O Violão No Brasil

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26/12/21, 20:28 O Violão no Brasil

O Violão no Brasil
A VIOLA, instrumento de 5 cordas duplas, precursor do violão e popularíssima em Portugal, foi
introduzida no Brasil pelos jesuítas portugueses, que a utilizavam na catequese. Já no século
XVII, referências são feitas à viola em São Paulo, uma delas colhida por Mário de Andrade: "Em
1688 surge uma certa viola avaliada em dois mil réis, preço enorme para o tempo. E, caso curioso, esta
guitarra pertenceu a um dos mais notáveis bandeirantes do século XVII: Sebastião Paes de Barros."

Ainda na mesma obra, Mário de Andrade cita Cornélio Pires, para quem a viola é um dos instrumentos que
acompanha as danças populares de São Paulo. A confusão entre a viola e violão começa em meados do
século XIX, quando a viola é usada com uma afinação própria do violão, isto é, lá, ré, sol, si, mi. A confusão
no uso do termo viola/violão, continua nessa época como atesta Manuel Antônio de Almeida, autor da
Memórias de um Sargento de Milícias (1854-55), quando se refere muitas vezes com terminologia da época
do final da colônia, à viola em vez de violão ou guitarra sempre que trata de designar o instrumento urbano
com o qual se acompanhava as modinhas. A viola, hoje, tornou-se a viola-caipira, instrumento típico do
interior do país, e o violão, depois de ter sua forma atual estabelecida no final do século XIX, tornou-se um
instrumento essencialmente urbano no Brasil. O violão também tornou-se o instrumento favorito para o
acompanhamento da voz, como no caso das modinhas, e, na música instrumental, juntamente com a flauta e
o cavaquinho, formou a base do conjunto do choro. Por ser usado basicamente na música popular e pelo
povo, o violão adquiriu má fama, instrumento de boêmios, presente entre seresteiros, chorões, tornandos-se
sinônimo de vagabundagem. Assim o violão foi considerado durante anos.

Os primeiros a cultivar o instrumento de uma maneira séria foram considerados verdadeiros heróis. O
engenheiro Clementino Lisboa foi o primeiro a se apresentar em público tocando violão, especialmente no
Clube Mozart, o centro musical da elite carioca fin-de-siècle. Ainda algumas figuras proeminentes da
sociedade carioca dedicaram-se ao instrumento na tentativa de reerguê-lo, tal é o caso do desembargador
Itabaiana, do escritor Melo Morais e dos professores Ernani Figueiredo e Alfredo Imenes. Um dos
precursores do violão moderno no Brasil foi Joaquim Santos (1873-1935) ou Quincas Laranjeiras, fundador
da revista O Violão em 1928, e que nos últimos anos de vida dedicou-se a ensinar o violão pelo método de
Tárrega.

Uns anos antes, 1917, Augustin Barrios se apresenta em uma série de recitais no Rio de Janeiro, tocando o
instrumento de uma forma nunca vista/ouvida antes. Segue-se a tournée de Josefina Robledo, que tendo
permanecido aqui por algum tempo, estabelece os fundamentos da escola de Tárrega.

Dessa época destaca-se a agora reconhecida obra de João Teixeira Guimarães (1883-1947) ou João
Pernambuco, sobre quem Villa-Lobos dizia, a respeito de suas obras: "Bach não teria vergonha de assiná-las
como suas." Atualmente a obra de João Pernambuco é bem conhecida graças ao trabalho de Turíbio Santos e
Henrique Pinto.

Aníbal Augusto Sardinha (1915-1955), o Garoto, foi um dos precursores da bossa-nova. Atualmente as
excelentes obras de Garoto ganharam vida nova, graças a Paulo Bellinati, que recuperou, editou e gravou boa
parte de sua obra. Mencionamos o samba-exaltação Lamentos do Morro, os choros Tristezas de um violão,
Sinal dos Tempos, Jorge do Fusa e Enigma, e a Debussyana, entre tantas outras. Ainda na linha da música
popular destacam-se Américo Jacomino (1916-1977), Nicanor Teixeira, e mais recentemente a figura de
Egberto Gismonti com suas obras Central Guitare e Variations pour Guitare (1970), ambas de caráter
experimental. Também Paulo Bellinati realiza excelente trabalho como compositor, obras como Jongo, Um
Amor de Valsa e Valsa Brilhante já ganharam notoriedade.

O violão no Brasil passou a se desenvolver, principalmente, em dois grandes centros, Rio e São Paulo, de
onde vem a maioria dos grandes violonistas brasileiros, que tiveram ou têm sua formação instrumental com
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os professores destas cidades.

