U3 Renasceçm

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UNIDADE 3

MÚSICA NA RENASCENÇA

Objetivos
• Formular uma visão panorâmica sobre a música na Renascença com uma consciência da cronologia aproxima-
da de seus principais fatos e subdivisões periódicas.
• Identificar fatos e acontecimentos marcantes na história do pensamento e da prática musical na Renascença.
• Reconhecer algumas estruturas musicais históricas da renascença e as respectivas personagens históricas a
ela identificadas.
• Reconhecer a variedade de tipos formais musicais de acordo com a época e o local no qual eram praticados.

Conteúdos
• A Renascença: aspectos culturais.
• A música renascentista.
• Transição entre Idade Média e Renascença musical.
• Polifonia franco-flamenga.
• Polifonia imitativa.
• Polifonia homofônica-homorrítmica.
• Estilos nacionais na Renascença: frotolla, madrigal, chanson, lied, madrigal inglês e canções para voz e alaúde.
• Instrumentos musicais renascentistas.
• Música instrumental renascentista.
• Música na Reforma Protestante: o choral.
• Música na Contrarreforma: Polifonia após Concílio de Trento.

Orientações para o estudo da unidade


Antes de iniciar o estudo desta unidade, leia as orientações a seguir:
1) Não se limite a este conteúdo; busque outras informações em sites confiáveis e/ou nas referências bibliográ-
ficas, apresentadas ao final de cada unidade.

2) Busque identificar os principais conceitos apresentados.

3) Não deixe de recorrer aos materiais complementares descritos no Conteúdo Digital Integrador.

4) Ouça, com a maior frequência possível, os exemplos musicais sugeridos, buscando saboreá-los, inicialmente,
de forma prazerosa; posteriormente, busque perceber os aspectos comentados sobre os conteúdos aos quais
eles estão ligados.

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UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

110 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

1. INTRODUÇÃO
Caro aluno, nesta unidade será abordado o período conhecido como Renascença ou
Renascimento, um momento histórico de grande efervescência artística e intelectual. Inicial-
mente, você verá um período de transição entre os estilos medieval de escrita musical e o
renascentista, ocorrido no início do século 15.
Você terá a oportunidade de conhecer como o estilo renascentista se firmou a partir da
segunda metade do século 15, por meio da linhagem de compositores franco-flamengos, de-
tentores de um estilo de escrita internacional (junção de estilos de vários locais).
Após a influência dos franco-flamengos, houve o surgimento dos estilos nacionais e da
produção musical em língua vernácula no século 16. Este será o começo, também, do prestí-
gio dos compositores italianos, especialmente, os que compunham madrigais. É também no
século 16 que haverá o crescimento da documentação da música instrumental e a produção
de música sacra no embate entre cristãos protestantes e cristãos católicos contrarreformistas.

2. CONTEÚDO BÁSICO DE REFERÊNCIA


O Conteúdo Básico de Referência apresenta, de forma sucinta, os temas abordados nes-
ta unidade. Para sua compreensão integral, é necessário o aprofundamento pelo estudo do
Conteúdo Digital Integrador.

2.1. O RENASCIMENTO: CONTEXTO HISTÓRICO E CULTURAL

O Renascimento, ou Renascença, foi um período histórico-cultural marcado pela ideia de


ressurgimento de certos valores da antiguidade greco-romana, bem como pela secularização
da cultura. Mas isso coloca algumas questões iniciais: a cultura greco-romana, em algum mo-
mento da Idade Média, deixou de existir? É sabido que não. No entanto, a Igreja Cristã, como
orientadora da vida medieval europeia, privilegiou determinados tipos específicos de pensa-
mento greco-latino, como é o caso da filosofia de Platão. E o Renascimento rompe totalmente
com a Idade Média? Podemos dizer que não completamente.
Muito dos propulsores deste período de mudanças estão presentes em determinados
fatos históricos e em características presentes na Idade Média. A seguir, você verá alguns des-
tes fatores que influenciaram ou impulsionaram o pensamento renascentista.
Desde o século sete, árabes e judeus habitaram o sul do continente europeu propor-
cionando a conservação de escritos gregos e latinos antigos desvalorizados, muitas vezes, até
banidos pela Igreja Cristã medieval (HOURANI, 1991). Este é o caso da filosofia de Aristóteles,
de cunho mais empírico do que a platônica, que voltou a ser lida e traduzida em continente
europeu a partir de filósofos árabes.
A partir do século 13, sucessivas tentativas de reconquistar os territórios europeus sob
domínio árabe ficaram conhecidas como guerra de reconquista. Tais guerras culminaram com
a expulsão quase completa de árabes e judeus do sul da Europa (século 15) e com a criação
dos estados nacionais de Espanha e Portugal.

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Houve, também no final da Baixa Idade Média, uma grande migração de estudiosos bi-
zantinos devido ao processo de conquista de Bizâncio realizado pelos turcos otomanos. Tal
processo culminou, em 1453, com a tomada de Constantinopla e extinção definitiva do Im-
pério Bizantino. Com esses estudiosos, chegaram à Europa textos até então desconhecidos da
antiguidade clássica.
A maior parte dessa migração aconteceu em direção à península itálica e muitas dessas
famílias passaram a ser incentivadoras da produção cultural, prática que ficou conhecida como
mecenato.
Nesse contexto das práticas comerciais surge a burguesia, uma classe social não neces-
sariamente oriunda da nobreza das famílias reais, mas que consegue certos poderes por meio
do comércio. Esse é, também, um período de aumento da concentração populacional nas
cidades, o que acentuou uma tendência contraria ao feudalismo medieval.
O já referido fluxo de obras da antiguidade clássica influenciou o surgimento, na penín-
sula itálica, do movimento conhecido como humanismo. Este termo, assim como o termo Re-
nascimento, só passou a ser utilizado no século 16 (SILVA, 2009), mas designou uma crescente
valorização do homem como o centro dos valores da vida, em detrimento do teocentrismo
medieval.
O humanismo, apesar de surgir na Itália, expandiu-se para outras regiões da Europa.
Petrarca, poeta e pensador, é tido como o grande pioneiro do humanismo.
A partir desses propulsores, é possível entender a definição de Renascimento dada por
Silva:
O Renascimento, assim, foi a expressão das novas concepções de mundo que começavam a apare-
cer entre os ascendentes burgueses urbanos, razão pela qual a Itália, rica, comercial e urbanizada,
foi o ponto de partida e o ápice desse movimento. Para a mudança mental e artística era necessário
dinheiro, pois os grandes artistas da Renascença trabalhavam principalmente sob encomenda. Na
Itália, o secularismo da classe média começava a contestar as extravagâncias de um clero muito
mundano, e influenciou as transformações mentais, aliada à capitalização de banqueiros, comer-
ciantes, burgueses e da própria Igreja, enriquecidos com o próspero comércio com o Oriente (SIL-
VA, 2009, p. 360).

Pode-se observar três fases distintas de evolução do Renascimento no que diz respeito
à cultura geral: o Trecento (século 14), o Quatrocento (século 15) e o Cinquecento (século 16).
Mas você verá que, no que diz respeito à música, as mudanças estilísticas acontecem, de fato,
a partir do século 15.
Como artistas e literatos precursores do Renascimento, no Trecento, pode-se destacar
Giotto, Dante, Petrarca e Bocaccio. Do Quatrocento, Botticelli, Da Vinci e Brunelleschi. E, fi-
nalmente, do Cinquecento, Ariosto, Torquato Tasso, Maquiavel, Rafael e Michelângelo.
Os principais mecenas foram a família Medici (de Florença, século 15) e os papas (século
16).
Por fim, deve-se destacar que, em meados do Renascimento, a expansão marítima eu-
ropeia, capitaneada por Portugal e Espanha, traz uma nova onda de modificações no contexto
sócio-cultural-econômico. Por um lado, tal expansão intensificou o crescimento comercial eu-
ropeu e, consequentemente, a expansão da cultura renascentista. Por outro lado, essa inten-

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sificação se deu para além do mediterrâneo, deslocando, mais ao fim do século 16, o poderio
comercial da península itálica.

Quadro 1 Cronologia do Renascimento.


CRONOLOGIA RENASCIMENTO
1436: Consagração de Santa Maria Del Fio- 1500: primeira viagem de Cabral ao Brasil.
re em Florença, com a peça Nuper Rosarum 1517: 95 teses de Lutero.
Flores de Dufay. 1521: Morte de Josquin Desprez.
1454: Invenção da Imprensa de Gutemberg. 1530: teoria das órbitas de Copérnico.
1747: morte de Dufay. 1545: Início do Concílio de Trento
1477: batalha de Nacy e fim do ducado da 1559: Willaert, Música Nova.
Borgonha. 1563: Fim do Concílio de Trento.
1492: primeira viagem de Colombo às Amé- 1581: Dialogo della musica antriga et della
ricas moderna, de Vicenzo Galilei.
1495: A Última Ceia de Da Vinci.

Fonte: adaptado de Grout; Palisca (2007, p. 170).

As leituras indicadas no Tópico 3.1. tratam do período


histórico do Renascimento. Neste momento, você deve reali-
zar essas leituras para aprofundar o tema abordado.

2.2. A TRANSIÇÃO DA MÚSICA MEDIEVAL PARA A RENASCENTISTA: VIRADA DO SÉCULO 14

Durante os anos de 1337 e 1453, ocorreu uma série de conflitos entre França e Ingla-
terra denominados de “Guerra dos Cem Anos”. As consequências políticas de tal conflito são
profundamente influentes no trânsito entre músicos ocorrido a partir do século 14 na Europa.
A música produzida na primeira metade do século 15 é o que se pode chamar, de fato, de tran-
sição entre Idade Média e Renascimento, pois possui ora características estilísticas medievais,
ora renascentistas.
Na França, um dos principais centros culturais da Europa, o ducado da Borgonha, que
era um feudo, tornou-se uma importante força.
É importante observar que os compositores desse período, embora se vinculem com
frequência à produção sacra, eram empregados dos reis e nobres em suas capelas reais (pe-
quenas igrejas ligadas aos nobres e aos seus palácios e que dispunham do serviço religioso
particular aos membros da nobreza) e não das catedrais mais diretamente ligadas ao papado.
O ducado de Borgonha tinha um grande aparato artístico, o que influenciou a arte deste
período. Os músicos das capelas circulavam pelos demais ducados e cortes por causa das fes-
tividades, o que possibilitou grande troca de estilos musicais. Essa troca de estilos aconteceu,
principalmente, entre Inglaterra, França e Itália.

Influências da música Inglesa

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A música inglesa deste período apresentava características muito definidas e diferentes


da música francesa, tais como:
• Homofonia: o movimento de vozes na forma de acordes.
• Discante inglês: paralelismo de terceiras e sextas.
• Uso do fauxbourdon: técnica de composição em que uma melodia é cantada na
voz superior, acompanhada de paralelismos de sexta no tenor; a essas vozes é
acrescentada terceira voz (contratenor), formando com o triple um paralelismo de
quarta, podendo também utilizar quintas e oitavas.
Sobre o fauxbourdon:
No sentido estrito do termo, um fauxbourdon era uma composição escrita a duas vozes que evo-
luía em sextas paralelas com oitavas intercaladas e sempre com uma oitava no final das frases. A
estas vozes escritas, acrescentava-se na execução uma terceira voz [que poderia ser improvisada],
movendo-se invariavelmente uma quarta abaixo do soprano (...) a melodia principal era a do sopra-
no (GROUT; PALISCA, 2007, p. 165).

