Aquisição Da Linguagem em Crianças Surdas

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UNIVERSIDADE AUTÓNOMA DE LISBOA

DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA E SOCIOLOGIA


LICENCIATURA EM PSICOLOGIA
3º ANO- PSICOLOGIA DA LINGUAGEM
Aquisição da linguagem em crianças surdas.

Docente: Professora Doutora Cláudia de Castro


Discente: Mónica Paulino nº 30002932

2020/2021

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Resumo

Escolhi como tema a aquisição da linguagem em crianças surdas porque é um


tema que eu tenho muito interesse em explorar, tenho interesse em aprender como é que
as crianças surdas de pais ouvintes ou não aprendem a comunicar e quais as dificuldades
e barreiras que estas enfrentam durante todo o processo de aquisição. Ainda sobre as
barreiras que estas enfrentam, quero tentar ir à raiz do problema e posteriormente tentar
encontrar soluções para os problemas existentes. Quero poder fazer algo para ajudar na
inclusão destas crianças para fazer deste mundo, um mundo melhor e através deste
trabalho tentar fazer com que tal como eu, várias pessoas também tenham iniciativa de
pesquisar sobre este tema e tentar de alguma forma ajudar.

Falando agora sobre a importância da linguagem de maneira breve, a aquisição


da linguagem é extremamente importante no desenvolvimento da criança pois através
desta a criança também adquire processos de socialização e de construção do mundo e o
desenvolvimento intelectual da criança ocorre quando ela domina a linguagem. Posto
isto é importante que todos nós procuremos compreender a realidade em que vive uma
criança surda para que com isto futuramente consigamos encontrar soluções para os
problemas existentes até ao dia de hoje sobre este assunto, nomeadamente a inclusão
destas crianças em todas as atividades do dia-a-dia. Durante todo o processo de
aprendizagem o papel da família essencial. É importante que a família compreenda as
funções da linguagem que a criança apresenta mesmo que esta seja totalmente diferente
daquela que estão habituados a usar para comunicar.

Posto isto, os meus principais objetivos neste trabalho são: Dar a conhecer a
perspetiva histórica da educação dos surdos, falar sobre a aquisição da linguagem nas
crianças surdas e fazer uma breve comparação com as crianças ouvintes, falar sobre as
dificuldades e obstáculos que as crianças surdas apresentam durante o processo de
aquisição e por fim tentar encontrar soluções para esses problemas e futuramente se
surgir oportunidade pôr em prática aquilo que vou aprender com este trabalho. Para este
trabalho os autores que vou usar são: Vygotsky, Goldfeld, Lacerda, Fabíola Mecca &
Maria Cárnio e Lodenir Karnopp.

Palavras-chave: Crianças surdas, aquisição da linguagem, inclusão, LGP

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Introdução

Todos os dias enfrentamos uma luta enorme pela inclusão de crianças com
necessidades especiais, uma vez que estas são rotuladas pela sociedade devido às suas
limitações e diferenças. É importante referir que esta exclusão tem um grande impacto
negativo na vida destas crianças pois apesar das suas diferenças são seres humanos e
têm emoções tal como nós. É nosso dever enquanto seres humanos dar o nosso
contributo para a inclusão destas crianças na sociedade e contribuir para que tenham
uma vida melhor. Posto isto, surge a necessidade de fazer este trabalho cujo foco vai ser
nas crianças surdas, e é extremamente importante primeiramente perceber como estas
adquirem a linguagem e quais os processos. Para além do que referi anteriormente, é
necessário também perceber quais as dificuldades que a comunidade surda enfrenta
diariamente e perceber que esta varia de país para país.

1 Enquadramento teórico
1.1 Pensamento e linguagem: Piaget vs Vygotsky

Para Vygotsky, o pensamento e a linguagem apresentam funções distintas. A linguagem


como sendo um intercâmbio social ela tem uma função de comunicação que facilita a fala com
os outros e tem também uma função de pensamento generalizado que seria ela enquanto
instrumentos deste pensamento. São essas as duas funções específicas da linguagem segundo o
autor. Antes do pensamento e a linguagem se unirem, eles passam por dois processos distintos,
são elas a fase pré linguística do pensamento que diz respeito a uma inteligência mais prática e
que ocorre entre os zero e os dois anos, isto é, uma criança que pegar algum objeto que lhe
interessou e que está muito alto, como é que ela vai fazer para conseguir pegar o objeto? Vai
utilizar a inteligência prática e vai procurar algum banco ou vai meter-se em cima do sofá para
conseguir alcançar o determinado objeto, ela acaba então consegui alcançar o objeto de uma
maneira prática. E na outra fase, a fase pré intelectual da linguagem define-se como uma função
de alívio emocional, isto é, quando a criança quer algo começa a chorar ou balbuciar uma vez
que ainda não consegue expressar-se verbalmente das suas necessidades. Neste momento o

