Dissertação de Mestrado - Ana Luísa Fernando-1

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

A Tutela Indemnizatória dos Nascituros Já Concebidos à Luz


da Dogmática Comum da Responsabilidade Civil

Ana Luísa Teixeira Neves Pereira Fernando

Mestrado em Direito

Faculdade de Direito | Escola do Porto


2019
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

A Tutela Indemnizatória dos Nascituros Já Concebidos à Luz


da Dogmática Comum da Responsabilidade Civil

Ana Luísa Teixeira Neves Pereira Fernando

Dissertação de Mestrado em Direito, elaborada


sob orientação científica do Exmo. Professor
Doutor José Carlos Brandão Proença.

Faculdade de Direito | Escola do Porto

2019
“Nós, seres humanos, somos contadores de histórias inatos e
gostamos imenso de contar histórias sobre o início das coisas.
Temos um êxito razoável quando se trata de amor ou de traição,
temas excelentes para histórias que falem de origens. O mesmo não
acontece quando nos viramos para a profundidade do mundo
natural. Como começou a vida? Como surgiram as mentes, os
sentimentos ou a consciência? Quando apareceram os
comportamentos sociais e as culturas? De repente, tudo se complica.
Quando o laureado físico Erwin Schroedinger se virou para a
biologia e escreveu a obra clássica “O Que É a Vida?” note-se que
não a intitulou «As “Origens” da Vida». Schroedinger reconheceu
a armadilha.”

ANTÓNIO DAMÁSIO, A Estranha Ordem das Coisas


AGRADECIMENTOS

Uma dissertação, apesar do processo solitário a que qualquer investigador está


fadado, reúne contributos que não devem deixar de ser realçados.

O meu mais sentido agradecimento é dirigido à minha Mãe, pelo incentivo e


paciência infindáveis e pelo sacrifício reconhecido em proporcionar-me as melhores
condições para que pudesse singrar, pessoal e academicamente. Sei do orgulho que tem em
ver-me fazer mais e melhor, e a ela devo tudo.

À minha tia, primeira referência com que tive contacto enquanto magistrada judicial
de reconhecida competência, cuja sagacidade e trabalho afincado me fazem querer seguir os
seus passos. Agradeço-lhe o tempo, nunca regateado, que me cedeu, o conhecimento e a
prudência jurídicas que me transmitiu.

À minha “segunda família”, que a é de coração, de Viana do Castelo e da Póvoa de


Varzim, por serem modelos de perseverança e pelo apoio e amizade demonstrados ao longo
de todo este percurso, além do constante estímulo intelectual e emocional.

Às minhas colegas e amigas de faculdade, companheiras de todas as horas, por


partilharem comigo todas as conquistas e frustrações que pautaram este nosso affaire com
o Direito – sem vocês não teria sido tão gratificante.

Ao Professor Doutor Brandão Proença, pela prestimosa colaboração e orientação


facultadas. Uma referência incontornável enquanto jurista de excelência e inexcedível na
qualidade de Professor, julgando pelo que tive a sorte de presenciar. As notas dominantes
da sua orientação foram a utilidade das suas recomendações e a cordialidade com que me
recebeu. Estou grata por ambas, assim como pela liberdade de ação que me concedeu e que
foi decisiva para que este trabalho contribuísse efetivamente para o meu amadurecimento
académico.

Por fim, à Escola de Direito do Centro Regional do Porto da Universidade Católica


Portuguesa, e mais especificamente aos docentes do Mestrado em Direito Privado que me
acompanharam neste ciclo de estudos, agradeço a inspiração académica e a dedicação
comprovada em propiciar uma formação universitária de qualidade superior.

A todos, enfim, reitero o meu apreço e a minha gratidão.


RESUMO

A possibilidade de atribuição de direitos, de variadíssima índole, aos nascituros


decorre já do panorama vigente de direito positivo, expondo questões relacionadas com o
momento da génese da vida humana, a articulação entre os conceitos de ‘personalidade’ e
de ‘capacidade’ jurídica, a própria qualificação conceitual do nascituro enquanto elemento
do tráfego jurídico e as implicações legais desse mesmo reconhecimento.
Quando apreciada à luz da responsabilidade civil, a temática, que divide opiniões na
doutrina e gera decisões jurisprudenciais contraditórias, ganha renovados contornos,
exigindo uma análise cuidada do instituto enquanto expediente adequado para a reparação
do dano que possa advir de uma qualquer interação lesiva com o nascituro.
Neste estudo, propomo-nos a refletir acerca dos recursos jurídicos de que dispomos
para acautelar este estado mais vulnerável do desenvolvimento da pessoa humana, tecendo
críticas acerca dos potenciais regimes a aplicar e cogitando sobre soluções desejáveis a
adotar, tendo em vista uma proteção abrangente da vida pré-natal.

PALAVRAS-CHAVE: responsabilidade civil; nascituro; indemnização; personalidade


jurídica; dano;

ABSTRACT
The possibility of granting rights, of various kinds, to unborn children already
derives from the prevailing panorama of positive law, exposing questions related to the
moment of the genesis of human life, the articulation between the concepts of legal
personality and legal capacity, the conceptual qualification of the unborn child as an
element of legal interactions and the judicial implications of that same recognition.
When considered in the light of Civil Liability, the theme, which divides opinions
in the doctrine and generates contradictory jurisprudential decisions, earns renewed
outlines, requiring a careful analysis of the institute as an appropriate remedy for the
repair of the damage that may arise from any harmful interaction with the unborn child.
In this study, we propose to reflect upon the statutory resources at our disposal to
safeguard this most vulnerable condition of human development, criticizing the potential
legal frameworks to be applied and considering desirable solutions to be pursued, bearing
in mind a comprehensive protection of prenatal life.

KEYWORDS: Tort Law; unborn child; indemnity; legal personality; damage;


6
ÍNDICE

1. CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS .............................................................................................. 10


2. ENQUADRAMENTO LEGAL E CONSIDERAÇAÕES GERAIS ACERCA DO ESTATUTO DO
EMBRIÃO ................................................................................................................................................. 11
2.1. ALUSÃO À DISTINÇÃO TERMINOLÓGICA ENTRE “NASCITURO” E
“CONCEPTURO” ……….…….............................................................................................. 13
2.2. A PROTEÇÃO DA VIDA PRÉ-NATAL NOS INSTRUMENTOS LEGISLATIVOS
PRESENTES NO ORDENAMENTO JURÍDICO PORTUGUÊS – DO ARTIGO 66.º DO
CÓDIGO CIVIL E DO ARTIGO 24.º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
PORTUGUESA AO DISPOSTO NO ARTIGO 2.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS
DIREITOS DO HOMEM……………………………………………………………….….. 13
2.3. PERSONALIDADE VS. CAPACIDADE JURÍDICA – A PEDRA DE TOQUE NA
AFERIÇÃO DA VIABILIDADE DA TUTELA INDEMNIZATÓRIA………………….. 18
3. O QUADRO JURÍDICO GLOBAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL LIGADA AOS
NASCITUROS CONCEBIDOS ....................................................................................... 20
3.1. IDONEIDADE DO INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL ......................... 20
3.2. ENQUADRAMENTO NO ÂMBITO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DELITUAL OU
OBRIGACIONAL – A QUESTÃO DA CONTRATUALIZAÇÃO ............................ 24
3.3. VISÃO SUMÁRIA DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
SUBJETIVA……………………………………………………………………….………... 27
3.3.1. DO FACTO ILÍCITO, DA CULPA, DO DANO E DO NEXO DE
CAUSALIDADE………………………………………………………………………………….. 27
3.4. DA QUESTÃO DO DANO DA MORTE DO NASCITURO JÁ CONCEBIDO .......... 32
3.5. O CASO MAIS ESPECÍFICO DA POSSÍVEL APLICAÇÃO DO ARTIGO 496.º, 3 DO
CÓDIGO CIVIL À COMPENSAÇÃO POR MORTE DO PROGENITOR…………….. 35
CONCLUSÕES………………………...……………………………………………. 37
BIBLIOGRAFIA E LISTAGEM DE JURISPRUDÊNCIA……………...………………… 41

7
ABREVIATURAS

AAFDL – Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa


Ac./Acs. – Acórdão(s)
Art./Arts. – artigo(s)
BFDUC – Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
BGB - Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil alemão)
BMJ – Boletim do Ministério da Justiça
C.C. – Código Civil
CEDH – Convenção Europeia dos Direitos do Homem
CEJ – Centro de Estudos Judiciários
Cfr. – confrontar
CJ – Colectânea de Jurisprudência
Col. – Coleção
Coord. - Coordenação
CP – Código Penal
CRP – Constituição da República Portuguesa
Disp. – disponível
DR – Diário da República
Ed. – Edição
EDUM – Escola de Direito da Universidade do Minho
e.g. – por exemplo (do latim, exempli gratia)
etc. – e outros (do latim, et cetera)
ex. – por exemplo
i.e. – isto é (do latim, id est)
IVG – Interrupção Voluntária da Gravidez
n.º/n.ºs – número(s)
op. cit. – obra citada (do latim, opus citatum)
p./pp. – páginas(s)
PMA – Procriação Medicamente Assistida
Proc. - Processo
Rev. – revista
RFDUL – Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
RLJ – Revista de Legislação e de Jurisprudência
ROA – Revista da Ordem dos Advogados
8
SIDA – Síndrome da imunodeficiência adquirida
ss. – seguintes
STJ – Supremo Tribunal de Justiça
TC – Tribunal Constitucional
TEDH – Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
TRC – Tribunal da Relação de Coimbra
TRL – Tribunal da Relação de Lisboa
TRP – Tribunal da Relação do Porto
Vd. – vide
Vol. – volume

9
1. CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

Quis o progresso da mentalidade (e sensibilidade) social, parâmetro alicerçador da


atuação do Direito, trazer novos elementos ao debate sobre o estatuto jurídico do embrião,
no encalço da problemática sempre atual do aborto, dos novos métodos de procriação
artificial, da manipulação genética, da admissibilidade das wrongful actions1, do estatuto
do embrião humano in vitro e dos notáveis avanços na área do diagnóstico pré-natal2,
colocando em primeiro plano as questões alusivas à proteção da vida uterina e, num
prisma mais holístico, do próprio alcance e limites do direito à vida.
Note-se, pois, que versaremos sobre uma temática irremediavelmente
metajurídica3, que requer uma coordenação e interpretação transversal de elementos
constitucionais, filosóficos, antropológicos e sociológicos. Não obstante esta realidade, o
propósito da presente exposição será o de arquitetar uma reflexão seleta e o mais
direcionada para o âmbito privatístico quanto nos é possível.

Saber se o nascituro é titular originário de um direito de indemnização por danos


resultantes de uma lesão à sua integridade física, ou a uma compensação em caso de morte
de um dos seus progenitores, assim como avaliar se os seus progenitores poderão ver
constituída a seu favor uma obrigação de indemnizar em virtude de morte do próprio
nascituro que resulte de um ato ilícito imputável a terceiro, serão quesitos sobre os quais
nos iremos debruçar, enquanto descortinamos as vias que o Direito pátrio nos oferece.

A maleabilidade do nosso corpo legislativo, assim como dos restantes instrumentos


legais supranacionais nele integrados, deixam espaço para que possamos contemplar a
proteção dos nascituros numa vertente responsabilizante, isto para que as lesões ou ilícitos
juscivilmente contemplados não passem a ser, quando suportados por aquele que já foi
gerado mas ainda não nasceu, irrelevantes.

1
Comummente repartidas em três categorias - wrongful conception (conceção indevida), wrongful birth
(nascimento indevido) e wrongful life (vida indevida) – as wrongful actions respeitam às situações em que,
por virtude de diminuída diligência, o médico falha no diagnóstico pré-concecional ou pré-natal, pretendendo
os lesados reagir judicialmente contra quem deu azo à possibilidade de gravidez ou ao nascimento de uma
criança com malformações, ainda que não as tenha provocado diretamente.
2
Quaestiones disputae que integram (e praticamente esgotam) o domínio da Bioética e do Biodireito,
reclamando uma ingerência legislativa no sentido de as dotar de um regime regulatório – neste sentido, vd.
DIOGO LORENA BRITO, A vida pré-natal na jurisprudência do Tribunal Constitucional, Publicações da
Universidade Católica, Porto, 2007, p. 21, e OLIVEIRA ASCENSÃO, “Direito e Bioética”, in Direito da Saúde e
Bioética, Lex, Lisboa, 1991, pp. 14 e 20-21.
3
Cfr. PAIS DE VASCONCELOS, Teoria Geral do Direito Civil, Lex (fascículos), 1995-96, p. 29, nota de rodapé
n.º 33 e STELA BARBAS, Direito ao Património Genético, Almedina, 1998, p. 246.

10
Atenderemos, no âmago deste estudo, aos pressupostos imprescindíveis à
afirmação da responsabilidade civil in casu, quer contratual, quer extracontratual,
prendendo-nos nós, naturalmente, com os requisitos que mais equivocidade suscitem.
O desafio, crê-se, será o de compatibilizar os diferentes posicionamentos que aqui
se degladiam, procurando encontrar um consenso quanto a uma matéria de manifesto
interesse e alcance na vivência prática dos legítimos afetados.

2. ENQUADRAMENTO LEGAL E CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DO


ESTATUTO JURÍDICO DO EMBRIÃO

Enquanto fenómeno evolutivo e extensivo a várias etapas do desenvolvimento, a


vida humana abrange, coerentemente, a vida intrauterina4. Radica desta constatação que
o Estado, para disponibilizar meios jurídicos coercivos que a protejam 5 – prescrevendo
sanções, adotando medidas preventivas, impondo intimações de abstenção e admitindo o
recurso a ações inibitórias, além de facultar o instituto da responsabilidade civil - não está
sequer dependente do reconhecimento de um direito à vida do nascituro concebido, uma
vez que a exigência da inviolabilidade do direito à vida6 bastaria para assegurar esta
proteção transversal7.

