SEXO
SEXO
SEXO
Osho
Tradução
DENISE DE C. ROCHA DELELA
EDITORA CULTRIX
São Paulo
Título do original: Sex Matters.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por
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Este livro contém vários trechos de palestras, incluindo as publicadas originalmente no livro Do Sexo à Supraconsciência.
O primeiro número à esquerda indica a edição, ou reedição, desta obra. A primeira dezena
à direita indica o ano em que esta edição, ou reedição, foi publicada .
Edição Ano
1-2-3-4-5-6-7-8-9-10-11 03-04-05-06-07-08-09-10
Prólogo
Parte I: Do Sexo à Supraconsciência
1. Em Busca do Amor
2. A Atração Básica
3. A Nova Porta
4. O Surgimento de uma Nova Humanidade
5. Do Carvão ao Diamante
Sobre o Autor
Retiro de Meditação
Como a filosofia zen encara o sexo? Seus adeptos parecem
não ter sexo ou ter uma aura assexuada em torno deles.
O homem tem medo dos dois. É por isso que eles são tabus.
Ninguém fala de sexo e ninguém fala de morte.
Ficamos em silêncio quando o assunto é sexo ou morte. Faz
séculos que mantemos esse silêncio. Eles são assuntos tabus, que
nunca são mencionados. No momento em que isso acontece, você
começa a tremer.
Parece que existe uma grande repressão. É por isso que temos
palavras que substituem essas duas. No Ocidente, as pessoas não
dizem que “fazem sexo”, elas dizem que “fazem amor”. Esse é um
termo substituto. E é mentiroso, porque o amor é uma coisa
totalmente diferente. Fazer sexo é fazer sexo, não é fazer amor. O
amor pode incluir sexo, mas é algo completamente diferente.
Nunca falamos da morte diretamente. Se alguém morre,
também contornamos o assunto com palavras mais amenas.
Dizemos que a pessoa “foi para o céu” ou “descansou”. A morte
nunca é encarada de frente.
Criamos muitos fenômenos falsos em torno da morte e do
sexo. Se duas pessoas vão se casar, o sexo nem sequer é
mencionado. E eles vão se casar só para poder fazer sexo! Criamos
uma grande ilusão em torno do casamento, mas o fato nu e cru é o
sexo. Criamos um ritual, um ritual magnífico de casamento, só para
esconder esse fato. Por quê? Por que essas duas coisas são tabus?
Porque elas estão profundamente relacionadas.
Elas estão relacionadas pelo seguinte:
Primeiro, você nasce do sexo; o nascimento é conseqüência do
sexo. E nascimento e morte são os dois pólos da mesma coisa. A
morte está oculta no seu próprio nascimento. É por isso que o
homem se dá conta da relação entre sexo e morte. A morte não pode
acontecer sem o sexo, assim como o nascimento não pode acontecer
sem o sexo.
Você talvez esteja se perguntando... Existem organismos –
como as amebas e as bactérias – que não nascem do sexo, mas de
uma simples divisão. As amebas continuam crescendo e se
alimentando. Ao chegar num ponto, ocorre uma divisão, pois ela fica
tão grande que não pode mais se movimentar. Ao chegar num certo
limite, o corpo se divide em dois. Então esses dois corpos continuam
crescendo até se dividir em quatro. Não existe sexo, só uma simples
divisão. É por isso que a ameba é considerada imortal. Elas nunca
morrem. Enquanto tiver um suprimento de comida, elas não
morrem. Não é preciso morrer, porque não há sexo.
O homem não pode se tornar imortal enquanto não encontrar
algo que mude todo o processo da reprodução. Se puder nascer sem
que o sexo seja necessário, ele nunca morrerá. A Ioga,
particularmente a Hatha Ioga, já fez várias tentativas para encontrar
um método que prolongue a vida. É por isso que a Hatha Ioga é
contra o sexo. Segundo ela, se você quiser ter uma vida mais longa,
não pode praticar sexo, pois o sexo antecipa a morte.
Mas você já nasceu, por isso já está interessado em sexo. Se
você se reprime sexualmente ou se expressa livremente nesse
campo, pouco importa. Você já escolheu de que lado ficar. Logo,
logo estará do outro.
O sexo está profundamente relacionado com a morte num
outro sentido também. Num ato sexual profundo, você pode sentir
uma espécie de morte, como se você não existisse mais. Se de fato
estiver totalmente entregue ao ato, você se fundiu com o parceiro.
Sua entidade individual desapareceu e uma força maior que você
tomou conta do seu ser. De início, o ato sexual é voluntário, mas
nunca termina como um ato voluntário. Chega um ponto em que o
mecanismo voluntário é sobreposto por outro involuntário. Chega
um ponto em que a sua mente consciente fica de lado e o
inconsciente assume o comando. Chega um ponto em que o ego
deixa de existir e o não-ego assume o controle. Você sente uma
morte repentina do ego; sente que está morrendo.
Essa é a razão por que as pessoas muito egocêntricas não
conseguem chegar ao orgasmo sexual. Elas não conseguem se
entregar; não conseguem deixar que o inconsciente assuma o
comando. Elas permanecem conscientes e tentam controlar todo o
processo. Por isso não conseguem ter um orgasmo profundo. Quanto
mais civilizada for a pessoa, menos possibilidade ela tem de chegar
ao orgasmo. Esse momento de bem-aventurança em que o ego se
esvai e você se funde com a existência é uma espécie de morte; a
morte do ego, do consciente, da individualidade.
É por isso que as pessoas que temem o sexo também têm medo
da morte. E aquelas que temem a morte também temem o sexo.
Essas pessoas pensam: “Eu posso me perder. Como ter certeza de
que poderei voltar?” Não há nenhuma certeza. Quem pode saber se
você vai voltar ou se vai continuar até desaparecer por completo?
Esse mesmo medo acontece na meditação também. A
meditação também leva a um orgasmo profundo, muito parecido
com o orgasmo sexual. De certo modo, trata-se da mesma coisa.
A psicologia moderna, particularmente a junguiana, descobriu
um conceito que, na verdade, trata-se de um conceito tântrico muito
antigo. O Tantra diz que todo ser humano é bissexual. Nenhum
homem é apenas um homem. Ele é, num certo sentido, um homem e
uma mulher. E nenhuma mulher é simplesmente uma mulher. Lá no
fundo, ela é um homem também. Portanto, todo indivíduo, homem
ou mulher, é bissexual. O sexo oposto encerra-se nas profundezas de
cada ser humano.
Quando está em meditação profunda, a pessoa tem um
orgasmo sexual – não com outra pessoa, mas com o oposto polar que
tem dentro de si. Vocês se encontram ali: sua mulher interior e seu
homem interior. Esse encontro é espiritual, não físico. Eles se
penetram, o yin e o yang. Eles se penetram, tornam-se uma coisa só
e se fundem um no outro. A meditação é um orgasmo sexual
profundo entre os seus próprios opostos polares. Isso também
provoca medo.
Se meditar profundamente, um dia, mais cedo ou mais tarde,
você saberá quando será a sua hora. A morte é anunciada: “Agora eu
vou morrer!” O medo toma conta de você. Esse medo pode fazer
você voltar. Se voltar, você terá perdido uma grande oportunidade
que só acontece muito raramente. Vidas e vidas passarão até que
esse raro momento aconteça outra vez, fazendo com que você
comece a sentir um profundo orgasmo interior. A mulher interior e o
homem interior se encontram; seus dois opostos polares penetram
um no outro, tornando-se uma coisa só. Nesse momento, você se
sente inteiro. Mas surge o medo, pois o ego desaparece. Você, como
você se conhece, a sua imagem, esvai-se. Surge um novo ser que não
tem nenhuma relação com o anterior, que não tem nenhuma
semelhança com o anterior. Mas antes você terá de morrer, levando
consigo todo o seu passado. Isso causa medo.
Na meditação, você se depara com a morte; no orgasmo
sexual, você também se depara com a morte. Mas, se conseguir
enfrentar essas mortes, você será capaz de enfrentar a morte
suprema: a morte do ego. E sem sentir medo. Depois que você
descobre que você pode perder o ego e continuar existindo, depois
que você percebe que essa perda não é bem uma perda, mas um
ganho e essa morte não é uma morte, mas a vida eterna – depois que
descobre isso, a morte deixa de existir para você. Seu corpo pode
morrer, tudo o que você tem pode morrer, mas não você – o seu ser,
o fundamento da sua existência – é eterno.
E isso é ótimo. Se você conseguir enfrentar a morte no sexo,
ele se tornará espiritual; tornar-se-á uma meditação. Depois que
você a conhecer com outra pessoa, com a pessoa que ama ou com
um amante, será muito fácil passar para a meditação e criar o mesmo
fenômeno dentro de você.
A pessoa também pode criar esse fenômeno no reino interior.
Será difícil, mas não impossível. Depois que ele for criado e a
pessoa tiver passado por esse encontro profundo, por uma profunda
comunhão interior entre seus opostos polares, o sexo deixará de
existir, pois ele é um mero substituto do sexo interior. Eu chamo a
meditação de sexo interior. Você está sozinho, mas tem um orgasmo
profundo com seu oposto polar.
