Nicodemos Araújo - Capitão Diogo Lopes (1978)

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NICODEMOS ARAUJO

Capitão
Diogo Lopes
(NOTAS BIOGRÁFICAS)

ACARAÚ – CEARÁ
1978
TRABALHOS DO AUTOR

HARMONIA INTERIOR – Versos –1935


SANTA CRUZ DO ACARAÚ – Esboço Histórico – 1936
MUNICÍPIO DE ACARAÚ – Monografia – 1940
VOZES DA ALMA – Versos – 1940
MINHA PRECE – Poema – 1947
PELA GLORIA DO ALTAR – Hinário – 1953
O ANJO PROTETOR – Teatro – 1954
FALAS DO CORAÇÃO – Versos –1955
FOLHAS DO OUTONO – Versos – 1970
MUNICÍPIO DE ACARAÚ – Notas Para Sua História – 1971
CAPITÃO DIOGO LOPES – Dados Biográficos – 1978

A SAIR:

DESCENDÊNCIA DE MEUS AVÓS – Trabalho genealógico


À memória de meus pais, João Lopes
de Araújo e Francisca Silveira Lopes,

o testemunho do meu amor e


da minha saudade.
À numerosa e tradicional família
LOPES ARAÚJO, que, há dois e meio
séculos, veio de Portugal, através do
Capitão-mor José de Araújo Costa,

dedico este modesto trabalho.


"Ser grande homem é multiplicar-se para benefício dos
semelhantes atuais e futuros. O gênio nada tira para si; as
moléculas de sua inteligência são distribuídas, durante séculos,
pela humanidade, em radiatividade permanente."

A. Austregésilo
"Todos os que têm vontade e atividade, encontram
ocasião de fazer o bem. E o sacrifício em favor do próximo
é sempre sagrado."
Samuel Smiles

"Aplicai-vos a fazer o bem diante de todos os


homens."

Romanos, 12-17
FALANDO AO LEITOR

Preliminarmente, devemos esclarecer que, quase todas as


notas contidas neste modesto opúsculo, foram colhidas neste
manancial inesgotável que se chama Tradição, "fogo sagrado que
a alma do povo deve conservar sempre vivo", como disse Coelho
Neto, adiantando que "todos os que viajam nos caminhos da vida,
trazem da peregrinação uma lembrança ou deixam ficar uma
recordação".
Efetivamente, foi baseado no que nossos pais ouviram de
nossos avós e nos transmitiram, que nos propusemos a escrever
estes sucintos apontamentos. E o fazemos para a numerosa e
tradicional família LOPES ARAÚJO, que tem no Capitão Diogo
Lopes de Araújo Costa o seu patriarca e o seu ancestral maior.
Afora o que nos proporcionou a palavra falada, e as
consultas que fizemos em alguns arquivos, apenas conseguimos ler
poucos e escassos documentos de família, e ligeiras referências que
alguns historiadores escreveram sobre o homem que constituiu,
durante mais de meio século, o personagem máximo de sua
Comunidade, pela sua marcante atuação em setores diversos da
vida coletiva.
Todavia, apesar da escassez do material de que nos foi
possível dispor, ousamos mandar aos "quatro ventos da
publicidade" estes deficientes dados biográficos desse conterrâneo,

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cuja existência foi uma grande lição de amor ao trabalho e de amor
no próximo, e que, por isto mesmo, representa um valioso legado
para a Posteridade.
O Capitão Diogo Lopes, não obstante as infrações que
cometeu contra a sacrossanta lei do matrimónio, pertenceu e
pertence ainda no número dos vultos eminentes de que nos fala o
poeta João Damasceno Vasconcelos, na biografia que escreveu e
em que magistralmente retratou nosso patrício Mário Domingues
Lousada, afirmando que "são eles, na verdade, os fatores decisivos,
os personagens centrais desse drama real e existencialista, vivido
por todas as gerações humanas, numa sucessão ininterrupta de
protagonistas, sob os quais se desenvolve, no cenário anguloso do
palco da vida, com a marca da liderança pessoal, o tecido dos
acontecimentos, de que é feita a História".
Significa, portanto, um precípuo dever de justiça tornar
mais conhecido o trabalho admirável e a obra grandiosa e utilíssima
desse homem que, mercê de sua inteligência privilegiada e de sua
força de vontade, soube projetar-se no cenário de seu mundo
contemporâneo. E que conseguiu, por causa disto, impor-se no
respeito e à gratidão de seus conterrâneos, deixando aos pósteros
um nome que vale uma glória para sua família e até para sua terra.
Tentando, portanto, com estes humildes apontamentos, tirar
esse acarauense ilustre da obscuridade a que injustamente tem sido
relegado, queremos e devemos render nossas homenagens ao seu
excepcional talento, e a nossa admiração, pelos inumeráveis
benefícios que prestou à coletividade, durante a decorrência de sua
vida, toda ela consagrada ao estudo e ao trabalho, pelo bem
comum.

NICODEMOS ARAÚJO

Acaraú, 1976

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1

O Homem

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INTELIGÊNCIA QUE DESPONTA

Diogo Lopes de Araújo Costa nasceu a 8 de março de 1761,


na fazenda Lagoa Grande, filho do Capitão-mor José de Araújo
Costa e de dona Brites de Vasconcelos, uma das Sete Irmãs.
Seu batismo ocorreu a 22 do mesmo mês e ano, na capela
de Santa Cruz, hoje cidade de Bela Cruz, sendo oficiante o Padre
Jerônimo da Cunha Lima.
Eis o termo de seu batismo, respeitada a respectiva
ortografia:

"Aos 22 dias do mez de Março do anno de 1761, de


licença minha, o Padre Jerônimo da Cunha Lima, na
Capella de Santa Cruz, desta Freguesia, baptisou e poz
os Santos Olhos a DIOGO, nascido aos oito do mesmo,
filho de José de Araujo Costa, natural da cidade de
Porto e de sua mulher Dona Brites de Vasconcellos,
natural da Vila de Goiana; avós paternos, Pedro de
Araujo, natural de Portugal e Maria de Sá, tambem da
mesma naturalidade; avós maternos, Manoel Vaz
Carrasco, natural de Iguarassú e Dona Maria
Madalena, natural de Iguarassú. Forão Padrinos,
Antonio Alvares Linhares, casado, e Dona Roza de
Mello, mulher do Sargento-mor José de Xerez,
fregueses deste Curato e moradores em Santa Cruz, do
que fiz este assento em que me assigno.

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Manoel da Fonseca Jaime
Cura do Acaraú"
(Livro 2, folha 23, verso)

Muito cedo Diogo Lopes manifestou sua extraordinária


inteligência. Mas seu pai, apesar de sua elevada posição social e
política, deixou de possibilitar ao filho os meios com que e em que
pudesse ser bem aproveitado e cultivado, através de uma formatura
em curso superior, o seu maravilhoso talento. Limitou-se a mandá-
lo estudar dois anos em Fortaleza, o que fez quando Diogo já
contava 17 anos.
Entretanto, o futuro médico de Lagoa do Mato, desde
menino, começou a estudar, dentro, embora, das precárias
condições do ambiente. Com seus irmãos, freqüentou as aulas de
um dedicado mestre-escola que o Capitão José de Araújo Costa
contratou, por alguns anos, e em que muito aproveitou, graças à sua
espantosa inteligência e faculdade de assimilação.
Possuído, assim, de um imenso desejo de aprender, lia tudo
o que lhe caía nas mãos, com inusitada avidez. Desta maneira,
Diogo Lopes podia dizer como Rui Barbosa: "Eu sentia em mim
uma paixão entusiástica pelo estudo, sentia um atrativo irresistível
pela ciência, tinha a vontade heróica do trabalho."

VIA ATRAVÉS DE VARIAS CORES

Disse um escritor patrício que "o sistema visual do homem


é o mais complexo de todas as espécies vivas".
E o saudoso genealogista Mário Linhares, escrevendo sobre
a excepcional individualidade do Capitão Diogo Lopes, informa:
"Dizem as tradições que ele via através das cores branca,
encarnada, preta e azul."

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Efetivamente, ao que pudemos ler, em manuscritos antigos,
Diogo Lopes possuía a chamada percepção extra-sensorial, e tinha
nos olhos uma espécie de força radiográfica ou raio-X. Era dono de
uma estupenda acuidade visual que lhe possibilitava enxergar
claramente através das cores aludidas pelo escritor Mário Linhares.
Aliás, convém salientar que tal fato desgostava multo o
médico de Lagoa do Mato, o qual, segundo ainda fomos
informados, apesar da vida que levava, sempre possuiu apurado
senso de moral. Tanto assim que Diogo Lopes não recebia em seu
consultório nenhuma mulher vestida com essas cores.

ESGRIMISTA

O Capitão Diogo Lopes, em conseqüência, provavelmente,


dos romances de cavalaria que lia, e de que muito gostava, era um
apaixonado admirador da arte da esgrima. Assim, quando esteve
em Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, aproveitou a ocasião
também para aprender a esgrima. E o fazia magistralmente.

E, posteriormente, mandou ensinar o jogo de espada a todos


os seus filhos que o quiseram aprender, diziam nossos antanhos.

Naquela capital, Diogo Lopes permaneceu dois anos, como


dissemos, e então teve oportunidade de estudar muito os
compêndios de medicina.

Em conseqüência, regressou feito um esgrimista dos


melhores, e com seus conhecimentos largamente aumentados na
arte de curar. Antônio Bezerra afirma: "O Capitão Diogo Lopes,
em seu tempo, representou papel saliente, como homem instruído."

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"NÃO É BOM QUE O HOMEM ESTEJA SÓ"

Não podendo ou não querendo eximir-se às contingências


da natureza e do meio ambiente, aos 28 anos de idade, Diogo Lopes
passou a viver maritalmente com a senhorita Antônia Maria do
Rosário, mesmo sem as bênçãos do matrimônio.
Em seguida, adquiriu um trato de terra e instalou-se na
localidade denominada Lagoa do Mato, isto é, ali construiu uma
casa de morada, uma pequena fábrica de farinha de mandioca,
cacimba, curral para gado etc. Essa instalação foi montada um
pouco ao poente do chamado "Alto da Lagoa do Mato", à margem
norte da mesma lagoa, distante cinco quilômetros do então
povoado de Santa Cruz, anteriormente "Alto da Genuveva" e hoje
a linda e progressista cidade de Bela Cruz.
E aqui nos cabe o dever de tentar esclarecer um ponto de
capital importância para a vida familiar e para a posição social de
eminente Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa.

MULHERES E FILHOS DO CAPITÃO


DIOGO LOPES

Consoante informações de alguns escritores que algo


dedicaram à vida do Capitão Diogo Lopes, a começar pelo grande
historiador Antônio Bezerra, tivera ele sete mulheres, e com
nenhuma fora casado, resultando desses concubinatos trinta e cinco
filhos, dos quais faleceram quinze.
Supomos, no entanto, que as informações prestadas a
respeito do Capitão Diogo, ao historiador Antônio Bezerra, quando
o mesmo aqui esteve, em 1884, isto é, mais de meio século após o
falecimento do patriarca de Lagoa do Mato, foram um tanto
apressadas, ou seja, sem o merecido cuidado pela completa
exatidão dos fatos. E alguns dos que, posteriormente, também se

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ocuparam do assunto, certamente em virtude da escassez de fontes
de pesquisas, louvaram-se no que informara Antônio Bezerra sobre
o médico de Lagoa do Mato.
Aliás, o mesmo Antônio Bezerra, a quem "as pesquisas
históricas deram posição emérita em nosso Estado", como disse o
eminente historiador Raimundo Girão, admitiu isto, quando
informou: "Tratei de colher os dados precisos que tornassem mais
conhecida a Província, e, se não consegui, por aninhar-se qualquer
inexatidão no que está escrito, deve ser atribuído à falta, não a mim,
mas às pessoas a quem recorri, em tais casos."
E alguns antepassados nossos afirmavam que Diogo Lopes
nem tivera tantas mulheres, nem tantos filhos, mormente os
falecidos. E que, já bem próximo de seu falecimento, o velho
Capitão consorciara-se com Maria Siciaca da Fonseca, sendo
assistente do casamento um missionário que então ali estivera, em
desobriga.
E, consoante um documento escrito a 17 de outubro de
1872, pelo seu filho, Major João de Araújo Costa, o velho Capitão
teria casado com essa senhora. Em mencionado documento, que é
uma relação dos filhos de João de Araújo Costa, com registro de
datas de nascimentos e batizados, lê-se as seguintes notas: "Em 12
de janeiro de 1833, nasceu meu filho Galdino, em um sábado, às 4
horas da tarde; foi batisado em Santa Cruz, pelo Padre Miguel
Francisco Mendes de Vasconcelos; foi padrinho meu finado pai
Diogo Lopes de Araújo Costa" etc. E mais adiante: "Em 30 de
janeiro de 1838, nasceu minha filha Belarmina, em uma terça-feira,
às 4 horas da tarde; foi batisada em Lagoa do Mato, pelo Padre
Bernardo (Bernardo da Cruz Oliveira); foi madrinha minha finada
mãe Maria Siciaca da Fonseca" etc.
Pois bem: sabemos que a Igreja Católica nunca permitiu e
nem aceita, para apadrinhar batizandos, as pessoas amasiadas ou
de vida conjugal irregular. Logo, se Diogo Lopes de Araújo Costa

