A Ética Tomista - Faitanin
A Ética Tomista - Faitanin
A Ética Tomista - Faitanin
A Ética Tomista
por Paulo Faitanin - UFF
Fonte: http://www.aquinate.net/portal/Tomismo/Filosofia/tomismo-filosofia-a-etica-
tomista.html
3.1. Ética Geral: (a) O fim último do homem: o homem, por todo e qualquer ato humano que
proceda da vontade livre [Sum. Theo. I-II, q.1,a.1 e 3], age em vista de um fim último, que é a
felicidade [In I Eth. lec.9,n.105] e é impossível que se dirija simultânea e absolutamente a
muitos fins últimos, pois a exceção do último, todos os demais são imperfeitos [In I Eth. lec.9,
n.109] e só o último satisfaz plena e perfeitamente todo o apetite do homem [Sum. Theo. I-
II,q.1,a5/In II Sent. d.31,q.1,a.1,c]. Por isso, a felicidade humana não se encontra nos bens
criados, senão só em Deus [In I Sent. proem. q.1,a.1/Sum. Theo. I-II,q.2,a.8], consistindo em
seu conhecimento [C.G.III,48]. Tal felicidade, que consiste no conhecimento de Deus, o
homem não atinge nesta vida, mas atinge a felicidade imperfeita, pelo conhecimento do amor
de Deus e na prática das virtudes [C.G. III,48/In X Eth. lec.12, n.2111], enquanto se exigi
também, para tal, certos bens exteriores necessários e suficientes para a manutenção de sua
vida e do aperfeiçoamento de sua natureza [In IV Sent. d.43, a.1,c/C.G.III,38-40]. (b) O ato
voluntário: por ação voluntária entende-se aquela que procede de um princípio intrínseco -
exclui, portanto, a violência [In III Eth, lec4,n425] - com conhecimento formal do fim [Sum.
Theo. I-II,q6,a1,c]. O voluntário pode ser livre ou necessário, em si ou em causa, positivo ou
negativo [Sum. Theo. I-II,q6,a2/q20,a5/II-II,q64,a7/De malo, q1,a3,ad15]. Dentre aquelas
coisas que influenciam o voluntário contamos: a concupiscência - o movimento do apetite
sensitivo ao bem prazeroso [In III Eth. lec4,n.426] -, o medo - paixão causada pela eminência
de um mal difícil de evitar [In IV Sent. d.29,a1] -, a violência - que viola o uso livre do
princípio intrínseco -, a ignorância - que tolhe o conhecimento devido [De malo, 3,8/Sum.
Theo. I-II,q76,a3]. (c) O ato moral: por ação moral entende-se aquela ação voluntária,
portanto livre, acerca de um bem ou mal [De malo, q.2,a4/C.G. III,9/Sum. Theo.
I,q48,a1,ad2]. A moralidade é primeira e principalmente especificada pelo objeto e
secundariamente pelas circunstâncias - quem, o que, onde, com o que, porque, de que
modo e quando - e pelo fim [In III Eth. lec3,n414/Sum. Theo. I-II,q7,a3/I-II,q18,a4]. O ato
humano que é sempre individual nunca é indiferente moralmente. A indiferença moral resulta
da carência de conformidade ou da inadequação com relação à regra moral [Sum. Theo. I-
II,q18,a9/De malo, q2,a5]. O ato humano moralmente mau é denominado pecado. O pecado
consiste na privação de conformidade e adequação com a regra moral e na aversão e ofensa ao
fim último que é Deus. O pecado pode ser atual, enquanto atualmente é contrário à lei eterna e
quase habitual, quando consiste numa certa disposição. Pode ser grave ou mortal, quando pelo
ato humano o homem se volta eficaz e absolutamente para o bem criado e toma aversão ao
fim último que é Deus; e leve ou venial, quando o homem pelo ato humano se volta utilitária e
parcialmente para o bem criado, mas não toma total aversão ao fim último [Sum. Theo. I-
II,q72,a5/De malo,q7/C.G.III,139]. É ato mau ou pecado o ato livre que contraria a lei da
natureza, ou seja, a lei inscrita por Deus nos corações dos homens. (d) A lei moral: a lei pode
ser considerada de diversos modos: em sentido geral, é a medida de qualquer ato - a lei física
regula as atividades das forças naturais e, em sentido estrito, é o que regula os atos humanos.
