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Gabarito de Respostas
Um quarteirão não corresponde a uma distância muito longa. Quando a gente diz: “Essa loja fica no
próximo quarteirão” a pessoa sente que não tem que andar muito. Mas o espaço físico nem sempre corresponde
ao espaço emocional, cujas possibilidades são quase infinitas. Caminhando por um quarteirão de Porto Alegre
tive dois encontros, para dizer o mínino, insólitos. E reveladores. E enriquecedores.
Numa esquina havia um menino chorando. Um menino de uns dez anos, bem vestido, bem nutrido –
não era de fome que ele chorava, mas chorava, de qualquer modo, perguntei o que tinha acontecido. Não quis
responder. Insisti, quis saber se podia fazer alguma coisa. Já irritado, pediu-me que o deixasse em paz e seguisse
meu caminho. Foi o que fiz meio desconcertado, e na esquina seguinte, lá estava a moça rindo, sozinha. Dessa
vez era uma moça pobre, malvestida, e, o riso mostrava que lhe faltavam vários dentes. Mas a moça ria, mesmo
assim. Não lhe perguntei por que estava rindo – já aprendera a minha lição.
Num mundo em que não faltam solitários e pessoas meio estranhas, não é raro surpreender alguém
falando sozinho. Ás vezes é uma conversa amena, outras, uma verdadeira alteração. Ou então resmungo puro e
simples, o que explica aquela velha anedota, do homem que foi ao médico queixando-se que falava sozinho. O
facultativo ponderou que isso acontecia com muitas pessoas, ao que o homem suspirou: pois é, doutor, mas o
senhor não em ideia de como eu sou chato.
Um menino que chora sozinho e uma moça que ri sozinha podem ser qualquer coisa, menos chatos. O
menino nos remete a essa imensa tristeza que acompanha a humanidade desde o seu nascimento, e que justifica
expressão “vale de lágrimas”.Mas a moça, por alguma razão, nos dá esperanças. Se uma criatura pobre, sem
dentes, consegue rir, então nem tudo está perdido. Se o nosso time dá a volta por cima, nem tudo está perdido. Se
os pobres conseguem ter esperanças, nem tudo está perdido.
O menino que chora, a moça que ri. É a vida, não é? É a vida. Que é feita de choro e riso. E que
exatamente por isso vale a pena ser vivida.
Moacyr Scliar. In: Pipocas / Moacyr Scliar, Rubem Fonseca, Ana Miranda. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 10-13. Coleção
Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
Prática de leitura e prática de análise linguística da crônica “Menino chorando, moça rindo”
Você respondeu às questões propostas na aula passada, agora compare o que você
escreveu com a resposta esperada.
1) O texto que acabamos de ler pertence ao gênero crônica, um tipo de texto literário que trata de
situações do cotidiano, essas situações podem ser de humor, de reflexão crítica-social ou mesmo
lírica, momento em que a crônica se aproxima do gênero poema. No caso da crônica “Menino
chorando, moça rindo” qual dessas características se sobressai?
A característica lírica aparece, principalmente na conclusão do texto: “O menino que chora,
a moça que ri. É a vida, não é? É a vida. Que é feita de choro e riso. E que exatamente por isso vale
a pena ser vivida”. Essas frases são também são reflexivas. Não notamos a carcterística
humorística, tampouco a crítica social.
2) Na crônica lida, os fatos são narrados em primeira pessoa. Relacionando a narrativa às pessoas
do discurso, quem representa as pessoas:
a) eu: o narrador.
b) tu (você): o leitor.
3) Como o espaço influenciou os fatos narrados?
O espaço está diretamente ligado aos fatos narrados, pois a história foi formada a partir de pessoas que
estavam na ruas(espaço).
4) Escreva sobre a importância de ter algo, mesmo ficcional, definidos no espaço e no tempo
para a construção de um texto narrativo.
