Fichamento 1 - Conceitos em R.I - Amado Cervo
Fichamento 1 - Conceitos em R.I - Amado Cervo
Fichamento 1 - Conceitos em R.I - Amado Cervo
Relações Internacionais
Aluno - Gabriel dos Santos Molon –
221900
Prof - Luiz Armando Capra Filho
Espécie de Trabalho – Fichamento
Obra: CERVO, Amado Luiz. Conceitos
em Relações Internacionais. Revista
Brasileira de Política Internacional.
Volume 51( 8-25) - 2008
1. INTRODUÇÃO
“O estado atual das teorias das relações internacionais apresenta um quadro caótico do
ângulo de sua formulação intelectual. [...] Elas conservam, como afirma Marie-Claude
Smouts, a função original de elaborar a compreensão do objeto de estudo, as relações
internacionais, e de iluminá-lo com o conhecimento organizado.” (PG.9)
“As teorias integram, no Brasil, os currículos dos cursos de relações internacionais,
aproximadamente setenta cursos de graduação e cerca de uma dezena de cursos de pós-
graduação de mestrado e doutorado[...]como afirma em seminários o atual ministro
brasileiro de relações exteriores, Celso Amorim. [...] Quem não conhece a teoria não
exercita a intuição conselheira da decisão.” (PG.9)
“O estado caótico das teorias explica-se pelo fato de não serem imparciais, já que se
inspiram em campos de observação limitada, e pelo fato de não serem objetivas. [...] A
desconfiança intelectual invade com força ética o domínio das teorias das relações
internacionais. As raízes em que se apoiam as vinculam a interesses específicos de
determinadas sociedades que constituem seu campo de observação, bem como a valores
que estas sociedades cultivam e, ainda, a padrões de conduta que sugerem e enaltecem
como sendo ideais. [...] O construtivismo, mélange das contradições da teoria, surge como
reação de superação do impasse a que se chegou.” (PG.9-10)
“Desvendar as ciladas da teoria é tarefa tão relevante quanto apropriar-se de seu
conhecimento. O realismo, por exemplo, trilhou o caminho do sucesso nas universidades
e meios intelectuais de todo o mundo, de modo incomparável. [...] O realismo propõe ao
mundo interesses, valores e padrões de conduta do Ocidente. O realismo não é isento nem
explica as relações internacionais como pretende.” (PG.10)
“As teorias que servem ao Primeiro Mundo não são convenientes, necessariamente, aos
emergentes. Tomemos, como exemplo, a teoria da estabilidade hegemônica. Para
Bertrand Badie, a teoria da estabilidade hegemônica, no mundo atual, exibe tanta
capacidade explicativa para as relações internacionais quanto uma eventual teoria da
instabilidade hegemônica.” (PG.10)
“A ordem internacional não se ampara na potência hegemônica do momento se esta não
for capaz de conectar-se com as forças globais de modo a agregar o peso destas últimas
na criação da ordem. E nesse caso a teoria da estabilidade hegemônica esvazia-se. Um
contrapoder, com efeito, ergue-se daquele sul que os geopolíticos já denominaram
periferia, depois terceiro mundo, hoje emergentes.” (PG.10-11)
“Desde a Segunda Guerra Mundial, a velha periferia assistia a decisões elaboradas pelos
países centrais do capitalismo no seio do GATT-OMC e propostas como regras para todas
as nações. A periferia não participava da formulação, tampouco usufruía de benefícios
estruturais, por certo haveria de cumpri-las. [...] Os emergentes organizaram-se então no
G20 com o fim de participar, pela primeira vez, da formulação das regras de liberalização
de modo a estabelecer a reciprocidade de benefícios. Caso não fosse possível atingir a
reciprocidade, bloquear-se-ia a produção de regras multilaterais para o comércio
internacional. A OMC paralisou-se por anos em razão da emergência do contrapoder.”
