O Primeiro Soar Da Trombeta - John Knox

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O Presbiteriano, 2020

Título Original: The First Blast of the Trumpet


Against the Monstrous Regiment of Women, 1558.
Tradução: Rodrigo Varoni
A equipe autoriza e incentiva o
compartilhamento gratuito deste livro, sendo
vendas proibidas sem a nossa devida
autorização. Para acesso ao material gratuito e a
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PREFÁCIO DO EDITOR

O livro que você tem em mãos é uma das obras


mais polêmicas uma vez escritas pelos
reformadores. Trata-se de uma grande defesa da
ordem prescrita por Deus quanto à autoridade.
John Knox, o grande reformador escocês, vai
contra um costume muito frequente em sua
época: a designação de mulheres para o
regimento de nações por meio de herança.
Poucas pessoas de nossa sociedade atual
tiveram acesso a este material, julgando Knox
como um dos mais misóginos religiosos que já
esteve à frente da igreja, mas, de certo, nunca
houve uma verdadeira busca para entender qual
era a posição genuína do reformador. O
interessante é que Knox ressalta o quanto seu
posicionamento já era antiquado para sua
própria época, escrevendo que sabia que os
homens não aceitariam seu discurso, uma vez
que ―é difícil e perigoso falar contra um erro
comum, especialmente quando as mentes
ambiciosas de homens e mulheres são chamadas
à obediência ao simples mandamento de Deus.
Pois, para a maior parte dos homens, lícita e
piedosa parece ser qualquer antiguidade que
tenham recebido‖.
Em nossa presente era, não só é comum
mulheres se levantarem em posição de
autoridade, mas até mesmo ―pastoras‖ têm sido
ordenadas nas mais diversas igrejas, até mesmo
nas que se dizem reformadas. Knox, a voz que
clama no deserto, estaria surpreso ao
contemplar o lugar aonde chegamos assim como
aponta que homens como Tertuliano,
Crisóstomo e Agostinho estariam surpresos se
contemplassem sua própria época.
O Primeiro Soar da Trombeta é uma obra de
nome sugestivo. Segundo Knox, a verdade tem
uma propriedade peculiar: ―em um momento
ou em outro ela obterá para si mesma a
audiência‖. Como um aroma forte que não pode
ser escondido, como uma trombeta que não
considera seus adversários, a verdade soará. Seu
intuito, então, é soar a primeira trombeta, ainda
que seus adversários sejam muito maiores que
ele.
Não obstante, é importante explicar
alguns aspectos da obra. O contexto geral dos
reformadores sempre foi específico: além de
citarem as Escrituras para comprovarem seus
posicionamentos, eles também se preocupavam
em ter os pais da igreja ao seu lado. Foi assim
com Calvino, em suas Institutas e comentários;
era preciso mostrar que os mais piedosos pais
da igreja também sustentavam esse testemunho.
Por isso, Knox cita fontes clássicas e patrísticas
em seu tratado sobre o regimento das mulheres,
os quais são muitas vezes ásperos e fortes para
um leitor sensível ou impressionável. Nunca
saberemos, no entanto, qual é o real
posicionamento de Knox quanto a tais citações
da antiguidade clássica, do direito romano e da
opinião dos pais da igreja, uma vez que seu
intuito foi somente citá-las como um argumento
de autoridade naquilo que defendia contra seus
resolutos opositores.
É irrelevante saber se o autor apoiava por
completo suas citações escolhidas, uma vez que
o mesmo ainda declara: ―Pois, como não
dependo de determinações dos homens, assim
acho que minha causa não se enfraquece —
embora sua autoridade seja negada a mim —
desde que Deus, por Sua vontade revelada e
palavra manifesta, permaneça clara e
evidentemente ao meu lado‖. Ou seja, se
somente o testemunho das Escrituras fosse
exposto, o autor consideraria suficiente para
provar que as mulheres não podem exercer
domínio sobre homens. Porém, revela Knox, os
leitores de sua própria época pareciam tão
incautos e ignorantes da verdade que ―não
tivesse agora o mundo chegado a essa cegueira,
em que qualquer coisa que não agrade aos
soberanos e à multidão, a mesma é rejeitada
como uma doutrina criada recentemente e que
deve ser condenada por heresia‖, seus
argumentos seriam poucos e sucintos, uma vez
que as Escrituras são claras quanto ao assunto.
Ao referir-se com tanta propriedade aos
mais variados autores da antiguidade, Knox
quer mostrar que os seus argumentos são, na
verdade, atemporais, havendo grande oposição
tanto na Escritura quanto no testemunho
histórico de que o domínio de mulheres é algo
contra a própria natureza. Mais uma vez, Knox
diz que ―essa parte da natureza não é minha
base mais firme‖.
O tratado foi publicado em Genebra em
1558. Como indicado no prefácio do autor, a
obra foi publicada anonimamente. Knox
desejava ocultar sua identidade, até que emitisse
mais dois soares, pretendendo divulgar seu
nome com a publicação do Terceiro Soar. O plano
do reformador de escrever duas continuações
não foi cumprido, embora mais tarde ele tenha
publicado um resumo do conteúdo que propôs
tratar no Segundo Soar. Tal resumo foi anexado
ao Primeiro Soar no presente volume.
Deixamos em negrito as partes
consideradas mais importantes pelos editores
originais do livro, uma vez que nenhum
argumento pode ser desconsiderado e que uma
leitura minuciosa deve ser feita a fim de melhor
aproveitar a presente obra. Além do esboço do
Segundo Soar, foram anexadas ao livro algumas
cartas que Knox enviou tanto aos conselheiros
quanto à própria rainha Elizabeth (Isabel I) da
Inglaterra, rainha protestante que assumiu o
trono após a morte de sua irmã (Maria I,
historicamente conhecida como Maria Sangrenta
por ter perseguido cristãos protestantes), o que
ocorreu pouco tempo após a publicação do
Primeiro Soar.
De certo, essa foi uma situação
desconfortante para nosso reformador; mas,
nem por isso, Knox parece voltar atrás em seus
firmes argumentos. É verdade que o reformador
se submete ao seu reinado, mas retifica-lhe que
era pela misericórdia de Deus e contra a lei da
natureza que sua cabeça havia sido exaltada e,
portanto, não lhe caberia exaltação, mas ela
deveria agir como uma serva de Deus, pelo bem
de Sua religião, humilhando-se para que Deus
fosse exaltado. Elizabeth, obviamente, não se
agradou do escrito e não deixou a situação
agradável para o reformador, que, mesmo
escrevendo cartas a fim de explicar seu
posicionamento, não teve a oportunidade de se
redimir com a rainha.
John Knox, naquele mesmo ano, escreveu
uma Rogativa para a dirigente da Escócia (Maria
de Guise), um Apelo à nobreza, explicando seus
posicionamentos, e uma Carta ao Povo em Geral
da Escócia, onde buscou despertar seu país para
os interesses políticos vigentes. Mesmo distante,
em Genebra, o reformador se preocupava
sobremaneira com seu país.
Apesar de seus argumentos serem um
tanto perigosos e sediciosos, revelam a
característica geral da época, onde o povo tinha
seus líderes como exemplo de conduta e moral.
Segundo Knox, num reino onde tamanha ordem
era dissolvida, seu povo, de igual modo,
também ficaria em desordem.
Esta obra não reflete, necessariamente, a
totalidade da opinião dos editores, mas
julgamos necessária a tradução de um material
tão rico, histórico e importante para nós. É um
avanço enorme para o leitor brasileiro ter acesso
a esse livro, já que há pouco tempo poucos
seriam capazes de traduzir, ler ou defender um
único princípio deste escrito. Que a leitura traga
reflexões e conhecimentos para todos os que
tiverem contato com este rico conteúdo.

EQUIPE O PRESBITERIANO
PREFÁCIO
“O REINO PERTENCE AO NOSSO DEUS”

É de se admirar que, entre tantas


inteligências férteis que a Ilha da Grã-Bretanha
produziu, entre tantos pregadores piedosos e
zelosos que a Inglaterra uma vez nutriu e entre
muitos homens estudiosos e de solene juízo,
nestes dias exilados por Jezabel, nenhum é
encontrado resoluto de coragem, fiel a Deus,
nem amando tanto a sua pátria, que ouse
admoestar os habitantes desta ilha do quão
abominável é perante Deus o império ou o
governo de uma mulher perversa, sim, de uma
traíra e ilegítima. E o que pode um povo ou
nação, destituído de um líder legítimo, fazer
pela autoridade da palavra de Deus ao eleger e
ao designar governantes e magistrados comuns?
Essa ilha (que tristeza!), pelo desprezo e horrível
abuso das misericórdias ofertadas por Deus e
pela vergonhosa rebelião de Satanás a Jesus
Cristo e ao Seu Evangelho outrora professado,
merece justamente ser deixada às mãos de seu
próprio conselho e, assim, chegar à confusão e à
escravidão por estrangeiros. Mas ainda temo
que essa negligência universal daqueles que
outrora foram estimados sentinelas deva ainda
agravar a nossa anterior ingratidão em vez de
justificar esse nosso silêncio universal e
descrente em um tema tão importante. Nós
vemos nosso país estabelecido como uma presa
a nações estrangeiras; nós vimos o sangue de
nossos irmãos, os membros de Cristo Jesus, mais
cruelmente para ser derramado; e sabemos que
o monstruoso império de uma mulher cruel (o
conselho secreto de Deus removido) é a única
causa de todas essas misérias; mas em silêncio
deixamos o tempo passar, como se o assunto
não coubesse a nós. Mas os exemplos contrários
dos antigos profetas1 me levam a duvidar desse
nosso fato. Pois Israel rejeitou universalmente a

1 Repare o contraste entre a negligência dos sentinelas com a


diligência dos antigos profetas de Deus [N. do T.].
Deus ao abraçar a idolatria sob Jeroboão (1Rs
12), na qual eles permaneceram até a destruição
de sua comunidade. E Judá, com Jerusalém,
seguiu a vil superstição e a manifesta iniquidade
de Samaria (Ez 16). Mas, contudo, não cessaram
os profetas de Deus em admoestar a um e a
outro. Sim, mesmo depois disso Deus derramou
Suas condenações sobre eles. Pois Jeremias (cap.
29) escreveu aos cativos na Babilônia e corrigiu
seus erros, instruindo claramente àqueles que
permaneceram no meio daquela nação idólatra.
Ezequiel, no meio de seus irmãos presos na
Caldeia, escreveu sua visão àqueles que estavam
em Jerusalém; e, severamente repreendendo
seus vícios, assegurou-lhes de que não
escapariam da vingança de Deus em razão de
suas abominações cometidas (caps. 7, 8 e 9).
Os mesmos profetas, para o conforto dos
aflitos e escolhidos santos de Deus que se
ocultavam entre os réprobos daquela época2
(como comumente faz o trigo entre o joio),

2 Deus sempre teve Seu povo entre os ímpios, os quais nunca


careciam de seus profetas e mestres [N. do T.].
profetizaram e predisseram as mudanças dos
reinos, as punições dos tiranos e a vingança que
Deus executaria sobre os opressores de Seu
povo (Is 13, Jr 46, Ez 2). O mesmo fez Daniel e o
restante dos profetas, todos em sua época. Por
cujos exemplos e pelo preceito manifesto, o qual
é dado a Ezequiel, é ordenado que se diga aos
ímpios: ―Morrerás da morte‖ [Ez 28:8]. Nós,
nesta nossa era miserável, somos obrigados a
admoestar o mundo e os tiranos do mesmo de
sua repentina destruição, para assegurá-los e
clamar a eles, querendo ou não ouvir-nos, que
o sangue dos santos, que por eles é derramado,
continuamente clama e anseia vingança na
presença do Senhor Deus dos Exércitos (cf. Ez
2, Ap 6). E, além disso, é nosso dever expor ao
mundo ignorante e cego a verdade revelada a
nós; a menos que, para nossa própria
condenação, prefiramos encerrar e ocultar o
dom dedicado à nossa responsabilidade.
Estou certo de que Deus revelou a alguns
nesta nossa época que é mais do que um
monstro em natureza que uma mulher reine e
tenha império sobre o homem. E, no entanto, em
todos nós existe tamanho silêncio que é como se
Deus não estivesse ofendido. O homem natural,
inimigo de Deus, encontrará, sei, muitas causas
por que tal doutrina não deveria ser publicada
nestes dias perigosos. Em primeiro lugar,
porque isso parece tender à sedição. Em
segundo lugar, isso seria perigoso, não apenas
para o escritor ou editor, mas também para
todos os que lerem os escritos ou favorecerem
essa verdade falada; e, por último, isso não
corrigirá os principais transgressores, em parte
porque nunca chegará a seus ouvidos e em parte
porque eles não serão admoestados em tais
casos. Eu respondo que, se algum desses
motivos fosse suficiente para que uma verdade
conhecida seja escondida, então foram tolos os
antigos profetas de Deus, os quais não melhor
promoviam a sua própria tranquilidade, que
arriscavam suas vidas por repreenderem os
vícios e por acusarem abertamente crimes que
não eram conhecidos pelo mundo. E Cristo Jesus
teria insultado a Seus apóstolos ordenando-lhes
que pregassem o arrependimento e a remissão
de pecados em Seu nome para todos os reinos e
nações. E Paulo não teria entendido sua própria
liberdade quando exclamou: ―Ai de mim se eu
não pregar o Evangelho!‖ (1Co 9). Se o temor,
digo eu, da perseguição, da difamação ou de
qualquer inconveniência antes citada pudesse
dispensar e exonerar os servos de Deus de
simplesmente repreender os pecados do mundo,
justa causa teria cada um deles de deixar seu
cargo (Mt 26, At 18, 21). Pois, de repente, sua
doutrina fora acusada por termos de
insubordinação, de novo ensino e de traição;
perseguição e veemente dificuldade
rapidamente sobrevieram tanto aos professos
quanto aos pregadores. Reis, príncipes e
governantes do mundo conspiravam contra
Deus e contra o Seu ungido, Jesus Cristo (Sl 2,
At 4).

Mas e então? Algum desses problemas


move os profetas e apóstolos a desanimarem de
sua vocação? Não. Mas, através da resistência
que o diabo lhes fez por meio de seus
seguidores, eles ficavam mais inflamados para
difundir a verdade revelada a eles e para
testemunhar com seu sangue que a grave
condenação e a forte vingança de Deus
sucederiam o orgulho em desprezar as graças
oferecidas. A fidelidade, a ousada coragem e a
constância daqueles que são anteriores a nós
devem incitar-nos a seguir seus passos, a menos
que busquemos outro reino além do que Cristo
tenha prometido aos que perseverarem na
profissão de Seu nome até o fim.

Se alguém acha que o império das


mulheres não é de tamanha importância; que,
para suprimi-lo, qualquer homem está fadado a
arriscar sua vida, respondo que reprimi-lo está
nas mãos de Deus somente. Mas, proferir a
impiedade e abominação do mesmo, digo eu, é
o dever de todo verdadeiro mensageiro de
Deus, a quem é revelada a verdade neste
sentido. Pois o dever especial3 dos mensageiros
de Deus é pregar o arrependimento, advertir os
ofensores de suas ofensas e dizer ao iníquo:

3É necessário que cada homem exponha a impiedade que ele sabe


que fere sua comunidade [N. do T.].
“morrerás da morte, a menos que se
arrependa”. Confio que nenhum homem negará
ser ofício adequado de todos os mensageiros de
Deus pregar (como disse) arrependimento e
remissão de pecados. Mas nenhum dos dois
pode ser feito a não ser que a consciência dos
infratores seja acusada e condenada de
transgressão. Mas como pode alguém se
arrepender sem saber no que tem ofendido?
Onde nenhum arrependimento é encontrado,
não pode haver acesso à graça4. E, portanto,
digo que necessário é que esse império
monstruoso de mulheres (que, entre todas as
atrocidades que hoje abundam sobre a face de
toda a terra, é detestável e condenável) seja
abertamente revelado e manifestamente
declarado ao mundo, com o fim de que alguns
possam se arrepender e ser salvos. Digo isso à
primeira classe de homens.
Para os que pensam que demorará muito
para que tal doutrina chegue aos ouvidos dos