Em São Paulo, o excepcional trabalho desenvolvido pelo violonista uruguaio Isaías Savio (1900-1977), que
teve sua formação violonística com Miguel Llobet, resultou em uma das melhores escolas de violonistas da
América do Sul. Depois de residir na Argentina, Savio radicou-se definitivamente no Brasil, primeiro no Rio,
depois em São Paulo. Nesta cidade, onde desenvolveu a maior parte do seu trabalho, fundou a Associação
Cultural Violonística Brasileira, e em 1947 tornou-se professor de violão do Conservatório Dramático e
Musical de São Paulo, como fundador da cadeira de violão, a primeira do país. Ainda em 1951, participou da
fundação da Associação Cultural de Violão de São Paulo. Além desta intensa atividade, Savio se distinguiu
pela composição de mais de 100 obras para o instrumento e cerca de 300 transcrições e revisões. Hoje em dia
suas compilações de estudos ainda são usadas em muitas escolas por todo o país.

Entre os discípulos de Savio que mais se destacaram está Antonio Carlos Barbosa-Lima (1944), que aos 13
anos estreou como concertista e aos 14 gravou seu primeiro LP. Barbosa-Lima é na atualidade um dos mais
conceituados violonistas, tanto em concertos, como na edição, transcrição e comissão de novas obras para o
instrumento. Basta dizer que a Sonata op. 47 de Alberto Ginastera foi por ele comissionada e a ele dedicada.
Henrique Pinto, também aluno de Savio, é reconhecidamente um dos mais importantes pedagogos do
instrumento na atualidade. Além de desenvolver uma grande atividade como editor e revisor de obras para
violão, Henrique é o responsável por uma geração dos melhores violonistas brasileiros. Entre estes estão:
Angela Muner, Jácomo Bartoloni, Edelton Gloeden, Ewerton Gloeden e Paulo Porto Alegre.

Ainda de São Paulo devemos citar a Manoel São Marcos e sua filha Maria Lívia São Marcos, radicada na
Europa, e Pedro Cameron, também compositor de excelentes obras como Repentes, vencedora do 1º
Concurso Brasileiro de Composição de Música Erudita para piano ou violão - 1978.

No Rio, destaca-se a figura de Antonio Rebelo (1902-1965), que também foi aluno de Savio quando da
residência deste no Rio. Rebelo desenvolveu atividades como docente, impulsionando o violão na cena
musical. Entre seus discípulos estão Jodacil Damasceno, Turíbio Santos, Sérgio e Eduardo Abreu.

Jodacil Damasceno (1929), além dos estudos com Rebelo, estudou com Oscar Cáceres. Turíbio Santos
(1943), também estudou com estes dois mestres e com Julian Bream e Andrés Segóvia. Santos foi o primeiro
brasileiro a vencer, em 1965, o Concurso Internacional de Violão da O.R.T.F., em Paris. Fez a primeira
gravação integral dos doze Estudos de Villa-Lobos e participou da estréia mundial do Sexteto Místico,
também de Villa-Lobos. Turíbio é um dos maiores divulgadores da obra do grande compositor brasileiro e
hoje dirije o Museu Villa-Lobos no Rio.

Os irmãos Abreu, Sérgio (1948) e Eduardo (1949), desenvolveram uma das mais brilhantes carreiras de
concertistas internacionais. Ambos estudaram com seu avô Antonio Rebelo e com Adolfina Raitzin de
Távora. Foram premiados, em 1967, no Concurso Internacional de Violão da O.R.T.F.. Realizaram inúmeras
gravações na Inglaterra, e se destacaram como um dos melhores duos de violão de todos os tempos.
Atualmente, Sérgio dedica-se à construção de violões. Ainda devemos mencionar outros violonistas cariocas
como Léo Soares, Nicolas Barros, Marcelo Kayath, também premiado em Paris, e o brilhante Duo Assad,
formado pelos irmãos Sérgio e Odair.

A música brasileira para violão tem se desenvolvido, praticamente, à sombra da excepcional, embora
pequena, obra de Villa-Lobos, que continua sendo a mais conhecida nos meios violonísticos nacionais e
internacionais.

