Temática - Sonho e Realidade

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TEMÁTICA – SONHO E REALIDADE

“Não sei se é sonho se realidade”


O sujeito poético começa por afirmar a sua incapacidade para distinguir o sonho da realidade (v. 1-2).

Essa incapacidade torna o desejo de felicidade (v.6) tão forte (v.5), que Não sei se é sonho, se realidade,
esta se presentifica, como se de uma realidade tangível se tratasse (v- Se uma mistura de sonho e vida,
3-4). Aquela terra de suavidade
Que na ilha extrema do Sul se olvida.
Neste contexto, a “ilha extrema do Sul” simboliza precisamente a 5 É a que ansiamos. Ali, ali
felicidade ansiada, porém inacessível. A vida é jovem e o amor sorri

Na primeira palavra da segunda estrofe anuncia o tom geral desta Talvez palmares inexistentes,
Áleas longínquas sem poder ser,
parte do texto (de dúvida), bem como a impossibilidade de
Sombra ou sossego deem aos crentes
concretização do sonho (“Inexistentes”, “longínquas) presentes na 10 De que essa terra se pode ter
terceira estrofe (v.17-18). Felizes, nós? Ali, talvez, talvez,
Naquela terra, daquela vez,
Os paraísos imaginados (v.7-9) são uma forma de evasão reconfortante
dos crédulos (v.9-10) mas apenas desencadeiam no sujeito poético Mas já sonhada se desvirtua,
duvidas e ceticismo (v.11-12) e descrença a possibilidade de se ser feliz Só de pensá-la cansou pensar;
(v.15) e a consciência da realidade (v.17-18), quando pensadas (v.13), 15 Sob os palmares, à luz da lua,
Sente-se o frio de haver luar
perdem o seu efeito balsâmico (v.13), pois causa dor (v.14) a
Ah, nesta terra também, também
consciência do seu carácter ilusório (v.16). O mal não cessa, não dura o bem.
Concluindo, o sonho é ilusão e a felicidade aí procurada (v.19-20) traz Não é com ilhas do fim do mundo,
ilusões e desilusões (v.19-22). Ela está perto, mas só pode ser 20 Nem com palmares de sonho ou não,
alcançada no íntimo de cada um de nós (v.23-24). Que cura a alma seu mal profundo,
Que o bem nos entra no coração.
A nível vocabular, o sentido do poema progride da dúvida, logo É em nós que é tudo. É ali, ali,
presente no verso 1, para a certeza. A transição do “sonho” para a Que a vida é jovem e o amor sorri.
realidade é feita na terceira estrofe através da conjunção adversativa
“mas”. O adverbio “ali” acompanha esta progressão, pois, na primeira
estrofe, refere a “ilha extrema do Sul” e, na última, remete para o
interior de cada um de nós, pois é em nós, e apenas em nós, que podemos encontrar a felicidade (v.23). Esta
conclusão é marcada, igualmente, pela utilização de atos ilocutórios assertivos, destacando a certeza do sujeito
poético relativamente àquilo que afirma.

O título do poema remete já para o tema – o refúgio no sonho – e para a oposição em torno da qual se desenvolve o
texto: sonho vs realidade.

Começa o poeta por reforçar o seu sentimento nas duas primeiras linhas, expressando nas duas o mesmo: a dúvida
quanto à possibilidade de atingir a felicidade terrena. A ilha sonhada por Pessoa será aquela ilha dos sonhos, já
descrita por Camões - a Ilha dos Amores, onde reside escondido o Paraíso terrestre. A vida jovem e o amor são o que
Pessoa considera os melhores objetivos:
- a juventude eterna (imortalidade ou negação da morte);
- o amor (negação da solidão humana).

A dúvida subsiste, no entanto Pessoa sabe-a de um só desejo íntimo. Essas paisagens distantes são provavelmente
só “palmares inexistentes, / Áleas longínquas sem poder ser”, ou seja, campos de palmeiras, ilusões, avenidas
grandiosas, mas enganadoras.

A felicidade é ainda um talvez. Mas um talvez soturno, porque se adivinha que seja um talvez que degenere em
impossibilidade.
Isto porque o sonho degenera quando se sonha. A terra da felicidade é apenas terra da felicidade enquanto
imaginada, e “já sonhada se desvirtua”, ou seja, mesmo o sonho perde a sua essência quando passa a ser sonhado –
torna-se quase real, e a realidade mata os sonhos mais altos. A terra imaginada, ao luar, sofre afinal dos mesmos
males da realidade vivida no presente (v.16 e 18).

Pessoa finalmente aceita que o talvez é um não. E é com um não que concluí o seu pensamento (v.19-22).
Espantosamente aqui parece que Pessoa assume a futilidade de sonhar, de idealizar a vida, o mesmo é dizer que
Pessoa aceita a futilidade de não aceitar a vida como ela é.