Portanto, se construíssemos um fauxbourdon sobre o cantochão Victmae Paschali (posi-


cionado no tenor como cantus firmus), teríamos o seguinte resultado:

Figura 1 Fauxbourdon a partir de Victimae Paschali.

As características da música inglesa diferenciam-se do estilo francês desse período, por


exemplo, na ars nova, na qual as consonâncias privilegiadas eram as 5ªs e 4ªs e as vozes de-
veriam estritamente se manter consonantes em relação à voz Tenor, ou à independência das
vozes e a complexidade rítmica. O estilo inglês era reconhecido como mais “doce” e “pleno”
e passou a predominar como textura harmônica da maior parte do repertório renascentista.
Este foi um importante passo para o surgimento futuro dos acordes resultantes da sobreposi-
ção de terças, como serão conhecidos no sistema harmônico tonal.
Um dos principais compositores ingleses foi John Dusntable. Ele Trabalhou na França
e foi um personagem importante nas trocas de influências entrem compositores ingleses e
franceses.
Compôs músicas sacras em forma de hinos, sequências, antífonas, motetes e missas.
Para suas músicas profanas, Dunstable utilizou as formas rondeaux, ballata e carol. Deve-se
destacar que o uso do motete realizado neste momento se diferia daquele encontrado até a
ars nova.
No início do século 15, um motete poderia ser composto completamente com texto
secular e com as características de contraponto de um novo estilo de escrita (textura). Mais
adiante, no Renascimento, o termo “motete” passou a designar, como até hoje, qualquer

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peça polifônica composta para texto latino, desde que não fosse parte do ordinário da missa
(GROUT; PALISCA, 2009, p. 169).
Pode-se destacar como características de sua música:
• textura homorrítimica (mesmo ritmo) entre as vozes;
• utilização de paralelismo de terceiras e sextas;
• uso de isorritmia.

Fonte: adaptado de Nancho Alvarez (s.a.).


Figura 2 Motete: Quam Pulchra Es de John Dunstable.

Gravação de Quam Pulchra Es––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

No link a seguir, você poderá ouvir o motete Quam Pulchra Es, de John Dunstable. No vídeo, há uma partitura
que acompanha a gravação. Repare na sonoridade suave de sua composição, o que reflete o estilo de escrita já
mencionado:
• JOHN DUNSTABLE. Quam Pulchra Es. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=qQjdEbZH2wI>.
Acesso em: 29 maio 2015.
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Dunstable também utilizava os modos maior e menor em suas composições, estilo que
irá influenciar os músicos da Borgonha, como Dufay e Binchois.

Música Francesa
A música francesa desse momento sofreu influências italianas e inglesas. Como você viu,
a ars nova chega à Itália no final do século, e os compositores italianos passam a utilizar as
formas fixas francesas em suas composições. O contrário também ocorre. Compositores fran-
ceses como Dufay, influenciados pela caccia italiana, utilizam pequenos pontos de imitação
em seus motetes. Outra característica italiana absorvida na música francesa é a utilização de
partes instrumentais. Nesse momento, os tenores passam a ser compostos.
Como exemplo do estilo francês desenvolvido nesse período, destaca-se a música reali-
zada no ducado de Borgonha (França).

Música no ducado de Borgonha


Borgonha no século 14, como já visto, assistiu a uma ascensão do poderio de seus du-
ques, mesmo que eles ainda fossem subordinados ao reino da França. Borgonha tornou-se um

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poderoso ducado, e esse poder se refletiu no financiamento de diversos artistas (mecenato),


que faziam parte da sua capela de músicos.
Eles proliferaram exemplares da canção popular francesa chamada de chanson. Além
da abundância de repertório secular, pode-se citar a utilização do fauxbourdon (influência da
música inglesa) e da imitação entre as vozes (música italiana) como características gerais da
música borgonhesa.
Guillaume Dufay (1400-1474), Antoine de Busnois e Gilles Binchois (1400-1460) foram
importantes compositores que fizeram parte deste ducado.

Guillaume Dufay
Nasceu na França, mas trabalhou em diversos locais da Europa, inclusive na Itália. Com-
pôs, em abundância, tanto música sacra (incluindo missas, motetes, e músicas para o próprio
tempo da missa) quanto profana (incluindo ballades, virelais, rondeaux e alguns exemplares
das canções em italiano). A maioria de seu repertório secular foi escrito enquanto trabalhava
em uma corte na Itália.
Dufay utilizou a técnica do fauxbourdon em suas composições. Veja o exemplo de um
trecho de Ave Maris Stella, peça na qual a técnica é empregada com algumas variações que
evitam monotonia:

Fonte: adaptado de Jansen (2010).


Figura 3 Fauxbourdon em Ave Maris Stella de Dufay.

Gravação de Ave Maris Stella–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir o motete Ave Maris Stella, de Guillaume Dufay. Inicialmente, a gravação apresenta um
cantochão que é seguido da composição de Dufay. O momento da entrada do coro, após o cantochão, correspon-
de ao trecho apresentado na Figura 3. Observe a sonoridade da textura do fauxbourdon:
• DUFAY, G. Ave Maris Stella. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=O-25R_SaDao>. Acesso
em: 29 maio 2015.
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Outras características de sua música são:


a) Utilização de textos em francês.
b) Uso de “formas fixas” tendo predileção pelo rondeau (ABaAabAB).
c) Tenor e contratenor tocado por instrumentos.
d) Escrita a três e a quatro vozes.

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e) Uso ocasional de pontos de imitação que se dissolvem na malha polifônica.


f) Combinação do estilo do fauxbourdon com o discante inglês.
g) Uso de cadência próxima da relação D – T.
Outra obra importante de Dufay é o motete Nuper Rosarum Flores, composto para a
consagração da Cathedral de Santa Maria del Fiore, em Florença. Este é um motete isorrít-
mico, de forma conservada pelo compositor para situações políticas ou religiosas de grande
seriedade.

Fonte: adaptado de Legge (2006).


Figura 4 Fragmento do motete Nuper Rosarum Flores.

Gravação de Nuper Rosarum Flores––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir o motete Nuper Rosarum Flores, de Guillaume Dufay. Repare como ainda aparecem,
neste motete, algumas cadências de Landini. No entanto, a cadência final já possui características renascentistas.
Isso reflete o modo como este compositor está situado na transição entre Baixa Idade Media e Renascimento:
• DUFAY, G. Nuper Rosarum Flores. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=hGW2HL35kqY>.
Acesso em: 29 maio 2015.
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Para suas peças sacras, são notáveis os usos de imitação entre as vozes, chegando, em
certos casos, a formar cânones estritos.

Fonte: adaptado de Cassola (2008).


Figura 5 Imitações literais em Ave Regina Coelorum de Dufay.

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Obras de Dufay–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá acessar gravações de obras de Dufay.


• DUFAY, G. Missa L’Homme Armé 1. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=fLwMEBlBBB4>.
Acesso em: 1 jun. 2015 .
• DUFAY, G. Vergine Bella. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=6uSyOeLx2z0>. Acesso em:
21 mar. 2015.
Informação: Vergine Bella é uma chanson baseada em um poema de Petrarca.
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Gilles Binchois

Gilles Binchois serviu na corte borgonhesa por trinta anos, a partir de 1430. Este é um
dos mais significativos compositores da Borgonha, tendo se destacado por suas chansons.
Compôs também música sacra, mas, nesta esfera, destaca-se pelo uso de um procedimento
chamado de contrafacta, que consistia na utilização de “peças vocais nas quais o texto secular
era trocado por um texto sagrado”, convertendo-as em obra sacra (STOLBA, 1998, p. 143). Foi
responsável por introduzir a chanson dentro da igreja.

Gravação de Adieu, adieu, mon joileux souvenir––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação da chanson Adieu, adieu, mon joileux souvenir, de Gilles Binchois:
• BINCHOIS, G. Adieu, adieu, mon joileux souvenir. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=qv83yN8wQwY>. Acesso em: 1 jun. 2015.
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Antoine de Busnois

Antoine de Busnois possui a mesma variedade de peças compostas de caráter sacro e


secular, exemplificando as características já mencionadas sobre o estilo borgonhês. Busnois é
o responsável pela fixação da quarta voz na composição de chansons populares. Ele utilizou
uma terminologia para as partes vocais que foi muito utilizada durante a Renascença e tor-
nou-se a base da terminologia moderna:

Quadro 2 Nomes dos registros vocais do início do século 14.

NOME DESCRIÇÃO NOME RECENTE


Superius Voz superior mais aguda. Soprano
Contratenor Altus Voz mais alta que o tenor. Contralto, ou Alto
Tenor Sustenta o cantus firmus, Tenor
quando ele existe.
Contratenos Bassus Voz mais baixa que o tenor. Baixo

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2.3. A AFIRMAÇÃO DO ESTILO RENASCENTISTA: A DIFUSÃO DA POLIFONIA FRANCO-FLA-


MENGA

Nas cronologias de estilo de época mais comuns nos livros de história da música, a Re-
nascença musical começa, de fato, ao redor de 1450. Apesar do período anterior apresentar
importantes modificações estilístico-musicais e culturais, muitas das características marcantes
do estilo renascentista só se afirmaram a partir da segunda metade do século 15.
No renascimento, é possível ver a predominância da música coral polifônica, muitas ve-
zes, com utilização de instrumento dobrando ou substituindo uma ou algumas vozes da parti-
tura. Há, também, o aumento significativo da quantidade de vozes das composições.
A abundância da música secular é mantida, mas as formas fixas medievais caem em de-
suso. Os compositores continuam a produzir música sacra, embora ao fazê-la buscassem um
estilo mais conservador, com menos vozes e menos inovações harmônicas.
No renascimento, há dois estilos vigentes, o que chamamos de estilo internacional e os
estilos nacionais.
Os estilos nacionais são os gêneros musicais seculares baseados nas línguas nacionais
(francês, italiano, espanhol, alemão, holandês, inglês etc.).
O estilo internacional, desenvolvido pelos franco-flamengos, tinha como base a polifonia
desenvolvida pelos franceses, mas agregava a imitação do cânon italiano (caccia) e a sonori-
dade do discante inglês (uso de intervalos de 6ª e 3ª como consonância e do fauxbourdon,
também inglês). O desenvolvimento desse estilo formado pela mistura de vários outros estilos
só foi possível pelo trânsito de compositores pelas cortes europeias em grande fluxo interna-
cional. Essas viagens e também a produção musical foram feitas com o financiamento cortesão
(mecenas), burguês ou papal.
Uma das características mais marcantes do renascimento é a utilização do contraponto
imitativo sistemático, como você notará, especialmente, nos compositores franco-flamengos.
Os franco-flamengos foram compositores de Borgonha. Eles eram contratados para o
trabalho musical de diversas cortes em outros estados europeus, e difundiram o já citado esti-
lo internacional e o contraponto imitativo.
Esse contraponto apresenta como caraterísticas os intervalos de terças e sextas como
consonâncias, reservando as quintas e oitavas para as cadencias finais. Neste período há uma
grande variedade cadencial e o desaparecimento de cadências medievais com a de Landini. As
escalas modais ainda são utilizadas, mas a sistematização da música ficta leva à definição das
escalas maior e menor, mais ao fim da Renascença.
Além do contraponto imitativo, uma das maiores conquistas deste período é o abando-
no do cantus firmus (cantochão) como base da composição.
No que diz respeito aos hábitos musicais, um dos fatores mais importantes ocorridos
no campo musical foi o desenvolvimento da impressão musical e da publicação de partituras
após a invenção da imprensa (1455) por Gutemberg e após o desenvolvimento das técnicas
de impressão musical (1498) por Ottaviano dei Petrucci. Esse fato possibilitou que a música

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UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

passasse a fazer parte do cotidiano das pessoas em uma prática musical doméstica de leitura
e interpretação de pequenas obras corais.
Neste período, há também a proliferação de escritos científicos musicais ligados à acústi-
ca, à filosofia, à prática musical e à construção de instrumentos. É importante destacar o papel
especial desempenhado pelos tratadistas musicais (tratados entre ciência, filosofia, teoria e
prática) desse período:
• Complexus effectuum musices (1472-1475), de Johannes Tinctoris.
• Le Instituitioni harmoniche (1558), de Gioseffo Zarlino.
• Dialogo della musica antica e della musica moderna (1581), de Vicenzo Galilei (Pai de
Galileu Galilei).
No renascimento, você também verá a revalorização do ethos musical grego sob nova
perspectiva, mais independente da vida religiosa e mais próxima dos afetos e das disposições
morais individualistas.

