Economia Empresarial Apostila
Economia Empresarial Apostila
Economia Empresarial Apostila
OLIGOPÓLIO ..................................................................................................................................... 39
Cartéis sob a ótica da Teoria dos Jogos ................................................................................ 40
Regulação do governo: o papel do Cade .............................................................................. 43
Caso da aquisição da Garoto pela Nestlé ....................................................................... 43
NOVA ECONOMIA ............................................................................................................................ 44
Schumpeter e a destruição criativa ....................................................................................... 45
REVOLUÇÕES INDUSTRIAIS ............................................................................................................ 45
Primeira Revolução Industrial ................................................................................................ 45
Segunda Revolução Industrial ................................................................................................ 46
Terceira Revolução Industrial ................................................................................................. 46
Quarta Revolução Industrial ................................................................................................... 47
MACROMERCADOS .......................................................................................................................... 49
Macromercados de bens e serviços ...................................................................................... 50
Macromercado de moeda ...................................................................................................... 50
Macromercado de câmbio...................................................................................................... 51
INFLAÇÃO E POLÍTICA MONETÁRIA ............................................................................................... 52
Como se mede a inflação? ...................................................................................................... 53
Hiperinflação brasileira e Plano Real .................................................................................... 54
Plano Real ............................................................................................................................ 55
Regime de metas da inflação ................................................................................................. 56
Regime de metas de inflação no Brasil ........................................................................... 57
Escolha do índice da inflação para o regime de metas no Brasil ................................ 57
Atuação do Banco Central na busca do cumprimento da meta .................................. 58
Papel das expectativas e autonomia do Banco Central ................................................ 59
MENSURAÇÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA ................................................................................. 60
Produto interno bruto (PIB) .................................................................................................... 60
PIB nominal e PIB real........................................................................................................ 61
Produto nacional bruto (PNB)........................................................................................... 61
Neste módulo, apresentaremos a economia como a ciência das escolhas, aquela que explica
a forma como os agentes econômicos alocam os seus recursos escassos. Para tanto, definiremos o
custo de oportunidade das decisões de um administrador de empresa, entenderemos as escolhas
dos agentes econômicos (famílias, empresas e governo) e buscaremos compreender a escolha das
famílias entre consumir ou poupar. Em seguida, determinaremos se um setor possui as
características de um mercado com concorrência e definiremos as principais estruturas de
mercado existentes: monopólio e oligopólio. Por fim, identificaremos os elementos que definem a
demanda e a oferta de um bem ou serviço, buscando compreender como, em determinado
mercado, tais elementos respondem às variações do preço.
O que é economia?
A Economia pode ser vista como uma ciência, dado que as suas teorias são formuladas a
partir de métodos científicos. Um físico, por exemplo, formula as suas teorias a partir da
observação da natureza. Depois de formulá-las, ele executa experiências para verificar se tais
teorias podem ser confirmadas ou não. De modo análogo, os economistas observam os
acontecimentos econômicos em diversos países para, dessa forma, formular as suas teorias. Por
exemplo, muito do que se conhece, atualmente, como parte das teorias econômicas consagradas é
resultado das observações e dos estudos realizados durante a Grande Depressão de 1930. Ao
observarem os acontecimentos pertinentes a esse momento histórico, os economistas puderam
responder a questões como:
Quais foram as causas e origens daquela catástrofe?
Por que se aprofundou tanto?
Por que foi tão longa?
Quais foram os principais equívocos dos governos?
Quais foram os motores que, finalmente, tiraram o mundo daquela terrível situação de
profundo desemprego e sofrimento?
O processo de observação e estudo por parte dos economistas é contínuo e pode modificar
as teorias originais quando a realidade as confronta.
10
Princípios econômicos essenciais
Há dois princípios extremamente importantes na Economia. São eles:
a) Uma pessoa racional pensa na margem:
O conceito do termo “marginal” é fundamental em Economia. Podemos compreendê-lo
melhor por meio de um exemplo: suponhamos que um empresário opere a sua empresa
lucrativamente e esteja decidindo se deve ou não aumentar a sua produção em 10%. A decisão deve
ser tomada verificando se a receita marginal, ou seja, a receita a mais que esse acréscimo de produção
proporcionará, superará o custo marginal, que é o custo de ampliar a produção em 10%.
Cada um desses agentes econômicos deve decidir como alocar os seus recursos escassos. A
seguir, analisaremos como se dá essa escolha com mais detalhes.
11
tempo que Maria terá de esperar para poder usufruir desse aumento de consumo. Suponhamos
que os juros anuais das aplicações de Maria sejam de 10% a.a. Isso significa que cada real
poupado por Maria hoje lhe renderá 1,10 reais daqui a um ano. Dizemos então que o preço
relativo do consumo hoje e do consumo daqui a um ano é de 1,10. O custo de oportunidade do
consumo hoje é o consumo futuro a mais a que ela terá de renunciar.
Importante!
2. o consumo futuro que Maria obterá um ano depois, se decidir poupar parte da sua renda
hoje, não depende somente dos juros anuais da aplicação financeira mas também da
inflação nesse ano – se os preços dos bens subirem, em média, 10% durante esse ano, o
consumo futuro de Maria não será maior no final desse período e se a inflação no ano for
superior a 10%, Maria perderá poder aquisitivo. O consumo de Maria só será maior um ano
depois se a taxa de juros obtida superar a inflação no período e
3. os juros obtidos na aplicação são chamados de taxa de juros nominal – a taxa de juros que
importa para a decisão de Maria entre consumir ou poupar é a taxa de juros real, que
consiste na diferença entre os juros obtidos, descontada a inflação no período.
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Escolha do governo
O recurso limitado do governo é a carga tributária que a sociedade lhe transfere. Ele deve
escolher, portanto, como irá alocar esse recurso: se em serviços públicos, como segurança, saúde e
educação, em programas sociais ou mesmo na construção de um novo porto ou estrada. Cada vez
que o governo resolve alocar capital em uma dessas importantes finalidades, esse capital não está
mais disponível para as outras finalidades também importantes. O critério utilizado pelo governo
para escolher como vai alocar os recursos que recebe da sociedade prevê uma combinação de
finalidades que maximize o bem-estar social.
Neste ponto, chegamos a um impasse: é verdade que o governo visa maximizar o bem-estar
social, mas, no mundo democrático, ele também visa ganhar apoio político e votos.
Frequentemente, portanto, a decisão mais eficiente de alocar recursos para construir o bem-estar
social nos médio e longo prazos não é a mais eficiente para obter apoio político no curto prazo.
Conflitos como esse são inerentes à situação básica da Economia, que, como vimos, é a
ciência das escolhas. Por isso mesmo, a opinião unânime entre os economistas jamais é alcançada.
Essa impossibilidade de alcançar unanimidade se reflete nas infindáveis discussões entre
economistas de diferentes linhas de pensamento econômico.
Estruturas de mercado
As estruturas de mercado são as seguintes:
concorrência perfeita;
concorrência monopolística;
monopólios e
oligopólios.
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A teoria econômica define as características de cada estrutura. Na vida real, é natural que
sintamos dificuldade ao tentar determinar se dado mercado está operando em uma ou outra
estrutura. É para isso que serve a teoria. Por meio dela, podemos verificar se os mercados
apresentam ou não determinadas condições que os aproximem de uma ou outra estrutura.
Basicamente, o número de empresas operando em um mercado é o que determina a
estrutura vigente, determinando também o nível de competitividade. Existem, contudo,
características e nuances em cada caso. O esquema apresentado a seguir nos auxilia no
mapeamento das características de cada estrutura. Vejamos:
Concorrência perfeita
Um mercado nada mais é que um grupo de compradores e vendedores de determinado bem
ou serviço. Em um mercado competitivo, o número de compradores e vendedores é grande o
suficiente para que nenhum deles consiga impactar individualmente o preço praticado nesse
mercado. Dizemos que, nesse mercado, cada participante é um price taker (tomador de preço).
Isso significa que cada vendedor ou comprador negocia o bem ou serviço ao preço que o mercado
como um todo pratica, não conseguindo nele interferir.
Para que ocorra uma concorrência perfeita:
os compradores e vendedores devem ser tão numerosos que nenhum comprador ou
vendedor pode influenciar no preço de mercado;
os produtos devem ser idênticos;
a entrada e saída do mercado deve ser livre e
a assimetria de informação não deve existir.
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Veremos, mais adiante, que as barreiras à entrada de novos participantes são um fator-chave
para que a concorrência não aconteça. Voltaremos a tratar desse assunto quando verificarmos as
condições do monopólio.
Quanto à assimetria de informações, participantes que tivessem informações privilegiadas
acerca das condições do mercado em que atuam não estariam competindo em igualdade de
condições. Informações privilegiadas são, via de regra, uma fonte de lucro diferenciado para quem
as possui. Em um mercado cuja concorrência é perfeita, todos os participantes devem possuir,
portanto, o mesmo nível de informação.
Concorrência monopolística
No mercado que opera em uma estrutura de concorrência monopolística, o número de
ofertantes e demandantes é elevado. No entanto, cada empresa detém identidade própria, o que
pode advir da sua marca, grife ou patente. Isso dá a cada ofertante uma certa autonomia para
determinar o preço do seu bem ou serviço. Essa autonomia é, contudo, reduzida devido à
concorrência de outras marcas de produtos similares.
Apesar da diferenciação dos produtos ou serviços de cada empresa, os consumidores os
percebem como substitutos próximos. São exemplos: produtos eletroeletrônicos, redes de fast-
food, restaurantes de chefes renomados, provedores de acesso à internet, produtos de beleza,
academias de ginástica, lojas de café gourmet, etc.
Importante!
15
estar ou não de dieta;
possuir ou não um freezer para armazenar o produto;
ter dinheiro ou não para comprar esse sorvete e
o preço do sorvete (talvez o mais importante desses fatores).
Em uma curva da demanda, cada ponto é uma combinação ( , ) entre determinado preço
do bem ou serviço ( ) e determinada quantidade demandada desse bem ou serviço ( ).
No gráfico apresentado, se o preço do produto for , a quantidade demandada pelos
consumidores será . Os consumidores que demandam esse produto ao preço são todos
aqueles que estão dispostos a pagar por esse bem ou serviço de para cima. Se o preço ficar
abaixo de , a quantidade demandada aumentará, dado que, a um preço inferior, mais
consumidores estarão dispostos a demandar o produto. Se o preço ficar acima de , ocorrerá o
contrário, ou seja, a quantidade demandada diminuirá, já que alguns consumidores desistirão de
demandar o produto.
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Além do preço, podemos listar alguns outros fatores importantes na determinação da
demanda por um bem ou serviço. Vejamos:
a) Renda:
Se, em um país, o crescimento da economia tem sido consistente e a renda real (variação da
renda descontada da inflação) das famílias tem se expandido, a demanda pela maioria dos
produtos aumentará. Caso o país esteja passando por uma recessão, acontecerá o contrário. A
gráfico a seguir mostra como a expansão e a contração de renda afetam a curva de demanda.
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b) Disponibilidade de crédito:
Alguns produtos têm a sua demanda muito afetada pela disponibilidade de crédito, como:
eletrônicos, linha branca (geladeiras, máquinas de lavar e eletrodomésticos em geral), automóveis,
casas e apartamentos.
O advento do crédito consignado – regulamentado por lei desde 2003 no Brasil –, no qual
as parcelas do empréstimo são diretamente descontadas do salário ou da aposentadoria do
cidadão, reduziu o risco de inadimplência para as instituições financeiras, diminuindo os juros
pagos pelo consumidor e deslocando a curva de demanda para fora. Em outras palavras, a
demanda por esses produtos foi expandida por haver mais crédito a juros menores.
c) Gostos e preferências:
O fato de algum produto começar a ser, por conta de algum fenômeno mercadológico, da
preferência da população também causa deslocamentos na curva de demanda.
d) Expectativas:
As expectativas da população têm expressivas consequências na economia. Em períodos de
expansão econômica, com o aumento da taxa de emprego e da renda, as pessoas ficam mais
confiantes, com boas expectativas, e ousam consumir mais e realizar sonhos de consumo não só
com a renda corrente mas também com a expectativa de rendas futuras, comprando a crédito.
Esse cenário desloca as curvas de demanda por bens e serviços para fora. O maior consumo cria
mais empregos, reforçando as boas expectativas e a demanda.
Infelizmente, em um período de recessão, toda essa lógica se dá de modo inverso: o
consumidor fica menos confiante, as suas expectativas são ruins, e as curvas de demanda se
deslocam para dentro, reforçando essas más expectativas.
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f) Bens ou serviços substitutos:
Quando acontecem variações de preço, os consumidores buscam substituir determinados
bens ou serviços por outros. Um bem ou serviço é um substituto perfeito de outro quando o
indivíduo troca um pelo outro, por menor que seja a variação relativa de preços, guardando o
mesmo nível de satisfação. Quando ocorre um aumento do preço da maçã, a demanda por peras
aumenta, pois são bens substitutos próximos, quase perfeitos. Certamente, se o preço da Coca-
Cola aumentar, a demanda por outros refrigerantes e similares aumentará.
Importante!
Vimos que, quando o preço de um bem e serviço varia, a quantidade demandada se move
sobre a curva de demanda. Os outros fatores, quando variam, deslocam a curva, como vimos
no caso de variação da renda. No entanto, para analisarmos como uma dessas variáveis afeta a
demanda, temos de isolar o efeito das outras.
Sempre que o preço de um bem ou serviço sobe, a quantidade demandada cai? Depende. Se,
ao mesmo tempo, a renda aumentar, não saberemos o resultado final dos dois efeitos.
Contudo, se imaginarmos que nada mais foi alterado, podemos afirmar que, se o preço subiu, a
quantidade demandada do bem ou serviço em questão caiu. Essa relação costuma ser definida
pelo termo ceteris paribus, que, em latim, significa “tudo o mais constante”, ou seja, a renda e
todos os outros fatores que afetam a demanda não mudaram.
Elasticidade-preço da demanda
Os compradores reagem, em termos das quantidades adquiridas, quando os preços são
alterados. Avaliar, quantitativamente, essa reação é fundamental para a tomada de decisão dos
empresários ou gerentes quanto aos preços. Como a receita total das vendas resulta da
multiplicação das quantidades adquiridas pelos preços de mercadorias e serviços, ( =
), a reação dos consumidores altera o faturamento da empresa. A medida dessas variações é
chamada de elasticidade-preço da demanda.
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∆%
=
∆%
Como a curva de demanda é uma relação inversa entre a quantidade demandada e o preço,
o sinal da elasticidade-preço da demanda encontrado será negativo. Como isso pode levar a erros
de interpretação, o sinal não costuma ser considerado, sendo comum apresentar a elasticidade-
preço da demanda por meio de um valor absoluto.
Embora os compradores sempre reajam às oscilações de preço, tais reações podem ser mais
ou menos intensas, dependendo das características do bem ou serviço em questão. A seguir,
analisaremos alguns fatores determinantes da elasticidade-preço da demanda. Vejamos:
∆%
1
∆%
Nesse caso, a quantidade demandada cai percentualmente menos do que o aumento do preço.
