SOARES, Marcos. A Neurociencia e As Provas Judicais

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A neurociência e as provas judiciais

A NEUROCIÊNCIA E AS PROVAS JUDICIAIS


Neuroscience and evidence
Revista de Processo | vol. 300/2020 | p. 309 - 339 | Fev / 2020
DTR\2019\42754

Marcos José Porto Soares


Mestre em Razonamiento Probatório pela Universidade de Girona – Espanha e
Universidade de Gênova – Itália. Especialista em Direito Processual Civil – UNIDERP.
Professor de Direito Processual Civil – Centro Universitário Integrado. Coordenador do
Núcleo de Pesquisa e Extensão e Tecnologia e Inovação aplicada ao Direito da Fundação
Escola do Ministério Público do Estado do Paraná. Promotor de Justiça do Ministério
Público do Estado do Paraná. marcosjps@uol.com.br

Área do Direito: Processual; Filosofia


Resumo: O presente estudo visa apontar em que medida conhecimentos da neurociência
podem colaborar para a busca de maior racionalidade para a formação e valoração das
provas judiciais.

Palavras-chave: Prova – Tecnologia – Neurociência – Racionalidade – Cérebro humano


Abstract: The present study aims to present the extent to which knowledge of
neuroscience can contribute to the search for more rationality in the field of evidence.

Keywords: Evidence – Technology – Neuroscience – Rationality – Human brain


Sumário:

1 Introdução - 2 Conceito e finalidade das provas - 3 Por que controlar a subjetividade


do juiz na valoração das provas? - 4 Como minimizar a subjetividade do juiz ao valorar
as provas? - 5 A necessidade da aproximação do raciocínio probatório às demais ciências
para garantir a racionalidade na valoração da prova - 6 Aproximações das demais
ciências à formação dos meios de prova (dados probatórios) - 7 A neurociência - 8 A
aproximação da neurociência ao direito - 9 A neurociência como meio de prova - 10 A
valoração da prova como ato de decisão advindo do cérebro - 11 A possibilidade de
aplicação dos conhecimentos da neurociência no ato de valorar as provas - 12 Como
funciona o cérebro humano - 13 Importância da aplicação dos conhecimentos básicos da
neurociência à valoração das provas - 14 Introdução de conhecimentos básicos da
neurociência cognitiva na formação dos juízes - 15 Considerações finais - Referências
bibliográficas

1 Introdução

A evolução científica não para. Depois de grandes descobertas no campo espacial,


voltam-se os cientistas para um dos órgãos do homem, o cérebro: tão complexo como o
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espaço, ou aliás como quase tudo que envolve a natureza. O século XXI tem visto um
assombroso desenvolvimento do estudo da neurociência.

A proposta do presente trabalho é apontar a relação da neurociência com os meios de


prova, e também descrever como a neurociência é capaz de servir de instrumento aos
juízes para exercer mais racionalmente a valoração das provas.

Vê-se que é imprescindível que os julgadores tenham conhecimento de como funcionam


seus cérebros para que se afastem ao máximo da tomada de decisões movida pela
irracionalidade.

Os custos sociais, morais e econômicos de uma decisão injusta justificam trazer ao


raciocínio probatório novos conhecimentos científicos e tecnológicos que possam
minimizá-los. Os juízes necessitam para comporem uma decisão justa terem acesso não
somente às normas e aos fatos a serem julgados, mas também visualizar o que acontece
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A neurociência e as provas judiciais

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no interior do seu corpo; de forma mais específica no seu cérebro, órgão humano o qual
desenvolve em grande medida a tarefa de formar as decisões.

2 Conceito e finalidade das provas

O direito é um fenômeno humano que tem como finalidade pacificar a sociedade. É


formado por normas abstratas que recaem sobre fatos. Possui uma característica que o
distingue da moral, qual seja, a coercibilidade. Isto quer dizer que consequências
jurídicas serão impostas caso o fato ocorrido se encaixe na previsão normativa. Deste
modo, é da essência do fenômeno jurídico que se verifique se um determinado fato
tenha ocorrido ou não. Pois somente com a sua comprovação é que será possível a
3
incidência das consequências jurídicas . Para tanto são necessárias as provas.
4
O termo prova tem muitos sentidos, é polissêmico. Numa perspectiva geral
vislumbra-se prova como algo formado por dois elementos: um fato perceptível e a
inferência. O fato perceptível são os dados e informações captáveis através dos sentidos
humanos. Inferência é o elo entre o dado percebido e a hipótese que se quer provar.
Provar um fato “consiste em mostrar que a luz da informação que possuímos está
5
justificado aceitar que esse fato tenha ocorrido” . As provas são as razões ou premissas,
com natureza empírica, de um argumento, na esfera judicial e podem ser vistas sobre
três enfoques: como meios de prova, atividade probatória e resultado probatório. Os
meios de provas são informações ou dados percebidos através dos sentidos e
interpretados de forma a serem usados como argumento a favor ou contra uma hipótese
enunciada (exemplos: documentos, testemunhos, laudos periciais). Por sua vez, a
atividade probatória corresponde na proposição, admissão e valoração dos meios de
prova no processo; é ela regulada e institucionalizada. E por fim, existe o enfoque da
prova como resultado, consistente na comprovação ou não da ocorrência de uma
determinada hipótese (pretensão), advinda da valoração sobre os meios de prova.

Como o senso de justiça aponta que um fato sobre o qual deve recair a norma não pode
ser jamais um evento aleatório, mas sim algo que tenha realmente ocorrido, é tarefa
6
primordial no processo judicial a busca pela verdade . Já dizia Benthan: “La falsedad es
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la sirventia de la injusticia”.

Há importantes visões, no âmbito da filosofia sobre o conceito de verdade. Entre elas se


destaca a que a vê como correspondência a realidade, visão tradicional de Aristóteles e
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Tarski ; como algo construído pelo consenso na linha de Habermas ou ainda como
coerência discursiva. A primeira supõe a existência da realidade fora do sujeito
cognoscente. Fora essa, as demais mencionadas se alinham ao ceticismo que nega a
existência de fatos naturais e brutos, não havendo uma realidade pura sem o filtro da
linguagem e da teoria, sendo a verdade algo a ser construído e não descoberto.

Alinha-se aqui ao conceito de verdade como correspondência à realidade; mas sem


adotar a tese do objetivismo (ou realismo) ingênuo segundo o qual os fatos são só
objetivos. Isto pois, percebe-se que é inevitável que a captação de um fato (dado
objetivo) se passa pelo prisma da percepção (dos órgãos sensoriais) e também da
10 11
interpretação (classificação, categorização) do sujeito . E, tanto o filtro da percepção
como o da interpretação estão sujeitos a problemas que necessitam ser ajustados pelo
sujeito que busca a correspondência ou não do enunciado fático à realidade. Por isso, é
mais sensato o pensamento que acolhe a tese do objetivismo não ingênuo mas crítico
(objetivismo ou realismo crítico). Neste contexto, é tarefa de quem valora o mundo, pelo
meio empírico das provas, perceber e corrigir as falhas que advenham das lentes
sensoriais e da interpretação. Ou seja, levar em conta a possibilidade ao valorar um
objeto de distorções ou erros psicológicos, visuais, auditivos, fisiológicos, ou de
interpretação do que foi percebido (como alguém levantar a mão em sinal de
cumprimento para uma pessoa, que retribui, mas na realidade o aceno foi de um cliente
chamando o atendente de um restaurante à mesa).

Além desse problema, há outro que pode existir quando o objeto de análise da
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veracidade não diz respeito a um fato percebido diretamente, mas sim de forma indireta
(por exemplo um fato passado ou único, que são os mais comuns nos processos
judiciais). A forma lógica de comprová-los se dá por meio de inferências indutivas, que
não sempre encontram a verdade. Destarte, por meio de uma generalização, mesmo
diante de premissas certas, é possível advir uma conclusão equivocada.

Assim, deve-se dizer que é impossível ter certeza de que o resultado probatório, ou seja
a conclusão advinda da valoração das provas, coincida todas as vezes com o que tenha
12
realmente acontecido. Por isso, como ensina Jordi Ferrer Beltrán , uma hipótese
provada não é sinônimo que o fato correspondente seja verdadeiro, mas sim que haja
uma grande probabilidade que assim o seja. Como o resultado probatório nem sempre
coincidirá com a verdade, a solução é que o julgador se contente para a formação da sua
convicção com o grau de probabilidade de que o fato tenha ocorrido.

3 Por que controlar a subjetividade do juiz na valoração das provas?

Por muito tempo, durante os últimos séculos, perdurou a crença de que o juiz detinha
alguma habilidade particular – carismática – para aceder a verdade dos fatos. Esta ideia,
por incrível que pareça, foi admitida inclusive entre os profissionais do direito e pela
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jurisprudência, e somente em época bem recente passou a ser objeto de revisão crítica
. A aceitação a essa condição dos juízes deveu-se a razões políticas, ligada à ideia de
concentração do poder nas mãos de uma classe detentora do controle social e político.
Nesse tempo, qualquer decisão judicial era considerada fundada em razão, mesmo que
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irracional.

Foi a partir da metade do século XVIII, em decorrência do processo de secularização que


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a racionalidade jurídica adquiriu maturidade. Neste novo contexto, percebeu-se que as
normas jurídicas deveriam ser aplicadas sobre fatos realmente ocorridos, comprováveis
por dados empíricos, tão comprováveis como os fenômenos históricos ou naturais, e não
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por misteriosos desígnios divinos ou dos detentores do poder.

Admitir que um juiz possa julgar conforme suas preferências pessoais é afrontar o
princípio democrático que desde o século XX predomina nos Estados Constitucionais. É
garantia fundamental de qualquer cidadão o devido processo legal, em que possa ser
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julgado por um juiz isento de parcialidade. Como diz Perfecto Ibáñez , é da essência da
racionalidade jurídica que o juiz esteja equidistante das partes e isento de interferência
pessoal ou política ao proferir suas decisões. Essa posição de imparcialidade do juiz é
essencial para a obtenção de um conhecimento de qualidade e de equilíbrio de uma
decisão.

Logo, aceitar a ideia de que o juiz é possuidor de um dom superior é continuar na idade
média defendendo o misterioso e inexplicável que reluz na pessoa do magistrado. Mas o
juiz não tem essa aptidão sobrenatural, e suas condições físicas, psicológicas e
biológicas são as mesmas de qualquer ser humano. Parece absurdo ter que dizer isso,
mas por um bom tempo, isso foi aceito, ou melhor imposto aos que se serviam da
justiça.

No entanto, mesmo não aceitando a comunidade jurídica esta ideia, é de se notar que o
sistema da livre valoração da prova somado ao desconhecimento por parte da
comunidade científica de métodos racionais de valorar a prova, dá ao magistrado ainda
hoje uma enorme discricionariedade: comumente preenchida com a intuição, crença
pessoal, ideologia política, ou sesgos psicológicos. Em que pese, uma evolução, o
problema ainda persiste.