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e Maria Siciaca da Fonseca puderam ser padrinhos, na capela de
Santa Cruz e na fazenda Lagoa do Mato, perante dois padres
católicos, é de admitir-se que estivessem casados pela mesma
Igreja, que sempre foi exigente e cuidadosa na observância deste
preceito.
Outro argumento: Quando o Padre Manoel Antônio da
Rocha, "Visitador Geral do Norte de Cima da Comarca do Ceará
Grande", visitou o Curato da Ribeira do Acaraú, em 28 de julho de
1777, deixou no livro competente a seguinte reclamação: "Porque
tem mostrado a experiência e o clamor dos Povos que se não acham
muitos assentos de Batismo, Mortes e Casamentos, em muitas
Freguesias, o que certamente procede da falta de assentos, por
virem eles para a Matriz das respectivas Capelas em cedulazinhas
que muito fácilmente se perdem". (História de Sobral, de Dom José
Tupinambá da Frota, 1.ª Ed. pág. 663).
Ora, se apesar das pesquisas feitas, até agora não se
conseguiu encontrar o termo de casamento de Diogo Lopes de
Araújo Costa com Maria Siciaca da Fonseca, é possível que o
mesmo houvesse sido extraviado, em uma dessas cedulazinhas a
que alude o Padre Manoel Antônio da Rocha.
E, no que concerne ao número de filhos mortos, nem se
compreende mesmo como Diogo Lopes, que exercia a arte de
curar, com tanta proficiência e felicidade, deixasse morrer, assim,
quinze filhos seus, sem que na localidade onde residiam ocorresse
qualquer surto de epidemia mortal.
Felizmente, o próprio Capitão Diogo como que veio
esclarecer, em parte, o assunto, em seu testamento, feito no
Primeiro Cartório de Sobral, em data de 22 de junho de 1833,
valiosa pesquisa que devemos ao meticuloso genealogista Luiz
Coelho de Vasconcelos, a quem muito sinceramente saberemos
agradecer. Em referido Testamento, Diogo Lopes de Araújo Costa

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reconheceu apenas 16 filhos de três mulheres, e que são os
seguintes:

– "Filho reconhecido de Antônia Maria do Rosário:

1 – João Bento de Araújo Costa

– Filhos reconhecidos de Maria Rodrigues de Sousa:

2 – Diogo Lopes de Araújo Costa Júnior (falecido em 1825)


3 – Manoel de Araújo Costa
4 – Antônio de Araújo Costa
5 – Lúcio de Araújo Costa
6 – Félix de Araújo Costa
7 – Bernardino de Araújo Costa
8 – Antônia Balbina de Araújo Costa
9 – Inácia Sabina de Araújo Costa, casada com João Nepomuceno
de Araújo Costa

– Filhos reconhecidos de Maria Siciaca da Fonseca:

10 – João de Araújo Costa


11 – José Lopes de Araújo Costa
12 – Venâncio Meireles de Araújo Costa
13 – Raimundo Nonato de Araújo Costa
14 – Simplício de Araújo Costa
15 – Vicente Lopes de Araújo Costa
16 – Beatriz Geracina de Araújo Costa, casada com Francisco
Joaquim da Silveira".

Todavia, afora as notas que acabamos de registrar, não


encontramos elementos autênticos com que possamos confirmar ou

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ratificar as razões desses nossos antanhos que diziam haver Diogo
Lopes casado um pouco antes de falecer. Ao contrário, apurando,
cuidadosamente, o quanto lemos a respeito do assunto, chegamos
à conclusão de que o saudoso Capitão preferiu viver solteiro. E, por
isto, teria falecido inupto, tal como informaram ao historiador
Antônio Bezerra.
E, segundo informações de outros nossos antepassados, em
1789, isto é, aos 28 anos de idade, Diogo Lopes passou a viver
maritalmente com a aludida Antônia Maria do Rosário, com a qual
conviveu apenas dois anos.
O tempo correu e decorreu, e, em 1798, tomou para sua
companheira a mulher Maria Rodrigues de Sousa (portuguesa),
com a qual conviveu onze anos. Entretanto, simultaneamente, isto
é, desde 1801, também se concubinara com Maria Siciaca da
Fonseca, com a qual viveu conjugalmente o resto de sua existência.

"PLANTANDO, DÁ"

Tal como afirmamos em linhas anteriores, unindo-se a


Antônia Maria do Rosário, Diogo Lopes entregou-se aos trabalhos
da pecuária e da agricultura, sem descurar os estudos da medicina,
que era a sua vocação, e sem deixar de ajudar aos que o
procuravam, especialmente aos menos afortunados, pois ele
compreendia o provérbio de Salomão (19,17): "Quem se apieda do
pobre empresta ao Senhor que lhe restituirá o benefício." E parece
que tinha sempre presente este belíssimo pensamento: "A caridade
é o marco luminoso da Fé, refletindo na Terra a imagem de Deus."
A terra era fertilíssima. Ao lado sul demorava a piscosa
lagoa que, até hoje, é a maior existente no município de Bela Cruz.
A leste corria o legendário Rio Acaraú, cujos terrenos marginais se
prestam admiravelmente ao cultivo do algodão, do feijão, batata
doce e frutas diversas. As terras da mata foram aproveitadas para o

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cultivo da mandioca, milho, feijão e outros produtos da nossa
lavoura, enquanto o rebanho aumentava, graças à abundante
pastagem ali existente. Nestas condições, dentro de pouco tempo,
o Capitão Diogo era um dos mais abastados proprietários do Baixo
Acaraú.

DATA DE SESMARIA

No ano de 1817, o Capitão Diogo Lopes, necessitando de


mais terras, para o desenvolvimento de sua lavoura e de sua
criação, em conseqüência do aumento de sua família, que então já
se elevava a dezenas de filhos e netos, requereu, ao Governador da
Capitania do Ceará, como Data de Sesmaria, umas sobras de terra,
medindo três léguas de comprimento, e tendo por sede a fazenda
Lagoa do Mato. Mencionado trato de terra limitava-se: ao Norte,
com terras de Timbaúba (hoje Acaraú); ao Sul, com a mesma
Lagoa do Mato; ao Nascente, com terras de São Francisco da Cruz;
e, ao Poente, com terras das Ilhargas do Castelhano. O
requerimento em referência, após as tramitações legais, foi
deferido, em data de 18 de junho daquele mesmo ano, pelo então
Governador Cel. Manoel Inácio de Sampaio.
Como documentação, transcrevemos, a seguir, o teor da
petição do Capitão Diogo Lopes e o Despacho do Governador da
Capitania do Ceará:

"CARTA DE DATA DE SESMARIA DO


CAPITÃO DIOGO LOPES

Registro da Carta de Data de Sesmaria de três léguas de


terra de comprido e uma légua de largura, ou légua e meia
em quadro passada ao Capitão Diogo Lopes de Araújo
Costa, do Termo de Sobral. (Volume 9.º, N.º 728).

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"Manoel Inácio de Sampaio, fidalgo de Sua Majestade," Coronel
do Real Corpo de Engenheiros, Governador da Capitania do Ceará,
pelo Presidente da Junta da Real Fazenda etc.

"Faço saber aos que esta Carta de Data de Sesmaria virem,


que o Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, morador no Termo da
Vila de Sobral, desta Capitania me enviou dizer, por sua petição,
cujo teor é o seguinte:"

REQUERIMENTO DO CAPITÃO
DIOGO LOPES

"Ilmo. e Exmo. Governador:


"Diz o Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, que sendo
senhor e possuidor de uma Sesmaria de terra, há vinte anos, na
Ribeira do Acaraú, Termo da Vila de Sobral, lugar denominado
Lagoa do Mato, onde tem situados seus gados, cavalares, de toda a
sorte, ha, misto a este sítio, um Riacho chamado da Prata, que corre
de sul a norte, habitado e lavrado, com casa de aviamento de fazer
farinha, roças e fruteiras do suplicante, ha quase outro tanto tempo
quanto o em que possui Lagoa do Mato, sem oposições nem
contradição de pessoa alguma, tendo por heréos seus confinantes:
pela parte do nascente, com terras da Cruz, Lagoa Seca e
Malassombrado, de Francisco Antônio Linhares, do mesmo Termo
de Sobral e com a dita Lagoa do Mato do suplicante; pela parte do
Poente, com terras da Data do Comandante Antônio da Silva
Barros, do Termo da Vila de Granja; pela parte do norte, com terras
do Castilha, (Castelhano), Termo de Granja e com terras de
Timbaúba, Ribeira do Acaraú, Termo de Sobral; e, pela parte do
sul, com terras da mesma Lagoa do Mato do suplicante, ficando-
lhes mistas as terras sobreditas do Riacho da Prata, que quer o
suplicante lhes sejam concedidas por Sesmarias de Sobras dos

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sobreditos heréos confinantes, pegando dos providos do limite do
norte, pelo Riacho da Prata a cima, compreendendo as terras
devolutas e sobejas que houverem por uma e outra parte do
mencionado Riacho ou pela parte que realmente houverem sobras
entre todos os sobreditos heréos confinantes, até às testadas da
Lagoa do Mato do suplicante, tanto pelos benefícios de agricultura,
aproveitamento e posse pessoal em que esta ha tantos anos, como
pelo cômodo público que daí resulta, pois que tem o suplicante
feito estradas pelas caatingas desertas daquele sítio, para os
providos da Ribeira do Curuaru, Termo da Vila de Granja, fazendo
comerciados os povos do Acaraú com os da Granja, por aquela
parte até então incomunicável, portanto.
"Pede a V.ª Excia. se digne conceder-lhe as sobreditas
sobras por Sesmarias, para si e seus herdeiros ascendentes e
descendentes, debaixo das cláusulas expressadas nas Ordens
Régias tendentes a este negócio, e receba mercê

ass) Diogo Lopes de Araújo Costa".

DESPACHO DO GOVERNADOR
DA CAPITANIA

"E sendo visto o seu requerimento com as informações a


que se procedeu, pela Câmara respectiva e pelo Dr. Juiz de
Sesmarias, que nenhuma dúvida se lhes ofereceu, e a resposta do
Procurador da Coroa e Fazenda, a quem de tudo mandei dar vistas;
e respondeu está nos termos, Hei por bem, na conformidade da Real
Ordem de 22 de dezembro de 1715, conceder, em nome de S.ª
Majestade, EL REI, nosso senhor e do dito Capitão Diogo Lopes
de Araújo Costa, por Datas de Sesmarias, três léguas de comprido
e uma de largura, por légua e meia em quadrado, como na verdade
se acha, das terras que pede e confronta, em sua petição, no Termo

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da Vila de Sobral, desta Capitania, para si e seus herdeiros
ascendentes e descendentes, quais logrará em todas as suas
testadas, matas, campos, águas, logradouros e mais úteis que nelas
houver, reservados os paus reais para construção de caminhos
livres no Conselho, para fontes, pontes e pedreiras; e pagará
dízimos dos frutos que delas houver.
"Assim também será obrigado a medí-las e demarcá-las e a
haver de S.ª Majestade, pelo Tribunal competente, a Régia
confirmação, na forma das Reais Ordens, e mais alvará de 25 de
janeiro de 1809. E havendo nas ditas terras rio navegável, ficará
livre de uma das margens que toca às terras do suplicante meia
légua, para uso e comodidade do público, pena de que faltando a
qualquer das cláusulas declaradas, se houverem por devolutas ditas
terras e darem a quem as pedir. Pelo que ordeno ao Juiz de
Sesmarias e mais justiça e pessoal a que tocar, que, na forma
requerida e condições confrontadas, cumpram e guardem, façam
cumprir e guardar esta minha Carta de Data de Sesmarias, como
nela se contém, em firmeza do que lhes mandei passar a presente
por mim assinada e selada, com o sinete das minhas armas, que
registrará na Secretaria deste Governo, Contadoria da Real
Fazenda, onde pertencer.
"Dada na Vila da Fortaleza, Capitania do Ceará, aos 18 de
junho de 1817.
"E eu, Vicente Ferreira de Castro e Silva, Oficial Secretário
do Governo, no impedimento do Secretário, a fiz escrever.

ass) Manoel Inácio de Sampaio".

"Estava o selo. Francisco Esteves Almeida a fez. N.º 930.


Pagou quatro mil réis de selos.
Fortaleza, 19 de junho de 1817.
GARCIA FARIAS".

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Conseguida, assim, mencionada Data de Sesmaria, 6
Capitão Diogo Lopes teve consideravelmente aumentada sua
propriedade, com amplas vantagens para sua numerosa família, a
qual, em sua quase totalidade, vivia do cultivo do solo e do
pastoreio, bem como, para os agregados, a quem ele, todos os anos,
cedia terra de plantio, sem cobrar qualquer renda. Sim, porque o
Capitão de Lagoas do Mato entendia o Deuteronômio (15,11):
"Abre tua mão ao teu irmão necessitado ou pobre que vive em tua
terra."

LÍDER INCONTESTÁVEL

O Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa possuía o autêntico


espírito de liderança, segundo é sabido e ainda comentado. E, não
obstante o cuidado com a manutenção e orientação de seus
familiares, uma de suas maiores preocupações era no sentido de
que a Comunidade em que vivia e agia caminhasse dentro da
harmonia e do amor ao trabalho.
E, com a decisiva influência que tinha perante o povo, desde
a camada mais humilde até a mais elevada, quase todas as questões
e problemas que surgiam no seio da Comunidade, fossem de ordem
familiar, financeira ou política, eram levados ao seu conhecimento.
E a quase todos também o Capitão conseguia uma solução justa e
adequada, de modo harmonioso e conveniente, para as partes
interessadas. De forma que os contendores, quando os havia,
voltavam satisfeitos e até amigos.
Antônio Bezerra, cognominado o "Sábio Cearense", em
suas Notas de Viagem, pág. 371, afirma que "seu nome corria por
toda parte, cercado de respeito e veneração". E o historiador Renato
Braga, em seu Dicionário Histórico e Geográfico do Ceará, V. II,
pág. 86, informa: "Homem inteligente, consagrou-se à medicina,
granjeando grande no do povo."