(PG.11)
“Como toda teoria serve a uma cultura, o choque de civilizações serve à cultura ocidental
de matriz anglo-americana. Brasil, Índia e China, entre outros países pacifistas, concebem
e praticam políticas exteriores não confrontacionistas e pautam sua conduta pela
convivência das diferenças culturais. Em particular, segundo Renato Ortiz, o Brasil é
formado por cultura plural, oriunda de grupos sociais distintos, culturas que se
transformam com o tempo.” (PG.11-12)
“Em seu livro The Central Liberal Truth: How Politics Can Change a Culture and Save
it from Itself, Lawrence E. Harrison utiliza a lógica de Huntington ao perguntar-se sobre
quais elementos de cultura promovem democracia, justiça social e desenvolvimento. [...]
Identificou mais de duas dezenas de fatores de propulsão e obstrução. Contudo, sua base
de referência epistemológica prossegue sendo a cultura do Ocidente. [...] Quando se
unem, Harrison e Huntington descartam o valor explicativo das interpretações que
fizeram sucesso no sul, como as teorias do imperialismo, do colonialismo e da
dependência, entre outras.” (PG.12)
“Revelando atitude intelectual mais aberta e mais simpática, Alexander Wendt escala uma
nova fase dessa evolução recente das teorias. Construtivista, construtivista racionalista
como se apresenta a si mesmo. [...] Wendt inicia a demolição do imperialismo das teorias
das relações internacionais. Essas teorias, segundo o autor, nunca foram capazes de prever
algo que já não fosse uma tendência em curso. [...] Ávido por ideias novas, não hesita em
colocar em cheque por meio de seu ecletismo metodológico o conhecimento disponível
para explicar as relações internacionais. O realismo, por exemplo. Existem três
paradigmas de Estado, afirma: o hobbesiano, que vê os outros como inimigos, o lockeano,
que os vê como rivais, e o kantiano, que os vê como amigos. Embora pretenda golpear o
realismo, que opera em seu entender por meio do primeiro modelo, o argumento de Wendt
permanece em certa medida tributário dessa corrente.” (PG. 12)
“Do ângulo epistemológico, o construtivismo encaminhou a avaliação crítica das teorias,
sem conduzir sua lógica ao termo do raciocínio. [...] A ousadia consiste em descartar de
vez a pretensão universalista das teorias e limitar-se a erguer conceitos aplicados às
relações internacionais. Estes não renegam suas raízes nacionais ou regionais – interesses,
valores e padrões de conduta – por tal razão não se apresentam com a ambição explicativa
universal das teorias.” (PG.13)
3. OS CONSTUTORES DE CONCEITOS
“Em que mundo vivemos? Tem o Brasil um lugar especial no mundo? Que mundo se
deseja para a humanidade? Qual o papel a desempenhar sobre o cenário internacional.
