Parecer Juridico Inex. 04 2021 Demaess

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PARECER JURÍDICO

Inexigibilidade de Licitação nº 004/2021

RELATÓRIO

Cuida-se de pedido de parecer, quanto à inexigibilidade de Licitação para


Contratação de Escritório de Advocacia Especializado em Assessoria Jurídica para o
Departamento de Água e Esgoto de São Simão (DEMAESS), para defesa dos interesses da
respectiva administração indireta em todos os procedimentos administrativos e judiciais de
interesse do órgão, inclusive, perante o Tribunal de Contas dos Munícipios do Estado de Goiás
e diante do processo de concessão dos serviços de água e esgoto do Município.

Os autos estão instruídos com:

1. Solicitação;
2. Termo de referência dos serviços;
3. Declaração sobre estimativa do impacto orçamentário-financeiro;
4. Declaração de compatibilidade da despesa com o orçamento vigente;
5. Declaração de disponibilidade orçamentaria;
6. Despacho autorizando a abertura do procedimento;
7. Despacho de autuação;
8. Proposta de preços e documentação da sociedade de advogados selecionada,
consubstanciada nos seguintes documentos:
a. Atos constitutivos;
b. Comprovante de inscrição no CNPJ;
c. Certidões negativas de débito junto às fazendas, federal, estadual e
municipal;
d. Certificado de Regularidade com o FGTS;
e. Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas;
f.Curriculum Lattes dos responsáveis técnicos;
g. Atestados de capacidade técnica.

9. Razão da escolha do fornecedor e justificativa do preço subscrita pela CPL;


10. Encaminhamento para a procuradoria;

É o breve relatório.

DA FUNDAMENTAÇÃO

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A Constituição Federal de 1988 estabelece que, como regra, as contratação
realizadas pela administração devem ser realizadas por meio de procedimento licitatório
prévio, assegurando igualdade de condições a todos concorrentes, nos seguintes termos:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos


Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
...
XXI -ressalvados os casos especificados na legislação, as obras,
serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo
de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de
pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos
da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica
e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das
obrigações.

Logo, apesar de o procedimento licitatório ser a regra, a Constituição da República,


ao inaugurar o citado comando legal, ressalva que haverá casos especificados na legislação
em que a obrigatoriedade da licitação não será exigida.

A Lei Federal nº 8.666/93, ao regulamentar a previsão contida na Constituição


Federal, assim também prevê em seu art. 2º:

Art. 2o. As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras,


alienações, concessões, permissões e locações da Administração
Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente
precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.

No caso dos autos, se pretende realizar contratação por meio de inexigibilidade


de licitação, com fundamento no art. 25 da lei de licitações, que dispõe:

Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de


competição, em especial:
...
II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13
desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de
notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de
publicidade e divulgação;

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Ao analisar o citado dispositivo, fica evidente a natureza exemplificativa do rol nele
inserido, haja vista que, dos elementares fundamentos da hermenêutica jurídica, o dispositivo
analisado deve ser enfocado a partir de sua premissa maior, a qual, no presente caso, é a
inexigibilidade do ato de licitar decorrente da inviabilidade de competição.

Ademais, é certo que inexistem “palavras soltas” no texto da lei, portanto, a


expressão “em especial”, contida na parte final do caput do artigo 25 da Lei 8666/93,
demonstra que o legislador não exauriu as possibilidades de inexigibilidade às hipóteses
elencadas em seus incisos I, II e III, mas, especialmente, diante daquelas.

Assim já se manifestou o Tribunal de Contas do Estado do Paraná, que:

“Os casos de inexigibilidade de licitação não se exaurem nas


disposições legais, as quais consignam,
apenas exemplificativamente, algumas situações”
(Processo TC/PR 4707-02.00/93-5, publicado no informativo de
Licitações e Contratos – ILC, nº 53, jul./98, Curitiba: Zênite, p. 649) –
grifei.

Pode-se concluir, portanto, que, para a Administração Pública contratar serviços


técnicos de consultoria e/ou assessoria jurídica, seja por meio de advogado, ou de sociedade
de advogados, deve proceder-se mediante a inexigibilidade de licitação, com fulcro no caput
do art. 25, da Lei nº 8.666/93.

Isto ocorre porque não há como existir competição entre advogados, por força
doartigo 5º, do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, vinculado
diretamente à Lei nº 8.906/941, que proíbe o advogado de promover a mercantilização de sua
profissão, em que a competição é espécie:

Art. 5º. O exercício da advocacia é incompatível com qualquer


procedimento de mercantilização.

Esse é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás:

1Art. 33. O advogado obriga-se a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina.
Parágrafo único. O Código de Ética e Disciplina regula os deveres do advogado para com a comunidade, o cliente,
o outro profissional e, ainda, a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica, o dever geral de
urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares.
Art. 34. Constitui infração disciplinar:
VI -advogar contra literal disposição de lei, presumindo-se a boa-fé quando fundamentado na
inconstitucionalidade, na injustiça da lei ou em pronunciamento judicial anterior;