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Homem de rara fibra e lisura de caráter, Diogo Lopes era
dono de uma autoridade que ninguém ousava pôr em dúvida ou
menosprezar. Sua palavra valia por um documento legalmente
assinado. De tal maneira que sua orientação era sempre acatada
pelos que o procuravam. Educado na escola do trabalho, tendo
herdado, de seu ilustre pai, a serenidade ante as vicissitudes da vida
e o espírito de solidariedade para com os seus semelhantes, o
Capitão Diogo Lopes era, incontestavelmente, um homem, no
integral significado da palavra, e que, por isto mesmo, se tornou
indispensável à sua Comunidade.
E a ação de seu prestígio não se restringia somente às
localidades de Lagoa do Mato e Santa Cruz. Não. Daqui, da então
Barra do Acaraú, e até de outras povoações, muita gente acorria à
casa do velho Capitão, para expor situações e ouvir sua palavra
conciliadora e amiga, firmada no conhecimento e na experiência.
E, no exemplo de sua vida e de sua luta, ele deixou claro que
pensava com Samuel Smiles, que "os melhores homens não vivem
para gozar nem ganhar fama. O que os move é a esperança de serem
úteis a uma boa causa".
E no que alude aos interesses da Comunidade, – diziam
nossos maiores, – o Capitão muito fazia em benefício de seu
desenvolvimento.
Assim é que, no requerimento que, a 28 de abril de 1817,
dirigiu ao Cel. Manoel Inácio de Sampaio, então Governador da
Capitania do Ceará, pleiteando uma Carta de Data de Sesmaria, ele
informava: "que tem feito estradas pelas caatingas desertas daquele
sítio, para os providos da Ribeira do Coreaú, termo da Vila de
Granja, fazendo comunicados os povos do Acaraú com os da
Granja, por aquela parte até então incomunicáveis".
Pelo visto, esse trabalho foi feito entre o ocaso do século
dezoito e o amanhecer do século dezenove. É fácil, portanto,
avaliar-se o quanto foi preciso, então, de energia, de audácia e

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mesmo de dinheiro, para abrir uma estrada, ligando Acaraú a
Granja, numa extensão de quase cem quilômetros, com grandes
trechos em plena mata virgem, povoada de bichos silvestres,
inclusive onças, maracajás e outros animais perigosos.
Um serviço assim, de tão marcante significação no
importante setor do transporte e da comunicação, possibilitando o
relacionamento e o intercâmbio entre os habitantes dos dois então
futuros municípios, é capaz de pôr em destaque a personalidade do
Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, também como homem de
realizações em benefício da coletividade, sobretudo pelo seu
espírito pioneiro.

PERDEU A VISÃO AOS 60 ANOS

Exatamente aos 60 anos de idade e 40 de profissão, o


Capitão Diogo Lopes perdeu a visão, de maneira inesperada.
Tal fato constituiu motivo de geral consternação para a
população ribeirinha aqui no Baixo Acaraú, muito especialmente
para os menos aquinhoados da fortuna, entre os quais possuía ele
maior número de amigos.
Então, desde Santana até à Barra do Acaraú, várias pessoas
foram levar ao Capitão médico palavras de conforto e de
solidariedade, ante o golpe subitâneo por ele sofrido. Encontraram-
no, porém, conformado e alegre, de ânimo cada vez mais elevado,
dizendo-se pronto para continuar o seu trabalho, o que realmente
fez, enquanto teve condições de fazê-lo.
Efetivamente, embora privado da faculdade de ver, aquele
homem fenomenal, consoante dizem as tradições, prosseguiu a sua
faina de todos os dias, já na administração de seus haveres, para o
que então contava com a dedicada colaboração de seus filhos, já
nos trabalhos de sua clínica, a qual, à medida que os anos iam

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transcorrendo, mais e mais ia sendo procurada, por doentes de
todas as classes sociais.
É que, para Diogo Lopes de Araújo Costa, servir ao
próximo constituía o primeiro dever do homem e a sua obrigação
maior. E o seu reconhecido espírito de concórdia, conforme
asseveravam antepassados nossos, conseguía manter em paz e
harmonia toda a Comunidade da qual fazia parte.
Sim, porque o velho Capitão, como fosse um nordestino
autêntico, integrando a "rocha viva de nossa nacionalidade", como
nos denominou Euclides da Cunha, possuía, em alta dose, a "calma
e a serenidade admiráveis", tão apreciadas pelo saudoso escritor
Gustavo Barroso.
E com aquela calma e aquela serenidade que eram, na
maioria das vezes, o segredo de suas vitórias e do seu êxito, no
solucionamento dos problemas que freqüentemente lhe eram
apresentados, o Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, não
obstante o pesado ônus de seu labor, apesar de suas
responsabilidades perante os seus familiares e perante a sua
Comunidade, não se irritava nunca, e, por isto mesmo, era um
homem invariavelmente disponível, tranquilo e feliz.

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33
2

O Político

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VEREADOR PELA CÂMARA DE SOBRAL

Como não podia deixar de suceder, o Capitão Diogo Lopes


exercia, também, uma notável liderança política no seio da
população de Acaraú. E, como conseqüência natural e lógica disto,
seu nome foi solicitado para ingressar em uma das agremiações
partidárias em atividade no seu tempo, dada a sua popularidade e a
sua ascendência entre os seus conterrâneos pobres e ricos.
Eis que, dentro de pouco tempo, seu prestigio se tornou
cada vez mais elevado, não só em Acaraú, mas igualmente nesta
região toda, onde ele era vastamente conhecido e admirado.
Tanto isto é verdade que, no ano de 1789, não obstante
Lagoa do Mato, onde residia Diogo Lopes, distar mais de cem
quilômetros da então Vila de Sobral, chegou ele a ser eleito
Vereador à Câmara daquele município. (Cronologia Sobralense,
vol. I, pág. 315).
E, como naquele tempo, a Vila de Sobral era uma espécie
de Capital do Vale do Acaraú, – diziam nossos antanhos, – o
Capitão, com sua influência de representante do povo, naquela casa
de legislação municipal, conseguiu, então, numerosos benefícios
para sua Comunidade. Aliás, o gosto pela vida político-partidária
Diogo Lopes herdou de seu pai, Capitão-mor José de Araújo Costa,
o qual, embora português, natural de Santa Lúcia de Barcelos, teve
posição de relevo na política desta Ribeira. Tanto que foi
convidado especial para assistir às solenidades e assinar a Ata de

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instalação da Vila Distinta e Real de Sobral, a 6 de julho de 1773,
quando foi nomeado Tesoureiro para os impostos do Porto de
Acaraú, pelo Dr. Joaquim da Costa Carneiro e Sá, então Ouvidor e
Corregedor da Comarca do Ceará (Cronologia Sobralense, págs.
302/307).
E em 1775/76 o Capitão José de Araújo Costa foi eleito
Vereador à Câmara de Sobral (Obra citada, págs. 274 e 276).

EXEMPLO QUE PASSA AOS FILHOS

O interesse do Capitão Diogo Lopes, pela vida político-


partidária, passou, como era natural, a diversos filhos seus, que se
integraram nos partidos políticos da época, e prestaram bons
serviços à coletividade de sua terra. Por exemplo: – A página 110
do livro Município de Santana, seu autor, comentando a
memorável campanha cívica aqui realizada, visando a criação do
município de Acaraú, se expressa da seguinte maneira:
– "Nesse tempo prestigiosas influências partidárias
sustentavam, com mão segura, o leme da governança; sabiam
dirigir o barco. O Major João de Araújo Costa, o Alferes Raimundo
Lopes de Araújo Costa, o Capitão João Bento de Araújo Costa
(todos 3 filhos do Capitão Diogo Lopes), o Tenente Albano José da
Silveira, o Tenente Francisco Joaquim da Silveira (genro do
Capitão Diogo Lopes) e o Capitão Antônio Teixeira Pinto,
venerandos patriarcas, intrépidos campeões dos interesses pátrios,
se haviam colocado à frente dos públicos negócios que geriam com
dedicação própria de Filhos da terra".
Com efeito, em 1846, o Capitão João Bento de Araújo
Costa coordenou e chefiou o movimento para a criação da primeira
Junta de Qualificação Eleitoral de Acaraú, a qual foi instalada, em

36
casa do mesmo João Bento, então Juiz de Paz de Acaraú, a 17 de
janeiro de 1847, e teve decisiva, influência na cruzada cívica que
culminou com a criação do município de Acaraú, pela Lei n.º 480,
de 31 de julho de 1849, sancionada pelo Dr. Fausto Augusto de
Aguiar, então na Presidência da Província do Ceará.
Criado o município, e realizada a eleição para Vereadores
ao poder legislativo municipal, que então centralizava o executivo,
quatro filhos do Capitão Diogo Lopes foram votados para a sua
Primeira Câmara, que foram os seguintes: – "João Bento de Araújo
Costa, 760 votos; Manoel de Araújo Costa, 1008 votos; Simplício
de Araújo Costa, 1010 votos; e João de Araújo Costa, 769 votos."

(Ata da Apuração da Eleição de Vereadores para a


1.ª Câmara Municipal da Vila da Barra do Acaraú,
realizada pela Câmara de Sobral, a 14.11.1850, e
transcrita no Livro n.º 1, fls. 4 e 5, da mesma
Câmara).

Desta maneira, Manoel de Araújo Costa e Simplício de


Costa, foram eleitos, e os outros dois ficaram na Suplência, porém,
posteriormente ocuparam o cargo, na ausência dos respectivos
titulares.
Manoel de Araújo Costa, já no Posto de Capitão da Guarda
Nacional, chegou a ser eleito chefe do Poder Executivo Municipal
de Acaraú. E Simplício de Araújo Costa, que era homem instruído,
naquele tempo, exercendo o mandato de Vereador pela Câmara de
Acaraú, que o foi em mais de uma legislatura, teve ali marcante
atuação, conforme os livros de Atas daquela casa legislativa. E aqui
exerceu, também, os cargos de Professor Provincial, 1.º Adjunto de
Promotor de Justiça e Procurador da Câmara.

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CAPITÃO DE ORDENANÇAS

Diogo Lopes, cujo prestígio, como dissemos, era dos mais


sólidos, desta região do Baixo Acaraú, era Capitão de Ordenanças,
nomeado pelo Governador da Capitania, de acordo com a Ordem
Régia de 3 de novembro de 1749. Tais Ordenanças integravam as
milícias que, desde a criação das Capitanias, eram responsáveis
pela segurança pública e que foram substituídas pela Guarda
Nacional.
Pois bem: com o título de Capitão de Ordenanças e suas
funções, Diogo Lopes defendeu numerosos oprimidos e firmou,
juntamente com outras autoridades, na Vila Real de Sobral, uma
representação, datada de 4 de fevereiro de 1814, e enviada a Sua
Majestade, Dom João VI, contra o Bacharel Antônio Manoel
Galvão, então no exercício do cargo de Ouvidor da Capitania do
Ceará, representação transcrita na notável obra intitulada História
de Sobral (1.ª Ed. págs. 199/205), de Dom José Tupinambá da
Frota.

DEIXOU A POLÍTICA AOS 60 ANOS

Em 1821, ano em que perdeu sua visão, o Capitão Diogo


Lopes desligou-se de seu Partido e abandonou a vida político-
partidária.
Entretanto, no que diz respeito à sua profissão de médico,
aquele homem extraordinário continuou com a mesma dedicação e
a mesma proficiência de sempre. Igualmente, não arrefeceu em seu
entusiasmo e em seu interesse, em prol dos irmãos necessitados,
nem tampouco em favor daqueles que continuamente o
procuravam, pedindo solução para seus problemas.
Sim, porque o velho Capitão de Lagoa do Mato, afora o seu
condenável desprezo pelo sagrado instituto do matrimônio,

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naturalmente tinha outros defeitos, como todos nós os temos,
dentro da fraqueza e das limitações da criatura humana. Uma
qualidade, porém, salientava-se em sua pessoa, segundo diziam os
que o conheceram de perto: era a sua disponibilidade, o seu espírito
de solidariedade humana, com preferência especial para aqueles
que mais precisavam de ajuda, em qualquer emergência.

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3

O Médico

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MÉDICO SEM DIPLOMA

Como tivemos ensejo de aludir, em capítulo anterior, desde


a sua adolescência Diogo Lopes manifestou sua inclinação pela
medicina, isto é, sua vocação pela arte de curar.
Mocinho ainda, ele era chamado, pelos vizinhos, para fazer
curativos e até ensinar meisinhas.
E, à medida que os anos iam decorrendo, seus
conhecimentos, no ramo, iam aumentando, não somente pelos
estudos a que se entregava continuamente, mas também pela
prática que ia adquirindo, em seu labor de todos os dias.
Vale ressaltar que os dois anos que estudou em Fortaleza,
consoante referimos no capítulo primeiro, foram de grande
aproveitamento para Diogo Lopes, que teve seus conhecimentos
medicinais largamente enriquecidos, como não podia deixar de
acontecer, dada a sua privilegiada inteligência e o seu imenso gosto
pelo estudo da matéria.