Se, por outro lado, o bem ou serviço em questão for supérfluo, isto é, o consumidor puder
deixar de consumi-lo sem grandes prejuízos à sua qualidade de vida ou ao seu conforto,
provavelmente um aumento de preço terá como consequência uma queda na quantidade
demandada, que será percentualmente maior que o aumento de preço. Dizemos então que esse
bem ou serviço tem uma demanda elástica, o que significa que a elasticidade-preço é maior que 1:
∆%
1
∆%
20
c) Horizonte temporal:
A elasticidade dos bens tende a aumentar em horizontes de tempo mais longos. Se o preço
da gasolina aumentar consideravelmente, a demanda cairá pouco inicialmente, dado que esse é
um bem muito necessário. Com o passar do tempo, no entanto, os consumidores tenderão a
comprar carros mais econômicos, buscar trabalhar em locais mais próximos à sua moradia ou
morar mais perto do trabalho. Com isso, a demanda por gasolina cairá bem mais. Isto é, a reação
dos consumidores ao aumento de preço fará com que a resposta à quantidade demandada se
intensifique no horizonte de tempo. Isso aconteceu na década de 1970, nos choques de petróleo,
quando a organização de países exportadores de petróleo (Opep) restringiu a oferta, forçando uma
repentina e aguda alta de preço do produto.
5
∆% 100 0,05
= = = = 0,25
∆% 20 0,20
100
21
Podemos observar que um bem que tenha uma demanda inelástica, como um remédio
muito específico, favorecerá o produtor em detrimento do consumidor.
22
∆% 100 0,22
= = = = 2,20
∆% 10 0,10
100
Nesse caso, para cada aumento de preço de 1%, ocorrerá uma queda de 2,2% na
quantidade demandada. Em outras palavras, se o preço subir, haverá uma queda percentual maior
ainda na quantidade comprada. Dessa forma, os gastos do consumidor e a receita de vendas
cairão. Para os consumidores, esse produto, provavelmente, não é essencial ou tem substitutos
próximos, pois há uma forte redução na sua demanda quando ocorre o aumento de preço. A
demanda é, portanto, elástica.
Podemos observar que um produto que tenha uma demanda elástica favorece o consumidor
em detrimento do produtor. Quanto maior for a flexibilidade de escolha existente para o
consumidor – seja porque o produto não é necessário ou porque existem bens substitutos
próximos –, mais elástica será a demanda.
10
∆% 100 0,10
= = = =1
∆% 10 0,10
100
Para cada aumento de preço de 1%, ocorrerá uma redução de 1% na quantidade comprada.
A decisão de aumentar os preços não irá modificar, portanto, o gasto do consumidor e a receita de
vendas. Em outras palavras, o consumidor reduzirá as quantidades demandadas na mesma
proporção que os preços subirem. Dizemos então que a demanda desse bem apresenta elasticidade
unitária.
22
Nos gráficos a seguir, estão representados os conceitos de elasticidade-preço da demanda
que acabamos de analisar.
No gráfico A, vemos que, quando o bem tem demanda inelástica, a curva é mais vertical,
pois as variações das quantidades demandadas são menos intensas que as variações dos preços. No
gráfico B, vemos que, quanto maior for a elasticidade-preço, mais horizontal será a curva de
demanda, ou seja, as variações das quantidades serão mais que proporcionais às variações dos
preços. Por fim, no gráfico C, vemos que, se a elasticidade é unitária, as variações percentuais nas
quantidades compradas são iguais às dos preços.
23
MÓDULO II – CURVA DE OFERTA E FORMAÇÃO
DO PREÇO NOS MERCADOS COMPETITIVO E
MONOPOLISTA
Neste módulo, abordaremos o lado do produtor (aquele que faz a oferta) e o mercado, local
de encontro entre compradores e vendedores, e onde ocorre a formação de preços. Para tanto,
veremos como se forma o preço em um mercado cuja concorrência é perfeita e analisaremos o
papel fundamental do preço nas decisões dos agentes econômicos, que buscam sempre maximizar
o seu lucro. Apresentaremos também situações em que o mercado falha e, por isso, a competição
não acontece, o que leva ao monopólio.
26
Figura 6 – Relação entre preço e quantidade ofertada
b) Tecnologia:
Toda produção usa certa tecnologia específica, e as atualizações tecnológicas tornam os
processos mais eficazes, elevando a produtividade dos recursos usados, reduzindo os custos e
aumentando a oferta. As mudanças nos serviços de telefonia oferecidos nas últimas três décadas
são um bom exemplo de como a tecnologia influencia a oferta.
c) Expectativas:
Se as expectativas para determinado mercado forem boas, mais empresários decidirão
produzir o bem ou serviço, e a oferta aumentará. Se as expectativas forem ruins, empresários
abandonarão o setor, e a oferta diminuirá.
27
Elasticidade-preço da oferta
Assim como acontece com as quantidades demandadas, as quantidades ofertadas variam
quando o preço do bem ou serviço se altera. A intensidade dessa reação depende do tempo de
resposta da produção da empresa. Na maioria das cadeias produtivas, a oferta tende a ser mais
elástica (mais sensível ao preço) no longo prazo. No curto prazo, podem ocorrer dificuldades no
fornecimento de matérias-primas e, sobretudo, de equipamentos, ou ainda dificuldades em
contratar mão de obra especializada, dependendo da especificidade do processo produtivo.
20
∆% 100 0,20
= = = = 1,33
∆% 15 0,15
100
Dessa forma, para cada aumento de preço de 1%, ocorrerá uma elevação da quantidade
ofertada de 1,33%. Isso mostra que a estrutura produtiva dessa mercadoria tem poucas restrições
e é capaz de responder, prontamente, ao estímulo de preço.
5
∆% 100 0,05
= = = = 0,33
∆% 15 0,15
100
Dessa forma, para cada aumento de preço de 1%, ocorrerá uma elevação da quantidade
ofertada de 0,33%. Isso mostra que a estrutura produtiva responde ao estímulo de preço com
dificuldade.
28
c) Exemplo de elasticidade – preço da oferta unitária:
Se o percentual da quantidade ofertada for igual ao percentual da variação de preço,
dizemos que a elasticidade-preço da oferta é unitária. No exemplo, tanto o preço quanto a
quantidade ofertada variam 5%.
5
∆% 100 0,05
= = = =1
∆% 5 0,05
100
Os gráficos apresentam três curvas com inclinações distintas, representando as curvas das
ofertas elástica, unitária e inelástica. A oferta representada pela curva OA do gráfico A é a mais
horizontal (elástica em relação aos preços) quando comparada às ofertas presentes nos gráficos B e
C. A reação da quantidade ofertada no gráfico A à variação do preço tende a ser maior que nos
gráficos B e C.
29
Mercado: os opostos se encontram
No gráfico a seguir, podemos ver, ao mesmo tempo, as curvas da demanda e da oferta.
Por outro lado, se o preço estiver abaixo do ponto de equilíbrio, haverá um excesso de
demanda no mercado. Esse excesso de demanda fará o preço subir, aumentando a quantidade
ofertada e diminuindo a quantidade demandada. Nesse caso, o preço subirá até alcançar o preço
30
de equilíbrio, quando o excesso de demanda terá desaparecido. Essa situação está representada no
gráfico a seguir.
Quando o governo interfere no sistema de preços, ele faz com que os agentes econômicos
tomem as suas decisões com base em um preço que não foi definido pelo mercado, mas
artificialmente. Isso, via de regra, acaba criando distorções sérias na economia. Por exemplo,
quando o governo abaixa ou congela, por decreto, o preço da energia, ele cria problemas
financeiros para as empresas geradoras, que param de investir e de ampliar a capacidade de
fornecimento. Já o consumidor, ao observar o preço congelado pelo governo, não se preocupará
em racionar energia. Haverá, portanto, distorções de alocação de recursos tanto por parte do
produtor quanto por parte do consumidor, pois o preço não é o correto. No caso do mercado de
energia, teremos um cenário que, claramente, poderá levar a um apagão.
31
Maximização do lucro
Equação do lucro
Toda empresa aloca o seu capital visando maximizar o seu lucro. Inicialmente, podemos
dizer que o lucro é resultante da seguinte equação:
! = – !#
Já os custos totais de uma empresa são resultantes da soma entre os custos fixos e os custos
variáveis:
!# = !# # $ # % !# # & á& #
! = ( ) !# # $ # % !# # & á& # * +,
32
em que a sua empresa está inserida. Isto é, vai depender, principalmente, da existência de
concorrência e do quão numerosa é essa concorrência.
Como vimos, no caso de concorrência perfeita, quando muitas empresas atuam no mesmo
segmento, o preço imposto pelo mercado é aquele em que prevalece o equilíbrio: o preço que faz a
quantidade demandada ser igual à quantidade ofertada.
Se o nosso fabricante de bolos sofrer a concorrência de muitas fábricas semelhantes à dele,
ele venderá os seus bolos ao preço que estiver sendo praticado pelo mercado, podendo somente
escolher a quantidade a ser vendida para maximizar o seu lucro. Isso é o que significa ser tomador
de preço (price taker).
Falhas de mercado
No século XVIII, Adam Smith, autor do famoso livro A riqueza das nações, usou a imagem
da mão invisível do mercado para fazer referência àquilo que impulsionaria os indivíduos, ao
perseguirem os seus interesses individuais, a promoverem eficiência e bem-estar social. Dessa
forma, os recursos escassos da sociedade seriam utilizados do modo mais eficiente possível se os
mercados funcionassem em competição perfeita. No entanto, a realidade pode afastar-se desse
modelo de competição. Essas situações são denominadas falhas de mercado e justificariam a
atuação do governo em busca do aumento da eficiência na alocação dos recursos da sociedade e na
promoção do bem-estar social.
33
Um exemplo clássico de falha de mercado é o de uma fábrica cuja produção provoque a
poluição do ar ou de rios, prejudicando a saúde da população. Nesse caso, após realizar uma
fiscalização, o governo poderá aplicar uma multa à empresa ou, até mesmo, fechá-la. Essa eventual
multa ou punição induzirá a empresa a investir em tecnologias menos poluentes e a reparar os
danos causados ao ambiente.
A atuação do governo também é necessária quando os mercados que não acontecem, pois
não são lucrativos, não atraindo produtores. Uma cidade pode não ter o número suficiente de
habitantes para que uma empresa privada de ônibus ali se instale, deixando os seus moradores sem
esse serviço essencial. Normalmente, em casos como esse, o governo cria uma empresa estatal para
ofertar o serviço ou oferece algum subsídio ao setor privado.
Monopólio
Uma outra possibilidade de falha de mercado ocorre quando há somente um produtor de
determinado bem ou serviço, e não existe substituto próximo para esse bem. Dizemos então que
esse produtor é monopolista daquele bem ou serviço.
Uma empresa pode ser a única a fazer o trajeto de ônibus do Rio de Janeiro a Belo
Horizonte, e vice-versa. Há, contudo, a possibilidade de o consumidor ir de avião ou dirigindo o
seu próprio carro. Dessa forma, se a empresa aumentar muito o preço da passagem de ônibus,
certamente perderá clientes para o avião ou o carro particular.
Importante!
Um ponto importante a observar é que não existe curva da oferta no monopólio. Como vimos,
a curva da oferta de um mercado nos informa que, se o preço de um bem subir, novos
produtores ficarão dispostos a vendê-lo, e a quantidade ofertada aumentará. Por outro lado, se
o preço cair, alguns produtores desistirão de vender o bem, e a quantidade ofertada cairá.
Como estamos analisando um monopólio, somente um produtor existe e, consequentemente,
não faz sentido falar em curva da oferta.
O monopolista, como qualquer outro produtor, tem como objetivo maximizar o seu lucro.
No entanto, apesar do seu poder de mercado, o monopolista não pode vender o produto ao preço
que quiser. Se a curva de demanda de determinado produto indicar que, ao preço de R$ 100,00, a
quantidade demandada é de 10.000 unidades, mesmo sendo monopolista, o produtor não pode
34
decidir vender as 10.000 unidades ao preço de R$ 150,00, pois, a esse preço, haverá menos
consumidores dispostos a adquirir o produto.
Por outro lado, o monopolista tem mais liberdade que o produtor que atua em um
mercado em competição perfeita, pois ele pode escolher a melhor combinação preço-quantidade
para maximizar o seu lucro. Como vimos, o produtor em concorrência perfeita é um tomador de
preço e só escolhe a quantidade a ser comercializada, pois o preço é determinado pela interação da
demanda e da oferta no mercado como um todo.
O monopolista vai escolher, portanto, a combinação preço-quantidade ( , ), representada
por um ponto sobre a curva de demanda, que maximize o seu lucro que depende do preço e da
quantidade.
! = ( ) !# # $ # % !# # & á& # * +,
35
Figura 11 – Competição perfeita versus monopólio
Tipos de monopólio
O monopólio acontece quando existe alguma barreira que impeça novas empresas de atuar
naquele segmento de mercado. Os principais tipos de barreira à entrada a novos produtores,
propiciando a manutenção dos monopólios, são os seguintes:
a) Monopólio legal:
O monopólio legal é aquele instituído por lei, como acontecia em diversos serviços de
utilidade pública no Brasil até alguns anos atrás.
36
Essa prática é considerada ilegal, sendo motivo de diversas ações judiciais. Alguns casos são
controversos, pois a empresa alega (e, às vezes, prova) que os preços baixos não são predatórios,
mas consequência das inovações tecnológicas ou da escala de produção.
Monopólio natural
O monopólio também pode ser resultante do tamanho do mercado e dos altos custos fixos
de um setor. Imaginemos uma pequena cidade onde se instale um hipermercado. Esse
estabelecimento, por operar em ampla escala e ter custos mais baixos, pode levar todos os
mercados tradicionais dessa cidade à falência. Na verdade, só há espaço para uma empresa de
porte naquela cidade, dado o número limitado de consumidores. Essa estrutura de mercado é
conhecida como monopólio natural.
Os serviços de distribuição de água ou de energia elétrica em uma cidade são casos típicos
de monopólio natural. Se mais de uma empresa atuasse em algum desses setores, os custos altos
decorrentes da escala menor de produção fariam com que, para que as empresas atuassem sem
prejuízo, o preço para o consumidor fosse mais caro do que se houvesse uma única empresa.
Papel do estado
O Estado deve atuar no caso do monopólio natural, principalmente nos casos de empresas
que ofereçam serviços públicos, como aeroportos, estradas, distribuição de energia e
fornecimento de água. Esses bens são essenciais e, pela sua estrutura de custos fixos altos, não
comportam concorrência.
A atuação do Estado pode ocorrer por meio da criação de empresas estatais que se ocupem
desses setores ou da realização de leilões de concessão do serviço ao setor privado. Nesse segundo
caso, o Estado atua como regulador, criando agências reguladoras para cada setor, como a Aneel
(Agência Nacional de Energia Elétrica) e a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
Essas duas hipóteses de lidar com o monopólio natural são motivos de intermináveis
discussões entre os economistas. Alguns preferem as estatais, outros preferem as concessões ao
setor privado.
No caso das concessões, a regulação governamental deve ter o objetivo de fazer com que o
mercado sem competição, ou no qual a competição seja restrita, funcione o mais próximo
possível da situação de concorrência. As agências reguladoras devem preservar a rentabilidade do
capital investido pelo concessionário, zelar pela qualidade do serviço e atuar para que os
37
contratos sejam cumpridos adequadamente. Já as concessionárias têm obrigações com o nível de
qualidade dos serviços prestados ao público e prazos para realizar os investimentos definidos nos
contratos de concessão.
Alguns modelos de regulação dão garantia de retorno mínimo para o investimento da
empresa. No entanto, essa garantia de retorno pode induzir a investimentos maiores que o
necessário por parte da concessionária, que pode contabilizar um capital maior e, portanto,
aumentar o que recebe.
