Logica 2014
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LÓGICA
Nota do autor
Para garantir o processo de ensino e aprendizagem na Universidade Pedagógica—Maxixe
(UP-Maxixe), e especificamente na cadeira de Lógica, elaboráramos estes apontamentos. É um
trabalho ainda em laboratório, que irá sendo melhorado conforme as discussões próprias das
aulas e conforme a confrontação bibliográfica ainda por descobrir, mas podemos assegurar que
uma boa iniciação será feita. E porque é um trabalho em laboratório, a sua referência e
multiplicação devem ser precedidas por uma autorização do autor.
O autor
Domingos Francisco Mazive
Formado em Teologia pelo Seminário Teológico Interdiocesano de São Pio X
Licenciado em Filosofia pela Universidade São Tomás de Moçambique
Mestrado em Administração e Gestão Escolar pela Universidade Pedagógica
INTRODUÇÃO
A necessidade de o homem se comunicar com o outro homem (passar uma informação
e/ou receber uma informação) faz com que tenha de se preparar para que não passe o dilema de
dizer o que não queria dizer, ou, então, não dizer o que queria dizer.
De, facto, como por exemplo, pode acontecer que alguém prepare um prato (comida)
convencido de estar a preparar o melhor prato da sua vida. Depois de o preparar, orgulhosamente
serve-o ao convidado (ou, seja a quem for). Este pode gostar do prato, ou não.
Se gostar, significa que os passos e os ingredientes utilizados adequam-se às disposições
culturais, económicas e ao paladar de quem provou o prato. Mas, se acontecer que não goste do
prato, significa que, ou foi mal preparado, ou, ainda que o prato tenha sido bem preparado
(respeitadas todas as regras da culinária), quem provou não dispõe de condições (culturais,
económicas, do paladar) para reconhecer o «bem feito» do prato.
Com efeito, não poucas vezes, acontece que, ao passarmos uma informação, ela chega de
uma maneira diferente (até contraditória àquilo que queríamos informar). Isto acontece, ou porque
o emissor não observou todos os passos e todas as regras que ajudariam a passar a informação,
tal como deveria ser, ou porque (ainda que o emissor tenha observado todas as regras) quem
recebe a mensagem não reconhece os passos e as regras que orientaram a elaboração daquela
mensagem.
Portanto, tanto o que emite, como o que recebe, ambos devem conhecer as regras para que
a emissão e a recepção sejam feitas com o devido rigor.
A lógica poderá ajudar-nos a cultivar a arte de observância dos referidos passos e das
referidas regras, para que o nosso raciocínio, sendo recto, facilite a comunicação e, deste modo,
não passemos daquele dilema acima referido.
Este pequeno subsídio não é um trabalho finalizado, mas sim instrumento de reflexão.
Esta reflexão deverá ser feita na medida em que se leia, com o objectivo de aprender dele e de
enriquecê-lo com outras noções e doutrinas de lógica.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
I. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS
Philo + sophia
Portanto, a aproximação etimológica do termo Filosofia remete-nos ao termo sabedoria.
É um termo por nós conhecido, mas não seria perder tempo procurar entender mais, o que ele
significa.
Mas, ainda que seja difícil, de entre tantas definições que se podem colher, assumimos
esta que vê a filosofia como sendo a ciência que “procura explicar toda a realidade pelas causas
mais remotas que a razão pode atingir” (J. Bonifácio, p.11). Como disse Aristóteles: filosofia é a
ciência das últimas causas.
O Método da filosofia
O método da filosofia é essencialmente racional, embora não exclua a intuição (visão
directa do concreto e real, visão instintiva, por isso, oposta à reflexão). E os processos
raciocinativos usados pela filosofia são: Indução e Dedução. A Indução para ascender dos factos
aos primeiros princípios; a Dedução para descer, de novo, dos princípios primeiros e iluminar
posteriormente os factos, para compreendê-los melhor.
O Instrumento de trabalho da filosofia:
(para aprofundar sobre o método de filososfia)
é a RAZÃO, a razão pura, uma razão que “para subtrair-se a todo o tipo de distracção,
deve encerrar-se em seu sagrado recinto, longe do barulho das máquinas, da sedução dos prazeres
e da praxis, da confusão dos sentidos, em solitária companhia com o próprio objecto” (MONDIN,
1981: 6).
O filósofo não tem máquina fotográfica, microscópio, telescópio, e outros instrumentos
que lhe ajudem a analisar o seu objecto de estudo; de facto, o seu objecto de estudo não cabe
nestes instrumentos sensíveis e nos nossos órgãos dos sentidos. Só a razão (por ser elástica) pode
conter a totalidade do real.
Mas isto não significa que o filósofo não precisa destes instrumentos todos; ele precisa
deles sim, mas só no momento inicial; logo os abandona e serve-se da razão para alcançar o seu
objectivo.
2. O Problema Lógico
Só lógica, só lógica, só lógica, só lógica...!!!!!!!!!!!
«Filha: Pai, as nossas conversas têm regra? A diferença entre um jogo e brincadeira é que
um jogo tem regras.
Pai: Sim. Deixa-me pensar nisso. Acho que temos uma espécie de regras… e julgo que
uma criança a brincar com blocos também tem regras. Os próprios blocos constituem uma espécie
de regras. Manter-se-ão em equilíbrio em certas posições e cairão noutras. E seria uma forma de
batota a criança usar cola para manter os blocos em posição de onde normalmente cairiam.
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2.2. Língua
É “um determinado sistema de sinais com regras precisas de pronúncia, gramática e
sintaxe” (MONDIN: 312).
2.4. Discurso
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
a). Conceito
Discurso é “um conjunto de enunciados articulados entre si de uma forma coerente e
lógica. Uma operação intelectual que se processa por uma sequência de operações elementares e
sucessivas em que cada um retira o seu valor dos antecedentes, procurando chegar a determinadas
conclusões” (LOURENÇO: 27)
b). Dimensões do Discurso
O Discurso humano é pluridimensional, ou seja, tem muitas dimensões.
- Dimensão linguística: “todo o discurso é, em primeiro lugar, um acto individual de fala,
em que um dado emissor actualiza a língua em palavra”
- Dimensão textual: o produto final do discurso é sempre uma sequência de enunciados
que são coerentemente ordenados e que se materializam num texto, escrito ou oral.
- Dimensão lógico-racional: o Discurso implica sempre um movimento do nosso
pensamento. A nossa razão discorre de uma proposição a outra, procurando estabelecer um
encadeamento lógico, uma dada sequência.
- Dimensão expressiva ou subjectiva: todo o discurso humano é sempre expressão pessoal
e subjectiva das emoções, dos pontos de vista, das razões, dos argumentos dos diversos sujeitos.
- Dimensão inter-subjectiva ou comunicacional: o Discurso humano é, normalmente,
partilhado entre os sujeitos. O interlocutor é sempre presente ou pressuposto.
- Dimensão argumentativa: todo o discurso apresenta razões, argumentos, provas para
justificar as posições defendidas.
Argumentação é “um conjunto de frases, ou, com mais rigor, um conjunto de proposições,
no mínimo duas, relacionadas entre si segundo uma estrutura tal que uma, e só uma, é a conclusão
do argumento e uma/as outra/as é (são) a/as premissa/as do argumento”.
