Sexualidade À Luz Da Antroposofia - Ana Paula Cury PDF
Sexualidade À Luz Da Antroposofia - Ana Paula Cury PDF
Sexualidade À Luz Da Antroposofia - Ana Paula Cury PDF
SEXUALIDADE
À LUZ DA CIÊNCIA ESPIRITUAL ANTROPOSÓFICA
Introdução
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E, perguntava Steiner, que dirão os homens da Ciência se aparecerem estes
instintos degenerados e antissociais? “Eles dirão que se trata de uma evolução
normal, de uma fase inevitável da evolução humana. Não é através das
Ciências Naturais que o homem pode ser advertido contra esses perigos;
porque do ponto de vista científico tudo pode ser explicado: que os homens se
transformem em anjos ou demônios”
Não é fácil reconhecer este fato de maneira imediata, mas “aquilo que a
juventude faz com suas capacidades sexuais influi diretamente sobre o futuro
social – o futuro que todos nós, mas especialmente os jovens, gostariam de
aguardar com esperanças positivas”.
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forças de ideias em sexualidade, e não o contrário. Este desastre é típico, tanto
do materialismo moderno quanto da ainda inadequada luta contra ele.
Por um lado, existem grandes esperanças quanto aos benefícios humanos que
poderiam surgir de uma melhor compreensão do mistério do sexo. Estas
esperanças bem intencionadas estão à base do intenso movimento em prol da
educação sexual. Por outro lado, o pensamento materialista visa objetivos
menos nobres para a educação sexual. Aplicando os conceitos da moderna
biologia, psicologia e sociologia ao campo do sexo, o espírito do materialismo
espera ganhar a batalha decisiva contra o único adversário capaz de dominá-
lo.
A experiência nos ensina que, para poder iluminar as mentes sobre o sexo, é
preciso ser sábio, de fato. Ora, quem se atreverá a considerar-se sábio neste
mais profundo dos temas que se oculta eternamente sob ambiguidades e
ilusões? Não obstante, sentimos que é necessário tentar, da melhor forma
possível falar energicamente a favor das pistas que achamos seguras; pois a
juventude precisa muito de orientação e, tantos estão dando conselhos
indubitavelmente errados.” John F. Gardner (1)
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O Mistério da Origem e Natureza dos Sexos
A palavra sexo tem sua origem no latim; vem do verbo seccare, que quer dizer
separar, cortar, dividir. Portanto, sexo é pedaço, fração. Ora, se algo foi
fracionado, dividido, deve ter existido antes numa totalidade íntegra. Como
será que isto se deu?
Enquanto tinha domínio da matéria a alma dava ao corpo uma forma que não
era nem masculina nem feminina, mas dotada de ambas as propriedades.
Com o decorrer do tempo, a matéria foi-se solidificando e a formação exterior
da Terra provocou uma configuração unilateral do corpo, que então assumiu
uma forma semelhante à da futura mulher e outra semelhante a do futuro
homem.
A parte das forças anímicas que não pode manifestar-se exteriormente fica
agora livre, e se dirige internamente para a formação de um órgão que pudesse
servir de base à atividade do espírito: a faculdade do pensar, até então
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inexistente. É preciso lembrar que nos tempos que precederam a separação
em sexos, o ser humano era ainda constituído apenas de corpo físico, corpo
vital e corpo astral ( emocional). Porém gradualmente foi-se preparando para
acolher a substância espiritual do Eu, e era chegado este momento – o de
receber em si o germe do espírito e tornar-se propriamente humano.
Assim, agora, a energia anímica que não encontra emprego no exterior, pode
entrar em relação com a força espiritual e por meio dessa união desenvolvem-
se órgãos que mais tarde farão do ser humano, um ser pensante. A força que
outrora servira para reproduzir seu semelhante, dali em diante é utilizada no
aperfeiçoamento do seu próprio ser.
Pode-se dizer que o corpo masculino tem uma alma feminina e o corpo
feminino, uma alma masculina. Essa unilateralidade íntima do homem é
compensada, desde então, pela fecundação com o espírito.
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A maneira de compreender as imagens da criação da Terra e do Ser Humano
determina em última instância nossa atitude perante a vida em todos os
âmbitos. No versículo 27, lê-se:
Neste primeiro capítulo não há ainda nada de terreno material. O que surge
são os arquétipos, as ideias puramente espirituais da criação. A ideia tem
depois de soltar-se do interior do Criador para tomar existência própria fora
d’Ele.
E agora temos Adão. O nome Adão vem do Hebraico – Adamá – que quer dizer
terra; da mesma forma que Hummus, em latim, de onde deriva a palavra
Humano. Assim, em Adão, temos não o homem, sexo masculino, mas o Ser
Humano Terrestre primordial em sua totalidade ambivalente: masculino-
feminino. Este é o arquétipo do ser humano criado por Deus; o arquétipo do
gênero humano inteiro. A separação em dois seres distintos, homem e mulher,
é o conteúdo central da criação da Terra propriamente dita. Esta se relata no
segundo capítulo, quando já existe um processo de materialização gradual e
progressiva.
“E fez descer sobre Adão um sono para que adormecesse e de suas costelas
tomou uma, e fechou a carne em seu lugar. Deus configurou a costela que
havia tomado do homem como uma mulher e levou até o homem.”
A imagem da costela fala por si mesma. Como parte do tórax que dá morada e
proteção aos órgãos rítmicos – pulmões e coração, pertence à parte média do
ser humano. Orientando-nos pelo conceito da Trimembração do homem e
percebendo a relação dos três sistemas (Polo Neurossensorial; Sistema Rítmico
e Polo Metabólico e Motor) com as três faculdades anímicas – Pensar, Sentir e
Querer – vemos que, se dividimos o ser humano original, inteiro, tirando-lhe a
parte do meio e tornando-a independente, fica uma parte orientada para a
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cabeça e as extremidades (pensar e agir) e outra parte orientada para o peito (
o sentir).
Diante desta descrição podemos discernir três fases claras deste processo
evolutivo.
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interessando particularmente pelos companheiros do mesmo sexo ou do sexo
oposto.
Vimos que nos primórdios o ser humano possuía uma forma tal que não pode
ser imaginada como a configuração física atual. A humanidade ainda existia
numa esfera acima da esfera terrena material. Mas com a separação em sexos,
em lugar da reprodução assexuada, que era idêntica ao ato de dar
nascimento, iniciou-se a procriação sexual por meio da união dos dois sexos,
que são distintos um do outro. Este ato passou a ser a preparação para a
gestação que era prerrogativa do gênero feminino.
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sono ainda cumpria sua parte. A inocência da condição paradisíaca primordial
era ainda preservada na concepção e no nascimento. Por um longo tempo
ainda, a reprodução humana se deu mais por intermédio dos anjos que pelos
próprios homens.
Por algum tempo a procriação que fora assunto dos deuses, foi ainda tratada
como algo sagrado e era realizada sob a condução de sacerdotes iniciados
nestes mistérios e em ligação com os ritmos cósmicos na natureza. Em muitas
comunidades ou tribos era comum que todas as mulheres férteis concebessem
na mesma época -- na primavera, no hemisfério norte -- e dessem à luz seus
filhos no mesmo período do ano _ no solstício de inverno. Mas pouco a pouco
esta condução sagrada foi-se perdendo e a humanidade foi-se emancipando
dos ritmos da natureza, e restaram apenas preceitos ligados à religião que
pretendia organizar a vida interior de maneira moralmente sábia. Enquanto os
seres humanos podiam devotar-se em confiança a uma autoridade externa
que se lhes afigurasse digna desta dedicação, ainda havia certa obediência a
estes preceitos.
“Muitos jovens indagam por que razão não deveria iniciar-se a atividade sexual
tão logo os órgãos sexuais atingem sua maturidade. No caso dos animais, a
maturidade sexual desencadeia, pouco tempo depois, o funcionamento sexual.
No caso do homem moderno, entretanto, a maturidade biológica ocorre dez,
quinze ou mais anos antes do casamento. Terá sentido este lapso? De que
modo deve ser usado?”
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“Pessoalmente, acredito que a verdadeira maturidade, digna de seres
humanos, é atingida vários anos mais tarde do que sugere o desenvolvimento
físico. Atividade sexual antes dessa fase se revelará como exploração, tendo
por consequência uma redução da vitalidade e da longevidade da função.
Observando a vida convenci-me, ademais, de que os jovens que praticam
continência e sublimação sexuais são muito mais felizes, mais ativos, mais
sadios e criativos do que os que trilham o caminho supostamente natural e
cedem aos desejos sexuais.”( John F. Gardner)
A Oportunidade da Adolescência
Por volta dos 12 anos, duas forças diametralmente opostas, mas também
intensamente relacionadas entre si, surgem como disposições novas no ser
humano: a força do intelecto e a da sexualidade, respectivamente nos polos
superior e inferior do organismo. A tensão entre estes dois polos pode e deve
ser criativa no mais alto grau, mas para que isto se dê é necessário que se
estabeleça o domínio da parte central do homem, da qual emana o poder de
harmonizar a ambos.
Examinemos primeiro cada uma destas faculdades. O intelecto pode ser visto
como um anseio de discernir, de conhecer. E para realizar-se necessita de
distanciamento, a fim de obter clareza e distinguir tudo com objetividade,
analisando os fatos, ocupando-se de cada aspecto do fenômeno observado. Já
o sexo é experimentado como uma ânsia de unir. Nele vigoram o calor, a força
de atração, a vitalidade.
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contrabalançar a atração sexual quando esta eventualmente contribuir para o
amor. E, sendo o sexo incomensuravelmente profundo e potente no sentido de
atrair e fundir, a mente ideativa que discrimina, individualiza e separa deve
exercer uma força capaz de opor-se à do sexo. Existem algumas
possibilidades: Pode ocorrer que por um lado o intenso calor da vida seja
resfriado e apagado pelo intelectualismo, por outro, pode ser que a mente
intelectual seja invadida pelo erotismo. Ambas as perspectivas são
indesejáveis. O ideal seria que os dois polos não se enfrentassem de forma
agressiva nem submissa, mas com amor. Neste caso, cada polo faria um
sacrifício de si, a fim de experimentar o outro. Cada um renunciaria em favor
do outro e, consequentemente, redescobriria sua própria vida numa forma
mais elevada.
Esta auto restrição, auto abnegação, é o começo do amor que faz do homem
um ser humano. Neste ato amoroso, o pensamento espera pacientemente até
que seu caráter abstrato se tenha transformado em imagens vivas, seu frio em
calor, sua distância em intimidade, seu desejo de analisar as partes do todo
em vontade de compreender os conjuntos em sua unidade indivisível. O
correspondente ato de amor no polo inferior leva a sexualidade a restringir sua
ânsia de união física a fim de alcançar uma percepção espiritual; a curvar seu
imperioso ardor físico, a conter seu apetite imediato, em prol de um amor
duradouro e de uma visão interior.
Quando o sexo se deixa fecundar pelo seu oposto, ele renasce sob forma de
amor criativo. Quando o intelecto integra as qualidades do seu contrário, ele
se redescobre como amor intuitivo.
Para promover este encontro ideal entre os dois polos, o melhor momento é
justamente o período que vai do início da adolescência até meados da terceira
década de vida. Isto, porque são requisitos para a transformação: de um lado
a continência sexual e de outro uma atitude mental religiosa. Ora, é na
adolescência que encontramos o melhor período para impulsionar a vitalidade
sexual no sentido ascendente, para enriquecer o coração com sentimentos
puros de toda sorte; pois, embora o desejo sensual seja mais intenso nesta
fase, o idealismo também costuma ser mais forte aí do que em qualquer outra
época da vida.
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anímicas para o amor e a beleza, próprias do segundo setênio, experimentarão
ao invés de um ataque atormentador da sexualidade, um amadurecer mais
harmonioso. O aspecto somático do sexo se desenvolverá tranquilamente, aos
poucos, modestamente. A força intelectual, por sua vez, crescerá dotada de
interesse, imaginação, e intuição.
Algo disto transpira nos versos poéticos de Victor Hugo sobre o Homem e a
Mulher:
O Homem e a Mulher
Victor Hugo
O homem é a mais elevada das criaturas; a mulher, o mais sublime dos ideais.
Deus fez para o homem um trono; para a mulher, um altar. O trono exalta, o
altar santifica.
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Voar é dominar o espaço, cantar é conquistar a alma.
Enfim, o homem está colocado onde termina a terra; a mulher, onde começa o
céu...
A principal questão para os jovens desta época é que eles carecem de imagens
e conceitos sobre o que é possível no caminho do desenvolvimento humano.
Eles imaginam que a meta da vida é o uso de suas capacidades herdadas ou
adquiridas para realizar desde logo alguma coisa no mundo exterior, ao invés
de primeiro se encontrarem a si mesmos. Não lhes ocorre pensar que a maior
e primeira tarefa é conceber-se a si mesmo, a pessoa que ele será, e de
promover o nascimento de si mesmo sob a forma de ser humano livre e
criativo, capaz de conduzir-se a si próprio.
