Antropologia Politica
Antropologia Politica
Antropologia Politica
alguma modalidade de Estado acoplada ou não a uma estru- em função da simples descendência u.nil~teral, que não pos-
tura unilinear ( Zulu, Kede, Anlcole), ficando pouco analisado suem aralelamente a mesma permanenc1a n~ ~~mpo que os
um terceiro tipo, que seria composto por situ.ações onde a grupot corporados e que não excluem a ress1b1lidade de um
política estivesse inserida no relacionamento de parentesco. duplo pertencimento por parte de seus a eptos.
Mas ao falar em contribuição de antropólogos ao estudo da Outra ordem de críticas provém de que _grande aarte das
política é necessário especificar a que orientação teórica e
metodoló ica estão vinculadas tais es uisas e, portanto, a ue
análises estruturalistas tomo as sociedades estuda ascomo
se essas es 1ve~ Ji,O a as e ~ ntivessem u . . o-
~-Gc~·
mo i e e · istoricamente re enc1a
No caso dos africanistas as eca as dos 30 e O
cor- e
nõiiüá---n õtttki: ecgnômica, cui!Bf r em rou ne~se sentid~
e
R. Cohen{Põíitical anthropology: t future of a p1onee~. ln.
pr o ma inteiramente a · · a bor- Anthropological quarterly. 38(3): 117-31, 1965) a necess!dade
aagem_.!ios,2istemas sociais. Em primeiro lugar, é vital a · de se estudar os sistemas político~ africanos tendo ~m vista o
-'~ que esses autores Tazem entre o domínio da _201íncã' fato - que já era bastante sens1vel , durante as decadas em
e ~ parentes59:, ~nquanto o último diz rêspeito às rela~ que ocorreram os estudos estruturalistas clássicos - .de que os
\!/ iirtê essoa1S, a ohtica se refere sempre às re ras ue aefinem sistemas nativos estavain sendo inco orados a entidades na-
o .relacionamento entre ~os co~ ora os m agens, c as, c10na1s mais a ran en es, so reviven_ o a en~s
"'1patélho ãdnrtrustrativo", gfüpós rêltg1osos oú rituais etc.) ( The
---
articulados ao enomeno a ru:.esença de uma a
structure of unilineal descent groups. ln: American anthropo- coToniaI.
lcgist. 1951. n. 55). Em segundo lugar, o que esses investi-
gado~es p~curam apreender _são as normas e p~scri~ s~ w e
@ norteiam idealmente o func1ona~ temas oií · os B3 Embora durante a década dos 50 a influência do estru-
tu~aÍismo tenha persistido e .al~un~ autores tenham t~ntado
a ricanos, vo tan o-se muito c aramente para tentar con ecer
realizar uma atua1ização e sofisticaçao da proposta contida e;
e ãnalisãr suas ideologias ( não escritas) de governo, para
detectar os "arranjos constitucionais" nativos (EVANS-Pl:UT- African political systems (ver MIDDLETON, J. & TAIT, ·
CHARD, E. 'Ê. & FORTES, M. [orgs.]. Op. cit., p. 12). Em
Tribes without rulers. London, Routledge & Kegan P~ul'. ~957),
as críticas aqui apresentadas confluíam ~ara a substitu1çao ~o
terceiro lugar, esses autores pressupõem geralmente que as
quadro teórico de orientação estruturalista por uma análise
(:;"\ sociedades que estudam se encontram em uma condição de
nova mais voltada para o estudo do conflito e das mudanças
UI "estal?.ilida(k relativa" (Ibid.), o que justifica a utilização de
modelos d e e.9uilíbrio para sua descrição. sociaís, atentando para a multiplicação de cri~ériosde form~ç_âo
clé grupos políticos e enfatizando uma análise das estrategias
B.2. Nas muitas críticas dirigidas a essa perspectiva, salien- e ações individuais. .
ta-se que em suas análises os estruturalistas clássicos desco- Algumas colocações mais relevantes me_recem ser salient_\\das.
