A Freira No Subterrâneo
A Freira No Subterrâneo
A Freira No Subterrâneo
LUZ
• FLORESC
THE LIBRARY
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08
VINCNE
REGENTS 16.
11.
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OMNIBUS K
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ARTIBUS
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ENCADERNADOR
ouessa da
Darualliosa , 52
PORTO
200
A FREIRA NO SUBTERRANEO
ROMANCE HISTORICO
TRADUZIDO
POR
PORTO
TYPOGRAPHIA - PEREIRA DA SILVA
Impressor da Casa Real
1872
(
1
1
8696277
Ofr
ADVERTENCIA DO TRADUCTOR
Foi tão bom para commigo até hoje ... Tratou-me com
tanto mimo, e quer n’um momento destruir as caricias
de desasete annos . Pense, meu pai ! Olhe que vai fazer
a desgraça de sua filha, condemnal-a á morte peior que
a dos criminosos ...
« Minha filha , respondeu o juiz , rasgas -me o cora
ção, e fazes -me com as tuas lagrimas maior mal do que
tu imaginas ...
-Então enchugue-m'as, meu pai .
- Não posso, por que a minha posição de pai me
obriga a fazer - te feliz embora não queiras... Tu amas,
crês amar um homem de vinte annos, sem posição , po
bre, sonhador de chimeras, que te arrebatou a não sei
que mundo perigoso e falso, embriagando-te com pro
messas tanto mais perturbadoras quanto ellas se desfa
zem no vago .Filtrou-te ao coração isso que os homens
chamam poesia, e que tu bebeste a longos haustos ...
Wladimir sabe que és rica, vê-te formosa, que admira
que elle te queira ?
Quer-me sim ; mas não pede dote .
--Mas sabe que eu não deixarei minha filha ser
pobre .
- E por que não , se eu antes quero com Wladimir
a miseria do que a opulencia com o conde de Sergy !
Dou importancia á riquesa como accessorio, mas como:
base da felicidade não . Wladimir não é nobre ?
-É .
-O pai sabe que elle trabalha incessantemente; e
se a sua familia, empobrecida pelas revoluções , nada lhe:
7
longos discursos.
Vanda comprehendia que a sua sorte ia ser decidi
14 A FREIRA
da pelo commissario .
Um lucta somente contra os argumentos, o outro
sacrifica -se pessoalmente muitas vezes . Pamza possuia
24 A FREIRA
E '.
-Se me não falha a memoria, esta menina foi man
dada ao convento pela familia que o não considerou rico
bastante para ser marido d'ella.
FO
E verdade.
Em 1841 soaram em Cracovia estranhos rumores
a respeito d'esta mesma senhora: disse-se que v. ex.a
viera a esta cidade e diligenciava arrancar a menina do
convento .
Assim foi.
-Uma patrulha impediu a execução do projecto.r.
mas não houve procedimento. A tentativa de rapto ficou
abafada em misterio tão importante ao interesse de Bar
bara, como ao interesse do snr . Zolpki e da sua fami
lia ... Depois ...
--Cazei-me, e o senhor sabe qual a minha vida tem
sido .
-Não suspeita que alguem lhe désse este aviso ?
-Não .
--Examinemos, replicou o commissario . A carta
está escripta em optimo papel, compacto , um verdadeiro
papel inglez... Logo quem quer que lhe escreveu é abas
tado... O caracter da lettra é redondo, largo e grande ...
e a margem enorme... O auctor da carta denota gene
rosidade e excellente natureza. Phrase breve e laconica ...
, auctor desculpa -se de empregar tal meio para lhe trans
0.
mittir a verdade ..: logo receia prejudicar alguem ... O
segredo não é só d'elle... Movido por amor á justiça de
nuncia factos que sabe ; mas sem duvida, se nos dissesse
o nome levar-nos-hia no incalço de culpado que elle não
quer denunciar... E' talvez parente ou amigo ... Alguma
26 A FREIRA
-Recorrer ao bispo.
-0 bispo não punirá freiras.
- Por que não, se é justo ?