Mesmo assim, a vulnerabilidade sabida da vida pré-natal, aos olhos da comunidade


e do intelecto jurídico, conduz à opinião, francamente dominante8, de que os danos

4
Como aponta MARIA CLARA SOTTOMAYOR, “o estatuto do nascituro […] está intimamente relacionado com
o conceito de vida humana, um conceito biológico e objetivo, fornecido pela ciência e que é indiferente a
conceções políticas ou religiosas.” (“Breves Reflexões sobre a Evolução do Estatuto da Criança e a Tutela do
Nascituro”, in Juris et de Jure, Porto, 1998, p. 174). Acrescenta SÓNIA MOREIRA (“O Direito (?) Constitucional
à Vida do Embrião”, in Direito na Lusofonia – Diálogos Constitucionais no Espaço Lusófono, Vol. II, EDUM,
2017, p. 175) que “o embrião não é apenas material genético – é o resultado da união dos gâmetas masculino
e feminino, do qual resulta um código genético único e irrepetível que, nas condições adequadas, se
desenvolverá até maturar em vida humana tal como a conhecemos”. Vd. ainda OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito
Civil, Teoria Geral, Vol. I - Introdução, As pessoas, Os bens, Coimbra Editora, 1997, pp. 42-48.
5
Clarifica CURA MARIANO que “na escolha das medidas destinadas a proteger a vida intrauterina, o legislador
ordinário goza de uma ampla margem de discricionariedade, estando, no entanto, proibida uma tutela
insuficiente” (“A indemnização do dano da morte do nascituro já concebido e os imperativos constitucionais
de tutela do direito à vida”, in Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda, Vol. II, 2012, Coimbra
Editora, p. 112).
6
Tal como prescreve o artigo 24.º da CRP.
7
Neste sentido, CURA MARIANO, op. cit., p. 112. Cfr. igualmente com o Ac. n.º 85/85, de 26-05-1985, e n.º
288/98, de 18-04-1998, ambos do TC.
8
Vd. a exposição de PAIS DE VASCONCELOS, em Teoria Geral do Direito Civil, 8.ª Ed., Coimbra, Almedina,
2015, pp. 68 e ss., que reúne um amplo registo bibliográfico. LARENZ (Allgemeiner Teil des deutschen
Bürgerlichen Rechts, §5, II, p. 79) reconhece que “o feto ou embrião é um homem em formação (ein werdender
mensch), que precisa de proteção da ordem jurídica como ser humano em permanente evolução – e nunca
como coisa, puro objeto de relações jurídicas”, no sentido do artigo 202.º/1 do C.C.
11
próprios dos nascituros merecem a devida tutela jurídica, independentemente das diversas
orientações que se possam subscrever – direitos sem sujeito, expetativa jurídica,
antecipação da personalidade, retroatividade ao momento do nascimento, bens em estado
de vinculação ou sob condição suspensiva, posicionamentos sobre os quais discorreremos
adiante9.

Há muito que o feto10 deixou de ser entendido como um mero portio viscerum
matris11, para se tornar em algo “digno de proteção legal pela sua potencialidade em se
tornar uma pessoa.”12 O Código Civil, instrumento legal refletor desta mudança de
paradigma, institui a este propósito um regime ambíguo13 – não ignora os nascituros e
reconhece-lhes, a título excecional, alguns direitos, nomeadamente no que concerne a
doações (artigo 952.º), perfilhação (artigo 1855.º), poder paternal (artigo 1878.º),
capacidade sucessória (artigo 2033.º/1 e n.º 2, alínea a)) e administração da herança ou
legado a favor de nascituro (artigo 2240.º), condicionando, no entanto, a respetiva
aquisição ao seu nascimento14, nos termos do artigo 66.º/2.

À vista do exposto, não lhes atribui personalidade jurídica, já que os direitos assim
atribuídos o são em função da pessoa, entendida como o ser humano após o nascimento
completo e com vida15 – como impressivamente observa CABRAL DE MONCADA16, “o
homem só existe para o Direito como pessoa, depois de ter nascido”. A doutrina e a
jurisprudência vêem-se, então, obrigadas a construções dogmáticas complexas, no sentido
de descodificar a vontade do legislador nesta matéria.

9
Fazendo já uma súmula, vd. JOSÉ ALBERTO GONZÁLEZ, Wrongful birth, wrongful life: o conceito de dano
em responsabilidade civil, Lisboa, Quid Juris, 2014, pp. 95 e ss.
10
Por comodidade de expressão, empregaremos o termo “feto” para nos referirmos a todo o ser humano já
concebido mas ainda não nascido. Em rigor científico, “feto” abrange apenas a fase da vida embrionária que
tem lugar depois das oito semanas de gestação.
11
Como explica o Ac. do STJ de 03-04-2014 (ÁLVARO RODRIGUES), “uma simples massa orgânica, uma parte
do organismo da mãe”. Densifica MARIA CLARA SOTTOMAYOR (op. cit., p. 188) que “as descobertas da
fetologia demonstram que o embrião é autónomo em relação à mãe de um ponto de vista genético e
imunológico e que, durante a gestação, interage com o ambiente intrauterino e também com o exterior”.
12
Ac. n.º 75/2010 do TC.
13
Não existe em Portugal, a bem dizer, um estatuto jurídico do embrião humano – contam-se apenas algumas
orientações vagas, destacando-se as formuladas pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, a
propósito da PMA.
14
É também esta a solução dos sistemas jurídicos que nos são próximos – e.g. § 1 do BGB, o artigo 1.º do
C.C. italiano, o artigo 311.º/4 do C.C. francês, o artigo 30.º do C.C. espanhol e o artigo 2.º do C.C. brasileiro.
15
A personalidade jurídica, à semelhança do que acontece com a maioridade, é um fenómeno de produção
gradual, e não instantânea, do organismo humano, que se processa durante os curtos meses que medeiam entre
a fecundação do óvulo e o nascimento da criança. Uma vez que a ordem jurídica não consegue fixar o momento
exato da conceção, nem acompanhar a evolução fisiológica do embrião no ventre materno, necessita de um
momento objetivamente determinável a partir do qual reconheça a existência de uma pessoa como sujeito
autónomo de direitos – o nascimento.
16
Lições de Direito Civil, Almedina, 1995, p. 253.
12
2.1. ALUSÃO À DISTINÇÃO TERMINOLÓGICA ENTRE “NASCITURO” E
“CONCEPTURO”

No direito positivo, o termo “nascituro” é utilizado, em sentido amplo, para designar


todo o sujeito não nascido, incluindo o concepturo17 (nondum conceptus – aquele que ainda
está para ser concebido) e, strictu sensu, o nascituro18, que já foi gerado, ainda não nasceu,
mas a cujo respeito existe a expetativa de que venha a nascer.
Noutras palavras, os “concepturos não estão concebidos, não têm vida humana e não
têm sequer existência. Não são entes. O termo “concepturo” exprime apenas uma potência,
a possibilidade abstrata de alguém vir a ser concebido.” Por sua vez, os nascituros já
concebidos “são seres humanos, com vida, que se encontram numa particular fase da sua
vida.”19

A propósito do conceito de ‘nascimento’, o momento do total desligamento do seio


materno, há que aludir ao Decreto-Lei n.º 44 128, de 28 de dezembro de 1961, que explica
que se considera “nascimento da criança viva a expulsão ou extração completa,
relativamente ao corpo materno”.20

2.2. A PROTEÇÃO DA VIDA PRÉ-NATAL NOS INSTRUMENTOS


LEGISLATIVOS PRESENTES NO ORDENAMENTO JURÍDICO PORTUGUÊS – DO
ARTIGO 66.º DO CÓDIGO CIVIL E DO ARTIGO 24.º DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA PORTUGUESA AO DISPOSTO NO ARTIGO 2.º DA CONVENÇÃO
EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM

É de sublinhar a crescente atenção do Estado (e da sociedade em geral) à salvaguarda


da vida em gestação, ecoando tal dever de respeito pelas diversas ordens jurídicas e
convenções internacionais – é a própria Declaração dos Direitos da Criança, adotada em

17
A respeito do concepturi não se colocam, evidentemente, quaisquer interrogações acerca da sua eventual
personalidade jurídica, visto que ainda nem sequer foi gerado. Contudo, não são totalmente irrelevantes para
a ordem jurídica – o artigo 2033.º/2 do C.C., a propósito da sucessão testamentária ou contratual, prescreve
que, ao lado das pessoas coletivas, têm ainda capacidade “os nascituros não concebidos, que sejam filhos de
pessoa determinada, viva ao tempo da abertura da sucessão” – ou seja, seria perfeitamente válida, a título de
exemplo, cláusula testamentária em que o autor da herança instituísse “como herdeiro de uma quarta parte da
herança, o filho que o meu sobrinho Abel, prestes a casar com Benedita, vier a ter deste casamento”. Cfr.
ANTUNES VARELA, “A Condição Jurídica do Embrião Perante o Direito Civil”, in Estudos em Homenagem ao
Prof. Doutor Pedro Soares Martínez, Vol. I, Almedina, 2000, p. 623.
18
Sempre que façamos uso do termo “nascituro”, sê-lo-á neste sentido.
19
PAIS DE VASCONCELOS, op. cit., p. 74.
20
STELA BARBAS (op. cit., pp. 73-74) reflete, porém, que com o surgimento de novas técnicas de procriação
que permitem o desenvolvimento da vida humana em suportes artificiais (sem ‘corpo materno’), o “nascimento
deixará de ser o único modo de as pessoas “nascerem”, passe o absurdo redundante, pelo menos para o efeito
do referido diploma. Será o artigo 8.º/3 do C.C. a ocupar-se desta vicissitude dos tempos hodiernos, ao instituir
que o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo.
13
1959 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, que prescreve que “a criança, pela sua falta
de maturidade física e intelectual, tem necessidade de uma proteção jurídica adequada, tanto
antes como depois do nascimento.” Aliás, já em 1950 a Convenção Europeia dos Direitos
do Homem se referia “ao direito de qualquer pessoa à vida”, sendo necessário um
esclarecimento da Comissão Europeia dos Direitos do Homem, desta feita em sentido
contrário, a elucidar que o termo ‘pessoa’ não abrangia o ser humano já concebido mas ainda
por nascer.21

Ainda no plano europeu, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, em decisão


de 02-02-2004, na qual estava em causa a interpretação do artigo 2.º da CEDH, entendeu
que “(…) não é desejável, nem mesmo possível atualmente responder em abstrato à questão
de saber se a criança por nascer é uma pessoa". Com esta justificação, o Tribunal observa
que a questão da natureza e do estatuto do feto não é objeto de consenso, podendo-se apenas
encontrar um denominador comum de proteção dos Estados - a pertença à espécie humana.

Noutro contexto, e introduzindo o capítulo dos Direitos, Liberdades e Garantias, o


artigo 24.º/1 da Constituição proclama, sob o título “direito à vida”, que “a vida humana é
inviolável”, consagrando assim um princípio primordial da consciência axiológica
universal. Também aqui os entendimentos diferem: se, por um lado, estudiosos como JORGE
MIRANDA22 inferem que a inviolabilidade a que se refere o artigo se traduz num dever de
tutela jurídica de toda a vida humana, “sem distinguir a vida dos já nascidos e a vida dos
nascituros” e elevando-a a valor ou bem jurídico fundamental, por outro, o Tribunal
Constitucional tem já afirmado, não raras as vezes23, que apesar de a vida intrauterina ser
efetivamente um bem jurídico constitucionalmente protegido, gozando por isso da tutela
devida à vida humana em geral (maxime, à pertença à espécie humana), não se retira do
preceito em causa um direito fundamental à vida do nascituro já concebido24. Leia-se,
exempli gratia, o Acórdão n.º 617/2006:

“Da inviolabilidade da vida humana como fórmula de tutela jurídica não deriva, desde logo,

21
Não encontra justificação para esta distinção entre ‘pessoa’ e ‘vida humana’ ÁLVARO DIAS, que insiste que
“o direito à vida é garantido a quem quer que “viva”. (“Procriação Medicamente Assistida, Dignidade e Vida”,
in Ab uno ad omnes – 75 anos da Coimbra Editora, 1998, p. 138).
22
JORGE MIRANDA, “Aborto: Debates Parlamentares”, in Textos do Colóquio “O Aborto e os Direitos
Humanos, um Projeto, uma Experiência”, Universidade Católica, Coleção Estudos e Ensaios, 1985, p. 25.
23
Vd. os Acs. n.º 25/84, 85/85, 288/98, 617/06 e 75/2010, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, Vol. 2.º,
p. 7, Vol. 5.º, p. 245, Vol. 40.º, p. 7, Vol. 66.º, p. 7 e Vol. 77.º, p. 131, respetivamente.
24
Esta orientação do TC coincide com a posição adotada pelo TEDH – e.g., o Ac. de 10-04-2007, Evans c.
Royaume-Uni, acessível em cmiskp.echr.coe.int/hudoc.
14
que a proteção contra agressões postule um direito subjetivo do feto ou que não seja de
distinguir um direito subjetivo à vida de uma proteção objetiva da vida intrauterina […]. O
facto de o feto ser tutelado em nome da dignidade da vida humana não significa que haja
título idêntico ao reconhecido antes do nascimento.”

