Vampires Never Get Old, Tales With Fresh Bite
Vampires Never Get Old, Tales With Fresh Bite
Vampires Never Get Old, Tales With Fresh Bite
Rebecca Roanhorse
Meu carro velho vaga pelas ruas vazias de Blood River. Eu nem
teria um carro se tivesse escolha, mas preciso de um carro para
levar minha mãe às consultas semanais com o médico no hospital
da cidade vizinha. É também por isso que consegui o emprego na
Lanchonete. Meu salário, o pouco que sobra dele, vai para pagar
esse pedaço de lixo e o que sobrar vai para as contas médicas de
mamãe.
Blood River não é muito grande. Cerca de dez quilômetros
quadrados de ruas ortogonais. Estamos a uns quarenta quilômetros
da rodovia principal. É uma daquelas cidades que já foram
importantes quando a ferrovia percorria por aqui e passavam silos
de grãos cheios, porém, agora com as grandes rodovias e aviões e
ninguém plantando mais grãos, as pessoas não vêm mais aqui.
Blood River é o que algumas pessoas chamam de uma cidade sem
vida. Quer dizer, tem a lanchonete, e os jogos de futebol americano
do colégio são muito populares nas noites de sexta-feira, e tem
alguns lugares que tentam atrair turistas para fazer canoagem ou
pescar com mosca no rio próximo, mas a única coisa pelo que nós
somos realmente famosos, o que deu nome ao lugar, foi um
massacre.
Não tão popular entre os turistas.
Passamos pelo antigo cemitério e entre ruas desertas, passando
por quintais cobertos de mato e casas de um andar com a pintura
descascando nas laterais das tábuas. Entro na esquina que Neveah
manda e chegamos a um trailer em cima de blocos de cimento e a
um punhado de carros velhos estacionados aleatoriamente no
cascalho a frente.
— É aqui — ela diz.
Eu encosto com o carro. Não falamos muito durante toda a
viagem.
Ela abre a porta do passageiro. A pequena luz do teto se acende,
e posso ver seu rosto. Sua pele é de um branco pêssego, quase o
oposto da minha pele marrom, e seu cabelo é amarelo vivo com a
raiz mais escura. Suas unhas são longas e de um azul brilhante com
pequenos strass incrustados nas pontas. Ela para, uma perna
vestida de jeans para fora, o resto do corpo ainda no carro. Ela olha
para mim, o lábio inferior preso entre os dentes, os olhos castanhos
muito grandes.
— O que foi? — Pergunto, cauteloso.
— Obrigado pela carona — ela diz. — Eu sei que as pessoas da
cidade são uma merda com você por você ser...
— Nativo?
— Gay.
Nós dois ficamos corados e envergonhados. O silêncio se
estende como outro bloco solitário deste monte de lixo de cidade.
— Sinto muito pelo seu olho — diz ela apressada.
Meu coração acelera um pouco, mas franzo a testa como se não
tivesse entendido. — O que você quer dizer?
— Que Jason Winters bateu em você, que ele e os gêmeos Toad
sempre batem em você. Que essa é a razão pela qual você nunca
vai à escola. Bem, isso e sua mãe estar doente.
Eu olho para ela fixamente, desejando que ela cale a boca.
— Acho que é por isso que você gosta tanto da história dos
Garotos de Blood River. É como uma fantasia, certo? A ideia
daqueles meninos vindo para resgatá-lo da sua vida de merda nesta
cidade de merda.
Meu rosto esquenta, o rubor subindo pelo meu pescoço. — Meu
interesse pelos Garotos de Blood River não tem nada a ver com
nada disso — minto categoricamente. — Eu simplesmente gosto de
uma boa história.
— Você tem certeza?
— Positivo.
— Porque se fosse comigo...
E eu sei que ela não entenderia. — Boa noite, Neveah — eu digo,
estendendo a mão e empurrando a porta para abrir um pouco mais.
Ela franze a testa.
— Boa noite! — Eu repito.
Ela entra de novo no carro e pega meu braço. Eu me encolho. É
uma resposta automática, nada pessoal, mas que deixa sua mão
pairando no ar. A luz do teto reflete nos strass em suas unhas. Ela
puxa o braço para trás e diz: — Estou tentando ser legal com você.
Tentando ser simpática.
— Mantenha isso para você — eu digo asperamente e, mesmo
enquanto as palavras saem da minha boca, eu me arrependo delas.
Mas eu não sei o que seu tipo de simpatia significa. Isso cheira a dó
de menina branca para mim, e eu não quero a pena de Neveah. Eu
lanço um olhar sério para seu trailer, os veículos batidos em seu
quintal. Você não é melhor do que eu, digo, sem dizer nada. Basta
olhar em volta.
Seu rosto se contorce e meu estômago cai até meus pés como
um peso morto. Estou sendo um idiota e sei disso, mas não vou
voltar atrás.
Ela acena com a cabeça uma vez e desliza para fora do carro.
Fecha a porta e a luz do teto se apaga, me lançando na escuridão.
A vergonha me cobre e eu gemo, esfregando a mão no rosto. Por
que eu fiz isso? Não é à toa que não tenha amigos. Não é de
admirar que Jason Winters goste de chutar minha cara. Eu meio que
sou um cuzão.
Eu espero ela ir até a porta e, uma vez que ela entra, eu saio com
o carro, o cascalho rolando sob minhas rodas. Estou no meio do
caminho para casa, tentando desesperadamente não pensar no que
Neveah disse, quando percebo que estou cantarolando aquela
música novamente. A canção dos Garotos de Blood River.
Mais tarde, depois que tudo isso acabar, me perguntarei se as
coisas teriam sido diferentes se eu tivesse dito algo. Pedido
desculpas por ser um idiota, admitido o que eu queria e por quê os
Garotos me fascinavam, como me sentia em relação à minha mãe e
tudo mais. Talvez Neveah pudesse ter dito algo, conjurado algumas
palavras ou um toque caloroso que teria mudado as coisas. Mas eu
não falei e ela não fez nada e as coisas ocorreram da mesma
maneira que sempre ocorrem nesta cidade sem vida.
Julie Murphy
Heidi Heilig
Tessa Gratton
A primeira vez que ele me mordeu foi bem na virilha, e eu não dei a
mínima porque ele apenas me arruinou para todos os outros caras.
Não para todas as outras garotas - garotas eram melhores nisso,
especialmente Sid.
De qualquer forma, acho que tinha uma veia ali embaixo.
Eles me deram uma escolha. Viver para sempre como uma filha da
noite (sim, Esmael usou exatamente essas palavras), ou esquecê-
los e viver meus dias, sejam eles quantos forem, sob o sol.
Na manhã seguinte, deitei-me ao lado de minha mãe e contei
tudo a ela, apenas para desabafar. Mamãe sempre disse que falar
algo pode mostrar a direção certa. Enquanto explicava tudo, eu
fiquei pensando que, já que fiz tanto furdunço sobre não ter uma
escolha sobre com quem eu queria dormir - nasci assim, etc., etc. -
seria melhor levar essa escolha, sobre quem e o que eu queria ser,
muito a sério.
— Se você pudesse viver para sempre, você viveria? — Perguntei a
Sid enquanto nos espremíamos pelo corredor até nosso bloco.
Quando estava muito frio, nós duas passávamos a hora no auditório
com a Sra. Monroe e eu geralmente terminava minha leitura de
biologia da semana. Então eu não tinha que arrastar aquele bloco
de concreto em forma de livro para casa.
Sid inclinou a cabeça e puxou o cós enrolado de sua saia
plissada. Eu usava a opção de calça do uniforme durante todo o
inverno, mas Sid dizia que a única coisa que a fazia se sentir
realmente católica era puxar a saia para cima até que todos os
professores considerassem pegar uma régua para conferir se
seguia as regras do uniforme. — Como um Highlander, ou um
vampiro, ou em algum tipo de loop da relatividade ou algo assim? —
Sid conhecia esse jogo.
— Um vampiro. — Eu não me incomodei em ser casual sobre
isso, e eu a encarei como se quisesse afundar meus dentes em seu
pescoço pálido.
Seus lábios se curvaram em um sorriso, porque ela gostava
quando eu ficava estranhamente intensa, dizia que era minha
característica de artista, e empurrou a porta do auditório com o
quadril. — Acho que sim. Tipo, um vampiro não tem que viver para
sempre, então você pode simplesmente viver o quanto quiser. Você
tem que matar pessoas?
(Eu fiz a Esmael a mesma pergunta. Ele arrastou os nós dos
dedos pela minha perna nua e disse: — Não, mas você pode.)
Eu balancei minha cabeça para Sid.
— A única desvantagem é o sol?
Escolhemos uma fileira curva de assentos sujos de teatro antigo
e nos sentamos bem longe da maioria dos alunos do terceiro ano
que compartilhavam nosso bloco. — E água benta e alguns tipos de
magia.
— Magia, uh, então não é algum tipo de vampiro viral, mas um
tipo de demônio.
Seti e Esmael não pareciam particularmente demoníacos para
mim, mas eu supus que tecnicamente era correto. — Sim.
— Eu acho que provavelmente sim, mas talvez eu queira esperar
alguns anos até que eu seja maior de idade. E talvez tentar perder
alguns quilinhos.
Meus olhos se arregalaram. Eu nem tinha pensado nisso. Se a
transformação mantivesse meu corpo exatamente do jeito que
estava, eu teria essa barriga e gordura em volta do meu sutiã para
sempre.
Eu deslizei na cadeira do teatro para apoiar minha cabeça contra
a parte das costas e olhar para o teto.
— Você vai viver para sempre comigo? — Sid sussurrou em meu
ouvido.
Isso não fazia parte da escolha; os vampiros foram claros. Só eu,
e se tentasse transformar alguém nos primeiros cinquenta anos,
eles matariam a nós dois. Eu a beijei rapidamente. — Claro — eu
disse. — Nós vamos mandar na noite juntas e vamos tumultuar o
mundo todo.
Fiz uma lista para minha mãe de tudo no mundo que eu mudaria.
Essa só tinha uma linha.
Samira Ahmed
Você pode estar amaldiçoando bastante a sua vida agora, mas não
há razão para se desesperar; não é uma tragédia. Esta não é a Mãe
Índia. O que quer dizer que você não viu esse filme? É um clássico.
Não importa, você tem todo o tempo do mundo para se atualizar
com os filmes que perdeu. Literalmente. Hello, re-assista todos os
mais de oitenta filmes de Shah Rukh Khan. Mime-se.
De qualquer forma, estamos divagando. (Se você se atrever a
chamar o rei Khan de uma mera digressão.)
Este folheto prático é seu guia de campo, seu roteiro, seu livro de
receitas. Estamos aqui para separar o mito da realidade.
Vampiros, zindabad!
QUEM É VOCÊ?
Bem, além de um vampiro recém-transformado. Todos vocês são de
religiões diferentes, ou talvez nem tenha uma. Vocês falam idiomas
diferentes. Vocês são de regiões diferentes. Alguns de vocês podem
pensar que suas almas foram condenadas. Alguns de vocês podem
acreditar que, de alguma forma, não são desnaturados. Que você é
uma das antigas criaturas sobrenaturais dos mitos e religiões desi.
Vamos esclarecer as coisas.
Você não é um gênio – eles são metamorfos feitos de fogo sem
fumaça.
Você não é um Rakshasa – muitos deles também mudam de
forma, nascidos da respiração de Brahma, guerreiros.
Você não é um ghul – ok, eles são considerados mortos-vivos
também, mas são mais comedores de carne do que sugadores de
sangue. Além disso, eles têm essa excelente habilidade de serem
capazes de assumir a forma da pessoa que comeram mais
recentemente. E eles também são metamorfos! Aparentemente,
toda essa região é forte em metamorfos. Infelizmente, você não
pode fazer isso. Queria que pudéssemos.
Você não é um demônio. Lembre-se de que repudiamos essa
calúnia e teoria. Sua alma não foi devorada por uma entidade
maligna – tipo, você não foi subitamente transformado num CEO
americano bilionário que pensa que pode comandar um país ou um
capitalista sugador de vida que voa em seu jato particular para
Davos para reclamar do aquecimento global e não entende a ironia.
Você é um vampiro.
Você é o que sempre foi. Se você fosse um nerd estudioso em
sua vida humana, adivinhe? Você ainda é! E muito bem por ter
estudado tanto para as provas finais do Ensino Médio. Se parece
que tudo foi em vão, não se preocupe! Estamos trabalhando com o
ministro da educação para permitir que você faça as provas, mesmo
que não haja uma faculdade que possa ir. Ainda. Se você era uma
pessoa matinal que amava acordar cedo mais que tudo e correr ao
amanhecer, sentimos muito. Vai ser uma merda por um tempo, e
não de um jeito bom.
Os vampiros são criaturas da noite – a luz do sol não é nossa
amiga. Muitos de nós dormimos, lemos durante o dia ou tentamos
organizar o inferno do armário de temperos da cozinha antes que
nossas mães nos digam que o garam masala vencido há sete anos
em algum pacote de plástico turvo ainda está bom, muito obrigado.
Ou abane nossos daddis ou nannis no calor escaldante com aquele
pankha vintage bordado à mão que eles têm desde antes dos carros
serem inventados. E não podemos enfatizar o quão crucial as suas
habilidades de se esquivar serão agora, já que você ficará em casa
o dia todo e, sem dúvida, estará morrendo de vontade de fugir das
diversas tarefas "especiais" que seus pais reservaram para você.
“Beta, já que você está preso aqui dentro de qualquer maneira...” é
um refrão com o qual você se tornará dolorosamente familiar.
Estamos brincando, mas, honestamente, conselho de um sábio:
se você era um dacoit vagabundo, inútil, sem vergonha e sem
respeito pelos mais velhos em sua antiga vida, ponha ele pra fora.
Você provavelmente vai ser muito pior agora, e esta comunidade
não precisa de mais drama ou banditismo.
Você é um imortal. E isso pode ser maravilhoso e assustador ao
mesmo tempo. Seu mundo virou de cabeça para baixo. Dia é noite.
Muitos daqueles que você amava irão evitá-lo. Vão chamá-lo de
intocável. Mas há um mundo para você descobrir – onde o tempo
não é mais seu inimigo. Exceto quando se trata de todos os mortais
que você ama, que morrerão de velhice.