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APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
CONTRATAÇÃO DIRETA DE SERVIÇOS DE ASSESSORIA JURÍDICA.
CÂMARA MUNICIPAL. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO (ARTIGOS 13,
II, III E IV, E 25, CAPUT E INC. II, LEI FEDERAL Nº 8.666/1993).
INVIABILIDADE DA COMPETIÇÃO. OFÍCIO DE NATUREZA SINGULAR.
PRECEDENTES DO STJ E DO STF. RECURSO E REMESSA DESPROVIDOS.
(...)
3 - Não é permitido aos advogados a disputa pela captação de
clientes - infração disciplinar punida pela Lei Federal nº 8.906/1994,
Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 34, VI), e pelo
Código de Ética e Disciplina da categoria (artigo 33) -, evidente aí a
inviabilidade da competição. A conclusão é roborada pela
impossibilidade de julgamento objetivo das propostas apresentadas.
Deveras intrincada seria a tarefa da comissão de licitação de sopesar
qual dos licitantes inspiraria maior confiança ao chefe do poder
executivo, qual melhor conheceria a realidade administrativa local,
qual possuiria maior poder de persuasão escrita e verbal e maior
perspicácia diante do complexo cenário de atuação e, mais ainda, de
constatar se o trabalho prestado pelo advogado que ofereceu a
proposta de menor valor realmente atenderia a necessidade da
contratação. De mais a mais, a natureza intelectual do serviço
prestado pelo advogado, de per si, demonstra a singularidade do
serviço. Não se pode olvidar que as peças e pareceres produzidos são
marcados pelas características próprias da formação, estudos e
particularidades de cada advogado.
(...)
(TJGO, DUPLO GRAU DE JURISDICAO 307820-83.2013.8.09.0076, Rel.
DES. BEATRIZ FIGUEIREDO FRANCO, 3A CAMARA CIVEL, julgado em
31/01/2017, DJe 2209 de 13/02/2017).

DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.


PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTADA.
TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ADVOCACIA. INEXIBILIDADE DE
LICITAÇÃO. INCOMPATIBILIDADE COM A MERCANTILIZAÇÃO E COM
O JULGAMENTO OBJETIVO EXIGIDOS PELA LEI 8.666/1993.
PRECEDENTES DO STF. PROCURADORIA MUNICIPAL. AUSÊNCIA DE
PREVISÃO CONSTITUCIONAL PARA A CRIAÇÃO DO ÓRGÃO POR
CONCURSO. JUÍZO DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DO
ADMINISTRADOR.
1. A licitação, grosso modo, persegue a seleção da proposta mais
vantajosa para a administração a partir do incitamento de competição
e do julgamento objetivo das propostas apresentadas pelos licitantes,

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nos termos do artigo 3º da lei federal nº 8666/1993. Na hipótese em
embate a licitação impõe franca concorrência entre os advogados no
rastro da captação do cliente, enfrentamento que, à sabença,
constitui infração disciplinar punida pela lei federal nº 8906/1994 -
Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 34, VI), e pelo
Código de Ética e Disciplina da categoria (artigo 33). Soma-se a isso,
a impossibilidade de se realizar julgamento objetivo acerca de
proposições apresentadas pelos licitantes, verificado o vínculo de
confiança que circunda a contratação do representante judicial, além
das naturais dificuldades em se sopesar qual dos profissionais
habilitados seria o melhor para o exercício judicial da defesa do
município. Desta forma, porquanto embrionariamente incompatíveis
com a mercantilização e com o critério de julgamento objetivo (artigo
5º, lei federal nº 8906/1994), os serviços de advocacia compõem-se,
reflexamente, também inconciliáveis com a licitação.Precedentes do
STF e Súmula nº 04/2012/COP, Conselho Pleno da OAB.
(...)
(TJGO, DUPLO GRAU DE JURISDICAO 295899-63.2008.8.09.0154, Rel.
DES. GERSON SANTANA CINTRA, 3A CAMARA CIVEL, julgado em
20/08/2013, DJe 1373 de 27/08/2013).

Assim, com respaldo na jurisprudência do Egrégio Tribunal Goiano, é forçoso


concluir que a realização de procedimento licitatório para contratação de Advogado gera
disputa entre os profissionais e, consequentemente, ocasiona a mercantilização da profissão,
o que é vedado pelo Código de Ética e Disciplina da OAB (CED, art. 5º), sendo igualmente
vedado o oferecimento de serviços profissionais que impliquem, direta ou indiretamente,
inculcação ou captação de clientela (CED, art. 7º)2.

Ademais, complementando todo o acima articulado, evidenciamos que o Egrégio


Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás, através do Julgado nº 003/2006,
proferido nos autos do Processo nº 07847/2006, consignou que:

Processo nº 07847/2207
Julgado nº 003/2206
Enunciado: “Possibilidade de contratação de assessoria e consultoria
jurídica, mediante inexigibilidade de licitação, fundada na
inviabilidade de competição de que trata o caput do art. 25 da Lei n.
8.666/93, devendo, entretanto, estar o feito instruído de
conformidade com os artigos 26 e 38 da mesma Lei, principalmente

2Art. 7º. É vedado o oferecimento de serviços profissionais que impliquem, direta ou indiretamente, inculcação
ou captação de clientela.

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no que alude à razão da escolha do profissional ou empresa e a
justificativa do preço”.

Após demonstrado que o exercício da advocacia é incompatível com a regra do


dever de licitar, porquanto, enquadrado na exceção do art. 25, caput, da Lei nº 8.666/93, por
inviabilidade jurídica de competição, o que, por si só, é fundamento suficiente para
contratação dos serviços jurídicos por meio de inexigibilidade de licitação, cumpre-nos, ainda,
adentrarmos ao comando do inciso II do artigo 25 da Lei de Licitações e Contratos, o que
passamos doravante fazer.

Ainda, cumpre salientar ainda que o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado
de Goiás editou Enunciado de Súmula nº 08, em janeiro de 2020, nos seguintes termos:

“Admite-se a inexigibilidade do procedimento licitatório para


contratação de serviços advocatícios pela Administração Pública com
base na singularidade dos serviços técnicos, desde que atendidos os
requisitos do inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666/93.”.