Modificando a atitude de A. R. Radchffe-Brown de que a
* cera?1- =CW!i na :rêalidade;-sõc1eêlade ! l~umã~ v ã em
uilibno; ue o ue 1líes"'dlrva'"fãrãõãr'êriC1a eram os moctefos explicação sincrônica era por si só_ sati~fat~~a e constituía ·a
1 eo ogicos construi os e os na ·vos, os uais recuravam única base adequada para construçoes c1enhfic~, algu~ auto-
a~esentar os fatos a-e sua socie a e como .. armomosos, inte- res dão lugar de destaque em suas etnografias aos fatores
históricos ( EVANS-PRITCHARD, E. E. The Sanusi of Cy_re-
gr~ os e rel?e ·1 1vos .. ·-~··• . R. o 1t1ca systems of
h'íghlând Bunna. 1:ondon, Bell, 1954. p. 4-10).· naica. Oxford, Clarendon Press, 19.49), cneganêlo mesmo a
Outros antropólogos, retomando uma linha _de reflexão ab~rta efetuar p ~!ristó.rjg, biblio~áfjc;a e nosumental s~re as
por B. K. Malinowski ( Crime & custem tn savage society. s~ edades p_oi;_~s_ abo.! ~~ (BARNES, J. !',· Op. ci_t.).
i
London, Routledge & Kegan Paul, 19~ ª? observa,r .que a Côiiieça a delinear-se, então, uma ~va noçao de soe1e~~e,
conduta do primitivo não era consequene1a autom~tica de a qual repousa justainente na constataçao de que os propnos
determinações morais ou jurídicas, mas passava pela filtra~em ~pios estruturais básicos de certas sociedaaes são contra-
de seus interesses privados, objetaram que os estruturahstas dit~ raçao existente entre eles é sempre
clássicos haviam descurado inteiramente o estudo do compor- i~ x f ~ ! : _ , a~ açao ~:.,.me_canismos ête reajuste ÍUfÍ•
tamento individual. Na visão de autores como R. Firth ( Social ~ s•ôêiãis, econõm1cosêrifüa1s. Para mvestigar uma sOCle-
organization and social change. ln: Journal of the Royal dàdê aêsse '·ti~-=-õs- N'demõü,"êtâ"" Africa meridional - ·V. V/.
Anthropological Institute. 1954. n. 89, I_>· 1-20) e F. Barth Tumer ( Schism and continuity in an African society. Man-
(Models of social organiziitions. ln: Occasional papers. Londo_n, chester, Manchester Univ. Press, 1957) sugere que a unidade
Royal Anthropological Institute, 1966. n._ 23 ~, a preocupaçao básica da etnografia política seja dada pela consideração dos
unilateral em descrever as nQ11llaS e !)adroe~ eais de ~2.ll2.u!a
das sociedades pgmtlívas fiãviãlevãdo4 !g~~~~ sao
J
dramas soçjw, i.e., pela <;kscrição minucjma das ocasiões em
ocorre uma ru tura das normas aceitas n s ·
o rocesso ue se se ue e o ua a uela infra ão ou é
das esco!has, b~m como o~_gt~~~os.e m~.!!!ff·ª ~ s_ aS,JlQ!!!las reincorpora ã ao funcionamento socia , ou acarreta a separaçao
em fu_!l_ç~Q_~- mferesses e s1tua~oes p!_,r hcp ares'.: . do indivíduo ou grupo em uma nova unidade social autónoma.
Umoutrôcôõjunfü._c:Iêãütores, entre os quais ca_b ena ~es-
t~car especialmente J. A. Barnes ( Class an~ comm1ttees m a J. van Velsen ( The politics of kinshi . Manchester, · Man-
Norwegian island parish. ln: Human relat10~. 1954. v. VII, chester Univ. ress que es ou oura o os ong~)
p. 39-58; - - - . Politics in a changing society. Manch~s~er, da mesma região, a irma a necessidade de uma metodolo~a
Manchester Univ. Press 1954; - - . Networks and pohtical e de té_cnicas de pe_!Suisa novas, ~uestionando r'adicalmeíie
até a construçao ~ etnografia própria aos autores estrutura-
process. ln: SWARTZ, M. J. [org.]. Local-level politic~. ~~icago, listas. Para ele grande parte das generalizações de tais autores
Aldine, 1968), J. C. Mitchell, A. C. May~r _(The s1gruhcance
of quasi-groups in the study of complex soc1eties. ln: BANTON, e a própria descrição dos padrões de condutas e das crenças
M: [org.]. The social anthropology of complex s~cieties. London, se apoiavam em formulações de informantes nativos que não
Tavistock 1966) e J. Boissevain ( Friends of friends: networks, eram adequadamente enquadrados em termos situacionais ( i.e.,
manipulators and coalitions. New York, St. Martin Press, 1974; sem que fosse levado em consideração quem foi o autor de
BOISSEVAIN, J. & MITCHELL,_J. C. [o~gs.]. Network ana- tal discurso; qual a situação em que esse discurso foi pronun-
lysis: itudies in human interact1on. Pans, Mouton, 1973), ciado; quais as relações não explicitadas que existiam entre o
dedicou-se ao estudo .das diferentes modalidades de ~rupos falante, os nativos referidos em seu discurso e o etnógrafo
políticos, cujos critérios de constituição não podem ser fixados que o ouve).