- Dimensão comunitária e institucional: tudo o que está contido no nosso discurso é pré-
configurado pelas estruturas da nossa língua materna. Encontramos tal língua logo à nascença e
não fomos nós que a inventamos. Ela é fruto da comunidade onde vivemos.
- Dimensão ética: qualquer interveniente numa situação de discurso deve respeitar o que
poderemos chamar o «código deontológico do Discurso», cujos teorizadores foram Karl Otto
APEL e J. HABERMAS. Alguns princípios, segundo os referidos autores:
* todos os participantes no discurso devem:
--- ter amor à verdade;
--- empenhar-se na sua procura, conformando e adequando a sua razão àquilo que é;
---- falar a verdade
* todos os participantes no discurso:
--- podem problematizar qualquer posição de outro participante
--- só devem afirmar aquilo em que acreditam;
--- devem ser isentos, reconhecendo aos outros igualmente essa capacidade;
* todos os participantes devem ter a vontade sincera de chegar a um acordo ou a um
consenso, próprios de sujeitos livres e emancipados;
* não é legítimo que os participantes entrem em contradição.
- Dimensão sintática: Sintaxe deriva de syn+táxis (co-ordem) = coordenado; é a parte da
gramática que estuda as regras combinatórias entre os diversos elementos da frase. Portanto, em
termos sintácticos, uma série de palavras postas ao acaso não é uma frase. Exemplo: se que fogo
ver sem arde amor é. Mas se lhes ordenarmos, encontramos: Amor é fogo que arde sem se ver.
Portanto,
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* uma série de letras ao acaso, sem nenhuma ordem, não são uma palavra;
* uma série de palavras, postas ao acaso, não são uma frase;
* uma série de frases, postas ao acaso, não são um discurso.
- Dimensão semântica: o termo «Semântica» vem do grego, isto é, semantiké (tékhné) =
“arte da significação”. É a ciência que se dedica ao estudo dos significados –significações.
- semântica lexical: estudo do significado das palavras
- semântica da frase: o significado das palavras no contexto da frase
- semântica do discurso: as relações de significado entre várias proposições que
constituem e dão coerência ao texto.
- Dimensão Pragmática: do grego, pragmatiké (do Pragra = acção) ocupa-se com os
signos na sua relação com os utilizadores.
Pragmática é o estudo da linguagem, procurando ter em conta a adaptação das expressões
simbólicas aos contextos referencial, situacional de acção e interpessoal (LOURENÇO: 28-32).
2. Platão e a lógica
Embora não fosse clara a obra lógica de Platão, a partir do que escreve em Timeu,
podemos considerá-lo como percurssor. É, de facto, nele, já no fim da sua vida, que vemos pela
primeira vez, estabelecer-se a ideia daquilo que constituirá o próprio objecto da lógica.
Escreve assim, em Timeu: “se um deus inventou, para nós, o dom da visão, foi para que,
contemplando no céu as revelações da inteligência divina, o aplicássemos aos circuitos que em
nós percorrem as operações do pensamento; estes têm a mesma natureza daquelas, mas são
imperturbáveis e eles sempre perturbados; graças a este estudo, temos acesso aos cômputos
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
naturais na sua rectidão e, à semelhança dos movimentos divinos, absolutamente isentos do erro,
podemos dar uma solução à anomalia dos que estão em nós.”
Portanto, queria dizer que, tal como há leis que regulam o curso dos astros, há leis que
regulam o curso do raciocínio; só que, enquanto os astros, que são divinos respeitam sempre as
suas leis, nós homens, violamos constantemente as leis no desenrolar dos nossos pensamentos,
porque não temos delas uma visão clara, e é essa a razão porque caimos no erro. Para o evitar,
temos a necessidade de aprender a conhecer essas leis de maneira a podermos submeter-nos a elas
com exactidão – este é o objecto e objectivo da lógica.
Desta forma, Platão tinha colocado as primeiras sementes da lógica, delineando o seu
caminho.
Aristóteles e a Lógica
Aristóteles foi o primeiro a fazer um estudo sistemático dos conceitos (isto é, das ideias),
procurando descobrir as propriedades que eles têm enquanto produzidos pela mesma mente, como
podem ser unidos e separados, divididos e definidos e como é possível tirar conceitos novos de
conceitos conhecidos anteriormente. A lófica, para Aristóteles, é tudo isto. E como tudo isto foi
reunido numa obra denominada Organon, isto é, instrumento, a lógica, para Aristóteles é um
instrumento de pensamento (Cfr. Battista Mondin, vol 1., p.83); é “o meio que é posto à
disposição do espírito para lhe permitir raciocinar e exprimir-se de acordo com a verdade” (Denis
HUISMAN, Dicionário das Mil obras de filosofia, Porto Editora, 2001, p. 374).
Esta obra de Aristóteles, Organon, que contém todo o pensamento lógico do autor,
compreende seis partes:
- As Categorias
Nelas, Aristóteles consagra o estudo da predicação, isto é, atribuir um predicado a um
sujeito (HUISMAN, 2001: 374). Todos os seres são predicáveis pelas categorias que Aristóteles
apresenta em número de dez: substância, quantidade, qualidade, relação, tempo, estado, hábito,
acção, paixão e lugar.
As palavras sem combinação umas com as outras significam por si mesmas uma das
seguintes coisas: o que (substância), o quanto (quantidade), o como (qualidade), com o que se
relaciona (relação), onde está (lugar), quando (tempo), como está (estado), em que circunstância
(hábito), atividade (ação) e passividade (paixão). Dizendo de modo elementar, são exemplos de
substância, homem, cavalo; de quantidade, de dois côvados de largura, ou de três côvados de
largura; de qualidade, branco, gramatical; de relação, dobro, metade, maior; de lugar, no Liceu,
no Mercado; de tempo, ontem, o ano passado; de estado, deitado, sentado; de hábito, calçado,
armado; de ação, corta, queima; de paixão, é cortado, é queimado
(www.http//pt.wiki.pedia.org.wiki categorias - aristóteles).
- Da Interpretação
Que trata das proposições, susceptíveis de serem verdadeiras ou falsas, e onde analiza
também a combinação das proposições e suas modalidades;
- Os primeiros analíticos
Que contêm a teoria aristotélica, mais exactamente a teoria do silogismo.
- Os segundos analíticos
Que consagra a teoria aristotélica da ciência, com a sua teoria da demonstração;
- Os Tópicos
Que analisa algumas regras práticas e alguns esquemas típicos da argumentação dialética;
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
- As refutações sofísticas
Que versa sobre a arte de descobrir os raciocínios falazes, incluindo uma análise,
classificação e crítica dos paralogismos (VICENTE: 29).
Informática
A informática é a ciência do processamento automático da informação, considerada o
suporte dos conhecimentos humanos e das comunicações dos domínios técnicos, económicos e
sociais.
Os primeiros computadores propriamente ditos surgem entre 1945 e os meados dos anos
60. O ENIAC é o primeiro exemplar.
Inteligência artificial
A inteligência artificial inspira-se natural, própria dos seres humanos. A inteligência
engloba todo o conhecimento, consciente ou inconsciente, que fomos adquirindo ao longo da
nossa vida, fruto do estudo ou em resultado de multifacetadas experiências que realizamos de
muitas situações mais ou menos problemáticas que fomos ou vamos enfrentando.