4Nenhum homem pode arrepender-se sem que tenha conhecimento


de seu pecado [N. do T.].
principais ofensores, respondo que a verdade de
Deus é desta natureza: em um momento ou em
outro ela obterá para si mesma a audiência. É
um aroma, um perfume, que não pode ser
suprimido. Sim, é uma trombeta que soará
apesar do adversário. Ela obrigará os próprios
inimigos, para sua própria confusão, a testificá-
la e testemunhá-la. Pois vemos que a profecia ou
pregação de Eliseu foi declarada no salão do rei
da Síria pelos servos e bajuladores do próprio
rei perverso, fazendo menção de que Eliseu
declarava ao rei de Israel quaisquer que fossem
as palavras que o rei da Síria falava em seu mais
secreto aposento (2Rs 6). E as maravilhosas
obras de Jesus Cristo foram notificadas a
Herodes (Mt 14), não em qualquer grande
louvor ou elogio de Sua doutrina, mas, antes,
para tornar sabido que Cristo havia chamado
esse tirano de raposa e que Ele não considerava
sua autoridade mais do que o fez João Batista,
que Herodes havia decapitado por sua liberdade
de expressão.
Mas os transmissores dos rumores e das
notícias, quer fossem favoráveis a Cristo quer
fossem bajuladores do tirano, certo é que a
fama, tanto da doutrina de Cristo quanto de
Suas obras, chegou aos ouvidos de Herodes.
Assim também pode o som da nossa fraca
trombeta, pelo apoio de algum vento (soprado
do sul ou soprado do norte, não importa),
chegar aos ouvidos dos principais ofensores
(Rm 1). Mas quer isso aconteça ou não, ainda
assim não ousamos cessar de soprar enquanto
Deus nos der força. Pois somos devedores mais
do que aos príncipes, a saber: à multidão de
nossos irmãos, dos quais, sem dúvida, um
grande número até agora tem sido ofendido
pelo erro e pela ignorância, dando seus
sufrágios, consentimento e ajuda para
estabelecer mulheres em seus reinos e impérios,
não entendendo quão abominável, odiosa e
detestável é toda essa autoridade usurpada na
presença de Deus. E, portanto, a verdade deve
ser claramente dita para que a multidão simples
e rudimentar seja admoestada.
E, quanto ao perigo que isso pode
acarretar, não sou tão bruto e insensível, mas
tenho colocado em minha conta o que a
finalização desta obra pode custar de mim.
Primeiro, não ignoro como é difícil e perigoso
falar contra um erro comum, especialmente
quando as mentes ambiciosas de homens e
mulheres são chamadas à obediência ao
simples mandamento de Deus. Pois, para a
maior parte dos homens, lícita e piedosa parece
ser qualquer antiguidade que tenham recebido.
E, em segundo lugar, procuro ter mais
adversários, não apenas entre a multidão
ignorante, mas também entre as sábias,
prudentes e calmas almas deste mundo, de
modo que os que deveriam manter a verdade e
veracidade de Deus tornem-se inimigos para
mim neste caso, como também os príncipes e
pessoas ambiciosas, que, para manter sua tirania
injusta, sempre procuram suprimi-la [isto é,
suprimir a verdade]. E assim estou certamente
convencido de que meu trabalho não escapará à
repreensão de muitos.
Mas, porque me lembro de que a
prestação de contas dos dons recebidos deve
ser feita Àquele que não considera a multidão
nem ainda aprova a sabedoria, a prudência, a
paz e nem a antiguidade, as quais concluam ou
determinem qualquer coisa contra a Sua
vontade eterna revelada a nós em Sua mais
bendita Palavra, sou obrigado a cobrir os meus
olhos e tampar-me os ouvidos para que não veja
a multidão que se oporá a mim neste assunto,
nem que eu ouça os opróbrios nem considere os
perigos que posso incorrer ao proferir o mesmo.
Serei chamado de tolo, estranho, mal-humorado
e semeador de sedição; e, um dia, por acaso
(embora agora não tenha nome), posso ser
condenado por traição. Porém, vendo que isso é
impossível, vendo que eu ou ofenderia a Deus,
que diariamente convida minha consciência de
que devo manifestar a verdade conhecida, ou
contrariaria o mundo ao fazer o mesmo,
determinei-me a obedecer a Deus, apesar de o
mundo estar enfurecido.
Sei que o mundo ofendido (pela permissão
de Deus) pode matar o corpo, mas a majestade
de Deus ofendida tem poder para punir corpo e
alma para sempre. Sua majestade é ofendida
quando Seus preceitos são desprezados e Suas
ameaças são consideradas ineficazes. E, entre os
Seus múltiplos preceitos dados aos Seus
profetas, entre as Suas ameaças, nenhuma é
mais veemente do que a pronunciada a Ezequiel
com estas palavras: ―Então tu, ó filho do
homem, te estabeleci vigia sobre a casa de Israel;
portanto, tu ouvirás a palavra da minha boca, e
lhes avisará de mim [e lhes advertirás com
franqueza] quando eu disser ao perverso: Ó
homem perverso, tu certamente morrerás; se tu
não falares, para avisar ao perverso do seu
caminho, aquele homem perverso morrerá na
sua iniquidade, mas o seu sangue eu o
requererei da tua mão. Entretanto, se tu avisares
ao perverso do seu caminho para que se desvie
dele, se ele não se desviar do seu caminho, ele
morrerá na sua iniquidade; mas tu livraste a tua
alma‖ (Ez 33:7-9).
Esse preceito, digo eu, com a ameaça
anexada, juntamente com o restante do que é
falado no mesmo capítulo não somente a
Ezequiel, mas a todo aquele a quem Deus coloca
sobre Seu povo e rebanho (e vigias são aqueles
cujos olhos Ele abriu e cuja consciência Ele
atormenta para admoestar os ímpios), compele-
me a expressar minha consciência nessa questão,
apesar de todo o mundo se escandalizar comigo
por fazê-lo. Se alguém se perguntar por que
escondo meu nome, assegure-se de que o medo
da punição corporal não é a única nem a
principal causa. Meu propósito é três vezes
tocar a trombeta sobre o mesmo tema, se Deus
permitir: duas vezes pretendo fazê-lo sem nome;
mas, no último soar, pretendo assumir a culpa
sobre mim para que todos os outros possam ser
absolvidos5.

5 Ao que parece, Knox nunca encontrou tempo para efetuar seu


propósito a esse respeito. Ele escreveu apenas um sumário do
Segundo Soar, como será visto ao fim deste livro, e nada do Terceiro
[N. do T.].
O PRIMEIRO SOAR
PARA DESPERTAR AS
MULHERES DEGENERADAS

Promover uma mulher para assumir


governo, superioridade, domínio ou império
sobre qualquer reino, nação ou cidade é
repugnante para a natureza; uma contumélia
[isto é, um insulto] a Deus, a coisa mais
contrária à Sua vontade revelada e ordenança
aprovada; e, finalmente, é a subversão da boa
ordem, de toda equidade e justiça.

Na comprovação dessa proposição, não


serei tão curioso em reunir qualquer coisa que
possa amplificar, demonstrar ou decorar a
mesma, mas tenho o propósito, como tenho
expressado minha consciência nas mais simples
e poucas palavras, de assim satisfazer com uma
simples prova de cada elemento, trazendo para
o meu testemunho a ordenança de Deus na
natureza, Sua simples vontade revelada em Sua
palavra, e os pensamentos dos mais antigos
entre os piedosos escritores6.

6As divisões de capítulos neste livro não são de formato original


[N. do T.].
O IMPÉRIO DAS MULHERES
É REPUGNANTE
PARA A NATUREZA

Primeiramente, onde afirmo o império de


uma mulher como sendo algo repugnante para a
natureza, quero dizer não apenas que Deus, pela
ordem de Sua criação, privou a mulher da
autoridade e do domínio, mas também que o
homem tem visto, provado e pronunciado
causas justas por que assim deveria ser. O
homem, digo eu, cego em muitas outras
circunstâncias, vê deste modo muito claramente.
Porque as causas são tão manifestas que não
podem ser escondidas. Pois, quem pode negar
que nada mais é do que repugnante para a
natureza que o cego possa ser apropriado para
guiar e conduzir tanto quanto o que vê? Que a
pessoa fraca, doente e impotente possa suprir e
manter aquela que é saudável e forte? E,
finalmente, que o tolo, o louco e frenético possa
governar o prudente e dar conselhos para os de
mente sã? Assim são todas as mulheres
comparadas ao homem assumindo a
autoridade. Pois sua visão em regimento civil
não é nada além de cegueira; sua força,
fraqueza; seu conselho, insensatez; e
julgamento, frenesi, se justamente considerados.

Excluo aquelas que Deus, por singular


privilégio e por certas causas conhecidas apenas
por Ele mesmo, isentou da classificação comum
das mulheres, e falo das mulheres como a
natureza e a experiência as declaram neste dia7.
A natureza, digo eu, retrata-as como sendo
fracas, frágeis, impacientes, debilitadas e
insensatas; e a experiência as tem declarado
como sendo inconstantes, variáveis e cruéis,
faltando-lhes espírito de conselho e regimento.
Os homens, em todas as gerações, descobriram
notáveis faltas deste tipo, pelas quais não

7 Exemplos privados não quebram a ordem geral [N. do T.].


apenas removeram as mulheres do governo e da
autoridade, mas também alguns julgaram que
os homens sujeitos ao conselho ou império de
suas esposas são indignos de ofício público. Pois
isto escreve Aristóteles na segunda de suas
Políticas8: qual diferença podemos extrair, diz
ele, entre mulheres que assumem autoridade e
maridos designados para serem magistrados os
quais obedecem ao comando de suas esposas?
Pois o que acontece no primeiro caso, precisará
ser inferido no outro, a saber, injustiça, confusão
e desordem. O mesmo autor posteriormente
raciocina que a política ou regimento dos
lacedemônios (que, de certa maneira, eram os
mais excelentes entre os gregos) não era digna
de ser reputada nem contabilizada entre o
número das comunidades que eram bem
governadas, pois os magistrados e governantes
da mesma eram deveras dados a agradar e
obedecer às suas esposas. O que este escritor (eu
lhes suplico) teria dito para o reino ou a nação

8 Aristóteles, Política II.


onde uma mulher se assenta coroada no
parlamento no meio de homens?

“Oh! Temíveis e terríveis são os teus


julgamentos; Oh, Senhor, que assim abateram o
homem por sua iniquidade!” (cf. Is 3).

Estou seguramente persuadido que se


qualquer um destes homens, que, iluminados
apenas pela luz da natureza, viram e
pronunciaram as causas suficientes por que as
mulheres não deveriam assumir o governo nem
a autoridade, pudessem este dia viver e ver uma
mulher se assentando em julgamento, ou
dirigindo o parlamento em meio a homens,
tendo uma coroa real sobre sua cabeça, a espada
e o cetro diante de si como sinal de que a
administração da justiça estaria em seu poder:
estou seguramente persuadido, digo eu, de que
tamanha visão tanto os espantaria que julgariam
o mundo inteiro como tendo sido transformado
em amazonas9; que tamanha metamorfose e

9 Segundo a mitologia grega, as amazonas eram mulheres


monstruosas que não toleravam o regimento dos homens e,
mudança foram feitas em todos os homens
daquele país, como os poetas simularam ter
acontecido na companhia de Ulisses; ou, ao
menos, embora a forma externa dos homens
houvesse permanecido, eles ainda julgariam que
seus corações foram mudados da sabedoria, do
conhecimento e da coragem dos homens, à
inclinação tola e à covardia das mulheres. Sim,
eles ainda pronunciariam que onde as mulheres
reinam ou estão em autoridade ali deve haver
mais necessidade de vaidade do que de virtude,
mais ambição e orgulho do que temperança e
modéstia; e, finalmente, que a avareza, a mãe de
todos os males, devoraria a equidade e a justiça.

Mas, a fim de que não pareçamos


sustentar essa opinião sozinhos, ouçamos o que
outros viram e declaram sobre isso. Nas Regras
da Lei10 está escrito: “Mulheres estão removidas
de todo ofício civil e público, a fim de que não
possam ser juízas, nem possam ocupar o lugar

portanto, matavam seus próprios maridos. Ler Justino de Roma [N.


do T.].
10 Lib. 50. De regulis iuris.
de magistrado, nem ainda possam ser oradoras
de outros”. O mesmo é repetido no terceiro e no
décimo sexto livros do Digesto11, onde
determinadas pessoas são proibidas Ne pro aliis
postulent, isto é, não podem ser oradoras nem
advogadas de outros. Entre o restante, as
mulheres estão proibidas, e esta causa é
acrescentada: para que não se interponham sem
pudor [isto é, modéstia] nas causas dos outros12;
nem tampouco que as mulheres presumam
utilizar os ofícios devidos aos homens. A Lei, na
mesma passagem, ainda declara que um pudor
natural deve estar nas mulheres13, o qual ela
certamente perde sempre que toma sobre si o
ofício e a posição do homem. Como em
Calpúrnia foi evidentemente declarado, a qual,
tendo licença para falar perante o senado,
tornou-se tão impudente e importuna que, pelo
seu balbucio, ela perturbava toda a assembleia; e
assim motivou-se o estabelecimento desta lei.

11 3. 16. Lib. Digestorum.


12 Ad Senatus consul, Veleianum.
13 Lib 3. De posulationse Tit. 1.
No primeiro livro do Digesto14 é
pronunciado que a condição da mulher, em
muitos casos, é pior do que a do homem, como
na jurisdição (diz a Lei), no recebimento de
cuidado e ensino, na adoção, na acusação
pública, na delação, em toda ação popular e no
poder maternal que ela não tem sobre os
próprios filhos15. A Lei ainda não permitirá que
a mulher dê algo para o seu marido, porque é
contra a natureza de seu gênero, sendo o
membro inferior, ousar dar alguma coisa para a
sua cabeça16. A Lei, além disso, pronuncia a
mulher como sendo mais avarenta17 (o que é um
vício intolerável naqueles que deveriam
governar ou ministrar a justiça). E, Aristóteles18,
como antes foi citado, simplesmente afirma que,
onde quer que as mulheres assumam o domínio,

14 De statu homino Titul. 8. Da mulher.


15 Note que o poder é tirado por essa lei civil sobre seus próprios
filhos. Se, à luz natural, os homens tinham tais observações acerca
da autoridade das mulheres em coisas tão pequenas, Knox
argumenta, por que dar autoridade a elas em coisas tão grandes?
[N. do T.].
16 Dig. lib. 24. De donatione inter virum et foeminane.
17 Segundo a lei, faz parte da natureza da mulher ser cobiçosa,

portanto ela é inadequada para o governo [N. do T.].


18 Lib 1. Digest. De le gib. et senatuscon Titul. 3, Politica 2.
ali o povo deve estar em desordem, vivendo e se
infestando em toda a intemperança, dado ao
orgulho, excesso e vaidade; e finalmente, no fim,
ele deve chegar à confusão e à ruína.

Quisera Deus os exemplos não fossem tão


manifestos na declaração adicional sobre as
imperfeições das mulheres, sobre a sua fraqueza
natural e suas inclinações desordenadas! Eu
poderia citar histórias, provando que algumas
mulheres morreram pela súbita alegria;
algumas, pela impaciência, assassinaram umas
às outras; algumas se inflamaram com uma
luxúria tão desordenada que, para sua própria
satisfação, traíram o seu país e a sua cidade para
estrangeiros19; algumas têm sido tão desejosas
de domínio, que, para a obtenção do mesmo,
assassinaram os filhos de seus próprios filhos,
sim, e algumas mataram com crueldade seus
próprios maridos e filhos20. Mas, para mim, é

19 Romilda, esposa de Gisulfo II (duque de Friuli, na Itália), traiu-no


com Cacano.
20 Joana, rainha de Nápoles enforcou seu marido. Atália (cf. 2Rs 1:1).

Irene, imperatriz bizantina (cf. Opera omnia, vol. II, pp. 446-7).
suficiente (porque essa parte da natureza não é
minha base mais firme) ter provado que os
homens, iluminados somente pela luz da
natureza, viram e determinaram que é a coisa
mais repugnante para a natureza que a mulher
domine e governe sobre o homem. Pois aqueles
que não permitem que uma mulher tenha poder
sobre os seus próprios filhos não permitirão
(estou seguro) que ela tenha domínio sobre um
reino21; e aqueles que não suportam que ela fale
em defesa daqueles que são acusados (nem
admitem a sua acusação contra homens) não
aprovarão que ela se assente no julgamento,
coroada com a coroa real, usurpando da
autoridade no meio de homens.

21Se essas pequenas coisas são negadas às mulheres, as maiores não


podem ser concedidas.
O IMPÉRIO DAS MULHERES
É CONTRÁRIO À VONTADE
REVELADA DE DEUS

Mas agora, na segunda parte da natureza,


na qual incluo a vontade revelada e a perfeita
ordenança de Deus e, contra essa parte da
natureza, digo que [a vontade de Deus]
manifestamente repugna que qualquer mulher
possa reinar e exercer domínio sobre o homem.
Pois Deus, primeiro pela ordem de Sua criação e
depois por sua condenação e maldição
pronunciada contra a mulher (por razão de sua
rebelião), pronunciou o contrário.

Primeiramente, digo que a mulher em sua


máxima perfeição foi feita para servir e
obedecer ao homem, não para governá-lo e
comandá-lo. Como São Paulo argumenta nestes
versos: ―Porque o homem não provém da
mulher, mas a mulher do homem. Porque
também o homem não foi criado por causa da
mulher, mas a mulher por causa do homem.
Portanto, a mulher deve ter sobre a cabeça sinal
de poderio (isto é, uma cobertura em sinal de
sujeição), por causa dos anjos‖ (1Co 11:8-10).
Nessas palavras está claro que o apóstolo quer
dizer que a mulher, em sua máxima perfeição,
teria conhecimento que o homem era senhor
sobre si; e, por isso, ela nunca teria intentado
nenhum tipo de superioridade sobre ele, não
mais do que fazem os anjos sobre Deus, o
Criador, ou sobre Cristo, seu cabeça22. Então
digo que, em sua máxima perfeição, a mulher
foi criada para ser sujeita ao homem.

Mas, após a sua queda ou rebelião


cometida contra Deus, havia sobre si uma nova
necessidade, e ela foi feita sujeita ao homem
pela sentença irrevogável de Deus,
pronunciada nestas palavras: ―Multiplicarei

22 Uma boa comparação.


grandemente a tua dor, e a tua conceição; com
dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o
teu marido, e ele te dominará‖ (Gn 3:16). Por
isso, podem aqueles que não são cegos ver
claramente que Deus, por Sua sentença, negou
a todas as mulheres o império e o domínio
sobre o homem. Pois duas punições estão sobre
ela, a saber, uma dor, angústia e sofrimento
sempre que ela for mãe; e uma sujeição de si
mesma, seus desejos e suas vontades, ao seu
marido e à vontade dele. Da primeira parte
desta maldição não pode nem arte, nem
nobreza, nem política, nem qualquer lei ser feita
pelo homem para libertar as mulheres; mas toda
aquela que alcança a honra de ser mãe prova na
experiência o efeito e a força da Palavra de
Deus. Mas (que tristeza!) a ignorância sobre
Deus, a ambição e a tirania têm tentado abolir e
destruir a segunda parte da punição de Deus.
Pois as mulheres são levantadas para serem
cabeças sobre reinos e para governar sobre
homens em seus prazeres e seus desejos. Mas
horrível é a vingança que está preparada para
uns e para outros, para os promotores e para as
pessoas promovidas, a não ser que
rapidamente se arrependam. Pois tais serão
rejeitados da glória dos filhos de Deus para a
escravidão do diabo e para o tormento que está
preparado para todos aqueles que se exaltam
contra Deus.

Nada pode ser mais manifesto contra Deus


do que uma mulher sendo exaltada para reinar
sobre o homem. Pois a sentença contrária Ele
pronunciou nestas palavras: ―e o teu desejo será
para o teu marido, e ele te dominará‖ (Gn 3:16).
Como se Deus dissesse: ―Portanto, como tu
abusaste de tua primeira condição, e porque o
teu livre-arbítrio trouxe a humanidade e tu
mesma à escravidão de Satanás, Eu, assim
sendo, levarei-te à escravidão do homem. Pois,
onde antes a tua obediência deveria ter sido
voluntária, agora ela deverá ser por
constrangimento e por necessidade; e, porque
enganaste o teu homem, tu não deverás,
portanto, ser mais a mestra de teus próprios
desejos, sobre a tua própria vontade ou anseios.
Pois em ti não há nem razão nem liberdade que
sejam suficientes para moderar tuas afeições, e,
portanto, elas deverão estar sujeitas ao desejo de
teu homem. Ele deverá ser senhor e governante
não apenas sobre o teu corpo, mas até mesmo
sobre os teus próprios desejos e vontades‖. Essa
sentença, digo eu, Deus pronunciou contra Eva
e suas filhas, como o restante das Escrituras
evidentemente testifica. Por isso, nenhuma
mulher pode sequer presumir reinar sobre o
homem, pois isso ela fará a despeito de Deus e
em desprezo de Sua punição e maldição23.