A lei é um princípio racional que estabelece ordenação dos atos humanos para o bem comum,
para o bem da comunidade e pela comunidade é promulgada [Sum. Theo. I-II,q90,a4]. Sendo
uma ordenação da razão, é a própria razão a reguladora dos atos humanos, em função do bem
último a que se ordenam tais atos. A lei pode ser essencial, enquanto procede de Deus como
princípio e regra de todas as ações humanas e participativa, enquanto estabelecida pelo
homem; e esta pode ser positiva essencial ou acidental: a essencial é a lei civil estritamente
considerada e a lei acidental, é aquela que se pauta nos princípios gerais da lei natural [Sum.
Theo.I--II,q90,a1,ad1/q91;95,a4/In V Eth. lec12]. Quis Deus por sua providência dar-nos a
conhecer, em nossa mente, por participação, a sua lei eterna. Esta é a lei natural inscrita na
mente humana e que é a participação da lei eterna de Deus. É da lei natural na mente humana
que procede a lei civil, na qual deve manifestar uma inclinação natural à lei eterna [Sum.
Theo. I-II,q91,a2,c/C.G.III,129/In V Eth. lec12]. Cabe ao legislador observar o ensinamento
da mesma e prevenir acerca da sanção, no caso da sua não observação. A lei, portanto, obriga
o sujeito a observá-la, sob aplicação de pena no caso de sua não observação [C.G.III,140/In I
Sent. d39, q2,a2,ad5/Sum. Theo.
I-II,q2,a2,ad1/II-II,q58,a3,ad2/I-II,q96,a4/II-II,q60,a5,ad1/II-II,q108]. A lei próxima da
moralidade é o ditame da razão - a reta razão do agir -, enquanto participação da lei eterna
divina. A regra suprema da moralidade é Deus, pois não encontramos na razão a regra
suprema da moralidade, senão os ditames que são a participação em nós dos princípios da lei
eterna divina, que é a regra suprema [C.G.III,129/Sum. Theo. I-II,q19,a4/I-II,q71,a6/I-
II,q72,a5/II-II,q17,a1/De ver. q23,a7/De malo,q2,a4/C.G.III,9]. (e) As paixões da alma: as
paixões são os movimentos dos apetites sensíveis, pela imaginação do bem ou do mal [Sum.
Theo. I-II,q22,a3/De ver.q26,3/In II Eth. lec5,n292]. A alma humana, dita racional ou
intelectiva, possui as faculdades: intelectiva que possui duas potências - a razão que se ordena
à verdade e a vontade que, sendo apetite do intelecto, se ordena ao bem; sensitiva que possui
duas potências - a concupiscível que move a alma para a busca de bens sensíveis e evita os
males sensíveis e a irascível que move a alma para a busca de bens sensíveis difíceis de
conseguir e evitar os males sensíveis difíceis de evitar e a vegetativa que move a alma
humana na consecução e realização de suas funções inferiores correlatas ao corpo, como
crescimento e diminuição. Pois bem, a potência sensitiva opera mediante os órgãos dos
sentidos. Por meio dos sentidos produz-se a sensação nos órgãos dos sentidos [Sum. Theo. I-
II,q10,a3/De malo,q3,a9-10/Comp. Theo.c128]. Tais sensações quando recebidas na alma -
por isso são paixões da alma - produzem, pela imaginação que causam nos sentidos internos
[além da imaginação, estes são os outros três sentidos internos: senso comum, memória e
estimativa ou instintos], certos movimentos, que vão desde o desejo da posse de um bem
sensível ou da aversão de um mal sensível. Daí as paixões, emoções ou sentimentos, serem
estabelecidas em dois grupos: um concupiscível, caracterizado pelo movimento que se pauta
na busca do bem sensível e na aversão do mal sensível e outro irascível, que se caracteriza
como um movimento mais violento, seja para conseguir um bem difícil de conseguir ou para
evitar um mal difícil de evitar. Daí termos as seguintes paixões [Sum. Theo.