2
--Diz missa.
-Não podemos esperar .
Se é caso reservado ...- balbuciou o famulo, sa
hindo ás « recuadas .
O bispo veio logo.
E o juiz disse o seguinte:
-Monsenhor, a nossa authoridade succumbe hoje
diante d’uma porta que precisamos abrir .... Fui avisa
do de que uma freira é detida ha vinte annos no tronco
do convento das carmelitas . Queremos salvar a desgra
çada presa, interrogar e castigar aquellas que exercem o
mister de verdugas.
-E' impossivel o que me diz !-clamou o bispo.
As religiosas do Carmo vivem edificantemente austeras .
O seu capellão não cessa de nos elogiar a pontualidade,
modestia e zelo com que vivem .
-Quem sabe se o capellão não é cumplice d'ellas ?
-Observou o chefe de policia.
Permitta Deus que se enganem , senhores; mag
eu toda a vida me reprehenderia se atravancasse a ac
ção da justiça, e estorvasse o cumprimento d’um acto de
reparação. Entrem , pois, quando quizerem no convento
das carmelitas, e para isso lhes vou dar plena authori
sação. Não posso agora acompanhal-os , por que está
cheia a capella episcopal de fieis que me esperam : são
horas de celebrar o sancto sacrificio da missa. Mas antes
que hajam concluido a sua visita , irei encontral-os, ou
NO SUBTERRANEO . 29
O IN PACE ( * )
ferno.
-Não me enganem murmurou ella com voz in
ternecida - Se me querem matar, façam -no ... facil é...
aqui estou . Que supplicio não será preferivel a esta vida?
-Nós viemos a salval-a !-repetiu Zolpki—Em no
me da lei e da justiça levante-se, que nós vamos ampa
ral-a para sahir d'este carcere.
Pamza acercou -se da prelada e disse: « Dê cá o seu
manto para cobrir aquella desgraçada .»
Só n’este momento , Barbara divisou a prelada ; e en
tão vibrando um grito estridente correu impetuosa para
o fundo da masmorra, bradando:
-Mentem ! querem enganar-me. A furia está ali, o
supplicio está perto. Ah! sim, pois não saio , matem -me
aqui, d'um golpe, por piedade! E' muito... morrer a pe
daços!
-Em nome de Deus lhe juro que venho soccorrel- a
-- replicou Zolpki .
46 A FREIRA
3
Ponha esta capa - disse o bispo meigamente.
Mas Barbara, reconhecendo o habito religioso, re
9
cusou .
E então o bispo, tirando a propria capa, lançou -Ik'a
sobre os hombros .
Barbara envolveu -se, e das dobras negras resalta
va -lhe a face livida como cabeça mumificada pela morte .
Zolpki e Pamza ampararam -na.
· Dois esbirros ladearam a prioresa .
O serralheiro ía á frente do grupo levando aa tocha :
Quando Barbara chegou ao topo da escada, cahiu ,
ajoelhou, e soluçou como creança . 3
POR
OR 1817 , nascia em Czerniakow , nas cercanias de
Varsovia, uma d'essas explendidas crianças das quaes
nos contos das fadas se diz : Ella era formosa como o
dia. A familia dos condes de Ubryk era opulenta. Bar
bara, ao entrar no mundo, foi saudada com extremos de
alegria. Pai e mãe acariciavam -na á competencia , e a
creança cresceu entre duas ternuras cujo defeito era a
exaggeração. Os haveres dos Ubryks permittiram que
Barbara fosse educada com esmero, e bastante é dizel-o
assim , quando se falla d’uma donzella do norte. Por mui
to soberbos que sejamos em França da nossa nacionali
dade, talento, e vivesa de espirito, é mister reconhecer
que a educação de nossas filhas, está muito áquem , da
que recebem as russas e as polacas. Barbara, de na
tural ardente, palpitante de vida e enthusiasmo, estuda
60 A FREIRA
sas preclaras.
Continuou o elogio do moço algum tempo ainda,
por modo qué Barbara se interessou por elle sem o co
nhecer, por que nome nenhum se dera áquelle retrato.
