Critérios Contratos

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Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Ano Lectivo 2018/2019


Direito dos Contratos I
3º Ano/Turma A
Professor Doutor António Menezes Cordeiro/Professor Doutor Rui Ataíde
Exame escrito/1ª época

Tópicos de correcção1

1. Venda de empresa com passivo não declarado

- Qualificação completa do contrato em apreço.


- A compra de empresa através da aquisição das acções representativas da sociedade
que a detinha, constitui actualmente, segundo MENEZES CORDEIRO, Tratado de
Direito Civil, Volume XI, pp. 229 ss, o campo mais significativo da venda de bens
onerados (artigos 905º e seguintes) quando, como é o caso, exista dívida social não
assumida e/ou não declarada no contrato de compra e venda.
- Referência à impropriedade da solução legal de aplicar à venda de bens onerados o
regime do erro, o qual respeita à formação do contrato, quando o cumprimento
imperfeito, como é o caso, respeita à execução do contrato; o comprador fez uma
declaração correcta, correspondente à vontade real e esta formou-se devidamente;
todavia, na execução, foi-lhe entregue uma coisa onerada, que contraria o programa
contratual.
- Na doutrina, esta hipótese da venda de empresa com passivo não declarado, é objecto
de enquadramentos alternativos à venda de bens onerados, como é o caso da culpa in
contrahendo, defendida por PEDRO ROMANO MARTINEZ (Contratos, p. 124), o
qual alega que, em rigor, sobre os títulos transaccionados não existem quaisquer ónus
mas antes que as acções não representam o valor esperado do capital social. Contudo,
embora exista decerto culpa in contrahendo, dado que o vendedor violou um dever de
informação pré-contratual ao ocultar do comprador a totalidade do passivo social, esse
incumprimento não deixou de provocar tecnicamente uma venda de bens onerados, pelo
que se deve reconhecer ao lesado o direito de optar entre a indemnização concedida pelo
artigo 227º e os meios de defesa previstos nos artigos 905º e seguintes. Aliás, a não ser
assim, então nunca haveria aplicação deste regime, dado que a venda de bens onerados,
quando não existe informação ao adquirente sobre a existência dos ónus, significa que
houve violação de um dever de informação pré-contratual.
- No âmbito dos meios de tutela do comprador concedidos pelos artigos 905º e
seguintes, e como os adquirentes querem manter o negócio, os vendedores têm a
obrigação de fazer convalescer o contrato, expurgando os ónus existentes, pelo que
devem entregar aos adquirentes o montante do passivo não declarado (artigo 907º),
podendo estes, na falta disso, socorrerem-se do mecanismo da redução do preço (artigo
911º/1), o qual é compatível com as pretensões indemnizatórias que ao caso couberem
(artigo 911º/1, parte final). Nada impede, com efeito, o comprador de exigir
imediatamente a redução do preço, caso não esteja interessado, como é o caso, na
anulação do contrato (LUÍS MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, Volume III,
p. 117).

2) Distribuição de dividendos

1
Podem ser ponderados outros tópicos que tenham a devida cobertura normativa.
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- Segundo o artigo 880º/1, a coisa deve ser entregue no estado em que se encontrava à
data da venda. Por seu lado, o n º 2 deste preceito legal especifica que a obrigação de
entrega compreende, inter alia, os frutos pendentes;
- Como a deliberação de distribuição de dividendos foi tomada em Março de 2009, isso
significa que no momento da venda das acções, em Abril, os dividendos eram frutos
civis que se encontravam pendentes, pelo que deviam ser abrangidos pela obrigação de
entrega da coisa mãe. Pronuncia-se neste sentido, MENEZES CORDEIRO, Tratado de
Direito Civil, Volume XI, p. 150 e, em sentido contrário, PIRES DE LIMA/ANTUNES
VARELA, Código Civil Anotado, Volume II, nota 3 ao artigo 213º/2, considerando que
o artigo 880º/2, quando dispõe sobre frutos pendentes, apenas se refere aos frutos
naturais, pelo que a partilha dos frutos civis se deve fazer pro rata temporis, nos termos
do disposto no artigo 213º/2.

3) Utilização do apartamento arrendado para sessões de jogos clandestinos a


dinheiro

- O locatário não pode aplicar a coisa a fim diverso daquele a que ela se destina (artigo
1038º, alínea c).
- Explicação completa e fundada dos contornos da resolução do contrato de
arrendamento e, em particular, que no âmbito da resolução deste contrato, há um plus
face à resolução dos contratos em geral, o qual se traduz no fundamento da resolução
que é dado pelo disposto no corpo do artigo 1083º/2 – não é qualquer incumprimento
que pode fundamentar a resolução mas apenas um incumprimento que, pela sua
gravidade ou consequências, torne inexigível a manutenção do arrendamento pela outra
parte.
- A prática de organizar sessões de jogos clandestinos a dinheiro, subsume-se ao campo
de aplicação do artigo 1083º/2, alínea b), na parte em que prevê a utilização do prédio
em contrariedade à lei como fundamento de resolução do contrato pelo senhorio (mais
forçadamente, pode admitir-se que se trata também de uma violação dos bons costumes)
e alínea c);
- Há ainda que avaliar se o comportamento só por si constitui fundamento bastante da
resolução ou se é necessário que preencha os requisitos constantes do corpo do artigo
1083º/2, consubstanciando um incumprimento que, pela sua gravidade ou
consequências, torne inexigível a manutenção do arrendamento.

4) Construção de um novo bloco de quartos na unidade de turismo rural

- Qualificação completa do contrato, referindo que esta empreitada submete-se ao


regime civil, em virtude de ter sido celebrada entre duas entidades empresariais (artigos
1207º e seguintes, CC);
- O contrato tem por objecto um imóvel que se destina, por sua natureza, a longa
duração (artigo 1225º). Explicação cabal dos requisitos deste preceito;
- Os defeitos manifestaram-se e foram denunciados dentro do prazo de cinco anos a
contar da entrega da obra2, como exige o artigo 1225º/1 e a denúncia foi feita dentro do
prazo de um ano a contar da descoberta do defeito (artigo 1225º/2);

2
A entrega da obra aconteceu em Novembro de 2013 e os defeitos foram denunciados em Maio de
2018.
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- Segundo o artigo 1221º/1, o dono da obra pode exigir a eliminação dos defeitos, não se
justificando neste caso exigir nova construção, porque os defeitos podem ser
suprimidos. Se não o forem, pode ser exigida a redução do preço nos termos 1221º/1,
sem prejuízo da indemnização a que se refere o artigo 1225º/1, parte final, a qual deve
ser pedida no ano seguinte à denúncia (artigo 1225º/2);
- A propósito da natureza subjectiva ou objectiva da responsabilidade do empreiteiro
fixada no artigo 1225º, deve entender-se que se trata de uma verdadeira garantia legal,
apenas sendo possível ao empreiteiro evitar a responsabilidade, se provar que os
defeitos advieram de causas exteriores à sua actuação (neste sentido, MENEZES
CORDEIRO, Tratado de Direito Civil, Volume XI, pp. 975-976 e LUÍS MENEZES
LEITÃO, Direito das Obrigações, Volume III, pp. 547-548).

5) Compra da produção de cereja que ficou totalmente inutilizada

- Como a compra e venda tinha por objecto frutos naturais, a transferência da


propriedade não se deu aquando da celebração do contrato, apenas se verificando no
momento da colheita (artigo 408º/2, parte final);
- Logo, a transmissão do risco apenas se deu também nesse momento, nos termos do
artigo 796º/1, pelo que, em princípio, caberia ao adquirente pagar o preço da fruta, caso
se verificasse o seu perecimento acidental após esse momento;
- Contudo, o perecimento da coisa não foi casual, antes sendo imputável culposamente
ao alienante (artigo 801º/1), por força dos artigos 880º/1, 882º/1 e 918º, porquanto a
fruta foi deixada de modo descuidado em cima dos camiões durante a noite, não tendo
sido devidamente guardada. Deste modo, foram mal cumpridas as diligências
necessárias para o comprador adquirir os bens vendidos (artigo 880º/1, hipótese que
deve ser alargada às diligências necessárias para fazer com que o comprador entrasse na
posse da coisa), tendo sido violado o dever de custódia que impende sobre o vendedor
até à entrega da coisa (artigo 882º/1), pelo que são aplicáveis as regras relativas ao não
cumprimento das obrigações (artigo 918º). Logo, o pagamento da fruta não é devido,
cabendo ainda ao devedor ressarcir os danos sofridos pelo credor (artigo 798º) com a
impossibilidade culposa da prestação. Só assim não seria se as partes tivessem atribuído
carácter aleatório ao contrato (artigo 880º/2), o que, porém, não sucedeu.
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Direito dos Contratos I – turma A
Exame de Recurso
Senhor Professor Doutor Pedro de Albuquerque
19 de Janeiro de 2018

Tópicos de Correção

Em Junho de 2016, Dinis vendeu a Edilberto (conhecido ator, a residir em Los Angeles) uma
moradia em Cascais, com vista frontal do mar, por € 3.000.000, juntamente com um carro
da marca Austin Martin que acabara de chegar ao stand de automóveis usados de que Dinis
é proprietário, pelo preço de €180.000.
A moradia foi paga integralmente na mesma data. Quanto ao automóvel, Dinis reservou para
si a propriedade do mesmo até integral pagamento do preço. A cláusula de reserva de
propriedade foi registada.

Responda de forma completa, fundada e independente, às seguintes questões:

a) Em Novembro de 2016, Edilberto regressa definitivamente a Portugal e pretende


passar a viver na moradia que adquirira em Cascais. Porém, constata que ela se encontra
habitada por uma família brasileira, que a tinha tomado de arrendamento a Dinis em
Maio de 2013, pelo prazo de 6 anos. Quid Juris? (3,5 valores)
-Explicação completa e fundada da situação de venda de bem onerado, regulada no
artigo 905.º e seguintes do CC sendo o contrato anulável por erro (do comprador) ou dolo
(do vendedor).
-Assim, caso o vendedor tenha intencionalmente ocultado a existência do contrato de
arrendamento ou o comprador, por lapso, não se tenha apercebido da existência desse
contrato (sendo essa informação essencial para a decisão de contratar – artigo 247.º CC),
verificar-se-ão os requisitos para a anulabilidade do negócio.
- O regime desta invalidade apresenta, porém, algumas particularidades. Uma delas
consiste na obrigação que sobre o vendedor impende de fazer convalescer o contrato,
eliminando os ónus ou limitações existentes, como determina o artigo 907.º do CC.
- Caso os ónus ou limitações venham a desaparecer (seja pelo cumprimento da obrigação
de convalidação do vendedor, seja por algum outro facto), fica sanada a anulabilidade do
contrato – artigo 906.º do CC.
- Nem todos os tipos de ónus ou limitações são suscetíveis de ser eliminados por
vontade unilateral do vendedor. Assim, se a limitação consiste na existência de um direito de
terceiro, emergente de um contrato do qual o vendedor já não é parte (porque a sua posição
se transmitiu nos termos do disposto no artigo 1057.º do CC), nada poderá fazer para
eliminar essa limitação.
- O contrato de arrendamento foi celebrado em Maio de 2013, pelo que poderá terminar
em Maio de 2019, caso Edilberto (novo senhorio) se oponha à sua renovação, nos termos
do disposto no artigo 1097.º do CC, com um ano de antecedência.
- Assim, caso Edilberto tivesse outra casa onde pudesse viver até à extinção do contrato
de arrendamento, e se demonstre que ele sempre teria adquirido aquela moradia, embora por
um preço inferior, haverá redução do preço (em vez de anulação do contrato), nos termos
do artigo 911.º do CC.
- Não se verificando esta hipótese, e decidindo o comprador invocar a anulabilidade do
negócio, terá direito a ser indemnizado pelos danos emergentes do contrato, na hipótese de
ter havido apenas erro (nos termos do disposto no artigo 909.º do CC), ou por todos os
prejuízos que não teria sofrido se a compra não tivesse sido celebrada, no caso de ter havido
dolo do vendedor (nos termos do disposto no artigo 908.º do CC).

