Habitos Espirituais David Mathis
Habitos Espirituais David Mathis
Habitos Espirituais David Mathis
Bíblia, oração e comunhão cristã (com dois ou três outros fatores incluídos), sua
grande força e beleza é que nutre minha resolução de ler a Bíblia e me dá fome de
oração. Se os chamados “meios de graça” são apresentados como nada além de
deveres, a engrenagem da santi cação é a obrigação. Mas, neste caso, os meios de
graça são corretamente percebidos como dons graciosos e sinais de que Deus está
trabalhando em nós, o que aumenta nossa alegria por estarmos no auge da
liberdade cristã sob as glórias do Rei Jesus.
D. A. Carson
Professor Pesquisador de Novo Testamento no Trinity Evangelical Divinity
School; co-fundador do e Gospel Coalition
David Mathis mais do que cumpriu o seu objetivo de escrever uma introdução às
disciplinas espirituais. O que mais amo no livro é como Mathis apresenta as
disciplinas — ou “meios de graça”, como ele prefere descrevê-las — como hábitos
a serem cultivados para deleitar-se em Jesus. As práticas bíblicas que Mathis
explica não são ns — esse foi o erro dos fariseus na época de Jesus e dos
legalistas em nosso tempo. Antes, são meios pelos quais buscamos, desfrutamos
e nos deleitamos em Jesus Cristo. Que o Senhor use este livro para ajudá-lo a se
colocar “no caminho da atração” que resulte em um aumento de sua alegria em
Jesus.
Donald S. Whitney
Professor Associado de Espiritualidade Bíblica e Reitor Associado Sênior da
Escola de Teologia no e Southern Baptist eological Seminary; autor de
Disciplinas espirituais (Editora Batista Regular)
David Mathis nos deu um livro sobre as disciplinas espirituais que é prático, útil
e acessível. Ele fala com uma voz que não repreende nem sobrecarrega,
oferecendo encorajamento por meio de sugestões e percepções para ajudar até
mesmo o mais novo crente a encontrar um ritmo pelo qual empregar esses meios
de graça. Com uma abordagem do assunto que é maravilhosamente
descomplicada e minuciosa, Hábitos espirituais oferece um ponto de partida para
iniciantes e um caminho de crescimento para os experientes na fé.
Jen Wilkin
Autora de Mulheres da Palavra; Professora de estudo bíblico
Sou atraído por livros que sei que primeiro foram vividos na confusão da vida
antes de serem colocados em folhas de papel em branco. Este é um desses livros!
David encontrou um caminho antigo até Jesus por meio dos hábitos de graça que
ele nos recomenda. Sou extremamente grato pelo compromisso de David em
tomar a mensagem atemporal deste livro e comunicá-la em uma linguagem que
seja cativante para a mente e calorosa para o coração. Este livro tem a amplitude
de uma revisão da literatura com o estilo de um devocional. Estou ansioso para
colocá-lo nas mãos de nossa equipe de ministério do campus e vê-lo sendo lido
em dormitórios e centros estudantis em todo o país.
Matt Bradner
Diretor Regional da Campus Outreach
David Mathis nos forneceu uma visão das práticas espirituais cristãs que é
guiada pelo evangelho, centrada na Palavra e exalta a Cristo. Além disso, ele
entende que a santi cação é um projeto comunitário: a igreja local tem uma
grande importância em Hábitos espirituais. Este livro é perfeito para estudo em
pequenos grupos, leitura devocional ou para ser dado a um amigo que está
pensando neste assunto pela primeira vez. Dou a ele minha mais alta
recomendação.
Nathan A. Finn
Deão da Escola de Teologia e Missões na Union University
Para Carson e Coleman
Que ele lhes dê um paladar para as receitas antigas
Sumário
Apresentação
Prefácio
Introdução | Graça indomada
Parte 1 | Ouvir a vozde Deus — Palavra
1 | Molde sua vida com as palavras de vida
2 | Leia para amplitude, estude para profundidade
3 | Aqueça-se no fogo da meditação
4 | Leve a Bíblia em seu coração
5 | Memorize a mente de Deus
6 | Decida ser um aprendiz por toda a vida
Parte 2 | Ser ouvido por Deus — Oração
7 | Desfrute da dádiva de ser ouvido por Deus
8 | Ore em secreto
9 | Ore com constância e companhia
10 | A e suas afeições com o jejum
11 | O diário como um caminho para a alegria
12 | Faça uma pausa no caos
Parte 3 | Pertencer ao seu corpo — Comunhão
13 | Aprenda a voar com a comunhão
14 | Acenda a chama da adoração comunitária
15 | Ouça a graça no púlpito
16 | Lave-se novamente nas águas
17 | Cresça em graça na mesa
18 | Receba a bênção da repreensão
Parte 4 | Desfecho
19 | A comissão
20 | O dinheiro
21 | O relógio
Epílogo | Comunhão com Cristo em um dia caótico
Agradecimentos
Apresentação
N ão acho que tenha sido a intenção de David, mas seu título e subtítulo são
um quiasmo. E eu gostei tanto disso que vou construir meu prefácio em
torno disso. Um quiasmo (tirado da letra grega chi, que se parece com um X) é
uma sequência de pensamentos em que o primeiro e o último membro
correspondem, e o segundo e o penúltimo membro correspondem, e assim por
diante, com um pensamento de articulação no meio. Portanto, o título do livro
ca assim em um quiasmo:
Hábitos
espirituais:
Prazer em Jesus
pela graça
diária
Hábitos corresponde a diária. Espirituais corresponde a graça. E prazer em
Jesus é a articulação. Isso está repleto de implicações que fazem valer a pena ler o
livro de David.
O quiasmo, o livro e a teologia por trás dele exigem que deleitar-se em Jesus
seja a articulação. Mas essa “articulação” signi ca apenas o ponto de virada no
meio dos outros pensamentos. Sempre há muito mais que isso. Nesse caso, a
articulação é o objetivo de todo o resto.
David está escrevendo um livro para ajudá-lo a deleitar-se em Jesus. Ao fazer
isso, ele não está procurando ser “legal”. Ele está procurando ser “bombástico”.
Sua maneira de pensar sobre prazer em Jesus é explosiva. Se você tem mais
prazer em Jesus do que na vida (Mt 10.38), você viverá uma vida de entrega
absoluta por Jesus, que fará o mundo maravilhar-se. Deleitar-se em Jesus não é
algo como a cobertura do bolo; é como a pólvora em uma cápsula de projétil.
Deleitar-se em Jesus não é apenas uma transformação explosiva na maneira
como vivemos; é também algo essencial para evidenciar a grandeza de Jesus. E é
por isso que temos o Espírito Santo. Jesus disse que o Espírito veio para
glori cá-lo ( Jo 16.14). A missão principal do Espírito (e de seu povo) é mostrar
que Jesus é mais glorioso do que qualquer outra coisa ou pessoa. Isso não pode
ser feito por aqueles que acham este mundo mais agradável do que Jesus. Eles
fazem o mundo parecer ótimo. Portanto, o objetivo nal da vida cristã — e do
universo — depende do povo de Deus deleitar-se no Filho de Deus.
Mas isso está além de nós. Nossos corações geralmente deleitam-se no
mundo mais do que em Jesus. É por isso que a ideia de articulação — deleitar-se
em Jesus — é cercada de ambos os lados pelas palavras espirituais e graça.
Espirituais
Prazer em Jesus
Graça
Graça é a obra livre e soberana de Deus em fazer por nós o que não podemos
fazer por nós mesmos, embora não mereçamos. Espiritual é a palavra bíblica para
descrever o que foi realizado pelo Espírito Santo. “Espiritual” não signi ca
religioso, místico, ou no estilo da nova era. Signi ca compelido e moldado pelo
Espírito de Deus.
Portanto, o ponto é o seguinte: Deus todo-poderoso, por sua graça e por seu
Espírito, não nos deixa sozinhos quando se trata de deleitar-nos em Jesus. Ele
nos ajuda. Ele não diz “agrada-te do S ” (Sl 37.4) e depois simplesmente
se afasta e observa para ver se conseguimos. Ele faz uma aliança conosco e diz:
“Porei dentro de vós o meu Espírito e farei que andeis nos meus estatutos” (Ez
36.27). Ele causa o que ele comanda. Deleitar-se em Jesus não é opcional. É um
dever. Mas também é uma dádiva — espiritual e graciosa.
Mas a dádiva vem através de meios. É por isso que Espirituais está ao lado de
Hábitos, e Graça está ao lado de Diária.
Hábitos
espirituais:
Prazer em Jesus
pela graça
diária
A Bíblia não diz: “Deus está operando em vocês para realizar seus bons
propósitos, portanto, quem na cama”. Diz: “Desenvolvam a sua salvação, porque
Deus está operando em vocês” (veja Fp 2.12-13). A obra de Deus não torna
nosso trabalho desnecessário; torna-o possível. “Trabalhei muito mais do que
todos eles; todavia, não eu, mas a graça de Deus comigo” (1Co 15.10). A graça
não apenas perdoa nossas falhas; ela fortalece os nossos sucessos — como por
exemplo, o de efetivamente deleitar-se em Jesus mais do que na vida.
Este livro é sobre hábitos capacitados pela graça e disciplinas capacitadas pelo
Espírito. Esses são os meios que Deus concedeu, para que se beba da fonte da
vida. Eles não conquistam o prazer. Eles o recebem. Eles não são pagamentos
pelo prazer; são canais dele. O salmista não diz: “lhes vende bebida”, mas: “na
torrente das tuas delícias lhes dás de beber” (Sl 36.8). Mas todos nós
desperdiçamos. Todos nós precisamos de inspiração e instrução sobre como
beber — repetidamente. Habitualmente.
Se você nunca leu um livro sobre hábitos da graça ou disciplinas espirituais,
comece com este. Se você é um amante veterano do rio de Deus, mas, por algum
motivo, recentemente tem vagado sem rumo pelo deserto, este livro será um bom
caminho de volta.
John Piper
desiringGod.org
Minneapolis, Minnesota
Prefácio
INUNDANDO O FUTURO
Justamente quando temos certeza de que já é o bastante e de que alguma ordem
deve ser restaurada e alguns limites estabelecidos, a graça de Deus não apenas
inunda nosso futuro nesta vida, mas também cruza a fronteira com a próxima, e
se derrama nas planícies de nossa eternidade. A graça glori ca.
Se as Escrituras não fossem tão claras sobre essa história da nossa glória,
caríamos com medo até de sonhar com tal graça. Não apenas Jesus será
glori cado em nós, mas nós seremos glori cados nele, “segundo a graça do nosso
Deus e do Senhor Jesus Cristo” (2Ts 1.12). Ele é “o Deus de toda a graça, que
em Cristo vos chamou à sua eterna glória” (1Pe 5.10).
Portanto, Pedro nos diz: “esperai inteiramente na graça que vos está sendo
trazida na revelação de Jesus Cristo” (1Pe 1.13). Será indescritivelmente
impressionante nos séculos vindouros, quando ele mostrar “a suprema riqueza da
sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus” (Ef 2.7). Mesmo os mais
maduros de nós apenas começaram a provar a graça de Deus.
Escolhidos antes do tempo. Chamados e cazmente. Unidos a Jesus em fé e
arrependimento. Adotados e perdoados. Justi cados. Santi cados. Glori cados.
E satisfeitos para sempre. Esta é a graça que se tornou maravilhosamente
indomada. Este é o dilúvio do favor de Deus, no qual descobrimos o poder e a
prática dos meios de graça.
COLOQUE-SE NO CAMINHO DA GRAÇA DE DEUS
É nesse mar in nito de sua graça que percorremos o caminho da vida cristã e
damos passos de esforço e iniciativa, capacitados pela graça. Funciona mais ou
menos assim:
Posso ligar um interruptor, mas não forneço a eletricidade. Posso abrir a
torneira, mas não faço a água correr. Não haverá luz nem água fresca sem que
alguém as forneça. E assim é para o cristão com a contínua graça de Deus. Sua
graça é essencial para nossa vida espiritual, mas não controlamos seu suprimento.
Não podemos fazer o favor de Deus uir, mas ele nos deu circuitos para conectar
e canos para abrir com expectativa. Existem caminhos pelos quais ele prometeu
seu favor.
Como já celebramos, nosso Deus é generoso em sua graça; ele é livre para
dispensar liberalmente sua bondade, sem o mínimo de cooperação e preparação
de nossa parte,
e frequentemente o faz. Mas ele também tem seus canais regulares. E podemos
rotineiramente nos valer desses caminhos revelados de bênçãos — ou
negligenciá-los para nosso prejuízo.
