TCC Joana Musse Finalizado

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CENTRO UNIVERSITÁRIO BARÃO DE MAUÁ

JOANA MUSSE MONTEIRO FERRI

A SOCIEDADE MEXICA E O MILHO

RIBEIRÃO PRETO – SP
2021
JOANA MUSSE MONTEIRO FERRI

A SOCIEDADE MEXICA E O MILHO

Trabalho de conclusão de curso de História do


Centro Universitário Barão de Mauá para
obtenção do título de licenciatura.

Orientador: Dra. Nainora Maria Barbosa de


Freitas

RIBEIRÃO PRETO – SP
2021
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

F448s

Ferri, Joana Musse Monteiro


A sociedade mexica e o milho/ Joana Musse Monteiro Ferri - Ribeirão Preto,
2021.

41p.il

Trabalho de conclusão do curso de História do Centro Universitário Barão de


Mauá

Orientador: Dra. Nainôra Maria Barbosa de Freitas

1. Milho 2. México 3. Cosmovisão I. Freitas, Nainôra Maria Barbosa de II. Título

CDU 94(72):633.15

Bibliotecária Responsável: Iandra M. H. Fernandes CRB8 9878


JOANA MUSSE MONTEIRO FERRI

A SOCIEDADE MEXICA E O MILHO

Trabalho de conclusão de curso de História do


Centro Universitário Barão de Mauá para
obtenção do título de licenciatura.

Data da aprovação: ___/___/___

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________
Dra. Nainôra Maria Barbosa de Freitas (Orientador).
Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto

___________________________________________
Dr. Felipe Ziotti Narita
Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto

___________________________________________
Me. Antônio Aparecido de Souza
Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto

RIBEIRÃO PRETO – SP
2021
Dedico este trabalho à minha avó Norma.
AGRADECIMENTO

Eu agradeço primeiramente aos meus pais que sempre me apoiaram nesta


caminhada e que nunca me deixaram desistir, também aos meus avós Kim e Norma, que
mesmo de longe estão sempre comigo.
Agradeço à minha orientadora professora Dra. Nainôra Maria Barbosa de Freitas
que fez com que este trabalho fosse possível e que sempre esteve do meu lado nessa
caminhada.
Agradeço também a todos os professores do curso e da instituição que serviram de
inspiração e principalmente aos meus queridos amigos e companheiros que fiz nessa jornada.
“En estos días es necesario volver a la milpa, a
nuestra madre en cuyo regazo
encontramos el grano de oro que los dioses nos
dieron para formar nuestras
carnes y almas, el grano que nos hizo hablar”
(Natalia Toledo)
RESUMO

O milho, um dos mais importantes grãos do mundo, alimentou diferentes grupos


mesoamericanos desde a época pré-colombiana até os dias de hoje. Este trabalho é relevante
para entender a relação que essa planta possui com a ancestralidade dos povos indígenas e que
ainda tem papel fundamental atualmente. Tendo o milho como protagonista tanto na
alimentação em si quanto inserido com elementos da cosmovisão, discutiremos desde sua
origem como planta até sua simbologia inserida ao cotidiano dos povos ameríndios,
principalmente dos mexicas. O milho foi representado em deuses, em todo processo de
nascimento-vida-morte do ser humano, na colheita, nas guerras, sem contar que, junto com o
feijão e a abóbora, constituiu a principal refeição da Mesoamérica. Hoje, no México,
encontram-se dezenas de pratos à base de milho e segue sendo ainda um dos principais
elementos da culinária. Através do sistema de milpa os povos pré-hispânicos alcançaram
domesticar e diversificar a planta que, séculos mais tarde, já estaria conhecida em todo o
mundo.

Palavras-chave: Milho. Indígenas. Cosmovisão.


ABSTRACT

Corn, one of the most important grains in the world, has fed different Mesoamerican groups
from pre-Columbian times to the present day. This work is relevant to understand the
relationship that this plant has with the ancestry of indigenous peoples and which still plays a
fundamental role today. Having corn as the protagonist both in the food itself and inserted
with elements of the cosmovision, we will discuss from its origin as a plant to its symbology
inserted in the daily life of Amerindian peoples, mainly the Mexicas. Corn was represented in
gods, in every human birth-life-death process, in harvest, in wars, not to mention that,
together with beans and pumpkin, it constituted the main meal of Mesoamerica. Today, in
Mexico, there are dozens of dishes based on corn and it is still one of the main elements of
cuisine. Through the milpa system, pre-hispanic peoples managed to domesticate and
diversify the plant that, centuries later, would already be known throughout the world.

Keywords: Corn. Indigenous. Cosmovision.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Evolução do milho atual a partir de milhos primitivos: tunicado, palomero e


do tripsacum 16
Figura 2- Evolução do milho a partir do teosinto 17
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Centro de cultivo e domesticação de plantas 28


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO:......................................................................................................................12
1 Teorias Evolutivas e Ancestralidade do Milho..................................................................14
1.1 Lugar de Origem e Domesticação do Milho...................................................................18
2 Cosmovisão Mesoamericana Acerca do Milho..................................................................21
2.1 Simbologia do Milho Segundo Algumas Culturas Mesoamericanas............................23
3 Alguns Povos que Antecederam os Mexicas......................................................................27
3.1 Aztlán e História do Povo Mexica...................................................................................30
3.2 Ancestralidade do Milho e Suas Permanências Como Patrimônio..............................35
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................38
5 REFERÊNCIAS...................................................................................................................39
12

INTRODUÇÃO

Neste trabalho percorreremos o caminho de alguns povos mesoamericanos até o


que seria a última sociedade autóctone da região: os Mexicas.
No que hoje compreendemos como México, foram encontrados vestígios de vida
humana há mais de 10.000 a.C.: povos caçadores que viviam em cavernas e eram nômades.
Com o desenvolvimento destes, ao longo de todo o processo não podemos deixar de notar a
presença de um alimento que é comum e igualmente importante a todas as sociedades: o
milho, cuja data comprovada da primeira domesticação data de 3.500 a.C.
Sempre com o olhar atento às relações que possuíam com o alimento principal
estudado nessa pesquisa com o intuito de, finalmente, discorrer a respeito de como o milho é
sumamente importante para o México, dado o histórico com seus antepassados indígenas e
como vários aspectos dessa cultura pré-colombiana ainda permeia a vida atualmente.
Para este trabalho seguiremos uma linha de pesquisa bibliográfica e documental,
utilizando fontes como livros, códices e artigos referentes ao milho e ao modo de vida povos
mesoamericanos.
Algumas das fontes mais relevantes que usaremos neste trabalho serão os livros
“A Civilização Asteca”, de Jacques Soustelle e “A Conquista da América Latina Vista Pelos
Índios”, de Miguel León de Portilla; relatos contidos no Códice Florentino de Frei Bernardino
de Sagahún; as crônicas escritas por Bernal Dias del Castillo e vários artigos acadêmicos de
estudiosos mexicanos como, por exemplo, de artigos publicados pelo Instituto Nacional de
Antropologia e História no México, tratando desde questões sobre a evolução do milho
quanto pautas culturais e históricas.
Sendo assim, no primeiro capítulo refletimos a origem do milho e o início de seu
manuseio e domesticação pelos indígenas mesoamericanos através de artigos acadêmicos.
Serão apresentadas as teorias mais relevantes a respeito de sua evolução e o desenrolar desta
discussão.
Para o segundo capítulo será apresentada a importância que as populações nativas
atribuíam ao milho, tanto se tratando da alimentação, como- principalmente- da cosmovisão à
que era atribuído. Embasando-se em livros, artigos e também fotos de artefatos e pinturas que
mostram sua onipresença nessas comunidades, serão mostrados alguns deuses, mitos e o
caráter sobrenatural que lhe era atribuído.
13

Se tratando do terceiro capítulo começaremos com um panorama desde a época


em que os indígenas mesoamericanos ainda eram nômades e caçadores até os grandes e
organizados centros urbanos que formaram tempos depois com o auxílio da agricultura que
permitiu que os mesmos se fixassem. Depois enfocaremos na sociedade Mexica desde que
vieram da mítica Aztlán, até o grande Império que se tornariam no vale do México.
Finalmente pretende-se, através deste estudo, questionar se realmente houve permanências
relacionadas ao milho no que diz respeito ao plantio e uso desde época pré-hispânicas até os
dias de hoje, como um patrimônio. As razões do porquê do modo de vida mexicano que
envolve o sistema de produção do milho aliado às receitas foram consideradas patrimônio
cultural.
14

