura da Natividade onde se encontram as moedas com as efígies de Fernando de Aragão e
Isabel de Castela.
7
In hoc signo vinces. Tradução livre da autora: “neste sinal vencerás”.
113
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
114
A Adoração dos Magos...
8
“Magi sunt, qui munera Domino dederunt: primus fuisset dicitur Melchior‘, senex et canus,
barba prolixa et capillis, tunica hyacinthina, sagoque mileno, et calceamentis hyacinthino et albo
115
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
mixto opere, pro mitrario variae compositionis indutus: aurum obtulit regi Domino. Secundus,
nomine Caspar‘, juvenis, imberbis, rubicundus, mylenica tunica, sago rubeo,calceamentis
hyacinthinis vestitus: thure quasi Deo oblatione digna, Deum honorabat. Tertius, fuscus, integre
barbatus, Balthasar‘ nomine, habens tunicam rubeam, albo vario, calceamentis milenicis amictus:
per myrrham Filium hominis moriturum professus est. Omnia autem vestimenta eorum Syriaca”.
Corpus Corporum – repositorium operum Latinorum apud universitatem turicensem. Consultado em:
<http://mlat.uzh.ch/MLS/>. Acesso em: 26 jul. 2016.
116
A Adoração dos Magos...
Figura 7- Rei Melchior- detalhe da pintura de Vasco Fernandes, à esquerda do livro de Dom
Manuel I.
117
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
118
A Adoração dos Magos...
119
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
9
MatrizNet. Disponível:
<http://www.matriznet.dgpc.pt/MatrizNet/Objectos/ObjectosConsultar.aspx?IdReg=20760
2&EntSep=5#gotoPosition>. Consultado em: 27 jul. 2016.
120
A Adoração dos Magos...
10
Livros de Horas de D. Manuel. In: Projeto Memória. Disponível em:
<http://www.projetomemoria.art.br/PedroAlvaresCabral/links/horas.htm>. Consultado em:
27 jul. 2016.
121
Operários do evangelho:
construindo a espiritualidade franciscana no Brasil
T
alvez um dos traços mais marcantes da cultura artística
portuguesa transladados para o Brasil tenham sido os
azulejos bicromados nas cores azul e branco, reconhecidos
em qualquer parte do país como azulejos portugueses ou azulejos
coloniais. Foram introduzidos em Portugal no século XV, compondo
com a tijolaria a decoração geométrica dos palácios. Mais tarde
começaram a revestir as paredes dos edifícios civis e religiosos. Os
primeiros azulejos a desembarcarem no Brasil datam do século XVII
(1653), quando reinava, em Portugal, D. João V. Pareciam perfeitos
para o revestimento das paredes dos edifícios da colônia de clima
tropical. Os azulejos foram, então, destinados a grande parte do
espaço interno da Igreja Franciscana de Cairu no Recôncavo Baiano.
Uma das fontes mais importantes sobre a presença dos
Franciscanos no Brasil são as crônicas seráficas de Frei Antonio
Santa Maria Jaboatão. Trata-se de dois volumes impressos em
123
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
1
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil. Por Fr.
Antonio de Santa Maria Jaboatam. Impressa em Lisboa em 1761. Reimpresa por ordem do
Instituto Histórico Geográfico Brasileiro. Rio de janeiro, 1858. v. I, p. 5.
2
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 8.
3
Decreto de 13 de março de 1584.
124
Operários do evangelho
4
Decreto de 16 de outubro de 1609.
5
O alvará régio liberou novas construções, excluindo inclusive qualquer exigência de licença da
Câmara e do Governo Geral.
125
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
6
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 8.
7
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 9.
8
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 76-78.
126
Operários do evangelho
9
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 96.
10
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 5.
11
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. I, p. 10.
127
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
128
Operários do evangelho
12
O conjunto convento igreja recebeu duas visitas de inspeção do SPHAN respectivamente em 1946,
1937, 1957. Em 1962 nova visita constatou o desabamento do altar de Santa Barbara que veio a ser
restaurado no ano seguinte. A ordem realizou trabalhos de conservação em 1964 e teve apoio do SPHAN
para os mesmos fins em 1967. No final da década de 60 e início de 70, o SPHAN restaurou a sacristia e
duas escadarias. Em 2009 deu-se início a última restauração dos elementos artísticos.
13
BAZIN, Germain. A arquitetura Religiosa Barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 1956, p. 14-15.
129
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
14
SOUSA, Alberto. In: Anais do VI Colóquio Luso-Brasileiro de História da Arte. Rio de Janeiro:
CBHA, UFRJ, UERJ, 2004. v.1, p. 39-49 (Foi consultada a versão revisada pelo autor).
15
ARGOLO, José Dirson. O Convento Franciscano de Cairu. Restauração de Elementos
Artísticos. Brasília: IPHAN, 2009.
130
Operários do evangelho
16
ARGOLO, José Dirson. O Convento Franciscano de Cairu, p. 61.
17
ARGOLO, José Dirson. O Convento Franciscano de Cairu, p. 63.
131
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
18
Embora tenhamos visitado a ilha e o convento de São Francisco e feito na época, algumas fotos,
em particular da capela de Santa Rosa, o trabalho de restauração estava no começo. Por esta razão
recorremos também, ao trabalho de José Dirson Argolo. ARGOLO, José Dirson. O Convento
Franciscano de Cairu, p. 59-61.
19
RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros. Ver e sentir: Imagem e espiritualidade Franciscana. In: I
Colóquio Internacional de estudos medievais e I Encontro do GEPEM (Grupo de estudos e pesquisas
do medievo) da PUC-GO – ‘Entre a história e a historiografia’. Goiânia: PUC-Goiás, 2012.
20
Azulejos da Igreja Matriz de Cachoeira. In: Revista da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, 2006.
132
Operários do evangelho
21
RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros. A metamorfose do modelo. Estudos de espiritualidade e
iconografia franciscana. In: MENDONÇA, Manuela; SANTOS, João Marinho dos. Raízes
medievais do Brasil Moderno – Ordens religiosas entre Portugal e o Brasil. Lisboa: Academia
Portuguesa da História, 2012.
22
ARGOLO, José Dirson. O Convento Franciscano de Cairu, p. 66-67.
133
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
23
ARGOLO, José Dirson. O Convento Franciscano de Cairu, p. 68-69.
24
Ordália, ordálio ou sentença divina em que a verdade era atribuída a Deus, consistia em uma
forma de comprovação em litígios particulares e públicos. Era um meio de prova. De origem
anglo-saxã, generalizou-se pelos países europeus até o século XIII, quando a prática foi condenada
oficialmente no IV Concílio de Latrão e pelas Decretais do papa Gregrório IX(1234).
25
Foram mantidas as traduções feitas no original por Cândido da Costa e Silva. ARGOLO, José
Dirson. O Convento Franciscano de Cairu, p. 69.
26
ARGOLO, José Dirson. O Convento Franciscano de Cairu, p. 69.
134
Operários do evangelho
27
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil. Por Fr.
Antonio de Santa Maria Jaboatam. Parte Segunda (Inédita). Impressa por Ordem do Instituto
Histórico Brasileiro. Rio de Janeiro: Typ. Brasiliense de Maximiano Gomes Ribeiro, 1861. v. II,
Livro III., p. III.
135
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
28
Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Chronica dos frades menores da Província do Brasil, v. II, p. 304.
136
Operários do evangelho
29
Santa Rosa de Viterbo viveu na primeira metade do século XIII, época em que parte da Europa
atravessava um momento de crise em que os poderes da Igreja, representado pelo Papa e o poder
temporal pelo imperador se enfrentavam. Do lado da igreja uma crise de espiritualidade de grandes
proporções abria espaço para a formação das ordens mendicantes, um fenômeno a mais que a
urbanização provocava. Francisco de Assis se tornou um emblema deste tempo, ao assumir uma
vida apostólica e seguir as pegadas do próprio Cristo. Neste contexto de luta entre poderes tão
distintos viveu a jovem Rosa. Seus pais trabalhavam no mosteiro São Damião de Clarissas, em
Assis, fundado por Clara de Assis, que havia seguido Francisco e seus companheiros. Rosa
começara a se inspirar em Francisco desde muito cedo. Como ocorria naquela época aos que o
admiravam, ela buscava uma vida de oração e doação a Deus. Recusado. O mosteiro das Clarissas
onde Rosa foi enterada passou a se denominado de Mosteiro de Santa Rosa.
137
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
Anexos
30
RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros. O inferno terrestre. O tempo das imagens e o tempo da
história. Revista VIS (UnB), v. 5, p. 100-112, 2006, p. 110.
138
Operários do evangelho
139
Os historiadores:
seus feitios e seus limites
O elogio do contraditório.
Reflexões sobre a cronística de Zurara
E
m 2015 celebraram-se os 600 anos da conquista de Ceuta.
Os herdeiros mais ou menos explícitos da consagrada
análise dirigida por Pierre Nora sobre “locais de memória”
multiplicaram colóquios e congressos, com proveito no
aprofundamento e alargamento de perspectivas, é certo. Eu mesma
retornei a Ceuta através do obrigatório regresso à Crónica da Tomada
de Ceuta por El Rei D. João I e à Crónica do Conde Dom Pedro de
Menezes:1 revisitação aliciante pela constatação de que textos,
conhecidos pela comunidade científica ao longo de muitos anos,
1
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica da Tomada de Ceuta por El Rei D. João I [CTC].
Publicada por Francisco Maria Esteves Pereira. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, 1915;
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde Dom Pedro de Menezes [CDPM].
Reprodução fac-similada com nota de apresentação por José Adriano de Freitas Carvalho. Porto:
Programa Nacional de Edicões Comemorativas dos Descobrimentos Portugueses, 1988. São estas
as edições por nós utilizadas, muito embora tenham saído recentemente outras igualmente fiáveis.
143
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
**
2
Mt. 13: 52.
3
ARISTÓTELES. Poética. Prefácio de Maria Helena da Rocha Pereira. Trad e notas de Ana
Maria Valente. 3ª edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008, 1451 a-b.
4
BANDEIRA, Manuel. Pneumotórax. In: Poesias completas. Rio de Janeiro: CEB, 1948.
144
O elogio do contraditório
5
BRITO, António José de. O possível e o real. Filosofia: revista da faculdade de letras da
Universidade do Porto. Porto, v. II, p. 71-92, 1994, p. 92.
6
CARVALHO, Joaquim de. Sobre a erudição de Gomes Eanes de Zurara. In: Obra Completa.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1981. v. II, p. 185-340.
7
Tornam-se assim irrelevantes acusações com que a uma alegada historiografia, que ainda faz
escola, o arruma como cronista menor pela alegada falta de objectividade por obediência aos
interesses do seu mentor, o infante D. Henrique.
145
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
8
CTC, cap. 9, p. 24-26.
9
CTC, cap. 10, p. 28.
10
CARVALHO, Joaquim de. Sobre a erudição de Gomes Eanes de Zurara. In: Obra Completa, p.
188.
146
O elogio do contraditório
11
Trata-se da carta guardada entre os papéis de D. Duarte e incluída no Cap. 98 do Leal
Conselheiro. Cf. D. DUARTE. Livro dos Conselhos de El-Rei D. Duarte (Livro da Cartuxa).
Edição Diplomática. Lisboa: Editorial Estampa, 1982, [18.], p. 100-113.
12
CTC, cap. 97, p. 257.
13
CTC, cap. 98, p. 259.
147
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
14
CTC, cap. 10, p. 30.
148
O elogio do contraditório
15
CTC, cap. 4, p. 15.
16
CTC, caps. 10, 11 e 12, p. 30-42.
17
CTC, cap. 12, p. 38.
18
D. DUARTE. Livro dos Conselhos de El-Rei D. Duarte (Livro da Cartuxa), [6.], p. 43-86.
19
CTC, cap. 12, p. 38.
149
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
20
CTC, cap. 12, p. 38.
21
CTC, cap. 12, p. 42.
22
CTC, cap. 13, p. 42.
150
O elogio do contraditório
23
CTC, cap. 14, p. 46.
24
Sl 118:6; 27:1; 84:11
25
CTC, cap. 14, p. 47.
26
CTC, cap. 14, p. 48.
27
CTC, cap. 19, p. 60.
28
CTC, caps. 16, 17 e 18.
29
CTC, cap. 19, p. 60.
151
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
30
CTC, cap. 20, p. 62 ss.
31
CTC, caps. 20, p. 65.
32
CTC, caps. 21, 37 e 38.
152
O elogio do contraditório
33
CTC, cap. 22.
34
CTC, cap. 23.
35
CTC, cap. 24.
36
CTC, cap. 25.
153
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
37
CTC, cap. 27.
38
ALBUQUERQUE, Martim de. O Poder Político no Renascimento Português. Lisboa: Instituto
Superior de Ciências Sociais e Politica Ultramarina, 1968, p. 278; Vd, o conceito de reis como
“monopolistas do poder” em: ALBUQUERQUE, Ruy de; ALBUQUERQUE, Martim de.
História do Direito Português (1140-1415). 10ª ed. Lisboa: Pedro Ferreira, 1999. v. I, p. 51.
39
Cf. VENTURA, Margarida Garcez. O Messias de Lisboa: um estudo de mitologia política
(1383-1415). Prefácio de Martim de Albuquerque. Lisboa: Edições Cosmos, 1992, p. 97-98.
40
CTC, cap. 26.
41
CTC, cap. 26, p. 80.
154
O elogio do contraditório
42
CTC, cap. 27, p. 81.
43
CTC, cap. 27, p. 81.
44
CTC, cap. 27, p. 83.
45
CTC, cap. 37.
46
CTC, cap. 44, p. 135.
155
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
47
CTC, cap. 47.
48
CTC, cap. 57, p. 145.
156
O elogio do contraditório
49
CTC, cap. 57, p. 146.
50
CTC, cap. 47, p. 146.
51
CTC, cap. 48.
157
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
52
CTC, cap. 48, p. 149.
53
CTC, cap. 49.
54
CTC, cap. 49, p. 149.
55
Sobre a suspeita lançada sobre o Prior do Hospital vd. infra, n. 41.
158
O elogio do contraditório
56
CTC, cap. 50.
57
CTC, cap. 52. Cf. VENTURA, Margarida Garcez. O Algarve nos primórdios da Expansão: um
sermão milenarista em lagos (12.VII.1415). Sep. da Revista da Faculdade de Letras, n 8, Lisboa,
1987 e nas Actas das IIIªs Jornadas de História Medieval do Algarve e Andaluzia, Loulé, 1992.
58
CTC, cap. 53.
59
Vd. MONTEIRO, João Gouveia; COSTA, António Martins. 1415, A Conquista de Ceuta: O
relato empolgante da última grande vitória de D. João I. Barcarena: Manuscrito, 2015, p. 40.
60
CTC, cap. 52, p. 180.
159
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
61
CTC, cap. 52, p. 181.
62
CTC, cap. 52, p. 182.
63
CTC, cap. 63.
64
CTC, cap. 53, p. 184.
160
O elogio do contraditório
65
CTC, cap. 63, p. 185.
66
CTC, cap. 64, p. 185.
67
CTC, cap. 64, p. 185.
68
CTC, cap. 71.