4 Como minimizar a subjetividade do juiz ao valorar as provas?

A valoração da prova é o ato em que o juiz avalia se as premissas ou dados probatórios


tem força suficiente para demonstrar como provado uma hipótese fática. O que se busca
provar é a ocorrência ou não de um enunciado sobre um fato. Para que a valoração da
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prova seja controlada é preciso saber se foi obedecido um método adequado, e isto só é
possível se houver uma explicação pública de como o resultado probatório foi alcançado,
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ou seja, com uma motivação. Michele Taruffo parte do pressuposto de que o que não é
motivável não existe para o direito. Este pensamento afina-se à racionalidade que deve
existir no momento de valoração das provas, retirando-se a possibilidade de julgar com
base na intuição, crença pessoal, emoção, ou outro atributo exclusivamente subjetivo.
Não é crível que um juiz possa dizer que acreditou numa testemunha pois sua intuição
assim o sinalizou, ou que por ter vivido situação semelhante na sua família sabe bem do
sofrimento que é um abuso sexual durante a infância. Ou ainda, por ter acordado de
mau humor ou com fome resolveu prejudicar uma parte com quem não teve empatia.
Foge da racionalidade e de um controle intersubjetivo uma motivação deste tipo. Por
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isso é preciso fundamentar a valoração das provas em elementos objetivos e racionais.

A questão mais problemática é exatamente o enlace, ou seja, a inferência, entre o dado


de prova e a hipótese que se quer provar, pois ele tem quase sempre natureza indutiva.
Assim, partindo de uma generalização com base em informações de dados específicos
chega-se a uma conclusão. Neste salto é que deve estar a racionalidade. Um método
racional supostamente simples é descartar as hipóteses contrárias à pretensão, ou seja
demonstrar que não ocorreu uma situação diversa a que se pretende provar. Esse
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método foi primeiramente indicado por Lawrence Jonathan Cohen . Outros esquemas
dizem respeito à probabilidade matemática, incluindo o Teorema de Bayes, a utilização
da lógica, e ainda estudos estatísticos. Há ainda a aproximação ao conhecimento da
psicologia cognitiva e a neurociência como as pesquisas de Daniel Kahneman e Tversky
22
.

Percebe-se que nenhum dos métodos apresentados pelos estudiosos até hoje foram
suficientes para zerar a subjetividade do juiz ao valorar uma prova, talvez jamais isto
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seja possível . Mas quase todos propõem algo em comum: a necessidade da
aproximação do direito aos conhecimentos já sedimentados em outras ciências, pois são
24
os dados científicos que garantem maior força a inferência probatória. Amalia Amaya
aponta que a “ the most important topic in the agenda of the ‘the new evidence
scholarship’has been the study ot the nature ” . Logo, é necessário que o raciocínio
probatório seja complementado e auxiliado por outras ciências. Esta é a forma de
restringir ao máximo a subjetividade do juiz, tornando a valoração objetiva e motivável.

5 A necessidade da aproximação do raciocínio probatório às demais ciências para


garantir a racionalidade na valoração da prova

O raciocínio probatório é composto por uma cadeia de argumentos que podem ou não
levar a comprovação de uma hipótese fática. Para compreender o esquema racional que
envolve uma argumentação (cadeia de argumentos) basta analisar a estrutura de um
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argumento. Um argumento segundo Stephen Toulmin é composto pelo fato probatório
e a hipótese a ser provada, e entre eles há um elo que é a inferência.
26
A inferência deve estar sustentada por uma garantia , formada por regra geral,
27
normalmente de natureza empírica, ligada à máxima experiência ou à sana crítica. Mas
tanto a máxima experiência e a sana crítica são conceitos deveras vagos que, por si sós,
não tem a aptidão de apontar qual a estrutura racional e empírica que suporta uma
inferência. Critérios são apontados por Daniel González Lagier como aptos a estruturar
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racionalmente uma inferência probatória. Entre eles se destacam a quantidade e a
diversidade dos meios probatórios; a demonstração de impossibilidade de ter ocorrido
hipótese diversa da que se quer provar e a coerência. E, ainda, se a máxima experiência
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tem corroboração ou comprovação científica. Jordi Nieva Fennol aponta ser
fundamental trazer fundamentos de outras ciências à valoração das provas. Pois a
ciência jurídica ainda não conseguiu, talvez jamais consiga, expressar mais
racionalmente do que estabelecer como critério de racionalidade aos juízes as regras de
“máximas experiências” e “sana crítica”; mais que isso, seria regressar ao sistema legal
de valoração das provas. Identifica que para cada meio de prova normalmente há uma
ciência diversa que a jurídica apta a conferir racionalidade a sua respectiva inferência.
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A neurociência e as provas judiciais

A percepção de que as provas devem ser vistas de forma multidisciplinar não é tão
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recente. É defendida por William Twining há quase duas décadas, que por sua vez diz
que a ideia inicial é de Bentham, quando em 1810 expressou: “The field of evidence is
no other than the field of knowledge”. Atualmente é evidente a aproximação de diversas
ciências ao campo das provas judiciais. A biologia, em diversos aspectos, mas sobretudo
com os exames do DNA, a medicina, a psicologia, a informática e muitas outras áreas do
conhecimento científico trazem bases sólidas e racionais para as inferências probatórias.
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Como diz Twining : “ Evidence as a multi-disciplinary subject is about inferencial
reasoning”. É o momento, portanto, de sedimentar esta aproximação, seja para ampliar
o leque dos meios probatórios, como também para garantir uma racional valoração das
provas, a qual deve ocorrer tanto para a formação dos meios de prova, como também
para valorá-los.

6 Aproximações das demais ciências à formação dos meios de prova (dados probatórios)

A valoração das provas se dá sobre o conjunto de elementos de juízo, que são os meios
de prova. Os meios de prova são os dados voltados a esclarecer a ocorrência ou não do
enunciado fático. É “tudo aquilo que permite conhecer os fatos relevantes da causa, ou
seja, o que permite formular ou verificar enunciados assertivos que servem para
32
reconstruir esses fatos” . São meios de prova, entre outros, as declarações das
testemunhas, partes e experts, a apresentação de documentos, os laudos periciais, o
reconhecimento judicial.

É no campo da formação das provas técnicas que nas últimas décadas se viu cada vez
mais respaldo científico. Isto é facilmente perceptível diante de novas mas também
outras tradicionais ferramentas que envolvem as provas técnicas. Uma das mais
famosas é o exame do DNA, que serve tanto de meio de prova para comprovar o
vestígio de um crime, como também a filiação de certa pessoa. Nota-se que os avanços
de cada prova científica estão ligados ao avanço da ciência à qual conecta-se, por sua
vez, à medicina, psicologia, física, biologia e química.

No entanto a experiência passada, muitas vezes timbrada por uma empolgação inicial,
com a descoberta de uma nova tecnologia que pudesse servir como meio de prova,
aponta a ocorrência de equívocos decorrentes de falhas do mecanismo técnico, ou na
apreciação das informações por ele transmitidas.

Casos emblemáticos, como o ocorrido em 2004 em que envolveu o advogado Brandon


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Mayfield ao atentado terrorista em Madrid – que nem estava no local, mas suas
impressões digitais supostamente sim –, chamaram a atenção da comunidade científica
e do mundo jurídico sobre a potencialidade dos erros advindos de provas técnicas
consideradas quase perfeitas.

O questionamento sobre a validade de provas técnicas tem como caso embrionário o


julgamento célebre Frye v. United States, em 1923. Neste caso, a corte americana de
Columbia sinalizou que para uma prova técnica ser válida antes era preciso passar pelo
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critério do reconhecimento científico .

Aproximadamente setenta anos depois, em 1993, estabeleceu-se considerado por


muitos como mais importante julgado sobre a validade da prova técnica, o caso Daubert
v. Merrel Dow Pharmaceuticals. Neste precedente a Suprema Corte Americana descreveu
quais são os critérios de validade para a utilização de qualquer nova técnica relacionada
à prova científica. Indicou a Corte que para ser utilizada a técnica necessita o respeito de
certos requisitos, são eles: a) que possa e tenha sido submetida a exame para
comprovar sua solidez científica; b) que tenha sido submetida a revisão por pares e
objeto de publicação científica; e c) que tenha sido objeto de reconhecimento ou
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aceitação geral na comunidade científica.

É por essa razão que atualmente os exames via polígrafos não são na maior parte dos
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casos admitidos como meio de prova. A perspectiva inicial quanto ao uso do polígrafo foi
que seria ele capaz de demonstrar quando uma pessoa estivesse mentindo. Todavia,
percebeu-se que este somente registra uma atividade fisiológica referente à excitação do
sistema nervoso, que pode estar ligada ou não a uma mentira. Essa associação
praticamente automática entre polígrafo e detecção de mentira gerou muitos equívocos
36
em valorar os resultados da sua utilização.

Os critérios do caso Daubert hoje são considerados os mais abalizados para a admissão
de um meio de prova técnica em um processo judicial. É sobre os meios de prova que se
faz as inferências para verificar a comprovação do enunciado fático, que pode levar
alguém à condenação. Logo, a aproximação dos conhecimentos técnicos com respaldo
científico para a constituição de meios de prova é fator importante para garantir uma
maior racionalidade na inferência. Mas, em que pese a evolução avassaladora, e a
importância da interferência da tecnologia na produção dos meios de prova, é preciso
respeitar os critérios científicos assinalados.

7 A neurociência

A neurociência é a ciência que estuda o cérebro e seu funcionamento; é uma das áreas
da medicina que mais se tem avançado nos últimos anos. Esta evolução está ligada ao
estabelecimento de ferramentas tecnológicas capazes de observar por sinais e imagens e
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a estrutura do cérebro em movimento. O estudo das neurociências ajudam a
compreender a complexidade do funcionamento cerebral e as articulações entre o
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cérebro e o comportamento.

Costuma-se marcar o nascimento da neurociência em 1888 quando Santiago Ramón y


Cajal descobre que o cérebro é uma rede de células, que são os neurônios. Após,
Charles Sherrington verificou as conexões entre elas e Edgar Adrian registrou as
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atividades bioelétricas em todo o sistema nervoso . Todavia, somente na década de
sessenta do século XX, surgiu o termo neurociência, isto para definir um campo
particular dos estudos interdisciplinares a respeito do sistema nervoso do cérebro. Em
1971 foi fundada a Society for Neuroscience, e anos depois o assunto passou a ser
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debatido em revistas especializadas.

No final anos 80 do século passado George Miller y Michael Gazzaniga focaram em


determinar como o funcionamento do cérebro enseja a atividade mental; e
denominaram esse ramo da neurociência como “neurociência cognitiva”, voltada para
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demonstrar como o cérebro ativa a mente.