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pensamento e a linguagem vão por caminhos diferentes. Depois disso, segundo Oliveira, 1997:
‘’nesta fase do desenvolvimento, a criança embora não domine a linguagem enquanto sistema
simbólico, já utiliza manifestações verbais. O choro, o riso e o balbucio da criança pequena têm
clara função de alívio emocional, mas também servem como meio de contato social, de
comunicação difusa com outras pessoas’’, o que é que acontece na sequência, como o enfoque
principal de vygotsky é o da interação social então e partir da interação da criança com as
pessoas que a rodeiam, a partir da interação ela passa a ter um salto qualitativo no
desenvolvimento porque a sua fala passa a desenvolver-se mais e passa de uma fala
intelectualizada para um pensamento verbal e aqui temos a união do pensamento com a
linguagem que segundo Oliveira, 1997 ‘’o surgimento do pensamento verbal e da linguagem
como sistema de signos é um momento crucial no desenvolvimento da espécie humana,
momento em que o biológico transforma-se no sócio-histórico’’, isto é, como já referi
anteriormente, a criança tinha uma inteligência prática em que ia buscar um banco para
conseguir alcançar o objeto que estava num sitio alto e isto faz parte do biológico mas a partir
do momento em que a criança começa a prever e a pensar no que ela vai fazer não para resolver
de forma prática, começamos a perceber que já vai para além do biológico e passa e transforma-
se no sócio-histórico. Segundo vygotsky, o desenvolvimento acontece de fora para dentro, daí o
autor dar tanta importância à interação social para o desenvolvimento. A criança passa as
funções psicológicas de um meio interpsíquico que seria o de forma para as relações
interpsíquicas, para o seu interior como por exemplo a fala egocêntrica, em que vemos uma
criança com cerca de 2/3 anos e está com um vocabulário maior e fala sozinha quando está a
brincar exemplo: ‘’agora vou dar comida à boca da minha boneca e ela não quer esta comida’’ a
criança. Nesta situação a criança está com um pensamento interpsíquica, isto é, o pensamento
ainda está externo e com o tempo a criança passa a interiorizar o pensamento e passa a ser um
pensamento intrapsíquico (Vygotsky, 2007) e segundo Oliveira, 1997 ‘’a fala egocêntrica
aparece como um procedimento de transição, no qual o discurso já tem a função que terá como
discurso interior mas que ainda tem a forma socializada externa’’.

Já para Piaget, a aprendizagem é construída internamente e depende do nível de


desenvolvimento do sujeito. Como é que o ser humano elabora os seus conhecimentos? Para
responder a esta pergunta, Piaget procurou estudar os processos de formação do pensamento da
criança e chegou à conclusão que os processos de formação do pensamento da criança ocorrem
por meio da ação, ou seja, do sujeito com o meio (visão interacionista da aprendizagem). Para
Piaget, o conhecimento é baseado na organização, na estruturação, e na explicação a partir das

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experiências. O desenvolvimento cognitivo é estruturado internamente pelo sujeito através dos
processos chamados de assimilação e acomodação, ou seja, na assimilação o meio é que é
alterado para ser incorporado a partir do que já conhece e na acomodação é o organismo que é
alterado então o processo de desenvolvimento depende de fatores internos que são esses
processos mentais, depende da maturação e das experiências com o meio. Isso dá-se pelo
equilíbrio que seria a organização dessas atividades mentais a partir dos conflitos chamados por
ele de conflitos cognitivos que temos com o meio. Vou dar como exemplo, o exemplo que usei
para Vygotsky em que se o bebé tenta pegar um objeto, mas não consegue, essa resistência do
meio faz com que ele crie um esquema mental pois ele precisa puxar se ele não consegue pegar.
Dessa forma os seus esquemas precisam de ser aperfeiçoados. Isso quer dizer que para a Piaget
o desenvolvimento cognitivo ocorre por meio de estágios que são caracterizados por uma forma
de agir e de pensar. Assim ele aponta quatro estágios principais que vão desde o estágio
sensório motor até ao estágio operatório formal para compreender as diferentes maneiras de
pensar da criança nas diversas faixas etárias. Em relação à prática pedagógica a abordagem
piagetiana não é o método, inclusive os métodos passam a ser secundários uma vez que é um
processo interno de construção do conhecimento (Piaget, 1999).