1- Teorias evolutivas e ancestralidade do milho

Através da “milpa”, denominada segundo o site do Governo do México1 como um


sistema agrícola milenar e tradicional caracterizado pelo poli cultivo, onde as plantas como
milho, feijão e abóbora (conhecida como a Tríade Mesoamericana) entre outras que crescem
de maneira natural são aproveitadas, o milho foi e continua sendo parte fundamental para as
culturas mesoamericanas e seu lugar de origem assim como sua evolução, após décadas de
estudos e debates ainda é um tema controverso. O milho foi uma das inúmeras plantas
domesticadas na Mesoamérica, entre elas a abóbora, o chile, a leucena e o abacate.
Depois das primeiras referências botânicas obtidas por Francisco Hernández,
médico, botânico e primeiro informante da planta até 1570, e da primeira difusão do milho na
Europa até o século XVI, os estudos sobre o milho e o teosinto 2continuaram até séculos mais
tarde. (SERRATOS, 2009).
José Antônio Hernandez Serratos (2009), investigador e acadêmico da
Universidade Autônoma do México, em sua obra “El origen y diversidad del maíz en el
continente Americano”, afirma que o milho não havia sofrido grande transformações
relevantes até o século XX, até o momento em que o teosinto (classificado na metade do
século XIX através de estudos taxonômicos realizados por Schrader como Euchlaena
mexicana) foi integrado ao mesmo gênero do milho: o Zea.
De acordo com Beadle (1978 apud SERRATO) a questão do teosinto como
ancestral do milho foi apontada em 1875 pelo botânico e etnógrafo alemão Paul Ascherson,
ou seja, ele já considerava que Euchlaena era, na realidade, do gênero Zea, mas para ele era
uma questão muito complicada explicar “como uma simples espiga de teosinto pode dar
origem e evoluir para a monstruosa espiga de milho, mesmo com a poderosa influência da
seleção humana.” (BEADLE, 1978 apud SERRATOS, 2009, p.5).
Segundo pesquisas, por não possuir folhas ao redor que segurasse os grãos, o
milho primitivo selvagem tinha sua dispersão facilitada, ao contrário do milho que se
domesticou, cujos grãos ficam presos dentro das grandes folhas verdes e que, por isso,
necessita da intervenção humana (BRAUDEL, 2005).

1
https://www.gob.mx/agricultura/articulos/milpa-el-corazon-de-la-agricultura-mexicana?idiom=es
2
Planta (Zea mays) da família das gramíneas, nativa do México e da América Central, cespitosa, de folhas
largas, cultivada por fornecer excelente forragem e pelas sementes comestíveis, altamente nutritivas. Disponível
em https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/teosinto/
15

No começo do século XX, antes das primeiras escavações arqueológicas


relacionadas ao milho, deram início aos estudos da genética celular tanto do milho como do
teosinto. Estes estudos acerca da citogenética e também as análises morfológicas deram
indícios da origem do milho ao permitir a reprodução de séries morfológicas que sugeriam um
caminho possível da evolução do teosinto até o milho. Com esses dados disponíveis, deu a
alguns investigadores como Beadle, um dos principais defensores do teosinto como o
antepassado do milho, bases para propor alguns dos possíveis passos evolutivos dessas duas
espécies (BEADLE, 1939 apud SERRATOS, 2009, pp. 5-6).
Ainda assim, apesar dos avanços obtidos através de tais pesquisas, para muitos
investigadores a falta de registros fósseis e a evidente diferença entre as plantas seguiam
sendo fatores que impediam uma explicação de fato satisfatória da origem do milho a partir
do teosinto.
Na década de 1930, na chamada teoria tripartite, Paul Mangelsdorf e R. Reeves
propuseram uma das hipóteses mais influentes sobre a origem do milho, e que descartava
totalmente o teosinto como seu ancestral (MANGELSDORF e REEVES, 1938 apud
SERRATOS, 2009, p.6).
De acordo com estudos de Mangelsdorf realizados anos mais tarde na análise
morfológica de restos de milho encontrados na Caverna do Morcego (Bat Cave,
Novo México, EUA), comparados com milhos mais recentes com características
primitivas (tunicado e palomero) e seus parentes silvestres: o teosinto e o tripsacum,
ele estabelece que o que deu origem ao milho foi um híbrido de uma espécie de
tripsacum com um milho silvestre do tipo tunicado já extinto.” (SERRATOS, 2009,
p.6). Tradução pessoal

“Ou seja, a mistura direta do Tripsacum ou a introgressão do germoplasma de


Tripsacum via teosinto ao milho deu origem a grande parte dos tipos modernos que existem
hoje na América.” (KATO, 2009, p.44). Tradução pessoal
Nos anos 1970 com o descobrimento do teosinto perenne, Mangelsdorf modifica
sua teoria e propõe que o milho teve origem a partir de um cruzamento entre o teosinto
perenne com um antigo milho tunicado-palomero. A teoria da origem do milho a partir de um
milho silvestre, atualmente extinto, teve distintas versões por várias décadas. Paralela a esta
teoria, a hipótese oposta do teosinto como o antepassado do milho seguiu presente
(SERRATOS, 2009).
A imagem abaixo mostra ilustrações que facilitam a compreensão desta teoria de
Mangelsdorf a partir de cada planta.
16

Figura 1 – Evolução do milho atual a partir de milhos primitivos: tunicado,


palomero e do tripsacum.

Fonte: http://www. greenpeace. org/mexico/global/mexico/report/2009/3/el-origen-yla-diversidad-del. pdf, 2009.

Algumas das objeções que se opõe a esta teoria é o fato de que um milho com
essas características não seria capaz de sobreviver na natureza. Uma das falhas da teoria
tripartite - e que inclusive foi rejeitada por um de seus autores anos mais tarde
(MANGELSDORF, 1974 apud KATO, 2009, p.45) - reside na afirmação de que o teosinto foi
originado da mistura entre um milho silvestre sem nós cromossômicos, com o Tripsacum que
possui muito deles. “Os híbridos de milho-Tripsacum conhecidos foram obtidos
artificialmente e apenas com o auxílio de técnicas especiais que fazem com que a ocorrência
natural dessa hibridização seja improvável.” (KATO, 2009, p.45).
Quem deu bases para a hipótese da evolução do milho a partir do teosinto
juntamente com a intervenção humana em sua domesticação foi George Beadle (1980 apud
SERRATOS, 2009), quem desde 1939 realizava estudos na área.
Nas décadas de 1970 e 1980 foram elaboradas e publicadas as evidências que o
autor recolhera até então.
Apesar das diferenças morfológicas, o milho e o teosinto possuem ambos origem
fértil e se cruzam de forma natural no campo além de que, segundo Beadle, o entrecruzamento
dos cromossomas dos híbridos é normal, razão pela qual se deduziu que existe uma relação
muito próxima entre ambos progenitores. Também, afirma-se que o teosinto é o antepassado
do milho pela sua capacidade de sobreviver de forma silvestre (não necessitando da
17

intervenção humana). Com essas evidências Beadle fundamentou o estudo da origem do


milho a partir do teosinto, no qual tem seguido não apenas seus alunos como os principais
centros de investigação a respeito do tema no Estados Unidos e América Latina (BEADLE,
1980 apud SERRATOS, 2009, p.7).
Outros estudos desde a citogenética realizados por Ángel Kato, em 1976, permitiram
identificar a variação e características de cada espécie, fato este que determinou que
o teosinto era o ancestral do milho. Tal investigação sustentava a ideia da evolução
progressiva do teosinto até o milho. (SERRATOS, 2009, p.7).

A imagem abaixo ilustra como seria a possível evolução de seu ancestral, teosinto,
até na grande espiga de milho atual.

Figura 2- Evolução do milho a partir do teosinto

Fonte: http://www. greenpeace. org/mexico/global/mexico/report/2009/3/el-origen-yla-diversidad-del. pdf, 2009.


