Humanitas11-12 Artigo9 PDF
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ALGUNS ASPECTOS DO CLASSICISMO
DE ANTÓNIO FERREIRA
(1) Epistola aos Cristãos. Cfr. Doutor Dom Manuel Gonçalves Cerejeira,
Clenardo, Coimbra tùlitora, Ltda., Coimbra, 1927, pp. 93-104.
(2) O autor tia Descripçam e Debuxo do Mosteiro de Saneia Cruz de Coimbra.
citado por Doutor Gonçalves Cerejeira, ibidem, p. 103.
(3) Cf. Dr. Luís de Matos, O Humanista Diogo de Teive, Coimbra, 1937,
p. 40.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 81
como o demonstram as poesias que lhe dirigiu (Écloga Tévio, Carta IV).
Desta última salientamos este passo, mais que todos elucidativo:
(1) Lembre-se, por exemplo, a discussão em volta das fontes platónicas das
redondilhas camonianas Sobolos rios que vão, de que citamos entre outras, as seguin-
tes obras: Prof. Doitlor Joaquim de Carvalho, «Leituras Filosóficas de Camões» in
Lusitânia, VI, 1925, pp. 241-253, reproduzido em Estudos sobre a Cultura Portuguesa
do Séc. XVI, vol. I, Acta Universitatis Conimhrigcnsis, Coimbra, 1948, pp. 49-72;
António Salgado Júnior, «Camões e Sobolos Rios» in Labor, 1936; F. Costa Marques,
«Teria Camões lido Platào?» in Biblos. XVIII, 1. 1942 e nótula, com o mesmo título e
no mesmo volume, pelo Prof. Doutor A. J. da Costa Pimpão; P.* Dr. Mário Martins,
S.J., «Babel e Sião, de Camões, c o Pscudo-Jerónimo» in Brotéria, vol. LU, fase. 4,
1951, pp. 391-401 ; Prof. Doutor Hernâni Cidade, Luis de Camões, o Lírico, 2.a edição,
Lisboa, 1952, pp. 161-167; Doutor António José Saraiva. Luis de Camões, Colecção
Saber, Lisboa, 1959, pp. 96-114.
(2) O facto tem sido reconhecido por todos os estudiosos que se ocuparam de
A. Ferreira, desde Cláudio Du-Beux (na sua edição dos Poemas Lusitanos, 2." impres-
s: MARIA HELENA ROCHA PEREIRA
são, Lisboa, na Regia Ofticina Typographica, Anno 1771, p. 16) a Francisco Dias
Gomes (apud Marques Braga, edição dos Poemas Lusitanos na Colecção de Clássicos
Sá da Costa, Lisboa, 1939, vol. T, p. X) e a A. J. Saraiva e Óscar Lopes, História da
Literatura Portuguesa, Porto, s. d., pp. 212-213.
(1) Já nos fins do séc. xv (c. 1480) havia uma por Marlinus Phileticus, publi-
cada em Roma, por Fucherius Silbcr, e em Veneza, por B. de Vitalibus (esta, junta-
mente com Hesíodo). Em 1545, a edição de Francforte declara: Theocriti idyllia.
Praeter haec et Latina versio carmine reddita per H. Eohanum Hessum. (Informa-
ções obtidas na Biblioteca Bodleiana pelo Dr. S. Weinstock, que actualmente professa
na Universidade de Oxford).
(2) Ê sabido que o estudo do Grego nunca lançou raízes muito fundas entre
nós c que o melhor helenista português do Renascimento, Aires Barbosa, professou
em Salamanca, e não no nosso País. O seu período de maior esplendor é, porém,
no séc. xvi, como vemos por testemunhos vários, entre os quais avultam o de Clc-
nardo, atrás citado, e os encómios e exortações constantes das Orações de Sapiência
da época, nomeadamente da famosa Oratio pro Rostris de André de Resende, a pp. 40-
-41 da edição de A. Moreira de Sá-Migucl Pinto de Meneses, Centro de Estudos de
Psicologia e História da Filosofia anexo à Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa, 1956, c da í)f disciplinarum Omnium Studiis Oratio de Belchior Beieago
(p. 48 da nossa edição. Colecção Amphitheatrum II, Centro de Estudos Humanísticos
anexo à Universidade do Porto, 1959). Um breve esboço da história do ensino do
Grego em Portugal pode ver-se em João Pereira Gomes, S.J., Frei Manuel do Cenáculo,
História da Lógica, texto estabelecido, traduzido e anotado por , Lisboa,
Edições Brotéria, 1958, pp. 12-20.