I-II,q23,a4/q22,a2,ad3/In II Eth.lec5,n293/De ver.q26,a4]:
As paixões da alma
presente>
amor ódio
acerca
acerca do bem ausente>
desejo aversão do mal
presente>
concupiscível alegria tristeza
acerca
do mal
afastando>
esperança audácia difícil
acerca do bem difícil ausente
ausente: irascível
aproximando> temor
desespero
As virtudes cardeais
Intelecto: hábito dos primeiros
princípios teóricos que permite a
intuição dos primeiros
princípios [Sum. Theo. I-II,q57,a1].
Sindéreses: hábito dos primeiros
princípios práticos que notifica a
consciência como deve agir fazendo
Especulativa: inclina o
o bem e evitando o mal [Sum. Theo.
intelecto para a verdade
I,q79,a12].
universal
Sabedoria: hábito de considerar as
coisas à luz das últimas
causas[Sum. Theo. I-II,q57,a2].
Ciência: hábito de considerar as
coisas à luz das causas
Virtudes intelectuais: particulares [Sum. Theo. I-
aperfeiçoam a inteligência II,q57,a2].
Prudência: reta razão do agir para
agir como se deve agir em cada
Prática: inclina o intelecto
momento [Sum. Theo. II-II,q47].
para o juízo reto acerca das
Arte: reta razão de fazer para fazer
operações particulares
bem certos objetos [Sum. Theo. I-
II,q57,a3].
Todas as virtudes morais se conectam entre si e supõem a prudência [Sum. Theo. q65,a1/De
virt. card. ai,ad1/Quodl. XII,a22] e todas dispõem a vontade ao fim último [In VI Eth.
lec10,n1270 e lec11,n1289]. Já que o apetite não se inclinaria ao fim último se a razão e a
vontade não fossem afetas pelas paixões e se a razão e a vontade não fossem dispostas
segundo a reta razão do agir pelos hábitos, conclui-se que as paixões e os hábitos são
disposições especiais pelas quais o homem pela razão e pela vontade age em função do fim
último [In I Eth. lec13,n516/Comp. Theo. c.174/Sum. Theo. I,q20,a1,ad1/De
ver.q24,a1,ad19/De virt. card. a2]. Seria equivocada a opinião que sustentasse que, porque são
as paixões e os instintos que favorecem a formação de vícios, não seriam tais disposições
adequadas à formação de virtudes. Nada mais incorreto, pois se são os instintos e as paixões
naturais disposições da alma, são elas mesmas as mais adequadas para a formação das
virtudes. Por isso, diz-se que as paixões e os instintos em si mesmos considerados, não são
nem bons nem maus, porque são disposições naturais da natureza, são bons e maus segundo o
uso ou não do reto ditame da razão. No estado da vida presente em que a alma se encontra
unida ao corpo não se atinge o fim último; mas no estado da vida futura, em que a alma se
encontra separada e que pode atingir o fim último, para ela deve ordenar-se toda a vida atual,
segundo a ordenação da reta razão dos atos humanos [De ver. q24,a11/C.G.IV,92 e 95].
(g) Os vícios: temos visto até aqui que a virtude é a disposição do que é perfeito para o
melhor, por perfeito entende-se o que está disposto segundo o modo de sua natureza [Sum.