Já o Acórdão n.º 25/84 havia referido que a vida intrauterina representava “um valor
não juridicamente subjetivado”, ou seja, que não era protegida mediante a atribuição ao seu
portador de um verdadeiro direito subjetivo fundamental, mas antes como um bem objetivo
em si mesmo. Esta ideia foi precisada e desenvolvida no subsequente Acórdão n.º 85/85 25,
tendo-se escrito a esse respeito:

“Só as pessoas podem ser titulares de direitos fundamentais – pois não há direitos
fundamentais sem sujeito. A verdade é que o feto (ainda) não é uma pessoa, um homem, não
podendo por isso ser diretamente titular de direitos fundamentais enquanto tais. A proteção
que é devida ao direito de cada homem à sua vida não é aplicável diretamente, no mesmo
plano, à vida pré-natal, intra-uterina.”

Assentaram também alguns veredictos do Tribunal Constitucional o entendimento


de que a vida intrauterina não merece o mesmo grau de proteção ao longo de toda a sua
evolução, devendo esta ser progressivamente mais intensa à medida que a gestação se
desenrola. É essa, aliás, a ideia subjacente à não penalização da interrupção voluntária da
gravidez, aflorada já nestas duas decisões jurisprudenciais, onde se exarou que “não é
indiferente, à luz da consciência cultural e jurídica, a fase de desenvolvimento do feto,
reclamando este uma tutela quanto maior quanto mais próximo estiver o nascimento”. A
ideia presente é a de que a Constituição não poderá deixar de tutelar o embrião em nenhuma
das suas fases, mas poderá permitir diferentes graus de proteção26.

Na vertente penal, constatamos que o Código Penal vigente dedica um capítulo à


criminalização dos atos contra a vida intrauterina (Capítulo II, do Título I, do Livro II),
punindo a prática do crime de aborto (artigos 140.º e 141.º do CP). Contudo, exclui dessa
mesma punição os atos meramente negligentes, através do artigo 13.º do CP – ora,
considerando que o Direito Penal é, em regra, o ramo de Direito infraconstitucional que,
devido ao impacto dos meios repressivos de que lança mão, revela maior eficácia na
proteção dos bens jurídicos, cremos nós que peca aqui o legislador pela insuficiência da

25
Não se afastou desta orientação o Ac. do TC n.º 75/2010.
26
Opõem-se aqueles que defendem a impossibilidade de gradações no domínio da salvaguarda da vida
humana. Cfr. DIOGO LORENA BRITO, A Vida Pré-Natal…, pp. 87 a 98.
15
tutela conferida.27

Percorrendo a legislação civil mais recente28, constatamos que o tratamento jurídico


dispensado ao nascituro se pauta também pela ambivalência e imprecisão, reflexos da
controvérsia gerada em torno do seu estatuto legal.
Subscrevia o vetusto Código de Seabra uma posição de antecipação de proteção
jurídica ou de “expetativa dos direitos do nascituro”29 – a lei conferia proteção (ainda que
restrita) ao embrião desde o momento da sua conceção para que este, depois de nascido,
pudesse adquirir os direitos condicionais que lhe advinham desde que foi gerado30.
. Por conseguinte, a capacidade jurídica surgia com o nascimento (artigo 6.º) e só era
tido por “filho”, para efeitos legais, aquele que se provasse ter nascido com vida e figura
humana (artigo 110.º).

Já o Código Civil de 1966, constituindo a pessoa como um elemento da relação


jurídica, à imagem do sistema das Pandectas do BGB alemão, enuncia no seu artigo 66.º31:

“1. A personalidade jurídica adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.”


“2. Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento.”

O conceptus fica então privado do atributo da personalidade jurídica, prosseguindo


o legislador a elencar uma série de direitos que lhe reconhece, mas que condiciona ao facto
do nascimento32, que funciona aqui como condição suspensiva33.

27
Sobre a carência de tutela penal, vd. MARIA DA CONCEIÇÃO FERREIRA DA CUNHA, A Constituição e Crime,
Uma Perspetiva de Criminalização e de Descriminalização, Estudos e Monografias, Universidade Católica
Portuguesa, 1994, pp. 217 e ss.
28
Sumariza MARIA CLARA SOTTOMAYOR (op. cit., p. 185) que, remontando a épocas mais antigas, os
nascituros eram equiparados por lei, no que fosse de seu interesse, aos já nascidos, conservando “até ao
momento do nascimento todos os direitos que lhe competiriam, contanto que nascessem capazes de viver”.
Com mais pormenor, vd. COELHO DA ROCHA, Direito Civil Portuguez, Tomo I, Coimbra, 1848, p. 35.
29
A doutrina alemã mais qualificada há muito que inclui, entre os vários tipos ou modelos de direitos
subjetivos, os chamados direitos de expetativa (die Anwastschaftsrechte), no sentido técnico de titularidade de
um direito em formação, quando se tenham já verificado alguns pressupostos da sua criação e haja um grau
bastante de probabilidade de consumação dos restantes pressupostos da sua existência. Cfr. LUIZ DA CUNHA
GONÇALVES, Tratado de Direito Civil em comentário ao Código Civil português, Vol. XI, Coimbra Editora,
1936, p. 179.
30
Dispunha o artigo 6.º do Código de 1867 do seguinte modo: “A capacidade jurídica adquire-se pelo
nascimento; mas o indivíduo, logo que é procriado, fica debaixo da proteção da lei, e tem-se por nascido para
os efeitos declarados no presente Código.” Não significa isto outra coisa senão atribuir ao nascituro, por via
de ficção e retroativamente, a capacidade de gozo estritamente indispensável para encabeçar os direitos que
lhe são atribuídos. A proteção da lei ao nascituro era então condicional e resolúvel, manifestando-se desde os
primeiros sinais de gravidez, segundo LUIZ DA CUNHA GONÇALVES, op. cit., p. 179.
31
Resultante do anteprojeto apresentado por MANUEL DE ANDRADE, Esboço de um anteprojeto de Código
das Pessoas e da Família, no BMJ, n.º 102, p. 153.
32
Não se exigindo forma humana, viabilidade do recém-nascido ou um tempo mínimo de sobrevivência.
33
A lei é clara – “dependem”. Cfr. ÓRFÃO GONÇALVES, op. cit., p. 538.
16
Ora, a dupla proposição do artigo 66.º do C.C, com a ideia implícita de que antes do
nascimento a personalidade não existe, suscita imediatamente no intérprete a questão de
saber a que regime estão sujeitos esses mesmos direitos, enquanto o nascimento do seu
futuro titular não se verifica.
A interpretação deste artigo, negando a qualidade de sujeito de direitos ao nascituro
concebido corresponde à leitura maioritária efetuada pela doutrina e jurisprudência34,
registando-se as opiniões dissonantes daqueles35 que entendem que o sistema jurídico acaba
mesmo assim por reconhecer personalidade jurídica aos nascituros concebidos. Há ainda os
que a reconhecem, apesar da letra da lei, argumentando que o legislador não se soube
expressar convenientemente36, há quem adira à tese de personalidade jurídica parcial ou
fracionária37 e ainda os que fazem retroagir a personalidade jurídica ao momento da
constituição do direito em causa38.

Será este o punctum saliens de qualquer reflexão capacitada sobre a condição do


nascituro à luz da regulamentação civil nacional – não há que negar o facto evidente da
identidade biológica entre nascituro e criança nascida, é certo, mas a letra da lei é categórica
ao determinar que a personalidade jurídica e, em consequência, a capacidade para ser titular
de um direito de indemnização, só surge com o nascimento, e cessa com a morte.

34
Ilustrando, ANTUNES VARELA, op. cit., p. 631-633; CASTRO MENDES, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. I,
Ed. de 1978, AAFDL, pp. 103-109; HEINRICH HÖRSTER, A Parte Geral do Código Civil Português, Teoria
Geral do Direito Civil, Reimpressão da Ed. de 1992, Almedina, 2017, pp. 293-296; CARLOS MOTA PINTO,
Teoria Geral do Direito Civil, Reimpressão da 4.ª Ed., Coimbra Editora, 2012, pp. 199-202; INOCÊNCIO
GALVÃO TELLES, Introdução ao Estudo do Direito, Vol. II, 10.ª Ed. da Coimbra Editora, 2010, pp. 165-167;
CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. I, 3.ª Ed. da Universidade Católica, 2012, pp.
193-199; RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código Civil, Vol. I, Ed. de 1987, Almedina, pp. 107-108; RITA LOBO
XAVIER, O Direito civil e a protecção dos nascituros: algumas considerações acerca do momento da
aquisição da personalidade jurídica no Direito português, em Brotéria, Vol. 147, 1998, pp. 176-184; e DIOGO
LORENA BRITO, A vida pré-natal…, Ed. de 2007, Universidade Católica, pp. 121-122.
35
É o entender de OLIVEIRA ASCENSÃO (op. cit., pp. 14-21), MENEZES CORDEIRO (Tratado de Direito Civil
Português, Livro I, Tomo III, Ed. de 2004, Almedina, pp. 293-306), PAIS DE VASCONCELOS (op. cit., pp. 104-
118), ÓRFÃO GONÇALVES (op. cit., pp. 525-539), LEITE DE CAMPOS (Lições de Direito da Família e das
Sucessões, 2.ª Ed. da Almedina, 2012, pp. 511-514) e STELA BARBAS (op. cit., pp. 235-242).
36
Sugere PAIS DE VASCONCELOS que o artigo 66.º/1 do C.C. deve ser entendido como referindo-se à
capacidade de gozo, e não propriamente à personalidade jurídica, como algumas vozes entendiam suceder com
o artigo 6.º do Código de Seabra e com o §1 do BGB - não nos parece razoável, contudo, supor que o legislador
não se tenha sabido expressar num ponto tão elementar, isto em consonância com o princípio de interpretação
hermenêutica contido no artigo 9.º/3 do mesmo diploma.
37
Cfr. RABINDRANATH CAPELO DE SOUSA, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. I, Ed. de 2003, Coimbra
Editora, pp. 265-281 e PEREIRA COELHO, Direito das Sucessões, Lições ao Curso de 1973-1974, Coimbra,
1992, pp. 192-193.
38
Referimo-nos a DIAS MARQUES, Código Civil Anotado, Ed. de 1968, Petrony, Lisboa, p. 23.
17
2.3. PERSONALIDADE VS CAPACIDADE JURÍDICA – A PEDRA DE TOQUE NA
AFERIÇÃO DA VIABILIDADE DA TUTELA INDEMNIZATÓRIA
Clarificava, já em 1929, LUIZ DA CUNHA GONÇALVES39, que “a personalidade é o
homem jurídico num estado por assim dizer estático; a capacidade é o homem jurídico no
estado dinâmico”.
Há, pois, que distinguir os dois conceitos para inferir se a inexistência de
personalidade jurídica, aos olhos do Direito Civil, constitui um entrave à concessão de
direitos ao nascituro ou se, por sua vez, é possível conceber que alguém que prescinda dessa
qualidade seja titular de um direito indemnizatório.
Aprofundando, o conceito de personalidade jurídica é puramente qualitativo e
significa a suscetibilidade de se ser sujeito de relações jurídicas; já o de capacidade jurídica
comporta uma dimensão quantitativa, expressando a medida variável dos direitos e
vinculações de que a pessoa pode ser titular (capacidade de gozo) ou pode exercer e cumprir
pessoal e livremente (capacidade de exercício ou capacidade de agir).

A eleição, seguindo a nossa tradição jurídica40, do momento da aquisição da


personalidade no ato do nascimento41, com a consequente exclusão dos nascituros da
condição de pessoa jurídica, significa que o legislador optou por uma tese natalista – só o
nado vivo é pessoa jurídica, estando o feto, faz-se a ilação, privado de capacidade jurídica.

Compete-nos, porém, aludir à tese do tipo concepcionista sustentada pela voz


autorizada de ERNST WOLF, que ganhou fôlego no direito civil alemão contemporâneo –
segundo o autor, a capacidade jurídica do Homem começa logo com a conceção, até porque
é a partir deste momento que a vida humana começa a medrar. Ora, se o embrião é um ser
humano em formação (quer venha a nascer vivo ou morto), “constitui um corte
verdadeiramente arbitrário a norma legal segundo a qual só depois do nascimento com vida

39
Op. cit., p. 169.
40
Que, por sua vez, remonta já ao Direito Romano – vd. MAX KASER, Direito Privado Romano, Ed. de 1999,
Fundação Calouste Gulbenkian, p. 101 e SANTOS JUSTO, Direito Privado Romano I, Parte Geral (Introdução,
Relação Jurídica, Defesa dos Direitos), Ed. de 2000, Coimbra Editora, p. 105-107. Em Portugal, sobre o
período de vigência do Código Civil de 1867, leia-se BORGES CARNEIRO, Direito Civil de Portugal, Vol. I,
Ed. de 1826, Lisboa, p. 65, COELHO DA ROCHA, Instituições de Direito Civil Portuguez, Tomo I, 6.ª Ed. da
Imprensa da Universidade, Lisboa, 1917, p. 35, CUNHA GONÇALVES, op. cit., pp. 176-182 e CABRAL DE
MONCADA, op. cit., pp. 253-257.
41
Justifica ANTUNES VARELA (op. cit., pp. 176 a 184) a preferência pelo momento do nascimento pela sua
notoriedade e fácil reconhecimento, em contraste com o secretismo natural e social da conceção do embrião;
pelo facto de o desenvolvimento das capacidades básicas do ser humano, apesar de progressivo, se situar mais
perto do nascimento do que da fecundação do óvulo materno; e por se tratar comprovadamente do momento
da autonomização física do filho perante o organismo da mãe.
18
a criança adquire personalidade jurídica”.42
Contribuiu para que este entendimento, em parte, vingasse, o facto de os tribunais
alemães terem reconhecido em certos casos um direito de indemnização a crianças que
tinham nascido vivas mas que haviam sofrido, ainda no ventre materno, danos causados
pelos próprios pais ou por ato ilícito de terceiro43. Nisto viram numerosos juristas a
consagração da existência, mesmo que excecional, de uma personalidade jurídica limitada
anterior ao nascimento.44 Mas não terá de ser, permita-se-nos, necessariamente assim: não
obstante a lei só reconhecer como pessoa jurídica (é o mesmo que dizer, titular de direitos
e dotada de capacidade jurídica) o ser humano que nasce com vida, nada impede que se
reconheça o embrião enquanto pessoa em formação, sancionando quaisquer agressões à sua
saúde. Id est, a indemnização concedida seria a repercussão jurídica da ofensa da vida
humana45, enquanto bem jurídico, fazendo jus ao preceito romano ‘nasciturus pro iam nato
habetur quando de eius commodo agitur’ ("em tudo o que for de seu interesse, é o nascituro
considerado já nascido").