EXERCITE-SE NA PIEDADE
Sim, é graça e, sim, nos esforçamos. Assim o apóstolo Paulo diz ao seu
protegido: “Exercita-te, pessoalmente, na piedade” (1Tm 4.7). Discipline-se para
crescer. Aja regularmente para ter mais de Deus em sua mente e coração, e ecoar
seus caminhos em sua vida, o que o tornará cada vez mais parecido com ele
(“piedade”). É um presente que recebemos à medida que nos tornamos assim.
A própria con ança de Paulo em Deus para obter graça contínua é um
poderoso testemunho dessa dinâmica cristã dos meios de graça e dos hábitos de
vida que cultivamos. Ele diz em 1 Coríntios 15.10: “pela graça de Deus, sou o
que sou; […] trabalhei muito mais do que todos eles; todavia, não eu, mas a
graça de Deus comigo”. A graça de Deus não tornou Paulo passivo, mas forneceu
a energia para a disciplina e o esforço, e cada grama de energia despendida foi
toda devido à graça.
E Paulo diz em Romanos 15.18: “Porque não ousarei discorrer sobre coisa
alguma, senão sobre aquelas que Cristo fez por meu intermédio”. A graça de
Jesus, neste caso, não signi ca cumprir seu propósito apesar de Paulo, ou
separado dele, mas por meio dele. Onde o apóstolo obtém força para trabalhar e
despender tanto esforço espiritual? “eu também me afadigo, esforçando-me o
mais possível, segundo a sua e cácia que opera e cientemente em mim” (Cl
1.29).
A PALAVRA ORIGINAL
Antes de identi carmos a presença da voz de Deus em nossas vidas com os
muitos bons hábitos de receber sua palavra — seja lendo e estudando a Bíblia,
ouvindo sermões, meditando ou memorizando as Escrituras e muito mais —
primeiro vamos ver sua palavra como um princípio geral, antes das práticas
especí cas.
Antes de imprimi-la, encaderná-la e encapá-la com couro, considere o
conceito da palavra de Deus. Deus fala. Ele se revela a nós. Ele se comunica
conosco. Sua palavra, como diz John Frame, é “sua autoexpressão poderosa e
autoritativa”.18 Assim como as palavras de um amigo são fundamentais para nos
revelar sua pessoa, o mesmo ocorre com Deus.
Aquele que nos criou — e nos sustenta a cada momento (Cl 1.17; Hb 1.3) —
expressou-se a nós em palavras humanas e é vital que o ouçamos. Os outros
meios principais de sua graça (oração e comunhão), embora igualmente
essenciais, não são tão fundamentais como este. Criação (Gn 1.3) e nova criação
(2Co 4.6) começam ambas com a voz de Deus. Ele inicia, e o faz pela fala. Essa
autoexpressão de Deus é tão profunda, rica e plena que não é apenas pessoal,
mas uma pessoa.
A PALAVRA ENCARNADA
A autorrevelação completa e culminante de Deus ao homem é o Deus-homem,
seu Filho (Hb 1.1-2). Jesus é “o Verbo” ( Jo 1.1) e “o Verbo se fez carne” ( Jo
1.14). Ele é aquele que de maneira mais completa e nal “revelou” o Pai ( Jo
1.18). Jesus é a autoexpressão culminante de Deus e diz sem qualquer engano ou
oreio: “Quem me vê a mim, vê o Pai” ( Jo 14.9).
Jesus é a Palavra de Deus corpori cada. Ele é a graça de Deus encarnada (Tt
2.11). Tão plena e completa é sua revelação de Deus que ele não é uma “coisa-
palavra”, mas uma pessoa-Palavra. Ele cumpriu o destino da humanidade em sua
vida perfeita e morte sacri cial (Hb 2.9), ressuscitou em triunfo sobre o pecado e
a morte, e agora se assenta à direita do Pai, com todas as coisas sendo colocadas
em sujeição a ele (1Co 15.25-28). Ele é a Palavra divina-humana de que nossas
almas precisam para sobreviver, ter força e crescer. Mas como acessamos essa
Palavra, agora que ele está assentado nos céus?
A PALAVRA EVANGÉLICA
O uso mais frequente de palavra no Novo Testamento é em referência à
mensagem do evangelho — a palavra evangélica, podemos chamá-la, ou a palavra
do evangelho — a mensagem sobre Jesus, “a palavra de Cristo” (Cl 3.16). Para
Paulo, as expressões “pregar a Cristo”, “proclamar a Cristo” e “falar a palavra de
Deus” são sinônimos (Fp 1.14-17). A missão de sua vida, Paulo diz, é
“testemunhar o evangelho da graça de Deus” (At 20.24), que é “a palavra da sua
graça” (At 20.32).
É “a palavra da verdade do evangelho” que não só vem a nós para conversão,
mas também produz frutos e cresce (Cl 1.5). É “a palavra da verdade, o
evangelho da vossa salvação” que muda tudo para os cristãos (Ef 1.13), e “a
palavra da vida” à qual nos apegamos no meio de uma geração pervertida e
corrupta (Fp 2.15-16). E, assim, na luta cristã pela alegria, John Piper escreve: “A
estratégia central é a pregação do evangelho a nós mesmos […] Ouvir a palavra
da cruz e pregá-la a nós mesmos é uma estratégia central para os pecadores que
lutam pela alegria”.19
E conforme essa palavra do evangelho passa de boca em boca, de pessoa em
pessoa, de povo em povo, de nação em nação, como a mensagem sobre Jesus
permanecerá na mensagem? O que manterá a palavra falada el, verdadeira e
transformadora? E como podemos evitar cair em vícios e seguir as mesmas
velhas maneiras enlatadas de contar a mensagem?
A PALAVRA ESCRITA
Tendo vislumbrado o ápice da Palavra de Deus na pessoa e obra de Jesus e a
prevalência da palavra de Deus em seu evangelho, agora chegamos ao lugar
essencial, neste lado do céu, para a palavra de Deus escrita. Tão crucial para a
vida espiritual quanto termos Deus em sua Palavra, Jesus, e termos Jesus em sua
palavra, o evangelho, precisamos das Escrituras como a revelação inspirada,
inerrante e infalível de Deus sobre si mesmo.
Sem a Bíblia, logo perdemos o verdadeiro evangelho, o verdadeiro Jesus e o
verdadeiro Deus. Agora, se quisermos saturar nossas vidas com palavras de vida,
devemos ser o povo do Livro. Isso não é uma prescrição necessária para que todo
cristão tenha os mesmos hábitos especí cos; mas é um apelo ao princípio de
mergulhar nossas vidas na voz de Deus e diversi car o portfólio de pontos de
acesso a ela. Antes de ponderar sobre os muitos e maravilhosos hábitos de graça
que podem ser melhores para você em seu contexto e época de vida, coloque este
princípio no lugar: desenvolva ritmos de vida que o ajudem a concentrar-se em
ter a Palavra de Deus encarnada, pela palavra do evangelho de Deus, por meio da
palavra escrita de Deus.
A PALAVRA ABRANGENTE
Com essa perspectiva da palavra de Deus em ação, incontáveis rotinas criativas
podem surgir, seja ler a Bíblia em um ano, ou memorizar passagens ou livros
inteiros, ou meditar em versículos ou parágrafos únicos, ou identi car e buscar
aplicações incisivamente, ou ouvir sermões em podcasts, ou ler conteúdo
biblicamente rico online, ou fazer cursos bíblicos, ou consumir livros cristãos, e
assim por diante — e variando de vez em quando. As práticas potenciais são
ilimitadas, mas o princípio por trás das práticas é este: O meio fundamental da
graça contínua de Deus, por meio de seu Espírito, na vida do cristão e na vida da
igreja é a autoexpressão de Deus em sua Palavra, no evangelho, perfeitamente
guardado para nós e apresentado em todas as suas texturas, riquezas e matizes
na palavra escrita e externa das Escrituras.
Ao considerarmos a leitura da Bíblia, o estudo, a meditação, a memorização, a
aplicação e o aprendizado vitalício nos próximos capítulos — e o mais
importante, ao colocar-se sob a pregação el da Bíblia, que vem na parte 3 —
que Deus lhe dê a intenção de moldar suas semanas com sua palavra, habilidade
para regar seus dias com sua voz e criatividade para pontuar sua vida e a vida
daqueles ao seu redor com novas rotinas para usufruir regularmente de suas
palavras vivi cantes.
3
TODA ELA?
“Toda a Escritura”, diz 2 Timóteo 3.16, “é inspirada por Deus e útil”. Tudo na
Escritura, de Gênesis 1 a Apocalipse 22, é para o bem da igreja. “Estas coisas
lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa, de nós
outros sobre quem os ns dos séculos têm chegado” (1Co 10.11). “Pois tudo
quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi escrito, a m de que, pela
paciência e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança” (Rm 15.4).
Mas nem todo texto funciona para edi car nossa fé da mesma maneira ou
tem o mesmo efeito para cada um dos lhos de Deus na nova aliança. É uma
coisa maravilhosa ler a Bíblia toda. É algo que os pastores e professores na igreja
deveriam considerar muito praticar anualmente, para fazer todos os dados
bíblicos passarem diante de seus olhos e continuamente abastecerem suas
reivindicações teológicas públicas. Mas este não é um jugo a ser imposto a todo
cristão todos os anos (Embora seja bom para todo cristão tentar fazê-lo em
algum momento, ou pelo menos ter algum plano plurianual para, eventualmente,
ajudá-lo a ler toda a Bíblia em algum ciclo).
Para aqueles que estão considerando a jornada, é surpreendente como ela é
viável. Ler a Bíblia de capa a capa leva cerca de setenta horas. “Isso é menos
tempo do que o americano médio passa em frente à televisão todos os meses”,
observa Donald S. Whitney. “Em outras palavras, se a maioria das pessoas
trocasse seu tempo na TV pela leitura das Escrituras, terminariam de ler a Bíblia
inteira em quatro semanas ou menos. Se isso parece impraticável, considere o
seguinte:
com menos de quinze minutos por dia, você pode ler a Bíblia em menos de um
ano”.23
Talvez o próximo ano novo, ou mesmo agora, seja seu momento de começar a
jornada. Alguns de meus planos favoritos de leitura da Bíblia ao longo dos anos
foram o de M’Cheyne e e Kingdom, além do meu preferido, do Discipleship
Journal.24
Ou, se ler tudo em um ano parece fora de seu alcance, tente fazer um plano e
cumpri-lo em seu próprio ritmo, mesmo que demore vários anos. Isso lhe dará
um lugar especí co para ir quando abrir a Bíblia, em vez de apenas abrir para
algum texto aleatório e com o tempo vai lhe dar a con ança de que você
atravessou todo o terreno das Escrituras e pelo menos vislumbrou toda a
plenitude da revelação escrita de Deus para nós.
DESCUBRA OS DIAMANTES
Na introdução de seu livro Graça futura, John Piper celebra o lugar da “re exão
pausada” e pede ao leitor que abra espaço para isso.
Como é grande a riqueza procedente da demora na re exão sobre uma ideia nova — ou uma nova
expressão de um conceito antigo! Eu gostaria que este livro fosse lido da mesma forma que Paulo
desejava a leitura de suas cartas por Timóteo: “Re ita no que estou dizendo, pois o Senhor lhe
dará entendimento em tudo” (2Tm 2.7). Todo livro digno de ser lido acena com as palavras:
“Re ita no que estou dizendo” […] Quando meus lhos se queixam de que um bom livro é de
difícil leitura, digo: “Rastelar é muito fácil; no entanto, tudo que se obtém são folhas; cavar é
difícil, mas talvez achem-se diamantes.26
E se isso é verdade para todo livro digno de ser lido, quanto mais para o Livro
de Deus. Vamos buscar a amplitude e juntar as folhas. E vamos cavar em
profundidade e procurar os diamantes também.
3
F omos feitos para meditar. Deus nos projetou com a capacidade de parar e
ponderar. Seu desejo é que não apenas o escutemos, não apenas leiamos
rapidamente o que ele diz, mas que re itamos sobre o que ele diz e processemos
isso em nossos corações.
É uma característica distintamente humana parar e considerar, mastigar algo
com os dentes de nossas mentes e corações, projetar alguma realidade em nossos
pensamentos e aplicá-la profundamente em nossos sentimentos, olhar de
ângulos diferentes e buscar uma noção melhor de seu signi cado.