Theo. I-II,q71,a1,c]. Três coisas se encontram em oposição à virtude: o pecado, que se opõe
ao fim bom que a virtude se ordena; a malícia, que se opõe àquilo a que se ordena a virtude, a
bondade e o vício, que se opõe à disposição habitual da virtude ao bem [Sum. Theo. I-
II,q.71,a1.c]. Vício é a privação de perfeição da natureza por disposição habitual contrária ao
bem da mesma [Sum. Theo. I-II,q71,a1,c]. O vício opõe-se à virtude. Ora, a virtude de cada
coisa consiste em que esteja bem disposta segundo o que convém à natureza. Logo, deve-se
chamar vício, em qualquer coisa, o fato de estar em disposições contrárias ao que convém à
sua natureza [Sum. Theo. I-II,q71,a2,c]. O hábito é que está no meio entre a potência e o ato.
É evidente que o ato é mais do que a potência, no bem como no mal. Por isso é melhor agir
bem do que poder agir bem e, do mesmo modo, é pior agir mal do que poder agir mal.
Portanto, o ato vicioso é pior do que o hábito mal ou o vício [Sum. Theo. I-II,q71,a3,c]. Pois
bem, denomina-se pecado, como já aludimos, o ato vicioso que se opõe: à lei eterna, que é
Deus, ou seja, é a aversão a Deus e a conversão às coisas criadas e à lei natural da razão, que é
a lei da natureza humana. Portanto, em oposição às virtudes cardeais há os vícios ou pecados
capitais, ditos deste modo, porque são cabeças e dão origem a muitos outros [Sum. Theo. I-
II,q.84,a4,c]. Os vícios se dividem segundo a oposição às virtudes. Sendo assim, temos:
Os vícios capitais
À prudência, a reta razão soberba: apetite desordenado da
de agir, que ordena e própria excelência e início de todos os
inclina a razão ao fim vícios [Sum. Theo. I-II,q84,a2,c].
último que é Deus, se avareza: apetite desordenado das
contrapõe o vício riquezas, de qualquer bem temporal e
corruptíveis [Sum. Theo. I-
II,q84,a1,c].
À justiça, que ordena e inveja: apetite desordenado dos bens
inclina a vontade dar a alheios que se caracteriza como uma
cada um o que lhe tristeza em que considera que o bem
convém se contrapõem do outro é um mal pessoal [Sum.
os vícios Theo. II-II,q36,a1,c].
preguiça: apetite desordenado que se
configura como uma tristeza profunda
que produz no espírito do homem tal
depressão que este não tem vontade
ou ânimo de fazer mais nada, e se
manifesta como um torpor do espírito
que não pode empreender o bem[Sum.
À fortaleza, que põe Theo. II-II,q35,a1,c].
firmeza na vontade ira: apetite desordenado que se
Vícios configura como tristeza e se conflagra
frente ao apetite
capitais: desorde sensitivo irascível se no desejo e na esperança de
m do intelecto e contrapõem os vícios vingança [Sum. Theo. I-II,q46,a1,c].
das potências gula: apetite desordenado do desejo e
apetitivas do deleite de alimentos [Sum. Theo.
II-II,q148].
luxúria: apetite desordenado do
desejo e dos prazeres sexuais [Sum.
Theo. II-II,q153].