Já nos anos 1990 parece haver um consenso entre a comunidade científica sobre a
supremacia da teoria do teosinto, no entanto, vez ou outra ressurgiam investigações a respeito
do suposto milho silvestre extinto. Essa foi uma época de grande avanço das novas técnicas
da biologia molecular, o que levaria a um estudo mais aprofundado sobre sua origem, em uma
escala evolutiva de milhões de anos. Esses estudos tem contribuído para explicar a evolução
de características importantes do milho e seus parentes silvestres e desde o final do século XX
e início do século XXI vem sido consolidado os estudos sobre a origem do milho com a ajuda
da biologia molecular; a determinação da estrutura e a origem da estrutura genômica (o
conjunto dos genes) que se alcançam com tais pesquisas tem sido um fator imprescindível
para entender sua evolução (SERRATOS, 2009).
18

1.1 Lugar de origem e domesticação do milho

Define-se como “centro de origem” de plantas cultivadas a uma zona geográfica


onde se encontra o máximo de diversidade do cultivo, na qual coexistem ou coexistiram seus
parentes silvestres.
De acordo com Serratos (2009) quem consolidou esse conceito foi
o geneticista russo do século XX, Nicolai Vavilov. É graças a seus estudos que se conhecem e
exploram as oito grandes regiões do mundo nas quais tiveram origem as plantas cultivadas.
Por “centro de origem” entendemos que se trata de áreas geográficas em que determinadas
plantas seguem sendo cultivadas, são associadas a grandes extensões de territórios e quando
os focos primários da origem dos cultivos se encontram nas regiões montanhosas
(SERRATOS, 2009).
Segundo Serratos, a origem do milho e cerca de 49 outras espécies se localiza
desde o centro-sul do México até a metade do território da América Central. Desde suas
primeiras explorações no México, para ele ficou evidente que Euchlaena, gênero que se
classificou o teosinto, era o parente silvestre mais próximo do milho (SERRATOS, 2009).
Com a ajuda dos avanços tecnológicos da biologia molecular pode-se conhecer a
escala evolutiva do milho na época cujas estruturas genômicas de organismos de plantas
ancestrais às famílias nas quais pertencem não só o milho e o teosinto como outros tipos de
vegetais tiveram suas bases formadas.
Também tem apresentado sobre certos mecanismos genéticos que poderiam estar
envolvidos na transformação específica do teosinto ao milho cerca de sete a nove mil anos,
data na qual supõe-se que tenha acontecido a domesticação (AUSTIN, 1990).
Embora pesquisas sobre o centro de origem e domesticação tenham contribuído
grandemente com informações cruciais, ainda carecem dados a respeito de aspectos básicos
de como e onde de desenvolveu esta planta. Em décadas de discussão, hipóteses antagônicas,
similares e mudanças nas ideias sobre o tema o único consenso que a comunidade científica
chegou foi que de fato o teosinto é o ancestral do milho (SERRATOS, 2009).
As escassas explorações paleontológicas e arqueológicas voltadas para o estudo
do milho na América tem dificultado a afirmação plena de qualquer teoria que seja.
Saber qual foi o mecanismo de domesticação é a chave para localizar o centro de
origem. Dado que não se pode separar os agricultores das diferentes culturas americanas do
processo de domesticação, e principalmente, da diversificação do milho tanto em épocas pré-
19

hispânicas como atualmente, desde o surgimento das discussões acerca do tema foi proposto
que os mecanismos empregados para domesticar estão intimamente ligados à agricultura e ao
trabalho humano (SERRATOS, 2009).
Resquícios de pólens foram encontrados em escavações arqueológicas, próximo à
Cidade do México, há mais de cinquenta metros de profundidade, o que leva a concluir que
esta planta, mesmo em modo selvagem e primitivo, existe na região há milhares de anos
(BRAUDEL, 2005).
Conforme Serratos (2009, p.12) “Os estudos sobre a domesticação do milho tem
gerado teorias antagônicas com relação ao centro de origem: a unicêntrica e a multicêntrica”.
Se tratando da unicêntrica, os defensores de dita teoria concluíram que todo milho
que conhecemos hoje teve surgimento num evento único de domesticação no sul do México
há nove mil anos. Foram identificados dois tipos de teosinto, sendo um o único progenitor do
milho e o outro como o contribuinte para a sua diversificação. Pelo fato de ambos se
encontrarem em uma limitada área que compreende a região do Balsas e no altiplano do
centro-sul do México, os que seguiam essa linha de pesquisa deduziram que poderia restringir
a área geográfica que foi o berço do milho (MATSUOKA et al., 2001 apud SERRATOS,
2009, p.12).
De acordo com o que Matsuoka e seu grupo de estudos (como Goodman,
Doebley, entre outros) afirmam, segundo os resultados de suas análises, as populações de
teosinto não mudaram desde a época da domesticação do milho até o presente, tanto em
termos genéticos, quanto em sua distribuição geográfica, isso significa que apenas o milho
experimentou mudanças evolutivas (MATSUOKA et al. 2002, apud KATO, 2009, p.60).
Algumas das objeções à estas conclusões sobre a teoria unicêntrica é que
justamente as duas espécies de milho e teosinto tiveram que adaptar-se com o passar do tempo
desde que ocorreu o processo que deu origem ao milho (KATO, 2009).
Tempos depois da chegada dos espanhóis ao continente americano, foi trazido
com eles diferentes animais domésticos como caprinos e bovinos. Crosby menciona o fato de
que tais gados fugiam do controle humano e se distribuíam amplamente a novos territórios
antes mesmo que os espanhóis (CROSBY, 1972 apud KATO, 2009, p.60).
Não se conhece quase nada sobre a intensidade com que o homem modificou o
ambiente em que vivia durante a época pré-colombiana para afirmar se foi possível uma
alteração na quantidade e distribuição do teosinto (HOLST et al. 2007 apud KATO, 2009, p.
60).
20

Enfocando na teoria multicêntrica é proposto que a origem e domesticação do


milho não ocorreu apenas em um local e tempo, mas que também pode ter ocorrido em vários
lugares e tempos, de tal forma que uma diferença de setecentos anos não é um problema se
estamos tratando de um período que compreende milhares de anos nesse processo. Por outro
lado, também é possível que no momento que a prática da agricultura já estava estabelecida
houve um intercâmbio entre diferentes locais de domesticação do milho (KATO, 2009).
Estudos morfológicos comparativos do milho, teosinto e hibrido de milho-teosinto
dão suporte à teoria da domesticação multicêntrica.
A teoria multicêntrica da origem do milho provavelmente é a única que parece
explicar adequadamente como se deu a evolução da sua grande variedade racial e sua
distribuição geográfica existente no México (MCCLINTOCK, 1978; MCCLINTOCK et al.
1981, KATO, 1984 apud KATO, 2009, p. 67).
Conforme afirma Kato (1984 apud SERRATOS 2009, p.10) conclui que a origem
do milho é fruto de várias populações de teosinto e, por isso, existem pelo menos quatro
centros de origem e domesticação do milho que se estende ao longo do México até a
Guatemala.
Ainda não é possível afirmar a supremacia de alguma das teorias da localização
do centro ou centros de origem e domesticação, porque este cenário ainda carece de registros
fósseis e arqueológicos suficientes. Ficam por resolver perguntas cruciais no que diz respeito
ao processo de domesticação e da definição uni ou multicêntrica da origem e diversidade do
milho.
Apesar de toda esta discussão ampla a respeito do teosinto e do milho, outras
ciências como arqueologia, biologia, precisam avançar nas pesquisas para também contribuir
com a história do milho. O fato é que algumas das teorias identificadas acima são
consideradas de relevância para o surgimento deste grão tão importante não apenas para a
Mesoamérica como para o mundo de maneira geral.
Falado a respeito da origem do milho e sua distribuição, entraremos no próximo
capítulo no mundo religioso e mítico no qual essa planta não só faz parte como é um dos
principais elementos cosmogônicos.
21