Sobre o tema, o Tribunal de Contas da União - TCU editou a Súmula nº 252, que
traz o seguinte enunciado:

Súmula 252 – TCU: A inviabilidade de competição para a contratação


de serviços técnicos, a que alude o inciso II do art. 25 da Lei nº
8.666/1993, decorre da presença simultânea de três requisitos: serviço
técnico especializado, entre os mencionados no art. 13 da referida lei,
natureza singular do serviço e notória especialização do contratado.

Portanto, para a contratação direta, mediante inexigibilidade de licitação, com


amparo exclusivamente no inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666/93, devem ser preenchidos,
simultaneamente, três requisitos, quais sejam: a)serviço técnico especializado;b)natureza
singular; e, c)notória especialização do contratado.

Dado o objeto que se pretende contratar nos presentes autos, não há discussão
quanto ao cumprimento do requisito “serviço técnico especializado”, vez que se trata de
contratação de serviços advocatícios e eles encontram-se elencados no rol do art. 13, da Lei
de Licitações e Contratos.

Art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos


profissionais especializados os trabalhos relativos a:
...
II - pareceres, perícias e avaliações em geral;

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III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou
tributárias; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)
...
V - patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; ...

Já a notória especialização é conceituada pelo §1º do art. 25 da lei de licitações:

Art. 25...
§ 1o Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa
cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de
desempenho anterior, estudos, experiências, publicações,
organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos
relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é
essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do
objeto do contrato.

Tal requisito tem a finalidade de evitar que a Administração Pública contrate quem
ela bem entender, evitando assim o despropósito da contratação de pessoas não qualificadas
para a execução de serviços.

Sobre a prerrogativa da Administração de avaliar a notória especialização do


pretenso contratado, cabe aqui trazer os ensinamentos do Jurista Eros Roberto Grau (in
Licitação e Contrato Administrativo - Estudos sobre a Interpretação da Lei, Malheiros, 1995,
pág. 77), que brilhantemente nos esclarece:

“... Impõem-se à Administração - isto é, ao agente público destinatário


dessa atribuição - o dever de inferir qual o profissional ou empresa
cujo trabalho é, essencial e indiscutivelmente, o mais adequado
àquele objeto. Note-se que embora o texto normativo use o tempo
verbal presente (‘é, essencial e indiscutivelmente, o mais adequado à
plena satisfação do objeto do contrato’), aqui há prognóstico, que não
se funda senão no requisito da confiança. HÁ INTENSA MARGEM DE
DISCRICIONARIEDADE AQUI, AINDA QUE O AGENTE PÚBLICO, NO
CUMPRIMENTO DAQUELE DEVER DE INFERIR, DEVA CONSIDERAR
ATRIBUTOS DE NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO DO CONTRATADO ou
contratada.”

É entendimento dominante que a lei não exige que o notório especialista seja
famoso ou reconhecido pela opinião pública. De acordo com o texto legal, o conceito do
profissional, no campo de sua especialidade, decorre de desempenho anterior, estudos,
experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros
requisitos relacionados com suas atividades.

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O ilustre doutrinador Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, consigna que:

"A reputação da notoriedade só precisa alcançar os profissionais que


se dedicam a uma atividade, sendo absolutamente dispensável, ou
impertinente, a fama comum, que a imprensa não especializada
incentiva”.

O Min. Dias Tofolli,em seu voto como Relator no RE 656558/SP, discorrendo sobre
a “notória especialização” pontua que:

(...)
“Saliento, inclusive, as lições de Joel de Menezes Niebuhr (Dispensa e
Inexigibilidade de Licitação Pública. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p.
169):

‘[A] expressão notória especialização costuma ser interpretada de


molde a exigir alguém bastante conhecido em seu meio, afamado, que
goze, como o próprio nome indica, de notoriedade. Ressalva-se,
contudo, ser equivocado apurar a notória especialização pela
notoriedade da pessoa. O sujeito pode ser em tudo conhecido, mas não
necessariamente por seus méritos profissionais. A notoriedade é da
especialização do profissional e não do profissional em si. Outrossim, a
notória especialização deve ser apreciada no meio que atua o
profissional. De um jeito ou de outro, o termo notoriedade induz
conceito indeterminado, isto é, variável em grau maior ou menor, em
decorrência do que se afere discricionariedade em sua apreciação. A
determinação do grau mínimo de notoriedade necessária para dar
suporte à inexigibilidade não é precisa.’.

Portanto, na apreciação desses conceitos, afigura-se um juízo de


certeza positiva e outro de certeza negativa. Há profissionais que são
conhecidos em todo país, cujos estudos são tomados como referência
pelos demais que militam na área. Não há dúvida alguma de que esses
agregam notória especialização. Ocorre que, em sentido
diametralmente oposto, existem profissionais que não são nem
remotamente conhecidos; recém-formados, sem experiência alguma,
sendo igualmente estreme de dúvida que esses não detêm notória
especialização.

Ocorre que, entre um grupo e outro, haverá um terceiro, composto por


profissionais nem tão conhecidos quanto os primeiros nem tão

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desconhecidos quanto os segundos. Trata-se, é certo, da maioria,
aqueles que ocupam posição mediana: estão no mercado; possuem
alguma experiência, já realizaram alguns estudos, de certa forma são
até mesmo conhecidos, mas, igualmente, não podem ser reputados
detentores de notória especialização. Note-se que a expressão exige
experiência e estudos que vão acima da média, tocante a profissionais
realmente destacados.

Nesse ponto, reside a chamada zona de incerteza, em que já não é


possível distinguir com exatidão quem detém e quem não detém
notória especialização. Aí vige a competência discricionária atribuída
ao agente administrativo, que avalia a experiência dos profissionais
com margem de liberdade, pelo que é essencial a confiança depositada
no contratado.
A questão, então, no caso em julgamento, passa também pela análise,
no âmbito territorial, da apuração concreta da reputação profissional
da contratada, de modo a qualificá-la, ou não, como portadora de
notória especialização.