Correção: o tempo não é mais o inimigo de sua vaidade pessoal.
Ainda é um ladrão. Mas pelo menos não roubará sua beleza. E,
querido, você é um arraso.
Conheça esta regra inquebrável: Nenhum bebê. Nenhum menor de idade. Nenhum
pobre
Ninguém que foi jogado nas ruas e marginalizado.
Não faça o que foi feito para você.
Lembra-se da forma desi de nutrição? Coma o que estiver
disponível, causando o mínimo de dano possível ao meio ambiente.
A sua memória da noite passada está ficando mais clara agora? O
que aconteceu? Quem fez isso com você, sem o seu
consentimento? Lembra do turista britânico? Aquele que parecia
muito pálido e provavelmente estava vestido com algum tipo de
kurta com jeans e chappals de borracha pensando que estavam se
misturando? Até parece.
Agora você entende? Sua principal diretriz alimentar: Coma os
colonizadores primeiro.
Aqui está um fato simples e inegável: turistas britânicos brancos
estão prontamente disponíveis. Para ser claro, queremos dizer
britânicos Britash: o Angrez. (Não é como se eles pensassem em
mais ninguém como britânico, de qualquer maneira. ) Você já
esteve em Baga Beach nas férias de inverno? Eles estão
praticamente tropeçando um no outro no sábado à noite do Mackie's
Bazaar, tentando pechinchar com um pobre vendedor de
bugigangas quase à beira da morte. Ou no Taj Mahal, durante, ah,
literalmente qualquer estação, empurrando uns aos outros para
conseguir o encaixe perfeito de “Toque no Taj” e de alguma forma
esquecendo que é na verdade uma tumba – o local do descanso
final de uma rainha e seu amado. Imagine como eles reagiriam se
milhares de desis aparecessem no túmulo de Churchill, de ressaca
e reclamando do estômago de Delhi. Obviamente, isso é hipotético;
sabemos que nenhum de vocês iria lá, a menos que fosse para
cuspir no túmulo do homem que deixou alguns milhões de bengalis
mortos de fome.
Mas estamos divagando.
O Des está repleto de turistas Angrez, e sugerimos que, após
alguns momentos de observação cautelosa, você escolha aquele
que seja mais desagradável. O vândalo. Aquele que está mais
bêbado e mais rude do que todos os outros. Aquele que é ouvido
reclamando em voz alta sobre como as condições anti-higiênicas
são ou como é incivilizado para as pessoas comerem com as mãos
ou como os britânicos fizeram um favor (!) à Índia ao colonizá-la.
Você sabe quais queremos dizer. Confiamos no seu julgamento.
Você pode estar se perguntando como irá atrás de suas vítimas.
Essa é realmente a parte fácil. Ligue o seu charme. Prometa-lhes
um acordo. Mostre a eles um caminho para a melhor loja de bhang
lassi. Diga a eles que você conhece o melhor cigarro de beedi da
vizinhança. Atraia-os e deixe seu instinto assumir o controle. Você já
passou a língua nos dentes? Notou que seus caninos parecem
extremamente pontudos? Voilà! Deixe sua bandeira de vampiro
voar!
MAS.
A última coisa de que precisamos é que os vampiros turistas
invadam a Índia. E, sim, se você morder um humano e beber um
pouco de seu sangue, seu vampirismo se espalha (enzimas
transferidas do contato direto da saliva com o sangue) e você os
transforma. E, claramente, não é sustentável se continuarmos
gerando mais e mais vampiros que, por sua vez, diminuem a
população humana, eventualmente levando a apenas vampiros, que
morrerão de fome. Nós não queremos isso. Especialmente com os
Angrez, porque então acabaríamos recolonizando o Sul da Ásia com
os mortos-vivos britânicos.
Não. Uma regra simples a seguir é esta: se você for atrás de um,
deve chupar todo o seu sangue. Todos os cinco litros. Não será fácil,
nem deveria ser. Você viveu sua vida pacificamente, provavelmente
de forma não violenta, até este momento. Até a ideia de tirar uma
vida pode ser repugnante para você. Afinal, não foi isso que o
colocou nessa situação? Sua vida violada; sua escolha tirada. Você
pode não querer perpetuar o ciclo. Mas você pode não ter escolha.
Precisamos salientar bem o seguinte: não completar a tarefa,
simplesmente beber, digamos, um litro para se saciar, só garantirá
um novo vampiro bebê. Então você precisa matá-los. Mortos. Acha
que cinco litros é demais? Sugerimos trabalhar em pares, caso você
esteja preocupado em não conseguir beber os cinco litros inteiros.
Além disso, se você encontrar algum vampiro neocolonial britânico
de férias, talvez não queira confrontá-lo sozinho. Eles
frequentemente vagam em bandos de saqueadores, como se seu
time de futebol tivesse acabado de perder e eles estão em busca de
vingança. Portanto, formar pares é prático. Segurança no grupo e
tudo mais. O aplicativo VampersandTM tem um conveniente recurso
“Encontre seus amigos”, que já ativamos para você, então ao
anoitecer, vá em frente e localize seu novo melhor amigo mais
próximo. (Quer experimentar? Vai, só não saia, sabe, se ainda for
dia.)
Queremos prepará-lo para uma coisa: alguns turistas Angrez são
sem sabor pra caramba. São aqueles criados numa culinária
nacional que inclui grandes sucessos como feijão na torrada e onde
o sal é o principal tempero. (Alguém realmente precisa dizer a eles
que é um mineral e não tempero.) Ao lado de sua garrafa térmica,
você notará um pequeno pacote de tempero. Antes de beber,
sugerimos balançar um pouco disso na língua; fará com que o
sangue desça muito mais facilmente. Sinta-se à vontade para mudar
as especiarias! Viva o melhor da vida!
Ainda está ouvindo a voz em sua cabeça dizendo que matar é
errado? Mas também se sentindo incapaz de negar sua sede por
sangue? Não se preocupe, estamos trabalhando numa solução –
uma resposta menos humana aos seus desejos. Vários de seus
colegas vampiros, que são ex-alunos dos ilustres Institutos Indianos
de Tecnologia, estão trabalhando em parceria com a Universidade
Nacional de Ciências e Tecnologia do Paquistão para criar um
sangue sintético. Os primeiros protótipos se mostraram muito ácidos
ou amargos. Portanto, nossos cientistas estão trabalhando noite e
dia (literalmente!) para aperfeiçoar a fórmula. O nome desta
maravilha moderna – espere por isso: Rooh Afza. É grosso. É
melado. Parece sangue de qualquer maneira. Só não misture o
original com o nosso falsificado. E será muito menos suspeito nos
Vampmarts que surgirá em breve. Não precisa se desesperar.
Você terá opções logo, logo. Mas até então, beber o sangue é seu
salva-vidas. Você está fazendo isso por sua equipe e salvando seus
companheiros desis do destino verdadeiramente terrível de ouvir um
turista Angrez tentar pronunciar namaste ou as-salaam alaikum
enquanto ferra totalmente os gestos de mão que os acompanham.
TIA CASAMENTEIRA
Se você acha que ser transformado em um vampiro vai lhe fornecer
uma desculpa conveniente para evitar a pergunta eternamente
temida – Beta, quando você vai se casar? – você está prestes a
ficar desapontado. Talvez você não tenha um perfil no shaadi.com,
mas a rede de tias imortais está viva e forte, porque ser morto-vivo
nunca impediu uma tia decidida a casar todos.
Está certo. Você pode ser um vampiro adolescente,
erroneamente transformado, mas existem muitos vampiros de meia-
idade que estão por aí há anos – imagine ter décadas para
aprimorar o apertar as bochechas e a arte do tom desi entregue
como um ladoo com xarope doce. Imagine ser capaz de dar o olhar
de desprezo da tia de meia-idade para sempre. Novos vampiros são
festejados e bajulados porque representam sangue novo. Novos
projetos. E qual o maior projeto do que casar os mortos-vivos.
Agora, é verdade. Você não tem idade para se casar. Ainda. Mas,
daqui a alguns anos, quando seria a sua época de faculdade, você
começará a ser perguntado. Formulários de biodata com fotos de
estranhos elegíveis aparecerão misteriosamente em sua mesa de
cabeceira ou desktop. A vantagem? Você nunca mais terá que se
preocupar com alguém editando as fotos para parecer mais jovem.
Porque nunca envelhecemos. Você é o sonho de uma tia
casamenteira! Nem importa se você não é médico. Até quando você
for velho, você ainda será jovem e bonito. E acredite em nós, se
você não encontrar uma parceira adequada logo, isso não
desencoraja a rede de tias porque você é elegível... Para sempre!
Se esse pensamento faz você correr para as montanhas, não se
preocupe. Há um ashram no sopé do Himalaia, para todas as
denominações, para jovens vampiros que precisam apenas fugir.
Existem até passagens noturnas especiais do trenzinho para levá-lo
até lá. Entendemos você.
Se acontecer de você encontrar o seu par perfeito, então o
casamento desi dos seus sonhos pode ser seu. A menos que seu
sonho seja o casamento de Priyanka e Nick, nesse caso, desculpe,
não há como replicar aquele nível de épico. Mas existe um mundo
inteiro de designers de casamento, joalheiros e floristas que estão
prontos para atendê-lo. Perto de Chandni Chowk em Delhi e a Rua
Juhu Tara em Bombaim estão prósperos mercados noturnos,
escondidos dos olhos mortais por antigos encantamentos mantidos
no lugar por tântricas Mayong parceiras dos vampiros. (Aviso: você
é um vampiro bebê, então fique longe das magias. Por enquanto.
Elas são poderosas e não devem ser tratadas com leviandade. Você
já é eterno; não é mágica suficiente?)
Imagine o casamento desi mais magnífico que você já foi – algum
palácio no Rajastão, talvez? Uma casa-barco em Kerala? Uma
tenda colorida ao ar livre em Shimla? Milhares de pétalas de flores
vibrantes dispostas em redemoinhos ombré alinhando a estrada da
cerimônia. Mehendi tão intrincado que parece renda. Zaiwar repleto
de jóias. Tudo isso ainda pode ser seu. Se você quiser. E só se.
Sim, as tias vão te bajular, mas isso é coisa delas. Você ainda tem
uma escolha e é só sua.
AGORA O QUÊ?
Você tem o básico. Comida. Comunidade. Casamento. Fique longe
do sol. O colonialismo é o verdadeiro sugador de sangue, etc. Agora
o que você faz? Tipo, literalmente agora.
Encontre sua galera. Espalhe a sua verdade. Viva sua vida.
Não pretendemos pirar com isso. Bem, nós piramos, um pouco.
Tentamos suavizar o golpe com sarcasmo e trocadilhos. A questão é
que é difícil viver a sua vida. Foi difícil antes disso. É difícil agora.
Você não pediu por isso. Foi imposto a você. Talvez, se pudesse
escolher, essa teria sido a sua escolha. A imortalidade é uma droga
e tanto. Mas o fato é que você não teve escolha. E agora tudo que
lhe resta é continuar vivendo. Seguindo em frente. Ou encontrar o
seu senhor e exigir vingança, deixando-o queimar ao sol. Colocar
uma estaca em seu coração e decapitação serve também. Então,
realmente, tire o melhor proveito disso, como quiser. Apoiamos suas
escolhas.
Nota de rodapé
Se você não quiser seguir a rota tradicional de troca de dados pelas tias, a
Vampersand™ contratou a TrulyMadly para criar uma comunidade protegida por
senha apenas para vampiros em seu site. Sua vida pode pensar que sua vida
acabou, mas você ainda pode deslizar para a esquerda ou direita de acordo com o
seu coração que já não bate mais.
E você ainda tem escolhas. Seu futuro não está escrito. Você tem
o poder de fazer isso. Na verdade, talvez mais do que nunca.
Falando sério? Você ainda tem os mesmos sentimentos de antes.
Eles não desapareceram. Lembra do que dissemos? Você não é um
demônio. Você ainda é você. Apenas com mais desejo por sangue e
imortal. Mas, no fundo, você é o que sempre foi. E este momento,
agora, pode ser assustador. E comovente. E enfurecedor. Mesmo
que o potencial para o amanhã seja infinito. Mesmo que amanhã
você se sinta livre e possa viver uma vida sem restrições. Hoje, algo
foi tirado de você que ainda não estava pronto para abrir mão.
Família e amigos. Amores, novos e antigos. Sonhos. Tudo isso vai
mudar. Todos eles morrerão. O tempo continua mesmo quando você
tenha parado. Onde uma vez você pode ter se sentido cercado, às
vezes sufocado, por sua família barulhenta, irritante, intrometida,
linda e amorosa, agora você está sozinho. Não é mais humano.
Insultado e incompreendido por muitos. Mas você não está
abandonado. Você está aqui. Então estamos também. Nós
entendemos você. Acreditamos em você. Você é suficiente.
Quando sair deste lugar, saia para a quietude do fim da noite pela
primeira vez, renasça. Aprecie as ruas brilhantes e em ruínas ao seu
redor. Olhe para a noite negra como tinta. Está escuro. E cheio de
diamantes.
E você, querido, é feito de poeira estelar.
VAMPIRISMO Ou é possível que os vampiros
sejam reais?
Kayla Whaley
Minha — morte — foi um caso suave. Quieto. Neve rara havia caído
durante todo o dia e na noite anterior, acumulando-se em pinheiros,
salgueiros, magnólias, galhos do sul, desacostumados a suportar
mais peso do que pólen de brilho ofuscante ou de todo o verão.
Conforme o dia escurecia, os galhos começaram a se quebrar em
uma cascata escalonada, como fogos de artifício ou vasos
sanguíneos estourando. Acima de mim, meu pai chorou. Suas
lágrimas caíram no meu rosto e rolaram pelo meu rosto seco. Eu
mantive meus olhos fechados. Escutei atentamente as quebras
agudas à distância. Senti meu coração bater forte nos ouvidos. Meu
peito se recusou a subir. Ele chorou e chorou. Ele não enxugou meu
rosto. Eu não conseguia limpar meu rosto. O gerador de energia
zumbiu. Outro galho quebrou, mais alto desta vez. Um segundo.
Dois segundos. Crack. Um segundo. Dois segun... crack. um...