Outro modelo, utilizado nas privatizações das estradas brasileiras, é aquele em que o
governo define a tarifa máxima a ser paga pelos consumidores às empresas. Nesse caso, os
participantes do leilão oferecem descontos sobre essa tarifa. Quem oferecer o maior desconto
ganha a concessão.
Uma crítica comum feita à regulação consiste no fato de que os reguladores, indicados pelo
governo, podem distanciar-se do interesse da população, sendo cooptados pelas próprias empresas
que deveriam regular. Essa dificuldade é conhecida como “problema da captura”.
Como os investimentos em setores de infraestrutura são elevados, um país que necessite
atrair capital privado para a sua infraestrutura deve ter um ambiente regulatório previsível e
confiável. Para investir, o setor privado precisa ter confiança de que os contratos firmados serão
cumpridos. Enfim, o risco regulatório e o respeito aos contratos são pontos sensíveis nas decisões
de investimento do setor privado. Incertezas nessas áreas afugentam potenciais investidores.
A realidade é que temos exemplos tanto de eficiência e quanto de má gestão em casos de
concessões ao setor privado e de estatais. Por exemplo, as principais estradas francesas e alemãs
figuram entre as melhores do mundo: as francesas são privatizadas, e as alemãs são gerenciadas
pelo Estado. Ambas as soluções para lidar com o monopólio natural apresentam, portanto,
vantagens e desvantagens.
38
MÓDULO III – OLIGOPÓLIOS E FORMAÇÃO
DE CARTÉIS
Neste módulo, trataremos da situação do oligopólio, que ocorre quando poucas empresas
produzem determinado bem ou serviço. Analisaremos então a estratégia utilizada pelos setores
oligopolizados e compreenderemos como se formam os cartéis sob a ótica da Teoria dos Jogos.
Veremos também a teoria de Shumpeter, economista criador da expressão “destruição criativa”,
que tem relação com a nova economia e os impactos das novas tecnologias nos diversos mercados.
Oligopólio
Diversos mercados operam com poucas empresas (duas ou mais, mas não muitas). São os
oligopólios, estruturas de mercado em que, normalmente, também encontramos barreiras à
entrada. Existem dois tipos de oligopólio:
oligopólio homogêneo – ocorre quando o produto ofertado pelas empresas que operam
em oligopólio é bastante semelhante. Nesse caso, os preços das empresas não podem ser
muito diferentes, sob pena de a empresa que cobrar mais caro perder fatia de mercado e
oligopólio diferenciado – quando há uma diferenciação maior entre os produtos das
empresas.
A questão da estratégia se faz presente nessa estrutura de mercado, pois, devido ao porte das
poucas empresas, o que uma decide em relação à produção e aos preços afeta o resultado das
outras. Por exemplo, se a empresa A de transporte aéreo lançar promoções nos preços das suas
passagens, ela estará conquistando passageiros da empresa B. De modo a reagir à estratégia da
concorrente, a empresa B, possivelmente, lançará promoções semelhantes para não perder a sua
fatia de mercado. A concorrência entre os participantes do oligopólio é, portanto, benéfica para o
consumidor, pois gera quedas nos preços ou pode melhorar o produto ou serviço.
A concorrência, no entanto, nem sempre acontece. As empresas que formam o oligopólio
podem agir em conluio, formando um cartel. Nesse caso, essas empresas tomam a decisão de
ofertar uma quantidade em bloco, como se fossem um monopolista, combinando quanto cada
uma irá produzir. Essa situação é prejudicial ao consumidor e, por isso, a formação de cartel é
ilegal na maioria dos países, inclusive no Brasil.
A Teoria dos Jogos trata de situações nas quais a ação de cada agente envolvido afeta os
ganhos ou as perdas obtidas por ele e por todos os demais. No entanto, o seu uso não se limita à
análise da interação entre empresas. Por meio dessa teoria, é possível analisar outras situações,
como a interação entre as equipes de uma mesma empresa, entre negociadores de um contrato,
entre o conselho de administração e a diretoria executiva em uma sociedade anônima, entre países
que discutem a diminuição de barreiras alfandegárias, limitações no desenvolvimento de armas
nucleares, acordos de redução da emissão de gases para atenuar o efeito estufa, e assim por diante.
Para melhor entendermos os oligopólios usando a Teoria dos Jogos, consideraremos,
inicialmente, uma situação imaginária clássica, conhecida como “dilema dos prisioneiros”.
Suponhamos que duas pessoas tenham sido presas (prisioneiro A e prisioneiro B) e acusadas de
terem cometido um crime juntas. Cada uma é colocada em uma cela própria e precisa decidir se
confessa ou não o crime sem saber se o outro prisioneiro confessou ou vai confessar. As penas
aplicadas são as seguintes:
40
caso ambos os suspeitos confessem o crime, serão condenados a uma pena de três anos
de prisão cada um;
caso um confesse e o outro não, aquele que confessou será libertado imediatamente
como prêmio e incentivo às confissões. O suspeito que não confessou será punido com
cinco anos de detenção e
caso nenhum dos dois confesse, eles permanecerão apenas um ano na prisão, durante as
investigações, pois, sem confissões, as provas para condená-los a uma pena maior são
insuficientes.
prisioneiro B
A tabela apresentada nos mostra que, para os dois prisioneiros, a cooperação é a opção que
trará o melhor resultado. Se nenhum deles confessar, ambos receberão a menor pena: um ano de
prisão para cada um. A pena total dos dois seria de dois anos, menor que em qualquer outra
opção. No entanto, nenhum deles pode ter certeza absoluta daquilo que o outro vai fazer (mesmo
que tenham combinado, mutuamente, não confessar antes de entrar nas suas celas separadas).
Além disso, individualmente, ser o único a não confessar levará um dos prisioneiros à pior opção:
ficar cinco anos na prisão. Dessa forma, se nenhum prisioneiro tem certeza do que o outro vai
fazer, um deles pode preferir confessar, usando a chamada estratégia dominante.
Imagine o prisioneiro A, sozinho na sua cela, decidindo se confessa ou não. Ele sabe que o
resultado final depende do que ele e o prisioneiro B decidirem. Suponha que ele raciocine do
seguinte modo: “Não tenho certeza do que B fará. Mas, se ele confessar, o melhor para mim será
41
confessar também, pois fico três anos preso, em vez dos cinco anos, se eu não confessar. E se ele
não confessar? O melhor para mim também será confessar, pois serei libertado imediatamente, em
vez de ficar preso um ano, o que ocorreria se eu não confessasse.”
Considerando esses possíveis comportamentos de B, seria então melhor para A confessar.
Como a tabela é simétrica, o mesmo raciocínio, com os mesmos resultados, pode ser realizado
para o prisioneiro B. Confessar é, portanto, uma estratégia dominante para cada jogador
individualmente, e é o que pode acabar acontecendo. Dessa forma, apesar de a cooperação ser
melhor para os prisioneiros, como não há garantias, as ações individuais independentes levam a
um resultado pior para ambos.
Para utilizarmos o dilema dos prisioneiros na análise dos oligopólios, imagine um mercado
no qual existam apenas duas empresas, A e B, produzindo um bem padronizado. Elas devem
decidir a quantidade a ser produzida. Suponha também que essas empresas possam escolher
apenas entre dois níveis de produção: 1 e 2, ou seja, cada uma tem duas estratégias possíveis. Os
resultados, em termos de lucros, estão resumidos na tabela a seguir.
empresa B
nível 1 nível 2
42
O mesmo raciocínio vale para a empresa B, por simetria. Dessa forma, a estratégia de produzir
no nível 1, não cumprindo o combinado, é uma estratégia dominante para ambas as empresas.
O pior dos mundos para um participante de cartel seria ver-se como o único a fazer o
combinado. Notemos que, se A não cumprir o combinado e B cumprir, A obtém o melhor
resultado, R$ 13 milhões, e B lucra somente R$ 6 milhões. A tendência desse jogo é,
portanto, a de que ambas as empresas quebrem o acordo e produzam no maior nível, obtendo
o resultado de R$ 9 milhões cada. Esse não é o melhor resultado para a dupla, mas é,
certamente, bom para o consumidor.
Apesar dessa dificuldade de cooperação entre as empresas que operam na estrutura de
oligopólio, ainda se formam cartéis bem-sucedidos em diversos setores da economia. Isso
acontece, possivelmente, porque as empresas conseguem verificar o cumprimento dos acordos
feitos ou porque esses acordos são de longo prazo. Um dos motivos para a cooperação prevalecer é
que um oligopolista, geralmente, permanece no mercado muitos anos. Isso significa que o jogo
vai repetir-se várias vezes, e cada empresa sabe que pode esperar retaliação das outras, sofrendo
prejuízos se não cumprir o combinado. Desse modo, a melhor estratégia passa a ser a de
cooperação. Em alguns casos, pode existir uma organização que zele pelo cartel e aplique uma
punição à empresa que não cooperar, como no clássico caso do cartel de postos de gasolina em
algumas cidades.
43
Após o recebimento dos pareceres da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e a análise
de concorrentes e clientes, com fundamento na Lei 8.884/94 e no Guia para Análise Econômica
de Atos de Concentração, o Cade concluiu que essa fusão geraria uma grande concentração no
mercado relevante de chocolates de consumo imediato, caixas de bombons e ovos de páscoa, bem
como geraria um monopólio no mercado de coberturas de chocolate líquidas, pois somente a
Nestlé e a Garoto oferecem esse produto no mercado. Isso poderia ocasionar um aumento no
preço dos produtos, não dando opção ao consumidor.
Na análise feita pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, foi elaborado um quadro
comparativo para mostrar que esse ato geraria uma grande barreira às empresas que pretendessem
entrar nesse mercado, bem como àquelas que já se encontram nele, como a Lacta, pois seria
impossível concorrer com a Nestlé. Além disso, a fusão também geraria um impacto social
negativo, pois levaria ao risco de fechamento da fábrica da Garoto em Vila Velha (ES), o que
causaria o desemprego de muitas pessoas.
Nova economia
Atualmente, os meios de comunicação estão repletos de histórias sobre a nova economia.
Novas tecnologias estão modificando tudo: podemos adquirir grande parte do que consumimos
pela internet, a pesquisa de preços pode ser feita em qualquer lugar do planeta e de modo
instantâneo, os nossos meios de comunicação foram totalmente modificados, as campanhas
eleitorais utilizam, fortemente, as redes sociais; tudo isso por conta da revolução da informática,
que está transformando a vida dos cidadãos em todo o planeta.
Em 1999, foram incluídos no índice da bolsa de valores americana Dow Jones a Microsoft
(produtora do sistema operacional Windows para computadores) e a Intel (grande produtora de
microprocessadores para computadores). Em 2018, o valor de mercado da Amazon ultrapassou
um trilhão de dólares.
As inovações tecnológicas estão mudando não só os hábitos dos consumidores mas também
o funcionamento das empresas. Agora, as linhas de montagem são apoiadas por robôs controlados
por computadores. Além disso, a relação das pessoas com as empresas está evoluindo, o que gera
mais competição nos mercados.
Considerando esse contexto, será que as teorias econômicas desenvolvidas a partir de Adam
Smith, em 1776, quando a industrialização ainda estava engatinhando e a economia da maioria
dos países ainda era baseada na agricultura, conseguem dar conta da transformação que estamos
vivenciando? Segundo os economistas Carl Shapiro e Hal Varian, da Universidade da Califórnia,
sim. Na segunda página do livro Information rules (2003), os autores afirmam que, apesar de a
tecnologia mudar, as leis econômicas não mudam. Em outras palavras, as ideias básicas que
estudamos na teoria econômica continuam a lançar luz ao entendimento dos novos mercados.
44
Schumpeter e a destruição criativa
A competição em mercados em que inovação é importante pode não atingir o ideal da
concorrência perfeita que discutimos anteriormente, mas ainda assim é intensa. Nesse caso, a
concorrência se concentra tanto em introduzir novos produtos quanto em vender produtos
antigos a preço mais baixos. Esse tipo de concorrência é, muitas vezes, chamado de competição
Schumpeteriana, em referência ao grande economista Joseph Schumpeter.
Schumpeter começou a sua carreira na primavera de 1919, na Áustria, como ministro das
finanças do Império Austro Húngaro, e terminou como professor emérito de Economia da
Universidade de Harvard. A sua visão da economia era nitidamente diferente daquela presente no
modelo de equilíbrio em concorrência perfeita. O economista questionava a própria noção de
equilíbrio, pois, para ele, a economia sempre estará em movimento, e o papel do economista é
entender as forças que impulsionam esse movimento.
Segundo Schumpeter, a economia se caracteriza por um processo de destruição criadora. Isso
quer dizer que uma empresa inovadora pode, por meio do seu novo produto ou de custos de
produção mais baixos, adquirir uma posição dominante no mercado. No entanto, eventualmente,
tal produção dominante será destruída por uma nova empresa inovadora, que tomará o seu lugar. A
preocupação de Schumpeter era a de que as corporações gigantescas que estavam surgindo
sufocassem a inovação criadora e acabassem com o processo de destruição criativa. Até agora,
felizmente, os seus temores foram infundados. Na verdade, muitas dessas firmas gigantescas, como a
IBM, conseguiram gerenciar o processo inovador de modo a acompanhar os demais novatos.
Economistas schumpeterianos de hoje voltam-se, com frequência, para a Biologia ao
buscarem compreender o processo de mudança, descrevendo-o como evolucionário: algo lento e
com muitos elementos aleatórios. Nesse processo, sobressaem-se as firmas mais aptas e que, por
sorte ou habilidade, conseguem descobrir novos produtos ou novos modos de fazer negócios em
dado ambiente melhores que os dos rivais. Essas firmas difundem as suas práticas às outras firmas.
Revoluções industriais
Primeira Revolução Industrial
A Inglaterra foi o primeiro país a deixar de ser uma economia primordialmente agrícola e
foi palco da Primeira Revolução Industrial ocorrida durante o século XVIII e o início do século
XIX. A cidade de Manchester é o símbolo dessa Primeira Revolução Industrial, pois foi lá que os
45
teares manuais foram substituídos pelos primeiros teares mecânicos. Nessa esteira, surgem as
indústrias do aço, as primeiras ferrovias e os barcos a vapor que facilitam a formação e a conexão
de mercados. O carvão é a principal fonte de energia dessa época.
A maior produtividade dos teares mecânicos assustou os trabalhadores que vislumbraram o
encolhimento do seu mercado de trabalho. A palavra sabotagem vem de sabot que, em francês,
significa tamanco. Os trabalhadores colocavam os seus tamancos entre as peças das novas
máquinas visando destruí-las com a finalidade de preservarem os seus empregos. Atualmente,
sabemos que a maior produtividade dos teares mecânicos criou mais riqueza, mais renda, mais
mercados e a expansão de outros mercados de trabalho.
Essa revolução, iniciada na Inglaterra, algumas décadas depois aconteceu na Europa
continental e também nos Estados Unidos da América.
46
foi desenvolvido na fábrica de automóveis Toyota, no Japão, e utiliza a flexibilidade do
trabalhador, não a especialização. A produção torna-se mais horizontalizada diferente da
verticalização característica da Era Fordiana.
O desenvolvimento das telecomunicações e da internet permitiu que trabalhos sejam feitos
a distância, possibilitando que diferentes equipes em diferentes lugares cooperem para a produção.
O computador é facilmente reprogramável por um novo software que atualiza o meio de
produção. Essa nova tecnologia permite uma maior integração da produção em diversos países,
acelerando o que denominamos de globalização. A tecnologia da informação confere mais poder
ao consumidor, que consegue fazer pesquisa de preços instantaneamente com o seu celular. As
compras pela internet revolucionaram o varejo.
