Mariza Peirano. A Favor Da Etnografia

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CAPÍTULO 2

A FAVOR DA ETNOGRAFIA

An anthropologist's work tends, no matter what its ostensible subject, to be but an expression
of his research experience, or more accurately, of what his
research experience has done to him.
Clifford Geertz 1968: vi

O tema que pretendo abordar neste ensaio7 diz respeito à relação


entre pesquisa de campo e etnografia. Nesse sentido, procuro desenvol-
ver, no âmbito do debate atual sobre o estatuto teórico das ciências sociais
brasileiras, algumas questões tratadas no capítulo anterior.
A motivação para continuar a discutir esse problema surgiu da consta-
tação de que não só no Brasil e nos Estados Unidos se questiona a etno-
grafia, mas diversos cientistas sociais de países europeus e de outros
continentes também o fazem. As razões são diversas, mas o tema, cons-
tante: Paul Rabinow fala de um estágio `beyond ethnography'; Martyn
Hammersley faz a pergunta `what's wrong with ethnography?', a revista
Contemporary Sociology dedica um volume ao assunto; e Nicholas
Thomas posiciona-se `against ethnography'.8
Optei por discutir o texto de Thomas principalmente pela clara
provocação do título. Mas não só por isso. Escolhi um pretenso inter-

Em versões anteriores, este ensaio foi apresentado em seminários no PPGAS do


7

Museu Nacional (em 1993) e no Departamento de Antropologia da Unicamp (em


1991). Sou grata aos colegas dos dois programas de pós-graduação pelos
comentários e sugestões.
Ver, respectivamente, Rabinow 1988; Hammersley 1990; Thomas 1991d. O número
8

de janeiro de 1993 de Contemporary Sociology, revista da American Sociological


Association, aborda a questão da etnografia em resenhas de vários livros então
recém-publicados: Understanding ethnographic texts, de Paul Atkinson; Reading
ethnography, de David Jakobson; Reading ethnographic research: a critical guide,
de Martyn Hammersley; além de Romantic motives: essays on anthropological
sensibility, de George Stocking Jr.
locutor pós-moderno porque, geograficamente remoto e socialmente
distante, ele está ideológica e intelectualmente próximo, uma vez que, no
Brasil, funcionamos como `uma câmara de decantação na periferia'9 e na
medida em que temos como diretriz ideológica o fato de que a ciência é
universal.
A opção, contudo, não é ingênua: primeiro, estou ciente de que o
debate que proponho é uma ficção — isto é, Nicholas Thomas não saberá
(pelo menos por ora) que está sendo contestado no Brasil; segundo, estou
também ciente da existência de múltiplas tradições etnográficas: os india-
nos, por exemplo, consideram que para eles fazer pesquisa de campo é
uma soft experience porque dominam a língua nativa e porque ainda se
guiam pelos padrões ingleses (Saberwal 1982). Mas aproveito para aqui,
de forma indireta, fazer algumas provocações em relação ao caso brasi-
leiro. Especificamente, penso que nossa tradição etnográfica se baseia, de
forma equivocada, no princípio de que a criatividade pode superar a falta
de disciplina e a carência de um ethos científico.
Mas quem é esse Nicholas Thomas que escreveu `Against ethno-
graphy'? Nicholas Thomas é um jovem australiano de 33 anos, com
experiência como research fellow da Universidade de Cambridge, King's
College, e hoje professor da Australian National University (onde se
doutorou). Apesar de jovem, Nicholas Thomas é autor bem-sucedido nos
Estados Unidos e na Europa: nos últimos cinco anos (de 1989 a 1993),
publicou dois livros, editados por Cambridge e Harvard, e mais de uma
dezena de artigos nas melhores revistas internacionais.10

A expressão é de Paulo Arantes; cf. Arantes 1991. No relato da viagem que fez a
9

vários centros de pesquisa fora dos Estados Unidos, George Marcus salienta sua
surpresa por não haver constatado maior interesse nos questionamentos pós-
modernos americanos (Marcus 1991). O silêncio em relação ao Brasil, país que
visitou no mesmo ano, parece confirmar a visão da `câmara de decantação na
periferia' de Paulo Arantes.
Nicholas Thomas publicou seus artigos nas seguintes revistas: Cultural Anthropology,
10

Current Anthropology, Comparative Studies in Society and History, American


Ethnologist, Social Analysis. Os títulos são sempre provocadores: `The force of
ethnology' (1989b), `The curiosity of the gaze' (1991c); `Against ethnography'
(1991d); `The inversion of tradition' (1992a). Os livros são: Out of time: history
and evolution in anthropological discourse (1989c); Entangled objects (1991b). (Os
dois livros foram comentados por James Carrier na revista Man; cf. Carrier 1992b.)
É nesse contexto que, tendo feito pesquisa em Fiji, Nicholas Thomas
está preocupado e descontente com a maneira como os antropólogos têm
tradicionalmente estudado as sociedades coloniais. Da Austrália, ele,
assim, insere-se no grupo pós-moderno com projeto político específico,
isto é, oriundo de um dos vários campi avançados do mundo britânico,
ele se torna um representante da rebeldia dentro do império.11 E, nessa
disputa aparentemente localizada no mundo anglo-saxão colonial, levanta
a bandeira `contra a etnografia'. E nos atinge.
Atinge a nós, no Brasil, como decorrência da ideologia da universali-
dade da ciência, de um lado, e pelo nosso afã de transformar em modis-
mo a última produção reconhecida na Europa ou Estados Unidos, de
outro. Modismos são freqüentemente daninhos; neste caso, quando se
levanta a bandeira política, o potencial de chegar a nós de forma inade-
quada é ainda maior. É preciso cautela, portanto, especialmente porque,
se os temas tratados por ele e por outros pós-modernos são indiscutivel-
mente pertinentes para a disciplina, nem sempre as soluções são sensa-
tas.12 Antecipo: considero que as alternativas oferecidas por Nicholas
Thomas (assim como as de outros autores da mesma vertente) se baseiam
em um processo de reinvenção da história teórica da antropologia que,
além de repetir antigas fórmulas, revive dicotomias que já deveriam estar
ultrapassadas.13 Velhos debates, como iluminismo vs. romantismo, ciência
vs. arte etc., renascem e na versão atual assumem a forma/fórmula
positivismo vs. interpretativismo, cânone vs. pós-etnografia.14 Penso tam-

Nicholas Thomas é também o editor da revista History and Anthropology e de


uma série monográfica sobre o mesmo assunto. Ver referências na bibliografia.
Naturalmente que as críticas não se restringem aos britânicos. Por exemplo, em Out
11

of time (Thomas 1989c), Marshall Sahlins é o alvo das críticas, e o tema, a


etnologia da Melanésia e da Polinésia.
Ver Sena 1987; Trajano Filho 1987; DaMatta 1992; Peirano 1992a: cap. 5 e 6 para
12

reflexões sobre esta vertente da antropologia norte-americana.