Quanto à sugestão, apontada por CAPELO DE SOUSA, da personalidade parcial,


reduzida ou fracionária do nascituro, não nos parece que possa receber acolhimento no plano
civil, já que um dos alicerces da nossa construção jurídica é considerar a qualidade
(ontológica) de ser Homem, ou melhor, Homem face ao Direito, uma categoria “insuscetível
de graduações”46. O que poderia ser limitada, isso sim, seria a capacidade do nascituro,
quanto ao gozo e ao exercício de direitos – à imagem do que acontece com os menores e,
até recentemente, com os inabilitados e os interditos47, surgiria então uma nova incapacidade
na nossa ordem jurídica, que posta nestes termos nos parece um mecanismo atrativo para a
edificação de um estatuto legal do nascituro.
Certo é que a capacidade de direito do nascituro é limitada pela própria natureza das
coisas (melhor se lhe poderia chamar uma ‘capacidade embrionária’48) – limita-se aos
direitos de personalidade, que são inerentes à sua hominidade, e àqueles que a lei lhe atribui:

42
WOLF-NAUJOKS, Anfang und Ende der Rechtsfähigkeit der Menschen, Klostermann, 1955, pp. 83 e ss.
43
As situações mais recorrentes foram as resultantes de transfusões de sangue infetado ou de contágio
proveniente de relações adulterinas da mãe.
44
Cfr. HANS-MARTIN PAWLOWSKI, Allgemeiner Teil des BGB, I, C.F. Müller, 1972, p. 61.
45
Vd. WALTER SELB, “Schädigung des Menschen vor Geburt – ein Problem der Rechtsfähigkeit”, in Archir
für die civilistische Praxis, Mohr Siebeck GmbH & Co. KG, 1966, pp. 76 e ss.
46
ÓRFÃO GONÇALVES, op. cit., p. 537.
47
A 14 de agosto de 2018 foi publicado o Regime Jurídico do Maior Acompanhado (Lei n.º 49/2018), que
substituiu os tradicionais institutos da interdição e inabilitação previstos no C.C. A regra passa a ser a da
capacidade de qualquer pessoa maior, apenas se introduzindo as limitações estritamente necessárias.
48
Expressão de SÓNIA MOREIRA (“O direito do nascituro à compensação por morte de um dos progenitores:
Anotação ao Acórdão do STJ de 3.4.2014, Proc. 436/07”, in Cadernos de Direito Privado, n.º 50, 2015, p.
73).
19
adquirir por herança e por doação. A capacidade genérica de gozo é que só se adquire nos
termos do artigo 66.º do C.C., com o nascimento completo e com vida.

Sumarizando, percebemos que uma leitura conjunta do exarado no artigo 66.º do


C.C. com o disposto no artigo 24.º/1 da CRP potencia duas possíveis interpretações
(alternativas):
“– O nascituro é dotado de personalidade jurídica, sendo assim tutelado contra
qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa – a isso obrigaria o disposto no artigo 24.º/1 da
CRP, ao proclamar a inviolabilidade da vida humana;
- (…) Em obediência ao artigo 66.º/1 do C.C., o nascituro não tem efetivamente
personalidade jurídica, mas é tutelado, enquanto vida humana que é, no seu direito à vida e
integridade física e moral.”49

Por ora, conservemos esta dupla ilação, em representação das teorias e hipóteses
estudadas, enquanto perscrutamos o regime indemnizatório que o Código Civil disponibiliza
aos interesses do nascituro.

3. O QUADRO JURÍDICO GLOBAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL LIGADA


AOS NASCITUROS CONCEBIDOS

3.1. IDONEIDADE DO INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Decomposta a vexata quaestio nos seus elementos preponderantes, cumpre explorar


o conteúdo e alcance da proteção concedida ao ser humano em fase de gestação pelo instituto
da responsabilidade civil.
OLIVEIRA ASCENSÃO50 realça a singularidade da problemática – “pergunta-se se é
possível alguém pedir indemnização por lesões que lhe foram causadas na vida pré-natal –
por uma intervenção cirúrgica negligentemente executada na mãe ou pela prescrição a esta
de um medicamento errado, por exemplo”.
Com efeito, há que apurar, à luz do estudado, se o nascituro tem personalidade
jurídica ou direitos suscetíveis de lesão51, se se verificou efetivamente uma lesão e se daí se

49
Conclusões de ÓRFÃO GONÇALVES, op. cit., p. 535.
50
Op. cit., p. 46.
51
Para quem advoga a tese dos direitos sem sujeito, a personalidade jurídica não é condição imprescindível
para a formação e existência de direitos numa certa esfera jurídica. Em sentido contrário, aduz o parecer
daqueles que entendem que todo o direito tem de pertencer a algum sujeito ou, noutras palavras, que exista um
sujeito para que haja um predicado.
20
formou uma obrigação de indemnização, com base na responsabilidade civil aquiliana ou
obrigacional52.

O instituto da responsabilidade civil, como sabemos, impõe a quem ofenda bens


tutelados pela ordem jurídica, a reconstituição da situação que existiria, caso não se tivesse
verificado o evento lesivo, nos termos do artigo 562.º do C.C. Visa, portanto, alcançar dois
grandes objetivos: reintegrar um património lesado e/ou reparar a componente pessoal que
tenha sido afetada, isto porque normalmente os factos lesivos acarretam consequências
patrimoniais e não patrimoniais. Numas vezes, reintegra (sendo esta a forma mais perfeita53
de eliminação do dano, alfa e ómega da responsabilidade civil), noutras repara, através,
normalmente, de uma indemnização em dinheiro, quando a reconstituição natural não é
possível.
A função ressarcitória assume, então, um especial destaque na configuração da
responsabilidade civil, mas não deixa também de estar patente, e articulada consigo, uma
função preventiva54 – querem-se dissuadir comportamentos ofensivos de bens jurídicos,
através da cominação da obrigação de reparação dos prejuízos causados na esfera jurídica
alheia. Por isso mesmo é que a atuação deste instituto continua a ser justificada, mesmo
quando não se mostre violado qualquer direito subjetivo, ou mesmo quando não exista uma
pessoa concreta lesada a quem atribuir o direito de indemnização55, uma vez que subsistem
os seus fins sancionatórios.

Apesar das clivagens doutrinárias e axiológicas inerentes à finalidade do instituto da


responsabilidade civil, é indiscutível que são inúmeros os problemas relacionados com a

52
O nosso sistema encontra-se bipartido entre responsabilidade civil contratual (artigos 798.º e ss. do C.C.) e
extracontratual (artigos 483.º e ss. do C.C.). Na responsabilidade civil obrigacional ou contratual estão em
causa situações onde há violação de direitos relativos (vínculos obrigacionais e incumprimento de deveres
contratuais); já na responsabilidade civil extracontratual ou delitual, há uma violação de direitos absolutos
(deveres genéricos de respeito ou de normas gerais destinadas à proteção de outrem). O nosso Código tratou
separadamente as duas categorias de responsabilidade, tendo procurado aproximar os dois ângulos num
conjunto de normas comuns (artigos 562.º a 572.º). Trataremos de ambas as responsabilidades, já que a tutela
indemnizatória do nascituro pode passar, como veremos, por uma ou outra via. Vd., sobre o tema na sua
generalidade, ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, Volume I, 10.ª Ed., Coimbra, Almedina, 2011,
pp. 518 e ss.
53
Reivindica-se um restabelecimento do status quo ante, pelo princípio da restitutio ad integrum, que
acompanha o direito civil português desde os seus primórdios enquanto ramo jurídico. Cfr. Ac. do STJ de 10-
02-2004 (PONCE DE LEÃO) - “a trave mestra da reparação do dano ao nível do Direito Civil é, pois, o princípio
da reposição ou reconstituição natural, o qual se traduz na obrigação de reconstituir a situação anterior à lesão”.
54
Sobre a articulação destas finalidades da responsabilidade civil, e vincando a importância da finalidade
sancionatória na indemnização dos danos não patrimoniais, vd. INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, Direito das
Obrigações, Ed. de 1997, Coimbra Editora, p. 387, nota 1 e ANTUNES VARELA, Rasgos Inovadores do Código
Civil Português de 1966, em matéria de Responsabilidade Civil, Vol. XLVIII, BFDUC, 1972, pp. 77 e ss.
55
Mesmo nas situações em que não há nenhum sujeito que mantenha uma relação privilegiada com o bem
lesado, nada impediria o Estado de ser o beneficiário desse direito, em representação da comunidade onde
aquele ser humano em formação se viria a inserir.
21
lesão do nascituro que este pode solucionar – saber o que consubstancia, nesta sede, um
ilícito, se se pode considerar existir dano, a importância do nexo de causalidade para a
aferição da adequação da conduta,… enfim, todos os pressupostos imprescindíveis para a
constituição de um direito de indemnização que vise uma reposição da situação do nascituro,
não fossem as lesões que teve de suportar.
Há, claro, quem56 subscreva a opinião de que o suprimento das prementes
necessidades que essa lesão acarreta (usualmente uma deficiência mais ou menos
incapacitante) deverá ser efetuado por recurso ao sistema da segurança social, interrogando
se se estará a exigir demais do instituto da responsabilidade civil e extravasando os seus já
múltiplos fins. Não tendemos a enfileirar por esta posição – cremos que a segurança social
tem de atuar, tenha ou não ocorrido um cenário de responsabilidade civil. Além do mais,
seria inaceitável que, pensando numa ação de wrongful life em que o médico tenha atuado
de forma negligente, não haja qualquer consequência jurídica para essa mesma atuação,
através da atribuição de uma indemnização ao lesado. Deste modo, vedar a intervenção da
responsabilidade civil “implicaria estabelecer uma situação de impunidade legal, em que é
toda a sociedade a pagar os danos resultantes da negligência médica”57.

Precisamente quanto às ações de wrongful life58, que nos despertam um acrescido


interesse por constituírem exemplo de um quase aporismo na área da responsabilidade
médica, há que fazer menção ao célebre arrêt Perruche, decidido pela Cour de Cassation
em 200059 - trata-se da primeira decisão judicial europeia a conceder uma indemnização à
criança numa ação deste tipo, confirmando a existência de uma relação causal entre as fautes
cometidas por um médico e o dano sofrido pela criança, e que acarretou importantes
repercussões a nível legislativo, culminando na introdução da chamada Lei Anti-Perruche60,
que estipula no seu artigo 1.º que “Ninguém pode tirar partido de um prejuízo pelo facto de
ter nascido”61. O legislador francês afastou assim o regime da responsabilidade civil,

56
ÁLVARO DIAS, Dano Corporal: Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Teses de Doutoramento,
Almedina, Coimbra, 2001, p. 502 e PINTO MONTEIRO, “Anotação ao Acórdão do STJ de 19 de Junho de 2001
(Direito a não nascer?)”, in RLJ, n.º 3933, Ano 134, p. 384.
57
LUÍS MENEZES LEITÃO, “O Dano da Vida”, in Cadernos de Direito Privado, n.º 02 – Especial, 2012, pp. 3
e ss.
58
Nicolas Perruche nasceu em 1983, com fortes deficiências e lesões auditivas e visuais, cardiopatias e
neuropatias, em consequência de rubéola contraída pela mãe durante a gravidez mas que não foi detetada
(apesar de a mãe ter chegado a informar os médicos da história clínica da sua família que poderia colocar em
risco a criança e avisado que, caso existisse a possibilidade de esta nascer com problemas de saúde, preferiria
abortar).
59
Ac. da Cour de Cassation de 17-11-2000. Esta decisão foi confirmada pelo Acs. da mesma instância de 13-
07-2001 e de 28-11-2001.
60
Lei n.º 2002-303, de 4 de março de 2002.
61
Estipula ainda a segunda alínea deste artigo que “A pessoa que nasceu com um defeito devido a um erro
médico pode obter a reparação do seu dano quando, o autor faltoso provocou diretamente o defeito ou o
22
pugnando, ao invés, pela aplicação do direito social como meio exclusivo para o apoio aos
cidadãos com deficiências daquele modo geradas.

Importa, à parte disto, referir também que a tutela de bens ou interesses jurídicos
através da responsabilidade civil pode processar-se dispensando o prévio reconhecimento
de direitos subjetivos, conforme resulta do artigo 483.º do C.C., que convoca este instituto
para intervir nos casos de violação de qualquer disposição legal destinada a proteger
interesses alheios62. Assim, a violação de um dever geral de conduta de respeito pelo bem
jurídico vida, mesmo que não subjetivado, pode ser desembaraçadamente reconduzida,
apesar da atipicidade dogmática63, à norma de proteção do artigo referido, numa leitura
abrangente da expressão “interesses alheios”.
Note-se ainda que, mesmo negando a teoria da concessão de personalidade jurídica
ao nascituro, é sempre possível recorrer à responsabilidade civil para tratar das lesões
praticadas na vida pré-natal, sem ter de invocar tal qualidade. Raciocinemos: o nascituro
não tem personalidade jurídica, logo é juridicamente impossível de ser lesado (não tem
direitos passíveis de serem afetados), mas facticiamente essas lesões subsistem após o seu
nascimento. Ora, será aí que elas adquirem relevância jurídica, segundo o artigo 66.º/1 do
C.C., só aí há ilicitude e a lesão se consubstancia, por se registar a violação dos direitos de
outrem (que dantes não existia). CASTRO MENDES64 simula um episódio – “por culpa de A,
B tem um acidente. B é mulher e estava grávida ao tempo do acidente. Por culpa deste, o
filho, C, nasce defeituoso. Pode C exigir a A indemnização? Entendemos que pode. No
momento do acidente, gera-se uma relação jurídica de indemnização, imperfeita, sem
sujeito, mas completa-se e torna-se perfeita com o nascimento de C.”