A negatividade do início do poema escorre lentamente e definha, dilui-se. Mas não parece diluir-se para um
otimismo inverso, porque a conclusão é uma conclusão de inevitabilidade. Poderíamos pensar que Pessoa tomasse
consciência da futilidade dos seus sonhos e da necessidade de encarar a frio a vida presente, mas o que parece ter
acontecido é que Pessoa chega à conclusão de que os sonhos de nada valem, que tudo se realiza nesta vida, mas que
mesmo assim ele não vai encontrar força para se sentir vivo, para reagir a essa adversidade.

Isto porque é uma grande adversidade para Pessoa o facto de a sua vida não poder concretizar-se como ele a
imagina em sonhos. O que para outros poetas poderia ser um momento de epifania, para Pessoa é um momento de
triste realização da sua impotência, ele não consegue viver normalmente, não consegue ter a vida jovem onde o
amor sorri, porque deseja sempre o sonho irreal, mesmo que por apenas um segundo.

“Tudo que faço ou medito”

1º estrofe Tudo que faço ou medito


Fica sempre na metade.
A poesia ortónimo Pessoa segue algumas regras. Querendo, quero o infinito.
Fazendo, nada é verdade.
A saber: estados negativos e depressivos, presença de uma
constante autoanálise e reflexão fria e racional perante o 5 Que nojo de mim me fica
Ao olhar para o que faço!
presente e o passado, uso abundante de símbolos e paradoxos Minha alma é lúcida e rica,
que passam uma ideia de desespero e de futilidade de viver e E eu sou um mar de sargaço —
agir.
Um mar onde boiam lentos
Na primeiro quadra, Pessoa fala sobre os seus sonhos e desejos. 10 Fragmentos de um mar de além...
Dono de uma imaginação delirante e febril, Pessoa tinha sempre Vontades ou pensamentos?
mil projetos a correr simultaneamente. Mas ele diz-nos que Não o sei e sei-o bem.
“Tudo o que faço ou medito / Fica sempre na metade” – ou seja,
dos seus projetos nada se realiza por inteiro, por a realidade nunca se encontrar com os seus desejos.

Os seus projetos não se realizam, confirma-se o que dissemos antes – v.3 e 4.

2º estrofe

A segunda quadra é a mais emocional. Perante o desespero de não conseguir nunca realizar os seus projetos, fica-lhe
um sentimento de vazio e de inutilidade. Veja-se como, usando uma linguagem simples, mas expressiva, Pessoa
passa o que lhe vai na alma. Ele sente a sua grande imaginação, a quantidade infinita de ideias e de pensamentos
que nele abundam, mas ele próprio, a sua vida real, é um mar de sargaço, ou seja, um mar de algas espessas, que
prendem o movimento, que impedem que ele caminhe e avance. É uma metáfora de grande beleza que dá a
entender ao leitor o estado de desespero do poeta.

3º estrofe

É o mar onde boiam pedaços de um mar de além. Que mar é esse? Trata-se porventura de um mar distante e
diáfano, um mar irreal, mas livre e desimpedido, onde os sonhos de Pessoa não o prenderiam, mas antes o fariam
seguir em frente, onde tudo o que ele imagina podia ser real. É muito Fernando Pessoa este final, paradoxal e
intrigante. O que nos diz é que mesmo esse mar de além, esse futuro irreal, pode ser uma ilusão, só a sua vontade
de querer ter os seus sonhos. Ele diz saber a resposta ao mesmo tempo que a desconhece, isto porque confia no
destino. Sabe que será impossível que se realizem todos os seus projetos, mas ao mesmo tempo essa
impossibilidade é humana, é dentro dele, e fora dele ele não sabe o que poderá acontecer – um milagre, um
imprevisto. Pessoa deixa ao futuro a resposta para a sua angústia presente.

Nada sou, nada posso, nada sigo

Na 1º estrofe deste poema, (v.1) mostra o descontentamento do eu Nada sou, nada posso, nada sigo.
lírico sobre a vida dele, sobre a sua personalidade, pois no próximo Trago, por ilusão, meu ser comigo.
verso já fala: (“Trago, por ilusão, meu ser comigo”), então justifica Não compreendo compreender, nem sei
que ele leva a vida dele por ilusão, e sozinho sem ninguém. Se hei de ser, sendo nada, o que serei.
No começo da 2ºestrofe ele já fala sobre o não acreditar em coisas
além do céu, pois fala: “Fora disto, o que é nada, sob o azul”. Fora disto, que é nada, sob o azul
Do lato céu um vento vão do sul
Por fim, na 3º estrofe ele finaliza o poema com um trecho: “Incerto Acorda-me e estremece no verdor.
coração”, mostra então que ele não tinha um coração certo, e sim, Ter razão, ter vitória, ter amor.
um coração indeciso, sem decisão própria.
Murcharam na haste morta da ilusão.
Sonhar é nada e não saber é vão.
Dorme na sombra, incerto coração.

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