De repente um dos dois, mostrando ao seu amigo
um gentil rapaz, disse :
-Elle aqui vem para nós .
De certo ia para elles , mas com certeza não os via:
>
Barbara .
Ao menos vou fazer-lhe os funeraes pomposos.
-Vá, que o seguem os votos de todas as polacas.
-De todas ? E' de mais .
-Não ! A patria é mãe de todos nós .
-Pois, se eu succumbir na lucta, tenha saudades de
2
mim .
-Antes quero offerecer-lhe um talisman ... Acceite
este raminho de urze... Na volta m'o entregará. Já vê
por isto que tem obrigação de voltar.
C
-E tornarei a vêl-a ?
-Hade ver .
-Talvez não saiba a historia das nossas familias...
-Eu não acceito herança de odios; além de que, o
cavalheiro' serve a causa da patria , que é o laço sancto
da familia .
-E pensará em miin ?
68 A FREIRA
-Pois se eu o espero...
A fina mão de Barbara estremecera no braço do
mancebo .
-Ahi vem meu pai- disse ella alvoroçada.
Zolpki desappareceu , mas não tão rapido que Ubrik
o não reconhecesse. Pelo que dardejou á filha um severo
olhar .
-Sabes quem dançou comtigo ?
Barbara hesitou na resposta; mas, vencida pela fran
queza do caracter,, respondeu:
Sei.
-E não receias desobedecer -me ? ..
-Pois que me prohibiu ?
-Ha preceitos implicitos. Sabes de mais que odeio
a familia Zolpki.
--E tambem sei que Ladislau é estimado e admira
do; e sei tambem que estou n'um baile e que dancei...
não sei mais nada .
-A isso ajuntarei que a prohibo de fallar com tal
homem .
--Comprehendo, meu pai.
- E , se transgredir esta ordem ...
>
-Não diga mais nada ... E' tarde ... quer que nos
retiremos ?
E' o que Ubryk desejava.
Desde esta noite Barbara teve um segredo para seu
pai .
O amor que lhe prohibiam implantou -se tanto mais
entranhadamente quanto era o esforço para lh'o arran
car . E do mesmo passo que ella ouviu encarecer a cora
gem e patriotismo de Zolpki, mais vibrava de jubilo ou
NO SUBTERRANEO . 69
O POEMA ETERNO
-Ai, filha !
-Quer dizer que isto é um sonho ? Pois seja. Mas
por que não havemos de continual- o com a obstinação do
desejo !? A mim parece -me que, á força de vontade, se
vence o destino , e o que desejamos se realisa por effeito
d'uma lei de attracção moral; eu por mim só me cazarei
por amor, por que d'outra maneira nunca acceitarei ma
rido .
-Pobre creança ! -murmurou á condessa.
-Não me lamente, approve.
--Quizera, mas não posso ..
-Censura -me ?
-A mãe não ousa dizer-te que tens razão .
-Isso não pode ser, permitta-me que lh'o diga,
não pode ser assim ... O que eu penso ... é o que a mãe
pensa ou já pensou... Se fossemos sósinhas aqui, estava
tudo decidido; más ha um estorvo ...
-Um estorvo ...
-Meu pai ... Sei que elle , fiel ao seu systema im
perativo, hade querer impôr-me cazamento que mereça a
approvação dos seus chefes, e o suffragio do partido rus
so ... A mãe abaixa a cabeça... entendo-a... não me res
ponde nem eu quero que me responda ... é-me doloroso
expôl-a a mentir, a mim ou a elle... Veio procurar-me
ao meu quarto; isto, á primeira vista, parece simples...
måe e filha tem sempre necessidade de se verem e con
fiarem insignificancias que são coisas grandes como tudo
que pertence ao amor... Entretanto, algum motivo aqui
trouxe minha mãe ... não me engane . A maneira como
me abraçou não era a do costume... O seu lance d'olhos
espreitava tudo o que está por aqui ... Foi meu pai que
NO SUBTERRANEO . 85
-
-Escuta, Barbara - disse o conde -a minha von
tade é immutavel... A’manhã entrarás no convento .