Sinta a morte sempre que tiver oportunidade. Não fuja dela. A
morte é bela; é o maior mistério deste mundo; chega a ser mais
misteriosa que a vida. Por meio da vida, você ganha o mundo, o
mundo das futilidades – totalmente sem sentido, sem valor. Por meio
da morte, você ganha o eterno. A morte é a passagem para ele.
Sócrates estava morrendo; ele havia sido envenenado. Seu
rosto tinha uma expressão de êxtase. Os amigos então lhe
perguntaram: – Sócrates, você está nos seus últimos instantes de
vida. Por que parece tão feliz, tão alegre? Nunca vimos ninguém
morrer com tamanha expressão de bem-aventurança, com um olhar
tão extasiante! O que acontece com você?
– Estou no limiar da morte – respondeu ele, – o maior mistério
da vida. A vida não é nada diante disso. O desconhecido está se
abrindo para mim, o ilimitado, o inexplorado. Estou prestes a
embarcar numa grande viagem. Estou me perdendo de mim mesmo,
mas ganhando todo o universo, toda a existência.
Não tenha medo da morte. É esse medo que o impede de
passar por todas as experiências profundas: o amor, a meditação, o
êxtase.
Nota do Editor: As idéias expressas por Osho sobre a AIDS não dão a
entender que essa doença tenha uma origem apenas psicológica. Na verdade,
Osho foi uma das primeiras pessoas que percebeu os perigos da pandemia
incipiente da AIDS, em 1984, e recomendou na época que as pessoas
adotassem práticas severas de sexo seguro e, logo que possível, fizessem o
teste que detectava anticorpos ao vírus HIV.
P: E o que é virtude?
P: Consciência de tudo?
R: De tudo. Depois que você está plenamente alerta, toda a sua
vida é uma virtude; tudo o que fizer terá um sabor de pureza, uma
fragrância do divino.
PARTE I
DO SEXO À SUPRACONSCIÊNCIA
1. Em Busca de Amor
O que é amor?
Sentir e conhecer o amor é muito fácil, mas defini-lo é
realmente difícil. É o mesmo que perguntar a um peixe o que é o
mar; ele dirá: – É tudo o que está ao meu redor. Só isso. – Mas se
você insistir para que ele o defina, em vez de apenas mostrar o que
ele é, você criará um problema para o pobre do peixe.
Da mesma forma, na vida dos seres humanos, tudo o que é
bom, belo e verdadeiro só pode ser vivido e conhecido por meio da
experiência, mas dificilmente pode ser descrito ou definido. O
problema maior é que, nos últimos cinco ou seis mil anos, os seres
humanos têm se limitado a falar sobre algo que eles deveriam estar
vivendo intensamente – que, na realidade, existe para ser vivido: o
amor. O amor é tema de conversas e discussões, é cantado em prosa
e verso, é entoado em hinos de louvor. Mesmo assim, não existe
espaço para ele na vida do homem.
Se sondarmos profundamente a alma humana, veremos que
nenhuma palavra usada pelo homem é tão falsa quanto “amor”. O
maior infortúnio na vida dele é a crença que tem de que aqueles que,
na verdade, tornaram o amor uma farsa, bloquearam todas as
correntes do amor, são a fonte desse sentimento. As religiões falam
de amor – mas esse tipo de amor que envolveu os homens como
uma maldição só serviu até agora para fechar todas as portas para o
amor verdadeiro na vida deles.
Com respeito a isso, não existe nenhuma diferença básica
entre Oriente e Ocidente, entre a Índia e os Estados Unidos. O rio do
amor ainda não flui na vida do homem. E a culpa por isso atribuímos
ao próprio homem ou à mente. Dizemos que os seres humanos são
cruéis, que a mente humana é um veneno e que é por isso que o
amor não flui na nossa vida. Mas a mente não é um veneno, não é
perversão; são justamente aqueles que dizem isso que, na realidade,
perverteram o amor e não deixaram que ele se manifestasse. Nada
neste mundo é um veneno. Nada em toda a existência é um veneno;
tudo é néctar. Foram os seres humanos que transformaram todo o
néctar em veneno. E os maiores culpados são os chamados
professores, os considerados santos, os supostos homens de religião.
É importante entender isso muito bem; do contrário, não existe
nenhuma possibilidade para o amor na vida de qualquer ser humano
– nem futuramente.
Continuamos usando como alicerces para o crescimento do
amor exatamente aquilo que o tem impedido de brotar nos seres
humanos. Princípios absolutamente equivocados são repetidos e
reiterados há séculos e não conseguimos ver suas falhas estruturais
justamente por causa dessa repetição. Enquanto isso, o ser humano é
condenado por não ser capaz de cumprir as exigências desses
mesmos princípios.
A humanidade de hoje é produto de uma cultura de cinco, seis,
dez mil anos. Mas é o ser humano que é acusado de estar errado, não
a cultura. Ele está definhando e a cultura continua sendo louvada.
Nossa grande cultura! Nossa grande religião! Tudo é visto como
algo grandioso. Mas veja os frutos disso!
Isso ninguém consegue enxergar. O homem está errado e tem
de mudar, é isso o que todos dizem. Ninguém ousa se pôr de pé e
questionar se o erro não estaria justamente nessa cultura e nessa
religião que, em dez mil anos, não foram capazes de preencher o ser
humano com amor. E, se o amor não evoluiu nos últimos dez mil
anos, qual é a chance de que ele venha a preencher o coração do
homem no futuro, se tomarmos por base essa mesma cultura e essa
mesma religião? Se isso não foi possível nos últimos dez mil anos,
por que seria nos próximos dez? O ser humano de hoje será o
mesmo de amanhã. A humanidade sempre e foi e sempre será igual
e, no entanto, nós continuamos elogiando nossa cultura e nossa
religião e beijando os pés dos santos. Não estamos nem sequer
prontos para considerar a possibilidade de que nossa cultura e nossa
religião estejam equivocadas.
O que eu estou afirmando aqui é que elas estão equivocadas. E
o ser humano de hoje é a maior prova disso. Que outra prova pode
haver? Se plantamos uma semente e os frutos são amargos e
venenoso, o que isso prova? Prova que a semente era amarga e
venenosa. Sem dúvida é difícil prever se uma semente dará frutos
amargos ou não. Você pode examiná-la com cuidado, pressioná-la
ou abri-la ao meio, mas não pode adivinhar se seus frutos serão
doces ou amargos. Plante uma semente e o broto rasgará a terra.
Anos se passarão, a árvore crescerá, seus galhos se estenderão em
direção ao céu e ela produzirá frutos. Só então será possível
descobrir se a semente era boa ou não.
O ser humano de hoje é o fruto das sementes da cultura e da
religião que foram plantadas há dez mil anos e vêm sido regadas
desde então. O fruto é amargo; está cheio de ódio e de conflitos. Mas
nós continuamos a louvar essas sementes e a achar que o amor
germinará a partir delas.
Quero dizer a você que isso não acontecerá, pois o potencial
básico para que o amor brote foi aniquilado pelas religiões. Elas o
corromperam. Existe mais amor entre os pássaros, os animais e as
plantas, que não têm nenhuma religião ou cultura, do que entre os
seres humanos. O amor é mais evidente nas tribos que vivem
embrenhadas na selva – e que supostamente não têm nenhum
religião, civilização ou cultura – do que nos povos considerados
progressivos, cultos e civilizados.
Por que os seres humanos ficam cada vez mais áridos de amor
à medida que vão se tornando mais cultos e civilizados, à medida
que se sujeitam à influência das religiões e que freqüentam mais
templos e igrejas para rezar? Certamente existem razões para isso e
eu quero comentar aqui sobre duas. Se elas forem entendidas, as
correntes do amor deixarão de ser represadas e poderão fluir
novamente.
Existe amor dentro de cada ser humano. Não é preciso
importá-lo de outro lugar, nem sair à procura dele. O amor está no
interior do homem. Ele é a vontade de viver que existe dentro de
cada um de nós. É a fragrância da vida que se espalha dentro de cada
pessoa. Mas esse amor está cercado por grandes muralhas e não
consegue se manifestar. Ao redor dele só existem rochas e a corrente
não pode fluir.
A busca pelo amor, a disciplina do amor não é algo que você
possa aprender na escola.
Um artista estava esculpindo um bloco de pedra. Um visitante
que viera saber como se fazia uma escultura não viu nenhum
vestígio de estátua, só pedra sendo talhada aqui e ali, com um
martelo e um cinzel. – O que você está fazendo? – perguntou o
visitante. – Não vai fazer uma estátua? Vim para ver como se faz
uma estátua e só vejo você talhando uma pedra!
O artista respondeu: – A estátua já está escondida aí dentro.
Não é preciso fazê-la. Só é preciso tirar a camada inútil de pedra que
existe em torno da estátua para que ela possa se mostrar. A estátua
não é feita, ela é descoberta. É preciso descobri-la, trazê-la à luz.
O amor também está oculto nos seres humanos; só é preciso
deixá-lo vir à luz. A questão não é gerar amor, mas descobri-lo. Nós
nos cobrimos de algo que não deixa o amor vir à superfície.
Tente perguntar a um médico o que é saúde. Por mais estranho
que pareça, nenhum médico do mundo sabe dizer o que é saúde!