AS PLANTAS CURAM

O grande botânico A. Balbach afirmou que "no reino das


plantas há abundância de virtudes curadoras, próprias para as
necessidades do homem". E lemos também que "a medicina, desde
os seus primórdios, buscou no reino vegetal a maior parte de seus

43
recursos. Hipócrates só aconselhava medicamentos vegetais e dava
as suas consultas entre as plantas, ao ar livre".
Pensando de igual maneira, certamente, o Capitão Diogo
Lopes quase sempre ia colher na riquíssima flora brasileira os
elementos de que necessitava, para exercer a sua terapêutica.
Folhas, flores, sementes, cascas, resinas, raízes etc., eram
constantemente empregadas na clínica do ilustre patriarca de
Lagoa do Mato. E ele conhecia, como poucos, as qualidades
medicinais das plantas e suas aplicações no tratamento das
numerosas doenças que afetam o organismo humano.
Deste modo, as plantas eram responsáveis pela quase
totalidade de suas vitórias, na grande arte de curar. Vitórias que,
muitas vezes, representavam prodígios, tal como a tradição ainda
assevera.
Dizem, ainda, que Diogo Lopes estudava anatomia
continuamente, pelo que conhecia a complicada estrutura do corpo
humano, bem como a função específica e a capacidade normal de
funcionamento de vários órgãos, o que contribuía para o bom êxito
de sua profissão de médico, embora lhe faltassem o equipamento e
o instrumental necessários para exames e análises.

FATOS INCRÍVEIS

As pessoas que conviveram com Diogo Lopes e de perto


acompanharam suas atividades, eram unânimes em afirmar que
algo de misterioso, qualquer cousa de sobrenatural influía nas
ações daquele homem singular, que era, antes de tudo, um profundo
psicólogo.
E ninguém que conheceu as curas que Diogo Lopes
realizava, seria capaz de negar que ele recebera, do alto, um dom
especial para tal mister. Sem dúvida, – diziam, – Deus concedera
àquele homem extraordinário uma graça particular, para que

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pudesse desempenhar, como o fazia, a relevante missão que lhe
estava reservada, em benefício da humanidade sofredora.
O renomado historiador Antônio Bezerra, em Notas de
Viagem, pág. 371, informa: "Ainda hoje as pessoas que o
conheceram referem fatos incríveis a respeito da experiência e
conhecimento que tinha das moléstias, afirmando que foram
inúmeras as curas difíceis que conseguiu fazer, de sorte que o seu
hospital era ansiosamente procurado, pela certeza do pronto
restabelecimento."
E o escritor e poeta Mário Linhares, em seu trabalho
genealógico intitulado Os Linhares, 2.ª ed., pág. 21, adianta:
"Homem notável, pela sua perspicácia médica. Dele se contam
curas admiráveis. Era um verdadeiro discípulo de Hipócrates."

MEDICINA, UM SACERDÓCIO

Disse um brilhante escritor brasileiro que "a medicina, é um


sacerdócio".
Pois bem: o Capitão Diogo Lopes, embora não houvesse
cursado faculdades onde fossem ministrados ensinamentos sobre a
ciência de curar, fazia de sua modesta mas nobre profissão um
autêntico sacerdócio, senão um apostolado. Exercia a sua medicina
com honestidade, dedicação e altruísmo. Muitas vezes, ao que
consta, privava-se das próprias refeições, para atender ao doente
que carecia de assistência. Outras vezes passava as noites em claro,
ao lado de um paciente, acompanhando, cuidadosamente, a marcha
da doença, o tratamento prescrito e os resultados que iam sendo
obtidos.
Seus sentimentos humanitários prevaleciam sempre sobre
quaisquer interesses ou pretensões. Seu conforto e seu bem estar
eram condicionados às necessidades de seus semelhantes. Dele
bem que se podia dizer o que, mais de um século depois, diria Rui

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Barbosa, falando de Osvaldo Cruz: "Decididamente, uma espécie
de predestinação acompanha esta existência privilegiada."

FAMA QUE SE AMPLIA

Com o perpassar dos anos, a fama de Diogo Lopes ia se


ampliando e transpondo, mesmo, as fronteiras da Província do
Ceará Grande, para atingir "outras terras e outras gentes". Antônio
Bezerra informa que à Lagoa do Mato vinham doentes até da
Província de Piauí, à procura de saúde.
Os diagnósticos do Capitão médico eram efetuados quase
sempre pelo apalpar do pulso dos enfermos. E, graças à espantosa
sutileza de sua audição, várias moléstias do coração e dos pulmões
eram rapidamente identificadas, por meio de auscultações
cuidadosas, auxiliadas pela grande experiência de Diogo Lopes.
Coisa maravilhosa: qualquer doença o Capitão descobria
logo ao tomar o pulso ao enfermo. Em seguida, receitava o
remédio, prescrevia o tratamento e a dieta, se houvesse
necessidade. E a cura, quase sempre, era certa.
Muita gente pasmava ao ver que numerosos consulentes, ao
serem recebidos pelo Capitão Diogo, este somente ao olhar
fixamente para eles diagnosticava, com acerto, suas respectivas
moléstias.
Como poucos, o Capitão sabia preparar e aplicar
sinapismos, cataplasmas, emplastros, ventosas, sangrias, bem
como praticar a respiração artificial.
Um cavalo de sela era tratado na cocheira, junto à residência
do Capitão, para facilitar o atendimento aos chamados que,
frequentemente, lhe chegavam, para doentes sem condições de
viajar. E a todos ele atendia, não importando a hora do dia ou da
noite.

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PARTEIRO

Além dos trabalhos da clínica propriamente dito, o Capitão


Diogo Lopes era também parteiro, embora não houvesse feito
nenhum curso de obstetrícia. E, mesmo assim, era chamado para
fazer partos não só em localidades vizinhas mas igualmente para
lugares distantes. E muito raramente perdia um caso, pois, além de
trabalhar com admirável perícia, sempre foi muito feliz, em seu
meritório labor, em benefício do próximo.
E esse seu trabalho de assistente aumentava, de muito, a
estima e a consideração que ele desfrutava entre as populações
ribeirinhas, naqueles recuados tempos tão carecidos de assistência
médica. É que o médico mais próximo residia então na Vila Real
de Sobral, que dista quase dezoito léguas de Lagoa do Mato, onde
morava Diogo Lopes.
E ocorria que o ilustre Capitão patriarca era chamado para
assistir parturientes até aqui da então Barra de Acaraú, segundo
diziam antepassados nossos.

HOSPITAL PARA TRATAMENTO GRATUITO

Um fato de relevante importância na clínica daquele médico


que a Providência mandara, para servir ao povo: qualquer que fosse
a condição social ou financeira do consulente ele não pagava nada.
E aconteceu que, com o aumento da afluência, cada vez
maior, de doentes que o procuravam, Diogo Lopes houve por bem
mandar construir um pavilhão anexo à sua residência. E ali passou
a funcionar, então, um pequeno hospital, aliás com muita
freqüência de enfermos vindos de diferentes localidades.
E, então, não só as consultas, mas também os remédios e o
tratamento eram gratuitos: Isto porque Diogo tinha recursos e
filantropia.

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Afirmamos, em período anterior, que a fama do Capitão
Diogo Lopes chegou a transpor fronteiras interprovinciais, como
disse A. Bezerra.
E, na verdade, doentes vindos até da Província do Piauí, vez
por outra, procuravam o hospital do médico de Lagoa do Mato. A
cavalo, em carros-de-boi, em liteiras, e muitos transportados em
redes, pela gravidade de seu estado de saúde, acorriam àquela
localidade. E naquele nosocômio de emergência recebiam o
tratamento de que estavam carecidos. E dali retornavam às suas
terras e aos seus lares, prontamente restabelecidos ou em vias de
recuperação.
E não só quando possuía sua vista, porém, mesmo depois
de perdê-la, o que jamais lhe foi motivo de queixa ou lamento,
Diogo Lopes nunca deixou de atender aos que precisavam de seus
serviços. A qualquer hora, sempre o encontravam disposto e bem
humorado, num impressionante exemplo de dedicação aos seus
semelhantes, tal como dizem as tradições.
O brilhante orador sacro, Padre Valdevino Nogueira, em
memorável discurso, afirmou: "Os homens imortalizam os séculos,
e as boas obras imortalizam os séculos e os homens." Assim, o
nome do Capitão Diogo Lopes ficou imortalizado, pelas boas obras
que praticou, em toda sua vida. Vida que pertenceu mais aos outros
do que a ele próprio. Vida de um homem que, na verdade, foi uma
figura humana insubstituível em seu meio ambiente.

ESPÍRITO DE DOAÇÃO

Foi assim a vida do Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa,


durante mais de meio século: um trabalho incessante, uma
preocupação de todas as horas, para amenizar os sofrimentos de
seus semelhantes, restituindo a saúde aos enfermos, na medida de
suas forças e dos conhecimentos que a Providência lhe concedeu

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tão munificentemente. E a muitos outros ajudando, defendendo e
orientando, pelo caminho certo.
Se tal como registramos no capítulo anterior, na vida
política e social de sua Comunidade, as atividades do Capitão
Diogo Lopes se fizeram sentir de maneira positiva e marcante, em
favor da coletividade, mais importante, porque mais humano e mais
útil, foi o seu trabalho na arte de curar.
Efetivamente, foi o seu serviço de médico, embora sem
diploma, que o tornou célebre, como afirmavam nossos ancestrais
e ainda rezam as tradições.
Ele constituiu, em sua existência e em seu trabalho, um
grande e nobre exemplo de caridade cristã, fiel, que sempre foi, ao
divino ensinamento do Evangelho: "Amarás a teu próximo como a
ti mesmo", (Marcos, 12-31), que é o segundo Mandamento do
Cristo.
Deixando a seu crédito tão larga folha de serviços prestados
aos seus semelhantes, portador, que era, de grande espírito de
doação, o Capitão Diogo, de Lagoa do Mato, certamente pensara e
falara, como George Elliot: "Não me dês, ó Deus, inteligência que
não me sirva para auxílio do próximo, nem forças que não
contribuam para o aperfeiçoamento do homem."
É de acreditar-se, portanto, que o seu labor e a sua
abnegação a serviço da Comunidade tenham contribuído para
aplainar os ângulos de sua vida social, conseguindo, tanto quanto
possível, indulgência para os delitos que ele praticou contra a
sagrada instituição da família, e expungindo, ao menos em parte, a
nódoa que macula o seu nome, ameaçando empanar a sua memória.

MORTE DO CAPITÃO DIOGO LOPES

O estado em que se encontram os livros de registro de óbitos


que nos foi possível manusear, no arquivo da Secretaria da Diocese

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de Sobral, relativos ao antigo Curato do Acaracu, não nos permitiu
localizar o termo referente ao falecimento do Capitão Diogo Lopes
de Araújo Costa. Foram baldados todos os nossos esforços neste
sentido, porque as folhas dos mencionados livros estão dilaceradas
e ilegível o que ali foi escrito, na época.
Entretanto, graças ao interesse do nosso prestimoso
conterrâneo José Maria Silveira, que, há quase meio século,
trabalhou vários anos no Primeiro Cartório da Comarca de Acaraú,
encontramos o resumo do inventário dos bens deixados pelo
saudoso Capitão. Inventário procedido aí pelos idos de 1840.
Pois bem: no referido documento, consta não somente o
registro do óbito de Diogo Lopes, ocorrido a 18 de setembro de
1838, mas também os nomes, com os respectivos anos de
nascimentos, de todos os 16 filhos que ele reconheceu como
legítimos, em seu Testamento datado de 22 de junho de 1833, no
1.º Cartório de Sobral, distribuídos exatamente pelas três mulheres
com as quais o grande Capitão conviveu maritalmente. E antigo
caderno, contendo notas de família, nos deu conta de que o cadáver
desse nosso eminente ancestral foi sepultado na Capela de Santa
Cruz.
Aliás, era costume, naquele tempo, utilizar-se as Capelas
para inumação dos cadáveres. E os mortos aqui na Barra do Acaraú
eram, em geral, sepultados na Capela de Santa Cruz. Tanto isto é
verdade que, quando, a 21 de outubro de 1849, aqui esteve, em
Visita Pastoral, o Padre Antônio Pinto de Mendonça, Cônego
Honorário da Capela Imperial do Rio de Janeiro, entre outras
recomendações, fez a seguinte, que se acha exarada no Livro de
Tombo da Matriz de Acaraú: "E, enquanto não se edifica a Igreja
Matriz, faça-se um Cemitério em que se possam sepultar os corpos
dos que morrerem, visto que na pequena Casa de Oração se não dá
jazigo algum, e muito incômodo é conduzir os corpos para a Capela

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de Santa Cruz, como tem sido costume, na distância de quatro
léguas."
Cumprida, portanto, sua missão entre os homens, cercado
do respeito e do reconhecimento de quantos conheciam a sua obra
de benemerência, o Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, tal
como já registramos, fechou os olhos para sempre, em sua sempre
bem amada fazenda Lagoa do Mato, a 18 de setembro do ano da
graça de 1838, legando à posteridade uma lembrança abençoada
pelo povo da sua Comunidade, do qual sempre foi um verdadeiro
amigo, de todos os instantes e de todas as circunstâncias.
Aos seus descendentes deixou um impressionante exemplo
de amor ao trabalho e amor ao próximo.
Se "os vivos são sempre governados pelos mortos", tal
como afirma um pensamento oriental de Lao-Tsé, citado pelo
saudoso escritor e poeta Mário Linhares, o Capitão Diogo Lopes
deve ter uma grande parcela de mando, entre os seus pósteros. Ele,
que encheu meio século de história da vasta região onde viveu e
trabalhou; ele que entendeu, muito bem, a recomendação de São
Paulo aos Gálatas (5-10): "Enquanto é tempo, façamos o bem a
todos os homens."