3.2. Ética Especial ou Social: A segunda parte da Ética versa acerca da Ética Social, ou do
comportamento humano em sociedade, na medida em que busca o fundamento da
sociabilidade humana. (a) O direito natural: o direito natural fundamenta-se na lei natural -
participação em nós da lei eterna - inscrita na natureza do homem, enquanto a dispõe a agir
bem e adquirir virtudes, das quais a justiça aperfeiçoa e modera a vontade; virtude, por meio
da qual o homem toma consciência do que lhe convém e o faculta a dar a cada qual o que lhe
convém. O direito natural é essencial ao homem, porque se fundamenta na lei natural e o
essencial desta tal lei, como já vimos, está contida primeiro na lei eterna e secundariamente na
lei natural [Sum. Theo. I-II,q71,a6,ad4]. É próprio do direito natural buscar o que lhe é devido
por natureza, como, por exemplo, os meios necessários para o aperfeiçoamento de sua
natureza. A busca do que convém a cada qual é objeto próprio da justiça. Ora, neste sentido, o
direito natural é objeto próprio da justiça [Sum. Theo.II-II,q57,a1], que é a virtude que regula
o apetite da vontade. O sujeito do direito natural é a pessoa humana e o seu fundamento é a lei
eterna [In I Pol. lec1/Sum. Theo. II-II,q57,a3]. (b)O direito individual: A pessoa humana tem,
pela liberdade, no que se refere ao seu bem integral, o pleno direito sobre si mesma, mas com
relação às coisas que lhe são inferiores, tem o direito perfeito de propriedade, mas não o tem
com relação à outra pessoa [In I Pol. lec2 e lec.6/C.G.III,22/Sum. Theo. II-II,q64,a1/In III
Eth. lec14,n536]. A pessoa humana pelo direito que lhe faculta os ditames da razão pode
adquirir propriedades e bens materiais, seja para consumir ou usar [Sum. Theo. I-
II,q94,a5,ad3/II-II,q66,a7/In II Pol.lec4/C.G.III,127]. (c) O direito social: o homem é
naturalmente um animal social [In I Pol. lec1/In I Eth.lec1/De regim. princ. I,c.1/Sum. Theo.
I,q96,a4]. E a primeira ordenação humana é a constituição da família, a sociedade conjugal, a
sociedade doméstica [In VIII Eth. lec12/In I Pol. lec1/Sum. Theo.
II-II,q154,a2/C.G.III,122,126]. Fundamentado no direito natural, na liberdade, os parentes e
os demais homens da sociedade doméstica devem ser educados [in VIII Eth.lec11/Sum. Theo.
II-II,q10,a12/C.G.III,122]. O matrimônio pela lei natural é união indissolúvel do homem com
a mulher, sendo o adultério e a fornicação ilícitos e contra a lei natural [Sum. Theo. II-
II,q154,a2/C.G.III,122-123]. A sociedade doméstica ordena-se à sociedade civil, que deve
aperfeiçoá-la. Os filhos são o bem supremo da família e o tesouro da sociedade. Portanto, a
causa da sociedade civil é a doméstica e o seu fundamento é a lei natural que dispõe o homem
por natureza a viver em sociedade [De regim. princ. I,c.1/In III Pol. lec5/In X Eth. lec16]. O
princípio ou causa próxima da sociedade civil é a lei natural, sendo esta dificultada por
alguma razão, o pacto social, pautado em legislação que não contrarie o bem comum, deve ser
a solução, na medida em que constitua uma autoridade ordenadora deste pacto e da
sociabilidade [In III Pol. lec.13/Sum. Theo. I-II,q90,a3/q97,a3,ad3]. O fim da sociedade civil
é a felicidade e o bem dos cidadãos, sem que com isso se oponha ao fim absoluto a que por
natureza e lei natural todo homem ordena-se [In VIII Eth. lec9/C.G.III,128;IV,54/De regim.
prin. I,c14/Sum. Theo. I-II,q95,a4]. O fundamento da relação entre sociedades civis distintas
será a lei natural. A guerra somente seria justa, em caso de oposição entre sociedades, sob três
aspectos: autoridade, justa causa e reta intenção de um bem maior [Sum. Theo. II-II,q40,a1].