Os compositores Franco-Flamengos
Como resultado do processo de expansão da influência do ducado da Borgonha, sur-
giu uma linhagem de compositores chamados de franco-flamengos. Tais compositores eram
oriundos de regiões que atualmente se encontram nos territórios do norte e nordeste da Fran-
ça, da Bélgica e da Holanda, e, por isso, são designados por franco-flamengos.

Informação:
“Flamengo” é uma designação para os povos originários de Flandres, um território integrante da
atual Holanda.

Esses compositores tiveram grande prestígio por toda a Europa. Foram cultivadores e
divulgadores de um estilo internacional ligado à música sacra e, também, divulgadores dos
estilos particulares de cada língua e nação, uma vez que atendiam às demandas de diferentes
cortes e carregavam as particularidades de uma corte para outra.
Este estilo internacional, chamado de franco-flamengo, era mais utilizado em obras sa-
cras, tais como motetes e missas. Ele era caracterizado por:
1) predomínio de música coral a capella, mas podendo-se usar instrumentos, em cer-
tos casos, para dobras ou linhas graves;
2) escrita polifônica a quatro, cinco ou mais vozes (era o auge da polifonia em número
de vozes independentes);
3) linhas melódicas mais similares entre as vozes, diferente do grande contraste entre
as características de cada voz na Idade Média: preocupação com a homogeneidade
da textura coral;
4) uso recorrente de contraponto imitativo;
5) privilégio de terças nos contrapontos, o que resultava em uma sonoridade tríadica
no interior das frases, guardando-se as quintas e oitavas para os finais das peças (era
comum o uso do fauxbourdon);

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6) sonoridade modal;
7) influência gradativa e crescente da música dos estilos nacionais;
8) elaboração de regras e técnicas de contraponto para evitar elementos medievais,
tais como movimentos paralelos de quintas e oitavas entre as vozes;
9) menor uso de cantus firmus derivado do gregoriano. Mas quando usado, era tratado
de forma mais livre.
Os compositores franco-flamengos são também os grandes responsáveis pela divulgação
das músicas específicas de cada região, uma vez que transitavam entre cortes de toda Europa
para prestarem seus serviços; assim, eles carregavam obras musicais e influências estilísticas
de um lugar para outro.
Compositores como Tinctoris e Agricola faziam parte desta linhagem já no momento de
transição do estilo medieval para o renascentista. Uma vez firmado o estilo renascentista, os
compositores franco-flamengos dividem-se, grosso modo, em duas gerações:
• primeira geração (mais produtiva na segunda metade do século 15 e início do século
16): Johannes Ockeghem (1410-1497), Jacob Obrecht (1450-1505), Josquin des Prez
(1440-1521), Heinrich Isaac (1450-1517), Jean Mouton (1459-1522) e Pierre de la
Rue (1460-1518).
• segunda geração (mais produtiva na segunda metade do século 16): Adrian Willaert
(1490-1562), Nicolas Gombert (1495-1560) e Jacob Clement (1515-1556).
Todos os compositores franco-flamengos compuseram missas completas, movimentos
de missas, motetes e chansos. Com o adentrar do século 16, muitos deles trabalharam em
cortes italianas e, por isso, contam com gêneros italianos em seu catálogo de obras.
De todas as migrações possíveis desses compositores pela Europa, suas estadas em cida-
des e cortes italianas merecem destaque, pois a centralidade da produção musical desloca-se
da região franco-flamenga em direção à Itália, na medida em que o século 15 avança. Isso se
deve ao fato de que as cortes italianas possuíam um grande acúmulo de riqueza, decorrente
do comércio mediterrâneo, e gozavam de status ao contratar serviços desses tão prestigiados
compositores franco-flamengos.
Em meados de século 16, a passagem dos compositores franco-flamengos havia sido
suficiente para que compositores italianos herdassem sua maestria e desenvolvessem uma
escola de compositores nascidos nas regiões da península itálica.

Primeira geração: Johannes Ockheghem, Jacob Obrecht e Josquin Desprez

Johannes Ockheghem

Nascido em Flandres, Johannes Ockheghem trabalhou na capela do Duque de Bourbon,


e foi mestre de capela dos reis Carlos VII e Luis XI da França. Foi um compositor muito
reconhecido pelos próprios compositores, tendo recebido grandes homenagens na ocasião
de sua morte.

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 121


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Figura 6 Johannes Ockheghem.

Em suas composições amplia a textura utilizada por Dufay e passa a utilizar cinco vozes.
Essas vozes passam a ter o mesmo grau de importância, assim, há o afastamento da prepon-
derância do superius na condução melódica, como era na música francesa. Ockeghem cria
melodias de grande fôlego, evitando as cadências; também utiliza a imitação entre as vozes,
mas esta não é feita de modo sistemático, ou seja, aparece em suas obras ocasionalmente.

Fonte: adaptado de Stone (2011).


Figura 7 Chanson “Ma Bouche Rit” de Ockeghem.

Ma Bouche Rit––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação da chanson Ma Bouche Rit, de Ockenghem, demonstrada na Figura 7:
• CLEMENT CONSORT. Ockeghem – Virelai ‘Ma bouche rit’ . Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=JXW2qbCmnm0>. Acesso em: 2 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Outra característica de suas composições é o uso tardio da isorritmia. Ockeghem com-


pôs uma missa prolationum, utilizando o cânone por meio da mensuração. Desse modo, em-
bora todas as vozes comecem juntas, a defasagem rítmica entre elas, por meio da utilização de
diferentes pés métricos (prolação), faz com que haja os diferentes pontos de imitação.

122 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Figura 8 Missa Prolationum.

Gravação da Missa Prolationum–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação da Missa Prolationum de Ockenghem. Ouça os pontos de imitação
realizados pela prolação.
• JOHANNES OCKEGHEM. Missa Prolationum – Kyrie. Disponível em: <https://youtu.be/ZWLsLAujZzI>.
Acesso em: 2 jun. 2015.
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Jacob Obrecht
Jacob Obrecht trabalhou em cortes na França, Bélgica, Holanda e, em especial, em Fer-
rara (Itália).

Figura 9 Jacob Obrecht.

Em suas missas ainda utiliza o cantus firmus. Suas chansons são escritas, na grande
maioria, para quatro vozes.
A principal característica de suas composições sacras é o uso da imitação sistemática
entre as vozes.

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 123


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Figura 10 Imitação em Jacob Obrecht.

Gravação Missa Caput–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, confira uma gravação da Missa Caput de Jacob Obrecht.


• Obrecht, J. Missa Caput. Disponível em: <https://youtu.be/lqFju-GDY7Q >. Acesso em: 15 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Josquin des Prez


Josquin des Prez nasceu em 1440, provavelmente, na França e faleceu em 1521. Foi alu-
no de Ockeghem e trabalhou em diversas cortes da França e da Itália, incluindo a sede do Pa-
pado em Roma e a Catedral de Notre-Dame. Foi, sem dúvida, o compositor mais importante,
influente e produtivo desta geração, bem como um dos mais significativos de toda a história
da música. Compôs 18 missas, 95 motetes e 68 peças seculares, incluindo chansons e frotollas
(gênero italiano que será mais bem detalhado no decorrer deste estudo).
Suas missas são compostas, em geral, de quatro vozes. Seus motetes foram compostos
para quatro, cinco e, até, seis vozes. Suas chansons foram compostas a três, quatro ou cinco
vozes.

Figura 11 Josquin des Prez.

Especialmente em seus motetes é possível ver a consolidação da polifonia imitativa ini-


ciada por Ockeghem e Obrecht. Em Josquin os pontos de imitação acontecem nas entradas
sucessivas das vozes.

124 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

No exemplo a seguir, o primeiro trecho da missa Pange Lingua, observe o jogo de imi-
tação entre as vozes. O superius (soprano) é uma imitação literal do tenor, enquanto o altus
(contralto) é uma imitação literal do bassus (baixo). Mas repare que as quatro primeiras notas
de cada uma das vozes constituem o mesmo motivo melódico executado, inicialmente, em Mi
e, posteriormente, em Lá. Este é um exemplo eficaz da característica maior do contraponto
franco-flamengo:

Fonte: adaptado de Cassola (2011).


Figura 12 Kyrie da Missa Pange Lingua, de Josquin Desprez.

Gravação de Pange Lingua–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, ouça uma gravação da missa Pange Lingua, de Josquin de Prez, acompanhada de partitura. Repare tanto
nas texturas harmônicas quanto nas imitações:
• DESPREZ, J. Missa Pange Lingua. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=3SH3drDXE8M>.
Acesso em: 2 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Josquin acrescentou uma voz mais grave do que era comumente utilizado, o bassus, e
buscou estabelecer uma relação entre música e texto. Ele se preocupou em adequar a sua
música aos sentidos das palavras. A esse tipo de música foi dado o nome de música reservata
(GROUT; PALISCA, 2007).
Para salientar as palavras mais importantes do texto musical, eram utilizados cromatis-
mos, ornamentos e contrastes rítmicos e, desse modo, a música servia ao texto.
Em Josquin há um exemplo claro de música reservata no motete Absalon fili mi. No final
da peça, quando o texto diz “mas desça ao inferno chorando”, as vozes fazem um movimento
descendente na melodia e também na harmonia. Josquin desce abaixo de um Mib, movimen-
to incomum neste período (GROUT; PALISCA, 2007).

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 125


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Fonte: adaptado de Grout; Palisca (2007, p. 210).


Figura 13 Absalon fili mi.

Gravação de Absalon fili mi–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, ouça uma gravação do motete Absalon fili mi, de Josquin des Prez.
• DESPREZ, J. Absalon Fili Mi. Disponível em: <https://youtu.be/r8fXhTN-Zpw>. Acesso em: 2 jun. 2015.
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Segunda geração: Adrian Willaert e Jacob Clement
Da segunda geração de franco-flamengos serão destacadas as obras de Clement e Willa-
ert. O que diferencia esta geração da primeira são as características a seguir (GROUT; PALISCA,
2007):

1) maior influência dos estilos nacionais;


2) abandono gradual das longas imitações canônicas;
3) maior número de composições instrumentais;
4) aumento significativo de obras para cinco ou seis vozes;
5) maior uso da música reservata.