As implicações da neurociência podem acarretar no nascimento de uma das revoluções


científicas de maior impacto nos últimos tempos, o que implica consequências sociais
importantes, em várias áreas, afirma René Molina Garcia, no trabalho Neurociencia,
42
Neuroética, Derecho y Proceso.

8 A aproximação da neurociência ao direito

É hora de aproximar a ciência jurídica à biologia e ao estudo do cérebro. Este


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pensamento deve ganhar força. É o que diz Yuval Harari . Constata o pesquisador que
cada vez mais os cientistas percebem que comportamento humano é determinado por
hormônios, genes, e sinapses, são essas “as mesmas forças que determinam o
comportamento de chimpanzés, lobos e formigas”, e acrescenta, “nossos sistemas
jurídicos e públicos tentam varrer tais descobertas inconvenientes para debaixo do
tapete. Mas, com toda franqueza, por quanto tempo podermos manter o muro que
separa o departamento de biologia dos departamentos de direito e ciência política?”

Essa aproximação pleiteada por Yuval Harari já está em curso. Na Universidade de


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Vanderbilt , em Nashville, Estados Unidos, há um campo de investimentos pela
MacArthur Foundation, pesquisas e publicações, nesta nova área do direito denominada
“neurolaw”.
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A neurociência e as provas judiciais

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Por sua vez, Camilo José Cela Conde e Enric Munar Roca estão desenvolvendo
interessante pesquisa “Crimen, juicio y moral: un modelo de interpretación de la
dinámica de las redes cerebrales en juicios morales realizados por jueces y delincuentes”
na Universitat de les Illes Balears voltada a identificar o que passa no cérebro dos juízes
e criminosos ao tomar decisões morais.

A percepção da inevitabilidade de aproveitamento das novas ferramentas introduzidas na


comunidade científica pela neurociência no direito vem se alastrando velozmente. Talvez
até um pouco com atraso, comparando com outras áreas do conhecimento, como a
economia. Daniel Kahneman venceu o prêmio conhecido como o Nobel de economia em
2002, exatamente fazendo essa conexão entre neurociência com a tomada de decisões
na área econômica.

São várias as aplicações da neurociência ao direito atualmente em curso. Uma das mais
interessantes tem como base os experimentos de Libet na década de 80 do século XX.
Alguns autores diante do resultado desses experimentos chegam a defender que a
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liberdade humana é uma mera ilusão. Após os experimentos de Libet fortaleceu, por
exemplo, na área do direito penal, o questionamento sobre a existência do livre-arbítrio,
e qual a repercussão disso na culpabilidade.

Outra área interessante resulta em demonstrações que a capacidade de tomar decisões


cunhadas pela moralidade possam ter relação com a constituição fisiológica e o sistema
de funcionamento do cérebro de cada indivíduo. O que obviamente, deixa um campo
incrivelmente aberto para especulação sobre até que ponto uma pessoa é responsável
pelos seus atos, e pode ainda gerar uma revisão gigantesca em muitos fundamentos
jurídicos.

Uma das apostas da neurolaw é desenvolver instrumentos que permitam dentro de um


processo judicial introduzir dados biológicos do agente criminoso. Já há antecedentes de
intervenções biométricas em juízos reais. Em um caso ocorrido em 2005 a evidência
neurocientífica mudou o rumo de uma sentença judicial. O norte americano Grady
Nelson esfaqueou sua esposa setenta e uma vezes, e também seus filhos. Nelson
recebeu pena de morte. Mas a defesa alegou que o consumo de cocaína havia danificado
o cérebro do réu, e que ele predispunha de atos de violência involuntária. Apresentaram
análises quantitativas de eletroencefalografia que demonstravam atividade cerebral
alterada. A Corte da Flórida admitiu a evidência e em 2010 alterou a sentença não mais
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para a pena de morte mas para a prisão perpétua.

Já há, também, possibilidade de compreender, no campo da neurociência, como as


pessoas apresentam condutas maliciosas. Aplicado ao direito, esse conhecimento será
capaz de identificar se alguém cometeu um crime ou mesmo se poderá cometer no
48
futuro.
49
Daniel González Lagier esclarece com propriedade que não se pode confundir a
neurociência com as diversas “neurodisciplinas” que se proliferam ligadas a ela, tal como
a neuroética. Diz que a neurociência é uma ciência em sentido estrito ainda que possa
não parecer haver um conjunto de teorias comumente aceitas. A neuroética, pelo
contrário, ainda que pretenda ter uma conexão estreita com a ciência parte do
descobrimento dos neurocientíficos, extrapola esse âmbito de descoberta com
interpretações que os submergem em problemas conceituais e metodológicos próprios
da filosofia e das ciências sociais. Afirma que não é igual constatar que quando se realiza
uma ação simples, como mover o dedo, o potencial de preparação do cérebro se ativa
350 milésimos de segundos antes do momento da tomada consciente da decisão (campo
da neurociência), com a inferência de que esse dado ou constatação indica não haver
livre-arbítrio (interpretação da neuroética). Conclui Gonzalez Lagier que a maioria das
notícias espetaculares tem a ver com a evolução das técnicas de neuroimagem, que tem
dado lugar ao que se tem chamado de neurociência cognitiva, isto é, o estudo do
funcionamento do cérebro nos processos de aquisição do conhecimento e a formação dos
estados mentais. É neste aspecto da neurociência que segue o presente trabalho.
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A neurociência e as provas judiciais

9 A neurociência como meio de prova

Uma área certamente do direito em que já há influência da neurociência é o campo das


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provas. Michele Taruffo elenca algumas situações em que a neurociência poderia servir
como meio de provas e trazer informações em um processo judicial. São elas: a) para
provar a natureza e a gravidade de uma lesão cerebral; b) determinar se um sujeito
sente dor e com qual intensidade; c) estabelecer se uma lesão cerebral condiciona o
comportamento físico do sujeito; d) descobrir se certa lesão cerebral incide sobre a
vontade do sujeito; e) provar, a partir de certos dados sobre o cérebro do sujeito a
existência ou não de algum vício de vontade ao celebrar um contrato; f) estabelecer se
uma lesão cerebral pode reduzir ou eliminar a voluntariedade de um comportamento
supostamente delitivo; g) averiguar a falsidade ou verdade de uma declaração; h) e,
mostrar a ausência de voluntariedade de qualquer comportamento.

Este grande número de possibilidades do uso da neurociência como meio de prova,


advêm do surgimento de novos aparatos tecnológicos para examinar o cérebro.

Instrumentos estão sendo desenvolvidos para enunciar o testemunho de uma pessoa


sem que ela precise falar. A captação das informações adviriam diretamente do cérebro
da pessoa. Por enquanto, mais solidamente, o que existe são equipamentos aptos a
medirem o funcionamento do cérebro na detecção de uma mentira. Hoje não com
grande precisão de certo, mas no futuro bem próximo talvez. Uma das mais importantes
técnicas capazes de medir a atividade cerebral é a chamada RMf (ou fMRI). Por meio
dela observa-se que ao mentir há uma maior atividade em certas áreas do cérebro. Essa
ativação a mais é medida pela identificação de maior quantidade de oxigênio na
hemoglobina na região do cérebro. A quantidade de oxigênio faz com que aumente a
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intensidade do sinal magnético, que é atestado por imagens tridimensionais .Esse
método, no entanto é questionado cientificamente. Isto pois estudos retratam a
inexistência de um local exato no cérebro onde a mentira possa estar. Como dizem
52
Gonzáles e Manzanero o ato de mentir é uma atividade complexa que implica múltiplas
estruturas cerebrais.

Ultimamente, surgiram novas e interessantes técnicas na área da neurociência, como o


P300 e o N400. Partindo da constatação que os neurônios se acendem eletricamente, e
formam uma rede de circuitos elétricos, descobriram os investigadores que certas
ocorrências sensoriais, motores ou cognitivas provocam flutuações no
eletroencefalograma, as quais chamaram de “ potenciales evocados ” ou “ event-related
potencial”. Estas técnicas referem-se à detecção de uma onda chamada P300, a qual é
obtida em resposta a estímulos visuais e auditivos. Com base no P300, o pesquisador
53
Lawrence Farwell desenvolveu a metodologia denominada brainfingerprinting para ser
usada em investigações policiais. Consiste em um exame de eletroencefalograma
mediante sensores colocados no couro cabeludo, de forma não evasiva, com aptidão
para medir a resposta do cérebro a certos estímulos que se apresentavam, tais como
palavras, fotos e frases. Um sistema informático mede e informa se o sujeito conhece ou
não os dados a ele mostrados. Assim, é capaz de revelar se a pessoa presenciou ou
viveu uma situação com aquele objeto. Este artifício hoje é muito interessante em
auxiliar nas investigações criminais, sobretudo para localizar objetos ou vestígios de
ilícitos. Mas como o fRMI, o P300 e também o mais recente N400 que é uma evolução do
P300 (com detecção de ondas de forma mais rápidas) não apresentam validez científica
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na detecção de mentira .

É inegável a importância da evolução científica para a formação dos meios de prova, e


com isso o fortalecimento da garantia de maior racionalidade nas inferências. Neste
contexto aponta-se os exames de DNA, a evolução da medicina legal, os laudos médicos
psiquiátricos, e a psicologia do testemunho. No entanto, o meio de prova técnica para
que tenha validade precisa passar pelos critérios do caso Daubert. E, por sua vez, a
aplicação da neurociência como de meio de provas ainda é muito recente, e ainda não
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passa por tais critérios. Daniel Gonzalez Lagier vê como problemática a utilização da
neurociência como prova em juízo, pois o status científico se encontra em estado muito
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A neurociência e as provas judiciais

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incipiente, padecendo de confiabilidade suficiente as suas aplicações.

Ademais, há a questão do impacto aos direitos fundamentais a qual pode advir da


57
admissão das evidências neurocientíficas como meio de prova. Tanto Nieva Fennol ,
58
como Villamarín Lopez apontam que tal uso pode redundar na violação ao direito de
não produzir provas contra si mesmo e também ao direito à intimidade. Neste último
aspecto fica claro que ao ter em mãos os dados cerebrais do agente poderá o Estado
acessar a intimidade de uma vida, além de tendências ideológicas e pessoais. São
questões ainda em aberto, mas que inicialmente já se colocam como barreira, ao lado do
não preenchimento dos critérios Daubert, para a utilização de provas neurocientíficas
como meio de prova.

A seguir ver-se-á sobre a possibilidade de alguns fundamentos da neurociência serem


utilizados não para a formação do meio de prova, mas no ato sua valoração.