Estou fazendo a distinção entre a historiografia da antropologia (como exemplarmente
13

desenvolvida por George Stocking Jr.) e a legitimação social/intelectual — que é


histórica — dos trabalhos e autores que constituem o referencial teórico da
disciplina. Daí a expressão história teórica. Para maior elaboração deste tema, ver o
Posfácio.
Alguns antropólogos pós-modernos reconhecem que fazem uma `caricatura' da
14

antropologia. Cf. a crítica ao essencialismo do clássico de Marcel Mauss, `A


bém que os textos sobre pesquisa de campo, curiosamente, reproduzem
muitas das preocupações da década de 30, quando, então como agora, se
considerava um perigo a saturação dos textos etnográficos. A solução
proposta em 30 residia na adoção de uma abordagem comparativa como
meio de atingir uma discussão teórica mais relevante. É justamente esta a
proposta que Nicholas Thomas faz, mas com a natural ressalva de que
não se trata `da velha comparação positivista' (Thomas 1991d: 317).
Alguns anos atrás Michael Fischer (1985) notou que a ciência social
muitas vezes assume o caráter de duplicação ou repetição ao longo do
tempo. Há, com freqüência, um retorno a uma era anterior em busca de
textos inspiradores, mas como a história não é circular, e sim espiralada, a
duplicação ou repetição nunca é a mesma, pois existe sempre uma nova
faceta ou uma nova solução (1985: 60). Fischer exemplifica com a trajetó-
ria intelectual de Clifford Geertz, que surge quase como uma cristalização
típica ideal de certos processos nos quais os anos 60 aparecem como se
fossem uma reprise dos anos 20. Esse foi o período de amadurecimento
de uma geração de ensaístas que, em oposição aos grandiosos sistemas de
explicação dominantes no século XIX, propunha que era possível atingir
apenas insights fragmentários da realidade (entre eles estavam Robert
Musil, Ludwig Wittgenstein, Walter Benjamin e os surrealistas). Dessa
perspectiva, diz Michael Fischer, os trabalhos de Geertz sobre o fazer
etnográfico reproduzem preocupações do início do século, mas chamam
a atenção, como novidade dentro da antropologia, para o modo como
são construídos os textos etnográficos. Eles imprimem, portanto, uma
nova faceta substantiva aos velhos problemas da verstehen weberiana.
Eis o problema. Divido minhas observações em quatro partes: em
primeiro lugar, apresento brevemente os argumentos de Nicholas
Thomas; a seguir, teço alguns comentários sobre dois clássicos da disci-
plina com o objetivo de mostrar que a `história teórica' da antropologia
apresentada por Nicholas Thomas está viciada por uma visão que opõe
um passado positivista (representado pelas idéias de Radcliffe-Brown) a
uma contemporaneidade interpretativa; em terceiro lugar, discuto o im-
pacto da pesquisa de campo na trajetória intelectual de alguns antropólo-
gos renomados, para então, finalmente, procurar acatar o desafio de

Dádiva', em Carrier 1992a: 195-212.


Michael Fischer, de que, mesmo nas repetições históricas há algo novo
que, com sorte, pode ser vislumbrado.

I
O argumento de Nicholas Thomas

Em `Against ethnography', o autor adere a um estilo deliberadamente


provocativo. Aqui estão alguns pontos de Thomas:
1º) o problema atual da interpretação na antropologia não advém da
expectativa de que todos os povos são iguais, mas de um pressuposto de
que os `outros' devem ser diferentes; isto é, o problema da antropologia
contemporânea tem a ver com uma fixação no exotismo (1991d: 306);
2º) considerando-se que a pesquisa de campo e o escrever etnográfico
são práticas discursivas políticas, hoje os seguintes procedimentos são
inaceitáveis: a fabricação da alteridade, a homogeneização do `outro' e a
negação implícita do significado das culturas migrantes dentro do
ocidente;
3º) nesse contexto, é preciso separar a pesquisa de campo da etnogra-
fia, de forma a: i) focalizarem-se os problemas permanentes da visão
antropológica na constituição do gênero etnográfico; e ii) abrir-se a pos-
sibilidade para o desenvolvimento de outro tipo de escrita `energizada
pela experiência do campo' (:307);
4º) a associação entre o exotismo e a tendência marcante da etnografia
para tratar questões teóricas a partir de análises locais não é puramente
contingente. Estes traços da antropologia contemporânea estão
associados à dominância da escrita antropológica, que apresenta as
culturas como totalidades unitárias. Em outras palavras, a persistência do
exotismo deriva do fato de que o exótico é intencional na etnografia
(:315);
5º) duas tarefas desafiam os antropólogos atuais: i) o revigoramento da
antropologia comparativa e ii) um novo tipo de `escrita antropológica
pós-etnográfica'. Em relação à primeira proposta, `não se trata do velho
tipo de comparação positivista que procura estabelecer teorias gerais, mas
uma forma de análise que use um quadro regional para argüir sobre
processos de mudança social e diversidade' (:317); e, em relação à nova
escrita etnográfica, `ela deve se mover no espaço entre o teórico e o
universal e o local e o etnográfico, um lugar que seja energizado por
formas de diferença que não estejam contidas na ficção nós/eles' (:315).

II
Que modelo canônico?

Nicholas Thomas não é modesto. Em `Against ethnography' ele diz


que o objetivo do artigo `não é de forma alguma o de condenar toda a
disciplina' (1991d: 315), naturalmente, mas apenas o de apontar proble-
mas cruciais associados ao que considera o modelo canônico.
Mas que modelo canônico? O de Franz Boas e os `four fields'? A
comparação de Radcliffe-Brown? A arte e a tradução de Evans-
Pritchard? Na verdade, a crítica desenvolvida por Thomas recai sobre a
tendência de tratar questões teóricas totalizadoras a partir de análises
locais de eventos exóticos, e sua solução contempla um revigoramento da
antropologia comparativa e uma reformulação da escrita pós-etnográfica.
Isso nos leva a pensar que o modelo criticado como `canônico' se fixa na
experiência totalizadora de uma pesquisa de campo traduzida como exo-
tismo e transformada em experimento teórico. Mas em quem cabe a
carapuça?
Penso em dois clássicos/ancestrais para, mediante seus trabalhos,
refletir sobre as questões levantadas por Nicholas Thomas: Malinowski,
para focalizar a questão da co-autoria etnográfica; e Evans-Pritchard, para
discutir a visão da disciplina como tradução e da metodologia concebida
como impacto.