C
-Entrarei, meu pai .
>
exclamou o moço .
A infeliz saltou - lhe aos braços, d'onde o pai a arran
cou de repellào, lançando Zolpki fóra do jardim .
Quando voltou, Barbara, rigida e inanimada, estava>
cahida em terra.
Ubryk tomou - a nos braços e levou-a á camara da
mãe .
.
-Aqui está como educaste tua filha--disse elle
encontrei esta amorosa no jardim , em galante entrevista
com Zolpki . A’manhã leval-a-hei ao convento das car
melitas.
-Oh ! tu não praticarás semelhante crueldade! --
exclamou a mãe .
-A'manhã -repetiu o conde .
No dia immediato a nova da entrada no Carmelo
da formosa Barbara não era a unica de que a sociedade
se preoccupava. Ao mesmo tempo era preso em sua ca
sa, sem processo algum , o joven patriota Zolpki e con
duzido ninguem sabia onde; talvez. encarcerado n’algu
ma fortaleza.
VI
MORTA E VIVA
Ergueram -na.
A ultima palavra do seu destino estava dita.
$ Levaram -na ao locutorio . ... in
Esperavam -na a condessa e o conde de Ubryk.
A mãe abraçou - a desfeita em lagrimas.
O conde disse- lhe em voz baixa: :
-Estás perdoada..
E ella nem se inclinou nem respondeu a taes pala
vras : ficou de gelo para o perdão; mas apertou ao seio a
mãe com a vehemencia da suprema ternura . ?
A prelada cortou estas expansões; por que, ao fim
d'um quarto de hora, a freira devia deixar a familia , e
ir tomar posse do seu cubiculo.
Estamos em um recinto quadrado, de tabique com
janella para um pateo, e com o unico horisonte d'um alto
muro. Um leito de bancos coberto com uma manta , uma
cruz, uma banquinha e algumas vasilhas de barro: eram
o adorno da cella. Tudo ahi era frio de trespassar. Ha
via mais um craneo, e uma imagem de Santa Barbara
com uma espada na mão, e a torre na outra gru
dada no tabique. A vista não achava ali nada consola
tivo. Era tudo assellado de soffrimento rigido sem com
pensação, nem allivio. Era ahi o reduzir -se hora a ho
rà a pó o corpo em martyrio vagaroso, em lenta consum
pção.
-Filha ! -disse a madre S. Xavier -- a porta d'uma
cella é a entrada do céo .
--Basta que seja a entrada da sepultura --disse
.
Barbara . **
O RECINTO DA PENITENCIA
noite .
.
Uma lampadazinha alumia froixamente o corredor
do convento das carmelitas .
O som d'uma sineta, funebre como a toada da cam
painha que tange no viatico, tilintava a espaços e lenta
mente . Vão -se abrindo as cellas das freiras uma após ou
tra . Algumas perguntam em tom afflicto o que vai acon
tecer . As professas novas tentam em vão que as velhas
religiosas lh'o digam . Grande numero d'ellas caminha ao
longo do dormitorio, com aspecto de medo . As duas no
viças Santa Angela e Cinco Chagas 'vão pressurosas,
procurando Barbara, que as espera transida do espanto
causado por umas palavras ouvidas na véspera. Não pó
de recuzar - se aquella reunião; mas segue-a com visivel
répugnancia.
110 A FREIRA
AS NUPCIAS CELESTIAES
1
132 A FREIRA '
trada .
Depois ? sentia me tão languidamente abatida, co
mo se me estivessem amolecendo as mãos dos anjos,
n’aquelles dulcissimos contactos que as virgens devem
sentir ao ascenderem para Deus, caricias divinas, mercês
de alto amor, que eu toda ancias me ia ao encontro d'el
las para as saborear melhor ... Algumas vezes, abafava
NO SUBTERRANEO . 133
O APRISCO DO SENHOR
1
136 À FREIRA
6
138 A FREIRA
3
NO SUBTERRANEO , 141
+
X
O AFILHADO DO DOUTOR
-
-0 padrinho entra no convento ?