Antropologia Política 66
C .1. Nesta última perspectiva, algumas vezes cara,c~erizada NER, V. W. Ritual aspects of conflict control in African micro-
com rocessualista a unida · anál' e ohhca des- politics. ln : SWARTl, M. J.; TURNER, V. W.; TUDEN, A.
loca-se o aml>1 o e uma sociedade ara o stu situa ões l orgs.] . Op. cit. ), considerando os aspe~os políticos de asso-
) a s,s a socia situa on ,n modem Zu u and. ciações étnicas ( BANTON, M. Adaptation and integration in
Mane ester, Manchester Univ. Press, 1942; Order and rebellion the social system of Temme immigrants in Freetown. ln:
in tribal Africa. London, Cohen & West, 1963). Contr~riamente WALLERSTEIN, I. [org.] . Social change: the colonial Bitua-
à divisão da sociedade em domínios autónomos, firma-se a tion. New York, Wiley, 1966), religiosas (COHEN, A. The
crença de que ~tieo é uw aspeçto l?rese,nte em qualquer politics of misticism in some local communities in newly
atividade humana. Na década dos 60 especial~ente, sur~em independent African States. ln: SWARTl, M. J. Local-leoel
várias sistematizações e conceitos novos. Para evitar as anáfises politics. Chicago, Aldine, 1968), de sociedades secretas ( - - .
holísticas de sistemas sociais, M. J. Swart~ V. W . ~ e The politics ol ritual secrecy. In: Man. 6: 427-48, 1971), de
A. Tuden propõem um novo co~ceilÕ: o _d~ p~ o~ , grupos da elite económica em uma cidade moderna ( FERRIS
ca o ao s uisador erse 1r s cóíiseoüe n~ m P. The city. Harmondsworth, Penguin, 1960) etc. '
con ·t ão s no as ua uer mve ue No correr da década dos 70 a crença de que a antropologia
o rocesso s dese bservam esses autores que limitar a política estaria limitada ao estudo de comunidades primitivas,
inves 1gação a um grupo, comunidade ou sociedade, seria isoladas ou relativamente equilibradas ~rdeu inteiramente sua
confiar em suposições não provadas de que aquele grupo apre- sustentação ( COHEN, A. O homem bídimensional. Rio de Ja-
sente plenas condições pata· o fechamento da análise ( lntro- neiro, Zahar, 1978). Nas várias coletâneas que se referem
duction. ln: Political antlíropology. Chicago, Aldine, 1966. p. 8 ) . precipuamente à antropologia política ( SPRADLEY, J. P. &
Em artigo posterior M. J. Swartz sugere que esses fatores que ~cCURDY, D. W. [orgs.]. Conformity and conflict. Boston,
não se fazem diretamente presentes no campo político consi- L1ttle, Brown, 1972; FOGELSON, R. D. & ADAMS, R. N.
derado, mas que sobre ele atuam e condicionam os processos [orgs.]. The anthropology of pow_er. New York, Academic Press,
ali desenvolviaos, sejam englobados em um novo conceito, o 1977; SCHMIDT, S. W. et alii [orgs.]. Friends, followers and
de arena ( lntroduction. ln: Local-level politics. Chicago, factions. Berkeley, Univ. of California Press, 1977) tem sido
Aldine, 1966. p. 8). . notada a tendência a que os diferentes trabalhos de pesquisa,
Com isso se estabelece uma nova visão da política, como sem se contraporem rawcalmente, enfatizem mais o estudo da
processo que não envolve necessariamente a presença do Es- política, seja segundo as próprias representações e a cultura
tado ou àe autoridades superiores e que pode . ocorrer tanto do grupo social abordado, seja em termos de esquemas de
no interior de pequenos grupos dentro da sociedade quanto decisão e de estratégias de ação elaboradas pelos seus ~gentes
chegar a extravasar suas fronteiras (WINCKLER, E. A. Op. cit., ( COLSON, E. Power at large: meditation on the Sympasium
p. 303). Como definem M. J. Swartz, V. W. Turner e A. Tuden on Power. ln: FOGELSON, R. D. & ADAMS, R. N. Lorgs.].