(a) Malinowski (1884-1942)

Na mitologia da disciplina, Malinowski inventou a pesquisa de campo;


na história da antropologia é significativa a legitimação que ele trouxe à
pesquisa. Chamo a atenção para a questão da legitimação porque hoje
sabemos que a proposta malinowskiana já havia sido formulada pelo
menos desde Rivers. Em sua contribuição às Notes and Queries de 1912,
Rivers alertava para os perigos da utilização de `categorias civilizadas' na
pesquisa de campo; propunha que as noções abstratas deveriam sempre
ser atingidas por intermédio do concreto; falava da necessidade do domí-
nio da língua nativa; defendia a importância da empatia e do tato na
pesquisa e afirmava que relatos mais observação (isto é, relatos nativos
mais observação etnográfica) poderiam resultar em mais insights que `um
mês de perguntas'. Ainda segundo Rivers, o investigador de campo
deveria reconhecer que o nativo também tem um ponto de vista, prova-
velmente bem mais interessante que o do pesquisador.
Como costumamos ler Rivers apenas para nos informar sobre o
método genealógico, perdemos esse verdadeiro projeto etnográfico, que
felizmente George Stocking resgatou.15 É verdade que, na época do
próprio Rivers e, especialmente na famosa expedição ao Estreito de
Torres, esses procedimentos não foram adotados. A `etnografia de
varanda' era considerada adequada e suficiente, isto é, antes de 20, os
antropólogos de então (na verdade, fisiologistas, psicólogos experimentais,
lingüistas) deslocavam-se até as sociedades primitivas para coletar dados,
mas, em um contexto evolucionista no qual dominava o que hoje
chamamos de `antropologia de gabinete', seus procedimentos já eram
bastante revolucionários. Isto é, sentavam-se a uma mesa, geralmente na
varanda da casa de um oficial da colônia ou missionário, ou em um
convés de navio em trânsito local, e convocavam os nativos, que, enfi-
leirados, esperavam sua vez para fornecer os dados requisitados. Aquela
foi a época em que não só se chamou privadamente os nativos de niggers
— como Malinowski fez em seus diários —, mas em que se referia à
atividade de pesquisa como niggering.16
Águas passadas? Não tanto: não faz muitos anos uma `pesquisa de
campo' no Brasil adotou a estratégia de reunir os nativos em uma sala de
universidade para que eles dessem entrevistas e depoimentos. Uma nova
versão de etnografia de varanda? Por outro lado, quantas vezes a ex-
pressão `ir a campo' não é utilizada, de modo no mínimo exagerado,
para informar o ouvinte que o pesquisador tem freqüentado reuniões de
condomínio do grupo que vem estudando?

Consultar Stocking Jr. 1983 para a elaboração de vários pontos levantados nesta seção.
15

Stocking menciona que essa referência era costume de Frank Gillen (o companheiro
16

de Baldwin Spencer nos estudos de parentesco australiano); cf. Stocking Jr. 1983.
Mas volto a Malinowski para sugerir que a co-autoria defendida
atualmente esconde a ingenuidade de pressupor que os nativos querem
sempre ser co-autores ou antropólogos de si mesmos. De novo, foi
Stocking Jr. quem alertou, há algum tempo, que a pesquisa de campo
pressupõe uma hierarquia: ou ela é aceita pelos nativos, ou não há pes-
quisa etnográfica (1974). Stocking acrescentava que a pesquisa, como
idealmente concebida hoje, é um fenômeno histórico dentro da discipli-
na. Assim, da mesma forma que a pesquisa de campo teve um início, ela
pode vir a ter um fim — este temor foi especialmente registrado na década
de 60 por Lévi-Strauss (1962) e Jack Goody (1966).
Proponho, portanto, que a co-autoria que os pós-modernos advogam
na relação pesquisador-nativo não é novidade na disciplina; apenas ela
não ocorre entre indivíduos empíricos concretos, mas teoricamente na
produção etnográfica. Na vertente pós-moderna chegou-se a acreditar nas
transcrições dos diálogos etnográficos (por exemplo, Dwyer 1982), pro-
cedimento que o próprio Geertz ironicamente denunciou como `words,
the whole words, and nothing but the words' (Geertz 1988: 96).
Malinowski sabia mais: ele não chegou a traduzir para o inglês o ter-
mo nativo `kula' que encontrou entre os trobriandeses apenas para tornar
os melanésios exóticos (como sugere Nicholas Thomas), mas para ser fiel
a uma categoria trobriandesa diferente das categorias ocidentais. Foi essa
fidelidade (ou tentativa de fidelidade, não importa) às evidências
etnográficas que permitiu, posteriormente, a Marcel Mauss utilizar os
dados trobriandeses em sua teoria geral da dádiva. E foi também graças a
ela que Karl Polanyi pôde explicar a experiência histórica ocidental por
meio das descobertas de Malinowski, `exotizando' o ocidente.
Outro exemplo desse projeto de fidelidade diz respeito às descobertas
de Malinowski sobre o poder mágico das palavras entre os trobriandeses.
Foram as inúmeras evidências etnográficas que Malinowski coletou que
justificam sua teoria sobre os aspectos pragmáticos da linguagem que, se
até recentemente não haviam recebido maior atenção (a antropologia,
assim como as demais ciências do homem, estava mais preocupada com
os aspectos cognitivos e semântico-referenciais dos sistemas simbólicos),
hoje estão na ordem do dia no estudo dos aspectos `performativos' das
palavras e dos rituais (ver, por exemplo, Tambiah 1968, 1985).
Se assim é, talvez tenhamos de deixar de falar sobre `a teoria da
magia de Malinowski', ou sobre `a teoria da linguagem de Malinowski',
para focalizar as teorias da magia ou da linguagem dos trobriandeses, que
Malinowski teve a sensibilidade de captar — porque as estranhou — e
depois a ousadia e/ou vaidade de divulgá-las.
E, se é verdade que, ao longo do século, antropólogos ingleses se
tornaram africanistas; franceses, americanistas; norte-americanos, ocea-
nistas, o que pode fornecer um indício claro do poder político colonial
do qual Nicholas Thomas tanto se ressente (acredito que com razão), por
outro lado esses rótulos também indicam como, na antropologia, as
orientações teóricas estão relacionadas a especificidades geográficas de
uma maneira que talvez não aconteça em outras ciências sociais.17 Isto é,
se orientações teóricas se vinculam a especificidades aparentemente
`geográficas', talvez estes fenômenos resultem do fato de que a teoria
antropológica sempre se fez melhor quando atrelou a observação etnográ-
fica ao universal/teórico. Exatamente como Nicholas Thomas propõe
hoje e como Malinowski já realizava.
Ao próprio Malinowski, por outro lado, os dados trobriandeses servi-
ram muito bem: é difícil acreditar que, arguto observador do poder da
linguagem para os trobriandeses, as estratégias retóricas que adotou em
suas monografias tenham sido fruto apenas da intuição ou do acaso. Para
Malinowski, a fórmula mágica tinha como abertura a expressão `Imagine
yourself...', que fazia do leitor um cúmplice do autor. Alguns exemplos
são suficientes para relembrar a estratégia: `Imagine yourself suddenly
transported on to a coral atoll in the Pacific, sitting in a circle of natives
and listening to their conversation' (1930: 300). Ou, `Imagine yourself
suddenly set down surrounded by all your gear, alone on a tropical beach
close to a native village, while the launch or dinghy which has brought you
sails away out of sight' (1961: 4). Adjetivos também eram cuidadosamente
deixados ao longo do texto: `... which I heard on that memorable
morning in the lagoon village' (:304; ênfase minha). Se, freqüentemente,
essas expressões `conativas' (para usar a linguagem de Roman Jakobson)
eram utilizadas para fazer o leitor partilhar o isolamento e a perplexidade
do etnógrafo, outras vezes eram empregadas para convidá-lo a seguir
viagem: `Let us imagine that we are sailing along the South coast of New
Guinea towards its Eastern end' (:33; ênfase minha). Uma viagem imagi-