Valeria Perasso
[...]
“A Quarta Revolução Industrial não é definida por um conjunto de tecnologias emergentes, mas
pela transição em direção a novos sistemas que foram construídos sobre a infraestrutura da
revolução digital (anterior)", diz Schwab, diretor executivo do Fórum Econômico Mundial e um
dos principais entusiastas da "revolução".
"Há três razões pelas quais as transformações atuais não representam uma extensão da
terceira revolução industrial, mas a chegada de uma diferente: a velocidade, o alcance e o
impacto nos sistemas. A velocidade dos avanços atuais não tem precedentes na história e está
interferindo quase todas as indústrias de todos os países", diz o Fórum.
47
A automatização acontece através de sistemas ciberfísicos, que foram possíveis graças à
internet das coisas e à computação na nuvem.
Os sistemas ciberfísicos, que combinam máquinas com processos digitais, são capazes de
tomar decisões descentralizadas e de cooperar - entre eles e com humanos - mediante a
internet das coisas
O que vem por aí, dizem os teóricos, é uma "fábrica inteligente". Verdadeiramente inteligente.
O princípio básico é que as empresas poderão criar redes inteligentes que poderão controlar a
si mesmas.
Mas esses também serão os causadores da parte mais controversa da quarta revolução: ela
pode acabar com cinco milhões de vagas de trabalho nos 15 países mais industrializados do
mundo.
[...]
Fonte: PERASSO, Valeria. O que é a 4ª Revolução Industrial – e como ela deve afetar nossas vidas. BBC Brasil, 22 out. 2016.
Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/geral-37658309>. Acesso em: jan. 2019.
48
MÓDULO IV – MACROMERCADOS,
CONTROLE DA INFLAÇÃO E PIB
Macromercados
A macroeconomia estuda a economia como um todo. Apesar de não estarmos focando um
mercado específico, continuaremos a lidar com a demanda, a oferta e a formação de preços, agora
nos três macromercados de uma economia:
o macromercado de bens e serviços;
o macromercado de moeda e
o macromercado de câmbio.
Como em qualquer mercado, cada um desses tem os seus compradores (demanda), os seus
vendedores (oferta) e a formação do preço.
O padrão de atuação do governo em cada um desses macromercados é denominado,
respectivamente, política fiscal, monetária e cambial, e o conjunto dessas políticas forma o tripé
macroeconômico do País.
Macromercados de bens e serviços
Os bens e serviços demandados e ofertados em uma economia são considerados produtos.
Os compradores (demandantes) de bens e serviços de uma economia são: as famílias, as
empresas, o governo (municipais, estaduais e federal) e o resto do mundo (quando há exportações
de bens e serviços). O conjunto da demanda desses agentes econômicos é denominado demanda
agregada por bens e serviços.
Já os vendedores (ofertantes) de bens e serviços de uma economia são: as empresas, o
governo e o resto de mundo (quando há importações de bens e serviços). O conjunto da oferta
desses agentes econômicos é denominado oferta agregada de bens e serviços.
Vimos, nos módulos sobre microeconomia, que, quando a demanda supera a oferta em um
dado mercado, o preço é ajustado para cima, de modo a equilibrar a quantidade ofertada e
demandada. Se o contrário acontece, ou seja, a oferta supera a demanda, o preço é ajustado para
baixo, sempre buscando o equilíbrio.
Em um macromercado de bens e serviços, quando a demanda agregada supera a oferta
agregada de bens e serviços, os preços sobem, e isso se reflete nos índices de inflação.
O governo está presente tanto do lado da demanda quanto do lado da oferta agregada e
pode atuar aumentando ou contraindo os seus gastos, ou mesmo cortando impostos para
incentivar o consumo das famílias. Como exemplo dessa atuação, podemos citar o corte do IPI
(imposto sobre produtos industrializados) sobre carros e eletrônicos que ocorreu em 2008, após
uma forte contração da demanda das famílias, como resposta à crise mundial deflagrada pela
falência do então terceiro maior banco de investimentos dos Estados Unidos, o Lehman Brothers.
Macromercado de moeda
Em uma economia, atuam os agentes econômicos que ofertam e demandam moeda.
Quando pensamos nos ofertantes de moeda em uma economia, é comum nos lembrarmos
dos bancos. No entanto, os bancos atuam, principalmente, como intermediários. Os principais
ofertantes de moeda em uma economia são, na verdade, as famílias que poupam. É importante
salientar que, quando mencionamos a poupança das famílias não estamo-nos referindo à
caderneta de poupança. A poupança de uma família é o que resta da sua renda após os gastos com
consumo e pagamentos de impostos. Ao aplicar esse dinheiro no mercado financeiro, seja
comprando um certificado de depósito bancário (CDB) de um banco ou um título público,
50
aplicando em um fundo de investimentos ou mesmo na caderneta de poupança, essa família está
ofertando moeda. Se agregarmos o que todas as famílias que possuem poupança aplicam, temos a
oferta de moeda das famílias.
Assim como as famílias, as empresas que estão com dinheiro em caixa acima da sua
necessidade de capital de giro também aplicam esse excesso no mercado financeiro, ofertando
moeda. O governo também oferta moeda por meio, por exemplo, dos empréstimos concedidos
pelo BNDES ou dos financiamentos do programa Minha Casa, Minha Vida, concedidos pela
Caixa Econômica Federal. Os poupadores do exterior também podem ingressar com capital no
País, ofertando moeda no mercado financeiro interno.
Já as famílias que recorrem ao mercado financeiro buscando crédito para financiar o seu
consumo ou mesmo o investimento em uma casa ou apartamento são demandantes de moeda. As
empresas também buscam financiamento para os seus projetos no mercado financeiro ou em
bancos. O governo, geralmente, gasta mais do que arrecada e busca suprir esse déficit de receita
pedindo emprestado por meio do lançamento de títulos da dívida pública no mercado financeiro.
Os juros pagos ou recebidos são o preço desse mercado de moeda e formam-se nas diversas
modalidades de financiamento em uma economia. O governo, por meio da atuação do Banco
Central (Bacen), interfere nesse mercado definindo a taxa básica de juros do País (Selic) nas
reuniões periódicas do Comitê de Política Monetária (Copom).
Macromercado de câmbio
No Brasil, o mercado de câmbio é o ambiente em que se realizam as operações de câmbio
entre os agentes autorizados pelo Banco Central e entre estes e os seus clientes. O mercado de
câmbio é regulamentado e fiscalizado pelo Banco Central e compreende as operações de compra e
venda de moeda estrangeira, tendo como referência o dólar americano. A cotação do dólar é
determinada pelo equilíbrio da quantidade transacionada pelos ofertantes e demandantes.
Os principais ofertantes do macromercado de câmbio são os agentes econômicos que
trazem dólares para o País. Por exemplo:
empresas brasileiras exportadoras que recebem em dólar o valor das exportações;
investidores residentes no exterior que ingressam com capital para aplicar no mercado
financeiro brasileiro;
empresas que ingressam com capital para montar ou comprar uma empresa no Brasil
(esse tipo de ingresso é denominado investimento direto);
empresas brasileiras que captam empréstimos no exterior;
residentes no exterior pagando pacotes turísticos no Brasil e
especuladores que vendem dólares apostando em uma queda da cotação.
51
Já os principais demandantes são os agentes econômicos que saem com dólares, como:
importadores que compram dólares para quitar as suas dívidas no exterior;
investidores residentes no exterior que estão com capital aplicado no mercado financeiro
do País e decidem retornar com esse capital para o exterior;
empresas multinacionais que remetem lucro para o exterior;
empresas brasileiras pagando principal e juros devidos ao exterior;
residentes no país pagando viagens internacionais e pacotes turísticos no exterior e
especuladores que compram dólares apostando em uma alta da cotação.
O preço que se forma nesse mercado é a cotação do dólar. Como em outros mercados, o
preço será aquele que equilibra a quantidade ofertada e a quantidade demandada de dólares. O
Banco Central pode atuar nesse mercado comprando ou vendendo dólares e, consequentemente,
interferindo no valor da moeda.
As três políticas que formam o tripé macroeconômico serão o objeto do nosso estudo de
macroeconomia e, como observaremos, a atuação do governo em cada um desses mercados tem
consequências nos outros dois.
52
igual. Em um período em que os alimentos são os bens que mais sobem de preço, as classes D e E
sentem uma inflação maior que as classes A e B, pois os alimentos têm um peso maior na cesta
consumida por pessoas com menor renda. Quando serviços sofrem uma maior variação de preços,
acontece o contrário. Serviços estão muito mais presentes nas classes A e B e representam um peso
maior na cesta consumida por essas classes.
ano de início da
área geográfica
faixa de renda
data de coleta
componentes
em salários-
responsável
divulgação
míni mos
data de
índice
série
IPCA-15 dia 15 até dia 25 2000
1 a 40 SM 11 Regiões
IBGE IPCA não há
Metropolitanas dia 30 até dia 15 1979
INPC 1 a 6 SM
IPA-10
IGP-10 IPC-10 dia 10 até dia 20 1994
O IPC da FGV é
INCC-10
calculado em 12
Fipe-
IPC-Fipe não há 1 a 20 SM cidade de São Paulo dia 30 até dia 10 1939
USP
53
A Fundação Getulio Vargas (FGV) é um dos órgãos mais tradicionais do Brasil no
levantamento de toda uma série de indicadores econômicos. Ela é responsável pelo cálculo dos
Índices Gerais de Preços (IGPs). O mais antigo deles é o Índice Geral de Preços –
Disponibilidade Interna (IGP-DI), cuja série surgiu em 1944 como parte dos esforços do governo
brasileiro para gerar indicadores com base em metodologias padronizadas internacionalmente. Por
seguir normas internacionais, IGP-DI brasileiro pode ser comparado aos IGPs de outros países.
Esse índice é encontrado a partir da média ponderada de outros três:
o Índice de Preços no Atacado (IPA), com ponderação de 60%;
o Índice de Preços ao Consumidor – Brasil (IPC-Br), com 30% de peso e
o Índice Nacional de Custos da Construção (INCC), com 10% de peso.
54
tempo, o congelamento mostrou-se insustentável, pois houve desabastecimento em diversos
setores da economia. Quando o congelamento foi cancelado, a inflação voltou ainda mais forte do
que antes.
Entre 1986 e 1994, houve diversas tentativas de domar a inflação, como o Plano Collor,
que, em 1990, bloqueou a maior parte do dinheiro da população depositada nos bancos. Como
podemos observar no gráfico a seguir, cada plano funcionava por um curto período e, quando
falhava, a inflação reaparecia com mais força. Em julho de 1994, finalmente, o Plano Real
conseguiu trazer a inflação para padrões bem menores.
Plano Real
Em julho de 1994, o Governo Itamar Franco, tendo Fernando Henrique Cardoso como
Ministro da Fazenda, fez uma nova tentativa de controlar a hiperinflação, dessa vez com sucesso.
O Plano Real, diferentemente dos planos que o precederam e falharam, não tentou congelar
preços ou segurar o dinheiro da população. Ele agiu na origem do problema.
Invariavelmente, se formos procurar a origem de um processo hiperinflacionário,
encontraremos um governo que gasta muito mais do que arrecada e, para cobrir essa diferença,
emite moeda. A hiperinflação faz a moeda não valer nada. E o que não vale nada? O que existe em
demasia. Se, em determinado ano, acontecer uma supersafra de maçã, o preço dessa fruta
despencará devido ao excesso de oferta. Da mesma forma, se houver excesso de moeda em
circulação, esta não valerá muito, e o poder aquisitivo será corroído pela inflação descontrolada. A
origem da hiperinflação alemã pós-Primeira Guerra, mencionada anteriormente, foi justamente a
emissão desenfreada de moeda para financiamento da guerra e do pós-guerra.
55
Em 1993, ano que precedeu o Plano Real, o governo aumentou os impostos e a
arrecadação, e vendeu estatais para não necessitar mais emitir dinheiro para financiar-se. Isso não
ocorreu nos planos anteriores, que, invariavelmente, voltavam à emissão desenfreada e,
consequentemente, à inflação.
Outro fator importante do Plano Real foi a utilização do que chamamos de âncora cambial
para a inflação. O real nasceu no dia 1º de julho de 1994, valendo US$ 1,00, e o governo, por
meio do Banco Central, comprometia-se a manter esse valor fixo.
O câmbio fixo auxilia no controle da inflação porque todos os preços cotados em dólar,
como insumos, produtos finais ou mesmo commodities – que são cotadas em dólares, como soja –,
terão os seus preços estáveis em moeda nacional (no caso brasileiro, em reais). Se um
supermercado importar uma manteiga dinamarquesa por US$ 4,00, e a cotação do dólar ficar fixa
em R$ 1,00, o preço da manteiga ficará estacionado em R$ 4,00.
Para manter a cotação fixa, o Banco Central do Brasil necessitava ter reservas razoáveis de
dólares. Qualquer movimento dos investidores ou agentes econômicos em geral, buscando
comprar dólares, exigia que a autoridade monetária (Banco Central) vendesse dólares para
equilibrar o mercado e não permitir o aumento da cotação, o que traria mais inflação via aumento
dos preços dos importados ou cotados em dólar.
No início de 1999, depois de muitas crises externas e internas que enfraqueceram as
reservas de dólares brasileiras, o Banco Central desistiu de manter a cotação da moeda americana e
parou de vender dólares. A cotação do dólar dobrou rapidamente, pressionando a inflação via
aumento dos importados, bens e serviços cotados na moeda americana. O Brasil precisava de uma
nova ferramenta para o controle do aumento dos preços e foi então implementado o regime de
metas de inflação.
56
comunicação da estratégia de atuação do Banco Central de forma transparente e clara ao
público e
uso dos mecanismos que tornam as autoridades monetárias (Banco Central) responsáveis
pelo cumprimento das metas de inflação.
Como podemos observar, o regime de metas de inflação é mais do que o anúncio público das
metas, envolvendo também transparência de atuação e prestação de contas regulares à sociedade.
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Dentro do conjunto de índices de preços ao consumidor, o IPCA foi escolhido por ser o de
maior abrangência: ele mede a inflação para domicílios com renda entre um a 40 salários-
mínimos em 13 cidades ou regiões metropolitanas.
A meta definida para a inflação medida pelo índice escolhido pode ser pontual ou utilizar
um intervalo. No caso de a meta ser definida por um intervalo ou banda, existe ainda a alternativa
de haver ou não a meta central. No Brasil, foi escolhida a modalidade que utiliza uma meta
central dentro de uma banda de tolerância. Por exemplo, em 2014, a meta era de 4,5% de
inflação, com um intervalo de tolerância de 2% para cima (6,5%) e para baixo (2,5%).
Os motivos que justificam a existência desse intervalo de tolerância são os seguintes:
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O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) estabelece, em reuniões pré-
agendadas que acontecem de seis em seis semanas, a meta para a taxa Selic. O Banco Central, se
necessário, intervém no mercado interbancário, para manter a taxa Selic diária próxima à meta.
A taxa básica de juros-Selic atua na inflação, e os principais mecanismos para isso são a
atuação:
na demanda agregada, com ênfase no consumo das famílias e em investimentos que
respondam ao custo dos créditos e financiamentos;
na taxa de câmbio, já que a entrada de capital do exterior responde ao diferencial da taxa
de juros interna e externa (o valor do dólar, por sua vez, atua sobre a inflação) e
sobre as expectativas dos agentes econômicos. Por exemplo, ao elevar a taxa de juros de
curto prazo para evitar o surgimento da inflação, o Banco Central pode restabelecer a
confiança no desempenho futuro da economia. A queda da taxa de juros durante uma
recessão pode significar que tempos melhores virão, estimulando o consumo da
população.