RESPOSTA A UMA OBJEÇÃO


Não ignoro que a maior parte dos homens
entende essa maldição da sujeição da esposa ao
seu marido e do domínio que ele tem sobre ela,
mas o Santo Espírito nos dá outra interpretação
dessa passagem, retirando de todas as mulheres
todos os tipos de superioridade, autoridade e
poder sobre o homem, falando como se segue,
pela boca de São Paulo: ―Não permito, porém,
que a mulher ensine, nem use de autoridade

23 Prestem atenção nisso, mulheres.


sobre o marido, mas que esteja em silêncio‖
(1Tm 2:12). Aqui ele designa mulheres em geral,
com exceção de nenhuma, afirmando que ela
não pode usurpar de autoridade sobre qualquer
homem. E isso ele fala mais claramente em outra
passagem, nestas palavras: ―As vossas mulheres
estejam caladas na congregação; porque não
lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas,
como também ordena a lei‖ (1Co 14:34). Esses
dois testemunhos do Espírito Santo são
suficientes para provar o que quer que
tenhamos afirmado antes e para reprimir o
orgulho desordenado das mulheres, como
também para corrigir a estultice daqueles que
têm planejado exaltar as mulheres em
autoridade sobre os homens, contra Deus e
contra Sua sentença pronunciada.

Mas essas mesmas duas passagens do


apóstolo podem ser melhor entendidas. Deve
ser notado que, na última [passagem], escrita na
primeira epístola aos Coríntios, capítulo 14 (vvs.
31-32), antes que o apóstolo tivesse permitido
que todas as pessoas profetizassem uma após a
outra, adicionando esta razão: ―para que todos
aprendam, e todos sejam consolados‖; e a fim de
que ninguém pudesse ter julgado que,
juntamente com uma grande multidão e uma
pluralidade de falantes, muitas coisas pudessem
ser afirmadas, ou senão que alguma confusão
pudesse ser levantada, ele adiciona: ―E os
espíritos dos profetas estão sujeitos aos
profetas‖. Como se ele dissesse: ―Deus sempre
levantará alguns a quem a verdade é revelada, e
a estes vocês devem dar lugar, ainda que se
sentem nos assentos mais baixos‖. E, assim, o
apóstolo definiria a profecia como um exercício
livre para toda a igreja: que qualquer um
poderia comunicar à congregação o que Deus
lhes havia revelado, desde que fosse feito de
forma ordenada. Mas, deste privilégio geral, ele
excluiu todas as mulheres, dizendo: ―As vossas
mulheres estejam caladas nas igrejas‖. E por
que, rogo-lhes? Era porque o apóstolo achava
que nenhuma mulher tinha qualquer
conhecimento? Não, ele deu outra razão,
dizendo: ―mas estejam sujeitas, como também
ordena a lei‖ (v.34)24. Nessas palavras,
primeiramente deve ser notado que o apóstolo
chama essa primeira sentença pronunciada
contra a mulher de uma lei, isto é, o decreto
imutável de Deus, o qual, por Sua própria voz a
sujeitou a um membro da congregação, ou seja,
ao seu marido. A respeito disso, o Espírito Santo
conclui que ela nunca deve governar, nem
assumir império sobre o homem, pois ela, que é
feita sujeita a um, nunca deverá estar acima de
muitos. E isso o Espírito Santo manifestamente
expressa, dizendo: ―Não permito, porém, que a
mulher ensine, nem use de autoridade sobre o
marido‖ (1Tm 2:12). Ele diz: ―Não, eu não
permitirei que a mulher usurpe de autoridade
sobre o seu marido‖, mas Ele nomeia o homem
em geral, retirando da mulher todo o poder e a
autoridade para falar, argumentar, interpretar
ou ensinar; mas, principalmente, para governar
ou julgar na assembleia dos homens. Assim
sendo, a mulher, pela lei de Deus e pela

24 As mulheres são excluídas de um privilégio geral.


interpretação do Espírito Santo, é absolutamente
proibida de ocupar o lugar de Deus nos ofícios
já ditos, os quais Ele assegurou ao homem, a
quem Ele designou e ordenou como Seu
comissário na terra, excluindo dessa honra e
dignidade todas as mulheres, como este
pequeno argumento evidentemente pode
declarar.

UM FORTE ARGUMENTO
O apóstolo tira o poder de todas as mulheres
para falar na assembleia. Ergo [isto é, logo], ele
não permite que mulher alguma governe sobre
o homem. A primeira parte é evidente, sobre a
qual a conclusão por necessidade se segue. Pois
aquele que tira da mulher a mínima parte de
autoridade, domínio ou governo, não permitirá
dar a ela aquela que é máxima. Maior é reinar
sobre reinos e nações, publicar e fazer leis,
comandar homens de todas as posições e,
finalmente, designar juízes e ministros, do que
falar na congregação. Pois seu julgamento,
sentença ou opinião feitos na congregação
podem ser julgados por todos, podem ser
corrigidos pelos instruídos e reformados pelos
piedosos, mas a mulher, sendo promovida em
autoridade soberana, suas leis devem ser
obedecidas; sua opinião, seguida; e sua tirania,
conservada; o que é expressamente contra Deus
e o benefício da comunidade, como também a
manifesta experiência este dia testifica.

E, portanto, ainda novamente repito


aquilo que antes afirmei, a saber: que uma
mulher promovida a assentar-se no assento de
Deus (isto é, para ensinar, julgar ou reinar sobre
o homem) é um monstro por natureza, uma
contumélia a Deus e a coisa mais repugnante à
Sua vontade e ordenança. Pois Ele as privou,
como anteriormente é provado, de falar na
congregação e expressamente as proibiu de
usurpar qualquer tipo de autoridade sobre o
homem. Como, pois, Ele as apoiaria reinando e
tendo império sobre reinos e nações? Ele nunca,
digo eu, o aprovará, pois é a coisa mais
repugnante para a Sua perfeita ordenança, como
posteriormente deverá ser declarado e como as
anteriores passagens da Escritura claramente
deram testemunho. Adicionar qualquer coisa a
elas seria supérfluo não tivesse agora o mundo
chegado a essa cegueira em que qualquer coisa
que não agrade aos soberanos e à multidão, a
mesma é rejeitada como uma doutrina criada
recentemente e que deve ser condenada por
heresia.

Tenho, portanto, julgado ser bom recitar


os pensamentos de alguns antigos escritores
sobre o mesmo assunto, com o fim de que
aqueles que, de um modo geral, não estão
cegados pelo diabo possam considerar e
entender esse meu julgamento como sendo
nenhuma nova interpretação das Escrituras de
Deus, mas como sendo um consenso uniforme
da maior parte dos escritores piedosos desde o
tempo dos apóstolos.

Tertuliano, em seu livro O Traje das


Mulheres25, depois de ter mostrado muitos
motivos por que as vestes pomposas são

25 Tertuliano, de habitu mulierum.


abomináveis e odiosas numa mulher, acrescenta
estas palavras, como se estivesse conversando
com cada mulher pelo nome: ―Tu não sabes,‖
diz ele, ―que és Eva? A sentença de Deus é viva
e é efetiva contra este gênero; e, neste mundo,
por necessidade é que a punição também vive.
Tu és a porta e o portão do diabo. Tu és a
primeira transgressora da lei de Deus. Tu
persuadiste e facilmente enganaste aquele que o
diabo não ousou atacar26. Pelo teu mérito (isto é,
pela tua morte), convinha que o Filho de Deus
sofresse a morte. Isso ainda está em tua mente
quando tu te acomodas sob teus casacos de
pele?‖

Por estas e muitas outras solenes sentenças


e breves interrogações trabalhou este piedoso
escritor para trazer cada mulher à contemplação
de si mesma, com o fim de que cada uma,
profundamente ponderando qual sentença Deus
havia pronunciado contra toda a raça e filhas de
Eva, pudesse não apenas aprender diariamente

26 Que toda mulher ouça o que Tertuliano, um antigo doutor, diz.


a se humilhar e a se sujeitar na presença de
Deus, mas também que elas evitassem e
abominassem qualquer coisa que pudesse
exaltá-las ou enchê-las de orgulho ou que
pudesse fazer com que elas se esquecessem da
condenação e da maldição de Deus.

E o que, rogo-lhes, é mais capaz de fazer


com que uma mulher se esqueça de sua própria
condição do que se ela for levantada em
autoridade sobre o homem? É uma coisa muito
difícil para um homem promovido às honras
não ter em mãos qualquer coisa com orgulho
(pois o vento de vanglória facilmente levanta a
poeira seca da terra). Mas para a mulher, é tão
possível que ela, sendo posta na elevada
autoridade sobre o homem, resista às moções
de orgulho, quanto é possível que a cana fraca,
ou o cata-vento, não se curve ou gire na
veemência do vento irregular. E, portanto, o
mesmo escritor expressamente proíbe todas as
mulheres de intermediar com o ofício do
homem. Pois assim ele escreve em seu livro O
Véu das Virgens27: ―Não é permitido para uma
mulher falar na congregação, nem ensinar, nem
batizar, nem reivindicar para si mesma qualquer
ofício de homem‖. O mesmo ele diz ainda mais
claramente no Prefácio do seu sexto livro escrito
Contra Marcião28, onde, relatando determinadas
coisas monstruosas, as quais eram vistas no Mar
chamado Euxino, entre o restante, ele recita isto
como um grande monstro na natureza: ―as
mulheres naquelas regiões não são amansadas e
docilizadas em consideração ao seu próprio
sexo, mas, esvaindo-se de toda vergonha,
gastam com armas e aprendem as façanhas da
guerra, tendo mais prazer em lutar do que em
casar e serem sujeitas ao homem‖. Até então, as
palavras de Tertuliano são tão claras que não
precisam de explicação alguma. Pois aquele que
tira dela todo o ofício pertencente ao homem
não suportará que ela reine sobre o homem; e
aquele que julga ser um monstro em natureza
que uma mulher possa exercer armamento deve
julgar ser o monstro dos monstros que uma

27 Tertuliano, De Virginibus Velandis.


28 Pomio, Contra Marcionem.
mulher possa ser exaltada sobre todo um reino e
nação. Da mesma opinião é Orígenes e diversos
outros (cujas sentenças omito para evitar
redundância), sim, até mesmo nos dias de
Agostinho.

Agostinho, em seu vigésimo segundo livro


escrito Contra Fausto29, prova que uma mulher
deveria servir a seu marido como a Deus,
afirmando que em nada tem a mulher igual
poder com o homem, exceto que nenhum dos
dois têm poder sobre os seus próprios corpos.
Pelo que ele concluiria claramente que a mulher
nunca deveria alegar nem ansiar por este poder
e autoridade que são devidos ao homem. Por
isso, ele se explica em outro lugar30, afirmando
que a mulher deveria ser controlada e refreada a
tempo se ela aspirasse por algum domínio;
alegando que é perigoso e arriscado sustentá-la
em seu proceder, embora fosse em coisas
temporais e materiais. E, além disso, ele
adiciona estas palavras: ―Deus não vê por um

29 Agostinho, lib. 22, contra Faustum, c.7.


30 De Trinitate, lib. 12, cap. 7.
tempo, nem há qualquer coisa nova em Sua
visão e conhecimento‖, querendo dizer que,
desse modo, o que Deus viu em uma mulher (a
respeito do domínio e exercício de autoridade),
o mesmo Ele vê em todas. E o que Ele proibiu
para uma, o mesmo Ele também proíbe para
todas. E mais evidentemente ele ainda escreve
em outro lugar, levantando esta questão: ―Como
pode a mulher ser a imagem de Deus, haja vista
que (diz ele) ela é sujeita ao homem e não tem
autoridade alguma, nem para ensinar, nem para
ser testemunha, nem para julgar, muito menos
para governar ou assumir um império?31‖. Essas
são as próprias palavras de Agostinho, das
quais é evidente que este piedoso escritor não
apenas concorda com Tertuliano, antes citado,
mas também com a sentença anterior da lei, que
tira da mulher não apenas toda autoridade entre
os homens, mas também todo ofício pertencente
ao homem.

31 In quaect. veteris Testamenti, quaest. 45.


Sobre a questão de como ela pode ser a
imagem de Deus, ele responde como se segue:
―A mulher,‖ diz ele, ―comparada com as outras
criaturas, é a imagem de Deus, pois ela exerce
domínio sobre elas. Mas, comparada com o
homem, ela não pode ser chamada de imagem
de Deus, pois ela não exerce nenhum governo e
senhorio sobre o homem, mas deve obedecê-lo,‖
etc. E, como a mulher deve obedecer ao homem,
ele ainda fala mais claramente nestas palavras:
―A mulher deve estar sujeita ao homem como a
Cristo. Pois a mulher‖, diz ele, ―não tem seu
exemplo a partir do corpo e da carne para que
devesse estar sujeita ao homem, como a carne
está para o Espírito; porque a carne, na fraqueza
e mortalidade desta vida, deseja e luta contra o
Espírito, e, portanto, o Espírito Santo não daria
exemplo de sujeição à mulher em tal coisa,‖32
etc. Essa sentença de Agostinho deveria ser
notada por todas as mulheres, pois nela ele
claramente afirma que a mulher deveria estar
sujeita ao homem [de modo] que ela nunca

32 Lib. de Continentia cap. 4.


deveria desejar mais preeminência sobre ele do
que sobre Jesus Cristo.

Com Agostinho, São Jerônimo concorda


em todos os pontos, que assim escreve em seu
Os Seis Dias [Hexamerão]33: ―Adão foi
enganado por Eva, e não Eva por Adão, e por
isso é justo que a mulher receba e reconheça
como governante aquele que ela chamou a
pecar, a fim de que novamente ela não
escorregue e caia pela flexibilidade feminina‖.
Escrevendo sobre a epístola aos Efésios34, ele
diz: ―Que as mulheres sejam sujeitas aos seus
próprios maridos, como ao Senhor; porque o
marido é a cabeça da mulher, como também
Cristo é a cabeça da congregação, e ele é o
salvador do corpo: mas a congregação está
sujeita a Cristo, assim também as mulheres
devem ser em tudo sujeitas a seus maridos‖. Ele
vai além, dizendo: ―As mulheres são ordenadas
a serem sujeitas aos homens pela lei da
natureza, porque o homem é o autor ou o

33 Ambrósio, Hexaemero lib. 5. c.7.


34 Ambrósio, Ad Ephesios, 5:22-4.
iniciador da mulher: pois como Cristo é a cabeça
da igreja, assim o homem é a da mulher. De
Cristo, a igreja se iniciou, e, por isso, ela está
sujeita a Ele; assim também a mulher se inicia
do homem, a quem ela deve se sujeitar‖. Desse
modo, nós ouvimos a concordância desses dois
escritores como sendo tamanha que qualquer
homem poderia julgar que um furtou as
palavras e as sentenças do outro. E ainda está
claro que, durante o tempo de seus escritos, um
estava muito distante do outro. Mas o Espírito
Santo, que é o Espírito de concórdia e unidade,
tanto iluminou seus corações e direcionou suas
línguas e canetas, que, assim como eles
conceberam e entenderam uma só verdade,
assim eles pronunciaram e proferiram a mesma,
deixando um testemunho de seu conhecimento
e de sua concórdia para nós, sua posteridade.

Se alguém acha que todas essas sentenças


anteriores são ditas somente para a submissão
de mulheres casadas para com os seus maridos,
como antes provei o contrário pelas simples
palavras e argumentos de São Paulo, assim devo
brevemente fazer o mesmo com outros
testemunhos dos escritores supracitados. O
próprio Ambrósio, escrevendo sobre o segundo
capítulo da primeira epístola a Timóteo35, depois
de ter falado muito sobre o traje simples das
mulheres, adiciona estas palavras: ―A mulher
não deve apenas ter vestimentas simples, mas
toda autoridade deve ser negada a ela. Pois ela
deve estar em submissão ao homem (de quem
ela tem sua origem), tanto em hábito quanto em
serviço‖. E depois de algumas palavras, ele diz:
―Porque a morte entrou no mundo por ela, não
há intrepidez que seja permitida a ela, mas ela
deve estar em humildade‖. Acerca disso, está
claro que, de toda mulher, seja ela casada ou
não-casada, toda autoridade de executar
qualquer ofício que pertença ao homem é
retirada. Sim, está claro que toda mulher é
ordenada a servir, a ser humilde e submissa. O
que ainda fala o mesmo escritor mais claramente
nestas palavras36: ―não é permitido às mulheres
que falem; mas estejam sujeitas, como também

35 Ambros. super. 2. c. 1 epist. ad Timoth.


36 Ambros. in 1. epist. ad Corin. cap.14.
ordena a lei. O que ordena a lei? E o teu desejo
será para o teu marido, e ele te dominará. Essa é
uma lei especial‖, diz Ambrósio, ―cuja sentença,
para que não fosse violada, debilitada ou
enfraquecida, as mulheres são ordenadas a estar
em silêncio‖. Aqui ele inclui todas as mulheres.
Ele ainda prossegue na mesma passagem,
dizendo: ―É uma vergonha para elas presumir
falar da lei na casa do Senhor, que as ordenou
serem submissas aos seus homens‖37.

Mas mais claramente diz ele, escrevendo


sobre o capítulo 16 (v. 13) da epístola de São
Paulo aos Romanos, nestas palavras: ―Saudai a
Rufo e a sua mãe38‖. ―Por esta causa‖, diz
Ambrósio, ―o apóstolo colocou Rufo antes de
sua mãe: pela eleição da administração da graça
de Deus, na qual uma mulher não tem lugar
algum. Pois ele foi escolhido e promovido pelo
Senhor para tomar conta de Seus negócios, isto
é, sobre a igreja, ofício o qual sua mãe não

37 Rogo-lhes, deveria a casa do parlamento ser de Deus ou dos


demônios?
38 Rufo é por São Paulo saudado antes de sua mãe.
poderia ser designada, embora sendo ela uma
mulher tão santa que o apóstolo a chama de sua
mãe‖. Acerca disso está claro que a
administração da graça de Deus é negada a toda
mulher. Por administração da graça de Deus é
entendida não apenas a pregação da palavra e
administração dos sacramentos, pelos quais a
graça de Deus é apresentada e habitualmente
distribuída aos homens, mas também a
administração da justiça civil, pela qual a
virtude deve ser preservada, e os defeitos,
punidos. A execução da mesma não é menos
negada à mulher do que a pregação do
evangelho ou a administração dos sacramentos,
conforme a seguir mais claramente será dito.

Crisóstomo, entre os escritores gregos de


não pouco crédito, falando em repreensão aos
homens que, em seus dias, estavam se tornando
inferiores a algumas mulheres em inteligência e
piedade, diz39: ―Por essa causa foi posta a
mulher sob o teu poder (ele diz aos homens em

39 Crisóstomo, homil. 17. Em Gênesis.


geral), e tu foste nomeado senhor sobre ela para
que ela lhe obedecesse e para que a cabeça não
seguisse o pé. Mas, ao invés disso, nós vemos o
contrário: aquele que, por Sua ordem, deveria
ser a cabeça não mantém a ordem do pé (isto é,
não governa o pé), e ela, em seu lugar de pés, é
constituída cabeça‖. Ele diz essas palavras, por
assim dizer, em perplexidade de que o homem
havia se tornado tão inferior que não
considerava como sendo a coisa mais
monstruosa que a mulher tivesse preferência
sobre o homem em qualquer coisa, quando
Deus havia sujeitado ao homem todas as coisas.