Aos que afirmam que salutar é seguir os impulsos da natureza, e que praticar
sexo é algo inteiramente natural, é bom lembrar que o homem não é
exclusivamente um ser natural. Ele possui sem dúvida uma dimensão que
pertence à natureza, mas viver entregue a ela é ignorar, desmerecer ou
desprezar as demais instâncias de seu Ser. O que caracteriza o ser humano é
justamente o fato de que não foi criado perfeitamente pronto e acabado, mas
afirma sua dignidade precisamente quando se eleva acima desta natureza e a
transforma a serviço de algo maior e mais nobre, a dimensão ideal, espiritual
do ser. Em sua filosofia da Liberdade, diz Steiner: “Existe no homem a
possibilidade de se transformar, assim como a semente da planta contém em
si a possibilidade de evoluir para uma planta completa. A planta se
desenvolverá em função da lei que lhe é inerente; o homem permanece em seu
estado imperfeito, a menos que assuma a si mesmo como uma matéria a ser
transformada por força própria. A natureza faz do homem um mero ser
natural; a sociedade, um ser que age conforme leis; um ser livre somente ele
pode fazer de si mesmo. A natureza abandona o homem em determinado
estado de sua evolução; a sociedade o conduz alguns passos adiante; o último
aperfeiçoamento somente ele pode dar a si próprio”.
O homem não recebe sua qualidade humana como dádiva, mas tem que forjá-
la, tem que lutar por ela. Sua luta é contra a própria natureza: tem de
apoderar-se da natureza dada e reestruturá-la de acordo com a própria ideia.
Por outro lado, encontrar o tom adequado para abordar a questão, não é tão
simples e encontra-se entre os grandes desafios que confrontam aqueles que
queiram dedicar-se à tarefa de orientação dos jovens para uma sexualidade
sadia. Se não se trata de entregar-se aos instintos naturais, tampouco se trata
de obedecer a preceitos morais, mas agir a partir do reconhecimento do
verdadeiramente bom por si mesmo. Trata-se de um progresso ético quando
alguém não executa mais cegamente um mandamento externo ou interno,
mas deseja entender a razão pela qual deve fazer isto ou aquilo. Este
progresso é o passo da moral autoritária para a moral baseada em
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entendimento ético. E assim prossegue Steiner dizendo: “Em função dos meus
instintos e impulsos somente pertenço à espécie homem; o fato de expressar
na minha organização uma força ideativa é o que possibilita a minha
individualidade. Por meus instintos e impulsos sou um homem igual aos
outros; pela força ideativa, que me capacita a ser um eu no meio de outros,
sou uma individualidade. A sensação de liberdade, nós a temos quando uma
ação provém da parte ideativa de nosso ser.”
E ainda: “Quem apenas age porque reconhece certos princípios morais, age
em virtude de um código moral, é apenas um executor ou um autômato. (...)
Apenas seguindo o meu amor à ação sou eu quem age. Nesse nível da
moralidade, não ajo por obediência a uma autoridade e tampouco em
decorrência de uma voz interna. Não reconheço nenhum princípio externo
para meu agir, porque achei em mim mesmo a razão para minhas ações, o
amor à ação. Não analiso racionalmente se minha ação é boa ou má; eu a
realizo porque a amo. (...) Não me sinto coagido por meus instintos naturais, e
tampouco por mandamentos morais, quero fazer o que está em mim”.
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Entretanto, duas coisas são necessárias para que isto se dê: primeiro, uma
preparação através da purificação e iluminação, e , em segundo lugar, um
abrir-se livremente para o mundo espiritual. Aqui podemos perceber a
semelhança de nossa natureza anímica com o aspecto feminino e o conteúdo
do mundo espiritual com o masculino em sua atuação impulsionadora,
fecundante. O ser interior deve se tornar sensível e receptivo ao Eu Superior.
Quando isto acontece, o ser humano superior flui para dentro de nós desde as
alturas espirituais.
Isto significa que nossa natureza íntima – o corpo astral – deve ser purificada e
enobrecida, submetendo-se a uma “catharsis”. Então o espírito pode
derramar-se nela iluminando-a. Isto acontece quando o corpo astral se depura
até o ponto de desenvolver órgãos de percepção suprassensível.
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Eros e Psique
Fernando Pessoa
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
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Se, no entanto prosseguirmos em nossas reflexões, veremos que alguém assim
iluminado, ou ainda, alguém que tenha concebido o Espírito Santo em si, fala
de maneira diferente dali em diante. E como fala então? Quando alguém assim
fala, por exemplo, de Saturno, Sol, Lua, quando fala dos estágios
evolucionários ou de diferentes aspectos do ser humano, ou ainda de
processos da evolução cósmica, não está expressando sua opinião. Sua
própria visão não entra em consideração de modo algum. Quando tal pessoa
fala do Antigo Saturno, é o próprio Saturno que fala através dela. Quando ela
fala do Sol, é o ser espiritual do Sol quem fala por meio dela. Ela é o
instrumento, seu ego pessoal é eclipsado – o que significa que em momentos
assim, é o Eu Universal Cósmico e Supra pessoal que se utiliza de seu ego
como instrumento para falar por meio dele.
Nós sabemos que o ser humano consiste de corpo físico, corpo etérico, astral e
um Eu. Este ser humano tetramembrado é o ser humano terrestre que
conhecemos. Mas a certo estágio da evolução, num momento em particular,
uma pessoa pôde retirar seu Eu destes três corpos e abandoná-los, deixando-
os intactos, inteiramente incólumes. Este Eu penetrou os mundos do espírito
e os três corpos ficaram para trás. E porque estes corpos eram tão refinados e
altamente desenvolvidos pelo Eu que neles vivera, eles eram instrumentos
adequados a um ser ainda mais elevado que então se apropriou deles. No 30º
ano de Jesus de Nazareth o ser a quem chamamos Cristo tomou os corpos
físico, etérico e astral de Jesus.
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Logos Solar que pode brilhar nos seres humanos através da Iluminação, o
próprio Logos, o Espírito Santo, penetrou. O Eu Universal, o Eu Cósmico
entrou em Jesus e dali em diante, por três anos, falou através do corpo de
Jesus. Cristo fala através de Jesus durante aqueles três anos. Este evento é
indicado no evangelho de João e também nos outros evangelhos, como a
descida da pomba do Espírito Santo em Jesus. Neste momento, o Cristianismo
Esotérico nos conta que o Eu de Jesus deixou seu corpo e a partir de então o
Cristo está nele falando, ensinando, e agindo por meio dele. Este é o primeiro
evento de acordo com o evangelho de João. Agora temos o Cristo nos
invólucros astral, etérico e físico do homem de Nazareth. Ali Ele atuou como
descrito até o mistério do Golgotha. O que ocorreu no Golgotha? Consideremos
aquele importante momento em que o sangue fluiu das chagas do Salvador
crucificado. Para facilitar a compreensão, utilizemos uma comparação.
Desse modo não apenas um processo físico ocorreu quando o sangue jorrou
das chagas do Salvador, mas foi realmente acompanhado de um processo
espiritual. Ou seja, o Espírito Santo que fora recebido por ocasião do Batismo
no Jordão uniu-se com a Terra. O próprio Cristo fluiu para o Ser da Terra. E
desde então a Terra se transformou e é por isso que se uma pessoa pudesse
ver a Terra desde as estrelas com olhar clarividente observaria que sua
aparência foi totalmente transformada pelo mistério do Golgotha. O Logos
Solar tornou-se parte da Terra, formou com ela uma aliança e se converteu no
Espírito da Terra. Ele alcançou isto entrando no corpo de Jesus de Nazareth
em seu 30º ano de vida e permanecendo ativo nele por três anos, após o que,
prosseguiu incorporando-se à Terra.
Agora o fato importante aqui é que este evento deve agora exercer um efeito
sobre todo cristão verdadeiro, isto é, todo aquele que busca uma relação com o
Cristo, cuja essência é Amor. Isto deve dar-lhe algo por meio do que ele possa
gradualmente desenvolver os primórdios de um corpo astral purificado no
sentido crístico. Tinha de haver um poder disponível para os que o buscassem,
pelo qual se pudesse fazer do próprio corpo astral uma Virgem Sophia e
através dele receber o Espírito Santo que pôde impregnar a Terra toda, mas
que não poderia ser acolhido por qualquer um cujo corpo astral não se
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assemelhasse à Virgem Sophia. Que poder é este? Ele consiste no fato de o
Cristo Jesus ter confiado ao “discípulo que Ele amava”, o escritor do evangelho
de João – a missão de descrever verdadeira e fielmente por meio de sua
iluminação, os acontecimentos na Palestina de forma que eles pudessem atuar
sobre os seres humanos.
“E o discípulo tomou-a consigo”. Isto quer dizer que ele escreveu o evangelho
de João. E neste evangelho o escritor encerrou forças que levam ao
desenvolvimento da Virgem Sophia. Junto à cruz ele recebeu a missão de
acolher estas forças como sua mãe e de ser o fiel e autêntico intérprete/
tradutor do Messias.
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Referencias Bibliograficas
The Mysteries of The Holy Grail ( from the work of Rudolf Steiner) – extrato da
palestra dada em Hamburgo, 18/05/1908 --- Rudolf Steiner Press
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Sobre Sexualidade e Primeira Infância
“No curso da evolução da Terra, tal como nos declara a Bíblia (Gen, 1:27), o
ser humano surgiu inicialmente como um ser masculino-feminino, não
sexuado. Em nossos estudos anteriores, falamos das primeiras fases do
desenvolvimento humano na Terra em conexão com as imagens da pesquisa
espiritual antroposófica. Nós tentamos explicar que o ser humano primordial
não pode ser imaginado em um corpo físico material denso. Por mais tempo
que os outros reinos da natureza, o homem permaneceu no estágio bem inicial
da integração de substâncias mais densas na corporalidade. Até então,
nenhum traço do elemento sólido terrestre estava presente em toda a
existência planetária. Ao emergir da criação pré-física, a evolução primeiro
passou através dos elementos do calórico, aéreo, e líquido. Enquanto os seres
humanos eram de natureza assexuada e habitavam um corpo volátil ou fluido,
a procriação acontecia por meio de um sacrifício de uma parte da
corporalidade a uma outra alma humana sob a direção de seres superiores.
Um profundo sono, induzido pela divindade, era o elemento protetor para o
mistério do nascimento. E quando uma alma humana deixava seu corpo,
então isto também era como mergulhar em sono profundo, como se o ser fosse
inalado pelo cosmos. Nenhum resto mortal era deixado para trás.; a
corporalidade abandonada podia imediatamente continuar a servir à
configuração da vida. O sono, que ocupava o lugar da morte, era bem próximo
do que se ocultava no mistério do nascimento, o mesmo sono sob cuja
proteção ocorria a oferta da base corpórea para uma outra alma que desejasse
nascer.
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Assim como a assexualidade, esta forma de nascimento continuou existindo
por longo tempo, mesmo quando o ser humano começava a viver numa
corporalidade que gradualmente foi se solidificando. Tendo falado da origem
do ser humano terreno (Gen 2:7), o relato bíblico descreve-nos como esta
forma de procriação foi mantida até os tempos em que a separação dos sexos
ocorreu. A criação de Eva, na origem da diferenciação dos sexos, é contada da
seguinte forma: Os seres criadores fizeram com que o ser humano caísse num
sono profundo, e do ser adormecido, tomaram uma parte de sua corporalidade
a fim de formar um corpo para aquela alma que, pela primeira vez, seria a
portadora de uma forma humana feminina (Gen 2:21).
Até então, o ser humano não pode ser imaginado em uma forma física
semelhante à que possui hoje. A humanidade ainda existia numa esfera acima
da esfera terrena material. Mas agora, em lugar da reprodução assexuada, que
era idêntica ao ato de dar nascimento, inicia-se a procriação sexual por meio
da união dos dois sexos, que são distintos um do outro. Este ato era agora a
preparação para a gestação, que era prerrogativa do gênero feminino. O papel
do sono protetor permaneceu na passagem da primeira para esta segunda
condição. Contudo, a união dos sexos não partia de uma vontade humana; ela
era gerada pelos seres superiores que guiavam a humanidade. O que a Bíblia
narra acerca da criação de Eva foi sempre repetido, embora de maneira
diferente, quando o ato reprodutivo estava prestes a acontecer. Os divinos
poderes induziam a um sono profundo os dois seres humanos. Em tempos
históricos quando homens e mulheres assumiram uma forma corpórea bem
similar à que portamos hoje, o papel desempenhado pelo sono ainda cumpria
sua parte. A inocência da condição paradisíaca primordial era ainda
preservada na concepção e no nascimento. A reprodução humana acontecia
mais por intermédio dos anjos que pelos próprios homens.