Quando a meta não é cumprida, o que, no caso brasileiro, significa a inflação ficar fora do
intervalo de confiança, o presidente do Banco Central publica uma carta aberta, no seu site,
dirigida ao Ministro da Fazenda, que preside o Conselho Monetário. Nessa carta, são explicitadas
as razões para o descumprimento da meta e as providências tomadas para o retorno à trajetória
que leva à meta. No Brasil, desde 1999, cartas foram escritas em 2001, 2002, 2003 e 2015, anos
em que o limite superior de tolerância foi rompido.
Em 2017, pela primeira vez desde que o Brasil adotou o regime de metas de inflação, o
IPCA registrou uma inflação abaixo do limite inferior de tolerância definido pelo Conselho
Monetário. Nesse ano, uma carta foi publicada no site do Banco Central dando as devidas
explicações à sociedade.
59
percepção da necessidade de autonomia do Banco Central nos governos Fernando Henrique
Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva foi bastante consistente. Durante o Governo Dilma Rousseff,
no entanto, a percepção de autonomia do Banco Central foi debilitada, gerando consequências
nos resultados da inflação, principalmente entre 2012 e 2015. Durante esse período, podemos
dizer que as expectativas dos agentes econômicos quanto à inflação foram desancoradas da meta
anunciada. Isso quer dizer que a meta tornou-se menos crível.
No gráfico a seguir, mostramos a evolução da inflação medida pelo IPCA e a Selic entre
2000 e 2015.
60
O PIB é o valor monetário total de todos os bens e serviços
finais produzidos dentro das fronteiras nacionais durante
certo período – geralmente, um ano.
61
operações de mineração de níquel no Canadá. O valor da produção de níquel é contabilizado no
valor do PIB do Canadá.
Uma parcela de lucro da operação dessas multinacionais fora dos seus países de origem pode
ser enviada aos seus acionistas. A BMW pode então enviar o lucro da operação realizada no Brasil
para a Alemanha, e a Vale pode enviar o lucro resultante da operação no Canadá para o Brasil.
Nesse caso, a BMW estaria enviando um pouquinho do valor do PIB brasileiro para a Alemanha,
e a Vale estaria enviando um pouquinho do valor do PIB canadense para o Brasil.
O produto nacional bruto (PNB) leva em conta tanto a renda que foi enviada ao exterior
quanto a que foi recebida do exterior no período:
62
MÓDULO V – CRESCIMENTO ECONÔMICO,
PRODUTIVIDADE E SUSTENTABILIDADE DAS
CONTAS PÚBLICAS
Tudo isso não invalida, no entanto, o fato de que, em qualquer transação e qualquer que
seja o comprador ou vendedor de bens e serviços, um deles paga e o outro recebe. Podemos
afirmar então que, na economia como um todo, despesa e renda são sempre iguais.
O PIB de uma economia pode ser calculado sob a ótica da despesa ou da renda. Neste
conteúdo, para estudarmos o crescimento da economia, o PIB pela ótica da despesa será
especialmente importante.
64
PIB pela ótica da despesa
Consideraremos, agora, uma economia completa (com famílias, empresas e governo) que
transaciona com o resto do mundo. Quais são os elementos responsáveis pela compra de bens e
serviços nessa economia? Vejamos:
a) O consumo das famílias *-+:
As famílias adquirem bens e serviços para o seu consumo.
Pela ótica da despesa, o PIB é, portanto, calculado por meio da seguinte fórmula:
.6 = - % . /01 % .2 1 % 3 % 4 ( 5
Uma parte dos bens e serviços que uma economia produz é demandada pelo exterior, assim
como parte do que é adquirido dentro de uma economia é ofertada pelo exterior. Se uma família
adquire um carro produzido no Brasil por R$ 60.000,00, esse valor aparecerá no item -
(consumo das famílias). Vamos supor que R$ 20.000,00 do preço desse carro seja de peças
importadas. Essa parte do valor do carro não foi produzida em território nacional e, portanto, não
faz parte do PIB do Brasil. Esses R$ 20.000,00 aparecerão então no item 5, que representa as
importações, e serão subtraídos da equação.
65
Produtividade e crescimento de longo prazo
Se compararmos o padrão de vida médio de um cidadão americano no final século XIX e de
um cidadão atual, encontraremos diferenças marcantes. Em 1900, por exemplo, a expectativa de
vida e o consumo médio do cidadão eram bem inferiores aos atuais. Muito bens e serviços
disponíveis atualmente, como celulares, computadores e internet, simplesmente não existiam.
Essa melhora de vida é consequência do crescimento econômico, ou seja, vivemos melhor porque
conseguimos produzir mais bens e serviços que nos proporcionam padrões de vida superiores e
mais conforto. O crescimento econômico deriva de um aumento de estoque de capital na
economia (máquinas e instalações), do aumento da força de trabalho e de inovações tecnológicas
que modificam e tornam mais eficientes o modo como produzimos bem e serviços.
A taxa de crescimento do produto total de uma economia é a soma de dois fatores: taxa de
aumento das horas trabalhadas e a taxa de aumento do produto por hora trabalhada.
O aumento do número de horas trabalhadas é o resultado do aumento da força de trabalho,
seja por um aumento da taxa de natalidade, por imigração ou por um aumento da jornada de
trabalho média (horas de trabalho por dia). O aumento do produto por hora de trabalho, que
chamamos de produtividade, é o mapa do tesouro para o aumento do padrão de vida.
b) Capital humano:
Trabalhadores produzirão mais por hora trabalhada quando possuírem mais conhecimentos
e habilidades adquiridos por meio do ensino, do treinamento e da experiência.
c) Recursos naturais:
Insumos fornecidos pela natureza como terra fértil, água e jazidas minerais. Esses recursos
podem ser renováveis, como uma floresta, ou não renováveis, como uma jazida de minério de
ferro.
66
d) Conhecimentos tecnológicos:
Melhores e mais eficientes formas de produzir bem e serviços. Um exemplo de como a
tecnologia afeta a produtividade seria a enorme revolução que as inovações desenvolvidas pela
Embrapa produziram no setor agrícola brasileiro nas décadas recentes.
Poupança e investimento
O crescimento de longo prazo de uma economia depende do aumento da produtividade.
Para que ocorra o aumento da produtividade, são necessários investimentos em:
capital físico;
capital humano e
inovações tecnológicas.
67
a médica estaria emprestando dinheiro ao banco, que poderia, por sua vez, utilizar esse dinheiro
para financiar o investimento de uma empresa.
O mercado financeiro, com as suas diversas modalidades, faz o meio-campo entre
poupadores e investidores em uma economia. É um mercado em que o produto que está sendo
negociado é a moeda, os ofertantes são os poupadores na economia e os demandantes são os que
buscam crédito ou financiamento para investimentos em capacidade produtiva. Nesse mercado, o
preço que se forma são os juros, cobrados em todas as modalidades de financiamento.
Via de regra, os governos gastam mais do arrecadam e necessitam financiar esse déficit,
denominado déficit fiscal. Para isso, lançam no mercado financeiro os títulos da dívida pública.
A médica do nosso exemplo anterior pode comprar títulos públicos com a sua poupança,
tornando-se credora do governo. No entanto, se ela decidir pelos títulos públicos, a sua
poupança não estará mais disponível para financiar empresas do setor privado. Isso quer dizer
que o governo está, constantemente, disputando a poupança disponível com o setor privado e
ele tem uma vantagem nessa disputa: é comum a percepção de que financiar o governo é mais
seguro que financiar uma empresa.
Se o governo tiver uma necessidade de financiamento do seu déficit que consuma a maior
parte da poupança disponível, restará bem menos volume de recursos para financiar as empresas.
Essa escassez de capital se refletirá em juros mais altos para o setor privado, que investirá pouco.
Isso prejudicará o crescimento de longo prazo do país, principalmente se o déficit do governo
tiver como origem gastos de custeio, e não investimentos.
Quando o governo impede o investimento do setor privado, consumindo a maior parte da
poupança disponível, diz-se que ele está expulsando o setor privado. O termo usado para
expressão essa situação é crowding out (expulsando, em inglês).
68
Política fiscal e sustentabilidade das contas públicas
Como vimos, quando o governo gasta mais do que arrecada, ele necessita financiar essa
diferença, denominada déficit fiscal. Uma maneira perversa de o governo financiar o seu déficit é
por meio da emissão de moeda. O Banco Central emite moeda para financiar o governo e, nessa
situação, dizemos que ele é fiscalmente dominado. Esse fato fará com que haja mais dinheiro em
circulação e, portanto, a demanda agregada se elevará continuamente, causando um aumento no
nível de preços (inflação).
O outro modo de o governo financiar seu déficit é pedir emprestado por meio da venda de
títulos públicos no mercado financeiro. Se o governo brasileiro lançar títulos no mercado
mundial, em moeda estrangeira (principalmente, dólares), ele captará dólares e ficará devendo em
dólares. Esses títulos fazem parte da dívida externa do País. Existe também a possibilidade de
lançamento de títulos em reais. Nesse caso, o governo captará reais e ficará devendo em reais.
Esses títulos compõem a dívida interna do País.
Normalmente, os governos têm déficits anuais e ofertam títulos no mercado financeiro para
financiá-los, formando a dívida pública. Geralmente, o estoque de títulos devidos cresce em valor
no tempo. Os investidores externos ou internos que adquirem os títulos públicos estão sempre
atentos à sustentabilidade dessa dívida. Isso quer dizer que os investidores estão atentos à
possibilidade de essa dívida tornar-se impagável e de eles levarem um calote.
í10 8 %
9:;
O principal indicador de solvência da dívida pública é a relação , em que o
numerador é o valor de todos os títulos do país a pagar no futuro, e o denominador é o PIB, que é
o valor da renda produzida pelo país anualmente.
Quando falamos de qualquer conta pública, o que importa não é o seu valor monetário, mas
o quanto ela representa em percentual do PIB. Suponhamos que um indivíduo deva R$ 30.000,00.
Não é possível analisar a sua situação financeira somente com essa informação. Para sabermos se há
o risco de ele não conseguir pagar essa dívida, precisamos saber, por exemplo, qual é a sua renda
mensal. Se a sua renda mensal for de R$ 50.000,00, a dívida será paga facilmente; se, por outro
lado, a sua renda for de R$ 1.500,00 por mês, a chance de tornar-se inadimplente é altíssima.
O crescimento da dívida pública não é o problema. O problema existe quando essa dívida
começa a crescer em um ritmo bem maior que o PIB, entrando no que os economistas chamam
de trajetória explosiva, que pode levar ao calote. Essa trajetória fará com que, cada vez que o país
precise colocar novos títulos no mercado para se financiar, menos investidores (externos e
internos) queiram correr o risco. Isso significa que o país terá de pagar juros mais altos para atrair
capital e também que os seus títulos precisarão ter prazos mais curtos para serem aceitos. Juros
69
mais altos farão a dívida crescer ainda mais, acelerando a deterioração financeira do país, em um
processo que se realimenta.
O pequeno poupador compra títulos públicos, financiando o governo, quando realiza, por
exemplo, aplicações em fundos de renda fixa. O regulamento desses fundos – o qual o poupador,
normalmente, não lê – diz, explicitamente, que a maior parte do dinheiro aplicado ali tem como
destino a compra de títulos públicos, ou seja, será emprestada ao governo. Outro caminho para o
pequeno poupador comprar títulos públicos é o Tesouro Direto. Nesse caso, o cidadão compra
ou vende títulos pela internet, negociando diretamente com o Tesouro Nacional (a instituição
que lida com o dinheiro do Governo Federal ou, simplesmente, o caixa do governo). Dessa
forma, todo pequeno poupador deveria estar bastante interessado na solvência do setor público,
í10 8 %
9:;
isto é, na trajetória da relação , ao longo do tempo.
70
A tabela a seguir mostra as notas de risco concedidas pelas três principais agências. A linha
pontilhada que aparece na tabela separa as notas inferiores, consideradas grau especulativo, das
notas superiores, consideradas grau de investimento.
A+ A1 A+
A- A3 A-
BB Ba2 BB
avaliação bem baixa/cap. especulativo
BB- Ba3 BB-
B+ B1 B+
B- B3 B-
Caa1 CCC+
avaliação extremamente baixa/altamente
Caa2 CCC
especulativo
CCC Caa3 CCC-
CC
Ca mais baixa avaliação/altamente especulativo
C
DDD C D falência
Depois de ter ascendido, em 2008, ao grupo com grau de investimento, o descontrole das
contas públicas brasileiras, ocorrido a partir de 2013, fez com que, em 2015, as três principais
agências rebaixassem a nota do Brasil para a segunda nota mais alta do grupo especulativo.
71
Ao perder o grau de investimento, o país deixa de receber os investimentos dos grandes
fundos de pensão do mundo, cujos estatutos proíbem aplicar em países que não possuem grau de
investimento. A menor oferta de dinheiro obriga então o país a pagar juros mais altos e a
comprometer-se com prazos mais curtos para a quitação dos títulos. O custo mais alto para
financiar a sua dívida deteriora, cada vez mais, a condição financeira do país, em um processo
perverso que se realimenta.
í10 8 %
9:;
O gráfico a seguir mostra a evolução da bruta do País. A deterioração da dívida e as
projeções de piora desse indicador estão no centro da perda de credibilidade e da profunda crise
econômica vivida pelo País a partir de 2014. Os valores dos anos de 2019 e 2020 são projeções
realizadas em 2018.
72
MÓDULO VI – INSTRUMENTOS DE POLÍTICA
MONETÁRIA E SPREAD BANCÁRIO
a) Resultado nominal:
A receita anual do governo (o que ele tem para gastar) é a arrecadação tributária, que
chamaremos de <. As despesas do governo são: os investimentos do governo (.2 1 ), os gastos de
custeio e os gastos financeiros do governo (3), e os juros sobre a dívida pública (=). O resultado
nominal das contas públicas compara a arrecadação com todas as despesas1. Dessa forma, temos:
< ( *.2 1 % 3 % =+
b) Resultado primário:
O resultado primário das contas públicas compara a arrecadação com todas as despesas,
exceto os gastos financeiros (=). Desse modo, temos:
< ( *.2 1 % 3+
1
É importante observarmos que, quando falamos das contas de um país, estamo-nos referindo às contas consolidadas
de todas as esferas governamentais: federal, estadual e municipal.
74
í10 8 %
9:;
aumentou a credibilidade do País, que recebeu o grau de investimentos das principais
agências de risco em 2008.
Em 2014, o Brasil voltou a apresentar déficits primários, e as agências de risco retiraram o
grau de investimento do País, levando à necessidade de medidas de austeridade e reformas para,
novamente, controlar o crescimento explosivo da dívida.
Em 2017, no governo de Michel Temer, foi aprovada a PEC (Proposta de Emenda da
Constituição) do Teto de Gastos, cuja intenção é fazer com que o País volte a apresentar
superávits primários a partir do início da próxima década e retome a credibilidade junto a
investidores.
Para melhor entendermos as consequências do endividamento descontrolado de um país,
veremos, a seguir, o caso da crise grega.
75
bem-estar social. Depois de 1981, o governo levou essa política ao extremo, e a intervenção do
Estado na economia, sem levar em conta a meritocracia, virou regra na economia grega.