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Capela de Santa Cruz

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JAZIGO MORTUÁRIO DOS ASCENDENTES
DO CAPITÃO DIOGO LOPES

– O capitão Manoel Vaz de Carrasco e Silva, filho de


Francisco Vaz Carrasco e de dona Inez de Vasconcelos, nasceu em
Ipojuca, Pernambuco, em 1673, e faleceu em sua fazenda Lagoa
Seca, na Ribeira do Acaraú, a 23 de novembro de 1757. Sua esposa,
dona Maria Madalena de Sá e Oliveira, nasceu, também, em
Ipojuca, Pernambuco, em 1698, e faleceu, igualmente, na fazenda
Lagoa Seca, a 24 de julho de 1791.

– O capitão-mor José de Araújo Costa, filho de Pedro de


Araújo Costa e de dona Maria de Sá, nasceu em Santa Lúcia de
Barcelos, Arcebispado de Braga, em Portugal, em 1717, e faleceu
em sua fazenda Lagoa Grande, na Ribeira do Acaraú, a 4 de agosto
de 1791. Sua esposa, dona Brites de Vasconcelos (a 6.ª das Sete
Irmãs), filha do capitão Manoel Vaz de Carrasco e Silva e de dona
Maria Madalena de Sá e Oliveira, nasceu em Goiana, Pernambuco,
em 1724, e faleceu na fazenda. Lagoa Grande, a 10 de fevereiro de
1818.

– O capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, filho do capitão-


mor José de Araújo Costa e de dona Brites de Vasconcelos, nasceu
na fazenda Lagoa Grande, a 8 de março de 1761, e faleceu na
fazenda Lagoa do Mato, a 18 de setembro de 1838.

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Pois bem: por uma coincidência talvez providencial, essas
cinco pessoas, representando quatro gerações e nascidas em quatro
localidades diferentes e distantes, mas tão estreitamente unidas
pelos laços do sangue, depois de mortas, foram reunir-se na capela
de Nossa Senhora da Conceição, no então povoado de Santa Cruz
(hoje cidade de Bela Cruz), onde foram sepultadas.

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Ascendentes e descendentes
do Capitão Diogo Lopes

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ASCENDENTES DO CAPITÃO DIOGO LOPES

Com referência à cepa genealógica do Capitão Diogo Lopes


de Araújo Costa, recorremos, primeiramente, à tradição oral,
através de nossos antepassados.
No ano da graça de 1717 nascia, na comunidade de Santa
Lúcia de Barcelos, Arcebispado de Braga, no velho Portugal, o
menino José de Araújo Costa, filho do casal Pedro de Araújo Costa
e de d. Maria de Sá.
Jovem, ainda, José de Araújo Costa, em companhia de dois
irmãos seus, – Pedro de Araújo Costa (filho) e Manoel de Araújo
Costa, – emigrou para o Brasil. Provavelmente vieram tentar
fortuna na Colônia rica das minas gerais. Pedro foi morar na
Fazenda Morrinhos, Manoel, na Fazenda Boa Vista e José fixou
residência em Lagoa Grande, aqui no hoje município de Acaraú
(Cronologia Sobralense, do Cônego Francisco Sadoc de Araújo, v.
I, págs. 33, 345/6).
Inteligente e ativo, e sobretudo, fiel ao objetivo que o
trouxera da Pátria de Camões, José de Araújo Costa dedicou-se,
concomitantemente, ao comércio, à lavoura e a criação de gado,
únicas profissões que aqui se ofereciam, naqueles recuados tempos.
O vento da sorte soprou propício, de modo que fez fortuna dentro
de poucos anos.
Continuou trabalhando. E, de logo, adquiriu uma posse de
terra na mesma Lagoa Grande. E ali construiu casa de morada e
comércio, ao mesmo tempo em que dava incremento ao pastoreio.

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Portador de bons conhecimentos, José de Araújo Costa fez
boas amizades, ao longo da Ribeira do Acaraú até Sobral. Não
sabemos em que ano foi ele nomeado Capitão-mor.
Assim, já com sólida situação financeira, a 31 de julho de
1747, casou-se com d. Brites de Vasconcelos, filha do Capitão
Manoel Vaz Carrasco e Silva e de d. Maria Madalena de Sá e
Oliveira, tendo a cerimônia ocorrido na Fazenda Lagoa Seca,
propriedade de seu sogro, oficiada pelo Pe. Pedro de Albuquerque.
Por força de sua posição, ingressou na política, chegando a
ser escolhido Vereador, pela Câmara de Sobral, nos anos de
1775/76, como dissemos anteriormente.
Destarte, figura marcante dos poderes públicos do Baixo
Acaraú, o Capitão José de Araújo Costa, tal como já aludimos,
integrou uma das Comissões dos festejos da criação da Vila de
Sobral, a 5 de julho de 1773. Abra-se História de Sobral, de D. José
Tupinambá da Frota, 1.ª ed., pág. 303, e lá encontraremos o nome
de José de Araújo Costa, entre os promotores da memorável festa
histórica da hoje Princesa do Norte.
E na mesma data foi ele nomeado, pelo Ouvidor João da
Costa Carneiro e Sá, para controlar a venda de gado e cobrar o
respectivo imposto, no porto de Acaraú. Isto naquele tempo em que
o comércio de gado vacum aqui acusava um grande movimento,
em conseqüência das charqueadas.
Foi assim que o Capitão José de Araújo Costa, depois de
bem criar a sua família, constituída de 3 homens e 8 mulheres,
fechou os olhos para sempre, a 4 de agosto de 1791, em sua
Fazenda Lagoa Grande, e foi sepultado na capela de Santa Cruz.
Dona Brites de Vasconcelos, sua companheira de todas as horas,
faleceu a 10 de fevereiro de 1814, na mesma Fazenda, e sepultou-
se em Santa Cruz (hoje cidade de Bela Cruz).

***

60
No que concerne à família de d. Brites de Vasconcelos, mãe
do Capitão Diogo Lopes, a história é mais ou menos idêntica.
No ano de 1073 residia em Ipojuca, Pernambuco, o casal
Capitão Francisco Vaz Carrasco e d. Inez Vasconcelos, "tronco de
inumerável descendência em toda a Ribeira do Acaraú", tal como
informa o Cônego Francisco Sadoc de Araújo.
Pois bem: nesse mesmo ano e desse mesmo casal nasceu
Manoel Vaz de Carrasco e Silva, o qual consoante Cronologia
Sobralense, 1.º v., pág. 32; "emigrou para o Ceará, fixando
residência na Fazenda Lagoa Seca, perto do local onde hoje se
encontra a cidade de Bela Cruz". Adianta citada obra, que "Manoel
Vaz Carrasco e Silva é o pai das Sete Irmãs, de cuja fecundidade
maternal provém grande parte da família sobralense, como aliás de
toda a Ribeira do Acaraú".
Não sabemos qual a profissão usada por Carrasco.
Provavelmente, como proprietário de terra, ocupou-se ele da
criação e da agricultura.
Aí pelos idos de 1712, Manoel Vaz Carrasco contraiu
núpcias, com d. Luíza de Sousa. Esta faleceu anos depois. E
Carrasco casou-se novamente com d. Maria Madalena de Sá e
Oliveira. Desse matrimônio houve 7 filhos, e entre estes, d. Brites
de Vasconcelos.
Vaz Carrasco, que tinha patente de Capitão, desfrutava de
conceito, nesta Ribeira. E depois de 80 anos de vida, faleceu, em
sua Fazenda Lagoa Seca, a 23 de novembro de 1753, sendo
sepultado na capela de Santa Cruz. Dona Maria Madalena de Sá e
Oliveira, faleceu a 14 de julho de 1758, e ali sepultada também.
Para corroboração e ampliação destas notas, vamos
transcrever, de História de Sobral, de D. José Tupinambá da Frota,
1.ª ed., págs. 87/88, o seguinte:

61
– "Manoel Vaz Carrasco, filho de Francisco Vas Carrasco
e d. Inez de Vasconcelos, veio, nos começos do século 18, para a
ribeira do Acaraú, onde era geralmente conhecido pelo Pai das Sete
Irmãs, das quais procedem muitas famílias de Sobral, Licania e
Acaraú.
Era natural de Recife e casou-se duas vezes: a 1.ª com D.
Luíza de Sousa, filha de Sebastião Leitão de Vasconcelos e de D.
Inez de Sousa; a 2.ª com D. Maria Madalena de Sá e Oliveira, viúva
de Francisco Bezerra de Menezes, e filha de Nicácio Aguiar de
Oliveira e de D. Maria Madalena de Sá.

Do 1.º matrimônio nasceram:

a) Manoel Vaz da Silva, que se casou duas vezes: 1.ª com


Maria Bezerra Montenegro, filha do Capitão Felipe Bezerra
Montenegro e de sua mulher D. Maria; 2.ª com uma sobrinha do
Padre Gonçalo, senhor do Engenho Mississipe.
b) D. Maria de Góes, casada com Nicácio de Aguiar
Oliveira, filha de outro Nicácio de Aguiar Oliveira e de D. Maria
Madalena de Sá.
c) D. Sebastiana de Vasconcelos, casada em Goiana, com
João Dias Galêgo, filho de Domingos Aguiar Oliveira e D. Inez
Montenegro.

Do 2.º matrimônio de Manoel Vaz Carrasco, nasceram:

a) Nicácio de Aguiar Oliveira, que se casou, na Freguezia


de Granja, com D. Micaela da Silva, filha de Tomaz da Silva Porto
e de sua mulher, D. Nicácia Alves Porto, donde vem a família
Porto, de Granja.
b) D. Maria Madalena de Sá e Oliveira, que se casou, no
sertão do Acaraú, com Francisco Ferreira Ponte, que foi Coronel

62
do Regimento de Cavalaria desta Ribeira. Era filho do Coronel
Gonçalo Ferreira Ponte e de sua mulher, D. Maria de Barros. Daí
procedem os Ferreira Ponte.
e) D. Inez Madeira de Vasconcelos, que se casou com o
Sargento-mor Antônio Alves, (Alvares) Linhares, filho do Capitão-
mor Dionísio Alves Linhares e de D. Rufina Alves Linhares, alibi
Rufina Gomes de Sá. Dionísio era português, natural de S. Marinha
de Linhares, do Arcebispado de Braga, e veio residir no Rio Grande
do Norte, Cavaleiro da Ordem de Cristo e por todos considerado
como de muito boa nobreza, o que confirma sua patente de
Capitão-mor, registrada no livro das Miscelâneas da Ouvidoria
Geral de Pernambuco, e descendente de uma nobilíssima família
portuguesa. Daí procedem os Linhares.
d) D. Rosa de Sá Oliveira, que se casou com seu parente
Capitão-mor José de Xerez Furna Uchôa, autor da Genealogia da
família Holanda Cavalcante, e do qual procedem muitas outras
famílias.
e) D. Ana Maria de Vasconcelos, que se casou com Miguel
do Prado Leão, natural de Goiana (de onde vem a família Prado, de
Sobral e Granja).
f) D. Brites Vasconcelos, que se casou, a 31 de julho de
1747, com o Capitão-mor José de Araújo Costa, que foi sogro do
Capitão Inácio Gomes Parente, português, natural de Lamêgo, e de
José Alves Linhares, filho de Antônio Alves Linhares. José de
Araújo Costa, residente em Acaraú, era natural de Santa Lúcia de
Barcelos, Arcebispado de Braga, em Portugal, e era filho de Pedro
de Araújo e de D. Maria de Sá".

***

Com alusão aos irmãos do Capitão Diogo Lopes de Araújo


Costa e a ele próprio, data vênia, transcrevemos de Cronologia

63
Sobralense, do Cônego Francisco Sadoc de Araújo, págs.
157/158/239, os seguintes apontamentos:
"1. Alferes Anselmo de Araújo Costa, que foi Vereador à
Câmara de Sobral, em 1780, c. c. Francisca dos Santos Xavier, filha
de Manoel Gomes Diniz e Josefa Maria dos Santos, a 30 de maio
de 1769. Anselmo faleceu a 13 de setembro de 1795.
2. Maria Madalena de Sá, c.c. seu primo legítimo Inácio
Bezerra de Menezes, filho de Gonçalo João Coimbra e Cosma
Melo de Moura, a 17 de abril de 1744. Inácio Bezerra faleceu a 21
de janeiro de 1781 e foi sepultado na capela de Santana.
3. Francisca de Araújo Costa, c.c. Inácio Gomes Parente,
filho de Manoel Gomes e Catarina Lopes, a 24 de novembro de
1777.
4. Ana Maria de Jesus, c. c. João de Sousa Xerez Uchoa,
filho de Luiz de Sousa Xerez e Ana Tereza de Albuquerque, a 15
de agosto de 1771.
5. Anastácia de Sá Araújo, c.c. João Francisco Perfeito.
6. Antônia Maria da Purificação, c.c. Paulo Joaquim de
Medeiros, filho de Domingos Alvares Magalhães e Clara da Silva
Medeiros, a 14 de fevereiro de 1778.
7. Rita Tereza de Jesus, c.c. o Capitão José Alvares
Linhares, filho de Antônio Alvares Linhares e Inez Madeira de
Vasconcelos, a 8 de julho de 1781.
8. Diogo Lopes de Araújo Costa, batisado a 22 de março de
1762, nascido no dia 3 do mesmo mês e ano, que faleceu solteiro,
mas com grande descendência. Dizem ter tido 35 filhos de sete
mulheres, dos quais 20 sobreviveram.
9. Maria da Encarnação, c.c. Bernardo Pereira de
Carvalho, filho de Tomás da Silva Porto e Nicácia Alves Pereira, a
14 de novembro de 1777.
10. Francisco Xavier de Sales, nascido a 13 de setembro de
1767,"

64
11. Maria Quitéria de Araújo, c.c. com seu primo Narciso
Lopes de Aguiar, a 25 de janeiro de 1796, na Matriz".