Eis alguns dos problemas que colocam os novos domínios de aplicação de lógica:
* Um computador moderno realiza, a uma velocidade prodigiosa, longas sequências de
operações que, de outra forma, não seriam exequíveis em tempo útil e na sua totalidade. Contudo,
leva ao desempredo de milhares e milhares de pessoas;
* O homem estabelece mais «comunicação» com máquinas do que com os seus
semelhantes. Isto faz com que haja dificuldades de aproximação entre os seres humanos;
* É difícil explicar se a cultura informática é sinónimo de libertação do homem ou de sua
escravização;
* Há tendência a se «substituir» o homem por máquinas. Contudo, estas não contêm os
elementos dignidade e consciência, e nunca podem chegar a ser homens. Se uma máquina
«substituir» o homem, que dizer do futuro deste?
* Os investigadores da inteligência artificial partem da ideia de que o cérebro é um
computador. Pensam até na possibilidade de os computadores do futuro virem a ter, em vez da
electrónica, o mundo biológico como suporte conceptual. Que dizer do homem nessa altura?
* Pode o computador ser considerado como modelo de consciência e do raciocínio,
devendo-se a sua existência à consciência e ao raciocínio do homem?
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
A divisão mais imediata da lógica é a que dá conta de que temos dois ramos principais:
lógica formal ou teórica e lógica material ou aplicada.
1. Lógica Formal
É o acordo do pensamento consigo mesmo.
Na lógica formal estudamos as leis a que devem obedecer as operações da inteligência
para serem válidas e poderem atingir a verdade. Ora, as operações da inteligência são três:
concepção (pela qual se obtêm uma ideia ou conceito); juízo (pelo qual se afirma ou nega uma
relação entre duas ideias); raciocínio (pelo qual, de dois ou mais juízos conhecidos, concluimos
um outro juízo desconhecido que daqueles deriva necessariamente).
Portanto, a lógica formal divide-se em três partes: Lógida do conceito, lógica do juízo e
lógica do raciocínio.
2. Lógica Material
Na lógica material consideramos as leis do pensamento na sua relação com este ou com
aquele objecto, com esta ou aquela ciência: estuda o acordo do pensamento com a realidade.
Validade material e validade formal
Por consequência, a lógica formal dá-nos uma validade formal das proposições, enquanto
que a lógica material dá-nos a validade material. Atendamos ao seguinte exemplo:
Joaquim Chissano foi o fundador da FRELIMO.
Este enunciado é sintaticamente correcto; não há nele uma contradição formal, ou seja,
é gramaticalmente bem feito. Do ponto de vista lógico é formalmente válido, correcto e legítimo.
É formalmente válido, uma vez que os elementos que o constituem (conceitos no juízo,
juízos no raciocínio) formam um todo coerente, sem contradição interna e os seus elementos sao
compatíveis.
Mas, se formos a analisar do ponto de vista histórico, real, estamos perante um enunciado
não válido. Como se deve saber, o fundador da FRELIMO foi Eduardo Chivambo Mondlane.
Seria materialmente válido se o seu conteúdo fosse conforme à realidade.
Desta forma, o enunciado acima citado é formalmente correcto e válido, mas
materialmente inválido.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
A Concepção é o acto pelo qual a inteligência obtêm uma ideia, sem nada afirmar ou negar
a seu respeito.
A ideia ou conceito é a representação intelectual da essência de um objecto; representa
aquilo que há de permanente, imutável e comum em todos os objectos de uma espécie.
A inteligência forma as ideias, como sabemos da psicologia, a partir das imagens, pela
Abstração e Generalização, que são operações de carácter intelectual.
1.1. Abstração
É «pôr de parte», «isolar» alguma coisa de outras coisas. É separar algo do restante.
Quando o «pôr de parte» é mental e não físico a abstração é um modo de pensar mediante
o qual separamos conceptualmente algo de algo.
Pelo processo de abstração, isola-se o geral, o universal, o necessário, o essencial, do
individual. Por outras palavras, isola-se o que faz com que uma realidade seja aquela e não outra
de tudo o que constitui acidental. De facto, essência é o que faz com que a coisa seja o que ela
é, e não seja outra coisa.
Exemplo: para formar o conceito de «panela», tivemos que separar o essencial – o que faz
com que a panela seja panela – dos acidentes, ou seja, aquilo que não define a panela. Por
exemplo: não é a cor, o tamanho, a tampa, o formato que fazem com que a panela seja panela.
Portanto, quando se diz «panela», considera-se somente o que faz com que a panela seja panela,
ou seja, o essencial. É assim como se formam os conceitos.
É a abstração que nos ajuda a formar conceitos.
1.2. Generalização
Se pela abstração separamos dos indivíduos ou objectos as caracteristicas de cada um,
ficando-nos os elementos que entre eles existem de comum, reunir estes elementos comuns numa
noção e aplicá-la a muitos seres é generalizar.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
Generalização é, portanto, “a operação pela qual o espírito reune numa representação (ideia
ou conceito) os elementos comuns a muitos indivíduos ou objectos e aplica esta noção
identicamente a um número indeterminado de indivíduos da mesma espécie” (BONIFÁCIO:
156). Exemplo, generalizamos ao gato, cão, ave, peixe o conceito de animal. Quer dizer, no gato,
no cão, na ave e no peixe, estão os elementos que constituem o conceito de vertebrado.
Portanto, é a abstração e a generalização que nos permitem formar conceitos.
2. Princípios da Razão
(Cfr. J. Vieira LOURENÇO, Razão e Sentido, p. 66).
Como pensar com coerência? Como evitar o absurdo? Como fazer com que o que se pensa
e se diz não entre em contradições formais (contradições de pensamento?)
A lógica ajuda-nos a responder a estas e outras perguntas relacionadas com a coerência do
pensamento. Existem três princípios fundamentais, sem os quais não haveria pensamento
possível. São eles:
- Princípio de Identidade
Enuncia-se (formula-se) da seguinte maneira:
- Uma coisa é o que é
- O que é é; o que não é não é.
- A é A, e não B.
Em termos de proposições:
- Uma proposição é equivalente a si mesma.
- Princípio de contradição (ou de não contradição)
Enuncia-se da seguinte maneira:
- Uma coisa não pode ser e não ser, ao mesmo tempo, segundo uma mesma perspectiva.
Devemos esclarecer este enunciado: o camaleão pode ser amarelo e verde, mas não ao
mesmo tempo. É que ele, como é mimético, pode ser verde, conforme o lugar em que se encontra,
e amarelo num outro momento conforme o outro lugar e/ou situação.
Por outro lado, mesmo se for ao mesmo tempo, as perspectivas vão mudar. Uma pessoa
pode ser alta e gorda ao mesmo tempo, mas aqui temos perspectivas diferentes.
Em termos de proposições:
- Uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo.
- Uma proposição e a sua negação não podem ser simultaneamente veradadeiras.
- Duas proposições contraditórias não podem ser simultaneamente verdadeiras.
- Princípio de terceiro excluido
Enucia-se da seguinte maneira:
- Uma coisa deve ser, ou então não ser; não há uma terceira possibilidade (o terceiro é
excluído)
Em termos de proposições, teremos:
- Uma proposição ou é verdadeira ou é falsa (não há outra possibilidade).
- Se encararmos uma proposição e a sua negação, uma é verdadeira e a outra é falsa, não
há meio termo.