O espaço e o tempo são componentes de uma narrativa, como as crônicas. Uma história é contada a
partir de algo que acontece com alguém, em um determinado lugar. E essa história acontece com a
passagem do tempo, mesmo que seja um tempo curto, no presente, no passado, ou no futuro, mas é
preciso contar com o fator tempo.
5) Apesar de abordar as diferenças sociais entre as personagens, a crônica aborda também
alguma crítica social? Justifique.
Não, ele somente menciona o menino bem cuidado e a moça descuidada, porém não faz críticas, isto
é, ele não faz ligação entre o estado das personagens e a distribuição de renda no Brasil, por
exemplo.
6) Relacione as oposições chorando/rindo à conclusão em que o cronista chega.
Conforme o narrador, o ato de chorar estaria ligado à insatisfação do ser humano, já o ato de sorrir estaria
ligado à esperança. Para colocarmos isso de outra forma, poderíamos fazer as oposições
desespero/esperança.
7) Leia as expressões “Numa esquina” e “Na esquina seguinte” e recupere, pela leitura do texto,
onde ficavam essas esquinas.
Na cidade de Porto Alegre, RS.
8) Releia o trecho “Mas o espaço físico nem sempre corresponde ao espaço emocional” e
relacione-o ao conteúdo da crônica.
O espaço físico é limitado entre uma esquina e outro, conforme explícito na frase: “Um quarteirão
não corresponde a uma distância muito longa” . Já o espaço emocional abrange a humanidade inteira ,
pois nos três últimos parágrafos, o narrador fala da humanidade em geral, ou seja, extrapola bastante o
espaço emocional.
9) Considerando que a moça e o menino sejam pessoas reais, pois o gênero crônica permite a
mistura de ficção e realidade, qualquer pessoa que os visse teria a mesma percepção que teve o
narrador de “Menina chorando, moça rindo?
Não, o menino e a moça estavam nas esquinas, um chorando e outro sorrindo, mas a percepção dos
fatos depende da subjetividade do autor.
10) Considerando o que você respondeu no item anterior, pense: além de observar o cotidiano, o
que é interessante em um cronista?
Observar os fatos, de forma subjetiva, dando originalidade à sua história, ou melhor, a forma em
que se narra pode ser mais interessante do que os fatos narrados.
11) Todos os fatos narrados estão presentes no texto ou alguns vieram pela percepção do narrador
em relação ao espaço e as personagens da narrativa?
Os fatos rir e chorar estão nos textos, já a reflexão sobre a condição humana é criação do cronista.
12) Você consegue perceber a importância da subjetividade para a construção de uma crônica
reflexiva? Escreva sobre isso.
(Resposta pessoal)
13) Identifique as opiniões expressas no último parágrafo.
A vida é feita de choro e riso e, por isso, vale a pena ser vivida.
Acho que foi uma espécie de provocação amistosa. Quando minha amiga soube que eu
estava escrevendo crônicas, ela disparou por telefone mesmo: “Sabe o que disse um escritor,
com quem eu mantenho contato, sobre as crônicas?
Fiquei em silêncio, pressentindo as críticas que viriam.
“Ele acredita que são ficções malfeitas. Um tipo de conto preguiçoso, ou uma história
de pouco fôlego”.
Fiquei contente. Há tempos que eu desejava escrever sobre o tema, e o desafio me
incentivou. De início, concordei com o “pouco fôlego”. Sempre comparo esse gênero literário
à fotografia, técnica que se propõe a registrar instantâneos. As crônicas, via de regra, não se
metem a grandes narrativas, como um longa-metragem. Isso fica para os romances ou aos
seus irmãos menores, as novelas. Olha-se uma situação, escuta-se um caso, recorda-se um
episódio, e eis o material para reflexão. Tudo, literalmente funciona como assunto. Serve o
trânsito? Serve. A impunidade dos ministros, os campeonatos esportivos? Servem também.
Quem não leu ainda À sombra das chuteiras imortais, de Nelson Rodrigues, está perdendo
uma ótima análise da paixão dos brasileiros pelo futebol.