Como adverte Joel de Menezes Niebuhr (op. cit., p. 172):

‘[H]á profissionais cujos trabalhos são conhecidos em todo país, outros


no Estado a que pertencem, e outros apenas no Município. A
abrangência territorial da contratação deve ser vista com certa
parcimônia, adaptável ao objeto e ao lugar da contratação: por vezes,
torna-se conveniente a seleção de um profissional de trato próximo,
mais acessível. Isso deve ser fitado com parcimônia, porque o que
realmente importa são os estudos feitos pelo profissional, a
experiência anterior dele, os resultados obtidos. O lugar onde o
profissional é conhecido deve ser posto em segundo plano, sem que
este prevaleça sobre as efetivas realizações dele.”

Assim, no caso dos autos, a notória especialização da sociedade que se pretende


contratar está mais do que comprovada, em especial mediante a apresentação de atestados
de capacidades técnicas e currículos vitae dos responsáveis técnicos do escritório advocatício,
dentre outros documentos jungidos a este procedimento.

Quanto ao último requisito, qual seja, singularidade do objeto, insta consignar


que o art. 3º-A da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da OAB), recentemente incluído
pela Lei nº 14.039/2021, estabelece expressamente que “Os serviços profissionais de
advogado são, por sua natureza, técnicos e singulares, quando comprovada sua notória
especialização, nos termos da lei”.

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Ademais, cabe mencionar que a atual redação da Lei nº 8.906, de 4 de julho de
1994 (Estatuto da OAB), dada pela Lei nº 14.039/2020, estabelece em seu art. 3º-A que “Os
serviços profissionais de advogado são, por sua natureza, técnicos e singulares, quando
comprovada sua notória especialização, nos termos da lei”.

Portanto, tem-se que os serviços a serem contratados são singulares por expressa
previsão legal.

Como se já não bastasse o acima analisado, cabe esclarecer que a confiança que
deve haver entre contratante e contratado é outro elemento que autoriza a realização da
inexigibilidade de licitação, em razão da liberdade que o gestor público deve possuir ao
escolher sua assessoria e consultoria jurídica.

O certo é que os serviços de natureza advocatícia, como os que se pretendem


contratar através do procedimento em apreço, em uma análise primária e geral, sempre
poderão ser prestados por mais de um profissional especializado, mormente em razão da
popularidade da profissão atualmente alcançada na sociedade brasileira.

Porém, por outro lado, não se pode suprimir do administrador público que,
sempre atuando no interesse público, confie seu assessoramento e consultoria jurídica ao
profissional que ele repute mais capacitado, em decorrência de características específicas
encontradas no contratado. É o que se tem chamado de Princípio da Confiança, o qual atribui
ao administrador público a discricionariedade de contratar com aquele profissional que ele
entende ser o melhor para desempenhar o objeto do contrato.

Cita-se, a propósito, a lição de Joel de Menezes Niebuhr, Doutor em Direito


Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo:

‘Repita-se que a inexigibilidade encontra amparo no traço singular


com que qualquer um dos potenciais contratados imprimiria à
execução do mesmo. Várias pessoas poderiam executar o contrato,
todas de modo especial e peculiar, incomparável objetivamente em
licitação pública. Daí a inexigibilidade, que depende da subjetividade
dos critérios para a aferição do contratado, isto é, no final das contas,
da discricionariedade dos agentes administrativos. Nesse processo
discricionário, o agente administrativo encontra amplo espaço de
liberdade para escolher aquele especialista que reputa o mais
adequado à satisfação da utilidade pretendida com a contratação,
pressupondo-se, pois, a avaliação de conceitos de valor, variáveis em
grau maior ou menor, de acordo com estimativa subjetiva. Na
perspectiva dessa competência discricionária, observa-se elemento de

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extrema relevância para visualizar a inviabilidade de competição, qual
seja o juízo de confiança do agente administrativo em determinado
especialista, que o leva a contratá-lo, preterindo outros com similar
capacitação.’

Por precisos e aplicáveis a espécie em comento, calha transcrever os seguintes


excertos dos Boletins de licitações e contratos da editora NDJ:

‘Inexistindo, assim, a possibilidade de confrontarem as propostas dos


contratantes, a realização do certame constituir-se-ia em uma em
farsa, não atendendo, sua realização, aos objetivos do próprio instituto
da licitação. Como afirma Celso Antônio de Melo, “só se licitam bens
homogêneos, intercambiáveis, equivalentes. NÃO SE LICITAM COISAS
DESIGUAIS.

A notória especialização diz respeito às qualidades técnicas que o


profissional ou empresa goza na sociedade, fruto do acumulado
conhecimento em contratações anteriores.

Seu trabalho e seu nível de conhecimento permitem à Administração


considerar, de início, que este poderá, de forma adequada, satisfazer
plenamente aos objetivos do contrato.

Há que ser, para tanto, profissionais ou empresa bem sucedidos,


credores de bom conceito na área profissional, de forma que suas
credenciais tranqüilizem o gestor público quanto à capacitação para
desempenhar tal tarefa..
-----
Ora, para que a Administração possa inferir sobre o mais adequado
trabalho, necessário é que, baseado nas situações fáticas que o
profissional (ou empresa) apresenta, decida, SUBJETIVAMENTE, com
lastro na CONFIANÇA que lhe inspira o eventual CONTRATADO,
escolhendo este ou aquele, por entender que é ele o mais capaz para
EFETUAR o serviço mais adequado.’ (in cit. Boletim nº4- BLC- Boletim
de Licitações e contratos, Editora NDJ Ltda.)