(op. cit., p. 7) é político "tudo que é ao mesmo tempo público, \ Op. cit., p. 378-84).
orientado para certos fins e 9.ue envolve uma diferença de
poder [no sentido de controle] entre os indivíduos do grupo D. Atualmente alguns autores têm r.rocurado encaminhar uma
/ em questão". _ proposta nova para o estudo da política, apoiando-se para isso
Segundo tais autores um componente básico dos processos em uma consiaeração explícita da teoria marxista. '.e dessa
políticos é que neles se desenvolve uma competição em torno forma que deve ser entendido o esforço crítico de H. Alavi
aa obtenção de certos fins aceitos _ou -definidos por grupos (Peasant classes and primordial loyalties. ln: The fournal of
( e não apenas por . indivíduos isolados); _isto é que torna a peasant studies. 1 ( 1) :23-62, 1973) ao avaliar as diferentes
atividade política um P.rocesso úblico, oi · uestões vertentes da antropologia política, por ele caracterizadas como
afetam o interesse e ru os e _nao apenas de a umas estruturalismo e indiviaualismo metodológico. Procurando for-
essoas em r. en ro e ta grupo n cessano necer um substrato social mais denso ao estudo das diferentes
supor a enstencia de qualquer hierarquia permanente de poder, formas de coalizões ( ver NICHOLAS, R. W. Factions: a
nem tampouco imaginar que os meios empregados para atingir comparative analysis. In: BANTON, M. [org.]. Political systems
tais fins sejam apenas os recursos institucionais e legítimos. and the distribution of power. London, Tavistock, 1965;
Além do mais, não há qual'luer razão para supor que a política BOISSEVAIN, J. Op. cit.), Alavi aponta a importância de um
diga respeito tão-somente as atividades que visam, de forma estudo da formação de classes sociais apoiar-se em uma análise
direta ou não, a promover o bem-estar ou a continui,d ade da p~ocessualista, passando por outro lado a incorporar o perten-
existência do grupo, podendo abranger do mesmo modo as c1ment~ ~e class~ à próJ>ri~ definição de certos tipos cruciais
atividades que visam ao desenraizamento das estruturas de coahzoes. Assim ele ( lbid., p. 53) constrói alguns conceitos
(SWARTZ, M. J.; TURNER, V. W.; TUDEN, A. Op. cit., p. 6). novos e de bastante eficácia operativa, como ocorre com a
Concluindo, afirmam esses autores que a política é o "estudo definição de alinhamentos horizontais ( intraclasse) e alinha-
dos processos envolvidos na determinação e implementação de mentos verticais ( interclasses ) , por meio dos quais podem ser
objetivos públicos e na obtenção e uso de poder diferencial pensados os fenómenos relativos ao conflito de classes e aos
pelos membros do grupo relacionado com aqueles objetivos" ~ários mecanismos de dependência ( patronagens, cliente-
(Ibid., p. 7). lismo etc. ) .