O nome bíblico para essa arte é meditação, que Donald S. Whitney de ne
como “pensamento profundo sobre as verdades e realidades espirituais reveladas
nas Escrituras, para ns de compreensão, aplicação e oração”.27 Esse é um meio
maravilhoso da graça de Deus na vida cristã; talvez a mais incompreendida e
subestimada das disciplinas na igreja hoje. E é o ponto alto em receber a palavra
de Deus.
CURA VERDADEIRA
A meditação cristã tem menos a ver com a postura de nossos corpos e mais com
a postura de nossas almas. Nossas instruções não são “sente-se no chão com as
pernas cruzadas” ou “sente-se em uma cadeira com os pés no chão e as costas
retas, as palmas das mãos voltadas para cima”. A meditação cristã começa com
nossos olhos no Livro, ou ouvidos atentos para a Palavra, ou uma mente repleta
de Escrituras memorizadas.
Talvez comecemos com uma leitura mais ampla da Bíblia, a partir da qual
selecionamos um versículo ou frase em particular que chamou nossa atenção e
reservamos alguns minutos para nos aprofundarmos nele. Então, com
intencionalidade e foco (geralmente funciona melhor com a caneta na mão ou
com os dedos nas teclas) procuramos entender melhor as palavras de Deus e
aquecer nossa alma em seu fogo, e deixar que ela nos conduza à oração e então ao
nosso dia.
Em nossa sociedade inquieta e estressada, praticar a arte da meditação cristã
pode muito bem fortalecer nosso cérebro e diminuir nossa pressão arterial. Mas
ainda mais signi cativo é o bem que ela faz às nossas almas.
3
Considere cada palavra como dita a você. Quando a palavra troveja contra o pecado, pense assim:
“Deus está falando de meus pecados”; quando exige qualquer dever, “Deus quer isso de mim”.
Muitos afastaram a Escritura de si mesmos, como se ela se referisse apenas àqueles que viveram na
época em que foi escrita; mas se você pretende bene ciar-se da palavra, traga-a para junto de si;
um remédio não fará nenhum bem a menos que seja usado.30
Sim, tome cada palavra como dirigida a você mesmo, com esta âncora
essencial no lugar: Procure entender primeiro como as palavras de Deus foram
recebidas pelos ouvintes originais e como elas se relacionam com a pessoa e obra
de Jesus, e então traga-as para você mesmo. Deseje aplicação para sua vida, à
medida que Deus fala conosco, hoje, por meio da compreensão iluminada pelo
Espírito do que o autor humano inspirado disse a seus leitores originais no texto
bíblico.
Não cesses de falar deste Livro da Lei; antes, medita nele dia e noite, para que tenhas cuidado de
fazer segundo tudo quanto nele está escrito; então, farás prosperar o teu caminho e serás bem-
sucedido.
Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros
superiores a si mesmo. Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também
cada qual o que é dos outros. (Fp 2.3-4)
Esconda as palavras de Deus em seu coração; construa um arsenal para lutar
contra a tentação. Mas não perca o poder transformador de memorizar a mente
de Deus para hoje.
3
Mas os sentidos deles se embotaram. Pois até ao dia de hoje, quando fazem a leitura da antiga
aliança, o mesmo véu permanece, não lhes sendo revelado que, em Cristo, é removido. Mas até
hoje, quando é lido Moisés, o véu está posto sobre o coração deles. Quando, porém, algum deles
se converte ao Senhor, o véu lhe é retirado. (2Co 3.14-16)
Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo
nós ainda pecadores. (Rm 5.8)
Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo
Jesus, nosso Senhor. (Rm 6.23)
Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. (Rm 8.1)
Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos
dará graciosamente com ele todas as coisas? (Rm 8.32)
Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça
de Deus. (2Co 5.21)
Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de
vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos. (2Co 8.9).
Fiel é a palavra e digna de toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores,
dos quais eu sou o principal. (1Tm 1.15)
Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou e
enviou o seu Filho como propiciação pelos nossos pecados. (1Jo 4.10)
E entoavam novo cântico, dizendo: Digno és de tomar o livro e de abrir-lhe os selos, porque foste
morto e com o teu sangue compraste para Deus os que procedem de toda tribo, língua, povo e
nação. (Ap 5.9)
Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justi cados gratuitamente, por sua graça,
mediante a redenção que há em Cristo Jesus. (Rm 3.23-24)
Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida. Mas, ao que não
trabalha, porém crê naquele que justi ca o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça. (Rm 4.4-5)
Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados,
segundo as Escrituras, e que foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras.
(1Co 15.3-4)
Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar (porque
está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro), para que a bênção de Abraão
chegasse aos gentios, em Jesus Cristo, a m de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido.
(Gl 3.13-14)
Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando
nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, —pela graça sois salvos. (Ef
2.4-5)
Pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si
mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e,
reconhecido em gura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e
morte de cruz. (Fp 2.6-8)
Porque aprouve a Deus que, nele, residisse toda a plenitude e que, havendo feito a paz pelo sangue
da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer
nos céus. (Cl 1.19-20)
E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões e pela incircuncisão da vossa carne,
vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos; tendo cancelado o escrito de
dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o
inteiramente, encravando-o na cruz. (Cl 2.13-14)
Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com
todos, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou
mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo, que ele derramou sobre nós
ricamente, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, a m de que, justi cados por graça, nos
tornemos seus herdeiros, segundo a esperança da vida eterna. (Tt 3.4-7)
Visto, pois, que os lhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele,
igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a
saber, o diabo, e livrasse todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a
vida. Pois ele, evidentemente, não socorre anjos, mas socorre a descendência de Abraão. Por isso
mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos, para ser
misericordioso e el sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos
pecados do povo. (Hb 2.14-17)
O qual não cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca; pois ele, quando ultrajado,
não revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que
julga retamente, carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para
que nós, mortos para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas, fostes sarados. Porque
estáveis desgarrados como ovelhas; agora, porém, vos convertestes ao Pastor e Bispo da vossa
alma. (1Pe 2.22-25)
Para mais informações, consulte o posfácio sobre “comunhão com Cristo em um dia caótico”.
David Mathis, “Dez passagens para o pastor memorizar por completo”, 22 abr. de 2022, Voltemos ao
Evangelho, www.voltemosaoevangelho.com/blog/2022/04/dez-passagens-para-o-pastor-memorizar-por-
completo/ (acesso em: 2 de maio de 2022).
O texto mais aclamado que conheço para memorizar livros inteiros da Bíblia (e que está disponívei em PDF
gratuito) é Andrew Davis, “An Approach to Extended Memorization of Scripture”, Two Journeys,
www.twojourneys.org/all-books/an-approach-to-extended-memorization-of-scripture/ (acesso em: 2 de
maio de 2022) [edição em português: Um Método para a Memorização Extensiva da Bíblia (Brasília: Éden
Publicações, 2022)].
6 | Decida ser um aprendiz por toda a vida
CONCENTRE-SE NA PALAVRA
Há realmente algo que concentramos no início da vida cristã, e no qual passamos
o resto de nossos dias explorando e indo mais fundo: é a “palavra” ou
“mensagem” sobre Jesus, a Palavra encarnada de Deus. Simpli cando, o ponto
focal e o centro de nossa aprendizagem ao longo da vida é a pessoa e obra de
Cristo. Todas as coisas são dele, por ele e para ele (Cl 1.17).
Quando dizemos “aprendizes”, não nos referimos a meros fatos, informações e
conhecimento intelectual. Queremos dizer tudo isso e muito mais. Não
aprendemos apenas fatos, aprendemos um rosto. Não somos apenas aprendizes
de princípios, mas de uma Pessoa. Somos aprendizes vitalícios no
relacionamento com Jesus, ao ouvirmos sua voz em sua palavra e sermos ouvidos
por ele em oração, e compartilharmos em comunhão com seu corpo, tudo por
meio do poder de seu Espírito.
E uma das principais maneiras pelas quais conhecemos mais sua pessoa é
aprendendo mais sobre sua obra em nosso favor. Não estamos apenas “arraigados
e alicerçados” no amor de Cristo por nós no Calvário, mas prosseguimos para
“compreender, com todos os santos, qual é a largura,
e o comprimento, e a altura, e a profundidade e conhecer o amor de Cristo, que
excede todo entendimento, para que sejais tomados de toda a plenitude de Deus”
(Ef 3.17-19).
O cerne da aprendizagem vitalícia que é verdadeiramente cristã não é
meramente cavar mais fundo na reserva aparentemente ilimitada de informações
que há, para aprender sobre o mundo, a humanidade e a história, mas mergulhar
na torrente in nita do amor de Cristo, e como tudo se volta para ele, em sua
largura, comprimento, altura e profundidade ilimitados, e vendo tudo o mais à
luz disso. O centro da aprendizagem ao longo da vida para o cristão é este:
conhecer e deleitar-se no próprio Deus, em Cristo, por meio da palavra do
evangelho e da palavra escrita das Escrituras — ouvir, ler, estudar, meditar e
memorizar a Bíblia. Assim, incluímos este capítulo sobre aprendizagem ao longo
da vida aqui na parte 1, sobre ouvir a voz de Deus.
E le é “o Deus de toda graça” (1Pe 5.10). Ele não apenas nos escolheu antes da
fundação do mundo, e deu seu Filho para nos salvar e nos fazer nascer de
novo, mas também sustenta toda a nossa vida cristã, desde o primeiro dia até
aquele Dia, em sua graça incomparável. Ele cobre nossas vidas com sua
inesperada bondade, por meio de pessoas e circunstâncias, nos momentos bons e
ruins, e nos derrama um favor imprevisto na saúde e na doença, na vida e na
morte.
Mas, como vimos, ele nem sempre nos pega desprevenidos; geralmente não é
o caso. Deus tem seus canais regulares — os meios da graça, aqueles caminhos
bem batidos pelos quais ele tantas vezes tem o prazer de passar e derramar sua
bondade sobre aqueles que esperam ansiosamente. As principais vias são sua
palavra, sua igreja e a oração. Ou sua voz, seu corpo e seus ouvidos. Agora
mudamos nosso foco de sua voz para seus ouvidos.
Mas devemos entender que ele ouvir nossa oração tem relação com o
ouvirmos em sua palavra.
Não é errado querer as dádivas de Deus e pedi-las. A maioria das orações na Bíblia é para pedir as
dádivas de Deus. No entanto, toda dádiva deve ser desejada essencialmente porque ela nos mostra
mais de Deus e nos acrescenta mais dele […] Quando o mundo todo falha, a base para a alegria
permanece. Deus. Assim, é secundária cada oração pela vida, pela saúde, pelo lar, pela família,
pelo emprego e pelo ministério. O grande propósito da oração é pedir que — em todas as suas
dádivas e por meio delas — Deus seja nossa alegria.38
Ou, como C. S. Lewis disse de maneira tão memorável: “Oração no sentido
de petição, de pedir coisas, é uma pequena parte dela; a con ssão e a penitência
são seu princípio; a adoração, seu santuário; a presença e a visão e o deleite de
Deus, seu pão e vinho”.39 O grande propósito da oração é chegar com humildade,
expectativa e — por causa de Jesus — com ousadia à presença consciente de
Deus, relacionar-se com ele, conversar com ele e, por m, desfrutá-lo como nosso
grande tesouro.
A gora é a hora de trazer um novo olhar para sua vida particular de oração.
Talvez você encontre um ou dois ajustes que podem ser feitos nos
próximos dias. Normalmente, a melhor maneira de crescer e avançar não é uma
revisão total, mas identi cando uma ou algumas pequenas mudanças que trarão
benefícios ao longo do tempo.
Ou talvez você tenha pouca ou nenhuma vida real de oração particular (o que
pode ser tão comum hoje entre os cristãos professos quanto sempre foi) e
realmente precise começar do zero. Você pode sentir em primeira mão o peso do
alarme de Francis Chan: “Minha maior preocupação com esta geração é sua
incapacidade de se concentrar, especialmente na oração”.42 Talvez seja verdade no
seu caso, e você está pronto para a mudança.
Se você está precisando de um pouco de autoavaliação ou aprender como um
iniciante, gostaria de oferecer algumas dicas práticas sobre a oração particular.
Mas vamos começar explicando por que a oração particular, ou “oração no
quarto”, é tão importante, em primeiro lugar.