126 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Jacob Clement
Jacob Clement nasceu e trabalhou em territórios da atual Holanda. Sua produção segue,
em linhas gerais, as características estilísticas dos franco-flamengos anteriores. No entanto, foi
sob sua caneta que ficaram conhecidos os primeiros gêneros de música polifônica em língua
holandesa: o souterliedekens e o lofazgen (STOLBA, 1998, p. 166). Foram baseados em textos
preparados e publicados por Willem van Zuylen na Niejvelt (1540) contendo trechos de sal-
mos em holandês. Tais textos, após serem adaptados para melodias de canções populares,
receberam um tratamento polifônico a três vozes, dado por Clement, utilizando um superius
(soprano), tenor e bassus.
Gravação de Egos Flos Campi–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação da chanson Egos Flos Campi, de Jacob Clement. Observe, na partitura,
os comentários a respeito da segunda geração de franco-flamengos.
• CLEMENT, J. Egos Flos Campi. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ev9owpVMPVA>.
Acesso em: 2 jun. 2015.
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Adrian Willaert
Adrian Willaert, também de origem holandesa, trabalhou em Veneza e é considerado o
grande formador da escola veneziana, continuada por alguns de seus discípulos como Cipria-
no de Rore, Nicolas Vicentino, Andrea Gabrieli e Giosefo Zarlino (estes são todos de origem
italiana).

Figura 14 Adrian Willaert.

Na Catedral de São Marcos, em Veneza, aproveitou a existência de dois órgãos dispostos


em pontos opostos da igreja de modo a criar obras para dois coros simultâneos. Isso propor-
cionava uma escuta espacial da música diante dos jogos de resposta musical entre os dois
coros dispostos nos diferentes locais. Tais técnicas foram seguidas e desenvolvidas, posterior-
mente, por Andrea Gabrieli e Giovanni Gabrieli.
Compôs motetes a cinco, a seis e a sete vozes e muitos deles não possuem cantus firmus,
sendo que as vozes eram compostas com igualdade de importância. Outra característica de

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 127


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

sua música é a relação entre música e texto, utilizando cromatismos para salientar as palavras
importantes.
Dentre os gêneros nacionais italianos, compôs madrigais e villanesches. Algumas de suas
obras seculares em estilo italiano foram publicadas na coletânea Musica Nova (1559), a qual
contém 25 obras em estilo italiano baseadas em sonetos de Petrarca (GROUT; PALISCA, 2007).

Figura 15 Motete O Salutaris Hostia a seis vozes, de Willaert.

Gravação de O Salutaris Hostia––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, ouça uma gravação do Motete O Salutaris Hostia, de Willaert.


• CHOIR OF ST. IGNATIUS OF ANTIOCH EPISCOPAL CHURCH. Adrian Willaert: O Salutaris Hostia. Dispo-
nível em: <https://youtu.be/UBDW-wktZCo>. Acesso em: 2 jun. 2015.
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Com Willaert, a influência recíproca entre italianos e franco-flamengos chega a seu auge
e marca a passagem para o próximo momento da Renascença, no qual os estilos nacionais
populares preponderarão.
Vídeo complementar –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Neste momento, é fundamental que você assista ao vídeo complementar.


• Para assistir ao vídeo pela Sala de Aula Virtual, clique no ícone Videoaula, localizado na barra superior. Em
seguida, selecione o nível de seu curso (Graduação), a categoria (Disciplinar) e o tipo de vídeo (Comple-
mentar). Por fim, clique no nome da disciplina para abrir a lista de vídeos.
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tiguidade ao Barroco – Vídeos Complementares – Complementar 3.
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2.4. OS ESTILOS NACIONAIS NO RENASCIMENTO

Enquanto os compositores franco-flamengos eram portadores de um estilo internacio-


nal de escrita musical, cada região europeia desenvolveu, baseada em sua língua regional,

128 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

estilos composicionais. Esses estilos gozavam de popularidade local e, no decorrer do século


16, assumiram um primeiro plano de importância na produção musical.
Sem dúvida, o estilo nacional mais proeminente e influente foi o italiano. Grout e Palisca
salientam que “a passagem do testemunho da música estrangeira à música nacional [na Itália]
é claramente ilustrada pela posição, em Veneza, do flamengo Adrian Willaert e de seus discí-
pulos” (2007, p. 224).
Willaert mudou-se para Veneza em 1515, e em 1527 tornou-se diretor musical da cate-
dral de São Marcos de Veneza. Tais datas trazem uma noção clara sobre o período no qual a
Itália assume a centralidade da vida musical Europeia, posição que ostentará até meados do
século 18.
Muitos foram os gêneros desenvolvidos em cada região. Neste estudo, serão privilegia-
dos: a frotolla e o madrigal (na Itália) e a chanson (na França). No entanto, também houve ou-
tros gêneros nas demais regiões como o Lied, na Alemanha; o villancico, na península ibérica;
e o madrigal inglês e as canções e árias acompanhadas de alaúde, na Inglaterra.
Apesar da variedade de gêneros, é possível observar certas características gerais:
1) todos eles privilegiavam a palavra, a clareza do texto e da narrativa das obras;
2) possuíam temática predominantemente profana, variando de assuntos sérios a as-
suntos satíricos e cômicos;
3) eram, predominantemente, de textura homorrítmica;
4) poderiam ser executados por vozes, com dobras instrumentais ou ter as vozes mais
graves substituídas por instrumentos;
5) privilegiavam a clareza e consonância harmônica sem deixar de aproveitar sonorida-
des mais estranhas para a ênfase dramática, quando o texto assim exigia.

França

Chanson
Apesar das origens da chanson remontarem à Idade Média e terem perpassado a gera-
ção dos franco-flamengos, é possível dizer que, no início do século 16, os compositores fran-
ceses passaram a escrever um tipo de chanson mais marcadamente nacional, que possuía
características semelhantes à frótola italiana, pois eram canções ligeiras, bem ritmadas, de
textura predominantemente homofônica com a melodia principal na voz superior (GROUT;
PALISCA, 2007).
Os textos abrangiam uma gama bem ampla de temáticas, desde questões amorosas ou
jocosas, até comentários sérios de caráter moral.
Os principais compositores da chanson foram Claudin de Sermisy (1490-1562) e Clé-
ment Janequin (1485-1560).

Claudin de Sermisy
Claudin de Sermisy evitava os efeitos contrapontísticos e rítmicos complexos em suas

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 129


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

chansons. Inclusive, não utilizava a imitação e, preferencialmente, suas composições utiliza-


vam o tempus imperfectus diminutum, ou seja, tempos binários; as texturas de suas canções
eram acordais, influência da frótola italiana e escrita a quatro vozes. Observe essas caracterís-
ticas na chanson a seguir:

Figura 16 Tant Que Vivrai.

Gravação de Tant que vivrai–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

No link a seguir, ouça uma gravação com partitura da chanson Tant Que Vivrai, de Claudin de Sermisy.
• SERMISY, C. Tant Que Vivrai. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=CW31yXZIrbM>. Acesso
em: 2 jun. 2015.
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Clément Janequin
Clément Janequin foi compositor de câmara do rei e ordenou-se clérigo. Em sua época
alcançou uma grande notoriedade e suas canções foram transcritas para instrumentos inú-
meras vezes. As características de suas chansons diferem das de Sermisy, especialmente, pela
textura: Janequin mantinha o uso da imitação e tinha uma predileção pela música descritiva.
Ele é um mestre das chansons descritivas, a quatro vozes, chegando, inclusive, a utilizar ono-
matopeias em busca do realismo.
La Guerre––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Uma das composições de Janequin que utiliza os recursos estudados é La Guerre. Ouça esta gravação e perceba
em 2min.40. e 3min.40. as onomatopeias.
• CLÉMENT JANEQUIN. La Guerre. Disponível em: <https://youtu.be/JY2rLfhJLmY>. Acesso em: 2 jun.
2015.
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130 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Fonte: adaptado de You Tube, 2012.

Figura 17 La Guerre.

Já na segunda metade do século 16, a chanson sofreu forte influência do madrigal italia-
no. O compositor Orlando di Lassus foi o grande pivô desta influência. A mudança estilística
fica por conta de uma maior quantidade de imitação, de alterações de andamento e um maior
adensamento das vozes. Os compositores que seguiram tal mudança são Claude Le jeune
(1528-1600), Guillaume Costeley (1531-1606) e Jacques Mauduit (1557-1627).

Fonte: adaptado de Jones (2010).


Figura 18 Chanson: Margot Labourez Les Vignes, de Orlando di Lasso.

Gravação de Susanne un jour–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir a chanson Susanne Un Jour de Orlando Di Lasso, um exemplar típico da influência do
madrigal na chanson francesa.
• ORLANDO DI LASSO. Susanne un jour. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=wf1ulwBMkAk>.
Acesso em: 3 jun. 2015.
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© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 131


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Itália
Na primeira metade do século 15, a Itália passa por um período de pouca inspiração mu-
sical. Você viu que, nesse período, o estilo composicional dos franco-flamengos é que ganha
maior destaque. No entanto, no fim do século 15, na Itália, florescem as músicas nacionais,
que passam a influenciar outras regiões europeias.
Entre os gêneros nacionais italianos estão a frottola, o madrigal, laudes e sacra
rappresentazione e os canti carnascialeschi. Nesta obra, você estudará a frottola e o madrigal.

Frotolla
Floresceu entre o final do século 15 e início do século 16, composta em estilo silábico e
a quatro vozes, com estrutura rítmica bem marcada, harmonia diatônica simples, estilo homo-
fônico (homorrítmico) e com a melodia na voz principal (GROUT; PALISCA, 2007). Suas letras
eram de temática amorosa ou satírica.
As frotollas eram habitualmente executadas com um cantor na voz superior e as outras
vozes podendo ser tocadas por instrumentos ou cantadas.
Em meados do século 16, já se conheciam diversos arranjos de frotollas para ser canta-
dos por uma só voz e acompanhados, apenas, por um alaúde tocando uma redução das outras
vozes. Tal forma foi muito influente para o madrigal, também italiano, e para a chanson fran-
cesa. É importante destacar as frótolas, compostas por Marco Cara (1470-1525).

Fonte: Adaptado de Eischler (2013).


Figura 19 Frotolla Signora, Un Che V’Adora, de Marco (ou Marchetto) Cara.