O sol nasceu rápido e milagrosamente quente. A dez graus, o
solo da floresta havia se transformado em lama pegajosa. A vinte e
seis graus, o solo era de palha e barro vermelho mais uma vez, os
únicos sinais de uma nevasca sem precedentes sendo algumas
zonas ainda sem energia e sem gritos, você acredita? saudações de
uma garagem para a outra. Ele deve ter planejado me enterrar, mas
a neve o impediu. Seanan disse que havia uma pá encostada no
tronco quando ela me encontrou, algumas tentativas infrutíferas de
fazer buracos agrupados na frente da ampla base da magnólia. Ele
examinou nossa propriedade com antecedência, procurando o local
perfeito? Ou ele sabia instintivamente que acomodaria meu corpo
confortavelmente sob a árvore centenária mais distante da casa?
É assim que sei que meu pai estava agitado: ele deixou meu
corpo fora do centro, inclinado descuidadamente e torto. Talvez ele
tenha considerado esperar até que o derretimento e o degelo
terminassem. Mas se ele esperasse, teria que me carregar de volta
para casa, e onde ele me deixaria? Na minha cama? No porão
inacabado que certamente inundaria com o escoamento? Na
garagem que, apesar do mau isolamento, ainda estaria quente
demais para me impedir de apodrecer? Não. Eu precisava de um
túmulo e ele precisava de ajuda para providenciar um.
Ele improvisou.
É assim que sei que meu pai estava desesperado: ele acreditava
que estava congelando, apertando as mãos quando não conseguia
encontrar o pulso. Provavelmente nem pensou duas vezes antes de
me deixar lá e ir para a estação.
Seanan não precisou checar meu pulso, é claro. Ela podia sentir
o cheiro em mim.
Meu coma passou como uma febre assim que ela agarrou a parte
interna da minha coxa. A artéria femoral, rodeada como é por carne
e gordura, fornece a melhor âncora. Você realmente pode
especificar, o que significa que você pode sugar mais rápido, o que
significa que há uma menor chance de o corpo perceber que deveria
estar morto antes que o veneno possa terminar de recobrir o
sistema circulatório. Se você quiser apenas uma amostra, morda o
pulso. Morda a garganta para drenar todo o sangue, e coxa para
transformar uma pessoa em vampiro.
Eu a senti puxar o sangue do meu corpo, a súbita guinada e
balanço como eu imagino que uma onda de adrenalina deve ser
sentida quando estou de pé muito rápido, apenas amplificado por
presas, intenção e finalidade. Seanan não poderia saber que meu
coração, como todos os meus músculos, estava muito mais fraco do
que na maioria dos humanos. Não conseguia bombear rápido o
suficiente para seu veneno me inundar de volta à vida. Não sem
algum incentivo.
Tudo era sombrio e puro. Nenhum pensamento, apenas uma dor
intensa e uma sensação de queda.
Então, calor. A boca cheia - muito mais do que um bocado - de
algo espesso como melaço. O sabor do luar e do latão. Minha
língua, sem sucesso, tentando encontrar apoio nos dentes ou no
céu da boca. Eu não tinha corpo, só essa boca e essa massa líquida
se enchendo, correndo. Engasguei. Minha garganta se abriu e a
inundação foi drenada. Eu tinha engolido tão pouco nos últimos
anos, usando um tubo de alimentação, mas a memória muscular
assumiu o controle. Minha boca se esvaziou, meu estômago inchou
com sangue e bile e perdi a consciência novamente.
— Você não deveria estar aqui — diz Seanan atrás de mim. Eu não
me assusto com sua aparição repentina como deveria ter feito
antes, quando ela era a garota estranha e solitária da igreja e eu era
a estudante secundária desajeitada sentada no final de um banco.
Nunca tínhamos nos falado antes, nem uma vez nos três anos
desde que ela apareceu sozinha e reservada em uma manhã de
domingo. As notícias sobre ela se espalharam rapidamente
naquelas primeiras semanas, mais rumores do que qualquer coisa,
como acontece em uma pequena congregação do sul, onde
qualquer coisa nova ou diferente merece fofoca. Ela era órfã ou
fugitiva. Ela bebeu ou traficou drogas. Ela teve um bebê ou um
aborto. Todo mundo tinha uma teoria, e todas pintavam um retrato
horrível do pecado e da depravação. Todos estavam tão focados em
suas histórias de fundo imaginárias que perderam (ou ignoraram) o
óbvio: sua piedade.
Eu a observei durante os serviços. Sua devoção não era nem um
pouco ostensiva - diabos, ela nem mesmo cantava durante a
adoração, pelo que eu poderia ver - mas algo na maneira como ela
mantinha as mãos no colo, a cabeça ligeiramente inclinada, todo o
corpo relaxado e totalmente em paz, totalmente em casa,
convenceu-me de que ela sabia mais sobre divindade do que
qualquer um de nós jamais poderia alegar. Eu estava com muito
medo de cumprimentá-la. E foi medo o que senti, não intimidação ou
constrangimento, mas uma espécie de anseio. Suponho que seja
uma contradição de termos. Como você pode ser atraído e repelido
ao mesmo tempo?
— Nós conversamos sobre isso, Grace — diz ela agora, seu
desapontamento palpável enquanto ela caminha ao meu lado. —
Você não deveria ter vindo de novo.
Meu túmulo de fato parecia desapaixonadamente sombrio com as
notícias da outra noite. Dezenas de pessoas da cidade haviam se
reunido sob a magnólia onde, uma semana antes, eu havia caído
em meio metro de neve em minha camisola de flanela azul, morta
para o mundo. Eles trouxeram lírios, cravos, violetas e ursos de
pelúcia - tantos ursos de pelúcia, alguns ainda com etiquetas de
preço furadas nas orelhas. Presentes para a garota morta. Alguns
dos participantes carregavam cartazes com mensagens escritas à
mão emoldurando fotos granuladas do meu rosto: DESCANSE EM PAZ
ou DANCE COM OS ANJOS ou SEU PAI A CHAMOU DE CASA. Nossa vizinha,
uma mulher incrivelmente doce que insistia em me chamar de
Gracie, carregava aquele último. Era o meu favorito dos sinais,
como se o próprio Deus tivesse tocado a sineta do jantar e eu
tivesse zanzado obedientemente para o céu. Como se meu pai
terreno não tivesse injetado uma tonelada de morfina no meu tubo
de alimentação em vez do meu jantar.
No final do memorial, todos receberam uma vela branca barata,
do tipo descartável com um protetor de papel para evitar que a cera
pingasse em sua mão. A vigília havia se transformado em uma cena
linda: pontos quentes de luz iluminando silhuetas escuras contra um
céu azul-escuro. Eu assisti a cobertura na pequena sala de estar de
Seanan no mudo, formas se movendo sem som, uma coreografia de
luto. Uma última parte da multidão mostrou uma fila de pessoas
esperando para abraçar meu pai, seus olhos estavam vermelhos de
tanto chorar.
Não há luz agora. Seanan diz que serei capaz de resistir ao sol
em cinquenta anos ou mais, assim que me acostumar. Não muito
tempo, ela disse. Sombreados pela lua nova, os ursos de pelúcia
parecem coisas vivas e vigilantes. E as flores, meio murchas e já
apodrecidas, tinham cheiro de cinzas de alguma forma. Eu imagino,
não pela primeira vez, o quão rápido eles pegariam fogo com a
ajuda de uma faísca perdida. A floresta inteira pode queimar antes
que alguém perceba.
Seanan se afasta da tela e me encara. — Devemos ir, Grace. —
Faz apenas algumas semanas, mas já estou aprendendo a ler suas
expressões. Seus braços estão cruzados, cabeça inclinada, como
se ela estivesse firme, mas seus olhos a denunciam: ela está
preocupada.
— Você o viu? — Eu pergunto.
— O que?
— Você o viu? — Repito devagar, como se ela fosse uma criança.
É grosseiro, mas não faço nada para modular meu tom. — Na
Igreja? No trabalho? Qualquer lugar.
A ATLANTA JOURNAL-CONSTITUTION
Após a recente morte de Grace Williams, de 17 anos, nas mãos de seu pai, Grant
Williams, de 53 anos, uma conversa sobre a falta de apoio disponível para
cuidadores de crianças gravemente deficientes ocorreu. Grace Williams, que
nasceu com uma doença neuromuscular degenerativa, estava em uma cadeira de
rodas e precisava de cuidados intensivos 24 horas por dia. Seu pai, criando e
cuidando da adolescente sozinho desde que sua ex-mulher pediu o divórcio há
uma década, citou o enorme fardo como um dos motivos pelos quais decidiu
realizar o que muitos estão chamando de — um ato de misericórdia.
— Mais do que tudo, eu queria que Grace tivesse um pouco de paz. Isso foi o
principal. Sua vida era uma miséria constante, e ninguém pode suportar ver sua
filha passar por isso — disse Williams recentemente em uma entrevista ao jornal
11Alive News de Atlanta. — Mas as pessoas não percebem como é difícil ser a
única fonte de cuidados. Tentando manter um emprego, colocar comida na mesa
e cuidar de Grace? Foi exaustivo. Insustentável.
Ele falou publicamente nas últimas semanas sobre a impressionante falta de
apoio disponível para cuidadores de crianças como Grace. Embora algumas
organizações ofereçam ajuda financeira para equipamentos médicos e visitas
médicas, há pouco apoio emocional ou serviços temporários.
Alguns grupos de defesa com foco na deficiência condenaram as ações de
Williams e sua resposta pública. — Nossas compaixões estão com Grace
Williams, cuja vida foi tirada sem sentido e cruelmente — disse o porta-voz da All
Access, uma organização sem fins lucrativos com sede em Atlanta, ao AJC por e-
mail.
— É um crime o que colocamos em cima dos pais — Williams continuou na
entrevista 11Alive. — É um crime esperar que esses pais sacrifiquem tudo por
essas pobres crianças e não recebam ajuda alguma. Não está certo.
Williams está planejando criar uma fundação em nome de sua filha para
resolver esses problemas, embora ele ainda não tenha feito um anúncio oficial.
USA TODAY
Grace Williams, a adolescente que se acredita ter sido vítima de uma — morte por
misericórdia — revelou em um vídeo lançado recentemente que está viva após a
tentativa de assassinato de seu pai.
O vídeo, que vários meios de comunicação autenticaram de forma
independente, mostra Grace Williams descrevendo os eventos em torno de sua
suposta morte. — Meu pai tentou me matar — ela diz para a câmera. — Mas,
felizmente, uma amiga me encontrou onde havia deixado meu corpo na neve,
acreditando erroneamente que eu já tinha morrido
A Srta. Williams diz que está atualmente se recuperando com a referida amiga
em um local não revelado e que ela não planeja voltar para sua cidade natal, pois
teme por sua segurança.
— Meu pai não achava que valia a pena viver minha vida, então ele tentou
acabar com essa vida. Ele acreditava que havia conseguido. Sem a sorte da
minha amiga em me encontrar, ele teria feito — ela continua. — Mas ele estava
errado em dois aspectos. Um, ele não me matou. E dois, minha vida sempre valeu
a pena
Na cobertura da mídia após a suposta morte da Srta. Williams, Grant Williams
foi retratado como um cuidador dedicado e sofredor. A tentativa de assassinato foi
amplamente chamada de — morte por misericórdia — e nenhuma acusação foi
apresentada.
— Não houve nada de misericordioso nas ações do meu pai — disse Srta.
Williams no final do vídeo de cinco minutos. — Espero que todos que os
chamaram assim possam pensar por que puderam acreditar que o assassinato é
uma bondade em vez de uma monstruosidade. Por que você se convenceu tão
facilmente de que minha vida nada significava? Por que ninguém perguntou o que
minha vida significava para mim?
A Srta. Williams afirma que esta será sua última comunicação e pede às
autoridades para não procurá-la. Como ela ainda é menor, porém, uma busca
está em andamento.
Grant Williams não emitiu uma resposta às revelações de sua filha, embora ele
tenha sido levado às pressas para um hospital local na noite passada com o que
as autoridades estão chamando de - ferimentos misteriosos.
Uma fonte próxima ao Gabinete do Xerife do Condado de Robertson disse que
as acusações de tentativa de homicídio contra Williams são - possíveis, mas
improváveis sem a cooperação de Grace Williams. Enquanto isso, uma petição
online exigindo a remoção do Sr. Williams de seu cargo de professor atingiu
50.000 assinaturas. Atualizaremos esta história conforme ela evolui.
A CURA MÁGICA ou encarnando o mito do
vampiro
BRITTANY
Sinceramente, não sei porque fiz isso.
Não há mais muitas coisas sobre as quais eu possa dizer. Não
sou impulsiva. Talvez costumasse ser, mas a temeridade é um luxo
da juventude. Da mortalidade.
E não tenho nada disso.
Talvez seja por isso que entrei no Instagram. Para sentir uma
conexão com as coisas que perdi. Ou talvez eu só quisesse um
hobby e o Instagram parecesse uma opção tão boa quanto qualquer
outra. Melhor, porque tudo o que eu tinha que fazer era escolher um
nome e poderia ser quem, o que quisesse.
Talvez eu quisesse encontrar um lugar onde não estivesse no
comando. Onde eu não era Brittany Nicolette Fontaine, Vampire
Premier da cidade de Nova York, onde cada momento de cada dia
não era uma consolidação de poder. Acho que é ingênuo pensar
que não há poder a ser encontrado no Instagram, mas certamente
não era o meu, e gostei disso por um tempo.
Apesar de não poder participar plenamente da geração da selfie,
encontro um tipo de alegria indireta em consumir as vidas
remediadas das outras pessoas. Há algo reconfortante em saber
que nenhum de nós é exatamente o que diz. A Brittany que
compartilho online não é real, e o que é realmente maravilhoso
sobre essa era das mídias sociais é que ninguém espera que ela
seja nada além de um mito. Uma fabricação baseada em algo real.
Uma camada de renda e Chantilly sobre porcelana, a pele faminta
pelo sol. Como meu reflexo aquoso nas janelas altas do meu
apartamento.
Me aproximo, até que estou a apenas um fôlego de distância do
vidro. Mesmo assim, a garota que me encara de volta está
distorcida, uma série de impressões difundidas pela luz que penetra
da cidade abaixo de mim como chamas frias e pálidas. Além de um
trecho teimoso de árvores que obscurece as estradas abaixo, o rio
passa piscando. É uma faixa de escuridão presa entre filas
penetrantes de semáforos amarelos que crescem como colheitas.