E, quando orardes, não sereis como os hipócritas; porque gostam de orar em pé nas sinagogas e
nos cantos das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a
recompensa. Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai,
que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará. (Mt 6.5-6)
Assim como orar ao alcance dos ouvidos de outras pessoas tinha suas
recompensas imanentes no judaísmo do primeiro século, o mesmo ocorre em
nossas comunidades eclesiásticas do século 21, seja na igreja, em um pequeno
grupo ou à mesa apenas com amigos e família. Facilmente, nossa motivação para
orar com alguém pode ser impressionar os outros, seja pela extensão, tom,
tópico, estilo ou escolha de palavras da oração, tudo cuidadosamente escolhido
para produzir certos efeitos apenas em nossos ouvintes humanos.
É uma linha tênue, porque devemos orar com os outros — na igreja, em
nossas casas e em outros lugares — e a oração pública deve levar em conta que os
outros estão ouvindo; deve ter os outros em mente. Mas o perigo de deixar Deus
de lado e mudar nosso foco para parecermos impressionantes está à espreita.
Mas a “oração no quarto” oferece um teste de autenticidade para nossa oração
pública. Como Tim Keller comenta sobre Mateus 6.5-6:
O teste infalível da integridade espiritual, diz Jesus, é sua vida de oração privada. Muitas pessoas
oram por exigência de expectativas culturais ou sociais, ou talvez pela ansiedade provocada por
circunstâncias difíceis. Aqueles que vivem de fato um relacionamento com Deus como Pai, no
entanto, internamente haverão de querer orar e, portanto, orarão ainda que nada ao redor os
pressione nesse sentido. Buscarão orar mesmo em tempos de aridez espiritual, quando não houver
qualquer retribuição social ou empírica.43
A oração privada é um teste importante para saber se somos reais. Ele é nosso
verdadeiro tesouro ou estamos simplesmente usando a oração para parecermos
piedosos e impressionar os outros? Nossas orações são realmente dirigidas a um
Deus que nos ouve e quer nos fazer o bem, ou a oração é uma ferramenta para
conseguirmos o que queremos dos outros? A oração privada dissipa a névoa e a
confusão e ajuda a mostrar que nosso relacionamento com Deus é autêntico.
5. Renove sempre
Mude a cada novo ano, novo mês ou nova fase da vida. Regularmente, ou
apenas ocasionalmente, escreva orações com foco e cuidado (esta é uma faceta
valiosa da disciplina de fazer um diário, como veremos no capítulo 11), ou
fortaleça seus afetos em oração com jejum (cap. 10) ou faça uma pausa no caos
da vida com algum retiro especial para silêncio e a solitude (cap. 12).
Poucas coisas são tão dignas de sua atenção e investimento quanto o privilégio
e o poder da oração particular.
3
Os hábitos da oração particular regular mudarão em várias fases da vida. Houve
épocas em que eu mantinha listas com tópicos para orar diariamente, ou itens
para orar semanalmente. Eu tinha anotações detalhadas sobre o que estava
orando em determinados dias e tentava voltar a elas para tomar notas sobre
orações atendidas ou desejos alterados. Outra prática útil tem sido escrever ou
digitar as orações diárias (mais sobre isso no capítulo 11, quanto a fazer um
diário).
Nos últimos anos, descobri que é mais útil orar brevemente no início do meu
tempo devocional algo como: “Pai, por favor, abençoe a leitura de tuas palavras
para o meu coração esta manhã”, tentando mantê-la renovada a cada dia. Então,
depois de ler e de preferência meditar em alguma seção da leitura, tento fazer a
transição para a oração com base no que venho meditando, usando o padrão
geral de adoração, con ssão, ação de graças, súplica (o conhecido ACAS da
oração).
Normalmente começo com louvor ou adoração, falando palavras de adoração
a Deus por quem ele é, o que fez por mim ou o que promete fazer à luz do texto
sobre o qual meditei. Eu busco permanecer nisso, pelo menos por algumas
frases, cultivando um coração de adoração enquanto procuro colocar em palavras
a glória que vislumbrei em sua palavra.
Em seguida, vem a con ssão. Ainda em vista dos meus momentos de
meditação, confesso meus pecados, insu ciências e falhas, gerais e especí cas,
dependendo da verdade em questão.
Depois, procuro cultivar a gratidão a Deus, expressando palavras de
agradecimento por sua graça e misericórdia, pois, apesar de sua grandeza e
minha pequenez, sua santidade e minha pecaminosidade, ele me resgatou e me
fez seu em Jesus.
Finalmente, volto-me para a súplica, para pedidos especí cos por mim e por
aqueles que amo, primeiro uindo da verdade em foco durante a meditação e
depois deixando que se amplie para o que está em minha mente e cronograma
para o dia. Atualmente, meus tempos de oração têm sido quase exclusivamente
guiados pela meditação e pelo que está em minha mente e coração naquele dia,
em vez de ser guiado por listas.48
A oração privada pode ser um momento intensamente pessoal entre você e
Deus. Assim deve ser. Na prática regular de ouvir a voz de Deus e responder a
ele em oração, você desenvolverá seus próprios hábitos de graça para deleitar-se
em Deus em oração.
Dito em participação na conferência Passion 2015 em Atlanta, 3 de jan. de 2015.
Tim Keller, Oração: Experimentando intimidade com Deus (São Paulo: Vida Nova, 2016), p. 32.
John Piper, Quando eu não desejo Deus (São Paulo: Cultura Cristã, 2018), p. 148.
David Hanes (ed.), My Path of Prayer: Personal Glimpses of the Glory and the Majesty of God Revealed
through Experiences of Prayer (West Sussex: Henry Walter, 1981), p. 56.
A Narrative of Some of the Lord’s Dealings with George Mueller, Written by Himself, Jehovah Magni ed.
Addresses by George Mueller Complete and Unabridged, (Muskegon, MI: Dust and Ashes, 2003), vol. 1, p.
272–73. Para um excelente livro recente sobre este assunto, veja Donald S. Whitney, Praying the Bible
(Wheaton, IL: Crossway, 2015).
Law, A Serious Call to a Devout and Holy Life (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1966), p. 154.
Não desprezo a oração baseada em listas, mas aconselharia você a evitar os perigos descritos por Timothy
Keller, citando J. I. Packer, em Oração: Experimentando intimidade com Deus (São Paulo: Vida Nova,
2016), p. 241.
9 | Ore com constância e companhia
C omo vimos, a oração está no cerne da vida cristã. Não é apenas obediência
ao mandamento de Deus, mas é um meio vital de recebermos sua graça
contínua para nossa sobrevivência e crescimento espiritual. E a alegria da oração
— comunhão com Deus — é essencial para o que signi ca ser cristão. Sem
oração, não há relacionamento verdadeiro com ele, e nenhum prazer profundo
em quem ele é, mas apenas vislumbres de longe.
Como Jesus ensina, a oração privada (ou “oração no quarto”) tem um papel
importante a cumprir na vida do crente. Desenvolvemos nossos vários padrões e
práticas de oração secreta nos ritmos de nossas vidas únicas. Encontramos nosso
lugar e hora para entrar em nosso quarto, fechar a porta e orar a nosso Pai, que
está em secreto (Mt 6.6). Amém para a oração particular (cap. 8). Ela é
fundamental. Mas não para por aí.
1. Torne-a regular
Faça da oração regular com companhia uma parte de sua rotina semanal ou
quinzenal. Em vez de algo esporádico, planeje um tempo e um lugar para se
reunir com outros cristãos e orar. Quanto à duração do compromisso, façam um
acordo de nido juntos, em vez de um plano eterno e inde nido. Quando o prazo
especi cado terminar, renove ou reconsidere. Compromissos de oração regulares
sem uma data de término tendem a enfraquecer com o tempo e podem gerar
desânimo para compromissos futuros.
1. Mais poder
Mateus 18.15-20 pode ser um dos textos mais mal compreendidos do Novo
Testamento. A promessa frequentemente citada “onde estiverem dois ou três
reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (v. 20) vem no nal de uma
seção sobre disciplina na igreja, “se teu irmão pecar [contra ti]” (v. 15). No
entanto, Jesus apela a um princípio mais profundo aqui, que é um benefício da
oração comunitária. Ele diz: “se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a
respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem” (v. 19). Há um poder
adicional em nossas orações quando nos unimos aos companheiros na fé e
fazemos nossos pedidos ao Pai com nossos corações unidos.
2. Alegria multiplicada
Vamos deixar explícito o que dissemos acima: Quando compartilhamos a
alegria da oração, dobramos nossa alegria. Quando temos a prática regular de
orar junto com nossos irmãos na fé, nos bene ciamos de um canal de alegria que,
sem isso, estaríamos negligenciando. E ao orar com os outros, não apenas
aumentamos nossa alegria, mas também a deles. E quando ajudamos outros em
sua alegria em Deus (2Co 1.24), nós novamente aumentamos a nossa.
Deus quer que algumas respostas à oração esperem nossa união a outros.
Frequentemente, oramos sozinhos por nossas necessidades pessoais, e Deus se
apraz em responder. Mas às vezes, seus meios incluem os líderes da igreja, ou
apenas a simples oração de mais um pecador tornado justo em Cristo.
O jejum tem passado por tempos difíceis — pelo menos, ao que parece, entre
os estômagos cheios de muitas de nossas igrejas. Falo como um dos bem
alimentados.
Certamente, você encontrará exceções aqui e ali. Alguns bolsões valorizam
tanto o contracultural a ponto de conduzir seus veículos para o fosso do
ascetismo. Mas eles estão em número muito menor do que o resto de nós,
nadando na direção oposta. Os perigos do ascetismo são grandes, superados
apenas pelos do excesso de condescendência.
Nosso problema pode ser a forma como pensamos sobre o jejum. Se a ênfase
for na abstinência, e o jejum for um mero dever a cumprir, então apenas os mais
obstinados entre nós superarão os obstáculos sociais e de autossatisfação para
realmente colocar essa disciplina em prática.
Mas se formos despertados para ver o jejum pela alegria que ele pode trazer,
como um meio da graça de Deus para fortalecer e aprofundar nossos afetos para
com Deus, então podemos estar diante de uma nova ferramenta poderosa para
enriquecer nosso prazer em Jesus.
O QUE É O JEJUM?
O jejum é uma medida excepcional, projetada para canalizar e expressar nosso
desejo por Deus e nosso santo descontentamento em um mundo caído. É para
aqueles que não estão satisfeitos com o status quo. Para os que desejam mais da
graça de Deus. Para os que se sentem verdadeiramente necessitados de Deus.
As Escrituras incluem muitas formas de jejum: pessoal e comunitário, público
e particular, congregacional e nacional, regular e ocasional, parcial e absoluto.
Normalmente, pensamos no jejum como uma renúncia voluntária à comida por
um tempo limitado, por um propósito espiritual expresso.
Também podemos fazer jejum de outras coisas boas além de comida e bebida.
Martyn Lloyd-Jones disse: “O jejum, na realidade, deveria incluir a abstinência
de qualquer coisa, legítima em si mesma, tendo-se em vista algum propósito
espiritual especial”.55 Mas o jejum cristão normal signi ca de maneira privada e
ocasional escolher car sem comida (mas não sem água) por algum período
especial (um dia, três, sete etc.) em vista de algum propósito espiritual especí co.
De acordo com Donald S. Whitney, os propósitos espirituais do jejum
incluem:
• Fortalecer a oração (Ed 8.23; Jl 2.13; At 13.3);
• Buscar a orientação de Deus ( Jz 20.26; At 14.23);
• Expressar lamento (1Sm 31.13; 2Sm 1.11-12);
• Buscar libertação ou proteção (2Cr 20.3-4; Ed 8.21-23);
• Expressar arrependimento e voltar para Deus (1Sm 7.6; Jn 3.5-8);
• Humilhar-se diante de Deus (1Rs 21.27-29; Sl 35.13);
• Expressar preocupação com a obra de Deus (Ne 1.3-4; Dn 9.3);
• Ministrar às necessidades do próximo (Is 58.3-7);
• Vencer a tentação e dedicar-se a Deus (Mt 4.1-11);
• Expressar amor e adoração a Deus (Lc 2.37).56
Embora os potenciais propósitos sejam muitos, será mais útil concentrarmos
nossos pensamentos sobre o jejum, neste breve capítulo, nesse último ponto. Ele
abrange todos os outros e atinge a essência do que torna o jejum um meio de
graça tão poderoso.
Whitney descreve desta maneira: “O jejum pode ser a expressão de ter
encontrado o seu maior prazer e alegria na vida em Deus”. E ele cita uma frase
útil de Matthew Henry, que diz que o jejum serve para “a ar as afeições da
devoção”.57
Quando Jesus, nosso noivo, estava aqui na terra entre seus discípulos, era um
tempo para a disciplina do banquete.58 Mas agora que ele foi “tirado” de seus
discípulos, eles “hão de jejuar”. Não é que eles “poderão jejuar, se for o caso”, mas
“hão de jejuar”. Isso é con rmado pelo padrão de jejum que surgiu
imediatamente, na igreja primitiva (At 9.9; 13.2; 14.23).