Estilos dos compositores do Norte–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação da frotolla Io Nom Compro Piu esperanza, de Marco Cara.
• CARA, M. Io non compro più speranza. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Sf_8cEeIcIo>.
Acesso em: 3 jun. 2015.
Veja, também, uma gravação da frotolla El Grillo, de Josquin des Prez.
• DES PREZ, J. El Grillo. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=OI-bQ0RkArA&list=RDMs6Hc
n9POxo&index=4>. Acesso em: 3 jun. 2015.
A primeira gravação é de uma obra de um importante compositor italiano, e a segunda, de um franco-flamengo,
demonstrando o modo como os compositores do norte absorveram os estilos nacionais:
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

132 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Madrigal
O madrigal é o gênero nacional mais influente e praticado do renascimento italiano; da
segunda metade do século 15 ao início do século 16, é possível dizer que é o gênero musical
mais representativo do renascimento. Ele transcendeu os domínios da península itálica, che-
gando até a Inglaterra e influenciando os principais compositores deste período.
O madrigal era um gênero existente desde o século 14, mas sofreu profundas mudanças
no século 15, momento em que se originou a frótola. A frótola apresentava textos de baixa
qualidade, o que levou a uma exigência de melhor qualidade dos textos no madrigal, uma vez
que ela levou a uma decadência literária. Desse modo, o madrigal está estritamente ligado aos
gêneros literários do Renascimento.
O madrigal desenvolveu-se a partir de um círculo de admiradores da poesia, em espe-
cial, a de Petrarca. Tais admiradores valorizavam a riqueza sonora dessas poesias.
As principais fontes poéticas dos madrigais eram Francesco Petrarca (1303-1374), Pie-
tro Bembo (1470-1547), Jacopo Sannazaro (1457-1530), entre outros importantes poetas do
período.
As características marcantes do madrigal são (GROUT; PALISCA, 2007):
1) Valorização da musicalidade da palavra e do texto para a composição.
2) Utilização de textos de qualidade.
3) Música reservata: uso de cromatismos ou motivos melódicos que destacavam a
ideia poética musicalmente, como se a música representasse o texto.
4) Liberdade formal: não possuía repetição de partes, uma vez que cada trecho do tex-
to exigia uma música específica que o representasse. Desse modo, a forma depende
mais do significado do poema do que de uma estrutura musical fixa.
5) Independência das vozes: não há voz preponderante.
6) Escrita polifônica imitativa sem a utilização de cantus firmus.
7) Alternava texturas contrapontísticas (às vezes, até mesmo, imitativas) e texturas ho-
morrítimicas, com imbricamento entre as partes e, correspondentemente, entre os
versos da letra.
8) Até 1550, era composto predominantemente a quatro vozes; a partir de 1550, a nor-
ma passou a ser cinco vozes, com a existência de peças a dez vozes.
O madrigal passou por fases evolutivas. Inicialmente, era semelhante à chanson, mas,
com o tempo, deixou de ser uma forma estrófica e tornou-se uma forma livre.
Outra mudança que ocorreu com o tempo foi a utilização da imitação, que ocorre graças
à influência dos compositores franco-flamengos. No entanto, uma característica muito mar-
cante e que se mantém no decorrer do madrigal renascentista é a relação entre música e
texto, ou seja, a música deveria representar o texto. Desse modo, sempre que havia um novo
texto, havia, também, uma nova música, pois ela deveria servir à representação desse texto.
É possível medir e diferenciar a evolução da escrita dos madrigais pelo modo com que
os compositores utilizaram efeitos do cromatismo. Sua história é dividida em três momentos:
madrigal da fase inicial (early madrigal), madrigal clássico (classical madrigal) e madrigal tar-
dio (late madrigal), segundo Stolba (1998, p. 176-179).

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 133


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Primeira fase: madrigal da fase inicial


Nesta primeira fase, ocorre a transição da frótola para o madrigal. Os madrigais desse
período têm como característica o uso de imitações em intervalos de oitavas, quartas e quin-
tas, e passagens polifônicas mescladas com textura de acordes. Eles eram compostos a quatro
vozes, com algum jogo imitativo entre as vozes, mas com a predominância de estrutura homo-
fônica-homorrítimica cordal.
Desta fase fazem parte os madrigais dos pioneiros Bernardo Pisano (1490-1548) e
Philippe Verdelot (1475-1535) – este último, um compositor franco-flamengo. Seu centro
de produção foi Roma e Florença. Outros compositores deste período são Festa Constanzo
(1480-1545) e Jacob Arcadelt (1505-1568).

Figura 20 O Dolce Nocte.

Gravação de O dolce nocte–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação do madrigal O Dolce Nocte, de Philippe Verdelot. Observe as caracte-
rísticas deste madrigal para comprará-lo aos que serão estudados posteriormente:
• VERDELOT, P, J. O Dolce Nocte. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WZrmbRmRPSI>.
Acesso em: 08 jun. 2015.
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Segunda fase: madrigal clássico


Em 1540, o principal centro de produção de madrigais passa a ser Veneza. Inicialmente,
os principais compositores são Adrian Willaert e Cipriano de Rore (1516-1565).
Os madrigais passaram a ser compostos em quatro ou cinco vozes e a influência do
contraponto franco-flamengo gera uma maior complexidade de estruturação da escrita vocal,
com maior quantidade de imitação e abandono da homorritmia predominante anteriormen-
te. Nesta fase, é possível observar a utilização de progressões harmônicas inusitadas, graças
à utilização do cromatismo; cresce, também, a preocupação da representação do texto pela
música.
Willaert utiliza em suas composições progressões de sextas e terceiras paralelas, assim
como no fauxbourdon inglês. Essas progressões permitem a maior expansão da harmonia uti-
lizada até então.

134 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Rore foi aluno de Willaert e em seus madrigais é possível observar maior dramaticidade
causada pelas mudanças de atmosferas durante as músicas e mudanças de texto. Pode-se
notar, também, um uso revolucionário de melodias cromáticas, o que ficou conhecido como
madrigal cromático.

Fonte: adaptado de Eischler (2013).


Figura 21 Madrigal da fase clássica: Calami Sonum Ferentes, de Cipriano de Rore.

Gravação de Calami sonum ferentes–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação com partitura do madrigal Calami Sonum Ferentes, de Cipriano de Rore.
Observe as imitações existentes neste madrigal, bem como as melodias cromáticas. De Rore foi aluno de Willaert
e herdou os procedimentos de imitação franco-flamengos.
• RORE, C. Calami sonum ferentes. Disponível em: <https://youtu.be/5qHYw1qd6r8>. Acesso em: 08 jun.
2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Os madrigais do período clássico passaram a ser impressos no formato grade, diferente-


mente do restante da música coral secular que era, desde a Ars Nova, impressa com as vozes
separadas.

Terceira fase: madrigal tardio


Este período dos madrigais é marcado pela predominância de compositores de origem
italiana, diferentemente dos períodos anteriores, nos quais os franco-flamengos dividiam a
prática desse tipo de composição. É importante lembrar que isso coincide com o declínio da
influência dos franco-flamengos.
Nesse período, houve o auge da representatividade da palavra, um grande uso do cro-
matismo, expansão harmônica e aumento da malha polifônica.
Seus principais compositores são Orlando di Lasso (1532-94), Luca Marenzio (1553-99),
Carlo Gesualdo (1561-1613) e Claudio Monteverdi (1567-1643).

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 135


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Orlando di Lasso (1532-94)


Compôs madrigais, chansons, lieder, motete e todos os gêneros de música sacra.

Figura 22 Orlando di Lasso.

Em seus madrigais, destacam-se a dramaticidade, a experimentação harmônica, o uso


do contraponto imitativo (escola franco-flamenga) e do cromatismo.
Gravação de Lagrime di San Pietro–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Ouça Lagrime di San Pietro, uma obra a sete vozes de Orlando di Lasso.
• ORLANDO DI LASSO. Lagrime di San Pietro: I. Il magnanimo Pietro. Disponível em: <https://youtu.
be/8URQ0ZElT0Q>. Acesso em: 08 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Luca Marenzio (1553-99)


Luca Marenzio compôs uma vasta obra de madrigais que foram reunidos em dezessete
livros. Seus madrigais são, frequentemente, a cinco vozes e utilizam seções em contraponto
imitativo e em homofonia. Assim como seus contemporâneos, ele fazia uso frequente do cro-
matismo, buscando a todo tempo em suas músicas expressar o afeto do texto.

Figura 23 Luca Marenzio.

136 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

A seguir, veja o exemplo do madrigal Solo e pensoso, cuja letra é um poema de Petrarca.
O primeiro verso diz:
“Só e pensativo, os mais desertos campos
Vou a passo tardo e lento.”
Para representar o texto, o soprano faz uma lenta subida cromática sem interrupção.
Observe o soprano na partitura:

Figura 24 Solo e pensoso.

Neste madrigal, é possível ver claramente a busca da representação do texto pela música.

Gravação de Solo e Pensoso––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, ouça o madrigal Solo e pensoso no link:


• LUCA MARENZIO. Solo e pensoso i piú deserti campi. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=ZJlj1uy8cSA>. Acesso em: 08 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 137


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Carlo Gesualdo (1561-1613)


Os madrigais de Gesualdo chegaram a um ápice do cromatismo no período renascentis-
ta, um uso que reforçava, sem dúvida, o seu caráter representativo por meio da busca de um
“colorismo” harmônico.

Figura 25 Carlo Gesualdo

Destaca-se como a principal característica dos seus madrigais o seu estilo altamente
cromático que, nesse período, era conhecido pelo nome de “colorismo”. Outras características
do seu madrigal é o uso de frases melódicas curtas, textura homofônica com seções imitativas
curtas, modulações súbitas e mudanças abruptas de tempo e modo.
Gravação de Moro, Lasso, al mio duolo–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação com partitura do madrigal Moro, Lasso, Al Mio Duo, de Carlo Gesualdo.
Observe o cromatismo e a textura harmônica peculiar deste madrigal, bem como a utilização dos recursos de imi-
tação ou de homorritmia como expressão do texto. Observe, especialmente, o uso de dissonâncias para a palavra
e cromatismos para o verso “Ahi, mi dà morte”, ao final da obra:
• GESUALDO, Carlo. Sesto Libro di Madrigali: XVII. Moro, Lasso, Al Mio Duolontes. Disponível em: <https://
www.youtube.com/watch?v=6dVPu71D8VI>. Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Claudio Monteverdi (1567-1643)


Claudio Monteverdi foi um compositor que atuou na passagem do estilo renascentista
para o estilo barroco. Compôs madrigais renascentistas, mas percebeu a existência de duas
práticas musicais em um mesmo período: uma ligada ao renascimento (madrigal) e outra li-
gada ao novo estilo barroco (monodia acompanhada). Por causa dessa peculiaridade, você
voltará a estudar Monteverdi na próxima unidade, quando será abordado o estilo barroco.

138 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Figura 26 Claudio Monteverdi.

Entre 1587 e 1638, publicou oito coleções de madrigais. As características de seus ma-
drigais é a utilização de cinco ou mais vozes, uso do cromatismo e representação da palavra,
assim como os madrigais dos seus contemporâneos. Seus livros de madrigais são um marco
do madrigal polifônico, pois demostram um perfeito domínio da técnica nesse estilo no final
do século 16.
Gravação de Lagrime d’Amante al Sepolcro dell’Amatta–––––––––––––––––––––––––––

A seguir, ouça o madrigal Lagrime d’Amante al Sepolcro dell’Amatta de Monteverdi.


• MONTEVERDI. Sestina – Lagrime d’Amante al Sepolcro dell’Amatta. Disponível em: <https://youtu.be/
p4hFT8bkG0E>. Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

As leituras indicadas no Tópico 3.2 tratam dos estilos na-


cionais com o foco no madrigal italiano. Neste momento, você
deve realizar essas leituras para aprofundar o tema abordado.