Um espaço entre espaços.
Antes desse momento, eu estava feliz em existir naquele espaço
liminar entre o que é real e o que não é, entre o que é humano e o
que não é. Aproveitei a liberdade que encontrei ao construir um
reflexo de mim mesma em imagens do que vi no mundo ao meu
redor, mas, olhando para trás agora, posso ver que cometi um erro
fatal de julgamento.
O nome dela é Theolinda, ou @YoSoyTheolinda, para a maioria.
Desbloqueio meu telefone e passo o polegar sobre a tela, até que
estou olhando para minhas mensagens diretas do Instagram.
Apenas três pessoas entram em contato comigo dessa forma. A
primeira é Imogen. Ainda não sei como ela encontrou a minha
conta, mas ela é a mais jovem das minhas petits crocs e geralmente
a primeira a se adaptar às mudanças de tecnologias e padrões
sociais. A segunda, um homem que atende por Brad, que lança
mensagens genéricas como iscas de pesca que nunca respondo
porque não me importo que ele seja solteiro e pense que somos
almas gêmeas. Nós não somos.
A terceira é Theo. Seu ícone de usuário é a imagem de uma lua
crescente se transformando em uma flor escarlate brilhante. Eu
seleciono o seu nome e nossa conversa se espalha pela telinha.
Nós conversamos assim desde que ela tinha apenas quinze anos e
percebeu a única selfie que eu já postei. Nem sempre
conversávamos por muito tempo, mas após um período inicial de
brincadeiras e os tipos de trocas sociais que se poderia esperar de
uma criança e de um ancião imortal, nossas conversas tomaram um
rumo surpreendente.
Elas importavam.
Discutimos vida, perda e mudança. Discutimos o que significava
ter influência e ser influenciado. Discutimos poder, corpos e morte.
E então, de repente, do azul galáctico, isso.
A última mensagem de Theo para mim fica no topo da tela. É a
imagem de uma garota em um vestido branco parada em um túnel
escuro. Está borrada, como se a câmera ofegasse com um feixe de
luz, mas posso ver sua pele castanha clara, seus longos cachos
negros caídos sobre um ombro, seus lábios pintados de vermelho
profundo.
Na parte inferior da imagem, uma mensagem está escrita em
letras prateadas:
THEOLINDA
— Eu honestamente não sei como vou me superar — digo para a
sala vazia.
O lounge do porão do Root & Ruin é minha obra-prima. De
verdade. Cortinas de veludo preto estão penduradas na parede. O
bar de mogno, que antes era coberto por teias de aranha que
rivalizavam com as do meu sótão, brilha com o Mistolin polido e com
perfume de lavanda. Embora, talvez, teias de aranha tivessem
combinado com o tema.
Bem, sempre há o próximo ano.
Um cara com um chapéu de cowboy de couro preto, um colete de
veludo e jeans tão rasgados que nem contam como calças, entra. —
Ei, sou o DJ Hex Marks the Spot.
Mordo o meu lábio inferior para parar de rir. Devo estar
lacrimejando e não posso me dar ao luxo de bagunçar o delineador
que levei três tentativas para aplicar uniformemente. Os velhos são
tão nojentos. — Mm-hmm. Então esse não é apenas o seu nome
artístico. Ok, ok, ok. Eu sou Theo. Você pode ficar perto do bar.
Lembre-se. Sem pop. Nada de anos 70 ou 80. A menos que seja
exclusivamente Led Zeppelin. — Mordo a ponta das minhas unhas
pontudas. Minhas unhas de gel são brancas, mas parece que cada
ponta foi mergulhada em sangue. Ei, eu achei inteligente, mesmo
que óbvio. — Embora eu não tenha certeza do que Brittany curte.
Ela gosta das minhas atualizações musicais, mas geralmente a
variedade de lady-rock — quer saber? Você é o profissional.
Quando o DJ Que Eu Nunca Vou Repetir O Nome abre um
sorriso, seus dentes parecem muito brancos e afiados por um
segundo. — Eu sou o profissional. Imogen me recomendou, certo?
— Sim?
— Então eu te peguei, passarinho.
Rio nervosamente. — Faça isso e irei verificar se temos gelo.
Desbloqueio meu telefone e mando uma série de mensagens.
Tive que convidar minha amiga Miriam da escola porque o pai dela é
dono do clube. Mas ela está tratando de uma infecção na garganta
que pegou de Andy Jackson III. Foi extremamente difícil explicar a
Miriam para quem era essa festa de aniversário surpresa. Ela
estava toda “Vampiros são tão 2005”. Eu tenho um álbum de
recortes muito detalhado da época em que fomos ver a Saga
Crepúsculo: Amanhecer - Parte 2 da estréia da meia-noite na quinta
série que diz que ela já pensou o contrário. Eu digo a ela para se
sentir melhor, então pego a última mensagem de seu pai. Garanto
ao Sr. Greenspan que tudo está sob controle e o porteiro adulto e o
barman chegaram (não chegaram). Mas ainda é cedo. Greenspan é
dono de quatro casas noturnas e bares no Lower East Side. O Root
& Ruin é o menos popular, provavelmente por isso que ele me deu o
bar do porão, que está praticamente inacabado e tem aquele cheiro
de cimento de Nova York, mofo e uma pitada de xixi. Mas o tecido
de veludo preto grampeado nas paredes faz com que pareça o covil
de vampiros que eu sonhei que Brittany teria.
Eu rasgo um saco de dentes de vampiro de plástico e os espalho
ao redor do bar. Quando o DJ diminui as luzes, alguns deles brilham
no escuro. O barman chega - um cara mal-humorado que se parece
com Oscar Isaac, se Oscar Isaac tivesse sido mergulhado no
mesmo tanque de substâncias radioativas e tudo o que deixou o
cabelo do Coringa verde.
— Você é a chefe, niña?
— Só meu pai me chama de niña — digo, e ele ri. — Eu sou
Theo.
Ele aperta minha mão. Meu pai sempre me ensinou a olhar
alguém nos olhos e nunca ser a primeira pessoa a desistir. Eu
gostaria de poder implementar isso na minha escola, onde os
professores parecem olhar através de mim. Por outro lado, meu pai
vem da geração de imigrantes que pensam que tudo é justo se você
trabalhar duro o suficiente para morrer por isso, mesmo se você for
desvalorizado e mal pago. Eu? Eu tenho sonhos. Grandes. Um
aperto de mão sólido não pode machucar, acho.
— Escute, o porteiro descamou — diz o Coringa, coçando a
tatuagem no bíceps esquerdo. — Quer que eu ligue para o Sr.
Greenspan?
— Na verdade… — Eu levanto meu telefone. Meu pai também
me ensinou a nunca mentir. Nunca roubar. Nunca pecar. Eu falhei
em meu catecismo por uma razão. Mas há algumas coisas que meu
pai equatoriano não pode me ensinar. Não nesta cidade, não na
minha escola e definitivamente não neste bar. — Estava apenas
conversando com o Sr. Greenspan e ele disse que está tudo bem.
Com isso resolvido, volto minha atenção para os retoques finais.
Um candelabro enferrujado pende precariamente do teto baixo.
Parece um perigo à segurança, algo saído de uma mansão mal-
assombrada. Usando uma escada, coloco pequenas velas a pilhas
em cada castiçal. Quando termino, dou um passo para trás. O teto
faz um estranho som de gemido e prendo minha respiração por um
segundo, esperando que ele desabe. Mas está tudo bem. O DJ dá o
pontapé inicial na música - algo com um baixo pesado e guitarra
profunda.
— Agora eu me superei — digo.
— Com certeza — diz uma jovem que reconheço imediatamente.
O tipo de cabelo louro-gelo que me lembra um cotonete. Ela tem
maçãs do rosto e lábios perigosos que deixariam a maioria dos
relatos de tutoriais de maquiagem com ciúmes. O vestido dela é
todo de renda, como na capa deste disco muito antigo que minha
mãe tem de uma mulher chamada Stevie Nicks. Há uma gargantilha
de renda branca em torno de seu pescoço esguio, e ela anda como
quem está acostumada a ter a atenção do cômodo inteiro.
Essa é a pose que tanto tentei capturar em minhas fotos. Claro,
eu consigo quatro mil curtidas apenas em pé com a Ponte do
Brooklyn ao fundo, mas definitivamente não sou nada como Imogen.
Serei, algum dia
— Você deve ser Imogen! — Digo. Limpo minha garganta e baixo
minha voz — Eu sou Theo. Que bom que você recebeu meu
convite. Estamos apenas começando.
— Você é... adorável. — Ela tem cerca de um metro e setenta,
apenas tímida de ser mais alta do que eu. A cor dos seus olhos
parece um pouco irreal, com tons de azul marmorizado e avelã. Meu
corpo inteiro fica tenso quando ela fica a cinco centímetros de mim.
Tenho o instinto imediato de dar vários passos para trás. Mas, sabe
o que? Frequentei uma escola católica e uma escola particular
minha vida inteira. Já vi meninas mais malvadas, ricas e mal-
intencionadas, e fico parada.
Giro em meu vestido preto de boneca. É um pouco exagerado e
mais apertado do que a imagem barata online prometida. Mas eu
estava indo para um visual mais de quarta-feira Addams. —
Obrigada. Gosto do visual retrô.
Pela primeira vez, noto outro grupo de mulheres ao nosso redor.
Como elas entraram tão silenciosamente? Três morenas e três
ruivas com a pele tão branca que parecia que poderia brilhar no
escuro, como os dentes falsos no bar. Uma das garotas pega um
par e o enfia na boca. Ela quase se dobra de tanto rir.
— Estou curiosa — Imogen diz, batendo o dedo no queixo. —
Como você e Brit se conheceram?
É difícil explicar para algumas pessoas que conheci uma das
minhas melhores amigas na internet. Minha mãe não entende por
que passo tanto tempo no telefone. Por que não posso
simplesmente ter amigos na vizinhança ou na escola, além de
Miriam. Sempre houve algo que faltava em mim. É como se olhar
fotos minhas pudesse me ajudar a descobrir quem eu realmente
sou. Eu sei algumas coisas: sou filha de imigrantes equatorianos.
Sou uma estudante A. Vou dominar o mundo algum dia, de alguma
forma. E quando amo as pessoas, irei até o fim ou morrerei. É por
isso que tenho tão poucos amigos.
Brittany foi um feliz acidente. Às vezes, ela coloca em palavras o
que estou sentindo sem que eu tenha que me explicar. Às vezes, ela
me deixa desabafar sobre os xingamentos que Genie Gustavson
escreve no meu armário (e depois ameaça cuidar dele). É disso que
se trata toda esta festa. Agradecer a Brittany, porque ela nem
mesmo dá tempo para se mimar. Ela está na faculdade e tudo que
ela faz é tirar fotos nos dias em que está escuro e chuvoso.
#Vampstagram é nossa piada interna, e essa Imogen e suas amigas
podem rir disso, mas acho que essa festa é a melhor ideia que já
tive.
Então, quando ela pergunta como Brittany e eu nos conhecemos,
dou de ombros. — Por aí. Ela é bem reservada, no entanto. Você é
literalmente a única pessoa que já a marcou em uma foto.
— Sim, ela é tímida diante das câmeras. — Ela vai até o bar e
pisca para mim. — Venha tomar uma bebida.
Minha mãe é a melhor anfitriã que conheço. Ela passa o dia todo
fazendo comida — arroz, pernil, hayacas, salada de batata, apenas
o trabalho —, depois toma banho e veste um vestido bonito. O
álcool nunca passa por seus lábios, mas ela é toda sorrisos. Não
sou minha mãe, e nós bebemos as malditas mimosas que criei.
Enquanto a música ressoa, fazendo as paredes e o teto vibrarem,
mais pessoas entram. Mais mulheres que pintaram suas peles até a
sombra da morte. Uma mulher está com um vestido verde neon e
sapatos plataforma. Ela conduz uma mulher mais velha por uma
coleira e se acomoda em um assento almofadado.
Ok, isso é novo. Talvez ela tenha pensado que era uma daquelas
barras de torção, ou como são chamadas.
Ela puxa o cabelo da mulher para trás e expõe seu pescoço. Eles
me lembram a época em que Ricky Ramirez e eu tínhamos que
fingir que nos beijávamos quando éramos Maria e Tony na versão
de West Side Story em nossa escola .
Uma garota branca que deve ser mais jovem que eu enfia um
cigarro na boca. Ela parece um extra de um videoclipe do blink-182.
— Ugh, lembro-me de quando esta cidade era viva.
Oooooookay?
Vou para o fundo do clube, onde as pessoas parecem ter se
multiplicado. Duas mulheres estão se beijando em uma das
poltronas. Vinho tinto foi derramado em alguns guardanapos. Eu
deveria ter comprado guardanapos pretos?
Mudo minha trajetória e vou para a frente do bar, onde três jovens
que parecem ter vindo errado de Williamsburg estão agrupados.
— Isso é “Traga a sua própria bebida”? — pergunta um deles,
tirando um frasco do bolso da camisa de flanela.
O que ele quer dizer com “traga a sua própria bebida”? Há
literalmente um open bar completo!
Eles me avistam em pé perto deles e um sorri. Ele é o mais novo
dos três, com olhos escuros e cabelo curto, como se tivesse
acabado de sair do bootcamp.
— Você é nova? — ele pergunta, um pouco confuso.
— Não mais do que você — eu digo. Não quero deixar na cara
que estou tecnicamente a dois meses de terminar o ensino médio.
— Onde está a convidada de honra, afinal? — um cara com um
bigode de guiador pergunta. — Eu tenho um osso para pegar com
ela. Ela tem que afrouxar as rédeas desse toque de recolher de
vampiros.
— Foi você quem disse — murmura o jovem. Seus músculos
flexionam quando ele pega o frasco de seu amigo. Ele não bebe, no
entanto. — Eu sei que Imogen ainda está chateada, mas isso é
outra história.
— Imogen quer transformar cada modelo que chama sua
atenção. É por isso que não assinamos a petição.
— Uau, vocês gostam mesmo dessas coisas de RPG — eu digo.
Estou prestes a enviar uma mensagem para Brittany quando o
nome dela acende na minha tela. Reli a frase em que ela diz que
não vai conseguir. Ah não. Inaceitável. Eu respondo sem olhar e
coloco meu telefone no bolso.