Ver Sahlins 1989: 37, respondendo a Nicholas Thomas; ver, também, Viveiros de
17

Castro 1993a.
nária, como sabemos, mas que só o leitor treinado reconhece já que em
1922 Malinowski confessava suas limitações apenas nas entrelinhas. O
texto exibia um estilo em que o autor exortava o leitor à participação no
paraíso edênico onde se ouvia `the sound of conch shells blowing
melodiously', e à cumplicidade dos tipos sociais como o chefe de uma
aldeia, `an old rogue [um patife] named Moliasi' (:66). Esse era o período
em que a pesquisa de campo aparecia como misteriosa: `It is difficult to
convey the feelings of intense interest and suspense with which an
Ethnographer enters for the first time the district that is to be the future
scene of his field-work' (:51).
Em 1935, contudo, seu estilo havia mudado radicalmente. Nessa
época, a legitimidade de Malinowski já estava estabelecida, de forma que
em Coral gardens o etnógrafo não mais precisava seduzir o leitor me-
diante um estilo predominantemente `ilocucionário' (conforme a concep-
ção de J.L. Austin). Foi quando Malinowski pôde se permitir publicar
uma monografia composta de vários fragmentos: relatos em língua nativa
com tradução intercalada em inglês (os prometidos `corpus inscriptio-
num agriculturae quirininiensis'); observações sobre magia agrícola; uma
teoria etnográfica da linguagem; especulações teóricas sobre regime
fundiário e, agora sim, `Confessions of failure' e `An autobiography of
mistakes'.
A obra de um antropólogo não se desenvolve, portanto, linearmente;
ela revela nuanças etnográfico-teóricas que resultam não apenas do tipo
de escrita que sempre foi `energizada pela experiência do campo' (para
não perder a referência a Nicholas Thomas), mas também do momento
específico da carreira de um pesquisador, em determinado contexto
histórico e a partir de peculiaridades biográficas. A obra de Malinowski
demonstra tais pontos; a de Evans-Pritchard os reforça e os esclarece.

(b) Evans-Pritchard (1904-1970)

Para Evans-Pritchard o antropólogo era um tradutor e, portanto, a


antropologia seria sempre comparativa, mesmo que não o fosse explicita-
mente (Evans-Pritchard 1972). Se esta visão derivou dos ensinamentos de
Malinowski (de quem E-P foi aluno) é uma questão em aberto, mas o fato
é que a tradução tinha um leitor específico em mira. Ou seja, não era
pretensão de Evans-Pritchard um trabalho de mão dupla: ele sabia que
estava traduzindo a bruxaria Azande, as linhagens Nuer, a história dos
beduínos de Cirenaica para os ocidentais. Mas, em vez de usar os termos
nativos, E-P usou exatamente as categorias ocidentais, isto é, bruxaria,
oráculos, magia. Ele assim o fez não só porque o seu problema era
ocidental (a velha questão da distinção entre os pensamentos místico e
empírico, como freqüentemente relembrado), mas porque seus leitores
também deveriam sofrer o impacto das categorias. Malinowski havia
optado por manter o termo nativo; a estratégia de E-P foi a de contrastar
as categorias européias/familiares com a etnografia Azande/diferente. O
objetivo maior, contudo, era semelhante. (Uma questão que se coloca
aqui, e que naturalmente fica sem resposta, se refere a qual das duas
estratégias é a melhor: a de Malinowski ou a de Evans-Pritchard).18
Evans-Pritchard confiava bastante no poder do confronto de experi-
ências e suas conseqüências emocionais e intelectuais.19 Para ele as
impressões de campo não eram apenas recebidas pelo intelecto, mas
exerciam `um verdadeiro impacto na personalidade total do etnógrafo',
fazendo com que diferentes culturas se comunicassem via a experiência
singular de uma única pessoa. O texto etnográfico resultava, assim, da
adequação da ambição universalista da disciplina com os dados (novos)
detectados pelo pesquisador em determinado contexto etnográfico. Estes
dados, por sua vez, resultavam da combinação da sensibilidade do
etnógrafo e do aprendizado adquirido quando da formação do
pesquisador.20
É de Evans-Pritchard um dos mais singelos e exemplares depoi-
mentos nesse sentido, isto é, o conhecido `Eu não tinha interesse por
bruxaria quando fui para a terra Zande, mas os Azande tinham; de forma
que tive de me deixar guiar por eles' (1978: 300). Este depoimento revela

O que se pode notar é que, além do círculo restrito de antropólogos, o trabalho de


18

Malinowski serviu mais aos sociólogos; o de Evans-Pritchard rendeu numerosas


discussões na filosofia. Para a influência de Malinowski, as principais referências
são os trabalhos clássicos de Mauss e Polanyi; para Evans-Pritchard, ver Winch
1970, 1977; Hollis & Lukes 1982; Roth 1987 cap.9.
Ver, especialmente, Evans-Pritchard 1972 e, posteriormente, Dumont 1970: 157.
19

Se a simples erudição fosse condição suficiente para formar um antropólogo, George


20

Stocking Jr. seria hoje um dos maiores. Mas é o próprio Stocking quem reconhece
sua limitação para a pesquisa de campo e, portanto, sua incapacidade para o ofício.
o estreito vínculo entre teoria e pesquisa na antropologia, demonstrando
a tese de que a pesquisa etnográfica é o meio pelo qual a teoria
antropológica se desenvolve e se sofistica quando desafia os conceitos
estabelecidos pelo senso comum no confronto entre a teoria que o
pesquisador leva para o campo e a observação entre os nativos que
estuda. Assim como para Malinowski, mais uma vez fica claro que não há
uma teoria antropológica de Evans-Pritchard, mas a teoria sobre bruxaria
que ele propôs como resultado do confronto/impacto entre sua bagagem
intelectual européia (incluindo aí seus conhecimentos antropológicos e o
conceito folk-europeu de bruxaria) e o interesse dos Azande em explicar
seus infortúnios. Pensar em impacto e/ou confronto é pensar
comparativamente. Para E-P este procedimento deveria ser levado às
últimas conseqüências: ao antropólogo caberia pesquisar várias socieda-
des. Ele reconhecia as dificuldades a serem enfrentadas, especialmente
tendo em vista o tempo de pesquisa e de elaboração dos resultados (que
ele estimava aproximadamente em dez anos), mas uma segunda
sociedade auxiliaria o etnógrafo a abordá-la à luz da experiência da
primeira, sugerindo-lhe linhas de pesquisa novas.
Evans-Pritchard foi dos poucos antropólogos a fazer etnografia em
várias sociedades: Azande do sul do Sudão, Nuer do Sudão anglo-egípcio
e Cirenaica (hoje Líbia). Atualmente são raros os antropólogos de reco-
nhecimento internacional com essa experiência (Geertz talvez seja o
exemplo contemporâneo de maior expressão). Nos dias atuais, procura-
mos resolver o problema colocado por E-P de várias maneiras: ou con-
tando o `tempo de serviço' da leitura de monografias21 ou, na versão
indiana, considerando que a antropologia é um empreendimento de
natureza coletiva e o antropólogo não precisa pesquisar pessoalmente
diferentes culturas: ele é, ao mesmo tempo, um insider e outsider em
virtude do seu treino acadêmico (Madan 1982, 1994). Esta, inclusive, era
a posição de Malinowski no final dos anos 30, quando prefaciou o
trabalho de dois ex-alunos (Jomo Kenyatta, do Quênia, e Fei Hsiao-Tung,
da China) que haviam pesquisado suas sociedades de origem.22

A expressão é de Viveiros de Castro 1993a.