Com toda a medicina preocupada com a saúde, ninguém é capaz de
dizer o que ela é. Se perguntar aos médicos, eles só irão discorrer
sobre doenças e sintomas. Eles sabem os termos técnicos que
servem para descrever cada doença, mas e a saúde? Sobre saúde,
eles nada sabem. Só podem afirmar que a saúde é o que resta quando
não existe nenhuma doença. Isso porque a saúde está oculta dentro
dos seres humanos. Ela está além da nossa capacidade de defini-la.
A doença vem de fora; por isso, pode ser definida. A saúde
vem de dentro; portanto, não pode ser definida. Só podemos dizer
que a saúde é a ausência de doenças. Mas isso não é uma definição,
pois não diz nada com respeito diretamente a ela. A verdade é que a
saúde não precisa ser criada. Ela é encoberta pela doença e se revela
quando a doença é curada. A saúde está dentro de nós. Ela faz parte
da nossa natureza.
O amor está dentro de nós. Ele também faz parte da nossa
natureza. Por isso não faz sentido esperar que os seres humanos
cultivem o amor. A questão não é cultivar o amor, mas investigar e
descobrir por que ele não consegue se manifestar. Qual é o
impedimento? Qual é a dificuldade? Onde está a barreira para a sua
manifestação?
Se não existem barreiras, o amor se manifesta naturalmente.
Não há necessidade de ensiná-lo ou explicá-lo às pessoas. O coração
de todos seria repleto de amor não fossem as barreiras da falsa
cultura e dos condicionamentos impostos. O amor é um sentimento
inevitável, ninguém pode deixar de senti-lo. Ele faz parte da nossa
natureza.
O Ganges nasce no Himalaia. É natural que ele flua; ele está
vivo, é feito de água, simplesmente flui até encontrar o mar. Ele não
precisa perguntar a um guarda ou a um padre como tem de fazer
para chegar ao mar. Você já viu um rio parado num cruzamento,
perguntando a um guarda como chegar ao mar? Não, a busca pelo
mar está oculta em seu próprio ser. Ele tem um impulso interior,
portanto, abrirá fendas nas montanhas, cruzará planícies e chegará
ao mar. Por mais distante que o mar possa estar, por mais oculto que
ele esteja, o rio certamente encontrará o caminho. Ele não tem
nenhum guia ou mapa que indique por onde passar... mas é certo que
chegará ao seu destino.
Mas suponhamos que se construa uma barragem que impeça o
rio de seguir o seu caminho. Suponhamos que se construam diques
em torno dele. O que acontecerá? O rio pode vencer barreiras
naturais, mas, se o homem construir diques para represá-lo, é
possível que ele não consiga chegar ao mar.
É importante entender essa diferença. Nenhuma barreira
natural é de fato uma barreira; é por essa razão que o rio consegue
chegar ao mar. Transpondo montanhas, ele chega ao mar. Mas, se os
seres humanos constróem barreiras, tomam providências para contê-
lo, eles podem impedir que o rio chegue ao mar.
Na natureza, existe uma harmonia, uma unidade fundamental.
Os obstáculos naturais, as obstruções aparentes encontradas na
natureza são talvez desafios para despertar energia; elas servem
como estímulos para invocar o que está latente no ser. Quando
plantamos uma semente, parece que a camada de terra jogada sobre
ela a pressiona para baixo, dificultando o seu crescimento. Mas isso
não é verdade; sem essa camada de terra, a semente não conseguiria
germinar. Embora pareça que a terra sufoca a semente, na realidade,
ela a pressiona para que possa amadurecer, desintegrar-se e
transformar-se num broto. Externamente, é como se o solo a
impedisse de brotar, mas ele é só um amigo; está ajudando a
semente a crescer.
A natureza é uma sinfonia harmoniosa, cadenciada. Mas a
artificialidade que os seres humanos têm imposto à natureza, as
coisas que eles têm construído sobre ela e os artifícios mecânicos
que têm lançado sobre a corrente da vida criaram obstáculos. Muitos
rios deixaram de correr e depois foram culpados por isso. Mas não
há nenhuma necessidade de se culpar a semente. Quando ela não
germina, dizemos que a terra talvez não seja propícia, que a rega não
foi suficiente ou que a semente recebeu pouca luz. Mas, se a flor do
amor não desabrocha na vida de uma pessoa, nós a culpamos por
isso. Ninguém pensa que talvez o solo não fosse propício ou que
talvez não houvesse água e calor suficientes para que a planta
crescesse e pudesse dar flores.
As obstruções básicas são responsabilidade do homem, são
criadas pelo próprio ser humano. Do contrário, o rio do amor
poderia fluir e chegar ao mar da vida. O ser humano está aqui para
que seu amor possa fluir e chegar à divindade.
Quais são esses obstáculos criados pelo homem? Em primeiro
lugar, o fato de que toda a cultura humana é até hoje contra o sexo,
contra a paixão. Essa barreira, essa negação, acabou com a
possibilidade de que o amor nasça entre os seres humanos.
A verdade pura e simples é que o sexo é o ponto de partida de
todas as jornadas para o amor. O início da jornada para o amor – o
Gangotri do amor, a fonte, a origem do Ganges do amor – é o sexo.
E todo mundo é inimigo dele – todas as culturas, todas as religiões,
todos os gurus, todos os santos têm atacado o próprio Gangotri, a
própria fonte, represando o rio: “Sexo é pecado... é anti-religioso... é
um veneno!” E nunca compreendemos que é a energia sexual que
acaba por se transformar e se transmudar em amor.
A evolução do amor nada mais é que energia sexual
transformada. Diante de um pedaço de carvão, nunca ocorre a você
que ele poderia se transformar num diamante. Não existe nenhuma
diferença básica entre o diamante e o carvão. Os elementos que os
compõem são os mesmos. Depois de passar por um processo que
leva milhares de anos, o carvão vira um diamante.
Mas o carvão não é considerado um artigo valioso. Quando
estocado em casa, ele é mantido longe dos olhos das visitas. Os
diamantes são usados em volta do pescoço ou sobre o peito, de
modo que todos possam vê-lo. O diamante e o carvão são a mesma
coisa, mas não parece existir nenhuma relação visível entre eles,
nenhuma consciência de que eles não passam de dois pontos da
jornada de um mesmo elemento. Se você for contra o carvão – o que
é bem provável, pois à primeira vista ele nada mais é do que fuligem
preta –, a possibilidade de que ele se transforme em diamante cai por
terra. Mas o carvão pode vir a ser um diamante.
É a energia sexual que se transforma em amor. Mas todo
mundo é contra ela, é inimiga dela – até mesmo aqueles
considerados pessoas de bem. Essa oposição não permite que a
semente germine e o palácio do amor é destruído em seus alicerces.
O carvão nunca se transforma em diamante porque a aceitação
necessária para que ele evolua, para que se transforme, está fora de
cogitação. Como algo considerado nosso inimigo, contra a qual só
demonstramos oposição e estamos permanentemente em guerra
pode ser transformado?
Estão jogando o homem contra a sua própria energia. Ele está
sendo levado a lutar contra sua energia sexual. Na superfície, espera-
se que o homem se livre de todos os seus conflitos, lutas e batalhas.
Mas, no fundo, ele é levado a lutar: “A mente está corrompida,
portanto, lute contra ela – é preciso combater essa corrupção. O sexo
é pecado, portanto, lute contra ele”. Espera-se que o homem fique
livre de todos os conflitos! Os próprios ensinamentos que são a base
dos seus conflitos interiores exigem que ele se livre de todos esses
conflitos! De um lado, levam o homem à loucura; de outro,
constróem sanatórios para tratá-lo. Disseminam os germes da
doença e ao mesmo tempo constróem hospitais para tratá-la.
É fundamental entender uma coisa: o ser humano não pode ser
separado do sexo. O sexo é a própria fonte da vida; ela nasce do
sexo. A existência aceitou a energia do sexo como o ponto de partida
da criação, e os santos a consideram pecaminosa... algo que a
própria existência não considera um pecado! E se você pensa em
Deus como o criador e se Ele considerasse o sexo um pecado, não
haveria maior pecador neste mundo, neste universo, do que Ele
próprio!
Veja uma flor desabrochando – já lhe ocorreu que o
desabrochar de uma flor é um ato sexual? O que acontece quando a
flor desabrocha? As borboletas pousam na flor e carregam seu pólen,
seu esperma, para outra flor. Um pavão dança em toda a sua glória –
os poetas cantarão essa glória, os santos se encherão de alegria ao
vê-lo. Mas será que eles não têm consciência de que essa dança é
uma expressão patente de paixão; que, antes de tudo, trata-se de um
ato de conotação sexual? O pavão dança para seduzir a fêmea. Sua
dança é um chamado. O pássaro canta, o pavão dança, o menino vira
adolescente, a menina cresce e se torna uma linda mulher – todas
essas são expressões da energia sexual. Trata-se de manifestações
diferentes da mesma energia. Toda vida, toda expressão, todo
florescimento é, basicamente, energia sexual. E é por causa dessa
energia que as religiões e as culturas corromperam a mente do
homem. Elas estão tentando fazer com que o homem lute contra ela.
Estão envolvendo o homem nessa batalha contra sua própria energia
básica e o estão deixando fraco, patético, mentiroso, desprovido de
amor e de humanidade.
Não se deveria lutar contra o sexo, mas sim fazer dele um
aliado e elevar às alturas a corrente da vida.