1.1 Linguagem, Língua e fala

Os conceitos linguagem, língua e fala são utilizados por diversos autores, no


entanto, com significados diferentes uma vez que estamos a falar na área da surdez.
Estes conceitos foram usados primeiramente por Saussure, em 1916, onde o autor diz
que a linguagem é formada pela língua e pela fala em que a língua é composta por
elementos inter-relacionados. A língua é o aspeto social da linguagem uma vez que é
partilhada por todos os falantes de uma comunidade linguística. Já a fala, é o aspeto
individual da linguagem, isto é, as características pessoais que os falantes imprimem na
sua linguagem (Goldfeld, 2002).

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1.2 Comunidade surda

A LGP é uma língua oficial e é um veículo de expressão de pensamento e


valores de um grupo que a utiliza e que com ela se identifica. A LGP sofreu
repressão uma vez que foi apostado no método oralista, isto é, a forte aposta no
treino das cordas vocais e a proibição da língua gestual. Face a isto, os surdos
começaram a formar uma comunidade com outros com quem partilhavam os
mesmos valores e que se pudessem expressar através de um único idioma (LGP). É
uma comunidade que até hoje luta pelo direito de igualdade, contra a discriminação
e acima de tudo que luta pela valorização da LGP uma vez que é um meio de
comunicação e por isso deve ser respeitada tal como qualquer outro idioma. É,
portanto, constituída por um código de signos que os seus utilizadores descodificam
porque o conhecem, no entanto nem todos os surdos sabem ou utilizam a LGP, tudo
isto tem a ver com a maneira como se identificam com os valores da comunidade e
pelo orgulho que tem na língua. A palavra ‘’surdo-mudo’’ é bastante ofensivo para a
comunidade surda uma vez que a pessoa surda tem perda auditiva, mas não tem
qualquer problema nas cordas vocais, portanto é errado dizer que todo o surdo é
mudo, porque muitos surdos tornam-se oralizados com a ajuda da terapeuta da fala
(Escola virtual LGP, 2020).

Para terminar, a LGP é uma língua natural e foi criada pelo ser humano e como
em todas as línguas tem regras universais e especificas, portanto, é errado pensar e
dizer que a LGP é uma língua criada a partir do português (Escola virtual LGP,
2020).

1.3 Aquisição de linguagem em crianças surdas

É certo que a visão que a sociedade tem dos surdos modifica-se a cada dia que
passa, no entanto durante o século XVIII sempre houve muito estigma em relação à
utilização da língua de sinais, uma vez que a utilização da mesma não só tinha

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defensores como opositores, no entanto, apesar dessas divergências nunca se deixou de
utilizar a língua de sinais e inclusive eram bastante utilizadas em todo o mundo sendo
utilizada até hoje por pessoas surdas. Entretanto com o passar do tempo e com o avanço
das tecnologias surgiu o oralismo, isto é, a oportunidade para os surdos aprenderem a
língua oral. No entanto o surgimento do oralismo teve alguns contras, nomeadamente a
discribilidade por parte de alguns educadores face à língua de sinais, uma vez que estes
a viam como um entrave à aprendizagem da língua oral, querendo então que o surdo
aprendesse a língua oral em vez da língua de sinais. No entanto, apesar dos avanços
tecnológicos, a língua oral não pode ser adquirida pela criança surda espontaneamente.
É necessário que a criança seja submetida à terapia da fala e este acompanhamento é
longo e intensivo. Ainda também devido às novas tecnologias surgiu o implante coclear,
onde os surdos podem ter o privilégio de voltar a ouvir, no entanto nem todos tem
condições e quando me refiro às condições não falo apenas em termos monetários como
também ao próprio organismo da pessoa, uma vez que o corpo pode não aceitar bem o
implante. Por todas estas complicações, há muitos surdos que continuam a usar a LGP
como a única língua. Independentemente se a pessoa surda seja oralizada ou não, a LGP
é usada quase na sua maioria na rotina diária. (Goldfeld, 2002).