69
Liber Gestorum Concilii Constanciensis. Livro de Arautos: de ministerio armorum. Estudo
codicológico, histórico, literário, linguístico por Aires do Nascimento.Lisboa: [s.n.], 1977, p. 330.
161
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
70
O primeiro doc. em que surge a nova titulação é de 8 Fev. 1416. Vd. BRAGA, Isabel M. R.
Mendes Drumond; BRAGA, Paulo Drumond. Ceuta Portuguesa (1415-1656). Ciudad Autónoma
de Ceuta: Instituto de Estudios Ceutíes, 2008, p. 23.
71
CTC, cap. 12.
72
CTC, cap. 88.
73
CTC, cap. 89.
74
CTC, cap. 97, p. 257.
75
CTC, cap. 97, p. 257-258.
76
CTC, cap. 97, p. 258.
162
O elogio do contraditório
todos quantos queiram lutar pela fé. Como se vê, o rei traz, a par de
argumentos sempre aduzidos, outros mais raros ou novos.
Uma vez mais – a última num conselho e com a presença régia
–, surgem as objecções, agora claramente assumidas pelos membros
do conselho que não estavam de acordo com a permanência na
praça.77 Objecções, ou seja, contrários com presença teorizada, como
já vimos: “Por quamto, senhor, conheçemos de uossa uoomtade que
he sempre seerdes comsselhado em todallas cousas, e que uos nom
despraz de uos serem ditas quaaesquer cousas, que homem semta
comtra uosso proposito”.78 Esses conselheiros, não obstante,
reconhecerem a boa intenção do rei, lembram que há necessidade de
ver “se ha hi outros comtrairos que uos possam embargar”.79 E, de
novo – porque já conhecemos estas objecções noutros contextos – se
lembra a distância a que fica Ceuta e o facto de estar no meio de
inimigos; aduz-se ainda a quantidade de gente que seria necessária
para a defesa da cidade, gente que não existe no reino, e o perigo deste
ficar indefeso perante um eventual ataque de Castela; as exigências
em dinheiro e mercês que seriam exigidas pelos que ficarem, com
grande escândalo do povo em geral; finalmente, lembram que, se o
rei quer erguer igrejas onde se celebre o culto divino, deveria começar
pelas que estão no reino, quase todas destruídas; e o facto de Ceuta
servir para cumprir penas, só vai multiplicar o atrevimento dos
criminosos.
A resposta régia80 vai insistir, precisamente, no longo
caminho percorrido, pontuado por conselhos que eles mesmos lhe
tinham dado, no sentido de abandonar o projecto; mas que ele,
quando se lembrava que o fundamento da empresa era ser serviço de
Deus, logo voltava a confiar na sua capacidade para a levar a bom
termo com a ajuda de Deus, e conclui: “ponho estes feitos nas maãos
de nosso Senhor Deus, e de minha Senhora a uirgem Maria sua
madre, sob cuja esperamça determino de guardar e mamteer esta
çidade aa sua homrra e louuor”.
77
CTC, cap. 98.
78
CTC, cap. 98, p. 259.
79
CTC, cap. 98, p. 259.
80
CTC, cap. 99.
163
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
81
CTC, cap. 100; CDPM, cap. 5.
82
CDPM, cap. 7.
83
CDPM, cap. 8.
84
CTC, cap. 101, p. 265; CDPM, caps. 10 e 11.
85
Cf. CONTAMINE, Philippe. La Guerre au Moyen Age. 5ª ed. Paris: Puf, 1999, cap. IX.
164
O elogio do contraditório
86
D. DUARTE. Livro dos Conselhos de El-Rei D. Duarte (Livro da Cartuxa), [4.], p. 37. Na carta
a D. Duarte aquando da sua subida ao trono (Ag. 1433) D. Pedro não inclui nenhum conselho
relacionado com o Benamarim.
87
É esta a opinião de José de Bragança, que aqui referimos, embora não nos convença. Vd.
GOMES EANES DE ZURARA. Cronica do Descobrimento e Conquista da Guiné [...]. Intr. José
de Bragança. Porto: Civilização, 1937. v. I e II, XLII.
88
RUI DE PINA Chronica do Senhor Rey D. Duarte. In: Crónicas de Rui de Pina. Introdução e
revisão de M. L. de Almeida. Porto: Lello & Irmão, 1977, caps. XXXVIII-XLI.
165
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
89
Apropriando-me do conceito de SERRÃO, Vítor. Trans-Memória das Imagens. Lisboa: Ed.
Cosmos, 2008.
90
Cf. ALBUQUERQUE, Martim de. A Consciência Nacional Portuguesa. Lisboa, [s.n.], 1972.
91
Consideramos operacional para os historiadores a formulação de Georges Didi-Huberman, ver:
DIDI-HUBERMAN, Georges. Devant le temps. Paris: Les Éditions de Minuit, 2000.
166
O
tempo e a grandeza das obras são os pontos destacados na
crônica sobre as primeiras conquistas do reino de
Portugal, a Crônica da tomada de Ceuta, como o que
justificava o historiar.2 Ambos os aspectos, retomados do saber
antigo, ganham, no século em que Portugal avança por outros
territórios, o século XV, sentidos históricos específicos, configurados
pelo desejo3 dos historiadores de então de colocar Portugal no centro
1
Este trabalho é resultado de pesquisa desenvolvida no âmbito do Projeto Temático “Escritos sobre
os novos mundos: uma história da construção de valores morais em língua portuguesa”, financiado
pela FAPESP (Processo: 2013/14786-6), e do projeto “Patrimônios escritos e a invenção de novos
mundos (séculos XIII-XV)”, financiado pelo CNPq (Processo 470371/2014-5).
2
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica da Tomada de Ceuta. Francisco Maria Esteves Pereira
(ed.). Coimbra: Imprensa da Universidade, 1915, p. 8.
3
Vale destacar que o discurso histórico no período que nos interessa, entre o século XV e o XVI, é
um discurso que não tem pretensão de distinguir real e desejo. A ideia de que o discurso histórico
resulta de uma conjugação entre discurso do real e do desejo já foi apontada por diversos
167
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
estudiosos, entre os quais vale lembrar Susanne Fleschman. Cf. FLESCHMAN, Susanne. On the
Representation of History and Fiction in the Middle Ages. History and Theory, v. 22, n. 3, oct.
1983, p. 278-310.
4
CAVALCANTE SCHUBACK, Mareia Sá. Para ler os medievais: ensaio de hermenêutica
imaginativa. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 171-172.
5
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné. Introdução, novas anotações e glossário de
José de Bragança. Lisboa: Livraria Civilização, 1973, p. 8.
6
Vale recordar, por exemplo, as proposições da “Nova História” francesa que, segundo Pomian,
põem abaixo três ídolos da tribo dos historiadores – os grandes homens e os acontecimentos; o
estudo da política, da diplomacia e da guerra; a cronologia – e expandem os domínios da história.
168
Investidas moralizantes na história...
POMIAN, Krzysztof. L´heure des “Annales”. La terre – les hommes – le monde. In: NORA,
Pierre (Dir.). Les lieux de mémoire. Paris: Éditions Gallimard, 1997, p. 905.
7
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 9.
8
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 10.
9
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 13.
10
CARVALHO, Joaquim Barradas de. As fontes de Duarte Pacheco Pereira no «Esmeraldo de Situ
Orbis». Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1982, p. 19.
11
CARVALHO, Joaquim Barradas de. As fontes de Duarte Pacheco Pereira no «Esmeraldo de Situ
Orbis», p. 19-20.
12
ZUMTHOR, Paul. La Medida del Mundo: representación del espacio en la Edad Media. Trad.
Alicia Martorell. Madrid: Cátedra, 1994, p. 288.
169
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
13
DUARTE PACHECO PEREIRA. Esmeraldo de Situ Orbis. Intr. e anotações históricas
Damião Peres. Lisboa: Academia Portuguesa de História, 1988, p. 9.
14
GILSON, Étienne. O espírito da Filosofia medieval. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo:
Martins Fontes, 2006, p. 395; 477-478; VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV.
Introdução à ética filosófica. São Paulo: Edições Loyola, 2008, p. 216.
15
FERNANDES, Fátima R. A participação da nobreza na expansão ultramarina portuguesa. Estudos
Ibero-Americanos, PUCRS, Edição Especial, n. 1, p. 107-124, 2000, p. 124. Disponível em:
<https://www.academia.edu/4082546/A_participação_da_nobreza_na_Expansão_Ultramarina_port
uguesa>. Acesso em: 15 jan. 2016.
16
Sobre a ideia de ordem como normativa da existência ética segundo Agostinho e sobre os
fundamentos éticos teológicos da história cristã, ver: VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de
filosofia IV, p. 195-197.
17
Duarte Pacheco Pereira, no prólogo do Esmeraldo de Situ Orbis, define o território antigamente
chamado Etiópia como limitado entre os cabos Não e Bojador até a Serra Leoa. A localização da
Etiópia foi até o século XVI, vale destacar, marcada pela imprecisão, como mostram os mapas
desde o século VIII. No século XIV, um planisfério circular anônimo distingue uma área junto à
Índia, como Etiópia Oriental, e outra próximo ao Atlântico, chamada Etiópia ou Barbaria. Cf.
ALBUQUERQUE, Luís de. Uma releitura de Azurara. Studia. Lisboa, n. 47, 1989, p. 423. Além
disso, no tempo de Zurara, identificava-se a Etiópia como o reino do Preste João. ARNAUT,
Salvador Dias. Três estudos sobre descobrimento. Biblos, v. LXX, 1994, p. 102.
18
Aquele que é reconhecido como síntese da moral cristã, São Tomás de Aquino, propôs que o
exercício das virtudes requer, dada a condição humana, o “auxílio divino que se manifesta pelos
dons do Espírito Santo correspondentes a cada virtude”. VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de
filosofia IV, p. 237-238.
170
Investidas moralizantes na história...
19
DUARTE PACHECO PEREIRA. Esmeraldo de Situ Orbis, p. 10.
20
DUARTE PACHECO PEREIRA. Esmeraldo de Situ Orbis, p. 11.
21
As virtudes podiam se manifestar em diferentes escalas. ARMAS, Gregório. La moral de San
Agustin. Madrid: Asilo de Huérfanos del Sagrado Corazón de Jesus, 1955, p. 360.
22
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes. Reprodução
Facsimilada com nota de apresentação por José Adriano de Freitas Carvalho. Porto: s/n, p. 214-215.
171
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
23
Inspirada em Tomás de Aquino, que cumpriu papel fundamental na história da Ética ocidental.
VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV, p. 232 e 236.
24
VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV, p. 233; GILSON, Étienne. O espírito da
Filosofia medieval, p. 397.
25
NERI, Demetrio. Filosofia Moral. Manual introdutivo. Trad. Orlando Soares Moreira. São
Paulo: Edições Loyola, 2004, p. 148.
26
VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV, p. 238.
27
GUENÉE, B. Histoire et Culture Historique dans l´Occident médiéval. Paris: Aubier Montaigne,
1980, p. 309.
172
Investidas moralizantes na história...
28
GILSON, Étienne. O espírito da Filosofia medieval, p. 473.
29
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 14.
30
DUARTE PACHECO PEREIRA. Esmeraldo de Situ Orbis, p. 168.
31
Edifício ancorado na moral helênica, segundo Étienne Gilson. GILSON, Étienne. O espírito da
Filosofia medieval, p. 397.
32
Seja no sentido agostiniano de garantia da paz, seja no tomasiano, como definidora de certa
autonomia do cosmo. GROSSI, Paolo. A ordem jurídica medieval. Trad. Denise Rossato
Agostinetti; rev. Ricardo Marcelo Fonseca. São Paulo: Martins Fontes, 2014, p. 100-101.
33
GROSSI, Paolo. A ordem jurídica medieval, p. 117. Referência à lei divina, suprema, que é o
modelo de toda ordenação possível. GUGLIELMI, Nilda. Ley y virtud (Italia, siglos XIV-XV).
In: GUGLIELMI, Nilda; RUCQUOI (Coord.). Derecho y justicia: el poder en la Europa
medieval (Droit et justice: le pouvoir dans l´Europe médiévale). Buenos Aires: IMHICIHU –
CONICET, 2008, p. 179-180.
34
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 10.
35
D. Pedro de Menezes, Conde de Vila Real, foi o primeiro capitão de Ceuta. Seu filho bastardo D.
Duarte de Menezes, terceiro Conde de Viana, o sucedeu no governo de Ceuta. Sobre a trajetória de
vida de D. Duarte Menezes, ver: MORENO, Humberto Baquero. A batalha de Alfarrobeira. Volume
II – Antecedentes e significado Histórico. Coimbra: Por Ordem da Universidade, 1980, p. 874.
173
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
36
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 12.
37
Vale recordar que Luís Filipe Thomaz e Jorge Santos Alves lamentam o caráter ideológico da
história da expansão portuguesa, extremado “em tom de lenda cor-de-rosa” no início e depois em
lenda negra, dado o peso do presente nas suas configurações. THOMAZ, Luis Filipe; ALVES,
Jorge Santos. Da cruzada ao Quinto Imperio. In: BETHENCOURT, Francisco; CURTO, Diogo
Ramada (Orgs.). Memoria da Nação. Lisboa: Livraria Sa da Costa, 1991, p. 81.
38
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica da Tomada de Ceuta, p. 28.
39
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica da Tomada de Ceuta, p. 48.
40
Cf. SCHMITT, Jean-Claude. O corpo, os ritos, os sonhos, o tempo. Ensaios de antropologia
medieval. Petrópolis: Vozes, 2014, p. 376 e ss. Ver, também: VENTURA, Margarida Garcez.
Regalismo e anti-regalismo no século XV. In: Lusitania Sacra. Revista do Centro de Estudos de
História Religiosa. Cristianização na época medieval, 2 série, Tomo X. Lisboa: Universidade
Católica Portuguesa, 1998.
174
Investidas moralizantes na história...
41
Na edição utilizada, o termo era “acreditarão”, mas utilizamos uma edição de apoio (Chronica
do descobrimento e conquista de Guiné. Escrita por mandado de El Rei D. Affonso V, Direcção
sciestifica, e segundo as instrucções do illustre infante D. Henrique, pelo Cronista Gomes Eannes
de Azurara; Edição do Visconde da Carreira. Paris: Aillaud, 1841) para o entendimento da frase.
Cf. GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 47.
42
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 47.
43
DUARTE PACHECO PEREIRA. Esmeraldo de Situ Orbis, p. 78-79.
44
BARROS, João de. Asia. Dos feitos que os portugueses fizeram no descobrimento e conquista
dos mares e terras do Oriente. Primeira Década. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda,
1988, p. 11, 13.
175
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
45
FARINHA, António Dias. Os portugueses em Marrocos. Lisboa: Instituto Camões, 1999, p. 13.
46
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 231.
47
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 232.
48
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 13.
49
A ideia do poder como necessidade é formulada por São Tomás de Aquino a partir de Aristóteles
e amparava-se no fundamento de que “toda multidão, para realizar seu fim comum, tem
necessidade de um princípio diretor” ou de que a força diretiva é imanente. SENELLART,
Michel. As artes de governar. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 2006, p. 176-180.
50
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 238-239.