O aumento dos gastos em programas de bem-estar social angariava apoio político e votos,
enquanto subsídios a setores escolhidos asseguravam o apoio dos mais poderosos. Qualquer
político que não seguisse essa cartilha, simplesmente não era eleito.
A pergunta que não quer calar é: de onde veio o dinheiro para financiar essa gastança, com
o agravante de que a Grécia tem uma das maiores taxas de evasão de impostos do planeta? A
resposta é: o país recebeu transferências da União Europeia e endividou-se a juros baixos,
principalmente junto aos seus pares da Zona do Euro. Essa política populista e irresponsável
prosseguiu até 2009, quando a crise internacional interrompeu o fluxo de empréstimos baratos
para a Grécia e a realidade chegou: o país estava quebrado. Mais cedo ou mais tarde, a realidade
sempre chega!
Ao contrário de uma família que, quando se endivida, sabe que quem pagará é ela e
programa-se para isso, os políticos no poder pedem emprestado em nome da população (a dívida
pública é da população). Beneficiam-se assim dos votos e do apoio político angariados com os
gastos públicos sabendo que, quando essa dívida tiver de ser paga (ou não puder ser paga, por ser
grande demais, levando à bancarrota do país), eles não estarão mais no governo. O cidadão que
está recebendo os benefícios acha que é o governo quem o paga, sem se dar conta de que o
dinheiro sai do seu bolso (ou do bolso de outro cidadão), por meio dos impostos pagos.
O ponto crítico no caso grego é que o dinheiro tomado emprestado por três décadas foi
usado para financiar o consumo, e não o investimento, a infraestrutura e o desenvolvimento
econômico. Esse subsídio ao consumo dos gregos iludiu a população, que achava que esse bem-
estar, financiado com o dinheiro dos outros, duraria para sempre. A renda média dos gregos
(obtida, principalmente, por transferências do governo) chegou a subir mais que a dos seus pares
da Zona do Euro. No entanto, a dívida grega também subia muito mais rápido. Isso acontecia
porque a renda do povo grego tinha origem, na sua maior parte, em dinheiro emprestado, e não
na produção.
O retrato que emergiu dessas últimas décadas de populismo na economia grega não é
bonito. A Grécia exibe a maior ineficiência, a maior burocratização e o mais alto
intervencionismo estatal da Zona do Euro. Essas características levaram ao aumento intolerável da
corrupção. Tudo isso deságua no maior nível de economia informal da região.
Ensinaram ao cidadão grego a considerar todos os benefícios e transferências recebidas do
governo como seus direitos sociais. O cidadão não se pergunta de onde vem o dinheiro que
financia esses direitos. Em 2012, o governo grego gastava € 10.600,00 por cidadão em benefícios
sociais, mas só tinha receitas de € 8.300,00 por cidadão em impostos, o que significa € 2.300,00
de déficit por pessoa. Esse rombo foi então coberto com o endividamento.
Os funcionários públicos (a Grécia exibe o maior percentual sobre a população de
funcionários públicos da Zona do Euro) receberam aumentos generosos, acima da inflação, de
76
1996 a 2009. Após trabalharem por 35 anos, esses funcionários tinham o direito de aposentar-se
aos 58 anos. Se fossem mulheres, mais cedo ainda. O alemão se aposenta aos 67 anos (funcionário
público ou não), e, atualmente, a Alemanha estuda ampliar essa idade de aposentadoria para 69
anos em 2040.
Apesar dos imensos gastos sociais, o ensino gratuito grego é de péssima qualidade, e as
famílias têm de gastar em ensino privado se quiserem dar uma educação razoável aos filhos. A
mesma coisa ocorre com a saúde.
Com a crise de 2009, no auge da crise internacional, o dinheiro fácil e barato sumiu. Os
gregos se viram falidos, tendo de recorrer ao FMI e à União Europeia para sobreviver. Essa ajuda,
obviamente, veio junto com exigências duras de mudança na condução da economia do país. As
exigências necessárias de cortes nessa abundância de gastos públicos são politicamente muito
difíceis e dolorosas. As aposentadorias já concedidas tiveram de ser reduzidas, e a nova geração
grega está desempregada, pagando pelos excessos dos seus pais e avós.
Moeda
Quando uma pessoa vai a uma loja e compra uma bolsa de couro, ela obtém algo de valor.
Para pagar por esse produto, essa pessoa pode dar ao dono da loja vários pedaços de papel
decorados com símbolos, prédios do governo, retratos de pessoas famosas já falecidas, ou mesmo
animais. A pessoa também pode entregar um pedaço de papel com o nome de um banco e a sua
assinatura, ou, por meio de um cartão de plástico, transferir um número para a conta da loja. O
proprietário da loja fica feliz por receber esses papéis ou números em troca do seu produto. Essa
aceitação vem da confiança de que, futuramente, uma terceira pessoa aceite os papéis ou números
em troca de algo que tem valor para ele.
O uso social da moeda nas transações é extremamente útil em sociedades grandes e
complexas. Imagine, por um instante, que não existisse qualquer item na economia que fosse
aceito amplamente em troca de bens e serviços. Para comprar uma bolsa, a pessoa deveria então
oferecer à loja algo em troca, como uma aula de Matemática. E se o dono da loja não estivesse
interessado em aprender Matemática? Não haveria negócio. Essa seria uma economia que
dependeria do escambo e teria enormes dificuldades para alocar eficientemente os seus recursos
77
escassos. Exatamente pelo fato de o valor do dinheiro estar associado à confiança que as pessoas
têm nele – e não aos valores intrínsecos, como é o caso de metais preciosos como o ouro – é que
se diz que o sistema financeiro é composto de moeda fiduciária (fé).
Funções da moeda
A moeda exerce quatro funções essenciais:
meio de troca;
unidade de conta ou padrão de referência;
reserva de valor e
liquidez.
c) Reserva de valor:
É aquilo que as pessoas podem usar para transferir poder aquisitivo do presente para o
futuro. Quando aceita moeda hoje, em troca de um bem ou serviço, o vendedor pode guardar o
dinheiro e tornar-se comprador de outro bem ou serviço mais adiante.
Obviamente, a moeda não é a única reserva de valor da economia. Uma pessoa também
pode transferir poder aquisitivo do presente para o futuro guardando títulos, ações, objetos de
arte, etc.
d) Liquidez:
É um termo utilizado para descrever a facilidade com que um ativo pode ser convertido no
meio de troca da economia. Como a moeda é o meio de troca da economia, ela é o mais líquido
dos ativos disponíveis. Outros ativos variam amplamente quanto à liquidez. Muitos títulos e ações
podem ser vendidos rapidamente, com pequeno custo, de modo que são ativos relativamente
líquidos. Já a venda de uma casa, um quadro ou uma joia exige mais tempo e esforço.
78
A moeda é o ativo mais líquido, mas é uma reserva de valor
imperfeita.
Quando os preços sobem, o valor da moeda cai. Essa relação entre o nível de preços e o
valor da moeda é importante para entender como a moeda afeta a economia. A inflação
descontrolada destrói o valor da moeda, pois impede que esta cumpra as suas funções.
Durante o período de hiperinflação ocorrido no País, pudemos observar alguns fatos:
qualquer cidadão que guardasse moeda na sua conta-corrente ou carteira corria o risco
de, em pouco tempo, não conseguir comprar mais nada. A moeda perdia, rapidamente,
a capacidade de transferir consumo no tempo (ser reserva de valor);
para se ter noção do que se gastava em uma compra mensal de supermercado, era
necessário “dolarizar” o dispêndio. A moeda nacional se desvalorizava tão rapidamente
que não conseguia mais ser referência de valor (unidade de conta);
a moeda, em geral, perde credibilidade e pode ser rejeitada como meio de troca nos
processos agudos de inflação. No caso brasileiro, como havia as aplicações no overnight,
que corrigiam monetariamente o dinheiro, a moeda não foi rejeitada. A população mais
pobre, que não tinha acesso a esse tipo de aplicação, tinha como única defesa contra a
desvalorização acelerada fazer assuas compras de supermercado imediatamente após
receber o seu salário e
o Banco Central é o guardião da moeda, isso significa que ele deve manter a moeda do
país capaz de cumprir as suas funções.
Política monetária
A seguir, veremos os instrumentos de controle da oferta de moeda na economia, ou seja,
veremos como se dá a política monetária.
Redesconto
Diariamente, as instituições financeiras emprestam reservas entre si no mercado interbancário.
Se, por acaso, algum banco não conseguir se financiar com os seus pares, ele recorrerá ao Banco
Central para realizar uma operação de antecipação de títulos públicos de propriedade do banco. O
Banco Central cobrará então uma taxa de juros por essa antecipação: a chamada taxa de redesconto.
O Banco Central atua, portanto, como emprestador de última instância.
79
Depósito compulsório
Os bancos comerciais mantêm reservas fracionárias. Isso significa que, a cada depósito dos
seus correntistas, os bancos deixam como reserva um percentual, utilizando o restante na oferta de
crédito na economia. Os bancos podem fazer isso porque enquanto alguns correntistas estão
fazendo retiradas, outros estão realizando depósitos. As instituições utilizam então os depósitos
destes para honrar as retiradas daqueles.
Essas operações fazem surgir recursos nas contas desses tomadores de crédito, “criando
moeda”. As instituições nas quais esses tomadores de crédito têm conta, novamente, vão manter
como reserva uma fração desses recursos e emprestar o restante, o que gera um processo em
cadeia. Esse aumento de quantidade de moeda (escritural) em circulação se chama multiplicador
bancário. Para controlar a quantidade de moeda “criada” nesse processo, cabe ao Banco Central
determinar qual o percentual que os bancos devem deixar como reserva. Esse percentual se chama
depósito compulsório.
Durante um processo de aceleração da inflação, o Banco Central pode, além de aumentar a
taxa básica de juros da economia, aumentar o percentual de depósito compulsório, restringindo a
oferta de crédito pelo sistema financeiro. Isso aumentaria os juros nas diversas modalidades de
financiamento, restringindo a demanda agregada e, consequentemente, ajudando no controle da
inflação. Por outro lado, em um processo de recessão e aumento de desemprego, o Banco Central
pode, além de baixar a taxa básica de juros da economia, diminuir o percentual do depósito
compulsório, ampliando e barateando a oferta de crédito, e impulsionando a demanda agregada.
80
superando a demanda, puxando os juros para baixo. A mesa de open market realiza então um
leilão de oferta de títulos públicos, retirando moeda do mercado, até que os juros do interbancário
fiquem, novamente, próximos do valor da Selic.
Corridas bancárias
Os bancos trabalham com reservas fracionárias. Isso significa que nenhum banco suportaria
que a maioria dos seus correntistas resolvesse retirar os seus depósitos simultaneamente. Se um
boato maldoso espalhasse a notícia de que algum banco está insolvente, isso poderia levar a
instituição, mesmo saudável, à falência. É o que chamamos de boato autorrealizável. Se essa
corrida se tornasse generalizada, a oferta de moeda na economia encolheria rapidamente, já que o
multiplicador bancário deixaria de funcionar.
Em 1933, após diversas corridas bancárias ocorridas durante a Grande Depressão, o
governo americano criou o Federal Deposit Insurence Corporation (FDIC), um fundo que garante
aos correntistas os seus depósitos até determinado valor (atualmente, US$ 250.000,00). No
Brasil, temos o Fundo Garantidor de Crédito, que garante os depósitos em conta-corrente,
caderneta de poupança, certificados de depósitos bancários, letras de crédito imobiliárias e letras
de crédito agrárias em um montante, atualmente, de R$ 250.000,00 por CPF.
Como os depósitos têm garantia até esse valor, a probabilidade de ocorrerem corridas
bancárias originárias de boatos diminui.
Spread bancário
Spread é um termo, em inglês, que significa diferença. Spread bancário é a diferença entre a
remuneração que o banco paga ao aplicador para captar um recurso e o quanto esse banco cobra
para emprestar o mesmo dinheiro. O cliente que deposita dinheiro no banco, na poupança ou em
outra aplicação, está, de fato, fazendo um empréstimo ao banco.
O spread bancário refere-se à diferença entre a remuneração obtida por um investidor que
aplica o seu dinheiro em um banco – comprando, por exemplo, um CDB – e o quanto o banco
cobra nas diversas modalidades de crédito que disponibiliza para financiamento de empresas e
pessoas físicas.
O spread bancário brasileiro situa-se entre os maiores do mundo. Por conta do alto custo
financeiro, o pequeno e o médio empresário têm muita dificuldade de viabilizar algum projeto.
Esse é, certamente, um importante fator que dificulta o desenvolvimento econômico do País.
81
Mas porque que o spread bancário é tão grande no Brasil? Vejamos algumas fontes de spread
bancário existentes no País:
os bancos cobram um diferencial de juros para cobrir os seus custos administrativos;
o Banco Central retém um percentual das reservas dos bancos, não deixando que eles
utilizem essa parte retida para conceder crédito. Esse percentual se chama depósito
compulsório. No Brasil, esse percentual costuma ser bem mais alto do que na maioria
dos países. Para compensar a parte que fica retida no Banco Central, os bancos
aumentam os juros sobre a parte que podem utilizar para conceder crédito;
os impostos diretos são altos;
os bancos têm risco nos empréstimos que concedem. Para gerenciar esse risco, eles
monitoram a inadimplência e, quando essa inadimplência sobe, eles aumentam a taxa de
juros cobrada nos seus financiamentos. Desse modo, os devedores que estão honrando os
seus compromissos com o banco compensam as perdas com os caloteiros.
a concentração bancária no Brasil é muito grande. Existe muito pouca concorrência no
mercado e, como vimos, a pouca concorrência prejudica o consumidor, que, no caso, é o
tomador de empréstimo e
o fato de o governo ser um grande tomador de empréstimo (o déficit público é muito
grande) faz com que ele dispute a disponibilidade de crédito no país com o setor
privado, pressionando o custo de financiamento das empresas e pessoas físicas.
Importante!
A questão do risco do banco é sempre um fator muito importante para os juros cobrados nos
financiamentos. Os juros de um financiamento de um carro, por exemplo, costumam ser mais
baixos porque o banco tem uma garantia real. Se o tomador do empréstimo não honrar as
prestações, o banco pode retomar o veículo. Já no financiamento do cartão de crédito, o banco
não tem nenhuma garantia. Se o cliente resolver não pagar a dívida, tudo que o banco pode
fazer é enviar o nome e CPF desse cliente para cadastros de maus pagadores, como o Serasa ou
o SPC. É exatamente por esse motivo que os juros de financiamento pelo cartão de crédito são
os mais altos do sistema financeiro.
Cooperativas de crédito
Uma cooperativa é uma associação de pessoas que se unem voluntariamente e tornam-se
sócias, passando a fazer as suas movimentações financeiras por meio dessa associação, e não mais
junto aos bancos tradicionais. Esses sócios passam a ser donos da cooperativa, juntamente com
centenas ou milhares de outras pessoas. Na maioria das instituições financeiras cooperativas
82
existentes no País, o capital social exigido para ingressar como sócio é bastante baixo, cerca de R$
100,00. Esse capital pode ser resgatado quando e se a pessoa decidir sair da cooperativa.
As cooperativas não têm fins lucrativos, o que significa que, normalmente, os seus preços
são mais acessíveis e competitivos que os dos bancos tradicionais. Além disso, todos os anos, após
apuradas as sobras do exercício, as cooperativas convocam os seus sócios para comparecer a uma
assembleia geral. Nesse momento, é decidida a destinação a ser dada às sobras financeiras.