É importante que todas as crianças sejam expostas desde cedo à língua de sinais e de
preferência que interajam com sinalizadores fluentes, quer sejam eles pais, professores,
ou até mesmo pessoas surdas de preferência para que as crianças não se sintam
desamparadas e que consigam familiarizar-se o mais rápido possível com a língua de
sinais. Para dar continuidade a este processo, é essencial que a criança seja inserida num
primeiro momento numa escola para crianças surdas para esta ser preparada em relação
à língua de sinais, à escrita e à leitura caso pretendam para mais tarde serem inseridas
em contexto escolar junto com as crianças ouvintes (Karnopp, 2005).

2 Inclusão das crianças surdas na sociedade

Nos momentos que correm, é certo que ainda existe preconceito em relação às
crianças surdas, onde muitas das vezes estas acabam por cair no esquecimento, seja na
escola onde não na maioria das vezes não há professores especializados para

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acompanhar as crianças surdas ao longo do percurso escolar, acabando estas por não
terem a mesma experiência que as outras crianças. Este problema não existe só na
escola como também em outras situações que aos olhos de muita gente podia muito bem
ser corrigido, como por exemplo quando publicamos algo quer seja nas redes sociais ou
não, ter sempre o cuidado de legendar tudo o que metemos porque o conteúdo publicado
pode atingir todo o tipo de pessoas, quer sejam elas com alguma deficiência ou não.
Posto isto, ao longo deste trabalho e no decorrer da parte prática pedida pela professora,
pude reparar que nos canais de desenhos animados que se encontram na televisão, sendo
eles a Disney Channel, Canal Panda, Nickelodeon entre outros não possuem intérprete.
Como é que queremos apelar à inclusão destas crianças se o entretenimento delas não é
garantido? Face a isto, decidi entrar em contacto através das redes sociais com alguns
membros da comunidade surda com o intuito de criar um canal na plataforma Youtube e
de inserirmos nesse canal vídeos legendados, onde as crianças pudessem disfrutar de
momentos de entretenimento como as crianças normais.

3 Método

Participantes

Este projeto conta com a ajuda de 4 participantes sendo que, 3 participantes pertencem à
comunidade surda, 2 do sexo masculino e 1 do sexo feminino e 1 ouvinte do sexo
feminino.

Instrumento

O instrumento aplicado foi a criação de um canal no YouTube com a finalidade de


inserir na plataforma vídeos legendados em LGP cujo objetivo será apelar à inclusão
das crianças surdas na sociedade.

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Considerações finais

Com este trabalho, o objetivo principal foi aprofundar mais sobre o tema
relacionado à surdez e aprender cada vez mais sobre o tema. Podemos também verificar
que existem ainda algumas limitações que podem e devem ser resolvidas.

Apesar dos avanços na tecnologia e de os surdos cada vez mais se aproximarem


da realidade dos ouvintes, é da nossa responsabilidade fazer algo também para nos
aproximar-mos deles, principalmente das pessoas surdas que não tem oportunidade de
ter um implante coclear que lhes permite ouvir e posteriormente comunicar, das pessoas
oralizadas e das pessoas que usam LGP como língua oficial. Enquanto houver
possibilidades de darmos o nosso contributo, devemos sempre fazê-lo. A sociedade
ainda tem muito que evoluir no que toca ao respeito pelos outros para acabar de uma
vez por todas com todo o preconceito existente.

Em relação à parte prática do trabalho este projeto tem os seus prós e os seus
contras, sendo que os prós dizem respeito ao facto de serem todos voluntários ao darem
o seu contributo para a inclusão destas crianças, e os contras dizem respeito ao facto de
ser legendado em LGP, o que significa que somente vai ser compreendido por falantes
de LGP e não de outras línguas como por exemplo LIBRAS, ASL, FSL entre outras.

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Referências
Goldfeld, M. (2002). A criança surda: linguagem e cognição numa perspetiva
sociointeracionista. Editora Summus
Karnopp, L. (2005) Aquisição da linguagem de sinais: uma entrevista com Lodenir
Karnopp. Revista Virtual de Estudos da Linguagem
Oliveira, K. M. (1997). Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-
histórico. Editora Scipione
Piaget, J. (1999). O pensamento e a linguagem na criança. Editora Martins Fontes
Vygotsky, L. S. (2007). Pensamento e linguagem. Climepsi Editores

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