b) O preço do Austin Martin deveria ser pago em duas prestações de igual valor, vencendo-
se a primeira no último dia de Outubro de 2016 e, a segunda no último dia de Março de
2017. Edilberto passou de imediato a conduzir o automóvel. Após o pagamento da
primeira prestação, Edilberto vendeu e entregou o automóvel a um colega de profissão
americano, Francis. Dinis, ao tomar conhecimento de tal facto, acha que Edilberto não
foi leal consigo e decide vender o automóvel a Gaspar, inimigo de longa data de
Edilberto, que o pretende reivindicar a Francis. Quid Juris? (3,5 valores)
- Explicação completa e fundada do sentido, função e natureza da cláusula de reserva de
propriedade. Implicações daqui resultantes para o caso em apreço. Em princípio, não se trata
de uma exceção ao princípio da transmissão da propriedade por efeito do contrato, mas
apenas de uma dilação dessa transmissão para momento posterior.
- Pode alienar-se a posição jurídica do comprador com reserva de propriedade (que era
relevante qualificar), que tem conteúdo patrimonial e não está abrangida por qualquer
proibição de disposição pelo seu titular. Pode também tratar-se o bem como bem
relativamente futuro (artigo 893.º do CC). Fora desses casos, parece que há venda de bens
alheios (artigo 892.º CC).
- Assim, in casu, depois da venda a Edilberto, Dinis não mantém a plenitude dos poderes
de um normal proprietário, nomeadamente os poderes de alienação. A reserva de
propriedade cumpre uma função de garantia, pelo que se deve entender que Dinis não tem
legitimidade para alienar a coisa. Consequentemente, tal hipótese deverá ser equiparada à
venda de coisa alheia como própria, sancionando-se tal venda com a nulidade.

c) Aquando da compra do Austin Martin, o Stand de que Dinis é proprietário fez saber a
Edilberto que o preço original de €200.000 seria apenas de €180.000, se Edilberto
assinasse um documento em que declarava comprar o automóvel “no estado em que se
encontrava”, o que veio efetivamente a acontecer. Algumas semanas depois o carro
começou a manifestar problemas no sistema elétrico. Edilberto prontamente se queixou
das avarias no Stand de automóveis de Dinis e pretende que o mesmo seja reparado.
Dinis declina qualquer responsabilidade e recorda a Edilberto a declaração que assinou
aquando da compra do carro. Quid Juris? (3 valores)
- O contrato de compra e venda em apreço está sujeito ao regime previsto no Decreto-
Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, com as alterações entretanto introduzidas, uma vez que foi
celebrado entre um particular e um profissional, o stand de automóveis. Assim, o vendedor
é responsável perante Edilberto por qualquer falta de conformidade que exista no momento
em que o bem lhe é entregue, presumindo-se essa falta se o vício se manifestar num prazo
de 2 anos (cfr. Artigo 3.º, n.º 2).
-No caso em análise Edilberto assinou um documento em que declarou aceitar o Austin
Martin estado em que se encontrava, o que leva o vendedor a declinar qualquer
responsabilidade quanto aos defeitos que, entretanto, se manifestaram. Todavia, a proteção
conferida pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, com as alterações entretanto sofridas,
é imperativa, sendo nulo o acordo ou cláusula contratual pelo qual, antes da denúncia da falta
de conformidade ao vendedor se excluam ou limitem os direitos do consumidor aí previstos
(artigo 10.º). A renúncia de Edilberto à proteção que lhe é conferida legalmente é, pois, nula.
Nos termos do disposto no n.º 2 e no n.º 3 do artigo 16.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho
(Lei de Defesa do Consumidor), a nulidade apenas pode ser invocada pelo consumidor ou
seus representantes, e o consumidor pode optar pela manutenção do contrato quando
algumas das suas cláusulas forem nulas.
- Assim, Edilberto deve denunciar os defeitos ao vendedor no prazo de dois meses a
contar da data em que os detetar (artigo 5.º A, n.º 2), tendo direito à reparação pretendida no
prazo de trinta dias sem grave inconveniente para si (artigo 4.º, n.º 2).
- Note-se, por último, que o prazo de garantia para as coisas móveis é de dois anos a
contar da data da entrega do bem (artigo 5.º, n.º 1), ou seja prolonga-se até Junho de 2018.
Todavia, como estávamos perante a venda de um automóvel usado, o artigo 5.º, n.º 2 teria
permitido que o prazo de garantia, por acordo das partes, tivesse sido reduzido a um ano.

II

António, proprietário de um terreno no Douro e conhecido promotor imobiliário na região,


acordou com Bernardo, a preparação de um terreno e a construção das necessárias
infraestruturas para a construção de um hotel de 3 andares e um luxuoso SPA, por um preço
global de €5.000.000,00, prevendo-se a sua conclusão em Dezembro de 2016.
Bernardo, sentindo dificuldades em concluir a obra atempadamente, contrata
Casimiro, encarregando-o de realizar o último piso do edifício do hotel, bem como todas as
instalações elétricas interiores.
A obra foi entregue no dia 31 de Dezembro de 2016 a António que, entusiasmado,
a aceitou sem qualquer ressalva, declarando que o SPA e o hotel estavam fabulosos e que de
certeza seriam um enorme sucesso.
Em Março de 2017, antes da abertura oficial do hotel, António resolve instalar-se
com a família e amigos no último piso, a fim de testar as funcionalidades e a operacionalidade
do hotel. Uma vez instalados, António verifica que o mesmo não só não tinha luz, fruto de
um curto-circuito na instalação elétrica, mas também que todo o soalho flutuante estava mal
colocado e começar a levantar em alguns pontos, o que poderia até atentar contra a
integridade física de quem aí passasse.
António notificou imediatamente Bernardo do sucedido, mas como não obteve
qualquer resposta, decidiu promover a expensas suas todas as necessárias reparações, tendo
despendido €50.000, que prontamente reclamou de Bernardo. Este recusa-se a reembolsar
António afirmado que a culpa é exclusivamente de Casimiro.
Quid Juris? (8 valores)
-Qualificação completa e fundada do contrato entre António e Bernardo como contrato
de empreitada (artigo 1207.º do Código Civil do Código Civil (“CC”)), com fixação de preço
global;
- Regime jurídico aplicável: âmbito de aplicação objetiva e subjetiva do Decreto-Lei n.º
67/2003, de 8 de Abril, com as alterações entretanto introduzidas – artigo 1.º-A, n.º 1 e 1.º
B, n.º 2. Exclusão deste regime e aplicação do regime comum do CC;
- Qualificação completa e fundada do contrato entre Bernardo e Casimiro como
contrato de subempreitada (artigo 1213.º do CC);
- Aferição da validade do contrato de subempreitada (artigo 264.º ex vi artigo 1213.º, n.º
2 do CC);
- Referência ao regime da verificação da obra (artigo 1218.º do CC), aferindo da
relevância da aceitação efetuada por António (artigo 1219.º do CC);
- Referência à existência de defeitos ao abrigo do contrato de empreitada (artigo 1225.º
do CC), com referência ao regime da responsabilidade de Casimiro enquanto subempreiteiro
(artigo 1226.º do CC), referindo o regime dos artigos 1221.º a 1223.º do CC.

Duração da prova: 1 hora e 30 minutos.


2 Valores de ponderação global.
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DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

21 de janeiro 2022

TÓPICOS

a)

- Classificação do negócio jurídico celebrado entre A. e C.: compra e venda de bens de


consumo;

- Compra e venda porque foi celebrado um contrato pelo qual C. transmitiu a A. a


propriedade de um carro mediante o pagamento de um preço (874.º do CC). O facto de
parte do preço ser pago em espécie não é suficiente para o negócio ser qualificado como
permuta. Continuamos a ter preço. De todo o modo, impunha-se analisar a questão, dado
podemos estar perante um contrato misto ou uma permuta;

- É uma compra e venda de bens de consumo, dado A. ser consumidor e C. um


profissional, conforme previsto no DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, que atualmente
regula a matéria [art. 2.º/g) e o) e 3.º/1/a)];

- De acordo com o disposto no artigo 5.º do DL n.º 84/2021, C. devia entregar a A. um


bem com requisitos objetivos e subjetivos de conformidade. Não é adequado ao uso que é
dado a um veículo de circulação novo, que o painel de instrumentos apague a configuração
introduzida pelo respetivo utilizador. Logo, o bem vendido por C. a A. não é conforme o
contrato [al. a) do n.º 1 do art. 7.º do DL n.º 84/2021]. Falta de conformidade que, tendo
ocorrido nove meses após a entrega, se presume existente na data da entrega do carro (art.
13.º do DL n.º 84/2021);

- O direito à indemnização do consumidor não consta entre os direitos do consumidor


elencados no artigo 15.º do DL n.º 84/2021, à semelhança do que sucedia no regime
anterior. Contudo, o consumidor continua a ter direito a ser indemnizado do profissional,
quer nos termos gerais quer ainda nos termos do disposto no artigo 12.º da Lei de Defesa
do Consumidor, e o DL n.º 84/2021 consagra genéricamente a responsabilidade do
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profissional por qualquer falta de conformidade, o que veio a suceder [art. 12.º/1 do DL n.º
84/2021], sem prejuízo do disposto abaixo;

- No caso em análise, deve questionar-se se, de facto, A. tem alguma pretensão


indemnizatória contra C. Todas as pretensões indemnizatórias estão relacionadas com
danos relativos à morosidade da reposição da conformidade do veículo. Porém, C. nunca se
recusou a receber de volta o carro de A. para análise e eventual reparação ou substituição.
Foi A. quem, ao invés de levar o carro a C., decidiu levá-lo a oficina terceira onde a
reparação do mesmo se prolongou no tempo, implicando mais de que uma deslocação. Isto
é, A., sem motivo justificado, não praticou os atos necessários ao cumprimento da
obrigação da C., de reposição da conformidade do veículo. Não sendo D. representante legal
ou auxiliares de C., para efeitos do disposto no artigo 800.º do CC, será, em princípio de
afastar qualquer indemnização da mesma.

- Admite-se, porém, que ainda que A. tivesse, de facto, agendado o arranjo do seu carro a
C., mesmo podendo utilizar o carro, ficaria sempre temporariamente privado do seu uso
pleno. Com efeito, não podia fazer uso do mesmo de acordo com as suas configurações, mas
apenas de acordo com as configurações de origem. E tudo isto, poderia levar,
eventualmente, a responsabilidade de C.

b)

- Conforme visto na alínea a), o negócio jurídico em apreço é uma compra e venda de
bens de consumo DL n.º 84/2021, de 18 de outubro.

- T. é a representante em Portugal do produtor [cf. alínea q) do artigo 2.º DL n.º


84/2021, de 18 de outubro], podendo, em abstrato, ser responsável, independente de
culpa, pela desconformidade do produto adquirido por A., nos termos do disposto no artigo
40.º/1 e 4 do DL n.º 84/2021, de 18 de outubro.
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- Contudo, também aqui, a resposta é negativa. Os direitos conferidos no artigo 40.º/1


do Decreto-Lei n.º 67/2007, de 8 de abril, ao consumidor em relação ao produtor limitam-
se à reparação ou substituição da coisa, não contemplando qualquer indemnização, para
mais quando A. configura essa mesma pretensão indemnizatória não diretamente
relacionada com a falta de conformidade do bem, mas apenas com danos relativos à
morosidade da reposição da conformidade do veículo, aos quais o representante do
produtor será, em princípio, alheio.

- Assim, uma eventual de responsabilidade de T., a existir, só poderia ser por eventuais
atos de D., contando que preenchidos os pressupostos do artigo 800.º do CC.

c)

- Qualificação do contrato celebrado entre A. e D.: contrato de prestação de serviços


atípico.

- Apesar de D. se obrigar para com A. a realizar uma obra, este nada pagou por a mesma.
Assim, atendo os elementos qualificadores do contrato de empreita (artigo 1207.º do
Código Civil), o contrato não pode qualificado com um contrato de empreitada mas como
uma prestação de serviços atípica, concretamente uma reparação a título gratuito.

- Em alternativa, caso se decidisse pela existência de preço, deveria fundamentar-se que


este nunca foi cobrado ao consumidor mas, ao invés (e eventualmente), a C. (terceiro ao
contrato de prestação de serviços), porquanto a reparação – a título gratuito – ainda
encontraria cobertura no contrato de compra e venda já analisado [art. 18.º/2/a) DL n.º
84/2021)].

- Não obstante, sendo A. um consumidor e C. um profissional, poderíamos de aplicar o


previsto no DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, que atualmente regula a matéria, uma vez
que o mesmo se aplica, com as devidas adaptações [art. 2.º/g) e o) e 3.º/1/b)];
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- Quanto à pretensão de A., ficou demonstrado que este, após contratar os serviços de D.,
teve de deslocar-se por quatro ocasiões às suas instalações e que apenas por ocasião da
última deslocação, a reparação contratada ficou executada com sucesso. Em face do
exposto, o serviço prestado por D., não estava em conformidade com o contrato (cf. art. 5.º
e al. d) do art. 7.º do DL n.º 84/2021). Não é expectável que a reparação de um veículo
contratada a um profissional só tenha sucesso após quatro deslocações às instalações do
profissional.