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O mais interessante é que, simultaneamente, começam a se desenvolver as
vesículas cerebrais, a partir das quais se forma o cérebro – base da atividade
pensante, da consciência. Isto nos mostra que potencialmente, tanto o homem
quanto a mulher possuem a predisposição para os dois sexos no que se refere
às forças de crescimento. Este processo se relaciona também com outra
transição que ocorre entre duas fases da vida: assim, a primeira infância é
como um eco do paraíso, do ser humano ainda não diferenciado em homem e
mulher. A criança conserva a pureza, a inocência e a inconsciência em relação
a estas coisas. Vive em unidade com o mundo, especialmente com a Natureza,
e aprende por meio de vivências que faz mediante sua corporalidade e a
imitação. Daí a importância de se cuidar do seu entorno, daquilo a que ela
estará exposta como influência do seu ambiente físico e anímico, pois ela o
absorverá sem qualquer censura ou discernimento. Em contrapartida, é na
adolescência que recapitulamos a experiência da queda do Paraíso com o
despertar simultâneo da consciência, do pudor (a vergonha) e a consumação
da diferenciação sexual. Este período e’ chamado por Steiner de “maturidade
terrena”. Será então apropriado falar de sexualidade da criança pequena?
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SEXUALIDADE DA CRIANÇA PEQUENA?
De Wolfgang Gadeke
É somente durante o desafiador estágio do Não – por volta dos três anos que a
criança começa lentamente a distinguir-se de seu ambiente e principia a
experiência de si mesma como algo separado, com sentimentos próprios.
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calcanhares. Eu diria que não há absolutamente nenhuma diferença na
atenção da criança pelas várias partes de seu corpo, inicialmente todas elas
são de igual interesse. Donde se conclui que é prematuro falar em sexualidade
neste contexto.
Quando atos sexuais reais, num sentido adulto, são realizados com uma
criança – como o abuso por um parente próximo – e não é necessário que seja
um estupro – então esta é uma das situações mais atrozes, das coisas mais
cruéis que podem ser feitas a uma criança. Em meu grupo de aconselhamento
de casais encontrei certa vez uma jovem senhora que lidou bastante com este
tipo de problema, e também conheço vários relatos de pessoas que sofreram
abuso sexual na infância. Tais abusos tiveram efeitos terríveis no quarto
setênio de vida destas pessoas. Isto também afeta a relação conjugal de
diversas formas sendo verdadeiramente um infortúnio, pois é muito difícil
curar as feridas sofridas dessa maneira.
(...)
WW.: Como uma criança se relaciona com seu corpo nestes primeiros
anos? Ela se relaciona com seus órgãos sexuais diferentemente dos
outros órgãos do corpo?
W. Gadeke: Penso que não. E certamente nunca observei qualquer coisa assim
com meus próprios filhos.
W. Gadeke: Isto varia de criança para criança. Mas em geral, quanto mais
inocente, ou em outras palavras, quanto menos acordada e consciente for uma
criança, tanto mais espontânea ela será. A vergonha indica o despertar da
consciência de si mesmo associada a um sentimento de autocensura.
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Segundo a Dra Michaela Gloeckler em seu consultório Pediátrico diante da
pergunta: “Existe uma sexualidade Infantil?” as opiniões divergem. De
acordo com sua experiência a imitação tem um papel importante neste
aspecto. Num sentido puramente biológico, o amadurecimento das glândulas
germinativas inicia-se entre os nove e os dez anos de vida, e junto com ele o
desenvolvimento sexual. Antes disso, a criança está totalmente aberta ao
mundo e tem necessidade de uma vivência corporal em sentido amplo, e não
especificamente vinculada às zonas erógenas, que mais tarde serão
vivenciadas com maior nitidez. Ela quer ser amada por inteiro e não ser
estimulada sexualmente. Se isto, todavia for provocado pelo adulto ou por
crianças mais velhas, despertando sua atenção ou até dando o exemplo, o fato
se resolverá por si desde que não se dê atenção especial à conduta resultante
e o contato com os coleguinhas em questão seja reduzido ou acompanhado
mais atentamente. A situação, porém, é diferente quando a criança fica
sozinha, ou sente tédio, ou tem medo. Então a necessidade de intensificar a
propriocepção é satisfeita, via de regra, com o chupar o dedo, ou com a
ingestão de alimentos. Essa também pode ser a causa de masturbação
excessiva.
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os quatro e os sete anos. Após este período esta dinâmica submerge, entra
num estado de latência, voltando a emergir por volta dos doze anos, desta vez
com outro caráter.
“Nós devemos aprender a dizer-nos não somente: nós estamos felizes porque
nasceu-nos uma criança; mas também poder dizer que somos meramente o
instrumento para isso; para que uma individualidade espiritual que quer
continuar sua existência sobre a Terra possa encontrar a oportunidade para
isso por nosso intermédio.”
“(...) O fato não é que a criança se assemelha aos pais, mas ao contrário, ela
buscará nascer naquela família cujos pais mais se assemelhem a ela”. Poder-
se-ia pensar: ‘mas isso não desmerece o amor materno? ’ De forma alguma.
Justamente por já existir uma profunda simpatia antes do nascimento, é que
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a criança vai ao encontro daquela mãe em particular. O amor entre eles tem
sua origem num tempo muito anterior a este acontecimento; e continua a fluir
depois que a criança vem ao mundo.
A criança amou sua mãe muito antes de nascer. Não é de admirar que a mãe
corresponda a esse amor. Assim “o significado do amor materno não fica
falsamente explicado; antes, tem sua verdadeira fonte esclarecida”.
Certo dia, um menino de dez anos mostrou furtivamente à mãe um bilhete que
trouxera da escola. Este continha um desenho obsceno e uma frase
correspondente. A mãe tranquilamente comentou: “Eu não gosto desse tipo de
coisa. Foi bom você me mostrar, mas agora eu gostaria de jogar fora este
bilhete.” E assim o caso ficou resolvido. O menino percebeu que a mãe não fez
nenhum escândalo, ao contrário da professora, que ficara vermelha e deixara
a classe toda de castigo na sala de outro professor. Isto lhe trouxe um grande
alívio. Assim ele ficou sabendo que aquilo é algo que se evita, como evitamos
outras coisas das quais não gostamos, e que o escândalo na escola não teria
sido necessário. Na hora do jantar, o pai conta como ele e a mãe se
conheceram, e fala da alegria de poder ter muitos filhos.
29
garoto de dez anos. Também se pode ignorar o ocorrido, ou procurar tratá-lo
com humor. Uma coisa e certa: quanto maior for a atenção dada pelos adultos
a esses acontecimentos, tanto mais frequente será sua repetição; pois as
crianças tem enorme prazer em provocar a atenção dos adultos. Se elas não
atingirem esta meta por meio de um comportamento positivo ou simplesmente
por serem como são, atrairão a atenção dos adultos por meio destas e de
outras provocações.
“Bem, e’ uma mãe que escreve. Ela tem duas filhas, de cinco e sete anos, que
ficam frequentemente em casa de uma senhora casada. As crianças, em geral,
jantam com o pai a noitinha quando voltam da casa da baba; a mãe continua
seus estudos e tem aulas a noite. Ela escreve: ‘ Recentemente, ao final de um
jantar, as meninas preveniram o pai de que tinham algo muito importante a
dizer-lhe. Mas na verdade não queriam falar: - Se agente disser, você vai
zombar de nos. Seu pai garantiu que não zombaria delas, e elas se decidiram. A
mais velha começou: - Bem, e isso. O marido da baba botou o pinto dele na
minha boca. E ficou praticamente muda, não quis dar outros detalhes. Nesse
momento, a menor disse: - Mas, sabe, eu dei um tapa na cara dele. E a mais
velha recomeçou: - Sim, mas, sabe, ela não fez isso de propósito , isso de bater
nele. Temos ai realmente uma situação sobre a qual muitas perguntas podem
ser feitas na família. A mãe escreve: “ No dia seguinte pela manha, quando quis
falar com elas a respeito – pois meu marido me contara – curiosamente elas
foram muito reticentes e não quiseram falar novamente. Elas me disseram: -
Não, não, nós esquecemos o que aconteceu. Principalmente não deve falar com a
babá.”
‘E, porque tudo isso se passa numa pequena aldeia. São pessoas que se
conhecem...”
30
Os riscos da profissão?
FD: Este mesmo. As crianças imaginam cenas sexuais que contam a seu
modo. Aqui era destinado somente ao pai; com, o que ‘e bastante curioso como
expressão: “Você vai zombar de nos” ; depois `a mãe : “Não, não, esqueci...” e
mais, “ Bater de propósito” ... Tenho a impressão de que estamos diante de
uma fantasia. Tudo se passa `a noite, `a hora do jantar. Há coisas lascivas que
as crianças se contam, assim, entre si, para fantasiar coisas para se tornarem
interessantes, no caso, principalmente para o pai. Creio que esta mulher esta’
absolutamente certa em não insistir sobre essa historia para que, se algo sério
acontecer um dia, as crianças possam dizer-lhe. Isto e’ o importante: não
zombar nem ralhar; mas dizer: - “Tudo bem. Se ela bateu na cara dele, espero
que tenha sido de propósito, porque um senhor não deve fazer isso com
meninas”.
Ela pergunta também: “Como se defender, em geral, contra esse tipo de coisas?”
Porque existem as fantasias e existe a realidade.
FD: Ela poderia dizer, por exemplo, diante do pai: “Um dia, vocês contaram
isso ao seu pai (verdade ou não, não se deve forçá-las a dizer que não ‘e
verdade). Mas quando se e’ pequeno inventa-se uma série de coisas. Se, de
uma outra vez, algo assim como o que vocês contaram acontecer, se for
verdade, não deve acontecer novamente. O senhor sabe muito bem disso.
Então vocês dirão a ele: Não deve fazer isso. Um senhor não brinca dessas
coisas com crianças. Assim e’ que se previne as crianças.
Mas a “não verdade” não pode ser impedida. Não se pode impedir as crianças
de contarem fantasias, ou historias inventadas.
Recordo para aqueles que não viram o filme de Brel que uma menininha
acusava um professor de coisas muito semelhantes, e que isto levou este ‘ultimo
`a prisão.
FD: ‘E’ tristemente banal. Acho que o pai reagiu muito bem não zombando
delas e fazendo algumas perguntas -- `as quais elas não responderam, pois
quando perguntou: “A baba estava presente”? Elas nem sequer sabiam dizê-lo.
Por tudo isso, creio que foi uma fantasia.
Tenho justamente uma pergunta sobre essas famosas fantasias. A palavra esta
na moda. O que são elas? Invenções infantis?
FD: São fabulações que correspondem `as imaginações que as crianças têm
com muita frequência em certo estagio de seu desenvolvimento, estagio em
que desejam a sedução por um adulto. Esses desejos trazem consigo imagens
do tipo contado por essas meninas.
31
Este e’ um estágio absolutamente obrigatório do desenvolvimento infantil?
Porque freqüentemente os pais, ao surpreenderem uma criança em plena
fantasia, dizem: “São mentiras, e’ preciso dizer a verdade”. Eles freqüentemente
veem isso como mentira.
FD: Não e’ uma mentira, e’ uma brincadeira, pelo prazer de sonhar acordado
sem riscos... e’ romance, ora! A maioria das fantasias infantis não e’ feita para
os pais. Neste caso, as menininhas talvez tenham sido pilhadas justamente
por falarem com seu pai. Elas eram naquela note, as mulheres do papai, pois
a mãe não estava lá. (...) Para estas crianças, parece que isto não foi sequer
erótico, a julgar pela maneira como contaram ao pai. Então, creio que está
certo não fazer um drama. E’ uma historia sem importância, esquecida tão
logo contada.
Hoje há uma clara percepção de que a linha divisória entre a infância e a idade
adulta está se apagando rapidamente entre os que estão atentos. Neil
Postman, um dos mais brilhantes críticos sociais de nossos tempos, apresenta
algumas hipóteses para explicar este fato, todas relacionadas com a maneira
como os meios de comunicação afetam o processo de socialização; em
particular, como a prensa tipográfica criou a infância e como a mídia
eletrônica a faz desaparecer.
Em seus estudos ele nos mostra que a concepção atual de infância inexistia
até o fim da idade media. Surge na renascença, após a revolução promovida
pela palavra impressa, que socializa a necessidade de alfabetização, multiplica
e torna rotineiras as escolas, hierarquiza o conhecimento por faixa etária,
dissemina noções de pudor, estabelecendo, por tudo isso e pela dificuldade de
acesso aos segredos culturais que armazena, limites bem demarcados ente
crianças e adultos.
32
adultas e adultos infantis. Os prenúncios dessa massa de criaturas
indiferenciadas invadem o dia-a-dia dentro e fora da tela mágica da TV: nas
roupas, nos hábitos alimentares, no padrão linguístico, no fim das velhas
brincadeiras infantis, em atitudes mentais e emocionais e é claro, no campo
da sexualidade e da violência.