Coisa curiosa: tanto faz se o fato principal, o foco de interesse, o ocorreu no
Afeganistão ou na casa do vizinho. Nesse sentido, O nascimento da crônica, artigo escrito por
Machado de Assis em 1877, é memorável. Nele, o mestre destaca que a maneira certa de se
começar uma crônica é pela trivialidade.
Mas quem teria inventado esse gênero literário, e quando isso teria ocorrido? Machado
de Assis ironiza: foi no exato momento em que apareceram as primeiras vizinhas. Elas se
sentaram na calçada no final do dia e, provavelmente, disseram: “Que calor! Que desenfreado
calor!”. Então, do clima, a conversa foi para as plantações e aos demais acontecimentos que
as circundavam.
Volto para a provocação da minha amiga e pergunto: será que a crônica é realmente
um gênero menor? Como um advogado de defesa, fui pesquisar e destaco os trechos mais
importantes que encontrei sobre o assunto.
No Dicionário Aurélio deparei com várias definições para crônica. Em resumo, ela é
considerada um texto jornalístico escrito de forma livre e pessoal, cujos temas são ideias,
fatos da atualidade ou do cotidiano. Foi justamente o caráter jornalístico que me chamou a
atenção e lembrou-me um livro excelente sobre a história da imprensa, escrito por Jacques
Wolgensiger.
Segundo o autor, a imprensa teria surgido para atender à necessidade que o ser
humano tem de informar-se sobre o mundo que o cerca. Porém, as notícias, além de orientar
as pessoas, deveriam oferecer algo mais: “o prazer de descobrir”.
Nutrindo a minha obsessão de advogado, palpito que a crônica – sendo “livre e
pessoal” – pode explorar mais esse prazer do que o texto jornalístico, limitado à informação.
Jacques considera os poetas gregos e os trovadores da Idade Média ancestrais do jornalismo
moderno. E (por que não?) excelentes cronistas, já que em seus cantos eles informavam para o
povo fatos míticos mesclados ao cotidiano.
Bem, devo confessar uma coisa: quanto mais mergulhava na história da imprensa,
mais maravilhado eu ficava. Quem imaginaria que o primeiro jornal do Ocidente, o Acta
Diurna romano, já se utilizava das crônicas? E o pensar Commentarius Rerum Novarum, que
a época de Júlio César conseguia ser semanal? Detalhe: eram feitos dez mil exemplares,
escritos à mão, por escravos.
Pulo, por uma questão de espaço, centenas de anos e encontro mais um elemento para
a defesa da crônica. Estamos no século XIX, as publicações são diárias, a distribuição é
ampla, notícias voam entre os continentes. Inicia-se o império dos grandes jornais com a
árdua tarefa de conquistar leitores.
A necessidade furiosa de vender jornais acirrou a competição entre os impressos. O
francês La Presse, em 1836, dá um golpe fatídico, corta seu preço pela metade e duplica suas
vendas. A concorrência, percebendo o seu sucesso, logo o imita. Giradim, o gênio do La
Presse, não se abate e apela à qualidade, convocando os grandes escritores da época. Mas
para quê? Para escreverem crônicas.
Sim, eu considero este o meu argumento final: o que dizer de Balzac, Victor Hugo,
Alexandre Dumas escrevendo essas “ficções malfeitas”? Pois foi o que ocorreu. A cada dia,
uma crônica diferente aparecia na primeira página do jornal para estimular os leitores a lerem
o resto do jornal.
Felizmente, essa competição entre os gigantes do jornalismo se manteve. Trouxe
frutos, deu exemplos para que outros países os imitassem. Graças a ela, nossos melhores
escritores, cujos textos podemos encontrar em coletâneas, retrataram suas épocas e costumes.
A palavra “crônica” está ligada ao tempo (do grego chrónos, tempo) e ela funciona como um
registro do presente. Basta procurar nos jornais de hoje. Os grandes cronistas passam por lá.