Aquela queimação interna, o fogo em seu estômago, ardendo para que você o
alimente com mais comida, sinaliza a hora da ação para o jejum como um meio
de graça. Somente quando abraçamos voluntariamente a dor de um estômago
vazio é que vemos o quanto permitimos que nossa barriga seja nosso deus (Fp
3.19).
E nesse desconforto torturante da fome crescente está o motor do jejum,
gerando o lembrete de direcionar a Deus o nosso anseio pela comida, e inspirar
maiores anseios por Jesus. O jejum, diz Piper, é o ponto de exclamação físico no
nal da frase: “Ó Deus, eis o quanto te desejo!”60
1. Mantenha a simplicidade.
Um diário é uma dádiva para o longo prazo. A tentativa de começar com tudo
tem valor limitado. Portanto, um conselho importante para os registros é mantê-
los simples o su ciente para que você possa continuar fazendo.
Seja modesto em seus planos de frequência e duração das anotações. Se suas
expectativas forem muito profundas e complexas, será menos provável que você
continue com o tempo. Se o seu único modelo para as anotações requer meia
hora ou 45 minutos, então você terá muito menos probabilidade de desenvolver
o hábito do que se sua expectativa fosse, digamos, cinco minutos.
Se você está apenas começando ou voltando à prática, não tente ir de zero a
cem de uma vez, mas dê pequenos passos com regularidade. Uma ideia para
ganhar ritmo é tentar escrever algo curto durante as devocionais diárias, mesmo
que seja apenas uma frase. Descobri que tentar escrever apenas uma frase por dia
é uma maneira útil de quebrar longos intervalos entre as anotações.
4. Traga o Evangelho
Os cristãos que prosperam em manter um diário não apenas buscam a oração
e meditam nas Escrituras em geral, mas procuram aplicar o evangelho com
especi cidade aos seus medos e frustrações, seus altos e baixos, suas alegrias e
tristezas. Quando abrir seu diário em angústia, tente seguir o caminho dos
salmistas e fechá-lo com esperança. Dê vida a 2 Coríntios 4.8-9 ao preencher o
espaço em branco com palavras. Quando você se sentir atribulado, alegre-se por
não estar angustiado; quando perplexo, afaste o desânimo; quando perseguido,
lembre-se de que você não foi desamparado; quando abatido, saiba que não será
destruído.
Seu diário é um local para pregar o evangelho para si mesmo, em suas
circunstâncias particulares, sem repetir as mesmas verdades de sempre que já
nem fazem meditar. Capture em suas próprias palavras o que você realmente está
sentindo e, em seguida, procure as palavras de Deus que atendem às suas
necessidades. Torne a aplicação sob medida para hoje.
5. Continue
Mesmo quando você personaliza seu diário e o mantém simples, sem se
preocupar em atualizá-lo, ainda há a necessidade de perseverança a longo prazo.
Quando a novidade passar e sua energia para escrever parecer baixa, lembre-se
de que é natural encontrar uma barreira como essa sempre que desenvolvemos
um novo hábito útil. Peça a ajuda de Deus para superar o atrito, “na força que
Deus supre” (1Pe 4.11), “segundo a sua e cácia que opera e cientemente em
mim” (Cl 1.29).
Frequentemente, a parte mais difícil é simplesmente sentar e girar aquela
manivela interna enferrujada para fazer as palavras começarem a sair. Porém,
quando o portão se abre, como o rio pode uir!
N. E.: Tradução de parte do hino Amazing Grace, de John Newton (em português: hino 314 do Hinário
para o Culto Cristão; hino 48 do Livro de Canto da IECLB).
12 | Faça uma pausa no caos
SILÊNCIO E SOLITUDE
Somos humanos, não máquinas. Fomos feitos para ritmos de silêncio e barulho,
comunidade e solidão. Não é saudável ter pessoas sempre por perto e não é
saudável raramente desejá-las. Deus nos fez para ciclos e estações, para rotinas e
cadências.
Desde o início dos tempos, precisamos de nossos intervalos. Até o próprio
Deus-homem foi “levado pelo Espírito ao deserto” (Mt 4.1), “foi para um lugar
deserto” (Mc 1.35; Lc 4.42), e “subiu ao monte, a m de orar sozinho” (Mt
14.23).
Afastar-se de vez em quando sempre foi uma necessidade humana, mas é
ainda mais urgente na vida moderna; principalmente na vida urbana. Ao que
tudo indica, as coisas estão mais lotadas e barulhentas do que nunca.
“Um dos custos do avanço tecnológico”, diz Donald S. Whitney, “é uma
tentação maior de evitar a quietude”. E assim, muitos de nós “precisamos
perceber como somos viciados em barulho”.63 Às vezes, me pego ligando o rádio
sem pensar, quando entro no carro. Ocasionalmente, desligo e direciono meus
pensamentos para Deus em oração. No meio de uma semana agitada, é incrível
como o silêncio pode ser estranho, e maravilhoso.
Assim, os excessos e desvantagens da vida moderna apenas aumentaram o
valor do silêncio e da solitude como disciplinas espirituais. Provavelmente
precisamos car sozinhos e quietos mais do que nunca.
VOZES NO SILÊNCIO
Podemos car sozinhos e quietos para ouvir nossa própria voz interior, os
murmúrios de nossa alma que são facilmente abafados pelo barulho e pela
multidão. Mas a voz mais importante a ouvir no silêncio é a de Deus. O objetivo
de praticar o silêncio como disciplina espiritual não é ouvir a voz audível de
Deus, mas carmos menos distraídos e ouvir melhor quando ele fala, com ainda
mais clareza, em sua Palavra.
Retirar-se e car quieto e sozinho não é uma graça especial por si só. Mas o
objetivo é criar um contexto para melhorar nossa audição de Deus em sua
palavra e respondê-lo em oração. Silêncio e solitude, portanto, não são meios
diretos de graça em si mesmos, mas podem lubri car as engrenagens — como
cafeína, sono, exercícios e música — para encontros mais diretos com Deus em
sua palavra e em oração.
É uma pena que a palavra “comunhão” esteja atravessando uma fase em alguns
círculos e esteja morrendo em domesticação e trivialidade. Ela é uma
realidade vibrante no Novo Testamento, um ingrediente indispensável na fé
cristã e um dos principais meios da graça de Deus em nossas vidas.
A koinonia — grego para comunidade, parceria, comunhão — que os
primeiros cristãos compartilhavam não estava ancorada em um amor comum por
pizza, refrigerante e uma noite agradável e tranquila de diversão entre os irmãos
religiosos. Sua essência estava no Cristo que compartilhavam, e na missão de
vida ou morte que compartilhavam a partir de sua convocação para levar a fé em
todo o mundo, diante da perseguição iminente.
Tolkien chamou corretamente seus nove de “a Sociedade do Anel”64. Não se
trata de uma confraternização amigável com aplicativos, bebidas e jogos. É um
empreendimento coletivo de vida ou morte, tudo ou nada, contra um grande mal
e uma oposição esmagadora. A verdadeira comunhão tem menos a ver com
amigos reunidos para assistir ao jogo nal do campeonato e mais a ver com
jogadores em campo com sangue, suor e lágrimas, reunidos no vestiário para
decidirem a tática para o segundo tempo. A verdadeira comunhão, nesta era, é
mais como as tropas invasoras lado a lado na praia da Normandia do que como a
alegre parada de celebração da vitória nas ruas.
Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras. Não
deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais
quanto vedes que o Dia se aproxima.
Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de
incredulidade que vos afaste do Deus vivo; pelo contrário, exortai-vos mutuamente cada dia,
durante o tempo que se chama Hoje, a m de que nenhum de vós seja endurecido pelo engano do
pecado.
Aqui, a carga não recai sobre o santo à deriva, para que ele volte sozinho para
o caminho, mas sobre os outros na comunidade, para que tenham tal
proximidade com ele, atenção a ele e regularidade com ele a ponto de perceber o
desvio e lutar com ele, por ele, contra o pecado. Esse meio de graça, então, em tal
circunstância, tem uma função única na vida cristã. Não cabe aos
espiritualmente fracos ter mais força de vontade e se autodisciplinarem, mas cabe
ao corpo assumir a disciplina em favor do errante, mediar a graça aos que
batalham, evitar a apostasia falando palavras de verdade e graça em seus ouvidos
e orando para que o Espírito gere vida.
OFICIALIZANDO A COMUNHÃO
Uma coisa a tornar explícito aqui no nal deste primeiro capítulo sobre
comunhão, e no início da terceira parte sobre os meios de graça na igreja, é que a
forma mais profunda e durável de comunhão é a aliança; em outras palavras, é
entre partes que assumiram compromissos formais entre si. Isso não é verdade
apenas na parceria do casamento, mas também na igreja local. Quando fazemos
votos e promessas uns aos outros de aliança em uma igreja local como “membros”
ou “parceiros” (ou qualquer termo que a igreja use), não inibimos a verdadeira
vida da igreja, mas damos as condições mais verdadeiras para seu crescimento e
orescimento.
Quando nossa comunhão não é simplesmente uma rede de relacionamentos
soltos entre cristãos, mas ancorada em uma “comunidade de aliança” particular
como membros comprometidos em um posto local do reino de Cristo, chegamos
mais perto de experimentar o que os primeiros cristãos zeram, quando as
pessoas não entravam e saíam da comunidade de qualquer maneira, mas ou
estavam dentro ou fora; e, aqueles que estavam dentro, estavam comprometidos
em ser igreja uns para os outros, nos bons e maus momentos. A comunidade de
aliança é como o casamento cristão, no sentido de que é dentro da estrutura de
compromissos declarados e lealdades prometidas que a vida no relacionamento é
protegida, nutrida e encorajada a prosperar.66
3
SEIS LIÇÕES PARA SER UM BOM OUVINTE
Vamos encerrar este capítulo considerando a importância de ouvir, e como esse
ato subestimado, essencial para a comunhão, serve como um meio de graça tanto
para nós mesmos quanto para os outros na vida da igreja. Ouvir é uma das coisas
mais fáceis de se fazer, e uma das mais difíceis. Em certo sentido, ouvir é fácil; ou
melhor, escutar é fácil. Não exige a iniciativa e a energia necessárias para falar. É
por isso que “a fé vem pelo ouvir, e o ouvir, pela palavra de Cristo” (Rm 10.17,
NAA). Isso signi ca que ouvir é fácil, e a fé não é uma expressão de nossa
atividade, mas a recepção da atividade de outra pessoa. É a “fé naquilo que
ouviram” (Gl 3.2, 5, NVI) que destaca as realizações de Cristo e, portanto, é o
canal da graça que inicia e sustenta a vida cristã.
Mas, apesar dessa facilidade — ou talvez precisamente por causa dela —
muitas vezes lutamos contra ela. Em nosso pecado, preferimos con ar em nós
mesmos do que nos outros, acumular nossa própria justiça do que receber a de
outro, falar o que pensamos em vez de ouvir outra pessoa. A escuta verdadeira,
sustentada e ativa é um grande ato de fé e um grande meio de graça, tanto para
nós quanto para os outros na comunhão.
O texto de referência para a escuta cristã pode ser Tiago 1.19: “Todo homem,
pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar”. É bastante
simples em princípio e quase impossível de viver. Frequentemente, somos tardios
para ouvir, prontos para falar e para nos irarmos. Portanto, aprender a ouvir bem
não é algo que acontece da noite para o dia. Requer disciplina, esforço e
intencionalidade.
Você melhora com o tempo, dizem. Tornar-se um ouvinte melhor depende não
de uma grande resolução de melhorar em uma única conversa, mas do
desenvolvimento de um padrão de pequenas resoluções — cultivar o hábito —
de se concentrar em determinadas pessoas em momentos especí cos.