2.5. MÚSICA INSTRUMENTAL

Ao observar o vasto acervo histórico, é possível ter a impressão de que a prática instru-
mental cresceu a partir de, aproximadamente, 1450. No entanto, Grout e Palisca (2007) suge-
rem que esse é um grande engano. Na verdade, a prática instrumental sempre existiu durante
a Idade Média, mas, no Renascimento, com a mudança de ênfase da cultura musical sacra para
a secular, houve uma maior documentação da música instrumental. Deve-se destacar que,
embora comecem a surgir alguns gêneros instrumentais, neste período ainda era frequente
o fato de uma composição ser executada por um grupo vocal ou por um grupo instrumental.
No Renascimento, surgiram os tratados sobre construção de instrumentos, suas varieda-
des de famílias e suas maneiras de serem tocados, e estes eram, de forma inovadora, escritos
nas línguas regionais.
O tratadista e compositor de Michael Praetorius (1571-1621) publicou, em 1618, o tra-
tado Syntagma Musicum (tratado de música), no qual veiculava gravuras de instrumentos mu-
sicais usados no século 16. Os tratados de Virdung e de Praetorius são duas das principais

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 139


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

fontes que permitem, atualmente, saber sobre a disponibilidade e uso dos instrumentos na
Renascença.
É importante destacar o uso de instrumentos por famílias, de modo a se conferir grande
homogeneidade timbrística às formações instrumentais, à semelhança do modelo vocal. Por
exemplo, uma flauta corresponde à voz tenor, que seria a flauta tenor, outra corresponde ao
baixo, que seria a flauta baixo, e assim por diante.
Alguns instrumentos estudados no período da Idade Média, como as flautas doces, as
charamelas e os alaúdes, ainda eram utilizados no Renascimento. E ganham destaque, tam-
bém, os cromornes (sopro), sacabuxas ou sackbuts (sopro), violas (cordas) da gamba (de per-
na) e da braccio (de braço), clavicórdio (teclas) e cravo (teclas).
Conheça os instrumentos renascentistas–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Neste momento, é importante que você assista ao vídeo, disponível no link a seguir, para conhecer as imagens e
os sons dos instrumentos renascentistas.
• KLARNET, I. Como soam os instrumentos renascentistas. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=k56fziINlE8>. Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A música instrumental renascentista conheceu alguns gêneros específicos:


1) Canzona de sonar: possui características semelhantes à chanson francesa, ou
à canzone (tradução de chanson para o italiano), mas era executada apenas
instrumentalmente.
2) Ricercar: gênero instrumental baseado em escrita imitativa, escritos para execução
em conjunto ou para execução em instrumento solista. É considerado um dos gêne-
ros matrizes da fuga barroca.
Gravação de Ricercar del duodecimo tuono –––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir uma gravação do Ricercar del duodecimo tuono de Andrea Gabrielli. Repare nas imi-
tações presentes nesta música:
• GABRIELLI, A. Ricercar del duodecimo tuono. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Cihvujvb_
pQ>. Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

3) Sonata: termo utilizado para designar um pequeno conjunto de peças instrumen-


tais para instrumentos solistas ou em conjunto. Possuía várias seções baseadas
em temas diferentes ou variações do mesmo tema, mas com andamento e caráter
contrastantes.
4) Peças improvisatórias: alguns gêneros renascentistas tiveram origem na improvi-
sação instrumental, mas passaram a ser escritos. As improvisações poderiam ser
decorrentes da ornamentação e do embelezamento de uma dada melodia, ou da
improvisação de contrapontos para um cantochão. Fazem parte desses gêneros as
fantasias, as toccatas e os prelúdios.
5) Peças para dança: outra função da música instrumental era o acompanhamento de
danças. Estas proliferavam das mais variadas fontes em cidades e povos europeus,
transformando-se em modelos estilos básicos de música e dança. Dentre elas, é pos-

140 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

sível citar a pavane, a allemande, o ballet, a gaillarde, a courante, o passamezzo


etc. Muitos desses gêneros possuíram exemplares compostos já sem a finalidade da
dança, convertendo-se, apenas, em gênero estilístico musical.
Destacam-se as obras para alaúde de Luís Milan (1500-1561), Antonio de Cabezon
(1510-1566) e John Dowland. Para órgão, destacam-se as obras para órgão de Andrea Ga-
brieli e Claudio Merulo (1533-1604). Houve um grupo de compositores ingleses para teclado,
conhecidos como virginalistas, que foram amplamente conhecidos e respeitados, tais como
Willian Byrd (1553-1623), John Bull (1562?-1628), Orlando Gibbons (1583-1625) e Thomas
Tomkins (1562-1656).
Fantasias de Luís Milan––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, você poderá ouvir um conjunto de fantasias, escritas para o instrumento vihuela por Luís Milan:
• MILAN, L. Fantasia I a La VI. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=bN_WYs-85KQ>. Acesso
em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

As escutas e leituras indicadas no Tópico 3.3 tratam da


música instrumental e dos instrumentos utilizados no período
renascentista. Neste momento, você deve realizar essas leitu-
ras para aprofundar o tema abordado.

2.6. MÚSICA SACRA NO RENASCIMENTO: REFORMA E CONTRARREFORMA

Apesar do fato de a religião perder o posto de centralidade da vida na Renascença, um


movimento de âmbito religioso transformou o mundo europeu. Esse movimento foi a Refor-
ma Protestante, impulsionada pelas teses de protesto contra a doutrina católica (dogmas,
hábitos, proibições etc.) formuladas, em 1517, por Lutero.
Martinho Lutero era um padre alemão que passou a questionar alguns posicionamentos
da igreja católica. Dentre as questões problematizadas por Lutero, estava a impossibilidade de
se compreender os textos sagrados em latim por parte dos fiéis, uma vez que esses só teriam
tal habilidade em suas línguas nacionais. Lutero sugeria a tradução da bíblia para o alemão.
Ele questionava, também, alguns hábitos católicos como o pagamento de indulgências, o culto
a determinados objetos, tidos como sagrados, e o culto a outras personalidades, santificadas
pelo cristianismo, que não o próprio Jesus Cristo.

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 141


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Figura 27 Martinho Lutero.

Suas teses não foram aceitas pelo papado, o que culminou na separação entre os re-
formistas e a Igreja Católica. A reforma irradiou-se a partir de Wittenberg (atual Alemanha)
e afetou territórios germânicos, franceses, ingleses, escandinavos e algumas regiões do leste
europeu.
Reforma Protestante–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Para compreender melhor sobre a Reforma Protestante, assista ao vídeo indicado a seguir:
• FILME LUTERO. Disponível em: <https://youtu.be/xbPF-y4_I5M>. Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A reforma protestante teve início no decorrer do século 16. Como contrapartida, o cato-
licismo lançou o movimento de Contrarreforma, no qual rebateu as teses luteranas e lançou
medidas de controle dos fiéis em seus domínios.

Reforma: a música na igreja protestante


Uma das principais modificações do ritual luterano foi a tradução da Bíblia para a lín-
gua vernácula alemã, permitindo seu completo entendimento pelos fiéis. Essa modificação
exerceu um grande impacto musical, uma vez que um grande repertório musical deveria ser
traduzido para o alemão.
Grosso modo, Lutero manteve a estrutura da missa católica utilizando os textos em ale-
mão, mas suprimindo o Gloria. Alguns hinos poderiam ser adicionados à liturgia (STOLBA,
2007). A principal forma musical luterana foi o choral ou chorale (coral).
O choral consistia em uma melodia monofônica composta utilizando-se os textos bíbli-
cos em alemão e, muitas vezes, aproveitando-se melodias populares de origem germânica. Os
corais deveriam, inicialmente, ser cantados por toda a congregação em uníssono. Em 1524,
foi editado o primeiro hinário, contendo corais luteranos, intitulado Etlich Christlich Lieder (Al-
gumas canções Cristãs). Daí em diante, os corais foram usados para composições polifônicas.
Estas se dividem em quatro tipos estilísticos predominantes (STOLBA, 1998, p. 195):
1) uma melodia tratada como cantus firmus escrita com notas longas e posicionada na
voz tenor;
2) cada frase melódica escrita como um mote de imitação como nos motetes
franco-flamengos;

142 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

3) melodia na voz tenor em contraponto quase cordal com as outras vozes;


4) em estilo cancional, com a melodia na voz superior e contraponto de caráter
homorrítmico.
Os principais compositores do protestantismo luterano foram John Walter (1496-1570)
e Georg Rhau (1488-1548), Hans Leo Hassler (1564-1612) e Michael Praetorius (1571-1621).

Fonte: adaptado de Dreschel (2003).


Figura 28 Choral polifônico protestante Vom Himmel Hoch Da Komm Ich her, de Hans Leo hassler.

Hans Leo Hassler–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Ouça as duas gravações indicadas a seguir, e observe as características estudadas:


• HASSLER, H. L. Vom Himmel Hoch Da Komm Ich her. Disponível em: <https://youtu.be/Qb92wdLaTos>.
Acesso em: 10 jun. 2015.
• HASSLER, H. L. Christ Ist Erstanden. Disponível em: <https://youtu.be/kmWqL9pHx5M>. Acesso em: 10
jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Na França, a tradução dos salmos católicos ficou por conta do reformador João Calvino,
criador da linhagem conhecida como calvinista. Em 1542, ele publicou uma antologia de sal-
mos, em francês, que se tornou o núcleo da música calvinista. Assim como os corais luteranos,
os salmos calvinistas eram, inicialmente, cantados em uníssono.
O primeiro livro de salmos calvinistas com composições polifônicas foi publicado por
Pierre Certon em 1546. Os mesmos salmos, uma vez traduzidos para o holandês, foram base
para composições polifônicas de Clement e de Jean Swelinck (1562-1621).
Na Inglaterra, a reforma assumiu o formato que ficou conhecido como Igreja Anglicana.
O anglicanismo surgiu, oficialmente, com a separação da Igreja Católica posta em marcha pelo
Rei Henrique VIII, em 1534. Também realizou a tradução dos textos bíblicos para o Inglês, além
de abolir os monastérios e de subordinar o poder religioso ao estado.
Os compositores ingleses da geração de John Taverner (1490-1545) e Tomas Tallis (1505-
1585) posicionam-se na passagem da liturgia católica para a anglicana. Por motivos políticos,
tal passagem não se deu de forma direta e objetiva, havendo certa alternância entre angli-

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 143


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

canismo e catolicismo. Portanto, juntamente a William Byrd (1543-1623), tais compositores


possuem obras sacras em inglês e em latim.

Contrarreforma
A contrarreforma católica teve início a partir do Concílio de Trento (entre 1542 e 1565),
conclamado pelo Papa Paulo III, após tentativas mal-sucedidas de reconciliação com os protes-
tantes. No que diz respeito à música sacra deste período, Grout e Palisca afirmam que:
As principais queixas que se fizeram ouvir no Concílio de Trento diziam respeito a seu espírito fre-
quentemente profano, evidenciado nas missas baseadas em cantus firmus profanos ou na imitação
de chansons, e à complexa polifonia que impossibilitava a compreensão das palavras da liturgia.
Além disso, houve quem criticasse o uso excessivo de instrumentos ruidosos na igreja e a pronún-
cia incorreta dos cantores (GROUT; PALISCA, 2007, p. 284).

