Ebook - Blockchain Inovação e Proteção de Dados 23112019
Ebook - Blockchain Inovação e Proteção de Dados 23112019
Ebook - Blockchain Inovação e Proteção de Dados 23112019
Esse e-book foi desenvolvido a partir de uma iniciativa (sem fins lucrativos) que
começou em agosto/2018, o grupo LGPD Acadêmico, o qual é composto por
voluntários do Brasil inteiro, apaixonados pelo mundo da privacidade e com
objetivo comum – aprender e compartilhar.
Boa Leitura!
A tecnologia blockchain, que está por trás da famosa criptomoeda Bitcoin, foi
descrita por Naughton (2016) como: "a mais importante invenção de TI da nossa era".
Mougayar (2016) disse que "está no mesmo nível da World Wide Web em termos de
importância". Com essas duas afirmações e toda a propagação de notícias quanto à
Bitcoin, outras criptomoedas e a constante divulgação de novos usos e inovações
utilizando a tecnologia blockchain como base, podemos perceber que ainda que essas
afirmações façam parte do “hype”, como alguns dizem, precisamos estar de olho e
acompanhar suas transformações.
O que é blockchain? 5
Guilherme Sampaio
A tecnologia blockchain foi pensada por Satoshi como uma forma segura para se
transferir Bitcoins de uma pessoa para outra. A criptomoeda Bitcoin apenas aceita
transferências de Bitcoins, mas a tecnologia blockchain utilizada para a criação da
criptomoeda permite a transação de qualquer ativo, com um registro seguro.
Conceito
A blockchain é uma rede distribuída, na qual não existe um único intermediário
para realizar e validar uma transação, muito menos alguém para cobrar altas taxas de
operação. Basicamente, todos os computadores dentro dessa rede (também conhecidos
como nós) precisam reconhecer a transação para ela se tornar válida.
LGPD ACADÊMICO
● A unidade de informação numa blockchain é chamada de transação;
● Após o bloco ser criado e validado pela rede, ele será adicionado a cadeia
de blocos – também conhecido como BLOCKCHAIN!
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Razões pelo hype
A razão pela qual a tecnologia blockchain ganhou tanta admiração é que:
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O primeiro passo é o registro de uma transação. Digamos que Marcos Pianter
deseje enviar dinheiro para Axl Rose. Ele envia essa requisição para a blockchain,
deixando sua transação em um pool de transações que serão consumidas pelos
mineradores para validarem as informações.
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3º Passo: Tornar a transação “oficial”: O pool
Depois de anonimizadas as informações, a transação entra no pool de transações
com o status de pendente.
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4º Passo: Tornar a transação imutável: O hash das transações
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para conectar e validar o bloco na blockchain. O único bloco que não possui hash do
bloco anterior é o bloco gênesis, ou seja o primeiro bloco da blockchain.
● Mesmo que alguém consiga alterar uma cópia local para enganar a blockchain,
jamais conseguiria oficializar isso frente as demais cópias do blockchain, pois,
para enganar, teríamos que alterar todos os blocos anteriores para que os hashes
estejam em conformidade;
● Para garantir que realmente um bloco está seguro, a blockchain pode ser
programada para ter um limite, esperando que um bloco apenas é válido depois
que mais N blocos sejam validados, validando a cadeia anterior ao bloco.
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APLICABILIDADE DOS SMART CONTRACTS
Por Maristela Marquiafave
Sabemos, no entanto, que este não foi sempre o ritmo das mudanças. Mais de dois
séculos foram necessários para que três grandes revoluções de forte impacto para o
cenário socioeconômico global se desenvolvessem, diga-se de passagem, linearmente,
e se concretizassem: a invenção da máquina a vapor, o advento da eletricidade e o
desenvolvimento da computação.
Uma longa estrada foi percorrida para que definições até então desconhecidas,
como blockchain, criptoativos, inteligência artificial, robótica, internet das coisas,
pudessem ser hoje debatidos em larga escala e compreendidos por nossa geração, o
que comprova estarmos diante de um caminho inovador sem volta. E em meio a
tamanha inovação, modificam-se exponencialmente também as relações humanas e a
forma como as partes de uma relação contratual adquirem direitos e assumem
obrigações, surgindo espaço para o uso dos smart contracts (ou contratos inteligentes).