2- Cosmovisão mesoamericana acerca do milho

Sempre presente no cotidiano dos povos pré-colombianos, o milho não só serviu


de sustento, mas também como elemento sagrado e intrínseco nos ritos e mitos desses povos.
O milho é o grão identitário e multifacetário da Mesoamérica e além de ser a base
da alimentação desta região também tem cunho espiritual, econômico e político (RÚBIO,
VIZCARRA E ORTIZ, 2017).
Por meio da intervenção de indígenas que habitavam essa região, através de um
processo evolutivo conjunto, ele segue sendo uma das plantas cultivadas com maior
diversidade genética. O cultivo desse cereal deu suporte para as bases das civilizações que
floresceram na Mesoamérica (NUÑEZ, 2013).
Segundo (BRAUDEL, 2005), o milho, visto como uma planta miraculosa, se
“auto cultivava”; em terrenos áridos os indígenas alcançaram fazer seu plantio e todo o
processo de agricultura dessa planta só exigia, por ano, cerca de cinquenta dias de trabalho.
Além de todos estes fatores que contribuíram para o papel protagonico do milho,
seus grãos, para cada unidade, rendiam dezenas.
O milho é parte fundamental dos principais mitos que explicam fenômenos da
natureza como vento, chuva, germinação das sementes.
A respeito do milho foram escritas inúmeras histórias, contos, lendas e poesias, e
isso é realizado desde a ancestralidade indígena que vinha também acompanhado de cânticos
(RIVAS, 2021).
História, religião, cultura e a identidade do milho estão entrelaçadas em uma
harmonia que sustenta essa planta milenar que tem sido imprescindível no desenvolvimento
das culturas mesoamericanas.
Introduzir-se no mundo da religião da Mesoamérica não é tarefa fácil. É preciso
viajar a outras épocas, acercar-se de outra mentalidade e tentar compreender uma
visão de mundo diferente da que estamos acostumados. Para estudar este tema
contamos com importantes fontes de informação, porém, parte da documentação
escrita que nos é disponível passou pelo filtro do olhar ocidental de seus autores.
Além disso essa história também é transmitida através das imagens que eram
plasmadas em diversos suportes como por exemplo: o papel, o barro, os muros
pintados, em pedras, tecidos. (OLVERA, 2011, p. 186). Tradução pessoal

Os variados grupos mesoamericanos compartilham de uma mesma concepção da


vida, resultado de seus mitos, seus deuses, crenças, rituais e conceitos acerca do ser humano.
As divindades foram criadas frente a questões existenciais como de onde viemos, pra onde
vamos e quem somos, e também de constantes dúvidas a respeito da natureza, da chuva, do
22

vento, reprodução da flora e da fauna, que, carecendo de conhecimentos científicos, atribuíam


tudo isso a forças sobrenaturais.
A religião surge, então, como um recurso ideal para sanar no pensamento a
impotência do homem diante da natureza.
Não é de se estranhar então que as primeiras divindades sejam precisamente
objetos da natureza como rios, animais, árvores e plantas. Em diferentes modalidades todas as
religiões dizem sobre a relação da terra com o céu, entre o homem e os deuses; todas buscam
um meio de justificar a organização social de seu entorno e no Universo (NUÑEZ, 2011).
O fato de o milho tal qual conhecemos hoje não poder existir sem que o homem
intervisse fez com que historicamente fosse desenvolvida uma relação - principalmente
simbólica- entre seu cultivo e as comunidades indígena (RALLT, 2012).
O milho, sentli, jank’a o avati é um dos cultivos mais importantes na América Latina
desde o ponto de vista cultural, social, econômico e alimentício. Por ser um cultivo
sagrado, muitos povos americanos incorporam o milho em seus ritos e celebrações
agrícolas, através dos quais fortalecem os laços de solidariedade e reciprocidade no
interior das comunidades, reafirmam suas práticas agrícolas, criam biodiversidade e
realizam o Sumak Kawsay. Muitos dos rituais agrários estão relacionados com a
benção das sementes, do plantio, para atrair as chuvas, com a finalidade de obter
uma boa colheita. (RALLT, 2012, p.10). Tradução pessoal

As celebrações ligadas ao milho são inúmeras e seu calendário agro festivo está
relacionado intimamente com o ciclo do milho entre a cosmovisão mesoamericana. Sendo
assim, o milho está unido fatalmente às comunidades indígenas mesoamericanas.
Conforme Florescano (1999 apud RALLT 2012, p.14) a identificação da origem
do milho com a origem dos cosmos, o nascimento dos seres humanos e o começo da vida
civilizada, expressam a importância que estes povos atribuíram à domesticação desta planta.
“...o trabalho heroico dos agricultores que as conservam por seu valor
cosmogônico e cultural” (RALLT, 2012, p.14).
Ocupando importante lugar na cultura mesoamericana, não se pode negar que a
difusão do milho tenha sido o elo de união de grande parte dos povos indígenas da região. A
maneira como os agricultores manejam seu cultivo reflete características próprias da estrutura
social.

2.2 Simbologia do milho segundo algumas culturas mesoamericanas

A origem do deus do milho tem sido identificada como uma criação Olmeca, pois
diversas investigações sugerem que as primeiras representações das raízes, das folhas, das
23

florescências, o grão e a semente, a espiga ou a envoltura verde desta divindade foi a do deus
Olmeca do milho. Os olmecas floresceram entre 1.500 e 300 a.C. e desde esse tempo o deus
do milho adquiriu três características que perdurariam na civilização mesoamericana: sua
qualidade enquanto deus da fertilidade e criador do ordenamento dos cosmos e dos seres
humanos; seu caráter de símbolo da criatividade humana e sua associação com o governante,
quem desde então tomou para si as imagens e os atributos do deus (JORALEMON, 1971;
FLORESCANO, 2003 apud NUÑEZ, 2013).
Os olmecas foram os primeiros a representarem os deuses mediante imagens com
a que conceitualiza o milho, que representa uma Árvore Cósmica, rodeada de quatro grãos
que simbolizam as quatro direções do mundo. Nessa civilização as representações do deus do
milho são antropomorfas e incluem em seu corpo características vegetais ou zoomórficas.
Tanto nos campos de cultivo como nos templos e palácios e nos utensílios de
barro do cotidiano proliferaram as representações do deus do milho com diversos significados
que não necessariamente se contrapõe (NUÑEZ, 2013).
Segundo Abreu (1980 apud MAZÓN, 2012, p.6) a cosmologia Maya atribui a
origem do homem americano a uma massa de milho amarelo e branco com que se
conformaram os órgãos locomotores de criaturas dotadas de inteligência, as que constituíram
a cúspide de um árduo processo de criação que antecedeu numerosas tentativas falhas.
Em Memória do Fogo, o escritor Eduardo Galeano apresenta um relato indígena
pré-hispânico:
Os deuses fizeram de barro aos primeiros mayas-quichés. Pouco duraram.
Eram moles, sem força; se desmoronaram antes de caminhar.
Logo testaram com madeira. Os bonecos de pau falaram e andaram, mas eram
secos: não tinham sangue nem sustança, memória nem rumo. Não sabiam
falar com os deuses, ou não encontravam nada para dizer.
Então os deuses fizeram de milho às mães e aos pais. Com milho amarelo e
milho branco amassaram sua carne. As mulheres e os homens feitos de milho
eram parecidos com os deuses. Seu olhar se alcançava o mundo inteiro.
Os deuses sopraram sobre eles e deixaram seus olhos nublados para sempre,
porque não queriam que as pessoas vissem além do horizonte. (GALEANO,
1983, p.124).

Essa tradição vem revelar o habitante do novo mundo como o produtor de grãos de milho, já
que desde remotos tempos os indígenas recorreram ao milho em suas diferentes preparações,
como tortilha que acalma a fome e nutre, como o atole que acalma a sede, como pinole,
misturado com outros ingredientes ou como simples elote cozido ou assado, mas sempre
como admirável alimento para que o indivíduo sobreviva e se desenvolva (PAREDES-
LÓPEZ et al. 2000 apud LÓPEZ MAZÓN et al; 2012, p.6).
24