Fica bem claro porém que os autores marxistas não desem-
•2. · Ainda que tais fo~ulações dos antropólogos processua- bocam ~m uma antiantropologia política, tomando como ponto
hstas tenham representado um grande avanço em face do de partida de suas reflexões mais freqüentemente os autores
~truturali_smo clássico, é necessário admitir que esses autores p~~c~ssualistas. A crítica que lh~ fazem é bem ·abrangente,
nao co~titu~rllfi! um corpo teórico homogêneo para o estudo amg_mdo-se ao ce~tro do pensamento político ocidentaf. Em
d~ _pohtica, ªJ?Olando-se freqüentemente em conceitos e defi- um 1m~ortante a~go onde discute a monografia de F. Barth
ruçoe,s encaminhados por diferentes tradições teóricas ( M. ( op. cit. ) sobre liderança entre os Swat Pathans, T. Asad
Weber, T. Parsons, D. ~a~on, D. Apter, R. A. Dahl, G. A. ( Market model, class structure and consent: a reconsideration
Aln;i~nd). Apesar df:Ssa limitada contribuição a uma teoria do of Swat E?li?cal organi~tion. ln: Man. 7(1):74-94, 1972)
pohtico, a perspectiva processualista abriu aos antropólogos
l\
aponta os bm1!es da anáhse processualista. Enquanto F. Barth
novos campos de estudo ~a conduta política, investigando por t~ma como, guia para sua análise a questão de como um indi-
exemplo os aspectos políticos de um ritual não-poHtiçg (TUR- Vlduo ( 0 líder) pode formar em tomo de si um conjunto de
'
Antropologia Social
seguidores, T. Asad (op. cit., p. 90) pondera que esse problema passo que a etnologia "com seu método estritamente hist6rico
só s~ co!oca porque o autor omite os processos concretos de só nos - pode revelar se certos fatos aconteceram ou se têm
donunaçao de classe e de acesso aos meios básicos de ro- probabilidade ou possibilidade de terem acontecido" (Ihi?·•
dução Se os líderes são justamente os indivíduos que controYam p. 29-30). Seguindo a tradição de Durkheim e da Année 80CI<!·
o uso da terra, q~e constitui problema social significativo logique ele também distinguiu psicologia de antropologia
par~ a grande mruo~a da população é_ como tei acesso à terra, social, ;ustentando que: ". . . primeir~ ~ta do comporta-
denva~ao .ª formaçao ~e _grupos políticos e f a ~ desse pro- mento individual em sua relaçao com o indivíduo; a segunda
cesso meV1tável de verticais, de alianças e confrontos trata do comportamento de grupos ou corpos coletivos de
com outros grupos socialmente dominantes. indivíduos em sua relação ·com o gnipo (Ibiâ., p. 17). Para
P~a T. Asad, apesar de _suas inovações, os processualistas uma análise posterior sobre a ampli~de desse campo ~e estudo,
partilham com os estruturalistas uma mesma questão aquela segundo a tradição de A. R. Radchffe-Brown, cabe atar E. E.
que está na base da concepção ocidental da política deriva Evans-Pritchard (Social anthropology. London, Cohen & West,
da velha questão formulada por T. Hobbes: dado um conjunto 1951).
de indivíduo,s dotados de interesses e valores contrastantes
como é possivel que entre eles, ao invés de se estabelecer C. Alguns antropólogos norte,americano~ ?>~ideram antro-
c~os! surja uma ordem políti~a que l~es permita uma exis- pologia social e antropologia cultural iden_!icas ou quase
tene1a _comum suportável? Urudo à tradição marxista, r. Asad idênticas no que diz respeito à esfera de açao, encarando.ª
( op. ~t._. p. 92-3) observa que a busca de uma ordem folítica etnologia como o aspecto teórico e g~n~r~te, a etno~a
constitui _falso problema, uma preocupação secundaria ou como o aspecto descritivo de tal d_!saplin_'.1, Assim, M: ~iti~v
mesmo artificial para os agentes envolvidos, um guia profunda- em seu compêndio geral diz que: . . . nao se f~ distinçao
men~e e!1ganoso p~ra as ?~crições do etnógrafo e para as entre o etnólogo e o antropólogo cultural ou social. Alguns
explicaçoes do ~~sta poh~co. Toda sociedade já possui uma matizes diferenciais podem surgir com o uso dos termos sepa-
certa ordem po!1tica, que e a ordem imposta ou defendida radamente, mas eles se confundem bastante para 4ue se possa
pel~. class: ~ommante. A ques~ão significativa para a análise mantê-los separados" (The science of man. New York, Henry
política nao e, po_rtanto, a geraçao da ordem política, mas como Holt, 1954. p. 329, nota) . A. L. Kroeber (Anthropology. New
uma classe dommante pode reproduzir as condições de sua
própria dorrúnação. .
li York, Harcourt, Brace, 1948) ou fala conjun~a~ente de a~tro-
pologia social e cultural ou as funde numa um~ expressao . -
,. João Pacheco de Oliveira Filho antropologia sócio-cultural. Os autores que consideram a dlS-
Ver também: ANT;llOPOLOGIA; ANTROPOLOGIA SO- tinção desnecessária tendem a argumentar que todo comporta-
CIAL; crnNCIA'J>OLlTICA. mento social humano é influenciado por padrões e definições
culturais, e, ao contrário, que a cultura é essencialmente social
em sua transmissão e distribuição entre os membros de uma
Antropologia Social (S_~cia\ Anthropology) ' sociedade.