Não podemos falar de smart contracts sem antes citar o cientista da computação
americano Nick Szabo, que instituiu o referido termo em 1994, ao afirmar que: “A
smart contract is a computerized transaction protocol that executes the terms of a
contract”, o que em livre tradução define um smart contract como nada mais que um
protocolo de transação informatizado que executa os termos de um contrato.
1 https://firstmonday.org/ojs/index.php/fm/article/view/548
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códigos computacionais, buscando maior segurança e proteção para as partes. A
tradução livre do resumo de seu artigo assim detalha o centro de suas ideias: “Smart
contracts combinam protocolos com interfaces de usuários para formalizar e assegurar
as relações em redes de computadores. Objetivos e princípios para o design desses
sistemas são derivados dos princípios legais, teoria econômica e teorias de protocolos
confiáveis e seguros. Similaridades e diferenças entre os smart contracts e os
procedimentos de negócios tradicionais baseados em contratos escritos, controles e
formulários estáticos são discutidas. O uso de criptografia e outros mecanismos de
segurança podem trazer proteção a muitas relações especificadas por algoritmos
contra violações de princípios e de interceptação ou interferência maliciosa de
terceiros, até considerações de tempo, interface do usuário e integridade da
especificação algorítmica”.
Essa teoria teria sido pensada através da análise das vending machines, pois se
traçarmos um paralelo, estamos “contratando” com referidas máquinas ao compramos
um refrigerante, por exemplo, mediante várias cláusulas pré-estabelecidas: (i) escolha
do produto; (ii) depósito do valor estabelecido na máquina para aquisição daquele
produto; (iii) liberação do produto pela máquina mediante pagamento do valor correto;
(iv) devolução de troco devido a eventual depósito de valor a maior. Com isso, resta
adimplida e executada a transação, sem a intervenção de terceiros.
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to-Peer Electronic Cash System”2 é que surge o criptoativo Bitcoin (BTC) e a tecnologia
blockchain, trazendo finalmente as condições necessárias para o desenvolvimento dos
smart contracts em seu formato atual.
Ainda, vale dizer que a blockchain do BTC (assim como as demais), é uma camada
de tecnologia que roda em cima da internet, assim como a nossa velha conhecida www
(World Wide Web) e mantém uma transparência sem igual via ledger de transações
(uma espécie de “livro-razão”) com todas as operações registradas com horário e por
ordem cronológica, desde o início de sua operação.
Em 2013, o programador russo Vitalik Buterin, então com 19 anos de idade, sob o
argumento de que a rede do Bitcoin precisava de uma linguagem mais generalizada,
apresenta o white paper da rede Ethereum, rede descentralizada e capaz de executar
smart contracts, também com código fonte aberto3, tendo sido o projeto financiado
através de crowdfunding, com lançamento efetivo em 2015.
2 https://bitcoin.org/bitcoin.pdf
3 https://github.com/ethereum/wiki/wiki/White-Paper
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Como na blockchain do Bitcoin, as características principais da rede Ethereum
são similares, sendo que ela também armazena as transações numa espécie de planilha
pública, distribuída e criptografada, validadas pelos próprios usuários da rede. No
entanto, contratos inteligentes formalizados na blockchain do Ethereum não são pagos
em Bitcoins, mas sim em Ether, a “moeda” da rede.
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A linguagem de programação mais utilizada é o Solidity, sendo o Remix a melhor
ferramenta para redigir e publicar os contratos. O Ether é o “combustível” da
plataforma, apto a possibilitar que as transações se realizem e que o contrato se
implemente.
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formalização via modelos tradicionais, o que possibilitará o self-enforcement preciso
do smart contracts.
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5 – Autoexecução: findo este processo de negociação, deployment, validação e
registro pela rede, estando as condições do contrato adimplidas, ocorrerá o seu
enforcement e, consequentemente, a satisfação das partes envolvidas.
Diante desse contexto, podemos concluir que temos vivenciado uma excitante
jornada disruptiva e de inovação sem precedentes, sendo possível atrelar as relações
humanas e, neste particular o Direito, ao ramo da Tecnologia.
O objetivo central das pessoas que hoje detêm o conhecimento e estão à frente
deste cenário é justamente buscar o protagonismo e a mudança gradativa do mindset
comum e dos antigos modelos sócio-político-econômicos, abolindo os pontos de atrito
do sistema tradicional, em busca de economia de tempo e recursos.