Enquanto abençoava um casal, um sábio seguidor dos
Upanishades disse à noiva: – Que você possa ser mãe de dez
crianças e seu marido se torne seu décimo primeiro filho”. Quando a
paixão é transformada, a esposa se torna mãe; quando a luxúria é
transformada, o sexo se torna amor. Somente a energia sexual pode
florescer em energia de amor.
Mas temos bombardeado os seres humanos com antagonismos
com respeito ao sexo. Em conseqüência disso, não só o amor deixou
de florescer dentro deles – pois o amor é uma evolução da energia
sexual e só pode surgir quando a aceitamos –, como a mente passou
a ficar cada vez mais erótica graças a essa oposição ao sexo. Todas
as canções, todos os poemas, todas as pinturas e obras de arte, todos
os templos e imagens que eles ostentam giram, direta ou
indiretamente, em torno do sexo. Nossa mente gira em torno do
sexo. Nenhum animal deste mundo é tão sexual quanto o ser
humano. O homem é sexual o tempo todo – quando acorda, quando
dorme, quando senta, quando caminha. O sexo passou a ser tudo
para ele. Por causa dessa inimizade contra o sexo, dessa oposição e
repressão, o sexo é como uma úlcera em seu ser.
O ser humano não pode se livrar de algo que é a raiz da sua
própria vida. Mas, em função desse constante conflito interior, todo
o seu ser pode ficar doente – e está doente. As chamadas religiões e
culturas são as maiores responsáveis pela sexualidade excessiva que
é tão evidente no gênero humano. Os responsáveis por isso não são
considerados pervertidos, mas santos e pessoas de bem. Até que toda
a raça humana se livre dos erros e crueldades desses líderes
religiosos e dessas “pessoas de bem”, não haverá nenhuma
possibilidade de que o amor brote no coração do homem.
Lembro-me de algo que aconteceu:
Um homem santo estava um dia saindo de casa para ver um
conhecido quando se deparou, no portão, com um amigo de infância.
Ao vê-lo, deu-lhe as boas-vindas e perguntou: – Onde você esteve
todos esse anos? Entre! Eu prometi encontrar uns amigos e seria
difícil adiar a visita agora, mas entre e descanse em minha casa. Eu
voltarei dentro de uma hora, mais ou menos, e então poderemos
conversar bastante. Há muito tempo que eu quero vê-lo.
O amigo contestou: – Não seria melhor se eu fosse com você?
Minhas roupas estão sujas, mas se você me emprestar algumas
limpas, eu posso me trocar e acompanhar você.
Alguns dias antes, um homem abastado havia dado ao santo
algumas roupas caras e ele as guardara para uma ocasião especial.
Com satisfação ele as emprestou ao amigo, que logo vestiu o
elegante casaco, o turbante e os belos sapatos. Ele parecia um rei!
Olhando para o amigo, o homem santo ficou enciumado, pois perto
dele ele próprio parecia um simples criado. Então achou que tinha
sido um erro emprestar ao outro suas melhores roupas e começou a
se sentir inferior. Agora todo mundo só prestaria atenção ao seu
amigo, ele pensou, e ele pareceria um criado. As roupas lhe
pertenciam, mas aos olhos dos outros ele pareceria um mendigo.
Ele tentou acalmar a mente, lembrando a si mesmo que era um
homem de Deus, que falava com Ele, e pensando o tempo todo em
coisas nobres. Afinal de contas, que importância tinha um casaco
elegante ou um caro turbante? Que diferença poderiam fazer? Mas
quanto mais ele tentava se convencer, mais obcecado ficava com o
casaco e o turbante.
Ele tentava conversar com o amigo sobre outros assuntos, mas,
por dentro, não pensava em outra coisa além do casaco e do
turbante. No caminho, embora andassem lado a lado, as pessoas só
prestavam atenção ao amigo dele; ninguém o notava. O homem
começou a ficar deprimido.
Então chegaram à casa das pessoas que iam visitar e ele
apresentou seu acompanhante: – Este é Jamaal, um amigo de
infância. É um homem encantador! E, sem poder se conter, soltou: –
Quanto às roupas, são minhas!
O amigo ficou chocado. E os anfitriões também; que tipo de
comportamento era esse? O pobre homem então percebeu que o
comentário fora inoportuno, mas já era tarde demais. Arrependeu-se
da besteira que fizera e reprimiu-se ainda mais.
Ao sair da casa dos amigos, ele se desculpou:
O amigo respondeu: – Fiquei pasmo. Como pôde dizer uma
coisa daquelas?
O homem santo respondeu, constrangido: – Sinto muito, foi
sem querer.
Mas as pessoas nunca dizem nada que não queiram. Às vezes,
elas deixam escapar alguma coisa, mas nada no qual já não tivessem
pensado antes. Ele disse: – Perdoe-me, não sei como pude falar uma
coisa dessas. – Mas ele sabia muito bem que o pensamento tinha
surgido em sua mente.
Dirigiram-se então para a casa de outro amigo. O homem santo
não parava de repetir a si mesmo que não deveria mencionar que as
roupas eram dele; mais uma vez ele tentou controlar seus
pensamentos. Quando chegaram ao portão da casa que visitariam,
ele tomou a firme resolução de que não diria nada sobre as roupas.
O pobre homem não percebia que, quanto mais resolvido
estava de que não deveria dizer nada, mais crescia dentro dele a
consciência de que todos deveriam saber que as roupas eram dele.
Afinal, quando se toma uma resolução como essa? Quando alguém
toma uma firme resolução, como um voto de celibato, por exemplo,
isso só significa que sua sexualidade está pressionando
desesperadamente para poder se expressar. Caso contrário, por que
essa pessoa precisaria tomar uma resolução tão firme? Se uma
pessoa decide comer menos ou fazer um jejum, isso significa que ela
tem uma vontade incontrolável de comer mais. Esses esforços
sempre acabam gerando um conflito interior. Estamos combatendo
nada mais nada menos que as nossas próprias fraquezas. O conflito
interior é, portanto, uma conseqüência natural.
Assim, travando essa batalha interior, o homem santo entrou na
casa do outro amigo. Ele começou a apresentar o amigo com muita
cautela, mas percebeu que ninguém prestava atenção nele. Todos
olhavam para o outro e para as roupas que usava. Isso mexeu com
ele: Este casaco é meu, assim como o turbante!, pensou ele, mas
lembrou-se a tempo de que resolvera não falar das roupas. Ricas ou
pobres, todas as pessoas têm roupas de um tipo ou de outro. Essa é
uma questão trivial, todo esse mundo é maya, é ilusão, ele dizia a si
mesmo. Mas as roupas oscilavam em frente aos seus olhos como um
pêndulo, de um lado para o outro.
Ele decidiu abreviar as apresentações: – Este é um amigo de
infância. Um honrado cavalheiro. E as roupas... são dele, não são
minhas!
As pessoas ficaram surpresas. Nunca tinham ouvido uma
apresentação como essa: “As roupas são dele, não minhas!”
Quando foram embora, ele se desculpou profusamente: – Que
bela asneira eu disse! – Agora nem sabia direito o que fazer ou
deixar de fazer: Eu nunca dei nenhuma importância a roupas antes.
O que está acontecendo comigo? O pobre sujeito não sabia que a
estratégia que usava consigo mesmo nunca daria certo.
O amigo, agora totalmente indignado, disse então que não o
acompanharia mais a lugar nenhum. O suposto homem de Deus
agarrou o braço do outro e implorou: – Por favor, fique! Eu serei
infeliz pelo resto da vida por ter tratado um amigo dessa maneira.
Juro que não mencionarei as roupas novamente. De todo o coração,
juro por Deus que não direi mais nada sobre as roupas.
Mas sempre se deve desconfiar daqueles que juram, pois
obviamente existe dentro deles algo mais profundo que o juramento
que fazem – e contra o qual tiveram de jurar. O juramento ou a
resolução acontecem num nível superficial, exterior. São feitos pela
mente consciente. Mas aquilo contra o qual a resolução foi tomada
encontra-se nas profundezas, nos labirintos da mente subconsciente.
Se a mente fosse dividida em dez frações, somente uma delas, a
mais exterior, comprometer-se-ia com o juramento; as outras nove
ficariam contra ela. O voto de celibato, por exemplo, é feito por uma
parte da mente, enquanto o resto dela, as outras nove partes, está
implorando à existência por ajuda, está implorando por aquilo que a
própria existência implantou nos seres humanos.
Eles foram então à casa de outro amigo. O homem santo
procurava se conter, com medo até de respirar.
As pessoas controladas são muito perigosas, pois um vulcão
ativo ferve dentro delas; só externamente são firmes e controladas.
Nunca se esqueça de que tudo que é controlado requer tanto esforço
e energia que é impossível manter esse controle por muito tempo.
Uma hora você vai ter de relaxar, de descansar. Por quanto tempo
consegue ficar com o punho cerrado? Vinte e quatro horas? Quanto
mais força você fizer para cerrá-lo mais rápido se cansará e mais
depressa terá de abri-lo. Tudo requer um esforço e, quanto maior ele
for, mais rápido ele cansa e produz um efeito contrário. Sua mão
pode permanecer sempre aberta, mas não pode ficar cerrada o tempo
todo. Nada que exija esforço pode ser espontâneo, tornar-se uma
parte natural da vida. Se exige esforço, também exige descanso.