Nessa sociedade cada vez mais carente de contato físico, passamos grande
parte do tempo em atividades despersonificadas e desumanizadas. Como uma
cultura, temos cada vez menos convivência com as pessoas, seja conversando,
tocando música, cantando, fazendo jogos, cozinhando ou comendo juntos.
Corremos o risco de desaprender como é bom ficar abraçados, de mãos dadas,
unidos em silêncio, olhando para o fogo ou para as estrelas, ouvindo e sendo
ouvidos, contemplando aqueles que amamos. Ao mesmo tempo, o hábito da
solidão autêntica está se perdendo. Vivemos bombardeados por barulho, gente
correndo, coisas, atividades, prazos, resultados, telefonemas, e-mails, e uma
avalanche de imagens eletrônicas. Quase não temos mais aquela convivência
familiar ou social enriquecedora, nem aquele tempo revigorador para ficarmos
sós, em silêncio, contemplando.
33
posicionar nesta batalha, precisa assumir com responsabilidade as
consequências de suas ações e/ou omissões na educação daqueles que se
confiaram a nós.
Isto nos remete ao nosso cotidiano. Como vestimos nossas crianças? Que
brinquedos oferecemos a elas? Que alimento anímico, que imagens
preparamos para nutrir-lhes e fortalecer-lhes? Que exemplos de
relacionamento estamos dando? Nossos gestos são conscientes, escolhidos
porque pensados? Ou apenas reagimos, ou vamos levando sem jamais parar
para refletir sobre o possível impacto de nossos atos em suas vidas?
Que mensagens não verbais, o nosso semblante ou tom de voz emite para a
criança? Nossas ações podem muitas vezes como que enviar mensagens
negativas sobre uma coisa tão fundamental como o corpo e ferir
profundamente a autoestima da criança, minando sua exuberância natural e
os sentimentos de prazer que seu corpo lhe dá.
34
deveria ter um corpo de criança que ainda não entrou em diferenciação do
masculino/feminino. Entretanto, quando verificamos a oferta de bonecas no
mercado de brinquedos, as mais vendidas são bonecas que representam
adultos, com tudo o que está ligado a isso. São homem ou mulher e tem-se a
impressão de que a criança deve absorver estas diferenças o mais rápido
possível: tudo é sexual. E o pior é que as imagens de sexo veiculadas
dificilmente estão associadas ao amor. Antes parecem formas de exercer o
poder, ou meio de obter vantagens pessoais.
Ao lado disso, também está o consumo. Vocês já viram uma criança ter uma
única Barbie? Quantos modelos e quantos acessórios em combinações e
situações ligadas a modismos – isto é, aos valores efêmeros, rapidamente
descartáveis, pois outros novos precisam vir ocupar seu lugar. Deve meu filho
ter desde cedo a impressão de que o importante é ter para cada ocasião uma
vestimenta elegante e adequada? E quem como adulto não possuir o poder
aquisitivo que lhe permita constantemente participar de todas as tendências
da moda, não poderá ser humano nesse sentido? Ser humano é ser
consumidor?
Por exemplo, a pequena criança pega sua boneca e atira longe. Se a mãe não
der nenhuma importância ao fato a criança aprende que pode tratar as
pessoas de qualquer maneira. Se a mãe vai, pega a boneca maltratada no
braço e diz: “Coitadinha, você se machucou? Venha, vamos para a caminha
que vou te cobrir”. A criança não será castigada por sua atitude, mas a mãe
age de maneira visível para as forças imitativas da criança, com a atitude
humana correta. Ela ensina à criança através do próprio agir, a ter devoção e
compaixão pelo próximo. Se um adulto tratar uma boneca visivelmente com
dignidade e respeito, a criança mais tarde terá uma base de vivências para
tratar seus semelhantes com sentimentos.
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consciência a tarefa de educar estes que trazem em si o futuro de nossa
civilização.
De Wolfgang Gadeke
36
Sexualidade e segundo Setênio
Introdução
A educação sexual, num sentido mais estrito, refere-se a como lidar com a
sexualidade. Num sentido mais amplo, porém, veremos que abrange todos os
âmbitos da vida social, devendo contemplar especialmente a prevenção de
desvios de rota e ameaças ao desenvolvimento harmonioso do ser humano,
como, por exemplo, a antecipação de certas vivências e conteúdos para os
quais falta ainda a necessária maturidade, fato tão comum hoje em dia.
Por mais louvável que possa parecer o fato de se abordar de maneira cada vez
mais aberta enigmas da existência humana tais como o da sexualidade,
devemos considerar que isso também traz o grande risco de principalmente as
crianças e os adolescentes não estarem maduros para elaborar essa avalanche
de informações às quais têm acesso ou a que são expostos. Eles são
confrontados com coisas que abalam sua confiança na vida e que contribuem
para pôr em dúvida o sentido dela.
37
desse exercício de pesquisa, auto-observação, reflexão e elaboração algo
resultou que gostaria de compartilhar com todos, não como uma verdade
absoluta, nem uma cartilha a ser seguida, mas esperando servir como um
estímulo e encorajamento a um movimento individual de cada um para
conquistar por si mesmo certa consciência e autoridade moral quanto ao
tema.
Para tentar responder a todas elas meu primeiro impulso foi o de rever e
verificar as disposições anímicas da criança do segundo setênio e em
particular a de 9/10 anos. Pois é preciso reconhecer em que ponto do trajeto
se encontra a criança a quem vamos nos dirigir, quais são suas necessidades
reais e como podemos supri-las.
Sabemos que aos nove anos completos, ou por volta deles, acontece com a
criança algo muito especial. Ela quer, a partir desse momento, que de certa
maneira a autoridade justifique sua razão. Não é que ela pondere
racionalmente se a autoridade tem ou não razão. Mas dentro dela algo a faz
sentir que a autoridade se afirma por sua própria qualidade, por sua atuação
na vida, por sua própria segurança. A partir daí ela desenvolve uma
sensibilidade especial nesse sentido que se evidencia pela mudança objetiva
que ocorre em sua vida nesse momento. Anteriormente, a criança pouco se
distinguia do ambiente ao redor. Para sua sensibilidade, ela e o mundo eram
uma coisa só. Mas agora, na criança surgem perguntas – todas elas
relacionadas com a diferenciação emocional que ela passa a fazer entre ela
mesma e o mundo exterior, e também entre ela mesma e o educador que a
conduz, seja ele pai ou professor. Até então ela tinha pouca sensibilidade para
perceber se o professor ou o pai é uma pessoa desajeitada, que
ocasionalmente se choca com objetos diversos e os deixa cair no chão, por
exemplo. Naturalmente ela via acontecer, mas antes estas coisas não lhe
causavam uma impressão mais profunda. Contudo, com os nove anos
completos, a criança começa a prestar atenção especial justamente em tais
38
coisas, torna-se um tanto crítica. E surgem para ela questões que podem não
se manifestar explicitamente, mas que estão, todavia, presentes. Em seu
sentir, em suas emoções, ela pergunta se o professor é habilidoso nos
afazeres de sua vida, se antes de tudo o professor está integrado
seguramente na vida, se ele sabe o que quer; e sobretudo, ela tem uma
sutil sensibilidade para a situação geral da vida anímica dele. Assim,
por exemplo, uma pessoa cética provocará na criança um efeito
totalmente diferente daquele suscitado por uma pessoa de conduta ético-
religiosa. Na voz de uma pessoa cética ressoa algo totalmente diferente
do que na voz de uma pessoa de orientação espiritual. E é com estas
coisas que a criança entre os nove e os dez anos de idade, se importa.
Nesta fase a criança vem forçosamente procurar as pessoas de referência -- os
pais, a professora -- com toda sorte de perguntas. Muitas delas são perguntas
metafísicas sobre a origem. O que importa, entretanto, não é tanto o conteúdo
das perguntas, nem tampouco o teor das respostas que lhe damos, mas sim
que por meio do elemento indefinível e imponderável que precisa estabelecer-se
entre nós e a criança, esta sinta inserida em sua alma a seguinte noção: “até
agora eu me portava diante do meu pai ( minha mãe/ minha professora)
elevando os olhos a ele(a); agora não consigo mais fazê-lo sem saber que ele(a)
eleva os olhos para algo que, de alguma maneira, está fundamentado na
própria vida”. Importa mais o quê ressoa na voz daquele que fala: decisivo é o
que se manifesta no tom da fala, seja como firmeza interior, cuidado amoroso
ou hesitação e indiferença, do que o quê se fala. Agora se estabelece entre a
criança e o educador, um relacionamento que exige confiança, uma confiança
cada vez mais consciente. O fato de a criança se tornar uma pessoa
inconsistente ou segura na vida está muitas vezes relacionado com a questão
de encontrar-se ou não, nesse momento, uma maneira suficientemente segura
de posicionar-se perante a criança.
39
que esta não pode ser toda a verdade, ou então toma conhecimento de
detalhes sem saber o que fazer deles em seu íntimo. Quando percebemos que
de alguma forma ela tomou contato, seja através de conversas com outras
crianças mais velhas, seja por meio de imagens perturbadoras às quais tenha
assistido, podemos reafirmar a ela com toda segurança que certas coisas,
quando vividas fora de seu tempo não trazem nada de bom. Tudo tem seu
tempo certo de ser e quando chegar a hora certa nós lhe esclareceremos tudo
da melhor maneira. “Você não precisa saber disso agora. Seria como comer
algo que o seu corpo não sabe e nem pode digerir”. Podemos então reforçar
isto -- que tem de ser dito a partir de uma convicção plena, de modo a
transmitir-lhe a segurança e o alívio de que ela necessita – através de
metáforas, imagens da natureza e vivências. Por exemplo: podemos junto com
a criança, assar dois pães, sendo que o primeiro sovamos bem a massa e
depois, deliberadamente, não esperamos o tempo de descanso para que a
massa possa crescer sob ação do fermento e o depositamos no forno. Quando
estiver pronto, comemos o pão, que naturalmente terá a massa pesada e um
gosto amargo, nada agradável. Num outro momento, preparamos o pão
segundo a mesma receita e então esperamos que ele cresça, sem pular etapa
alguma, e depois assamo-lo. Ao provar do segundo pão, ficará clara a
diferença entre pular etapas, apressar as coisas e o vivê-las em seu devido
tempo. Também se pode oferecer à criança uma fruta nitidamente verde, que
não amadureceu o suficiente. Seria bom até se ela lhe provocasse um pequeno
episódio de mal-estar abdominal sem maiores consequências.
Outro aspecto de extrema importância tem a ver com o que a criança pode
compreender e abarcar com sua alma. De acordo com Steiner, pode-se dizer
que a criança ao terminar a troca de dentição teria a sensação de espetos
estarem invadindo seu organismo se quiséssemos introduzi-la no pensar
conceitual, principalmente a respeito do que surgiu da natureza morta, do
âmbito inorgânico. A criança já sente estranheza ao lidar com o que provém do
âmbito inanimado. Portanto, ao falar ou ensinar a crianças desta idade
precisamos ter dentro de nós o senso artístico para vivificar tudo. É como se
transformássemos tudo o que tenhamos a dizer em conto de fadas, fábula,
lenda, mito ou poesia. Em outras palavras, precisamos falar em imagens. A
cabeça pensa em conceitos, mas o coração aprecia e apreende em imagens. E
é preciso falar ao coração, pois é aí que a criança agora se encontra em seu
desenvolvimento: formando os órgãos rítmicos, o coração e os pulmões, e,
quanto à sua consciência, ela ainda não está plenamente acordada, mas
sonha. E nos sonhos qual é a linguagem que nos fala? A das imagens. Os
símbolos. Quando falamos às crianças a partir do conhecimento conceitual,
falamos como uma pessoa ressecada. Por outro lado, o que nós criamos como
imagem ainda tem a força do crescimento, a vida nova; isto atua sobre a
criança. Vocês poderiam dizer, “mas como podemos aprender a fazer isso?”
Isto começa com uma certa educação dos sentidos para uma percepção
artístico-simbólica das coisas. Como dizia Goethe tudo quanto existe de
efêmero no mundo sensorial não passa de um semblante, é como uma
40
parábola, uma manifestação de algo espiritual e superior. Trata-se, como
costuma dizer Rubem Alves, da “Complicada Arte de Ver”
Ela entrou, deitou-se no divã e disse: "Acho que estou ficando louca". Eu fiquei
em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. "Um
dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os
tomates, os pimentões - é uma alegria!
Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera
centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a
cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma
cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a
impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica.
Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro:
'Rosa de água com escamas de cristal'. Não, você não está louca.
Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê
que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito
trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo.
Adélia Prado disse: "Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma
41
pedra e vejo uma pedra". Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A
pedra que ele viu virou poema. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada
veem.
"Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a
janela para ver os campos e os rios", escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de
Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido.
"Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus
olhos se abriram".
Os olhos não gozam... Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos,
eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que veem, olham
pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo. Os olhos que moram
na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na
caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter
as crianças por nossas mestras.
Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus
Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: "A mim,
ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as
coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a
gente as têm na mão e olha devagar para elas".
Por isso - porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver -
eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor
que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que
42
crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do
poema de Caeiro. Sua missão seria partejar "olhos vagabundos”
43
fantástico. É fundamental cultivar o sentido do belo e despertar a
sensibilidade artística.
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do dom da beleza, enquanto o homem tem na força e na coragem, seu
principal atributo.
Que mensagens estão, via de regra, associadas ao sexo na forma como ele é
apresentado na TV, em vídeos, revistas, anúncios, etc.? Na esmagadora
maioria das vezes, como um meio de obter vantagens, exercer domínio ou
poder. A educadora Jean Kilbourne diz a esse respeito: “O sexo na publicidade
tem a ver com a banalização e não com sua promoção, tem a ver com
narcisismo e não com promiscuidade, com consumo e não com conexão. O
problema não é ser pecado, e sim, artificial e cínico”.
45
Parem para folhear as revistas dos adolescentes de hoje. Sintonizem em
estações de rádio que tocam os 40 maiores sucessos do momento e/ou rap.
Assistam à MTV e aos comerciais que passam durante as novelas, reality
shows, filmes e eventos esportivos. Aluguem (e assistam) filmes recomendados
para a idade deles. Explorem os canais onde são veiculados comerciais
voltados para as crianças tais como, Nickelodeon, Disney, Fox Family.
Naveguem na internet. Esqueçam os sites pornográficos – em vez disso,
procurem os sites corporativos voltados para crianças e adolescentes. Ao fazer
tudo isso pensem em quanto tempo estas crianças ficam envolvidas com a
mídia. E depois pensem sobre o que temos feito para preservá-las disso e/ou
para constituir-lhes uma referência diversa dessa. A concorrência é desleal!
Nos Estados Unidos, para as meninas brancas, a idade média para o início do
desenvolvimento dos seios e de pelos pubianos é de dez anos e, para meninas
afro-americanas, nove. No Brasil está entre 10 e 11 anos, atualmente. Mas
seios não fazem da menina uma mulher. Não há provas de que o seu
desenvolvimento emocional esteja acompanhando as mudanças orgânicas.
Imaginando como deve ser confuso, embaraçoso e até assustador para as
meninas experimentar alterações hormonais antes de chegarem aos dez anos,
faria sentido que nós adultos nos concentrássemos em ajudá-las a lidar com
isso. Qual é a melhor maneira de ajudar as garotas a seguir em frente quando
mudanças hormonais ocorrem antes que elas estejam emotiva e
cognitivamente preparadas para tomar decisões responsáveis sobre
sexualidade, sem falar de sexo? Qual é a melhor maneira de ajudar os
meninos que ficam atrás das garotas (no tempo) em relação ao
desenvolvimento sexual, a lidar com isso quando suas amigas e colegas de
sala se transformam diante de seus olhos?
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Mesmo que os jovens estejam se iniciando sexualmente mais cedo, muitos
relatam não ter informação adequada sobre sexo por parte dos pais e da
escola. Então aonde vão as crianças quando querem saber sobre sexo? Hoje,
elas recorrem à mídia, principalmente, TV e internet. (Vide reportagem –
Folhateen de maio de 2009)
NA TELEVISÃO
Sem dúvida, a televisão, por ser o maior meio de comunicação de massa, é
também o principal veículo de estímulo ao processo de erotização da infância.
Os lares brasileiros, de algumas décadas para cá, passaram a ser invadidos e
bombardeados, diariamente, por diversos programas — especialmente os de
auditório - em que apresentações de grupos musicais de axé music; pagode e
similares são, invariavelmente, acompanhadas pela exibição de dançarinas
(vestidas de modo a ressaltar e expor os seus atributos físicos) que, através de
requebros e gestos sensuais, produzem um erotismo quase sempre grotesco,
embora bem ao gosto masculino.
Por vezes, sequer há a justificativa da música e da dança; em diversos
programas, atrações constantes apelam sempre para um erotismo explícito
(Tiazinha, Feiticeira, mulher melancia, mulher pera, etc.).
A fórmula teve sucesso instantâneo face ao seu forte apelo sexual. Como
decorrência, as musas do rebolado atingiram a fama e ascensão econômica; o
Brasil passou a conviver, diariamente com as novas estrelas tipo Carla Peres,
conhecendo-lhes a intimidade, modo de vida etc.
A popularização de tal tipo de espetáculo e de artista não respeitou mais
hora nem faixa etária de público. Estas apresentações grotescas e de
baixa qualidade, mas cheias de erotismo, chegaram às crianças, inclusive
nos próprios programas destinados ao público infantil. As musas “da
boquinha da garrafa” apresentam-se, diariamente em programas de
auditório repleto de pequeninos.
47
Como não poderia deixar de ser esta sensualidade grotesca e totalmente
despropositada em programas infantis se constitui em importante fator no
processo de erotização da infância. Se este produto é apresentado às
crianças e exaltado o sucesso e fama atingidos pelas artistas, não há
como elas deixarem de captar uma mensagem subliminar de que este é
um caminho bom e desejável. Como decorrência lógica, surge a
necessidade de imitar: a roupa, os gestos e os meneios sensuais. Em
outras palavras, a sensualidade passou a invadir o mundo e a imaginação
infantil.
A partir do desejo de imitar, surge um subproduto de consumo na mídia
televisiva: as meninas e meninos que passam a se apresentar imitando os
ídolos.
As meninas - especialmente elas - são as principais vítimas deste processo. As
mais hábeis na imitação, incentivadas pelos pais, apresentam-se em
programas de auditório (tanto infantis como de adultos), com o mesmo gestual
supostamente erótico e com vestimentas que, tal como as adultas, expõem ou
ressaltam pernas, nádegas ou seios. Tudo sob os olhares orgulhosos de pais e
para o aplauso da plateia e telespectadores.
A falta de limites é tamanha que há algum tempo surgiu um trio “profissional”
de imitação do grupo È o Tchan” . O trio era composto por duas meninas (uma
loira e uma morena) e um menino, todos com idades em torno dos oito, nove
ou dez.
Dançavam e cantavam. Reproduziam os mesmo gestos e cantavam as mesmas
letras. Nada mais grotesco e agressivo do que a imagem e som daquelas
crianças, cantando e dançando com frases como esta: “...rebolando a
bundinha até o chão...”
Em um dos programas a apresentadora, a conhecidíssima Hebe Camargo,
quando o trio terminou a sua triste apresentação, não se conteve a exclamou:
“Gracinhas, é tão...tão natural!” (Não se atina o que, naquela apresentação,
poderia ser tido como natural, salvo que já se tenha como natural crianças
erotizadas!)
Este grupo mirim apresenta-se em programas de auditórios (infantis e adulto)
e faz apresentações em festas inclusive viajando em turnées. Entrevistada
uma das meninas, mencionou ela que, quando em viagem, tinham que faltar à
aula, “mas aproveitavam para estudar no caminho.”
É óbvio que, no caso sob enfoque, ao processo de erotização e imitação,
somou-se a ganância dos pais que passaram a ver nos dotes artísticos
naturais dos filhos uma forma de ganhar dinheiro.
48
Considerando que a apresentação de menores em qualquer tipo de espetáculo,
exige a prévia autorização do Juizado de Proteção a Infância e Juventude,
como tais licenças são concedidas? Sob qual justificativa legal, ética ou sob
qual juízo de conveniência se permite a exposição de crianças em tais tipos de
espetáculos? Sob qual fundamento se admite que grupos adultos, com este
nível de apelo erótico, se apresentem em programas infantis?
Não se trata de censura, mas do exercício regular de competência legal que, a
toda evidencia, não se está exercendo.
AS TELENOVELAS
49
ao ar, antes da meia-noite, cena em que um casal, na penumbra, em baixo
dos lençóis, sugeria a manutenção de relação sexual.
No Brasil, nas novelas, especialmente as da tarde e a das 21h00, tanto a
nudez, quanto o relacionamento sexual são sugeridos de forma muito
mais aberta do que aquela que motivou a penalidade e, rigorosamente,
nada acontece. Homossexualismo; lesbianismo; sexo oral; masturbação;
bestialismo; orgasmos explícitos; estupros, enfim, tudo quanto se possa
imaginar a respeito de sexualidade normal ou anormal, já foi objeto de
exibição ou sugestão nos nobilíssimos horários televisivos.
Não raro estas situações geram constrangimentos familiares: eis que tais
cenas, presenciadas por crianças sem qualquer condição de intelecção,
resultam em perguntas cujas respostas ou implicam em uma mentira
prejudicial, ou acabam antecipando o conhecimento a respeito de um
tema que, normalmente, não estaria no imaginário de uma criança. Pior
do que a constrangedora pergunta é o silencio, ou seja, a mera
assimilação de algo que não sabe o que é, mas começa a intuir. Isto
significa erotização precoce.
A tudo isto, o Estado jamais deu uma resposta que implicasse na punição da
emissora que abusou das liberdades públicas. Esta omissão estatal em
fiscalizar e punir os excessos gera a certeza da impunidade. Há, portanto,
também aqui, falta de exercício de competência legalmente atribuída ao
Estado.
50
dos países) para a profissão de modelo varia entre os dezessete e os dezoito
anos.
O fato pode ser constatado pelo grande público, porquanto, em todos os
desfiles internacionais de alta costura, a aparência das modelos é sempre de
jovens de idade superior a 17 ou 18 anos.
Onde vale tudo, até prostituir-se. Por isso, as escolas de modelo são cada vez
mais valorizadas. Existem cursos para modelos infantis, iniciando-se, já aí, o
51
treinamento da futura modelo. Não se pense que esta modelo mirim irá vestir-
se e comportar-se como uma criança. Não, a moda infantil, no Brasil, é uma
imitação da moda adulta (especialmente a moda infantil feminina) e é um dos
fatores do processo de erotização infantil.
52
proteção a infância e juventude. Por qual ignorado motivo, a profissão de
modelo, tão incompatível com a adolescência, parece entre nós liberada?
Também aqui, parece estar havendo a omissão estatal e falta de exercício de
competência legal já estabelecida no ECA.
A INTERNET
53
de erotização da infância. Nos cursos de modelo destinados a crianças, o que
se lhes ensina é a postura do desfile adulto; é o gestual adulto e até o olhar
adulto. Portanto, o erotismo postural das crianças fotografadas nestes sites
encontra plena correspondência na postura erótica que, de forma aberta, se
ensina e se mostra como algo bom e louvável na televisão.
A erotização da infância, embaralhando os sinais emitidos, pode gerar a
confusão da sexualidade normal no adulto.
Pois bem, esta questão, aos efeitos do presente trabalho, assume relevo, na
exata medida em que o avanço do processo de erotização da infância, com a
concreta exploração da sexualidade púbere e pré-púbere, parece representar
um afrouxamento do padrão cultural de reprovabilidade. Mais uma vez
relembre-se o acórdão do STF, em que, dadas as circunstâncias do caso
concreto, retirou-se a reprovabilidade penal de conduta essencialmente típica.
O tema está a merecer maior aprofundamento por parte dos especialistas da
área.
Não se está concluindo que o tabu tenha deixado de existir ou que não haja
a reprovação social e penal da pedofilia. O que se estabelece como fato a ser
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estudado é que o avanço da pedofilia encontrou na Internet canal de maior
concretização de fantasia e vai ao encontro de um mercado estimulado pela
mídia.
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da prevenção e repressão estatal. Os sites softcore tem conteúdo variado,
explorando a nudez (ou seminudez); a sensualidade em poses, gestos e
olhares.
Estranhamente, boa parte destes sites - por sua longa duração e por serem
comerciais, inclusive com oferta de assinatura periódica através de cartão de
crédito, contam com a tolerância das autoridades.
A tentativa de encontrar um critério lógico para que alguns destes sites sejam
considerados legais e outros não, aponta para uma estratégia comercial. Se o
endereço eletrônico consegue travestir o conteúdo de nudez ou erotização
infantil, sob a roupagem de alguma atividade lícita (divulgação do naturismo;
oferta de modelos infantis e de adolescentes para fotografia ou desfiles;
ateliers supostamente artísticos dedicados ao nu infantil) a sua exploração
comercial parece ser entendida pelas autoridades como lícita.
Os que procuram explorar a nudez sem qualquer suposta justificativa são em
sua maior parte fechados.
O que importa considerar - e até causa espanto - desta aleatoriedade na
permissão de exploração comercial da nudez infantil, é que haja um critério
admitido pelo Estado segundo o qual seja licito, ou tolerado este tipo de
exploração.
CONCLUSÕES
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a) Existe em curso um processo de erotização da infância que, aumentando,
inclusive, os níveis hormonais, determina a antecipação da puberdade e da
vivência sexual.