O cara de cabelo curto me olha com uma curiosidade
desconfiada. Ele sorri e isso lhe dá a aparência de um lobo. —
Quer?
Eu quero uma bebida de um frasco de um garoto estranho, mas
objetivamente gostoso, na festa onde sou a anfitriã e a convidada de
honra não apareceu ou me mandou uma mensagem de volta? Pego
e bebo.
O líquido é quente e ligeiramente espesso. Metálico. Sinto meu
reflexo de vômito em ação. Sangue. Definitivamente, 100 por cento
de sangue. O menor gole entra na minha língua e escorre pelo
canto da minha boca. Antes que eu possa limpá-lo, o menino arrasta
o polegar pelo meu queixo e o leva aos lábios.
Bruto.
Quando ele sorri de novo, pegando o frasco de volta, vejo dentes.
Não os caninos de néon que decoram o bar. Verdadeiros, afiados,
tão afiados que sei que rasgariam pele com o menor toque.
Talvez, apenas talvez, Brittany não estivesse mentindo.
Talvez, apenas talvez, eu esteja no centro de um porão cheio de
vampiros.
BRITTANY
Não escolhi me tornar o que sou.
Fui feita durante uma época sem lei de vampiros, quando as
consequências eram algo apenas para os mortais. Eu era pouco
mais velha do que Theo quando conheci meu... bem, nunca decidi
como chamá-lo. Senhor dificilmente é a palavra certa, embora
contenha um pouco da verdade. Em duzentos anos, não consegui
encontrar uma palavra que englobasse tanto a violência imaculada
de suas ações quanto o poder transformador que encontrei em suas
consequências. Ofensor. Invasor. Malfeitor. Todos eles carecem de
alguma parte do horror que experimentei durante o ataque e depois.
Ele pode ter sido o catalisador da minha transformação, mas eu
fui a arquiteta. Cada escolha que fiz depois disso foi uma resposta
ao seu argumento inicial. Se o argumento dele era algo como ser
mais poderoso do que eu em virtude de seu sexo e circunstância,
estive elaborando minha resposta desde então. Nem todo mundo
que mordo se torna como eu. Tenho que escolher. Posso escolher.
E ao longo dos anos, escolhi mulheres como eu. Mulheres que
disseram que eram menos do que indignas, fracas. Mulheres que
tinham fome do mundo. Mulheres com presas. Minhas petits crocs.
Meu telefone toca baixinho, me lembrando que são 22h e estou
faltando em um compromisso. Descarto o lembrete sem olhar para
as palavras.
Há uma sensação estranha se espalhando sob minhas costelas.
Não fome, mas algo próximo o suficiente. Enquanto abotoo minha
sobrecasaca até o queixo e saio para as ruas de Nova York,
empurro Theo e a decepção que ela certamente está sentindo agora
o mais longe de minha mente que consigo.
Posso não ter escolhido o caminho da lua e das sombras, mas
escolhi a cidade de Nova York. Cem anos atrás, deixei os vales
varridos pelos ventos e as montanhas ondulantes da Virgínia pela
energia frenética de uma cidade. É fácil se tornar uma gota no
oceano quando o oceano é tão inimaginavelmente vasto.
Afasto-me do rio e vou para o parque. Nós não caçamos aqui.
Costumávamos, logo depois que foi estabelecido no final de 1800,
mas bani a caça há décadas. Agora, caçar aqui nos colocaria em
grande risco. Há muitos olhos neste parque, muitas histórias
nascidas de suas colinas e cantos escuros. Quem caça aqui agora
será expulso da cidade.
Não tenho muitas regras. Apenas algumas. Cada uma visa
proteger meu rebanho de um mundo que parece cada vez mais
capaz de compreender criaturas como nós e aceitar que somos
reais. Mas o mais importante é o seguinte: sem procriação.
A cidade pode parecer grande, mas isso pode mudar em um
instante. Devemos aumentar nossas gerações com cuidado e
intenção primorosa. Qualquer um que desobedecer a esse edital
não será simplesmente expulso, mas muito morto.
Eu deslizo ao redor do reservatório e meus pés esmagam o
cascalho enquanto corro para o sul, passando como um fantasma
pelo obelisco arenoso, iluminado por todos os quatro cantos. Logo
deixo o parque para trás, cruzando a rápida corrente da Quinta
Avenida e mergulhando nas garras da cidade.
Uma garota com cachos escuros e frenéticos emerge com uma
risada de um prédio bem à minha frente. Sua boca é vermelha e
seus olhos são de um marrom-folha de outono que me lembra Theo.
Demoro um segundo para perceber que não é ela, mas olhei por
muito tempo. O sorriso da garota vacila de repente e ela se encolhe
como se algo sussurra em seu ouvido: Perigo. Sua expressão fecha
quando ela encontra meus olhos, e ela se vira, se afastando
rapidamente.
Essa sensação inquietante em minhas costelas se expande
novamente, aquela fome de não fome. Se eu ainda fosse humana,
poderia ter um nome para esse sentimento. Inquietação?
Frustração? Culpa? Algo que me coloca em conflito comigo mesma.
— Ei! Solte! — A voz de uma jovem se eleva acima do refrão
constante de buzinas, motores e vapor.
Eu a encontro imediatamente. Ela está saindo de uma bodega na
esquina, com os braços cheios de mantimentos. Logo atrás dela, um
jovem está muito perto, seus olhos tão grandes e selvagens quanto
seu sorriso. É um olhar que reconheço. Eu vi isso no rosto de muitos
homens ao longo dos anos. É uma expressão de puro deleite, de
alegria quase extática por saber que suas ações são erradas e
impossíveis de parar.
A jovem dá um passo rápido para frente, puxando a ponta do
casaco de sua mão com uma carranca e uma maldição. Ela sai
apressada e olha para trás apenas uma vez para garantir que ele
não a segue. Rindo, o jovem volta para o canto escuro da bodega,
onde espera pela próxima vítima.
Ele não precisa esperar muito.
A fome que não é fome se expande novamente e me coloco na
frente do jovem. Ele pisca, certo de que eu não estava lá um
momento atrás. Para ele, escorreguei das sombras, um sonho e um
desejo.
— Siga-me — digo, deixando minha voz afundar em meu peito
como o ronronar de um leão.
— Sim — diz ele, os olhos arregalados e desamparados agora,
seguindo a corda da minha voz no beco estreito onde as sombras
estão ansiosas para nos receber.
Encontro a depressão rasa de uma porta, talvez a entrada dos
fundos da bodega, e paro.
— Isso vai doer — afirmo, e ele apenas balança a cabeça
maravilhado. — Desabotoe sua jaqueta e não faça barulho.
Ele cheira a limão e suor e, quando o mordo, saboreio seu arrepio
de dor. O sangue cobre minha língua como a primeira mordida
suculenta de um morango. É ácido e forte ao mesmo tempo, e bebo
até que aquela estranha não-fome comece a diminuir.
O jovem não faz barulho, e não bebo de forma imprudente,
apenas o suficiente para saciar meu apetite.
— Pronto — digo, tirando um lenço do bolso e enxugando os
cantos da boca. — Agora vá para casa e pare de ser um completo
bruto.
Ele acena com a cabeça, os olhos ainda arregalados, mesmo
enquanto foge do beco.
Só então, meu telefone vibra no meu bolso. Passo a tela de
bloqueio para ver a mensagem que está esperando por mim. É de
Theo.
Então… eu mencionei que esta é uma festa surpresa e todos os seus amigos estão aqui?
Parece importante dizer isso kkkkk
BRITTANY: vou te fazer uma pergunta. e você não tem que responder.
THEO: eu amo sua voz terrível, b. OK. me pergunte.
BRITTANY: alguém conhece a verdadeira theolinda?
THEO: Eu responderei se você quiser.
THEOLINDA
O banheiro do Root & Ruin tem uma única lâmpada exposta
pendurada no teto. Sento-me na privada encardida depois de
esfregar a língua. É uma boa coisa eu carregar um kit de
emergência na minha bolsa - ataduras, balas, uma mini escova de
dentes, Midol, ibuprofeno, TUMS, um comprimido de hidratação que
se desfaz em pó Pixy Stix, brilho labial, três cores de batom, uma
nota de cem dólares para uma emergência, identidade, spray de
pimenta e um canivete.
Molhei um guardanapo que comprei do Coringa e passei nas
bochechas e no pescoço. Meu Deus. Brittany é uma vampira. Seus
amigos são vampiros. É por isso que ela não tira fotos. É por isso
que ela brincou sobre ser um "filtro de vampiro". Eu sabia que era
muito legal para copiar. Mas essas pessoas não são legais. São
perigosas. Eu deveria ter confiado em meus instintos quando se
tratava de Imogen.
Eles podem cheirar meu medo como tubarões? Aquele garoto
bonito estava me testando ao me dar sangue? Coloco outra hortelã
na boca para me livrar do gosto metálico, mas o fantasma dele
ainda está lá. Respiro longa e profundamente.
Ok ok ok. Eu posso lidar com isso.
Posso mesmo?
Mal consegui aguentar quando entrei na The New School em vez
de na Columbia. Mal consegui suportar quando meu irmão usou
meu livro da biblioteca para enrolar papel. Não é assim que eu
esperava que a noite fosse.
Brittany me deve uma explicação.
Então eu percebo - passei os últimos dois anos enviando
mensagens de texto com uma vampira. Ela poderia ter me
encontrado facilmente. Beber meu sangue e todas aquelas coisas
de vampiro. Por que não o fez? Houve tantas vezes em que ela
poderia ter me encontrado em um dos lugares onde eu tiro fotos.
Deus, eu sou o sonho de um perseguidor e essa é a primeira coisa
que vou mudar a partir de amanhã.
Brittany poderia ter me matado a qualquer momento. Em vez
disso, ela falou comigo. Em vez disso, foi minha amiga.
Então por que ela não está aqui?
Respiro novamente. Jogo o guardanapo no chão e me olho no
espelho, que está rodeado por décadas de grafite.
— Eu sou Theolinda Cecilia Romero de Reyes e tenho muito a
perder — puxo os cantos do meu delineador para suavizar as
manchas, reaplico meu batom e volto para a festa.
A música é mais profunda, como um coração metálico que bate
em um ritmo constante, e todos aqui parecem estar esperando que
eu aparecesse.
— Estávamos ficando preocupados — diz Imogen, levantando-se
da poltrona.
A garota com o vestido tomara-que-caia neon tem sangue nas
roupas. A mulher mais velha na coleira está curvada em um ângulo
estranho, sem se mover, e mesmo que Imogen esteja falando
comigo, tudo que posso pensar é que não quero morrer. Eu não
quero morrer.
— Onde está a Brittany? — pergunta o cara de bigode.
— Como eu poderia saber? — digo, tentando soar muito mais
corajosa do que realmente sou.
Posso sentir a tensão crescendo enquanto cada vampiro neste
lugar se vira para mim e recuo contra o bar. Há um gemido suave e
me viro para encontrar o barman caído entre dois vampiros, os
olhos revirados enquanto bebem de cada pulso. Fechei meus olhos
e soltei um grito.
— Onde? — o menino com o sorriso de lobo pergunta. — É
melhor você nos contar.
— É por isso que você veio? — Eu grito. — Para gritar com ela?
Há um consenso de encolher de ombros e acenos.
— Vocês são todos horríveis! — digo. — É aniversário dela.
— Você não entende? — Imogen pergunta. — Brittany não tem
aniversário. Brittany não envelhece há duzentos anos. E estou
começando a pensar que você também não vai.
Imogen está atrás de mim antes que eu possa piscar. Sua mão
está fria em volta do meu pescoço. Pego o spray de cabelo no
bolso. Ela não consegue me morder. Eu miro, fecho os olhos e
pressiono com força. Imogen grita e me empurra fortemente contra
o bar.
Os vampiros mais próximos de mim começam a tossir. Outros se
preparam para atacar. Usando a distração, me levanto e subo do
bar. Se eu não cruzar com um cadáver e dois vampiros bêbados, e
se ninguém conseguir me agarrar, posso chegar até a saída.
Atire seu tiro.
Eu me preparo para correr. Mãos pálidas me agarram, o grave
constante da música pulsa contra meus tímpanos, e sei que neste
momento não há como fugir. Sem liberdade. Não há mais fotos ou
gritos com meu irmão, ou conselhos de meu pai, ou minha mãe
reclamando de como ninguém a ajuda com a roupa, e se eu viver,
eu prometo, prometo que vou ajudá-la e fazer minhas tarefas e
transformar meu A- em A +.
Uma mão agarra meu tornozelo e eu caio. Estou de costas,
chutando e me debatendo contra um mar de mãos e dentes.
Em seguida, para.
Eu me sento. A porta está aberta. A música acabou. Entre a
multidão de vampiros e eu está uma garota com longos cabelos
negros. Seu batom cor de vinho é cuidadosamente desenhado e
suas presas estão à mostra. Eu levo um momento para notar a
sobrecasaca justa de Brittany, as leggings cinza escuro por baixo
que deslizam em botas pretas de cano alto, e o toque surpreendente
de rosa florescendo em torno de seus pulsos.
— Surpresa ponto de interrogação? — digo, e por um momento
eu juro que ela quer rir.
Então seus olhos mudam e se estreitam, cortando a sala como
uma lâmina. Um grunhido áspero deixa seus lábios — Minha.
— Você não tem direito — Imogen começa.
— Me desafie — diz Brittany. Alguns vampiros se movem atrás de
Brittany, encolhendo a cabeça. Mas o resto fica para trás de Imogen.
— Vou fazer melhor — Imogen diz, sua pele pálida como a lua
cintilando quando pega a luz fraca. Ela levanta a saia e puxa uma
adaga de aparência perversa.
— Truque barato — Brittany diz, e então ataca.
As duas mulheres se encontram em uma fúria de punhos e
bloqueios, mas, de mãos vazias, Brittany está em desvantagem.
Balanço sobre o bar e procuro por algo que ela possa usar como
arma. Encontro uma pequena faca para cortar limões e um martelo.
— Brittany! — Eu jogo o martelo, e ela o pega sem perder o ritmo,
bloqueando um golpe brutal da faca de Imogen bem a tempo. Elas
lutam como se estivessem dançando, cada movimento tão suave e
praticado como se a coisa toda fosse coreografada. É tão lindo que
não consigo desviar o olhar.