Com a convicção renovada de que esta é uma área que precisa crescer em
minha vida — e possivelmente na sua também — aqui estão seis lições sobre
como ouvir bem. (Tiramos nossas dicas dos que podem ser, fora da Bíblia, os
três parágrafos mais importantes sobre ouvir: a seção sobre “o ministério da
escuta” em Life Together de Dietrich Bonhoe er, bem como do clássico artigo de
Janet Dunn no Discipleship Journal, “How to become a good listener [Como
tornar-se um bom ouvinte]”)67
Um dos conselhos de Dunn para cultivar uma boa escuta é: “Dê mais ênfase à
a rmação do que às respostas […] Muitas vezes, Deus simplesmente quer me
usar como um canal de a rmação de seu amor, ao ouvir com compaixão e
compreensão”. Bonhoe er a rma: “Muitas vezes uma pessoa pode ser ajudada
simplesmente por ter alguém para ouvi-la seriamente”. Às vezes, o que nosso
próximo mais precisa é que outra pessoa que sabendo o que se passa, porque
isso demonstra que nos importamos o su ciente para ouvi-lo.
F omos feitos para mais do que devocionais privadas. Por melhor que seja nos
retirarmos em algum canto, completamente sozinhos, e ler as Escrituras que
queremos ler, fazer as orações que preferimos, tocar as músicas que gostamos,
memorizar os versos que escolhemos e jejuar quando é conveniente; por mais
importante que seja seguir um ritmo regular de “adoração particular” nessas
disciplinas pessoais, esse não é o auge de nossa vida cristã.
Fomos feitos para adorar Jesus juntos. Na multidão. Com a grande horda.
Absorvidos na magní ca massa dos redimidos. Deus certamente não nos criou
para nos deleitarmos nele como indivíduos solitários, mas como membros felizes
de uma família incontavelmente grande.
Quando a névoa da vida cotidiana se dissipa e temos um vislumbre da bem-
aventurança do céu, não nos vemos isolados em uma mesa de estudo ou
escondidos sozinhos em um quarto de oração no paraíso, ou mesmo a sós diante
do imenso Grand Canyon ou do pico montanhoso da majestade de Deus, mas
alegremente tomando parte na adoração com a multidão do povo de Cristo,
vindo de todas as línguas, tribos e nações.
Fomos feitos para a adoração comunitária.
Toda emoção genuína é um m em si mesma. Ela não é causada conscientemente como meio de
chegar a outra coisa. Isso não quer dizer que não possamos nem devamos procurar ter certos
sentimentos. Devemos e podemos. Podemos nos colocar em situações [como a adoração
comunitária] em que os sentimentos podem ser cultivados mais prontamente. […] Mas no
momento da emoção autêntica, todo cálculo desaparece. Somos transportados (talvez apenas por
alguns segundos) para acima do nível de raciocínio da mente, para experimentar o sentimento sem
referência a implicações lógicas ou práticas.71
1. Despertamento
Frequentemente, chegamos para a adoração comunitária com uma sensação
de neblina espiritual. Durante as di culdades da semana, a dureza da vida real
no mundo decaído pode nos desorientar para a realidade nal e para o que é
realmente importante. Precisamos limpar nossas mentes, recalibrar nossos
espíritos e reacender nossos corações lentos. Mencionamos acima como
Martinho Lutero achou a adoração comunitária poderosa para despertar seu
fogo espiritual: “Em casa, em meu próprio lar, não há calor ou vigor em mim,
mas na igreja quando a multidão está reunida, uma chama é acesa em meu
coração e ocupa seu espaço”.
Melhor do que Lutero, porém, é a experiência do salmista inspirado. No
Salmo 73, ele começa se desesperando com a prosperidade de seus pares ímpios
(v. 2–15). Mas a névoa se dissipa ao entrar conscientemente na presença de
Deus: “Em só re etir para compreender isso, achei mui pesada tarefa para mim;
até que entrei no santuário de Deus e atinei com o m deles” (Sl 73.16-17).
Ele estava em guerra. A neblina espiritual era densa. Mas a vitória veio no
contexto da adoração, o que levou a esta expressão culminante de louvor: “Quem
mais tenho eu no céu? Não há outro em quem eu me compraza na terra. Ainda
que a minha carne e o meu coração desfaleçam, Deus é a fortaleza do meu
coração e a minha herança para sempre” (Sl 73.25-26).
Percebi essa verdade em minha vida mais vezes do que posso contar. Em vez
de car longe da adoração comunitária quando nos sentimos espiritualmente
apáticos, o que precisamos mais do que nunca é exatamente o despertar da
adoração. Quando nossos corações menos sentem, é quando mais precisamos
lembrar nossas almas: “Quanto a mim, bom é estar junto a Deus” (Sl 73.28).
2. Segurança
Um segundo benefício é a dinâmica da comunidade, que signi ca não apenas
satisfazer nossos bons desejos de pertencimento e compartilhar a missão
(comunhão), mas também fornecer um catalisador para nossa segurança.
Embora possamos admirar guras como Atanásio e Lutero, que
aparentemente se colocaram sozinhos contra mundum (“contra o mundo”),
devemos lembrar que Deus disse que não é bom carmos sozinhos (Gn 2.18).
Esses heróis foram produto de dias terríveis e, inevitavelmente, suas histórias
foram diluídas na memória coletiva da história distante. Nem Atanásio nem
Lutero caram realmente sozinhos, mas faziam parte de comunidades éis que
promoveram e fortaleceram suas crenças, que do contrário seriam impopulares.
Assim também é conosco. Não fomos feitos para car sozinhos, sem
companheiros. Mesmo em tempos tão difíceis como os de Elias, Deus deu a ele
sete mil que não haviam abandonado a verdade (1Rs 19.18). Deus nos criou
para a comunidade — e a chamou de “igreja”; fazer parte dessa grande
comunidade local e global é de grande importância para garantir, não apenas que
não estamos nos enganando sobre a credibilidade de nossa pro ssão de fé, mas
também que sabemos verdadeiramente em quem cremos (2Tm 1.12).
E a adoração na igreja local nos aponta para a adoração da igreja universal, e
indica que Jesus tem um povo feito de muitas nações, e que um dia incluirá todas
as nações (Ap 7.9).
3. Crescimento
A adoração comunitária também desempenha um papel indispensável em
nossa santi cação — nosso crescimento progressivo em sermos conformados à
imagem de Jesus (Rm 8.29). A adoração comunitária é para nossa edi cação,
exortação e consolação em geral (1Co 14.3); mas também,
ao contemplamos Jesus unidos, todos nós “somos transformados, de glória em
glória, na sua própria imagem” (2Co 3.18).
O crescimento cristão não é apenas algo que extraímos como aplicação do
sermão e então trabalhamos em nossas vidas naquela semana. Como diz Tim
Keller, a santi cação pode acontecer “na mesma hora” quando nos sentamos para
ouvir a pregação do evangelho e nos engajamos na adoração comunitária. Há
momentos — que Deus nos dê muitos deles — em que o Espírito Santo usa a
Escritura lida, a oração feita, o coro cantado ou a verdade pregada para chegar
diretamente ao ponto de nossa necessidade. A adoração comunitária não apenas
orienta nossa caminhada cristã, mas nos cura ou nos transforma naquele
momento.
Quando participamos da adoração comunitária, Deus ama não apenas mudar
nossas mentes, mas mudar irresistivelmente nossos corações ali mesmo.
5. Alegria acentuada
Por último, mas não menos importante, está a experiência intensi cada de
adoração no contexto comunitário. Nossa própria reverência é acentuada, nossa
adoração aumentada, nossa alegria duplicada quando juntos adoramos a Jesus.
Como diz o provérbio sueco, alegria compartilhada é alegria dobrada. Na
adoração comunitária, as “graças e bênçãos” que desfrutamos exclusivamente não
são apenas o despertamento, a segurança, o crescimento e a aceitação da
liderança dos outros, mas também a alegria acentuada de adoração e temor mais
profundos, mais ricos e maiores, pois nosso deleite em Jesus se expande à medida
que nós o engrandecemos junto com outros.
O segredo da alegria na adoração comunitária não é apenas o esquecer de si
mesmo — ou, para colocar de forma positiva, a preocupação com Jesus e sua
glória — mas também a feliz consciência de que não estamos sozinhos ao
satisfazer nossas almas nele.
Donald S. Whitney, Spiritual Disciplines for the Christian Life, ed. rev. (Colorado Springs: NavPress,
2014), p. 111 [edição em português: Disciplinas espirituais (São Paulo: Editora Batista Regular, 2021)].
Citado em D. A. Carson (ed.), Worship by the Book (Grand Rapids, MI: Zondervan, 2002), p. 159–160.
John Piper, Desiring God: Meditations of a Christian hedonist, ed. rev. (Colorado Springs: Multnomah,
2011), p. 90 [edição em português: Em busca de Deus (São Paulo: Shedd, 2008)].
Em busca de Deus (São Paulo: Shedd, 2008), p. 73. Ênfase adicionada.
15 | Ouça a graça no púlpito
P oucas práticas irão estimular e afetar sua vida cristã tanto quanto sentar-se
atentamente para ouvir uma pregação el.
Embora a adoração comunitária como um todo possa ser o meio mais
importante da graça de Deus, como dissemos no capítulo 14, ouvir a renovada
pregação do evangelho a partir das Escrituras é a graça culminante dessa reunião.
É aquele momento na igreja reunida em que Deus fala em monólogo de maneira
mais clara e completa. Os outros elementos da reunião seguem o ritmo de
receber dele e respondê-lo, mas na pregação passamos à postura de simplesmente
receber, seja por uma hora ou trinta minutos corridos.
A prioridade semanal da pregação na adoração aponta para a importância de
não apenas interagir com Deus como amigos e partilhar de sua mesa como
família, mas também nos submeter à sua palavra na mensagem de seu arauto, o
pregador. Há tempo de sobra em outros lugares para fazer e responder
perguntas, e múltiplas ocasiões para conversar e dialogar. Mas a pregação é
aquele tempo por semana em que a assembleia dos redimidos coletivamente
fecha a boca, abre seus ouvidos e coração, e ouve a voz ininterrupta de seu Noivo,
através de seu porta-voz designado, ainda que seja um mensageiro falível.
A DISCIPLINA DE OUVIR
Mesmo que tenhamos outras 112 horas ou mais acordados por semana para
falar, discutir, dialogar e debater, ainda assim é fácil carmos inquietos por esses
trinta minutos. Amamos a ideia de igualdade e estamos acostumados a ouvir em
nossos próprios termos. Valorizamos as conversas; adoramos o diálogo. E o
diálogo é essencial para o discipulado. A Grande Comissão avança por meio de
grandes conversas. Há momentos para interagir com nosso Noivo, e momentos
para falarmos longamente em oração e em canções. Mas também há momentos
em que nos sentamos e ouvimos em silêncio e com atenção.
Quando nos colocamos debaixo da pregação da palavra de Deus, é um dos
poucos momentos preciosos na vida hoje em que fechamos nossa boca,
resistimos à tentação de responder imediatamente e concentramos nossa energia
e atenção em ouvir com fé.
EXPERIMENTE A ALEGRIA
O objetivo da pregação, como João Calvino observa, é “trazer-nos e apresentar-
nos Cristo, e, nele, os tesouros da graça celestial”.74 Na pregação da palavra de
Deus, diz Marcus Peter Johnson, “o próprio Deus fala e está presente para nós,
por meio de seu Filho, no poder do Espírito, para nos abençoar e nutrir”.75
O grande objetivo da pregação, assim como dos sacramentos e de nossos
vários outros hábitos de graça, como vimos, é que conheçamos e nos deleitemos em
Jesus. O maior incentivo para ouvirmos atentamente, quando nos reunimos para
a adoração corporativa e nos sentamos diante da pregação da palavra de Deus, é
poder conhecê-lo (Fp 3.10).
É o momento em que experimentamos a vida eterna durante trinta minutos
por semana, no objetivo mais elevado da pregação cristã: conhecer o único Deus
verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem ele enviou ( Jo 17.3).
3
2. Abastecer nossa fé
A pregação el reabastece nossa fé. A renovação pessoal e o fortalecimento
constante não vêm de darmos a nós mesmos um discurso estimulante, mas de
recebermos regularmente a pregação do evangelho. Simplesmente não temos os
recursos em nós mesmos. Precisamos de uma palavra externa. “A fé vem pelo
ouvir, e o ouvir, pela palavra de Cristo” (Rm 10.17, NAA).
Nossas almas são fortalecidas pelo evangelho pregado, como Paulo ora em
sua doxologia no nal de Romanos: “Ora, àquele que é poderoso para vos
con rmar segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo…” (Rm 16.25).
A mensagem da cruz é loucura para os que se perdem, mas é a sabedoria de
Deus para aqueles que creem — e poder para a vida cristã (1Co 1.18-24). E de
acordo com 1 Coríntios 15.1-2, o evangelho pregado não é apenas o que
recebemos no passado para nos tornarmos cristãos, mas é a graça na qual nos
rmamos atualmente, e aquela pela qual seremos nalmente salvos, se
continuamos a receber e nos apegar a este evangelho. A pregação contínua do
evangelho é vital para a vida contínua de fé.