Procurou-se também demonstrar que a mídia, especialmente a televisão pela
sua importância social, se constitui no principal instrumento do processo de
erotização da infância, com o que e lícito igualmente concluir:
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como objeto sexual.
Os sintomas deste abrandamento já se fazem sentir, não apenas no interior
das famílias, mas, especialmente, em todas as instâncias de poder estatal.
A troca de um padrão cultural sem que se criem estruturas familiares, sociais
e psicológicas capazes de assimilar ou de por limites aos novos padrões
prestes a serem estabelecidos é, sempre, perniciosa.
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finalidade de controlar e fiscalizar a ação da mídia no processo de erotização
da infância.
Aos que começam a despertar, ele tenta impedir que se fortaleçam em suas
convicções deixando-os solitários, e com isso, sobrecarregados e frágeis sob o
peso de uma maioria totalmente indiferente às suas necessidades comuns,
pois somos em nossa convivência, interdependentes. Ariman bem sabe que as
comunidades humanas que se baseiem em um impulso puramente espiritual,
oriundo de um reino que não pertença ao “Príncipe deste mundo” são as
únicas que podem resistir à sua sedução, além de promover um incremento e
uma potenciação às forças do Bem. E conhecendo este segredo ele faz de tudo
para corromper e submeter à sua influência, com todos os meios que
estiverem à sua disposição, justamente comunidades humanas como a de
uma Escola Waldorf que em seus fundamentos é profundamente Crística, cuja
pedagogia se baseia em uma visão do homem como ser portador de corpo,
alma e espírito. [Cristo já dissera: “Meu reino não é deste mundo” e “Eu venci
o príncipe deste mundo”]
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Educação na Adolescência (PDF)
(...) Vejam bem, é realmente essencial que neste contexto imperem conceitos
educacionais excepcionalmente claros. Não se pode dizer que seja este o caso,
hoje em dia. Precisamente quando se considera esta faixa etária, pode-se
observar como as pessoas supervalorizam questões puramente secundárias. A
coisa alcançou o ponto em que certos processos anímicos instintivos que
ocorrem na puberdade têm sido examinados, mesmo nos círculos pedagógicos,
à luz de uma análise completamente equivocada da psicologia envolvida.
Isto se aplica, naturalmente, não só ao que concerne à vida das pessoas, mas
de forma geral, a tudo – até a coisas como uma peça musical. Todas estas
coisas deveriam ser apresentadas aos jovens de tal sorte que se produzisse um
constante eco em seu íntimo, de modo que lhes surgissem questões sobre a
natureza, sobre o mundo e o cosmos, sobre o ser humano, sobre temas
históricos, e assim sucessivamente. Perguntas deveriam surgir de dentro dos
jovens sobre os enigmas do mundo e seus fenômenos. Pois dentro da alma
estão presentes nesta época forças que se disponibilizaram pela liberação do
corpo astral, cuja tarefa é confrontar-se com tais enigmas. Se questões deste
tipo acerca do mundo e seus fenômenos não emergirem do jovem coração
humano, estas forças se transformam em algo mais. Se não conseguimos
suscitar o mais intenso interesse pelos enigmas do mundo quando estas
forças se tornam disponíveis, elas então se metamorfoseiam naquilo que
hoje observamos nos jovens. Elas se transformam em algo instintivo que
segue em duas direções: primeiramente, no sentido de uma sede de
poder; e segundo, em erotismo. E a tragédia a esse respeito é que mesmo
o pensamento educacional moderno assume que esta sede de poder e este
erotismo são traços naturais do desenvolvimento do ser humano da
puberdade em diante, ao invés de percebê-los como fenômenos
subordinados produzidos pela metamorfose de forças que, até os 20, 21
anos, deveriam seguir um curso totalmente diferente.
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para a proeminência dada a esta questão é que, numa era em que o
materialismo se tornou uma concepção tão abrangente da vida, as pessoas
perderam tanto mais a habilidade de despertar um genuíno interesse no
mundo – e o mundo no sentido amplo da palavra. Nossas disciplinas
acadêmicas, nas quais, naturalmente, os próprios professores tem sido
educados, em essência, realmente não contêm nada sobre o mundo. Elas
oferecem leis físicas, relacionamentos matemáticos, descrições do que
acontece na intimidade da célula e toda sorte de visões sobre processos
históricos abertos ao debate. Estas coisas reunidas são incapazes de inspirar
interesse nos jovens, precisamente entre 15 e 20 anos de idade. Qualquer
pessoa de mente suficientemente aberta e sem preconceitos para fazer as
observações apropriadas nesta área poderá perceber que tais matérias são
simplesmente incapazes de mobilizar e satisfazer os interesses mais profundos
dos jovens desta idade. Mediante a falta de interesse no mundo à sua volta,
eles serão remetidos de volta a si mesmos e desse modo começam a
ruminar toda sorte de coisas.
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sentido mais amplo possível. Isto significa, por exemplo, que o professor deve
suscitar em sua alma os mais profundos sentimentos de responsabilidade
por sua tarefa.
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ÉPOCA DE REPRODUÇÃO HUMANA E SEXUALIDADE
1º dia
2º dia
3ºdia
4º dia
5º dia
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1º dia
2º dia
Respondendo à Pergunta
A imagem do corpo na concepção da Ciência atual e da Religião e suas
implicações e conseqüências
A relação entre os pólos da cabeça e dos órgãos sexuais na adolescência
(o amor e a ilusão do amor)
O Templo de Salomão como símbolo para o Corpo Humano
O Sopro Divino – O Eu Sou – O nome de Deus
3º dia
4º dia
5ºdia
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Amor de Índio
Beto Guedes
Composição: Beto Guedes/Ronaldo Bastos
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Homem Mulher
Órgãos genitais externos mais próximos da Orgãos genitais no interior e sem movimento
terra (membro) ; movimento
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O Homem e a Mulher
Victor Hugo
O homem é a mais elevada das criaturas; a mulher, o mais sublime dos ideais.
Deus fez para o homem um trono; para a mulher, um altar. O trono exalta, o
altar santifica.
Enfim, o homem está colocado onde termina a terra; a mulher, onde começa o
céu...
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ASSIM NA TERRA COMO CÉU
Do Sol emanam luz e calor. Ele fecunda a Terra. Ela gesta a vida, abriga os
seres. Nutre, cuida e protege tal qual uma grande mãe. Como cantou Caetano
Veloso: “Luz do sol, que a Folha traga e traduz, em verde novo, em folha, em
graça, em vida, em força, em luz”... Eia a grande polaridade arquetípica.
A Lua tem algo a ver com tudo o que cresce. Isto é sabido pelo agricultor, que
se orienta pelo que a Lua lhe dá como ajuda no manejo agrícola, na
semeadura, etc. A lua tem influência sobre as forças de crescimento. Todo
crescer e medrar está relacionado com esta natureza lunar. Mas se o crescer e
medrar deve ter resultados para o futuro, tanto para as próprias plantas como
para a humanidade que se alimenta delas, a planta deve formar frutos, não
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deverá crescer para sempre. – o crescimento deve ficar interrompido por um
tempo, entrando um outro processo em cena: o da maturação. Durante a
maturação, o crescimento, por assim dizer, estanca sutilmente. A maturação é
um morrer sutil. E na vida humana, o morrer deveria ser uma maturação.
Assim como no outono a árvore perde suas folhas, mas forja seus frutos,
assim também é quando nossas forças vitais começam a declinar que
podemos nos tornar sábios e maduros.
Isto também é semelhante a quando uma febre passa pelo corpo como um
calor inflamatório. Enquanto permanece é desagradável, contudo, depois da
febre geralmente nos sentimos renovados. É como se a febre dissolvesse
resíduos de depósitos no organismo, depurando-o. Cabe então imaginar que o
aparecimento de um cometa penetre no organismo de nosso sistema
planetário como uma espécie de calor passageiro, uma inflamação móvel, uma
trovoada cósmica, deixando atrás de si um organismo vital mais limpo dos
resíduos.
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TUDO O QUE MOVE É SAGRADO...
Neste sentido, podemos dizer que não é um lance impróprio quando pintores
insistem em reproduzir nos quadros natalinos que descrevem o nascimento de
Jesus, um cometa como a estrela guia dos Reis Magos. Não porque um cometa
tivesse surgido no céu na ocasião, mas muito mais como um sinal metafórico,
uma indicação simbólica sugerindo que “aqui entra no mundo terrestre uma
alma com uma missão toda especial”.
Mas porque é necessário que tal comunhão seja concedida por meio de pão e
vinho? Não seria suficiente ter apenas uma substância em que se soubesse
estar presente o ser do Cristo? Não, não seria suficiente, porque todo o mundo
veio à existência a partir da tensão entre as polaridades. Céu e Terra, Luz e
Trevas, Acima e Abaixo, O dia e a noite, O homem e a mulher. E assim, não
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poderia ocorrer outra coisa senão o fato de a majestosa entidade criadora solar
que no Cristo se uniu à Terra -- o Logos Solar feito homem -- viesse a se
comunicar com os homens que quisessem segui-lo e procuram por sua
presença, indo ao encontro deles sob dupla forma: no pão e no vinho, ou seja,
de um lado numa substância que é formada, assada num pão e depois cortada
como hóstia em forma circular, e de outro, na substância que como líquido,
não tem forma própria, ajustando-se ao recipiente que ocupa, tendo, em
contrapartida, em sua mobilidade, em sua fluidez líquida, o dom de
compenetrar e vivificar. Então forma e conteúdo, como encontramos no pão e
no vinho, se relacionam por sua vez com aquela mesma polaridade
arquetípica.
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AMAR __ ORAÇÃO DO ADOLESCENTE
Quem dera, neste tempo, o jovem tenha alguém para dizer-lhe isto. Pais que o
amem bastante para não retê-lo egoisticamente, mas dirigir-lhe o olhar para a
estrada nova e clara onde, um belo dia, a outra vai despontar.
Quem dera que ele tenha um amigo, um irmão que o ajude a sair de si próprio
e dar-se aos outros; sem isto ele se tornará escravo de si mesmo, incapaz de
amar.
Preciso amar.
Meus braços batem no ar e não consigo apanhar um objeto para o meu amor.
Preciso amar. Aqui está, Senhor, esta noite, todo o meu amor inativo.”
Para um pouco, e faze, silenciosamente uma longa romaria até o fundo de teu
próprio coração.
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É aquela que procuras,
Ela se aproxima,
Tu te aproximas,
Vos reconhecereis,
E já que tens fome de amor, botei no teu caminho todos os teus irmãos para
amar.
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O CORPO: ENCONTRO DO SAGRADO E DO PROFANO
Transcrito de uma palestra proferida por Jean Yves Leloup
Novalis
Que relação temos com o nosso próprio corpo? Para alguns o corpo é tudo.
Para outros é nada.
Será que nosso corpo é um caminho de vida espiritual? Uma ocasião de tomar
consciência do espírito que nos habita? Ou seria ao contrário, um obstáculo?
Alguns se sentem encerrados nos limites, nas patologias. Será que nosso
corpo é nosso amigo ou nosso inimigo? Estas são questões importantes de
nos colocarmos, pois de acordo com a relação que temos com o nosso próprio
corpo também será a relação que teremos com o corpo do outro. Nossa
maneira de acompanhá-lo, de cuidar dele até o fim da vida corpórea.
Há, por exemplo, a visão materialista. Neste pressuposto, não há nada além
da matéria. Não há nada além do corpo. E com o fim do corpo é o fim de tudo.
Para este modo de pensar, o que chamamos de alma e de inconsciente são
apenas processos mais complexos dos nossos próprios neurônios. E quando
queremos cuidar de alguém é a partir de sua química que se trata de intervir
ou agir para o bem dele. É bom vermos as consequências desses pressupostos
ou paradigmas. Se houver somente o corpo e a matéria, então se trata de fazer
isto durar pelo tempo mais longo possível e depois não há mais nada.
Para outros o ser humano é não somente matéria, mas esta matéria é
animada. Não há um corpo sem alma. Um corpo sem alma não é mais um
corpo, é um cadáver. Certa vez, estava um filósofo passando diante de um
74
cemitério, e, vendo o túmulo de alguém que fora há pouco enterrado,
perguntou-se: “Mas onde está a alma?” E eu respondo, a alma é o que
diferencia este monte de pó de você que está de pé. A alma é o que dá forma a
uma matéria, ao corpo. E sem esta animação, sem esta informação, o corpo se
dissolve. Assim, nesta visão, cuidar do corpo é cuidar da alma que o anima.
Nestes pressupostos antropológicos, alguns dirão que o importante no ser
humano é a alma e isso pode ter consequências num enfoque que vamos
chamar de dualismo: pode-se correr o risco de haver um certo desprezo pela
dimensão material do corpo. Mas os dois são indissociáveis e, entretanto,
alguns dirão que a alma pode subsistir mesmo quando já não anima mais o
corpo.