- Tratando-se de um dever inobservado por D. ao abrigo de contrato celebrado, vale a


presunção de culpa prevista no artigo 799.º do Código Civil, quanto à mora da reparação.

- Análise do eventual direito a indemnização de A., apesar de o mesmo não se encontrar


previsto no elenco dos direitos enunciados no artigo 15.º do DL n.º 84/2021, de 18 de
outubro.

GRUPO II

- Análise e discussão da distinção entre o contrato de compra e venda e de empreitada.


Uma das distinções mais difíceis de fazer, sobretudo nas compras e vendas de coisa futura
e nas empreitadas em que é o empreiteiro a fornecer os materiais a utilizar na obra.
Desenvolvimento, das soluções apresentadas na doutrina e na jurisprudência para a
distinção.

- Analisando o regime da empreitada, o próprio regime da empreitada, podemos


verificar que, em certos aspetos, remete diretamente para as regras da compra e venda
(artigos 1211.º/1 e 1222.º/2 do CC)

- Ademais, sendo a empreitada, à semelhança da compra e venda um contrato oneroso, e


podendo ter, em certos casos, um efeito real, poderão aplicar-se à empreitada as regras da
compra e venda, por via do disposto no artigo 939.º do CC. Por exemplo, na denúncia dos
defeitos da obra, na empreitada a prestações ou ainda a empreitada onerada.
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- Por fim, noutros casos ainda o regime aplicável a ambos os contratos é o mesmo. Assim
sucede nos bens de consumo, nos termos do disposto DL n.º 84/2021, de 18 de outubro,
quanto à compra e venda de bens de consumo e, igualmente, quanto à empreitada de bens
de consumo.
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27 de janeiro de 2022 90 minutos

Exame de Coincidências
a)

- Classificação do negócio jurídico celebrado entre A. e R.: compra e venda de bens de


consumo;

- Classificação do negócio jurídico celebrado entre A. e R.: compra e venda de bens de


consumo;

- Compra e venda porque foi celebrado um contrato pelo qual A. transmitiu a R. a


propriedade de um automóvel mediante o pagamento de um preço (874.º do CC).

- É uma compra e venda de bens de consumo, dado R. ser consumidor e A. um profissional,


conforme previsto no DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, que atualmente regula a matéria
[art. 2.º/g) e o) e 3.º/1/a)];

- Discussão sobre a perfeição do ato de entrega do bem ao consumidor, nos termos do


art. 11.º/1 do DL n.º 84/2021, atendendo a que foi entregue uma declaração de circulação
com carácter provisório e impacto na conformidade do bem [art. 7.º do DL n.º 84/2021]. O
facto de se tratar de um documento com carácter provisório, ainda que essencial à utilização
do automóvel em via pública, não impacta a conformidade do bem ao ponto de o tornar
desconforme. Com efeito, a entrega de um carro acompanhada da entrega de uma
declaração de circulação é adequada para o uso a que os veículos automóveis se destinam.

- A obrigação de entrega, além da própria coisa (art. 879.º/c) do CC), abrange os


documentos relativos à coisa [art. 882.º/2 do CC]. Entenda-se, a obrigação de entrega da
declaração de circulação e, posteriormente, do DUA, que deve acompanhar sempre o
condutor de veículos automóveis. In casu, atendendo à natureza do documento, nem estaria
na disponibilidade das partes, apesar da letra do artigo 882.º/2 do CC, o afastamento desta
obrigação. Isto é, tendo a obrigação de entrega o intuito de proporcionar ao comprador o
gozo pleno do direito transmitido, e considerando que a declaração de circulação é um
documento provisório, significa que o proprietário não pode (legalmente) circular com o
veículo sem o DUA. Logo, deve considerar-se aplicável o referido preceito.

- Sendo a obrigação de entrega da coisa uma obrigação do vendedor [arts. 879.º/b) do


CC], por um lado, e compreendendo a mesma, por outro, a obrigação de entrega do DUA [art.
882.º/2 do CC], os custos com o seu cumprimento, na ausência de convenção em contrário
das partes, correm por conta do devedor. Isto é, de A.

- Em alternativa à resposta anterior, desde que fundamentado, admitisse que se aplicasse


o artigo 878.º do CC, caso em que caberia ao comprador suportar as despesas acessórias ao
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

27 de janeiro de 2022 90 minutos

contrato. Isto porque, o DL n.º 178-A/2004, de 28 de outubro, refere que o DUA agrega a
informação anteriormente constante do título de registo de propriedade e do livrete do
veículo. As despesas são a cargo do comprador, se não houver documentos, e, por ocasião
da conclusão do negócio, ainda não havia DUA.

b)

- Classificação do sistema “Alerta Total” como conteúdo ou serviço digital incorporado


num bem, fornecido ao abrigo de um contrato de compra e venda [art. 3.º/1/c) do DL n.º
84/2021]; Presunção legal de que o sistema “Alerta Total” se encontra abrangido pelo
contrato de compra e venda [art. 3.º/2 DL n.º 84/2021].
- Disponibilização do sistema enquanto requisito adicional de conformidade do bem,
tratando-se de um único ato de fornecimento [art. 8.º/1 in fine, DL n.º 84/2021], devendo a
sua disponibilização ser assegurada durante o período razoavelmente esperado pelo
consumidor à luz do tipo e da finalidade do bem. O que significa que o bem vendido por A.
continuava, quanto ao sistema de alerta, a ter observar o disposto nos artigo 6.º e 7.º do DL
n..º 84/2021.
- Analise e discussão se é adequado que um veículo adquirido por ter um certo
equipamento veja o mesmo descontinuado ao fim de 18 meses sobre a data da sua aquisição
[art. 7.º/1/a do DL n.º 84/2021]. Tendo em conta o prazo previsto no artigo 12.º do DL n.º
84/2021, a resposta parece negativa.
- Verificando-se uma situação de falta de conformidade, a responsabilidade recai, a título
primário, sobre A., o profissional [art. 12.º/2/a), primeira parte, do DL n.º 84/2021],
- Validade da comunicação da falta de conformidade por R., admissível como meio de
prova [art. 12.º/5 e 13.º do DL n.º 84/2021], valendo a presunção geral de falta de
conformidade, exceto se o consumidor demonstrar que incompatível com as características
específicas do bem [art. 13.º/1/in fine].
- O direito à indemnização do consumidor não consta entre os direitos do consumidor
elencados no artigo 15.º do DL n.º 84/2021, à semelhança do que sucedia no regime
anterior. Contudo, o consumidor continua a ter direito a ser indemnizado do profissional,
quer nos termos gerais quer ainda nos termos do disposto no artigo 12.º da Lei de Defesa
do Consumidor, e o DL n.º 84/2021 consagra expressamente a responsabilidade do
profissional por qualquer falta de conformidade, o que veio a suceder [art. 12.º/1 do DL n.º
84/2021], sem prejuízo do disposto abaixo;
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

27 de janeiro de 2022 90 minutos

- No caso em análise, deve questionar-se se, de facto, R. tem alguma pretensão


indemnizatória contra A., visto que esta se fundamenta numa alegada desvalorização do
veículo pela desativação do sistema, por ato de terceiro, distinto do comprador. Assim, uma
eventual responsabilidade de A. seria por eventuais atos de Alfa Julieta contando que
preenchidos os pressupostos do artigo 800.º do CC.
- Análise e discussão da eventual responsabilidade direta da Alfa Romeo, enquanto
produtor, nos termos do disposto nos artigos 2.º/p) e artigo 40.º/1 e 4 do DL n.º 84/2021.
Em princípio, a resposta seria negativa. Os direitos conferidos ao consumidor em relação ao
produtor limitam-se à reparação ou substituição da coisa, não contemplando qualquer
indemnização, ainda que se decida por uma eventual falta de conformidade nos termos
acima fundamentados.

c)

- Os direitos que a lei reconhece ao consumidor no DL n.º 84/2021 por falta de


conformidade do bem que se manifeste no prazo de 3 anos, transmitem-se ao terceiro
adquirente do bem a título gratuito ou oneroso (art. 15.º/10). Assim, se passados os dezoito
mesmos, o proprietário do carro fosse C. os direitos de R. sobre A. passariam para C.
- Contudo, considerando que C. é um profissional, pode discutir-se, à luz do disposto no
n.º 10 do artigo 15.º do DL n.º 84/2021 se o “terceiro adquirente” compreende, ou não
profissionais.
- Análise e discussão sobre a eventual responsabilidade direta de R. (vendedor) a C.
(comprador). In casu, estando perante uma compra e venda invertida (de um consumidor a
um profissional), exclui-se a aplicação do DL n.º 84/2021. Porém, tal não obsta que C. possa
responsabilizar R. nos termos da compra e venda de coisa defeituosa da compra e venda de
bens de consumo.

d)

- S. obriga-se para com A. a realizar uma obra que, no silêncio da hipótese, se presume a
título oneroso. Análise dos elementos qualificadores do contrato de empreitada (art. 1207.º
do CC).
- S. não é profissional para efeitos de aplicação do DL n.º 84/2021, que atualmente regula
a matéria, [art. 2.º/g) e o) e 3.º/1/b)], faltando o elemento relacional (exercício com caráter
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

27 de janeiro de 2022 90 minutos

profissional de uma atividade económica). Logo, o contrato celebrado entre R. e S. é uma


empreitada civil.
- Envio de fotografias e subsequente concordância de R. enquanto aceitação da obra (art.
1218.º/1 do CC), não obstante a entrega do automóvel não se ter realizado. Não haveria,
portanto, mora quanto à aceitação da obra.
- O risco do perecimento do automóvel corre por conta do proprietário [art. 1228.º/1 CC].
No caso em análise, o proprietário é R., dono da obra, com a aceitação (art. 1212.º/1 do CC).
- Analise e discussão sobre a obrigação de entrega da coisa e o vencimento da mesma.
- S., empreiteiro, tinha a obrigação de entregar a obra a R. No caso, não tendo sido
estipulado um prazo para a entrega, o vencimento da obrigação, segundo doutrina na
regência, está dependente de interpelação do dono da obra (art. 777.º/1 do CC). Ora, não
tendo R. exigido a entrega do carro, não se venceu ainda obrigação de S. Não estando S. em
mora na obrigação de entrega e tratando-se de um perecimento por caso fortuito, não
proveniente de qualquer dever de custódia de S., o risco é de R., proprietário. S. não tem de
entregar um carro novo e mantém o direito ao pagamento do preço acordado.

e)

- Qualificação do contrato celebrado entre S. e T. como subempreitada civil.


- Análise da responsabilidade de S. (empreiteiro) por danos causados a R. (dono da obra)
pelo subempreiteiro, nos termos do disposto no artigo 800.º do CC.
- Análise da eventual ação direta do dono da obra sobre o subempreiteiro. Discussão do
problema atento o 406.º/2 e posição da regência.
- Havendo eventual concurso de responsabilidades, discussão do modo de articulação
das duas responsabilidades e do eventual direito de regresso (artigo 1226.º do CC).
- Não obstante, excluindo-se a responsabilidade do subempreiteiro nos termos já
descritos na alínea anterior, não haveria, de forma semelhante, lugar a imputação ao abrigo
do artigo 800.º do CC.
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

23 de fevereiro 2022 90 minutos

Coincidência de Recurso

Exame

a. Quid iuris? (7 v.)

Afastar a aplicação do DL 84/2021, de 18 de outubro, por não estar preenchido o seu âmbito.
Análise do artigo 920 do Código Civil: norma que remete para regime subsidiário ou norma
que subtrai a compra e venda de animais do regime dos artigos 913 e seguintes do Código Civil?
Apesar da legislação especial ser antiga não se encontra revogada expressa ou tacitamente.
Discussão sobre a finalidade dessa legislação especial e o caso dos animais de companhia. De
qualquer forma, a falta de qualidades não se encontra prevista em legislação especial.
A enumeração na legislação especial é taxativa? Ponderar divergência.
Ainda que se admita como exemplificativa, deverá ponderar-se criticamente se a teleologia
normativa do diploma especial abrange falta de qualidades de animais de companhia.
Não existindo usos, e considerando que seria inadequado aplicar a legislação especial às faltas
de qualidades de animais de companhia, seria de defender a aplicação do regime dos artigos
913.º e seguintes.
Apresentar criticamente os direitos do comprador: anulação (para o regente: resolução),
direito a exigir a substituição ou possibilidade de redução do preço, eventual indemnização.

b. Quid iuris? (4 v.)