- De duas proposições contraditórias, se uma é verdadeira, a outra é falsa, e se uma é falsa,
a outra é verdadeira, não há meio termo.
Vejamos o absurdo a que leva a falta da observância dos princípios da razão:
- João: Manelito, acreditas na igualdade entre os homens?
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
- Manelito: Claro que não acredito! Essa coisa de igualdade é uma estupidez! No
mundo não há duas pessoas iguais; ninguém é igual a ninguém. Mas quem te falou
desse disparate de igualdade?
- João: O meu pai.
- Manelito: Como sempre!... Estes pais são todos iguais.
A pergunta que se coloca é: afinal, há pessoas iguais ou não?
A ideia também se chama conceito, porque, na sua formação, dá-se no espírito uma
espécie de concepção, pela união da inteligência com o objecto, cujo fruto ou conceito é a ideia.
É fácil concluir que uma ideia não é verdadeira nem falsa, porque nela nada se afirma
e nada se nega.
Os conceitos podem ser possíveis (animal racional) e impossíveis (círculo quadrado),
segundo são formandos de elementos logicamente compatíveis ou incompatíveis entre si.
4.2. Termo
O termo é a expressão externa da ideia. Não deve confundir-se termo com palavra, porque
o termo pode ter várias palavras e até proposições gramaticais, ou ser constituído por simples
gestos.
Exemplo: Aristóteles é o filósofo da antiguidade que mais contribuiu para o
desenvolvimento da filosofia. «O filósofo da antiguidade que mais contribuiu para o
desenvolvimento da filosofia», é apenas um termo.
5. Relação entre conceito e termo
A ideia, sendo a representação intelectual de um objecto, dá-nos imediatamente a noção
do objecto, enquanto que o termo é expressão imediata da ideia e mediata do objecto. Quando
nos exprimimos para com o nosso semelhante, a ideia é anterior ao termo, visto que, para
comunicarmos aos outros os nossos pensamentos, precisamos ter primeiro a ideia que devemos
exprimir; para o nosso interlocutor, porém, o termo é anterior à ideia.
Por outras palavras, o apelo a que se pense antes de falar («pensa antes de falar») encontra
a sua explicação nesta relação entre o termo e o conceito. Portanto, para quem está a falar, o
conceito é anterior ao termo; mas para quem ouve, o termo é anterior ao conceito, ao qual chega
depois de entrar em contacto com o termo.
O termo é como que a ideia exteriorizada e concretizada, visto que, concebida uma
ideia, só lhe damos existência objectiva depois de encontrarmos o termo que a pode exprimir.
Exemplo:
Animal – vertebrado – mamífeno – cão (redução da extensão).
Dia 25 de Abril – Mes de Abril – primeiro semestre – ano de 2010
(aumentando a extensão)
A ideia de maior extensão chama-se género em relação à de extensão menor, e esta
denomina-se espécie em relação àquela.
O género diz-se próximo ou supremo, consoante o grau da sua generalidade. O género
próximo é a ideia de generalidade imediatamente superior à ideia que é a espécie (exemplo:
animal em relação ao homem); o género supremo representa as grandes classes dos seres ou as
grandes divisõe do ser. Às ideias que constituem os géneros supremos chamam os lógicos,
categorias, que para Aristóteles são 10, como se pode ver na ontologia. A ideia que não apresenta
abaixo de si senão indivíduos, chama-se ínfima espécie.
A diferença específica é a caracteristica que se junta ao género próximo para constituir a
espécie, aumentando-lhe a compreensão (racional que se junta ao género animal para constituir a
espécie homem). O género próximo e a diferença específica são os caracteres essenciais de
qualquer ser.
Na série de ideias – substância, corpo, vivente, animal, homem – que estão ordenadas por
ordem de extensão decrescente, a ideia «homem» é a infima espécie; animal, vivente e corpo, são
géneros em relação as ideias de menor extensão e espécies quando relacionadas com as de maior
extensão; substância é o género supremo ou categoria; animal é o género próximo do homem.
Acima de todos os géneros, englobando as categorias, está a ideia de ser, que, por esse
motivo, se chama uma noção transcendente.
Exemplo: o Ser. De facto, SER é o conceito/ideia que tem a extensão máxima – tudo o
oque o ser é engloba, portanto, todos os existentes – e a compreensão mínima – a única coisa que
se pode dizer do ser é que o ser é (Cfr. J Neves VICENTE, Diálogo e Razão, p. 13 – Dicionário
de Conceitos.)
Compostas, se constam de muitos caracteres, ou seja, podem ser decompostos (homem,
cadeira, pão...)
Os termos
Alguns autores não distinguem os conceitos dos termos, quando se trata de classificar.
Pode ser porque os termos constituem expressões verbais das ideias; mas, mesmo assim, é
conveniente apontar algumas outras classificaçõe referentes aos termos:
8. Definição
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
Por exemplo: as definições das ciências naturais, que caracterizam o homem como um
mamífero, bípede, de posição erecta, etc. O cão é um animal quadrúpede, mamífero, que ladra...
Outros acrescentam a
- física: (está no âmbito da descrição) quando a definição é feita mediante as propriedades
externas da coisa a definir.
Exemplo: quadrado é uma estrutura geométrica com quatro lados iguais, cujos ângulos
são todos rectos.
-Genética, se a definição é mediante a forma como o definido foi produzido ou de onde
resulta.
Exemplo: O macho é o resultado do cruzamento do cavalo com a burra.
- causa final: se a definição é feita tendo em conta a finalidade do definido.
Exemplo: termómetro é um instrumento que serve para medir a temperatura.
- causa eficiente: se a definição é feita tendo em conta o agente que produziu o definido.
Exemplo: gastrite resulta da inflamação do estômago.
- Operacional, se a definição é feita tendo em conta as regras e/ou as operações que
definem o conceito.
Exemplo: metro é igual a décima milionésima parte do quarto do meridiano etrretre.
Toda a ciência procura usar a definição essencial, a única verdadeira definição; no entanto,
na impossibilidade de utilizar aquela, as ciências contentam-se frequentemente com a pura
definição descritiva. Hoje ainda, querendo ser mais concretas, as ciências vão recorrendo às
definições operacionais (Cfr. J. Vieira LOURENÇO, Razão e Santido, p. 77)
seja, dadas as mesmas condições, se chegue à mesma conclusão (cfr. J. Vieira LOURENÇO,
Razão e Sentido, p. 78)
Não Material
Substância Não Vivo
Não sensível
Não Racional
Material
Vivo Sensível
Racional
10. Classificação
A clareza de um conceito exige que ele seja, depois de definido e dividido,
convenientemente classificado. Classificar é reunir ordenadamente em grupos os vários seres
ou objectos que uma ideia abrange, de harmonia com as suas semelhanças e diferenças;
atende-se, portanto, ao mesmo tempo, à compreensão e à extensão da ideia. A classificação é
como que uma variante da divisão que se usa em todas as ciências e especialmente as biológicas,
pois sem ela se tornaria impossível estudar os múltiplos seres vivos.
V. LOGICA DO JUÍZO
1. Definição do juízo
O juízo é a operação pela qual o espírito afirma ou nega uma relação de conveniência
entre duas ideias ou objectos do pensamento.
O juízo é a forma central do pensamento, pois todas as actividades mentais terminam no
juízo. Com efeito, as ideias são os materiais para formular os juízos , e os raciocínios são
encadeamentos de juízos, que conduzem a novos juízos.