10 A valoração da prova como ato de decisão advindo do cérebro

Após a constituição dos meios de prova, eles serão valorados pelo magistrado. A
valoração é uma decisão a respeito da comprovação ou não, por meio dos elementos
59 60
probatórios, da hipótese fática enunciada. Jordi Nieva Fennol diz que “a valoração da
prova é uma atividade mental do juiz na qual avalia criticamente os dados que percebe,
e que não se realiza em uma fase absolutamente precisa do processo”. Assinala Amalia
61
Amaya “ Moreover, it is hard even to image how we can imbibe the evidence we
‘see’without perfoming some sort of mental analysis.”

Para saber se a neurociência pode auxiliar o juiz ao valorar os meios de prova é


necessário responder a uma questão: os atos de decisão partem ou são formados em
grande parte pelo sistema nervoso cerebral? A resposta intuitiva é sim, mas merece ela
ser fundamentada, mesmo que em brevidade, com base na filosofia e ciência sobre a
relação mente, corpo e cérebro.

Descartes dizia que a mente era uma substância distinta do corpo humano. Defendia a
teoria dualista na qual a realidade era formada por entidades físicas e mentais. A mente
era algo livre e indestrutível, enquanto que o corpo era determinado, divisível e
destrutível. A mente, portanto, não era ligada ao corpo. Atualmente é dominante entre
os filósofos e cientistas a teoria monista, segundo a qual só existe uma entidade que é a
62
física; estando a mente a ela integrada. Mas onde a mente – que é da onde vêm as
decisões, a consciência, os sentidos, as sensações, e os sentimentos – está situada neste
63
contexto físico? António Damásio aponta para um sistema pelo qual: “Não existe
mente sem corpo. Nosso organismo contêm um corpo, um sistema nervoso e uma
mente que é derivada de ambos”. Nota-se, nesta linha, que as decisões não são
tomadas exclusivamente no âmbito do cérebro, mas dentro de um sistema complexo
maior que envolve todo o organismo humano, que por sua vez, é afetado pelo entorno, o
64
ambiente externo. No mesmo sentido Taruffo diz que a consciência não é algo que
sucede no cérebro, como a digestão que se produz no estômago, mas sim do contato
com o mundo exterior, em completa interação de cérebro, corpo e mundo”.

Pardo e Patterson, e Hacker e Bennet perfilham este mesmo entendimento, mas


acrescentam que a mente não pode estar reduzida a um órgão, que é o cérebro, em
65
razão de uma falácia que chamam de mereológica. Partem da ideia de que não se
pode atribuir a conduta, o comportamento de uma pessoa, ao seu cérebro. Pois o
cérebro faz parte do todo que é o sujeito no qual funciona.
66
Pardo e Patterson vão um pouco mais além e dizem que a mente não é em absoluto
uma entidade ou uma substância, mas o conjunto diverso de habilidades exercidas por
uma pessoa.

Esse radicalismo final de Hacker e Bennet é revisto por Lagier, John Searle e Thomas
Nagel. Dizem eles que os atributos mentais de uma pessoa não podem ser reduzidos às
condições do que foi externamente observável. Lagier assinala que com esta redução da
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A neurociência e as provas judiciais

mente à conduta, às habilidades ou aos papeis causais, deixa de fora a perspectiva


subjetiva da primeira pessoa, que na opinião de autores como Searle e Nagel é
67
precisamente o característico do mental. Acrescenta que Hacker y Bennet não levam
em conta o fato que a neurociência tem estabelecido que existe relação causal entre os
estados cerebrais e os estados mentais. Em que pese o organismo, em sua
complexidade, e o ambiente (o entorno) influenciarem nas tomadas de decisões,
ninguém questiona que as decisões humanas advêm principalmente do sistema nervoso,
cujo centro principal é o cérebro.
68
Por isso diz Daniel González Lagier que “deve ser levado a sério que o funcionamento
do cérebro é causa da existência das experiências mentais.” E nesse sentido confronta
de certa forma Taruffo dizendo que a atribuição dos estados mentais ao cérebro ou a
seus componentes não é muito distinta da que se faz quando atribui ao estômago a
digestão. O fato de localizar a causa do processo, ou o encarregado da função, o
cérebro, não reduz o estado mental ao estado cerebral, e nem identifica o cérebro com o
69
sujeito.

Conclui Lagier que se os estados cerebrais são condições suficientes dos estados
mentais, e se a relação causal é “entre tipos de estados cerebrais e tipos de estados
mentais, técnicas neurocientíficas suficientemente avançadas, confiáveis, levariam a um
valor probatório decisivo, porque seria impossível estar nesse estado cerebral e não ter o
estado mental correspondente”.

Fixada, deste modo, a premissa de que a atividade cerebral – em que pese não ser o
único fator – está envolvida diretamente no processo de tomada de decisões, pode-se
concluir que o ato de valoração da prova do juiz está ligado ao funcionamento do seu
cérebro; e desta forma condicionado aos conhecimentos da neurociência.

A partir do condicionamento do ato de valoração da prova pelo magistrado aos


conhecimentos da neurociência surgirão os mesmos questionamentos da aplicação da
neurociência, como já esboçado, quanto aos meios de prova. O que se pretende neste
trabalho não é proclamar o emprego aos juízes da tecnologia, como o P300 ou N400, já
usado nas testemunhas, para conhecer o processo cerebral do juiz de valoração da
prova ( o que talvez poderá ser utilizado no futuro), ou mesmo o uso de equipamentos
mais modernos para visualizar as imagens do nível da racionalidade do juiz quando
estiver valorando as provas, e verificar se há no cérebro do magistrado indicativo de
grau comprometedor de preconceito, crença pessoal, e subjetividade. Nota-se que essa
parte da neurociência ainda é incipiente em relação às comprovações científicas, e muito
arriscada para ser aplicada tanto na constituição de meios de prova para uma
condenação, como também para controlar a subjetividade do juiz. Não é esse aspecto
que pretende-se a utilização dos conhecimentos e técnicas da neurociência para
controlar a valoração da prova pelo juiz, mas outro, como se verá adiante.

11 A possibilidade de aplicação dos conhecimentos da neurociência no ato de valorar as


provas

Quanto maior a cientificidade do meio de prova mais forte se torna a garantia da


inferência. Mas a prova precisa ser valorada, e é no ato em si de valorar a prova que a
70
ciência também deve se aproximar. Existe um espaço em que a subjetividade costuma
71
residir que também precisa ser preenchido por dados científicos, o cérebro do julgador.
É preciso preencher com o máximo de dados objetivos os espaços das razões subjetivas
72
do juiz, onde não chega a estrita racionalidade, ao eleger uma hipótese como provada.
E por que não trazer conhecimentos da neurociência para o próprio ato de valorar a
prova em si? Como funciona o cérebro do julgador ao valorar uma prova, e como a
ciência pode ajudar para controlar a racionalidade também neste campo?

Como visto, a aproximação do conhecimento científico, até agora, disse respeito do


raciocínio probatório na linha da inferência de um dado probatório à hipótese que se
quer provar. Destaca-se a importância da ciência para garantir a racionalidade neste
Página 10
A neurociência e as provas judiciais

salto. Todavia, o cerco à subjetividade do julgador deve ir mais adiante. E esse mais
adiante, diga-se, não é para fora. Mas sim para dentro do cérebro do julgador. Qualquer
valoração da prova partirá do cérebro do juiz. E deverá ele se ater, se o fim for mesmo
se aproximar a maior objetividade possível, longe da discricionariedade e subjetividade,
saber como funciona o seu cérebro. Este conhecimento é fundamental pois, como será
apresentado no próximo tópico, o estudo do cérebro, através da neurociência, trouxe
dados científicos sólidos indicando que ele funciona através de dois sistemas: um rápido
e outro devagar. O primeiro ligado à intuição, instinto, e o outro à racionalidade,
estratégia. Saber usar esses dois sistemas, e controlar o primeiro, através dos dados da
neurociência, é tarefa primordial em busca da racionalidade na valoração das provas,
73
evitando-se desvios cognitivos.

A seguir, passa-se a demonstrar dados obtidos pelo estudo da formação e


funcionamento do cérebro humano que serão muito úteis para uma melhor valoração
das provas.

Neste campo, a neurociência nos últimos anos vem fornecendo sólidas informações que
podem auxiliar ao juiz a melhor cumprir o seu papel decisório.

12 Como funciona o cérebro humano

O cérebro é órgão que existe em alguns seres, entre eles os humanos, há dois milhões
de anos. As características do cérebro do homo sapiens o possibilitou dominar o planeta
Terra, acarretando, inclusive, na extinção dos demais, como os homoerectus e o de
neandertal. O nosso cérebro – somos espécies do homo sapiens – destaca-se pela
cognição histórica e por transmitir informações sobre coisas que não existem. “Até onde
sabemos, só os sapiens podem falar sobre tipos e mais entidades que nunca viram,
74
tocaram ou cheiravam”, diz Harari. A capacidade de abordar ficções, como o direito,
empresas, estados, instituições, história, entre tantas outras, é a característica mais
peculiar da comunicação dos sapiens.

Nas últimas décadas desenvolveram-se estudos sobre o funcionamento do cérebro


humano, com importantes constatações. Descobriu-se que o cérebro possui dois
sistemas de funcionamento. “O sistema 1 opera automática e rapidamente, com pouco
ou nenhum esforço e nenhuma percepção de controle voluntário. O Sistema 2 aloca
atenção às atividades mentais laboriosas que o requisitam, incluindo cálculos complexos.
As operações do Sistema 2 são muitas vezes associadas com a experiência subjetiva de
atividade, escolha e concentração”, diz o vencedor do Nobel de Economia Daniel
75
Kahneman.

As duas formas de funcionamento do cérebro, a rápida e a devagar, têm relação com a


sua estrutura. Na década de 1990 pesquisadores do MIT (Massachusetts Institute of
Technology) descobriram um nó de tecido neurológico conhecido como gânglios basais.
São eles estruturas mais antigas, primitivas, situadas ao fundo do cérebro, perto do
76
tronco cerebral. Explica Charles Duhigg que eles: “controlam nossos comportamentos
automáticos, como respirar e engolir, ou a reação de susto que sentimos quando alguém
pula de trás de um arbusto. Mais para o centro do crânio há um nó de tecido do
tamanho de uma bola de golfe, que é parecido com aquilo que se encontra dentro da
cabeça de um peixe, réptil ou mamífero. Esses são os gânglios basais, um oval de
células que, durante anos, os cientistas não entendiam muito bem”. Ao redor desses
gânglios formam-se camadas que vão se aproximando do couro cabeludo, são elas “os
acréscimos mais recentes de um ponto de vista evolutivo. Quando você cria uma nova
invenção ou ri de uma piada, são as partes do cérebro que estão em ação. É lá que
acontecem os pensamentos mais complexos”.