21

É interessante notar que o tema do estudo `of one's own society' vem sendo debatido
22

pelos antropólogos indianos desde a década de 50. Ver Béteille & Madan 1975;
Srinivas 1979; Madan 1994.
Volto a Evans-Pritchard. Destas breves referências decorrem algumas
implicações: 1ª) o processo de descoberta antropológica resulta de um
diálogo comparativo, não entre pesquisador e nativo como indivíduos,
mas entre a teoria acumulada da disciplina e a observação etnográfica que
traz novos desafios para ser entendida e interpretada. É nesse sentido que
Evans-Pritchard (1972) dizia não haver `fatos sociais' na antropologia,
mas `fatos etnográficos'. Esse é um exercício de estranhamento
existencial e teórico que passa por vivências múltiplas e pelo pressuposto
da universalidade da experiência humana, que o antropólogo aprendeu a
reconhecer, de início, longe de casa;
2ª) não há cânones possíveis na pesquisa de campo, embora haja,
certamente, algumas rotinas comuns, além do modelo ideal. E se não há
cânones no sentido tradicional, talvez não se possa ensinar a fazer pes-
quisa de campo como se ensinam, em outras ciências sociais, métodos
estatísticos, técnicas de surveys, aplicação de questionários. Na antropo-
logia a pesquisa depende, entre outras coisas, da biografia do pesquisa-
dor, das opções teóricas da disciplina em determinado momento, do
contexto histórico mais amplo e, não menos, das imprevisíveis situações
que se configuram no dia-a-dia local da pesquisa;23
3ª) na medida em que se renova por intermédio da pesquisa de cam-
po a antropologia repele e resiste aos modelos rígidos. Seu perfil, portan-
to, dificilmente se adequa a um modelo `positivista', como se tenta carac-
terizá-la atualmente em certos setores. Tal fato não a impede, contudo, de
se constituir em um conhecimento disciplinar, coletivo portanto, so-
cialmente reconhecido e teoricamente em transformação;24
4ª) consciente ou não, cada monografia/etnografia é um experimento.
É certamente óbvia a diferença entre a construção monográfica de
Witchtcraft (de 1936) e aquela dos The Nuer (de 1940), ou de cada livro
da trilogia Nuer — uma trilogia que resultou de uma só experiência
etnográfica, mas produziu livros construídos de modo bastante diferente;25

Ver, por exemplo, o hoje conhecido mas, na época da publicação, inovador relato
23

reflexivo de Maybury-Lewis (1965) sobre sua experiência de campo. Foi essa


mesma experiência de campo que fundamentou, dois anos mais tarde, sua
monografia clássica sobre os Xavante (1967).
DaMatta propôs, há mais de dez anos, que todo antropólogo realiza, durante sua
24

carreira, o seu `repensar a antropologia'. Ver DaMatta 1981: 146-7.


Para uma análise da construção monográfica de Os Nuer e a postura teórica de Evans-
25
5ª) o impacto dos dados sobre o pesquisador acaba gerando totalida-
des, sejam elas cosmológicas, sociológicas, ideológicas etc. Estas totali-
dades, que foram abordadas teoricamente por Mauss, têm correlação nas
recomendações de Rivers (acatadas tanto por Malinowski quanto por
Evans-Pritchard), de que o pesquisador deveria trabalhar sozinho no
campo porque o objeto etnográfico é indivisível. Por esse caminho, nota-
se uma aproximação curiosa dos dois autores: distintos na tradição, mas
contemporâneos, Rivers e Mauss enfatizavam a totalidade: um, via pes-
quisa; o outro, via teoria.26
Ao apresentar Evans-Pritchard como essencialmente comparativo e
não-positivista, reconheço que minha visão é radicalmente diferente da de
Geertz, por exemplo, para quem E-P retrata o paradigma do vilão
colonial. Para comprovar que Evans-Pritchard aderia a uma estratégia
textual imperialista, ele invoca a limpidez do seu estilo brilhante — a
paixão pelas frases simples, preferência pelo declarativo, ausência de
jargão, `as few commas as possible, mechanically placed, and hardly any
semicolons at all: readers are expected to know when to breathe' (Geertz
1988: 60). Ironias à parte, o ponto de vista que estou defendendo é que o
bom texto etnográfico foi sempre um experimento. É verdade que,
durante um breve interlúdio, se acreditou na eficácia do modelo tipo
ecologia-parentesco-política-cosmologia. No entanto, a história e a força
da antropologia não se fizeram por esses estudos `canônicos', mas muito
mais por Argonauts, Naven, Witchtcraft, The Nuer, Political Systems,
Islam Observed e outros, apesar das inevitáveis ausências e injustiças
cometidas.
Mas é tempo de se perguntar: ao reduzir e compactar a história da
antropologia aos estudos realizados pelos (politicamente incorretos) ama-
ntes do exótico, não se estará cometendo outra injustiça? Ao construir
uma história teórica tradicional que é, por definição, positivista e cientifi-
cista, os antropólogos pós-interpretativos não estarão dando razão históri-
ca a um personagem específico, isto é, Radcliffe-Brown e a seu conhecido
projeto de uma `história natural da sociedade' para a antropologia?

Pritchard, ver Dumont 1968.


Nesse contexto, pode-se imaginar uma relação possível entre o caráter fragmentário da
26

antropologia pós-moderna e a cosmovisão do novo antropólogo, a construção do


seu objeto de estudo, e, quem sabe, sua insensibilidade para perceber o `fato
social total'.
Aqui parece que localizamos o `modelo canônico' e seu sentido nega-
tivo. Ele é representado pelas idéias de Radcliffe-Brown que, efetiva-
mente, constituíram a vertente hegemônica da disciplina durante pelo
menos duas décadas, mas cuja dominação foi suplantada por Evans-
Pritchard quando este afirmou que a antropologia era mais arte que ciên-
cia. Naquele momento faliu o projeto `cientificista' da antropologia e suas
possíveis ambições positivistas.
O fato curioso, contudo, é que para a vertente representada por
Nicholas Thomas, Radcliffe-Brown é o vilão que deve ser condenado
mas que, ao mesmo tempo, inspira as novas propostas. Assim, a compa-
ração é resgatada (como se tivesse algum dia sido abandonada) para
contrapor-se ao excesso etnográfico, mas ela `não deve ser positivista'. A
etnologia é criticada, mas trata-se exatamente da etnologia de inspiração
radcliffe-browniana, isto é, aquela que se opõe à antropologia social
(diferenciação que, no Brasil de hoje, pertence à história arcaica da
antropologia). Por outro lado, não deixa de ser significativo que um
jovem antropólogo australiano eleja como oponente exatamente um
nome reconhecido da história da disciplina cuja carreira se desenvolveu,
em grande parte, lá mesmo: Racliffe-Brown realizou pesquisa entre os
aborígenes em 1910; de 1916 a 1919 foi professor em Sydney e nas ilhas
Tonga; e de 1926 a 1931 ocupou a primeira cadeira de antropologia na
Universidade de Sydney. Nesse último período, fundou a revista Oceania
— conceituada até os dias de hoje —, destinada ao estudo dos nativos da
Austrália, Nova Guiné e ilhas do Pacífico. Em outras palavras, Radcliffe-
Brown fez da Austrália um campus avançado da antropologia britânica27
e, naturalmente, levou junto a cosmologia dominante do império. A
rebeldia dos antropólogos australianos é relativamente recente e Nicholas
Thomas faz parte dessa rebeldia.