51
Apesar de os bastardos gozarem de estatuto inferior aos legítimos, havia uma legislação
especialmente dedicada a regular sua condição. Cf. VENTURA, Leontina. A família: o léxico. In:
MATTOSO, José (Dir.). História da vida privada em Portugal. Vol 1. Idade Média –
Coordenação de Bernardo Vasconcelos e Sousa. Lisboa: Círculo de Leitores e Temas e Debates,
2011, p. 116-117. No caso de D. Duarte de Meneses, especificamente, o próprio pai assumiu-o
176
Investidas moralizantes na história...
como filho e o rei lhe assegurou o título de nobreza, depois que suas capacidades governativas
foram demonstradas.
52
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 49.
53
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 51.
54
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 54.
55
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 54.
56
VENTURA, Margarida Garcez. O messias de Lisboa: um estudo de mitologia política, 1383-
1415. Lisboa: Edições Cosmos, 1992, p. 18.
57
A predestinação como traço distintivo dos grandes homens foi tema recorrente nas crônicas e
tratados moralizantes. Alguns escritores da corte de Avis, entretanto, refutavam a crença na
predestinação porque ela colocaria em causa o livre-arbítrio e a ação da graça de Deus. VENTURA,
Margarida Garcez. Regalismo e anti-regalismo no século XV. In: Lusitania Sacra, p. 317.
177
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
58
FERNÃO LOPES. Crónica do senhor rei Dom Pedro. Introd. de Damião Peres. Porto: Livraria
Civilização, 1979, cap. XLIII, p. 196. Lembremos que João das Regras defendeu a ilegitimidade
dos filhos de Inês de Castro e apresentou uma carta do papa Inocêncio VI indeferindo o pedido de
D. Pedro para legitimá-los (FERNÃO LOPES. Cronica del rei Dom João I de boa memoria. Parte
Primeira. Ed. Braamcamp Freire. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1973, cap. CXC,
p. 365-368). Todavia, o esforço deste rei fora no sentido de provar o contrário (FERNÃO LOPES.
Crónica do senhor rei Dom Pedro, cap. XXVIII, p. 129-134), o que, portanto, significa que os queria
como legítimos.
59
FERNÃO LOPES. Cronica del rei Dom João I de boa memoria. Parte Segunda. Ed. William J.
Entwisle. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1977, p. 3.
60
FERNÃO LOPES. Crónica do senhor rei Dom Pedro, cap. XLIII, p. 198.
61
VENTURA, Margarida Garcez. O messias de Lisboa, p. 9.
62
REBELO, Luís de Sousa. A concepção do poder em Fernão Lopes. Lisboa: Livros Horizonte, 1983,
p. 48. Ver também sobre as condições especiais da realeza. RINCÓN, David Nogales. Los espejos de
príncipes en Castilla (siglos XIII-XV): un modelo literario de la realeza bajomedieval. Medievalismo:
Boletín de la Sociedad Española de Estudios Medievales, n. 16, 2006, p. 9-40, p. 20.
63
Cf. RINCÓN, David Nogales. Los espejos de príncipes en Castilla (siglos XIII-XV): un modelo
literario de la realeza bajomedieval. Medievalismo: Boletín de la Sociedad Española de Estudios
Medievales.
178
Investidas moralizantes na história...
64
Sobre a fé como dom de Deus e confiança na autoridade divina em Agostinho. MARROU,
Henri-Irenée. Saint Augustin et l’augustinisme. Paris: Seuil, 2003, p. 64.
65
FRESNEDA, F. M.; NAVAS, J. L. P. Teología y Moral Franciscanas. Murcia: Editorial
Espigas, 2002, p. 169.
66
Os espelhos de príncipes ensinavam, por exemplo, que o temor e amor a Deus eram os princípios
básicos que deviam guiar. Cf RINCÓN, David Nogales. Los espejos de príncipes en Castilla
(siglos XIII-XV): un modelo literario de la realeza bajomedieval. Medievalismo: Boletín de la
Sociedad Española de Estudios Medievales, p. 21; ARMAS, Gregório. La moral de San Agustin,
p. 286-290.
67
BOEHNER, Philotheus; GILSON, Etienne. História da filosofia cristã. Trad. Raimundo Vier
(OFM). Petrópolis: Vozes, 1982, p. 11; COLEMAN, Janet. Ancient and medieval memories.
Studies in the reconstruction of the past. New York; Port Chester; Melbourne; Sydney:
Cambridge University Press, 1992, p. 3-4.
68
Crónica de Cinco Reis de Portugal. Ed. diplomática de A. Magalhães Basto. Porto: Liv.
Civilização, 1945, p. 5; RUI DE PINA. Chronica Del Rey D. Diniz. Sexto de Portugal. In: Crónicas
de Rui de Pina. D. Sancho I, D. Afonso II, D. Sancho II, D. Afonso III, D. Dinis, D. Afonso IV,
D. Duarte, D. Afonso V, D. João II. Introd. e rev. de M. Lopes de Almeida. Porto: Lello & Irmão,
1977, cap. XXXII, p. 310.
69
FERNÃO LOPES. Cronica del rei Dom João I de boa memoria. Parte Segunda, prólogo, p. 2.
70
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 25. Ver, também, p. 21-24 e p. 31-32.
71
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 30.
179
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
fim de sua vida, trabalhando por suas armas por honra do Reino e
exalçamento da santa Fé”72 – palavras praticamente reproduzidas no
século seguinte por João de Barros.73 Sem economizar elogios, como
então convinha a cronistas que entendiam os epítetos exaltatórios
como forma de recordar o estado e a essência da dignidade real,74
Zurara exalta esse príncipe como “tão religioso” e, na sequência,
reúne as marcas dessa qualidade, entre as quais, ter passado a vida,
sem descanso e “cercado de gente de diversas nações”.75 Ainda sobre
a sua fé, o cronista não deixa de lembrar que das cinco razões que o
moveram aos grandes feitos de conquista da África, três delas eram
claramente amparadas no seu dever de príncipe “tão católico”:
conhecer melhor o poder dos “inimigos” de outra fé; buscar supostos
príncipes cristãos em outras terras para apoiá-lo; e tentar trazer à
santa fé “todas as almas que se quisessem salvar”.76 A “energia de sua
vontade”, segundo escreve Mateus de Pisano (1383-1466?) –
tradutor para o latim da crônica de Zurara –, era mantida por este
móbil religioso,77 que o fez arriscar-se muitas vezes, sem perder de
vista a recomendação de sua mãe para não hesitar “em preferir às
doçuras da vida a morte com glória”.78
Tal motor religioso fundador de todas as verdadeiras
virtudes, a fé,79 não se apaga na história dos Menezes em Ceuta.
Sobre o conde D. Pedro, um rol de virtudes genéricas recorrentes em
outros nobres ou reis é igualmente retomado a seu propósito,
mostrando tanto o peso das convenções na história quanto a
72
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 32.
73
BARROS, João de. Asia. Dos feitos que os portugueses fizeram no descobrimento e conquista
dos mares e terras do Oriente. Primeira Década, p. 11.
74
Tal como nos Espelhos de Príncipe. RINCÓN, David Nogales. Los espejos de príncipes en
Castilla (siglos XIII-XV): un modelo literario de la realeza bajomedieval. Medievalismo: Boletín
de la Sociedad Española de Estudios Medievales, 20.
75
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 37.
76
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p.45.
77
O cristianismo prolongava a ordem natural com uma ordem sobrenatural. GILSON, Étienne.
O Espírito da Filosofia medieval, p. 445; CALAFATE, Pedro. História do Pensamento Filosófico
Português. Lisboa: Caminho, 1999, p. 420-425.
78
MATEUS DE PISANO. Livro da Guerra de Ceuta. Publicado por Ordem da Academia das
Sciências de Lisboa e vertido em português por Roberto Corrêa Pinto. Coimbra: Imprensa da
Universidade, 1915, p. 12 e 28.
79
SCHMITT, Jean-Claude. O corpo, os ritos, os sonhos, o tempo, p. 92 e ss.
180
Investidas moralizantes na história...
80
A prática da obtenção e troca de cativos foi corrente no período de guerra entre cristãos e
muçulmanos, legitimada de ambas as partes. D. Afonso V criou inclusive o Tribunal da Redencão
dos Cativos para regular as negociações. Os cristãos, explica António Farinha, eram resgatados
por preços mais elevados, de forma que a liberdade às vezes era por pagamento em numerário.
FARINHA, António Dias. Os portugueses em Marrocos, p. 51.
81
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 221.
82
Com o fim das guerras com Castela nas primeiras decadas do seculo XV, “Marrocos tornou-se o
grande palco de nobilitacão, para escudeiros e cavaleiros da nobreza não fidalga, por servicos
prestados”. MICHELAN, Kátia Brasilino. Ceuta, para alem da terra dos mouros. Tese (Doutorado
em História) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”, Franca, 2013, p. 82. Cf. também CRUZ, Abel dos Santos. A nobreza portuguesa
em Marrocos no século XV (1415-1464). Porto: [Edição do Autor], 1995. Disponível em:
<https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/27423>. Acesso em: 6 fev. 2016.
83
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, cap. III, p. 49.
84
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 44.
181
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
85
CAVALCANTE SCHUBACK, Mareia Sá. Para ler os medievais, p. 200. MARROU, Henri-
Irenée. Saint Augustin et l’augustinisme, p. 68.
86
A nobreza de então se mostrava confiante com as entradas no reino muçulmano de Granada e
vislumbrava agora conquistas mais avançadas. THOMAZ, Luis Filipe; ALVES, Jorge Santos.
Da cruzada ao Quinto Imperio. In: BETHENCOURT, Francisco; CURTO, Diogo Ramada
(Orgs.). Memoria da nação, p. 84.
87
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 60
88
Os teólogos medievais cuidavam para conservar da moral antiga o que ela continha de verdade,
de forma que nem sempre é fácil ver com exatidão como se distinguem. Porém, a relação entre os
meios e os fins não é a mesma entre os antigos e os moralistas cristãos. GILSON, Étienne. O
espírito da Filosofia medieval, p. 394-397, 419, 433. Sobre a tradição das virtudes retomando a
182
Investidas moralizantes na história...
97
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica da Tomada de Ceuta, p. 141. Definição devedora de
Cícero, que definia prudência como a virtude que permite “o conhecimento daquilo que é bom,
daquilo que é mau e daquilo que não é nem bom e nem mau”. CICERO. Treatise on Rhetorical
Invention, 1852, p. 373
98
“Reta razão das coisas por fazer”. TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica (1265-1273). Os
hábitos e as virtudes – Os dons do Espírito Santo – Os vícios e os pecados – A lei antiga e a lei nova
– A graça. Vol. 4 – I seção da II parte – Questões 49-114. São Paulo: Edições Loyola, 2005,
Questão 47. Cf. SENELLART, Michel. As artes de governar, p. 190.
99
Cf. RUI DE PINA. Chronica Del Rey D. Diniz. Sexto de Portugal. In: Crónicas de Rui de Pina,
cap. I, p. 222. Cf. Crónica dos Sete Primeiros Reis de Portugal. Ed. crítica de Carlos da Silva
Tarouca. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1952. 2 v, p. 4; RUI DE PINA. Chronica do
senhor rey D. Duarte. In: Crónicas de Rui de Pina, prólogo, p. 488; FR. JOÃO ÁLVAREZ.
Chronica do Infante Santo D. Fernando. Ed. crítica por Mendes dos Remédios. Coimbra: F.
França Amado – Editor, 1911, cap. VIII, p. 17; RUI DE PINA. Chronica do senhor rey D.
Affonso V. In: Crónicas de Rui de Pina, cap. CXXIV, p. 752, 880.
100
ZURARA, Gomes Eanes de. Crónica da Tomada de Ceuta, p. 141.
101
SENELLART, Michel. As artes de governar, p. 49
102
SENELLART, Michel. As artes de governar, p. 190.
103
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 37.
184
Investidas moralizantes na história...
104
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica da Tomada de Ceuta, p. 47.
105
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 22. Cf. DUARTE PACHECO
PEREIRA. Esmeraldo de Situ Orbis, p. 78.
106
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, cap. XXV.
107
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 45.
108
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 37.
109
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 37.
185
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
notável essa sua virtude que “as cousas que aos homens pareciam
impossíveis, a sua continuada força as fazia parecer ligeiras”,
exclama o cronista.110 Usada como sinônimo de força, a fortaleza
aparece nesta Crônica de Guiné especificamente associada ao uso das
armas. Inúmeras vezes, e não apenas a propósito do Infante mas
também de outros cavaleiros, ela é associada ao desempenho na
guerra contra os mouros – nos quais às vezes se reconhece fortaleza,
apesar de sem o fundamento da verdadeira fé para reforçá-la –, como
evidencia o capítulo final, quando Zurara anuncia que os feitos
derradeiros do Infante, ainda por registrar, não demandaram o
mesmo quantum de “trabalho e fortaleza”, pois manifestaram-se
mais por meio de “tratos e avenças de mercadoria, que por fortaleza
ou trabalho das armas”.111
Aos dois outros “grandes” cujos feitos mereceram capítulo à
parte na história da expansão portuguesa não faltavam, do mesmo
modo, prudência e fortaleza. O conde D. Pedro, nos mais de vinte
anos em que preservou Ceuta sob domínio português, manteve-a,
segundo o cronista no seu retrato final, como cavaleiro dotado de
“grande prudência e não menos ardideza”,112 justamente por não se
deixar vencer em batalha. Cavaleiro “valente e esforçado”, não
apenas mantinha sua própria fortaleza como avivava a dos
portugueses que com ele combatiam, “lembrando-lhes amiúde a
antiga virtude de seus antecessores”.113 No seu espelho e de outros
nobres cavaleiros que o acompanhavam, força e fortaleza,114 muitas
vezes confundidas, aparecem distinguidas como próprias
respectivamente do corpo ou do coração e como causa da conquista
de Ceuta;115 ou “ardimento e fortaleza”, que vinha com eles dos
ventres de suas mães, segundo D. João I.116 Distinguidas, mas
110
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 37, 23.
111
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica de Guiné, p. 406.
112
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 625.
113
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 258.
114
Para uma definição da virtude da fortaleza, ver: Glosa Castellana al “Regimiento de Príncipes”
de Egidio Romano (1344). Edición, estúdio preliminar y notas de Juan Beneyto Perez. Madrid:
Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2005, p. 73.
115
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 214.
116
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 259.
186
Investidas moralizantes na história...
117
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 214.
118
SENELLART, Michel. As artes de governar, p. 190.
119
TOMÁS DE AQUINO. Do governo dos Príncipes ao rei do Chipre e Do Governo dos Judeus à
Duquesa de Brabante. Editora Anchieta: São Paulo, 1946, p. 20-23.
120
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do conde Dom Pedro de Menezes, p. 485.
121
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, cap. RIIIJ.
122
Confundida por vezes com prudência, a sabedoria, no sentido prático – em que se diferenciava
da erudição também recomendada aos reis –, permitia pensar no alvo, contemplando as coisas
passadas e as futuras. RINCÓN, David Nogales. Los espejos de príncipes en Castilla (siglos XIII-
XV): un modelo literario de la realeza bajomedieval. Medievalismo, p. 25.
123
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, cap. II, p. 49.
124
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 72.
187
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
125
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 65.