(3) Cartas, n, 9, 3.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 83
* (Odes, I, 6, 45-47)
( I ) Op. cit.. p. 300. A fonte desta Ode já tinha sido apontada por Cláudio
Du-Beux, no seu prefácio aos Poemas Lusitanos, Lisboa, 2.» edição, 1771, p. 9.
(2) Júlio de Castilho, António Ferreira, Poeta Quinhentista. Livraria Clássica.
Excerptos dos principais autores de boa nota. Tomos XI, XII e XIII. Rio de
Janeiro, Livraria de B. C. Garnier Editor, 1875. Tomo II, p. 73.
86 MARIA HELENA ROCHA PEREIRA
(38)
(I) Nos versos 22, 23, 24, Júlio de Castilho, op. cit., ibidem vê uma indicação
do sentido da rota de Garcia Fróis, embora reconheça que a alusão ao Africo é,
atinai, também horaciana.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 87
(I) Júlio de Castilho, op. cit., t. Il, p. 74, não se apercebeu do facto, pois apenas
comentou: «Ë muito maviosa e gentil esta ode. Lembra Virgílio nos seus momentos
de maior suavidade».
88 MARIA HELENA ROCHA PI RIIRA
I u de palma, e de louro
Com razão coroado.
Eu da humilde, e sempre verde hera.
Seguindo tuas pisadas
Nas nuvens levantado
Assi serei senhor; descansa e espera (1).
(54-59)
(24)
e em
não lhe queirais seu beijo
(68)
versão de
xai fjv èôéXrjt ae tpiXãaai,
(pev ye
(26-27)
é fácil pensar que Andrade Caminha pôs aqui cm prática essa doutrina. Mas a pre-
sença de elementos comuns na sua versão c no original grego (o beijo de Vénus, como
recompensa, as selas que voam até ás estrelas, etc.). que foram desaproveitados por
Ferreira, invalida a hipótese.
(2) Muito recentemente, também João Maia, S.J., incluiu uma composição
de inspiração anacreôntica na sua colectânea de versos Écloga Impossível, Lisboa,
Círculo de Poesia, 1960.
94 MARIA HELENA ROCHA PEREIRA
(1) O facto já foi notado pela Dr.H Augusta Gcrsão Veniura, «Versões dum
passo anacrcôntico» in Labor, 150, Junho de 1955, ao analisar a impropriedade
astronómica da linguagem de Castilho neste passo.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 95
(touro, cavalo, lebre, leão. peixes, aves) com os seus atributos; o nosso
poeta não se cinge estritamente a ela. mas apenas se refere ao primeiro
e quarto dessa série, transfere o voo para a águia e a ligeireza para o
cervo, e depois envolve os restantes exemplos numa praeteritia:
tuguès pelo Dr. Tomás da Rosa, «As Éclogas de Henrique Caiado» in Humanitas,
V-VI, 1953-54. Sobre o valor da primeira obra citada, veja-sc a recensão do Prof.
Doutor F. Rebelo Gonçalves in Revista da /'acuidade de Letras de Lisboa, t. I, n." 1
e 2, pp. 305-314.
(1) As éclogas em vulgar tinham sido, aliás, já tentadas por Boiardo, Jacopo
Fiorino de' Boninsegni, Benevrcni e Francesco Arsocchi {vide Prof. Doutor A. .1.
da Costa Pimpùo, História da Literatura Portuguesa, Coimbra, Livraria Atlântida
(em curso de publicação), vol. Il, p. 76).
(2) História da Literatura Portuguesa, cit., tomo II, especialmente pp. 230 a
240. Veja-se ainda Prof. Doutor J. G. Herculano de Carvalho, «Teria Bernardim
Ribeiro falecido antes de 1536?» in Bihtos. XXXI, 1956 e «Influência Italiana em
Bernardim Ribeiro» in Miscelânea de listados em honra do Prof. Hernâni Cidade,
Lisboa, 1957.