Muitos antropólogos indianos se beneficiaram dessa situação: T.N. Madan, por


27

exemplo, doutorou-se na Austrália. Ver Baines 1993 para uma excelente etnografia
da antropologia australiana.
III
Trajetórias etnográficas

Neste ponto, tendo sugerido, senão identificado, o interlocutor oculto


de Nicholas Thomas, encerro esta parte da discussão. Permanece, contu-
do, o problema da relação entre teoria e pesquisa, agora ampliado pelas
observações a respeito de um tema específico: as trajetórias individuais. O
objetivo é o mesmo, isto é, fazer aflorar as áreas cinzentas que fazem a
riqueza e a criatividade da pesquisa em antropologia; eliminar as dico-
tomias do tipo antes-positivismo/hoje-interpretação. Vejamos.
Nem todo bom antropólogo é necessariamente um etnógrafo. Há
aqueles mais inclinados e os menos atraídos para a pesquisa de campo.
Mas todo bom antropólogo aprende e reconhece que é na sensibilidade
para o confronto ou o diálogo entre teorias acadêmicas e nativas que está
o potencial de riqueza da antropologia. Tal confronto, que teve sua gêne-
se na pesquisa de campo entre povos primitivos, encontra-se hoje domes-
ticado e incorporado como `visão' da antropologia, e é atualizado no
campo ou entre quatro paredes de uma biblioteca.
Nesse contexto, há uma curiosidade a ser observada, que, pela sua
recorrência, talvez não seja fruto de mero acaso: é fácil se perceber, no
âmbito da comunidade dos antropólogos, uma correspondência entre a
pesquisa de campo tradicional e a vocação para a teorização. Esta corre-
lação, contudo, é negativa, isto é, grandes etnógrafos nem sempre foram
bons teóricos (Nimuendaju é um bom exemplo) e grandes teóricos fre-
qüentemente mostraram-se avessos à pesquisa de campo (Lévi-Strauss
talvez seja o caso clássico).
Dessa perspectiva, parece haver um continuum no qual os dois extre-
mos seriam ocupados, de um lado, pelo etnógrafo empírico-proustiano;
de outro, pelo quase-filósofo. No primeiro caso, é a realidade empírica
que parece dominar e ofuscar (e a teoria é fraca ou pobre); no segundo, é
o fascínio pela universalidade que conduz à procura de leis e princípios
gerais, perdendo-se o aspecto sui generis da totalidade empírica (não)
observada. Mas, como para reforçar a idéia de que a pesquisa de campo
é constitutiva da antropologia, porém não empiricamente necessária,
temos os exemplos históricos da descoberta das leis de associação do
pensamento humano (que a lingüística [com Jakobson] e a psicanálise
[com Freud] creditaram ao velho The Golden Bough, de Frazer) e a
proposta das tipologias tradicionais dos sistemas de parentesco, de
Radcliffe-Brown e Lévi-Strauss.
Muitos antropólogos tenderam a ver tradições dicotômicas na discipli-
na: Leach, no afã estruturalista de então, mencionou duas, a de
Malinowski e a de Frazer,28 só dando espaço para esses dois pólos mu-
tuamente excludentes. Para Dumont, o mesmo tema é percebido como
um caso no qual a singularidade etnográfica representa o holismo, que
seria englobado por um universalismo como ideologia dominante
(Dumont 1980). A tradição teórica da antropologia contempla, no entan-
to, diversas formas de combinar a tensão sempre presente entre o parti-
cular/etnográfico e o universal/teórico. Antropólogos que aceitam essa
orientação são herdeiros de Evans-Pritchard neste aspecto e, entre a
pesquisa e a teoria, procuram o universal no particular ou, seguindo
Flaubert, acreditam poder encontrar `le bon Dieu dans le détail'.
A centralidade da tensão entre teoria e pesquisa pode ser apreciada,
na disciplina, na trajetória de alguns antropólogos pesquisadores. Quando
a tensão `ótima' entre os dois pólos se perde, a obra do autor conseqüen-
temente se empobrece. Em outras palavras, nem sempre os antropólogos
envelhecem bem.
Alguns exemplos são suficientes para ilustrar a questão. O caso de
Malinowski é singular: a distância que vai das monografias trobriandesas,
publicadas entre 1922 e 1935 (de Argonauts a Coral gardens), e, dez anos
mais tarde, a póstuma e simplista A general theory of culture (de 1944),
não pode ser explicada apenas por uma diferença de ênfase etnográfica
ou teórica, mesmo porque se trata de excelente etnografia e má teoria.
Em seus primeiros trabalhos, Malinowski confrontava as teorias
sociológicas, antropológicas, econômicas e lingüísticas de sua época com
as idéias que os trobriandeses tinham a respeito de temas correlatos, e
mais, ao comparar tais idéias com suas observações in loco, Malinowski
pôde perceber que ali permaneciam `resíduos' não explicados: é nesse
sentido que o kula se tornou uma verdadeira descoberta e as etnografias
trobriandesas permanecem até hoje como fonte de inspiração para análi-
ses de mitologia, lingüística e economia. Comparada a este corpus etno-
gráfico, a tentativa de uma abrangente `teoria geral da cultura' de cunho

E colocou Lévi-Strauss na segunda tradição; cf. Leach 1970.


28
determinista — porque universalmente derivada das necessidades biológi-
cas básicas — só confirma e expande a suposição de que os esforços dos
pesquisadores sobrevivem às suas elucubrações teóricas. (Frazer dizia, de
modo equivocado, que este era o seu caso.)
Outro exemplo é o de Victor Turner. Ao abandonar os ritos
Ndembu, Turner perdeu o melhor da universalidade de sua abordagem.
Os Ndembu conectavam Turner com a experiência ritual humana em
geral: para eles a vida social girava em torno do seu simbolismo ritual, que
Turner analisou com a centralidade que os nativos o concebiam (Turner
1967). Quando Turner decidiu extrapolar o que havia descoberto em sua
pesquisa africana para outros eventos religiosos do mundo moderno —
incluindo experiências no México, Irlanda e Inglaterra, tragédias gregas e
eventos históricos (Turner 1974) —, paradoxalmente o aspecto univer-
salista foi eliminado, embora o objetivo explícito fosse o exame da ação
simbólica no plano da `sociedade humana'. Por este exemplo, tal meta
talvez se alcance melhor e mais facilmente por intermédio da experiência
limitada de alguns casos reveladores.
Foi Geertz quem chamou a atenção para esse aspecto microscópico e
artesanal da pesquisa antropológica, afirmando que os etnólogos não
estudam aldeias, mas em aldeias (Geertz 1973). É lá que o repertório de
conceitos gerais das ciências sociais — como integração, racionalização,
símbolo, ideologia, ethos, revolução, visão de mundo, sagrado, cultura —
se entrelaçam `no corpo da etnografia de descrição minuciosa na
esperança de tornar cientificamente eloqüentes as simples ocorrências'
(1973: 38). Mas, infelizmente, Geertz não ficou imune ao envelhecimen-
to: é quase impossível reconhecer no autor cético e irônico de hoje o
artesão de Islam Observed (1968).29 Nesta pequena jóia de pouco mais de
cem páginas, Geertz propõe uma teoria da religião vinculada à análise da
experiência histórica do islamismo no Marrocos e na Indonésia, utili-
zando-se de uma abordagem de inspiração weberiana. Este feito, que
resultou de extensa pesquisa histórico-bibliográfica, seria inviável, segundo
o próprio autor, se antes ele não houvesse realizado pesquisa de campo
nos dois países. Em 1968, Geertz confessou que o que ele chegou a
observar `neste olhar amplo sobre a história social dos dois contextos
limites do mundo islâmico', ele viu primeiro `nos estreitos confins das