— Pegue a garota! — alguém grita.
— Oh, eu — digo, conectando os pontos tarde demais. — Eu sou
a garota.
Subo de volta no topo do bar, procurando freneticamente por um
lugar seguro para me esconder, mas antes que eu possa fazer
qualquer coisa, Brittany pula. Com uma das mãos, ela agarra o
candelabro e balança. O teto geme em protesto e eu ouço algo
estalar quando ela ataca com um pé para chutar o vampiro que vem
direto para mim.
— Saia daqui, Theo! — Brittany grita ao pousar.
— Eu não posso deixar você!
Não posso explicar por que faço isso, mas corro pela Brittany em
vez de pela minha vida.
Eu vejo o horror em seu rosto antes de saber o que está
acontecendo. O teto grita acima de mim enquanto o candelabro
desaba e uma dor aguda perfura meu pescoço.
BRITTANY
O candelabro pressiona o pescoço de Theo, e antes de arrancá-lo,
eu sei que perfurou sua pele. O jogo de lado como se não pesasse
tanto quanto pesa. Ele ressoa alto ao pousar, e Theo choraminga.
Ajoelho-me ao lado dela, levantando suavemente sua cabeça no
meu colo. Há uma mancha vermelha em seu queixo e ela me olha
com lágrimas nos olhos.
— É um prazer conhecê-la — diz ela com um sorriso sem humor.
— Desculpe o atraso. — Minha voz está distorcida, como se
espremida por uma peneira. Eu pressiono a mão no ferimento em
seu pescoço, tentando estancar o fluxo de sangue, mas este é um
ferimento mortal. Não há tempo para nada além de um rápido
adeus.
Imogen está perto, seu foco agrupando-se em torno de mim como
o sangue sob o pescoço e ombros de Theo. Mas a sala está quieta.
Theo não é minha presa, mas minha conquista. E os vampiros da
minha cidade sempre respeitam a conquista.
O sangue aquece meu colo. Ela se derrama no chão em um fluxo
constante, acumulando-se sob a cabeça de Theo de uma forma que
me lembra uma flor escarlate. Eu me concentro nisso e não na
garota agonizante e ofegante em meus braços.
— Você é uma vampira — Theo diz, e em seus olhos vejo
perguntas e teorias e muito mais do que ela é capaz de dizer agora.
Ela só tem mais algumas palavras. Ela escolhe duas: — Faça-me.
A sensação de não fome agachada sob minhas costelas retorna.
Ela se expande e se expande, inflando dolorosamente dentro de
mim. E, de repente, tenho um nome para isso: tristeza.
— Não posso — respondo, sabendo que os olhos dos meus
colegas estão sobre mim e este é um momento precário. — Theo,
sinto muito. Existem regras.
— Lembra daquela pergunta que você me fez? Há muito tempo
— Theo diz, a voz ficando fraca. — A resposta é: você.
Como é possível que uma garota que nunca conheci antes se
sinta tão próxima de mim quanto minha própria irmã? Não posso
deixá-la morrer. Não posso deixar isso ser o seu fim.
Eu levanto meus olhos para o círculo de vampiros que nos rodeia
e rosno, furiosa e feroz e mais certa do que nunca sobre qualquer
coisa em minha longa vida.
Então abaixo minha boca no pescoço de Theo e mordo.
THEO: se você pudesse ir a qualquer lugar do mundo, para onde iria? não pense apenas
responda.
BRITTANY: o futuro.
THEO: essa não é uma resposta real.
BRITTANY: não é?
THEOLINDA
Eu pego o elevador do meu andar para a cobertura de Brittany.
Depois do acidente, depois que pedi para ela me transformar,
descobri muitas coisas. Em primeiro lugar, Imogen é uma idiota,
mas isso é óbvio para qualquer pessoa com ou sem pulso. Já se
passaram quatro meses e ainda estou morrendo. Acontece que é
um processo lento e muito doloroso. Meu corpo está desligando e
está uma bagunça. Mas - eu tenho uma tutora morta-viva. Mesmo
que ela tenha que enfrentar um julgamento por me transformar,
apesar da proibição dos bebês vampiros de 1987 e toda a guerra
civil dos mortos-vivos que aparentemente também é minha culpa.
Ainda há coisas que preciso descobrir. Como convencer meus
pais de que eu faço aulas noturnas na faculdade. Como estar perto
deles sem querer matá-los. Estou brincando. Na verdade não. É
difícil.
Não achei que seria fácil. Algumas coisas levarão anos para
serem descobertas. Por exemplo, como vou conseguir não lançar
um reflexo? Acho que eu queria aquele filtro de vampiro, mas é uma
bênção mista. Pratico tirar minha foto no reflexo espelhado deste
elevador. Talvez em duzentos anos eu tenha que lidar com
alienígenas e eles terão uma cura para o vampirismo ou um telefone
que tire a Apple do mercado.
Não vou prender minha respiração. Embora eu pudesse, se
quisesse.
O elevador me deixa entrar na cobertura de Brittany. Ela tem um
cinema em seu apartamento. Ela tem tudo que precisa para nunca
sair de casa.
Mas me lembro da palavra que ela costumava me dizer. Solitária.
Não mais.
Ela me entrega um dos copos brilhantes combinando que
comprei para nós. Ainda não consigo olhar para o sangue, embora
tenha que superar para sobreviver.
— Você sabe que esses filmes não vão te ensinar nada — ela me
diz, e pula no sofá.
— Eu sei, mas literalmente os únicos filmes de vampiros que eu
já vi são Cre...
— Não se atreva.
— Cale a boca, é perfeito, ok. Per. Fei. To. — Eu me jogo ao lado
dela e tomo um gole. Estou começando a sentir o gosto de minerais.
Essa pessoa realmente gostava de sódio.
Tenho saudades da pipoca. Eu sinto falta da manteiga. Sinto falta
da luz do sol. Sinto falta de tantas coisas e apenas comecei. Minha
vida acabou. Minha nova vida começou.
Pelo menos não terei que fazer isso sozinha. Tenho minha melhor
amiga para sempre, e essa é uma promessa feita com sangue.
THRALL Ou “Estes não são os vampiros que você
está procurando ...”
Laura Ruby
Jude disse: — Como você sabe que não tenho buracos no meu
cérebro? E quem você está chamando de criança?
Diwata bebeu de seu próprio copo e estalou os lábios. — Você
não deve ter mais de dezesseis anos, então sim, estou te chamando
de criança, criança. Jude abriu a boca para mentir ou talvez deixar
escapar outra verdade, mas Diwata já estava marchando pelos
túneis atrás dos habitats, onde muitos dos habitantes do zoológico
ainda estavam esperando que alguém os soltasse em seus espaços
ao ar livre. Silenciosamente, Jude os cumprimentou, pressionando
os dedos frios no vidro. Olá, Jonas; Olá, Victor; olá, olá, olá. Ela
conhecia seus chamados, seus cheiros e seu tédio, e a batida de
seus corações. E por conta de muitos dos animais serem mais
velhos, ela conhecia suas aflições e dores também, sentia-as
vibrando em seu próprio corpo. Um quadril ruim. Um casco rachado.
Dores nas gengivas por conta de uma infecção. Memórias de um
rebanho se movendo lentamente no deserto, o disparo da arma que
mudou tudo.
Por sobre o ombro, Diwata disse: — Hoje é um dia letivo. Por quê
você está aqui?
Diwata também era mais velha, mas furtivamente rápida,
seguindo em frente como se estivesse sobre rodas. Jude correu
para acompanhar.
— Estou tirando um ano sabático.
— Você faz isso depois de se formar, não antes. — Se eu fosse
para a escola, quem te ajudaria com todos os animais?
Diwata grunhiu e continuou marchando. Elas vinham tendo essa
discussão desde que Diwata contratou Jude para fazer parte da
equipe de limpeza – apenas mais um par de mãos para varrer o
caminho por onde as mães com carrinhos passam, apenas mais
uma adolescente drogada que não saberia o que é um trabalho
honesto, nem que este lhe desse um tapa na cabeça. E então veio a
manhã seguinte... bem, a manhã em que Diwata a encontrou
deitada com as leoas Olive e Nell, as três dormindo empilhadas
como gatinhos. Em vez de chamar a polícia, Diwata a promoveu. E
ela protegeu Jude quando a administração quis saber por que
diabos uma “bruxa gótica viciada” estava alimentando os
rinocerontes e os crocodilos com as mãos. A garota queria morrer?
Diwata queria que eles fossem processados?
Jude queria e Diwata não, mas então o racionamento começou e
nada disso importava mais.
— Então — Jude disse, — quem é o próximo? Os pinguins? As
focas?
— Todos eles são os próximos. Eles e seus habitats. Temos que
limpar esse lugar inteiro.
— Com o quê? Mojo Joe?
— Com o que pudermos encontrar. A festa é neste sábado.
— Festa — Jude repetiu.
— Não me diga que você esqueceu.
— Como eu poderia esquecer? — Jude disse. Ela olhou de
soslaio para o pequeno grupo de pessoas vestindo ternos, tirando
fotos dos vários habitats, fazendo planos em seus tablets.
Organizadores de festas contratados para colocar luminárias, mesas
e decorações. Um deles, um jovem de cabelos escuros e pele
negra, encarou-a com tanta ousadia e por tanto tempo, que Jude
mostrou-lhe o dedo do meio. Ele riu e tirou uma foto dela, e então
fez beicinho quando conseguiu nada além de um borrão.
Diwata disse: — Você deveria vir para a festa.
— Claro.
— É sério.
Jude parou de andar, quase tropeçando em si mesma.
De jeito nenhum eu vou a uma 'festa' para o idiota que desligou a
água. Diwata parou de andar também, se virou para olhar para
Jude, uma sobrancelha cinza e volumosa arqueada. — Essa é a
posição do conselho, o idiota tecnicamente não desligou a água; ele
simplesmente aumentou o preço dela.
— Isso quer dizer a mesma coisa quando ninguém pode pagar.
— De qualquer modo, eles não vão dizer não ao CEO que
poderia ligar a água, entendeu?
Embora ela não estivesse nem um pouco com frio, Jude esfregou
os braços nus. — Ele vai ligar ela agora para que possamos limpar
o lugar? Onde estão os caminhões-pipa que nos prometeram?
— E eles não vão dizer não a todo o dinheiro que ele está dando
— Diwata continuou. — Ele está alugando o parque inteirinho por
um dia. Haverá bandas chiques, comida chique e centenas de
pessoas chiques. Quando foi a última vez que tivemos tantas
pessoas aqui ao mesmo tempo?
— Esse é um parque público. Para o público.
— Que fofo. Esse lugar é tão público quanto a água.
Diwata estava certa, Diwata sempre estava certa. Há muito tempo
atrás, o zoológico era gratuito, mas agora custava vinte e cinco
dólares para entrar, e mais para estacionar. No Safari Café, as
batatas fritas custam oito dólares, uma garrafa de água, dez. Agora,
pouco depois do amanhecer, o zoológico estava frio e deserto, um
guardanapo perdido se mexendo sob as mesas do café, dançando
no vento frio do lago. Mas o lugar não estaria muito mais lotado na
abertura, ou no almoço, ou no jantar. Não haveria multidões de
crianças rindo, se amontoando na Floresta dos Macacos, nenhuma
família saindo do Trem de Aventura Lionel, e o Carrossel das
Espécies Ameaçadas de Extinção giraria sozinho, imaginando as
espécies que poderiam se juntar a ele um dia, se sobrasse alguém
para esculpir um urso polar ou um tigre.
A raiva antiga e infrutífera cresceu dentro dela, amargando suas
entranhas. Embora ela fosse sofrer as consequências disso, Jude
bebeu o resto do café em um longo gole, e amassou o copo em seu
punho. Não ajudou. Só uma coisa ajudaria, mas ela não faria isso
nunca mais.
Ela jogou o copo amassado na lata de lixo mais próxima. —
Cesta — disse ela. As moscas, as formigas e os outros insetos
escavando o lixo protestaram com o equivalente a “Mas que diabos,
estamos tentando comer aqui!”, mas Jude tinha prática demais para
estremecer com uma linguagem que só ela entendia.
A expressão no rosto de Diwata se abrandou, de qualquer
maneira, as linhas se suavizando. — Escute, criança. Talvez essa
festa não seja tão ruim.
Jude odiava quando Diwata sentia pena dela. Ela passou os
dedos no telefone em seu bolso como se, de repente, tivesse que
atender uma ligação, realizar uma reunião, fazer uma reserva. —
Pare.
Diwata suspirou, soando como Lolo. Velha, dolorida e
desapontada. — Eu só quis dizer que talvez haja algumas pessoas
para você. Jovens. Não idiotas. — Seus olhos se dirigiram para o
jovem negro, e então voltaram a fitar o rosto de Jude. — Eu sei que
você não pensa assim, eu sei o quanto você ama Lolo, Olive, Nell e
os demais, mas você tem que encontrar seu próprio bando.
— Lolo é meu bando. Olive e Nell também.
— Estou falando sobre humanos.
— Os humanos também são animais — disse Jude.
— Pare com isso. — Diwata agitou a mão venosa e enrugada. —
Todo mundo precisa de alguém.
— Eu tenho você.
— Não é isso que eu quero dizer e você sabe disso. Encontre
algumas namoradas. Alguns namorados. Alguns amigos. Se divirta.
Você deve ter se divertido alguma vez, certo? Você se lembra dessa
sensação.
Ela tinha.
Havia um animal que vomitava seu próprio estômago para distrair
os predadores, mas Jude não conseguia se lembrar qual era.
Diwata era a coisa mais distante de um predador, e a mais próxima
de um bando que Jude tinha, mas Jude vomitou o Mojo Joe em
suas botas mesmo assim, mais uma bagunça que elas tinham que
limpar.
Mark Oshiro
invisibleb0y
5 de junho de 2018
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invisibleb0y
6 de junho de 2018
As regras
Ok, talvez essa última não seja uma regra real. Mas parece
verdade. Minha vida é planejada e segura. Acho que não fiz nada
perigoso desde que nasci.
É exatamente tão chato quanto parece.