Sem serem políticos, diplomatas ou cientistas, alguns brasileiros se inclinaram sobre tais
questões e formularam pensamento a tal respeito, de modo a impregnar o substrato
cultural da mente coletiva. Esses pensadores devem ser procurados na literatura
propriamente dita. [...] São encontrados também na plêiade de pensadores que não
figuram em manuais de história da literatura, porém deixaram suas ideias em obras que
compõem o acervo cultural da nação. Pela força da leitura, da citação, da aprendizagem
ou mesmo do subconsciente, a mensagem desse segmento do pensamento nacional revive
e se perpetua.” (PG.14-15)
“Os males da civilização dos trópicos não advêm da raça ou do clima, porém do modelo
de inserção internacional. Por que não libertar a América Latina do jugo externo e
estimular seu dinamismo, tomando como fatores de propulsão energias próprias? [...] Os
pensadores que forjam a cultura da nação lançam as sementes de paradigmas de Estado,
tão caros à teoria das relações internacionais. Morgenthau expressa a súmula do
pensamento social norte-americano do início da Guerra Fria, ao elaborar sua teoria
“realista” do Estado hobbesiano. Wendt expressa a súmula do pensamento clássico
europeu, ao elaborar sua teoria “construtivista” dos três Estados, hobbesiano, lockeano e
kantiano. Mas no Brasil, nenhuma dessas formulações teóricas tem assento na cultura
nacional.” (PG.15)
“O paradigma liberal-conservador estende-se da Independência a 1930, baseado na
apropriação do liberalismo clássico europeu e responsável por manter o atraso histórico
da nação segundo análise estruturalista dos pensadores da Comissão Econômica para a
América Latina (Cepal). O desenvolvimentista é destilado do pensamento modernizador
de que demos algumas referências e induziu as conquistas do progresso durante sessenta
anos. O neoliberal dos anos 1990 representa uma volta ao passado pela subserviência que
pratica e, ao mesmo tempo, um salto para o futuro, quando abre economia e sociedade
aos fluxos da globalização. O logístico, enfim, no século XXI, que transfere à sociedade
e a seus agentes as responsabilidades do desenvolvimento, sem deixá-los a mercê do
mercado porque lhes dá suporte em sua ação externa. A cultura brasileira é componente
congênito desses e dos demais conceitos aplicados às relações internacionais do país.”
(PG.16)
“Em todo país do mundo, homens de Estado desenvolvem ideias acerca do modo de
conceber o sistema internacional, sua estrutura e funcionamento, a economia
internacional, bem como as relações do país com estruturas e conjunturas e com as outras
nações. Estamos nos referindo a dirigentes, em especial os diplomatas, que desempenham
funções relevantes para a formação nacional. As correntes brasileiras do pensamento
político e do pensamento diplomático carregam como legado histórico a identidade
pluralista em que nasceu, cresceu e amadureceu a nação, cujo curso profundo repousa
sobre substrato étnico-cultural múltiplo. Na esfera das ideias políticas e diplomáticas
aplicadas às relações internacionais do país, esse substrato oferece base real, porém os
pensadores se alçam com desenvoltura. Examinemos, por exemplo, duas tendências
relevantes: o pensamento liberal e o pensamento industrialista.” (PG.16)
“Um país liberal, aberto aos fluxos de ideias, conhecimentos, pessoas, capitais, produtos;
conectado com o mundo não só por meio desses fluxos, mas por ordenamentos que os
convertem em organização institucional. [...] Essa linha de pensamento não emerge no
Brasil à era de Fernando Henrique Cardoso e dos neoliberais do fim do século XX. A
abertura ao mundo penetra a cultura e a vida política brasileira como fator imanente de
sua história. Assim pensava D. João VI quando concebia, em 1808, a liberdade para o
comércio e as manufaturas no Brasil: construir o império americano ancorado no aumento
da riqueza, cuja possibilidade seu conselheiro, José da Silva Lisboa, o primeiro
economista liberal brasileiro, condicionava à contribuição interna e ao livre comércio.”
(PG.16)
“Um país industrial não foi pela primeira vez conceituado por Getúlio Vargas ou
Juscelino Kubitschek, dois estadistas modernizadores do século XX. A linha de
pensamento teve precursores distantes. A gênese do pensamento industrialista brasileiro
vem embutida em medidas como Carta Régia, decreto e alvará tomadas em 1808 e 1809
por D. João, sob inspiração de seu conselheiro. [...] No século XX e XXI, porém sob
novas e adaptadas formulações, como democracia de mercado, globalização benéfica,
governança global, liberais radicais se colocam a serviço de interesses da elite das nações,
que estabelece em proveito próprio o ordenamento global. [...] A tendência liberal
imprimiu traços indeléveis na formação nacional. Já os pensadores que inspiraram o
paradigma desenvolvimentista pela via da modernização industrial, depois de observarem
sua voz ressoar no deserto durante tão longo tempo, a profetizar o futuro, acabariam
substituindo os primeiros de 1930 em diante.” (PG.17)
5. CONCLUSÃO