Então, para alguns o corpo é matéria, mas esta matéria é informada. E desse
modo, cuidar do próprio corpo e do corpo do outro é tomar em conta esta
informação, esta alma, em si mesmo e no outro.
Soma – Corpo
Psique – Alma
Noos – Espírito
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competência médica, ou da competência psicológica, mas isso depende da
nossa qualidade de ser e de escuta. E quando estamos nessa qualidade de ser
e de escuta pode haver uma transfusão de serenidade do meu ser ao seu ser,
do meu silêncio ao teu silêncio. E por vezes, é a partir desse silêncio, dessa
profundidade do Ser que a paz e a cura podem vir.
Nessa antropologia, nosso corpo não é somente físico e psíquico, mas ele
também tem uma dimensão noética (espiritual) e essa dimensão é a abertura
do corpo para a transcendência, a possibilidade que o corpo humano tem de
se abrir àquilo que vai além dele. A abertura do nosso ser finito ao infinito. E
por vezes, esta dimensão do composto humano é esquecida ou é fechada. A
observação, a atenção, a prática da meditação podem nos levar a essa
dimensão do ser. E é uma pena que nos privemos disso. Quando falamos de
castração, não se trata apenas de repressão de sua dimensão carnal, sensual,
ou de sua criatividade. O homem contemporâneo é por vezes castrado da sua
dimensão espiritual. E isso pode ser para ele uma fonte de mal-estar e de
doenças. Ele se priva da dimensão sagrada que habita seu corpo E esta é a
dimensão mais secreta, a mais discreta e silenciosa do corpo. É o corpo do
silêncio.
Há pessoas que têm uma saúde boa, mas não têm transparência. Outras,
segundo os cânones da moda e da beleza, têm aparência muito bela, mas não
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há transparência. Enquanto que por vezes, próximo a uma pessoa doente ou
no final da vida, há uma transparência, há essa transparência à grande vida
que atravessa esse corpo. E talvez se trate de reencontrar esse enfoque do
vivente, do Vivente que se encarna. Não se trata de se identificar com o seu
corpo, mas com a vida que se manifesta através dele. Não se trata de se fechar
em um corpo mortal, mas descobrir este corpo mortal como ocasião de
manifestação da grande vida que nos atravessa.
Não mais dizer eu tenho um corpo, mas Eu sou a vida que habita neste corpo.
Esta vida que continua quando o corpo não está mais aí para manifestá-la –
pois esta é uma experiência que nós todos faremos algum dia. Nosso corpo
não estará mais aí para manifestar a vida, mas a vida continua.
Quem somos nós? Será que somos a vida? O vivente que nos habita? O Eu
Sou que se manifesta neste corpo?Ou somente este corpo que deve
desaparecer? O Verbo se faz carne. A vida se encarna em cada um de nós. E o
tempo que temos para viver, é o tempo do qual precisamos para tomarmos
consciência do vivente que nos habita. A consciência toma corpo para que o
corpo tome consciência. A vida se faz carne para que a carne se faça vida. O
verbo, a palavra criadora se faz carne, para que a carne se torne verbo, para
que o nosso corpo descubra a informação que o anima.
Trata-se, pois, de não esquecer a presença que habita silenciosa este corpo. E
há algo de muito especial que acontece quando posso encontrar este corpo de
silêncio no outro. Não o silêncio ruim, o silêncio das coisas não ditas, mas o
silêncio que vem após a fala, após a emoção em simples comunhão. E nesse
momento pode acontecer uma revelação.
O grande Sopro que nos habita! E ainda que nós não creiamos em Deus, isso
não nos impede de respirar... E o Sopro não é propriedade de nenhuma
religião; mas se nós entramos na profundidade desse sopro, nele há a
presença deste Eu Sou que nos habita. Esse nome impronunciável que habita
a profundeza do sopro, esse nome se nos o tomarmos em comparação com o
corpo, veremos que ele tem a sua figura, a própria forma do corpo humano.
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O corpo do ser humano é o templo do nome. ‘É o templo do Sopro.
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SOBRE O TEMPLO DE SALOMÃO E SUA SIMBOLOGIA
Vocês sabem o curso dos acontecimentos tal como narrado na Bíblia, como
tudo começou. Neste caso não estamos lidando apenas com meros símbolos,
mas de fato com realidades objetivas em que, no entanto, um profundo
simbolismo histórico-mundial encontra sua expressão naquele tempo. E
aqueles que construíram o templo estavam conscientes daquilo que o templo
queria expressar, representar.
Consideremos porque o templo foi construído. E vocês verão que cada palavra
no relato bíblico tem um profundo significado simbólico. Basta considerar em
que período o templo foi erguido. Recordemos particularmente a explicação
bíblica para o que o templo devia ser. Jahveh disse a Davi: “Uma casa para o
meu nome”—isto é, uma casa para o nome Jahveh. E agora vejamos o que o
nome Jahveh significa.
Uma criança aprende num certo momento da vida a usar a palavra “Eu”.
Antes disso ela se considera como um objeto, na terceira pessoa. Assim como
dá nomes às coisas, também chama a si mesma por um nome objetivo – “nenê
quer, Bruninho quer”. Mais tarde vem a dizer Eu pela primeira vez.
Um poeta, Jean Paul descreveu este momento de sua vida assim: “Eu então
vislumbrei o mais íntimo recesso da alma, o sacrário do ser.”
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Assim um pentágono surgiu do quadrado.
Era assim que o judaísmo experimentava o Senhor Deus de seu povo, e era,
portanto uma coisa sagrada pronunciar o nome. Somente o Sumo Sacerdote
tinha permissão para falar o nome de Deus. E foi no tempo de Salomão que
chegou à santidade do nome Jahveh, a esse Eu que habita no homem.
Nós devemos tomar o desafio de Jahveh ao homem como aquilo que buscava
fazer dele um templo para o divino, o mais sagrado.
Mais tarde na idade média a idéia do templo de Salomão foi revivida pelos
cavaleiros templários. Desde então, não se ouviu mais falar de tais coisas.
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*ESTAÇÃO DESEMBARQUE – Referências Existenciais para o Jovem
Contemporâneo – José Ernesto Bologna
Seria bom que ela surgisse de uma decisão consciente e livre dos dois
parceiros;
Que houvesse uma clareza prévia quanto ao tipo de compromisso entre os dois
que essa decisão implica (apenas um breve encontro, pacto de namoro,
promessa de prosseguimento, etc);
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criativo. Dificilmente ele imagina – tanto tempo após ter iniciado sua
existência no corpo concebido e parido – que seus esforços contínuos devem
tender a evocar livremente e construir pacientemente, todo um ser, o seu ser,
que simplesmente não existirá, caso ele proceda apenas de acordo com a
maturação natural de suas forças congênitas no meio em que vive.
O homem não recebe como dádiva a sua qualidade humana. Tem que lutar
por ela. Sua luta é para superar a própria natureza: tem que impor sua
vontade sobre sua natureza, tem que apoderar-se dela, e reestruturá-la de
acordo com sua própria ideia. Quando sente preguiça, se disciplina a
trabalhar. Quando sente inclinação a fugir, decide defender sua posição.
Quando sente rancor, procura perdoar. E quando seu corpo é tomado de
desejo egoísta, ele transforma esse desejo em interesse objetivo, em afeto pelo
outro, e em atividade criadora.
Todos nós somos atraídos pelo sexo, sem dúvida. Mas existe algo mais
profundo. O que almejamos em realidade não é o sexo, mas a felicidade. O
sexo em nós procura poderosamente realizar-se. Mas nós mesmos procuramos
a alegria e o prazer. O sexo não é nossa alegria, embora possa, em
determinadas circunstâncias, contribuir muito para ela. O sexo contribui para
nossa felicidade quando ele é totalmente absorvido e integrado em algo de
mais elevado. E, neste caso, o sexo torna-se invisível. É eclipsado e apagado
na experiência de alegria do coração. Quando o coração desperta no amor; o
corpo é erguido castamente em um sagrado mistério; pois o verdadeiro amor
sexual é casto e puro. O fato de serem poucos os que alcançam uma relação
de amor romântico ideal, não impede que este ideal seja desejável, evidente e
eficiente como meta para todos os que almejarem desenvolver suas faculdades
superiores.
82
APÊNDICE I –
Sobre a Homossexualidade
83
Também ocorre que todo homem carrega dentro de si uma mulher e toda
mulher traz em si um homem. Este fato corresponde na psicologia ao conceito
do animus e da anima de Jung, e na Antroposofia isto se relaciona com o fato
de que num corpo físico do sexo masculino vive e tece um corpo vital (corpo
etérico ou corpo das forças plasmadoras) de polaridade oposta, portanto
feminino – e vice-versa. Assim, a questão da heterossexualidade ou
homossexualidade pode ás vezes ser determinada ou condicionada por um
desvio do processo encarnatório em que a individualidade não penetre tanto
quanto seria de se esperar em seu corpo físico, vivendo mais em seu corpo
vital, que traz uma identificação contrária à do sexo aparente.
Outra aspecto, que a meu ver, tem um papel de destaque em nossos dias,
relaciona-se com o fato de que na adolescência, ao despertarem sexualmente,
muitos jovens passam inicialmente, por uma fase de descoberta do próprio
corpo e do igual para depois se voltar para o sexo oposto. Isto se revela
muitas vezes por um lado, na masturbação, e por outro, na necessidade de
84
troca afetiva, como amizade, com alguém do mesmo sexo e, não raro, uma
figura mais velha que é alvo da admiração do jovem. Quando preexiste uma
forte carência dessa troca no lar, se esse amor (afeto) se desloca para uma
vivência no âmbito corpóreo momentânea, pode surgir um estado de confusão
sobre a própria identidade sexual. Alguns jovens ficam fixados nisto, não
transcendem esta que seria uma fase normal de seu desenvolvimento
psicossexual e podem assumir-se como homossexuais ou bissexuais.
85
APÊNDICE II
Sobre Pedofilia
O QUE É A PEDOFILIA
Não se pode falar em pedofilia sem se fazer uma breve referência aos desvios
da sexualidade, ou seja, às parafilias, perturbações da sexualidade que podem
ser constantes ou episódicas, que se manifestam através de fantasias ou de
comportamentos recorrentes e que são sentidas pelo próprio como
sexualmente excitantes.
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Como já ficou dito, a pedofilia é uma parafilia específica, mas não se sabe ao
certo o porquê desta perturbada orientação sexual, conforme não se sabe
porque é que há quem prefira pessoas mais velhas.
Sabe-se, sim, que nem todas as crianças que foram vítimas de abuso sexual se
tornam adultos abusadores, mas que muitos adultos abusadores foram
vítimas de abuso sexual durante a infância.
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Lembro que, normalmente, o pedófilo procura uma vítima indefesa que, por
coação, é por ele silenciada, vítima essa que lhe está normalmente muito
próxima, embora possa também pertencer a um espaço exterior à família ou
ao seu meio natural (padres, professores, médicos).
MANUEL COUTINHO
Psicólogo clínico
O PORQUÊ DO SILÊNCIO
São inúmeros os fatores que levam a criança a ocultar o abuso a que foi
sujeito, mas destacamos: medo de represálias por parte do agressor;
sentimentos de vergonha, culpa, vergonha, e insegurança ou proteção (irmão
mais novos); medo dos interrogatórios e da devassa da sua intimidade ou
família; exposição pública; estigma social.
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SINAIS E SINTOMAS
– Falta de confiança num familiar adulto, ou não querer ficar sozinha ou com
determinado adulto.
– Automutilação
– Tentativa de suicídio.
– Fuga.
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– Mostrar que acreditamos. Devemos dizer e mostrar à criança que
acreditamos no que está a contar, mesmo que nos pareça estar a fantasiar ou
a ocultar informação, sobretudo porque, em muitos casos, a criança procura
proteger o seu agressor.
ALEXANDRA SIMÕES
Psicóloga clínica e de aconselhamento
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APÊNDICE III
TV e a erotização precoce
Sonia Thorstensen – psicóloga clínica
Para começar, vamos definir o enfoque pelo qual abordaremos este tema: não
será aquele que implique qualquer desejo de volta da censura aos meios de
comunicação; nem um enfoque moralista ou religioso que diga o que é certo
ou errado; mas também não será um, muito em moda atualmente, no qual
sexo virou tabu ao contrário, isto é, qualquer questionamento da atual postura
do “é proibido proibir” é ridicularizado como retrógado, repressor,
ultrapassado. Nós vamos falar sob a ótica da psicologia e da psicanálise.