ThrowawayOne: primeiro
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invisibleb0y
8 de junho de 2018
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7 Notes
invisibleb0y
10 de junho de 2018
invisibleb0y
12 de junho de 2018
NoOneKissesLikeGaston: Ok, agora estou viciado. Quando sai o próximo capítulo? Você
devia publicá-los no AO3.
CanIScream: Não é uma fanfic. Lá só tem fanfics.
NoOneKissesLikeGaston: Acho que é uma boa história de qualquer maneira. Quase
parece real lol
15 notas
invisibleb0y
14 de junho de 2018
Eu fiz isso.
Eu fiz isso.
Foi muito pior dessa vez. Não tinha chuva de meteoros para usar
como álibi. Tínhamos acabado de terminar minha aula sobre uma
parte chata da América. Odeio quando meus pais tentam me
ensinar história porque...bem, geralmente eles estiveram lá. Pelo
menos nos últimos duzentos anos, quero dizer. Eles trocam sorrisos
e risadinhas conhecedoras, e fazem referências secretas a coisas, e
isso me frustra. Eles nunca me contam nenhuma dessas merdas
legais! Apenas se limitam aos livros escolares que roubaram,
ocasionalmente fazendo comentários sobre o quão “impreciso” é o
texto.
Esta é outra maneira de viver uma vida separada da deles. E eles
planejaram dessa forma. Minha vida inteira está planejada.
Então, quando Papi disse que iria para a escola novamente para
ver se eles tinham um livro de Álgebra II, eu disse a ele que não
precisava de álgebra porque era um vampiro. Ele achou muito
engraçado.
Mesmo assim ele foi.
Por quê? Por que eles querem que eu aprenda sobre coisas que
não posso experienciar? Por que devo me preocupar com história,
matemática e ciências se eles não me deixam conhecer o mundo?
Depois que papai saiu, Mami vagou até onde eu estava sentado,
minhas costas pressionadas contra a parede, irritação correndo em
mim. Ela disse que iria descer para o porão por alguns minutos. —
Já volto, mijo — disse, passando os dedos pelos meus cachos
pretos e beijando-me na testa.
Eu sabia que era minha única janela de oportunidade.
Eu corri. Ainda mais rápido do que na outra noite. Fui direto para
a casa de Jairo e, quando cheguei à porta dos fundos, congelei.
Eu nunca tinha feito nada assim.
Eu levantei minha mão para a maçaneta e lentamente a girei.
Não fez nenhum som. Eu puxei a porta e olhei ao redor. Sem
humanos. Ninguém. Eu me movi silenciosamente, impedindo a porta
de bater, e fui da cozinha para o quarto dele.
Ele estava dormindo.
E foi tão difícil. Eu não me alimentava há dois meses e, embora
eu tivesse um bom controle, podia ouvi-lo.
Thump, thump.
Thump, thump.
THUMP, THUMP.
Tão alto.
Tão...gostoso.
Mas eu tinha um motivo para estar ali. Fui até a mesinha de
cabeceira e peguei sua carteira, pegando dois cartões de crédito.
Eu fui embora segundos depois.
Chegando em casa não muito depois.
Lendo um site de notícias quando Mami voltou lá em cima.
— Alguma coisa interessante acontecendo no mundo?
Eu balancei minha cabeça. — Tudo a mesma coisa.
Ela suspirou. — Estamos com pouco sangue. Você quer vir caçar
amanhã?
Eu concordei. — Sí, Mami. — Comecei a dizer outra coisa, mas
ela me interrompeu.
— Juntos — ela disse. A frustração cresceu em mim com o
lembrete: nunca sozinho.
Mami me encarou, e em seus olhos havia a mesma infantilização
em sua voz. Ela estava no controle. Eu não poderia escolher por
mim mesmo.
— Ok — eu murmurei. Meu rosto queimando. — Juntos.
Ela bagunçou meu cabelo e seu toque enviou raiva pela minha
espinha. — Quando você crescer, conversaremos sobre isso.
Então ela saiu.
Ela estava parada do lado de fora da sala, a poucos metros de
mim, quando usei o cartão de crédito de Jairo para comprar uma
câmera digital, uma com excelente capacidade para pouca luz.
Eu vou fazer isso. Assim que chegar na casa dele, vou fazer.
invisibleb0y
14 de junho de 2018
Como eu pareço?
eu nariz é pontudo? Largo? Já o toquei antes. Acho que se alarga
nas laterais. E minhas sobrancelhas? Minhas orelhas? Eu realmente
não tenho nada com que comparar. Meus olhos são escuros?
Claros? Como são meus cachos? Eu sei a sensação deles, mas não
é a mesma coisa. Papi é quem corta meu cabelo, apenas algumas
vezes por ano, e sempre que enrolo meus cachos em volta dos
dedos, um lado parece mais curto que o outro. Mas não consigo ver
por mim mesmo. Ele diz que parece bom e, mais uma vez, devo
obedecer ao que meus pais me dizem. Não tenho escolha própria.
Mas isso vai acontecer.
Eu vou me ver.
invisibleb0y
15 de junho de 2018
invisibleb0y
16 de junho de 2018
Eu tenho lido sobre outras vidas por tanto tempo. Devorei histórias
aqui de pessoas de todo o mundo, que estão lidando com coisas
que são indiscutivelmente piores do que as que estou passando.
Mas ainda me sinto vazio na maioria dos dias, como se tudo o que
pudesse fazer fosse me entregar à vida de estranhos. Eu também
quero me sentir completo algum dia. Estou cansado de olhar pelas
janelas de suas casas e de suas famílias.
Eu quero que alguém me veja.
Papi me disse que passo muito tempo no computador. Que
preciso ouvir mais a ele e a Mami, que eles conhecem o mundo
melhor do que ninguém. Eu apenas sorri para ele. O que devo dizer
sobre isso? Eles não “vivem” no mundo há dezessete anos. Somos
exilados por nós mesmos desde que nasci. Como eles poderiam
saber mais do que qualquer outra pessoa?
Eu tenho que fazer isso. Papi acabou de me deixar ainda mais
certo disso.
NoOneKissesLikeGaston: Nós apoiamos você! Lmao olha para mim, pareço obcecado.
MiseryBusiness: As pessoas sempre me dizem que passo muito tempo online. Talvez se o
mundo exterior fosse melhor, eu passaria mais tempo nele.
CallOfDuty92301: Por que vocês gostam desse lixo melodramático?
12 notas
invisibleb0y
17 de junho de 2018
Corri para a casa do Jairo hoje. Tive uma breve oportunidade para
isso. Estou ficando bom em encontrar esses lampejos de tempo, e
nossa caçada da outra noite me deu a energia necessária. Pegamos
um homem espiando na casa de outro, e me alimentei do
responsável por quase uma hora. Não senti culpa enquanto o
drenava. Aquilo era bom. Alguns dias, sinto-me culpado quando
temos de encurtar uma vida. Mas agradecemos a eles pelo que nos
dão. Seus sacrifícios nos permitem viver.
Mami riu quando me sentei e arrotei. Ela olhou para o meu rosto
por um longo tempo, e não como no outro dia. — Estás creciendo —
disse ela, seus olhos calorosos. — Talvez você vá começar a caçar
por si mesmo.
Me animei com isso. — ¿De veras?
Ela balançou a cabeça. — Não tão cedo. Assim que soubermos
que você pode ser confiável. Assim que soubermos que você
seguirá as regras.
— Eu não estou seguindo?
— Sim — ela disse. — Mas precisamos de mais alguns anos,
apenas para ter certeza.
Então... nunca.
Isso é o que ela quis dizer, certo?
Levamos o outro homem conosco. Acontece que ele morava
sozinho e não fez muito barulho.
Não havia correspondência na casa de Jairo hoje.
Talvez tenha sido uma ideia terrível.
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invisibleb0y
18 de junho de 2018
invisibleb0y
19 de junho de 2018
Eles me encontraram.
Eu sou um tolo. Eu deveria saber que foi fácil demais. Eu deveria
saber que era bom demais para ser verdade.
Eles pensaram que eu estava caçando sozinho. Eles estavam
orgulhosos de mim. É por isso que eles me seguiram, à distância,
me observando enquanto eu corria para longe de casa, para o
deserto solitário.
Eles pensaram que eu estava pronto para ser outra coisa.
Em vez disso, eles me observaram enquanto me aproximava da
casa.
Enquanto eu seguia direto para a caixa de correio, sem prestar
atenção em mais nada.
Quando eu a abri.
Puxei o pacote.
Rasguei a borda.
E Jairo Mendoza ergueu sua espingarda.
Mirando em mim.
Eu ouvi o destravar da arma, então vi um borrão, um clarão e
então um pow, e Mami tinha Jairo ao chão. Ela gritou algo feroz ao
rasgar sua garganta, um movimento fluido, um jato de sangue
encharcando a areia sedenta.
Quando ela se levantou, sua mão havia sumido. Apenas um toco
onde esta costumava estar.
Ela tinha levado um tiro por mim. E lá estava eu, envergonhado,
com a caixa da câmera digital na mão e Papi gritando comigo, a
mesma coisa sem parar.
— ¿Qué hiciste, Cisco?!
O que eu fiz?
Mami se alimentou voraz e completamente do homem. Jairo
Mendoza não existia mais, esvaziado em minutos, e ela ofegava ao
começar o processo de regeneração. Isso levaria dias. Seria
doloroso.
— Fizemos isso para proteger você, mijo — disse ela, o líquido
descendo por sua própria garganta, sobre sua camisa agora
manchada. — Você deveria seguir as regras. Por quê? Por que você
fez isso?
Eu não tinha nada a dizer a eles. Não consegui explicar na época
e, mesmo agora, sentado no escuro, não tenho nada.
Eles enterraram seu corpo longe. Disseram que deveríamos ficar
bem, mas provavelmente precisaríamos nos mudar logo.
O sol está nascendo.
Eu tenho que ir.
invisibleb0y
24 de junho de 2018
NoOneKissesLikeGaston: Você fez o que tinha que fazer. Por favor volte!
TrueAnneRiceFan: cara, esse blog é gay
ToEachTheirOwn: @TrueAnneRiceFan quem mais diz isso em dois mil e gayzoito?
18 notas
invisibleb0y
29 de junho de 20188
CanIScream: maldito seja, estou tão envolvido nesta história. Você pode atualizar mais de
uma vez por dia lol por favooooor.
53 notas
invisibleb0y
9 de julho de 2018
invisibleb0y
16 de julho de 2018
Ele é real.
Ele é real.
Eu não estava imaginando.
ELE É REAL.
BrujaBorn: Espera, o que você quer dizer? Vamos, cara, nos dê outro post!
127 Notes
invisibleb0y
17 de julho de 2018
invisibleb0y
18 de julho de 2018
Pouco depois da meia-noite, voltei para o lago. Eu sabia que tinha
alguns minutos antes que meus pais voltassem. Eles me deixaram
sozinho para ir caçar, então quebrei essa regra sem hesitar. Eles
caçaram sem mim, então, tecnicamente... eles quebraram sua
própria regra?
Eu fui para aquela água cintilante.
Chamando seu nome.
O som ecoou na água e ele veio até mim, uma rajada de vento, e
então parou ao meu lado. Eu encarei aqueles olhos novamente.
— Você é real, não é?
Ele assentiu.
— Como existem outros?
— Não sabemos. — Ele passou a mão por todo o comprimento
do meu braço esquerdo. Eu estremeci, não de frio.
— Meus pais... — Fiz uma pausa, deixando meus olhos
passarem por seu corpo, a forma como sua camiseta se ajustava
em seu peito, sua barriga redonda. — Eles disseram que eu era o
único.
Ele sorriu. — Definitivamente, não é verdade.
— Mas por quê? — Minha voz não era mais um sussurro. — Por
que mentiriam para mim?
Seu rosto retorceu com uma careta. — Essa é uma questão para
eles, não para nós.
— O que mais é verdade?
Kwan inclinou a cabeça para o lado. — Sobre nós? Sobre o que
somos?
Eu assenti.
— Não sei o que mais eles disseram a você — disse ele. — O
que devo dizer sobre o que somos.
— Quero saber tudo — eu disse.
Sobre mim. Sobre nós. Sobre ele.
— Eu sei que você quer, mas... — Ele virou o rosto, franzindo-o.
— Não sei se devo dizer a você.
Eu coloquei minha mão em seu peito. Fiz sem nem pensar. Eu só
queria sentir aquela sensação novamente, e seu poder - se é assim
que você pode chamá-lo - correu para frente, espalhando-se por
mim.
Mas não foi o suficiente. Parecia tão injusto experimentar isso
apenas de vez em quando, sempre não planejado, sem nunca ter
certeza de quando seria a próxima vibração. Eu precisava de mais.
— Não sei se posso voltar — eu disse. — Se eu continuar vindo
meus pais vão me pegar.
Ele se virou para sair, mas parou. — Você poderia vir conosco.
— Não posso — respondi, mais por instinto do que por objeção.
— Como eu poderia fazer algo assim?
— Todos nós fizemos isso — disse ele sem hesitação. Nisso, ele
revelou muito.
Havia outros.
Os pais provavelmente também mentiram para eles.
E eles partiram.
— Você apenas... saiu por conta própria? Mas como?
— Apenas... pense nisso.
Então Kwan desapareceu tão rápido quanto chegou.
E suas palavras eram tudo o que eu pensava enquanto me
espreguiçava no telhado dez minutos depois, olhando para o céu
noturno. Papi juntou-se a mim e perguntou o que eu estava fazendo.
— Sonhando — eu disse.
Ele ficou lá por alguns momentos, e não poderia saber que meu
corpo estava zumbindo com energia, o efeito residual de estar perto
de Kwan.
— Eu sou realmente o único? — Eu perguntei. Em voz alta. Para
ele. Para o céu.
Ele usou a ponta da bota para arranhar o teto. Foi uma reação
inconsciente por estar nervoso, e me sentei, segurando-me com os
cotovelos.
— O único — disse ele, sorrindo para mim. — Eres especial.
Ele voltou para casa sem dizer mais nada.
Eles sabiam? Papi tinha certeza dessa afirmação, ou era apenas
mais uma mentira que eles contaram para me manter a salvo?
Comecei a considerar o que Kwan havia dito, e isso fez meu
estômago embrulhar, deixando meu coração em chamas de pânico.
Ele me disse para pensar sobre isso.