Portanto, quanto mais controlado for um santo, mais perigoso ele é –
pois chegará um momento em que terá de relaxar e afrouxar esse
controle. Depois de passar 24 horas se controlando, ele terá de
descansar por uma ou duas horas, e nesse período haverá um tal
levante de “pecados” reprimidos que a vida dele virará um inferno.
Então o homem santo e seu convidado foram para a casa de
outro amigo. O primeiro vigiava-se o tempo todo para não falar nada
sobre as roupas. Imagine a situação! Se você é uma pessoa pelo
menos um pouco religiosa, pode ter uma idéia dessa situação. Se já
jurou não fazer algo ou fez algum voto de que se controlaria, você
sabe muito bem o estado lamentável da mente de uma pessoa nessas
condições.
Quando entraram na casa, o homem santo sentia tamanho
tumulto interior que não parava de suar. O amigo também ficou
preocupado ao vê-lo tão tenso.
Devagar, escolhendo cada palavra com todo cuidado, ele fez as
apresentações: – Este é um amigo meu. Um velho amigo, um
homem muito bom... Por um momento, ele vacilou. E, como se um
impulso furioso viesse de dentro dele, varrendo para longe todo seu
autocontrole, ele falou abruptamente: – Quanto às roupas, vocês vão
me desculpar, mas eu jurei não falar nada sobre elas!
O que aconteceu a esse homem acontece com toda a
humanidade quando o assunto é sexo. Por se condenado, ele passou
a ser uma obsessão, uma doença, um ferida. Foi corrompido.
Desde cedo, a criança aprende que sexo é pecado. Meninos e
meninas aprendem que sexo é pecado. Eles crescem, chegam à
adolescência, então se casam e a jornada rumo ao mundo do sexo se
inicia com a forte convicção de que sexo é pecado. Na Índia,
também ensinam às meninas que o marido é seu deus. Como elas
podem reverenciar como um deus alguém que as toma em pecado?
Como isso é possível? Ao rapaz, eles dizem: – Esta é sua esposa, sua
companheira para toda a vida, sua cara-metade. – Mas ela o está
levando para o Inferno – pois as escrituras dizem que a mulher é a
porta para o inferno. Ele então pensa: “Essa porta para o inferno é a
minha companheira para toda a vida? Minha cara-metade? Essa é a
minha esposa? O limiar do inferno, um ser orientado para o
pecado?” Como poderá haver harmonia na vida desse casal?
Esses ensinamentos têm destruído a vida conjugal de pessoas
do mundo inteiro. Quando a vida do casal é destruída dessa maneira,
deixa de haver qualquer possibilidade de amor. Afinal, se marido e
mulher não podem se amar livremente – quando o fogo da paixão é
mais espontâneo e natural – , então quem pode amar a quem? Esse
mesmo amor entre marido e mulher pode ser elevado às alturas,
pode atingir dimensões tão sublimes que ponha abaixo todas as
barreiras e se expanda cada vez mais. Isso é possível. Contudo, se
ele for cortado pela raiz, se for reprimido, corrompido, não haverá
mais nada para crescer, nada para se expandir.
Procure dentro de você: onde está o seu ego? Onde está o seu
“eu”? Você não encontrará esse “eu” em parte alguma. Ele é só uma
combinação de muitas energias; só isso. Continue buscando cada
parte que o compõe, cada aspecto desse “eu”, e você não encontrará
nada. No final, nada restará.
O amor nasce desse nada – pois só um vazio é capaz de se
fundir com outro vazio; só o vácuo pode se incorporar a outro
vácuo. Só dois vazios podem se encontrar, nunca duas pessoas, pois
entre dois vazios não existe nenhuma barreira. As pessoas sempre
levantam muros em torno de si.
Portanto, lembre-se, quando a personalidade se desvanece, o
“eu” como indivíduo deixa de existir. Só o todo permanece. Quando
isso acontece, todas as barreiras, todos os muros desmoronam e o
Ganges do amor, oculto interiormente, volta a fluir. Ele está sempre
pronto, dentro de você, para se tornar um vácuo e retomar seu curso.
Nós cavamos um poço. A água já está dentro dele; não
precisamos trazê-la de outro lugar. Só é preciso retirar a terra e as
pedras. O que estamos fazendo quando cavamos um poço? Criamos
um vazio para que a água que está debaixo da terra possa vir à tona,
tenha um espaço onde possa se mostrar. Ela já está ali dentro,
esperando um espaço para se manifestar. Ela anseia por um vazio
que não está encontrando. O poço está cheio de areia e de pedras,
portanto, quando retiramos todo esse entulho, a água pode jorrar.
Do mesmo modo, o amor já está no interior dos seres
humanos; ele só precisa de espaço, de um vazio onde possa aflorar.
Mas nós estamos cheios de ego, todo mundo anda por aí se
vangloriando do próprio “eu”. Lembre-se, enquanto o seu ser estiver
gritando “eu”, você está cheio de entulho e a corrente subterrânea do
amor não tem como vir à superfície – você ainda não cavou o poço.
Li uma bela história chamada The Giving Tree, da autoria de
Shel Silverstein. Existiu certa vez uma árvore muito antiga e
majestosa, com galhos que se estendiam para o céu. Quando ela
florescia, borboletas de todas as formas, cores e tamanhos dançavam
à sua volta. Quando ela dava frutos, pássaros vinham de longe para
se empoleirar em seus galhos. Eles eram como braços abertos ao
vento, à espera dos que procuravam sua sombra.
Havia um garotinho que costumava brincar todos os dias sob
essa árvore e ela passou a cultivar uma grande afeição por ele. O
grande, o ancião, pode se afeiçoar ao pequeno e jovem se não tiver
consciência de que é grande. A árvore não tinha essa consciência –
só os seres humanos têm esse tipo de conhecimento –, portanto,
afeiçoou-se ao garoto. O ego sempre tenta amar o que é grande,
sempre procura se relacionar com o que é maior que ele. Mas, para o
amor, ninguém é grande ou pequeno. Ele abraça qualquer um que
esteja por perto.
Assim, a árvore nutriu um grande amor por esse menino que
costumava brincar perto dela. Seus galhos eram altos, mas ela os
curvava e os inclinava para baixo, de modo que ele pudesse colher
suas flores e comer de seus frutos. Ao contrário do ego, o amor está
sempre pronto a se curvar. Se alguém tenta se aproximar do ego, ele
procura se elevar ainda mais, esticando-se ao máximo para que não
seja possível alcançá-lo. Todo aquele que é acessível, ele considera
pequeno. Mas o que não se deixa atingir, o que está no trono do
poder, ele considera grandioso.
O garotinho vinha brincar e a árvore curvava seus galhos.
Quando ele colhia suas flores, a árvore ficava radiante, todo o seu
ser era preenchido com a alegria do amor. O amor sempre fica feliz
quando pode dar alguma coisa; o ego só fica satisfeito quando
consegue algo para si.
O menino cresceu. Às vezes ele dormia sob a árvore, às vezes
comia seus frutos e outras vezes fazia uma coroa com suas flores e
fingia que era o rei da selva. Qualquer um de nós vira rei quando
está cercado pelas flores do amor, mas tornamo-nos pobres e
miseráveis quando os espinhos do ego ferem a nossa pele. Ver o
garoto usando a coroa de flores e dançando ao redor dela, enchia a
árvore de alegria; ela balançava de amor e cantava ao sabor da brisa.
O menino cresceu mais ainda e virou um rapaz. Ele começou a subir
na árvore e a se balançar em seus galhos. A árvore sentia imensa
alegria quando ele descansava em seus galhos. O amor fica feliz
quando dá conforto a alguém; o ego só fica feliz quando tira o
conforto de alguém.
À medida que o tempo passava, o rapaz começou a ter outras
tarefas e obrigações. Sua ambição aumentou; ele tinha de passar nas
provas, tinha amigos a quem superar e por isso deixou de visitar a
árvore com tanta freqüência. Mas a árvore continuou esperando por
ele ansiosamente. Chamava-o com toda a sua alma: – Venha, venha!
Estou esperando você! – O amor sempre espera pela pessoa amada.
O amor é uma espera. A árvore ficava triste quando o rapaz não
vinha. O amor só tem uma tristeza: quando não pode ser
compartilhado; o amor se entristece quando não pode se entregar;
mas, quando pode se render totalmente, o amor é extremamente
feliz.
O rapaz ficou mais velho e quase não vinha mais visitar a
árvore. Todos os que crescem e se tornam grandes no mundo da
ambição têm cada vez menos tempo para o amor. O rapaz era agora
ambicioso e só encontrava tempo para assuntos mundanos: “Árvore?
Que árvore? Por que eu deveria visitá-la?”
Um dia, quando ele passava, a árvore o chamou: – Ouça! Estou
esperando-o, mas você nunca vem. Espero por você todos os dias!
– Por que você acha que eu tenho de ver você? O que você tem
para me dar? – retrucou o rapaz. – Estou atrás de dinheiro. – O ego
sempre tem uma motivação. – O que você tem a me oferecer? Só
vou vê-la se receber algo em troca. – O ego sempre quer um motivo,
um propósito. O amor não precisa de motivos nem propósitos. Poder
amar é a sua maior recompensa.