A. São bastante variados os usos ' da expressão antropologia D. Outros autores norte-americanos distinguem a antropologia
social, e se confundem muito com antropologia cultural, etno- cultural da social, e geralmente em termos semelhantes aos de
logia e etnografia para permitir a formulação de uma única E. A. Hoebel, que afirma que a antropologia social estuda
definição. ". . . o comportamento social per se e só muito incidentalmente
. . . os aspectos técnicos da cultura material" ( Man in the
B. A expressão é mais usada na Grã-Bretanha e na Comu- primitive world. New York, McGraw-Hill, 194tl. p. 5). As obras
nidade Britânica do que nos EUA ( ver por exemplo, RADIN, de G. P. Murdock, Social structure (New York, Macmillan,
P. Social anthropology. New York, McGraw-Hill, 1932) . Um 1949), e de R. H. Lowie, Social organization (New York,
dos primeiros britânicos a analisar o assunto foi J. G. Frazer Rinehart, 1948), são exemplos dessa disciplina. Freqüentemente,
(The scope of social anthropology. London, Macmillan, 1908). como acontece com Hoebel, esses autores consideram a antro-
Frazer reservou a expressão par! "uma seção especial" ( Ibi~., poloipa social como parte da antropologia cultural. Entretanto,
p. 4) do estudo da sociedaáe: ..., a esfera da antropologia não e sempre assim. Os antropólogos britânicos contemporâneos
social, a meu ver, ou ao menos como me proponho encará-1a, tendem a admitir que antropologia social designa uni campo
está limitada aos primórdios, ao desenvolvimento rudimentar bem mais amplo do que o que pensam muitos norte-americanos,
da sociedade humana" (Ibid., p. 6). "Sua esfera de ação", tornando a expressão sinônima de antropologia cultural, no
argumenta ele, "pode ser dividida, grosso modo, em duas sentido geral empregado na América, ou de antropologia sócio-
seções, uma das quais inclui os costumes e as crenças de cultural. Assim, de acordo com R. Firth, diz-se geralmente
selvagens, enquanto a outra inclui as relíquias destes costumes· que os antropólogos sociais "estudam uma sociedade, uma
e crenças que sobreviveram no pensamento e nas instituições comunidade, uma cultura .. . " ( Elements of social organization.
dos povos de mais cultura" (Ibid., p. 11). Uma análise pos- London, Watts, 1951. p. 22). S. F. Nadei, ao analisar a esfera
terior, e que foi influenciada pelas obras de ll:. Durkheim e de ação da antropologia social, diz: ".. . nem antropologia
seus sucessores na França, é a de A. R. Radcliffe-Brown, The social nem cultura[ definem nossa matéria satisfatoriamente ...
met_hods . of ethnology and social anthropology ( in: . So~th essencialmente bidimensional, ela é sempre cultural e social"
Afncan 7ournal of science. 1923. v. 20, p. 124-47, transcnto m: ( The foundations of social anthropology. Glencoe, III., Free
RADCLIFFE-BROWN, A. R. Method insocial anthropology. Press, 1951). Contudo, a antropologia social britânica está em
Chicago, Univ. of Chicago Press, 1958. p. 3-38). Ele distingue boa parte voltada para organização e estrutura social, especial-
antropologia social de etnologia - tanto da etnologia autêntica mente a estrutura de parentesco. Além disso, a maioria dos
como das formas de história conjetural pelas quais os etnólogos antropólogos britânicos exclui completamente da antropologia
do séc. XIX estavam obcecados. Ele acreditava ( Ibid., P· 8) social um ramo da antropologia sócio-cultural, i.e., o estudo
que a expressão antropologia social devia aplicar-se ao "estudo puramente histórico das ligações genéticas de culturas e a
due procura formular as leis gerais subjacentes aos fenômenos aifusão de traços culturais através do tempo (EVANS-
. a c~tw;~"· Tal estudo permitiria chegar a "generalizaç_ões PRITCH~~. E. ~- (!P· cit.). Isso se deve à grande ênfase
mdutivas que "podem nos dizer como e ~r que as coisas que os bntarucos dao a compreensão dos relacionamentos fun-
acont1:cem, i.e., de acordo com que leis" (Ibid., P· 30); ao cionais de traços culturais dentro de todo o contexto, o que