Se tratando dos governantes da sociedade Maia segundo Grube (2011 apud


LÓPEZ MAZÓN et al; 2012, p.7) afirma que os ciclos de vida, morte e renascimento, do deus
do milho foram considerados como o modelo paradigmático da vida de um ajaw (nome dado
ao governante e senhor da sociedade Maia). Nenhum outro deus possuía uma associação tão
forte com o poder real como aquele que representava a planta que constituiu o alimento mais
importante de todo o continente americano. É por isso que na arte Maia, os reis são
representados com o rosto imaculado do jovem deus do milho, mesmo que eles tivessem uma
idade mais avançada.
Esses mitos relatam como o milho era importante ao afirmar que com sua massa
se criou a o povo Maia, o que explica a existência de divindades vinculadas a ele. Para os
Maia de hoje o milho segue sendo uma planta sagrada, um presente dos deuses e o enxergam
com uma relação especial entre ele e as mulheres.
Seguindo pelo viés dessa forte relação que possui entre milho e o sagrado, é
evidente o papel fundamental que a mulher teve neste processo desde a seleção dos grãos nos
primórdios. Podemos citar o caso das mulheres matlatzincas.
A dimensão simbólica é enorme no que diz respeito às práticas de cultivo e
consumo do milho, razão para considerar a perspectiva das mulheres indígenas, porque além
de ser partícipe ativo dos trabalhos agrícolas também são elas que transformam o milho em
alimento (RINCÓN RUBIO et al; 2014).
Para os matlatzincas o milho servia como referência cósmica e vinculava os três
planos com os quatro cantos do Universo.
Conforme Rincón Rubio (2017, p.8)
A cosmovisão indígena matlatzinca tem uma estreita reação com os recursos
naturais, particularmente com os alimentícios. Dentro de tais alimentos, destaca a
presença do milho nativo, cujo processo produtivo se associa com um complexo
jogo de proximidades e distâncias entre as terras, a água e a presencia de sementes
de boa qualidade. Tradução pessoal

O milho nativo foi fundamental para a dispersão dos grãos e sua grande
diversidade; as mulheres foram ainda mais importantes dado que eram elas quem separavam
as melhores sementes, sabiam ao lado de quais plantas poderiam ser plantadas e quais não, e
principalmente, a relação simbólica que essas mulheres construíram durante todo o processo.
A autora continua:
A divinização feminina do milho, estabelece direções cosmológicas do tempo,
espaço e regeneração, mediante o estabelecimento de ciclos e repetições, onde a
alteridade é assumida mediante a experiência ritual. Essas práticas cumprem funções
essenciais na organização das comunidades e na conformação do espaço e do
território. Através da maduração do grão se estabelece o passo do tempo, as festas
25

agrícolas e a distribuição sazonal do trabalho. Este último relacionado a


subsistência, a qual tem um significado mais amplo que o de manutenção, abarca um
sentido de continuidade, no qual a mulher e o milho guardam um estreito vínculo.
(RINCÓN RUBIO et al; 2017, p.8). Tradução pessoal

Foram as mulheres quem, depois de um contínuo processo de experiências


acumuladas sobre o uso e transformação das plantas úteis, de aprender onde encontrá-las e de
experimentar como guardá-las, iniciaram os processos de domesticação.
O povo indígena mazateca, pertencente ao grupo dos Olmecas, que estão
localizados no noroeste do estado de Oaxaca, também possuía fortes vínculos com tal planta.
Segundo Barabas (2003 apud MARTÍNEZ VELÁSQUEZ, 2019, p.13) para
os mazatecos que habitam a parte alta da Sierra Madre Oriental no estado de Oaxaca, tudo o
que concerne a sua origem e desenvolvimento histórico está profundamente integrado à sua
cosmovisão e refletido nas relações, nas contradições e no equilíbrio de forças nas quais dão
ordem e sentido à vida.
A sua cultura está intimamente ligada ao seu território e suas atividades agrícolas
e especificamente em relação à semeadura do milho a partir da milpa, baseadas na ideia de
homem-milho-natureza como parte de seu desenvolvimento histórico, enfatizando o fato de
que sem o milho não haveria mazatecos e sem os mazatecos para semear, não haveria milho
(MARTÍNEZ VELÁSQUEZ, 2019).
Mexicas e Maias, bem como outros povos da Mesoamérica, fizeram o cultivo da
terra com ênfase no milho. Segundo historiadores, a vida desses povos girou em torno
da milpa, pois nenhuma civilização dependeu tanto do milho quanto essas. Os pipiles, (que
falavam o idioma Nahuátl) por exemplo, consideravam que existiam quatro colunas que
sustentavam a filosofia indígena sobre as coisas que os rodeavam: a fruta do campo, que se
convertia em sua carne e seu sangue; a terra, da qual extraem a fruta; a água, sem a qual nada
pode crescer; e os astros, que são os que imperam sobre todas as coisas (RIVAS, 2020).
O homem deu ao milho um papel único e protagonista na maioria dos relatos
míticos, pretendendo explicar adequadamente a perguntas fundamentais. As manifestações do
deus mesoamericano em sua grande maioria relatam as diferentes fases de cultivo, desde a
preparação do terreno, passando pela semeadura, o percurso da semente enquanto está dentro
da terra, a maduração da planta até a colheita.
Nos códices encontramos a existência de um deus mesoamericano do milho de
maneira constante. Suas características se encontram na cabeça e consistiam em elementos
tais como representações de espigas, grãos vou folhas de tal planta.
26

Durante muito séculos as técnicas de cultivo do milho sofreram transformações diante


da constante evolução dos povos mesoamericanos, pois junto com ela adquiriam novas
características socioculturais, econômicas e políticas. O árduo e complexo trabalho realizado
pelos coletores iniciais e cultivadores para transformar seu entorno natural e modificar a
planta do milho tem sido uma verdadeira façanha biológica e agrícola, foi compreendida e
sacralizada na Mesoamérica na figura carismática do deus do milho (FLORESCANO, 2003
apud NUÑEZ, 2013).
O cultivo do milho é tão identitário que permite que cada região ou povoado o
inclua como parte de sua própria existência, até o ponto de construir uma cosmovisão segundo
suas crenças. As populações indígenas da Mesoamérica, especialmente mayas, mexicas,
chibchas e quéchuas cultivavam o milho de forma intensiva, principalmente nos vales. Pelas
evidências destacadas este produto constituiu a força dinâmica de seu desenvolvimento. Por
isso, desde a origem de seu cultivo o milho tem sido utilizado na preparação de tortilhas,
trabalho que através de milhares de anos se manteve quase inalterável. Finalmente, com o
milho se criou cultura, identidade e, também, criou uma relação muito própria da região, tanto
que tal cultura é conhecida como “A cultura do milho” (RIVAS, 2021).
Os ritos e simbolismos do milho para todos os grupos mesoamericanos são muito
ricos culturalmente, são elementos que dão a grandeza não só ao povo mexicano mas também
de outros povos da Mesoamérica. Através dele os diversos grupos sociais reiteram e
reafirmam sua identidade e existência. Esses elementos permitem transmitir valores familiares
e de trabalho. Em alguns rituais se constrói uma visão unitária entre o homem, trabalho,
natureza e o sagrado.
Finalmente, em âmbito simbólico se conformou uma mitologia de grande riqueza,
inumeráveis metáforas e representações, as quais deram origem a uma cosmovisão que
chegaram a compartilhar todos os povos mesoamericanos e que mantem sua ressonância até
os dias de hoje (CARRILLO TRUEBA, 2009).
27

3- Alguns povos que antecederam os mexicas

Ao tratarmos do povo mexica, uma das civilizações pré-colombianas mais


conhecidas e estudadas, imediatamente nos vem à lembrança uma sociedade altamente
organizada e minuciosamente hierarquizada, com influências que irradiavam em grande parte
do território mexicano.
Mas nem sempre foi assim. Os mexicas chegaram ao Vale do México
tardiamente, no século XIII, e foram por longo período de tempo considerados intrusos e sem
terras; sua ascensão custaria para chegar (SOUSTELLE, 1987).
Para entender a sua trajetória desde Aztlán, a terra mítica que parece ser de onde
vieram, até o México central, onde fixaram e se expandiram, é necessário olharmos para seus
antepassados e suas origens.
Com a ajuda da arqueologia, os restos humanos mais
antigos foram encontrados nessa região há mais de
9.000 a.C., próximo à Cidade do México. Durante
séculos grupos de caçadores e coletores mantiveram o
estilo de vida nômade, nas cavernas. Foi necessário três
ou quatro mil anos para que o processo que resultaria na
agricultura tivesse início, em torno de 5.000 a.C.
(BETTEL, 1990, p.4). Tradução pessoal

Descobertas feitas em algumas covas no interior da serra de Tamaulipas e em


Cozcatlán, Puebla, mostram como, pouco a pouco, os primeiros coletores iniciaram o cultivo
da abóbora, do chile, do feijão e do milho (BETTEL, 1990).
Em seu livro intitulado “Armas, germes e aço”, o autor Jared Diamond reserva um
capítulo para tratar dos grandes centros de domesticação das plantas, incluindo o milho; ele
faz conexões entre Velho e Novo Mundos através dos centros de cultivo (DIAMOND, 2018).
Retirada deste livro, a tabela abaixo nos apresenta diversos sítios agrícolas, com
culturas diferentes de animais e plantas, datados da primeira comprovação de domesticação.
Com essa imagem podemos perceber que o milho na Mesoamérica, junto com o feijão e a
abóbora, está presente desde muito tempo, o que corrobora as fontes históricas disponíveis de
que a região ameríndia seria o centro de origem de tal planta.
28

Tabela 1- Centro de cultivo e domesticação de plantas.