Os gânglios basais, acima mencionados, são os responsáveis pelo sistema rápido do


cérebro, aquele através do qual se formam as decisões com base nos instintos, intuições
e hábito. Por sua vez, as camadas externas do cérebro são atreladas ao sistema de
tomadas de decisões mais lentas e complexas.
Página 11
A neurociência e as provas judiciais

77
Estudos comprovam que primeiramente apareceu no cérebro a estrutura ligada ao
instinto, o hábito e à intuição. Foi com o homo sapiens que se notou a evolução do
cérebro com o surgimento das suas camadas externas voltadas para a estratégia e
razão; derivando daí a cognição fictícia e os pensamentos mais complexos.
78
Daniel Goleman confirma essas duas formas de funcionamento do cérebro. A única
diferença é que as nominou diferente de Kahneman; em vez de sistema 1 chamou de
movimento ascendente, e o sistema 2 nominou de movimento descendente. Diz ele que
o ascendente ocorre quando as informações saem dos gânglios basais (parte inferior do
cérebro) ao neocortéx (camadas superiores do cérebro), e o descendente seria o
movimento contrário. Acrescenta que são dois sistemas distintos contudo influenciáveis
um pelo outro.

O movimento ascendente (ou o 1) é o veloz, involuntário, intuitivo, impulsivo, executor


das rotinas habituais. É um movimento “multitarefa que acompanha uma profusão de
informações em paralelo, incluindo detalhes do que nos cerca e que ainda não entraram
completamente em nosso foco. Ele analisa o que está em nosso campo de percepção
antes de nos deixar saber o que selecionou como relevante para nós.” E o sistema
descendente (o “2”) é aquele em que se leva mais tempo para deliberar sobre o que lhe
79
é apresentado, avaliando uma coisa de cada vez e aplicando análises mais ponderadas.

Embora tanto a decisão rápida advindas do instinto ou a devagar podem destoar da


realidade (afinal os humanos – até na sua espécie sapiens – são fadados a erros), o
reconhecimento do funcionamento desses dois sistemas de funcionamento do cérebro
são importantes para o aprimoramento das nossas decisões.

O método racional há muito tempo é explorado pela ciência, bem mais que o intuitivo.
“A mente intuitiva é um dom sagrado e a mente racional, um servo fiel. Criamos uma
80
sociedade que honra o servo e se esqueceu do dom”, disse Albert Einstein certa vez.
Por isso nota-se ultimamente o foco maior da ciência a forma e a importância das
deliberações rápidas advindas de uma primeira impressão frugal e intuitiva.

Descobriu-se que as decisões rápidas são tomadas abaixo da consciência, num


81
“inconsciente adaptável” pelo comportamento. E, é neste inconsciente que reside a
percepção de alerta diante das situações de perigo. Nele define-se e chega-se a
82
conclusões sem que os fatos sejam imediatamente revelados . Nesses momentos
surgem sinais em nosso corpo, como por exemplo, o funcionamento das glândulas
sudoríparas nas palmas das mãos. O que ocorre abaixo da nossa consciência não pode
ser ignorado, e em muitas situações é necessário confiar no sistema cerebral intuitivo e
83
instintivo.

Há, ainda, uma vantagem especial em se utilizar o inconsciente como meio de tomada
84
de decisões. É que com ele não haverá muito gasto de energia , o que normalmente
ocorre ao utilizar o sistema “2” do cérebro.

Estudos atuais indicam que o aproveitamento do sistema 1 (ou ascendente) está ligado
aos hábitos. O hábito consiste na repetição de comportamento de forma inconsciente, e
85
está inserido no sistema 1. Charles Duhigg , em sua pesquisa, aponta que ao agir de
forma habitual há menos gastos de energia, pois com o hábito se desliga o esforço
racional e metódico. A vantagem é que essa energia economizada, na atividade cerebral,
pode ser realocada em outros propósitos.

Em que pese partirem de setores distintos do cérebro, o hábito pode ser moldado pelo
comportamento racional. Pode ele ser controlado e construído conforme a nossa vontade
consciente. Esse é um ponto importante da teoria de Duhigg, que sinaliza o controle e
entendimento do hábito como forma de aprimorar o comportamento humano. Isto quer
dizer que o sistema 1 do cérebro controlado pelo sistema 2 pode trazer vantagens
enormes para a tomada de decisões.

Página 12
A neurociência e as provas judiciais

Exemplos de adaptação do hábito ao desejo, vontade e objetivos de pessoas que se


86
tornaram sucesso são muitos. Em sua obra, Malcom Gladwell apresenta empresários,
gênios do rock, e programadores de software – que se enquadram na categoria dos “fora
do comum” – e que para chegarem ao sucesso utilizaram-se do “poder do hábito”. Para
o sucesso é preciso talento inato mais treinamento, esforço e repetição. Também
87
comprova isso a regra das dez mil horas de Daniel Levitin . Ele identificou que
importantes símbolos da história, como Mozart, Bill Gates, os Beatles, antes de
demonstrarem a sua “genialidade” e destreza passaram muito tempo se preparando,
estudando, praticando ou tocando. No Brasil, serve-se de exemplo o caso de Zico,
jogador do Flamengo, exímio cobrador de faltas, mas para isso depois de todos os
treinos dedicava horas aos chutes em direção ao gol. Em sua autobiografia “Born to Run”
88
Bruce Springsteen avalia lendas da rock, deixando claro que para uma carreira
constante é preciso não somente a inspiração, talento e puro instinto, mas também
estratégia, planejamento e desenvolvimento pessoal. “Grande parte dos momentos mais
gloriosos da história da música parecem ter nascido duma explosão de talento puro e
instinto criativo (alguns foram mesmo!)”, diz Bruce, “ mas... se quisermos manter a
chama brilhante, pujante e duradoura, precisamos nos ancorar em algo para além dos
nossos instintos básicos. Vamos precisar desenvolver algum tipo de habilidade e uma
inteligência criativa que nos leve mais longe quando o piso se tornar escorregadio (...)
depois de levarmos o primeiro pontapé no traseiro, é melhor que tenhamos uma
estratégia, pois é preciso algum grau de planejamento e desenvolvimento pessoal caso
tenhamos a intenção de ficarmos por aqui mais tempo do que os 15 minutos de fama.”

O que se vê, portanto, é que o sucesso está relacionado às tomadas de decisões rápidas
e as sensações intuitivas, mas também ao esforço, cientificidade, dedicação e, repetição,
moldado pelo sistema 2 (movimento descendente) do cérebro.

Para se obter êxito nas atividades humanas é preciso muita atenção aos sistemas de
funcionamento do cérebro, o rápido e o devagar. E dentro das atividades humanas vê-se
a área jurídica como campo primordial para aplicação dos novos conhecimentos da
mente humana. A estrutura do direito, bem como a valoração das provas, sofre muita
influência de como o cérebro funciona.

13 Importância da aplicação dos conhecimentos básicos da neurociência à valoração das


provas

Como a neurociência é um campo do conhecimento ainda em franco desenvolvimento,


não há uma classificação firme e definida de suas subespécies. Existe o que se pode
denominar um núcleo duro, que envolve o estudo da estrutura do cérebro, como se dá o
funcionamento físico e neuronal, isto é, voltado para a sua estrutura fisiológica. E, uma
outra parte, mais periférica, voltada para o estudo da relação da estrutura física e
funcionamento do cérebro com as emoções, comportamentos e tomadas de decisões.
89
Esta última aproxima-se à psicologia , e está inserida no campo da neurociência
90
cognitiva , cujo estudo abarca a repercussão da estrutura e funcionamento do cérebro
na formação das emoções, intuição, sentimentos, além da importância do foco,
estratégia, racionalidade, para a tomada de decisões.

No capítulo anterior deparou-se com a validade dos fundamentos científicos quanto aos
sistemas de funcionamento do cérebro e a sua repercussão na tomada de decisões, o
que tem grande impacto ao ato de valorar as provas.

É fundamental para quem valore a prova que tenha a consciência de como pode estar
influenciado por emoções, carga cultural, tradição, intuição, sentimentos e outros
91
pensamentos.

O Juiz ao valorar a prova o faz através do seu cérebro. E se a decisão advêm do cérebro
92
é inevitável que passe pelo sistema 1 (rápido). Atahualpa Fernandez assinala que esta
percepção rápida advinda da atividade cerebral precisa ser estudada, pois “o direito não
é, e jamais será predominantemente, um sistema teórico-racional de pensamentos, ao
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A neurociência e as provas judiciais

menos enquanto a genética não produza inéditos milagres nos cérebros das pessoas”.

Mesmo que seja inevitável que qualquer decisão parta do sistema 1, não se pode admitir
que seja ela concluída sem a atuação do Sistema 2; caso contrário será ela totalmente
93
irracional. Isto pois, o sistema 1, o automático, “é uma verdadeira usina de
enviesamentos, distorções e erros em cascata e manipula as informações, longe do
94
abrigo seguro da prudência, incorrendo em inconsistências e ilusões de controle.”

A necessidade da utilização do Sistema 2 ao valorar a prova é sentida por Nunes, Santos


e Silva e Pedron, os quais afirmam: “No que toca ao processo judicial, em que se deve
primar pela racionalidade da análise dos argumentos e provas trazidos pelas partes
acerca dos fatos postos em litígio, os basic assessments gerados pelo sistema 1 são
extremamente nocivos, visto que se corre o risco que simplificações de problemas
95
complexas conduzam a resultados equivocados”. Se ficar o magistrado limitado ao
96
sistema 1 “necessariamente produzirá uma decisão subótima, dotada de latente
subjetividade, eis que decorrente de uma análise viciada dos fatos e das provas dos
autos, pois, ainda que de forma às vezes inconsciente, dá maior valor às provas e
argumentos que confirmam sua opinião ou crença primária sobre o caso,
desconsiderando outros potenciais aspectos que poderiam infirmar sua decisão”.

Vê assim que a valoração racional da prova deve contar necessariamente com a atuação
do Sistema 2 do cérebro. O sistema 1 deve ser encarado como uma barreira a ser
ultrapassada. Não vale o argumento apenas de negação, ou de vedação de se decidir
com base na intuição. É necessário saber como superar essa barreira, através de um
procedimento. Este procedimento deve contar de forma imprescindível com a certificação
que o sistema 1 do cérebro é algo natural e que estará sempre presente em qualquer
decisão. No entanto, é necessário que o jurista que irá valorar a prova se mantenha
alerta “para resistir às deliberações forjadas pelos preconceitos explícitos ou implícitos,
97
que derivam de áreas cerebrais primitivas, em lugar das justificações consistentes.”
Isto pois “o cérebro do intérprete, em suas zonas impulsivas, produz automatismos que
podem compeli-lo ao rumo errôneo, a não ser que haja tempestivo exercício do poder de
98
veto das áreas corticais mais novas, em termos evolucionários”.

