Artigo o Estúdio Como Um Laboratório
Artigo o Estúdio Como Um Laboratório
Artigo o Estúdio Como Um Laboratório
como laboratório¹
Resumo
¹ Este artigo foi publicado no Livro: SANTOS, Luciane M. dos; PREVE, Ana Maria Hoepers
(orgs). Laboratórios de Ensino em Cursos de Licenciatura: Relato de experiências e
Práticas. Porto Alegre: Alcance, 2016, p. 88-98.
4
Formado por 23 participantes, dentre estes, professores da UDESC, outras IES,
alunos de Graduação e Pós-Graduação em Artes Visuais, e professores da Rede Pública
de Fpolis/SC. Site: http://www.apothekeestudiodepintura.com
=107=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
Há duas linhas que pairam sobre o tema do artista professor: a
primeira, instaura que é preciso ter produção, reconhecimento,
receber crítica, curadorias e ser legitimado pelo sistema de cir-
cuito de Arte; A segunda, (a qual, penso fazer parte), aponta para
a percepção sobre o tema, evidenciado por eixos: de perceber no ato
criativo a concepção de planejamento e metodologia para aulas, bem
como, da relevância em ter processos criativos singulares e expe-
rimentações (seja por meio de cadernos, diários, anotações, até em
produção sistemática que pode estar (ou não) inserira em um siste-
ma e circuito de Arte, ou da conversa com artistas e reflexões sobre
outros textos e diálogos e exemplos de outros processos. Ou seja,
para ser um professor artista, (é necessário a pesquisa ser ine-
rente ao processo de criação), também ponderar sobre o
lugar/tempo/espaço de produção e recepção do ‘objeto' artístico.
Assim como, compreender a produção de conhecimento sobre o ensi-
no/aprendizagem, articulada com o espaço da sala de aula, da Esco-
la, do estúdio do artista ao diário, ao caderno e/ou à cidade, onde
deambulamos sobre diferentes visualidades, e que, poderá servir
de lugar para outros processos formativos, fora de conteúdos e cur-
rículos, a isto nomeia-se transcognição, segundo Sullivan (2005).
Como professora de Graduação e Pós-Graduação em Universidade
pública no Brasil, venho me questionando: como desenvolver arti-
culação entre teoria e prática no ensino/aprendizagem em Artes
Visuais? Também questiono, como são os profissionais que saem da
Universidade hoje, dos Cursos de Artes Visuais? Independente de
ser professor, artista, artista professor, ou mesmo, artista edu-
cador, ocorre refletir sobre como os profissionais reverberam e
articulam a potência criativa entre fazer e pensar Arte, e mais,
qual o lugar da pesquisa em Arte e sobre Arte, na vida profissional
desse sujeito?
Dentro de um quadro amplo, do lugar onde situa-se a pesquisa
em Arte e sobre Arte, o artista professor está urdido em uma inter-
face crítica e criativa, seja ministrando aulas, organizando even-
tos, desenvolvendo pesquisas, realizando exposições ou desempe-
nhando funções administrativas em projetos e no contexto univer-
sitário.
Alan Thornton (2013), questiona sobre a construção da iden-
tidade do artista professor pesquisador: 1) Como eu me identifico
em minha profissão? 2) Com quais títulos, regras, práticas, conhe-
cimento, valores e vocações os outros me identificam? O autor, refe-
re-se aos rótulos e conceitos, com que, frequentemente lidamos
como artistas professores pesquisadores no contexto onde nos
=108=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
situamos como tal. Cabe salientar, que todo o objeto artístico
poderá ser passível de dinâmicas pedagógicas, políticas e discur-
sivas. Também relevante apontar que a Arte que ensinamos na Uni-
versidade é diferente da Arte, que circula no sistema e mercado de
Arte, que é diferente da Arte que ensinamos na Escola. Trata-se do
mesmo cerne (Arte), e no entanto, com objetivos e proposições dife-
renciados, (Lampert, 2009), o que pressupõe a construção de pensa-
mentos e ações em instâncias distintas, que invadem práticas
artísticas e saberes pedagógicos. Desta forma, minhas reflexões
incidem sobre o tema do artista professor.