Sobre o recente livro do autor e sua crítica, ver Geertz 1988; Peirano 1992a cap. 6.
29
pequenas cidades e vilarejos' (1968: vi). Nesse empreendimento, Geertz
coloca a pesquisa de campo no centro da investigação e enfatiza:

Fieldwork has been, for me, intellectually (and not only intellectually) formative, the
source not just of discrete hypotheses but of whole patterns of
social and cultural interpretation (1968: vi).

Dadas as trajetórias intelectuais desses antropólogos o que teriam eles


perdido ao longo do tempo? Certamente não se trata do material etnográfico
propriamente dito, pois enquanto muitos continuaram a fazer uso dele anos
após o término da pesquisa de campo, outros deixaram extensa documentação
por analisar. Nesse contexto, o importante a ressaltar é que o que talvez tenha
empobrecido a obra desses antropólogos no decorrer do tempo tenha sido a
ausência da interlocução teórica que se inspira nos dados etnográficos. Sem o
impacto existencial e psíquico da pesquisa de campo, parece que o material
etnográfico, embora presente, se tornou frio, distante e mudo. Os dados
transformaram-se, com o passar do tempo, em meras ilustrações, algo muito
diferente e distante da experiência totalizadora que, embora possa ocorrer em
outras circunstâncias, a pesquisa de campo simboliza. Em suma, os dados
foram relegados à memória fria e perderam a presença teórica, e
conseqüentemente a presença na cosmologia do antropólogo. Isto significa,
em outras palavras, que o diálogo entre as teorias dos antropólogos (no caso,
ocidentais) e as teorias nativas (sejam elas Ndembu, trobriandesas, islâmicas ou
outras), diálogo este que se dá no antropólogo, desapareceu. O pesquisador,
agora sozinho, sem interlocutores interiorizados, voltou a ser apenas ocidental.
Para evitar o diagnóstico apressado de que estamos todos fadados à
30
`esclerose antropológica', lembro a palestra de Edmund Leach na qual o
autor elabora uma análise antropológica do acervo fotográfico de sua família
31
ao longo do século XIX. Nela, Leach refuta a diferença entre sociedades
`frias' e `quentes', revê a distinção entre história e mito e, com elegância e

Algumas exceções: Jack Goody, na Inglaterra; Louis Dumont, na França; M.N.


30

Srinivas, na Índia.
Esta conferência foi feita, em 1986, em duas universidades americanas: The Johns
31

Hopkins e Harvard. O texto foi publicado postumamente na revista Cambridge


Anthropology, com modificações na apresentação original dos slides; cf. Leach
1989-90.
expressividade, introduz, na série de fotografias de seus antepassados, algumas
de Malinowski, revelando, através da sua história pessoal, a base dos cultos de
ancestrais. Do interior da tradição da disciplina Leach aborda temas caros à
vertente pós-moderna: ele adverte para o fato de que os antropólogos ainda
mantêm a velha diferença entre `nós' e `eles', conscientemente ou não, e nota
o quanto seria excepcional se um antropólogo escrevesse uma monografia no
formato de autobiografia.
É curioso lembrar que Leach comentava, freqüentemente, que era
funcionalista metade da semana; na outra metade ele era um estruturalista. A
análise de sua árvore genealógica parece um acerto de contas com sua
identidade familiar e com sua trajetória como antropólogo. A crítica à
dicotomia `sociedades frias versus quentes' e a inclusão das fotos de
Malinowski nos dizem que, nos últimos anos, ele não mais dividia a semana
entre duas lealdades — Malinowski ocupava lugar de destaque entre seus
ancestrais.

IV
Novas provocações

Toda vez que elegemos um interlocutor, deixamos a descoberto alguns


traços característicos nossos. Foi esse truísmo que nos guiou na descoberta do
que era o `modelo canônico' para Nicholas Thomas; é ele que, agora, se faz
presente nestas reflexões finais. Encerro, então, provocativamente, com uma
agenda de problemas sobre outras implicações derivadas da pesquisa de
campo.
A meu ver o impacto profundo da pesquisa de campo sobre o etnólogo
ainda não recebeu a atenção devida. Uma evidência de sua complexidade está
na freqüência com que antropólogos renunciam à pesquisa, antes ou logo após
o seu início. Como tradicionalmente o trabalho de campo era realizado longe
de casa, essa desistência fazia com que o pesquisador fosse estigmatizado como
incapaz de enfrentar a experiência do exótico (o campo) sozinho, colocando-se
imediatamente em dúvida sua vocação. A legitimidade da pesquisa junto a
grupos exóticos era tão marcante que quando estudantes norte-americanos
começaram a pesquisar em continente europeu, já na década de 70, estes
foram considerados como `turistas' por seus professores mais tradicionais.
Mas existe também uma outra reação comum, que é aquela dos antropólogos
que, mesmo convencidos de sua vocação, não se dedicam à pesquisa de cam-
po, embora saibam do preconceito a que estarão sujeitos. Tais ocorrências
apontam para um impacto psíquico de tal dimensão que, em algumas circuns-
tâncias, se transforma em um desconforto insuportável. É verdade que no
meio acadêmico brasileiro tais casos não são particularmente problemáticos.
Em geral não só estudamos `nós mesmos', o que não produz desconforto
maior, como a `diferença' é construída às avessas: geralmente estamos nos
perguntando qual a nossa especificidade, em que somos peculiares, o que nos
separa e nos distingue.
No entanto, acredito que vale a pena, em qualquer das circunstâncias,
propor que o instrumental de uma outra disciplina, no caso a psicanálise,
talvez ajude a esclarecer certos processos de descoberta etnográfica: de Mali-
nowski a Victor Turner, até os recentes experimentos de Vincent Crapanzano
e Waud Kracke, a psicanálise tem despertado um certo encantamento, senão
32
fascínio, entre os antropólogos. Seria o momento, então, de aproveitar esse
vínculo entre as duas áreas. Penso, especificamente, na idéia de `transferência'
33
e seu potencial de criatividade no processo de descoberta antropológica e na
relação entre a transferência analítica e o impacto que Evans-Pritchard
identificou como constitutivo da pesquisa de campo.
Outro dos aspectos nebulosos que rondam a prática disciplinar na
antropologia diz respeito a assunto tabu entre os especialistas: trata-se da
conversão religiosa de vários antropólogos que, em determinada etapa de suas
carreiras, aderem a crenças institucionalmente reconhecidas. Tal conversão —
que no caso anglo-saxão se deu predominantemente mediante opção pelo
catolicismo (como ocorreu com Evans-Pritchard, Mary Douglas, Victor
Turner) — parece indicar que a antropologia favorece, em determinados
contextos, uma reestruturação da visão de mundo desses pesquisadores. Até
que ponto tal fato resulta do impacto da pesquisa de campo e suas
conseqüências é uma questão em aberto, já que não existem depoimentos