Para o bem comum de todos os cidadãos, justa medida de punição deve ser aplicada aos que
causam desordem à sociedade, inclusive a condenação à morte, não tendo sido eficazes os
remédios necessários, ou seja, se cada pessoa está para toda a sociedade, como a parte está
para o todo, se algum homem se torna perigoso para a comunidade e ameaça corrompê-la por
seu pecado, é louvável e salutar matá-lo [Sum. Theo. II-II,q64,a2,c]. Pois bem, assim como há
as virtudes morais individuais, ditas do homem individual que as adquire por seu hábito e
aprendizado próprio, há também as virtudes e os vícios sociais, ou seja, que visam o
comportamento e as relações sociais. O que aqui destacamos como 'virtudes sociais' em
Tomás de Aquino são apenas virtudes anexas da justiça, suas partes potenciais. Portanto, não
se deve perder de vista a intenção do Aquinate que procura elucidar o papel e a importância
da virtude pessoal da justiça no contexto prático da vida em sociedade. Diferente do contexto
contemporâneo que visa, a partir da virtude da justiça, elucidar a dimensão política e não
meramente pessoal. Neste sentido, o Aquinate tem mais razão que os contemporâneos que
buscam fundamentar uma ação numa substância 'invisível' que é o Estado, ao contrário ele
sempre fundamenta a ação em seres individuais e, neste caso, em pessoas humanas. A virtude
diz-se social porque é humana, pessoal e individual; de homem que convive com outros
homens. Eis, pois, as principais virtudes. [Sum. Theo. II-II,qq101-122]:
Virtudes Sociais
piedade: é a virtude pela qual se dá o devido respeito que se deve aos
pais, parentes, amigos e à pátria [Sum. Theo. II-II,q.101,a.1,c]. Opõe-
se à piedade a impiedade, ou seja, a falta de respeito devido às referidas
pessoas e instituições.
respeito: é a virtude pela qual se reconhece a excelência e dignidade de
outrem e o dever de prestar-lhe honras[Sum. Theo. II-
II,q.102,a.1,c]. Opõe-se à virtude do respeito o desrespeito, ou seja, a
falta de respeito devido às referidas pessoas e instituições.
honra: é a virtude pela qual ao se reconhecer a excelência e dignidade
de outrem manifesta tal reconhecimento pelo testemunho das palavras,
gestos, saudações, ou com oferendas, brindes, estátuas [Sum. Theo. II-
II,q.103,a.1,c]. Opõe-se à virtude da honra a desonra, ou seja, a falta do
testemunho devido à excelência de quem a quem se deve
reconhecimento.
obediência: é a virtude pela qual se reconhece pela ordem do direito
natural e do divino, a retidão e a excelência do mando de uma
Virtudes sociais
autoridade superior [Sum. Theo. II-II,q.104,a.1,c]. Opõe-se à virtude
da obediência a desobediência [Sum. Theo. II-II,q105,a1,c].
gratidão: é a virtude pela qual se reconhece a generosidade dos
benfeitores [Sum. Theo. II-II,q.106,a.1,c].Opõe-se à virtude da gratidão
a ingratidão [Sum. Theo. II-II,q.107,a1,c].
verdade: é a virtude pela qual alguém diz a verdade e nesta acepção se
diz verdadeira e é a virtude que torna bom aquele que a possui e faz
com que a sua obra seja boa [Sum. Theo. II-II,q.109,a.1,c]. Opõe-se à
virtude da verdade a mentira [Sum. Theo. II-II,q.110,a.1,c] a simulação,
a hipocrisia [Sum. Theo. II-II,q111,a1-4], a jactância[Sum. Theo. II-
II,q112,a1,c], a ironia [Sum. Theo. II-II,q113,a1,c].
amizade: é a virtude pela qual se mantém a harmonia da ordem entre
as relações humanas em vistas ao bem comum e do convívio [Sum.
Theo. II-II,q.114,a.1,c]. Opõe-se à virtude da amizade a inimizade e a
adulação[Sum. Theo. II-II,q.115,a.1,c].
liberalidade: é a virtude pela qual se faz bom uso daquelas coisas que
poderíamos usar mal [Sum. Theo. II-II,q.117,a.1,c]. Opõe-se à virtude
da liberalidade a injustiça, a avareza [Sum. Theo. II-II,q.118,a.1,c],
aprodigalidade [Sum. Theo. II-II,q.119,a.1,c].
eqüidade: é a virtude parte essencial da justiça pela qual se realiza a
justiça legal, por isso é a justiça com propriedade [Sum. Theo. II-
II,q120,a1,c]. Opõe-se à virtude da eqüidade a injustiça.
Bem
Deus
Moral
Virtude