Situa-se, destarte, o problema nos quadros tradicionais da responsabilidade civil, que

agravou ou não permitiu tomar as medidas suscetíveis de atenuação”. Fica assim patente a exigência de um
nexo de causalidade direto.
62
Sobre a introdução desta segunda modalidade de ilicitude inspirada no § 823, II do BGB, vd. VAZ SERRA,
Requisitos de Responsabilidade Civil, no BMJ, n.º 92; ADELAIDE MENEZES LEITÃO, Normas de Proteção e
Danos Puramente Patrimoniais, Ed. de 2009, Almedina, pp. 246 e ss. e MENEZES CORDEIRO, Tratado de
Direito Civil Português, Livro II, Tomo II, Ed. de 2010, Almedina pp. 448-453.
63
E não é inédita a tese da atribuição de direitos de indemnização próprios a terceiros pela ofensa de bens
jurídicos dos quais não são titulares, que alguns autores enquadram como se tratando de danos reflexos (vd.
Ac. STJ de 17-02-2009). E.g., o artigo 71.º/2, ao remeter para o disposto no artigo 70.º/2, ambos do C.C.,
confere um direito de indemnização por ofensa de direitos de personalidade de pessoas já falecidas aos sujeitos
aí elencados (vd., a este propósito, CASTRO MENDES, op. cit., p. 111 e RABINDRANATH CAPELO DE SOUSA, O
Direito Geral da Personalidade, Ed. de 1995, Coimbra Editora, pp. 195-196). Também a propósito do artigo
496.º/2 e da indemnização do dano da morte, parte significativa da doutrina e da jurisprudência interpreta a
disposição como atribuindo um direito próprio de indemnização aos familiares da vítima aí mencionados, pela
perda da vida.
64
Op. cit., p. 228.
23
não poderá deixar de ser recrutada para a tarefa de proteção dos interesses do ser humano
em formação, e que deverá ser complementada com medidas civilísticas suplementares de
prevenção. No que ao Direito português diz respeito, a obrigação de indemnizar nasce na
esfera jurídica do lídimo responsável se este praticar um facto ilícito e culposo que cause
um dano à outra parte, ou então que seja incumprida uma qualquer disposição contratual,
consoante essa obrigação se funde em responsabilidade extracontratual ou contratual,
respetivamente.
São esses os pressupostos que de seguida nos propomos a analisar, tendo em vista
dois conjuntos de situações que consideramos servirem ao nosso tema - por um lado, lesões
provocadas ao nascituro em virtude de um comportamento médico ou hospitalar
negligente65 (damos o exemplo das malformações do feto como efeito secundário do uso de
talidomida recomendada às grávidas, nos anos 50 e 60 do século passado, ou das ações de
wrongful life66, em virtude de um erro no diagnóstico pré-natal); por outro, danos sofridos
em virtude de agressões infligidas à mãe da criança (incluindo aqui lesões causadas pelos
próprios pais67 ou situações de acidente de que resulte a morte ou lesão grave do feto).

3.2. ENQUADRAMENTO NO ÂMBITO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DELITUAL OU


OBRIGACIONAL – A QUESTÃO DA CONTRATUALIZAÇÃO

Nas hipóteses nas quais o dano é imputado quer à violação de um vínculo negocial,
quer à violação de um direito lesado genericamente, e não sendo pacífica a questão de saber
qual das responsabilidades prevalece nem a de saber se é admitido o recurso a qualquer uma
delas por parte do lesado, a jurisprudência maioritária tem entendido que, gozando o lesado
das duas tutelas, poderá o mesmo optar pelo regime que lhe for mais favorável, ou que julgue
mais favorável em concreto68.

65
E.g., devido à ausência de acompanhamento devido da gravidez, ou derivadas da omissão de tratamentos
que teriam impedido a deficiência do nascituro ou mitigado as suas consequências.
66
Referimo-nos às demandas judiciais, intentadas em nome próprio pelo nascido - ou pelos seus representantes
legais (nos termos gerais do artigo 1878.º/1 do C.C.) em seu nome, cenário mais recorrente – em que uma
criança nasce com uma enfermidade ou anomalia congénita e interpõe contra o médico, cujo comportamento
negligente propiciou o seu nascimento, uma ação judicial solicitando uma reparação para o dano que suporta,
o da sua própria vida naquelas condições. Note-se que a ação também poderá ser dirigida contra os
progenitores, por terem decidido prosseguir com a gestação, não obstante serem conhecedores da doença que
acometia o nascituro.
67
Por exemplo, em contexto de violência doméstica.
68
É a tese do cúmulo de responsabilidades: se o mesmo facto representar concomitantemente uma violação
do contrato e uma violação de deveres extracontratuais, são aplicáveis as regras das várias responsabilidades
à escolha do prejudicado. Isto, claro, sem esquecer as limitações que poderão resultar da própria lei ou de
eventuais acordos das partes. Sobre o tema, ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 4.ª Ed., Almedina,
1990, pp. 356 e ss. e PINTO MONTEIRO, Cláusulas Limitativas e de Exclusão da Responsabilidade Civil,
Almedina, 1985, pp. 425 a 437.
24
Estando em causa a eventual violação ilícita de um direito de personalidade (a vida
ou a integridade física), tal ilícito gerará sempre responsabilidade extracontratual.
Ocorrendo, no entanto, essa violação na execução de um contrato, os danos daí decorrentes
assumem natureza contratual, já que “o genérico dever de neminem laedere é absorvido
sempre que estão em causa comportamentos ligados ao fim contratual, nos quadros da
responsabilidade ex contractu”.69

No âmbito da responsabilidade contratual, a ilicitude situar-se-á no incumprimento


de alguma das obrigações emergentes do contrato, isto é, na inobservância de deveres
principais ou acessórios por qualquer um dos contraentes, nos termos do artigo 798.º do
C.C.
A relação clínica médico-paciente70, que se juridificou enquanto relação de prestação
de serviços, desdobra-se num programa obrigacional complexo: para o paciente, a mãe da
criança em gestação, resume-se ao pagamento dos honorários e a deveres de informação e
cooperação, enquanto que para o médico há um considerável conjunto de comportamentos
cuja observação é imperativa para o cumprimento do contrato, destacando-se os deveres
acessórios de informação e o dever de obtenção de consentimento informado. Caso se
verifique o desapreço por qualquer um destes deveres que compõem o vínculo obrigacional,
preenche-se este requisito da ilicitude.

Até aqui, a parte contratual é, pelo menos aparentemente, apenas a mãe71,


descurando-se o nascituro, enquanto parte integrante desta relação, e o pai, igualmente
interveniente em matéria reprodutiva. Quanto a estes, a responsabilidade do médico pela via
contratual poderá ser equacionada apelando à figura do contrato com eficácia de proteção
para terceiros72.

69
MOTA PINTO, Cessão…, p. 341.
70
Na atuação do médico, o não cumprimento dos deveres de cuidado e proteção a que está obrigado pode ser
causa de responsabilidade contratual, na medida em que viola deveres laterais a que contratualmente está
obrigado, mas também é causa de responsabilidade delitual, na medida em que a referida violação representa
igualmente um facto ilícito extracontratual. Vd., por todos, ANTUNES VARELA (op. cit., pp. 636-637) e os Acs.
do STJ de 19-06-2001 (PINTO MONTEIRO) e de 07-10-2010 (FERREIRA DE ALMEIDA).
71
Em oposição aos seus pares, PIRES DA ROSA, no Voto de Vencido aposto ao Ac. do STJ de 17-01-2013,
apresenta-nos uma posição muito particular mas que se nos afigura plausível: “[…] as ecografias foram
efectuadas no âmbito de um contrato celebrado entre uma clínica radiográfica e uma mulher – não uma qualquer
mulher, mas uma mulher pejada, grávida […] A mãe (e o seu feto – porque o feto é ainda mãe, enquanto não
nascer com vida) foi (foram) atingida(os) no seu direito a poderem optar pelo não nascimento, por uma mesma
e única violação contratual”.
72
Cfr. ERWIN DEUTSCH e ANDREAS SPICKHOFF, Medizinrecht: arztrecht, arzneimittelrecht,
medizinprodukterecht und transfusionsrecht, 7.ª Ed., Berlin Heidelberg, Springer, 2014, p. 430, n.º 674.
Admitindo esta possibilidade, decisão do Hoge Raad de 18-03-2005 na declaração junta ao Ac. do STJ de 17-
01-2013.
25
Esta situação ocorrerá sempre que o terceiro apresente uma situação de tal
proximidade com o credor (neste caso, a progenitora), que justificará a extensão em relação
a ele do círculo de proteção do contrato, passando os deveres acessórios que vigoram entre
as partes a abranger a tutela da posição de terceiros, que supostamente estariam fora do
âmbito subjetivo do contrato. Neste conspecto, havendo dano para o terceiro indiretamente
protegido, a responsabilidade submete-se ao regime da responsabilidade civil contratual, de
modo que a culpa pela falta contratual também será presumida.

A figura, emergente do direito alemão, insere-se num “espaço dogmático-normativo


intercalar”73, mais precisamente, na denominada terceira via da responsabilidade civil, cuja
fonte não se baseia nem no delito, nem no contrato, fugindo, portanto, aos quadros
tradicionais deste regime.
A emergência deste tertium genus exige, contudo, um esforço de delimitação da
esfera dos terceiros abrangidos. Neste ensejo, deverão incluir-se apenas aqueles74 (i) que se
encontrem em contacto próximo com a prestação principal objeto do contrato; (ii) cuja
especial ligação com o credor seja cognoscível para o devedor; (iii) que mantenham uma
comunhão de interesses e vantagens com o credor. Estes terceiros, embora não sejam partes
no contrato, seriam então titulares de deveres laterais de cuidado, proteção e informação.
Assim, parece-nos haver um potencial evidente para recorrer a esta responsabilidade
intermédia - não se vê, sejam quais forem os critérios concretamente adotados na referida
delimitação, como se poderá exigir mais proximidade que a existente entre pais e filhos, e
mais ainda entre gestante e feto75. Neste cenário, tanto o nascituro como o pai associam-se
estreitamente com a finalidade do contrato de prestação de serviços médicos e a mãe tem
um interesse comprovado em que assim seja76.

73
CARNEIRO DA FRADA, Sobre a Responsabilidade das Concessionárias por Acidentes Ocorridos em Auto-
Estradas, in ROA, Ano 65, Vol. II, Setembro de 2005, p. 6.
74
Seguimos os critérios apontados por CARNEIRO DA FRADA, em Uma terceira via no direito da
responsabilidade civil? O problema da imputação dos danos causado a terceiros por auditores de sociedades,
Coimbra, Almedina, 1997, pp. 91-92 e CARLOS MOTA PINTO, Cessão…, p. 423.
75
Aliás, neste caso, os deveres médicos existem não apenas em razão da saúde da progenitora, mas também
diante da saúde do nascituro, igualmente beneficiário do dever de cuidado.
76
Não concorda com o recurso a esta construção jurídica a Exma. Juíza Conselheira A NA PAULA BOULAROT,
que adverte que “nenhum outro direito se afigura concretizável com o nascimento do nascituro, maxime, o
decorrente de um pretenso contrato com eficácia de protecção de terceiro (terceiro este apenas nascituro, falho
da qualidade jurídica de terceiro para efeitos obrigacionais, por ausência de personalidade jurídica), a quem a
Lei não concede qualquer protecção por via da celebração daquele outro contrato de prestação de serviços
médicos, a não ser a protecção directa do mesmo, ou seja, a decorrente de uma actuação do médico dirigida
especificamente ao feto e por isso causadora das suas eventuais malformações…” (“A Tutela Geral e Especial
da Personalidade Humana”, in Coleção Formação Contínua, e-book do CEJ, 2017).
26
3.3. VISÃO SUMÁRIA DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA

A chamada responsabilidade civil extracontratual emergente da prática de atos


ilícitos assenta no seguinte conjunto de pressupostos: o facto ou ato humano voluntário, por
ação ou omissão; a ilicitude ou antijuridicidade do mesmo; a imputação do facto ao lesante
ou agente, ou seja, a sua culpa; a ocorrência de um dano ou lesão e o nexo de causalidade
entre a violação do direito e a produção do dano77. Passemos então à sua decomposição.

3.3.1 DO FACTO ILÍCITO, DA CULPA, DO DANO E DO NEXO DE CAUSALIDADE

(i) O facto ou a conduta pode ser definido como a ação ou omissão humana e
voluntária, sem a qual não haveria modificação do mundo exterior. Nos cenários de que
tratamos, o facto consistirá no nascimento da criança com malformações ou lesões de vários
tipos ou no perecimento do feto.

(ii) Já subjacente à ilicitude está um juízo de desvalor que o facto merece à face do
ordenamento jurídico, ora por violar uma disposição contratual, ora por desrespeitar um
direito absoluto ou uma norma legal destinada a proteger interesse alheio78. Tratar-se-ia,
aqui, da conduta desvaliosa que provoca lesões ou a morte do feto.
O artigo 483.º, n.º 1, do Código Civil tipifica a ilicitude do facto constitutivo de
responsabilidade civil extracontratual em duas modalidades: a violação do direito de outrem,
ou seja, a violação de um direito subjectivo - maxime, de um direito absoluto -, ou na
violação de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios79.
É evidente que são abrangidos pela primeira modalidade de ilicitude os direitos sobre
bens jurídicos pessoais80 (vida, corpo, saúde e liberdade); já na segunda categoria de
ilicitude, o sujeito acaba por ser protegido indiretamente porque beneficia do cumprimento
dos deveres que são impostos aos outros sujeitos.