RELAÇÃO DOS FILHOS DO CAPITÃO


DIOGO LOPES DE ARAÚJO COSTA

1 – João Bento de Araújo Costa, Capitão da Guarda Nacional,


nascido em 1790, filho de Diogo Lopes e de Antônia Maria
do Rosário. Casado a 21 de janeiro de 1833, com Maria
Quitéria do Livramento Silva, na capela da Barra do
Acaracu, pelo Pe. José Gonçalves de Medeiros.
2 – Manoel de Araújo Costa, Capitão da Guarda Nacional,
nascido em 1799, filho de Diogo Lopes e de Maria
Rodrigues de Sousa. Casado a 9 de fevereiro de 1863, com
Raimunda Francisca do Nascimento, na Fazenda Lagoa
Seca, pelo Pe. Antônio Xavier Maria de Castro.
3 – Diogo Lopes de Araújo Costa Júnior, nascido em 1800,
filho de Diogo Lopes e de Maria Rodrigues de Sousa.
Casado a 21 de junho de 1821, na capela de Santa Cruz,
com Maria José da Conceição.
4 – Antônio de Araújo Costa, nascido em 1801, filho de Diogo
Lopes e de Maria Rodrigues de Sousa. Casado com Luiza
Mônica de Araújo.
5 – João de Araújo Costa, nascido em 1802, filho de Diogo
Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca. Casado a 6 de
fevereiro de 1832, com Maria José do Espírito Santo, na
capela de Santa Cruz, pelo Pe. Miguel Francisco Mendes
de Vasconcelos. Era Capitão da Guarda Nacional, nomeado
por decreto de 3 de abril de 1856.
6 – Lucas Lopes de Araújo Costa, nascido em 1803, filho de
Diogo Lopes e de Maria Rodrigues de Sousa. Casado a 8 de

65
maio de 1844, com Ana Joaquina de Jesus, na capela de
Santa Cruz, pelo Pe. João Francisco Dias Nogueira.
7 – Bernardino de Araújo Costa, nascido em 1805, filho de
Diogo Lopes e de Maria Rodrigues de Sousa. Casado a 8 de
agosto de 1829, com Maria do Livramento, na Ermida de
Santa Cruz, pelo Pe. José Gonçalves de Medeiros.
8 – Venâncio Meireles de Araújo Costa, nascido em 1806, filho
de Diogo Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca. Não se
casou. Era Capitão da Guarda Nacional, nomeado por
decreto de 14 de novembro de 1866.
9 – José Lopes de Araújo Costa. Tenente da Guarda Nacional,
por decreto de 3 de abril de 1856. Nascido em 1811, filho
de Diogo Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca.
10 – Félix de Araújo Costa, nascido em 1813, filho de Diogo
Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca. Casado a 21 de julho
de 1836, com Ana Donata de Araújo. Era Tenente da
Guarda Nacional, nomeado por decreto de 23 de abril de
1853.
11 – Raimundo Nonato de Araújo Costa, Tenente da Guarda
Nacional, por decreto de 21 de julho de 1872. Nascido em
1814, filho de Diogo Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca.
Casado a 8 de agosto de 1829, na Ermida da Barra do
Acaracu, pelo Pe. Bernardo Clemente da Cruz Oliveira.
12 – Antônia Balbina de Araújo, nascida em 1815, filha de
Diogo Lopes e de Maria Rodrigues de Sousa. Casada com
João Nepomuceno de Araújo Costa.
13 – Simplício de Araújo Costa, Alferes da Guarda Nacional,
por decreto de 3 de junho de 1872. Filho de Diogo Lopes e
de Maria Siciaca da Fonseca. Casado com Teresa Francisca
da Silveira, nascido em 1816.

66
14 – Inácia Sabina de Araújo Costa, nascida em 1817, filha de
Diogo Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca. Casada com
Antônio Dias da Silveira.
15 – Vicente Lopes de Araújo Costa, Alferes da Guarda
Nacional. Nascido em 1819, filho de Diogo Lopes e de
Maria Siciaca da Fonseca. Casado a 6 de setembro de 1844,
com Angélica Francisca da Silveira, na capela de Santa
Cruz, pelo Pe. João Francisco Dias Nogueira.
16 – Beatriz Geracinda de Araújo Costa, nascida em 1821. Filha
de Diogo Lopes e de Maria Siciaca da Fonseca. Casada com
Francisco Joaquim da Silveira, o qual era Tenente-Coronel,
Comandante do Estado Maior da Guarda Nacional, em
Acaraú, nomeado por decreto de 7 de julho de 1869.

DESCENDÊNCIA DO CAPITÃO
DIOGO LOPES

Temos, em vias de conclusão, um trabalho genealógico em


que relacionamos todos os descendentes do Alferes Vicente Lopes
de Araújo Costa (filho do Capitão Diogo Lopes com Maria Siciaca
da Fonseca), e de sua esposa, dona Angélica Francisca da Silveira.
Esses descendentes já se elevam a 3 523 pessoas.
Ora, se a descendência do Capitão Diogo Lopes, isto é, se a
proliferação dos 16 filhos reconhecidos como legítimos pelo
Capitão Diogo Lopes, for toda nesta base, a descendência do
eminente patriarca médico de Lagoa do Mato já está somando a
nada menos de 55 320 pessoas.

67
68
6

Referências ao
Capitão Diogo Lopes

69
70
REFERÊNCIAS AO CAPITÃO
DIOGO LOPES

"Outro homem não menos célebre foi o Capitão Diogo


Lopes de Araújo Costa, que nasceu na fazenda Lagoa Grande, no
ano de 1765, e veio a falecer em 1839.
"Nunca se casou, mas teve, de sete mulheres, 35 filhos, dos
quais sobreviveram 20, que constituem a família Araújo, uma das
mais numerosas e consideradas do município.
"O Capitão Diogo Lopes, no seu tempo, representou papel
saliente, como homem instruído. Sem ter frequentando a Academia
de Medicina exerceu, no entanto, com muito tino e inteligência, a
profissão de médico.
"Cego aos 60 anos, tinha, não obstante, na Lagoa do Mato,
lugar de sua residência, um hospital onde se tratavam doentes de
diferentes partes dos sertões desta e da Província do Piauí.
"Diz-se que ao apalpar o pulso de um doente, diagnosticava,
em seguida, a moléstia, e, pelo tratamento que lhe era dado, o
restituía a saúde.
"Seu nome corria por toda parte, cercado de respeito e
veneração.
"Ainda hoje as pessoas que o conheceram referem fatos
incríveis a respeito da experiência e conhecimento que tinha das
moléstias, afirmando que foram inúmeras as curas difíceis que
conseguiu fazer, de sorte que o seu hospital era ansiosamente
procurado, pela certeza do pronto restabelecimento.

71
"Entre as lendas com que se recria a imaginação popular,
houve esta: para o lado do Oeste há uma grande mata que se estende
desde a margem esquerda do Rio Acaraú até o rio da Tiaia, cerca
de 60 quilômetros de comprimento sobre 36 de largura.
"Um dia, um indivíduo da casa do Capitão Diogo Lopes,
andando à caça, internou-se na mata e perdeu-se.
"Depois de muito trabalho, conseguiu voltar à casa, e então
referia que tinha encontrado uma grande lagoa, na qual havia caça
em abundância, e de quando em vez ecoavam por ali os cantos mais
harmoniosos possíveis, que retinham a gente a ouvi-los por uma
eternidade.
"De lá trouxera, entre diversas flores que bordavam as
margens da lagoa, cada qual mais variada, cada qual mais
perfumosa, flores de água-pé.
"A essa notícia muitas pessoas procuravam e ainda
procuram a tal lagoa, pelo que passa como certo que ali existe uma
lagoa encantada."
(Antônio Bezerra – Notas de Viagem – Ed. de 1965,
págs. 371/372).

***

"Capitão José de Araújo Costa, casado com D. Brites de


Vasconcelos, e que residia na ribeira do Acaraú, natural de Santa
Lúcia de Barcelos, Arcebispado de Braga, em Portugal. Dentre os
filhos do casal figura Diogo Lopes de Araújo Costa, homem
notável pela sua perspicácia médica: Dizem as tradições que ele via
através das cores branca, encarnada, preta e azul. Dele se contam
curas incríveis; era um verdadeiro discípulo de Hipócrates,"

(Mário Linhares – Os Linhares – 2.ª Ed. págs.


21/22).

72
***

"Diogo Lopes de Araújo Costa (1765-1839). Não se casou,


porém houve, de sete mulheres, 35 filhos, dos quais 20
sobreviveram, constituindo as cepas da numerosa e considerada
família Araújo, da ribeira do Acaraú.
"Homem inteligente, consagrou-se à medicina popular,
grangeando grande prestígio no seio daquele povo abandonado de
assistência médica."
(Renato Braga – Dicionário Histórico e Geográfico
do Ceará – 1.ª ed., 2.º V. pág. 86).

***

"Diogo Lopes de Araújo Costa nasceu em 1765, na fazenda


Lagoa Grande. Largamente conhecido na ribeira do Acaraú, onde
exercia a medicina. Faleceu em 1839. Fez-se nome popularíssimo
e benquisto, por seus préstimos como conselheiro médico. Dele
refere Antônio Bezerra que não chegou a casar-se, mas teve, de sete
mulheres, 35 filhos, dos quais sobreviveram 20, que constituem a
família Araújo, uma das mais numerosas e consideradas do
Município."
(Antônio Martins e Raimundo Girão - O Ceará, 3.ª
ed., pág. 97).

***

"Diogo Lopes de Araújo Costa, batisado a 22 de março de


1762, nascido no dia 3 do mesmo mês e ano, que faleceu solteiro,
mas com grande descendência. Dizem ter tido 35 filhos de sete
mulheres, dos quais 20 sobreviveram."

73
Côn. Francisco Sadoc de Araújo – Cronologia
Sobralense, V. I, pág. 158).

***

"Diogo Lopes de Araújo Costa nasceu no lugar Lagoa


Grande, pertencente ao município de Acaraú, e viveu na localidade
de Lagoa do Mato, que até 1957 também pertenceu a este
município.
"Era filho do Capitão-mor José de Araújo Costa, português
de Santa Lúcia de Barcelos, e de Dona Brites de Vasconcelos, uma
das Sete Irmãs, das quais procede a maior parte das famílias que
vêm povoando o Vale do Acaraú, ao longo destes dois últimos
séculos.
"Em sua juventude, seu pai mandou-o estudar em Fortaleza,
onde esteve três anos. Então aumentou e aperfeiçoou seus
conhecimentos de medicina, e aprendeu a esgrima, arte que ele
muito apreciava.
"Durante meio século, Diogo Lopes, que tinha patente de
Capitão de Ordenanças, foi, sem dúvida, uma das maiores
personalidades aqui no município de Acaraú. Exercendo a arte de
curar, com espantosa inteligência, prestou assinalados serviços à
sua Comunidade. Mantinha um hospital, onde recebia e tratava,
gratuitamente, todos os seus doentes, segundo reza a tradição.
"Vários escritores têm se ocupado do Capitão Diogo Lopes.
O historiador Antônio Bezerra, em suas Notas de Viagem, afirma:
'O Capitão Diogo Lopes, em seu tempo, representou papel saliente,
como homem instruído. Seu nome corria por toda parte, cercado de
respeito e veneração.' O genealogista Mário Linhares, em seu livro
Os Linhares, também afirma: 'Dele se contam curas incríveis. Era
um verdadeiro discípulo de Hipócrates.’

74
"Mas não foi somente no setor de assistência médica que o
Capitão Diogo trabalhou em benefício da coletividade. Também na
esfera social e política ele teve grande influência, pois, não só de
Lagoa do Mato e Santa Cruz, porém igualmente daqui da então
Barra do Acaraú, muita gente acorria à casa do Capitão Diogo
Lopes, para debater problemas e resolver questões. E a sua palavra
experiente e sensata era sempre acatada.
"Tal era o seu prestígio político que, apesar de residir
distante da então Vila de Sobral quase cem quilômetros, chegou a
ser eleito Vereador por aquele município, cargo em que defendeu
muitos injustiçados.
"Entre os Vereadores eleitos para a Primeira Câmara do
município de Acaraú, figuraram quatro filhos do Capitão Diogo
Lopes.
"Assim, pela exposição feita, a Câmara Municipal de
Acaraú, outorgando o nome do Capitão Diogo Lopes de Araújo
Costa a uma rua desta cidade, presta uma justa homenagem à
memória de um de seus filhos que mais se destacaram na vida
política social do município, e que, com seu trabalho, seus
conhecimentos e sua dedicação, prestou reais benefícios ao povo
desta zona."
(Vereador Antônio Raimundo de Araújo Neto –
Exp. de Motivos anexa ao projeto de lei, dando o
nome de Capitão Diogo Lopes a uma rua da cidade
de Acaraú).