(3) Júlio de Castilho aponta, op. cit.. t. Il, p. 157, os versos 9-10 da Ode XXIV
do Livro I de Horácio para o v. 76, e D. Carolina Michaêlis (em nota manuscrita
ao seu exemplar da edição feita por aquele estudioso, c hoje pertencente ao Instituto
de Fstudos Românicos da Faculdade de Letras de Coimbra) lembra Virgílio, Buc. V,
13-14 c X, 53-54, como fonte do v. 108. Num e noutro caso, trata-se de influências
remotas.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 97
(1) O mesmo Júlio de Castilho, op. cit.. t. II, p. 155, indica como fonte dos
versos 335-336 um passo dits Metamorfoses de Ovídio (III, 407-410), e, a p. 156, dá
como modelo do v. 535 os versos 46-47 da IV Bucólica, aliás inspirados no final do
Carme LXIV de Catulo, fonte que é muito mais provável.
(2) Júlio de Castilho, op. cit., t. II, p. 99, escreveu:
«Na Écloga VIU este terceto:
é visível paralelo do
da Écloga II.»
A admitir influência, temos de a declarar um tanto remota, pois no verso 63
da II. Bucólica de Virgílio, a sequência é bastante diferente: o texto latino pretende
ilustrar a máxima famosa que expõe no verso 63:
apresentando exemplos clássicos — a leoa atrás do lobo, este da cabra, c esta, por
sua vez, da flor do cltiso. No texto português, os animais, a perseguir-se em busca
do acasalamento, são tomados como termo de comparação, para contrastar com a
separação a que Lídia é obrigada.
(3) Já notado por Júlio de Castilho, op. cit., t. II, p. 97:
«Nas éclogas é que o poeta se entrega todo a Virgílio e ai o repro-
duz com delícias em muitos passos.»
98 MARIA HELENA ROCHA PERETRA
uma lembrança fugaz de Virgílio, Buc. I, 83, que foi assinalada por
Júlio de Castilho (l).
Na objurgalória contra os maus poetas, Mévio e Bávio (vv. 19-26),
até os nomes convidam a recordar idêntica crítica nos versos 90-91 da
III. Bucólica. A taça proposta para prémio nos versos 28-72 é uma
adaptação da que Virgílio descreve de vv. 36 a 47 (ideia, aliás, tomada
de Teócrito, I, 27-55, e muito conforme ao gosto alexandrino). Adap-
tação, porque, em vez dos dois astrónomos antigos ou de Orfeu a encan-
tar os bosques, António Ferreira representa a morte do príncipe D. João
e o nascimento póstumo do seu filho D. Sebastião. Alguns versos,
como 34-36,
(43, 47)
(1) Op. cit.. t. Ií, p. 163. O mesmo comentador estabelece ainda as equi-
valências: 25-26 - Buc. III, 90-91; 31-34 = III, 44-47; 99-100 - V, 27-28; 139-140,
paráfrase de V, 29 seqq.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 99
com os do latino:
outro tanto já se não pode dizer dos sete versos com que termina a
Écloga, nos quais já a mesma ilustre investigadora reconheceu uma
acentuada reminiscência de Tcócrito, no final do mesmo Idílio I:
(!) Júlio de Castilho, op. cit., t. Il, p. 167. nota as equivalências dos primeiros
versos e a de 5 a 2. Marques Braga apenas afirma : «Nesta poesia pastoril há remi-
niscências da Écloga X de Virgílio» (Vol. I, p. 248).
0 CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 101
bucólica, que deseja oferecer a um seu amigo querido, e que seja digna
de ser lida pela amada deste. Virgílio invocara Aretusa e aproveitara
a lenda da passagem submarina entre esta fonte e o Rio Alfeu; Ferreira
substitui a Náiade pela «rústica Musa» e alude às águas do Tejo.
Até aqui, o tema de Ferreira aproximava-se do do Mantuano.
Havia, porém, uma diferença essencial: Gallus fora traído no seu amor
pela formosa Lycoris, que lhe fora infiel. No caso de Androgeo, há
apenas cruel indiferença da parte da sua amada. De comum, a morte
por amor de um e outro apaixonado. A delicadeza de Gallus, ao fazer
votos por que o frio e o gelo não molestem os pés mimosos da fugitiva
Lycoris, patente nos versos 48-49:
A, te ne frigora lacdant!
a, tibi ne teneras glacies secet áspera plantas!