Diante de tais argumentos, ficava claro que a reforma protestante só coroava um proces-
so de declínio da igreja medieval que viu seu rito se permear de práticas polifônicas das mais
diferentes variedades, fazendo com que suas escrituras sagradas fossem menos perceptíveis
aos ouvintes, distanciando-se dos objetivos iniciais da música sacra católica.
Apesar das reclamações expostas, o Concílio de Trento não aboliu a polifonia da Igreja
Católica. Pelo contrário, suas recomendações quanto à música não foram, ao final, muito ob-
jetivas. Elas pregavam o bom senso e comedimento na realização musical católica. No entanto,
a liturgia católica sofreu importantes modificações, formando-se o que ficou conhecido como
rito tridentino (nome derivado da palavra trento). Este rito tornou-se a base de toda a música
sacra católica após a contrarreforma.
A igreja católica valeu-se da música e da arquitetura de suas igrejas na tentativa de recu-
perar seus fiéis. Música e arquitetura deveriam remeter ao celestial. Na música, Palestrina foi
um importante compositor que teve o papel de reformular alguns cantos católicos.
Giovanni Perluigi da Palestrina (1525-1594) foi o compositor mais significativo do con-
texto. Nasceu na Palestrina, uma pequena cidade perto de Roma e trabalhou em algumas
capelas entre Roma e Palestrina. Em 1955, tornou-se o mestre da Capela Sistina, sede do Pa-
pado. Embora tivesse um grande envolvimento religioso com a igreja católica, Palestrina teve
vida secular, foi casado e teve filhos.

Figura 29 Palestrina.

144 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Palestrina não teve, de fato, uma participação ativa no Concílio (STOLBA, 1998; GROUT,
PALISCA, 2007), mas seu estilo composicional foi, posteriormente, tomado como um modelo
para a continuidade da polifonia católica. Isso se deve ao fato de que a escrita de Palestri-
na conserva o requinte e o detalhe da polifonia franco-flamenga, a consciência das sonori-
dades harmônicas provenientes dos madrigais venezianos, sem usos de cromatismo, e uma
maior clareza de compreensão dos textos em relação aos seus antecessores (STOLBA, 1998,
p. 203-204).
Nos séculos posteriores, foi tomado como modelo, também, para o ensino do contra-
ponto. Diversos mestres do contraponto analisaram sua obra e deduziram regras de escrita e
combinação de melodias a fim de melhor instruir seus alunos. Desses, é possível citar o Gradus
Ad Parnassum (1725) de Johann J. Fux. Tal fenômeno é repetido até a atualidade no ensino
universitário e conservatorial dessa técnica.
Mais ao final de sua vida, Palestrina foi o responsável pela revisão dos livros do graduale
romano, a fim de fazer as adaptações necessárias no rito tridentino.
Além de sua obra sacra, sem dúvida, de maior importância, ele também compôs música
secular, especialmente, madrigais. Suas peças sacras possuem um grande número de missas
e motetes. Muitas vezes utilizava cantus firmus, mas noutras compunha livremente. Compôs
também peças sacras menores, como hinos, ofertórios, magnificats e litanias.

Fonte: adaptado de Jones (2010).


Figura 30 Missa Papae Marcelli, de Palestrina, em edição com claves antigas utilizadas para cada voz.

Missa Papae Marcelli–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A seguir, veja a Missa Papae Marcelli, de Palestrina. Nos primeiro link, você poderá ouvir o Kyrie e, no segundo, o
Gloria. Ambos contêm a partitura no vídeo. Ouça as gravações e observe os conteúdos estudados:
• PALESTRINA, G. P. Kyrie Missa Palestrina. Disponível em: <https://youtu.be/NS44tTf3BSQ>. Acesso em:
10 jun. 2015.
• PALESTRINA, G. P. Missa Papae Marcelli - Palestrina. Disponível em: <https://youtu.be/5k3bfqQ1SpU>.
Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 145


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Outros importantes compositores de música sacra do final do século 16 são Tomás Luís
de Vitoria (1548 – 1611) e Orlando di Lasso (1532-1594). Victoria foi contemporâneo de Pa-
lestrina em Roma e compôs apenas música sacra.

Gravação de O Magnum Mysterium––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Ouça O Magnum Mysterium de Tomás Luís de Vitoria (1548 – 1611).


• Victoria, T. L. O Magnum Mysterium (The sixteen). Disponível em: <https://youtu.be/MRPEJkoEstc>.
Acesso em: 10 jun. 2015.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Já Lasso possui um vasto leque de gêneros e estilos que vão da música secular à música
sacra com igualdade de importância. Trabalhou em diversas cortes por toda a Europa e pode
ser considerado o compositor mais versátil do século 16.

As leituras e escutas indicadas no Tópico 3.4 tratam da


música no movimento da reforma Protestante e da Contrarre-
forma Católica. Neste momento, você deve realizar essas leitu-
ras para aprofundar o tema abordado.

3. CONTEÚDO DIGITAL INTEGRADOR


O Conteúdo Digital Integrador representa uma condição necessária e indispensável para
você compreender integralmente os conteúdos apresentados nesta unidade.

3.1. RENASCENÇA

A Renascença ou Renascimento foi um amplo movimento cultural que marcou o início


da Idade Moderna e teve como principal centro irradiador a península itálica. Suas origens se
encontram na Baixa Idade Média, a partir de ideias ligadas ao movimento filosófico chamado
Humanismo. Racionalismo, individualismo e naturalismo são algumas das marcas dessa mu-
dança na mentalidade europeia a partir do renascimento.
A partir do século 14, manifestações artísticas – literárias, arquitetônicas, pictóricas, te-
atrais e, mais tardiamente, musicais – trouxeram uma maior secularização da arte e maior
documentação da arte e cultura não religiosas.
• ACIDINI C.; DELPRIORI, A. Exposição Mestres do Renascimento: Obras Primas Italia-
nas. São Paulo: Base7 Projetos Culturais, 2013. Disponível em: <http://www.bb.com.
br/docs/pub/inst/dwn/renascimento.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2015.
• ARAÚJO, L. M. Europa Renovada: Renascimento e Humanismo – do maneirismo ao
barroco. Revista Católica, Uberlândia, 2011, v. 3, n. 4, jan/jul. Disponível em: <http://
catolicaonline.com.br/revistadacatolica2/artigosn4v2/11-historia.pdf>. Acesso em:
11 jun. 2015.

146 © HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

• EUREKA – HISTÓRIA E TEORIA DA ARQUITETURA E URBANISMO. Renascimento (séc.


XV e XVI). Disponível em: <http://www.histeo.dec.ufms.br/aulas/teoriaI/13%20
Renascimento.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2015.

3.2. ESTILOS NACIONAIS E MADRIGAL

Na Renascença, surgiram diversas manifestações polifônicas em estilos nacionais utili-


zando línguas vernáculas. Um vasto repertório de música secular foi produzido utilizando tais
gêneros. Em geral, caracterizavam-se por uma textura homofônica (polifonia homorrítimica).
Com o passar do tempo, desenvolveu-se o hábito de substituir vozes por instrumentos e, até
mesmo, cantar apenas a voz superior enquanto as outras eram tocadas por um alaúde. So-
mente o madrigal mantém uma maior complexidade na estruturação de suas vozes, contendo
imitação e, em alguns casos, cromatismos melódicos e harmônicos.
• GARBULO, R., FIORIN, C. A relação entre música e texto nos madrigais de Carlo
Gesualdo – um estudo sobre seu amadurecimento ao longo da obra. Música em
Perspectiva, Curitiba, 2012, v. 5, n. 2. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/
index.php/musica/article/view/32317>. Acesso em: 11 jun. 2015.
• RIBEIRO, H. L. Madrigal. Trabalho de conclusão da disciplina História da Arte II:
Escola da Música. Universidade Federal da Bahia, dez. 1999. Disponível em: <http://
hugoribeiro.com.br/download-textos-pessoais/madrigal.pdf>. Acesso em: 11 jun.
2015.
• SABAG, M. M. S.; IGAYARA, S. C. A notação original da música polifônica renascentista
e suas relações com as práticas interpretativas atuais. Revista Música Hodie, Goiânia,
2013, v.13, n.2, p. 34-51, 08 jun. 2012. Disponível em: <http://www.musicahodie.
mus.br/13.2/Artigo_Cientifico_02.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2014.

3.3. MÚSICA INSTRUMENTAL RENASCENTISTA

A música instrumental não surgiu no Renascimento. No entanto, é neste período que a


utilização de instrumentos passa a ser mais bem documentada, tanto em tratados quanto em
partituras. Seu uso era de acompanhamento da música vocal ou da dança. Mas, em algumas
ocasiões do final do século 16, é possível encontrar obras originais para instrumento, com-
postas com finalidades, apenas, musicais Muitos dos instrumentos musicais utilizados pelos
renascentistas possuíam origem medieval. Navegue pelos links indicados a seguir para escutar
obras e reconhecer os instrumentos.

Cromornes
• CRUMHORN TRIO. Susato: Die Ver Branlen. Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=6Pthv29TgRE>. Acesso em: 11 jun. 2015.

© HISTÓRIA E CRÍTICA MUSICAL: DA ANTIGUIDADE AO BARROCO 147


UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Flautas Doces
• AS FLAUTAS RENASCENTISTAS DE SÃO PAULO. Apresentação no IA UNESP. Disponí-
vel em: <https://www.youtube.com/watch?v=K_tWTRdAMO0>. Acesso em: 11 jun.
2015.
• ZABU TRIFÁSICO. Bergerette “Don Vient”. Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=RILbXgFPkxY>. Acesso em: 11 jun. 2015.

Alaúde
• BURMESTER, R. Instrumento com estilo: alaúde renascentista. Disponível em: <ht-
tps://www.youtube.com/watch?v=kCbHDT0qGTA>. Acesso em: 11 jun. 2015.

Sacabuchas
• LES SACABOUTIERS DE TOULOUSE. Falconiero: Passacaglia. Disponível em: <https://
www.youtube.com/watch?v=PxOEvNHkyqM>. Acesso em: 11 jun. 2015.

Charamela (Shawm)
• LODICO, J. Shawm. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=egifq8lEEu0>. Acesso em: 11 jun. 2015.
• SHAWM CONSORT. 04 Shawm. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=PMJ_jt209jg>. Acesso em: 11 jun. 2015.

3.4. MÚSICA NA REFORMA E NA CONTRARREFORMA

Você viu, ao final desta unidade, o impacto que os movimentos da Reforma Protestante
e da Contrarreforma Católica exerceram na produção musical sacra do período. No caso da
reforma luterana e calvinista, a passagem se deu de forma tensa, mas em uma direção única.
A seguir, você tem referências de textos, vídeos e documentários a respeito da música e dos
compositores deste período.
• BBC. Sacred Music with Simon Russel, 2: Palestrina and the Popes. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=IFbb-1hHkmI&list=PLtnzwFUT1dF09uI5dFsKN
moIMxzT0bAdP&index=2>. Acesso em: 11 jun. 2015.
• BBC. Sacred Music with Simon Russel, 3: Tallis, Byrd and
the Tudors. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=hBPk38sSUUI&list=PLtnzwFUT1dF09uI5dFsKNmoIMxzT0bAdP&index=3>.
Acesso em: 11 jun. 2015.

4. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar o seu desem-
penho. Se encontrar dificuldades em responder às questões a seguir, você deverá revisar os
conteúdos estudados para sanar as suas dúvidas.
1) Como se pode definir um fauxbourdon?