126
Sobre as partes da prudência, memória, inteligência e previdência, ver: YATES, Frances A. A
arte da memória. Trad. Flavia Bancher. Campinas: Editora da Unicamp, 2007, p. 38-39.
127
GOMES EANES DE ZURARA. Crónica do Conde D. Duarte de Menezes, p. 67.
128
VEYNE, P. Foucault. Seu pensamento, sua pessoa. Trad. Marcelo Jacques de Morais. Rio de
Janeiro, 2011, p. 25.
188
Investidas moralizantes na história...
189
E
ste texto apresenta uma visão geral, introdutória, acerca do
potencial informativo de narrativas escritas em língua
portuguesa sobre os povos da Costa da Guiné – com maior
ênfase para a região do Noroeste africano nomeada entre meados do
século XV e meados do século XVII de “Guiné do Cabo Verde” e
que mais recentemente tem sido chamada pelos pesquisadores de
Senegâmbia ou “Grande Senegâmbia” – cujos limites naturais eram
o vale do rio Senegal a Norte e o rio Kolenté ao Sul, e que, do ponto
de vista geográfico, corresponde grosso modo aos territórios dos
atuais Senegal, Gâmbia e Casamance, ao arquipélago de Cabo
Verde, à Guiné e ao litoral norte de Serra Leoa, acima da antiga Costa
1
A base inicial deste texto foi uma exposição feita no Seminário Nacional Interlocuções Brasil-
África, promovido pelo Núcleo de Apoio à Pesquisa Brasil-África, FFLCH-USP, nos dias 11-13
de novembro de 2013. Os dados apresentados integram o projeto de pesquisa “Portugueses e
africanos no contexto da abertura do Atlântico: séculos XV-XVII”, agraciado com Bolsa de
Produtividade em Pesquisa pelo CNPQ, no período entre março de 2013 e fevereiro de 2017.
191
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
***
2
O conceito de Grande Senegâmbia aparece na obra de: BARRY, Boubacar. La Sénegambie du
XV au XIX siècle: traité négrière, Islam et conquête coloniale. Paris: L’Harmattan, 1988, p. 7-35,
esp. 25. Ele foi repensado e alargado pelos pesquisadores Eduardo Costa Dias e José da Silva Horta
para quem tal noção ia além de uma realidade espacial homogêna, que expressasse algum tipo de
unidade, mas antes sugere um amplo espaço de interação econômica, política e cultural. DIAS,
Eduardo Costa; HORTA, José da Silva. La Senegambie: un concept historique et socioculturel et
un objet d’études réevalués. Mande Studies, Bloomington, n. 9, p. 9-19, 2007.
3
VALENTIM, Carlos Manuel. O trabalho de uma vida. Biobibliografia de Avelino Teixeira da
Mota (1920-1982). Lisboa: Edições Culturais da Marinha, 2007.
4
A respeito dessa identidade luso-africana, ver o estudo clássico de BOULEGUE, Jean. Les luso-
africains de Sénegambie. Lisboa: IICT; Université de Paris, 1989; ver também: MARK, Peter The
evolution of “Portuguese” identity: luso-africans on the Upper Guinea Coast from the sixteenth
to the early nineenth century. Journal of African History. Cambridge, n. 40, p. 173-191, 1999 e
MARK, Peter. “Portuguese” style and luso-african identity. Precolonial Senegambia, seixteenth-
nineeenth centuries. Bloomington; Indianapolis: Indiana University Press, 2002.
192
Narrativas portuguesas...
5
HORTA, José da Silva. Entre a História européia e História africana, um objecto de charneira:
as representações. In: Colóquio construção e ensino da História de África. 7, 8 e 9 jun. 1994,
Lisboa. Actas das Sessões realizadas na Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1995, p. 189-200.
6
Não quer dizer que tais fontes sejam dispensáveis. Pelo contrário, elas têm grande relevância não
apenas pelas descrições que apresentam, mas pelos testemunhos de africanos que os viajantes e
observadores europeus incorporaram em seus escritos. O valor documental e os critérios de edição
e anotação crítica destes documentos foram longamente debatidos no colóquio European sources
of african history, sobretudo nos textos de P. E. Hair e David Henige. HAIR, P. E. The task ahead:
the editing of Early european-language texts ob black Africa. Paideuma, Stuttgart, v. 33, p. 29-51,
1987; HENIGE, David. The race is not always to the swift: thoughts on the use of written sources
for the study of early african history. Paideuma, Stuttgart, v. 33, p. 53-79, 1987.
7
HORTA, José da Silva. O africano: produção textual e representações (séculos XV-XVII). In:
CRISTOVÃO, Fernando (org.). Condicionantes culturais da literatura de viagens: estudos e
biografias. Lisboa: Edições Cosmos, 1991, p. 269-270.
8
Behaim registrou em latim o depoimento oral de Diogo Gomes sobre a descoberta da Guiné. O
texto, reatribuído ao autor da narrativa, foi recentemente editado por Aires Augusto Nascimento.
Descobrimento primeiro da Guiné. Estudo preliminar, edição crítica, tradução e notas de comentário
de Aires A. Nascimento. Lisboa: Edições Colibri, 2002.
193
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
9
Sobre o interesse Europeu pelas descobertas portuguesas e o afluxo de estrangeiros para Lisboa,
ver: MATOS, Luís de. La littérature dês découvertes. Les aspects internationaux de la découverte
oceanique: aux XV et XVI siècles. In: Colloque international d’histoire maritime, n. 5, 14, 15 e 16
sept. 1960, Lisbonne. Actes du cinquième colloque international d’histoire maritime présentés par
Michel Mollat e Paul Adam. Paris: S.E.V.P.E.N., 1966, p. 23-29. A respeito especificamente de
Cadamosto e Valentim Fernandes, ver abaixo, notas 26-27, 32.
10
Viagens de um piloto português do século XVI à Costa de África e a São Tomé. Trad. Arlindo
Manuel Caldeira, Lisboa: Comissão para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses,
2000; A Ilha de São Tomé nos séculos XV e XVI: Navegação de Lisboa à Ilha de São Tomé, situada
sob a linha equinocial, escrita por um piloto português e mandada ao conde Rimondo Della Torre.
Edição de Luís de Albuquerque. Lisboa: Edições Alfa, 1979.
194
Narrativas portuguesas...
Literatura de viagens
11
JONES, Adam. The earliest German sources of West Africa (1504-1509). Paideuma,
Frankfurt, n. 35, p. 149-153, 1989.
12
Há dois trabalhos fundamentais para a discussão do conjunto dessas fontes: GODINHO,
Vitorino Magalhães. Fontes quatrocentistas para a geografia e economia do Saara e Guiné. Revista
de História, São Paulo, ano IV n. 13, p. 47-65, 1953; HAIR, P. E. The early sources on Guinea.
History in Africa, ASA-Nova Jersey, v. 21, p. 87-126, 1994.
13
Para a discussão conceitual, ver: CHOUIN, Gérard. Vu, dit ou déduit? L’étude des relations de
Voyage en Guinée. Journal des Africanistes, Paris, v. 75-2, p. 97-111, 2005; CRISTOVÃO,
Fernando. Para uma teoria da literatura de viagens. In: CRISTOVÃO, Fernando (org.).
Condicionantes culturais da literatura de viagens, p.16-52; CARVALHO, João Carlos F. A. de.
Ciência e alteridade na literatura de viagens: estudo de processos retóricos e hermenêuticos.
Lisboa: Edições Colibri, 2003.
14
O quadro geral da imagem construída pelos europeus foi analisado por HORTA, José da Silva.
Le portrait de l'Africain dans l'écriture de la recontre: XV-XVI siècles. Les Ateliers des intérpretes:
Revue Européenne pour Historiens d'Art, Berlim, n. 4, p. 61-91; 1992.; HORTA, José da Silva.
Primeiros olhares sobre o africano do Saara Ocidental à Serra Leoa: meados do século XV - inícios
do século XVI. In: FERRONHA. António Luís (org.). O confronto do olhar, o encontro dos povos
na época das navegações portuguesas (séculos XV e XVI): Portugal, África, Ásia, América. Lisboa:
Ed. Caminho, 1991, p. 73-126; DESTRO, Letícia Cristina Fonseca. Diferentes olhares sobre a
África negra: uma análise etnográfica dos relatos de viajantes. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca
Nacional –MinC, 2008; MONIZ, António Manoel de Andrade. A literatura portuguesa de
viagens do século XVI: deslumbramento e confrontação. In: portos, escalas e ilhéus no
relacionamento entre o Ocidente e o Oriente, 2001. Actas do congresso internacional comemorativo
do regresso de Vasco da Gama a a Portugal. Coordenação de Avelino de Freitas de Meneses.
195
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
18
LUÍS DE CADAMOSTO. Viagens de Luís de Cadamosto e de Pedro de Sintra. Prefácio e notas
históricas por Damião Peres. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1988.
19
CORRÊA, Silvio Marcus de Souza. A imagem do negro no relato de viagem de Alvise Cadamosto.
Revista Politéia, Vitória da Conquista, v. 2, 2001. Disponível em:
<http://periodicos.uesb.br/index.php/politeia/article/view/157>. Acesso em 04 nov. 2013;
DEVEAU, Suzanne. A organização do Espaço, de Arguim a Serra Leoa na segunda metade do século
XV e a sua progressiva descoberta pelas portugueses. In: DEVEAU, Suzanne. A descoberta da África
Ocidental. Ambiente natural e sociedades. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos
Descobrimentos Portugueses, 1999, p. 241-242; RONCIÈRE, Charles de la. La découverte de
L'Afrique au Moyen Age: Cartographes et Explorateurs (Mémoires de la Société Royale de
Géographie d'Égypte). Caire: Institut Français d'Archeologie Orientale, 1924. v. 3, p. 88-99.
20
EUSTACHE DELAFOSSE. Voyage d´Eustache Delafosse à la côte de Guinée, au Portugal &
en Espagne (1479-1481). Prefácio de Théodor Monod e transcrição, notas e comentários de Denis
Escudier. Paris: Ed. Chandeigne, 1992; MAUNY, Raymond. Eustache De La Fosse – Voyage à
la Côte Occidentale d’Afrique (1479-1480). Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Bissau, n. 14,
p. 181-195, 1949; EUSTACHE DE LA FOSSE. Crónica de uma viagem à Costa da Mina no ano
de 1480. Trad. e adaptação por Pedro Alvim. Lisboa: Editorial Veja, 1992.
21
HERAS, Ignacio Iñarrea las. Animales y animalidad en el Voyage de Eustache de la Fosse.
Revista Francofonia, Madrid, n. 17, p. 131-148, 2008; RUSSELL, P. E. New light on the text of
Eustache de la Fosse’s Voiage à la Guinée (1479-1480). In: RUSSELL, P. E. Portugal, Spain and
the African Atlantic, 1343-1490. Londres: Varioum Reprints, 1995, p. 1-12; HAIR, P. E. A note
on De La Fosse’s Mina vocabulary of 1479-1480. The journal of West African Languages,
Londres, v. 3, n. 1, p. 55-57, 1966.
197
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
22
A expressão aplica-se a certo conjunto de iniciativas da coroa portuguesa, sobretudo no período
de governo de D. João II, no sentido de manter em segredo determinados fatos e conhecimentos,
de modo a garantir o monopólio dos lugares mais importantes contatados pelos navegadores
portugueses, ver: CORTESÃO, Jaime. A política do sigilo nos descobrimentos: nos tempos do
Infante Dom Henrique e de D. João II. Lisboa: Comissão Executiva das Comemorações do
Quinto Centenário da Morte do Infante Dom Henrique, 1960. Também os africanos mantiveram
em sigilo certas informações sobre as rotas do comércio e as fontes de exploração do ouro, não
obstante a insistência dos portugueses em ter acesso direto a elas, cf: SANTOS, Maria Emília
Madeira. Caminhos e contatos comerciais na Costa da Mina durante as duas primeiras décadas do
século XVI. In: DOMINGUES, Francisco Contente; BARRETO, Luís Filipe (org.). A abertura
do mundo: estudos de História dos descobrimentos europeus em homenagem a Luís de
Albuquerque. Lisboa: Editorial Presença, 1987, p. 117; WEN-MEWUDA, J. Batoora Ballong.
São Jorge da Mina (1482-1637): la vie d’un comptoir portugais en Afrique occidentale. Lisbonne;
Paris: Foundation Calouste Gulbenkian; Commission Nationale pour les Commemorations des
Decouvertes Portugaises, 1993. v. 2, p. 407-412.
23
Desenvolveram-se paralelamente ao aprofundamento dos conhecimentos geográficos e ao
florescimento da cartografia, que assumiram papel de centralidade na ampliação da visão de
mundo europeia no final do século XV e início do século XVI, ver: MOTA, Avelino Teixeira da.
O Noroeste africano na cartografia portuguesa antiga. Boletim cultural da Guiné Portuguesa,
Bissau, v. III n. 9, p. 173-198, 1948; DEVEAU, Suzanne. Os geográfos portugueses e os
Descobrimentos. In: DEVEAU, Suzanne. A descoberta da África Ocidental, p. 247-272;
MASSING, Andreas. Mapping the Malagueta Coast: a history of the Lower Guinea Coast, 1460-
1510 through portuguese maps and accounts. History in Africa, ASA - Nova Jersey, v. 36, p. 331-
365, 2009.
198
Narrativas portuguesas...
24
Os mais antigos roteiros da Guiné. Edição crítica de Damião Peres. Lisboa: Academia Portuguesa
da História, 1992; Descobrimento primeiro da Guiné; Description de la cote Occidentale d’Afrique
(Senegal au Cap de Mont, Archipels) par Valentim Fernandes (1506-1510). Edição de Raymond
Mauny. Bissau: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, 1951; Códice Valentim Fernandes.
Edição de José Pereira da Costa. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1997.
25
Esmeraldo de Situ Orbis. Côte occidentale d’Afrique du sud marocain au Gabon, par Duarte
Pacheco Pereira. Trad. Raymond Mauny. Bissau: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, 1956;
Esmeraldo de Situ Orbis. Introdução e anotações de Damião Peres. Lisboa: Academia Portuguesa
da História, 1988.
26
CARVALHO, Joaquim Barradas de. A la recherche de la specificité portugaise: L’Esmeraldo de
Situ Orbis de Duarte Pacheco Pereira et la litterature portugaise de voyages à l’époque des grandes
découvertes. Paris: Centre Culturel Portugais; Fondation Calouste Gulbenkian, 1983, p. 399-400;
CARVALHO, Joaquim Barradas de. As fontes de Duarte Pacheco Pereira no Esmeraldo de Situ
Orbis. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1982.
27
Sobre o valor da experiência e a mudança de paradigma explicativo da visão de mundo expressa
na fonte, ver: MARINHO Elby Aguiar. Imaginário e experiência no Esmeraldo de Situ Orbis de
Duarte Pacheco Pereira (séculos X-XVI). Dissertação (Mestrado em História). Faculdade de
Ciências Humanas e Filosofia – Universidade Federal de Goiás. Goiás, 2008; SOUZA, Camila
Fernandes de. O Esmeraldo de Situ Orbis de Duarte Pacheco Pereira: mudanças e permanências
epistemológicas em Portugal no século XVI. Dissertação (Mestrado em História). Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas – Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2011;
CARVALHO, João Carlos F. A. de. Ciência e alteridade na literatura de viagens, p. 183-224.