Chocada, a árvore disse: – Você só virá se eu lhe der algo em
troca? Eu só posso dar o que tenho. – Aquele que nega não ama. O
ego nega, o amor dá incondicionalmente. – Mas eu não tenho
dinheiro. Isso é uma invenção humana. Nós, árvores, não temos essa
doença e somos felizes assim. Flores brotam em nós. Frutos pendem
de nossos galhos. Oferecemos uma sombra refrescante. Dançamos
com a brisa e cantamos canções. Pássaros inocentes empoleiram-se
nos nossos galhos e gorjeiam porque não temos dinheiro algum. No
dia em que nos preocuparmos com dinheiro, também passaremos a
ser fracas e miseráveis como os seres humanos, que freqüentam
templos e ouvem sermões sobre como conquistar a paz, como
encontrar o amor... Não, nós não temos dinheiro nenhum.
– Então por que eu deveria vir aqui? – perguntou o rapaz. – Eu
tenho de ir aonde há dinheiro. Eu preciso de dinheiro. – O ego quer
dinheiro porque dinheiro é poder. O ego precisa de poder.
A árvore refletiu profundamente e então teve uma idéia: – Faça
o seguinte. Colha os meus frutos e coloque-os à venda. Assim você
ganhará dinheiro!
Os olhos do rapaz brilharam. Ele subiu na árvore e colheu
todos os frutos, até mesmo os que estavam verdes. A violência dele
fez com que galhos se quebrassem e folhas fossem arrancadas, mas a
árvore ficou feliz e satisfeita. Mesmo a dor traz felicidade ao amor.
Mas o ego, mesmo quando ganha algo, não fica feliz.
O rapaz nem sequer se voltou para agradecer à árvore. Mas ela
nem notou. Sentia-se grata só pelo fato de o rapaz aceitar sua oferta
de amor: colher e vender seus frutos.
O rapaz ficou muito tempo sem aparecer. Ele ganhara dinheiro
e estava ocupado tentando fazer com que ele se multiplicasse.
Esquecera totalmente da árvore. Anos se passaram. A árvore ficou
triste. Ela esperava ansiosamente que ele voltasse, como a mãe que
procura o filho perdido, com os seios repletos de leite. Todo o seu
ser anseia pela criança, busca desesperadamente encontrá-la para
que possa sentir algum alívio. Assim era o choro interior da árvore.
Todo o seu ser estava em agonia.
Depois de muitos anos, o rapaz, já adulto, voltou para ver a
árvore.
– Aproxime-se, venha me abraçar. – pediu a árvore.
– Que bobagem é essa?! – respondeu o homem. – Não sou
mais criança. – O ego considera o amor uma bobagem, uma fantasia
infantil.
Mas a árvore lhe fez um convite: – Venha, balance nos meus
galhos. Venha dançar comigo!
– Pare com essa conversa fiada! – replicou o homem. – Quero
construir uma casa. Você pode me dar uma casa?
– Uma casa?! – exclamou a árvore. – Eu não preciso de uma
casa para viver.
Só os seres humanos vivem em casas. Nenhum outro ser deste
mundo vive numa casa, a não ser o homem. E veja as condições em
que ele está! Em que condição está esse homem que vive confinado
entre quatro paredes? Quanto maior a casa, mais insignificante o
homem se torna.
– Nós não precisamos de casas para morar – disse a árvore. –
Mas você pode cortar meus galhos e construir com eles uma casa.
Sem perder tempo, o homem foi buscar um machado e cortou
todos os galhos da árvore. A árvore se tornou apenas um tronco nu.
Mas ela estava feliz assim. O amor fica feliz mesmo quando seus
membros são mutilados pelo ser amado. Amor é doação; o amor está
sempre pronto para compartilhar.
O homem não se deu ao trabalho de agradecer à árvore.
Construiu sua casa. Os dias se passaram e se transformaram em
anos.
O tronco não se cansou de esperar. Ele queria chamar o
homem, mas não tinha nem galhos nem folhas que lhe dessem uma
voz. O vento soprava, mas ela não tinha como chamá-lo. Mas, em
sua alma, ainda ressoava um único apelo: – Venha, venha meu bem-
amado. Venha!
Um longo tempo se passou e o homem foi ficando velho. Certa
vez, ele estava passando pela árvore e resolveu parar.
– O que mais posso fazer por você? – perguntou a árvore. –
Faz tanto tempo que você não vem!
– O que pode fazer por mim? – Perguntou o velho. – Meu
desejo é viajar por terras distantes e ganhar mais dinheiro. Mas para
isso preciso de um barco.
Alegremente, a árvore disse: – Corte meu tronco e faça com
ele um barco. Ficarei muito feliz em ser um barco e em ajudá-lo a
ganhar mais dinheiro em terras distantes. Só não deixe de tomar
cuidado e de voltar logo. Estarei esperando a sua volta.
O homem trouxe uma serra, cortou o tronco, fez um barco e se
pôs a navegar.
Agora a árvore era apenas um toco. Ela esperava pela volta do
seu amado. Nunca se cansava de esperar. No entanto, já não tinha
nada a oferecer. Talvez o homem nunca voltasse; o ego só vai aonde
possa ter alguma vantagem. Ele nunca vai aonde não há nada a
ganhar.
Uma noite, eu estava descansando perto do toco da árvore. –
Aquele amigo meu não voltou ainda – ela sussurrou para mim. –
Estou muito preocupada, pois ele pode ter se afogado ou se perdido.
Pode estar perdido num daqueles países distantes. Pode ser que nem
esteja vivo. Como eu gostaria de ter notícias dele! Meu fim está
próximo e eu ficaria satisfeita se, ao menos, tivesse notícias dele.
Assim eu poderia morrer feliz. Mas ele não viria mesmo que eu
pudesse chamá-lo. Não tenho mais nada para lhe dar e ele só
entende a linguagem do pegar e tomar.
O ego só entende a linguagem do pegar e tomar; o amor só
entende a linguagem do dar.
Não há mais nada a dizer. Se a vida pudesse se transformar
nessa árvore e seus galhos se espalhassem em todas as direções, para
poder oferecer a todos a sua sombra, então conseguiríamos
compreender o que é o amor. Não existem escrituras, definições ou
doutrinas para o amor. O amor não se resume a princípios.
Quando cheguei para dar essa palestra, eu estava tentando
imaginar o que poderia dizer sobre o amor. O amor é algo tão difícil
de descrever! Tudo o que eu poderia fazer era vir e me sentar aqui –
se o amor pudesse chamejar em meus olhos, talvez ele pudesse, ou
se pudesse ser sentido nos gestos que faço com as mãos, então vocês
poderiam compreender e dizer: Isto é amor.
Mas o que é o amor? Se ele não puder ser visto em meus olhos
ou sentido no movimento das minhas mãos, então certamente nunca
poderá ser compreendido por meio de palavras.
Estou grato por terem me ouvido de modo tão terno e
silencioso. E agora, para acabar, eu me curvo diante do deus que
mora dentro de todos vocês. Por favor, aceitem meus respeitos.
2. A Atração Básica
3. A Outra Porta
5. Do Carvão ao Diamante
Talvez você ainda não tenha se dado conta de que é inútil fazer
perguntas sobre Deus a alguém que você nem mesmo considera uma
autoridade em sexo. Você perguntaria a alguém sobre o último
degrau da escada se essa pessoa não soubesse nada sobre o
primeiro? Se você não consegue aceitar o que eu tenho a dizer sobre
sexo, então não convém que me faça nenhuma pergunta sobre Deus
– a questão é essa. Se você não me considera capaz de falar sobre o
primeiro degrau, como posso ter competência para falar sobre o
último?
Mas existe uma razão mais profunda por trás dessa questão: até
agora, Deus e o sexo têm sido considerados inimigos um do outro.
Até agora, as pessoas são levadas a pensar que a busca pelo
transcendental não tem relação nenhuma com o sexo e que o
conhecimento sobre sexo não tem nenhuma relação com a
espiritualidade e com Deus. Essas duas idéias são ilusórias. A
jornada para o sexo só existe graças à jornada para o divino. Essa
grande atração pelo sexo nada mais é do que a busca pelo
transcendente e é por isso que o sexo nunca satisfaz. O sexo nunca
deixa a impressão de que a jornada está completa. Esse sentimento
só é possível quando se alcança a divindade.
Aqueles que estão em busca de Deus mas ao mesmo tempo
reprovam o sexo, na verdade, não estão em busca de Deus; isso nada
mais é que escapismo em nome da espiritualidade. Essas pessoas se
escondem atrás de Deus, atrás do transcendental, para fugir do sexo.
Isso porque elas temem o sexo, morrem de medo de sexo. Elas
procuram se refugiar na repetição de mantras e preces, na tentativa
de esquecer o sexo.
Sempre que você cruzar com um homem entoando o nome de
Deus, observe-o com atenção: por trás da repetição do nome de
Deus, oculta-se o eco do sexo. Se uma mulher entrar no seu campo
de visão, essas pessoas começarão a recitar o seu rosário – “Rama,
Rama, Rama” –, passando rapidamente as contas e entoando o nome
de Rama aos berros. Por quê? O clamor do sexo que existe dentro
desses escapistas começa a aumentar e eles tentam ignorá-lo,
sufocando-o, reprimindo-o, por meio da recitação do nome de Deus.