T
IIvOs ye juàv âôela y.al á KVTIQIç yehíotaa,
Á<áDor] fièv yeXáoioa, fiaçòv Ô'àvà Ovfiòv zypioa,
y.elne' «Tédtjv ròv "EOOJTU yjnev%£0, Aáyvi, Xvyi$slv
r) p" ovx avrvç "EQOJTOç VTI àoyaXéto êAvyt'/Qrjç;»
(73-82)
semelhante à de Teócrito:
KvTIQt fioQEta
KVTZOI vefiEoaeráf KVTIQI dvaroíaiv ânexOrjÇ'
(100-101)
O famoso triste lupus stabulis .... (80-81) tem o seu equivalente bas-
tante exacto em 78-81:
Et me fecere poetam
Piérides; sunt et mihi carmina; me quoque dicunt
uatem pastores: sed non ego credulus illis.
(1) Para este passo, Júlio de Castilho propõe apenas 11, 40-44. Parece ter
havido um cruzamento dos dois na mente do nosso poeta: da Écloga de Corydon
aproveita a ideia de encarecer o seu presente, declarando-o desejado por outrem;
da Palaemon, a escolha da ave simbólica da deusa do Amor.
(2) Júlio de Castilho notou as equivalências 1-5 = II, 1-4; 37-38 = IX, 32-34;
40-41 = II, 25. D. Carolina Michaëlis acrescentou 94-97 = II, 69-73, mas riscou,
não sabemos por que razão, 37-38 = IX, 32-34.
(3) «Está cheia de paráfrases e reminiscências da Écloga VIU de Virgílio»
— é quanto afirma a edição de Marques Braga, 1.1, p. 216. Júlio de Castilho, porém,
soube distinguir uma série de equivalências: 1-8 = VIII, 1-5; 32 = VIII, 21 ; 33-34 —
= VIII, 22-23; 41 e 49-50 = VIII, 26; 13 seqq. = VIII, 37-41 ; 95 seqq. - VIII, 62-63;
97 = VIII, 64; 104 = VIII, 68; 105-110 = VIII, 67, 69-71; 121-123 = VIII, 77-78;
166-167 = VIU, 108-109. Tal série, que figura nas notas das pp. 161-163 do t. II,
foi aumentada por D. Carolina Michaëlis, que ainda acrescentou por seu punho
106 MARIA HELENA ROCHA PEREIRA
sobre o texto da própria écloga outras correspondências, que podem resumir-se deste
modo: 9-16 = VIII. 6-13; 17-24 = VIII, 14-16; 25-32 - VIII, 17-21; 34-40 = VIII,
22-25; 41-55 = VIII, 26-31; 50-54 - VIU, 27-28 e 51-55; 56-63 = VIU, 32-36;
81-87 = VIII, 43-46; 97-104 = VIII, 64-68; 105-112 - VIU, 69; 121-128 = VIU,
73-78; 129-136 = VUI, 79-83; 137-144 = VIU. 84-89; 145-152 - VIU, 94-103;
153-160 = VIU, 90-93; 161-168 = VIU, 104-108.—Desta longa lista, entendemos que
devem retirar-se os versos 129-136 e 145-152, cuja semelhança é muito vaga com o
origina] latino apontado. O verso 108 parece recordar ofinaldeste dístico da Elegia I
do Livro I de Sannazaro (65-66):
(I) Camões parafraseou os mesmos versos na Écloga III, mas também nâo
aproveitou o motivo das exclamações. Sobre a mudança psicológica por ele intro-
duzida na cena, veja-se Dr. F. Costa Marques, Camões. Poeta Bucólico. Coimbra, 1940,
p. 17.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 107
o Louro,
que já honrou Mântua, Esmirna e Siracusas.
(146-147)
(1) Júlio de Castilho, op. cit., vol. II, p. 99, observa que o verso 7 «lembra
por longe» o v. 13 da II. Bucólica de Virgílio e nota que, nos versos 177-184, se
encontra «uma oitava à cigarra que lembra a Ode XL1II [XXXIV, na edição teubne-
riana de Preisendanz] de Anacreonte». Porém, a semelhança com a conhecida
Anacreontea é muito fugidia, para assinalarmos esta fonte, de preferência a qualquer
outro dos muitos poemetos helenísticos dedicados à cigarra.
O CLASSICISMO DE ANTÓNIO FERREIRA 111