Apesar de Emília ser titular de uma expectativa real de aquisição, não é proprietária.
A compra e venda celebrada entre António e Emília é, portanto, uma compra e venda de bem
alheio.
Discussão crítica sobre a oponibilidade da reserva de propriedade, não sujeita a registo, a
terceiros.
Legitimidade para arguir a nulidade por terceiro proprietário: consequências e alternativas.

II

a. Quid iuris? (5 v)

Qualificação do contrato celebrado como de empreitada civil de construção de coisa móvel.


As manchas e não instalação de camada isolante são defeitos.
Ponderação da aplicação do regime do artigo 1225.º do Código Civil.
O artigo 1225.º do Código Civil exige atualmente que o defeito seja grave? Análise da intenção
histórica na alteração da redação do preceito.
O prazo de cinco anos é para o exercício de direitos ou manifestação de defeitos? A seguir a
posição da regência, Armando estaria ainda em prazo.
Não obstante, o Código Civil estabelece uma hierarquia de direitos, a resolução não seria
possível nestes termos.

b. (3 v.)

DL 84/2021, de 18 de outubro – análise do preenchimento dos três âmbitos.


Existência de desconformidade nos termos do artigo 22.º.
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

23 de fevereiro 2022 90 minutos

Prazo de garantia de 5 anos que se suspende com a comunicação.


Ao contrário do regime previsto no DL 84/2021, de 18 de outubro, para os bens móveis, para os
bens imóveis não se estabelece uma hierarquia de direitos.
Em abstrato a resolução seria admissível. No caso concreto constitui abuso de direito, na
modalidade de desequilíbrio no exercício de posições jurídicas.
Assim, o dono da obra pode exigir judicialmente a reparação, substituição ou redução
proporcional do preço até 3 anos após a comunicação dos defeitos.

Ponderação global e redação: 1 v.


TÓPICOS

GRUPO I
1. Integração do caso prático no contrato de empreitada, discutindo o conceito de obra, ou num contrato
de prestação de serviços.
Sendo um contrato de empreitada, haveria ainda que tomar posição quanto a estarmos, ou não, perante
uma empreitada de bens de consumo. Em princípio, estaríamos perante uma empreitada de bens de
consumo. A. seria consumidora e C. um profissional.
Sendo um contrato de prestação de serviços, haveria ainda que discutir o regime aplicável ao mesmo.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed., Almedina,
2013, pp. 153-159 e 193-205.

2. Integração da situação no regime do cumprimento defeituoso, justificando. No cumprimento
defeituoso de contrato de empreitada, considerando-se que o contrato celebrado foi um contrato de
empreitada.
Identificar os direitos de C., enquanto dono da obra: reparação, nova construção, redução do preço e
resolução do contrato, de acordo com a hierarquia estabelecida pela lei. Com efeito esta empreitada (ou
subempreitada, dependendo da perspetiva) seria uma empreitada entre profissionais. Identificação do
direito à indemnização como cumulável com os outros direitos.
Discutir a utilidade para o dono da obra (C.) dos direitos à reparação, a nova construção ou à redução do
preço, atendendo a que A. “cancelou” o contrato com a clínica, compatibilizando com a parte final do art.
1222.º, n.º 1 do CC.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed., Almedina,
2013, pp. 416 e ss.

3. Distinção, no cumprimento defeituoso, entre defeitos ocultos e defeitos aparentes, concluindo pela
existência de defeitos ocultos.
Noção de aceitação de obra e identificação das respetivas modalidades.
Análise dos efeitos da aceitação de obra sem reserva no regime geral da responsabilidade por defeitos,
em particular quanto a responsabilidade do empreiteiro.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed., Almedina,
2013, pp. 289-292 e 412-415.

4. Análise do risco no contrato de empreitada. Atendendo a que os materiais de construção foram
fornecidos pelo empreiteiro, e presumindo ainda não ter ocorrido a aceitação à data do incêndio, L. é o
proprietário da prótese (art. 1212.º, n.º 1, CC).
Enquanto proprietário, o L. suporta o risco, e não pode por isso exigir o preço à C. (art. 1228.º).
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed., Almedina,
2013, pp. 289-292 e 412-415.

GRUPO II
Enquadramento da situação na venda de bens onerados (art. 905.º do C.C.).
Análise e fundamentação da boa-fé/má-fé das partes.
A obrigação de eliminação do ónus ou limitação (penhora, mediante o pagamento da dívida, e com isso
impedir a venda judicial), enquanto obrigação do vendedor fazer convalescer o contrato (art. 907.º),
sanando a sua anulabilidade.
Direito de A. ser indemnizado (art. 908.º e 909.º do C.C.), em cumulação com a indemnização prevista no
art. 910.º do C.C. no caso de não fazer convalescer o contrato de compra e venda.
Possibilidade de redução do preço, desde que preenchida a previsão do art. 911.º do C.C.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE, Direito das Obrigações, Volume I, 2.ª ed., Almedina, 2019, pp. 380 e ss.
DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época de Coincidência)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

I
Em agosto/2016, Afonso, proprietário de um terreno composto por laranjeiras, vendeu as laranjas que
se colhessem naquele ano a Beatriz, proprietária de uma mercearia. Em outubro/2016, Afonso vendeu
a Carlos, agricultor, o mencionado terreno. Do contrato de compra e venda ficou a constar que o
terreno tinha uma área de 1000 m2.

Responda de forma completa e fundamentada às seguintes questões:

(a) Em novembro/2016, Beatriz interpelou Carlos solicitando-lhe a entrega da colheita de laranjas


daquele ano. Carlos ficou surpreendido e recusou a entrega, pois Afonso nunca havia mencionado o
direito invocado por Beatriz. Quid iuris? (3 valores)

(b) Em novembro/2017, Carlos começou a vangloria-se na aldeia de que o terreno comprado a Afonso
tem 1500 m2, de modo que havia feito um excelente negócio, pois pagou 1 e levou 1 e ½. Afonso,
surpreendido por esta informação, quer saber se, e como, pode reagir. (2 valores)

(c) Em junho/2017, Carlos comprou à Deer, S.A. um trator agrícola por €10.000, o qual lhe foi
entregue de imediato. Carlos obrigou-se a pagar o preço em 10 prestações mensais de igual valor. A
Deer, S.A. não reservou para si a propriedade. No contrato de compra e venda, foi estipulado que o
incumprimento de uma prestação conferia ao vendedor o direito a resolver o contrato. Aprecie a
validade desta cláusula. (4 valores)

(d) O trator comprado por Carlos avariou 6 vezes nos primeiros 8 meses. A vendedora tem-se
prontificado a repará-lo em todas essas ocasiões. Todavia, Carlos, aborrecido com o transtorno,
pretende que o veículo seja definitivamente substituído por um novo. Tem esse direito? (3 valores)
.

II
A Wood, S.A., que comercializa móveis usados, contratou com Alberto, carpinteiro, a restauração de
duas cómodas antigas. As cómodas foram devolvidas por Alberto, já restauradas, em 15 de
janeiro/2016.

Responda de forma completa e fundamentada às seguintes questões:

(a) Em 13 de julho/2016, a Wood, S.A. apercebe-se de que o verniz aplicado no restauro é


manifestamente desadequado para o efeito, à luz das regras técnicas aplicáveis. Nesse mesmo dia,
confrontou Alberto com aquele facto, mas este rejeitou a correção do juízo segundo o qual o verniz era
desadequado. Posto isto, a Wood, S.A. quer saber de que prazo dispõe para exercer judicialmente o seu
direito. (4 valores)

(b) A Wood, SA nunca chegou a pagar o preço dos serviços prestados por Alberto. Em 19 de
janeiro/2018, Alberto ganhou coragem e interpelou a Wood, SA, através de carta, para pagar. Em
resposta, a Wood, SA informou que nada deve, dado que o crédito de Alberto já prescreveu. Considera
este argumento procedente? (4 valores)
DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época de Coincidência)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

Tópicos de Correção

(a) Cumpriria debater se a transferência da propriedade sobre o terreno para Carlos havia afetado o
direito de Beatriz.
Nos termos do artigo 408.º/2 CC, quanto aos frutos pendentes, apesar da dilação temporal entre a data
da celebração da compra e venda e o efeito real, a causa deste é o contrato, e não a separação da árvore.
Consequentemente, logo que os frutos se separassem da árvore (porque eram colhidos ou porque
haviam caído) a propriedade sobre os mesmos transferir-se-ia para Beatriz, que, em consequência,
poderia reivindicá-los de Carlos. Este poderia agir contra Afonso, designadamente com fundamento em
dolo, pedindo a anulação do contrato e/ou uma indemnização. Importaria ainda mencionar o artigo
880.º CC, nos termos do qual o vendedor fica obrigado a realizar as diligências necessárias para que o
comprador "adquira" os bens vendidos. Se o termo "adquira" puder ser entendido como "obter a
detenção material sobre a coisa vendida", então seria de sustentar que Beatriz poderia exigir a Afonso
que diligenciasse junto de Carlos no sentido de as laranjas lhe serem entregues.

(b) Nesta hipótese, seria valorizado o debate sobre o direito de Afonso à correção do preço.
Uma vez que a diferença entre a medida real do terreno e a declarada no contrato equivalia a ½, tem-se
por preenchido o requisito de relevância previsto no artigo 888.º/2 CC. Neste contexto, poderia
discutir-se se a correção proporcional do preço visaria a totalidade da diferença ou apenas a parte da
diferença que excedia 1/20. Justificar-se-ia ainda mencionar o direito de resolver o contrato pelo
comprador previsto no artigo 891.º/1 CC.
O direito de Afonso receber a diferença teria, todavia, caducado 1 ano após a entrega (artigo 890.º/1
CC), ou seja, antes de novembro/2017, data em que Afonso tomou conhecimento da discrepância.

(c) Nesta hipótese, depois de ser esclarecido se o artigo 934.º CC contém ou não uma norma
imperativa, caberia debater se, apesar de o preceito não ser aplicável, ao menos diretamente, dado que
não tinha havido reserva de propriedade, se justificaria estender o seu regime ao caso em apreço, com a
consequência de tornar a cláusula em causa inválida. Seria sobretudo valorizada a demonstração do
conhecimento deste debate na doutrina.

(d) Caberia debater se o legislador propôs uma hierarquia para os direitos que confere ao comprador de
bem defeituoso contra o vendedor (artigo 914.º CC). Resolvido esse debate no sentido positivo,
interessaria notar que essa hierarquia é, numa certa perspetiva, constituída a favor do vendedor, que
desse modo passa a ter o direito de escolher reparar em vez de substituir, o que será em princípio
menos oneroso. Caberia então colocar e responder às perguntas seguintes: (i) Se o vendedor, apesar de
se prestar a reparar os defeitos da coisa, evidencia incapacidade para realizar uma reparação eficaz, uma
que permita ao comprador utilizar o bem sem limitações, pode o comprador recusar a reparação e
exigir a substituição? (ii) As sucessivas reparações ineficazes tornam a substituição necessária?
Uma solução poderá passar por considerar que as reparações sucessivas e ineficazes demonstram a
incapacidade do vendedor para reparar o defeito, devendo, na sequência, ser a coisa substituída, o que
pode ser exigido pelo comprador. De acordo com este entendimento, Carlos teria direito à substituição.

II

(a) Nesta hipótese, está em causa decidir se a Wood é titular dos previstos nos artigos 1221.º-1223.º CC
contra Alberto.
DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época de Coincidência)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

Neste sentido, e assentando que Wood não conhecia o defeito quando aceitou a obra, interessaria
começar por discutir se o defeito em causa deveria ser considerado oculto ou aparente. Seria valorizada
a distinção fundada entre estes dois conceitos.
Sendo o defeito oculto, a Wood não só havia cumprido o prazo de 30 dias para denunciar o defeito
(artigo 1220.º CC), como poderia propor ação para fazer valer os seus direitos até ao dia 14 de janeiro
de 2018.
Sendo o defeito considerado aparente, e tendo a obra sido aceite sem reservas, a Wood teria de ilidir a
presunção prevista no artigo 1219.º/2 CC, caso pretendesse exercer os seus direitos. Se não fosse bem-
-sucedida nesta diligência, não só estaríamos perante um caso de irresponsabilidade do empreiteiro
(artigo 1219.º/1 CC), como o prazo para denunciar o defeito já teria caducado (artigo 1220.º/1 CC).