Se truques simples como esse tivessem o poder de mudar a vida das
pessoas, o mundo seria há muito tempo um lugar muito melhor! A
coisa não é tão fácil assim.
É preciso antes entender o sexo para depois entender a busca
espiritual. Por quê? Imagine alguém que queira ir de Bombaim a
Calcutá, pedindo informações sobre como chegar ao seu destino.
Mas se essa pessoa não tiver nem idéia de onde fica Bombaim,
como conseguirá chegar a Calcutá? Para ir de uma cidade à outra, é
necessário que ela saiba onde fica Bombaim, qual é a sua
localização – “Onde fica essa cidade em que me localizo agora?” Só
então ela poderá se dirigir a Calcutá. Sem conhecer a localização de
Bombaim, todas as informações a respeito de Calcutá ficarão sem
sentido, pois a jornada tem de começar de Bombaim. O ponto inicial
vem primeiro. O destino vem depois.
Onde você está agora? Você diz que anseia pela jornada que o
levará à supraconsciência – ótimo! Você diz que quer chegar até
Deus – muito bom! Mas em que ponto você se encontra agora? Você
está no estágio do sexo, da luxúria. É aí que você vive e é desse
ponto que tem de partir e começar sua jornada. Portanto, em
primeiro lugar é preciso entender o ponto em que você está agora.
Você tem de conhecer a realidade para então perceber a
possibilidade. Para saber onde você pode chegar, é preciso primeiro
saber onde você está. Para compreender qual é o último passo, é
preciso antes compreender qual é o primeiro, pois é essa primeira
etapa que preparará o caminho para a última etapa da jornada. Se o
primeiro passo for na direção errada, como será possível chegar no
destino certo?
Portanto, é mais importante entender primeiro o sexo do que
entender o que é supraconsciência. Por que isso é tão importante?
Porque você nunca chegará ao transcendental sem antes entender o
sexo. Então, por favor, não faça perguntas sobre essa
impossibilidade.
No que diz respeito à questão de autoridade, como você pode
saber se sou ou não uma autoridade em sexo? Com respeito à sua
pergunta, nada que eu disser adiantará, pois sou eu mesmo o assunto
em consideração. Se eu lhe disser que eu sou uma autoridade ou que
eu não sou uma autoridade, isso não fará a mínima diferença, pois o
tema em debate será justamente descobrir se a pessoa que está
fazendo essa afirmação é uma autoridade ou não. Por isso, nada que
eu disser a esse respeito poderá ser levado em conta.
Tudo o que eu digo é: pratique sexo e descubra por si mesmo
se eu sou ou não uma autoridade no assunto. Você só constatará se as
minhas afirmações são verdadeiras quando passar pela experiência.
Não existe outro jeito.
Por exemplo, se eu dissesse que o método tal é o melhor para
se aprender a nadar, você poderia duvidar de que eu estivesse
dizendo a verdade. Minha resposta seria mandá-lo a um lugar onde
você pudesse nadar comigo. Se o meu método o ajudasse a aprender
a nadar, então você saberia que o que eu disse não era mentira ou
pura bobagem.
A pessoa que fez a pergunta também disse que Freud poderia
ser considerado uma autoridade. Mas o mais provável é que Freud
não soubesse nada a respeito do que estou falando aqui. Freud nunca
poderia ir além do nível mental. Ele não fazia idéia da existência do
sexo espiritual. Todo o trabalho de Freud, tudo o que ele sabia, diz
respeito ao sexo patológico: comportamento histérico, masturbação;
toda a sua pesquisa é sobre isso, sobre sexo patológico e pervertido.
Freud era médico e tudo o que ele pretendia era achar um tratamento
para essas patologias. Portanto, o estudo que ele fez sobre as pessoas
– ocidentais – visava aqueles que estavam no nível mental do sexo.
Ele não teve um único caso que pudesse ser chamado de sexo
espiritual.
Por isso, se você quiser investigar a veracidade do que estou
dizendo, terá de se voltar para uma única direção, a filosofia do
Tantra. Deixamos de pensar no Tantra há milhares de anos. Foi ele
que fez as primeiras tentativas de elevar o sexo para a dimensão
espiritual. Os templos de Khajuraho, Puri e Konark são testemunhos
desse esforço. Alguém aqui já foi a Khajuraho? Viu as imagens que
existem ali? Ao visitar esse lugar, você verá dois fenômenos
maravilhosos. Primeiro, ao olhar as imagens de casais nus mantendo
relações sexuais, você não perceberá nenhuma vulgaridade; não verá
nada que seja feio ou ruim nessas imagens de homens e mulheres
nus, copulando. E a segunda coisa é que, ao olhá-las, você será
envolvido por um sentimento de paz, de reverência. Sua reação pode
surpreendê-lo. Os escultores que criaram essas estátuas conheciam
muito bem o sexo espiritual.
Tendo em vista essas estátuas, se você presenciar um homem
dominado pelo sexo, se olhar seu rosto ou seus olhos, ele parecerá
feio, assustador, bestial; você verá uma luxúria perturbadora e feroz.
Quando uma mulher vê até mesmo seu bem-amado, o homem que
ela adora e com quem tem mais intimidade, aproximar-se dela cheio
de luxúria, ela o vê como um inimigo, não como um amigo. Até
mesmo aos olhos da mais amorosa das mulheres, um homem que se
aproxime cheio de luxúria parecerá um mensageiro do inferno, não
dos céus. Mas, no rosto daquelas estátuas de Khajuraho, vemos a
face de Buda ou de Mahavira. A compostura e a serenidade que se
vêem no rosto dessas estátuas, casais copulando, são as do samadhi.
Você vê todas aquelas estátuas e só o que sente é uma paz suave que
invade seu coração, uma serena reverência. E isso o deixa admirado.
Se você acha que a sexo tomará conta dos seus pensamentos ao
contemplar essas imagens e estátuas, peço que vá a Khajuraho sem
demora. Não existe até o momento nenhum monumento como
Khajuraho sobre a terra. Mas os moralistas da Índia acham que as
paredes de Khajuraho deveriam ser cobertas com uma camada de
argila, pois as imagens podem fazer com que as pessoas só pensem
em sexo. É espantoso!
Os construtores do Khajuraho acreditavam que, se uma pessoa
se sentasse em frente a essas estátuas e as contemplasse por uma
hora, ela ficaria livre da luxúria. Há milhares de anos essas estátuas
têm sido objetos de meditação. As pessoas obcecadas por sexo que
eram enviadas a Khajuraho, para meditar diante das estátuas,
acabavam contemplando-nas enlevadas.
É espantoso que, embora tenhamos acesso a essa mesma
verdade na experiência humana diária, não sejamos capazes de vê-
la. Por exemplo, se você passar na rua e vir duas pessoas brigando,
você terá vontade de parar e observar a briga. Por quê? Você já
parou para pensar na vantagem de parar e observar outras pessoas
brigando? Mesmo tendo mil coisas urgentes para fazer, você pára
por meia hora para ver a briga de alguém. Por quê? O que você
ganha com isso? Você certamente não tem consciência de que isso
lhe traz um benefício. Ao observar duas pessoas brigando, o instinto
de briga profundamente enraizado dentro você passa por uma
catarse. Ele se dissipa; desaparece. Se uma pessoa se senta
calmamente diante das imagens de Khajuraho por uma hora, o
maníaco que existe dentro dela – a sexualidade louca de todo ser
humano – desaparece.
Questões de Sexo
7. Moral e Imoral
Por que todas as religiões são contra o sexo? E por que você
não é?
Você não acha que as pessoas podem exagerar caso não haja
nenhum tipo de repressão?
8. Ilusões e Realidades
O Ocidente parece ter obsessão por sexo. As pessoas estão
saturadas com tantas técnicas e imagens pornográficas. Por que,
depois de tanto tempo, elas ainda não conseguem sair disso e ver o
sexo de uma maneira mais tântrica?
9. O Entendimento na Prática
Basta que você olhe o seu ciúme para perceber como ele o
deixa maluco! Observe, veja como surge essa loucura –
simplesmente observe-o!
Não estou dizendo para deixar de ser ciumento. Aqueles que
dizem isso não entendem nada. Eu estou dizendo apenas para você
olhar, observar, meditar a respeito e, se esse ciúme for uma
estupidez, ele desaparecerá, pois como você conseguirá cultivar um
sentimento tão estúpido dentro de si? Mas a constatação de que se
trata mesmo de uma estupidez tem de partir da sua própria
experiência. Se não for assim, você só o reprimirá, só o condenará.
Não olhará para ele. Você o jogará no fundo do inconsciente e ali ele
fermentará e ficará cada vez maior. E isso é muito perigoso, pois ele
estará crescendo nas profundezas. Virará um câncer e se espalhará
por todas as áreas da sua vida. Então bastará apenas uma
oportunidade para que ele exploda, mais cedo ou mais tarde.
Qualquer dia destes ele explodirá, destruindo você.
É assim que surge a culpa. Você não pode escondê-la – ela tem
seu próprio jeito de se manifestar.
Você condena seu homossexualismo – é por isso que me fez
essa pergunta. Do contrário, você teria rido, teria gostado da piada!
E a menos que um homem seja capaz de rir de si mesmo, ele nunca
saberá o que significa uma risada nem saberá a beleza que ela tem.