-Como medico . ..
E ella está muito doente ?
Muito ...
-Póde morrer ?
- Sim , por que não quer viver.
E se ella quizesse ?
--Salyal- a -hia a mocidade.
-Graças! graças, meu amigo! E' preciso que Bar
-
a.
--Pobre amigo, não estamos em Portugal, no tem
po das escadas de corda .
-Ha um meio, que força os claustros mais rebel
des a franquearem - se.
Qual?
-O fogo - disse tranquillamente o mancebo.
-Pois serias capaz?
De tudo ... As chammas me darão Barbara, que
a auctoridade da familia me roubou, e a igreja me
nega ...
-Não queres ouvir nada ?
- Nada, se não é algum conselho que me ajude nos
meus projectos.
- Projectos d'um louco !
- Talvez! Mas que é o amor senio uma loucura!
Entre o crime e o suicidio, escolho... Esta é que é à
156 A FREIRA
-Só .
-Consinto .
Zolpki abriu o relicario, tirou um embrulhinho de
papel amarellido que continha umas esquirolas d'osso, e
escreveu dez linhas em caracteres microscopicos. Depois
repoz o papel á volta da reliquia, e entregou o relicario
ao padrinho. Este, porém , parecia hesitar, quando o
olhar supplicante de Ladislau conseguiu vencel-o .
Mas volveu o doutor Se Barbara estivesse
-
-Sei.
-Acho que não ha nada que fazer aqui; mas tenho
uma reliquia de efficacia divina; consinta que eu a lan
ce ao pescoço da doente, e esperemos o prodigio impe
trado pelas orações da senhora prioreza.
-Pois não !..-- disse Maria Wenzyk .
O medico tirou do seio o relicario de prata . ! /
11
XI
A RELIQUIA DE S. MARCIANO .
NO SUBTERRANEO . 165
O Evangelho o diz .
-Quem me assegura a mim a verdade ? ... a mim,
peccadora !.. Não consta da Biblia que os magos do Pha
raó operavam milagres semilhantes aos de Moisés? Si
mão Magico não espantou o povo com prodigios analo
gos aos dos apostolos? A nossa sancta fundadora pro
priamente não temia sempre de enganar -se com a qua
lidade dos espiritos que lhe assistiam, e tomar á conta
de conselhos angelicos as tentações do diabo ? +13
Tudo isso é assim concordou a porteira.
-Além de quê, se tal prodigio devia ter logar, por
que se não deu em uma filha de Sancta Thereza, perfei
tissima nas virtudes monasticas? Ha cinco annos apenas
que eu profossei; ainda não caminho, mas vou de rojo
na via da perfeição ... Antes eu queria vêr os favores do
céo cumulados sobre uma alma excellente, e que a re
frigerassem como os orvalhos celestiaes ao vélo de Ge
deão . O minha irmã, poderemos fallar confiadamente,
abrir-mo-nos as nossas almas, como Santa Thereza com
Pedro d'Alcantara? Os divinos segredos da consciencia
querem - se expandidos, por que a confiança ela amizade
og aviva . Ora diga -me: nos vinte annos que tem de frei
ra, foi favorecida dos favores do divino esposo ?
-Nunca respondeu Martha . # 1 ...
Como assim ? A minha irmã tem sempre estado
no dezerto arido... 3 : ارونا
--Senipre.. i 1 niny ,
-Sem consolação sensivel? ib :
-Privada da minima consolação!!!!!! 1.6 ? )
-Injustiçala.. se: tal palavra póde applicar-se aq
arbitrio de Deus... Ha vinte annos que exercita as vir
NO SUBTERRANEO . 169
A PATRULHA NOCTURNA
tre
O czar e o imperador d'Austria, os autócratas,
miam .
immediatamente sahiu .