Costumeiramente, a maior parte das sobras é devolvida aos sócios, na proporção da
movimentação que cada um realizou durante aquele exercício. Desse modo, são valorizados os
mais fidelizados, que realizam as suas operações com a cooperativa.
Uma pesquisa do Banco Central do Brasil realizada há poucos anos apontou que 42% dos
sócios de cooperativas são 100% fidelizados, ou seja, não possuem movimentação em nenhuma
outra instituição financeira. Isso comprova que as cooperativas oferecem todos os produtos e
serviços dos bancos tradicionais, como aplicações, empréstimos, seguros, consórcios, cartão de
crédito e de débito, etc.
Além disso, as cooperativas são geridas democraticamente. Nas assembleias, os sócios
elegem as pessoas que serão responsáveis pela gestão da cooperativa: os chamados conselheiros de
administração. Esses conselheiros terão de dar conta das suas ações nas próprias assembleias.
Um dos grandes diferenciais de uma cooperativa é que todos são sócios, não existindo
pessoas que sejam apenas clientes. Essa é uma exigência legal do Banco Central para que as
pessoas possam operar com uma cooperativa de crédito.
Essas instituições bancárias têm como característica ser de propriedade de um pequeno
número de pessoas (os donos ou sócios), que buscam obter, como qualquer empresário, o maior
retorno possível sobre o capital investido. Esse lucro é obtido por meio das movimentações
financeiras realizadas pelos clientes, pessoas que não possuem nenhum poder de decisão sobre a
forma de atuação do banco com o qual operam, apenas usufruindo dos produtos e serviços que
utilizam por meio do pagamento do preço estabelecido.
Talvez por mero desconhecimento, a quase totalidade dos brasileiros realiza as suas
operações financeiras com os bancos tradicionais. Ainda são poucos – menos de 10 milhões de
pessoas – os que descobriram que ser cliente não é a única opção existente e que é possível ser
dono da sua própria instituição financeira, organizada em forma de cooperativa.
Em julho de 2018, o Brasil apresentava 967 cooperativas de crédito com 1.037 pontos de
atendimento. Comparado ao resto do mundo, o Brasil ainda engatinha no setor. Nos Estados
Unidos, 30% da população é cooperada e na Alemanha 22%. Por aqui, somente 4% dos
brasileiros são associados a uma cooperativa.
Na contramão da crise, as cooperativas ofereceram os mesmos produtos e serviços dos bancos
a taxas mais baratas e, nos últimos cinco anos, ampliaram em 20% ao ano as suas operações. Em um
país no qual o spread bancário é tão expressivo, o crescimento dessa modalidade de instituição
financeira e de financiamento para os empreendedores é muito bem-vindo.
83
MÓDULO VII – CICLOS ECONÔMICOS E
POLÍTICAS CAMBIAIS
Ciclos econômicos
A atividade econômica flutua de um ano para o outro. Geralmente, ela se expande devido
ao aumento da força de trabalho, aos investimentos em bens de capital e em novas tecnologias.
Nesse caso, a economia produz mais. No entanto, há anos em que isso não acontece. A demanda
por bens e serviços encolhe, as empresas diminuem a produção dos bens e serviços por terem
menos clientes, os trabalhadores são demitidos, as firmas trabalham com ociosidade e a renda
encolhe. Esses períodos de queda de renda e aumento de desemprego são denominados recessões,
quando são relativamente moderados, e depressões, quando são mais intensos, como em 1930.
O Brasil, entre 2014 e 2016, passou pela pior recessão em mais de um século, com chances
de entrar para a história como uma depressão. O número de trabalhadores desempregados
alcançou a marca de 12 milhões no final de 2016.
A maioria dos economistas analisa a demanda e a oferta agregada para entender as causas
dessas flutuações. O fato é que elas sempre ocorrem.
Flutuações
As flutuações econômicas são irregulares. Por também serem chamadas de ciclos de negócio,
frequentemente as pessoas têm a errônea ideia de que as flutuações do PIB são regulares e
previsíveis, como os ciclos da Lua. Isso não é verdade. O gráfico a seguir nos mostra a evolução da
economia americana (PIB real) nas três últimas décadas do século XX. As faixas escuras
representam os períodos de recessão. Podemos observar que esses períodos têm durações
diferentes e ocorrem em espaçamentos irregulares.
Diversas variáveis econômicas, como a renda das famílias, a despesa ou a produção, flutuam
praticamente em conjunto. Há, contudo, algumas variáveis que apresentam ritmos diferentes de
flutuação. Normalmente, o investimento das empresas encolhe rapidamente no início de uma
recessão e é um dos últimos a recuperar-se. Isso acontece porque as empresas precisam ter certeza
da recuperação da economia para retomar os seus projetos de investimento. Já o desemprego
demora a aumentar, pois os custos das demissões são geralmente altos. Contudo, uma recessão
profunda e longa, como a que ocorreu no Brasil entre 2014 e 2016, acaba resultando em um forte
aumento de desemprego, o que aprofunda ainda mais a crise econômica. Normalmente, a
recuperação desses postos de trabalho se dá muito lentamente.
86
Origem das flutuações
Vejamos, a seguir, a origem dos diferentes tipos de flutuação econômica:
.6 = - % . /01 % .2 1 % 3 % 4 ( 5
87
decisão de investir ou não em obras de infraestrutura e os gastos sociais têm reflexo direto na
demanda de bens e serviços.
88
vez, depende da taxa de investimento. A linha sinuosa representa o PIB verificado no tempo, que
não necessariamente é igual ao PIB potencial.
O governo deve atuar no curto prazo para suavizar essas flutuações, o que pode ser feito de
diversas formas. Vejamos:
89
d) PIB acima do potencial – pressão inflacionária:
O Governo deve implementar políticas contracionistas da demanda agregada.
90
Mercado de câmbio
A cotação do dólar se forma no mercado cambial em que atuam ofertantes e demandantes
da moeda americana – referência mundial desde 1944. A cotação, obviamente, obedece a lei da
oferta e da demanda, subindo quando a demanda supera a oferta e caindo quando a oferta supera
a demanda
Diversos fatores afetam o mercado de câmbio. Vejamos alguns exemplos:
se o PIB brasileiro cresce mais rapidamente, a demanda por dólares é ampliada, pois o
país importará mais insumos para crescer;
se há uma crise de confiança sobre a sustentabilidade da dívida brasileira, o investidor
que trouxe dólares para cá, ofertou no mercado e aplicou reais em títulos brasileiros ou
em ações vai tirar o seu capital do país, comprando dólares;
se a China cresce mais fortemente e, consequentemente, os preços dos grãos e do
minério de ferro sobem no mercado internacional, o volume e valor das exportações
brasileiras crescem, refletindo-se em maior oferta de dólares no mercado de câmbio e
o diferencial de juros pagos pelos títulos da dívida interna brasileira (a Selic) e dos juros
pagos por títulos de outros países (principalmente, os juros americanos) também
influencia o mercado de câmbio. A oferta tende a aumentar quando esse diferencial
aumenta. Já a demanda tende a aumentar quando esse diferencial encolhe.
Regimes cambiais
Além dos compradores e vendedores de moeda estrangeira, o Banco Central também pode
atuar no mercado de câmbio, ofertando ou demandando reservas e interferindo na cotação.
O Banco Central pode querer, por exemplo, conter uma alta ou uma baixa excessiva da
cotação do dólar: quando o real se desvaloriza (a cotação do dólar sobe), as importações de bens e
serviços e tudo o que é cotado em dólares fica mais caro em reais, gerando impactos
inflacionários. Por outro lado, quando o real se valoriza, os bens e serviços brasileiros ficam mais
baratos em dólar, beneficiando a balança comercial do País.
O Banco Central também pode querer tentar suavizar uma forte volatilidade do valor do
câmbio: quando o real se valoriza (a cotação do dólar cai), as importações de bens e serviços e
tudo o que é cotado em dólares fica mais barato em reais, ajudando no controle da inflação. Por
outro lado, quando acontece a valorização do real, os bens e serviços brasileiros ficam mais caros
em dólar, prejudicando a balança comercial do país.
O padrão de comportamento do Banco Central no mercado de câmbio durante
determinado período é denominado regime cambial do país. O dólar é a moeda reserva do
mundo, e a cotação das moedas é dada em relação à moeda americana.
91
Vejamos, a seguir, as características principais dos diversos regimes:
Euro
Quando o euro foi criado, em 1999, os países da então União Europeia enfrentavam um
dilema: aderir ou não à moeda única. Até então, os preços do menu de um bistrô francês eram
listados em francos, os de um restaurante alemão eram listados em marcos e os de uma tratoria
italiana, em liras. A partir de então, os menus dos restaurantes dos três países passaram a mostrar
os seus preços em euros.
92
O euro nasceu no dia 1º de janeiro de 1999. A França, a Alemanha, a Itália e a maioria dos
seus vizinhos renunciaram à sua moeda nacional em favor do euro. A então nova Zona do Euro
ostentava um PIB combinado quase tão grande quanto o da zona do dólar, mais conhecida como
Estados Unidos da América. Mas nem toda União Europeia aderiu ao euro. À época, a ausência
mais sentida foi a da Grã-Bretanha. Por que a terra de Shakespeare e do Beatles decidiu manter a
sua moeda nacional, a libra?
Parte da resposta está no orgulho nacional. Ao adotar o euro, a Grã-Bretanha desistiria da libra
esterlina, que tinha sido a principal moeda mundial até a Primeira guerra e que ostentava o retrato da
rainha. Existiam também sérias preocupações econômicas e, como sempre, havia um trade-off: os
economistas britânicos que eram a favor da adoção do euro argumentavam que, se a Grã-Bretanha
utilizasse a mesma moeda que os seus vizinhos, o comércio internacional do país se expandiria e a sua
economia se tornaria mais produtiva. Já os economistas que eram contra a adoção, afirmavam que, ao
adotar o euro, a Grã-Bretanha não teria mais autonomia para implementar a sua própria política
monetária (deixaria, por exemplo, de implementar a sua taxa de juros), pois teria de seguir o que o
Banco Centra Europeu (Banco Central da Zona Euro) decidisse. Uma forte oposicionista à adoção do
euro foi a própria primeira ministra Margaret Thatcher.
Apesar de participarem da União Europeia, a Inglaterra e outros países, como a Dinamarca,
também não adotaram o euro. Em outubro de 2016, os britânicos optaram, em plebiscito, por
não fazer mais parte da União Europeia. As negociações dessa saída complicada ainda estão em
curso em 2019, e só o futuro mostrará quais serão as consequências dessa polêmica decisão para a
economia britânica. Por enquanto, só podemos afirmar que, certamente, trará ônus e bônus.
93
O Brasil sofreu um ataque especulativo à sua moeda em janeiro de 1999. O Banco Central foi
então obrigado a abandonar o câmbio fixo, que vigorava desde julho de 1994, adotando a partir
dessa data o regime de câmbio flutuante sujo. Na ocasião, em apenas um dia, a moeda americana
dobrou de cotação, trazendo fortes prejuízos a todos os que detinham dívidas em dólares.
94
MÓDULO VIII – SETOR EXTERNO E
TEORIA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL
Setor externo
Balanço de pagamentos
a) Canal comercial:
Pelo canal comercial, ocorrem a compra e a venda de bens e serviços.
Também chamados esse canal de transações correntes, pois, quando um país exporta,
envia mercadorias para o exterior e recebe um pagamento que é registrado, positivamente, na
sua conta-corrente.
b) Canal de capital e financeiro:
Também chamado de conta capital financeira, pois, quando uma empresa estrangeira
decide instalar uma filial no país, esse investimento é registrado, positivamente, na conta de
capitais.
Esse registro é feito em dólares pelo Banco Central. O que traz dólares para o país é lançado
a crédito, e o que faz com que saiam dólares do país é lançado a débito. Vejamos como esses
registros são realizados:
a) Balança comercial:
Na balança comercial são registras as:
exportações de bens (crédito) e
importações de bens (débito).
Notemos que somente o valor dos bens importados e exportados deve ser contabilizado na
balança comercial. Nenhum tipo de serviço (tal como fretes marítimos) deve ser incluído. Esses
serão lançados na balança de serviços.
b) Balança de serviços:
Na balança de serviços são registrados valores com transportes, viagens, fretes, seguros,
construção civil, financeiros governamentais (como embaixadas), manutenção e reparos, aluguéis
de equipamentos, propriedade intelectual (marcas, patentes, royalties), advocatícios, culturais,
telecomunicação, computação e informações, audiovisuais, saúde, etc.
c) Balança de rendas:
Na balança de rendas, os valores são registrados com base na seguinte subdivisão:
balança de rendas primária – são registrados salários, ordenados (diplomatas,
burocráticos), honorários, remessas de lucros, dividendos, juros, etc. e
balança de renda secundária (transferências unilaterais) – são registrados valores
advindos dos governos (bolsas de estudos), donativos, ajudas humanitárias,
transferências pessoas físicas, etc.
96
d) Conta capital-financeira:
Na conta capital-financeira, os valores também são registrados com base em uma
subdivisão:
conta de capital – são registrados ativos não financeiros, passes de atletas, direitos
sobre recursos naturais, marcas, logotipos, domínios, etc. e
conta financeira – são registrados investimentos diretos no exterior e no país,
empréstimos, financiamentos, créditos, ações negociadas em bolsas de valores do país
e do exterior, aplicações em títulos públicos e privados, amortizações de
compromissos externos, fundos de investimentos, etc.
97
transações correntes do balanço de pagamentos, como pagamento pela importação de
serviços. O mesmo acontece com a remessa de lucros e dividendos para o exterior, e
também com os pagamentos de royalties, seguros, fretes, aluguéis, etc.: todos
correspondem a serviços importados e devem ser registrados na conta transações
correntes do balanço de pagamentos.
6. Uma empresa residente no Brasil amortiza parte da sua dívida com um banco no
exterior. Nesse caso, a empresa não pagou pelos serviços do capital financeiro, mas
pagou parte do próprio valor que tomou emprestado, ou seja, comprou de volta o título
ou o direito que o banco possuía. A transação é então registrada na conta financeira do
balanço de pagamentos, como saída de capital do Brasil. O mesmo aconteceria se a
empresa recomprasse as suas próprias ações ou cotas em mãos de estrangeiros: o registro
seria feito na conta financeira do balanço de pagamentos.
7. As doações que um residente no exterior faz a um residente no Brasil – denominadas
“rendas” – também são registradas na conta transações correntes do balanço de
pagamentos, pois, em princípio, não geram obrigações futuras do residente do Brasil
com o doador. O residente no exterior não adquire direitos a serem cobrados no futuro.
Por exemplo, muitos brasileiros que moram e trabalham no exterior remetem recursos
financeiros aos seus familiares no Brasil. Os descendentes de japoneses que vivem em
São Paulo e vão trabalhar no Japão também enviam dinheiro ao Brasil. Essas
transferências são registradas na conta transações correntes do balanço de pagamentos,
na rubrica “rendas secundárias”, também conhecida como “transferências unilaterais
para residentes no Brasil”.
Quando somamos o resultado anual dos dois canais – as transações correntes e a conta
capital-financeira –, temos o resultado do balanço de pagamentos. Se o balanço de pagamentos
for deficitário, significa que, naquele período, saíram mais dólares do que entraram, e o país tende
a perder reservas internacionais que estavam à disposição do seu Banco Central. Se, por outro
lado, o país tiver um balanço de pagamentos superavitário, ele acumulará reservas.