O homem como ser vivo é movido por instintos e emoções. Não adianta fechar os olhos
a esse dado do ser humano. Para a valoração da prova é preciso partir de uma premissa
real: o sistema 1 do cérebro estará sempre presente. Para que seja controlada, ou
mesmo diminuída a influência do sistema 1 no momento da valoração das provas, o
julgador deve admitir que a influência existe e pode ele estar sendo levado a decidir por
ela. E este controle, se dá pelo sistema 2 do cérebro. Sem uma intervenção do sistema 2
99
“há uma tendência de que as decisões resultem de intuições”. A boa notícia é que o
sistema automático, ou 1 do Cérebro, pode ser “programável pelo sistema mais novo da
100
racionalidade”.

E para que haja essa intervenção do Sistema 2 é relevante introduzir conhecimentos


básicos da neurociência na formação dos juízes.

14 Introdução de conhecimentos básicos da neurociência cognitiva na formação dos


juízes

Como sinalizam as teorias de Kahneman e Duhigg, sendo o cérebro um órgão adaptativo


o seu sistema 1 pode ser moldado pelo sistema 2 (racional). Isto é, com o exercício e a
repetição do comportamento racional, pode o sistema 1 ser organizado pela
101
racionalidade, tornando-se um hábito positivo.

Assim, o sistema 1 mesmo que irracional pode sofrer influência da racionalidade, e


funcionar de forma melhor, através de novos hábitos. Ou seja devem-se criar “novos
hábitos que funcionem como anteparos contra as predisposições comprometedoras do
102
julgamento”. “É que se o intérprete quiser abandonar condicionamentos danosos e
perseguir os resultados apropriados, tem o condão de fazê-lo, desde que, em vez da
103
ilusão de extingui-los, cuide de trocar por outros melhores” e assim “desligará o
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A neurociência e as provas judiciais

hábito de pensar apenas o imediato, incorporando o foco a longo prazo: e nutrirá o


hábito de desconfiar das próprias crenças, por mais sedutores que seja, ciente do viés de
confirmação”.
104
Juarez Freitas , referindo-se a Duhigg aponta: “Os hábitos nos moldam, em uma
triangulação estímulo-recompensa-rotina que opera espécie de loop, no qual o cérebro
tenta operar com o menos esforço possível. Os erros surgem quando o automatismo
conjuga-se com uma racionalidade pouco laboriosa, de modo a embargar a formação de
rotinas superiores. Por esse motivo, quando o intérprete desconhece o processo
formativo de hábitos e as bases neuras dos juízos, converte-se em verdadeira marionete
de atalhos mentais, levando a julgamento inconscientes, facciosos e autodestrutivos”.

Nessa perspectiva, mesmo que os hábitos não se extingam, podem eles serem
105
substituídos, e muitos vieses irracionais serem eliminados.

A ideia portanto é despertar aos juízes a possibilidade de controlar o sistema 1,


tornando-o, por meio de conhecimento, esforço e atenção, espaço a ser preenchido por
hábitos condizentes com o fim racional exigido pela valoração das provas.

O juiz ciente de que seu cérebro possui o sistema 1 de processamento das informações,
ao valorar um depoimento de uma testemunha, por exemplo, com o sistema 2 afastará
ao máximo os seus preconceitos, crenças, para chegar mais próximo da verdade. O
mesmo poderá ocorrer com a valoração de qualquer outro meio de prova, como
documentos, exames periciais e reconhecimentos pessoais, ou durante uma inspeção
106
judicial.

Nota-se que não há necessidade de que os juízes estudem ou conheçam como é a


estrutura física do cérebro (funcionamento físico e neuronal – isto é “o núcleo duro da
neurociência”), mas sim as consequências deste funcionamento na tomada de decisões,
e como agir para livrar dos efeitos das decisões vindas do sistema 1. Esse conhecimento
pode até se fundamentar na estrutura fisiológica, mas não é necessário que juízes ou
juristas cheguem a esse nível de profundidade de saber. O importante é que percebam
como as decisões são influenciadas pela estrutura e sistema do cérebro, e que isto é
107
uma grande ferramenta para restringir a sua subjetividade ao valorar as provas.

Ademais, para a utilização desse conhecimento não haverá qualquer violação as normas
morais ou violação à direitos fundamentais, como a intimidade. O que se terá será tão
somente a gerência pelo próprio juiz do conhecimento de como são formadas as suas
decisões, com base em dados científicos da neurociência cognitiva.

A maneira como deve se dar tal educação dos juízes pode ser traduzida pelas palavras
108
de Nunes, Santos e Pedron referindo-se a Burke. Dizem que “O desenviesamento (
debiasing) deve passar primeiramente, pelo conhecimento, pelos próprios sujeitos do
processo (em especial, juízes, advogados, e membros do ministério público), da
possibilidade de que estejam decidindo com base em critérios extrajurídicos ou opções
argumentativas não racionalizadas adequadamente, ainda que de forma inconsciente.”
109
Afirmam, outrossim, com base em estudo de Brandom deverão os sujeitos
empregarem “todo o seu know how em uma interação que distingue razões de não
razões a partir da extração de consequências e com uso de projeções”, não havendo de
tal modo o “descarte das crenças e dos desejos manifestos comportamentalmente”,
mas, ao contrário, o seu uso para avaliar a racionalidade.

Fica claro que é pressuposto para uma postura racional a percepção, e o não desprezo,
dos fenômenos dos vieses cognitivos. Essa percepção pode ocorrer extra processo, ou
seja, o magistrado fazer por si só uma análise das suas crenças, sesgos psicológicos,
intuições, e demais situações advindas do sistema 1 do Cérebro, como também permitir
110
durante a própria atividade processual , que os demais sujeitos do processo caso as
percebam as manifestem.

Por sua vez os juízes não poderão considerar a exposição ou demonstração pelas partes
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A neurociência e as provas judiciais

de seus vieses cognitivos algo pejorativo, mas fator que o faça compreender aquilo que
111
as vezes nem ele mesmo conhecia.

Sendo a valoração da prova ato decisório do juiz, e portanto sujeito aos equívocos
oriundos do sistema 1, conclui-se como relevante que os juízes tenham conhecimento
básico de como funcionam seus cérebros.

15 Considerações finais
112
Como assinala propriamente Molina Garcia , o direito, como ciência, deve abraçar sua
condição interdisciplinar; abrir seus conteúdos e revisar seus dogmas, instituições,
regras e princípios. Ou seja, deve-se admitir uma análise não só dos conteúdos
sociológicos, econômicos e políticos, mas também incorporar a seus estudos elementos
que derivem da psicologia, biologia e neurociência.

A ligação dos conhecimentos científicos como o funcionamento do cérebro com a


113
valoração das provas é algo que se aponta nesse contexto de interdisciplinaridade. O
preenchimento da subjetividade do magistrado ao valorar a prova com dados científicos
é algo de suma importância na busca da racionalidade.

Diante da pergunta do porquê a matéria probatória tem especial apelo e chama atenção
114
das pessoas em geral, William Twining sustenta como motivo, que todas as disciplinas
carregadas de empirismo compartilham de uma mesma família com problemas sobre
provas e inferências. O que se buscou neste trabalho foi minimizar um pouco os
problemas, fazendo a conexão de ciências diferentes, que diante da complexidade da
natureza são exigidas a caminharem juntas, intercruzarem para evoluírem, sob a ótica
da racionalidade.

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1 ALLEN, 2011.

2 O renomado neurocientista António Damásio aponta que a formação das nossas


decisões envolve um sistema complexo, com participação do corpo inteiro influenciado
Página 18
A neurociência e as provas judiciais

pelo entorno (objetos e eventos no ambiente que circunda o organismo), mas mesmo
com base neste enfoque, aponta a imprescindibilidade e relevância do sistema nervoso
para a tarefa de sentir, pensar e decidir (DAMÁSIO, 2018).

3 É lição de Jordi Ferrer Beltrán: “A função do processo judicial no esquema geral de


funcionamento do direito é a determinação da ocorrência de determinados fatos aos
quais o direito vincula determinadas consequências jurídicas e a imposição dessas
consequências jurídicas aos sujeitos previstos pelo próprio direito” (FERRER BELTRÁN,
2017: 50).

4 GASCÓN ABELLÁN, 2010: 76.

5 GONZÁLEZ LAGIER, 2013: 75.

6 Nota-se que a busca da verdade é o objetivo fundamental do processo, desde os


tempos de Benthan, que por sua vez defendia a não restrição de provas relevantes no
processo para que o que fosse provado correspondesse a verdade. No entanto, no século
XIX, teóricos alemães passaram a observar obstáculos de natureza epistemológica e
normativa na missão de alcançar a verdade no processo. Observou-se que as normas
processuais limitavam o real conhecimento do fato, e que era impossível encontrar a
verdadeira verdade no bojo de um processo. Dividiram a verdade em duas, uma forma
(que seria a obtida dentro do processo) e outra material (a do mundo real). Por seu
turno, Carnelutti, em meados do século XX, argumentou contra essa construção, dizendo
que a verdade era só uma: “o algo é certo ou não é” (FERRER BELTRAN, 2017: 68).
Desfez a conexão conceitual entre prova e verdade, agasalhando a tese do escepticismo.
Considerou a prova como meio tão somente de fixar ou determinar os fatos a serem
valorados pelo juiz, não tendo mais relação com a verdade. Mas como o labor doutrinal
não para, posteriormente a Carnelutti, são retomadas por muitos a ideia original de
Benthan da importância da conexão da prova com a verdade. Levou-se em conta que o
direito está estruturado para que as consequências jurídicas (sanções) sejam extraídas
da aplicação de uma norma a um fato. E, o sentido da justiça demonstra que este fato
não pode ser um fato aleatório, mas comprovado e corresponda a verdade (TARUFFO,
2016:142). A novidade dessa constatação é que a verdade não vem do resultado
probatório, pois este como já assinalado, pode não coincidir com a realidade do fato
ocorrido. Esta base teórica, racionalista e lógica da concepção das provas, traz a ideia
que é na atividade probatória que deve se empregar o máximo esforço para alcançar a
verdade. E que, a verdade está teologicamente ligada a atividade probatória, sendo sua
busca primordial para a formação de uma decisão justa, ainda que o resultado final não
seja com ela coincidente.