‘Assim, podemos concluir, sem sombra de dúvida, que na aplicação da


norma contida no inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666/93, estará sempre
presente a DISCRICIONARIDADE, a subjetividade da Administração,...

...deve escolher o contratado cujo trabalho inferir como essencial e


indiscutivelmente o mais adequado ao objeto do contrato de acordo,

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em última instância, o grau de confiança depositado na especialização
desse contratado...

Contratação essa que a administração dever fazer com o profissional


ou empresa na qual, em relação a cada contratação, deposite maior
grau de confiança’. (in cit. Boletim nº 7-1998 – BLC – Boletim de
licitações e contratos, Editora NDJ Ltda).(grifei).

Assim, embora possam existir vários profissionais dotados de notória


especialização em determinada área do conhecimento, a circunstância que inviabiliza a
competição são as suas características individuais que despertam a confiança do
administrador, analisadas sob o enfoque do objeto do contrato a ser executado, bem como
do interesse público que deve ser buscado em toda atuação da administração.

Neste sentido, já se posicionou o e. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, em


recentes oportunidades, ao apreciar a legalidade da contratação de serviços jurídicos por
meio da inexigibilidade de licitação, como se infere das ementas a seguir transcritas, exaradas
pela totalidade das Câmaras Cíveis da Corte Estadual:

‘DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL


PÚBLICA. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTADA.
TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ADVOCACIA. INEXIBILIDADE DE
LICITAÇÃO. INCOMPATIBILIDADE COM A MERCANTILIZAÇÃO E COM O
JULGAMENTO OBJETIVO EXIGIDOS PELA LEI 8.666/1993.
PRECEDENTES DO STF. PROCURADORIA MUNICIPAL. AUSÊNCIA DE
PREVISÃO CONSTITUCIONAL PARA A CRIAÇÃO DO ÓRGÃO POR
CONCURSO. JUÍZO DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DO
ADMINISTRADOR. 1. A licitação, grosso modo, persegue a seleção da
proposta mais vantajosa para a administração a partir do incitamento
de competição e do julgamento objetivo das propostas apresentadas
pelos licitantes, nos termos do artigo 3º da lei federal nº 8666/1993.
Na hipótese em embate a licitação impõe franca concorrência entre
os advogados no rastro da captação do cliente, enfrentamento que,
à sabença, constitui infração disciplinar punida pela lei federal nº
8906/1994 - Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 34,
VI), e pelo Código de Ética e Disciplina da categoria (artigo 33). Soma-
se a isso, a impossibilidade de se realizar julgamento objetivo acerca
de proposições apresentadas pelos licitantes, verificado o vínculo de
confiança que circunda a contratação do representante judicial, além
das naturais dificuldades em se sopesar qual dos profissionais
habilitados seria o melhor para o exercício judicial da defesa do
município. Desta forma, porquanto embrionariamente incompatíveis

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com a mercantilização e com o critério de julgamento objetivo (artigo
5º, lei federal nº 8906/1994), os serviços de advogacia compõem-se,
reflexamente, também inconciliáveis com a licitação. Precedentes do
STF e Súmula nº 04/2012/COP, Conselho Pleno da OAB. 2. A criação
do cargo de procurador municipal por via de concurso público, é
questão atrelada ao mérito administrativo, não podendo ser imposta
pelo julgador, em face da Independência dos Poderes Constituídos,
insertos na Carta Magna. 3. REEXAME NECESSÁRIO E APELO
CONHECIDOS E PROVIDOS.’ (TJGO, DUPLO GRAU DE JURISDICAO
295899-63.2008.8.09.0154, Rel. DES. GERSON SANTANA CINTRA, 3A
CAMARA CIVEL, julgado em 20/08/2013, DJe 1373 de 27/08/2013) –
grifei

“EMENTA: Duplo grau de jurisdição e apelação cível. Ação civil pública.


Obrigação de fazer e não fazer. Criação de cargo de procurador
municipal. Juízo de conveniência e oportunidade do administrador.
Princípio da separação dos poderes. Inexigibilidade de licitação. Poder
discricionário da Administração Pública. Precedentes desta Corte e do
Superior Tribunal de Justiça.
I. A criação do cargo de procurador municipal e o seu respectivo
preenchimento e provimento, via concurso público, é matéria
vinculada ao mérito do ato administrativo (juízo de oportunidade e
conveniência da Administração Pública), não podendo ser imposta pelo
Poder Judiciário, sob pena de violação ao princípio da separação dos
poderes constituídos, disposto no artigo 2º, da Constituição Federal.
II. A Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93), em diversas oportunidades,
abre espaço para a atuação discricionária do administrador, em
especial nas hipóteses de inexigibilidade, onde há permissão de
contratação direta, para alcançar o objeto desejado pela
Administração Pública.
III. O Superior Tribunal de Justiça entende que a natureza intelectual
e singular dos serviços de assessoria jurídica e a relação de confiança
entre contratante e contratado legitimam a dispensa de licitação para
a contratação de profissionais de Direito, de modo que o administrador
pode, desde que movido pelo interesse público, fazer uso da
prerrogativa que lhe foi garantida pela Lei das Licitações (Lei
8.666/1993) para escolher o melhor profissional. Remessa necessária
e Apelação Cível a que se dá provimento monocraticamente. Sentença
reformada.”
(TJ/GO – 2ª Câm. Cível, Decisão Monocrática - DGJ nº 188109-
32.2011.8.09.0019 (201191881091) Buriti Alegre, Rel. Des. Carlos
Alberto França, j. em 09/02/2015).