O termo foi usado inicialmente por George Wallis, em meados
do século dezenove, e vem sendo construído desde então, para firmar
um retrato pedagógico da identidade associado a práxis do
fazer/saber Arte. Desde então, uma rede de ações, textos/teorias e
práticas foram desenvolvidas, para entender o processo de pensa-
mento que discute o lugar do artista professor, que é um processo
conceitual de ampliar um modo artístico e estético de pensar o ensi-
no de Arte. Assim, conforme Joaquim, p. 148-151:
=109=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
ca ou a capacidade de maravilhar-se com o que é produzido, mas há de
enfatizar a capacidade de instaurar um pensamento visual com mais
propriedade racional (mesmo que percebido como subjetivo). Do mesmo
lado, Educação tão pouco deverá ter o sentido de ler, escrever e
fazer cálculos, mas sim, 'formar' pessoas capazes de pensar criti-
camente, que sejam capazes de questionar e utilizar o pensamento cri-
ativo. Não sendo Educação, uma mera manutenção ou instrumento (tam-
bém) de controle do status quo e manutenção do Estado.
Assim, problemas geram respostas e respostas geram outros pro-
blemas, e isto obviamente, não cabe apenas no campo do ensino de
Artes Visuais, e sim, trata da área de Educação amplamente. Reflete-
se sobre a conjunção entre Arte e Educação, e a noção de que Arte tem
que ser uma parte do processo. Não se trata de entender "Arte na Edu-
cação" isto seria ainda, seguindo as reflexões de Camnitzer (2015),
um pensamento esquemático e fragmentado. Ler e escrever, não são ati-
vidades distintas de ver e desenhar, não é possível apartar concei-
tualização e questionamento de um processo de criação, desta forma,
ter uma visão multi, poli ou interdisciplinar claramente amplia o
repertório disponível para entender os elementos básico de um pro-
blema, e assim, Arte não pode ser uma disciplina ancorada em artesa-
nia ou fábrica de objetos, mas sim um meio ou lugar para organizar e
expandir conhecimento, isto porque é um meio de transbordar e trans-
gredir em diferentes áreas e metodologias, que questionam o próprio
conhecimento e sistema.
Trata-se de um exercício sobre o ‘duo’, sobre o duplo, no sentido de
percorrer fronteiras, ciente do risco, não somente criar uma zona
de contato entre o estúdio e a sala de aula, mas perceber em ações e
dinâmicas, que é possível uma colagem. Compreende-se que a aula
de Arte (Lampert, 2009), deverá ser um contexto multiplicador atra-
vés da pluralidade de confluências existentes em seu cerne, assim, a
colagem propiciaria estratégias conceituais e para Garoian e Gaude-
lius (2008, p. 23):
Dada a posição da colagem como uma forma usada para atrair con-
sumo, ela não é, coincidentemente, a forma de discurso mais
amplamente usada pelos sistemas mediados de massa de televi-
são, publicidade, noticiário, cinema e Internet. Além disso,
considerando o excesso de material visual disponível nos jor-
nais, revistas e outras formas de cultura visual, virtualmen-
te cada professor de sala tem empregado a colagem como um pro-
cesso rápido, fácil e barato de produção de imagem para os
estudantes ilustrarem o que eles aprendem em várias discipli-
nas acadêmicas.
=110=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
No entanto, a colagem poderá ser vista não como procedimento ou
meio somente de um fazer artístico tecnicamente concebido, mas sim,
evidenciar a dimensão estética e narrativa, entendendo a colagem
como um eixo conceitual que permeia a elaboração crítica do contex-
to. Na colagem há uma indecisão, narrativa de caráter representacio-
nal ou anti-representacional (seja qual for o caso), tratando-se de
um emblema para a cultura contemporânea, assim é necessário que seja
proposto ao ensino de arte uma atenção crítico/pedagógica sobre a
colagem.
Assim, partindo da interação (ou integração) entre theoria, prá-
xis e poesis entende-se um princípio onde são acolhidos sentidos múl-
tiplos que acabam por percorrer a tensão e a pulsão na Arte e Educa-
ção. Compreende-se que a pesquisa em Arte, que elabora um pensamento
sobre o processo criativo, não acaba em um objeto artístico, e sim
pressupõe a construção de um pensamento visual que pode ser subjeti-
vado em meio às questões que permeiam a cultura visual. Desta forma,
perceber o contexto relacional e o interstício social que a Arte pode
apontar, e isto não é negar a expressividade artística ou poesia ou
fantasia, como já foi dito, mas pressupõe entender a Arte como produ-
ção cultural.