77
Vd. Ac. do TRC de 04-11-2003 (JAIME FERREIRA).
78
Estas normas legais de proteção não têm de ser oriundas do direito civil, podendo ser (e normalmente até
são) normas de direito público (direito administrativo, penal, fiscal) – a título meramente exemplificativo,
refira-se a norma que impõe a vacinação obrigatória.
79
Contudo, como adianta o Ac. do STJ de 15-05-2003 (LUCAS COELHO), “(…) não basta a violação de uma
norma de protecção no sentido do preceito. Torna-se ademais mister atender ao concreto escopo de protecção
da norma, implicando a verificação de três requisitos fundamentais: que o lesado pertença ao seu domínio
subjectivo de aplicação, incluindo-se no círculo de pessoas que a norma abstractamente visa proteger; que
tenha sido em concreto ofendido o interesse tutelado mediante a lei de protecção; que se mostre concretizado
o perigo a esconjurar mercê da mesma lei”.
80
Em caso, por exemplo, de acidente de viação de que resulte a morte do nascituro, o requisito da ilicitude
estará por aqui cumprido. Cumpre lembrar a Lei n.º 16/2007, que exclui a ilicitude nos casos de interrupção
voluntária da gravidez permitidos legalmente. Deve também colocar-se a questão da licitude da fecundação
artificial quando implica a criação de embriões sobrantes, enquanto criação de vidas já à partida destinadas a
morrer.
27
Vertendo o descrito ao nosso objeto de estudo, e a propósito do direito do nascituro
a nascer saudável81, poderá defender-se que as equipas médicas que assistem a mulher
grávida deverão encetar todas as diligências e usar todos os recursos ao seu alcance em
ordem a precaver a disseminação de doenças ou deficiências genéticas, podendo o
desprezo por estas orientações fundar este requisito de ilicitude. A este propósito
atentemos nas assertivas palavras de FEINBERG82:

“[…] uma pessoa tem um dever de cuidado para com qualquer outra pessoa a quem possa
eventualmente causar danos como consequência da sua conduta (uma “vítima expectável”),
e, nalgumas ações, isso inclui pessoas não nascidas ou nem sequer concebidas. […] Uma
das consequências implícitas [desta conclusão] é que, quando estamos a lidar, medicamente
ou comercialmente, com uma mulher de certa idade, temos de pensar nela como podendo
estar grávida, e no seu meramente potencial futuro filho como uma “vítima expectável” da
nossa transação com ela.”

De entre todos os pressupostos a que nos reportamos, o da ilicitude revela-se, portanto,


o de mais difícil apuramento, uma vez que a sua verificação contende com as exigências
de causalidade fundante.

(iii) Prendamo-nos agora com a culpa83 (artigos 483.º e 799.º do C.C.), um juízo de
censura ético-jurídico dirigido ao agente quando este, pelas suas capacidades e em face das
circunstâncias concretas do caso, não age com a diligência e cuidado que lhe seriam
exigíveis84 - podia e devia ter agido de outra forma.
A culpa é, no ordenamento jurídico português, aferida em duas fases sucessivas:
primeiro através de um juízo genérico de imputabilidade85 e, de seguida, apreciando-se a
culpa em abstrato, recorrendo ao critério do bom pai de família, sem descurar, claro, o
concreto circunstancialismo do sucedido (artigo 487.º/2 do C.C.) 86.

81
Parecendo reconhecê-lo, ERMELANDO V. COSMI e E. MORDINI, “La bioetica ed i diritti del nascituro”, in
Scritti in onore di Guido Gerin, Padova, CEDAM, 1996, p. 123: “o direito biológico é aquele de ser
suficientemente são, ou de apenas ser portador de doenças, deficiências ou imperfeições físicas e mentais
devidas unicamente ao mecanismo da lotaria natural e portanto inevitáveis”.
82
FEINBERG, “Wrongful life and the counterfactual element in harming”, in SP&P, Vol. 4, Ed. 1, 1986, p.
155;
83
Sobre este requisito, vd. ANTUNES VARELA, op. cit., pp. 562 e ss. e LUÍS MENEZES LEITÃO, Direito das
Obrigações, Vol. I, Introdução, Da Constituição das Obrigações, 13.ª Ed., Coimbra, Almedina, 2016, pp.
304 e ss.
84
São excecionais os casos de responsabilidade sem culpa (artigo 483.º/2).
85
ANTUNES VARELA, op. cit., pp. 563 e ss.
86
No que se refere ao ónus probatório, e aplicando os termos gerais da sua repartição constantes do artigo
342.º/1 do C.C., incumbirá à gestante paciente, enquanto lesada, fazer prova da culpa do médico lesante, isto
28
Em sede de acompanhamento pré-natal e embriopático, o critério objetivo de
aferição da culpa será o do bom profissional médico, medianamente competente, prudente
e zeloso. Já a culpa em abstrato terá que se aferir tendo em conta um médico da mesma
categoria a que pertence aquele concreto médico87, avaliando-se as circunstâncias do caso,
i.e., o tipo de atividade em causa e o condicionalismo da situação que ladeou a displicência
e leviandade da atuação hospitalar.88

(iv) Mas certo é que a tónica da responsabilidade civil está na reparação do dano,
que para a conceção comum representa a supressão de uma vantagem assegurada pelo
Direito89. Haverá, portanto, a modificação de uma esfera jurídica, um antes e um depois do
sujeito90. Daqui se conclui, parece-nos, que só será de reparar o dano suportado pelo
nascituro se se lhe reconhecer a titularidade de uma vantagem já existente na sua esfera
jurídica ao tempo da supressão. In radice, deparamo-nos de novo com o dilema da atribuição
de personalidade jurídica ao feto, que muito já nos ocupou.

De facto, e permitindo-nos transcrever as palavras de OLIVEIRA ASCENSÃO91,

“a Responsabilidade Civil supõe a violação ilícita do direito de outrem (artigo 483.º) e


portanto uma personalidade contemporânea da lesão. Se não havia terceiro no momento da
prática do facto ilícito, nenhum dever de indemnizar se formou. (…) Não é o eventual
posterior nascimento de uma pessoa deformada que cria do nada este dever de indemnizar.”

Apesar de concordarmos com a proposição inicial92, não podemos acompanhar o


autor nesta sua última ilação, até porque a responsabilidade civil pode também supor a

no âmbito da responsabilidade aquiliana (artigo 487.º/1 do C.C.). Já no âmbito da responsabilidade contratual


opera uma inversão do ónus da prova (artigo 799.º/1 do C.C.), passando esta a recair sobre o médico lesante.
87
HENRIQUES GASPAR, “A responsabilidade civil do médico”, in CJ, Ano III, Tomo I, 1978, p. 346. Cfr.,
igualmente, RUTE PEDRO, A responsabilidade civil do médico: reflexões sobre a noção da perda de chance e
a tutela do doente lesado, Coimbra Editora, 2008, p. 128 e Ac. do STJ de 15-12-2011 (ÁLVARO RODRIGUES).
88
Como o sejam a urgência do caso, a qualidade e quantidade de instrumentos disponíveis, etc. Mais
aprofundadamente, vd. BRANDÃO PROENÇA, Lições de Cumprimento e Não Cumprimento de Obrigações, 2.ª
Ed. (Revista e Atualizada), Universidade Católica Editora, Porto, 2017, pp. 291 e ss.
89
Ou, como define MENEZES LEITÃO (op. cit., p. 297), “a frustração de uma utilidade que era objeto de tutela
jurídica”. Para mais desenvolvimentos sobre o conceito de dano e do “harm principle” desenvolvido por
STUART MILL, vd. ALBERTO GONZÁLEZ, op. cit., p. 57.
90
Cfr. CARNEIRO DA FRADA, “A Proteção Juscivil da Vida Pré-Natal – Sobre o Estatuto Jurídico do Embrião”,
in ROA, Vol. I/IV, Ano 70, 2010, p. 7. Não serão indemnizáveis, no sentido exposto, as hipóteses de uma
deficiência originária, já que nesses casos o sujeito nunca foi de outro modo. No caso, imaginemos, de uma
deficiência congénita ou de infeção desde o momento da conceção pelo vírus da SIDA transmitido pela
gestante, intervirá o direito da segurança social para garantir a assistência da criança, mas não se pode fundar
diretamente nenhuma obrigação de indemnização na lesão ilícita da posição do sujeito.
91
No mesmo sentido, vd. Ac. STJ de 17-02-2009 (HÉLDER ROQUE).
92
Com efeito, quando a ilicitude consiste na violação de direito de outrem, esse “outrem” tem de existir ao
tempo da ilicitude.
29
violação de uma norma legal destinada a proteger interesses alheios. Ora, nesse caso,
concebe-se facilmente a formação de um dever de indemnizar mesmo quando existe tão
“só” um ser, ainda não formado totalmente, mas que continua a ser uma vida humana, que
sofre um dano – basta que nele venha a verificar-se um dano (adequadamente causado pelo
facto ilícito culposo), que pode ocorrer antes de ele existir mas que só se materializa93 numa
realidade atendível pelo Direito num momento posterior (o do nascimento). E só aí, claro,
se formará na esfera jurídica do lesante a sua obrigação de indemnizar, apesar de o dano já
estar a ser suportado pelo nascituro.

Aliás, ÓRFÃO GONÇALVES94 coloca antes a tónica na contemporaneidade do ato


ilícito e da lesão - “o ato ilícito pode existir sem haver personalidade jurídica, e repercutir-
se depois numa pessoa, causando o dano. (…) Ato ilícito e lesão podem diferir – e muito –
no tempo: o suficiente para o aparecimento daquele que vai precisamente ser o lesado.”
Deste modo, e perante os dados legais de que dispomos, percebemos que
verdadeiramente indispensável para a tutela ressarcitória do sujeito é a afirmação da sua
personalidade ao tempo da lesão, que é o mesmo que dizer, quando o dano se consubstancia,
como resultado do facto ilícito que lhe dá origem.

Importa, neste ponto, aludir ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-04-


201495 que, baseando-se no Voto de Vencido do Exmo. Juiz Conselheiro MÁRIO CRUZ
aposto ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-02-2009, reconhece que:

“Não constitui óbice ao reconhecimento de tal direito o argumento da exigência da


contemporaneidade da personalidade com a lesão, uma vez que (i) nos Estados de Direito
contemporâneo é cada vez mais frequente a demanda cível e a responsabilização de agentes
cujos atos se produzem a longo prazo (de que são exemplo as doenças cujos efeitos se
revelam a posteriori e traumatismos causados por acidentes cuja evolução para neoplasias
malignas acontece a considerável distância cronológica), (ii) a relação entre a causa e o
efeito não implica necessariamente que os danos ocorram imediatamente, apenas se
exigindo o “nexo umbilical” que determine que o efeito ocorreu devido ao evento causado
por terceiro.”

93
Aliás, normalmente, o prejuízo que o nascido quer ver ressarcido é essa deficiência na projeção que ela tem
na sua vida atual ou futura.
94
Op. cit., p. 532.
95
Acórdão anotado por SÓNIA MOREIRA, em “O direito do nascituro à compensação por morte de um dos
progenitores: Anotação ao Acórdão do STJ de 3.4.2014, Proc. 436/07”, in Cadernos de Direito Privado, n.º
50, 2015, pp. 63-87.
30
Se tal conclusão não constitui um entrave à formação do direito indemnizatório do
nascituro quando este efetivamente nasça com vida, para os casos em que da sua lesão
resulte a morte, a dificuldade é óbvia, já que nunca chega a existir personalidade jurídica,
nos termos do artigo 66.º/1 do C.C. 96

No que tange às ações de wrongful life, colocou-se a possibilidade de configurar o


ato do nascimento ou a própria vida enquanto “dano”97 – o problema em presença passa, em
última análise, por saber se o Direito tutela um eventual interesse na morte. Teríamos, na
verdade, que avaliar o dano consoante a diferença entre a situação atual do lesado e a
situação em que estaria não fosse a ocorrência do facto lesivo98 (noutras palavras, de um
lado teríamos a vida e do outro a não vida, a não existência). Tudo isto contende com a
premissa constitucional da (in)disponibilidade ou irredutibilidade da vida humana, um dos
argumentos mais aproveitados para sustentar a improcedência destas ações. Contudo, há que
notar que não se discute aqui o ser ou o não ser, mas sim o sê-lo naquelas condições.
Naturalmente, a ordem jurídica portuguesa foi confrontada com estas pretensões
indemnizatórias, tendo sido o Supremo Tribunal de Justiça interpelado a pronunciar-se por
duas ocasiões: a primeira em 200199 e a segunda em 2013100. Ambas foram decididas no
sentido negativo, de rejeição da pretensão indemnizatória da criança, seguindo assim a
posição adotada pela maioria da jurisprudência estrangeira e não divergindo do escrito no
Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 55/2016101, que, em termos mais gerais, aponta o
seguinte:
“Temos de reconhecer, com humildade, que as contradições de valores pré e pós-
natais tornam impossível uma solução científica e sistematicamente conforme. Procurar uma
saída na relativização do próprio ser humano não é dogmaticamente possível nem eticamente

96
Ocupar-nos-emos adiante deste cenário, a propósito do artigo 496.º/2 do C.C. e da possibilidade de
concessão de indemnização a favor dos pais.
97
Leia-se, a título de exemplo, o Ac. do STJ de 19-06-2001. Vd. ainda RLJ, Ano 134.º, n.º 3933, pp. 371 e ss.,
com anotação de ANTÓNIO PINTO MONTEIRO.
98
A existência do dano avalia-se através do counterfactual test, i.e., da comparação entre a situação atual da
pessoa afetada com aquela outra em que ela se encontraria caso o autor da conduta não tivesse atuado como
atuou – a chamada “situação atual virtual”.
99
Ac. do STJ de 19-06-2001 (PINTO MONTEIRO) – o autor, menor, representado pelos seus pais, pede a
condenação dos réus (in casu, o médico e o gabinete de radiologia) no pagamento de uma indemnização por
danos patrimoniais e não patrimoniais, dado ter nascido com irreversíveis malformações nas duas pernas e na
mão direita.
100
Ac. do STJ de 17-01-2013 (ANA PAULA BOULAROT) – à semelhança do caso anterior, uma criança nasceu
com graves malformações, designadamente sem mãos nem braços, deformações nos pés, na língua, no nariz,
nas orelhas e na mandíbula. No decorrer da gravidez, a mãe sempre realizou as ecografias que lhe foram
requisitadas, período ao longo da qual lhe foi sempre informado que o bebé era perfeitamente saudável. A
verdade é que a mãe gerava um feto com profundas deficiências sem que disso tivesse conhecimento, o que
naturalmente lhe retirou a possibilidade de optar pela IVG e que fez com que instaurasse uma ação judicial
contra os médicos, tanto em nome próprio (wrongful birth), bem como em nome da criança (wrongful life).
101
Proc. n.º 662/15.
31
imaginável. A solução está noutra latitude: o alargamento dos escopos de responsabilidade
civil e a tutela da confiança na execução dos contratos levam-nos a propender para um direito
dos pais a uma indemnização, por violação do contrato e do dever de informar.”