2. Elementos do juizo
O juízo comporta três elementos:
- Sujeito, o ser de que se afirma ou nega qualquer coisa;
- atributo ou predicado, aquilo que se afirma ou nega do sujeito;
- cópula, elemento de ligação entre o sujeito e o predicado que, habitualmente, é
representada pelo verbo ser.
Esta cópula reveste o aspecto de afirmação ou negação, consoante o verbo afirma ou nega
e constitui a forma do juízo; o sujeito e o atributo constituem a matéria do juízo.
Por outras palavras, temos a matéria (cão, bonito, peludo, macaco, papaia), à qual
precisamos da forma, por meio de um elemento de ligação que se chama cópula. Assim, teremos:
O cão é bonito – «cão e bonito» são matéria; «é» é forma
SéP
nem o predicado, mas sim a cópula, que une ou separa o sujeito e o predicado; a cópula é o
elemento estruturante que dá a forma
quer dizer que não obedecem aos princípios racionais estabelecidos (Cfr. J. Vieira LOURENÇO,
Razão e Sentido, 83.)
VI. INFERÊNCIA
1. Noção
Até aqui limitamo-nos a estudar as proposições isoladamente, classificando-as quanto à
quantidade e qualidade e indicando a extensão dos respectivos termos.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
Mas as proposições não valem apenas em si mesma. Com efeito, podemos passar de uma
proposição a outra ou outras e a isso se chama inferir.
Inferência é a operação que consiste em tirar de uma ou mais proposições outra ou outras
que ai estavam implicitamente contida.
2. Espécies de inferências
A inferência divide-se em:
Imediata: consiste em obter directamente uma nova proposição a partir de uma proposição
dada e apenas com os termos que a constituem. Esta inferência compõe-se, portanto, de duas
proposições: uma servindo de ponto de partida (antecedente), e a outra de chegada
(consequência), e de dois termos (os termos do consequente não são os mesmos do antecedente).
Mediata: exige mais do que dois termos (normalmente três), servindo um de termo médio
e mais do que uma proposição (geralmente duas), como ponto de partida. Esta forma de inferência
será estudada adiante, na lógica do raciocínio.
INFERÊNCIA IMEDIATA
Segunda: duas proposições universais que diferem pela qualidade são chamadas
contrárias.
Exemplo: todos os homens são justos (A) e nenhum homem é justo (E)
Terceira: duas proposições particulares que diferem pela qualidade são denominadas
subcontrárias.
Exemplo: alguns homens são justos (I) e alguns homens não são justos (O).
Quarta: duas proposições que diferem entre si pela quantidade são designadas pelo nome
de subalternas.
Exemplo: todos os homens são justos (A) e alguns homens são justos (I); nenhum homem
é justo (E) e alguns homens não são justos (O).
Eis, em resumo, o que indicamos:
Particular
I
Afirmativa Particular O Negativa
predicado é acidental. Por outros termos: da verdade de uma conclui-se a falsidade da outra, mas,
se uma é falsa a outra é verdadeira (se apodíctica), ou falsa (se assertória).
Terceira: Subcontrárias (IO) – duas proposições subcontrárias podem ser ambas
verdadeiras, quando são a expressão de um juízo assertório, mas não falsas ao mesmo tempo. Isto
quer dizer: se uma é falsa, a outra é verdadeira, mas, se uma é verdadeira, a outra pode ser
verdadeira ou falsa, isto é, duvidosa.
Quarta: Subalternas (AI; EO) – a verdade da universal implica a verdade da particular
subordinada; a falsidade da universal não acarreta a da particular; a verdade da particular não
determina a da universal; a falsidade da particular a falsidade da universal
Exemplificando de: todo o homem é mortal (verdadeira) inferimos por oposição:
nenhum homem é mortal (contrária e falsa) algum homem é mortal (subalterna e verdadeira),
algum homem não é mortal (contraditória e falsa).
primeiramente a proposição a converter numa afirmativa particular que lhe seja equivalente
(consegue-se isto, tirando a negação da cópula e passando-a para o predicado) e depois converter
simplesmente a proposição obtida.
Exemplo: alguns homens não são sábios e, feita a conversão, teremos, primeiro: alguns
homens são não sábios e, daí, alguns não sábios são homens.
- Conversão por contraposição – esta consiste em juntar uma negação ao sujeito e outra
ao predicado da proposição a converter, fazendo em seguida a conversão simples. Pode aplicar-
se às proposições de tipo A e O. Exemplo: «todo o homem é mortal» - «todo o não homem é não
mortal» - «todo o não mortal é não homem». Para o caso da proposição de tipo O, teremos:
«alguns homens não são sábios» - «alguns não homens não são não sábios» - «alguns não sábios
não são não homens», ou, como as duas últimas negativas equivalem a uma afirmativa, «alguns
não sábios são homens».
A – pode converter-se por acidente ou por contraposição
I e E – podem converte-se simplesmente.
O – só se pode converter por negação e por contraposição
1. Raciocínio
Como dissemos, as inferências podem ser imediatas e mediatas. Embora a inferência
imediata se possa considerar já um raciocínio, é costume reservar este termo para significar
apenas a inferência mediata.
O raciocínio é a operação pela qual a inteligência, partindo de duas ou mais relações
conhecidas, afirmadas ou negadas, conclui uma nova relação que nelas estava implicitamente
contida e delas deriva logicamente.
Como as relações se exprimem por juízos, podemos também definir o raciocínio como
sendo a operação mediante a qual de dois ou mais juízos dados se tira um novo juízo; é a operação
mental que infere conhecimentos novos a partir de conhecimentos dados. O raciocínio será, assim,
a passagem do conhecido ao desconhecido.
É o processo utilizado pela inteligência na aquisição dos conhecimentos discursivos ou
mediatos, tal como a intuição conduz a conhecimento imediatos ou intuitivos.
O argumento/discurso é a expressão verbal do raciocínio e é, portanto, formando por
proposições, como o raciocínio é contituido por juízos.
2. Elementos do argumento
O encadeiamento lógico das proposições que constituem o argumento chama-se forma
do argumento, enquanto que as proposições em si próprias, constituem a matéria próxima e os
termos a matéria remota do mesmo argumento.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
4. Divisão do raciocínio
Durante muito tempo admitiram duas formas de raciocínio – a dedução e a indução – a
que depois ainda se acrescentou a analogia.
4.1. Dedução
“é um processo discursivo e descendente que passa do geral ao particular” (LOURENÇO:
88).
Na dedução a inteligência desce do geral ao particular, como costuma-se dizer, podendo
definir-se como operação da inteligência pela qual se conclui de uma ou mais proposições,
tomadas como premissas, uma nova proposição que é a sua consequência necessária. O
raciocínio dedutivo é, portanto, um movimenmto de pensamento que parte das causas para os
efeitos, das leis para os factos, dos princípios para as suas consequências necessárias e, nestes
termos, as suas conclusões são proposições apodíticas, por derivarem necessariamente das
premissas. É r raciocínio demonstrativo.
Exemplo: os bons poetas devem ser lidos;
Cameões é bom poeta
Camões deve ser lido.
Espécies de dedução
A dedução pode revestir dois aspectos:
- dedução matemática ou construtiva: a conclusão é tanto ou mais geral do que as
proposições de onde partimos. Dela se ocupa o método das matemáticas.