Paulo Bloise. In: Do conto à crônica. Machado de Assis.. (et. al). 1ª ed. São Paulo: Salamandra, 2003, p. 51-53
Coleção Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
1) Você leu ma crônica argumentativa metalinguística, pois o autor escreve uma crônica
para falar do gênero. Sobre a escrita, a história e temas da crônica, identifique e transcreva
trechos do texto.
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Aluno: __________________________________________ Ano: ______ Turma: ______
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Data: _____________________________ Disciplina: Língua Portuguesa
Você já teve contato com o gênero crônica e estudou algumas características desse
gênero. Agora você já pode produzir sua primeira crônica.
Para auxiliar na busca de um tema para a crônica, releia o que o cronista Paulo Bloise
escreveu sobre o gênero e seu processo de produção.
As crônicas, via de regra, não se metem a grandes narrativas, como um longa-
metragem. Isso fica para os romances ou ao seus irmãos menores, as novelas. Olha-
se uma situação, escuta-se um caso, recorda-se um episódio, e eis o material para a
reflexão. Tudo, literalmente, funciona como assunto. Serve o trânsito? Serve. A
impunidade dos ministros, os campeonatos esportivos? Servem também. (...)
Coisa curiosa: tanto faz se o fato principal, o foco de interesse, ocorreu no
Afeganistão ou na casa do vizinho. Nesse sentido, O nascimento da crônica, artigo
escrito por Machado de Assis em 1877, é memorável. Nele, o mestre destaca que a
maneira certa de começar uma crônica é a trivialidade.
Paulo Bloise. In: Do conto à crônica. Machado de Assis.. (et. al). 1ª ed. São Paulo: Salamandra, 2003, p.
55-57 Coleção Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
A infância e a adolescência são fases privilegiadas das nossas vidas, em que acontecem
muitas transformações, um período de transição e de integração ao mundo social.
Pense num fato ligado à infância ou à adolescência, sua ou de outra pessoa, e transforme-
o em uma crônica.
Antes de escrever, leia também textos diversos que tratam do tema, como poemas,
crônicas, reportagens, entrevistas, artigos de opinião, entre outros.
Seu texto tanto pode ser narrado em primeira pessoa, ou seja, escrito pelo ponto de vista
de uma das personagens, ou em terceira pessoa, com um narrador observador.
Dê à sua crônica o tom que você desejar - lírico, humorístico, filosófico, ou que a sua
história permitir.
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Data: _____________________________ Disciplina: Língua Portuguesa
Módulo 1
Garoto Linha- Dura
Deu-se que o Pedrinho estava jogando bola no jardim e, ao emendar a bola de bico por
cima do travessão, a dita foi de contra uma vidraça e despedaçou tudo. Pedrinho botou a bola
debaixo do braço e sumiu até a hora do jantar, com medo de ser espinafrado pelo pai.
Quando o pai chegou, perguntou à mulher quem quebrara o vidro e a mulher disse que
foi o Pedrinho, mas que o menino estava com medo de ser castigado, razão pela qual ela temia
que a criança não confessasse o seu crime.
O pai chamou Pedrinho e perguntou:
─ Quem quebrou o vidro, meu filho?
Pedrinho balançou a cabeça e respondeu que não tinha a mínima idéia. O pai achou
que o menino estava ainda sob o impacto do nervosismo e resolveu deixar para depois.
Na hora que o jantar ia para a mesa, o pai tentou de novo:
─ Pedrinho, quem foi que quebrou a vidraça, meu filho? ─ E, ante a negativa reiterada
do filho, apelou: ─ Meu filhinho, pode dizer quem foi que eu prometo não castigar
você.
Diante disso, Pedrinho, com a maior cara-de-pau, pigarreou e lascou:
─ Quem quebrou foi o garoto do vizinho.
─ Você tem certeza?
─ Juro.