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“EMENTA: DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. (...). TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ADVOCACIA.
INEXIBILIDADE DE LICITAÇÃO. INCOMPATIBILIDADE COM A
MERCANTILIZAÇÃO E COM O JULGAMENTO OBJETIVO EXIGIDOS PELA
LEI 8.666/1993. PRECEDENTES DO STF. PROCURADORIA MUNICIPAL.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONSTITUCIONAL PARA A CRIAÇÃO DO
ÓRGÃO POR CONCURSO. JUÍZO DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE
DO ADMINISTRADOR.
1. A licitação, grosso modo, persegue a seleção da proposta mais
vantajosa para a administração a partir do incitamento de competição
e do julgamento objetivo das propostas apresentadas pelos licitantes,
nos termos do artigo 3º da lei federal nº 8666/1993. Na hipótese em
embate a licitação impõe franca concorrência entre os advogados no
rastro da captação do cliente, enfrentamento que, à sabença, constitui
infração disciplinar punida pela lei federal nº 8906/1994 – Estatuto da
Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 34, VI), e pelo Código de Ética
e Disciplina da categoria (artigo 33). Soma-se a isso, a impossibilidade
de se realizar julgamento objetivo acerca de proposições apresentadas
pelos licitantes, verificado o vínculo de confiança que circunda a
contratação do representante judicial, além das naturais dificuldades
em se sopesar qual dos profissionais habilitados seria o melhor para o
exercício judicial da defesa do município. Desta forma, porquanto
embrionariamente incompatíveis com a mercantilização e com o
critério de julgamento objetivo (artigo 5º, lei federal nº 8906/1994), os
serviços de advocacia compõem-se, reflexamente, também
inconciliáveis com a licitação. Precedentes do STF e Súmula nº
04/2012/COP, Conselho Pleno da OAB.
2. A criação do cargo de procurador municipal por via de concurso
público, é questão atrelada ao mérito administrativo, não podendo ser
imposta pelo julgador, em face da Independência dos Poderes
Constituídos, insertos na Carta Magna.
3. Reexame necessário e apelo conhecidos e providos.”
(TJ/GO – 3ª Câm. Cível - DGJ e AC nº 295899-63.2008.8.09.0154
(200892958995), Rel. Des. Gerson Santana Cintra, j. em 20/08/13, DJe.
1373 de 27/08/2013).

“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DE


SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. INEXIBILIDADE DE LICITAÇÃO.
INCOMPATIBILIDADE COM A MERCANTILIZAÇÃO E COM O
JULGAMENTO OBJETIVO EXIGIDOS PELA LEI 8.666/1993.
PRECEDENTES DO STF.

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1. A licitação, grosso modo, persegue a seleção da proposta mais
vantajosa para a administração a partir do incitamento de competição
e do julgamento objetivo das propostas apresentadas pelos licitantes,
nos termos do artigo 3º da lei federal nº 8666/1993. Na hipótese em
embate a licitação impõe franca concorrência entre os advogados no
rastro da captação do cliente, enfrentamento que, à sabença, constitui
infração disciplinar punida pela lei federal nº 8906/1994 – Estatuto da
Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 34, VI), e pelo Código de Ética
e Disciplina da categoria (artigo 33). Soma-se a isso, a impossibilidade
de se realizar julgamento objetivo acerca de proposições apresentadas
pelos licitantes, verificado o vínculo de confiança que circunda a
contratação do representante judicial, além das naturais dificuldades
em se sopesar qual dos profissionais habilitados seria o melhor para o
exercício judicial da defesa do município. Desta forma, porquanto
embrionariamente incompatíveis com a mercantilização e com o
critério de julgamento objetivo (artigo 5º, lei federal nº 8906/1994), os
serviços de advocacia compõem-se, reflexamente, também
inconciliáveis com a licitação. Precedentes do STF e Súmula nº
04/2012/COP, Conselho Pleno da OAB.
2. Apelo conhecido e provido”.
(TJ/GO – 3ª Câm. Cível, Ap. Cível nº 460553-09.2011.8.09.0010
(201194605532), Comarca de Anicuns, Rel. Des. Gerson Santana
Cintra, j. em 25/11/2014).

Do primeiro aresto acima colacionado, pede-se vênia para transcrever o seguinte


excerto:

‘Quanto a necessidade de instauração de procedimento licitatório para


a contratação dos serviços de advogado, pertinente a transcrição do
magistério de FLORIANO DE AZEVEDO MARQUES NETO:

Por fim, temos uma última espécie de objetos contratáveis pela


Administração, na qual se encaixa a contratação de advogados.

São aqueles objetos dotados de uma singularidade objetiva, ou seja,


aqueles cuja contratação só faz sentido em virtude das características
subjetivas do executor. O parecer do jurista, a sustentação oral do
grande tribuno, o patrocínio do advogado afamado são objetos que se
caracterizam especificamente pelos atributos do seu executor. Uma
sustentação oral é atividade para a qual está habilitado qualquer
advogado inscrito na OAB. Porém ninguém diria ser irrelevante a
pessoa de que sobe à tribuna para sustentar. Opinar sobre um assunto

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jurídico tampouco é objetivamente fazer inacessível. Mas o jurista
notório produz um objeto (parecer) inigualável (ainda que vários o
façam). Para estes objetos o procedimento previsto na lei é um só: a
inexibilidade de licitação.

Na contratação de advogado, a licitação será inexigível porque a


advocacia não se exerce dissociada da pessoa do advogado, da relação
de confiança que se estabelece entre constituinte e constituído. Neste
sentido, impecável a decisão do então Ministro Carlos Velloso
mostrando a incompatibilidade entre a confiança inerente à advocacia
e a impessoalidade do processo licitatório (ver HC 72830/RO).

Não é por outra razão que o Código de Ética da Advocacia (art. 15)
obriga que o mandato seja outorgado individualmente aos advogados,
mesmo quando reunidos em sociedade. Tal nexo de confiança é
indissociável da pessoa do advogado, o que torna a resultado da
advocacia um objeto subjetivamente singularizado.