***

"Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, um dos nomes mais


conhecidos desta Região, em seu tempo. Exerceu, com
proficiência, a profissão de médico e foi chefe da numerosa família
Lopes Araújo."

75
(Santa Cruz – De Prédio Rústico a Cidade, pág.
128).
***

"Viveu, outrora, nos tabuleiros de Acaraú um famoso


curandeiro de nome Diogo Lopes de Araújo Costa. "Grangeou
fama de curandeiro, com escala, depois, para doutor instruído.
Fazia curas admiráveis. Na fazenda Lagoa do Mato, onde
estabeleceu moradia, vasta e hospitaleira, fundou até hospital, onde
atendia muita gente, vinda até dos longínquos sertões do Piauí.
"Foi venerado, pois tinha um poder sobrenatural para curar
os enfermos. Não podia ver o doente. Davam-lhe o pulso deste, e o
famoso Capitão Diogo, ao sentir as pulsações, conhecia o mal que
atormentava o paciente. Passava medicação e, com poucos dias,
estava o doente capaz de outra."

(Anuário do Ceará, de Valdery Uchôa. Ed. de 1953,


pág. 24).
***

"Diogo Lopes de Araújo Costa, solteiro, residente na


Fazenda Lagoa do Mato, termo da Barra do Acaracu, onde residiu
toda sua vida, chegando a ter 7 mulheres, com 35 filhos,
constituindo estes a grande família ARAÚJO, uma das mais
consideradas do termo da Vila de Acaracu. Sem estudar medicina,
teve a profissão de médico, conservando ao pé de sua residência
um Hospital no qual recebia, à sua custa, todos os doentes que
procuravam tratamento."

(Genealogista Luiz Coelho de Vasconcelos).

***

76
"Nos seus primórdios, Acaraú ganhou fama também por
conta de dois tipos populares que gozavam de extraordinário
prestígio em todo o Estado e nos vizinhos: João Saldanha Marinho
e Diogo Lopes de Araújo Costa.
..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... .....
"Capitão Diogo, o outro curandeiro, ainda tinha maior
conceito. Vinha gente de toda parte e para curar toda espécie de
doenças. Consta que Capitão Diogo apenas pegava no pulso do
doente, passava-lhe um remédio e, pronto, logo a pessoa ficava boa
e sã."
(Anuário do Ceará, de Dorian Sampaio, Ed. de
1976, pág. 30).

***

Acreditamos que muitas outras referências foram dadas à


publicidade por aí, ao longo destas duas centúrias, sobre o Capitão
Diogo Lopes de Araújo Costa. E muito nos agradaria o haver
conseguido todas elas, que seriam de real proveito, não só para
identificar, cada vez mais, a sua pessoa, mas também para valorizar
este modesto esboço biográfico.
Todavia, o tempo e o campo de ação de que pudemos
dispor, para a referida incumbência, foram relativamente escassos.
De tal modo que apenas uma dezena de apreciações nos é possível
oferecer aos leitores porventura interessados no assunto, se os
houver.

CAPITÃO DIOGO LOPES É NOME DE RUAS

Por força da Lei n.º 142, a cidade de Bela Cruz deu a uma
de suas ruas centrais o nome do Capitão Diogo Lopes em data de
26.11.1956.

77
Igual gesto teve a Câmara Municipal de Acaraú, que
também outorgou o nome do Capitão médico de Lagoa do Mato a
uma rua central desta cidade. O respectivo projeto foi apresentado
pelo jovem Vereador Antônio Raimundo de Araújo Neto, e que
obteve aprovação unânime de todos os membros daquela casa de
legislação municipal. E, por isto mesmo, foi convertido em lei, que
tomou o número 530/1976.
Desta maneira, são dois municípios que, pelos seus
legítimos representantes, tornaram público seu reconhecimento a
um conterrâneo que consagrou sua existência a serviço de sua terra
e de sua comunidade.
E esta atitude dos poderes públicos de Acaraú e de Bela
Cruz se reveste de mais elevada significação, porque é tomada nada
menos de dois séculos após o trabalho e a atuação do Capitão Diogo
Lopes de Araújo Costa, em benefício de seus semelhantes.

78
7

Lembranças do
Capitão Diogo Lopes

79
80
LEMBRANÇAS DO CAPITÃO
DIOGO LOPES

Quase todos os povos guardam suas tradições.


E diz Coelho Neto que "povo sem tradição é como árvore
sem raiz".
É por isto, provavelmente, que, nesta região do Vale do
Acaraú, ainda se relatam ocorrências ligadas à vida e ao trabalho
do Capitão Diogo Lopes de Araújo Costa, já como médico, já como
criatura extraordinária. Casos que teriam acontecido, apresentando
aquele homem como detentor de uma estupenda inteligência, e
possuidor de qualidades de autêntico vidente, inclusive capacidade
de perceber coisas fora do alcance dos cinco sentidos comuns da
pessoa humana.
Referimos, em seguida, algumas entre as muitas estórias
que se contam, vividas pelo grande líder de Lagoa do Mato.
Algumas incríveis, mas que a tradição vem conservando há mais
de dois séculos, de modo que muita gente ainda relata por aí. Vão
aqui, portanto, para recreação dos leitores porventura interessados
no assunto.

CHOROU NO VENTRE MATERNO

Uma semana antes do nascimento de Diogo Lopes, seu pai


e sua mãe dormiam na alcova matrimonial, e, no meio da noite,

81
acordaram ouvindo um choro de criança, como se fosse no cômodo
vizinho.
E grande foi o seu espanto, ao constatarem que, quem
chorava, e ainda no ventre materno, era o futuro médico de Lagoa
do Mato.

RECONHECEU SUA PRIMEIRA CAMISA

Dona Brites Vasconcelos, mãe de Diogo, tal como muitas


mães ainda o fazem, costumava guardar e conservar, marcadas, as
primeiras camisas de seus guris.
Pois bem: quando Diogo contava apenas dois anos, certo
dia sua mãe abriu, à sua vista, um baú de roupas. E ele, rápido,
apanhou uma pequena vestimenta, exclamando: Esta é minha
primeira camisa! E era, exatamente, a primeira camisa que Diogo
vestira.
Coincidência ou não, o fato é que dona Brites ficou
profundamente impressionada. Mesmo porque já vinha notando a
precoce inteligência do guri.

O ESCRAVO DE CONFIANÇA

Uma certa manhã, chegou à casa do Capitão Diogo Lopes


uma doente que vinha da Província do Piauí. Era uma jovem e
viajava em uma liteira. O cavalo da frente era montado por um
escravo de confiança do pai da moça, que ladeava a cadeirinha,
montando também um belo cavalo.
Feitos os cumprimentos, o pai da enferma, que já havia
consultado alguns médicos, sem obter resultado, expôs, para Diogo
Lopes, os sintomas da moléstia de sua filha.

82
Capitão Diogo, depois de tomar o pulso à jovem, fitou,
demoradamente, o escravo, e falou para o pai da doente: – Tenha
paciência, meu amigo. A vida da gente é cheia de surpresas, em sua
maioria desagradáveis. A doença de sua filha é apenas uma
gravidez recente.
– Não é possível, protestou o pai, vivamente contrariado.
Ao que Diogo Lopes adiantou: – É possível e é verdade. De minha
parte eu lamento sinceramente. Tanto mais, quando o autor do
crime é exatamente este seu escravo de confiança.
O pai da moça, então, quase fora de si, interrogou o escravo,
o qual, embora tremendo da cabeça aos pés, confessou tudo.
O homem retirou um clavinote que trazia preso à sela, e
preparava-se para atirar no escravo, quando o Capitão Diogo falou,
com autoridade:
– Não, senhor! Nesta casa nunca se praticou um crime. E eu
não consinto que o senhor o faça agora. Para punir os criminosos,
existe a Justiça. E Nosso Senhor disse: – Não matarás. Demore aqui
um pouco.
Em seguida, entrou em um quarto ao lado, de onde saiu, daí
a instantes, ostentando as insígnias de Capitão de Ordenanças e
trazendo ao cinto uma espada aparelhada de prata. Falou, então,
para o escravo criminoso: – Esteja preso, em nome da Lei. A seguir
escreveu um ofício à autoridade competente, em Sobral,
encaminhando o escravo.
Teve, então, sábias palavras de conforto e orientação para a
jovem e seu pai, que dali saíram mais ou menos conformados.

O PRESENTE DO CEL. GALVÃO

Certa vez, chegou à casa do Capitão Diogo um rico


fazendeiro, vindo de Crateús, o Cel. Vicente Cavalcante Galvão.

83
Trazia um filho gravemente enfermo. Era um jovem de 20 anos, e
que tinha uma banda morta. Isto é, um lado inteiro estava sem
movimentos, há vários meses.
O Cel. Galvão contou, então, a luta que até aí tivera, à
procura de remédios para o filho hemiplégico, sem obter resultado.
Após ouvir tudo e apalpar o pulso do doente, Diogo Lopes
diagnosticou congestão (hoje seria derrame). E adiantou que o
moço teria de ficar hospitalizado, pois o tratamento seria longo.
Entretanto, depois de quinze dias, o jovem estava restabelecido.
Tanto que viera em uma liteira e voltava montando um fogoso
cavalo.
No dia seguinte, o doente recebeu alta, e o Cel. Galvão disse
ao médico de Lagoa do Mato que pedisse quanto quisesse, pela cura
do filho. Diogo Lopes, porém, respondeu que ele nada lhe devia,
pois não exercia a medicina por pagamento.
Galvão, então, desfez-se em agradecimentos e foi embora.
Passaram-se os dias. E duas semanas depois, parou à porta
do Capitão Diogo Lopes um carro, puxado por três belas juntas de
bois, todos de uma cor só, transportando vinte queijos de quinze
quilos cada um.
Acompanhavam o carro dois escravos do Cel. Galvão, o
qual enviara aquele presente para o médico de seu filho. Uma carta
do Cel. renovava seus agradecimentos ao Capitão de Lagoa do
Mato, pelos favores recebidos, quando ali estivera, com o filho
enfermo.
O Capitão Diogo mandou então guardar os queijos e
convidou os escravos para ficarem até o dia seguinte, enquanto
tratavam dos bois, para o regresso, pois a viagem era muito longa.
Entretanto, os mensageiros do Cel. Galvão responderam
que a oferta constituía-se de tudo: – o carro, os bois e os queijos.

84
NATAL CHUVOSO

Como era costume, todos os anos, o Capitão Diogo Lopes


ia assistir à Missa de Natal, na capela da Barra do Acaraú. E sempre
se fazia acompanhar de uma meia dúzia de amigos.
Pois bem: naquele ano, como nos anos anteriores, o velho
patriarca de Lagoa do Mato ajustara a viagem. E, à hora marcada,
lá ia ele, com alguns companheiros, a caminho da Barra, para a
tradicional Missa do Galo. A noite estava esplendida. O céu,
inteiramente limpo, onde a lua, em plenilúnio, ostentava sua
maravilhosa brancura, numa belíssima apoteose à maior noite da
cristandade. Era o caso de a gente cantar, como Catulo da Paixão
Cearense:
"Não há, oh! gente. Oh! não,
luar como este do sertão".

Entretanto, ao atingirem o lugar Taboleirinho, Capitão


Diogo recomendou: – Apressemos nossos cavalos, porque dentro
de uma hora teremos chuva grossa. Alguns duvidaram, porque, na
verdade, o céu em nada justificava aquela profecia. Sucedeu,
porém, que, antes mesmo que chegassem à Barra, caiu uma chuva
pesada, deixando todos muito bem molhados e justamente
maravilhados ante aquele homem extraordinário que conseguia
desvendar os segredos da Natureza.

O ESGRIMISTA NOTURNO

Consoante informamos, em capítulo anterior, o Capitão


Diogo Lopes, muito cedo, aprendeu a jogar espada. E o fazia com

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admirável perícia, mesmo porque era um devotado admirador da
esgrima.
Tanto isto é verdade que, quando tinha seis filhos com idade
de quinze anos acima, contratou um mestre de esgrima, para
ensinar a todos o jogo da espada.
O mestre veio de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção
e começou as instruções. No entanto, um dos moços, no caso o
Bernardino, não quis participar dos exercícios. Limitava-se a
assistir às aulas.
E aconteceu que, uma certa noite de lua muito clara, o
Capitão Diogo viajava, sozinho, de Santa Cruz para Lagoa do
Mato. E na altura das "Pedras Grandes" saiu-lhe ao encontro um
homem mascarado, que, fincando uma espada no chão, desafiou-o
para jogar a esgrima.
Diogo Lopes, que era homem de coragem a toda prova, não
hesitou: atou seu cavalo a uma carnaubeira, fincou sua espada
diante da outra e recuou a distância de praxe, o mesmo fazendo seu
estranho adversário. Em seguida, avançaram, tomaram das espadas
e começaram a luta. Capitão Diogo era famoso na arte de jogar
espadas, mas o contendor defendia-se com extraordinária destreza
dos sucessivos golpes que lhe eram arremessados. O velho Capitão
estava surpreendido, porque o adversário não ousava atacar.
Apenas defendia-se. Assim, depois de uma hora de luta, Diogo
Lopes declarou-se vencido, fincando sua espada no chão. E esperou
a ação do adversário. Este, entretanto, desapareceu no meio do
denso carnaubal.
Em casa, Diogo Lopes contou o ocorrido. Mas ninguém
sabia explicar o estranho fato. Notaram, porém, a falta de
Bernardino. Seria ele? Mas ele nem sequer tomara parte nas aulas
de esgrima! E nem se atreveria a tanto. Todavia, o Capitão
lembrava-se, agora, que, na estatura e nos gestos de seu contendor,
notara algo que não lhe era desconhecido. Um pouco mais tarde,

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Bernardino vinha entrando, por uma porta dos fundos, quando o
Capitão, que o esperava, interrogou-o sobre o ocorrido. Bernardino
ajoelhou-se aos pés do pai e confessou ser ele o misterioso
esgrimista, pedindo perdão de sua audácia. Esclareceu que queria
apenas mostrar ao pai que aprendera a jogar espadas, sem participar
das aulas.
Diogo Lopes, em vez de punir o filho, mandou contratar
uma orquestra e fez uma festa em sua homenagem. Isto porque
nunca encontrara outro adversário que o tivesse vencido no jogo da
espada.