Primeiro vamos lembrar alguns dados sobre nossa realidade. Depois veremos
o que a psicologia e a psicanálise têm para nos ensinar sobre a estruturação
da sexualidade na criança e como nossa televisão se comporta face a esse
processo. Em seguida, discutiremos que posição e tipo de ação nós,
educadores, psicólogos, pais podemos ter face a esse estado de coisas. Alguns
dados e reflexões: números do Ministério da Saúde mostram que a maior
causa de internação de meninas de 10 a 14 anos nos hospitais do SUS são os
partos ou as consequências de abortos mal feitos. Em 98, no Brasil, foram
feitos cerca de 32000 atendimentos desse tipo. números do Serviço de
Atendimento ao Adolescente da PMSP mostram que 50% das adolescentes
engravidam nos primeiros 6 meses de atividade sexual; 20% no primeiro mês.
pesquisa recente em São Paulo revela que mais de 90% dos adolescentes
conheciam os recursos contraceptivos, no entanto, apenas 29, 6% usaram
esses recursos na primeira relação. não temos estatísticas sobre isso, mas
sabe-se que o Brasil é considerado uma das mecas do turismo sexual e da
prostituição infantil ? sobre as DST e a AIDS. Sabemos que 75% das
contaminações pelo vírus HIV se dão por meio das relações sexuais e que as
DST aumentam a vulnerabilidade ao vírus. E que o Brasil também é um dos
“campeões” nessa área há ainda um outro fator que precisa ser considerado
junto com esses dados: é o fato de que vivemos um momento histórico de
intensas mudanças culturais: a mudança da posição da mulher na família; a
diluição da função paterna e a instauração da “democracia familiar”; o
aumento da responsabilidade do Estado e da Escola face às crianças e a
consequente diminuição da responsabilidade dos pais, etc. Isso sem falarmos
nas mudanças tecnológicas e econômicas (globalização, por exemplo ). O fato é
que estamos todos um pouco perdidos, tateando pela vida na busca de novas
formas de ser. Esse vazio de referências dá espaço a um “vale tudo” no esforço
de preenchê-lo. Se por um lado vivemos uma fase fascinante em termos de
estímulo à criatividade, por outro temos que nos apoiar intensamente em
nossa capacidade de discernimento, para não deixarmos que o caos se instale
em nós. e, finalmente é importante remarcar que a televisão é um veículo
educativo e de promoção humana inigualável e que a televisão brasileira está
entre as melhores do mundo em qualidade técnica. E que, em parte, devemos
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à ela a unificação de nossa identidade de brasileiros, num país tão vasto e
diversificado.
Aqui estaremos falando da falta de responsabilidade social das emissoras
comerciais no que se refere a dois aspectos, que de fato são interligados: 1º) a
competição selvagem por índices de audiência e retorno financeiro, sem que o
governo faça cumprir leis existentes em vários níveis, até mesmo na
Constituição. 2º) a falta de compromisso com o bem estar psicológico de
nossas crianças e adolescentes (o que significa toda a programação diurna e
até às 22 horas, horário em que, na nossa cultura, os mais jovens estão
expostos, desacompanhados, à influência da televisão.) Falaremos aqui sobre
alguns aspectos da problemática da sexualização precoce, mas é bom lembrar
que a questão do estímulo à violência é igualmente grave. Como a Psicologia e
a Psicanálise podem nos ajudar? Como elas vêem o processo de estruturação
da sexualidade da criança? A sexualidade surge na adolescência devido à ação
dos hormônios? Ela é um instinto inalterável, como nos animais? Sabemos
que o impulso sexual humano caracteriza-se por ser moldado culturalmente, o
que explica as várias formas que ele apresenta. Como isso se dá? São os
cuidados maternos que despertarão o bebê para a vida erótica: dizemos que a
mãe fará uma inscrição erótica no corpo do bebê. Para isso, naturalmente
espera-se que a mãe seja psiquicamente saudável. A criança vai elaborando
aos poucos os estímulos que constituirão seu mundo erótico. A mãe é o seu
primeiro amor. Aos poucos, entra o pai requisitando a mãe e pondo limites
nessa relação. O pai torna-se também um objeto de amor e organizador do
erotismo da criança. A criança aprende a renunciar à mãe para o pai e se
resigna a adiar para mais tarde a expressão plena de seu erotismo. Esse é um
processo extremamente complicado onde entram a mãe, o pai e os familiares
próximos. Da forma como ele é resolvido, dizemos que dependerá a saúde
mental desse indivíduo, para o resto da vida. Portanto a estruturação
psicossexual da criança se dá na troca afetiva entre ela, seus pais e familiares,
na qual cada um tem sua função determinada, o que permite que a criança vá,
aos poucos, e de acordo com suas possibilidades crescentes, organizando seus
impulsos eróticos em consonância com as regras de seu sistema familiar. O
que está fazendo a nossa televisão? Ela inunda massivamente a criança com
uma sexualidade adulta e muitas vezes pervertida. A criança possui uma
sexualidade com características diferentes da sexualidade adulta, porque ela
ainda não organizou todos aqueles impulsos e impressões eróticas dispersas,
num todo coerente. Só aos poucos ela vai organizar seu erotismo na direção da
genitalidade, isto é, da relação sexual propriamente dita. É um processo no
qual ela terá que elaborar as ansiedades referentes às repressões sexuais da
primeira infância, para então poder atingir a plenitude da maturidade genital.
E temos a questão da perversão. O que são atitudes perversas? São ideias de
que posso usar o outro como eu quiser, transformando-o num objeto usável e
descartável do meu gozo momentâneo, fora do contexto de uma relação
humana com ele. A sexualidade infantil tem muitas dessas características
perversas, pois a criança ainda não consegue ver o outro como um ser
separado dela. Aos poucos, ela terá que aprender que o outro não existe para
ser usado, mas é alguém com quem ela deve se relacionar como um ser
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humano, diferente dela. Chamamos essa aprendizagem de socialização da
criança, ou, se quiserem, de educação moral. Trata-se de ensinar à criança a
controlar, reprimir, seus impulsos perversos (egoístas, se quiserem) para que
ela possa viver em sociedade. Esses impulsos são, por natureza, sem limites.
Daí a necessidade de se aprender a pôr limites neles. Esses limites são as
normas culturais que a criança introjeta, através de um processo que
chamamos de educação. É a educação que auxilia a criança a manejar seus
impulsos primitivos, tanto eróticos como agressivos, e esse processo é
necessário tanto para a saúde mental do indivíduo, como para possibilitar a
vida em sociedade. Uma má interpretação da psicologia e da psicanálise
parece ter levado as pessoas a acreditarem que não se deve pôr limites nas
crianças, para não traumatizá-las, e então elas perderem sua criatividade.
Essa idéia é uma falsa interpretação da psicanálise e que é muito difundida,
infelizmente. Ela está na raiz de muitos dissabores que vivemos na nossa
cultura atualmente: na aflição dos professores que não sabem mais o que
fazer para conter a falta de limites das crianças nas escolas, na sociedade
como um todo que não está conseguindo pôr limites na escalada de violência,
etc. Portanto a educação dos impulsos primitivos perversos (ou egoístas) é não
só socializadora como, de fato, humanizadora. Como, apesar das repressões,
esses impulsos tendem a ressurgir indefinidamente, a sociedade para
proteger-se deles, faz suas regras de conduta, sob forma de leis e sanções. (O
que nos remete à questão da impunidade em nossa cultura) Voltando à
sexualidade: Não faz portanto o menor sentido que nossa televisão tenha o
direito de invadir massivamente a criança com estímulos sexuais face aos
quais ela ainda não tem condições próprias de se defender. O que está
acontecendo em nosso meio equivale a alimentar bebês com feijoada e vatapá:
pratos genuinamente brasileiros, muito apreciados, mas impróprios para o
consumo infantil. A preocupação em preservar estilos próprios, brasileiros, de
viver a sensualidade, não deve nos confundir, levando-nos a compactuar com
essa ausência de regras sobre a veiculação da sexualidade pela mídia.
Sabemos que a sexualidade se constrói em cima de regras, as regras
familiares, e que sem regra e, portanto, interdições, não é possível estruturar
uma sexualidade propriamente humana. Nossas crianças e adolescentes não
estão tendo o direito de construir sua sexualidade aos poucos, partindo das
experiências vividas no seu núcleo familiar protegido, e, daí sim, adquirir seus
próprios valores sexuais com os quais irá fazer suas escolhas amorosas
futuras. Em vez disso, ela é bombardeada com cenas sexuais alheias à sua
realidade imediata, as quais ela não tem condições de integrar num conjunto
coerente. Esse bombardeio se dá por 3 a 4 horas, diariamente, e sabemos que
a maioria de nossas crianças passa menos tempo que isso na escola. Muitas
vezes ouvimos falar que nossa televisão não é diferente da televisão de outros
países, que também apresentam programas muito violentos e de baixo nível,
nos canais abertos. Isso entretanto não é verdadeiro no que se refere ao item
sexualidade. Nossa televisão caracteriza-se por ser hipersexualizada, como
nenhuma outra. Que efeitos isso pode ter? De fato não sabemos com precisão
todas as consequências desse estado de coisas. Vou citar algumas das
consequências mais conhecidas:
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1º) A banalização da sexualidade O acúmulo de cenas sexuais de todos os
tipos sendo despejadas continuamente sobre a criança faz com que ela
aprenda a ver o sexo como algo banal, que se faz porque todos fazem, porque o
grupo pressiona e não pelo significado pessoal que possa ter. Pesquisas
recentes atestam esse "fazer por fazer."
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cronológica que defina quem está pronto. Simplesmente cada um tem seu
ritmo. Pelo mesmo motivo nossa sociedade definiu que a idade mínima para
dirigir carro é 18 anos. E sabe-se que a maioria dos acidentes são provocados
pelos jovens motoristas. As consequências do sexo irresponsável não são
menos graves. (Por isso, quando aquele Ministro do Supremo disse que uma
menina de 12 anos, atualmente, já é uma adulta, ele mostrou que não entende
nada de adolescência.) Portanto, esse incentivo generalizado à atividade sexual
dos jovens é uma inconsequência de quem o faz. Em nosso Projeto, temos um
lema que repetimos à exaustão:
" Transar não é coisa para criança; é coisa para quem tem cabeça de
gente grande".
Além disso, ouvimos tanto falar que os jovens estão iniciando a atividade
sexual cada vez mais cedo, que fica no ar a impressão de que alguma
modificação biológica está ocorrendo na espécie humana. Isso não é verdade.
Embora a menstruação esteja ocorrendo ligeiramente mais cedo em diversas
populações, devemos pensar que, no ser humano, a atividade sexual é
predominantemente determinada pela cultura, não pelo instinto, como nos
animais e que essa precocidade deve ser compreendida culturalmente, em
suas múltiplas facetas.
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outro a minha vontade") como essa. A falta de regras leva as emissoras à uma
busca compulsiva de "cada vez mais transgressão" na procura do seu próprio
limite. Quem deve fazer aí a função de pai e colocar os limites? A sociedade
como um todo. O que estamos assistindo a televisão fazer é uma busca do
como chocar cada vez mais, como produzir cada vez emoções mais fortes. Sem
que aparentemente ninguém a detenha. Essa é uma atitude extremamente
deseducadora para a criança e o jovem, que estão aprendendo a conciliar seus
impulsos agressivos e eróticos com as regras sociais. Por sermos e para
sermos humanos, temos que estar todos sujeitos a regras, claro,
democraticamente feitas, mas que elas existam e sejam cumpridas. O "tudo
pode" sem limites leva:
1º) ou à busca desenfreada de emoções cada vez mais fortes numa atitude de
tipo psicótica (queimar o índio pataxó é um exemplo disso)
2º) ou a uma angústia avassaladora face a essa falta de freios aos impulsos
destrutivos inerentes ao ser humano, e à procura deles em rígidas regras
externas já estabelecidas (religiões fundamentalistas, o exército, colégio
interno, a polícia, uma ditadura etc.)
3º) ou, nas pessoas mais bem estruturadas, à busca de regras estabelecidas e
compartilhadas pela sociedade, que é o que estamos fazendo aqui. Antes de
finalizar, quero lembrar-lhes que as emissoras de televisão são uma concessão
do governo, feita em nosso nome
Se não estivermos satisfeitos com o uso que elas tem feito dessa
concessão, (e eu não estou nada satisfeita) devemos nos mobilizar e
reclamar, pressionar, boicotar os produtos dos patrocinadores de maus
programas, lutar pelos nossos direitos de telespectadores.
Nós já temos leis sobre os meios de comunicação bastante adequadas, que
não são cumpridas por falta de regulamentação e vontade política para fazê-la.
Em nenhum país avançado a televisão funciona sem regras, como no nosso.
Temos que mudar esse estado de coisas. Penso que o estabelecimento de
regras é urgente, assim como o seu cumprimento; nas sociedade modernas,
não só na nossa, muitos jovens vivem um esgarçamento severo dos valores de
convivência social. Isso tem várias causas (não só a pobreza) mas, no nosso
meio, a televisão, devido a seu alcance, certamente tem contribuído para essa
situação.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COMPLEMENTARES
FILMES:
Curta Infância
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