Países que não dispõem de reservas para “fechar” o balanço de pagamentos podem recorrer a
organismos internacionais como o FMI. Foi o caso do Brasil em 1998, que obteve, na ocasião, um
empréstimo de US$ 40 bilhões do FMI e do governo americano. Os aportes desses organismos são,
por convenção, registrados fora da conta de capitais, em contas que aparecem lado a lado com a
conta de reservas. Isso é feito porque, caso esses aportes fossem registrados na conta de capitais,
poderíamos ter a impressão (errada) de que o balanço de pagamentos está em equilíbrio.
Se um país não obtém apoio dos organismos internacionais para “fechar” o balanço de
pagamentos e as reservas internacionais atingem um nível muito reduzido, ele pode entrar em
moratória. Em 1986, o Brasil se viu com reservas muito baixas, mas não conseguiu aporte do
FMI. Isto é, o país precisou dar calote na sua dívida em moeda estrangeira. Essas dívidas foram
98
posteriormente renegociadas e pagas. No final de 2018, o Brasil possuía reservas em nível
confortável (cerca de US$ 380 bilhões em dezembro de 2018). A expectativa é a de que essas
reservas cheguem a US$ 400 bilhões em 2019 ou 2020.
Comércio internacional
O comércio internacional é um tema de grande importância no mundo atual, pois o custo de
transporte de mercadorias e pessoas, e o custo de comunicação entre as pessoas em diferentes países
têm sofrido reduções extraordinárias. Em consequência, a taxa de crescimento real do comércio
internacional tem sido substancialmente maior que a taxa de crescimento dos PIBs reais dos diversos
países, desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O mundo está se tornando, em termos de
comunicação, uma “aldeia global” (usando uma expressão de McLuhan) e as cadeias produtivas
internacionais – a mundialização dos mercados, inclusive o varejista – é uma tendência marcante.
Abordaremos então a Teoria das Vantagens Comparativas, pedra fundamental da
Teoria do Comércio Internacional, analisando aspectos da evolução da interdependência
econômica das nações. O conceito de vantagem comparativa está ligado, visceralmente, ao de
custo de oportunidade. Como vimos, a cada escolha que fazemos, estamos abrindo mão de
algo. O valor da melhor alternativa à escolha feita é o custo de oportunidade dessa escolha.
Esse conceito é fundamental para o entendimento das teorias do comércio internacional e das
vantagens comparativas.
99
Para explicar o assunto, imaginemos, por exemplo, dois países que chamaremos de A e B, os
quais produzem dois bens: tecido e vinho. Utilizando como único recurso o tempo da sua mão de
obra para a produção, suponhamos que:
os trabalhadores do país A necessitem de 1 hora de trabalho para produzir 1.000 metros
de tecido e 8 horas para produzir 1.000 litros de vinho e
os trabalhadores do país B necessitem de 20 horas de trabalho para produzir 1.000
metros de tecido e 10 horas para produzir 1000 litros de vinho.
Os trabalhadores do país A têm maior produtividade nos dois produtos, pois produzem
mais vinho e tecido por hora de trabalho. Dizemos então que o país A possui vantagem absoluta
na produção de vinho e na produção de tecido.
E quanto à vantagem comparativa? Para sabermos quem tem vantagem comparativa em
cada produto (tecido ou vinho), precisamos calcular o custo de oportunidade da produção de
tecido e de vinho em cada país.
No caso, o custo de oportunidade é o que se deixa de produzir de certo bem quando
optamos por alocar o recurso disponível (no nosso exemplo, horas de trabalho) na produção do
outro bem. Dessa forma, considerando o custo de oportunidade na produção de 1.000 metros de
tecido, temos:
a) No país A:
Para produzir 1.000 metros de tecido, o país A utiliza uma hora. Como A gasta oito horas
para produzir 1.000 litros de vinho, nessa uma hora utilizada na produção de tecido, ele estaria
deixando de produzir 125 litros de vinho. Desse modo, o custo de oportunidade para o país A na
produção de 1.000 metros de tecido é de 125 litros de vinho;
b) No país B:
Para produzir 1.000 metros de tecido, o país B utiliza 20 horas. Como B gasta 10 horas
para produzir 1.000 litros de vinho, nessas 20 horas utilizadas na produção de tecido, ele estaria
deixando de produzir 2.000 litros de vinho. Desse modo, o custo de oportunidade para o país B
na produção de 1.000 metros de tecido é de 2.000 litros de vinho.
100
Vamos considerar, agora, o custo de oportunidade na produção de 1.000 litros de vinho:
a) No país A:
Para produzir 1.000 litros de vinho, o país A utiliza oito horas de trabalho. Como A gasta
uma hora para produzir 1.000 metros de tecido, nessas oito horas utilizadas na produção de
vinho, ele estaria deixando de produzir 8.000 metros de tecido. Desse modo, o custo de
oportunidade para o país A na produção de 1.000 litros de vinho é de 8.000 metros de tecido.
b) No país B:
Para produzir 1.000 litros de vinho, o país B utiliza 10 horas de trabalho. Como B gasta 20
horas para produzir 1.000 metros de tecido, nessas 10 horas utilizadas na produção de vinho, ele
estaria deixando de produzir 500 metros de tecido. Desse modo, o custo de oportunidade para o
país B na produção de 1.000 litros de vinho é de 500 metros de tecido.
Apesar de A possuir vantagem absoluta nos dois produtos, A possui vantagem comparativa
na produção de tecido, e B possui vantagem comparativa na produção de vinho. Sempre que um
país tiver menor custo de oportunidade na produção de um bem ou serviço, isso leva o outro país
a ter menor custo de oportunidade no outro. É praticamente impossível que um país tenha
vantagem comparativa em todos os produtos.
Enfim, chegamos à seguinte conclusão final:
101
Se o país A resolver produzir os 1.000 litros de vinho, utilizará oito horas de trabalho. Com
essas oito horas, ele poderia produzir 8.000 metros de tecido. Desse modo, é mais conveniente
utilizar essas oito horas para produzir os 8.000 metros de tecido e trocar 3.000 metros pelos 1.000
litros de vinho. Nesse caso, o comércio permitiria ao país A ficar com 5.000 metros de tecido e
1.000 litros de vinho, claramente um resultado superior ao que ocorreria se não houvesse trocas.
Poderíamos dizer que isso acontece porque o país A tem mais produtividade nos dois
produtos. No entanto, devemos analisar a situação do país B.
Se o país B resolver produzir os 3.000 metros de tecido, utilizará 60 horas. Com essas 60
horas, ele poderia produzir 6.000 litros de vinho. Desse modo, é mais conveniente utilizar essas
60 horas para produzir os 6.000 litros de vinho e trocar 1.000 litros pelos 3.000 metros de tecido.
Nesse caso, o comércio permitiria que o país B ficasse com 5.000 litros de vinho e 3.000 metros
de tecido, claramente um resultado superior ao que ocorreria caso não houvesse trocas.
No exemplo que acabamos de ver, o país B, que possui menor produtividade em ambos os
produtos, obteve ganhos com o comércio, o que contradiz os argumentos contra o comércio, os
quais focam, erroneamente, as vantagens absolutas, e não as vantagens comparativas.
“Eis uma máxima que todo chefe de família prudente deve seguir: nunca
tentar fazer em casa aquilo que seja mais caro fazer do que comprar. O
alfaiate não tenta fabricar seus sapatos, mas os compra do sapateiro. Este
não gráficoenta confeccionar seu traje, mas recorre ao alfaiate. O
agricultor não tenta fazer nem um nem outro, mas se vale desses artesãos.
Todos consideram que é mais interessante usar suas capacidades naquilo
que têm vantagem sobre seus vizinhos e comprar, com parte do resultado
de suas atividades, aquilo que venham a precisar” (SMITH apud
MANKIW, 2014, p. 54).
102
Já David Ricardo é o autor do ensaio econômico A Teoria das Vantagens Comparativas,
apresentado ao parlamento inglês em 1817. O autor usou o seu modelo para defender o livre
comércio, particularmente o fim de tarifas que restringiam as importações de alimentos na
Inglaterra. A conjuntura político-econômica em que David Ricardo apresentou o seu modelo é
apresentada a seguir.
Desde o início da Revolução Francesa, em 1789, até a derrota de Napoleão em Waterloo,
em 1815, a Inglaterra esteve, quase continuamente, em guerra com a França. Após conquistar os
principais países da Europa continental, Napoleão impôs um bloqueio continental ao comércio
com a Inglaterra: corsários (piratas financiados pelo governo francês) atacavam e invadiam
embarcações, bloqueando os bens ingleses. A longa guerra interferiu nas trocas.
Dado que a Inglaterra, primeiro país a industrializar-se, era exportadora de produtos
manufaturados e importadora de produtos agrícolas, essa limitação ao comércio encolheu a oferta
de alimentos na Inglaterra, aumentando o preço de produtos agrícolas e valorizando as terras
inglesas. Os proprietários de terra prosperaram durante o longo período de guerra e, mesmo
sendo ingleses, foram bastante beneficiados pelo “protecionismo” decorrente do bloqueio
continental de Napoleão. Já as manufaturas inglesas foram prejudicadas, ficando somente com o
mercado interno para ofertar os seus produtos, que tiveram os seus preços depreciados.
Após a guerra, o comércio se restabeleceu, fazendo com que os preços dos alimentos na
Inglaterra caíssem. Para evitar a diminuição dos lucros, os proprietários de terra, politicamente
influentes, apoiaram a promulgação de leis que estabeleceriam tarifas sobre a importação de grãos
(corn laws) no parlamento inglês. Essa barreira tarifária substituiria a proteção à agricultura inglesa
proporcionada pelo bloqueio de Napoleão.
Como membro do parlamento, David Ricardo argumentou contra as corn laws no
parlamento inglês. Ele estava ciente de que a não adoção das tarifas favoreceria a indústria e
prejudicaria a agricultura, inclusive os influentes proprietários de terra. Ricardo convenceu então
os seus pares a votarem contra as tarifas e por uma maior abertura da economia inglesa,
apresentando o modelo das vantagens comparativas que vimos anteriormente. Ele, certamente,
representava os interesses dos industriais e operários das manufaturas, mas enfatizava, na sua
teoria, os ganhos da nação como um todo. Essa estratégia de Ricardo, certamente, justifica o uso
da expressão “economia política” para descrever os argumentos econômicos utilizados como base
das políticas do governo.
O modelo das vantagens comparativas é considerado um dos mais brilhantes ensaios da
Economia. No exemplo que vimos anteriormente, a única razão para as vantagens comparativas é
o diferencial de produtividade entre os trabalhadores dos dois países. No entanto, as mais
modernas teorias de comércio nacional estabeleceram, teórica e empiricamente, que as vantagens
comparativas entre os países podem decorrer de outras razões, tais como: diferenças na
disponibilidade de recursos naturais, na abundância relativa de capital, acesso à mão de obra
qualificada e não qualificada, acesso à tecnologia, acesso a mercados, assim como poder de
mercado e de economias de escala na produção.
103
Sobre perdedores e ganhadores
Se o livre comércio traz benefícios para a nação como um todo, por que vemos tantos
protestos contra a abertura da economia e presenciamos uma guerra aparentemente infindável
entre os que preferem o livre comércio e os que defendem o protecionismo?
O principal motivo é o seguinte: apesar do ganho como um todo para o país, a abertura de
uma economia gera, internamente, perdedores e ganhadores. A abertura ao comércio altera o
preço relativo dos diversos bens da economia, aumentando o preço dos bens que são exportados e
reduzindo o preço dos bens que também são importados. Dessa forma, os fatores de produção
utilizados mais intensivamente nos setores exportadores têm a sua remuneração aumentada com a
abertura comercial, e os fatores de produção utilizados mais intensivamente nos setores
importadores perdem em relação à situação sem comércio.
Os donos de terra e os trabalhadores rurais da época de David Ricardo não devem ter
ficado felizes com a revogação das corn laws, mesmo que isso fosse benéfico para a Inglaterra
como um todo. Os indivíduos visam, geralmente, o bem-estar próprio. Desse modo, os
empresários e os trabalhadores de setores que se sentem prejudicados pela concorrência de bens
ou serviços importados de outros países, via de regra, protestam e usam a sua influência política
buscando protecionismo.
De fato, as restrições às importações aumentam os ganhos dos empresários e dos
trabalhadores dos setores protegidos. Já os consumidores dos bens e serviços produzidos por esses
setores pagam mais caro do que se houvesse maior oferta de importados. Se o setor protegido
fornece máquinas, equipamentos e tecnologia, outros setores verão o seu desenvolvimento e
produtividade restringidos pelo aumento do preço desses itens e, em casos extremos, pela
impossibilidade de acesso ao produto estrangeiro.
No Brasil, a Lei de Informática, que restringia o acesso de empresas e cidadãos brasileiros a
computadores e outros bens e serviços de tecnologia de informação de outros países, criou um sério
obstáculo à competitividade brasileira em vários setores. Recentemente, a produção de petróleo no
Brasil, realizada pela Petrobras e por outras empresas do setor, também se viu prejudicada pelas
restrições à importação de equipamentos estrangeiros necessários à extração do produto.
104
Formas de protecionismo
Atualmente, muitos economistas defendem o livre comércio. No entanto, os governos,
embora normalmente proíbam o protecionismo entre os diversos estados, províncias e regiões do
próprio país (esse é o caso do Brasil), procurando alcançar a máxima eficiência de produção
dentro do país, tornam-se protecionistas em relação aos produtos estrangeiros. Provavelmente,
fazem isso em busca do apoio de grupos internos poderosos.
A seguir, examinaremos as políticas protecionistas mais utilizadas e as principais razões que
levam os países a adotá-las.
Quota de importação
Uma quota de importação é a quantidade máxima de importação de um bem ou serviço
definida por lei. Essa restrição é, normalmente, criada por meio de emissões de licenças de
importação. Assim como na tarifa, a quantidade total do produto ofertado internamente será
menor do que a quantidade em condições de livre comércio, levando a um preço mais alto.
Novamente, ganham os produtores nacionais e os trabalhadores do setor, mas perdem os
consumidores nacionais.
Aqueles que conseguirem as licenças para importar dentro da quota serão privilegiados com
preços mais baixos, podendo revender no mercado interno mais caro. Esse lucro dos detentores
das licenças é denominado renda das quotas e pode ser muito vultoso. Ao contrário da barreira
criada por tarifas, o governo não arrecada com as quotas, pois as distribui gratuitamente.
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Outras barreiras não tarifárias
À medida em que as tarifas diminuíram, nas últimas décadas do século XX, foram sendo
criadas barreiras não tarifárias, como exigências sanitárias, sociais, ecológicas, etc.
Atualmente, essas barreiras são muito usadas contra os produtos chineses.
106
BIBLIOGRAFIA
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STIGLITZ, Joseph; WALSH, Carl. Introdução à macroeconomia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015.
107
PROFESSORA-AUTORA
Nora Raquel Zygielszyper é mestre em Economia e Engenheira Eletricista pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro. Atuou como consultora e pesquisadora do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), onde participou da montagem do banco de dados Ipeadata.
Atua, desde 2001, como professora dos cursos da Escola de Pós-Graduação de Economia da
Fundação Getulio Vargas (EPGE/FGV-RJ), lecioando cadeiras de Economia e Finanças.
Atualmente, é sócia-diretora da Zygel Cursos e Treinamentos Ltda., que presta serviços de
treinamento e consultoria empresarial na área de finanças e avaliação de cenários
macroeconômicos.
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