Fonte: JARED, D. Armas, germes e aço: os destinos das sociedades humanas. Trad. Silvia de Souza Costa;
Cynthia Cortes; Paulo Soares. Rio de Janeiro: Editora Record, 2018

Com o advento da agricultura despontando, começam a surgir gradativamente as


aldeias e essas, dependendo da fertilidade do solo onde estão e também da proximidade ao
mar e à rios, experimentaram um rápido crescimento. Com o passar do tempo essas aldeias
foram apresentando diferenças notáveis entre si, no que diz respeito às questões étnicas e
linguísticas; entre todos os grupos emergentes, um ganhou seu destaque (BETTEL, 1990).
Considerado os precursores das maiores civilizações da Mesoamérica, os
Olmecas- localizados no litoral do golfo do México, nos atuais estados de Tabasco e
Veracruz- podem ser considerados a ligação entre o período pré-clássico e o clássico,
respectivamente o da aldeia e o da civilização.
Este povo exerceu grande influência por uma vasta área do México; com suas estelas
esculpidas, suas pirâmides, seu interesse pela jade, o baixo relevo e também a escrita
hieroglífica, constituíam marcas que seriam essenciais à todas as altas civilizações do México
(SOUSTELLE, 1987).
Esse povo foram os primeiros a construírem grandes edifícios, incluso destinado à
adoração de deuses. Também foi com eles que se inicia o costume arquitetônico das grandes
29

praças para as cerimônias ao ar livre. Outra característica que seria intrínseca aos povos
sucessores é o gosto pelas plumas e pedras preciosas como a jade (BETHELL, 1990).
Entrando na época clássica, quatro grandes centros culturais eram considerados os
principais: os Maias, os Zapotecas, o território de El Tajín e Teotihuácan, e ainda que
tivessem obstáculos importantes entre si como a longa distância e a imprevisibilidade da
natureza, certamente tiveram contatos e relações; prova disso são algumas características
arquitetônicas em comum, bem como objetos, ideias e ritos (SOUSTELLE, 1987).
Os mexicas herdaram as instituições culturais não só dos toltecas, como também
dos teotihuacanos (PORTILLA, 1985).
“Em decorrência de fenômenos econômicos e sociais ainda obscuros, as grandes
cidades clássicas foram pouco a pouco sendo abandonadas entre os séculos IX e XI”
(SOUSTELLE, 1987, p.11). Tradução pessoal
Vindos do Norte e falantes da língua nahuatl, os Toltecas em 856 d.C. fundaram
sua cidade, Tula, e muito provavelmente passaram longo tempo ainda com o modo de vida
nômade e caçador, aceitando a hegemonia sacerdotal de Teotihuacan (SOUSTELLE, 1987).
Um dos principais deuses da cultura teotihuacana – e por tanto de várias outras
culturas remanescentes do México Centra- era a Serpente Emplumada, de nome
“Quetzalcoátl”, cuja língua era uma bem distinta do náhuatl e cuja religião não permitia
sacrifícios humanos.
No século XVI essa divindade deu lugar a diferentes interpretações e seus
significados simbólicos poderiam ser diferentes ou ressignificados (AUSTIN, 1990).
Assim como o povo Tolteca, vários outros grupos começaram a migrar com maior
frequência para o Vale do México, o que faria com que eles levassem traços de sua cultura e
religião e, consequentemente, adotassem às do lugar no qual se fixavam.
A sociedade Tolteca começou de fato seu desenvolvimento no século XI e se
irradiou por vários territórios do México como Michoacán, Oaxaca e Yucatán; este último
sendo muito importante pois possibilitou a sociedade Maia, praticamente esgotada, de se
revigorar (SOUSTELLE, 1987).
Apesar da queda de sua principal cidade, Tula, manteve-se através das gerações a
língua e os costumes desse povo. Os rumores de sua decadência impactaram o mundo ao seu
redor e a notícia viajou de grupo em grupo até Aztlán, onde diversas tribos nômades iniciaram
sua migração para o sul.

3.1 Aztlán e história do povo mexica


30

Ao estudarmos a história da sociedade mexica sempre nos deparamos com uma


lacuna a ser preenchida: seu lugar de origem, Aztlán.
Há décadas tentam explicar a terra lendária da qual teriam vindo o povo mexica
e duas vertentes a respeito de sua migração são propostas, a interpretação histórica e a
interpretação mítica.
Enquanto a primeira trabalha com as narrações sobre a travessia mexica como, de
fato, uma fonte histórica- na qual existem fatos ou não, sujeitos à analise- a segunda é uma
explicação mítica, onde tentam entende-la como textos míticos cheios de simbologia.
Portanto, não tem o intuito de assegurar de que realmente aconteceu a migração do Norte até
o Vale do México, mas sim pretendem aprofundar e decifrar os significados simbólicos dos
personagens, dos lugares e acontecimentos relatados (NAVARRETE, 1999).
Localizado segundo a tradição nativa em um lugar à noroeste do atual país, que
pode ter se situado tanto em um ponto entre o Texas e o México, como também próximo à
Cidade do México.
Essas duas concepções não só são totalmente opostas em suas conclusões, como
também realizam a leitura das fontes mexicas de forma distinta.
Se a interpretação histórica fosse tomada como a correta, então os mexicas
estavam sempre buscando, durante sua travessia, a lugares parecidos com Aztlán; os dois
locais, portanto, estariam separados não só pelo tempo, mas principalmente pelo espaço. E,
supondo que a explicação mítica tivesse vantagem, então México-Tenochtitlán e Aztlán
seriam uma mesma coisa, separados apenas pelo tempo. Assim, inverte a relação entre ambas
cidades, onde Aztlán é que teria que se parecer com México-Tenochtitlán para assim seguir o
costume intrínseco nesse povo de legitimar a posso territorial do local (NAVARRETE, 1999).
As fontes contidas no Códice Botuniri segundo que, segundo o narrado pelo autor,
o deus Huitzilopochtli ordena aos sacerdotes-adivinhas que os habitantes de Aztlán deixem
sua terra para partirem em busca de uma nova, onde o sinal de que seria a terra correta era
uma águia pousada sobre um cacto-nopal com um pássaro na boca (JOHANSSON, 2016).
Também conhecido como “Tira de la Peregrinación”, este códice é uma das
principais fontes para conhecermos a história da migração mexica, onde podemos encontrar
registros de eventos relatados através de datas, lugares e pictogramas. Segundo se sabe, a
travessia durou aproximadamente cento e noventa anos.3