Ele prossegue, dizendo: ―Não obstante, é


do papel do homem, com cuidado diligente,
repelir a mulher que dá a ele conselhos
perversos; e a mulher que deu esse pestilento
conselho ao homem deve em todos os tempos
ter a punição que foi dada a Eva soando em seus
ouvidos‖. E, em outra passagem, ele induz a fala
de Deus para a mulher deste modo40: ―Porque tu

40 Homil. 15 em Gênesis.
o deixaste, aquele de cuja natureza tu eras
participante, e por quem tu foste formada, e
tiveste prazer em ter familiaridade com aquela
besta perversa e tomaste o seu conselho;
portanto, eu te sujeito ao homem e nomeio-o e
afirmo-o como sendo o teu senhor, para que tu
possas reconhecer o seu domínio; e, porque tu
não poderias governar, aprenda bem a ser
governada‖. Ele declara em outras passagens
por que elas não deveriam governar, dizendo41:
―O gênero feminino é imprudente e mole (ou
flexível): imprudente porque ela não pode
considerar com sabedoria e bom senso as coisas
que ela ouve e vê; e mole porque ela é
facilmente rendida‖.

Sei que Crisóstomo traz essas palavras42


para declarar por que os falsos profetas
comumente enganam as mulheres: porque elas
são facilmente persuadidas por qualquer
opinião, especialmente se for contra Deus; e

41 Deus quer que o coração de todas as mulheres entenda e siga essa


sentença.
42 Em Mt 23, homil. 44.
porque lhes faltam prudência e bom senso para
julgar as coisas que são faladas. Mas aqui pode a
sua natureza ser descoberta junto aos defeitos
da mesma, os quais de modo algum deveriam
estar entre aqueles que são nomeados para
governar outros. Pois devem ser constantes,
estáveis, prudentes e devem fazer tudo com
discrição e bom senso, virtudes as quais as
mulheres não podem ter em equivalência com
os homens. Pois isso ele testifica em outra
passagem, dizendo: ―As mulheres têm em si
mesmas um punhado e um bom exemplo de
vanglória; o que podem ter em comum com os
homens. Elas são repentinamente movidas à
raiva; e isso elas também podem ter em comum
com alguns homens. Mas elas não têm em
comum com o homem as virtudes nas quais ele
se sobressai; e, portanto, o apóstolo removeu-as
do ofício de ensinar, o que é uma prova
evidente de que, em virtude, elas em muito se
diferem dos homens‖.

Que os argumentos desse escritor sejam


manifestos, pois posteriormente ele ainda
prossegue após ter em muitas palavras
lamentado as condutas efeminadas dos homens
que estavam tão degenerados à fraqueza das
mulheres que alguns perguntariam: ―Por que as
mulheres não poderiam ensinar entre tais tipos
de homens, os quais em sabedoria e piedade se
tornaram inferiores às mulheres?‖ Ele
finalmente conclui: ―Porque, apesar dos homens
serem degenerados, ainda assim as mulheres
não podem usurpar de qualquer autoridade
sobre eles‖43. E, no final, ele acrescenta estas
palavras: ―Essas coisas eu não falo para louvá-
las (isto é, às mulheres), mas para a nossa
confusão e vergonha e para admoestar-nos a
exercer novamente o domínio que nos é próprio
e conveniente, não apenas aquele poder que está
de acordo com a excelência da dignidade, mas o
que está de acordo com a providência e de
acordo com o auxílio e a virtude; pois, assim, o
corpo está em melhor harmonia quando melhor
é o governante‖.

43O corpo desprovido da cabeça não pode ser bem governado, nem
pode a comunidade desprovida de homem.
Oh! Que ambos, homem e mulher,
considerem o profundo conselho e admoestação
deste pai! Ele não desejaria que o homem com
desejo de qualquer vanglória desejasse a
preeminência acima da mulher. Pois Deus não
fez o homem como sendo a cabeça por qualquer
motivo, mas com respeito àquela fraqueza e
imperfeição que sempre se levanta ao deixar a
mulher governar. Ele ordenou que o homem
fosse superior; e isso Crisóstomo quer dizer
quando fala: ―Assim, o corpo está em melhor
harmonia quando melhor é o governante. Mas a
mulher nunca pode ser o melhor governante,
pela razão de que ela, sendo privada do espírito
de regimento, nunca pode atingir aquele grau a
ser chamada ou julgada uma boa governante.
Porque na natureza de toda mulher escondem-
se tamanhos vícios, os quais, em bons
governantes, não são aceitáveis‖. O mesmo
escritor expressa nestas palavras44: ―O gênero
feminino‖, diz ele, ―é imprudente e temerário; e
sua cobiça é como o abismo do inferno, isto é,

44 Em cap. 22. João. homil. 87.


insaciável‖45. E, portanto, em outra passagem,
ele deseja que a mulher não tenha nada a fazer
no julgamento, nos assuntos comuns ou no
regimento da comunidade (porque é impaciente
com os problemas), mas ela deve viver em
tranquilidade e quietude. E, se ela tem a
oportunidade de sair de casa, que ainda assim
ela não tenha qualquer tipo de problema, nem a
seguindo, nem sendo oferecido a ela, como
comumente deve acontecer com aqueles que
possuem autoridade.

Com Crisóstomo profundamente concorda


Basílio Magno46 num sermão que faz sobre
algumas passagens da Escritura, onde ele
reprova diversos vícios; e, entre o restante,
afirma que a mulher é uma criatura temerosa,
flexível, mole e deplorável; cuja natureza Deus
deu a ela para que possa estar apta a nutrir seus
filhos. Foi tal facilidade da mulher que causou o
abuso de Satanás e, portanto, retirou-a da
obediência a Deus. E, portanto, em diversas

45 Em João, Homil. 41.


46 Basilius Magnus, Aliquot Scripturæ Locos.
outras passagens, ele conclui que ela não está
apta para governar e que ela está proibida de
ensinar.

Mais inumeráveis testemunhos de todos


os tipos de escritores poderiam ser aduzidos
para o mesmo propósito, mas com esses fico
satisfeito; julgando ser suficiente para calar a
boca de tais que acusam e condenam toda
doutrina como herética, os quais se desagradam
em qualquer ponto que tenho provado pelas
determinações e leis dos homens iluminados
somente pela luz da natureza; pela ordem da
criação de Deus; pela condenação e maldição
pronunciada contra a mulher; pela boca de São
Paulo, que é o intérprete da sentença e da lei de
Deus; e, finalmente, pelos pensamentos
daqueles escritores que, na igreja de Deus, têm
sido sempre abraçados com a maior reverência:
que é a coisa mais repugnante para a natureza,
para a vontade divina e para ordenança
empregada por Deus (sim, isso não pode ser
menos do que uma contumélia cometida contra
Deus), que a mulher seja promovida ao domínio
ou ao império para reinar sobre os homens, seja
num reino, nação, província ou cidade. Agora
resta em poucas palavras ser mostrado que o
mesmo império das mulheres é a subversão da
boa ordem, da equidade e da justiça.
O IMPÉRIO DAS MULHERES
É SUBVERSIVO À BOA ORDEM, À
EQUIDADE E À JUSTIÇA

Agostinho define47 ordem como sendo


algo pelo qual Deus designou e ordenou todas
as coisas. Note bem, leitor, que Agostinho não
admitirá qualquer ordem onde a designação de
Deus esteja ausente e em falta. E em outra
passagem48, ele diz: ―pois a ordem é uma
disposição, dando os lugares adequados às
coisas que são desiguais‖, o que ele chama em
latim de parium et disparium, isto é, de coisas
iguais e semelhantes e coisas desiguais e
diferentes. A partir dessas duas passagens e de
todo o debate (que é contido em seu segundo
livro De Ordine), é evidente que qualquer coisa

47 De ordine lib. 1. c.10.


48 De ciuit. Dei, lib. 19 cap. 13.
que seja feita quer sem a certeza da vontade de
Deus ou, ainda mais, contra a Sua vontade
manifestamente revelada em Sua palavra, é
feita contra toda ordem. Tal é o império e o
regimento de todas as mulheres (como
evidentemente foi declarado); e, portanto, digo
eu, é algo simplesmente repugnante para a boa
ordem. Sim, é a subversão da mesma.

Se alguém desejar rejeitar a definição de


Agostinho como não adequada para este
propósito ou também como insuficiente para
provar meu intento, que o mesmo homem
entenda que, ao fazê-lo, não debilita meu
argumento em nada. Pois, como não dependo
de determinações dos homens, assim acho que
minha causa não se enfraquece, embora sua
autoridade seja negada a mim, desde que Deus,
por Sua vontade revelada e palavra manifesta,
permaneça clara e evidentemente ao meu lado.

Foi declarado anteriormente que Deus


sujeitou o gênero feminino ao homem pela
ordem de Sua criação e pela maldição que
pronunciou contra ela. Além disso, Ele colocou
diante de nossos olhos outros dois espelhos e
lentes, nos quais Ele quer que nós
contemplemos a ordem a qual Ele designou e
estabeleceu na natureza: o primeiro é o corpo
natural do homem; o outro é o corpo político e
civil daquela comunidade, na qual Deus, pela
Sua própria palavra, designou uma ordem.

No corpo natural do homem, Deus


designou uma ordem de que a cabeça ocupe o
lugar mais alto. E à cabeça Ele reuniu o corpo,
da qual a vida e o movimento fluem para o
restante dos membros. Nela, Ele colocou o olho
para ver, o ouvido para ouvir e a língua para
falar, cujos ofícios não são designados para
nenhum outro membro do corpo. O restante dos
membros tem cada um seu próprio lugar e ofício
designado, mas nenhum pode ter nem o lugar
nem o ofício da cabeça. Pois quem não julgaria o
corpo como sendo um monstro onde não há
cabeça alguma em eminência sobre o resto, mas
que os olhos estivessem nas mãos, a língua e a
boca embaixo da barriga, e as orelhas nos pés?
Os homens, digo eu, não deveriam apenas
julgar esse corpo como sendo um monstro, mas
firmemente poderiam concluir que tal corpo
não poderia viver por muito tempo. E não
menos monstruoso é o corpo daquela
comunidade em que uma mulher assume o
império. Pois ou é destituído de uma cabeça
legítima (como cada ato que realiza) ou há um
ídolo exaltado no lugar da verdadeira cabeça.

Chamo de ídolo aquilo que tem forma e


aparência, mas é destituído da virtude e da força
que o nome e a proporção assemelham e
prometem. Como as imagens têm rosto, nariz,
olhos, boca, mãos e pés pintados, mas o uso dos
mesmos não pode a capacidade e a arte do
homem dá-los, assim o Espírito Santo, pela boca
de Davi, nos ensina, dizendo: ―Têm boca, mas
não podem falar, olhos, mas não podem ver;
têm ouvidos, mas não podem ouvir, nariz, mas
não podem sentir cheiro; têm mãos, mas nada
podem apalpar, pés, mas não podem andar;
nem emitem som algum com a garganta‖ (Sl
115:5-7). E tal, digo eu, é todo reino e nação
onde uma mulher exerce domínio. Pois, a
despeito de Deus (Ele, em Seu juízo justo,
entrega-os a uma mente reprovável), pode um
reino, confesso eu, exaltar uma mulher com
aquela monstruosa honra a ser considerada
como cabeça. Mas impossível é ao homem e aos
anjos dar a ela as propriedades e os ofícios
perfeitos de uma cabeça legítima, pois o mesmo
Deus que negou poder à mão de falar, à barriga
de ouvir e aos pés de ver, nega à mulher o poder
de comandar o homem e retirou a sabedoria
para considerar e prover as coisas que são
proveitosas para a comunidade. Sim, afinal Ele
negou a ela, em todo caso, ser cabeça para um
homem, mas claramente pronunciou que ―o
cabeça de todo homem é Cristo, e o cabeça da
mulher é o homem‖ (1Co 11:3).

Se os homens, em uma ira cega, se


reunissem e designassem por si mesmos outro
cabeça que não Cristo Jesus (como os papistas
fizeram de seu Anticristo romano), deveria
Cristo, portanto, perder Sua própria dignidade,
ou deveria Deus dar a essa cabeça falsificada
poder para dar vida ao corpo, para ver tudo o
que possa pô-lo em perigo ou feri-lo, para falar
em defesa e ouvir o pedido de todo súdito? Está
certo que Ele não faria. Pois essa honra Ele
designou antes de todos os tempos ao Seu único
Filho; e a mesma Ele não dará a nenhuma
criatura em Seu lugar. Não mais admitirá ou
aceitará Ele a mulher como sendo a cabeça
legítima sobre o homem, ainda que o homem,
o diabo ou os anjos conjurem em seu favor.
Haja vista que Ele a sujeitou a um (como antes
foi dito), Ele nunca permitirá que ela reine sobre
muitos. Visto que Ele a ordenou ouvir e
obedecer a um, Ele não suportará que ela fale e,
com autoridade, comande reinos e nações.

Crisóstomo, explicando estas palavras do


apóstolo: ―O cabeça da mulher é o homem‖
(1Co 11:3), compara Deus em Seu regimento
universal com um rei assentado em sua
majestade real, à qual todos os seus súditos,
ordenados a dar-lhe reverência e obediência,
comparecem diante dele tendo, cada um, um
distintivo e reconhecimento da dignidade e da
honra assim como ele os deu; distintivo o qual,
se desprezarem e desdenharem, então desonram
ao seu rei. ―Assim‖, diz ele, ―deve o homem e a
mulher comparecer diante de Deus, sustentando
as insígnias da condição que receberam dEle. O
homem recebeu certa glória e dignidade sobre a
mulher; e, portanto, deve ele comparecer diante
de Sua Alta Majestade sustentando o sinal de
sua honra, não tendo qualquer cobertura sobre
sua cabeça, para testificar que, na terra, o
homem não tem cabeça alguma [sobre si]‖49.
Tenha cuidado, Crisóstomo, com o que diz! Tu
poderás ser reputado um traidor se os ingleses
lhe ouvirem, pois eles necessitam de minha
soberana senhora e mestra; e a Escócia bebeu
também do encantamento e do veneno das
Circes50 – que isso seja para sua própria
vergonha e confusão.

Ele prossegue nestas palavras: ―Mas a


mulher deve estar coberta, para testificar que,

49Note a semelhança em Crisóstomo (1Co 11:7-11 e Homilia 26).


50Na mitologia grega, Circe era uma feiticeira especialista em
venenos e drogas [N. do T.].
na terra, ela tem um cabeça, que é o homem‖.
Isso é verdade, Crisóstomo, a mulher está
coberta em ambos ditos reinos51, mas não com
um sinal de submissão, mas com o sinal de
superioridade, a saber: com a coroa real. A isso
ele responde nestas palavras: ―E se o homem
negligenciar sua honra? Ele não deve ser menos
escarnecido‖, diz Crisóstomo, ―do que um rei
que se destitui de seu diadema ou de sua coroa e
de sua posição real e veste a si mesmo com as
roupas de um escravo‖. O que, rogos-lhes, esse
piedoso pai diria se visse todos os homens de
um reino ou nação se ajoelhando diante de uma
mulher? Se ele visse a coroa, o cetro e a espada,
que são insígnias da dignidade real, dados a ela,
uma mulher amaldiçoada por Deus, feita
submissa ao homem, colocada no trono da
justiça para se assentar como a comissária de
Deus? O que, digo eu, neste aspecto teria um
coração sinceramente temente a Deus julgado de
tais homens? Estou certo de que não apenas
teriam sido julgados tolos, mas também loucos e

51 Isto é, os reinos da Inglaterra e da Escócia [N. do T.].


escravos de Satanás, manifestamente lutando
contra Deus e Sua ordem designada.

Quanto mais considero a subversão da


ordem de Deus, à qual Ele colocou em geral
todas as coisas vivas, mais me admiro da
cegueira do homem que não considera a si
mesmo, neste caso, tão degenerado que as feras
selvagens são preferíveis a ele. Pois a natureza
estampou em todos os animais uma
determinada marca de domínio no macho e uma
determinada sujeição na fêmea, a qual
permanece inviolada por eles. Pois nenhum
homem já viu o leão obedecer e inclinar-se ante
à leoa; nem ainda pode ser provado que a cerva
toma a direção do rebanho entre os cervos. E
mesmo assim (que tristeza!) o homem que, pela
boca de Deus, tem domínio designado para si
sobre a mulher, não apenas para a sua própria
vergonha ajoelha-se para a obediência às
mulheres, mas também, a despeito de Deus e de
Sua ordem designada, alegra-se e preserva essa
monstruosa autoridade como uma coisa
legítima e justa. A alegria insolente52, as
fogueiras e os banquetes que aconteceram em
Londres e em outro lugar da Inglaterra, onde
aquela maldita Jezabel foi proclamada rainha,
testificaram ao meu coração que os homens se
tornaram mais do que tolos; pois, de outra
forma, como poderiam ter tanta alegria em sua
própria confusão e destruição na certa? Pois
qual homem houve de tão vil julgamento
(supondo que ele tenha alguma luz de Deus)
que não visse o surgimento desse monstro
como sendo a queda da verdadeira religião e a
destruição certa da Inglaterra e das antigas
liberdades da mesma? E ainda, mesmo assim,
todos os homens assim triunfaram, como se
Deus os tivesse libertado de toda calamidade.

“Mas justos e retos, terríveis e temíveis, são os


teus juízos, Oh Senhor! Pois como algumas vezes
castigaste os homens por ingratidão – onde o homem
não se envergonhou de cometer perversidade com o
homem, e por isso, tendo conhecido a Deus, não o
glorificaram como Deus (Rm 1:21-22) – mesmo
52 A qual trará súbito sofrimento.
assim tens mais justamente agora punido a orgulhosa
rebelião e a horrível ingratidão dos reinos da
Inglaterra e da Escócia. Pois, quando ofereceste-te a
Ti mesmo mais misericordiosamente a ambos,
oferecendo os meios pelos quais eles deveriam se
juntar para sempre em harmonia piedosa, foi um
[reino] orgulhoso e cruel, e o outro inconstante e
instável na promessa.