199
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
28
Reproduzia, neste ponto, um traço comum do comportamento dos navegadores portugueses,
que deste modo enquadravam mentalmente espaços recentemente descobertos nos modelos bem
conhecidos de sua própria visão de mundo, ver: ROSA, Maria de Lurdes. Velhos, novos e
mutáveis sagrados... Um olhar antropológico sobre formas ‘religiosas’ de percepção e
interpretação da conquista africana (1415-1521). Lusitania Sacra, Lisboa, 2ª série, n. 18, p. 13-85,
2006; VENTURA, Maria da Graça Alves Matheus. O batismo do(s) novo(s) mundo(s): a
toponímia como sistema de leitura do mundo. In: VASCO DA GAMA: HOMENS, VIAGENS
E CULTURAS, 4 a 7 de novembro de 1998. Actas do Congresso Internacional. Lisboa: Comissão
Nacional das Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1999, p. 279-304.
200
Narrativas portuguesas...
Literatura missionária
29
BARRETO, Luís Felipe. Duarte Pacheco Pereira e a ordem do discurso empírico. In:
BARRETO, Luís Filipe. Descobrimentos e Renascimento, p. 219.
30
Sobre esse incipiente comércio: VOGT, John. Portuguese rule on the Gold Coast. Athens:
Georgia University Press, 1979; WEN-MEWUDA, J. Batoora Ballong. São Jorge da Mina
(1482-1637); PEREIRA, João Cordeiro. Resgate do ouro na Costa da mina nos reinados de D.
João III e D. Sebastião. Studia, Lisboa, n. 50, p. 5-48, 1991.
31
Henrique Pinto Rema idêntica a origem da obra missionária no próprio contexto da abertura de
contatos dos portugueses com a Guiné e Cabo Verde. Entretanto, ele próprio informa ter sido
criada a diocese de Santiago em 1533 e que, embora tenham havido esforços da parte primeiro de
carmelitas e depois de jesuítas a partir de 1584, caberia aos franciscanos capuchinhos espanhóis
maior sucesso na empreitada espiritual a partir de 1644. REMA, Henrique Pinto. História das
missões católicas da Guiné. Braga: Editorial Franciscana, 1982, p. 119.
201
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
32
Documento n. 29 - Carta dos missionários do Benin a D. João III, 30/08/1539. In: Monumenta
Missionária Africana. Edição de António Brásio. Lisboa: Agência Geral do Ultramar, 1963. v. 2,
p. 79-80; BRÁSIO, António. Política do espírito no ultramar português. Portugal em África,
Lisboa, 2ª série, ano VI, n. 31, 1949, p. 20-290, 75-86, 209-222.
33
Relação anual das coisas que fizeram os padres da Companhia de Jesus nas suas missões, nos anos
de 1600 a 1609, pelo padre Fernão Guerreiro. Edição de Arthur Viegas. Coimbra: Imprensa da
Universidade, 1930. v. I, p. 240-284.
202
Narrativas portuguesas...
34
MANUEL ÁLVARES. Descripção da Etiópia Menor, e Província da Serra Leoa. Lisboa:
Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa. Ms. Res. 3 E-7. 1615. 123 fls.
35
Por causa disso é que parece prematura a qualificação das informações dos relatos missioneiros
como “pré-antropológicas” ou “proto-antropológicas”, como pretende GONÇALVES, José
Júlio. Contribuição dos missionários para o desenvolvimento da Antropologia. Studia, Lisboa, n.
53, p. 103-146, 1994. Além disso, os africanos não se mantiveram passivos diante do processo de
cristianização, selecionando nele aquilo que lhes convinha, não pondo em causa seus próprios
sistemas de valores, como bem demonstrou MBEMBE, Achille. África insubmissa: cristianismo,
poder e Estado na África pós-colonial. Luanda; Lisboa: Edições Mulemba; Edições Pedagô, 2013.
36
LOPES, Carlos. O Kaabu e seus vizinhos: uma leitura espacial e histórica explicativa de
conflitos. Afro-Ásia, Salvador, v. 32, p. 9-28, 2005, p. 22.
203
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
37
HAIR, Paul E. The Teixeira da Mota Archive and the Guinea texts Project. History in Africa,
ASA – Nova Jersey, v. 10, p. 387-394, 1983, p. 389.
38
Ethiopia Minor and a geographical account of the Province of Sierra Leone (c. 1615). Department of
History, University of Liverpool, 1990. Disponível em: <http://digicoll.library.wisc.edu/cgi-
bin/AfricanStudies/AfricanStudies-idx?id=AfricanStudies.Alvares01>. Acesso em: 30 nov. 2013.
39
FARO, Jorge. Manuel Severim de Faria e a evangelização da Guiné. Boletim Cultural da Guiné
Portuguesa, Bissau, v. XIV, n. 53, p. 460-497, 1959, onde consta a transcrição integral do
documento.
40
Peregrinação de André de Faro à terra dos gentios. coleção As Grandes Aventuras e os Grandes
Aventureiros. Edição de Luís Silveira. Lisboa: Tipographia Portugal; Brasil; Livraria Bertrand,
1945, p. LIV; SILVEIRA, Luís. Contribuição portuguesa para o conhecimento da Guiné: os
testemunhos de André Álvares de Almada e de André de Faro. In: Conferência internacional dos
africanistas ocidentais (Bissau, 1947). Lisboa: Junta de Investigações Coloniais – Ministério das
Colónias, 1952. v. IV, p. 405- 412.
204
Narrativas portuguesas...
41
O documento manuscrito contém 14 fólios, encontra-se transcrito e reproduzido em edição
facsimilar ao final do livro de: LABOURET, Henri; RIVET, Paul. Le royaume d’Arda et son
evangélisation au XVII siècle. Paris: Institut d’Ethnologie, 1929.
42
O conjunto da documentação encontra-se publicado por Mateo de Anguiano. Misiones
capuchinas en Africa. Publicado por Mateo Anguiano. Madrid: Consejo Superior de
Investigaciones Científicas; Instituto Santo Toribio de Mogrovejo, 1957. t. II – Misiones al reino
de la Zinga, Benin, Arda, Guinea y Sierra Leona. Para a reconstituição histórica dos eventos, ver:
RECHEADO, Charlene. As missões franciscanas na Guiné. Dissertação (Mestrado). Faculdade
de Ciências Sociais e Humanas – Universidade Nova de Lisboa. Lisboa, 2010.
205
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
Narrativas locais
43
DIAS, António J. Crenças e costumes dos indígenas da ilha de Bissau no século XVIII – segundo
manuscrito inédito. Portugal em África: revista de missiologia, Lisboa, 2ª série, v. II, 1945, p. 159-
165, 223-230; ARAÚJO, António de Souza. Em torno da Crónica da Província de Nossa Senhora
da Soledade de Frei Francisco de Santiago. Lusitania Sacra, n. 23, p. 233-241, 2011.
44
As viagens do bispo D. Frei Vitoriano Portuense à Guiné e a cristianização dos reis de Bissau.
Edição de Avelino Teixeira da Mota; Lisboa: Junta de Investigações Científicas do Ultramar –
Centro de Estudos de Cartografia Antiga, 1974.
206
Narrativas portuguesas...
45
Para os processos de interação na África atlântica, ver o estudo de VENÂNCIO, José Carlos. A
problemática social dos mestiços em África: a sua comparação com a situação asiática. Disponível
em: <http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/6896.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2013; sobre os
processos de interação entre populações africanas no contexto guineense, ver SANTOS, Beatriz
Carvalho dos. Entre mouros e cristãos: os Mandingas da Guiné do Cabo Verde. Dissertação
(Mestrado). Universidade Federal Fluminense. Niteroi, 2013; quanto ao fenômeno de interação
lingüística que esteve na origem do processo de constituição das línguas crioulas e pidginização,
ver: COUTO, Hildo Honório do. Comunidade e linguagem na Costa da Guiné nos séculos XV,
XVI e XVII. Polifonia, Cuiabá, n. 7, p. 87-102, 2003.
46
O estudo mais completo a respeito do assunto foi realizado por HORTA, José da Silva. A Guiné do Cabo
Verde: produção textual e representações (1578-1684). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2011; uma
síntese do estudo aparece em texto do mesmo autor: HORTA, José da Silva. O Nosso Guiné: representações
luso-africanas do espaço guineense (séculos XVI-XVII). Disponível em: <http://cvc.instituto-
camoes.pt/eaar/coloquio/comunicacoes/jose_silva_horta.pdf>. Acesso em: 11 nov. 2013.
47
Descrição da Serra Leoa e dos rios de Guiné do Cabo Verde (1625). Publicado por Avelino Teixeira da Mota,
como apêndice ao texto de André Donelha. Lisboa: Junta de Investigações Científicas do Ultramar – Centro
de Estudos de Cartografia Antiga, 1977, p. 332-357.
207
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
48
Aspectos retratados de modo detalhado no longo documento intitulado Informação da Mina, redigido em
1572, que se encontra no setor dos “reservados” da Biblioteca Nacional de Lisba. Informação da Mina.
Lisboa: Biblioteca Nacional de Portugal, Setor dos "reservados". Ms. 8457. 1572.
49
HORTA, José da Silva. A Guiné do Cabo Verde, p. 176-227; SANTOS, Maria Emília Madeira.
As estratégias ilhas de Cabo Verde ou a ‘FrescaSerra Leoa’: uma escolha para a política de expansão
portuguesa no Atlântico. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1988.
50
ANDRÉ ÁLVARES D’ALMADA. Tratado breve dos rios de Guiné do Cabo Verde. Publicado por
Diogo Kopke, Porto: Typografia Commercial Portuense, 1841; Tratado breve dos rios de Guiné feito
pelo capitão André Álvares d’Almada. Edição nova e tradução de Luís Silveira. Lisboa: Edição
patrocinada pelo Governo da colónia da Guiné no V Centenário do Descobrimento, 1946. As
traduções mais recentes do Tratado breve dos rios de Guiné são: Tratado breve dos rios de Guiné do
208
Narrativas portuguesas...
Cabo Verde. Leitura, interpretação e notas de António Brásio. Lisboa: Editorial L.I.A.M., 1954;
Tratado breve dos rios de Guiné do Cabo Verde. Leitura, introduçao, modernização do texto e notas de
António Luís Ferronha. Lisboa: Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as
Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1994.
51
ANDRÉ DONELHA. Descrição da Serra Leoa e dos rios de Guiné do Cabo Verde (1625). Lisboa:
Junta de Investigações Científicas do Ultramar – Centro de Estudos de Cartografia Antiga, 1977.
52
PUGA, Rogério Miguel. O discurso (etnográfico) da alteridade no Tratado Breve dos Rios da Guiné
do Cabo Verde (1594) do Capitão André Álvares de Almada. Disponível em: < http://cvc.instituto-
camoes.pt/eaar/coloquio/comunicacoes/rogerio_miguel_puga.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2013;
FERNANDES, Raul Mendes. André d’Almada: um certo olhar ‘renascentista’. Disponível em:
<http://cabodostrabalhos.ces.uc.pt/n2/documentos/2006_raul_fernandes_andre_dalmada.pdf>.
Acesso em: 18 dez. 2013.
53
Alguns aspectos particulares desses escritos foram ressaltados nos seguintes estudos: HORTA,
José da Silva. Evidence for a luso-african identity in ‘portuguese’ accounts on Guinea of Cape
209
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
***
Verde, sixteeenth-Seventeenth centuries. History in Africa, ASA - Nova Jersey, v. 27, p. 93-130,
2000; SANTOS, Beatriz Carvalho dos. Os escritos do ultramar: o aporte do olhar luso-africano
nos relatos sobre a “Guiné de Cabo Verde (séculos XVI-XVII). Cultura Histórica & Patrimonio,
Alfenas, v. 1 n. 2, p. 152-173, 2013.
54
ANDRÉ DONELHA. Descrição da Serra Leoa e dos rios de Guiné do Cabo Verde (1625).
210
Narrativas portuguesas...
211
Armando Martins
Universidade de Lisboa
Ao P. Benoît Lacroix, OP
(1915-2016)
E
m um dos seus mais belos diálogos, Platão refere o mito da
invenção da escrita. Põe Sócrates a dizer ao seu amigo Fedro
que deseja contar-lhe uma história transmitida pelos
antigos, avisando-o, porém, de que se ela é verdadeira ou não só Deus
sabe; mas, se nós pudermos conhecer a verdade, porquê preocupar-
nos com o que dizem os homens?!
Havia no Egipto um deus, de nome Toth que inventou os
números e o cálculo, a geometria e a astronomia, o jogo de damas e
os dados e também a escrita. O país era governado pelo rei Tamuz
que residia no sul, na cidade de Tebas. Toth foi ter com ele e
mostrou-lhe as suas artes, dizendo-lhe que elas deveriam ser
ensinadas aos egípcios. O rei, porém, quis saber da utilidade de cada
213
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
1
PLATÃO. Fedro. Lisboa: Guimarães Editores, 2000, p. 120-121. Aqui adaptada a partir de
Platon. Phèdre. Paris: Flammarion, 1997.
214
A hagiografia na escrita...
2.
2
BURY, Richard de (1286-1345). Philobiblon ou O Amigo do livro. Ed. bilíngue, tradução e notas
de Marcelo Cid. São Paulo: Ateliê Editorial, 2007, p. 43 e 168.
3
Certos autores contemporâneos utilizam “hagiologia” para se referirem ao campo de estudo que
toma como objecto o corpus hagiográfico. Ver: SOBRAL, Cristina. O modelo discursivo
hagiográfico. In: Colóquio da secção portuguesa da Associação Hispânica de Literatura Medieval,
2005, Porto. Modelo: actas do V Colóquio da Secção Portuguesa da Associação Hispânica de
Literatura Medieval. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2005. p. 97.
4
A sociedade dos ‘Bolandistas’ nasceu em Bruxelas, formada por um grupo de jesuítas, em torno
de Jean Bolland, no século XVII, com o objectivo de proceder a estudos críticos sobre as obras
215
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
216
A hagiografia na escrita...
217
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
5
LE GOFF, Jacques. À la recherche du temps sacré Jacques de Voragine et la Légende dorée. Paris:
Parrin, 2011, p. 7-8.
6
SIGAL, Pierre-André. Histoire et hagiographie: les miracula aux XIe et XIIe siècles. In:
L'historiographie en occident du Ve au XVe siècle, n. 8, 1977, Tours. Actes des congrès de la Société
des historiens médiévistes de l'enseignement supérieur public. Tours, 1977. p. 237.
218
A hagiografia na escrita...
7
LECLERCQ, Dom Jean. Initiation aux auteurs monastiques du Moyen Age. L’Amour des lettres
et le désir de Dieu, Paris: Les éditions du cerf, 1963, p. 154.
8
DELEHAYE, Hippolyte. Les Légendes hagiographiques, Bruxelles: [s.d.], 1905, p. 2.
9
DELEHAYE, Hippolyte. Les Légendes hagiographiques, p. 77.
10
LACROIX, Benoît, p. 44-55.
219
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
11
SIGAL, Pierre-André. Histoire et hagiographie: les miracula aux XIe et XIIe siècles. In:
L'historiographie en occident du Ve au XVe siècle, n. 8, 1977, Tours. Actes des congrès de la Société
des historiens médiévistes de l'enseignement supérieur public, p. 256-257.