Já dissemos que estes successos passavam por uma
noite de abril fria e clara. Terror, curiosidade e desejo
de vingança retinham ali todas as freiras. Nenhuma pen
sava em ir at) côro.. As monjas antigas scismavam no
rigor das penas infligidas ás religiosas delinquentes ; 'ais
novas, em cujas almas os sentimentos humanos ainda
não haviam morrido, tremiam de susto e escondíam as
lagrimas sobilos véos. ina't , du
NO SUBTERRANEO . 191
mo
o estar-se ahi a rememorar os deliquios da Sulami
ta, em quanto o rei lhe põe a mão esquerda sob a cabe
ça , e com a direita se abraça n'ella .
O Concilio, que tantas cousas trata, não poderá re
formar na egreja uma usança que não pode ser descul
pavel por ser muito ancian? Deixai que os psalmos de
David se leiam como poemas; mas expurgai-os das ora
ções christãs. Os pezares das multidões não se acham
bem exprimidos nos clamores do assassino de Urias e do
amante de Bethsabé . Se existisse officio especial para
uso dos grandes criminosos, convenho que a explosão
d'esses remorsos viesse a ponto; porém, quando uma me
nina innocente se ajoelha ante o altar, com a candura
dos quinze annos, parece -nos que a afinação da sua al
ma destôa d'isso que canta, e que o excesso do remorso
de David póde dar -lhe vontade de querer saber que cri
mes elle expiava com as suas choradeiras.
Em resumo: quizeramos que os padres catholicos
se servissem de orações catholicas. Por que é que se
muda o ornato dos templos e as ceremonias que lá se
celebram, se os sentimentos, que ahi se exaltam, são os
severamente reprehendidos por Jesus?
Mas emquanto esta logica não entrar na christan
dade , invocaremos com David a colera celeste sobre os
transviados, como se Christo não houvesse dito: « Vai
mais alegria no céo pela conversação d’um peccador,
que pela perseverança de noventa e nove justos » .
i
E n'aquella noite de abril de 1848 , as religiosas
carmelitanas de Cracovia pediam a Deus que trovejas
se sobre a criminosa, e a esmagasse sob o seu oppro
brio ...
XIII
ÉRA
RAMM passados dias depois que Barbara fôra en
carcerada na prizão denominada por Maria Wenzyk a
Cova negra .
Era uma especie de ante.camara do In -pace. Pren
diam-se abi as freiras incursas em algum delicto, em
quanto não eram sentenciadas no tribunal monastico .
N'este tribunal negrejavam ceremonias lugubres
com o intuito de atterrar as espectadoras do drama, e
espavorir a fantasia das noviças e recentes professas.
Qualquer successo avultava enorme proporções aos olhos
de mulheres privadas de distracções externas. Maria Wen
zyk procurou nas tradições do convento memorias dei
xadas por suas antecessoras do que praticaram em ana
196 À FREIRA
ção do horror que me faz a sua presença ... Não sei por
que, a sua visita a esta hora liga-se á lembrança d'uma
terrivel visão...
-Qual?-perguntou Zózimo.
-Lembre -se da sala da penitencia.
A minha filha está sonhando ... Mas o que é ter
rivel realidade ... é o castigo que lhe preparam , e do qual
só eu poderei salval-a...
-Estou resignada.
-Por que cuida morrer, como ha pouco disse; mas
conhece mal a justiça dos conventos, se cuida que o seu
castigo hade acabar tão depressa
-Pois não me hão de deixar morrer de fome ?
- Não.
-Então que me fazem ?
-Hade ser julgada primeiro.
-Estou prompta; e nada responderei ás accusações
que me fizerem ... Tentei fugir, a fatalidade não quiz :
soffrerei o castigo.
--Então não teme o carcere perpetuo, à tortura
infinita, um trespasse dilatado gota a gota de sangue?
-Zolpki está morto ! -- disse Barbara soluçando.
E ' tão nova replicou o padre Zózimo — Deve
querer a vida. Deve amal- a seja como fôr... Faz -me
compaixão , Barbara... Esqueço-me de que nunca deixou
ver ao confessor toda a sua alma... Quero arrancal- a a
este longo supplicio ... Confie -me o seu destino . Deixe
me salval- a .