“Mas (que tristeza!) miseravelmente a


Inglaterra ainda mais se rebelou contra Ti. Pois,
embora Tu não tenhas cessado de acumular benefícios
sobre benefícios durante o reinado de um inocente e
tenro rei, ainda assim nenhum homem reconheceu
Tua potente mão e maravilhosa obra. A intrépida
coragem dos capitães, a destreza e prudência
dos conselheiros e a erudição dos bispos
roubaram-Te Tua glória e honra. Pois o que
depois foi ouvido como relativo à religião a não ser
que „os procedimentos do rei devem ser obedecidos?
Ela é decretada pelo parlamento, portanto, é traição
falar em contrário‟.
“Mas este não foi o final desta miserável
tragédia. Pois Tu ainda prosseguiste em oferecer-
lhes Teus favores, enviando Teus profetas e
mensageiros para clamar por reforma de vida
em todas as posições. Pois, mesmo os mais altos
aos mais baixos, todos decaíram de Ti (sim, até
mesmo aqueles que eram as lanternas para outros).
Alguns, tenho certeza, estremeceram e tremeram, e,
no fundo de seus corações, tinham sede de reforma, e,
pelo mesmo propósito, fervorosamente clamavam por
disciplina. Mas, então, irrompeu-se o veneno que
antes escondia-se; logo não puderam conter suas
violentas vozes, mas com bocas abertas clamavam:
„Nós não aceitaremos este tal reinando sobre nós‟.
Então, digo eu, eram os homens tão fortes que não
poderiam ser levados à escravidão? Não, não para Ti,
Oh Senhor. Mas, com desdém, o povo eliminou de
sobre si o amável jugo de Cristo Jesus. Nenhum
homem suporta que o seu pecado seja
repreendido; nenhum homem quer que sua vida
seja chamada à provação. E, assim, eles
recusaram a Ti, Oh Senhor, e Teu Filho Cristo Jesus
em ser seu pastor, protetor e soberano. E, portanto,
Tu deste a eles uma mente reprovável. Tu tiraste
deles o espírito de firmeza, de sabedoria e de reto
juízo. Eles veem sua própria destruição e, ainda
assim, não têm qualquer graça para evitá-la. Sim, eles
estão se tornando tão cegos que, conhecendo o
abismo, precipitadamente se lançam ao mesmo,
como a nobreza da Inglaterra nestes dias, lutando em
defesa de seu inimigo mortal, os espanhóis.

“Finalmente, estão tão destituídos de


conhecimento e de juízo que, apesar de saberem que
existe uma liberdade e libertação que seus
predecessores gozaram, eles ainda são compelidos a
dobrar seus pescoços sob o jugo de Satanás, de sua
orgulhosa mestra, de pestilentos papistas e de
orgulhosos espanhóis. E ainda não podem considerar
que onde uma mulher reina e papistas exercem
autoridade é onde Satanás deve ser presidente e
conselheiro. Assim Tu tens, Oh Senhor, em Teu
furor, vingado a desdém às Tuas oferecidas graças”.

CONFISSÃO
“Mas, Oh Senhor, se mantiveres a ira até o
fim, qual carne seria capaz de suportar? Nós temos
pecado, Oh Senhor, e não somos dignos de ser
aliviados. Mas digno és, Oh Senhor, de ser um Deus
verdadeiro, e digno é o Teu Filho Cristo Jesus de ter
Seu evangelho e glória em avanço, ambos os quais
estão trilhados no chão desses cruéis assassinatos e
perseguições que os edificadores da Babilônia
cometem em sua fúria [e] têm se levantado contra
Teus filhos para o estabelecimento de seu reino. Que
os lamentos, portanto, de Teus prisioneiros, Oh
Senhor, suba aos Teus ouvidos; considere sua aflição;
e que os olhos de Tua misericórdia se inclinem para o
sangue dos que morreram por testemunhar de Tua
eterna verdade; e não deixe que Teus inimigos
zombem de Teus juízos para sempre. A Ti, Oh
Senhor, inclino meu miserável e perverso coração; a
Ti somente direciono minha queixa e meus gemidos;
pois, naquela ilha, aos Teus santos não há conforto”.

Embora eu tenha assim (falando com meu


Deus na angústia de meu coração)
digressionado um pouco, ainda não esqueci
totalmente minha principal proposição, a saber:
que é uma coisa repugnante para a ordem da
natureza que qualquer mulher seja exaltada
para governar sobre os homens. Pois Deus
negou a ela o ofício de cabeça. E, tratando dessa
parte, lembro-me de que tenho tornado a
nobreza de ambas, Inglaterra e Escócia,
inferiores a feras selvagens, pois fazem às
mulheres aquilo que nenhum macho entre o
tipo comum de animais pode ser provado fazer
às suas fêmeas, isto é, eles as reverenciam e
tremem em sua presença; obedecem aos seus
comandos, e isso contra Deus. Portanto, julgo-os
não somente submissos às mulheres, mas
escravos de Satanás, servos da iniquidade.

Se algum homem pensa que essas minhas


palavras são afiadas e fortes, que considere que
a ofensa é mais hedionda do que pode ser
expressa em palavras. Pois, onde todas as coisas
são expressamente resolvidas contra a glória e
honra de Deus e onde o sangue dos santos de
Deus é ordenado a ser derramado, quem
deveríamos julgar ser o presidente de tal
concílio? Deus ou o diabo? Claro está que Deus
não governa por Seu amor, misericórdia, nem
graça na assembleia dos impiedosos; então
resta ao diabo, o príncipe deste mundo, reinar
sobre tais tiranos. Quais dos servos, rogo-lhes,
deverão ser julgados por obedecer e executar
sua tirania? Que Deus, por Suas grandes
misericórdias, ilumine os olhos dos homens
para que possam notar para qual miserável
escravidão foram levados pelo monstruoso
império de mulheres!

O segundo espelho que Deus colocou


diante dos olhos do homem no qual se pode
contemplar a ordem que agrada à Sua sabedoria
(acerca da autoridade e do domínio) é a
comunidade a qual agradou à Sua Majestade
designar e dar leis, estatutos, ritos e cerimônias,
não apenas referentes à religião, mas também no
tocante à política e ao regimento da mesma. E,
contra essa ordem, Ele manifestamente repugna
que qualquer mulher possa ocupar o trono de
Deus, isto é, o assento real que Ele, por Sua
palavra, designou ao homem, como está
evidente ao dar a lei para Israel referente à
eleição de um rei. Pois assim está escrito: ―E
disseres: Porei sobre mim um rei, assim como
têm todas as nações que estão em redor de mim;
Porás certamente sobre ti como rei aquele que
escolher o Senhor teu Deus; dentre teus irmãos
porás rei sobre ti; não poderás pôr homem
estranho sobre ti, que não seja de teus irmãos‖
(Dt 17:14-15). Aqui expressamente um homem é
designado para ser rei escolhido, e um homem
nativo entre eles; de cujo preceito todas as
mulheres e todos os estrangeiros estão
excluídos.

O que pode ser contestado quanto à parte


ou a eleição de um estrangeiro deverá ser, se
Deus quiser, respondido no Soar da Segunda
Trombeta. Pois neste presente [momento], digo
eu, o levante de uma mulher para esta honra
não apenas inverte a ordem que Deus
estabeleceu, mas também contamina, polui e
profana (tanto quanto as mentiras do homem) o
trono e o assento de Deus, o qual Ele santificou
e designou somente ao homem no curso desta
miserável vida ocupar e possuir como Seu
ministro e comissário, excluindo do mesmo
todas as mulheres, como antes é expresso.
RESPOSTA A UMA OBJEÇÃO
Se alguém acha que a lei escrita
anteriormente restringe-se somente aos judeus,
que o mesmo considere que a eleição de um rei
e a designação de juízes nem se referem à lei
cerimonial nem ainda eram meramente
judiciais, mas fluíam da lei moral, como uma
ordenança em respeito à conservação de ambas
as tábuas. Pois o ofício de um magistrado deve
ter respeito primeira e principalmente à glória
de Deus, como ordenada e contida na primeira
tábua, e é evidente por aquilo que foi
encarregado a Josué no tempo em que foi aceito
e admitido legislador e governante sobre seu
povo, nestas palavras:

―Tu dividirás a herança a este povo, a qual jurei a


seus pais lhes daria; tão somente esforça-te e tem
mui bom ânimo, para teres o cuidado de fazer
conforme a santa lei que meu servo Moisés te
ordenou. Dela não te desvies, nem para a direita
nem para a esquerda, para que prudentemente te
conduzas por onde quer que andares. Não se
aparte da tua boca o livro desta lei53; antes medita
nele dia e noite, a fim de que possas observar e
fazer de acordo com tudo o que nele está escrito,
porque então farás próspero o teu caminho, e
serás bem-sucedido‖ (Js 1:1-9).

Deus dá o mesmo preceito pela boca de


Moisés aos reis, depois que fossem eleitos,
nestas palavras:

―E acontecerá que, quando ele se assentar no


trono do seu reino, ele escreverá para si uma
cópia desta lei em um livro [...] e ficará com ele, e
ele o lerá todos os dias de sua vida, para que
possa aprender a temer o SENHOR seu Deus, e
guardar todas as palavras desta lei e estes
estatutos, para fazê-los‖, etc. (Dt 17:18-20).

Nessas duas passagens fica evidente que


principalmente compete ao rei, ou aos
magistrados principais, conhecer a vontade de
Deus para serem instruídos em Sua lei e
estatutos e para promover Sua glória com todo o

53 Os governantes devem dar atenção a isso.


coração e entendimento, os quais são os pontos
principais da primeira tábua.

Nenhum homem nega que a espada é


confiada ao magistrado para o fim de que ele
possa punir o vício e manter a virtude. Punir o
vício, digo eu, não apenas aqueles que
perturbam a tranquilidade e o estado tranquilo
da comunidade (como o adultério, o roubo ou o
assassinato cometidos), mas também aqueles
vícios que abertamente impugnam a glória de
Deus, como a idolatria, a blasfêmia, a heresia
manifesta, ensinada e mantida
obstinadamente, como os atos históricos e
notáveis de Ezequias, Jeosafá e Josias nos
ensinam claramente; cujo entendimento e
intenção não eram apenas glorificar a Deus em
suas próprias vidas e atitudes, mas também
sinceramente labutaram para trazer seus súditos
para a verdadeira adoração e honra a Deus;
destruíram todos os monumentos de idolatria,
puniram à morte os que ensinavam [a idolatria]
e removeram do ofício e honras os que
mantinham tais abominações. Pelo que suponho
estar evidente que o ofício de um rei, ou
magistrado supremo, diz respeito à lei moral e à
conservação de ambas as tábuas.

Ora, se a lei moral é a vontade constante e


imutável de Deus, à qual os gentios não estão
menos sujeitos do que eram os judeus; e se é a
vontade de Deus que, entre os gentios, os
ministros e executores de Sua lei sejam agora
designados como certas vezes foram designados
entre os judeus; ainda, se a execução da justiça
não é menos necessária na política dos gentios
do que era entre os judeus, qual homem seria
tão tolo de supor ou acreditar que Deus
admitirá agora que tais pessoas se assentem em
julgamento ou reinem sobre os homens na
comunidade dos gentios, as quais Ele por Sua
palavra e ordenança expressas antes negou e
excluiu dos mesmos? A ordem e a eleição que
foram mantidas em Judá e Israel
manifestamente declaram que as mulheres
foram excluídas do assento real, o qual deveria
ser um santuário para todos os pobres aflitos e,
por isso, é justamente chamado o assento de
Deus (além da passagem antes citada sobre a
eleição de um rei e das passagens do Novo
Testamento, que são mais evidentes). Pois, onde
os homens de uma linhagem real fracassam,
todas as vezes que isso acontecia em Israel e
algumas vezes em Judá, nunca penetrou no
coração do povo escolher e promover às honras
qualquer uma das filhas do rei (mesmo se
houvesse muitas); mas, sabendo que a vingança
de Deus havia sido derramada sobre o pai ao
eliminar seus filhos, eles não tinham mais
respeito à sua linhagem, mas elegiam esse ou
aquele homem que julgavam ser mais aptos
para aquela honra e autoridade. Por meio de tais
premissas, concluo (como antes) que promover
uma mulher cabeça sobre homens é repugnante
para a natureza e a coisa mais contrária a essa
ordem que Deus aprovou na comunidade que
Ele instituiu e governou por Sua palavra.

Ora, ao último ponto, a saber: que o


império de uma mulher é uma coisa repugnante
para a justiça e a destruição de toda comunidade
onde ele é aceito. Na comprovação desse ponto,
porque o assunto é mais do que evidente, usarei
poucas palavras.

Primeiramente, digo que se a justiça é


uma vontade constante e perpétua de dar a
cada pessoa seu próprio direito (como a
maioria aprendeu em todas as eras como sendo
assim definida), então, dar ou ter vontade de dar
a qualquer pessoa aquilo que não é seu direito
deve repudiar a justiça. De fato, reinar sobre o
homem nunca pode ser direito de uma mulher,
pois isso é uma coisa negada a ela por Deus,
como foi anteriormente declarado. Portanto,
promover [a mulher] a esse estado ou
dignidade não pode ser nada mais do que uma
repugnância à justiça. Se eu não falasse mais,
isso seria suficiente. A não ser que possam
aprimorar a definição de justiça ou então rogar a
Deus para revogar e abolir Sua sentença
pronunciada contra a mulher, devem ser
compelidos a admitir a minha conclusão.

Se alguém acha falha na justiça como é


definida, ele bem pode acusar a outros, mas a
mim não poderá ofender, pois tenho o escudo, a
arma e a garantia dAquele que certamente me
defenderá nesta desavença; e Ele me ordena a
clamar: “Seja o que for que repugne a vontade
de Deus, expressa em Sua mais sagrada
palavra, repugna a justiça; que mulheres
tenham autoridade sobre homens repugna a
vontade de Deus expressa em Sua palavra;
logo, meu Autor me ordena a concluir, sem
temor, que tal autoridade repugna a justiça”. A
primeira parte do argumento, confio eu, nem
judeus nem gentios ousam negar; pois é um
princípio não apenas universalmente confesso,
mas também tão profundamente impresso no
coração do homem, estando sua natureza não
tão corrompida, que, quer queira ou não, ele é
compelido um momento ou outro a entender e
confessar que a justiça é violada quando as
coisas são feitas contra a vontade de Deus,
expressa por Sua palavra. E a essa confissão o
réprobo é não menos coagido e constrangido do
que os filhos de Deus, embora para um fim
diverso.
Os eleitos, com desagrado de seu feito,
confessam sua ofensa, tendo acesso à graça e
misericórdia, como fez Adão, Davi, Pedro e
todos os outros infratores arrependidos. Mas os
réprobos, mesmo sendo compelidos a
reconhecer a vontade de Deus como sendo
justa, a qual têm ofendido, ainda assim nunca
se desagradam interiormente com a sua
iniquidade, mas enfurecem-se, queixam-se e
bramam contra Deus, de cuja vingança não
podem escapar – como fez Caim, Judas,
Herodes, Juliano [chamado] o apóstata, sim,
Jezabel e Atália (Gn 4:9-12; Mt 27:3-5). Pois
Caim, sem dúvida, estava convicto em
consciência de que havia agido contra a justiça
no assassinato do seu irmão. Judas confessou
abertamente ante o sumo sacerdote que havia
pecado em trair sangue inocente. Herodes,
sendo acometido pelo anjo, zombou de seus
aduladores, dizendo a eles: ―Contemplem o seu
deus‖ (significando ele mesmo) ―que agora não
pode se preservar da corrupção e vermes‖.
Juliano foi compelido em seu fim a clamar: ―Oh,
Galileu!‖ (como sempre com desprezo nomeou
nosso Salvador Jesus Cristo) ―Tu venceste
agora‖. E quem duvida que Jezabel e Atália,
antes de seus fins miseráveis, foram condenadas
em suas consciências infectadas a entender que
o assassinato que haviam cometido e o império
que uma delas havia usurpado por seis anos
eram repugnantes à justiça? Mesmo assim,
deverão, não duvido, aqueles que neste dia
conservam e apoiam tal autoridade monstruosa
das mulheres em breve ser compelidos a
entender que seus entendimentos e planos têm
sido contra Deus e que toda autoridade que as
mulheres têm usurpado repugna a justiça; pois,
como tenho dito, ela repugna a vontade de Deus
expressa em Sua palavra sagrada.

E se algum homem duvida acerca disso,


que note bem as palavras do apóstolo, que diz:
―Não permito que a mulher ensine, nem ainda
usurpe de autoridade sobre o homem‖ (1Tm
2:12). Nenhum homem, confio eu, negará que
essas palavras do apóstolo são a vontade de
Deus expressa em Sua palavra; e ele diz
abertamente: ―Não permito‖, etc., o que é
equivalente a: ―Não vou [permitir]‖ que uma
mulher tenha autoridade, comando ou poder
sobre o homem; pois muito importa a palavra
grega authentein nesta passagem. Ora, que
homens e anjos conspirem contra Deus; que eles
pronunciem suas leis e digam: ―Nós apoiaremos
que mulheres assumam autoridade; quem então
as poderá destituir?‖. Ainda assim, essa única
palavra do Deus eterno, falada pela boca de um
frágil homem, deve lançar cada um deles no
inferno (Ap 2:20-23). Jezabel pode por um
tempo dormir silenciosamente na cama da sua
fornicação e prostituição; ela pode ensinar e
enganar por um momento; mas nem ela nem
ainda seus filhos adúlteros podem preservar-se
da grande aflição e da espada da vingança de
Deus, os quais devem em breve apreender tais
obras de iniquidade. Adio a admoestação para o
final.

Aqui eu poderia levantar [em questão] a


opressão e a injustiça que é cometida contra
reinos e nações, que certas vezes viveram livres
e agora são levados à escravidão por nações
estrangeiras por razão do monstruoso império e
autoridade das mulheres. Mas isso adio para
uma melhor oportunidade. Agora penso ser
oportuno responder tais objeções que homens
carnais e mundanos, sim, homens ignorantes de
Deus, usam para a manutenção dessa tirania
(autoridade que não é digna de assim ser
chamada) e do mais injusto império de
mulheres.
OBJEÇÕES COMUNS
RESPONDIDAS

A DEFESA DOS ADVERSÁRIOS


1. Em primeiro lugar, contestam-se os
exemplos de Débora e de Hulda, a profetiza,
onde uma julgou Israel, e outra, ao que parece,
ensinou e exortou (Jz 4; 2Cr 34:20-28).
2. Em segundo lugar, contesta-se a lei feita
por Moisés para as filhas de Zelofeade (Nm
27:1-12).
3. Em terceiro lugar, o consentimento dos
estados de tais reinos que aprovaram o império
e o regimento de mulheres.
4. E último, o costume antigo de aceitar o
regimento de mulheres, seus valentes atos de
prosperidade, junto a algumas leis papistas que
confirmam o mesmo.
UMA RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO
À primeira, respondo que exemplos
particulares não estabelecem qualquer lei
comum. As causas são conhecidas somente por
Deus por que Ele tirou o espírito de sabedoria e
força de todos os homens daquelas eras e tão
dignamente auxiliou mulheres contra a natureza
e contra Seu curso normal; a uma Ele fez
libertadora de Seu aflito povo de Israel, e a outra
Ele deu não apenas perseverança na verdadeira
religião, quando a maior parte dos homens
havia declinado da mesma, mas também a ela
deu o espírito de profecia para assegurar o rei
Josias das coisas que estavam por vir. Com essas
mulheres, digo, Deus agiu poderosa e
miraculosamente; sim, a elas deu a mais
singular graça e privilégio.