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UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

a) Composição realizada a partir de um cantus firmus, sempre com uma nota na voz superior para cada nota
da voz inferior (cantus firmus), privilegiando-se sonoridades de quintas e quartas entre as vozes.
b) Uma composição escrita a duas vozes que evoluía, predominantemente, em sextas paralelas com uma
terceira voz acrescentada na execução, movendo-se, invariavelmente, uma quarta abaixo do soprano.
c) Era uma forma de canção, inicialmente, composta para dança, com uma frase de refrão e outra frase (ou
conjuntos de frase) como estrofe para as quais a letra se modificava.
d) Composição em estilo silábico e a quatro vozes, com estrutura rítmica bem marcada, harmonias diatônicas
simples, estilo homofônico (homorrítmico) e com a melodia na voz principal.

2) Quais os nomes dos registros vocais apresentados por Antoine Busnois, no século 15, que deram origem ao
atual nome das vozes:
a) Tenor, duplum, quadruplum, triplum.
b) Tenor, baixo, contralto, soprano.
c) Contratenor bassus, tenor, contratenor altus, superius.
d) Bassus, tenere, vox principais, vox organalis.
e) Contrabaixo, contratenor, contralto, contrasoprano.

3) Quais das afirmações, a seguir, não correspondem com as características do estilo musical renascentista?
a) Predominância da música coral polifônica, mas com utilização de instrumento dobrando ou substituindo
uma ou algumas vozes da partitura.
b) Limite rígido da quantidade de vozes de uma partitura (no máximo quatro vozes).
c) Coexistência de repertório sacro e secular, mas com aumento significativo da quantidade e da variedade
de repertório secular.
d) Utilização sistemática das formas fixas medievais da música secular.
e) Uso comum de contraponto imitativo, melismas para repertório sacro ou secular, de caráter sério e predo-
mínio de contraponto homorrítmico e melodias silábicas para o repertório secular popular.
f) Proliferação de gêneros musicais seculares baseados nas línguas nacionais (francês, italiano, espanhol,
alemão, holandês, inglês etc.), paralela a um estilo internacional para o repertório sacro desenvolvido
pelos franco-flamengos.
g) Contraponto baseado nos intervalos de terças e sextas como consonâncias, reservando as quintas e oita-
vas para finais cadencias; uso restrito de dissonâncias entre as vozes respeitando um tratamento fino de
preparação e resolução.
h) Uso sistemático e obrigatório da cadência de Landini.
i) Uso tardio das escalas modais, no entanto, com as estruturas dos acordes de tríades (maiores e menores)
subjazendo sem uma teorização harmônica.
j) Utilização sistemática da musica ficta que colaborou, mais ao fim da Renascença, para a tendência em
utilizar apenas duas das escalas modais que viriam a se configurar como escala maior e escala menor.

4) Qual das alternativas, a seguir, lista apenas nomes de danças que eram praticadas como música instrumental
no Renascimento?
a) Caccia, allemanda, gaillard, pavane.
b) Minueto, carol, passamezzo, ballet.
c) Ballade, caccia, carol, Reel.
d) Ballet, pavane, gaillarde, allemande.
e) Ballade, tocata, fantasia, courante.

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UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Gabarito
Confira, a seguir, as respostas corretas para as questões autoavaliativas propostas:

1) b.

2) c.

3) b, d e h.

4) d.

5. CONSIDERAÇÕES
Então, o que achou da música renascentista? Você pôde, certamente, perceber os efei-
tos da secularização, da cultura escrita musical e os efeitos das mudanças de poderio político
e econômico dos estados na sonoridade que há na música renascentista, não?
A eclosão de uma música instrumental e de uma textura harmônica, que vão, gradativa-
mente, se tornando melodias com acompanhamento, trouxe importantes avanços da música
renascentista em direção à prática musical moderna cotidiana. Esses assuntos foram trabalha-
dos nesta unidade.
Na Unidade 4, atente-se para o modo como as mudanças do final da Renascença influen-
ciaram na caracterização da música barroca e ajudaram a concretizar uma das mudanças mais
significativas da música ocidental: o advento da noção de tonalidade em harmonia.

6. E-REFERÊNCIAS
FERNANDES, A. J.; KAYAMA, A. G. A sonoridade vocal e a prática coral na Renascença: subsídios para a performance da música
renascentista. Revista Claves, João Pessoa, 2008 nº 5, maio de 2008. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.
php/claves/article/view/2874>. Acesso em: 11 jun. 2015.

Sites pesquisados
BINDER, F. Histórias da Música – Estudo Dirigido. Disponível em: <http://fernandobinder.wordpress.com>. Acesso em: 11 jun.
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CASTAGNA, P. A. Homepage. Disponível em:<http://paulocastagna.com>. Acesso em: 11 jun. 2015.
CHORAL PUBLIC DOMAIN LIBRARY. Homepage. Disponível em: <http://www1.cpdl.org/wiki/index.php/Main_Page>. Acesso
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IMLSP PETRUCCI MUSIC LIBRARY. Homepage. Disponível em: <http://imslp.org>. Acesso em: 11 jun. 2015.

Lista de figuras
Figura 2 Motete: Quam Pulchra Es de John Dunstable. Disponível em: <http://www.uma.es/victoria/varios.html#dieciseis>.
Acesso em: 29 maio. 2015.
Figura 3 Fauxbourdon em Ave Maris Stella de Dufay. Disponível em: <http://www3.cpdl.org/wiki/images/4/43/Dufay-AveM.
pdf>. Acesso em: 29 maio 2015.
Figura 4 Fragmento do motete Nuper Rosarum Flores. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/wiki/images/7/72/Dufay_
Nuper_rosarum_flores_PML.pdf>. Acesso em: 29 maio 2015.

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UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

Figura 5 Imitações literais em Ave Regina Coelorum de Dufay. Disponível em: <http://www3.cpdl.org/wiki/index.php/Ave_
Regina_coelorum_a_4_(Guillaume_Dufay)>. Acesso em: 29 maio 2015.
Figura 6 Johannes Ockheghem. Disponível em: <http://www.musicaantigua.com/johannes-ockeghem-uno-de-los-mas-
influyentes-y-respetados-musicos-de-su-epoca/>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 7 Chanson “Ma Bouche Rit de Ockeghem”. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/wiki/images/6/6a/Ma_bouche_rit.
pdf>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 8 Missa Prolationum. Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/a1/Ockeghem_
Prolationum_Kyrie_full.pdf>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 9 Jacob Obrecht. Disponível em: <http://www.biografiasyvidas.com/biografia/o/obrecht.htm>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 10 Imitação em Jacob Obrecht. Disponível em: <http://s.ytimg.com/vi/vGIA8TVz-9w/0.jpg>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 11 Josquin des Prez. Disponível em: <http://www.nndb.com/people/611/000093332/>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 12 Kyrie da Missa Pange Lingua, de Josquin des Prez. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/wiki/images/d/d2/
Josquin_Des_Prez_Missa_Pange_lingua.pdf>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 14 Adrian Willaert. Disponível em: <http://www.classical.net/music/comp.lst/acc/willaert.php>. Acesso em: 2 jun.
2015.
Figura 15 Motete O Salutaris Hostia a seis vozes, de Willaert. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/wiki/images/0/09/
Willaert-O_Salutaris_Hostia.pdf>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 16 Tant Que Vivrai. Disponível em: <http://www1.cpdl.org/wiki/images/8/89/042.pdf>. Acesso em: 2 jun. 2015.
Figura 17 La Guerre. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=JY2rLfhJLmY>. Acesso em: 3 jun. 2015.
Figura 18 Chanson: Margot Labourez Les Vignes, de Roland d’Lassus. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/wiki/
images/9/94/487.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2015.
Figura 19 Frotolla Signora, Un Che V’Adora, de Marco (ou Marchetto) Cara. Disponível <http://www2.cpdl.org/wiki/
images/9/90/169.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2015.
Figura 20 O Dolce Nocte. Disponível em: <http://www3.cpdl.org/wiki/images/8/81/O_dolce_nocte.pdf>. Acesso em: 08 jun.
2015.
Figura 22 Madrigal da fase clássica: Calami Sonum Ferentes, de Cipriano de Rore. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/
wiki/images/8/8b/Rore_Calami.pdf>. Acesso em: 08 jun. 2015.
Figura 23 Luca Marenzio. Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/fb/Luca_conte_Marenzio,_
Komponist_des_16._Jahrhunderts.jpg>. Acesso em: 08 jun. 2015.
Figura 24 Solo e pensoso. Disponível em: <http://www2.cpdl.org/wiki/images/e/e8/Marenzio%2C_Solo_e_pensoso.pdf>.
Acesso em: 08 jun. 2015.
Figura 25 Carlo Gesualdo. Disponível em: <http://www.cinquerighe.it/2013/09/07/ist_gesualdo_8_sett_400_anni_dalla_
morte_del_principe_genio_della_musica/Ist_Gesualdo_Gesualdo_copia.jpg>. Acesso em: 10 jun. 2015.
Figura 26 Claudio Monteverdi. Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/02/Bernardo_Strozzi_-_
Claudio_Monteverdi_(c.1630).jpg>. Acesso em: 10 jun. 2015.
Figura 27 Lutero. Disponível em: <http://drw6y4cub0f0o.cloudfront.net/sites/4/2014/10/lutero.jpg>. Acesso em: 10 jun.
2015.
Figura 28 Choral polifônico protestante Vom Himmel Hoch Da Komm Ich her, de Hans Leo hassler. Disponível em: <http://
www2.cpdl.org/wiki/images/sheet/hassler/hass-vom.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2015.
Figura 29 Palestrina. Disponível em: <http://www.8notes.com/images/artists/palestrina.jpg>. Acesso em: 10 jun. 2015.
Figura 30 Missa Papae Marcelli, de Palestrina, em edição com claves antigas utilizadas para cada voz. Disponível em: <http://
www2.cpdl.org/wiki/images/2/27/Pal-papdwn5.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2015.

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UNIDADE 3 – MÚSICA NA RENASCENÇA

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BENNETT, R. uma breve história da música. Tradução de Maria Teresa Resende Costa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986.
BROWN, H. M. Music in the Renaissance. Nova Jersey: Prentice-Hall, 1976.
FUBINI, E. Estética da música. Lisboa: Edições 70, 2008.
GROUT, D. ; PALISCA, C. V. História da música ocidental. 5. ed. Lisboa: Gradiva, 2007.
LANG, P. H. Music in western civilization. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 1997.
LOYN, H.R. Dicionário da idade média. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.
SEVCENKO, N. O Renascimento: os humanistas, uma nova visão de mundo: a criação das línguas nacionais: a cultura
renascentista na Itália. São Paulo: Atual, 1985.
SILVA, K. V.; SILVA, M. H. Dicionário de conceitos históricos. São Paulo: Contextos, 2009.
STOLBA, K. M. The Development Of Western Music: a history. Nova Iorque: MacCgraw-Hill Companies, 1998.
______. The development of western music: an anthology. Nova Iorque: Wm C. Brown Publishers, 1991. vol.1
TARUSKIN, R.; WEISS, P. Music in the world: a historical in documents. Boston: Thomson Learning, 1984.
TOMAS, L. Música e filosofia: estética musical. São Paulo: Irmãos Vitale, 2005.

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