3. Crescer em graça
Quando nos sentamos atentamente para ouvir a pregação el do evangelho,
não apenas esquecemos de nós mesmos e reabastecemos nossa fé, mas somos
genuinamente transformados. O evangelho que pregamos é aroma de vida para
vida, ou de morte para morte (2Co 2.15-16). Crescemos ou murchamos. Nossos
corações aquecem ou esfriam. Nós amolecemos ou nos endurecemos. Não há
neutralidade quando a pregação soa.
Como observamos no capítulo anterior, Tim Keller chama isso de
“santi cação na hora”. A principal maneira pela qual a pregação nos muda não é
dando-nos pontos de aplicação para tirar do sermão e de nir como tarefas para a
semana. Em vez disso, ao ouvirmos com fé e contemplarmos a glória de Cristo
em nossas almas, “somos transformados, de glória em glória, na sua própria
imagem” (2Co 3.18).
Por isso é tão essencial que a pregação se preocupe não com o pregador ou
com os ouvintes, mas com Jesus. Somente ao percebê-lo existe um verdadeiro
poder de mudança. Somente por meio dele e de seu evangelho nossa fé é
fortalecida e renovada. E somente em conhecê-lo e deleitar-se nele nossa alma
está verdadeiramente satisfeita.
5. Encontrar Jesus
Finalmente, e mais importante, o principal benefício que a pregação el
proporciona é encontrar o próprio Jesus e deleitar-se nele, ouvindo e recebendo
sua palavra. Como disse Martinho Lutero: “Pregar o evangelho nada mais é do
que Cristo vir a nós ou sermos levados a ele”.76
A boa pregação nos ajuda não só a esquecer-nos de nós mesmos, mas a voltar
o olhar para o Deus-homem, que é o único capaz de satisfazer as nossas almas.
Na pregação el, encontramos Jesus, e sua presença é mediada a nós por meio de
sua palavra. A maior graça da pregação é encontrar Cristo, conhecê-lo, adorá-lo e
desfrutá-lo como nosso maior tesouro.
Isso mudará signi cativamente nossa perspectiva e experiência com a
pregação. O que você acha de ir para o culto da próxima vez não apenas
buscando ouvir algum pregador, mas para encontrar Jesus?
Jason Meyer, Preaching: A Biblical eology (Wheaton, IL: Crossway, 2013), p. 21 [edição em português:
Teologia bíblica da pregação: a mensagem que glori ca a Deus, honra as Escrituras e edi ca a igreja (São
Paulo, Vida Nova: 2019).
Marcus Peter Johnson, One with Christ: An Evangelical eology of Salvation (Wheaton, IL: Crossway,
2013), p. 220.
João Calvino, A instituição da religião Cristã (São Paulo: Unesp, 2009), IV.14.17, p. 706.
Marcus Peter Johnson, One with Christ: An Evangelical eology of Salvation (Wheaton, IL: Crossway,
2013), p. 221.
Citado em John C. Clark e Marcus Peter Johnson, e Incarnation of God (Wheaton, IL: Crossway, 2015),
p. 192.
16 | Lave-se novamente nas águas
GRAÇA NA ÁGUA
O batismo marca a iniciação na nova aliança. Deve ser aplicado apenas uma vez,
a um crente considerado por uma congregação local como tendo uma pro ssão
de fé legítima, como entrada na plena comunhão da igreja visível. O drama do
evangelho experimentado e exibido no batismo corresponde às graças da
conversão na vida cristã em sua recepção inicial do evangelho: perdão inicial e
puri cação do pecado, fé e arrependimento, a nova vida do novo nascimento;
tudo isso e mais, em união com Cristo (Rm 6.3-5).
O batismo não é apenas obediência ao mandamento de Cristo e um
testemunho vivo da fé, que o candidato tem em Jesus, a todas as testemunhas,
mas também serve como um meio de alegria para quem está sendo batizado.
Não é apenas uma con rmação valiosa dada pela igreja visível de que nascemos
de novo, como também uma experiência única e singular da graça do evangelho
dramatizada para aquele que está na água, que é simbolicamente sepultado com
Jesus em sua morte e ressuscitado para andar em novidade de vida (Rm 6.4).
Quando há fé genuína por parte da pessoa batizada, e quando a fé da igreja que testemunha o
batismo é estimulada e incentivada pela cerimônia, então o Espírito Santo certamente age por
meio do batismo, que se transforma assim num “meio de graça” pelo qual o Espírito Santo
dispensa bênçãos à pessoa batizada e também à igreja.80
muito claramente um meio de graça que o Espírito Santo usa para dispensar bênçãos à igreja. […]
Existe uma união espiritual entre os salvos e com o Senhor, que se fortalece e se solidi ca na ceia
do Senhor, e ela não deve ser desprezada. […] É de se esperar que o Senhor distribua bênçãos
espirituais aos que participam da ceia do Senhor com fé e obediência às orientações dispostas nas
Escrituras; dessa forma ela se torna “meio de graça” que o Espírito Santo usa para nos dispensar
bênçãos.83
U ma das coisas mais amorosas que podemos fazer uns pelos outros na igreja
é dizer um ao outro quando estamos errados. Chame isso de correção,
repreensão ou exortação — Paulo usa todos os três termos em apenas quatro
versículos em 2 Timóteo 3.16–4.2 — mas não perca o que a torna algo
distintamente cristão e um presente para nossas almas: é um grande ato de amor.
O tipo de repreensão que as Escrituras recomendam é o tipo que visa nos
impedir de continuar em um caminho destrutivo.
Há pelo menos dois participantes em uma repreensão que serve às nossas
almas como um meio da graça de Deus. Um é o que dá a repreensão; o outro a
recebe. Neste capítulo, trataremos primeiro sobre receber uma repreensão de um
irmão como uma graça de Deus; em seguida, veremos o que signi ca sermos um
meio da graça de Deus ao repreender com humildade e amor.
ABRA O PRESENTE
O sábio reconhece a repreensão como um presente de ouro (Pv 25.12). É uma
gentileza e um símbolo de amor. “Fira-me o justo, será isso mercê; repreenda-me,
será como óleo sobre a minha cabeça, a qual não há de rejeitá-lo” (Sl 141.5).
Normalmente, para alguns em nossa vida é mais fácil não dizer nada e apenas
nos deixar seguir alegremente pelo caminho da loucura e da morte. Mas a
repreensão é um ato de amor, uma disposição para enfrentar aquele momento
embaraçoso e, talvez, ter seu conselho jogado de volta na sua cara, pelo risco de
fazer o bem a alguém. Quando um cônjuge, amigo, parente ou colega chega a
esse nível de amor, devemos ser profundamente gratos.
FALAR É FÁCIL
Mas tudo isso, é claro, é muito mais fácil de ser dito do que feito. Bem no fundo,
nas cavernas de nosso pecado remanescente, onde podemos ser mais resistentes à
verdadeira graça em suas formas variadas, não queremos ouvir a correção. Algo
rebelde em nós se retrai.
Quando ouvimos que “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil”, é natural
carmos mais entusiasmados com a parte de ser “para o ensino” e “para a
educação na justiça” do que “para a repreensão” e “para a correção” (2Tm 3.16).
Isso é pessoal demais. Isso pisa no nosso calo.
E as forças externas não tornam as coisas mais fáceis. Não deveria nos
surpreender que o ar social que respiramos seja hostil à correção e repreensão,
mesmo em suas variedades mais gentis e amorosas. Se não se reconhece a
humanidade como depravada por natureza e pecaminosa na prática, então a
repreensão não é mais um salva-vidas, mas um aborrecimento, e até mesmo uma
ofensa. Mas se reconhecermos que somos falhos, egoístas, arrogantes e que
pecamos regularmente com nossas palavras e ações, então aprenderemos a ver a
repreensão de um irmão como a tremenda graça que de fato é.
LIBERE O PODER
Porém, por mais que receber repreensão vá contra nossos instintos naturais ou
nos pegue desprevenidos em nossa vida cristã, temos esta grande esperança na
qual crescer: o amor de Cristo por nós é a nossa chave para destravar o poder da
repreensão. Com ele em vista, aquele “que me amou e a si mesmo se entregou por
mim” (Gl 2.20), a repreensão já não será um ataque aos nossos fundamentos e ao
nosso profundo senso de valor, mas se tornará uma nova oportunidade para
crescimento e maior alegria.
É outra graça do evangelho podermos, pelo Espírito, amadurecermos o
su ciente para ouvir qualquer repreensão como um caminho para ainda mais
graça. É o evangelho que nos dá os meios para verdadeiramente nos inclinarmos
para a correção e recebermos suas riquezas. Somente em Jesus podemos
encontrar nossa identidade, não em não termos defeitos, mas em sermos amados
por Deus quando ainda somos pecadores, cheios de defeitos (Rm 5.8). Com tal
Salvador para rmar nossos pés, podemos aceitar a repreensão como a bênção
que é.
DÊ A BÊNÇÃO DA REPREENSÃO
A repreensão é uma bênção que requer duas pessoas. O amor nos compele não
apenas a querer receber uma repreensão com uma identidade no evangelho, mas
também a oferecer esse presente a outros. Uma das coisas mais amorosas que
podemos fazer pelos outros é dizer-lhes quando estão em erro.
Embora já seja bastante difícil aceitar a bênção da repreensão, quando é você
quem recebe alguma palavra de correção, pode ser ainda mais difícil iniciar e
conduzir aquele momento embaraçoso no qual amamos tanto alguém a ponto de
confrontá-lo. “Se é difícil aceitar uma correção, mesmo que seja particular”, diz
D. A. Carson, “é ainda mais difícil administrá-la com humildade amorosa”.86
Mas, por mais difícil que seja, se realmente acreditamos que todos somos
pecadores e que o pecado irrefreado leva à dor, miséria e destruição eterna, o
amor nos constrange a oferecer o presente da repreensão amorosa. Aqui, então,
no espírito de buscar prover repreensão em “humildade amorosa”, estão sete
passos para uma correção verdadeiramente cristã.
4. Seja rápido
Ore pela restauração da outra pessoa, mas não espere muito de joelhos.
Hebreus nos incentiva a ser rápidos e constantes — “cada dia”. Não deixe os
padrões manifestamente pecaminosos proliferarem. Se possível, nem sequer
deixe o sol se pôr.
Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de
incredulidade que vos afaste do Deus vivo; pelo contrário, exortai-vos mutuamente cada dia,
durante o tempo que se chama Hoje, a m de que nenhum de vós seja endurecido pelo engano do
pecado. (Hb 3.12-13)
5. Seja gentil
O que faz com que uma palavra corretiva seja verdadeiramente cristã não são
apenas lembretes explícitos das verdades do evangelho, mas também um tom e
uma conduta que combinam com nosso Mestre. Há um lugar para gravidade e
severidade em resposta à clara insensibilidade do coração, mas na maioria das
vezes, no tipo de correção convencional que oferecemos uns aos outros na
comunidade, é o padrão gentil de “servo do Senhor” que melhor nos atende:
Ora, é necessário que o servo do Senhor não viva a contender, e sim deve ser brando para com
todos, apto para instruir, paciente, disciplinando com mansidão os que se opõem, na expectativa de
que Deus lhes conceda não só o arrependimento para conhecerem plenamente a verdade, mas
também o retorno à sensatez, livrando-se eles dos laços do diabo, tendo sido feitos cativos por ele
para cumprirem a sua vontade. (2Tm 2.24-26)
7. Acompanhe
Finalmente, planeje alguma forma de fazer o acompanhamento. Se ele
responder bem, prossiga com uma mensagem, telefonema ou conversa, e elogie
essa evidência de graça em sua vida. Se ele não responder bem, prossiga com
alguma expressão adicional de amor, talvez um lembrete de que você não tem
nada a ganhar além do bem dele, que você estará feliz em estar errado se a
correção for muito subjetiva, e que você está orando em seu favor enquanto ele
considera sua observação.
Oferecer palavras de correção regulares e graciosas pode parecer uma coisa
muito pequena na vida da comunidade. É muito fácil deixar passar os pequenos
pecados e cuidar da sua própria vida. Mas o efeito de longo prazo dessa graça
ativa, administrada com humildade amorosa, pode ter implicações eternas.
“Meus irmãos, se algum entre vós se desviar da verdade, e alguém o
converter, sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho errado
salvará da morte a alma dele e cobrirá multidão de pecados” (Tg 5.19-20).