Mas quem ordenou que uma lei pública,


sim, tirânica e mais perversa seja estabelecida
com base nesses exemplos? Os homens que
fazem essa objeção não são de todo ignorantes
que os exemplos não têm força alguma quando
a questão é de lei. Como se eu perguntasse:
―Qual casamento é lícito?‖ e fosse respondido
que ―é lícito ao homem não apenas ter muitas
esposas de uma vez, mas também é lícito casar
com duas irmãs e desfrutá-las ambas vivas de
uma só vez porque Davi, Jacó e Salomão, servos
de Deus, assim o fizeram‖. Confio que nenhum
homem justificaria a vaidade desse raciocínio.
Ou se questão fosse feita se um cristão, com uma
boa consciência, poderia defraudar, roubar ou
enganar, e resposta fosse dada de que ele
poderia através dos exemplos dos israelitas,
que, sob a ordenação de Deus, enganaram os
egípcios e roubaram seus trajes, ouro e prata.
Julgo, de igual forma, que esse raciocínio
deveria ser ridicularizado.

E que maior força, rogo-lhes, tem o


argumento anterior: ―Débora julgou Israel e
Hulda profetizou em Judá; logo é lícito que as
mulheres reinem sobre reinos e nações, ou
ensinem na presença de homens‖? A lógica é vã,
e sem qualquer efeito. Pois de exemplos, como
foi declarado antes, não podemos estabelecer
qualquer lei, mas somos sempre sujeitos à lei
escrita e ao comando expresso na mesma. E a
lei escrita e pronunciada por Deus proíbe que
qualquer mulher reine sobre o homem não
menos do que proíbe que o homem tenha uma
pluralidade de esposas, se case com duas irmãs
vivas de uma vez, roube, assassine ou minta. Se
qualquer uma dessas proibições foi transgredida
e mesmo assim Deus não acusou a mesma, isso
não torna a mesma um fato ou um ato lícito a
nós. Pois Deus (sendo livre) pode, pelas causas
que são aprovadas por Sua sabedoria
inescrutável, suprimir o rigor de Sua lei e pode
usar Suas criaturas conforme Sua vontade. Mas
o mesmo poder não é permitido ao homem, o
qual Ele fez sujeito à Sua lei e não aos exemplos
dos pais. E isso acredito ser suficiente aos
espíritos sensatos e moderados.

Mas, para reprimir a ferocidade da


loucura da mulher, descerei um tanto mais
profundo neste assunto; não temerei em afirmar
que, porque encontramos um espírito contrário
em todas essas mais perversas mulheres (que
este dia são exaltadas a essa autoridade tirânica)
ao espírito que estava nestas piedosas matronas,
assim, digo eu, não temo em afirmar que a
condição delas é diferente, e que o seu fim
deverá ser diverso54. Nessas matronas,
percebemos que o espírito de misericórdia,
verdade, justiça e humildade reinava. Sob elas,
percebemos que Deus mostrou misericórdia ao
Seu povo, libertando-o da tirania de
estrangeiros e do veneno da idolatria pelas
mãos e conselho dessas mulheres. Mas nestas
de nossa época encontramos crueldade,
falsidade, orgulho, cobiça, engano e opressão.
Nelas também encontramos o espírito de Jezabel
e Atália; sob elas, o povo simples encontra-se
oprimido, a verdadeira religião, extinguida, e o
sangue dos membros de Cristo, o mais
cruelmente derramado; e, finalmente, pelas suas
práticas e fraudes, encontramos reinos e nações
antigos dados e traídos nas mãos de

54Segundo o argumento de Knox, as mulheres que se exaltavam


como cabeças de seus países tinham um espírito contrário ao das
mulheres que Deus havia usado em Seu povo de Israel. Dirigindo-
se à rainha Elizabeth, Knox confirma a sua tese, dizendo que seu
comportamento deveria ser como o de Débora, usando todo o
poder que Deus, por misericórdia e contra a ordem natural, lhe
havia dado, para a causa protestante. Ver Apêndices [N. do T.].
estrangeiros, seus títulos e liberdades retirados
dos seus devidos possuidores. Um testemunho
evidente do quão diferente nossa perniciosa
Maria é de Débora, sob quem foram os
estrangeiros expulsos de Israel, é que Deus a
levantou para ser uma mãe e libertadora de seu
povo oprimido. Mas (que tristeza!) Ele levantou
tais Jezabeis para serem o ápice de Suas pragas,
as quais a ingratidão do homem tanto merece.
Mas Seu julgamento secreto e mais justo nem
deverá exonerar a elas nem a seus apoiadores,
pois seus conselhos são diferentes.

Mas, para prosseguir com meu propósito,


deixe que os que, como relatado, defendem
esses monstros em sua tirania, provem,
primeiro, que suas mestras soberanas são como
Débora em piedade e devoção; e,
segundamente, que o mesmo sucesso que segue
sua tirania seguiu o extraordinário regimento
daquela piedosa matrona. O que, ainda que
fossem capazes de fazer (como nunca serão,
que se inflem até que se explodam!), mesmo
assim o seu exemplo não as beneficia em nada.
Pois nunca serão capazes de provar que Débora
ou qualquer outra mulher piedosa (tendo o
comando do Espírito Santo dentro das
Escrituras), tenham usurpado de autoridade
sobre qualquer reino ou nação por razão de seu
nascimento e sangue; nem ainda reivindicaram-
no por direito ou herança; mas Deus, por Seu
singular privilégio, favor e graça, liberou
Débora da maldição comum dada às mulheres
naquele sentido; e, contra a natureza, Ele a
tornou prudente em conselho, forte em
coragem, bem-aventurada no regimento e uma
bendita mãe e liberadora para o Seu povo. O
que fez Ele em parte para promover e divulgar
o poder de Sua majestade tanto aos Seus
inimigos quanto ao Seu próprio povo, no que
Ele declarou a Si mesmo capaz de trazer
salvação e libertação por meio dos mais frágeis
vasos; e em parte para confundir e envergonhar
todos os homens daquela época, pois haviam
em sua maior parte declinado de Sua verdadeira
obediência. E, portanto, foi o espírito de
coragem, regimento e firmeza retirado deles por
um tempo, para a sua confusão e maior
humilhação.

Mas o que isso tem a ver com Maria e com


seu companheiro Filipe55? Uma coisa eu
perguntaria a tais que confiam no exemplo de
Débora: era ela viúva ou esposa quando julgou
Israel e quando Deus deu aquela notável vitória
ao Seu povo sob ela? Se respondessem que ela
era viúva, dispensarei contra eles o testemunho
do Espírito Santo, testificando que ela era esposa
de Lapidote (Jz 4:4). E se eles mudassem e
alegassem que ela poderia ter sido chamada
assim a despeito de seu marido estar morto:
exorto-os ainda mais de que não são capazes de
provar como sendo uma frase comum ou uma
maneira de falar nas Escrituras que uma mulher
seja chamada esposa de um homem morto,
exceto que haja alguma nota adicionada, onde
possa ser entendido que o seu marido estava

55Maria I se casou com Filipe II da Espanha, estendendo os limites


do domínio do monarca espanhol também a Inglaterra, não fosse
por sua morte repentina e entrega do reino à sua irmã Elizabeth,
que nunca se casou [N. do T.].
morto, como é testificado sobre Ana (Lc 2:36-37).
Mas nesta passagem de Juízes, não há nenhuma
nota adicionada de que o seu marido estivesse
morto, mas, ao invés, o contrário é expresso.
Pois o texto diz: ―E Débora, mulher profetisa,
mulher de Lapidote, julgava a Israel naquele
tempo‖ (Jz 4:4). O Espírito Santo claramente
diz que, no tempo em que julgou Israel, ela era
mulher de Lapidote. Se ela era sua esposa, e se
ela julgou Israel sozinha, então pergunto: ―Por
que ela não preferiu dar ao seu marido a honra
de ser chefe e de ser líder da tropa do Senhor?‖.
Se alguém achar que foi [dado a] seu marido, o
texto prova o contrário; pois afirma que
Baraque, da tribo de Naftali, foi nomeado para
esse ofício. Se Baraque tivesse sido seu marido,
com qual propósito o Espírito Santo tão
diligentemente teria explicitado a tribo e outro
nome diferente do que foi citado antes? Sim,
para que propósito seria citado que ela o enviou
e o chamou?

Assim, não duvido que todo homem


sensato considere que esse Baraque não era seu
marido; e a partir disso, igualmente, é evidente
que o julgamento ou governo dela em Israel não
era tamanha usurpação de poder como nossas
rainhas injustamente possuem nestes dias; mas
era um espírito de profecia que estava sobre ela
nas vezes em que a multidão do povo havia
agido perversamente aos olhos do Senhor; por
cujo espírito ela repreendeu a idolatria e a
iniquidade do povo, exortou-os ao
arrependimento e, no final, trouxe-os este
conforto: que Deus os libertaria da escravidão e
da servidão de seus inimigos. E isso ela poderia
fazer a despeito de que outro ocupasse o lugar
de magistrado supremo (se houvesse algum
naqueles dias em Israel), pois assim noto que
Hulda, a esposa de Salum, nos dias de Josias, rei
de Judá, profetizou e confortou o rei (2Rs 22:14);
e mesmo assim ele não a designou nem ao cetro
nem à espada.

Essa nossa interpretação de como Débora


julgou em Israel é a verdadeira interpretação do
Espírito Santo, a ponderação e a pesagem da
história poderão manifestamente provar.
Quando ela chamou Baraque, rogo-lhes, em
qual nome deu a ele seu cargo? Ela fala com ele
como reis e príncipes costumam falar com seus
súditos em tais casos? Não, mas fala como se
tivesse uma revelação especial de Deus, a qual
nem era conhecida por Baraque nem pelo povo,
dizendo: ―Porventura o Senhor Deus de Israel
não deu ordem‖? (Jz 4:6). Essa é a sua
introdução, pela qual ela pôde fomentar os
sentidos embotados de Baraque e do povo,
disposta a persuadir-lhes de que o tempo havia
chegado em que Deus se mostraria seu Protetor
e Libertador; em cuja introdução ela não usurpa
para si mesma nem poder nem autoridade. Pois
não diz: ―Eu, sendo tua princesa, tua mestra, tua
senhora e rainha soberana, ordeno-te obediência
e, sob pena de traição, a ir e reunir um exército‖.
Não, ela elimina de si todo o poder de
comandar, atribuindo essa autoridade a Deus,
de quem ela recebeu sua revelação e sua certeza
de designar Baraque por capitão, o que se torna
visível mais claramente depois. Pois, quando ela
declara a ele todo o conselho de Deus,
designando-o tanto o número de soldados
quanto as tribos das quais eles deveriam ser
reunidos; e quando ela designa o lugar da
batalha (o que ela não poderia ter feito sem uma
revelação especial de Deus) e assegura-o da
vitória no nome de Deus; ainda ele enfraquece e
abertamente se recusa a entrar naquela jornada
a não ser que a profetiza o acompanhasse; ela
não usou contra ele qualquer poder externo, não
o ameaçou com rebelião e morte. Mas, para a
firmeza de seu fraco coração e de sua frágil
consciência, estando satisfeita em ir com ele,
pronunciou que a glória não seria dele naquela
jornada, mas que o Senhor entregaria Sísera nas
mãos de uma mulher.

Aqueles que têm mais prazer na luz do


que nas trevas podem claramente perceber que
Débora não usurpou de tal poder nem de tal
autoridade, como nossas rainhas neste dia
reivindicam, mas que ela estava revestida com o
espírito de sabedoria, de conhecimento e de
verdadeiro temor a Deus, e pelo mesmo ela
julgou os fatos do restante do povo. Ela
repreendeu sua deserção e idolatria, sim, e
também reparou com seu poder as injúrias que
eram feitas de homem a homem. Mas tudo isso,
digo eu, ela fez pela espada espiritual, isto é,
pela palavra de Deus, e não por qualquer
regimento ou autoridade temporal que ela
usurpasse sobre Israel, o qual, suponho eu,
naquele tempo não possuía magistrados legais
por razão de sua grande aflição. Pois assim
testifica a história, dizendo: ―depois de falecer
Eúde; vendeu-os o Senhor na mão de Jabim, rei
de Canaã‖ (Jz 4:1,2), e ele, por Sísera, seu
capitão, afligiu Israel grandemente no espaço de
vinte anos. A própria Débora, em sua canção de
gratidão, confessa isso antes que ela se tornasse
mãe em Israel, e, nos dias de Jael, não havia
nada a não ser confusão e problemas.

Se alguém se prender ao termo, alegando


que o Espírito Santo diz ―que ela julgou Israel‖,
que entenda que nem a palavra hebraica nem
ainda a latina sempre significam julgamento
civil, ou execução da espada terrena; mas mais
comumente é utilizada no sentido que nós antes
expressamos. Pois de Cristo é dito que ―Ele
julgará entre as nações‖ e que ―Ele trará justiça
aos gentios‖ (Is 2:4, 42:1; Mq 4:2-3) e mesmo
assim é evidente que Ele não foi ministro da
espada civil. Deus designou Jerusalém e Judá
para julgar entre Ele e a Sua vinha (Is 5:3), e
mesmo assim Ele não designou todos eles a
serem magistrados civis.

A Ezequiel é dito: ―Porventura tu os


julgarias, julgarias tu, ó filho do homem?‖. E
depois: ―Tu, pois, ó filho do homem, porventura
julgarás, julgarás a cidade sanguinária?‖. E,
também: ―Eis que julgarei entre ovelhas e
ovelhas, entre carneiros e bodes‖ (Ez 20:4, 22:2,
34:17,20). Tais passagens, em grande número,
são encontradas ao longo das Santas Escrituras.
E, mesmo assim, não confio que o homem seja
tão tolo de achar que qualquer dos profetas foi
designado por Deus para ser juiz político ou
para punir os pecados do homem por punição
corpórea. Não, o seu tipo de julgamento é
expresso nestas palavras: ―Faze-lhe conhecer,
pois, todas as suas abominações. E dize: Assim
diz o Senhor DEUS: Ai da cidade que derrama o
sangue no meio de si para que venha o seu
tempo! Que faz ídolos contra si mesma, para se
contaminar! Pelo teu sangue que derramaste te
fizeste culpada, e pelos teus ídolos que
fabricaste te contaminaste‖ (Ez 22:2-4).

Deste modo, digo eu, os profetas de Deus


julgaram, pronunciando a sentença de Deus
contra malfeitores. E assim eu não duvido que
Débora tenha julgado no tempo em que Israel
havia declinado de Deus, repreendendo suas
deserções e exortando-os ao arrependimento,
sem usurpação de qualquer autoridade civil. E
se o povo deu a ela, por um tempo qualquer,
reverência ou honra como sua piedade e felizes
conselhos bem mereciam, ainda assim não era
nenhum império como nossos monstros
reivindicam; pois quais de seus filhos ou
parentes próximos a ela governaram e julgaram
em Israel após ela? O Espírito Santo não
expressa tal coisa; o que é evidente que, pelo seu
exemplo, Deus não ofereceu ocasião de
estabelecer qualquer regimento de mulheres
sobre homens, reinos e nações.
UMA RESPOSTA À SEGUNDA OBJEÇÃO
Mas agora vamos à segunda objeção, na
qual as mulheres exigem (como parece) nada
menos do que equidade e justiça, ao passo que
elas e seus protetores requerem domínio e
império sobre homens. Pois esta é a sua questão:
―Não é lícito que mulheres tenham direito e
herança como as filhas de Zelofeade foram
designadas pela boca de Moisés a ter sua porção
de terra na sua tribo?‖

Respondo que não é apenas lícito que


mulheres possuam sua herança, mas afirmo
também que a justiça e a equidade exigem que
assim se faça. Mas acrescento o que elas não
desejam de bom grado entender: que governar
ou ter autoridade sobre o homem nunca pode
ser direito ou herança à mulher; pois nunca
pode ser uma herança justa a qualquer pessoa
aquilo que Deus por Sua palavra claramente
negou a ela. Mas a todas as mulheres Deus
negou autoridade sobre o homem, como mais
manifestamente é anteriormente declarado;
portanto a ela isso nunca pode ser herança. E
assim devem os advogados de nossas senhoras
fornecer um exemplo melhor e um argumento
mais forte, pois a lei feita em favor das filhas de
Zelofeade não os servirá de nada.

E é seguramente uma grande surpresa que


em tão nobre luz da verdade de Deus, os
homens desejem tatear e vagar na escuridão.
Pois deixe-os falar conscientemente se a
petição de quaisquer dessas renomadas
mulheres era reinar sobre qualquer uma das
tribos, sim, ou ainda sobre qualquer homem de
Israel. Claro está que elas não o fizeram, mas
somente requereram que pudessem ter uma
porção de terra entre os homens de sua tribo, a
fim de que o nome do seu pai não fosse abolido.
E isso foi concedido a elas a despeito de
qualquer regimento civil. E o que faz tal
exemplo, rogo-lhes, para o estabelecimento
deste monstruoso império das mulheres? A
questão não é se as mulheres podem suceder à
posse, substância, patrimônio ou herança,
como pais deixam aos seus filhos, o que
concordo de bom grado. Mas a questão é se
mulheres podem suceder a seus pais em ofícios,
e principalmente aquele ofício em que o
executor ocupa o lugar e o trono de Deus. E isso
absolutamente nego e não temo em dizer que
colocar uma mulher em autoridade sobre um
reino é poluir e profanar o assento real, o trono
da justiça, que deveria ser o trono de Deus; e
que mantê-las no mesmo não é nada mais do
que continuamente rebelar-se contra Deus.

Uma coisa deve ainda ser notada e


observada na lei feita concedendo a herança das
filhas de Zelofeade (Nm 36:6-12), a saber: que
era proibido a elas casar-se fora de sua própria
tribo, a fim de que tal porção que estava em seu
lote não pudesse ser transferida de uma tribo à
outra, e, assim, a tribo de Manassés fosse
defraudada e deteriorada de sua justa herança
por ocasião delas. Para a aprovação da lei, foi
ordenado por Moisés que elas deveriam se casar
na família ou com agregados da tribo e parentes
de seu pai. Curioso é que os advogados e
protetores do direito de nossas senhoras não
consideraram e ponderaram esta lei, antes
aconselharam os príncipes cegos e nobres
indignos de seus países a trair as liberdades dos
mesmos nas mãos de estrangeiros: a Inglaterra,
pela satisfação dos desejos desordenados
daquele monstro cruel Maria (indigna, por
razão de sua tirania sanguinária, do nome de
uma mulher), foi traída (que tristeza!), para o
orgulhoso espanhol; e a Escócia, pela loucura
precipitada de tolos governantes e pelas práticas
de uma dama astuciosa, renunciou-se, de igual
forma, sob o título de casamento, ao poder da
França.