(b) Na presente hipótese, interessaria debater se a presunção de cumprimento prevista no artigo 317.º,
b) CC aproveita ao dono de obra.
Depois de compreendido que a Wood não poderia alegar a prescrição, mas o cumprimento, dado que o
artigo 317.º CC não prevê qualquer efeito prescritivo, caberia debater se este regime é ou não aplicável
à empreitada, mobilizando as considerações doutrinárias e jurisprudenciais que se afigurassem
convenientes.
FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE LISBOA
DIREITO DOS CONTRATOS I
Época Especial

TÓPICOS DE CORREÇÃO
a)
- Análise dos efeitos da compra e venda. Concretamente da obrigação de entrega e do respetivo
devedor;
- No silêncio do contrato, sendo a obrigação de entrega do vendedor, caberá ao mesmo suportar
os custos com o cumprimento dessa obrigação;
- Contudo, na compra e venda, enquanto contrato, as partes estão adstritas, quer na sua
formação quer na sua execução, ao cumprimento de regras da boa-fé. Designadamente a deveres
de informação. O incumprimento das mesmas, poderá conferir uma pretensão indemnizatória à
parte contrária;
- Análise e discussão da eventual responsabilidade de A. por violação de deveres de
informação.

b)
- Tendo A. e B. celebrado uma compra e venda a prestações há que ter em conta o regime
especial do artigo 934.º do CC. Especial em relação à compra e venda (886.º), mas também em
relação ao regime geral das obrigações (781.º);
- Circunscrevendo a questão à resolução do contrato, por ter sido a pretensão exigida por B.,
estabelece o artigo 934.º que na compra e venda prestações com reserva de propriedade e entrega
da coisa o comprador não pode resolver o contrato em caso de incumprimento de uma prestação
que não exceda um oitavo do valor do preço;
- Contudo, no caso em análise, apesar da compra e venda a prestação, da entrega da coisa e de
a prestação incumprida não exceder um oitavo do valor do preço, não houve reserva de
propriedade. Assim, segundo faltando um pressuposto de aplicação do artigo 934.º, vale, em
princípio o disposto no artigo 886.º:
- Análise e discussão da posição na doutrina, em particular da regência, que defende nestes
casos a aplicação do artigo 934.º apesar da falta de reserva. Se assim for, B., com fundamento no
artigo 934.º do Código Civil não poderia resolver o contrato;
- Aplicando-se o artigo 886.º do Código Civil teríamos de concluir que B. não poderia resolver
o contrato: a propriedade transferiu-se, a coisa foi entrega e as partes não acordaram na resolução
do contrato por falta de pagamento do preço;
- Não podendo resolver, impõe-se analisar os direitos de B.: uma ação de cumprimento,
acrescida de uma pretensão indemnizatória por juros.
FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE LISBOA
DIREITO DOS CONTRATOS I
Época Especial

c)
- Sim. Neste caso poderíamos estava perante uma venda de coisa defeituosa. O aparelho
adquirido sofre de um vício que impede a realização de um dos fins a que se destina (913.º do CC);
- Provando o defeito e que o mesmo existia por ocasião da compra presume-se a culpa da B.
(799.º do CC);
- Em caso de venda de coisa defeituosa os direitos do comprador não se circunscrevem aos
previstos nos artigos 914.º e ss. Além dos previstos nos artigos 903.º por remissão do artigo 913.º,
temos os direitos gerais do credor no caso de incumprimento. No caso, atendendo à posição de A.,
à exceção do não cumprimento. In casu, a exceção do não cumprimento do contrato
defeituosamente cumprido, a que seria aplicável, com as devidas adaptações, o disposto no artigo
428.º do Código Civil.
- Desde a faculdade exercida por A. fosse proporcional ao cumprimento defeituoso da B. a
recusa daquele seria legítima.

d)

d.1)
- Qualificação do contrato celebrado entre A. e C. como empreitada;
- Nos termos gerais, o prazo de garantia do art. 1225.º (prazo de caducidade) é de cinco anos
contados da conclusão da obra;
- Análise e discussão sobre a admissibilidade do prazo legal se encurtado por acordo das partes.
Há quem defenda que sim porém de tal encurtamento não seja pode ser de tal monta que prive as
partes de exercerem os seus direitos (Romano Martinez). Por fim, há quem sustente que a
possibilidade de as partes alterarem o prazo só vale para a ampliação e não redução (Vaz Serra;
Pedro de Albuquerque);
- Concluindo-se que temos um cumprimento cujo defeito de manifestou no prazo de garantia.
Análise dos direitos de A. e de o prazo para os exercer, distinguindo a prazo para a denúncia, do
prazo para o exercício dos direitos;
- Distinção, quanto às pretensões de A., entre os danos extra rem e circa rem. Qualificação dos
danos no frigorifico como canos extra rem.
- Quanto a construção de móvel novo, análise da hierarquia dos mecanismos de reação do dono
da outra em caso de cumprimento defeituoso. Se a reparação do móvel que caiu fosse possível e
não fosse demasiado onerosa para devedor. A. não tinha direito a um móvel novo.
- Referência à questão de saber o regime aplicável à indemnização destes danos, considerando
que se trata da violação do direito de propriedade (situação jurídica absoluta). Designadamente
se o prazo dos 3 anos para a responsabilidade aquiliana

d.2.)
- Referência à discussão relativa à possibilidade de (em determinados casos) o dono da obra
poder substituir o empreiteiro por terceiro relativamente à eliminação dos defeitos, podendo
exigir as despesas ao empreiteiro.
Direito dos Contratos I – TA

Exame de Recurso

6/04/2021

Duração: 2 horas

Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

1. (4 valores).
Qualificação como contrato de compra e venda a prestações, de acordo com os artigos
874.º e 934.º do CC, sem reserva de propriedade e com tradição da coisa. Indicação
dos efeitos essenciais: 879.º do CC.
Referência ao princípio da consensualidade estabelecido no artigo 408.º/1 do CC. A
constituição e transferência de direitos reais, na ordem jurídica portuguesa, dá-se por
mero efeito do contrato (sistema do título).
Será valorizada a referência, nos termos do artigo 934.º, 2ª parte, à inadmissibilidade
do vendedor exigir antecipadamente as prestações vincendas, por não exceder a
prestação em falta 1/8 do preço.
A pretensão do António, ao exigir a devolução do automóvel, consubstancia uma
declaração tácita de resolução do contrato.
Discussão quanto à aplicabilidade do artigo 934.º, 1.ª parte, à venda a prestações sem
reserva de propriedade. Identificar uma contradição valorativa na interpretação literal
da norma, não permitindo ao vendedor, ainda proprietário, que resolva o negócio, mas
admitindo caso o contrato não tenha sido celebrado com reserva.
Quando à resolução convencionada, referir que podia afastar o artigo 886.º do CC, no
entanto, a sua admissibilidade fica arredada por ser aplicável o artigo 934.º do CC.
Se a norma fosse dispositiva não ficaria assegurada a tutela da parte mais fraca. Pela
imperatividade (mínima) da norma ser controversa, é admitida resposta diversa
devidamente fundamentada.
Por fim, ainda que o incumprimento resulte, indiciariamente, do desemprego de Bento,
presume-se culposo, nos termos do art. 799.º, e atendendo ser uma obrigação
pecuniária não configura uma situação de impossibilidade.

2. (4 valores)
Identificar uma cláusula penal stricto sensu, permitindo ao vendedor exigir, em
alternativa ao preço, o montante acordado.
Recusar a aplicação do artigo 935.º do CC, por implicar uma contradição valorativa.
Devido à natureza da presente cláusula penal, se a indemnização fosse reduzida a
metade do preço, o vendedor ficava sem a coisa e recebia apenas metade do preço.
Referir de forma fundamentada, que esta argumentação só é procedente se a cláusula
penal visa acautelar o incumprimento definitivo do devedor.
Valoriza-se que o aluno considere que o tribunal pode reduzir a cláusula penal, nos
termos do artigo 812.º n.º 1 do CC, por ser manifestamente excessiva.

II

1. (3 valores)
Qualificação do negócio como uma compra e venda de bens de consumo: verificação
do âmbito objetivo e subjetivo do DL n.º 67/2003, de 8 de abril.
Dever de conformidade do bem com o contrato, ao abrigo do artigo 2.º do diploma.
Referência à presunção de falta de desconformidade, nos termos do artigo 3.º n.º 2, e
ao prazo de garantia, previsto no artigo 5.º n.º 1.
Análise dos direitos do comprador previstos no artigo 4.º n.º 1, referindo que prima
facie nada impede o comprador de resolver o contrato, sem antes suscitar a reparação
do bem.
Ponderar a aplicação do artigo 4.º n.º 5, por eventual contrariedade ao princípio da
boa fé. O comprador pretende resolver o contrato, quando se verifica um pequeno
defeito, facilmente reparável, na qual o vendedor se predispõe a reparar o bem
prontamente. Veja-se, por exemplo, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa,
processo 899/17.1YRLSB-8, de 6.07.2017.
2. (5 valores)
Qualificação como contrato de empreitada (artigo 1207.º do CC), modalidade típica
do contrato de prestação de serviços (artigo 1155.º do CC).
Identificação dos efeitos essenciais do contrato: realização de uma obra mediante o
pagamento de um preço.
Referir que realização de obra pode compreender, além da construção, a reparação,
demolição ou destruição de coisa móvel ou imóvel.
Enquadrar a recusa na entrega da obra no exercício do direito de retenção, nos termos
do artigo 754.º do CC.
Discussão em torno da admissibilidade do empreiteiro reter a obra do dono da obra:
 Doutrina Tradicional: Preço não é um crédito por despesas, omissão de
referência ao empreiteiro no artigo 755.º do CC e a não integração expressa do
direito de retenção no Código Civil, apesar de constar do Anteprojeto de Vaz
Serra.
 Doutrina e Jurisprudência maioritária: direito de retenção é enquadrável no
artigo 754.º do CC, uma vez que o empreiteiro incorre em despesas para
atribuir valor a uma coisa e ser pago por isso.

3. (4 valores)
Referência à regra geral quando ao tempo do pagamento do preço – artigo 1211.º n.º
2 do CC.
Identificar o problema da prescrição do direito crédito do empreiteiro ao preço.
Referência ao afastamento do artigo 317.º b) do CC (“execução de trabalhos”) pela
Jurisprudência, por considerar que se trata de dívida que costuma ser pagas em prazo
longos e não ser costume exigir quitação.
Afastamento desta corrente jurisprudencial, por ser, atualmente, habitual o
cumprimento da obrigação em prazo curto e sobre o empreiteiro pender um dever de
emitir fatura, para efeitos fiscais.
Será valorizada a indicação do fundamento da prescrição presuntiva e a sua aplicação
ao presente caso.
EXAME DE DIREITO DOS CONTRATOS I

22 de janeiro de 2021
I
[…]

a) É permitida a estipulação no contrato de alienação do automóvel?


⟼ Tópicos:
- Qualificação do contrato celebrado como uma compra e venda (874.º);
- A compra e venda, enquanto contrato de alienação, pode ser objeto de uma cláusula de
reserva da propriedade (409.º/1). Contudo, por incidir sobre coisa sujeita a registo, a sua
oponibilidade depende do registo (409.º/2). Caso contrário, apenas tem eficácia inter partes;
- Questão controversa, atenta a letra do art. 409.º (“o alienante reservar para si”), é saber se é
admitida a reserva da propriedade a favor do financiador não alienante. Mas, no caso em análise,
a questão não se coloca: a propriedade foi reservada a favor do alienante.
- O problema da hipótese é distinto: saber se a propriedade pode ficar reservada a favor do
alienante até que o adquirente cumpra uma obrigação para com terceiro. No caso, C. Atenta a parte
final do art. 409.º (“até à verificação de qualquer outro evento”), a resposta é afirmativa. No
entanto devem ser debatidos os termos da controvérsia existente a este respeito na Doutrina com
menção dos argumentos invocados em sentido favorável e em sentido desfavorável,
nomeadamente a posição do Professor Gravato Morais.

b) Quais os direitos de D. perante B.?


⟼ Tópicos:
- Qualificação do contrato celebrado como uma compra e venda de coisa futura (880.º e 211.º).
sem natureza aleatória. Com efeito, tal não foi estipulado expressamente, nem resulta de
interpretação do contrato (para quem admita que possa resultar de mera interpretação do
contrato);
- Análise do momento da produção do efeito real na compra e venda de coisa futura (408.º);
- Análise da obrigação do vendedor na compra e venda de coisa futura (880.º). Concretização
da mesma face ao objeto (futuro) contratado. Uma obrigação cuja violação se presume culposa
(799.º).
- Análise das consequências da violação da obrigação do vendedor exercer as diligências
necessárias para o comprador adquirir os bens vendidos (880.º/1): quer ao nível do preço
recebido, quer ao nível da responsabilidade por tal violação (801.º e 798.º, respetivamente), e
nomeadamente da questão de saber se essa responsabilidade é pelo interesse contratual negativo
ou pelo interesse contratual positivo.
EXAME DE DIREITO DOS CONTRATOS I

II
[…]

c) F. deteta erros dos projetistas.