Sendo o objeto singular, ele é impassível de comparação, de cotejo. E


sendo assim, não se põe viável a competição (salvo se ela se travestir
de mero simulacro, de pantomima, de simulação). E a competição de
advogados é impossível por vários motivos.

Primeiro, porque serviços de advocacia não permite aferir,


objetivamente, a vantajosidade entre propostas. A uma porque o
aspecto subjetivo, vimos, é predominante, a duas porque os critérios
de julgamento serão impregnados de características prenhes de
pessoalidade como a segurança do profissional, a honorabilidade
deste, o respeito granjeado no meio, a reputação, seu poder de
convencimento, enfim, um plexo de características relevantíssimas na
escolha do advogado, mas de objetivação impossível num edital
(interditando o julgamento objeto referido no art. 3º da lei de
licitações).

Depois, porque é antípoda à profissão a disputa baseada no menor


preço. Diz expressamente o Código de Ética (art. 5º) que “o exercício
da advocacia é incompatível com qualquer procedimento de
mercantilização”. Não existe nada mais mercantil do que a disputa,
numa licitação, pelo contrato mediante oferta do menor valor de
honorários.

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Em caso semelhante, no julgamento da apelação cível nº 16119-
13.2007.8.09.0051 (200790161192), relatado pela eminente
Desembargadora Beatriz Figueiredo Franco, sob respaldo da
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, esta Câmara Cível
entendeu ser inexigível o procedimento licitatório para a admissão de
advogados pelos municípios.

Isto porque, a licitação, grosso modo, persegue a seleção da proposta


mais vantajosa para a administração a partir do incitamento de
competição e julgamento objetivo das propostas apresentadas pelos
licitantes, nos termos do artigo 3º da lei federal nº 8666/1993. Na
hipótese em embate a licitação impõe franca concorrência entre os
advogados no rastro da captação do cliente, enfrentamento que, à
sabença, constitui infração disciplinar punida pela lei federal nº
8906/1994 – Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 34,
VI), e pelo Código de Ética e Disciplina da categoria (artigo 33). Soma-
se a isso, a impossibilidade de se realizar julgamento objetivo acerca
de proposições apresentadas pelos advogados licitantes, verificado o
vínculo de confiança que circunda a relação entre constituinte e
constituído, além das naturais dificuldades de se sopesar qual dos
profissionais habilitados seria o melhor para o exercício da advocacia.

Desta forma, porquanto embrionariamente incompatíveis com a


mercantilização e com o critério de julgamento objetivo (artigo 5º, lei
federal nº 8906/1994), os serviços de advocacia compõem-se,
reflexamente, também inconciliáveis com a licitação. Esta
interpretação é, inclusive, adotada pelo Supremo Tribunal Federal,
intérprete final da Constituição.’

A arguta análise levada a efeito pela Corte de Justiça goiana, está impregnada do
mais acertado raciocínio lógico, bem assim guarda consonância com a jurisprudência superior,
o colendo STJ já decidiu nestes exatos termos, ao apreciar recurso que tratava do tipo previsto
no art. 89 da Lei de Licitações:

HABEAS CORPUS. LICITAÇÃO ILEGALMENTE INEXIGIDA (ART. 89 DA LEI


N. 8.666/93). ATIPICIDADE DA CONDUTA. CONTRATAÇÃO DE
ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO
PROFISSIONAL PARA PATROCÍNIO DE CAUSA ESPECÍFICA. EXISTÊNCIA
DE CORPO JURÍDICO CONSTITUÍDO NO ÂMBITO DA AGÊNCIA DE
FOMENTO. CONFLITO DE INTERESSES CONFIGURADO. GRAU DE
CONFIABILIDADE. CRITÉRIO SUBJETIVO. DISCRICIONARIEDADE DO

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AGENTE PÚBLICO. INVIABILIDADE DE COMPETIÇÃO.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.
(...)
2. A inviabilidade de competição a que se refere o artigo 25, inciso II,
da Lei n. 8.666/93, não se caracteriza apenas na exclusividade na
prestação do serviço técnico almejado, mas também na sua
singularidade, marcada pela notória especialização do profissional,
bem como pela confiança nele depositada pela administração.
Precedente do Supremo Tribunal Federal.
3. O grau de confiança depositado na contratação do profissional, em
razão da sua carga subjetiva, não é suscetível de ser valorado no bojo
de um certame licitatório e se encontra no âmbito de atuação
discricionária do administrador público, razão pela qual a competição
se torna inviável.
(...) (HC 228.759/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA,
julgado em 24/04/2012, DJe 07/05/2012)

Em decisão ainda mais recente, consolidando o entendimento das Turmas do


Corte Superior de Justiça, assim restou decidido:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE


ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS COM
DISPENSA DE LICITAÇÃO. ART. 17 DA LIA. ART. 295, V DO CPC. ART. 178
DO CC/16. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356
DO STF. ARTS. 13 E 25 DA LEI 8.666/93. REQUISITOS DA
INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. SINGULARIDADE DO SERVIÇO.
INVIABILIDADE DE COMPETIÇÃO. NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO.
DISCRICIONARIEDADE DO ADMINISTRADOR NA ESCOLHA DO MELHOR
PROFISSIONAL, DESDE QUE PRESENTE O INTERESSE PÚBLICO E
INOCORRENTE O DESVIO DE PODER, AFILHADISMO OU COMPADRIO.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Quanto à alegada violação ao 17, §§ 7o., 8o., 9o. e 10 da Lei
8.429/92, art. 295, V do CPC e art. 178, § 9o., V, b do CC/16, constata-
se que tal matéria não restou debatida no acórdão recorrido,
carecendo de prequestionamento, requisito indispensável ao acesso às
instâncias excepcionais. Aplicáveis, assim, as Súmulas 282 e 356 do
STF.
2. Em que pese a natureza de ordem pública das questões suscitadas,
a Corte Especial deste Tribunal já firmou entendimento de que até
mesmo as matérias de ordem pública devem estar prequestionadas.
Precedentes: AgRg nos EREsp 1.253.389/SP, Rel.