D. A. Carson, Matthew, ed. rev., e Expositor’s Bible Commentary (Grand Rapids, MI: Zondervan,
2010), p. 456.
Parte 4 | Desfecho
19 | A comissão
D issemos no início que não haveria lugar num livro deste tamanho para um
tratamento completo dos meios da graça e dos muitos bons hábitos que
podemos cultivar em torno deles. Há muito mais a ser dito no nível do princípio
e da teologia, para não mencionar incontáveis especi cidades e ideias criativas
que poderíamos abordar para a prática cotidiana. Deixo isso para outros autores,
e melhor ainda, para sua própria criatividade, tentativa e erro, e de outros em sua
vida e comunidade. Mas antes de partir, será útil tocar brevemente em três
tópicos mais orientados para a prática que estão intimamente relacionados aos
meios da graça.
Muitos consideram o evangelismo e a mordomia (tanto de tempo quanto de
dinheiro) como disciplinas espirituais. Certamente há elementos aqui que
envolvem disciplina, e há princípios e promessas bíblicas que nos levariam
corretamente a pensar neles como meios de graça em algum sentido real.
Contudo, considero mais útil tratar a missão, o tempo e o dinheiro
conjuntamente como disciplinas e atividades que são, antes e acima de tudo,
re exos de ouvir regularmente a palavra de Deus, ser ouvido por ele e pertencer a
seu corpo. Receber a graça contínua de Deus para nossas almas nos sustenta,
inspira e capacita para o evangelismo e a mordomia. E quando falarmos sobre o
relógio (cap. 21) e o dinheiro (cap. 20), poderá ser mais útil fazê-lo dentro da
estrutura da Grande Comissão.
Frequentemente encontro cristãos que estão mal espiritualmente, mantendo a fé, mas sem
avançarem muito. O estudo bíblico se tornou uma tarefa árdua; a oração é uma rotina árida. O
milagre de sua própria conversão, antes contado com grande paixão, agora é uma memória
distante e apagada. E ir à igreja, bem, é algo que eles simplesmente fazem. Mecanicamente e sem
entusiasmo, essas pessoas marcham ao longo do trabalho enfadonho do cristianismo recluso.
Mas quando esses crentes apáticos saem do isolamento espiritual e encontram alguns
necessitados espirituais, algo maravilhoso começa a acontecer. À medida que vivenciam as
conversas cruciais que tendem a acontecer com pessoas de fora da igreja, eles começam a notar que
uma espécie de renovação interior está acontecendo. Áreas há muito ignoradas de repente ganham
vida com um novo signi cado. […] Não é maravilhoso como o aumento de nossos esforços para
alcançar outras pessoas pode ser um catalisador para o crescimento pessoal?87
Viver em missão não é apenas um efeito da graça de Deus que vem a nós
pelos canais de sua palavra, oração e comunhão, mas também pode se tornar um
meio de sua graça para nós na totalidade da vida cristã.
P ara o cristão, a questão não é apenas dar, mas como. “Deus ama a quem dá
com alegria” (2Co 9.7). E dar alegremente tem base no grande porquê da
generosidade cristã: o próprio Cristo — nosso Salvador, Senhor e maior tesouro
— demonstrou a máxima generosidade ao descer para nos comprar de volta.
“Conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre
por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos” (2Co 8.9). Se
Jesus está em nós, então cada vez mais essa tendência generosa estará em nós
também.
Um dos efeitos do evangelho se aprofundando em nossas almas é que ele
libera nossas mãos para afrouxar o controle sobre nossos bens. A generosidade é
uma das grandes evidências de que somos verdadeiramente cristãos. Não apenas
é o próprio Jesus quem fala com mais frequência, e nos avisa com mais
severidade, sobre o perigo da ganância, mas também é ele que apela fortemente
para a nossa alegria e diz: “Mais bem-aventurado é dar que receber” (At 20.35).
Sem dúvida, discernir o que é e o que não é “uma vida totalmente humana,
livre de ser escravizada por nossas coisas” varia de lugar para lugar e de pessoa
para pessoa. “Cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com
tristeza ou por necessidade; porque Deus ama a quem dá com alegria” (2Co 9.7).
Quando se trata de nanças, fazemos bem em sermos críticos de nós mesmos, e
não dos outros — e de nos lembrarmos de como temos a tendência de sermos
gentis conosco e duros com os outros.
É difícil, e provavelmente imprudente, prescrever particularidades aqui, mas
podemos criar algumas categorias úteis e descrever erros a serem evitados, como
“ser escravizado por nossas coisas”. Uma coisa a se notar é que “uma vida
totalmente humana” não é uma existência estática. Deus nos criou para ritmos e
cadências, para banquetes e jejuns, para barulho e multidões e silêncio e solitude.
É de alguma utilidade, mesmo que mínima, identi car e nomear os extremos de
opulência e austeridade prolongadas. Precisamos de um espaço para banquetes e
jejuns nanceiros. Devemos abominar o chamado “evangelho da prosperidade”,
não sermos prejudicados pela mesquinhez disfarçada de mordomia cristã, e
estarmos alertas ao fato que acumular grandes dívidas no cartão de crédito
provavelmente signi ca dar além de nossas posses.
Embora discernir precisamente o que é pouco ou muito de pessoa para pessoa
não seja uma tarefa fácil, John Piper sabiamente observa: “A impossibilidade de
traçar uma linha entre a noite e o dia não signi ca que você não consiga
reconhecer quando é meia-noite”.91
Uma última coisa a se notar sobre padrões é o teste do sacrifício. Você já se
absteve de algo que, em geral, consideraria como uma “necessidade da vida” para
doar ao próximo?
Nada evidencia nosso coração como o sacrifício. Quando estamos dispostos
não apenas a dar de nosso excesso, mas a admitir alguma perda ou desvantagem
pessoal para sermos generosos para com os outros, dizemos em alto e bom som,
mesmo que apenas para nossa própria alma, que temos um amor maior do que a
nós mesmos e nossos confortos.
V ocê está sempre preso ao relógio. Não há como evitar. Todo ser humano,
em todos os lugares do planeta, qualquer que seja a cultura, está sujeito à
passagem incessante do tempo. Os ponteiros estão sempre se movendo. Não
importa o quanto o negligenciemos, ignoremos ou nos estressemos com isso, não
há nada que possamos fazer para conter seu ataque. Ignore sua velocidade por
sua conta e risco. Ou trilhe o caminho da sabedoria para administrar seus curtos
e poucos dias como dádivas de Deus.
A primeira coisa a dizer sobre ser intencional com nosso tempo é que as
Escrituras recomendam isso. Dar atenção a uma melhor gestão do tempo não é
uma criação secular. A recente enxurrada de livros de negócios sobre o assunto é
precedida em muito pelo ensino bíblico.
Não é apenas o apóstolo Paulo a nos dar a direção: “Portanto, vede
prudentemente como andais, não como néscios, e sim como sábios, remindo o
tempo” (Ef 5.15-16), mas 1500 anos antes, até mesmo a oração de Moisés pedia
a ajuda de Deus “Ensina-nos a contar os nossos dias, para que alcancemos
coração sábio” (Sl 90.12).
As Escrituras têm muito a dizer sobre como administrar nosso dinheiro, e
não é preciso muito para ver que o relógio é ainda mais precioso do que o
dinheiro. Como Donald S. Whitney argumenta: “Se as pessoas jogassem fora
seu dinheiro tão impensadamente como jogam fora seu tempo, nós as
consideraríamos loucas. No entanto, o tempo é in nitamente mais precioso do
que o dinheiro, porque dinheiro não compra tempo”.92
SE O SENHOR QUISER
Mas a Bíblia não apenas recomenda a gestão do tempo; também adverte sobre
ele. Sim, a negligência é um perigo frequente, mas a armadilha oposta é quase
epidêmica em nossos dias. Quer a raiz do pecado seja a ansiedade, o egoísmo ou
simplesmente orgulho e arrogância, a resposta para a negligência não é oscilar o
pêndulo até sermos consumidos por nossos calendários. O deus da
administração do tempo rapidamente fracassará, se estiver no lugar de Cristo e
sua providência e prerrogativas.
Tiago assume a voz principal para a repreensão, ou pelo menos santi cação,
da nossa agenda.
Atendei, agora, vós que dizeis: Hoje ou amanhã, iremos para a cidade tal, e lá passaremos um ano,
e negociaremos, e teremos lucros. Vós não sabeis o que sucederá amanhã. Que é a vossa vida?
Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa. Em vez disso, devíeis dizer:
Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos isto ou aquilo. Agora, entretanto,
vos jactais das vossas arrogantes pretensões. Toda jactância semelhante a essa é maligna. (Tg
4.13-16)
VÍCIO EM PRODUTIVIDADE
Certamente, muitos são negligentes com seu tempo, mas vivemos em uma época
em que a gestão do tempo está em voga. Pelo menos no Ocidente, talvez
estejamos mais cientes do que nunca quanto ao relógio e de como ele é fugaz.
Sua livraria local agora oferece mais lançamentos sobre produtividade e gestão de
tempo do que de loso a e religião. O “vício em produtividade” enredou
multidões em sua teia de sistemas em constante aperfeiçoamento.93
Hoje, os especialistas nos dizem que precisamos assumir o controle de nossa
rotina diária antes que alguém assuma, que o maior problema que enfrentamos é
o “ uxo de trabalho reacionário” e que devemos proteger vigilantemente nossa
agenda sagrada contra a invasão das necessidades e prioridades dos outros.94
Talvez, mais do que nunca, precisamos ouvir de nosso Pai amoroso o
lembrete difícil, mas feliz de 1 Coríntios 6.19-20, adaptado para o nosso
planejamento: Seu tempo não é seu. Você foi comprado por um preço. Portanto,
glori que-me com a sua agenda.
Mas e daí? Se nosso tempo, em última análise, não é nosso, mas dele, como a
fé direciona o tempo que estamos administrando por empréstimo?
T odos nós já passamos por isto. Talvez hoje mesmo seja um dia destes para
você. O dia caótico. Pelo menos espiritualmente falando.
Esperamos que você esteja desenvolvendo sua rotina regular e seus “hábitos
da graça”, os seus quando, onde e como buscar a comunhão diária com Deus.
Talvez você já esteja nisso há tanto tempo que, quando o despertador toca em um
dia normal, você já tem seus padrões e ritmos organizados de como se levantar,
preparar o café da manhã e se preparar, tudo desembocando em um tempo curto
mas signi cativo de “entrar na Palavra”, para rede nir sua mente, encher seu
coração e recalibrar sua perspectiva antes de começar o dia.
Mas então vêm aqueles dias caóticos. E eles parecem surgir com mais
frequência do que esperamos. Pode ser a conversa até tarde da noite, importante,
mas cansativa, que faz você acionar o modo soneca repetidamente na manhã
seguinte. Ou talvez seja car com parentes, ou recebê-los em sua casa.
Ou, para pais jovens, é o lho (ou lhos) que acordou durante a noite ou saiu
da cama muito cedo querendo o café da manhã e sua atenção. Ou talvez seja
apenas esta época da vida e, honestamente, todas as manhãs parecem ter seu
próprio caos. O Inimigo parece ter algum esquema novo e criativo a cada novo
dia para evitar que você tenha qualquer “tempo a sós com Deus”.
Quaisquer que sejam as circunstâncias que emperram sua rotina, suas
manhãs caóticas levantam a questão: Como você deve pensar e se envolver (se
conseguir) nos meios de graça da meditação bíblica e oração quando a boa,
porém muitas vezes inconveniente, soberania de Deus faz você cambalear sem
sua rotina?
www.ministerio el.com.br
Todo mundo quer ser feliz. O site do ministério Desiring God nasceu e foi
construído para a felicidade. Queremos que as pessoas em todos os lugares
entendam e abracem a verdade de que Deus é mais glori cado em nós quando
estamos mais satisfeitos nele.
Reunimos mais de trinta anos de mensagens e textos de John Piper, incluindo
traduções em mais de quarenta idiomas. Também fornecemos um uxo diário de
novos recursos em texto, áudio e vídeo para ajudá-lo a encontrar verdade,
propósito e satisfação que nunca terminam. E tudo isso está disponível
gratuitamente, graças à generosidade das pessoas que foram abençoadas pelo
ministério.
Se você quer mais recursos para a verdadeira felicidade, ou se quer aprender
mais sobre nosso trabalho, nós o convidamos a nos visitar:
www.satisfacaoemdeus.org