7 Apud TARUFFO, 2010:115.

8 ALCHOURRON e BULYGIN, 1989: 30.

9 MARINONI e ARENHART, 2015:49.

10 GONZÁLEZ LAGIER, 2013: 28 e 29.

11 António Damásio diz que “Nenhum dos cinco sentidos produz sozinho uma descrição
abrangente do mundo externo, embora nosso cérebro por fim integre as contribuições
parciais de cada sentido em uma descrição global de um objeto ou evento. O resultado
dessa integração dá uma descrição aproximada do objeto ‘inteiro’. Dessa maneira, é
possível gerar uma imagem razoavelmente abrangente de um objeto ou evento.
Provavelmente não será uma descrição ‘completa’, mas com certeza para nós, é uma
rica amostra de características; de qualquer modo, é tudo o que temos, dadas a
natureza da realidade à nossa volta e a estrutura dos sentidos. Felizmente, todos nós
estamos imersos nessa mesma ‘realidade’, que nos chega por amostras incompletas, e
todos temos limitações comparáveis na capacidade de formar imagens.” (DAMÁSIO,
Página 19
A neurociência e as provas judiciais

2018:97).

12 FERRER BELTRÁN, 2017:46.

13 E não custa dizer que ainda hoje percebe-se, como ocorre no Brasil, uma idolatria
irracional sobre a pessoa do juiz, como também de outras autoridades, incluindo
membros do Ministério Público.

14 IBÁNEZ, 2015: 252.

15 GASCÓN ABELLÁN, 2010: 15.

16 Um requisito mínimo de racionalidade consiste na possibilidade da decisão ser levada


ao crivo de uma outra pessoa, que seja ela justificada por um critério intersubjetivo, e
que, portanto, não seja controlado somente pela pessoa que decidiu. Para tanto, é
exigido uma motivação para a decisão, mas não de cunho pessoal e sim que possa ser
objeto de ajustes ou reanálise por outras pessoas. Assinala Jordi Ferrer Béltran que “o
problema da vinculação entre prova e convencimento ou crença do juiz é que nega essa
possibilidade de controle intersubjetivo e, portanto, de aplicação da racionalidade”.
(FERRER BÉLTRAN, 2017: 52)

17 IBÁÑEZ, 2015: 139.

18 Apud NIEVA FENNOL, 2010: 207.

19 A busca pela racionalidade para motivar a valoração probatória está presente desde
há muito tempo na história processual. Mas foi no século passado que estudiosos como
Serra Domingues, Francesco Carnelutti e Michele Taruffo passaram persegui-la com mais
intensidade, sob uma perspectiva epistemológica.

20 NIEVA FENNOL, 2010: 102.

21 Atualmente fornecem seguras soluções para este grande entrave na racionalidade


probatória grandes estudiosos e pesquisadores como Marina Gascón Abellán, Jordi Ferrer
Beltrán, Daniel González Lagier e Jordi Nieva Fennol.

22 NIEVA FENNOL, 2010: 124.

23 E se for, junto a possibilidade das decisões judiciais serem praticadas por inteligência
artificial. Sobre o tema processo judicial e inteligência artificial vide NIEVA FENNOL
(2018).

24 AMAYA, 2017: 76.

25 Apud. GONZÁLEZ LAGIER, 2013: 40.

26 As garantias são vínculos por meio dos quais certas afirmações se convertem em
razões pertinentes para apoiar as conclusões. São as “licenças da inferência”. Por sua
vez, uma garantia pode ser apoiada por um respaldo, que é o que demonstra a correição
ou a vigência dessa regularidade. Segundo Toulmin (2007: 140) os respaldos são
“outras garantias” que se situam “detrás de nossas garantias para mostrar sua
legitimidade”. São afirmações categóricas que servem para justificar a legitimidade da
garantia. Ainda sustenta Toulmin que como a garantia é composta por uma regra geral,
é possível haver uma exceção, que possa refutar essa regra. São os refutadores (
rebuttals), “circunstâncias através das quais a autoridade geral da garantia é deixada de
lado”. E para que um argumento seja plenamente válido deve ser afastada a incidência
do refutador.

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A neurociência e as provas judiciais

27 Essa garantia, ensina Daniel González Lagier, pode ser também de natureza
normativa ou conceitual.

28 GONZÁLEZ LAGIER, 2013: 57.

29 NIEVA FENNOL, 2016: 332.

30 TWINING, 2003: 97-107.

31 TWINING, 2003:97.

32 GÁSCON ABELLAN, 2010:77.

33 COLE, 2005.

34 VÁZQUEZ, 2015: 92 e 93. Em 1923, James Frye foi condenado por ter assassinado
Robert Brown. Inicialmente Frye confessou o crime, mas logo depois se retratou desta
confissão, e sua defesa ofereceu como prova de sua inocência que ele se submetesse ao
então muito novo método de análise de pressão sanguínea que supostamente servia
como detector de mentiras. Curiosamente, aponta VÁZQUEZ (2015), que esse
equipamento usado foi criado por William Moutlton Marston, criador do personagem
Mulher Maravilha, que entre suas habilidades estaria a aptidão mágica de obrigar as
pessoas a dizer a verdade. Enfim, o juiz de primeira instância excluiu esta prova pericial,
e condenou Frye. E o caso passou para a segunda instância, o fundamento do recurso
era que este equipamento demonstrava que as mentiras requeriam um esforço
consciente que refletia de forma particular no aumento da pressão sistólica, ao contrário
das afirmações verdadeiras. E a Corte de Apelação do Distrito de Columbia considerou
que “é muito difícil detectar o momento preciso em que um princípio ou descobrimento
científico cruza a linha que há entre sua etapa experimental e aquela em que é
demonstrável. Em algum lugar nesta zona de penumbra o valor da evidência a seu favor
deve ser reconhecido, e enquanto os tribunais recorrem um largo caminho para admitir
testemunhos de experts derivados de experimentos científicos ou descobertas bem
reconhecidas, e para isto as provas devem estar suficientemente fundadas para ter
aceitação geral na área relevante.” E o Tribunal considerou que a análise da pressão
sanguínea não estava suficientemente estabelecida pelas áreas da fisiologia e da
psicologia e excluiu a prova, confirmando a sentença que condenou Frye. Este critério do
caso Frye foi considerado adequado por grande parte dos Tribunais e da doutrina.

35 VILLAMARIN LÓPEZ, 2014: 58.

36 VILLAMARIN LÓPEZ, 2014: 33. A conclusão é que “o grave dano que pode causar
com um falso culpado, ainda que em uma porcentagem pequena de casos é
desaconselhável o uso do polígrafo, podendo no máximo ser usado em complemento a
outros procedimentos”. ( GONZÁLES e MANZANERO, 2018: 220/221)

37 TARUFFO, 2013 :15

38 TOLER RUSSO (2015:15).

39 GONZÁLEZ LAGIER. Sobre los presupuestos filosóficos de las pruebas


neurocientíficas. In: FERRER BÉLTRAN, Jordi; VÁZQUEZ, Carmen (coords.). Debatiendo
con Taruffo. Madrid, Barcelona, Buenos Aires, São Paulo: Marcial Pons. 2016, p. 386.

40 CORDA (2013: 109/110).

41 CORDA (2013: 110).

42 MOLINA GARCIA, (2013:44)


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A neurociência e as provas judiciais

43 YUVAL HARARI, 2016: 245.

44 Site: [https://www.macfound.org/grantees/857/]. Acesso em: 10.09.2018.

45 [https://evocog.org/research-projects/]. Acesso em: 08.02.2019.

46 O experimento de Libet sinalizou que quando é tomada uma decisão qualquer, seja
um movimento simples, como flexionar os dedos, o córtex motor do cérebro envia um
sinal elétrico aos nervos motores implicados no movimento. E se identificou uma certa
atividade elétrica no cérebro, cuja função parece se preparar para o movimento. E os
testes demonstraram surpreendentemente que este potencial preparatório não se
encontrava entre a decisão e o movimento, mas sim antes da decisão consciente
(aproximadamente 350 milésimos de segundo antes).

47 IBÁNEZ, GARCIA e MANES, 2017: 39.

48 Em estudo comandado por Augustín Ibánez, Adolfo M. Garcia e Facundo Manes


(IBÁNEZ, GARCIA e MANES, 2017: 40), avaliaram a o juízo moral de setenta e cinco
terroristas guerrilheiros presos, cada um deles cometeu em média, trinta e três
assassinatos. E em comparação com sujeitos controlados, seus perfis neurocognitivos
clássicos (atenção, inteligência, funções executivas e memoria) não evidenciaram
alteração nenhuma. Mas, em tarefas de juízo moral, julgavam suas ações
exclusivamente segundo o resultado e não sobre a base de intenção de causar dano.
Mediante métodos de classificação estadística, encontraram que o juízo moral anormal
(mas que qualquer outra medida cognitiva de agressividade) permitiu identificar 90 por
cento dos terroristas. E também demonstraram em estudo publicado na revista Brain,
que a amígdala (em diálogo com suas redes frontotemporales) necessita menos de 135
milésimos de segundos para detectar uma ação maliciosa. E no futuro talvez poder-se
tomar essas medições em delinquentes para ver ser há respostas atenuadas em dita
estrutura cerebral ou das redes em que participa.

49 GONZALEZ LAGIER, Daniel. Tres retos de la neurociencia para el Derecho penal. Site:
[https://www.academia.edu/35430450/Tres_retos_de_la_neurociencia_para_el_Derecho_penal_1].
Acesso em: 29.01.2019.

50 apud GONZÁLEZ LAGIER (2016: 389).

51 GONZÁLES e MANZANERO, 2018: 225; VILLAMARIN LÓPEZ, 2014: 83.

52 GONZÁLES e MANZANERO, 2018:225.

53 VILLAMARIN LÓPEZ, 2014: 89-90.

54 GONZÁLES e MANZANERO; 2018: 228.

55 NIEVA FENNOL, 2016: 703.

56 GONZÁLEZ LAGIER, 2016: 389.

57 NIEVA FENNOL, 2016: 704/707. Nieva Fennol defende a tese que não se pode
comparar os meios de prova neurocientíficos com outros, como o DNA, cujo objeto de
exame também é parte do corpo da pessoa. Diz que o potencial do cérebro é
impressionante, muito mais amplo que o DNA, e que “o cérebro somos nós”, “o cérebro
não é onde se encontra nossa intimidade, mas sim a própria intimidade. “Se ha
comprado el interior del cráneo con el interior del domicilio, señalando que si no se
puede acceder a este último salvo consentimento del reo o autorización judicial, con más
razon estaría vedado el acesso a algo irrefutablemente más íntimo como la cavidad
Página 22
A neurociência e as provas judiciais

craneal: La comparación es acertada, pero com una cautela importantísima: El cerebro


no debe ser explorable con una autorización judicial, salvo en casos de incapacidad
mental del reo” (2016:207).

58 VILLAMARÍN LOPEZ, 2014: 130/132. Entende Villamarín Lopez que não haverá
violação a tais direitos fundamentais se o investigado aceitar espontaneamente se
submeter aos exames neurocientíficos. Mas a informação obtida que não seja relevante
para o julgamento deverá ser destruída o quanto antes.