- dedução formal ou silogística: nesta, a conclusão está implicitamente contida nas
proposições dadas e é menos geral do que estas.
4.2. Indução
É “a operação racional através da qual se conclui uma verdade universal ou geral a partir
de verdades particulares, ou dito de outro modo, a partir da observação de um determinado
número de factos, conclui-se uma geral” (LOURENÇO: 90).
Exemplo:
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
O cão come
O gato come
O burro come...
O cão, o gato, o burro... são animais.
Logo, os animais comem
Portanto, na indução, a inteligência procede do particular para o geral, como também é
hábito dizer-se, podendo nós defini-la como a operação da inteligência que, partindo da
observação de um certo número de factos, conclui uma lei geral, aplicável a todos os casos
da mesma espécie. Na indução, o pensamento segue dos factos para as leis, das consequências
para os princípios; pelo exame dos factos, procura descobrir as causas que os explicam. A
conclusão tem um carácter assertório, pois não deriva necessariamente das proposições indutoras,
mas apoia-se na verificação experimental. É o Raciocínio investigativo.
Mais um exemplo:
Pelo facto de se ter verificado que a água de muitos mares é salgada e que a de muitos rios
é doce, é uma indução concluir que a água do mar é salgada e a dos rios é doce.
Tipos de indução
(Cfr LOURENÇO: 90-91)
- Indução formal ou totalizante: considera que a vardade de todos os casos particulares se
aplica a todos os casos numa perspectiva geral.
No caso deste exemlo: «o cão come, o gato come, o burro como...», o cão, o gato, o burro
são animais. Logo, os animais comem. Concluimos que todos os animais comem, uma vez que
todos os casos particulares de animais que conhecemos revelam esta caracteristica.
-indução amplificante ou baconiana (de Francis Bacon): consiste em inferir uma verdade
geral a partir de verdades particulares de vários casos, mas não de todos; atribui-se a uma classe
propriedades que verificamos relativamente a alguns. É a indução que ajuda para o avanço da
ciência, pois suas conclusões não são apodíticas, rigorosas, ou seja, deixam espaço para o que
pode vir a ser. E isto é o que faz a ciência avançar.
Exemplo: afirmamos que o calor dilata os corpos. A verdade desta proposição foi obtida
pelas várias observações e experiências particulares. Mas, para se chegar a esta afirmação
(generalizante) não foram verificados todos os corpos. Por isso, é uma conclusão geral e não
universal.
4.3. Analogia
Na analogia, a inteligência conclui do particular para o particular, podendo definir-se
mais rigorosamente como se$ndo o raciocínio que de certas semelhanças infere novas
semelhanças. As conclusões serão tanto mais prováveis quanto maiores sejam as semelhanças
entre os casos observados, mas nunca deixam de ter um carácter nitidamente problemático.
Exemplo: Manuel apresenta sintomas de doença semelhantes aos do João; logo, terá a
mesma doença.
Modernamente, a única forma de raciocínio admitida é a dedução, pois só ela permite
alcançar conclusões absolutamente certas. Com efeito, a analogia é considerada uma indução
seguida de uma dedução. Assim, no exemplo apontado, para saber quais os sintomas de certa
doença foi preciso observar vários indivíduos, como Manuel, João, etc – e aqui temos uma
indução; quando depois concluímos que o João terá a mesma doença de Manuel, há uma
verdadeira dedução. Além disso, as conclusões de uma analogia, podem permitir formular uma
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
hipótese, mas não a podem provar, porque uma semelhança não arrasta necessariamente outra
semelhança.
Quanto à indução, para muitos autores, ela não constitui um verdadeiro raciocínio, pois
que, segundo eles, a regra essencial do raciocínio exige que a conclusão não afirme mais do que
as premissas, o que, na verdade, não se verifica na indução. Além disso, a indução concluindo de
alguns casos para todos, pode conduzir a uma probabilidade maior ou menor, mas não a uma
certeza absoluta, que é própria da dedução; quando muito leva a uma certeza prática, por se apoiar
na verificação experimental.
A indução não será mais do que uma forma especial de intuição, pois é por intuição
inventiva que o sábio, ao observar os casos individuais, surpreende a relação essencial que
constitui a lei geral. Isto leva a considerar hoje a indução não como um raciocínio, mas como um
simples processo de método ou como um verdadeiro método.
Nestas condições, sob o ponto de vista lógico, raciocínio e dedução são a mesma coisa e
podemos, portanto, dezer: pensamento discursivo ou dedutivo e, em contraste, pensamento
indutivo ou intuitivo.
VIII. O SILOGISMO
Cfr. J. Bonifácio, Fundamentos da Filosofia; J. Vieira LOURENÇO, Razão e Sentido;
Fátima ALVES, A Chave do Saber; Rui dos Anjos DIAS, Filosofia, Livraria Almeida, Coimbra).
1. Noção
O silogismo é, como disse Aristóteles, um raciocínio formado de três proposições de tal
modo dispostas que, expressas as duas primeiras chamadas premissas, se segue necessariamente
à terceira, denominada conclusão. Por outras palavras, podemos dizer que o silogismo é um
argumento pelo qual, de um antecedente que liga dois termos a um terceiro, se tira um
consequente que une estes dois termos entre si.
Portanto, trata-se de um raciocínio formado por três proposições em que as duas primeiras
(chamadas premissas) originam uma terceira (conclusão lógica).
2. Elementos do silogismo
Todo o silogismo regular é formado por Três proposições, sendo as duas primeiras as
premissas e a última a conclusão, e por termos comparados dois a dois.
TRÊS proposições e TRÊS termos
Exemplo de um silogismo sob forma afirmativa:
B é C Toda a ciência normativa é prática
A é B…. a lógica é uma ciência normativa
A é C a lógica é pratica
Exemplo de um silogismo sob forma negativa:
C não é B Nenhum ortelão é juiz
AéB Pedro é juiz
A não C Pedro não é ortelão
Aqui estão os três termos do silogismo (A B e C) e, como podemos ver nos exemplos
anteriores, colocamos em cada premissa um destes termos em relação com um terceiro (B é C; A
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
Em resumo:
M T
O Moçambicano é honesto premissa Maior
t M
O beirense é moçambicano premissa Menor
t T
O beirense é honesto Conclusão
5. Princípios do silogismo
A dedução fundamenta-se, como consta da psicologia, no princípio da identidade, que se
pode enunciar das seguintes maneiras.
Princípio de compreensão: duas ideias que convêm a uma terceira convêm entre si;
Assim, se P é M e se S é M, necessariamente S é P.
Princípio de discrepância: duas ideias, das quais uma convém e outra não a uma terceira,
não convêm entre si.
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6. Figuras do silogismo
As figuras do silogismo são os aspectos que ele toma consoante a função exercida pelo
termo médio das premissas, quer como sujeito, quer como predicado. Como o termo médio pode
exercer a função de sujeito ou predicado em ambas as premissas ou sujeito de uma e predicado
da outra, são quatro os aspectos (figuras) possíveis. Estas quatro figuras (ou esquemas, como
Aristóteles chamava às três que admitia) são as seguintes:
Primeira figura: o termo médio é sujeito da primeira premissa ou premissa maior e
predicado da segunda ou premissa menor.