12
Ver: NASCIMENTO, Aires do. Hagiografia. In: TAVANI, Giuseppe; LANCIANI, Giulia
(org.). Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa, Caminho, 1993.
13
SOBRAL, Cristina. O modelo discursivo hagiográfico. In: Colóquio da secção portuguesa da
Associação Hispânica de Literatura Medieval, 2005, Porto. Modelo: actas do V Colóquio da Secção
Portuguesa da Associação Hispânica de Literatura Medieval, p. 97-105; SOBRAL, Cristina.
220
A hagiografia na escrita...
Conclusão
17
Thomas Hefferman apud SOBRAL, Cristina. Hagiografia em Portugal, balanço e perspectivas.
Revista Medievalista on line, p. 99.
18
SOBRAL, Cristina. O modelo discursivo hagiográfico. In: Colóquio da secção portuguesa da
Associação Hispânica de Literatura Medieval, 2005, Porto. Modelo: actas do V Colóquio da Secção
Portuguesa da Associação Hispânica de Literatura Medieval, p. 100.
19
SOT, Michel. Hagiographie. In: GOUVARD, Claude; SIRINELLI, Jean-François (dir.).
Dictionnaire de l’historien. Paris, PUF, 2015, p. 326.
222
A hagiografia na escrita...
20
CERTEAU, Michel de. Hagiographie. In: Encyclopédie Universalis. Paris, 1980. v. 8, p. 208.
21
ORDERICO VITAL. Historia ecclesiastica, VIII apud LACROIX, p. 146.
22
ORDERICO VITAL. Historia ecclesiastica, VIII apud LACROIX, p. 145.
223
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
23
Guilherme de Tiro. Historia rerum apud LACROIX, p. 167. Tem directa ressonância medieval
o lema que os eruditos editores alemães escolheram, em 1826, para os MGH: ‘Sanctus amor patriae
dat animum’!
24
Ver LECLERCQ. Dom Jean. Initiation aux auteurs monastiques du Moyen Age. L’Amour des
lettres et le désir de Dieu. Paris: Editions du Cerf, 1963, p. 151.
25
Bernard Guenée refere que sendo em princípio géneros distintos, em 1338 na biblioteca da
Sorbonne as hagiografias estavam agrupadas numa secção de crónicas. GUENÉE, p. 53 e 55.
26
LE GOFF, 1984, p. VII.
27
BOUREAU, p. 253.
224
A hagiografia na escrita...
28
KLEINBERG, Aviad. Histoires de saints leur rôle dans la formation de l’Occident. Paris:
Gallimard, 2005, p. 357-358 (tradução do hebraico).
29
MATTOSO, José. A Escrita da história teoria e métodos. Lisboa: Estampa, 1988, p. 27.
225
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
226
Adriana Zierer
O
objetivo deste artigo é discutir alguns elementos da
historiografia contemporânea luso-brasileira relacionados
a Fernão Lopes e ao rei D. João I. Os estudos aqui tratados
se referem à chamada Nova História Política, na esteira do
Movimento dos Annales, e buscam relacionar História e Poder.1
1
Sobre essa discussão, importantes historiadores a serem mencionados são: Marc Bloch, com a sua
obra fundamental até os dias atuais, publicada originalmente em 1924: BLOCH, Marc. Os Reis
Taumaturgos. São Paulo: Companhia das Letras, 1993; passa-se também pelo importante artigo
de Jacques Le Goff: A História Política Continua a ser a Espinha Dorsal da História? In: LE
GOFF, Jacques. O Imaginário Medieval. Lisboa: Estampa, 1994, p. 357-367. Em Portugal, é
possível citar, sobre as possibilidades de relações entre o político e o simbólico: GOMES, Rita
Costa. A Reflexão Antropológica na História da Realeza Medieval. Etnográfica, Portugal, v. II, n.
1, p. 133-140, 1988, p. 137-138. Ainda sobre o Movimento dos Annales e a Nova História Política,
nos remetemos a ZIERER, A. M. S. Forças Diabólicas e Cristãs: confronto e poder na Crónica de
D. João I. Signum, Londrina, v. 16, n. 1, p. 103-104, 2015. Outros autores lusos da Nova História
Política serão discutidos ao longo deste trabalho.
227
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
2
Neste sentido, não serão discutidos trabalhos importantes, como, por exemplo: ARNAULT,
Salvador Dias. A Crise Nacional dos Fins do Século XIV: I – a sucessão de D. Fernando. Coimbra:
Universidade de Letras, 1959 e COELHO, António Borges. A Revolução de 1383: tentativa de
caracterização. Lisboa: Portugália, 1965, entre outras obras relevantes, uma vez que o recorte deste
artigo se volta a um período um pouco posterior da historiografia contemporânea, com algumas
incursões pontuais a trabalhos mais antigos.
3
SOUSA, Armindo. D. João I. In: MATTOSO, José. História de Portugal. Lisboa: Estampa, s/d,
p. 496.
228
Fernão Lopes, o rei D. João I....
4
A Crónica de D. João nos mostra que ainda não existia sentimento de nacionalidade em Portugal
na época do Movimento de Avis, daí o fato de as linhagens tradicionais terem apoiado D. João de
Castela. Até então a nobreza ibérica portuguesa se via como um grupo único, como aparece, por
exemplo, na Crónica Geral de Espanha de 1344 e no Livro de Linhagens do Conde D. Pedro (1340).
5
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de O. Portugal na crise dos séculos XIV e XV. Lisboa: Presença,
1986, p. 529-530.
6
Embora só tenha sido publicada em 1644, a historiografia considera ser muito provável que o seu
conteúdo fosse conhecido muito antes disso. A Crónica pode ter sido lida em locais públicos das
cidades, onde havia grande circulação de pessoas, como nas praças, mercados, feiras, entre outros;
também pode ter sido utilizada para a educação de nobres e príncipes. O texto mostra a constante
presença do vocativo e o autor parece se dirigir a um público ouvinte, além do fato de a oralidade
229
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
ser bastante presente no período em questão. Desta forma, acreditamos que o conteúdo da crônica
auxiliou a formação uma memória positiva sobre D. João que se prolongou no tempo.
7
LANCIANI, Giulia; TAVANI, Giuseppe (org. e coord.). Dicionário de Literatura Galega e
Portuguesa. Lisboa: Caminho, 1993, p. 186.
8
FERREIRA, Maria da Conceição. Imagens dos Reis na Cronística Medieval. In:
MORENO, Humberto Baquero (coord.). História de Portugal Medievo. Lisboa:
Universidade Aberta, 1995, p. 17.
230
Fernão Lopes, o rei D. João I....
9
Foi filho de um mesteiral e possuía uma sobrinha casada com um sapateiro. Mas foi nobilitado
mais tarde pelo rei D. João I, em 1433.
10
FERNÃO LOPES. Crónica de D. João I. Ed. preparada por M. P. Lopes de Almeida e
Magalhães Basto. Lisboa: Livraria Civilização, 1990, v. I, p. 86. (grifos nossos). Dorante será
citada com a abreviação: CDJ.
11
A crônica dedicada a D. João dialoga com outras obras do cronista, como a Crónica de D. Pedro.
Neste último relato, Lopes procura argumentar que o casamento do monarca com Inês de Castro
nunca se efetivou, o que diminuiria as chances de que os filhos dessa união pleiteassem o trono
após a morte de D. Fernando. ZIERER, A. M. S. Forças Diabólicas e Cristãs: confronto e poder
na Crónica de D. João I. Signum, p. 108. Além disso, nessa mesma crônica é mencionado um sonho
do rei D. Pedro com um filho seu, João, que apagaria um imenso fogo, o que pode estar associado
ao fato de que o Mestre de Avis livraria Portugal da invasão castelhana. FERNÃO LOPES.
Crónica do Rei Dom Pedro I. Porto: Liv. Civilização, 1977, p. 196.
231
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
12
CDJ, I, p. 343-344.
13
CDJ, I, p. 343.
14
CDJ, I, p. 213.
15
CDJ, I, p. 213.
16
CDJ, I, p. 311.
232
Fernão Lopes, o rei D. João I....
17
CDJ, II, p. 125.
18
Sobre a técnica do quadrado a pé utilizada por D. Nuno e sua estratégia guerreira ver
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. Portugal na crise dos séculos XIV e XV, p. 530-531;
COELHO, Maria Helena. D. João I: o que re-colheu Boa Memória. Lisboa: Círculo de Leitores,
2008, p. 107-112.
19
COELHO, Maria Helena. D. João I, p. 336.
233
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
20
FROÉS, Vânia Leite. Espaço e Imaginário em Gil Vicente. Tese (Doutorado). Universidade de
São Paulo. São Paulo, 1986. Cf. também: FROÉS, Vânia Leite. Teatro como Missão e Espaço de
Encontro de Culturas. In: MISSIONAÇÃO PORTUGUESA E ENCONTRO ENTRE
CULTURAS, v. 3, 1993, Braga. Actas. Igreja, Sociedade e Missionação. Braga: Fundação
Evangelização e Cultura,1993, p. 180-202.
21
ACCORSI JR., Paulo. Do Azambujeiro Bravo à Mansa Oliveira Portuguesa: A Prosa
Civilizadora da Corte do Rei D. Duarte (1412-1438). Dissertação (Mestrado). Universidade
Federal Fluminense. Niterói, 1997.
22
FERREIRA, Roberto Fabri. O Papel do Maravilhoso na Construção da Identidade Nacional
Portuguesa: Análise do Mito Afonsino (séculos XIII-XV). Dissertação (Mestrado em História).
Universidade Federal Fluminense. Niterói, 1997.
23
FERREIRA, Roberto Godofredo Fabri. O tempo novo e a origem dos novos tempos a construção
do tempo e da temporalidade nos primórdios da Dinastia de Avis (1370 a 1440). Tese (Doutorado
em História). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2003.
234
Fernão Lopes, o rei D. João I....
[...] bem sabees como este rreino por nossos pecados he ora
deviso em duas partes, de guisa que a viimda do
Amtechristo, nom podia em ell fazer moor devisom do que
ora esta terra esta; ca os Castellaãos som todos comtra
Portugall, e a moor parte dos Portugueses segumdo bem
vedes.26
24
COSER, Miriam Cabral. Política e Gênero: o modelo de rainha nas crônicas de Fernão Lopes e
Zurara (Portugal - sec XV). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal Fluminense.
Niterói, 2003.
25
ZIERER, Adriana M. de S. Paraíso, Escatologia e Messianismo em Portugal à época de D. João I (1383-
85/1433). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2004.
26
CDJ, I, cap. CXXIII, p. 240.
235
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
27
Dentre alguns trabalhos desenvolvidos junto ao Scriptorium e concluídos no primeiro semestre
de 2016, citamos as teses de: LIMA, Douglas M. X. A diplomacia portuguesa no reinado de D.
Afonso V (1448-1481). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal Fluminense.
Niterói, 2016; TREVISAN, Mariana B. A primeira geração de Avis: uma família 'exemplar'. Tese
(Doutorado em História): Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2016.
28
GUIMARÃES, Marcella Lopes. Estudo das Representações de Monarca nas Crônicas de Fernão
Lopes (séculos XIV e XV). O Espelho do Rei: “Decifra-me e te devoro”. Tese (Doutorado em
História). Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2004.
29
VIEIRA, Ana Carolina Delgado. “Como he doçe cousa reinar”: a construção de uma dinastia sob
a ótica de Fernão Lopes. Dissertação. (Mestrado em História). Universidade de São Paulo. São
Paulo, 2011.
236
Fernão Lopes, o rei D. João I....
30
MALEVAL, Maria do Amparo T. Fernão Lopes e a Retórica Medieval. Niterói: Eduff, 2010.
31
MALEVAL, Maria do Amparo T. Fernão Lopes e a Retórica Medieval, p. 133.
32
FRANÇA, Susani L. Os Reinos dos Cronistas Medievais. Século XV. São Paulo: Annablume, 2006.
237
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
33
REBELO, Luís de Sousa. A Concepção do Poder em Fernão Lopes. Lisboa: Livros Horizonte, 1983.
34
REBELO, Luís de Sousa. A Concepção do Poder em Fernão Lopes, p. 61-71.
35
VENTURA, Margarida Garcez. O Messias de Lisboa. Um Estudo de Mitologia Política (1383-
1415). Lisboa: Cosmos, 1992.
238
Fernão Lopes, o rei D. João I....
36
Como exemplo dessas pesquisas, citamos ZIERER, A. M. S.; RIBEIRO, Josena N. L.
Messianismo, Escatologia e Pedagogia Cristã na Crônica de D. João I, de Fernão Lopes. Imagens
da Educação, Maringá, v. 3, p. 31-44, 2013; RIBEIRO, J. Messianismo e Poder no Reinado de D.
João I, de Portugal. Monografia de Conclusão de Curso (Graduação em História). Universidade
Estadual do Maranhão. São Luís, 2014. Esta última desenvolveu estudos no Mestrado junto à
docente Miriam Coser, na Universidade do Rio de Janeiro (UniRio), com o trabalho “Voz por
Portugall”: construções de tempo e espaço na Crônica de D. João I, de Fernão Lopes (1383-1434).
Dissertação (Mestrado em História) – UniRio, Rio de Janeiro, 2017.
37
AMADO, Teresa. Fernão Lopes, contador de História: sobre a Crónica de D. João I. Lisboa:
Estampa, 1991.
38
Ainda sobre o heroísmo na Crónica de D. João I, há o estudo de PASSOS, Mária Lúcia. O Herói
na Crónica de D. João I de Fernão Lopes. Lisboa: Prelo, 1974.
239
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
39
BEIRANTE, Maria Ângela. As Estruturas Sociais em Fernão Lopes. Lisboa: Livros
Horizonte, 1984.
40
MONTEIRO, João Gouveia. Fernão Lopes. Texto e Contexto. Coimbra: Minerva, 1988.
41
MONTEIRO, João Gouveia. A guerra em Portugal nos finais da Idade Média. Lisboa: Notícias,
1998; MONTEIRO, João Gouveia (coord.). Aljubarrota Revisitada. Lisboa: Imprensa da
Universidade de Coimbra, 2001.
42
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de O. Portugal na crise dos séculos XIV e XV; MARQUES, A.
H. de. A Sociedade Medieval Portuguesa. Lisboa: Sá da Costa, 1981.
43
MORENO, Humberto Baquero. Exilados, Marginais e Contestatários na Sociedade Portuguesa
Medieval. Lisboa: Editorial Presença, 1990.
44
COELHO, Maria Helena. D. João I. Foi publicada inicialmente em 2005, mas a edição que
consultamos é de 2008.
240
Fernão Lopes, o rei D. João I....
45
HOMEM, Armando Luís de C. Central Power: Institutional and Political History in the
thirteeth-fifteenth centuries. In: MATTOSO, José. (Dir.). The Historiography of Medieval
Portugal, c. 1950-2010. Lisboa: IEM (Instituto de Estudos Medievais), 2011, p. 205. (grifo nosso).
46
Coleção com 28 volumes, coordenada pelas professoras Isabel dos Guimarães Sá, Manuela
Santos Silva e Ana Maria S.A. Rodrigues.