O MENINO DA SECA

Estávamos no ano fatídico de 1793. A seca grassava,


terrível, desde 1790, mostrando "os campos desnudados de folhas
e flores, devastados pela soalheira; mostrando as árvores
esqueléticas e o dorso nu da terra causticada por um sol de fogo; o
céu lavado de uma luz faiscante, crua como o desengano,
parecendo uma fornalha gigantesca, onde se elabora o incêndio
pavoroso do mundo; a fome e a peste semeando cadáveres nas
casas, nas estradas e nos matos", como diria o Pe. Valdivino No-
gueira.
Diogo Lopes, embora tivesse "a alma feita das energias
possantes desta maravilhosa natureza ambiente", era, antes de tudo,
um homem generoso e magnânimo, em cujo peito pulsava um
coração afetuoso, sempre aberto para acolher e partilhar do
infortúnio dos outros. E, por isto mesmo, ele compreendia e sentia
o angustioso drama dos infelizes flagelados da seca. De tal modo
que sua casa era ponto de pousada de grande número de retirantes,
que ali encontravam sempre mãos amigas que lhes proporcionavam

87
os meios de tornar menos penosa a sua situação de miséria.
Retirantes que se dirigiam à praia, buscando sobrevivência na
beira-mar, onde era grande a fartura de caranguejos, sururus e
peixes diversos.
Pois bem: Capitão Diogo viajava para a povoação de Santa
Cruz, em companhia de seu irmão Francisco Xavier. Ao chegarem
ao lugar Pedras Grandes, ergueu ele a cabeça, fez parar seu cavalo
e falou: Alguma coisa me convida para aquela pedra. E apontou
uma enorme pedra distante uns 50 metros do caminho. Ali
chegando, encontraram um menino de uns dois anos de idade,
deitado sobre umas palhas de carnaúba. A criança, esquelética,
estava ali, deixada por estranhos ou mesmo por algum pai
desnaturado e brutalizado pela miséria e pela fome. Formigas e
moscas pousavam, famintas, no corpo do infeliz pequeno.
E Francisco Xavier viu, então, Diogo Lopes, homem forte,
quase a chorar ante aquele pequenino retirante, faminto e
abandonado. E o Capitão, muito cuidadosamente, tomou o
menininho, levou-o para sua casa, onde acabou de criar.

A SOLITÁRIA

Capitão Diogo foi visitar um compadre, em Fortaleza, tendo


feito a viagem por terra, com grande dificuldades, é claro. Viajou,
talvez, pelo "estirão pouco frequentado que cortava os povoados de
Siupé, Trairi e Almofala", de que fala Carlos Studart Filho, em
Páginas de História e Pré-História, pág. 161.
Recebido cordialmente pelo pessoal da casa, seu compadre
mandou uma sua filha cantar ao piano, para o patriarca de Lagoa
do Mato. Entretanto, Diogo, ao ouvir a voz da jovem, falou para o
amigo: – Sua filha está doente, compadre. Em seguida, tomou o

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pulso da moça e diagnosticou: – Uma solitária está minando seu
organismo. Tome cuidado. O compadre, justamente alarmado,
perguntou o que deveria fazer, ao que Diogo Lopes respondeu que
poderia curá-la, embora o tratamento fosse um tanto rigoroso.
Com o consentimento do compadre, o médico improvisado,
pela manhã, mandou a doente comer um pedaço de carne seca,
assada, e bem salgada. Em seguida trancou a moça em um quarto e
guardou a chave.
Poucos minutos depois, a doente começou a pedir água,
porque a sede a devorava. Diogo Lopes, entretanto, sentenciou que
ela teria de ficar dez horas sem beber; assim era preciso para sua
saúde. Em pouco, a doente chorava de sede. Mãe e irmãs também
choravam. E o compadre, vez por outra, passava o lenço nos olhos.
Mas era indispensável observar o regime imposto pelo doutor.
Destarte, dez horas depois, Capitão Diogo muniu-se de uma
laçada feita de fio de lã; mandou que a doente abrisse bem a boca,
mandou aproximar desta uma tigela de leite fresco, e esperou,
atento, segurando a laçada. Algum tempo depois, a tênia, impelida
pela falta d'água e atraída pelo cheiro do leite, mostrou a cabeça
que Diogo prendeu com a laçada. E foi puxando vagarosamente,
com admirável habilidade. E, como num passe de mágica, a
solitária, que media uns seis metros, foi retirada, inteirinha, do
estômago da jovem paciente.
Agora, falou Diogo Lopes, resta alimentar
convenientemente a menina, para que ela readquira a energia
perdida. No dia seguinte, ao despedir-se do Capitão que regressava
a Lagoa do Mato, a moça presenteou-o com um bolo muito bem
embalado, pedindo-lhe que o partisse somente em sua casa, pois
fora preparado para durar muitos dias. E quando, à hora da
merenda, em sua residência, Diogo Lopes mandou partir o bolo,
encontraram dentro dele moedas de prata e ouro.

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UMA CONSULENTE EQUINA

Entre os doentes que, de diversos pontos do Ceará, e até de


Províncias vizinhas, procuravam o hospital do Capitão Diogo
Lopes, muitos vinham da então vila de Sobral, onde, por isto
mesmo, havia um médico que lhe tinha inveja e lhe queria mal.
Especialmente porque Diogo lhe fazia concorrência, sem nada
cobrar dos consulentes.
Certo dia, o tal médico chamou um seu empregado, mandou
encher um vidro com urina de uma besta, e instruiu o mesmo
empregado para vir a Lagoa do Mato. Diria, então, que sua esposa
estava sofrendo dos rins e rediria um exame de urina e o respectivo
remédio, em virtude de sua mulher não estar em condições de fazer
a viagem.
O médico dizia: – Vou desmascarar aquele charlatão.
Nunca mais ele terá o atrevimento de receitar ninguém.
Capitão Diogo, depois de cuidadoso exame da urina, em
presença do consulente, perguntou-lhe: Esta urina é mesmo de sua
esposa? Ao que o homem respondeu: – É de minha esposa, pois
não.
Foi então que Diogo Lopes sentenciou: Pois o senhor queira
desculpar, mas a dona desta urina, no próximo mês de novembro,
dará à luz um poltro alazão, dos quatro pés brancos, que será um
bom cavalo de sela.
Aí o consulente pediu perdão ao Capitão, pela brincadeira,
e confessou quem o mandara fazer. Voltando a Sobral, contou o
ocorrido. O médico, então, apressou-se a escrever a Diogo Lopes,
desculpando-se da maldade que praticara. Em seguida, comprou a
besta, a qual, em novembro, pariu um poltro, com as cores previstas
pelo esperto veterinário de Lagoa do Mato.

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A ROMARIA

Consoante se tem escrito e a tradição ainda assevera, o


Capitão Diogo Lopes via perfeitamente através das cores
encarnada, branca, preta e azul, fato que aliás muito o contrariava.
É que ele olhava uma senhora trajada com uma dessas
cores, e era como se ela estivesse completamente despida. E Diogo,
apesar da vida que levara, neste tocante, não era um degenerado,
absolutamente. Ao contrário, possuía profundos sentimentos de
moral.
Pois bem: no ano de 1820, o Capitão Diogo realizou uma
romaria à capela de Santa Cruz. E ali, humildemente ajoelhado ante
o altarzinho da Virgem da Conceição, aquele homem excepcional,
firme na sua fé e na sua confiança, fez uma fervorosa prece,
suplicando que lhe fosse retirada a faculdade de enxergar através
das cores, ou lhe fosse retirada a visão.
Regressou à sua casa, cheio de esperança de que seria
atendido no pedido feito. E, sem que se soubesse como, dentro de
15 dias, estava completamente cego. Cegueira que ele nunca
deixou de bendizer.

INVERNO EM OUTUBRO

Diogo Lopes já estava cego. Naquele dia, ainda permanecia


em seu quarto de dormir, quando seu filho João de Araújo Costa
pediu-lhe permissão para vir à Barra do Acaraú, pois era este o
nome que tinha, naquele tempo, a nossa querida cidade.
O Capitão perguntou: – E as peles de cabras e caitetus? Vai
levá-las para vender? João respondeu que não, pois ainda não
estavam completamente secas. Deixá-las-ia ao sol.
– Guarde-as, recomendou Diogo Lopes, porque dentro de
três horas vai cair muita chuva.

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Estávamos, então, no mês de outubro. No céu não se via
uma nuvem. Mas, algumas horas depois, nevoeiros começaram a
levantar-se ao nascente. E, precisamente, às dez horas, em toda
aquela redondeza caiu uma pesada chuva que fez correr, com força,
o Córrego de Lagoa do Mato.

A PEDRA DE ASSENTO

Tal como já tivemos oportunidade de afirmar, o Capitão


Diogo Lopes era dono de uma extraordinária perceptibilidade. Sua
agudeza de sentidos era realmente assombrosa.
Pois bem: desde a construção de sua casa residencial, em
Lagoa do Mato, uma pedra arredondada, com mais ou menos um
metro de diâmetro, fora colocada junto à porta principal, do lado
externo. E depois que perdeu a visão, todos os dias, pela manhã, o
Capitão sentava-se alguns minutos, sobre aquela pedra.
Pessoas amigas, querendo experimentar sua pasmosa
faculdade de percepção, certo dia puseram uma folha de papel sob
a pedra.
E quando, na manhã seguinte, Diogo Lopes sentou-se,
notou, e disse: – O céu baixou ou a terra subiu alguma coisa, pois
estou sentindo a pedra mais alta.
Mencionada pedra é hoje conservada, com muito carinho,
pelo compositor, escultor e desenhista João Venceslau Araújo,
bisneto do Capitão Diogo Lopes, e que reside na cidade de Bela
Cruz.
***

Em alfarrabios do nosso avô, Alferes Vicente Lopes de


Araújo Costa, (filho do Capitão Diogo Lopes), foram encontrados
os versos transcritos a seguir, e que o povo de Lagoa do Mato
cantava, em louvor ao velho médico sem diploma:

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"Capitão Diogo Lopes
É homem muito ciente.
Homem que veio do céu
para dar saúde à gente.

Da Granja, do Piauí,
Da Imperatriz, de Sobral.
Vêm doentes todo dia,
Procurar seu Hospital.

O doente chega aqui


Sofrendo, desenganado,
E depois de poucos dias
Volta prá casa curado.

Capitão Diogo Lopes


Tem muito bom coração
Vive aqui em nossa terra
Curando todo cristão."

*
FONTES DE CONSULTAS

Antônio Bezerra – Notas de Viagem – 1965


Os Linhares – Mário Linhares – 1954
História de Sobral – Dom José Tupinambá da Frota – 1974
Cronologia Sobralense – Cônego Francisco Sadoc de Araújo
Dicionário Histórico e Geográfico do Ceará – Renato Braga –
1964
Martins Filho e Raimundo Girão – O Ceará – 1966
Inácio Ribeiro Pessoa – Município de Santana – 1928

93
Nicodemos Araújo – Bela Cruz – de Prédio Rústico a Cidade –
1967
Secretaria de Cultura – Sesmarias Cearenses – 1971
Nicodemos Araújo – Município de Acaraú – 1971
Arquivo da Cúria Diocesana de Sobral
Arquivo da Prefeitura de Acaraú
Arquivo da Paróquia de Acaraú
Arquivos dos Cartórios de Acaraú
Arquivo do Genealogista Luiz Coelho de Vasconcelos
Arquivo de José Maria Silveira
Arquivos da Família Lopes Araújo
Manuscritos Diversos

94
ÍNDICE

Falando ao leitor................................................................................... 13

1 – O Homem........................................................................................ 15

2 – O Político........................................................................................ 33

3 – O Médico......................................................................................... 41

4 – Capela de Santa Cruz..................................................................... 53

5 – Ascendentes e Descendentes do Capitão Diogo Lopes................. 57

6 – Referências ao Capitão Diogo Lopes............................................. 69

7 – Lembranças do Capitão Diogo Lopes............................................. 79


Composto e Impresso na Imprensa Universitária
da Universidade Federal do Ceará, Avenida da
Universidade, 2932 Fortaleza Ceará

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