3
https://mediateca.inah.gob.mx/repositorio/islandora/object/codice%3A605
31

Sendo assim, o povo mexica desde que eram nômades em Aztlán, até sua chegada
e desenvolvimento no Vale do México, provavelmente permaneceu séculos sem ter
conhecimentos das civilizações do Planalto central e vice-versa.
Não se deve pensar sua peregrinação como algo contínuo, uma vez que sempre
que encontravam uma região propícia para se instalarem o faziam e ali permaneciam por
algum tempo, “ora guerreando, ora entrando em contato com as populações civilizadas,
rapidamente assimilam (...) técnicas sobretudo referentes à agricultura do milho, como
também costumes e rituais” (SOUSTELLE, 1987, p.14).
Por sua rápida capacidade de adaptação, esse povo deu um salto no que diz
respeito aos aspectos culturais; ao se aproximarem do Vale do México, as tribos que
chegavam adotaram elementos como a língua e técnicas de agricultura e consequentemente
sedentarismo. No final do século XIII os chichimecas (nômades vindos de Aztlán) já haviam
abandonado o modo de vida das cavernas para começarem a construir vilas que viriam a ser
imponentes cidades.
O cotidiano desses vários povos e culturas mescladas eram bem turbulento uma
vez que estavam sempre fazendo a manutenção de alianças e guerreando para alcançar a
hegemonia de seu próprio grupo.
O primeiro importante governador que daria início a nobreza mexica era
descendentes dos toltecas, os povos desse período sabiam que tudo que era ligado a grande
era de ouro, em Tula, trazia prestígio e era associado a poder (BETHELL, 1990).
Até que se tornassem a grande e influente civilização mexica tal como
conhecemos, essa sociedade teve que passar por diversos percalços.
Como qualquer grupo que deseja submeter a outros e ter seu próprio governante,
os mexicas entraram em conflito com as soberanias vizinhas e, como consequência, foram
expulsos e exilados em Tizapán, para depois terminarem se fixando em uma zona pantanosa a
oeste do grande lago. Este lugar seria onde o grupo deveria se instalar, segundo a tradição,
quando o deus Huitzilopochtli fez uma revelação ao sacerdote e lhe contou sobre a águia por
cima de um cacto-nopal (SOUSTELLE, 1987).
Quando se instalaram no Vale do México, a organização do grupo era igualitária e
guerreira, onde os únicos que o povo respeitava eram os sacerdotes, que por sua vez também
eram guerreiros. Este grupo que a princípio era homogêneo, logo se transformaria em uma
sociedade rigidamente hierarquizada e bem organizada, cada qual com sua função.
No século XX estudiosos que revisaram algumas fontes indígenas a respeito das
relações sociais, concluíram que os macehualtin (homens do povo) se agrupavam nos capulli
32

de acordo com grau de parentesco e que o lugar que ocupava era tão exorbitantemente distinto
do da classe governante (pipiltin) que se deve reconhecer a existência de classes sociais; além
disso, o fato de possuírem um estado onde a palavra dos que governam prevalece e é
reconhecida, faz com que houvesse também uma minuciosa organização política (BETHELL,
1990).
A sociedade mexica era dividida principalmente entre os escravos, os cidadãos
comuns, os pequenos artesãos, os grandes comerciantes, os sacerdotes e os dignitários.
Começando pela estratificação mais baixa estavam os escravos, que poderiam o
ser por dívidas, prisioneiros de guerra, para servir de oferenda em sacrifício aos deuses, etc.
Embora pertencessem a um senhor, o escravo neste contexto não se assemelha aos exemplos
habituais nos quais estamos acostumados como no caso da antiguidade clássica greco-romana
e também o de africanos escravizados.
Ele era tratado como qualquer homem do povo: lhes davam de comer, de vestir e
um lugar digno para viverem, além das possibilidades de libertação que eram inúmeras. Os
mexicas tivera, inclusive, um deus que protegia os escravos: Tezcatlipoca, o Espelho
Fumegante, que era um deus onipresente e onipotente, o deus do céu noturno e da memória
que os acompanhava desde Aztlán, e que castigava quem os maltratasse (SOUSTELLE,
1987).
Se tratando do cidadão comum nesta sociedade, sua tarefa primordial era servir
como soldado em guerras e para afins militares, e também prestar o trabalho coletivo os quais
eram subordinados para o “Estado”. Os chamados na língua nahuátl de macehuáltin, poderia
ascender através da carreira militar e também religiosa- esta última estendida até as mulheres.
Além disso, os cidadãos comuns também poderiam exercer atividades
administrativas como escribas e também outras como a pesca, a caça, a carpintaria, tecelagem,
etc (SOUSTELLE, 1987).
Os ourives, joalheiros, os que praticavam a cinzelagem e o mosaico de plumas e
os demais artesãos costumavam passar seus saberes de geração em geração e assim manter a
façanha na família. Eles possuíam seus próprios bairros e seus próprios deuses e ritos de
acordo com a atividade que trabalhavam.
Acima dos artesãos estavam os grandes comerciantes, aqueles que detinham a
fortuna e o luxo, comercializando produtos valiosos do estrangeiro.
“...a mercadoria deles, então, eram plumas de papagaio, umas coloridas que se
chamavam quetzalli (...) e as pedras turquesas (...) e também mantas de algodão.”
(SAHAGUN, 1989, p. 489). Tradução pessoal
33

Sua posição social, embora claramente ascendente, ainda estava entre o povo e
classe dirigente.
As duas últimas classes sociais eram as mais importantes, dado que ambas
dirigiam a sociedade.
Os dignitários, título que recebiam por suas altas funções militares ou civis, eram
isentos de impostos, recebiam do governo vastos territórios de terra e, segundo seu escalão era
beneficiado com tributos em forma de joias, vestimentas e plumas.
Peça importante do mundo mexica, os sacerdotes também tinham sua própria
hierarquia e, embora a sociedade fosse repleta de religião, não era uma teocracia. Ainda é
nebuloso o processo de designação dos sacerdotes. Eles tinham, como os dignitários,
representação no grande conselho e no colégio eleitoral que designava o chefe máximo da
sociedade (SOUSTELLE, 1987).
No mais alto cume estava o “imperador” e abaixo dele o “vice-imperador”, onde o
segundo tinha quase o mesmo poder que o primeiro.
Como todos os indígenas que praticaram a agricultura no México, os Astecas, ao
se tornarem sedentários, alimentavam-se essencialmente de milho (em cozidos, bolos, ou
pequenos pãezinhos a vapor, os tamalli) ...”
Os tamales, prato culinário de origem mexica e um dos mais consumidos ainda
hoje no México, parecidos com a nossa pamonha, eram feitos à base de massa de milho que
podiam ser cozidas a vapor ou fervida. Em todas as inúmeras cerimônias que o povo mexica
realizava, os tamales eram diferentes e especiais para cada ocasião, além de serem
consumidos também no dia a dia daquele povo (MELGAREJO, 2006).
Considerado pelos mexicas como um dos produtos mais valiosos proporcionados
pela terra, sabemos que o milho faz parte da cosmovisão desse povo repleta de associações de
aspectos da vida cotidiana com elementos culturais, alimentícios e religiosos.
Os mexica associavam cada tipo de milho à um deus, sendo o principal Centéotl
que possuía seu lado feminino: Chicomecoátl (milho maduro) e Xilonen (milho jovem).
As etapas do milho eram de tamanha importância que esse povo as associava com
as etapas da própria vida.
Eles dedicavam três meses do ano para o culto do milho, ainda que nos outros
meses do ano ele também tivesse papel fundamental. O povo mexica usava as cerimônias que
envolviam o milho para a colheita e também para o nascimento de pessoas (RALLT, 2012).
Como se sabe, do milho surge uma série de comidas que permitiram alimentar aos
povos que o cultivaram. Por exemplo, as tortilhas recheadas da época pré-hispânica
34

estavam ‘desenhadas’ para servirem como alimento de viagem. Um uso similar ao


das atuais pupusas. A primeira descrição das tortilhas é dos primeiros anos da
conquista espanhola, no século XVI, mas não se refere a nenhum nome em
particular.
Outros derivados do milho naqueles tempos eram o atole e o chilate, que formaram
parte da gastronomia dos indígenas, mas que sofreram alterações com a chegada dos
espanhóis. (RIVAS, 2021, p.46) Tradução pessoal

Além da alimentação, o milho também foi eternizado como pinturas em barro,


esculturas em barro, muros pintados e até pedras.
Esta planta servia de inspiração para as mais diversas artes, muitas delas que
sobreviveram através da arqueologia até nossos dias; como o milho estava presente em todos
os aspectos do cotidiano é de se esperar que ele seja representado nas mais diversas formas.
Outro exemplo fundamental da incorporação do milho pelo povo mexica é a
relação da guerra e de seus atores com sua regeneração. “Aprofunda a relação que, de acordo
com os mexicas, existia entre a agricultura e a guerra” (OLVERA, 2011, p.187).
O principal ato dessa celebração consistia no esfolamento dos guerreiros mais
notáveis e coincidia com os processos da época de chuva, semeadura e desenvolvimento do
milho. Sendo assim, fica nítida a relação entre o milho e os guerreiros, já que ambos eram
esfolados, desmembrados e depois comidos (OLVERA, 2011).
Frei Bernardino de Sahagún, um monge franciscano que chegou no México no
século XVI, compilou em sua grande obra “Historia General de las cosas de Nueva España”,
muitos relatos e reflexões onde notamos claramente a presença do milho em todos os âmbitos
naquela sociedade.
Ele ainda escreve em sua obra que em oferenda a um dos deuses mexicas, eles
semeavam um tipo de milho tostado, no qual os espanhóis desconheciam e que seria nossa
pipoca.
O milho permitiu que as sociedades pré-hispânicas avançassem de forma incrível,
dado suas técnicas de preparo, como por exemplo a nixtamalização, que se trata de um
processo que os povos pré-colombianos inventaram para que o milho ficasse mais digerível e
nutritivo; consiste em ferver os grãos do milho com um pouco de cal. (TORRES, 2007).
Os artefatos usados na antiguidade para a preparação do milho ainda se vê
presente em diversas famílias campesinas no México.
As tradições e a religiosidade do homem pré-colombiano em relação com sua
terra, seus deuses, seu milho, continuam vigentes, ainda que tenham incorporado novas
35

crenças. O sincretismo não eliminou a cultura desses indígenas, mas sim, fez com que ela
sobrevivesse até os tempos atuais.