47
SILVA, Manuela Santos. Filipa de Lencastre: A Rainha Inglesa de Portugal. Lisboa: Círculo de
Leitores, 2012.
48
BALEIRAS, Isabel de Pina. Uma Rainha Inesperada: Leonor Teles. Lisboa: Círculo de
Leitores, 2012.
49
VENTURA, Margarida Garcez. A Corte de D. Duarte: Política, Cultura, Afetos. Aveleda, Vila
do Conde: Verso da História, 2013.
50
VENTURA, Margarida Garcez. Uma Lâmpada de Prata e Muito Mais. Testemunhos de D.
Duarte sobre a Santidade de Nuno Álvares Pereira. Revista Portuguesa de História do Livro,
Lisboa, Ano XIV, v. 27, p. 243-271, 2011.
51
MARTINHO, Francisco Carlos P. O Pensamento Autoritário no Estado Novo Português:
algumas interpretações. Locus: revista de História, Juiz de Fora, v. 13, n. 2, p. 9-30, 2007, p. 14-15.
241
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
52
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. D. João I. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História
de Portugal, p. 385.
53
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. D. João I. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História
de Portugal, p. 386.
54
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. D. João I. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História
de Portugal.
242
Fernão Lopes, o rei D. João I....
55
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. D. João I. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de História
de Portugal, p. 384.
56
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. Fernão Lopes. In: Dicionário de História de Portugal, p. 58.
57
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. D. João I. In: Dicionário de História de Portugal, p. 386.
(grifo nosso).
243
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
58
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. Portugal na Crise dos Séculos XIV e XV. Ibid., p. 538.
(grifos nossos).
59
PERES, Damião. História de Portugal. Porto: Portucalense, 1929. v. 3, p. 27.
60
SARAIVA, António José. O Crepúsculo da Idade Média Em Portugal. Lisboa: Gradiva, 1988,
p. 178. (grifo nosso).
244
Fernão Lopes, o rei D. João I....
61
COELHO, Maria Helena. D. João I, p. 395. (grifo nosso).
245
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
62
SOUZA, Armindo de. D. João I. In: MATTOSO, José (dir.). História de Portugal. v. II, p. 497-
498. (grifos nossos).
246
Fernão Lopes, o rei D. João I....
Considerações Finais
63
ZIERER, A. M. S. Fernão Lopes e seu Papel na Construção da Imagem de D. João I, o rei da
Boa Memória. Opsis, Catalão, (UFG), v. 12, n. 1, jan./jun 2012, p. 291.
64
COELHO, M. H. D. João I, p. 354. Ver também: MELO, Joana Ramôa; SILVA, José Custódio
Vieira da. O Retrato de D. João I no Mosteiro de Santa Maria da Vitória. Um novo paradigma de
representação. Revista de História da Arte, Lisboa, n. 5, p. 77-95, 2008.
65
Sobre essas obras ver: MONGELLI, Lênia Márcia (coord.). A Literatura Doutrinária na Corte
de Avis. Int. de A. H. de Oliveira Marques. São Paulo: Martins Fontes, 2001. Membros do
Scriptorium já desenvolveram alguns trabalhos sobre esses escritos, mas acreditamos que podem
ser retomados e aprofundados, vinculados com os modelos de rei e nobreza ideal e comparados
com as crônicas de Lopes e com outras obras, gerando novas investigações.
247
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
66
VENTURA, Margarida Garcez. Uma Lâmpada de Prata e Muito Mais. Testemunhos de D.
Duarte sobre a Santidade de Nuno Álvares Pereira. Revista Portuguesa de História do Livro, p.
243-271.
67
Sobre o messianismo associado a D. Sebastião, cf. Colóquio O Sebastianismo. Política, Doutrina
e Mito (sécs XVI-XIX). Lisboa: Edições Colibri/Academia Portuguesa de História, 2004. Ver
também: HERMANN, Jacqueline. No Reino do Desejado. A Construção do Sebastianismo em
Portugal (séculos XVI e XVII). São Paulo: Companhia das Letras, 1998; MEGIANI, Ana Paula.
O Jovem Rei Encantado: Expectativas do Messianismo Régio em Portugal, Séculos XIII a XVI.
São Paulo: Hucitet, 2003.
248
Fernão Lopes, o rei D. João I....
68
QUEIROZ, Maria Isaura. O Messianismo no Brasil e no Mundo. São Paulo: Alfa-Ômega, 1977.
Dentre as obras sobre os vários movimentos sociais no nordeste brasileiro, citamos a seguinte:
CABRAL, José Gomes. Paraíso Terreal: a Rebelião Sebastianista na Serra do Rodeador,
Pernambuco, 1820. São Paulo: Annablume, 2004.
69
BRAGA, Pedro. O Touro Encantado na Ilha dos Lençóis. O Sebastianismo no Maranhão. Petrópolis:
Vozes, 2001; GODOY, Marcio H. Dom Sebastião no Brasil: fatos da cultura e da comunicação em
tempo/espaço. São Paulo: Khronos, 2005. Sobre a relação do “Encantado” com a cultura afro-brasileira
e sua manifestação nos terreiros, cf. FERRETI, Sérgio. Encantaria Maranhense de D. Sebastião. Revista
Lusófona de Estudos Culturais, Minho, v. 1, n.1, p. 262-285, 2013.
70
Além de A Demanda do Santo Graal, proveniente da França, ter tido circulação longa em
Portugal, no reino luso foram produzidas várias obras de cavalaria no século XVI que mereceriam
ser estudadas com mais profundidade na busca de modelos ideias de nobre e rei propostos pela
nova dinastia. Megiani aponta a importância desses escritos literários para a formação do
imaginário cavaleiresco português. MEGIANI, Ana Paula. O Jovem Rei Encantado, p. 51-78.
249
O
presente texto propõe retomar a reflexão sobre a
diplomacia medieval, em especial, no século XV.
Buscaremos discutir a produção historiográfica acerca do
tema, levando em consideração a historiografia portuguesa. Com
esta orientação, dividiremos a exposição em três etapas:
primeiramente, uma breve caracterização da chamada “nova história
da diplomacia medieval”; em seguida, os caminhos percorridos pela
historiografia portuguesa; finalmente, apontamentos sobre a
documentação a partir de nossas investigações.
1
FEBVRE, Lucien. Contre l’histoire diplomatique en soi. Histoire ou politique? Deux
méditations: 1930, 1945. In: Combats pour l’Histoire. Paris: Armand Colin, 1952, p. 60-69.
2
DELACROIX, Christian, DOSSE, François; GARCIA, Patrick. Correntes historiográficas na
França, séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: FGV, 2012, p. 163-196.
3
MARTINS, Estevão de Rezende. História das relações internacionais. In: CARDOSO, Ciro
Flamarion; VAINFAS, Ronaldo (org.). Novos Domínios da História. Rio de Janeiro: Elsevier,
2012, p. 75; MOREIRA, Adriano. Teoria das Relações Internacionais. Lisboa: Almedina, 2008,
p. 37-39; NOGUEIRA, João Pontes; MESSARI, Nizar. Teoria das Relações Internacionais:
correntes e debates. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 3-5.
252
A diplomacia portuguesa quatrocentista
4
A identificação de uma nova história da diplomacia medieval e moderna é a base, por exemplo,
do artigo de WATKINS, John. Toward a New Diplomatic History of Medieval and Early
Modern Europe. Journal of Medieval and Early Modern Studies, Winter, n. 38, p.1-14, 2008.
253
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
5
SANTARÉM, Visconde de. Quadro Elementar das Relações Políticas e Diplomáticas de Portugal
com as diversas potências do mundo desde o princípio da Monarchia portugueza até os nossos dias.
Paris: J. P. Aillaud, 1842-1853. v. I-VIII; continuados por Luís Augusto Rebelo da Silva:
SANTARÉM, Visconde de. Quadro Elementar das Relações Políticas e Diplomáticas de Portugal
com as diversas potências do mundo desde o princípio da Monarchia portugueza até os nossos dias.
Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1864-1876. v. IX-XVIII.
6
BRANCO, Maria João; FARELO, Mario. Diplomatic Relations: Portugal and the Others. In:
MATTOSO, José (dir.). The Historiography of medieval Portugal, c.1950-2010. Lisboa: Instituto
de Estudos Medievais, 2011, p. 232-233.
254
A diplomacia portuguesa quatrocentista
7
Entendemos que o estudo de Carl Erdmann é uma exceção por estar ligado aos interesses do autor
alemão no tema da reconquista e das cruzadas, eixo central de sua grande obra: ERDMANN, Carl.
The Origin of idea of Crusade (1977 [1935]). Nova Jérsei: Princeton University Press, 1977.
8
Cf. TORGAL, Luís Reis; MENDES, José Amado; CATROGA, Fernando. História da
História em Portugal, séculos XIX – XX. Lisboa: Temas e Debates, 1998. v. 2.
9
BRANCO, Maria João; FARELO, Mario. Diplomatic Relations: Portugal and the Others. In:
MATTOSO, José (dir.). The Historiography of medieval Portugal, c.1950-2010, p. 231-259.
255
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
10
Limitamo-nos a apresentar apenas alguns livros como exemplo da produção portuguesa: KRUS,
Luís. A concepção nobiliárquica do espaço ibérico (1280-1380). Lisboa: FCG, 1994; OLIVEIRA
MARQUES, A. H. de. Hansa e Portugal na Idade Média. Lisboa: Estampa, 1993 (1959);
MARQUES, Maria Alegria Fernandes. O Papado e Portugal no tempo de D. Afonso III (1245-
1279). Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1990; MATTOSO, José.
Fragmentos de uma composição medieval. Lisboa: Estampa, 1987; MATTOSO, José. Le
monachisme ibérique et Cluny: les monastères du diocese de Oporto, de l’an mil à 1200. Louvain:
Université de Louvain, 1968; MATTOSO, José. Portugal Medieval: novas interpretações.
Lisboa: IN-CM, 1985; VELOSO, Maria Teresa. D. Afonso II: relações de Portugal com a Santa
Sé durante o seu reinado. Coimbra: Archivo da Universidade de Coimbra, 2000.
11
SERRÃO, Joaquim Veríssimo. Relações históricas entre Portugal e a França. (1431-1481). Paris:
Fundação Calouste Gulbenkian. Centro Cultural Português, 1975.
12
MORENO, Humberto Carlos Baquero. A Batalha de Alfarrobeira. Coimbra: Biblioteca Geral
da Universidade, 1979. 2. v.
13
FONSECA, Luís Adão da. O Condestável D. Pedro de Portugal: a Ordem Militar de Avis e a
Península Ibérica do seu tempo (1429-1466). Porto: INIC, 1982; FONSECA, Luís Adão da. O
essencial sobre o Tratado de Windsor. Lisboa: Imprensa Nacional, 1986; FONSECA, Luís Adão da.
O tratado de Tordesillas e a diplomacia luso-castelhana no século XV. Lisboa: Edições Inapa, 1991.
14
MACEDO, Jorge Borges de. História Diplomática Portuguesa. Constantes e linhas de força.
Lisboa: Instituto da Defesa Nacional, 1987.
15
MENDONÇA, Manuela. Relações externas de Portugal nos finais da Idade Média. Lisboa:
Colibri, 1994.
256
A diplomacia portuguesa quatrocentista
16
Um exemplo emblemático dessa inclinação é o artigo de Luís Adão da Fonseca, no qual o autor
analisa a questão cultural na diplomacia a partir do estudo das relações diplomáticas. FONSECA,
Luís Adão da. Política e cultura nas relações luso-castelhanas no século XV. Península: revista de
Estudos Ibéricos [da Universidade do Porto], Porto, p. 53-61, 2003.
17
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. Portugal na crise dos séculos XIV e XV. Lisboa: Presença,
1987, p. 279-334. Duas outras importantes obras de síntese, História de Portugal – A Monarquia
Feudal, de José Mattoso e Armindo de Sousa, e História de Portugal, com a parte medieval de
Bernardo Vasconcelos e Sousa, pouco deram espaço para a diplomacia. Acrescenta-se que coube
ao mesmo autor escrever sobre a temática na obra A Gênese do Estado Moderno no Portugal do
Tardo-Medievo (século XIII-XV), porém o texto, “Estado, fronteiras e relações exteriores”, limita-
se a tratar das embaixadas permanentes e do uso do latim como língua das relações diplomáticas.
Cf. OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. Estado, fronteiras e relações exteriores. In: COELHO,
Maria Helena da Cruz e HOMEM, Armando Luis de Carvalho (coord.). A Gênese do Estado
Moderno no Portugal do Tardo-Medievo (século XIII-XV). Lisboa: UAL, 1999, p. 189-197.
18
NUNES, Eduardo. Dom Frey Gomes: abade de Florença, 1420-1440. Braga: Livraria Editora
Pax, 1963.
257
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
19
MENDONÇA, Manuela. D. Jorge da Costa. “Cardeal de Alpedrinha”. Lisboa: Colibri, 1991.
20
DIAS DINIS, António Joaquim. Dois embaixadores de el-Rei D. Afonso V. Cadernos Históricos
1. Braga: Editora Franciscana, 1955.
21
MORENO, Humberto Baquero. Um grande diplomata português do século XV: o doutor João
Fernandes da Silveira. In: A diplomacia portuguesa na história de Portugal, 1990, Lisboa. Actas
do Colóquio A diplomacia portuguesa na História de Portugal. Lisboa: Academia Portuguesa da
História, 1990. p. 93-103.
22
HOMEM, Armando Luís de Carvalho. Diplomacia e burocracia nos finais da Idade Média: a
propósito de Lourenço Anes Fogaça, chanceler-mor (1374-1395) e negociador do Tratado de
Windsor. In: Estudos e Ensaios em Homenagem a Vitorino Magalhães Godinho. Lisboa: Sá da
Costa, 1988, p. 217-228
23
CAETANO, Pedro Nunes Pereira. A Burocracia Régia como veículo para a titulação
nobiliárquica. O caso do doutor João Fernandes da Silveira. Dissertação (Mestrado). Universidade
do Porto. Porto, 2011.
258
A diplomacia portuguesa quatrocentista
24
Para além desse texto, citamos: SILVA, Manuela Santos. Relações Internacionais na Idade
Média: tratados de amizade, alianças dinásticas, movimentações territoriais. In: MENDONÇA,
Manuela; REIS, Maria de Fátima (coord.). Do reino de Portugal ao Reino Unido de Portugal, Brasil
e Algarves. Lisboa: Academia Portuguesa de História, 2016, 95-109. Neste artigo, a autora analisa
os contratos matrimoniais em suas implicações no plano das relações entre os reinos, afastando-se,
assim, da ênfase na questão da política matrimonial.
25
MENDONÇA, Manuela. Relações externas de Portugal nos finais da Idade Média, 1994.
26
MARTINS, Armando. Diplomacia e gestos diplomáticos no reinado de D. Fernando (1367-
1383). In: Raízes medievais do Brasil moderno. Lisboa: Academia Portuguesa de História, 2008, p.
259
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
137-154; MARTINS, Armando. Depois da guerra, a difícil arte de fazer a paz. D. Fernando
(1367-1383). In: VI Jornadas Luso-espanholas de Estudos medievais. A Guerra e a Sociedade na
Idade Média. Sociedade Portuguesa de Estudos Medievais, 2009. v. 2, p. 69-76.