Aí o pai se queimou e disse que, acabado o jantar, os dois iriam ao vizinho esclarecer
tudo. Pedrinho concordou que era a melhor solução e jantou sem dar a menor mostra de
remorso. Apenas ─ quando o pai fez ameaça ─ Pedrinho pensou um pouquinho e depois
concordou.
Terminado o jantar o pai pegou o filho pela mão e ─ já chateadíssimo ─ rumou para a
casa do vizinho. Foi aí que Pedrinho provou que tinha ideias revolucionárias. Virou-se para o
pai e aconselhou:
─ Papai, esse menino do vizinho é um subversivo desgraçado. Não pergunte nada a ele
não. Quando ele vier atender a porta, o senhor vai logo tacando a mão nele.
Stanislaw Ponte Preta. In: Histórias de Humor/ Vários Autores. 1ª ed. São Paulo: Scipione, 2003, p. 17-20.
Coleção Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
Velho é demais
“Sai da frente, vô! Com esse grito, o skatista espanta um casal de velhinhos no parque
do Ibirapuera e, quase didático, ilustra um conflito de gerações. Nas ruas vizinhas, cartazes
coloridos de shows de rock exibem hordas de guerreiros-mirins. Por toda parte, garotas de
dezesseis anos mostram corpos que nenhuma academia produz e invadem as telas de cinema
em propagandas insinuantes, como rebeldes de confecções.
Estamos cercados de revistas para adolescentes, moda para adolescentes, agora
orgulhosamente chamados de teens. A música fatura milhões nessa faixa de mercado, e não é
à toa que os pisos dos shopping centers substituem as antigas praças públicas.
Consumo, produção, beleza e agilidade no raciocínio. Mas, então, como é que se
envelhece, ou melhor, como abandonar esse grupo tão cultuado e entrar para um outro bem
menos glamouroso? Há muito que a humanidade se faz essa pergunta.
Na mitologia grega, o implacável Chrónos engolia cada um de seus filhos, mostrando
o destino que nos aguarda. Quando o corpo engorda, as rugas marcam a pele, e o ritmo de
produção cai, a palavra velho surge como sinônimo de obsoleto, desnecessário.
O psiquiatra Carl Jung, que procurou em diversas culturas algo que pudesse ser o
patrimônio comum da humanidade, compara nossa vida à trajetória do Sol. Se ao amanhecer
ele vai adquirindo cada vez mais brilho, após o meio-dia, seu avançar não significa mais
aumento, e sim na diminuição de força. Sem dúvida, é difícil perceber que essa diminuição
não representa uma desvalorização, mas uma troca de sentido. O Sol não se imobiliza jamais.
No entanto, há um número considerável de pessoas que se fixam nos ideais luminosos, que
lutam pela eterna juventude, como se o entardecer não tivesse valor. Outras, ainda, apegam-se
às suas conquistas e tornam-se contrárias a qualquer novidade. Passados os “bons tempos”,
resta apenas lembrá-los. Jung sugere que , o que o jovem precisa encontrar fora, na relação
com o mundo, o homem, no entardecer da vida, deve encontrar dentro de si, e conclui: “Há
uma necessidade de se reconhecer o engano das convicções defendidas até então, de sentir-se
a inverdade das verdades”.
Em nossa sociedade jovem e pobre, o idoso não encontra apoio nem é valorizado
como alguém experiente, capaz de perceber coisas que fogem à pressa dos mais novos.
Nelson Rodrigues, em sua biografia, dedica um capítulo a esse tema. Melancólico, lembra-se
da infância como o tempo em que “ainda não era degradante ser velho. O sujeito podia ter,
impunentemente, setenta, oitenta, anos...” Aqui, como dolorida ironia, Nelson retrata o idoso
brasileiro punido pelos demais membros da sociedade.
E se aprendesse com a China? Esse país, que sempre honrou os velhos pela capacidade
de reflexão, considera a velhice uma imagem da imortalidade e sabedoria. Talvez, por isso, o
grande sábio Lao-Tse não precisou agarrar à juventude, nem correu o risco de ser atropelado
por skatistas. Impunentemente e cheio de glória, ele nasceu de cabelos brancos e aspecto
ancião.