Se pensarmos o artista e sua obra, a poética enquanto relação de
diálogo do processo criativo no fazer plástico e em correlação, pen-
sarmos a questão do professor e suas articulações na ação pedagógi-
ca, certamente encontraremos processo criador. Não é o processo de
construção plástica, mas sim a poética do ato criador exercido no
cotidiano da sala de aula, isto denota pensar o processo artístico
paralelo às questões que permeiam o ensino da Arte. Construir esta
poética é tarefa árdua, é amarrar a área de conhecimento a implica-
ções imbricadas no processo educacional. Levando-se em consideração
que estas questões e tantas outras são trabalhadas nos cursos de for-
mação, de acordo com Lampert (2005), é questionável o porquê ainda
encontrarmos professores em escolas (muitas vezes recém formados)
trabalhando de forma desconexa da realidade do aluno, sendo extrema-
mente conteúdista, aplicando provas, propondo atividades meramente
pelo fazer técnico, e sem fim educacional algum, ou por um mero valor
cartesiano.
=111=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
Imagem 1: Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke, 2014 – 2015. Estudos de
modelo vivo, colagem, natureza morta e anthotypes. Foto: Acervo do Grupo.
=112=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
Arte como Experiência
=113=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
nizado. O material vivenciado, ao mesmo tempo em que é marcado
pelas percepções, é transformado pelas experiências anteriores.
“A conclusão é uma consumação, e não uma cessação. Esta experiên-
cia carrega um caráter individualizador e autossuficiente.”
(DEWEY, 2010, p. 110)
A experiência singular/estética é uma espiral, seu fluxo con-
tínuo unifica a percepção entre o que é feito e o que é suportável;
cria conexões com experiências anteriores – uma observação cons-
tante entre o que existiu, existe e existirá, o processo é vivenci-
ado conscientemente. A ansiedade e as frustações, que fazem parte
da vida cotidiana e estão presentes no processo criativo, não são
impeditivas para que a inteligência organize a consumação da expe-
riência pulsante; discernimento entre ações e desejos, não há dico-
tomias, fragmentações entre inteligência e sensibilidade. Tudo se
relaciona, tudo está junto, é o próprio processo do viver unificado
ao ambiente tomando consciência de si – esse conjunto consciente
propicia ao sujeito uma experiência singular/estética. O estéti-
co, na filosofia da arte de John Dewey, não é um fator externo e que
se “lança” para a experiência. Tampouco está relacionado ao luxo,
ou é idealizado por qualquer corrente de pensamento transcenden-
tal. Para o autor, “o estético (...) é o desenvolvimento esclare-
cido e intensificado de traços que pertencem à toda experiência nor-
malmente completa (...) estético refere-se à experiência como
apreciação, percepção e deleite” (DEWEY, 2010, p. 125-127).
O estético presente na experiência e que faz desta uma expe-
riência singular/estética, possui uma forma distinta de operação.
O estético torna a experiência consciente através da classificação
do que é percebido – a consciência do conhecimento. Esse movimento
de relações está sempre unificado, incorporado com a apreensão
reflexiva de experiências anteriores. O material singular da per-
cepção estética é o equilíbrio e a proporção. Estes materiais sur-
gem da experiência, num primeiro momento das ideias, que proporci-
onam ao pensamento um carácter estético. A experiência se torna
predominantemente estética quando seu desenvolvimento é controla-
do, ou seja, quando aquilo que é feito transmite a ideia que está
sendo executada. A ordem e a realização existem e sinalizam o per-
curso da ideia, mesmo que assinalem o desvio e a ruptura (DEWEY,
2010).
Dewey afirma que “a arte, em sua forma, une a mesma relação
entre o agir e o sofrer, entre a energia de saída e a de entrada,
que faz com que uma experiência seja uma experiência” (DEWEY,
=114=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
2010, p. 128). Como o artístico está relacionado ao ato de produção
e o estético ao ato de prazer e percepção, uma obra acontece em sua
completude quando o artista, ao trabalhar, assume essas duas ati-
tudes transformando-a em uma só, ou seja, numa atitude artístico-
estética. O artista, na concepção de Dewey,
=115=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.
Referências
DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010
___________. A Escola e a Sociedade A Criança e o Currículo. Lisboa: Reló-
gio D’Água, 2002.
=116=
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.5, n.1, ano 3, março de 2017.