27
FARIA, Tiago Viúla de. Comunicação visual e relações externas: abordagens a partir do caso
anglo-português. In: SEIXAS, Miguel Metelo de; Rosa, Maria de Lurdes (coord.). Estudos de
Heráldica medieval. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, 2012, p. 209-222.
28
PEREIRA, Reinal Marisol Troca. Discursos dos embaixadores portugueses no Concílio de
Constança, 1416 (1999). Dissertação (Mestrado). Faculdade de Letras da Universidade de
Coimbra. Coimbra, 1999.
260
A diplomacia portuguesa quatrocentista
29
PINTO, Vítor Manuel da Silva Viana. De olhar atento e ouvidos à escuta... A espionagem militar
na cronística portuguesa de Quatrocentos: Fernão Lopes e Gomes Eanes de Zurara. Dissertação
(Mestrado). Universidade de Coimbra. Coimbra, 2015.
30
GONZÁLEZ SÁNCHEZ, Santiago. El espionaje en los reinos de la Península Ibérica a
comienzos del siglo XV. En la España Medieval, Madrid, v. 38, p. 135-194, 2015.
31
WALTER, Bastian. Urban Espionage and Counterespionage during the Burgundian Wars
(1468–477). In: CURRY, Anne; BELL, Adrian R. Journal of Medieval Military History: Soldiers,
Weapons and Armies in the Fifteenth Century. Woodbridge: Boydell & Brewer, 2011. v. IX, p.
132-145.
32
DENÉCÉ, Eric; DEUVE, Jean. Les Services Secrets au Moyen Âge. Rennes: Éditions Ouest-
France, 2011.
33
SANTOS, Maria Alice Pereira. A sociologia da representação político-diplomática no Portugal de
D. João I. Tese (Doutorado). Universidade Aberta. Lisboa, 2015.
261
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
34
Livro Vermelho do Senhor Rey D. Affonso V. In: Collecção de Livros Ineditos de História
Portugueza dos reinados de D. João I, D. Duarte, D. Affonso V e D. João II. Publicados por José
Corrêa da Serra. Lisboa: Academia Real das Sciencias de Lisboa, 1793, t. III, p. 391-540. No
prólogo da edição é informado que o documento foi tirado da coleção de Manoel Severim de Faria,
à época, em poder do conde de Vimieiro. O códex não é original, posto que este foi molhado e
danificado, mas é uma cópia encomendada por D. João III. José Corrêa da Serra argumenta que o
nome do livro foi tirado da cor da capa em que estava encadernado, visto que no período a cor
vermelha estava frequentemente aplicada aos livros em que os príncipes mandavam registrar os
estilos e ordens, e que precisavam consultar-se nas cortes.
35
LV, doc. 6, p. 420-421.
36
LV, doc. 26, p. 467-469.
262
A diplomacia portuguesa quatrocentista
37
Cf. GOMES, Rita Costa. A Corte dos Reis de Portugal no final da Idade Média. Lisboa: Difel, 1995.
263
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
38
RAU, Virgínia. Relações diplomáticas de Portugal durante o reinado de D. Afonso V. In: RAU,
Virgínia. Estudos de história medieval. Lisboa: Presença, 1986. p. 66-80.
39
OLIVEIRA MARQUES, A. H. de. Portugal na crise dos séculos XIV e XV, p. 279-334.
40
GOMES, Saul António. D. Afonso V. Lisboa: Círculo de Leitores, temas e debates, 2009.
41
RINCÓN, David Nogales. La cultura del pacto en las relaciones diplomáticas luso-castellanas
durante el período Trastámara (1369-1504). En la España Medieval, Madrid, v. 35, p. 121-144, 2012.
42
Nesse campo indicamos os seguintes estudos: ALTHOFF, Gerd. Family, Friends and
Followers: political and Social Bonds in Early Medieval Europe. Cambridge: Cambridge
University Press, 2004; SÈRE, Bénédicte. Ami et alié envers et contre tous: etude lexicale et
sémantique de l'amitié dans les contrats d'alliance. In: FORONDA, F. (dir.). Avant le contrat
social... Le contrat politique dans l'Occident médiéval (XIIIe-XVe siècle). Paris: [s.n.], 2011. p. 245-
268; SÈRE, Bénédicte. Penser l’amitié au Moyen Âge. Étude historique des commentaires sur les
livres VIII et IX de l’Éthique à Nicomaque (xiiie-xve siècle). Turnhout: Brepols, 2007; NABERT,
Nathalie. Les réseaux d’alliance en diplomatie aux XIVe et XVe siècles: étude de sémantique. [S.I.:
s.n.], 1994.
264
Quadro 1. Fórmulas de cortesia presentes no documento 4 do Livro Vermelho
Dinamarca
Inglaterra
Nápoles
Mouros
Polônia
Escócia
Aragão
Castela
Chipre
França
Hungria
Navarra
Sicília
Tipos de fórmulas de cortesia Fórmulas
Irmaaõ X X X X X X X X X X X X
Primo X X X
Retórica familiar
Tio X
265
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
1
Livro Vermelho do Senhor Rey D. Affonso V. In: Collecção de Livros Ineditos de História
Portugueza dos reinados de D. João I, D. Duarte, D. Affonso V e D. João II. Publicados por José
Corrêa da Serra, t. III, p. 402.
266
A diplomacia portuguesa quatrocentista
267
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
Considerações finais
268
A diplomacia portuguesa quatrocentista
269
N
as “Cartas” e “Relações” de Quinhentos-Seiscentos,
particularmente nas que tiveram como autores os Padres e
Irmãos da Companhia de Jesus que se dedicaram à
missionação ultramarina, o conceito “cousas” tem por significado
geral tudo quanto interessa aos homens e com eles tem relação.
Abrange, portanto, as cousas ou os assuntos temporais e religiosos,
se não mesmo as manifestações divinas.
Com o progressivo e surpreendente alargamento da visão do
Mundo e da Humanidade, como resultado das Conquistas e das
Grandes Descobertas em espaços exteriores à Respublica Christiana
ou à “Europa” emergente, as “cousas novas e estranhas”
converteram-se em inesgotável objecto de narração, descrição,
informação, notícia, enfim, de relato ou relação. Por curiosidade
271
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
1
Cf. Prólogo. Da Asia de João de Barros e de Diogo do Couto Nova Edição Offerecida a Sua
Magestade D. Maria I, Rainha Fidelissima. Lisboa: Na Regia Officina Typografica, 1778.
272
“Das cousas do Brasil”
2
LEITE, Serafim. Monumenta Brasiliae (1538-1553). Roma: Monumenta Historica Societatis
Iesu, 1956. v. I, p. 519-520.
273
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
3
SAINT FRANCIS XAVIER. Epistolae S. Francisci Xaverii aliaque eius scripta, por G.
Schurhammer S. I. et Wicki S. I. Roma: Monumenta Historica Soc. Iesu, 1944. t. I, p. 279.
274
“Das cousas do Brasil”
275
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
“Acudi irmãos a estas criaturas [...], vinde a ver estas novas estrellas,
e Reinos [...]”;4 ou “Manday muita gente à Índia, porque
acrescentarão muito os limites da Sancta Madre”.5
Outra das vertentes em que as “Cartas longas” e as
“Relações” se aproximam da História-estudo é a preocupação de
datar e periodizar, normalmente por décadas. No que concerne à
datação, paira já nesses registos uma certa ideia de historicismo ou de
valorização das circunstâncias, ou seja, o que acontece deve ser
explicado em função do momento em que aconteceu, podendo tal
registo ser importante para a leitura que o destinatário fará.
Da Baía e muito provavelmente da primeira quinzena de abril
de 1549 (já que, pela narrativa, precede uma outra missiva datada do
dia 15 dos mesmos mês e ano), o Padre Manuel da Nóbrega escreverá
ao Padre-mestre Simão Rodrigues, em Lisboa, a sua primeira carta.
Esta será também a primeira a ser enviada, pelos jesuítas, do “Novo
Mundo” para o “Velho Mundo”. Outras do mesmo missionário e
dos seus companheiros se seguirão, sendo curioso registar, quanto ao
carácter divulgador destas missivas, que, já em 1551, em treslado do
português para o castelhano, circulará Copia de unas cartas [em
número de 6] enbiadas del Brasil por el Padre Nobrega dela
Conpanhia [sic] de Jesus: y otros padres que estan debaxo de su
obediẽcia al padre maestre Simon [...]. A primeira deste conjunto tem
a designação Informação das Terras do Brasil, o que indicia sobre a
sua finalidade ou função essencialmente descritiva.
Releve-se que a preocupação com a divulgação, cumprindo
ordens superiores, também concorria para aproximar estes conjuntos
epistolares da História, ao torná-los mais inteligíveis na sua
significação do que se se mantivessem singularmente. Quanto à
contextualização temporal, espacial e substancial, ela é mais notória
nas “Relações ordenadas” ou sistematizadas, segundo critérios
subjectivos do compilador, ainda que satisfazendo, naturalmente, os
4
De uma carta do P. Gaspar Vilela, datada da Índia a 24 de abril de 1554, para os residentes no
Colégio de Coimbra. In: Cartas que os Padres e Irmãos da Companhia de Iesus escreverão dos Reynos
de Japão e China aos da mesma Companhia da India e Europa desdo anno de 1549 até o de 1580. Ed.
fac-similada. Maia: Castoliva Editora, 1997. t. I, f. 30-30 v.
5
De uma carta de Francisco Xavier, de Cochim, a 27 de janeiro de 1545. In: SAINT FRANCIS
XAVIER. Epistolae S. Francisci Xaverii aliaque eius scripta, p. 281.
276
“Das cousas do Brasil”
6
Cartas que os Padres e Irmãos da Companhia de Iesus escreverão dos Reynos de Japão e China aos
da mesma Companhia da India e Europa desdo anno de 1549 até o de 1580, t. I, f. 67.
277
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
7
Cartas que os Padres e Irmãos da Companhia de Iesus escreverão dos Reynos de Japão e China aos
da mesma Companhia da India e Europa desdo anno de 1549 até o de 1580, t. I, f. 73 v.
8
Monumenta Missionaria Africana. África Ocidental (1469-1599) coligida e anotada pelo P.
António Brásio, Lisboa: Agência Geral do Ultramar, 1954. v. IV de suplemento aos séculos XV
e XVI, p. 546-581.
278
“Das cousas do Brasil”
9
LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do
Livro – Ministério da Educação, 1949. v. VIII, p. 393-425.
279
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
pertenece escrivir todas las cartas del P. Pronvincial asi para personas
de la Compañia como [para] otras de fuera della, respondiendo de
otra manera; sacar extratos de las que vienen, copiar en libros las que
se enbian [...]”.10 Posteriormente, será tomada a decisão de
aperfeiçoar este serviço de secretariado e de proceder, com mais
cuidado e intensidade, ao registo dos factos e acontecimentos
notáveis da Companhia, ao que se propuseram vários agentes
internos, como foi o caso do P. Francisco Guerreiro.
A primeira edição da Relação, organizada (estruturada e
redigida em parte) pelo jesuíta P. Fernão Guerreiro, foi publicada em
cinco volumes (é raríssima a colecção completa) nos anos de 1603,
1605, 1607, 1609 e 1611. Em 1930, foi reeditado o Tomo Primeiro
(1600-1603) por Artur Viegas, com a chancela da Imprensa da
Universidade de Coimbra. O novo título será: Relação Anual das
Coisas que fizeram os Padres da Companhia de Jesus nas suas missões
Do Japão, China, Cataio, Tidore, Ternate, Ambóino, Malaca, Pegu,
Bengala, Bisnagá, Maduré, Costa da Pescaria, Manar, Ceilão,
Travancor, Malabar, Sodomala, Goa, Salcete, Lahor, Diu, Etiopia
a alta ou Preste João, Monomotapa, Angola, Guiné, Serra Leoa,
Cabo Verde e Brasil nos anos de 1600 a 1609 e do processo da conversão
e cristandade daquelas partes: tirada das cartas que os missionários de
la escreveram. Este título da nova edição tinha a vantagem de
enunciar as proveniências geográficas do epistolário dos jesuítas na
primeira década do século XVII e, deste modo, concorrer para
cartografar as missões da Companhia. Porém, fora mais sucinto, logo
menos específico, o frontispício do primeiro volume da edição
princeps, a saber Relaçam Annual Das Cousas Que Fizeram os Padres
da Companhia de Jesus na India, e Japão nos annos de 600, e 601, e
do processo da conversão, e Christandade daquellas partes: tirada das
cartas gẽrais que de la vierão pello Padre Fernão Guerreiro da
Companhia de Jesus. Em Évora, por Manuel de Lira, ano 1603.
Os temas ou as “cousas” concernentes ao Brasil na Relação do
Padre Fernão Guerreiro são, logicamente, também de
predominância espiritual e eclesiástica, a ponto de o motor da
10
LEITE, Serafim. Monumenta Brasiliae (1538-1553). Roma: Monumenta Historica Societatis
Iesu, 1958. v. III, p. 384.
280
“Das cousas do Brasil”
11
GUERREIRO, Fernão, S. J. Relação anual das coisas que fizeram os Padres da Companhia de
Jesus nas suas Missões do Japão, China, Cataio... Nos anos de 1600 a 1609 e do processo da conversão
e cristandade daquelas partes; tiradas das cartas que os missionários de lá escreveram. Coimbra:
Imprensa da Universidade, 1930. t. I, p. 395.
281
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
12
Cf. RODRIGUES, Francisco, S.J. História da Companhia de Jesus na Assistência em Portugal.
Porto: Apostolado da Imprensa – Empresa Editora, 1931. t. I, v. I, p. XIV.
13
apud RODRIGUES, Francisco, S.J. História da Companhia de Jesus na Assistência em Portugal, p. XV.
282
“Das cousas do Brasil”
14
RODRIGUES, Francisco, S.J. História da Companhia de Jesus na Assistência em Portugal, p. XVI.
15
Relativamente à Chronica, uma leitura dos subtítulos deixa perceber o interesse pelo registo da
vida e acção do padre Simão Rodrigues, fundador e governador da Província de Portugal, e de
outros jesuítas que serviram a Companhia em tempo de Inácio de Loyola, “Com o summario das
vidas dos Serenissimos Reys Dom Ioam Terceyro, E Dom Henrique, Fundadores e Insignes
bemfeytores desta Provincia”.
16
Abona também estas últimas informações bibliográficas RODRIGUES, Francisco, S.J. História
da Companhia de Jesus na Assistência em Portugal, p. XVII-XXI.
283
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
17
No título actualizou-se o emprego do u e do v. Foi publicada “Em Lisboa, na officina de Ioam
da Costa, 1672”. De visita ao Brasil, em 1922, o Presidente da República Portuguesa, António
José de Almeida, ofereceu uma cópia da obra ao seu par brasileiro.
18
LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil. Lisboa: Livraria Portugália, 1938.
v. I, p. 557 – 558.
19
LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil, p. 425-426.
284
Sobre os autores
Adriana Zierer
285
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
Armando Martins
286
Sobre os autores
287
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
288
Sobre os autores
Manuela Mendonça
289
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
290
Sobre os autores
291
A escrita da história de um lado a outro do Atlântico
292