Agrada à justiça de Deus tal versão de


reinos e nações56? Ou é a posse, por tais meios
obtida, lícita a Seu ver? Certo estou que não é.
Não mais é, digo eu, do que a posse onde
ladrões, assassinos, tiranos e opressores
realizam o roubo, o assassinato, a tirania, a
violência, o engano e a opressão, [posse] a qual
Deus, em Seu secreto (mas ainda mais justo)

56 Reinos obtidos por artifícios não são uma posse justa.


julgamento, frequentemente permite para a
punição tanto dos apoiadores quanto dos
opressores violentos, mas nunca aprova a
mesma como lícita e piedosa. Pois se Ele não
permitia que a herança dos filhos de Israel
passasse de uma tribo à outra pelo casamento
de qualquer filha, embora fossem todos um só
povo, falassem uma só língua, fossem
descendentes de um mesmo pai e professassem
um Deus e uma religião; se mesmo assim, digo
eu, Deus não suportava que a comodidade e o
fruto usual que podiam ser reunidos da porção
de chão delimitada e designada a uma tribo
pudesse passar para outra, suportará Ele que as
liberdades, leis, comodidades e frutos de
completos reinos e nações sejam dados ao poder
e repartição de outros, por razão de casamento,
e aos poderes de tais que além de serem de uma
língua estranha, de maneiras e leis estranhas,
são também ignorantes de Deus, inimigos de
Sua verdade, negadores de Cristo Jesus,
perseguidores de Seus verdadeiros membros e
detestadores de toda virtude? Como a odiosa
nação de espanhóis manifestamente declara, os
quais por ultraje governam contra Cristo Jesus,
Aquele que os seus antepassados crucificaram
(pois judeus eles são, como a história testifica, e
eles mesmos confessam57), este dia claramente
fazem guerra contra todo verdadeiro professo
de Seu santo evangelho. É notificado e
proclamado quão cega e escandalosamente o rei
francês e seus prelados pestilentos lutam contra
a verdade de Deus, os fogos ardentes que
lambem o sangue inocente dos membros de
Cristo testificam e pelos cruéis éditos [do rei]58 é
notificado e proclamado59. E, mesmo assim, a
esses dois tiranos cruéis (refiro-me a França e a
Espanha) são o direito e a possessão da
Inglaterra e da Escócia designados. Mas essa

57 Os espanhóis são judeus e se gabam de que Maria da Inglaterra é


a raiz de Jessé.
58 Observe a lei que ele proclamou na França contra aqueles que ele

chama de luteranos.
59 No ano de 1551, o édito de Henrique II, conhecido como Édito de

Chateaubriand, continha 56 artigos anunciando severas punições


aos luteranos, com o objetivo de suprimir a heresia e superar a
obstinação e teimosia ―dessa seita infeliz‖. Mas esse e outros
decretos semelhantes não tiveram esse efeito; e em maio de 1553,
cinco pessoas foram queimadas em Lyon e outras cinco no mesmo
ano, além de em Paris, Toulouse e outras partes da França [N. do
T.].
posse nunca será justa ou lícita, a menos que
Deus mude o estatuto de sua primeira lei, o que
Ele não fará para o prazer do homem. Pois Ele
não criou a terra para satisfazer a ambição de
dois ou três tiranos, mas para a semente
universal de Adão; e designou e determinou os
limites de sua habitação (At 17:26) a diversas
nações atribuindo-os a diversos países, como Ele
mesmo confessa, falando a Israel nestas
palavras: ―Passareis pela costa de vossos irmãos,
os filhos de Esaú, que habitam em Seir; e eles
vos temerão; portanto tende cuidado, não vos
intrometas com eles; pois não vos darei a terra
deles, não, nem mesmo a largura de um pé;
porque dei o monte de Seir a Esaú por
possessão‖ (Dt 2:4,5). E o mesmo Ele testifica aos
filhos de Ló, a quem Ele tinha dado Ar por
herança (Dt 2:9).

E Moisés claramente afirma que quando o


Altíssimo distribuía as heranças aos gentios,
quando dividia e dispersava os filhos dos
homens, então Ele estabeleceu os termos e
limites dos povos, conforme o número dos filhos
de Israel (Dt 32:8). De onde está claro que Deus
não expôs a terra às presas de tiranos, tornando
todas as coisas lícitas que, por violência e
assassinato, eles possam possuir; mas que Ele
designou a cada respectiva nação uma
possessão respectiva, desejando que ficassem
contentes (como a natureza ensinou um gentio a
afirmar60) com a porção que, por destino e por
meios justos, eles desfrutassem. As causas por
que Deus permitiu que Sua repartição fosse
perturbada e reinos e nações antigos sejam
possuídos por estrangeiros, adiarei desta vez em
tratar. Somente isso tenho citado para dar ao
mundo o entendimento de que o reino, o
império e a autoridade de mulheres não têm
fundamento algum nas Escrituras de Deus. Sim,
que reinos ou províncias possuídas por seu
casamento não é nada mais do que uma
conquista injusta; pois tão pouco a lei feita para
as filhas de Zelofeade ajuda a causa de suas
rainhas que, antes, luta completamente contra

60 Cícero, De Officiis, lib. 1.


elas, condenando tanto sua autoridade quanto
seus feitos. Mas agora vamos à terceira objeção.

UMA RESPOSTA À TERCEIRA OBJEÇÃO


O consentimento, eles dizem, dos reinos e
leis pronunciadas e admitidas a seu favor, aos
antigos costumes e tradições, junto à
prosperidade de algumas mulheres em seus
impérios, estabelecem sua autoridade. A quem
eu respondo que nem pode a tirania de
príncipes, nem a tolice do povo, nem as ímpias
leis feitas contra Deus, nem ainda a
prosperidade que neste mundo possa se suceder
tornar lícito o que Ele, por Sua palavra,
manifestamente condenou. Pois se a aprovação
de príncipes e do povo, as leis feitas pelos
homens ou o consentimento de reinos,
pudessem estabelecer qualquer coisa contra
Deus e Sua palavra, logo a idolatria seria
preferida como a verdadeira religião; pois
muitos reinos e nações, muitas leis e decretos
publicados por imperadores, com o consenso
comum de seus conselhos, têm estabelecido
mais a uma [isto é, a idolatria] do que aprovado
a outra [isto é, a verdadeira religião]. E, mesmo
assim, acho que nenhum homem de bom senso,
desta forma, justificará e defenderá a idolatria;
não mais deveria qualquer homem conservar
este odioso império das mulheres, apesar de ter
sido aprovado por todos os homens em suas
leis. Pois o mesmo Deus que em claras palavras
proíbe a idolatria também proíbe a autoridade
de mulheres sobre o homem, como as palavras
de São Paulo antes recitadas claramente nos
ensinam. E, portanto, quer as mulheres sejam
depostas desta injusta autoridade (nunca tendo
a usurpado por tanto tempo) quer toda honra
seja negada a elas, não temo em afirmar que
elas não são defraudadas nem de direito nem
de herança. Pois à mulher esta honra nunca
poderá ser conveniente nem lícita (muito menos
herança), quando Deus negou tão
manifestamente a elas.

UMA RESPOSTA À QUARTA OBJEÇÃO


Não ignoro que o juízo sutil de homens
carnais (os quais nunca poderão ser trazidos à
obediência dos simples preceitos de Deus),
conservando este monstruoso império, tem
ainda duas tendências vãs. Primeiro, eles
alegam que, embora as mulheres não possam
absolutamente reinar por si mesmas, porque não
podem assentar em julgamento, nem pronunciar
sentença, nem executar qualquer ofício público;
mesmo assim podem fazer todas essas coisas
por seus tenentes, deputados e juízes
substitutos. Segundamente, eles dizem, uma
mulher nascida para governar sobre qualquer
reino pode escolher para ela um marido, e a ele
pode transferir e dar sua autoridade e direito. A
ambos respondo em poucas palavras.

Em primeiro lugar, de uma fonte corrupta


e envenenada não se pode jorrar água saudável.
Em segundo lugar, nenhuma pessoa tem poder
de dar uma coisa que não pertence justamente a
ela mesma. A autoridade de uma mulher é uma
fonte corrupta e, portanto, dela nunca poderá
jorrar qualquer oficial lícito. Ela não é nascida
para governar sobre os homens e, portanto, não
pode designar ninguém por sua oferta, nem por
seu poder (o qual ela não tem) ao lugar de um
magistrado lícito; e, portanto, [aqueles] que
receberam de uma mulher ofício ou autoridade
são oficiais adúlteros e bastardos perante
Deus61. Isso pode parecer estranho na primeira
afirmação, mas se nós seremos tão imparciais e
justos na causa de Deus quanto podemos ser na
causa do homem, a razão deve subitamente
surgir. Num caso hipotético onde um tirano, por
conspiração, usurpasse do assento real e da
dignidade de um rei e, no mesmo, estabelecesse
a si mesmo, se ele apontasse oficiais e fizesse o
que quisesse por um tempo; e, nesse meio
tempo, o rei nativo fizesse estreita proibição a
todos os seus súditos de que ninguém deveria
aderir a este traidor, nem ainda receber
qualquer decoro dele; mesmo assim, não
obstante, eles honrassem o mesmo traidor como
rei e se tornassem seus oficiais em todos os
negócios do reino; se depois o príncipe nativo
recuperasse sua justa honra e possessão, deveria
ele considerar ou honrar qualquer homem da
designação do traidor como um magistrado

61 Que a Inglaterra e a Escócia prestem atenção a isso.


lícito ou como seu amigo e súdito verdadeiro ou
deveria ele, sem preferência, com uma sentença
condenar a cabeça junto aos seus membros? E,
se fizesse assim, quem é capaz de acusá-lo de
austeridade, muito menos condenar sua
sentença de injustiça? E ousamos nós negar o
mesmo poder a Deus em caso igual? Pois a
mulher [que] reina sobre o homem o obteve
por traição e conspiração cometida contra
Deus. Como pode ser, então, que ela, sendo
criminosa e culpada de traição cometida contra
Deus, possa designar qualquer oficial que lhe
aprouver? Isso é algo impossível.

Por isso, que os homens que recebem de


mulheres autoridade, honra ou ofício, sejam
mais certamente persuadidos de que, assim
mantendo esse poder usurpador, declaram a si
mesmos inimigos de Deus. Se alguém pensar
que, porque os reinos, e os estados dos mesmos,
deram seus consentimentos a uma mulher e
estabeleceram a ela e a sua autoridade, logo isso
é lícito e aceitável perante Deus; que os mesmos
homens lembrem-se do que eu disse antes, a
saber: que Deus não pode aprovar nem o feito
nem o consentimento de qualquer multidão,
concluindo qualquer coisa contra Sua palavra e
ordenança, e, portanto, eles devem ter uma
defesa mais segura contra a ira de Deus do que a
aprovação e consentimento de uma multidão
cega; de outro modo, não poderão ser capazes
de ficar de pé na presença de um fogo
consumidor. Isto é, eles devem reconhecer que o
regimento de uma mulher é a coisa mais odiosa
na presença de Deus. Eles devem recusar ser
seus oficiais, porque ela é uma traidora e
rebelde contra Deus. E, finalmente, devem
buscar cuidadosamente, ao extremo de sua
capacidade, reprimir seu desordenado orgulho e
tirania.

O mesmo é o dever da nobreza e dos


estados, pela cegueira dos quais uma mulher é
promovida. Em primeiro lugar, na medida em
que têm mais odiosamente ofendido a Deus,
colocando em autoridade quem Deus, por Sua
palavra, removeu da mesma, eles, com
sinceridade, deveriam clamar por misericórdia.
E, sendo admoestados de seu feito errôneo e
condenável, em sinal e testemunho de
verdadeiro arrependimento, em consentimento
comum, deveriam retratar que
imprudentemente e por ignorância têm se
pronunciado; e deveriam, sem atraso adicional,
remover da autoridade todas as pessoas que,
por usurpação, violência ou tirania, possuem a
mesma. Pois assim fez Israel e Judá depois que
se revoltaram por Davi, e Judá sozinho nos dias
de Atália (2Rs 11). Pois depois que ela, pelo
assassinato dos filhos de seu filho, havia obtido
império sobre a terra e mais desventuradamente
reinado em Judá por seis anos, Joiada, o sumo
sacerdote, convocou os capitães e principais
governantes do povo e, mostrando a eles o filho
do rei, Joás, compeliu-os por juramento a
destituir essa perversa mulher e promover o rei
em seu assento real; o que eles fielmente
fizeram, não apenas matando por seu comando
essa cruel e perniciosa mulher, mas também o
povo destruiu os templos de Baal, quebraram
seus altares e imagens, e mataram Matã, o sumo
sacerdote de Baal, diante de seus altares62.

O mesmo é o dever tanto dos estados


quanto do povo que têm sido cegados. Em
primeiro lugar, deveriam remover da honra e da
autoridade este monstro em natureza: assim
chamo uma mulher vestida nos hábitos de um
homem, sim, uma mulher, contra a natureza,
reinando sobre o homem. Em segundo lugar, se
qualquer um presume defender essa impiedade,
ele não deveria temer primeiro em pronunciar e
depois em executar contra si a sentença de
morte. Se qualquer homem estiver com medo de
violar o testemunho de obediência que tem
executado contra tais monstros, que ele seja
mais seguramente persuadido que assim como o
início de seus testemunhos (procedentes da
ignorância) eram pecado, assim é o propósito
obstinado de conservar a mesma nada mais do
que clara rebelião contra Deus. Mas sobre esse

62 Note esse fato, pois concorda com a lei de Deus pronunciada.


assunto, no Segundo Soar, se Deus quiser,
deveremos falar em maior liberdade.
CONCLUSÃO

E agora, coloco um fim ao Primeiro Soar.


Visto que pela ordem da natureza; pela
condenação e maldição pronunciada contra a
mulher pela boca de São Paulo, o intérprete da
sentença de Deus; pelo exemplo daquela
comunidade na qual Deus, por Sua palavra,
instalou ordem e política; e, finalmente, pelo
julgamento dos mais piedosos escritores; Deus
rejeitou às mulheres o governo, domínio,
império e autoridade sobre o homem; ainda,
visto que nem o exemplo de Débora, nem a lei
feita para as filhas de Zelofeade, nem ainda o
tolo consentimento de uma multidão ignorante
são capazes de justificar aquilo que Deus tão
claramente condenou; que todos os homens
prestem atenção à querela e à causa, a partir de
agora, que têm defendido.
Se Deus levantar qualquer nobre coração
para reivindicar a liberdade de seu país e para
suprimir o monstruoso império de mulheres,
que todos os que presumirem defendê-las no
[império] mais certamente saibam que, ao fazê-
lo, levantam suas mãos contra Deus e que, um
dia, verão Seu poder lutar contra sua tolice. Que
os fiéis, piedosos e valentes corações dos
soldados de Cristo não sejam totalmente
desencorajados, nem ainda os tiranos regozijem,
embora por um tempo triunfem contra aqueles
que buscam reprimir sua tirania e removê-los da
injusta autoridade. Pois as causas [são
conhecidas por Deus] apenas porque Ele
suporta que falhem na batalha os soldados que
Ele mesmo assim ordena lutar. Como algumas
vezes fez Israel, lutando contra Benjamim. A
causa dos Israelitas era a mais justa; pois foi
para punir aquela horrível abominação dos
filhos de Belial, abusando da esposa do levita, os
quais os benjamitas defendiam; e eles tinham o
preceito de Deus para assegurá-los do bem-feito,
pois Ele não apenas ordenou-os lutar, mas
também apontou Judá como sendo seu líder e
capitão, mas, mesmo assim, caíram duas vezes
em batalha contra aqueles mais perversos
adúlteros (Jz 20).

A causa secreta disso, digo eu, é conhecida


por Deus apenas. Mas, por Suas evidentes
Escrituras, nós podemos seguramente concluir
que, por tais meios, Sua sabedoria derruba o
orgulho da carne (pois os israelitas, no
princípio, confiaram em sua multidão, poder e
força); e algumas vezes, por tais derrotas, Ele
punirá as ofensas de Seus próprios filhos e os
trará ao autêntico conhecimento das mesmas
antes de dá-los vitória contra os depreciadores
manifestos, a quem Ele designou, não obstante,
à máxima perdição, como o fim da batalha
testifica. Pois, apesar de com grande assassinato
os filhos de Israel caírem duas vezes perante os
benjamitas, ainda depois clamaram perante o
Senhor, depois jejuaram e fizeram sacrifícios em
sinal de seu genuíno arrependimento; assim,
prevaleceram contra a orgulhosa tribo de
Benjamim, onde, depois que vinte e cinco mil
homens fortes de guerra foram mortos na
batalha, destruíram homem, mulher, criança e
animal, tanto os campos quanto as cidades, que
foram queimados com fogo; depois disso,
daquela tribo inteira, só sobraram seis mil
homens remanescentes que fugiram para o
deserto, onde ficaram por quatro meses e, então,
foram salvos.

O mesmo Deus que executou essa grave


punição, mesmo pelas mãos daqueles que Ele
suportou duas vezes serem derrotados na
batalha, este dia retém Seu poder e justiça. A
maldita Jezabel da Inglaterra junto à pestilenta e
detestável geração de papistas não fazem pouca
vanglória e ensejo de que têm triunfado não
apenas contra Wyatt63, mas também contra
todos que têm empreendido algo contra eles ou
seus procedimentos. Mas deixem que ela e eles
ainda considerem que ainda não prevaleceram
contra Deus; Seu trono é mais alto do que a
altura que seus chifres são capazes de alcançar.

63Sr. Thomas Wyatt foi o líder da insurreição contra a rainha Maria


da Inglaterra [N. do T.].
E que eles ainda considerem que, no
começo de seu reino sanguinário, o resultado de
sua iniquidade não veio à plenitude e maturação
completas. Não. Estava tão verde, tão secreto
quero dizer, tão coberto e tão escondido com a
hipocrisia, que alguns homens (até os servos de
Deus) pensaram não ser impossível que tais
lobos pudessem ser mudados em cordeiros, e
que ainda a víbora pudesse remover seu veneno
natural! Mas Deus, que revela em Seu tempo
designado os segredos dos corações e que terá
Seus juízos justificados até mesmo pelo mais
perverso, tem agora dado testemunho aberto da
bestial crueldade dela e deles. Pois homem e
mulher, instruídos ou não-instruídos, nobres e
homens de classe baixa, pais idosos e donzelas
tenras, e, finalmente, os ossos dos mortos, tanto
de mulheres quanto de homens, têm
experimentado sua tirania. De modo que, agora,
não apenas o sangue do pai Latimer, do grande
homem de Deus, bispo de Canterbury
[Cranmer], do instruído e prudente Ridley, da
inocente Lady Jane Dudley [Grey], e muitos
piedosos e valiosos pregadores que não podem
ser esquecidos, aqueles que o fogo consumiu e a
espada de tirania mais injustamente verteu,
clamam por vingança nos ouvidos do Senhor
Deus dos exércitos; mas também os soluços e
choros dos pobres oprimidos, os gemidos dos
anjos (os vigias) do Senhor, sim, e cada criatura
terrena abusada por sua tirania continuamente
choram e clamam pela rápida execução da
mesma.