Paulo Bloise. In: Do conto à crônica. Machado de Assis.. (et. al). 1ª ed. São Paulo: Salamandra, 2003, p. 55-57
Coleção Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
Em que momento esse verbo substantivado, pois é precedido por um artigo definido,
forma uma locução adverbial de tempo?
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9) Releia o trecho abaixo e relacione a comparação sobre o Sol e à atitude esperada em
relação aos idosos.
“Se ao amanhecer ele vai adquirindo cada vez mais brilho, após o meio-dia, seu avançar não significa mais
aumento, e sim na diminuição de força. Sem dúvida, é difícil perceber que essa diminuição não representa uma
desvalorização, mas uma troca de sentido”.
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Aluno: __________________________________________ Ano: ______ Turma: ______
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Data: _____________________________ Disciplina: Língua Portuguesa
Módulo 3:
A arte de brincar
É lamentável, mas os tempos andam tão maus que as próprias crianças já não sabem
mais brincar.
Em dias tranquilos, elas gostavam de suas cantigas de roda, tinham um largo
repertório, e à tardinha e à noite brincavam pelos quintais e pelas ruas, pelos jardins e pelas
praças. Tinham também jogos cantados e falados, resíduos ou esboços de teatro, e como eles
se entretinham, alegremente. Os brinquedos simples, primitivos e eternos, fáceis de obter e de
conservar, não faltavam nem mesmo ás mais pobres; e quase se podia saber em que mês se
estava pelo aparecimento de papagaios de papel ou das bolas de gude, do pião ou do bilboquê.
As bonecas ingênuas ocupavam as meninas com preparativos de enxovais de batizado e
casamento, conduzindo assim as pequeninas mãos à técnica da costura e do bordado por um
caminho de resultados surpreendentes, graças à sua origem terna e sentimental.
Esses jogos, quase todos de grupo, estabeleciam relações sociais de cordialidade, entre
as crianças. Muitas amizades nasceram de partidas de gude ou “cinco Marias”, de cirandas e
de fogos de artifício. E essa sociabilidade era autêntica, e de longa permanência, pois resistira
às competições dos jogos, às rivalidades aos despeitos, aprimorara o caráter nesses encontros
de infância, que é quando se deve aprender a tolerância, a admiração e outras coisas mais.
As crianças de hoje parecem-me irritadas e desnorteadas. Cerca-as uma atmosfera
bravia, uma agitada atmosfera, que as deixa sem a suficiente serenidade para apreciar a beleza
simples das pequenas coisas e admitir outras vidas, além da sua, neste mundo tão grande.
Os jogos de conjunto tendem a desaparecer, e são os brinquedos mecânicos que os
substituem. Mas uma das coisas mais interessantes naqueles jogos era a sua barateza. Não há
rua tão infeliz que não tenha pelo menos uma dúzia de crianças. Exceto aos pais, essas
crianças não custam nada. É só reuni-las, fazê-las entoar umas tantas cantigas, e já temos uma
festa, meio desafinada, meio rouca – mas há alguma festa que não seja meio rouca ou
desafinada? Nunca vi.
Agora com a bicicletas e os patins e os automóveis destes tempos de velocidade, a
história é outra. Nem todos os pais podem adquirir coisas tão cara para a sua prole. E, como
os possuidores de tão custosas prendas, graças exatamente à sua qualidade de brinquedos
velozes, podem estar quase ao mesmo tempo em muitas partes, resulta que uma boa porção da
criançada sofre – sofre profundamente – por ver essas belas máquinas fora do alcance das
suas possibilidades.
Não me quero deter na análise dos sentimentos que essa situação desperta na alma
infantil. “Há muitas coisas neste mundo, Horácio”, que as crianças não podem entender...