Alguns compositores tentaram reprisar o sucesso dos 12 estudos. Este é o caso de Francisco Mignone (1897-
1986), que com sua série de 12 Estudos (1970), dedicados e gravados por Barbosa-Lima, não obteve o
sucesso musical almejado. Já o mineiro Carlos Alberto Pinto Fonseca (1943), compôs Seven Brazilian
Etudes (1972), também dedicados a Barbosa-Lima, nos quais demonstra um nacionalismo e lirismo da mais
pura escola nacionalista. O compositor paulista Mozart Camargo Guarnieri (1907-1993), uma das figuras
mais proeminentes da música brasileira escreveu pouco, mas bem, para violão. O Ponteio (1944), dedicada e
estreada por Abel Carlevaro, a Valsa-Choro e os três pequenos Estudos, apresentam-se com uma linguagem
mais livre da influência da obra violonística de Villa-Lobos.

Mais original quanto a sua linguagem musical é a obra de Radamés Gnatalli (1906-1988). A forte ligação de
Gnatalli à música popular brasileira é claramente visível em várias de suas obras que misturam a música
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urbana carioca a uma refinada técnica e musicalidade. Das suas obras para violão, destacam-se os vários
concertos para violão e suíte Retratos para dois violões, Sonata para violoncelo e violão e a Sonatina para
violão e cravo, além da inclusão do violão em várias obras para grupo instrumental de caráter regionalista.

Edino Krieger (1928) compôs uma das mais importantes obras para o repertório dos últimos tempos. A
Ritmata (1975), dedicada a Turíbio Santos, explora novos efeitos instrumentais e associa uma linguagem
atonal a procedimentos técnicos utilizados por Villa-Lobos. A obra de Almeida Prado (1943) Livro para seis
cordas (1974) apresenta uma concepção musical originalíssima livre de qualquer influência violonística
tradicional e que delineia bem o estilo deste compositor; esta obra ainda apresenta certas semelhanças com as
Cartas Celestes (1974) para piano quanto à sua concepção sonora.

Marlos Nobre (1939) tem na série Momentos a sua obra mais importante para violão. Escrita a pedido de
Turíbio Santos e projetada para 12 números, os primeiros quatro foram escritos entre 1974 e 1982. Ainda de
Nobre destaca-se a Homenagem a Villa-Lobos e Prólogo e Toccata op. 65. Para dois violões, Marlos Nobre
recriou 3 Ciclos Nordestinos dos originais para piano, ótimas obras miniaturas que utilizam motivos do
folclore nordestino. Ricardo Tacuchian (1939) escreveu Lúdica I (1981), dedicada a Turíbio Santos, em que
apresenta uma linguagem contemporânea com toques de nacionalismo e efeitos sonoros os mais diversos. A
sua Lúdica II (1984), escrita em homenagem a Hans J. Koellreutter, é uma obra mais tradicional quanto à sua
concepção sonora. Jorge Antunes (1942) escreveu Sighs (1976), na qual o autos requer uma afinação
especial para o segundo movimento, uma invenção em torno da nota si.

Lina Pires de Campos escreveu o excelente Ponteio e Toccatina (1978), obra premiada no 1º Concurso
Brasileiro de Composição de Música Erudita para Piano ou Violão - 1978. Deste mesmo evento surgiram
novas obras, como o já mencionado repentes de Pedro Cameron, a Suíte Quadrada de Nestor de Holanda
Cavalcanti e o ótima Verdades de Márcio Cortes.

Ainda cabe aqui mecionar a obra do boliviano, radicado e ligado a Curitiba e ao Brasil durante anos, Jaime
Zenamon (1953), dono de uma excelente e prolífica produção para o instrumento que tem sido extremamente
bem aceita nos meios violonísticos internacionais. Entre suas obras destacam-se Reflexões 7, Demian, The
Black Widow, Iguaçu para violão e orquestra, Reflexões 6 para violoncelo e violão, e a Sonatina Andina para
dois violões.

Para finalizar mencionaremos jovens talentos na composição e que se destacam por sua produção para
violão: Francisco Araújo, Celso Machado, Artur Campela e Sérgio Assad que escreve, para o duo com seu
irmão, excelentes obras de caráter virtuosístico de efeito impressionante. Devem ser lembrados também
Jácomo Bartoloni, que tem escrito excelentes obras tonais como Elíptica, Ditirambo e o tango Martes, que
têm sido muito executadas, e Paulo Porto Alegre, com a Mini Suíte, que apresenta uma clara influência da
obra de Leo Brouwer. E ainda o paranaense Chico Mello, que tem a ótima Do Lado do Dedo (1986), obra de
caráter experimental e que explora efeitos sonoros inéditos, e como o próprio Chico diz: "minimalista à la
Chico".

Bibliografia - História do Violão / autor: Norton Dudeque / 1958 / Curitiba.

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