Rir dos outros é muito fácil; é uma violência, uma crueldade. A
capacidade de rir de si mesmo tem algo de espiritual. Mas nós
continuamos a nos esconder por trás das racionalizações.
Você acha que a minoria homossexual se sente ofendida. Há
uma coisa que você precisa saber: eu não sou nem heterossexual,
nem homossexual, nem bissexual – portanto, não posso ser nem
contra nem a favor. Eu não pertenço mais ao mundo do sexo. O sexo
não tem mais significado para mim – é por isso que eu consigo
aceitar vocês todos.
Os chamados santos não são capazes de aceitar todos vocês,
pois eles pertencem ao mundo do sexo; eles mesmos ainda são seres
sexuais – reprimidos, obcecados, talvez contra o sexo, mas se são
contra é porque ainda são obcecados por ele. Eu não sou nem a favor
nem contra, nem a favor disto nem a favor daquilo. Simplesmente
não importa! Esses são simplesmente jogos que as pessoas gostam
de jogar – são divertidos, só isso. Não há nada de sério quanto a
isso. É coisa de criança. Heterossexualismo, homossexualismo,
bissexualismo, é tudo coisa de criança.
Eu espero que um dia você possa superar tudo isso. E então
acontecerá um fenômeno totalmente diferente: no Oriente nós o
chamamos de brahmacharya. O Ocidente não tem uma palavra
equivalente para isso, pois a consciência ocidental nunca atingiu
uma esfera tão elevada. A palavra celibato é uma tradução pobre e
com conotações muito feias.
“Celibato” significa simplesmente não praticar sexo; é uma
palavra muito feia. O celibatário pode não ter transcendido o sexo;
apenas reprimido. Brahmacharya significa viver como um deus. O
significado literal é “viver como Deus”. O que significa isso?
Significa que o sexo simplesmente deixou de existir, a fumaça já não
sufoca a chama do seu ser; a chama do seu ser está livre da fumaça.
E depois que o sexo desapareceu definitivamente, toda a energia
contida na sexualidade é liberada na forma de amor, de compaixão.
Mas, ao se sentir ofendido, você se expôs. Num certo sentido,
isso é bom. Não se sinta culpado mais. E é sempre bom se expor em
toda a sua nudez. Não tenha medo, pois o único jeito de você se
conhecer é expondo-se.
Ajude-a a sair desse castelo. Ela vive num castelo, então, leve-
a para fora. Ame-a mais. Ela só entenderá a linguagem do amor. E
quero lhe dizer três coisas...
Primeiro, ame-a mais, mas não peça que ela faça sexo com
você. Só faça se ela pedir; do contrário, não faça – pelo menos por
um mês. Pois todo o seu empenho só servirá para criar mais
resistência da parte dela. Então simplesmente ame-a, seja afetuoso,
reverente, mas não peça para que ela faça sexo com você.
Muitas mulheres têm a idéia equivocada de que sexo é tudo de
que os homens precisam, por isso o sexo se torna uma mercadoria.
Elas só cedem com muito rancor, pois sabem que, quando
consentem em fazer sexo, elas são usadas e não podem mais
dominar o homem. Então elas começam a dominar o homem
negando-se a fazer sexo; deixando-o à mingua. Ele, por usa vez,
passa a rodeá-las como um cachorrinho abanando o rabo e elas
começam a gostar disso. Elas descobrem que o sexo é algo que
podem negar ao homem e deixá-lo maluco, a ponto de virar um
escravo.
Nunca force uma mulher a fazer sexo; se agir assim, você se
surpreenderá. Ela correrá atrás de você abanando o rabo, pois
precisa de sexo tanto quanto você. As mulheres adoram sexo tanto
quanto os homens – na verdade, gostam mais ainda do que eles, pois
a mulher tem essa capacidade. Para o homem, o sexo é algo muito
localizado. Para a mulher, o sexo é algo grandioso, muito maior do
que ela mesma. O homem é um círculo grande e o sexo, um círculo
pequeno dentro dele. A mulher é justamente o oposto: o sexo é um
grande círculo e ela é um círculo pequeno dentro dele.
Ela gosta de sexo, mas não quer demonstrar que gosta, pois, se
demonstrar, como poderá dominar você? Ela se mantém rígida, tensa
e dura e tenta provar que não gosta nem um pouco de sexo. Ela pode
ceder se você pedir, mas você terá de mostrar toda a sua gratidão por
ela. Ela lhe fez um favor. Essa é a política.
Portanto, durante um mês, não peça para fazer sexo com ela.
Assim ficará mais fácil para ela voltar a pôr os pés no chão e se
aproximar cada vez mais de você. Para ajudá-la, basta que você pare
de pedir. Seja apenas afetuoso. Se ela quiser, ótimo. Se não quiser,
não insista. Apenas espere.
A segunda coisa. Ela tem uma atitude antagônica com relação
ao sexo, por isso não toque o corpo dela com um sentimento de
luxúria. Quando estiver com um desejo muito ardente, não toque o
corpo dela. Apenas diga: “Não vou tocar o seu corpo. Estou excitado
agora”. Só toque o corpo dela quando estiver se sentindo reverente,
meditativo e sem nenhum desejo sexual – só quando sentir afeto.
Entende o que eu quero dizer?
Quando você está excitado, você implora por sexo, você tem
fome de sexo. Nesse momento, sua mente só pensa em sexo. Seu
toque e tudo o que faz só visa à sedução. Mas a mensagem mais
profunda é a seguinte: “Eu quero o seu corpo”. Não , esse não é o
momento certo – pelo menos neste primeiro mês. Quando você
estiver muito feliz e satisfeito e não estiver sentindo falta do corpo
de outra pessoa, toque o corpo dela com extrema reverência e ela
ficará muito feliz. Ela perceberá que você não está ansiando pelo
corpo dela. É assim que você a ajudará a se livrar dessa atitude
condenatória, contra o corpo.
E a terceira coisa: Não fiquem muito tempo juntos. Isso é o
que acaba com muitos relacionamentos. Tenha momentos só para
você e deixe que ela tenha os dela. Às vezes vocês podem se
encontrar, ficar juntos, mas não fiquem 24 horas por dia na
companhia um do outro. Deixe-a sozinha para que ela possa sentir a
sua falta; do contrário, ela não sentirá. Isso é o mesmo que ficar 24
horas olhando a comida na geladeira; você acaba perdendo o apetite.
Portanto, não fiquem muito tempo juntos. Os parceiros têm de
ser extremamente parcimoniosos com relação a isso. Quanto mais
tempo você ficar longe dela, mais ela sentirá a sua falta. Então,
quando você vier, ela ficará mais receptiva. Por isso, abra o apetite
dela, para que depois ela possa apreciar toda a refeição.
Faça essas três coisas e tudo terminará bem. Não se preocupe.
Isso não tem nenhuma relação com a idade – tem relação com
a conquista de uma consciência mais elevada, mais profunda.
Torne-se uma testemunha e não diga que o sexo é idiota. Passe
a ser mais inteligente, veja, observe, preste mais atenção. Tudo que é
dado a você tem uma razão de ser, tem uma rima. Tudo que você
conquista tem em si algo que o transcende. Você só é capaz de ver a
parte inferior da escada, pois seus olhos não estão abertos e seu ser
não está consciente; por isso você só vê a parte inferior da escada,
que é o sexo. A parte superior é o samadhi. Se você pudesse ver a
escada inteira, ficaria surpreso ao ver que o sexo é a porta do
samadhi.
A própria idéia do samadhi surgiu graças aquelas poucas
pessoas que conseguiram ter um prazer completo por meio do sexo.
Essas pessoas perceberam que, no sexo, existe algo que não é
absolutamente sexual. Durante um orgasmo profundo, o tempo
desaparece, a mente desaparece, o ego desaparece. Neste momento
essas coisas não têm nenhuma relação com sexo, mas, quando elas
deixam de existir, a pessoa sente uma alegria e prazer profundos.
Esse sentimento não tem nada que ver com o sexo; o sexo apenas
contribui para que ele brote, pois ele proporciona um contexto para o
desaparecimento do ego, da mente e do tempo.
Os primeiros que fizeram essa experiência – ninguém sabe o
nome deles, pois viveram há milhares de anos --, os primeiros
tântricos, foram as primeiras pessoas que chegaram ao samadhi por
meio do sexo. Eles observaram, meditaram e viram uma coisa: o
sexo é apenas o gatilho fisiológico de um certo processo que
também é possível iniciar sem o sexo, apenas por meio da
meditação. Não há necessidade nenhuma de se praticar sexo. Depois
que essas pessoas descobriram que esse processo também poderia
ser iniciado por outros meios – pelos métodos da Ioga, do Tao, do
Tantra, do Sufismo --, depois que perceberam que é possível chegar
a esse mesmo estado, de não-ego, de não-mente e de não-tempo,
sem a prática do sexo, elas descobriram a chave. Mas essa chave só
foi encontrada depois que elas tatearam às cegas pelo mundo do
sexo.
O sexo é a própria fonte da religião e a experiência sexual é a
primeira experiência do samadhi. Não diga que ele é idiota, por
favor. Pratique sexo com amor, com alegria, com uma atitude
meditativa. Procure entender o sexo, pois a libertação só ocorre por
meio do entendimento, de nenhuma outra forma.
EPÍLOGO:
EM BUSCA DA TOTALIDADE