-Para que?.. Não quero salvar-me.
--Mas queria fugir...
-Sim , por que me seguia o homem que eu amava.
NO SUBTERRANEO . 199
para Barbara .
Ella affastou - o de si com um repellão, apesar de
ter as mãos algemadas , e gritou:
--Soccorro ! meu Deus ! soccorro! Matem -me, mas
livrem -me d'este malvado homem !
Não obstante, Zózimo agarrou da victima pelos
bombros prostrando-a sobre a tarima chumbada na pa
rede.
N'este lance abriu -se a porta .
A prelada entrou.
Barbara arrastou-se até aos joelhos d'ella, que lhe
parecia já menos horrenda que o padre.
-Condemne-me ! faça que eu morra nas maiores
torturas ; mas tire-me este padre d'aqui ... tire-m'o, que
>
zyk, por que tamanho foi seu medo que julgou a con
demnada morta .
A prelada examinou vagarosamente a freira . De
pois disse á porteira:
--- Deixe-me sósinha. Basta eu para guardal-a .
Martha sahiu .
E então a prioreza, operando como um juiz em
exame de corpos de delicto, pegou d'um castiçal, exa
minou o quarto, encarou de novo a freira desfallecida,
abriu a porta da prisão, e, rastreando aa luz no pavimen
to, espreitou vestigios.
Estalou -lhe na garganta um rugido mal abafado .
Acabava de encontrar pegadas ; depois um phosphoro
apagado de fresco; e mais longe tres pingos de cêra no
chão .
Não procurou mais nada : sobravam - lhe vestigios .
-E'elle - bramiu ella--é o padre ! 0 corredor ...
a alcova ... Elle m'as pagará... Quanto a ella, se este
2
TORTURAS
os dias !
O terror, a agonia , o stupor moral, o spasmo eram
taes que nenhuma outra idéa se lhe suggeriu no espiri
to por tanta maneira atormentado.
Noite perpetua !
Ignorar infinitamente o resvalar dos dias ! Nem
uma claridadezinha, nem uma gota d'agua por onde ella
podesse contar os segundos! Pensou em contal-os pelas
pulsações. Mas calcular as horas de que lhe servia ?
Não haveria uma melhor que as outras na sua vida !
Quiz erguer-se, mas não se sustentava em pé . O tecto
era mais baixo do que ella.
Nem a palha chegava para se deitar toda. Era lhe
preciso encolher-se, retrahir-se, arquear -se. Ardia em
febre ... bebeu a agua toda. Soffreu sede cruel; mas me
deou tanto tempo a ser -lhe dado outro pão e outra agua ,
que ella calculou tres dias. Não era tanto . O certo ,
porém , é que lhe davam a miseravel ração com inter
vallos irregulares, muito de acinte para que ella não lo
grasse medir as horas decorridas .
A desgraçada, extorcendo - se em dores do corpo e
da alma, golpeada pelo sentimento de involuntaria macu
la, asphixiada por measmas pestilenciosos, para ali es
NO SUBTERRANEO . 223
XV
ZOLPKI
-Ferido!-exclamou a governanta .
A pobre mulher oirou. Com muito custo lhe fez Ca
simiro perceber que a salvação do moço dependia da
presteza d'ella .
Emfim , a creada acordou o amo. Wroblesky, infor
mado de estar ali um homem ferido n’uma desordem,
não lhe passou pela mente que se tratava do seu afilha .
do. Só depois que reconheceu Casimiro, comprehendeu o
que era.
- E ' Zolpkil - disse elle anciado.
--Fiz quanto pude por ajudal- o e defendel - o --ob
servou Casimiro, mostrando o peito e braços ensanguen
tados-- Tractemos d'elle -- proseguiu o amigo - e depois
fallaremos de mim .
Signal de vida não dava nenhum o ferido. Volvida
meia hora, porém, á custa de esforços mais de pai que
de medico, recobrou o alento, circumvagando um vago
lance de olhos.
o que primeiro reviveu n'elle . fui o instincto do:
amor .
liberdade .