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É importante que tenhamos passado a ideia de que hoje não estamos mais diante
da era da internet da informação, mas sim da internet do valor, em que transações
precisam ocorrer de forma online, com rapidez, segurança e transparência, sendo as
redes blockchain e os contratos inteligentes os grandes responsáveis por essa
concretização, em busca da modernização do cenário até então praticado e da
adaptação dos novos modelos econômicos e sociais a um cenário jurídico confiável.
Para corroborar esse pensamento e essa ânsia por mudanças, enumeramos cinco
grandes vantagens dos smart contracts: (i) segurança (criptografia); (ii) redução de
custos (menor intervenção humana); (iii) velocidade (ações rápidas e em tempo real);
(iv) precisão (100% programados por códigos); e (v) transparência (auditáveis).
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BLOCKCHAIN E A INDÚSTRIA DO
ENTRETENIMENTO
Por Guilherme Sampaio
Entender como o blockchain atua na estratégia mais ampla da empresa, quais são
as prioridades da empresa e se o modelo de negócios pode ser significativamente
impactado pela tecnologia será essencial. Embora a tecnologia ainda seja nova, ela
tem aplicativos para toda a indústria com o potencial de transformar a maneira como
o conteúdo é criado, consumido e protegido. Além disso, é importante começar a
pensar nos possíveis benefícios e desafios da adoção agora.
Eliminação de intermediários
A estrutura descentralizada da blockchain poderia permitir que os criadores de
conteúdo - como músicos ou escritores - distribuíssem diretamente seu trabalho para
os consumidores, ignorando os canais de distribuição tradicionais e deixando uma
parcela maior de receita para os próprios criadores de conteúdo. Isso poderia impactar
todos, desde grandes meios de comunicação até “blogueiros” independentes, ajudando
os artistas a formar um relacionamento direto com os consumidores.
Distribuição de royalties
A coleta e distribuição de pagamentos de royalties no setor musical se tornou
ainda mais complexa com o crescimento dos serviços de streaming de música. Cada
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vez que uma música é transmitida online ou reproduzida em segundo plano de um
programa de TV, por exemplo, o distribuidor deve compensar o detentor dos direitos
autorais da música, mas podem surgir controvérsias sobre a precisão e as taxas de
compensação desses royalties.
Vendas consumidor-consumidor
Uma tendência crescente que têm origens no crowdfunding e que pode ajudar
muito a todos os profissionais e empresas do mercado é a micro venda de ativos. Hoje
temos pinturas famosas como de Picasso que foram transformadas em milhões de micro
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ações e vendidas por valores menores por conta da quantidade, abrindo caminho para
micro investidores ou pequenos mecenas.
Essa transformação pode ser feita com qualquer ativo, principalmente os criados
pela indústria do entretenimento, onde a maioria dos produtos é virtual. E não é só
com produtos lançados que essa estratégia artística pode ser implementada, ela serve
para qualquer ideia! Ou seja, um artista poderia usá-la como um crowdfunding para
seu próximo álbum! E imagine se além de conseguir o valor para produzir seu novo
álbum, ele se torne um sucesso e todos os fãs que lhe ajudaram no começo, que hoje
são seus sócios em seu álbum de sucesso, estarão compartilhando não só da alegria de
um projeto bem sucedido, mas também de seus lucros!
Conclusão
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LGPD ACADÊMICO
BLOCKCHAIN E PROTEÇÃO DE DADOS: É
POSSÍVEL UMA COMPATIBILIDADE?
Por Amanda Alencar
A tecnologia blockchain vem causando ao longo dos últimos anos uma verdadeira
revolução, com soluções bastante inovadoras sendo experimentadas, que vão muito além
das criptomoedas. Entretanto, em meio a exaltação quanto aos diferentes usos da
tecnologia, ecoam questionamentos e debates acerca da sua compatibilidade quanto a
outro tema bastante destacado nos últimos anos: a proteção de dados pessoais. Isso
porque a tecnologia blockchain, da forma como foi originalmente pensada por Satoshi
Nakamoto, se caracteriza por ser uma base de dados descentralizada, com total
transparência e publicidade das informações inseridas, as quais são armazenadas de
maneira imutável, sem a possibilidade de qualquer alteração posterior. Tais
características, em uma primeira análise, parecem ser inconciliáveis com os principais
critérios relacionados à proteção de dados pessoais, o que gera várias discussões acerca
da compatibilidade e viabilidade da tecnologia quanto às normas de proteção de dados
hoje aplicáveis.