Exemplos:
Todo o homem é mortal BéC MéT
António é homem AéB téM
António é mortal AéC téT
Segunda figura: o termo médio é predicado nas duas premissas.
Exemplos:
Todo o homem é racional CéB TéM
O gato não é racional AéB téM
O gato não é homem AéC téT
Terceira figura: o termo médio é sujeito nas duas premissas.
Exemplos:
Os portugueses são europeus BéC MéT
Os portugueses são homens BéA Mét
Alguns homens são europeus AéC téT
Quarta figura: esta figura é um modo indirecto da primeira; é chamada a figura de
Galeno, porque foi este autor, segundo Averrois, que a juntou aos três esquemas de Aristóteles.
Nesta quarta figura, o termo médio é predicado na primeira premissa e sujeito na segunda.
Exemplos:
Os portugueses são homens CéB TéM
Os homens são mortais BéA Mét
Alguns mortais são portugueses AéC téT
Em resumo teremos:
1ª Fig. 2ª Fig 3ª Fig 4ª Fig
Suj. Pred. Suj. Pred.
Pred. Pred. Suj. Suj.
7. Regras do silogismo
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Exemplo:
As rosas são plantas
Há mulheres portuguesas que são rosas
Não podemos concluir: há mulheres portuguesas que são plantas.
Segunda: nenhum termo deve ser mais extenso na conclusão do que nas premissas. Se na
conclusão fosse considerado como universal um termo que nas premissas fosse particular, isso
infringiria o princípio da extensão, pois do que dissemos se infere que a conclusão é tirada das
premissas.
Exemplo:
Os portugueses são homens
Os francês não são portugueses
Não se pode concluir: os francês não são homens.
Terceira: o termo médio deve ser tomado pelo menos uma vez em toda a sua extensão,
isto é, universalmente. Se o termo médio fosse particular nas duas premissas, nada nos garantia
que a parte considerada na primeira fosse a mesma que tomávamos na segunda, e isso daria
origem à existência de quatro termos no silogismo, o que Seia contrário à primeira regra e,
portanto, ao princípio da compreensão.
Exemplos:
As portuguesas são brancas
As francesas são brancas
Não podemos concluir: as francesas são portuguesas
Quarta: a conclusão não deve conter o termo médio. Se, como já dissemos, o termo
médio serve para ligar os extremos, e, se na conclusão desejamos obter a relação entre os termos
maior e menor, é claro que o termo médio não pode aí entrar, pois só assim cumprirá a sua função
de elo entre os extremos. Também esta regra se justifica pelo princípio da compreensão.
Exemplo:
João é estudioso
João é feliz
Não se pode concluir: João é um feliz estudioso
O elefante é animal
Não se pode concluir: o elefante não morre
Sexta: de duas premissas negativas nada se pode concluir. Com efeito, pelo facto de não
existir relação entre o termo maior e o termo médio, nem entre o termo menor e o termo médio,
não se pode concluir se existe ou não relação entre o maior e o menor, pois o princípio da
compreensão não o autoriza. Duas ideias diferentes de uma terceira podem convir ou não entre
si, o que nós desconhecemos.
Exemplos:
Os portugueses não são ingleses
Os franceses não são portugueses
Não se pode concluir: Os franceses não são ingleses
Nem: os franceses são ingleses.
Sétima: A conclusão segue sempre a parte mais fraca. Por parte mais fraca entende-se a
premissa particular ou negativa. Quando uma das premissas for particular, a conclusão será
particular; quando qualquer das premissas for negativa, a conclusão será negativa; se uma das
premissas for negativa e outra particular, a conclusão será particular negativa.
Exemplos:
O virtuoso é amável
Alguns homens são virtuosos
Não se pode concluir: Os homens são amáveis
Oitava: nada se conclui de duas premissas particulares. Se as duas premissas fossem
particulares afirmativas, o termo médio, fosse qual fosse figura, seria tomado duas vezes
particularmente, o que era contrário à terceira regra.
Se as duas premissas fossem particulares negativas, nada se poderia concluir também, em
obediência à sexta regra.
Se uma fosse negativa e outra afirmativa, a conclusão seria negativa, de harmonia com a
sétima regra, e por isso o termo maior universal; mas, para que este não tenha maior extensão na
conclusão do que na premissa maior, esta terá de ser negativa e o termo maior ocupar nela o lugar
de predicado; neste caso, a menor teria de ser afirmativa, o que tornaria o termo médio particular
nas duas premissas, e isto é contrário à terceira regra.
Exemplos:
Há animais que respiram por traqueias
Muitos invertebrados não respiram por traqueias
Não se pode concluir: Muitos invertebrados não são animais.
8. Modos do silogismo
O modo do silogismo é o seu aspecto derivado da quantidade e da qualidade das
proposições que o constituem. Cada uma das proposições pode ser dos tipos A (Universal
Afirmativa), E (Universal Negativa), I (Particular Afirmativa) e O (Particular Negativa).
Nestas condições, n primeira premissa serão possíveis quatro casos (A, E, I,O) e, para
cada um destes, poderemos ter quatro casos na segunda premissa, o que dá origem a 16
combinações ou modos. Exemplificando:
AAAA EEEE IIII OOOO
AEIO AEIO AEIO AEIO
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
Isto no que se refere à primeira figura, como nas restantes figuras se podem fazer iguais
combinações, teremos 64 (16×4) modos possíveis. É claro que aqui não atenderemos à quantidade
e qualidade da conclusão – também incluída no modo – porque se atendêssemos, teríamos 256
modos (64+4).
Grande número dos modos possíveis é eliminado por infringir as regras enunciadas; são
os chamados modos ilegítimos ou sofismas.
Por exemplo: I I A, A I O, E E E, E I A.
Para respeitar as regras do silogismo, teremos a oportunidade de apontar certas regras às
quais obedecem as figuras, para que os seus silogismos sejam válidos, isto é, para que constituam
modos válidos ou legítimos. Estes, em número de 19, são os que obedecem a todas as regras do
silogismo e das figuras.
Os 19 modos válidos são designados por palavras latinas de três sílabas. Deve-se a Pedro
Julião, médico nascido em Lisboa e que mais tarde foi Papa, com o nome de João XXI, a
representação por palavras latinas dos modos válidos do silogismo.
A vogal da primeira sílaba indica a natureza da premissa maior, a vogal da segunda é o
símbolo da premissa menor; a terceira vogal representa a quantidade e qualidade da conclusão.
Estas palavras são as seguintes:
Se tu és lisboeta, és europeu
Não és europeu
Logo, não é lisboeta
Não admitem conclusão válida os silogismos condicionais em que se nega a condição e
em que se afirma o condicionado na premissa menor. Justifica-se esta regra porque, sendo a
condição tomada como causa do condicionado (mas não a única), a negação da causa ou condição
não obriga a negar o efeito ou o condicionado, visto que o efeito pode ser devido a outra causa;
pela mesma razão, não é legítimo passar da afirmação do efeito ou condicionado à afirmação da
causa ou condição. Assim, «se António não frequenta o Liceu» não podemos concluir que não
seja estudante, como também não podemos concluir que «tu sejas lisboeta» pelo facto de seres
europeu.
- Silogismo disjuntivo: é aquele cuja premissa maior é uma proposição disjuntiva, isto é,
uma proposição que tem dois ou mais atributos, dos quais um poderá convir ao sujeito com
exclusão do outro. Tem dois modos, a saber:
a) Menor afirmativa, conclusão negativa ou modo positivo-negativo.