Então eu fiz.
invisibleb0y
19 de julho de 2018
invisibleb0y
19 de julho de 2018
invisibleb0y
20 de julho de 2018
É isso.
Esta é a última vez que vocês terão notícias minhas.
Saí de casa pouco depois das três. Eu disse a Papi y Mami que
voltaria ao lago por alguns minutos antes de o sol nascer. Papi fez
uma piada terrível sobre como eu passava muito tempo lá. Eu ri,
mas não disse nada. Eu vi Mami trocar um olhar com ele.
Isso me encheu de pavor.
Eles sabiam?
Eu não estava longe de casa quando comecei a correr, quando
ouvi meu nome ser chamado atrás de mim, quando soube que eles
suspeitavam que eu estivesse mentindo. Corri mais rápido do que
pensei ser possível, a exaustão passando pelos meus ossos, me
implorando para parar, implorando para me alimentar. Comecei a
sentir outras criaturas, a sentir seus pulsos enquanto passava
correndo, mas as ignorei.
— Cisco!
Eu não conseguia parar.
— Cisco, ¡espera!
Eu não podia esperar mais.
— Cisco, por favor!
Eu estava cansado de ser protegido.
Eu derrapei até parar na beira da água.
— Kwan, estou aqui!
Segundos depois, meus pais tropeçaram e caíram em posições
defensivas.
Ali.
Do outro lado do lago: Kwan.
— Cisco... — ele rosnou. Meu nome em sua boca era cru em
possibilidade. Ele estava me avisando? Acenando para mim?
— Estou aqui — eu disse. — Me leve com você.
— Não! — Mami gritou. — Você não vai a lugar algum!
Ela estendeu a mão para agarrar meu braço, mas eu recuei e vi a
decepção e o choque se espalharem por seu rosto.
— Por favor, Cisco — disse Papi. — No puedes salir. Não
podemos protegê-lo se sair.
— Nós podemos.
Kwan estava ao meu lado. Ele colocou seus dedos entre os meus
e enviou um arrepio pelo meu braço, por todo o meu corpo. Seu
poder me acariciou, percorreu meu corpo, me deu força. Como? Eu
pensei. Como isso é possível?
— Você não está sozinho — disse Kwan, depois olhou para meus
pais. — Há mais de nós, assim como eu, nascidos como Cisco e
sobrevivemos.
Eles saíram de trás das árvores e arbustos que cercavam o oásis.
Cinco. Dez. Vinte. Tantas crianças, todas se movendo com o
cuidado de quem sabe que pode ser caçado com a mesma
facilidade com que caçam outros. Eram altos. Baixos. Eu fiz contato
visual com uma garota cuja pele era mais escura do que a minha,
com o cabelo trançado firmemente contra a cabeça e ela balançou a
cabeça tão ligeiramente que foi quase imperceptível.
E essa vibração foi imensa. Quase opressora. A energia que senti
de Kwan nessas primeiras interações era agora multiplicada por
vinte.
Isto. Isto era o nosso poder.
E era amplificado quando estávamos juntos.
— Como você pode confiar neles? — Mami perguntou, suas
mãos estendidas em minha direção como uma oferenda. — Eles
são apenas estranhos!
— Por causa de pessoas como você — a garota cuspiu. — Você
nos manteve separados. Você disse a Cisco que ele estava sozinho.
Eu me virei para meus pais, minha boca aberta de horror. — Você
sabia? Você sabia esse tempo todo?
Papi estava chorando. — Nós teríamos te contado — ele disse,
seu bigode torcendo em seu rosto. — Algum dia, teríamos contado
tudo a você.
Meu corpo se enfureceu, mas Kwan colocou a mão em meu
peito.
A vibração.
O poder.
Nosso poder.
— Quando? — Eu fui até o Papi e fiquei cara a cara com ele. —
Quando “algum dia” chegaria? Quando você ia me dizer que havia
outros como eu?
— Quando o clã nos disse — ele respondeu, seu rosto tremendo.
— Quando eles descobriram o que todos vocês podiam fazer
quando estavam juntos, eles ficaram com medo! Eles estavam com
medo de todos vocês!
Todos nós.
Eu não era o único da minha espécie. Eu não estava sozinho.
Kwan apertou minha mão. — Cisco, eu trouxe algo para provar
que falamos sério. Que sabemos o que você passou. Que prova que
nos importamos.
Ele me soltou. Enfiou a mão no bolso de trás.
Eu vi um flash na pouca luz do luar.
Papi gritou e fez menção de se mover em minha direção, mas foi
cercado momentos depois. Eu os contei: sete vampiros, todos
jovens, todos como eu.
Estranhos.
Estranhos como eu.
— Não faça isso — Mami implorou. — As regras são…
Mas ela não terminou a frase. Por que as regras importavam
agora? Meus pais as haviam desenvolvido para me manter preso e
agora... Lágrimas escorreram dos olhos de Mami. Eu estava livre. E
ela sabia disso. Ela não poderia me colocar de volta na caixa em
que eu morava.
Eu tinha que acreditar. Em mim mesmo.
Peguei o espelho e o segurei contra o rosto enquanto os gritos
dos meus pais enchiam o ar do deserto.
Lá estava eu.
Cisco.
Eu..
As lágrimas ameaçaram borrar minha imagem. Minha imagem
nítida. Limpei-as e lá estava eu.
Minhas sobrancelhas eram pretas. Grossas. Elas quase se
juntavam no centro. Usei minha outra mão para traçar a ponte do
meu nariz, por minhas narinas largas, por meus lábios, então sobre
minhas bochechas. Havia uma camada de pelos faciais na metade
inferior do meu rosto. Eu teria que começar a fazer a barba? Os
vampiros se barbeavam? Papi tinha que cortar meu cabelo, então…
Havia tanto que eu não sabia. Tantas perguntas que eu não havia
pensado em fazer antes.
Mas eu também nunca tinha visto isso.
Isso sou eu.
— Vocês me disseram que eu morreria — disse, falando para
meus pais sem olhar para eles. — Vocês me disseram que se eu
não seguisse suas regras, seria levado embora.
Papi começou a dizer algo. — Cisco…
— O que mais é mentira? — Eu gritei. — O que mais não é
verdade?
— Você tem que entender — disse Mami. — Nós tínhamos que
proteger você.
— O que mais não é verdade? — Eu repeti
— Não importa — disse o papi. — Um pouco de tudo. O
suficiente para que você confie em nós.
A ironia. Eles mentiram para me fazer confiar neles.
— Há mais — disse Kwan. — Muito mais sobre nós que você não
sabe. Muito sobre você.
Papi parou de chorar. Enxugando os restos de lágrimas. Ele se
endireitou, ergueu o queixo e me examinou.
Usei em meu rosto: uma declaração. Um apelo. Por favor, eu
tenho que fazer isso.
Ele balançou sua cabeça. — É muito cedo — disse.
Mas então Mami falou.
— É mesmo?
E meu Papi, que sempre foi tão certo, sempre tão satisfeito com a
história, sempre de posse de respostas, nada tinha a dizer sobre
isso. Eu podia ver as palavras se formando em seus lábios, mas
nada saiu.
Seus rostos estavam marcados pela dor.
E então... resignação.
Mami sorriu para mim.
Papi pronunciou uma palavra.
— Hazlo.
Mami chorou mais ainda, mas também assentiu.
Quase imperceptivelmente.
Eu dei minha mão a Kwan.
Dedos enlaçaram os meus.
Um desejo floresceu lá, não apenas nascido de nosso poder
coletivo, mas da luxúria também. Quando um menino havia me
tocado? Nunca. Eu queria isso também.
Faça isso.
Ele me levou embora e eu olhei para eles, apenas uma vez.
Eles sorriram.
Foi uma bênção? Possivelmente. Mas eles não me perseguiram.
Eles não seguiram.
Eles me deixaram ir.
Estamos em um carro agora. Nunca estive dentro de um antes.
Kwan disse que isso nos levaria à nossa próxima parada mais
rápido. Estávamos indo pegar alguém no caminho.
Outro de nós.
A bateria do telefone de Kwan está fraca. Eu tenho que devolver.
Vocês não vão mais ouvir falar de mim.
Eu estou livre.
Dhonielle Clayton
I
[Sexta-feira]
II
[Sábado]
Há uma placa na porta que diz ENTRE, mas Ben ainda tem que puxá-
la para dentro.
Festas têm tudo o que Juliette odeia.
Têm música alta e quartos lotados, comida que ela não pode
comer e bebida que ela não pode beber, e todas as armadilhas da
vida normal que ela nunca terá. Mas ela bebeu uma xícara cheia da
cafeteira antes de sair, e pelo menos o sol se pôs e levou o pior de
sua dor de cabeça com ele. O mundo é mais suave no escuro, mais
fácil de se movimentar.
Ainda assim, a única coisa que a faz entrar - além do intratável e
impossível Ben - é a ideia, o medo, a esperança de que Calliope
esteja em algum lugar desta casa.
Mas não há sinal dela.
— Ela vai aparecer — diz Ben, e ela quer acreditar nele, e ela
quer ir para casa, e ela quer estar aqui, e ela quer ser mais, e ela
quer tomar uma bebida no bar, quer fazer alguma coisa, qualquer
coisa para acalmar seu coração nervoso.
Ela franze os lábios, sentindo o gosto do batom vermelho-escuro
chamado Heart-Stopper, e concorda em ficar. Talvez ela encontre
outra pessoa, talvez não importe, talvez a primeira pessoa seja
apenas a primeira.
Dez minutos depois, uma dúzia deles havia migrado para um
quarto no andar de cima e Ben está liderando um jogo de Verdade
ou Desafio, e ela não sabia se ele estava fazendo isso por ela ou
por si mesmo, porque ele pareceu muito triste quando Alex escolheu
verdade, e então ele escolheu desafio, e agora ele está bebendo
uma cerveja enquanto planta bananeira, um ato que desafia as leis
da física, e Jules está rindo e balançando a cabeça quando Calliope
entra.
E quando ela vê Jules, ela sorri. Não é o sorriso brilhante de
amigos que se encontram no meio da multidão. É algo astuto e
silencioso, que logo foi embora, mas deixou seu coração batendo
forte.
Ela para a alguns metros de distância, então elas ficam do
mesmo lado da sala, lado a lado, e assim é melhor porque Jules não
precisa olhar para ela, não precisa suportar a força da outra garota
olhando de volta.
Ben termina e levanta as mãos como um ginasta finalizando uma
série para uma sala cheia de aplausos.
E então ele olha para Jules e sorri.
— Juliette — diz ele, os olhos dançando com poder, e ela sabe o
que ele vai dizer, sabe um pouco, pelo menos, e ela deseja que ele
não o faça, mesmo com seu coração batendo forte.
— Eu te desafio a passar sessenta segundos no armário com
Calliope.
A sala assobia e grita, e ela está prestes a protestar, a fazer uma
piada sobre não estar mais no armário, que se ele quiser que elas
se beijem, elas podem se beijar aqui mesmo, na frente de todos, na
segurança da luz. Mas não há tempo para dizer nada disso, porque
a mão de Calliope já está se fechando em torno da dela, puxando-a
para fora da multidão.
— Vamos, Juliette.
E o som de seu nome na boca da outra garota é tão certo, tão
perfeito, ela segue, deixa Cal conduzi-la para o armário. A porta se
fecha, mergulhando as duas no escuro.
Escuro. É uma coisa relativa.
A luz se espalha pela parte inferior da porta, e os olhos de Juliette
capturam o feixe de luz, usando-o para pintar os detalhes do
armário lotado. Os casacos ocupando 90 por cento do espaço, uma
pilha de caixas em torno de seus pés, os cabides batendo na parte
de trás de sua cabeça e Calliope - não a parte de trás de sua
cabeça ou algum olhar de soslaio roubado, mas bem aqui, a
inclinação de sua bochecha e a curva de sua boca e aqueles olhos
castanhos firmes, de alguma forma quentes e afiados.
— Oi — ela diz, sua voz baixa e segura.
— Oi — sussurra Juliette, tentando soar como sua irmã, com sua
confiança arejada, mas sai tudo errado, menos como uma
respiração e mais como um assobio, um guincho.
Calliope ri, menos dela, do que da situação. O armário lotado. A
proximidade de seus corpos. E, pela primeira vez, a outra garota
parece nervosa também. Tensa, como se ela estivesse prendendo a
respiração.
Mas ela não se afasta.
Jules hesita, acha que elas deveriam estar mais próximas ou
mais distantes.
Ben nunca disse o que elas deveriam fazer.
Sessenta segundos não é muito tempo.
Sessenta segundos são para sempre.
Calliope cheira bem, claro que ela cheira, mas não é seu perfume
ou seu hidratante labial.
É ela.
Os sentidos de Jules aumentam e se estreitam até que tudo que
ela consegue sentir é a pele da outra garota, seu suor e seu sangue.
Sangue - e algo mais, algo que ela não consegue identificar, algo
que faz soar sinos de alerta em sua cabeça.
Mas então Calliope a beija.
Sua boca é tão macia, seus lábios se separam entre os de Jules,
e não há fogos de artifício. O mundo não para. Ela não tem gosto de
mágica ou luz do sol. Ela tem gosto de refrigerante de laranja que
estava bebendo, como ar fresco e açúcar, e algo simples e humano,
e as pessoas falam sobre o mundo caindo, mas a mente de Juliette
está correndo, está aqui, ciente de cada segundo, da mão de
Calliope seu braço, de sua boca em sua boca, do cabide cavando
em seu pescoço, e ela não entende como as pessoas simplesmente
se beijam, como vivem o momento, mas Jules está tão
dolorosamente aqui.
Há uma dor sutil em sua boca, o desejo superficial de seus
dentes escorregando. E naquele momento, entre as presas e a
mordida, ela pensa em como ela preferiria ir ao cinema, preferia
aproveitar o cheiro do cabelo de Calliope, o murmúrio de sua risada,
preferia ficar neste armário e continuar beijando-a.
Apenas duas garotas humanas emaranhadas.
Mas ela está com tanta fome e sua boca dói muito, ela não é
humana e quer ser mais.
A boca de Juliette desce para o pescoço da outra garota.
Seus dentes encontram pele. Ela rompe tão facilmente, e ela
prova as primeiras doces gotas de sangue antes de sentir a ponta
de uma estaca de madeira cravada entre suas costelas.
I
[Sexta-feira]
II
[Sábado]