3.2 Ancestralidade do milho e suas permanências como patrimônio

Depois da enorme distribuição do milho dentro da própria Mesoamérica, com a


chegada dos espanhóis ele foi dispersado no resto do mundo.
As viagens para a dispersão do milho levam centenas e até milhares de anos, até
que um grupo leve a outro e comecem a naturalizar seu cultivo. Depois de ser levado do
Velho ao Novo Mundo, só se torna verdadeiramente conhecido e utilizado em maior escala a
partir do século XVIII. (BRAUDEL, 2005).
No México, onde acredita-se ser o berço do milho, fez com que este agregasse nos
saberes e fazeres, tornando-se patrimônio cultural, resultado de milhares de anos presente no
cotidiano.
Patrimônio cultural4 são todos aqueles bens materiais e também imateriais, como
manifestações populares, que possuem valor identitário e histórico para um certo grupo de
pessoas e que envolve saberes e práticas que são perpassados através das gerações.
O patrimônio imaterial é a soma de fazeres que se tornam identitários pela cultura,
isso inclui celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas, musicais e até mesmo lugares
como feiras de artesanatos e mercados populares.
Segundo afirma (KATO et al, 2010) não reconhecer e proteger sua importância
tanto alimentícia como cosmogônica seria trair toda a ancestralidade bem como se mostrar
totalmente irresponsável com as próximas gerações.
De acordo com uma análise feita pela Comissão de Agricultura e Pecuária, no que
concerne a alguns dos requisitos para que o milho pudesse entrar na lista de possíveis
candidatos a Patrimônio da Humanidade, fica claro que ele cumpre todos os requisitos.
Alguns dos exemplos são: estar diretamente relacionado com tradições e crenças, ser
exemplos de processos ecológicos e biológicos, ser testemunha de uma cultura ou civilização
existente ou já desaparecida. (KATO et al, 2010).
Em 2010, a culinária mexicana abarcou consigo o milho e diversas receitas que
incluem prática agrícolas e técnicas milenares, como a nixtamalização ao ser incluída como
Patrimônio Cultural.5

4
http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/234
36

Não só o fato de ser o sustento, mas a riqueza simbólica do milho, desde seu
plantio até seu consumo, os ritos e mitos relacionados, as relações sociais ao redor da
alimentação até nos dias de hoje faz com que não se possa contar a história do país sem
mencioná-lo.
Hoje, ainda milhões de campesinos ainda preservam não só a diversidade como as
técnicas milenares de preparo. (VARGAS, 2013).
Não é por acaso que no México a cultura é conhecida como “A cultura do
milho”.
Segundo Neurath (2009 apud NUÑEZ 2013) o milho não é simplesmente um
alimento, o humano criou uma relação especial com tal planta. Sendo assim, com as
constantes mudanças climáticas somada às técnicas industriais de mutação genética do milho
faz com que perca não só sua diversidade, mas a simbologia que o envolve ao não mais
reproduzir as etapas ancestrais de preparação.
O milho proporciona a base fundamental para pratos regionais, estacionais e que
carrega consigo as tradições cerimoniais que perigam serem extintas se não voltamos a
requerida preocupação que o tema demanda.
“Romper os vínculos estabelecidos com as entidades sobrenaturais e os sistemas
normativos da cultura pode gerar uma série de consequências não só na produção do milho,
como também da saúde e entre a comunidade.” 6
Assim como foram as mulheres que, com seus saberes e experimentos,
alcançaram domesticar o milho, ainda hoje em comunidades são as mesmas que tem papel
fundamental para a preservação de técnicas e diversidade. (RUBIO, ANO).
É perceptível que o milho está intimamente relacionado com a identidade
indígena.
Uma vez que se deu o contato entre Velho e Novo mundo, Colombo levou as
primeiras sementes de milho à Espanha, tal como os portugueses o levaram para a África e
China. (VARGAS, 2013).
No Velho mundo, o milho foi recebido como um produto novo e exótico, cuja
origem era desconhecida, e por isso eles atribuíram a planta como nativa da Turquia.
Provavelmente, sustentado por fontes históricas, o milho só chegou ao Velho mundo após as
viagens de Colombo. As vias, uma que contornavam a África e a outra que passava pelo

5
https://www.gob.mx/sectur/prensa/celebra-la-gastronomia-mexicana-diez-anos-de-ser-patrimonio-inmaterial-
de-la-humanidad-257259?idiom=es
6
BRODA, Johanna. Ritos y deidades Del ciclo agrícola. Arqueologia Mexicana, num 120, p. 54-61. Disponível
em www.arqueologiamexicana.mx, Acesso em 7 out. 2021
37

México, garantiram uma intensa troca com a Ásia e facilitava a difusão de muitos produtos,
principalmente o milho. (VARGAS, 2013).
Não cabe dúvidas de que a cultura de cada povo desempenha papel importante na
adaptação dos humanos ao seu redor. Prova disso é que por mais que o milho tenha se
dispersado ao redor de todo o mundo, as técnicas culinárias e também de preparo varia de
acordo com o ambiente; exemplo disso é a nixtamalização que se restringiu à Mesoamérica.
Em todo caso, no século XV, quando se formaram as civilizações asteca e inca, já há
muito o milho estava presente no espaço americano, associado à mandioca, no leste
da América do Sul; ou sozinho e submetido ao regime de sequeiro; ou sozinho nos
terraços irrigados do Peru e nas margens dos lagos mexicanos. (BRAUDEL, 2005,
p.140)

Conhecidos por diferentes nomes e distintas funções conforma o lugar, o milho


foi levado não só a América Latina, mas também a Ásia, África e Europa.
A maneira que a população de hoje encontra para se unir com essas raízes do
passo é justamente na alimentação e em suas festas. Estas, mescladas com outras culturas,
formam todo o imaginário nacional com suas raízes em tempos remotos. (MEJÍA, 2014)
Possuindo no México um valor econômico, social e cultural, os produtos à base de
milho seguem fazendo parte da dieta dentro dos lares mexicanos, sejam eles abastados ou
carentes.
38

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer deste trabalho percorremos toda a trajetória da história alimentícia,


social e cultura do milho na Mesoamérica.
Desde as pesquisas a respeito de sua origem como uma planta selvagem e suas
relações com o teosinto, até o processo que levou a domesticação e diversificação, o milho
esteve presente todo o tempo nos saberes e fazeres do cotidiano. Intrínseco nos ritos, na
religião e na culinária é fato que este grão fez história junto aos grupos que sempre o levou
consigo. Sua ancestralidade perpassa a história desses povos que o inseriram em sua vida
como um elemento fundamental para a manutenção da existência.
Conclui-se que o milho foi fundamental para a construção da identidade dos
povos mesoamericanos e que ainda reverbera em vários aspectos socioculturais do México.
As permanências dessa planta tão antiga é um fato na sociedade de hoje, tanto que foi
reconhecida como Patrimônio Cultural do país.
Este trabalho não é, de forma alguma, uma conclusão pronta, mas sim um impulso
como tantos outros existentes para dar continuidade à essa discussão que diz respeito
diretamente à cultura identitária de um povo através de um alimento.
O milho esteve presente na gastronomia, em cânticos, hinos, poemas, orações e
tem se transformado biológica e culturalmente de geração a geração há séculos.
39

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