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Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 02/05/2013; AgRg nos EAg
1.330.346/RJ, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe 20/02/2013; AgRg nos
EREsp 947.231/SC, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe
10/05/2012.
3. Depreende-se, da leitura dos arts. 13 e 25 da Lei 8.666/93 que, para
a contratação dos serviços técnicos enumerados no art.13, com
inexigibilidade de licitação, imprescindível a presença dos requisitos de
natureza singular do serviço prestado, inviabilidade de competição e
notória especialização.
4. É impossível aferir, mediante processo licitatório, o trabalho
intelectual do Advogado, pois trata-se de prestação de serviços de
natureza personalíssima e singular, mostrando-se patente a
inviabilidade de competição.
5. A singularidade dos serviços prestados pelo Advogado consiste em
seus conhecimentos individuais, estando ligada à sua capacitação
profissional, sendo, dessa forma, inviável escolher o melhor
profissional, para prestar serviço de natureza intelectual, por meio de
licitação, pois tal mensuração não se funda em critérios objetivos
(como o menor preço).
6. Diante da natureza intelectual e singular dos serviços de assessoria
jurídica, fincados, principalmente, na relação de confiança, é lícito ao
administrador, desde que movido pelo interesse público, utilizar da
discricionariedade, que lhe foi conferida pela lei, para a escolha do
melhor profissional.
7. Recurso Especial a que se dá provimento para julgar improcedentes
os pedidos da inicial, em razão da inexistência de improbidade
administrativa.
(REsp 1192332/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 19/12/2013)

A colenda Corte Suprema assim manifestou em relação ao tema:

‘EMENTA Penal e Processual Penal. Inquérito. Parlamentar federal.


Denúncia oferecida. Artigo 89, caput e parágrafo único, da Lei nº
8.666/93. Artigo 41 do CPP. Não conformidade entre os fatos descritos
na exordial acusatória e o tipo previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/93.
Ausência de justa causa. Rejeição da denúncia. 1. A questão submetida
ao presente julgamento diz respeito à existência de substrato
probatório mínimo que autorize a deflagração da ação penal contra os
denunciados, levando em consideração o preenchimento dos
requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, não incidindo
qualquer uma das hipóteses do art. 395 do mesmo diploma legal. 2. As

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imputações feitas aos dois primeiros denunciados na denúncia, foram
de, na condição de prefeita municipal e de procurador geral do
município, haverem declarado e homologado indevidamente a
inexigibilidade de procedimento licitatório para contratação de
serviços de consultoria em favor da Prefeitura Municipal de
Arapiraca/AL. 3. O que a norma extraída do texto legal exige é a
notória especialização, associada ao elemento subjetivo confiança. Há,
no caso concreto, requisitos suficientes para o seu enquadramento em
situação na qual não incide o dever de licitar, ou seja, de inexigibilidade
de licitação: os profissionais contratados possuíam notória
especialização, comprovada nos autos, além de desfrutarem da
confiança da Administração. Ilegalidade inexistente. Fato atípico. 4.
Não restou, igualmente, demonstrada a vontade livre e
conscientemente dirigida, por parte dos réus, a superar a necessidade
de realização da licitação. Pressupõe o tipo, além do necessário dolo
simples (vontade consciente e livre de contratar independentemente
da realização de prévio procedimento licitatório), a intenção de
produzir um prejuízo aos cofres públicos por meio do afastamento
indevido da licitação. 5. Ausentes os requisitos do art. 41 do Código de
Processo Penal, não há justa causa para a deflagração da ação penal
em relação ao crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/93. 6.
Acusação, ademais, improcedente (Lei nº 8.038/90, art. 6º, caput).’
(Inq 3077, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em
29/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 24-09-2012
PUBLIC 25-09-2012)

Como se pode concluir, a inviabilidade de competição no caso dos autos não reside
na inexistência de outros escritórios que prestem o mesmo serviço, mas na confiança e na
especialidade dos contratados, o que não seria possível aferir através de licitação, conforme
trecho transcrito acima.

Em tempo, aprovamos a minuta contratual encaminhada para análise, uma vez


que esta atende as disposições da Lei 8.666/93.

Por último, verificamos que constam a razão de escolha do executante e


demonstração da compatibilidade do preço a ser contratado com o preço de mercado, ficando
atendido os requisitos previstos nos incisos II e III do art. 26 da Lei nº 8.666/93.

CONCLUSÃO

Por tudo quanto exposto, esta Assessoria aprova a minuta contratual apresentada
para análise, bem como opina pela possibilidade de realização da contratação pretendida por

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meio de inexigibilidade de licitação, com fulcro no artigo 25, caput, e seu inciso II, este c/c art.
13, II, III e V, todos da Lei Federal nº 8.666/93, o Enunciado da Súmula 08/2020, bem como a
alteração da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da OAB) dada pelo art. 3º da Lei nº 14.039/2020
quanto a singularidade do objeto, bem como nas Decisões Plenárias nº. 003/2006, 024/2000,
02/2001 do TCM/GO, bem como nas diversas decisões judiciais acima transcritas.

É o nosso parecer. Salvo Melhor Juízo.

São Simão (GO), 09 de fevereiro de 2021.

GUSTAVO SANTANA AMORIM


OAB/GO 37.199

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