59 Diz FERRÉR BÉLTRAN (2007: 91), que mesmo sendo o conjunto probatório o objeto
sobre o qual o juiz toma a decisão final se o fato está provado ou não, não há
impedimento para que a valoração da prova seja realizada antes da sua formação ou dos
meios de prova. Há uma valoração in itinere que o julgador realiza durante a prática da
prova, mas esta valoração deve ter somente objetivo de detectar insuficiências em
relação ao peso ou a riqueza do conjunto de elementos de juízo para depois resolvê-la
(v.g., ordenar ou pedir de ofício uma nova prova para verificar a credibilidade de uma já
praticada, ou uma nova prova para verificar um conflito entre duas).

60 NIEVA FENNOL, 2010:32.

61 AMAYA, 2017:96.

62 Por esta linha o físico é o único irredutivelmente real e que, portanto, a mente deve
ser explicada a partir do material (ou eliminada). É a concepção dominante hoje entre
científicos e filósofos da mente. Mesmo para grande parte dos teóricos do monismo
prevalece a ideia dos estados mentais, isto quer dizer que eles devem ser aceitos.
Perfilha-se aqui a ideia de Daniel González Lagier (2016: 399) segundo a qual deve
prevalecer o materialismo ontológico, pois o mundo em que há vida é físico, mas
também deve ser considerada a existência dos estados mentais. Eliminar os estados
mentais seria uma loucura. Como aceitar que ninguém teve sede, dor, que nunca creu
em nada? Os estados mentais são perceptíveis por meio de experiência direta, por meio
da introspecção. Por sua vez, a eliminação da mente ao cérebro , “onde toda la vida
mental, espiritual, volitiva y cognitiva se reduciría al funcionamiento de las células
cerebrales y sus conexiones” teria uma grave consequência que seria o fim do
livre-arbítrio. E assim o homem estaria reduzido a uma “espécie de máquina do cérebro”
e “toda a sua vida estaria determinada mecanicamente pelo funcionamento sem controle
desta máquina” ( GONZÁLEZ LAGIER, 2016:391 e 393).

63 DAMÁSIO, 2018: 82.

64 apud GONZÁLEZ LAGIER, 2016: 404.

65 GONZÁLEZ LAGIER, 2016:391.

66 GONZÁLEZ LAGIER, 2016: 404.

67 GONZÁLEZ LAGIER, 2016: 407.

68 GONZÁLEZ LAGIER, 2016: 407.

69 “Não está dizendo que as intenções são estados cerebrais, mas sim que são causadas
por estados cerebrais. Há relação causal entre os estados mentais e o funcionamento do
cérebro.” (GONZÁLEZ LAGIER, 2016: 408).

70 Diz Jordi Nieva Fenoll “Quiero decir con todo ello que sólo siendo conscientes de todo
lo que puede influir en cada caso concreto, será posible que los jueces eviten los juicios
de valor apriorísticos que impiden una debida valoración de la prueba, precisamente
porque son realizados mucho antes de la misma”. Acrescenta ainda dizendo: “ Y es que
Página 23
A neurociência e as provas judiciais

no debe olvidarse que la valoración de la prueba es una actividade que debe estar
dominado por la lógica, pero que se ve condicionado por la psicología del pesamiento
que describe la percepción judicial, así como por la sociología que desvela el entorno del
juez.” (NIEVA FENNOL, 2010:25).

71 Da mesma forma que a testemunha vê um fato, o juiz também se põe diante do


conjunto probatório ou dos meios de prova. Da mesma forma que uma testemunha pode
ter seus erros e interpretação sobre a realidade fática, o juiz também poderá ter. Sobre
o tema a brilhante obra Prova Testemunhal: do subjetivismo ao objetivismo. Do
isolamento científico ao diálogo com a psicologia e a epistemologia, de Vitor de Paula
Ramos (RAMOS, 2018).

72 No campo da valoração da prova Jordi Nieva Fenoll cita estudos de Serra Dominguez,
Montero Aroca e Gorphe, os quais apontam que as máximas experiências que permitem
estabelecer a relação inferencial entre premissas e conclusões estão intrinsicamente
ligadas a um enfoque psicológico, e que o raciocínio probatório quando abandona algo
tão inseguro como a intuição ou a imaginação, apenas o substituem pela expressão
“máximas de experiência”. Diz que “se bem que a intuição é um mecanismo
extraordinariamente eficaz para tomar decisões rápidas na vida cotidiana, seu uso não
pode estender-se à algo que não tem porque ser rápido, nem muito menos irreflexivo,
como uma sentença. Isto é, o uso na valoração da prova por parte do juiz desse
conjunto difuso que constitui as chamadas máximas experiências, não pode se levar ao
extremo de substituir com essas máximas aquilo que as provas dizem, ou preencher
lacunas com o que não foi dito.” (NIEVA FENNOL, NIEVA FENNOL, 2010:129 e 2018:
113, 206/207).

73 Constata Juarez Freitas que: “A primeira providência para não enveredar em desvios
cognitivos consiste em conhecê-los. Nessa linha, significativos achados sobre o
funcionamento do cérebro precisam, o mais cedo possível ser incorporados pela
hermenêutica jurídica, de molde a lucidamente escrutinar aquelas predisposições
conducentes a erros sistemáticos de julgamento” (FREITAS, 2013: 223).

74 YUVAL HARARI, 2016: 32.

75 KAHNEMAM, 2012: 29..

76 DUHIGG, 2012, p. 31.

77 YUVAL HARARI, 2016: 41.

78 GOLEMAN, 2014: 32

79 GOLEMAN, 2014: 33.

80 GOLEMAN, 2014:.50.

81 GLADWELL, 2005: 16.

82 GLADWELL,2005: 19.

83 GLADWELL, 2005: 20.

84 GOLEMAN, 2014: 24

85 DUHIGG, 2012.

86 GLADWELL, 2008: 25.

Página 24
A neurociência e as provas judiciais

87 GLADWELL, 2008: 43 .

88 SPRINGSTEEN, 2016: 206-207.

89 Um dos campos da neurociência é a Neuropsicologia, a qual foi reconhecida no Brasil,


em 1988, com a fundação da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia. Segundo a
Resolução 002/04 da CFP a Neuropsicologia atua na “pesquisa da cognição, das
emoções, da personalidade e do comportamento sob o enfoque da relação entre estes
aspectos e o funcionamento cerebral”.
(https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2006/01/resolucao2004_2pdf.)

90 Como já assinalado por González Lagier, é a neurociência cognitiva: “o estudo do


funcionamento do cérebro nos processos de aquisição do conhecimento e a formação dos
estados mentais”
(GONZÁLEZ LAGIER, Daniel. Tres retos de la neurociencia para el Derecho penal.
[https://www.academia.edu/35430450/Tres_retos_de_la_neurociencia_para_el_Derecho_penal_1].
Acesso em: 29.01.2019.)

91 Diz Jordi Nieva Fennol que: “El juez tiene que saber por qué cree lo que piensa. Es
cierto que no estamos acostumbrados a dar razones de nuestras intuiciones, y a veces
hasta está socialmente mal visto buscar dichas razones (...), la convicción probatoria
debe ser una actividade principalmente producto de la razón, y no unicamente del
sentimento subjetivo”. (NIEVA FENNOL, 2010: 110).

92 ATAHUALPA FERNANDEZ, 2011: 189-213.

93 FREITAS, 2013: 240.

94 FREITAS, 2013:228. Referindo-se a Daniel Kanheman, acrescenta que: “o sistema


primitivo confunde facilidade cognitiva com verdade, abusa das heurísticas e simplifica
demais, especialmente ao substituir questões difíceis por fáceis, além de inventar
causas” e produz memórias fantasiosas.

95 NUNES, SANTOS e SILVA, e PEDRON, 2018: 62.

96 NUNES, SANTOS e SILVA, e PEDRON, 2018: 89.

97 FREITAS, 2013:226.

98 FREITAS, 2013:226.

99 NUNES, SANTOS e SILVA, e PEDRON, 2018: 62.

100 FREITAS, 2013: 228.

101 “Mais do que nunca é imprescindível que o jurista mantenha a mente empenhada
em trocar hábitos nocivos por saudáveis, ciente de que somos inescapavelmente o
conjunto de nossas rotinas mentais, das simples às mais elaboradas” (FREITAS, 2013:
240).

102 FREITAS, 2013: 224.

103 FREITAS, 2013: 240.

104 FREITAS, 2013:239.

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A neurociência e as provas judiciais

105 “De sorte que importa formar hábitos reflexivos e neutralizar, ao menos nas
situações de maior impacto, as decisões eviesadas” (FREITAS, 2013: 239).

106 Como disposto no artigo 481 do Código de Processo Civil brasileiro.

107 Para a máxima expansão da racionalidade durante o ato da valoração da prova é


preciso que os julgadores tenham consciência, e sejam educados a conhecer, quais os
efeitos na tomada de decisões do funcionamento dos sistemas cerebrais, “Conforme
afirmam Croskerry, Singhal e Mamede, o desenviesamento (debiasing) não é algo
simples, que pode ser praticado em um único ato: ‘o desenviesamento cognitivo envolve
mudanças que raramente acontecem por meio de eventos isolados, mas sim por uma
sucessão de estágios – de um estado de ignorância quanto aos vieses de cognição para
um estado de entendimento destas circunstâncias, para a habilidade de detectar vieses,
considerar a mudança, decidir mudar, então iniciar estratégias para a mudança e , por
fim, manter as mudanças” (NUNES, SANTOS e PEDRON, 2018: 203).

108 NUNES, SANTOS e PEDRON, 2018: 86, 202. E que é necessário “perscrutar como
viabilizar que o processo como garantia permita possibilidades efetivas de
desenviesamento (debiasing) de modo a não se tornar um mero lócus de legitimação
das pré-compreensões cognitivas dos decisores.” ( 2018: 154 e 155)

109 BRANDOM, Robert. Tales of the Mighty dead.

110 Neste sentido afirmam NUNES, SANTOS e PEDRON ( 2018: 171) que “a
responsabilidade no processo se sofistica a partir da virada cognitiva empreendida pela
psicologia comportamental e pelos estudos empíricos das heurísticas e dos vieses
cognitivos no campo jurídico, uma vez que o primeiro passo, como já apontado, é o de
perceber a racionalidade limitada (ou irracionalidade-automatismos) nas práticas
processuais cotidianas que exigem um constante comportamento contraintuitivo por
parte de todos aqueles que participem do espaço processual.”

111 NUNES, SANTOS e PEDRON, 2018:167.

112 MOLINA GARCIA, 2013.

113 “Entiendo imprenscindible que la formación del juez cuente con una vasta cultura
general, a fin de que pueda afrontar los problemas probatorios con mayores garantias de
êxito”. (NIEVA FENNOL, 2010: 96).

114 TWINING, 2003.

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