Deve comunicar esses erros a E.?
E se o fizer e, mesmo assim, E. insistir na realização da obra tal qual consta dos projetos,
declarando assumir a responsabilidade se algo correr mal, pode E. […]?

⟼ Tópicos
- Qualificação do contrato celebrado como uma empreitada (1207.º)
- Análise do dever de F., enquanto empreiteiro, de comunicar os erros que tenha conhecimento
que possam prejudicar a aptidão da obra. Ainda que esses erros sejam provenientes de terceiro,
e, naturalmente, sem prejuízo da eventual responsabilidade do terceiro. Um dever integrado no
dever de cumprir pontualmente a obrigação e de executar uma obra isenta de vícios e que
corresponda ao interesse do dono da obra (1208.º e 762.º). Caso contrário, será F. responsável
por cumprimento defeituoso, eventualmente em concurso com o projetista.
- Análise do eventual direito de E., informado dos erros, de receber/exigir uma prestação
desconforme. Apesar de o ponto de partida ser o que o empreiteiro já não pode recusar-se a
cumprir o projeto, há que ter em consideração que, por um lado, as declarações de E. apenas
operam ao nível da responsabilidade contratual entre F. e E., e, por outro, que a execução da obra
em causa, a concretizar-se, poderia ruir. Neste caso, há que ponderar a possibilidade de F. impor
alterações à obra que, a não serem aceites por E., apenas poderiam fundamentar a desistência da
obra (1229.º). Não o cumprimento.

d) […]
Quid iuris?

⟼ Tópicos
- Análise, atento o disposto nos arts. 1208.º e 762.º, segundo uma boa-fé subjetiva ética, se F.
não deveria ter conhecido dos erros dos projetistas e, assim sucedendo, da eventual
responsabilidade por cumprimento defeituoso.
- Contudo, E., sabendo dos erros dos projetivas, deveria ter informado F. dos mesmos. Menção
à posição de VAZ SERRA e PEDRO ROMANO MARTINEZ no sentido de que haveria venire contra factum
proprium. Posição diversa de MENEZES LEITÃO atento o disposto no artigo 1209.º/2. Menção há
possibilidade de haver abuso de direito de E, mesmo perante o disposto no artigo 1209.º/2. Com
efeito, por força da boa-fé, tinha o encargo de prestar-lhe a colaboração necessária à boa execução
do projeto (762.º). Não o tendo feito, e, em resultado da sua omissão, ruido a obra sido realizada
segundo o projeto, continua obrigado a pagar o preço acordado. Quanto à responsabilização de F.,
apesar a presunção da culpa de F. pela derrocada, importa analisar se a omissão, culposa, de
colaboração de E. pode conduzir à atenuação, ou mesmo exclusão, da responsabilidade de F.
DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época Normal)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

I
Ana, reformada e assídua espetadora de um programa de vendas na TV, encomenda um robot de
cozinha que é anunciado e explicado num desses programas pela BiTech, S.A.. O preço,
correspondente a €1.200, seria pago em vinte e quatro prestações mensais sem juros.

Responda de forma completa e fundamentada às seguintes questões:

(a) Sete dias após ter recebido o robot de cozinha, não obstante o seu impecável funcionamento, Ana
acha que cometeu um excesso e pretende devolvê-lo. Quid iuris? (1 valores)

(b) Ana encontra-se em falta quanto ao pagamento de três prestações. Que direitos assistem à
vendedora, a BiTech, S.A.? (4 valores)

(c) Dois dias após a compra do robot à BiTech, S.A., Ana vendeu-o à sua vizinha Célia, por €1100, que
recebeu o bem, mas nunca chegou a pagar o preço. Supondo que a BiTech, S.A. reservou para si a
propriedade, que, 6 meses após a venda, resolveu validamente o negócio celebrado com Ana e que, na
sequência da resolução, lhe solicita a devolução do robot, de que modo pode Célia reagir quando Ana lhe
solicita a entrega do bem para devolvê-lo à BiTech, S.A.? (4 valores)

(d) A máquina tinha uma garantia de bom funcionamento de um ano. Ao cabo de oito meses, o motor
avariou. A BiTech, S.A. substituiu-o por um motor novo. Decorridos dois anos e três meses sobre a
compra, o motor do robot de cozinha avariou novamente. Que direitos assistem a Ana? (2 valores)

II
António contratou com Bento a construção de uma moradia, pelo valor de €150.000, num terreno que
pertencia a António. Acordaram que a construção teria de estar concluída no prazo de 12 meses e que o
preço seria pago da seguinte forma: €70.000 no prazo de 6 meses contados desde a celebração do
contrato e o valor remanescente aquando da aceitação da obra.

Responda de forma completa e fundamentada às seguintes questões:

(a) Após o decurso de 7 meses de execução dos trabalhos, Bento apercebeu-se de que não conseguiria
concluir a obra no prazo acordado, pelo que contratou Carlos para proceder à instalação elétrica e das
canalizações no imóvel. A obra foi concluída dentro do prazo acordado e aceite por António sem
qualquer reserva. Sucede que, 2 meses após a aceitação, António comunicou a Bento que existia uma
infiltração na cozinha devido à deficiente colocação da canalização. Bento declinou qualquer
responsabilidade com o argumento de que havia sido Carlos a instalar as canalizações. Quid iuris? (5
valores)

(b) Na fase de acabamento, um sismo destruíra por completo a construção. António exige de Bento
nova construção; Bento recusa-se a reconstruir por tal estar completamente fora do que orçamentou
para a empreitada contratada. Quid iuris? (3 valores)

Ponderação global: 1 valor


DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época Normal)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

Tópicos de Correção

(a) Trata-se de um contrato celebrado a distância, supondo que Ana é consumidora e que a celebração
foi feita exclusivamente por uma técnica de comunicação a distância. (cf. artigo 3.º, n.º 1, al. f) do
Decreto-Lei n.º 24/2014 de 14.02). Ana tem direito à de livre resolução, dentro do prazo de 14 dias
subsequentes à entrega (artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 24/2014 de 14.02). Seria valorizada a explicação
do fundamento e funcionamento deste direito.

(b) No pressuposto de que o equipamento já foi entregue, o vendedor não pode resolver (mediante
conversão da mora em incumprimento definitivo), porque não há reserva de propriedade nem cláusula
resolutiva (cf. artigo 886.º CC). A resolução seria todavia admissível se as partes tivessem
convencionado nesse sentido (cf. artigo 886.º CC).
Uma vez que estão em falta três prestações (artigo 934.º), o vendedor pode exigir a totalidade do preço
em falta: perda de benefício do prazo, discutindo-se se há vencimento antecipado ou exigibilidade
antecipada, sendo necessário, neste último caso, interpelação para que o comprador entre em mora
quanto à parte restante do preço.
Em alternativa, se se tratar de contrato de crédito ao consumo, aplicar-se-á o artigo 20.º do Decreto-Lei
n.º 133/2009 de 2.06. Todavia, de acordo com os dados da hipótese, e tendo em vista a exclusão
prevista no artigo 2.º/1, f) do referido diploma, este regime não seria aplicável.

(c) O problema colocado pela questão prende-se com o reconhecimento do direito de Célia recusar a
entrega do robot que Ana lhe solicita.
Afigura-se irrelevante a circunstância de Célia ainda não ter pago o preço, atenta a regra no artigo 886.º
CC. Mais pertinente é decidir se Ana transmitiu validamente a propriedade do bem a Célia, dado que a
BiTech, SA havia reservado para si a propriedade. Cumpria, neste contexto, discutir a eficácia da
cláusula de reserva de propriedade relativamente a terceiros. Seria valorizada a exposição detalhada do
debate doutrinário sobre este tema. O sentido da resposta à questão levantada pela hipótese estaria
assim dependente da posição assumida na querela sobre a eficácia da reserva de propriedade
relativamente a terceiros. Sendo ineficaz, então teria sido válida a venda do bem a Célia, esta ter-se-ia
tornado proprietária do mesmo, podendo por conseguinte recusar entregá-lo a Ana. Se a reserva de
propriedade fosse considerada eficaz relativamente a Célia, então caberia apreciar a validade da venda
celebrada entre esta e Ana. Seria, designadamente, ponderável aplicar o regime da venda de bens
alheios, diretamente ou por analogia, sendo por conseguinte a venda nula (artigo 892.º), com as
consequências previstas no artigo 289.º/1 CC. Todavia, caberia questionar se Ana poderia alegar a
nulidade do negócio contra Célia, atendendo às limitações previstas no artigo 892.º. Não estaria, porém,
a BiTech, S.A. impedida de pedir a Célia a restituição do bem, invocando a reserva de propriedade.
Outras soluções, desde que devidamente fundamentadas seriam ponderáveis.

(d) Tratando-se de uma venda a consumidor, era aplicável o DL n.º 67/2003, 08.04.
Poderia debater-se a diferença entre a garantia relativa a defeitos da coisa e a garantia de bom
funcionamento. Neste caso, porém, esta distinção conceptual não envolve consequências de regime
aplicável, atendendo ao disposto nos artigos 5.º/1 e 10.º do DL n.º 67/2003, 08.04.
A substituição do motor do robot oito meses depois da compra do mesmo era devida, nos termos dos
artigos 4.º/1 e 5.º/1 do DL n.º 67/2003, 08.04. O motor avariou novamente dois anos e 3 meses após a
DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época Normal)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

compra, mas apenas 19 meses após ter sido substituído. Posto isto, importa discutir se, relativamente à
peça substituída, a garantia de dois anos (artigo 5.º/1 do DL n.º 67/2003, 08.04) se (re)iniciou na data
da substituição. A dúvida quanto à resposta a esta questão reside na redação do artigo 5.º/6 do DL n.º
67/2003, 08.04, que prescreve o reinício da garantia nos casos em que se verifique a substituição do
bem. Cumpre, então, questionar: no caso em apreço (e em hipóteses similares), releva a substituição do
motor do robot ou a reparação do robot através da substituição do motor? Seguindo o primeiro
entendimento, deve entender-se que, à data da segunda avaria, a garantia do motor subsistia; optando
pelo segundo, deve concluir-se que, na data da segunda avaria, a garantia do robot já havia expirado.

II

(a) Primeiramente, é necessário qualificar o contrato celebrado entre António e Bento como um
contrato de empreitada, nos termos do art. 1027.º do CC, e o contrato entre Bento e Carlos como um
contrato de subempreitada, de acordo com o art. 1213.º do CC.
A obra deve ser executada sem quaisquer vícios que excluam ou reduzam o seu valor (art. 1208.º do
CC), sendo que, antes da aceitação, o dono deve verificar se a obra corresponde ao convencionado com
o empreiteiro, não tendo qualquer defeito (art. 1218.º do CC). Neste âmbito, seria necessário qualificar
o tipo de defeito como oculto, não sendo conhecido pelo dono da obra aquando da aceitação, nem
tendo este a possibilidade de conhecer usando a diligência normal. Desta forma, não se aplica a
irresponsabilidade do empreiteiro, nos termos do art. 1219.º do CC.
O prazo de denúncia dos defeitos é de 30 dias após o descobrimento (art. 1220.º do CC), nos termos
gerais, sendo que no caso aplicar-se-ia o prazo de um ano (art. 1225.º, n.º 2 do CC), presumindo-se que
a comunicação dos defeitos pelo António a Bento foi realizada no prazo legal. Contudo, tratando-se de
um defeito relacionado com a execução da subempreitada, deve aplicar-se o disposto no art. 1226.º.
Denunciado o defeito, o dono da obra tem direito à sua eliminação, por ser possível (art. 1221.º do
CC). Caso os defeitos não sejam eliminados, o António teria direito à redução do preço ou à resolução
do contrato, no caso de os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que o dono a pretende
destinar. A acrescer a estes direitos, o António pode ser indemnizado nos termos gerais (art. 1223.º do
CC).
Para o caso de imóvel destinado por sua natureza a longa duração, como no caso em apreço, o prazo
de garantia é de 5 anos, desde a entrega, sendo que os direitos devem ser exercidos no prazo de 1 ano
após a denúncia dos defeitos. Este contexto, seria importante referir a posição assumida pelo Prof.
Pedro de Albuquerque quanto ao designado “prazo de manifestação de defeitos”, e aos seus efeitos
práticos na contagem dos prazos.
O argumento do Bento é ineficaz, atendendo à eficácia interna das obrigações (artigo 406.º/2 CC). O
empreiteiro responde sempre perante o dono de obra pelos atos do subempreiteiro, designadamente
por via do artigo 800.º CC (v. também artigo 264.º/4 e 1213.º/2)
Concluir-se-ia que o Bento seria responsável perante o António quanto ao defeito denunciado, e o
Carlos poderia ter de assumir responsabilidade perante o Bento, nos termos do art. 1226.º do CC.
(direito de regresso de Bento contra Carlos).
Caso se considerasse que Bento era um profissional, tratar-se-ia de uma empreitada de consumo, sendo
aplicáveis os direitos e os prazos previstos nos artigos 4.º e ss. do DL 67/2003.