Ainda uma coisa me parece pior: que os pais também sofram com essa situação. Esse
sofrimento não resolve nada. E se um sofrimento não resolve nada, é inútil e deve ser
eliminado. Deve ser substituído por uma coisa que resolva. A coisa que resolve é uma
compreensão diferente da vida, e uma interpretação mais pura, mais sadia, mais isenta. E eu
sei que dá um certo trabalho ter-se uma tal concepção do mundo que deixe em seus lugares
sem perturbar a paz de espírito de cada um. Mas enquanto não se tem essa concepção,
também não se tem essa paz e, assim, é mister começar pelo único lado que é,
verdadeiramente, começo.
Se os pais se lamentarem de não dar a seus filhos todas essas máquinas atraentes, mas
um pouco tediosas que se inventam para brinquedo, podem causar grande mal às crianças,
aumentando o interesse naturalmente suscitado por essas coisas. Mas se não lhes derem
grande atenção, se estiverem, eles mesmos, enamorados da infância e da beleza do mundo,
conseguirão inspirar em seus filhos a sedução profunda de coisas que não custam nada, ou
custam muito pouco, e encerram uma poesia delicada e imortal.
Outro dia eu estava muito quieta contemplando esta cena: um pequeno pássaro da
serra mirou e remirou o menino veranista que possuía uma dessas bicicletas fabulosas com
que, nos circos, se fazem bailados de prata; por fim, propôs-lhe um negócio que, à sua
experiência de pequeno comerciante, lhe parecia de alta vantagem: ele dava uma voltinha de
bicicleta e o veranista, duas voltinhas no seu cavalo.
Mas o veranista, como é da sua condição, dava uma grande importância a si mesmo e
à sua propriedade. De modo que o negócio não se fez.
Está claro que a minha conclusão é desfavorável ao veranista; pois que o menino rude
da montanha ache surpreendente aquela máquina cintilante e queria ver como funciona é
natural; mas que o veranista, pessoa já alfabetizada, geralmente com casa própria e professor
de inglês, não saiba apreciar a vantagem de uma voltinha a cavalo – cavalo, bicho que vive,
relincha, sacode a crina, e pisa com um garbo de jovem de dezoito anos na Cinelândia -, ah,
isso é inconcebível.
E é por isso que eu digo que arte de brincar se vai perdendo. A máquina está gastando
a infância. Qualquer dia as criaturas humanas nascerão de barbas brancas, como Lao-Tsé.
Oxalá se vierem com a sua sabedoria...
Cecília Meireles. In: Deixa que eu conto. Mário Quintana. (et. al). 1ª ed. São Paulo: Global, 2003, p. 27-31
Coleção Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
Módulo 4
A crônica que você vai ouvir, narrada pelo ator Paulo Autran, é de “Paulo Mendes
Campos, um dos escritores clássicos da crônica brasileira. As crônicas dele tem a cidade do
Rio como o grande cenário e o aspecto lírico presente em seus textos, como se observa na
crônica transcrita para essa atividade.
Achando o amor
Ele tem quinze anos, calça 42, usa cabelos razoavelmente compridos. Estava num bar
do Leblon, na companhia de castigados adultos. Estes tomavam uísque; o rapazinho tomava a
segunda coca média. Quando os homens feitos já tinham falado sobre mulheres, o time do
Flamengo, o custo de vida, reviravolta política de um país africano, desastre espetacular no
Aterro, música da moda, o Silêncio entrou no bar e empapou tudo como gordura. Um silêncio
hepático ou pancreático ou esplenético. O silêncio que intoxica os estilos. Para agravar o
oleoso drama, era aquela hora da noite, já um pouco tarde para o jantar doméstico ainda um
pouco cedo para a irresponsabilidade.O encaroçado point of no return dos boêmios.