(v) Igualmente decisivo para o êxito da pretensão indemnizatória do nascituro será


o estabelecimento da causalidade entre o facto danoso e a lesão sofrida às mãos de outrem.
A doutrina maioritária102 avalia a relação causa/efeito à luz da teoria da causalidade
adequada (artigo 563.º do C.C.) - determinada ação ou omissão é causa de um dano sempre
que seja abstratamente adequada a produzi-lo. Essa adequação abstrata é avaliada através
de um juízo de prognose póstuma, tendo em conta as regras da experiência comum e o curso
normal dos acontecimentos. A mencionada teoria pode também ser perspetivada na sua
formulação negativa e, assim, o facto só deixará de ser causa adequada do dano, desde que
o mesmo se mostre de todo inadequado à sua verificação e tenha sido produzido, apenas,
em consequência de circunstâncias anómalas ou excecionais.103
No que concerne ao nascituro, a grande dificuldade que este requisito comporta diz
respeito à prova da conexão causal concreta, dado que podem ter, entretanto, ocorrido outros
fatores causais, ainda que seja possível estabelecer na teoria uma relação de causalidade
adequada entre a conduta ilícita e o dano.
No nosso entender, deve ser admitida não só a concausalidade (em detrimento da
exigência de exclusividade), como também a possibilidade de causalidade indireta ou
mediata104 - quer isto dizer que, por um lado, nada impediria que a conduta do lesante
concorresse com outras igualmente suscetíveis de conduzir ao mesmo resultado e, por outro,
que subsistisse o nexo de causalidade quando o facto ilícito não produz ele mesmo o dano,
mas é causa adequada de outro facto que o produz105.

3.4. DA QUESTÃO DO DANO DA MORTE DO NASCITURO JÁ CONCEBIDO


A fixação do montante de indemnização deve resultar, para além do dano sofrido
pelo lesado, da ponderação de fatores como a culpa do lesante e as suas condições
económicas (artigo 494.º, ex vi do artigo 496.º, n.º 3 do C.C.), de modo a que a indemnização
funcione como uma sanção proporcionada ao comportamento danoso.
Entre as circunstâncias do caso que influenciam o valor da indemnização, figurará

102
MENEZES LEITÃO, op. cit., pp. 312-313; PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Vol.
1, 4.ª Ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, pp. 578-579.
103
Cfr. Ac. do TRL de 10-01-2012 e Acs. do STJ de 17-01-2013, de 07-10-2010 e de 03-03-2005.
104
Cfr. Ac. do STJ de 07-04-2005.
105
Vd. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, op. cit., p. 579.
32
seguramente o tempo de vida do feto106, como instrumento de medição da viabilidade do
seu trajeto rumo à autonomia biológica.

Quanto ao dano da morte, a doutrina maioritária subscreve o entendimento de que é


um dano não mensurável, pois não pode comparar-se a vida com qualquer outro bem cujo
valor seja conhecido e que possa constituir a sua contrapartida. O valor da vida é, noutra
perspetiva, igual para todas as pessoas, pelo que a indemnização não deve aferir-se pelo
custo da vida humana para a sociedade ou para os parentes da vítima, nem para os que dela
dependem, mas sim pelo valor da vida para a vítima enquanto ser.107

Num discurso jurídico aparentemente coerente com a posição que o nosso Direito
Civil reserva ao nascituro, o Supremo Tribunal de Justiça proferiu uma multiplicidade de
decisões referentes a pedidos cíveis, deduzidos na sua maioria pelos pais do nascituro, em
que se contemplava a indemnização do dano autónomo da perda de vida108 do feto. São os
casos dos Acórdãos do STJ de 09-10-2008109, em que uma mulher, vítima de um acidente
de viação na sequência do qual abortou, pretendia obter uma quantia compensatória110 pelo
dano da morte do feto, tendo o Tribunal apenas condenado à Ré o pagamento de uma
indemnização pelos danos morais sofridos em resultado do acidente, estando aí incluídos
“as dores, angústias, tristezas, falta de vontade de viver, ansiedade, vazio existencial e
carência afetiva que sofreu e irá sofrer, por ter perdido o filho que tanto desejava” ou do
Acórdão do STJ de 21-09-2006111, tendo igual pretensão, desta feita, partido dos pais de
uma jovem grávida de seis meses, vítima de homicídio às mãos do pai da criança – também
aqui se decidiu pelo mesmo, alertando-se ainda para as complicações advindas da
titularidade da indemnização, tendo-se inquirido:

“Mas o feto é centro autónomo de direitos patrimoniais? E transmitir-se-iam a quem? Aos

106
O legislador espanhol estabelece mesmo tabelas indemnizatórias consagrando variáveis de montantes fixos
determinados em função do mês de gravidez.
107
Sabido é que os tribunais têm fixado indemnizações pelo dano da morte com caráter meramente simbólico,
não ultrapassando normalmente os escassos milhares de euros.
108
Para uma leitura mais extensa das implicações do “pretium mortis”, vd. LEITE DE CAMPOS, A Indemnização
do Dano da Morte, Livraria Almedina, Coimbra, 1980; ORLANDO DE CARVALHO, Teoria Geral do Direito
Civil, Coord. de Francisco Liberal Fernandes, Maria Raquel Guimarães, Maria Regina Redinha, Coimbra
Editora, 2012, pp. 207 e 208; ADRIANO DE CUPIS, Il Danno, Teoria generale della responsabilitá civile, I,
Milano, Giuffrè Editore, 1971, pp. 61 e 62 e MARCO ROSSETTI, Il Danno da Lesione della Salute, CEDAM,
2001, pp. 819 e ss.
109
Publicado na CJ, Ano XVI, Tomo III, p. 59.
110
Aluda-se aqui à Portaria n.º 377/2008, de 26-05-2008, atualizada pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06-2009,
ambas publicadas em Diário da República. Fixam as mesmas os critérios para os procedimentos de
apresentação de proposta razoável aos lesados por acidente de automóvel, em particular no que diz respeito à
valorização do dano corporal.
111
Proc. n.º 06P1575.
33
ascendentes da mãe, por um lado, uma vez que esta perdeu a vida (antes, ao mesmo tempo
ou depois do feto?) e eventualmente aos descendentes do pai, por incapacidade deste
(artigos 234.º e 239.º do C.C.)?”.

Entendeu-se, então, que era impossível reconhecer ao feto um direito à vida


suscetível de ser indemnizado, uma vez que (regressando ao universo das nossas
preocupações) ele tinha perecido antes sequer de adquirir a qualidade de pessoa jurídica,
não podendo ser titular de qualquer direito.
Esta é, sabe-se, a hesitação que sempre pautou a admissibilidade do dano da morte112
em termos mais latos, e que melindrou a comunidade jurídica113 à conta do raciocínio lógico
quase inultrapassável que CURA MARIANO114 perentoriamente reproduz – “se o dano da
morte só ocorre no preciso momento em que a vida desaparece, o lesado nessa altura já não
dispõe de capacidade jurídica para adquirir direitos.”
Contudo, com a introdução do artigo 496.º/2 pretendeu-se, como pleiteia ANTUNES
VARELA, atribuir um direito de indemnização de origem115, pelos danos não patrimoniais
causados à vítima da lesão mortal, incluindo a própria supressão da vida.
Com efeito, as expressões “por morte da vítima” e “danos não patrimoniais sofridos
pela vítima” dos números 2 e 3 do artigo 496.º do C.C. podem perfeitamente abranger a
situação desses nascituros, os quais se encontram englobados no conceito de “vítima”.
Ora, esta posição de reconhecimento de um direito de indemnização autónomo pelo
dano da perda do bem vida, superando assim o obstáculo de o desaparecimento da pessoa
ocorrer simultaneamente com a verificação do dano que se quer ver ressarcido, aproveita
naturalmente à condição do nascituro, sendo hoje quase irrefutável116 que o dano da morte
justifica o arbitramento de uma indemnização específica117.

112
A polémica transparecia já do Anteprojeto Geral de VAZ SERRA sobre o “Direito das Obrigações” para o
atual Código Civil, onde no artigo 759.º/4 se previa que “o direito de satisfação por danos não patrimoniais
causados à vítima transmite-se aos herdeiros desta, mesmo que o facto lesivo tenha causado a sua morte e esta
seja instantânea”, e que se manteve no artigo 476.º/2 do Anteprojeto saído da 1.ª Revisão Ministerial.
113
Em geral, ao serem confrontados com a questão, os tribunais optavam por fixar indemnizações a favor dos
herdeiros ou das pessoas legalmente designadas para o efeito; por negar terminantemente a possibilidade de
constituição desse direito de indemnização; ou por seguir o entendimento segundo o qual o direito se transmitia
por morte aos seus sucessores (vd. os Acórdãos do STJ de 15-02-1952, no BMJ, n.º 29, p. 355, e de 17-03-
1959, no BMJ, n.º 85, p. 629). RITA LOBO XAVIER (op. cit., p. 80) sugere ainda a atribuição deste direito apenas
à mãe da criança, atendendo à dependência biológica do nascituro concebido em relação à progenitora.
114
CURA MARIANO, op. cit., p. 95.
115
A inconstitucionalidade da limitação do universo das pessoas que poderão receber uma indemnização pelo
dano de morte resultante da enumeração efetuada pelo artigo 496.º/3 do C.C. foi defendida com alguma
pertinência pelo Exmo. Juiz Conselheiro MÁRIO TORRES, em Voto de Vencido aposto no Ac. n.º 86/2007 do
TC.
116
Veja-se o Ac. do TRC de 29-01-2013. Contrariamente, vd. os Acs. do STJ de 21-09-2006 e 09-10-2008.
117
Quanto ao montante de indemnização, “a morte é o prejuízo supremo, envolvendo a desaparição do ser
humano. A destruição do bem vida envolve a destruição de todos os outros bens da personalidade: o feto nunca
34
Aliás, note-se que o instituto da responsabilidade civil não tem deixado de intervir
em dimensões, diga-se, menos exigentes da vida intrauterina, tutelando a integridade física
do feto e reconhecendo um direito de indemnização118 por ofensas corporais – desde que
este consiga nascer, atribui-se-lhe o direito de reclamar uma indemnização pelas ofensas
sofridas antes do nascimento. Ora, se a agressão tivesse sido de menor gravidade e o feto
tivesse vindo a nascer, poderia, pois, demandar judicialmente o agressor pelos danos
materiais e morais sofridos, pelo que não faz qualquer sentido que, tendo a agressão sido
letal, não possa exercitar o seu direito, por não ter chegado sequer a existir.
Como repara RABINDRANATH CAPELO DE SOUSA119, “seria premiado o assassino
mais eficaz que causasse a morte do concebido, face ao agressor que tão só lhe produzisse
danos corporais.” - implicitamente, a falta de intervenção da responsabilidade civil na lesão
do bem vida resultaria num défice incomportável de proteção que a ordem jurídica não pode
admitir.
Além disso, este dano também poderia ser considerado obrigatoriamente
indemnizável, face ao princípio estruturante do Estado de direito democrático, consagrado
no artigo 2.º da Constituição, do qual se colhe um direito geral à reparação dos danos, de
que são expressão particular os direitos de indemnização previstos nos artigos 22.º, 37.º/4,
60.º/1 e 62.º/2 da Constituição, como assinalam GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA120.