Ver, respectivamente, Stocking Jr. 1983; Crapanzano 1980; Kracke 1987; Turner
32

1978; no Brasil, os trabalhos de Luiz Fernando Dias Duarte (ver Duarte 1986). A
perda da noção do self é descrita pela antropóloga Kirsten Hastrup quando sua
biografia é representada por um grupo teatral dinamarquês (Hastrup 1992).
Ver Bird 1972 para o potencial de criatividade da transferência psicanalítica. A
33

pesquisa de Maria Luiza Peres da Costa, realizada em Goa, Índia, desenvolve essa
perspectiva. Infelizmente, seus resultados ainda não estão divulgados.
sobre essas conversões. Não deixa de ser sugestiva, contudo, a confissão de
Victor Turner, colocada de forma singela na introdução de um de seus livros:
`I have not been immune to the symbolic powers I have invoked in field
investigation' (1975b: 31). Turner acrescenta que, depois de muitos anos como
agnóstico e materialista, ele aprendeu com os Ndembu que o ritual e seu
simbolismo, a religião enfim, estava no centro das questões humanas. É
também interessante, nesse contexto, a afirmação de M.N. Srinivas, de que os
antropólogos são thrice-born, isto é, nascem uma vez mais que os brâmanes
hindus, que são twice-born: os antropólogos deixam sua cultura nativa para
estudar uma outra e, na volta, tendo se familiarizado com o exótico, tornam
34
exótica sua cultura familiar, na qual sua identidade social renasce.
Finalmente, verifico que vários antropólogos reconhecem que as
etnografias — que tanto perturbam Nicholas Thomas — constituem, mais que
os sistemas teóricos que elas suscitaram, a verdadeira herança da antropologia.
Esta foi a conclusão de Louis Dumont e de Lévi-Strauss. No Brasil, em
momento de particular lucidez, foi o que Darcy Ribeiro também confirmou:
seus diários de campo sobreviveriam a todas as teorias que ele propôs, no seu
35
entender, exatamente para serem refutadas.
Essa questão suscita um tema relevante: diferente do que se constata em
outras ciências sociais, dados etnográficos antropológicos freqüentemente são
alvo de reanálises. Em geral, a reanálise ocorre quando outro antropólogo
descobre um resíduo inexplicado nos dados iniciais que permite vislumbrar
uma nova configuração interpretativa. Ou quando um antropólogo aproxima
dados alheios de questões novas. Em qualquer dos casos, o que está em jogo é
a incompletude ou a abundância etnográfica, que incomodam menos que a
análise fechada. Esta foi a queixa formulada por M.N. Srinivas a respeito de
seu já clássico Religion and Society among the Coorgs. Para ele, um dos
problemas do seu trabalho era que `tudo estava muito bem amarrado, sem
36
deixar nenhum ponto frouxo'. Em suma, puras transcrições etnográficas
incomodam tanto quanto análises definitivas. Nesse contexto, as reanálises

Cit. em Turner 1975b: 32. A este respeito ver, também, DaMatta 1973, 1981; Velho,
34

G. 1978.
Cf. entrevista concedida em dezembro de 1978 no contexto da elaboração da minha
35

dissertação de doutorado; Peirano 1981.


Cf. Srinivas 1973: 141. Algumas vezes, o próprio autor revê seu trabalho de pesquisa à
36

luz de novas orientações interpretativas; ver Ramos 1990.


podem ser vistas como sinal de densidade das etnografias originais que
permitem, com sorte, uma nova visão, não `por cima dos ombros do nativo'
como queria Geertz, mas, nesse caso, do etnógrafo.
Concluo, então, com duas observações: primeira, de que toda (boa)
etnografia precisa ser tão rica que possa sustentar uma reanálise dos dados
iniciais. Nela, as informações não são oferecidas apenas para esclarecer ou
manter um determinado ponto de vista teórico, mas haverá sempre a
ocorrência de novos indícios, dados que falarão mais que o autor e que
permitirão uma abordagem diversa. Aos antropólogos soa familiar a
observação de Ítalo Calvino a respeito da exatidão na linguagem. Para ele, a
adequação do escrito ao não-escrito é problemática porque, de um lado, as
línguas naturais dizem sempre algo mais em relação às linguagens formalizadas,
comportam sempre uma quantidade de rumor que perturba a essencialidade
da informação; de outro, porque ao se dar conta da densidade e da
continuidade do mundo que nos rodeia, a linguagem se revela lacunosa,
fragmentária, diz sempre algo menos com respeito à totalidade do
experimentável (Calvino 1988: 88). Some-se a essas características das línguas
naturais a preocupação com a diferença (que freqüentemente se transforma no
`exótico') e haverá sempre mais informações que as necessárias para um relato
etnográfico apenas correto.
A segunda provocação está na idéia de que, então, a reanálise de um corpo
etnográfico é prova da adequação e qualidade da etnografia — e não, como
uma apreciação imediata de senso comum poderia indicar, da incapacidade
analítica do pesquisador. Em suma, rigor analítico e `ruído etnográfico' não
são incompatíveis na antropologia, fato comprovado pelas reanálises por que
passaram as etnografias de Malinowski, Evans-Pritchard, Edmund Leach,
Victor Turner e, no Brasil, as etnografias de Colbacchini & Albisetti, Eduardo
37
Galvão e Florestan Fernandes.
Com este fecho a favor da etnografia, concluo: novas análises e reanálises
virão para comprovar a fecundidade teórica do trabalho etnográfico. Elas

Ver Lounsbury 1965; Spiro 1982; Tambiah 1968, 1985, Leach & Leach 1984; Silva
37

1995 e cap. 3 desse livro. Para reanálise de material etnográfico brasileiro, ver
Peirano 1973; DaMatta 1977; Viveiros de Castro 1988. Ver Maybury-Lewis 1960
para crítica das propostas de Lévi-Strauss sobre organizações duais a partir de
considerações etnográficas. Naturalmente que a proposta teórica de Mauss em
`Ensaio sobre a dádiva', baseada nas etnografias de Malinowski e de Boas, é o caso
paradigmático dessa tendência na antropologia (Mauss 1974).
certamente irão reforçar a convicção central dos antropólogos: de que a prática
etnográfica — artesanal, microscópica e detalhista — traduz, como poucas
outras, o reconhecimento do aspecto temporal das explicações. Longe de
representar a fraqueza da antropologia, portanto, a etnografia dramatiza, com
especial ênfase, a visão weberiana da eterna juventude das ciências sociais.

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