(b) No caso em apreço, a empreitada tinha como objeto um imóvel, cujo terreno pertencia a António,
dono da obra, razão pela qual aplica-se o art. 1212.º, n.º 2 do CC.
Atendendo a que o imóvel ficara totalmente destruído por caso fortuito, o sismo, e sendo António o
proprietário já do imóvel construído por se encontrarem incorporados os materiais fornecidos pelo
DIREITO DOS CONTRATOS I
3.º Ano - 2017/2018
Exame (Época Normal)
Duração: 120 minutos
Regência: Professor Doutor Pedro de Albuquerque

empreiteiro à medida que fora construindo a moradia, o risco corre por conta de António (artigo 1228.º
do CC).
Nesta medida, António terá de pagar o preço acordado a Bento, e caso queira nova construção, a
mesma constituirá nova empreitada, nos termos do art. 1207.º e seguintes do CC.
DIREITO DOS CONTRATOS I

Exame Escrito de Coincidências de Recurso
20 de fevereiro de 2020 - 90 minutos
Prof. Doutor Pedro de Albuquerque

TÓPICOS DE CORRECÇÃO

GRUPO I

1. Integração do caso no contrato de empreitada (art. 1207.º);


Natureza jurídica da fiscalização (art. 1209.º);
Distinção entre a fiscalização e a verificação (art. 1218.º);
Distinção entre a aceitação com reserva e sem reserva (art. 1219.º);
Conclusão que A. tinha direito à eliminação dos defeitos ou à construção de nova obra (arts. 1221.º
e 1222.º), atendendo o facto de não ter referido nada aquando da fiscalização não implica a perda
de direitos aquando da verificação e aceitação com reserva. Adicionalmente, tem A. direito a ser
indemnizada dos prejuízos causados (art. 1223.º).
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed.,
Almedina, 2013, pp. 272-280, 284-292, 394-399.

2.Ponderação da eventual aplicação do regime dos bens de consumo, previsto no DL n.º 67/2003,
que não prevê hierarquia nos direitos atribuídos ao consumidor;
Nos termos gerais, a resolução do contrato é possível se os defeitos tornarem a obra inadequada
ao fim a que se destina (art. 1222.º, n.º 1, parte final), o que poderia ser o caso em análise.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed.,
Almedina, 2013, pp. 433-437.

3. Identificação da situação como sendo uma alteração por exigência do dono da obra (art. 1216.º).
A alteração por exigência do dono da obra como derrogação do artigo 406.º. Limitações legais às
alterações que o dono da obra pretenda, discutindo neste caso se existia alteração da natureza da
obra ou o valor podia exceder a quinta parte do preço estipulado (art. 1216.º, n.º 1).
Indicação dos direitos do empreiteiro caso a alteração exigida pelo dono da obra fosse aceite por
aquele (art. 1216.º, n.ºs 2 e 3).
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed.,
Almedina, 2013, pp. 365-373.

4. Desistência do dono da obra e os seus efeitos jurídicos (art. 1229.º). A desistência do dono da
obra como derrogação do artigo 406.º.
Identificação do interesse contratual protegido pela norma, a favor do empreiteiro.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE/MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito das Obrigações, Volume II, 2.ª ed.,
Almedina, 2013, pp. 502-510.
DIREITO DOS CONTRATOS I

Exame Escrito de Coincidências de Recurso
20 de fevereiro de 2020 - 90 minutos
Prof. Doutor Pedro de Albuquerque

GRUPO II

1. Ponderação da modalidade de venda de bens defeituosos (arts. 913.º e ss.);


Identificação dos direitos da compradora, nomeadamente à reparação e/ou substituição da
bicicleta (art. 914.º ).
Discussão sobre a possível aplicação do art. 914.º, parte final, quando o vendedor desconhecia sem
culpa o vício ou a falta de qualidade de que a coisa padece, o que também afasta o direito à
indemnização prevista no art. 909.º, por remissão do art. 915.º.
Identificação do procedimento da compradora aquando da constatação do defeito (denúncia) – art.
916.º.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE, Direito das Obrigações, Volume I, Almedina, 2019, pp. 418 e ss.

2. Ponderação da situação quanto à modalidade de venda de bens alheios (art. 892.º);
Diferenciação da venda de bens futuros (art. 893.º);
Identificação dos direitos de H., nomeadamente à convalidação do contrato, que a não ser cumprida
pelo vendedor gera um direito de indemnização cumulável com as indemnizações previstas nos
arts. 898.º e 899.º, com a limitação prevista no art. 900.º, n.º 2.
Direito à restituição do preço, que afasta a convalidação do contrato (arts. 894.º e 896.º, n.º 1, al. b);
Caracterização da nulidade decorrente desta modalidade de venda como atípica, justificando-a.
Cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE, Direito das Obrigações, Volume I, Almedina, 2019, pp. 325 e ss.
3.º Ano Dia
Turma A

14 de fevereiro de 2020
Prof. Doutor Pedro de Albuquerque

Direito dos Contratos I


EXAME DE RECURSO
TÓPICOS DE CORREÇÃO

1)

Qualificação completa e fundada do contrato como contrato de empreitada (incluindo os seus elementos
caraterizadores essenciais e caraterísticas) e referência à empreitada de construção de coisa imóvel e respetivas
implicações;
Qualificação da empreitada como empreitada de consumo (por estar em causa uma relação de consumo, o
que ocorre sempre que o empreiteiro seja um profissional e o dono da obra um consumidor, visando a obra
para fins não profissionais – arts. 1.º A, n.º 1, e 1.º B a) do DL 67/2003, de 8 de Abril, com as alterações
entretanto sofridas (de ora em diante, DL 67/2003) e arts. 2.º, n.º 1 da Lei 24/96, de 31 de Julho, com as
alterações entretanto sofridas) e aplicação do regime específico da empreitada de bens de consumo instituído
pelo DL 67/2003. Referência ao disposto no artigo 1.º A, n.º 2, deste diploma legal que declara expressamente
a aplicação do diploma “com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada
ou outra prestação de serviços”, o que permite incluir a empreitada, seja ela de construção, reparação ou modificação.
Explicação fundada de que estando em causa uma empreitada de bens de consumo, o regime dos artigos
1218.º e ss do Código Civil (de ora em diante “CC”) é substituído pela aplicação, com as necessárias adaptações
do regime do DL 67/2003 pelo que não será igualmente de aplicar o disposto no artigo 1225.º CC que
estabelece uma garantia suplementar no caso de empreitadas destinadas a longa duração. Daqui resulta que o
empreiteiro tem o dever de realizar a obra e de a entregar em conformidade com o contrato (artigo 2.º, n.º 1
do DL 67/2003) o que se presumirá não se verificar sempre que ocorra algum dos factos negativos referidos
no artigo 2.º, n.º 2 do DL 67/2003 – o aluno deverá explicar e fundamentar qual deste facto/os
ocorreu/ocorreram e articular esta desconformidade com o disposto no artigo 3.º, n.º 2 do mesmo diploma
legal que presume que a falta de conformidade que se verifique no prazo de 5 anos após a entrega, para os
imóveis, já existia nessa data.
Para além disso é relevante referir que o regime da empreitada de bens de consumo não impõe ao dono da
obra o dever de verificar, apenas irresponsabilizando o empreiteiro se o defeito for aparente, isto é, se o dono
da obra conhecia a falta de conformidade ou não podia razoavelmente ignorá-la ou se esta resultar dos materiais
por este fornecidos (artigo 2.º, n.º 3 do DL 67/2003). Ora, no caso sub judice era precisamente isso que sucedia
com a parte do pedido de substituição de todo o mobiliário de cozinha feito por Amélia (esta alega que o
mobiliário era de cor branca e havia sido convencionado, no contrato, que deveria ser de cor castanha) pois
trata-se de defeito aparente. Já o mesmo não sucede relativamente à pretensão de Amélia relativamente à
reparação do telhado já que se trata de defeito oculto.
Quanto à reparação do telhado, estando assente que se trata de uma falta de conformidade (nos termos do
disposto no artigo 2.º, n.º 2 do DL n.º 67/2003), caberia debater quais são os remédios ao dispor do consumidor
- dono da obra, bem como a existência ou inexistência de hierarquia entre eles (artigo 4.º, n.º 1 do DL n.º
67/2003). Mesmo sufragando a inexistência de hierarquia, de referir que sempre seria ser oponível a cláusula
geral prevista no artigo 4.º, n.º 5 Decreto-Lei n.º 67/2003.
No respeitante aos prazos, de referir ainda que a denúncia se pressupõe ter sido feita dentro do prazo, uma
vez que no enunciado da hipótese do exame se refere que Amélia notificou de imediato a empreiteira depois
de a desconformidade se manifestar (e nos termos do disposto no artigo 5.º-A, número 2 do Decreto-Lei n.º
67/2003), a dona da obra dispõe de um prazo de um ano para denunciar o defeito ao empreiteiro. Cumpriria
igualmente notar que a falta de conformidade se manifestou dentro do prazo (de garantia) de cinco anos
previsto no artigo 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 67/2003, conforme acima referenciado. Posto isto, A. poderia
propor ação em tribunal pedindo o reconhecimento do seu direito (reparação ou resolução do contrato) no
prazo de 3 anos após a denúncia (nos termos do disposto no artigo 5.º-A, n.º 3 do DL n.º 67/2003).
Por último, seria necessário referir também que o prazo de 8 dias para a reparação do telhado que fora
conferido por A. ao empreiteiro não seria, muito provavelmente, um prazo razoável, nem atendível pelo
empreiteiro para efetuar e concluir a reparação em apreço, já que, de acordo com o disposto no artigo 4.º, n.º
2 do DL 67/2003, o legislador dispõe que “tratando-se de um bem imóvel, a reparação ou a substituição devem ser realizadas
dentro de um prazo razoável, tendo em conta a natureza do defeito” (…), “sem grave inconveniente para o consumidor”. Ora,
apesar de este preceito legal não fixar um prazo concreto para o caso da reparação dos imóveis, considerando,
por um lado (i) a natureza da desconformidade em apreço – reparação do telhado, e, por outro lado (ii) o facto
de o prazo para a reparação de um móvel, ser fixado no máximo de 30 dias, pelo que deveria ser aventada pelos
alunos a desrazoabilidade do prazo de 8 dias fixado por Amélia.

2)

- Qualificação completa e fundada do contrato como contrato de compra e venda que tem por objeto um
bem imóvel – um determinado terreno com 10.000 metros quadrados.
- Análise do problema da compra e venda de coisas sujeitas a contagem, pesagem e medição, isto é venda
de coisas determinadas, ainda que sujeitas a uma posterior operação de contagem, pesagem ou medição (cf.
arts. 887.º e ss do CC).
- No caso concreto coloca-se o problema da existência de uma discrepância entre a referência contratual e
o resultado da operação de medição do terreno. Uma vez que o terreno se trata de uma coisa determinada, a
venda considera-se concluída antes da operação de medição, logo com a celebração do contrato, adquirindo
assim Amélia imediatamente a propriedade do terreno vendido (artigo 408.º, n.º 1), suportando assim
consequentemente o risco pela sua perda ou deterioração (artigo 796.º, n.º 1), pelo que a discrepância apenas
pode ter reflexos para efeitos do apuramento do preço devido.
- Havia que distinguir a venda ad mensuram ou por medida da venda ad corpus ou a corpo. No caso concreto
o preço havia sido fixado para o terreno como um todo, pelo que parece resultar estarmos perante um caso de
venda ad corpus ou a corpo, já que se tratará de um caso em que as partes não terem indicado um preço unitário,
mas antes um preço global, pelo que deveria ser aplicado o regime previsto no art. 888.º do CC que determina
que a correção da discrepância entre a “quantidade das coisas vendidas” e a que é declarada no contrato seja
apenas corrigida se a discrepância for superior a 5% na venda a corpo ou ad corpus. No caso concreto o preço
deveria, pois, sofrer redução proporcional uma vez que tinha, de facto, menos 1000 metros quadrados.