A placidez de Zolpki foi explicada por dissabores
da mocidade e trabalhos padecidos no praso dos oito an
nos de carcere duro. Não obstante, dizia-se que, se o cla
rim da peleja soasse outra vez, elle seria na vanguarda
dos mais valentes .
E assim proseguiu pacientemente no assiduo estu
do, como quem deseja tornar util ao menos uma existen
cia viuva de alegrias . A socierlade tem phases succes .
sivas de febre e repouso : o homem é como ella. As in
gentes crises não duram . As multidões, á imitação do
individuo em separado, não actuam longo tempo convul
sas. As febres e as revoluções tem intermittencias.
Viu Zolpki resvalarem longos annos em apparente
calmaria politica. Aquelle coração, onde o amor havia
chammejado, parecia exhaurido das doçuras dos affe
NO SUBTERRANEO 231
1 1
244 A FREIRA
padre.
O moribunido fez signal ao primo que puchasse ca
deira é se sentasse ao pé d'elle . .
A mim ?
-Fio -me na tua palavra ... Jura -me que me ajuda
rás a reparar uma iniquidade, a castigar um crime cuja
responsabilidade é minha em parte?
-Jüro.
-Escuta -me com a placidez de juiz. E's mais no
vo que eu ; e, com tudo, tens mais senso... Eu, apezar
do meu caracter sagrado, humilho -me diante de ti ...
Por que tu és quem és, e nunca te mascaraste com a
hypocrisia. Diante de ti arranco a mascara ! Antes de
morrer, quero que me vejas qual sou ! Tenho sede de
desprezo e odio, como se estes ultrajes, flagellando-me
7
-Barbara Ubryk .
E ' aquella celebre formosa que ha vinte annos ves
tiu ",o habito com grande admiração de Cracovia?
250 A FREIRA
E '.
Gziorowski escreveu a carta que os leitores viram
no principio d'este livro.Aderessou - a a Zolpki, e levou - a
á caixa postal.
A noite do infermo passou serena .
Assim que foi dia, esperou os periodicos impacien .
temente . Parecia - lhe que o facto da sequestração de Bar
bara havia de irritar a geral indignação, e forçar a jus
tiça a exercer violentas repressões contra os mosteiros,
e em particular contra os do Carmelo .
Gziorowski não se apartava do criminoso, posto que
o affecto que lhe tivera estivesse extincto. Assim mesmo
a confissão do padre commoveu-o. Era-lhe, todavia, cus
toso occultar o involuntario desprezo que sentia, ao pas
so que lhe suavisava os paroxismos..
Ao quarto dia, o jornal Le Kraj, de Cracovia , re
feriu que, por ordem de um magistrado , o snr . Pamza,
chefe da policia, com authorisação do bispo, as portas
do convento de Wesola haviam sido arrombadas, e ahi
encontrada em um fosso subterraneo uma freira chama
da Barbara Ubryk , encarcerada desde 1848; e acrescen
tava que o capellão fôra preso, juntamente com a prela
da e com a sub -prioreza.
O artigo do Kraj, relatava miudamente a exaspera
ção dos habitantes de Cracovia, as desordens que tumul-.
tuavam na casa dos jesuitas, o sentimento de ira geral
contra os conventos, e o proposito de os supprimir que
preocupava o governo .
Zózimo ouviu serenamente a leitura do Kraj.
Barbara está livre - disse elle . - Metade do meu
dever está cumprido. A outra é o meu proprio castigo.
NO SUBTERRANEO . 251
E abriu a porta . 1
::
+ 1
3
1
XVII
FIM .
པའོ།༧
INDICE
Cap. Pag .
I. Uma carta anonyma . 7
VI . Morta e viva 91
XV . Zolpki 227
PER 29 1966
9ZAR05D30S1
UNIVERSITY OF MINNESOTA
wils
869C277 OFr
Castelo Branco, Camilo, 1825-1890 .
A freira no subterr aneo : romance hist
Acce
Cent
Libr ss a
esot
Minnary
er
3 1951 001 069 469 8
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