Aí o jovem disse que estava juntando dinheiro para comprar um sabiá. Talvez eu não
comprasse um sabiá, mas um curió. Ia para o colégio de ônibus porque sempre estava em
cima da hora, mas voltava a pé. Não comia sanduíche no recreio. Sabiá ta caro! Vendedor de
passarinho tem muito trambique. Ele chateou tanto um, naquela lojinha de Ipanema, pedindo
abatimento para pintassilgo, que o homem acabou lhe ensinando onde se compra pintassilgo
mais barato da cidade. Tinha em casa azulão, canário, bigodinho... Teve bicudo, corrupião,
mainá... O triste é que passarinho morre.
Então os etílicos foram buscar passarinhos no fundão do tempo e começaram também
a passarinhar. O bar noturno virou um viveiro e cantores e cores. O Silêncio voltou de novo,
mais limpo, exorcizado.
O jovem retomou a palavra: o passarinho que mais o entusiasmou a vida toda não
cantava nem estava no dicionário por não saber se o certo era chopin ou chupim.
O chupim põe os ovos em ninho de tico-tico, e é este que cria os filhotes. Tinha
descoberto numa árvore da Lagoa Rodrigo de Freitas um ninho de tico-tico com um ovo de
chupim. Quando o chupim nasceu, o problema era mantê-lo vivo: arranjou um conta-gotas e,
todas as tardes, depois das aulas, subia à árvore e descia alimentos líquidos pela goela do
filhote. No momento certo, levou o chupim para casa. O passarinho não ficava preso pelo
menos grande parte do tempo, mas pousado num galho de arbusto decorativo. Saía ás vezes
para passear com o chupim andando atrás, a cachorrinha saltitando em torno. Bastava um
gesto e um assovio para que o chupim decolasse e viesse pousar em seu ombro. Espetacular!
Pouco depois, passou a lançar o passarinho pela janela; ele sumia durante uma ou duas horas,
pousando à tarde na amendoeira de defronte; um assovio, e o passarinho entrava pela janela,
pousando no ombro do dono. Como um falcão amestrado! Mas era um chupim, um triste e
feio chupim.
Uma tarde, quando o passarinho andava lá por fora, caiu a tempestade. O chupim na
voltou. Ele ficou à janela até depois e escurecer, mas o chupim não voltou. Esperou ainda
durante uma semana, sabendo que esperava sem motivo. Confesso que fiquei triste às pampas,
disse o jovem.
Aí o silêncio que entrou parecia uma enorme bola se sabão, uma coisa que não vale
nada, mas que nos inquieta de leve quando se desfaz.
O jovem arrematou: É engraçado, eu senti por aquele chupim um negócio esquisito.
Eu não tenho vergonha de dizer pra vocês: chorei por causa do meu chupim... Agora é que tou
entendendo: o que eu tinha pelo chupim era amor.
Paulo Mendes Campos. In: As eternas coincidências. Paulo Mendes Campos e José J. Veiga. Rio de Janeiro: J.
Bertrand Brasil, 2003, p. 20-21. Coleção Literatura em minha casa; v.2 Crônica e conto.
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6)
7) Sobre as funções da crônica, os teóricos da literatura apontam: é deflagrar uma
profunda visão das relações entre o fato e as pessoas, as pessoas e o mundo em que vivem;
buscar a essência dos seres e das coisas. Relacione a sequencia narrativa “Achando o amor”,
de Paulo Mendes Campos, às funções da crônica.
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8) A que campo semântico pertence as palavras hepático, pancreático e esplenético?
Relacione-as ao ambiente da narrativa.
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Escola: __________________________________________________________________
Aluno: __________________________________________ Ano: ______ Turma: ______
Professora: _______________________________________________________________
Data: _____________________________ Disciplina: Língua Portuguesa
Essa atividade será realizada a partir do texto da produção inicial e terá atendimento
individualizado para a reescrita da crônica.
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Escola: __________________________________________________________________
Aluno: __________________________________________ Ano: ______ Turma: ______
Professora: _______________________________________________________________
Data: _____________________________ Disciplina: Língua Portuguesa
Produção final: prática de escrita de uma crônica