Exemplo:
Esta estação é Inverno, primavera, verão ou Outono
É Inverno
Logo, não é primavera, verão ou Outono
b) Menor negativa, conclusão afirmativa ou modo negativo-positivo.
Agora é dia ou é noite
Não é dia
Logo, é noite.
- Dilema: é o silogismo, sob forma disjuntiva, chamado argumento de dois gumes, em que
se estabelece na premissa maior uma alternativa, conduzindo cada uma das suas partes à mesma
conclusão contra o adversário; por outras palavras, é um argumento em que a conclusão é sempre
a mesma, quer a premissa maior seja afirmativa quer negativa.
É nisto que difere do silogismo disjuntivo vulgar.
Exemplos:
A sentinela, que deixou passar o inimigo, ou esta ou não estava no seu posto.
Se estava, faltou ao seu dever; logo, merece castigo.
Se não estava, abandonou o seu posto e faltou ao seu dever; logo, merece castigo.
Dilema do califa Omar:
Estes livros (os da Biblioteca da Alexandria) ou contêm assuntos que não estão no Alcorão
ou nada contêm que lá não esteja. Se contêm, são prejudiciais porque toda a salvação provém do
Alcorão. Se não contêm, são inúteis, porque é suficiente o Alcorão. Logo, devem ser destruídos.
Regras do dilema
- a disjunção deve ser completa para que o adversário não acrescente terceiro ou quarto
caminho;
- a refutação de cada uma das hipóteses deve ser válida, para que o adversário não negue
a consequência;
- as partes do dilema devem ser tais que não possam voltar-se contra o arguente, isto é, o
dilema não deve ser retorquível.
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IX. FALÁCIAS
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
1. Noção
Acabamos de inidicar as regars do raciocínio correcto. Na verdade, por vezes, elas não
são observadas na linguagem. E, ainda que o fossem, o homem continuaria sujeito a erro e não
deixaria de se enganar, tomando o falso por verdadeiro. É que, frequentemente, o homem
raciocina mal.
É preciso não confundir o erro em si próprio com o raciocínio que lhe deu origem.
Apresentamos um exemplo explicativo: é um erro acreditar na influência aziaga do
número 13; observar e rebater esse facto não é tarefa da lógica, que apenas procurará mostrar
que essa falsa afirmação se baseia num raciocínio vicioso deste tipo: «se qualquer indivíduo
estava com mais 12 pessoas à mesa e durante o ano morreu uma delas, e se, noutra ocasião, fez
uma viagem em dia 13 e sofreu um desastre, conclui apressadamente que o número 13 é aziago».
São mais ou menos desta espécie os raciocínios defectuosos que vamos estudar, para
precaver o espírito humano, aos quais costuma dar-se o nome de sofismas e a que os antigos
chamavam falácias.
De um modo geral, o sofisma ou a falácia é um raciocínio errado com aparência de
verdadeiro. Mais particularmente, chama-se sofisma ao raciocínio falso, voluntário, feito com
intenção de enganar, para o distinguir do paralogismo que é igualmente um falso raciocínio, mas
involutário, feito sem intenção de enganar e de boa fé. Os dois são variedades das falácias.
Esta distinção só interessa ao moralista que pretende determinar a sinceridade das opiniões
alheias; logicamente, curamos de saber, não a origem, mas sim a forma do raciocínio falso, razão
po que sofisma e paralogismo serão considerados a mesma coisa.
2. Tipos de sofismas
Consoante o erro provém da linguagem ou das ideias que formam o raciocínio, assim
podemos dividir os sofismas em:
- sofismas de palavras ou verbais ou da gramática
- sofismas lógicos ou de pensamento.
b) a confusão entre sentido diviso e composto – quando damos o mesmo valor ao todo
que têm as partes consideradas separadamente e vice-versa.
Exemplos:
Nem esta. Nem aquela, nem outra falta às aulas me prejudicam
Logo, nenhuma falta me prejudica
Todos estes sofismas são, por alguns autores, chamados, formais, por pecarem contra a
forma do raciocínio.
Este sofisma também se pode dar na dedução, quando atribuimos ao sujeito um predicado
acidental e o tomamos como essencial.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
O homem corre
O coxo é homem
Logo, o coxo corre
- sofisma de falsa analogia – quando concluimos de um objecto para outros sem olharmos
à diferença existente entre eles, baseando-nos apenas em algumas semelhanças.
Exemplos:
A lua é um planeta como a Terra
A Terra é habitada
Logo, A lua é habitada
As aves voam
Os morcegos voam
Logo, os morcegos são aves.
Todos estes sofismas são materiais, por pecarem contra a matéria do raciocínio; obedecem
a todas as regras da lógica formal, mas não atendem á realidade.
B) Sofismas Materiais
a) petição de princípio – consiste em supor já demonstrado aquilo que é objecto da questão
ou em resolver a questão com a própria questão. É sofisma deste tipo incluir o definido na
definição.
Exemplos:
Porque faz o ópio dormir? – porque tem virtudes dormitivas
Que é a história? – é a ciência que trata dos factos históricos.
b) cérculo vicioso ou dialelo – é, em última análise, uma dupla ou tripla petição de
princípio, que consiste em provar uma questão por outra ou outras que têm igualmente
necessidade de ser demonstradas, provando, por sua vez, esta ou estas pela primeira.
Exemplos:
Provar a ordem do mundo pela sabedoria divina e a sabedoria divina pela ordem do
mundo.
c) Ignorância da questão – é muito frequente nas discussões humanas, e consiste em
provar coisa diversa daquela que é objecto da discussão ou em afastar a questão – quer insensível,
quer rapidamente – até a tornar esquecida.
Exemplos:
Dizer que o homem não é livre, porque não pode fazer tudo quanto deseja; ou um
advogado provar que certo criminoso é bom esposo e bom pai para o salvar da acusação de
falsificador.
X. ARGUMENTAÇÕES DEFEITUOSAS
Os sofismas são raciocínios errados, como dissemos. Há, no entanto, formas imperfeitas
ou defeituosas de argumentação que, embora não sendo verdadeiros erros, podem a eles conduzir.
Entre elas consideraremos:
a) Magister dixit ou argumento de autoridade – pretende provar a verdade de qualquer
asserção recorrendo à autoridade das pessoas que a defendem. Foi muito usado na Antiguidade e
Idade Média.
b) Argumento «ad hominem» - consiste em utilizar os próprios princípios falsos usados
pelo adversário para o atacar.
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Cadeira de lógica Domingos Francisco Mazive
c) Argumento «ad terrorem» - leva a admitir uma opinião em virtudes das consequências
funestas que resultariam da sua não admissão.
d) Uso das interrogações múltiplas – é caracterizado por se fazerem muitas perguntas
sucessivas, de modo que tornam impossível uma só resposta.
CONCLUSÃO
Se entendemos a lógica como ciência que procura regular o raciocínio, devemos
reconhecer ser uma ciência difícil mas necessária. É dentro deste quadro de pensamento que
propusemos-nos a esta aventura, certos de erros que o nosso raciocínio pode ter cometido. Essa
certeza de erros, porém, é redimida pela vontade de ir acertando os pontos sensíveis do raciocínio
de modo que cada vez mais se revele razoável. A investigação continuará.