3)

- Qualificação completa e fundada do contrato de como compra e venda como compra e venda fracionada ou
a prestações com reserva de propriedade (artigo 934.º do CC).
- Análise completa e fundada dos requisitos de aplicação do disposto no artigo 934.º do CC, quanto à primeira
parte (resolução) e quanto à segunda parte (exigibilidade antecipada das prestações vincendas) para aferir dos
direitos de A. em relação a C. (dar nota que apesar de a questão não se colocar no caso concreto, para o Senhor
Professor Pedro de Albuquerque, Professor Regente, entende que quanto à primeira parte do artigo 934.º, a
reserva de propriedade não é um verdadeiro e próprio requisito).
- Explicação completa e fundada do sentido, função e natureza da cláusula de reserva de propriedade.
Implicações daqui resultantes para o caso em apreço. Em princípio, não se trata de uma exceção ao princípio
da transmissão da propriedade por efeito do contrato, e, concomitantemente, ao Sistema do Título, mas apenas
de uma dilação dessa transmissão para um momento posterior.
- A. não poderia resolver o contrato, nem exigir as prestações ainda não vencidas, já que funcionava a tutela do
artigo 934.º do CC (1.ª e 2.ª parte deste preceito legal, respetivamente) mas poderia exigir o cumprimento
coercivo das prestações em falta ou a sua execução específica.
- Pode alienar-se a posição jurídica do comprador com reserva de propriedade (que era relevante qualificar),
que tem conteúdo patrimonial e não está abrangida por qualquer proibição de disposição pelo seu titular. Pode
também tratar-se o bem como bem relativamente futuro (artigo 893.º do CC). Fora desses casos, parece que há
venda de bens alheios (artigo 892.º CC). Assim, in casu, depois da venda a C., A. não mantém a plenitude dos
poderes de um normal proprietário, designadamente os poderes de alienação. A reserva de propriedade cumpre
uma função de garantia, pelo que se deve entender que Amélia não tem legitimidade para alienar a coisa a E..
Consequentemente, tal hipótese deverá ser equiparada à venda de coisa alheia como própria, sancionando-se
tal venda com a nulidade. Explicar fundadamente que tipo de nulidade estava em causa.
- Já no que respeita à alienação do carro por C., adquirente sob reserva, a D., haveria que distinguir e colocar
duas hipóteses (uma vez que o texto do enunciado do exame é omisso quanto a este ponto) e retirar daí as
devidas ilações, devidamente fundamentadas: (i) estando em causa uma de venda de bem alheio como bem
alheio, isso significará conforme acima referido, que esta venda será válida, sendo-lhe aplicável o disposto no
art. 880.º do CC, ex vi artigo 893.º do CC, tratando-se o bem como relativamente futuro; (ii) caso se trate da
venda de bem alheio como bem próprio, o contrato será nulo já que se tratará de uma compra e venda de um
bem alheio (artigo 892.º do Código Civil).
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

18 de fevereiro 2022 90 minutos

TÓPICOS

a)
- O negócio celebrado entre A. e D. é uma permuta. É elemento essencial da compra e venda
a existência de um preço (artigo 874.º do CC) e, interpretando as declarações negociais de A.
e T., não parece ter existido um preço ou, que o objeto do negócio não foi a transmissão do
direito de propriedade sobre uma coisa por um preço.
- Nos termos do disposto do artigo 939.º do CC, o negócio entre A. e D. segue o regime da
compra e venda, na medida em que seja conforme com a sua natureza e não esteja em
contradição com a permuta.
- Adicionalmente estamos, apesar de A. ser um consumidor e T. um profissional, não parece
que à permuta seja aplicável o disposto no DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, tendo em
consideração o disposto no artigo 3.º. Contudo, perante a ausência de regime para estes casos,
poderá suscitar-se a questão da sua aplicação, por analogia.

b)
- Análise e recondução da hipótese a uma permuta de coisa defeituosa sujeita, por
remissão, do artigo 939.º do CC, aos artigos 913.º e ss. Com efeito, ainda que se pudesse
considerar abstratamente aplicável, por analogia, o DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, estava
em causa o exercício de direitos do profissional perante o consumidor e não o inverso. Logo,
in casu, este regime não seria de aplicar.
- Estando no âmbito de responsabilidade obrigacional, vale a presunção de culpa prevista
no artigo 799.º do CC. Logo, se A. não tiver culpa, o que parece difícil de ocorrer, caberia a este
lidir tal presunção.
- Quanto à caducidade dos direitos de D., A. não tem razão. A denúncia do defeito, nos
termos do artigo 916.º do CC, conta-se da data da entrega e não da data da celebração do
contrato. Só então, o credor da prestação com defeitos está em condições, de querendo,
certificar-se do cumprimento integral, ou não, da prestação.

c)
- D., perante o cumprimento defeituoso de A., pretende manter o negócio reduzindo o
mesmo. O que, à luz do disposto no artigo 911.º do CC, com as devidas adaptações, por
remissão do 913.º do CC, por sua vez, por remissão do 939.º do CC, parece defensável.
- Pretendendo tal direito, há que analisar em que medida a caducidade prevista no artigo
917.º CC se aplica, ou não, aos demais remédios que a lei atribui ao adquirente de coisa
defeituosa. Designadamente, revelando conhecimento da posição da regência. Com efeito,
este artigo apenas fala da anulação por simples erro, o que parece induzir que os restantes
remédios estão sujeitos ao regime geral da repercussão do tempo nas relações jurídicas.
DIREITO DOS CONTRATOS I – TA

18 de fevereiro 2022 90 minutos

II
- Qualificação do contrato celebrado entre B. e C., analisando o conceito de obra, os seus
pressupostos e a problemática se a obra intelectual pode ser objeto de empreitada (1207.º do
CC). De todo o modo, ainda que se conclua pela existência de uma prestação de serviços
atípicos, há que ponderar, a aplicação, ao invés das regras do mandato (1156.º), da regra da
empreitada.
- Fornecendo o empreiteiro materiais alheios, mas (com reserva de propriedade), haveria
de discutir a possibilidade de estarmos perante uma empreitada onerada e o regime da
mesma.
- Uma vez concluída a obra, de acordo com o plano convencionado (1208.º do CC), as
pretensões de C. não têm fundamento. Não estamos perante uma alteração por iniciativa do
dono da obra, mas perante alteração após a entrega da coisa, sujeita ao regime do artigo
1217.º do CC.
- A recusa de C. em pagar o preço, não tem fundamento. Analise e discussão de um eventual
dever de C. aceitar a obra e efeitos de tal recusa. Designadamente em termos de risco e de
mora.
- Análise dos direitos do credor do preço (B.). B. poderia intentar ação de cumprimento,
acrescida de juros de mora (1207.º do CC, 817.º e 806.º). Eventualmente, tendo B. readquirido
o controlo material do quadro, haveria que analisar a possibilidade, discutida na doutrina, de
existir direito de retenção (754.º do CC).
- A execução da obra contratada, no prazo contratado, pressuponha, pelo seu objeto a
colaboração do credor (C.). Não tendo este colaborado por estar a viajar, o atrasado da obra
do prazo acordado não resultada de uma atuação culposa da B.
EXAME DE DIREITO DOS CONTRATOS I

22 de janeiro de 2021
I
[…]

a) É permitida a estipulação no contrato de alienação do automóvel?


⟼ Tópicos:
- Qualificação do contrato celebrado como uma compra e venda (874.º);
- A compra e venda, enquanto contrato de alienação, pode ser objeto de uma cláusula de
reserva da propriedade (409.º/1). Contudo, por incidir sobre coisa sujeita a registo, a sua
oponibilidade depende do registo (409.º/2). Caso contrário, apenas tem eficácia inter partes;
- Questão controversa, atenta a letra do art. 409.º (“o alienante reservar para si”), é saber se é
admitida a reserva da propriedade a favor do financiador não alienante. Mas, no caso em análise,
a questão não se coloca: a propriedade foi reservada a favor do alienante.
- O problema da hipótese é distinto: saber se a propriedade pode ficar reservada a favor do
alienante até que o adquirente cumpra uma obrigação para com terceiro. No caso, C. Atenta a parte
final do art. 409.º (“até à verificação de qualquer outro evento”), a resposta é afirmativa. No
entanto devem ser debatidos os termos da controvérsia existente a este respeito na Doutrina com
menção dos argumentos invocados em sentido favorável e em sentido desfavorável,
nomeadamente a posição do Professor Gravato Morais.

b) Quais os direitos de D. perante B.?


⟼ Tópicos:
- Qualificação do contrato celebrado como uma compra e venda de coisa futura (880.º e 211.º).
sem natureza aleatória. Com efeito, tal não foi estipulado expressamente, nem resulta de
interpretação do contrato (para quem admita que possa resultar de mera interpretação do
contrato);
- Análise do momento da produção do efeito real na compra e venda de coisa futura (408.º);
- Análise da obrigação do vendedor na compra e venda de coisa futura (880.º). Concretização
da mesma face ao objeto (futuro) contratado. Uma obrigação cuja violação se presume culposa
(799.º).
- Análise das consequências da violação da obrigação do vendedor exercer as diligências
necessárias para o comprador adquirir os bens vendidos (880.º/1): quer ao nível do preço
recebido, quer ao nível da responsabilidade por tal violação (801.º e 798.º, respetivamente), e
nomeadamente da questão de saber se essa responsabilidade é pelo interesse contratual negativo
ou pelo interesse contratual positivo.
EXAME DE DIREITO DOS CONTRATOS I

II
[…]

c) F. deteta erros dos projetistas.


Deve comunicar esses erros a E.?
E se o fizer e, mesmo assim, E. insistir na realização da obra tal qual consta dos projetos,
declarando assumir a responsabilidade se algo correr mal, pode E. […]?

⟼ Tópicos
- Qualificação do contrato celebrado como uma empreitada (1207.º)
- Análise do dever de F., enquanto empreiteiro, de comunicar os erros que tenha conhecimento
que possam prejudicar a aptidão da obra. Ainda que esses erros sejam provenientes de terceiro,
e, naturalmente, sem prejuízo da eventual responsabilidade do terceiro. Um dever integrado no
dever de cumprir pontualmente a obrigação e de executar uma obra isenta de vícios e que
corresponda ao interesse do dono da obra (1208.º e 762.º). Caso contrário, será F. responsável
por cumprimento defeituoso, eventualmente em concurso com o projetista.
- Análise do eventual direito de E., informado dos erros, de receber/exigir uma prestação
desconforme. Apesar de o ponto de partida ser o que o empreiteiro já não pode recusar-se a
cumprir o projeto, há que ter em consideração que, por um lado, as declarações de E. apenas
operam ao nível da responsabilidade contratual entre F. e E., e, por outro, que a execução da obra
em causa, a concretizar-se, poderia ruir. Neste caso, há que ponderar a possibilidade de F. impor
alterações à obra que, a não serem aceites por E., apenas poderiam fundamentar a desistência da
obra (1229.º). Não o cumprimento.

d) […]
Quid iuris?

⟼ Tópicos
- Análise, atento o disposto nos arts. 1208.º e 762.º, segundo uma boa-fé subjetiva ética, se F.
não deveria ter conhecido dos erros dos projetistas e, assim sucedendo, da eventual
responsabilidade por cumprimento defeituoso.
- Contudo, E., sabendo dos erros dos projetivas, deveria ter informado F. dos mesmos. Menção
à posição de VAZ SERRA e PEDRO ROMANO MARTINEZ no sentido de que haveria venire contra factum
proprium. Posição diversa de MENEZES LEITÃO atento o disposto no artigo 1209.º/2. Menção há
possibilidade de haver abuso de direito de E, mesmo perante o disposto no artigo 1209.º/2. Com
efeito, por força da boa-fé, tinha o encargo de prestar-lhe a colaboração necessária à boa execução
do projeto (762.º). Não o tendo feito, e, em resultado da sua omissão, ruido a obra sido realizada
segundo o projeto, continua obrigado a pagar o preço acordado. Quanto à responsabilização de F.,
apesar a presunção da culpa de F. pela derrocada, importa analisar se a omissão, culposa, de
colaboração de E. pode conduzir à atenuação, ou mesmo exclusão, da responsabilidade de F.

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