Não temo em dizer que o dia da vingança,


que deve apreender esse horrível monstro
Jezabel da Inglaterra e aqueles que conservam
sua monstruosa crueldade, já está designado no
conselho eterno. E eu em verdade acredito que
está tão próximo que ela não deve reinar tanto
em tirania como até agora tem feito64, quando
Deus declarar-se como seu inimigo, quando Ele
derramar desprezo sobre ela, de acordo com sua
crueldade, e inflamar os corações daqueles que

64Essa previsão de Knox sobre o rápido término do reinado de


Rainha Maria, a quem ele aqui denomina Jezabel da Inglaterra,
mostrou-se correta. Ela morreu no sexto ano de seu reinado, em 17
de novembro, ou dentro de sete ou oito meses após a publicação de
O Primeiro Soar [N. do T.].
outrora a honraram com um ódio mortal contra
ela para que possam executar Seus julgamentos.
E, portanto, que todos que prestam a ela
assistência possam estar atentos no que fazem;
pois seguramente seu império e reino é uma
parede sem fundação. Digo o mesmo da
autoridade de todas as mulheres. Ela tem se
apoiado, neste tempo cego que é passado, na
tolice do povo e nas perversas leis de ignorantes
e tirânicos príncipes. Mas o fogo da palavra de
Deus já está sobre esses apoios podres (incluo a
lei do papa com o restante), e atualmente eles
queimam, apesar de não vermos nenhuma
chama. Quando forem consumidos (como
brevemente serão, pois palha e madeira seca não
podem suportar o fogo), esta parede podre, o
usurpado e injusto império das mulheres, deve
cair por si mesma a despeito de todos os
homens, para a destruição de tantos que
trabalham para mantê-la. E, portanto, que todos
os homens sejam advertidos, pois a trombeta
soou uma vez.
“Vós, que temeis ao Senhor, louvai-o” (Salmos
22:23).
Sumário do Proposto
Segundo Soar da Trombeta
DE JOHN KNOX AO LEITOR

Porque muitos estão ofendidos pelo


Primeiro Soar da Trombeta, no qual afirmo que
promover uma mulher para governar ou
imperar sobre qualquer reino, nação ou cidade é
repugnante à natureza, uma contumélia a Deus
e uma coisa mais contrária à Sua revelada e
aprovada ordenança; e também porque alguns
têm prometido (como entendo) uma refutação
do mesmo, tenho atrasado o Segundo Soar até o
tempo em que seus raciocínios sejam expostos,
pelos quais eu possa ou ser reformado em
opinião ou ainda ter outra ocasião mais simples
e clara para exprimir meu julgamento. Ainda
neste meio tempo, para o desencargo de minha
consciência e para evitar suspeitas que possam
ser engendradas em razão de meu silêncio, não
poderia cessar de notificar estas subsequentes
proposições, que, pela graça de Deus, pretendo
tratar no Segundo Soar prometido:
1. Não é apenas por nascimento, nem por
proximidade de sangue, que um rei torna-se
legítimo para reinar sobre um povo professo de
Cristo Jesus e Sua eterna verdade; mas, em sua
eleição, deve a ordenança que Deus estabeleceu
na eleição de juízes inferiores ser observada.

2. Nenhum idólatra manifesto, nem transgressor


notório dos santos preceitos de Deus, deve ser
promovido a qualquer regimento, honra ou
dignidade públicos em qualquer reino,
província ou cidade que se sujeitou ao Seu
bendito evangelho.

3. Nem pode voto nem promessa obrigar tal


povo a obedecer e conservar tiranos contra Deus
e contra a Sua verdade conhecida.

4. Mas se, quer imprudentemente promovam


qualquer pessoa manifestamente perversa quer,
ainda que ignorantemente, escolham tal que
depois se declare indigno de regimento sobre o
povo de Deus (e tais são todos os idólatras e
perseguidores cruéis), mais justamente devem
os mesmos homens destituir e punir aquele que
imprudentemente antes haviam denominado,
designado e elegido.

“Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo


terá luz;” (Mateus 6:22)
APÊNDICE

10 DE ABRIL DE 1559. John Knox para


Sir William Cecil.

[...] Mas escrevi (tu o dizes) um livro de


traição contra o Regimento e império de
Mulheres: se isso for uma ofensa, o pobre
rebanho é inocente (exceto aqueles que neste dia
exclamam traição); pois, senhor (na presença de
Deus escrevo), com ninguém daquela
companhia consultei-me antes do término do
mesmo; e, portanto, no nome de Cristo, peço
que a culpa recaia sobre mim apenas. O escrito
daquele livro não negarei; mas prová-lo de
traição creio que será difícil. Pois, senhor, não
duvido [...] que esta era a voz de Deus, a qual
primeiro pronunciou esta pena contra Mulheres:
―Em dores terás filhos‖. É um rumor que meu
livro é ou deve ser refutado; se assim for,
senhor, temo grandemente que bajuladores mais
corromperão do que ajudarão a causa que
parecem defender; pois, a não ser que meu erro
seja claramente mostrado e refutado por melhor
autoridade do que tais leis que de ano em ano
podem ser mudadas, não ouso prometer silêncio
em tão importante negócio, para que, assim
fazendo, eu não possa parecer trair a veracidade
que não é sujeita à mutabilidade do tempo. E se
ainda qualquer um julgar-me inimigo da pessoa,
e ainda ao regimento dela, a qual Deus
promoveu agora, eles estão completamente
enganados de mim. Pois a miraculosa obra de
Deus ao confortar Seus aflitos por um vaso
fraco, de fato reverencio; e o poder de Sua mais
poderosa mão, exaltando quem melhor agrada
Sua sabedoria (nada ordenando contra Sua
glória) eu obedecerei, embora essa natureza e a
mais perfeita ordenança divina repugnem tal
regimento. Mais copiosamente falando, se a
Rainha Elizabeth confessar que a extraordinária
dispensação da grande misericórdia divina
torna lícito a ela aquilo que tanto a natureza
quanto a lei divina nega [a todas as mulheres];
então nem a Inglaterra pode ser mais disposta a
conservar sua autoridade lícita do que eu. Mas
se (a maravilhosa obra divina deixada de lado)
ela fundamentar (como Deus proíbe) a justiça de
seu título na tradição, leis e ordenanças de
homens; então, como estou certo que tal tola
presunção altamente ofende a suprema
Majestade de Deus, assim grandemente temo
que sua ingratidão não por muito tempo será
destituída de punição. E isso, no nome do Deus
eterno e de Seu filho Cristo Jesus (diante de
quem tanto eu quanto tu devemos permanecer a
fim de prestar contas de todo conselho que
temos dado), peço a ti que comunique a Vossa
Graça [em meu nome]; agregando que apenas a
humildade e a rejeição de si mesma diante de
Deus será a firmeza e a estabilidade de seu
trono, o qual sei que será ameaçado mais vezes
do que uma. Se isto esconderes de Vossa Graça,
tornarei patente para o mundo que deste modo
comuniquei-me contigo [...] Que tristeza!
Senhor, é minha ofensa (embora naquele tempo,
e naquele assunto, tenho escrito dezenas de
livros) tão odiosa que não posso ter licença,
pregando de Jesus Cristo, para aliviar aquelas
almas sedentas que por muito tempo têm falta
da água da vida? [...]
12 DE JULHO DE 1559. John Knox para
Sir William Cecil.

O espírito de sabedoria governe teu


coração para a glória de Deus e para o conforto
de Seu rebanho aflito.

Uma das causas de meu presente escrito,


Grande Honrável, é humildemente pedir que tu
entregues esta outra carta anexada à Graça da
Rainha, carta a qual contém em poucas e
simples palavras minha confissão, o que penso
da Autoridade dela, até que ponto ela é justa e o
que pode torná-la odiosa na presença de Deus.

Ouvi dizer que há uma refutação


apresentada na imprensa contra o ―Primeiro
Soar‖. Deus sabe que o escritor não tem
procurado mais os favores do mundo, a não ser
a glória de Deus e a estável comodidade de seu
país, do que aquele que empreendeu esse ―Soar‖
para expressar sua consciência. Quando eu tiver
tempo (que agora é caro e preciso para mim)
para ler essa obra, comunicarei meu julgamento
contigo sobre a mesma. Chegou a hora, senhor,
de todos os que confiam em Cristo Jesus para
reinar nesta ilha — que as liberdades da mesma
sejam mantidas aos seus habitantes e que seus
corações se unam em amor não fingido —
devem buscar como as mesmas podem ser
levadas a cabo, do que em vão trabalhar para a
manutenção daquilo de que já vimos o perigo e
sentimos o sofrimento. [...]

20 DE JULHO DE 1559. Declaração de


John KNOX à RAINHA ELIZABETH.

À virtuosa e piedosa Elizabeth, pela graça


de Deus, rainha da Inglaterra, etc. John Knox
deseja o aumento perpétuo do Espírito Santo,
etc.

Como o desagrado de vossa Graça contra


mim, injustamente concebido, tem sido e é para
o meu coração miserável um fardo pesado e
quase intolerável, o testemunho de uma
consciência limpa para mim é uma estadia e
sustentação que, em desespero, não sou
naufragado, como veemente as tentações
aparecem. Pois na presença de Deus minha
consciência me dá testemunho de que
maliciosamente nem de propósito ofendi vossa
Graça, nem vosso reino. E, portanto, de
qualquer modo que eu seja julgado pelo
homem, tenho certeza de que sou absolvido
pelo Único que conhece os segredos dos
corações.

Não posso negar a escrita de um livro


contra a autoridade usurpada e o regimento
injusto de mulheres. Ainda não me preocupo
em retratar ou voltar em qualquer ponto ou
proposição principal do mesmo, para que a
verdade e a veracidade apareçam ainda mais.
Mas, por que vossa Graça, ou ainda qualquer
um que favorece a liberdade da Inglaterra, deve
se ofender com o autor de tal obra, não consigo
perceber um justo motivo.
Primeiro, meu livro não tocou em
particular a pessoa de vossa Graça, nem é
prejudicial a qualquer liberdade do reino, se o
tempo e meu escrito forem considerados
indiferentemente. Como eu poderia ser inimigo
da pessoa de vossa Graça, pela libertação da
qual busquei e empreendi mais do que qualquer
um dos que agora me acusam? E no que diz
respeito ao vosso Regimento, como poderia ou
posso invejar aquilo em que mais confio e pelo
qual agradeço a Deus sem fingimentos, isto é,
que lhe agradou por Sua eterna bondade exaltar
vossa cabeça (que estava em perigo) para a
manifestação de Sua glória e extirpação da
idolatria?

E quanto a qualquer ofensa que tenha


cometido contra a Inglaterra, pelo escrito ou por
qualquer outra obra, não recusarei que homens
moderados e indiferentes julguem e discirnam
entre mim e os que me acusam, a saber: qual das
partes mais fere a liberdade da Inglaterra?
Afirmo que nenhuma mulher pode ser exaltada
acima de qualquer reino para tornar a liberdade
do mesmo escrava para uma nação estranha,
orgulhosa e cruel, ou para aprovar o que quer
que agrade ao príncipe da época.

Se eu estivesse tão disposto a acusar, como


alguns deles (para sua própria vergonha) se
declararam, não duvido que, em poucas
palavras, devo deixar homens razoáveis
entenderem que alguns que hoje em dia se
rendem humildemente à vossa Graça e
trabalham para me tornar odioso aos vossos
olhos, na vossa adversidade não se mostraram
amigos fiéis de vossa Graça, nem tão amorosos e
cuidadosos com o país de origem como agora
são estimados.

Mas, omitindo a acusação de outros para


minha própria purgação e para a satisfação de
vossa Graça, digo que nada no meu livro
contido é ou pode ser prejudicial ao justo
regimento de vossa Graça, desde que não sejais
achada ingrata a Deus. Ingrata sereis provada
na presença de Seu trono (seja como for que os
bajuladores justifiquem seus atos), se
transferirdes a glória daquela honra na qual
agora vos apegueis para qualquer outra coisa
senão à dispensação de Sua misericórdia, que
faz com que seja lícito à vossa Graça aquilo que
a natureza e a lei negam a toda mulher.
Tampouco gostaria que vossa Graça tivesse
medo de que essa vossa humilhação diante de
Deus desvanecesse ou enfraquecesse vossa
autoridade justa e lícita diante dos homens.
Não, senhora, essa confissão não fingida dos
benefícios de Deus recebidos será o
estabelecimento dos mesmos não apenas para si
mesma, mas também para vossa semente e
posteridade. Ao contrário, um orgulho e uma
elevação orgulhosos de si serão a ocasião em
que vosso reinado será instável, problemático e
curto.

Deus é testemunha de que, sem fingir,


amo e reverencio vossa Graça; sim, oro para que
vosso reinado seja longo, próspero e tranquilo. E
isso pela tranquilidade que os membros de
Cristo antes perseguidos receberam sob vós.
Mas, se eu lisonjeasse vossa Graça, não seria
amigo, mas um traidor enganoso. E, portanto,
de consciência, sou obrigado a dizer que nem o
consentimento das pessoas, nem o processo do
tempo, nem a multidão de homens podem
estabelecer uma lei que Deus aprovará; mas
tudo o que Ele aprova (por Sua palavra eterna)
será aprovado, e tudo o que Ele condenar será
condenado, embora todos os homens na Terra
elaborem uma justificação para a mesma. E,
portanto, senhora, a única maneira de reter e
colher os benefícios de Deus abundantemente
derramados agora nos últimos dias sobre vós e
sobre vosso reino é sem fingimento render a
Deus, à Sua misericórdia e graça imerecida, toda
a glória dessa vossa exaltação. Esqueça vosso
nascimento e todo o título que disso se
despende; e considere profundamente como,
por medo de vossa vida, recusastes a Deus e se
curvastes à idolatria. Não deixe parecer uma
pequena ofensa aos vossos olhos que tenhais
decaído de Cristo Jesus no dia de Sua batalha,
nem eu gostaria que estimásseis essa
misericórdia como vulgar e comum a qual
recebestes, a saber, que Deus cobriu a vossa
ofensa anterior, apresentou-lhe quando eras a
mais ingrata e, no final, exaltou e levantou a vós
não apenas do pó, mas também dos portões da
morte para governar acima de Seu povo para o
conforto de Sua igreja.

Cabe a vós, portanto, fundamentar a


justiça de vossa autoridade, não na lei que muda
de ano para ano, mas na providência eterna
dAquele que, contrariamente à natureza e sem
vosso merecimento, exaltou vossa cabeça. Se
assim, na presença de Deus, vós se humilhardes,
como em meu coração glorifico a Deus pelo
descanso concedido a Seu aflito rebanho na
Inglaterra, debaixo de vós, um instrumento
fraco, assim também com a língua e a caneta
justificarei vossa autoridade e regimento como o
Espírito Santo justificou os mesmos em Débora,
aquela mãe abençoada em Israel. Mas se essas
premissas (que Deus não permita) forem
negligenciadas, se começardes a gabar de vosso
nascimento, a construir vossa autoridade sobre
vossa própria lei e a lisonjear quem vós
desejardes, vossa felicidade será curta.
Interprete minhas palavras rudes na melhor
parte como escritas por aquele que não é
inimigo de vossa Graça.

Por diversas cartas, requeri licença para


visitar vosso reino, não para me exibir, nem
mesmo para minha própria comodidade ou
tranquilidade; a qual, se agora recusardes e
negardes, devo remeter minha [causa] a Deus,
acrescentando isto para conclusão: que
geralmente se vê que aqueles que recusam os
conselhos dos fiéis são compelidos a seguir o
engano de bajuladores, para sua própria
perdição. Que o poderoso Espírito do Senhor
Jesus mova vosso coração a entender o que é
dito, conceda a vós o discernimento dos
espíritos e, portanto, governe a vós em todas as
vossas ações e empreendimentos para que em
vós Deus seja glorificado, Sua igreja edificada, e
vós, como um membro vivo da mesma, possais
ser um exemplo e espelho da virtude e da vida
divina para os outros.
Que assim seja. De Edimburgo, no dia 20
de julho de 1559.

Pelas vossas graças, inteiramente para


governar em piedade,
John Knox.

À verdadeira poderosa, verdadeira alta,


excelente princesa Elizabeth, rainha da
Inglaterra, etc. sejam entregues.

5 DE AGOSTO DE 1561. Segunda defesa


de John Knox à rainha Elizabeth.

Graça de Deus Pai através de nosso


Senhor Jesus, com aumento perpétuo de seu
Espírito Santo.

Que, por favor, vossa majestade, seja


certamente falado aqui que a rainha da Escócia
[Maria Stuart] trabalha intensamente para
refutar um tratado intitulado ―O Primeiro Soar
da Trombeta‖ com a resposta dos eruditos em
diversos reinos, e ainda mais ela trabalha para
inflamar o coração dos principados contra o
escritor. E porque pode parecer que vossa
majestade tem interesse, ela se importa de
trabalhar com vossa graça, com o conselho de
vossa graça e homens estudiosos, para julgar
contra um inimigo em comum das mulheres e
de seu regimento. Seria unicamente tolice
prescrever à Vossa Majestade o que deve ser
feito em qualquer coisa, especialmente em coisas
que os homens supõem que me tocam. Mas, de
uma coisa acho que tenho certeza e, portanto,
não ouso ocultá-la, isto é, que nossa soberana
não tem tanto medo de sua própria posição por
causa desse livro, nem ainda ela favorece sem
fingir a tranquilidade do reinado de vossa
majestade e reino, que ela se esforçaria tanto e
sinceramente, a menos que seu conselho astuto
ao fazê-lo atirasse em outra marca.

Dois anos atrás, escrevi à Vossa Majestade


minha Declaração completa no tocante a essa
obra; a experiência desde então tem mostrado
que não desejo inovações [ou seja, no governo],
para que Cristo Jesus não seja em Seus membros
pisado abertamente aos pés dos ímpios. Com
mais purgação não incomodarei vossa
Majestade no presente. Suplicando ao Eterno
para ajudar vossa Alteza em todos os assuntos;
para que, aos Seus olhos, vós sejais considerada
aceitável, vosso regimento, proveitoso para a
vossa comunidade e vossas ações para que
sejam justamente louvadas por todos os
piedosos até a vinda do Senhor Jesus, a cuja
poderosa proteção eu sem fingir entrego Vossa
Majestade.

De Edimburgo, 5 de agosto de 1561

Servo de Vossa Majestade para governar


em piedade

[Aprovado] John Knox.

À poderosa e excelente princesa Elizabeth,


a majestade da rainha da Inglaterra, sejam
entregues.

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