3.5. O CASO MAIS ESPECÍFICO DA POSSÍVEL APLICAÇÃO DO ARTIGO 496.º, 3 DO


CÓDIGO CIVIL À COMPENSAÇÃO POR MORTE DO PROGENITOR

Cumpre-nos ainda indagar se o nascituro é titular originário de um direito de


indemnização, por danos não patrimoniais, provenientes da morte do seu pai, contra o autor
de facto ilícito correspondente, à margem do fenómeno sucessório da herança da vítima.
Como sabemos, indemnizar é reconstituir ou reparar a ofensa trazida a um concreto
direito subjetivo, diretamente lesado pelo facto ilícito. Porém, excecionalmente121, concede-

fruirá dos prazeres dos sentidos, da razão, do movimento, dos sentimentos, etc. […] O montante de
indemnização do dano da morte deve ser, pois, superior à soma dos montantes de todos os outros danos não
patrimoniais”. (DIOGO LEITE DE CAMPOS, Os danos causados pela morte…, p. 137).
118
Defendendo a ressarcibilidade destes danos, ANTUNES VARELA, op. cit., p. 633-634 e MOTA PINTO, op.
cit., p. 201-202.
119
Op. cit., p. 272, nota 673.
120
GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª Ed.
Revista, Coimbra, 2014, p. 324.
121
Dado existir o princípio geral de exclusão de ressarcimento do dano mediato, indireto ou por reflexo – a
sucessão de factos conducentes ao dano a indemnizar deve manter-se dentro do âmbito restrito de proteção
dessa norma, sem estar dependente da casualidade de ao mesmo tempo ser infringida lei destinada a proteger
uma esfera jurídica completamente distinta.
35
se o direito de indemnização a terceiros, mediata ou imediatamente lesados, sendo o artigo
496.º/3 do Código Civil um desses segmentos normativos. Os números 2 e 4 do artigo 496.º
atribuem aos familiares da vítima abrangidos pela enumeração legal, e segundo a ordem
indicada, direito a compensação pelos danos não patrimoniais próprios que tenham sofrido
com a morte122 daquela, por se reconhecer que à proximidade do vínculo familiar
corresponderá a existência de estreitos lações de afeição.

A propósito desta concreta questão, a nossa opinião espelha-se com precisão no


Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-04-2014123, cujo sumário se passa, data
venia, a transcrever:

“Repugna ao mais elementar sentido de justiça – e viola o direito constitucional de


igualdade – que dois irmãos, que sofrem a perda do mesmo progenitor, tenham tratamento
jurídico diferenciado pela circunstância de um deles já ter nascido à data do falecimento do
pai e outro ter nascido apenas depois de tal acontecimento fatídico, reconhecendo-se a um
e negando-se a outro, respetivamente, a compensação por danos não patrimoniais
decorrentes da morte do seu pai”.

Convoca-se ainda uma brevíssima, mas elucidativa passagem do Acórdão do STJ de


08-05-2008124, relativamente a um caso similar, doutamente relatado pelo Exmo. Juiz
Conselheiro SERRA BAPTISTA, que refletiu que:

“Serão desgostos bem diferentes, estamos certos, o sofrido pela perda do progenitor que
bem se conhecia, que se estimava e em quem se via, em princípio, um inestimável e
inesquecível apoio ou aquele outro trazido pela ausência do progenitor, que nunca se
chegou a conhecer, com as inerentes angústias que advirão de tal irreversível vazio que
também, com certeza, perdurará pela vida fora.”

Conciliando com o artigo 66.º/2 do C.C., quando a lei prevê casos específicos em
que reconhece direitos aos nascituros, não está a afastar, por exclusão de partes, a

122
Merecedores da tutela do direito não são apenas os danos não patrimoniais provenientes da morte da vítima
(hipótese especialmente contemplada nos números 2 a 4 do artigo) ou de lesão corporal – admite-se a
indemnização de danos não patrimoniais, desde que graves, resultantes da violação de outros direitos de
personalidade, como a saúde, a liberdade, a honra, a autodeterminação sexual, a vida privada ou a imagem.
123
Em sentido contrário, veja-se, por exemplo, o Ac. do STJ de 09-10-2008 e, entre outros, o Ac. do TRP de
13-04-1989 (ARAGÃO SEIA), no proc. n.º 0023761, in CJ, 1989, II, pp. 221 e ss.: "os nascituros não têm direito
a indemnização por danos morais próprios, mas poderão vir a tê-lo como herdeiros, pela perda do direito à
vida do de cujus". Dito doutro modo, a lei apenas reconhece expressamente aos nascituros a respetiva
capacidade sucessória, pelo que se os danos não patrimoniais da vítima mortal se transmitirem por essa via, o
nascituro poderá sempre receber a indemnização como seu sucessor.
124
Proc. n.º 08B726.
36
possibilidade de aplicação aos nascituros dos direitos que na lei surgem como próprios dos
filhos - não há razão para criar distinções onde a lei não distingue (ubi lex non distinguit,
necque nos distinguere licet).

Nas antípodas, encontramos quem considere que o legislador estatuiu, no artigo


66.º/2 do C.C., que “os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu
nascimento” e não que “os direitos dos nascituros dependem do seu nascimento”, o que
significa que comprimiu o feixe desses direitos, que não quis alargar, indiscriminadamente,
a qualquer situação, e que não confundiu o conceito de nascituro com o conceito de filho.125

Acresce que o artigo 26.º da Constituição, reconhecendo a todos o direito à


identidade pessoal, não estaria a ser cumprido, se se interpretasse o artigo 496.º/3 do C.C.
de uma forma limitativa, atribuindo o direito de indemnização por danos não patrimoniais
aos filhos que já tenham nascido e não aos filhos que estejam apenas concebidos, mesmo
que nasçam com meras horas de diferença. Violaria, por outro lado, também, o direito
constitucional de igualdade em que são colocados os descendentes no mesmo grau, do
mesmo progenitor, relativamente ao enunciado direito, sendo certo que tanto um como outro
provêm das mesmas pessoas e que a identidade física do filho nascido é a mesma do filho
nascituro enquanto contido no ventre materno, e que se desenvolve ininterruptamente desde
a conceção. De trazer à colação os artigos 13.º, 24.º, 25.º da Constituição que, em nosso
entender, sustentam a posição aqui plasmada126, de que a letra da lei parece ter latitude
bastante para admitir a inclusão dos filhos ainda não nascidos no conceito de “filhos” para
efeitos do artigo.

CONCLUSÕES
É incumbência do Direito compor variadíssimos conflitos de interesses, atendendo às
funções essenciais da justiça e igualdade social.

O ordenamento jurídico português confere alguma proteção ao nascituro – e até ao


concepturo – mas (com exceção das limitações legais à ilicitude da interrupção voluntária
da gravidez), fá-la depender do posterior nascimento completo e com vida.

Não é descabido falar de um deficit personalista no direito da codificação civil

125
Vd. Ac. do STJ de 03-04-2014.
126
Em sentido contrário, pronuncia-se o Ac. do STJ de 17-02-2009 - “a desigualdade do tratamento normativo
entre filhos e nascituros tem como fronteira e razão determinante o acontecimento mais marcante do ser
humano, que é o seu nascimento”.
37
relativamente ao estatuto do nascituro: nega-se-lhe a subjetividade jurídica, procura-se
resolver, tant bien que mal, algumas situações do foro patrimonial, mas deixa-se
desprotegido quanto aos bens essenciais e prioritários da personalidade. E apesar do reforço,
nas Constituições, da afirmação do princípio da dignidade humana (cfr. artigo 1.º da
Constituição Portuguesa) e da tutela dispensada aos “direitos humanos” (artigos 12.º e ss.),
e.g., à vida, integridade física e à saúde, o ser humano embrionário exposto, crescentemente,
a novas formas de agressão, vê-se privado do necessário amparo da lei.
No nosso entender, o simples facto de se considerar que a vida intrauterina é uma das
etapas da vida humana abrangida pela existência da sua inviolabilidade é suficiente para
reclamar da ordem jurídica infraconstitucional a adoção de medidas que a protejam e
tutelem, não estando portanto dependente de um reconhecimento de um direito à vida do
nascituro concebido.

Referindo-nos às palavras de LEITE DE CAMPOS127,

“a personalidade humana não pode depender da autonomia do ser. De outro modo, deixaria de
haver pessoa humana quando alguém estivesse atingido por uma doença capaz de provocar a
morte, a não ser mediante assistência médica. E não seriam pessoas humanas todos aqueles,
muito jovens, muito idosos ou muito doentes, incapazes de angariar os meios necessários para
a sua sobrevivência. Ora, é seguro que todos esses «seres humanos o são», são pessoas.”

Cremos que a definição de um prazo dentro do qual o feto não receberia qualquer
proteção legal e de um momento (sistema nervoso, córtex cerebral ou viabilidade) a partir
do qual representaria um valor merecedor de tutela jurídica tem um sentido arbitrário e
subjetivo, pois a vida humana é um processo e qualquer divisão dentro desse processo é
sempre discutível, não só de um ponto de vista ético mas também científico – o surgimento
da vida é um processo sem descontinuidades (natura non facit saltus). Com efeito, o feto
é sede de vida humana e desenvolve-se ininterruptamente desde a conceção. É, por isso,
naturalmente dotado de personalidade, personalidade essa que se impõe à ordem jurídica e
que não cabe a esta negar.

As posições do Supremo Tribunal de Justiça sobre a questão não permitem


considerar ainda a existência de correntes jurisprudenciais consolidadas ou trabalhadas,
que conflituem em coincidência temporal e que revelem oposição com consistência para

127
“A Capacidade Sucessória do Nascituro (ou a crise do positivismo legalista)”, in Pessoa Humana e Direito,
2009, p. 51.
38
permitir formar um juízo sobre a inviabilidade de estabilização de um determinado
entendimento.

As conceções tradicionais de justiça das sociedades antigas alicerçavam-se no


pensamento de que o dano injustamente suportado, decorrente da violação de um dever
genérico ou da desobediência a um preceito legal, faria corresponder à outra parte o direito
de exigir corporalmente do dever a satisfação da ofensa – assim previa a Lei de Talião, olho
por olho, dente por dente. Embora não seja nestes termos exatos que estas ideias
perpassaram para o Direito atual, certo é que é preocupação do nosso legislador a reposição
do status do lesado, forjando-se daí todo um sistema intrincado de responsabilidade civil.

Precisamente quanto à idoneidade deste instituto, é nossa convicta opinião que devem
ser aproveitadas todas as suas virtualidades - não podemos partir de uma negação
apriorística da aptidão da responsabilidade civil para responder ao problema da
indemnização devida aos nascituros, impondo-se antes, cautelosamente, uma análise dos
seus pressupostos.

No tocante à ilicitude contratual, constatamos que a relação médico-paciente é hoje


entendida como uma relação contratual de prestação de serviços, de onde facilmente
emergem vicissitudes legalmente relevantes, especialmente ligadas ao incumprimento dos
deveres de informação e de consentimento e de violação das legis artis, e que podem ser
geradoras da obrigação de indemnizar. Equacionamos também, com interesse elevado nas
hipóteses de wrongful life, o recurso ao contrato com eficácia de proteção para terceiros, de
modo a incluir a criança e o progenitor no âmbito de proteção do contrato celebrado entre a
mãe e o médico, expediente que nos parece perfeitamente admissível e útil para a questão
em apreço.

Nas situações em que a responsabilidade civil contratual não opera, averiguamos a


ilicitude no âmbito da responsabilidade aquiliana, que tanto se pode reportar à violação de
um direito absoluto, como à de um interesse legalmente protegido, dando margem para que
o Direito atue, impondo a reparação do dano a quem atuou imprudentemente. Relativamente
à culpa, entendemos não ser o requisito crucial para a aferição da admissibilidade deste tipo
de pretensões do nascituro, apesar das questões que levanta no campo da responsabilidade
médica em geral, sendo relativamente simples reconhecer a negligência da atuação danosa.

No que concerne ao dano, são várias as interrogações que se colocam quanto à


exigência de simultaneidade temporal entre a lesão causada e o direito passível de ser

39
lesável, acolhendo nós o entendimento de que não há necessidade de que o dano ocorra
imediatamente, apenas que haja uma conexão que permita afirmar que aquele efeito danoso
decorreu por via daquela conduta lesiva. Quanto à sua ressarcibilidade, socorremo-nos do
contrafactual test, para uma comparação da vida saudável à vida naquelas condições (e
nunca à não vida). Assim sendo, são os danos patrimoniais e não patrimoniais advenientes
daquelas condições os que deverão ser ressarcidos.

Por fim, para afirmação do nexo de causalidade é necessária a consideração da teoria


da causalidade adequada, também na sua formulação negativa, e da admissibilidade da
existência de nexo de causalidade indiretos e concorrentes.

Como tivemos a intenção de demonstrar, não constituirá, a priori, um óbice à


concessão de uma indemnização ao feto por danos perpetrados antes do seu nascimento, o
facto de, à data da prática do facto ilícito, a criança ainda não ter, precisamente, nascido.
Quer viva, com lesões, quer não chegue a viver, cremos que os danos que sofreu deverão
ser indemnizados, podendo uma ação típica de responsabilidade civil servir os seus
propósitos.

Contudo, é importante ir além da dinâmica da responsabilidade civil e decompor o


que significa dotar os nascituros de força jurisgénica à luz do conjunto legal nacional.
Lembra LEITE DE CAMPOS128 que “não há que perguntar qual o valor do nascituro mas,
previamente, o que é o nascituro: um ser humano, ou não? Respondido que é um ser humano,
o problema fica resolvido, pois a resposta determina as conclusões.”

Espera-se que seja possível extrair do presente estudo, no plano jurídico (onde as
divergências se dão), algum contributo para a compreensão das matérias nele abordadas,
que se prevê que continuem a ser, futuramente, objeto de reflexão e de discussão.

É inadiável a formulação de prescrições normativas mais transparentes para dar


resposta às interrogações que este tema, tão contemporâneo quanto fértil nas suas
perspetivas de análise, potencia.

128
LEITE DE CAMPOS, “O Estatuto Jurídico do Nascituro”, in ROA, 1997, p. 8.
40
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As decisões jurisprudenciais portuguesas citadas estão disponíveis em


www.dgsi.pt, salvo indicação expressa em contrário.

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Cour Européenne des Droits de l’Homme, Affaire Evans c. Royaume-Uni, de 10-04-2007,


acessível em https://www.echr.coe.int/Pages/home.aspx?p=caselaw&c=fre.

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