O primeiro aspecto a ser enfrentado diz respeito ao uso de dados pessoais numa
blockchain. Nos termos da Lei de Geral Proteção de Dados brasileira (LGPD), bem como
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do General Data Protection Regulation (GDPR), o conceito de dados pessoais é bastante
amplo, sendo considerado um dado pessoal aquele que possa tornar um indivíduo
identificado ou identificável. Aqui reside a primeira observação e um dos principais
problemas em relação aos dados pessoais e as blockchains: ainda que seja inserido um
dado que não possa identificar diretamente um indivíduo, o seu uso recorrente ou a sua
associação com outras informações torna o indivíduo identificável, o que fará incidir a
aplicação das leis de proteção dos dados.
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Importante lembrar que os mais diversos tipos de blockchains têm em comum a larga
utilização da chamada função hash criptográfica, que é utilizada principalmente para
encadear de forma bastante segura os blocos de informações um ao outro e na qual não
é possível haver reversão. A função hash é usualmente comparada a uma impressão digital
de um bloco de informações, pois o resultado gerado é único, de forma que a mínima
alteração, seja de um bit sequer, no bloco de informações corresponderá a um resultado
da função hash completamente diferente.
6 European Union Blockchain Observatory and Forum, “Blockchain and the GDPR”.
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referentes ao tratamento de dados pessoais. A definição do controlador é essencial em
termos de responsabilização, mas se mostra particularmente desafiadora quando se trata
de um sistema que tem múltiplos participantes, com uma base de dados descentralizada.
Por outro lado, a maior dificuldade reside em relação as blockchains públicas e não
permissionadas, que hoje correspondem a grande maioria das blockchains em uso, como
as blockchains de criptomoedas. Qualquer pessoa pode, sem nenhuma permissão
necessária do sistema, atuar na rede como um nó validador ou apenas um nó participante
(o qual possui uma cópia da base de dados). Assim, uma vez que não há controle dos
participantes, como determinar quem seria o controlador e o operador nesses casos,
segundo as normas de proteção de dados? O debate nesses casos ainda permanece
inconclusivo, apesar de algumas opiniões já expressadas. A CNIL, autoridade francesa de
proteção de dados, já apresentou relatório7 no qual considera, de maneira geral, os
participantes de uma blockchain não permissionada como responsáveis pelo tratamento
de dados pessoais. No entanto, o maior desafio não é definir essas responsabilidades e
sim aplicá-las.
Quando há um controlador definido de forma mais clara, que faz a coleta dos dados
de acordo com uma base legal definida, inclusive antes do início das atividades da
blockchain, se mostra muito mais fácil identificar também, a partir daí, suas obrigações.
Em outros casos, é necessária uma melhor orientação das autoridades de proteção de
7 CNIL, “Solutions for a responsible use of the blockchain in the context of personal data”.
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dados, o que certamente levará a uma análise a ser desenvolvida caso a caso, a depender
da configuração e características da blockchain e da forma de participação dos nós
validadores.
Aqui reside outro grande desafio quanto à proteção de dados pessoais numa
blockchain, que tem relação com uma de suas principais características: a imutabilidade.
Como visto anteriormente, a alteração das informações contidas num bloco invalida o
encadeamento de blocos, uma vez que a mínima alteração necessária altera também o
código resultante da função hash, o principal responsável pela segurança do
encadeamento. Assim, o cumprimento das obrigações de eliminação e correção de dados
pessoais pode se tornar tecnicamente desafiador.
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Considerações finais: quais as soluções possíveis?
Essa, como outras técnicas que estão sendo estudadas atualmente, precisam cumprir
uma extensa lista de requisitos das leis de proteção dados, como visto nas seções
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anteriores. Por isso, o consenso hoje é que os riscos inerentes induzem quem procura
implementar soluções em blockchain a evitar ao máximo o uso de dados pessoais, também
em cumprimento ao indispensável princípio da necessidade, previsto no artigo 6º, inciso
III da LGPD9 (ou minimização de dados, conforme o GDPR). Se é preciso utilizar dados
pessoais, é necessário antes se certificar da utilização de técnicas atuais e eficazes por
meio de ofuscação, encriptação e agregação objetivando a anonimização para que se
possa mitigar os riscos do uso de dados pessoais numa blockchain.
9 Artigo 6º, III da LGPD: “III - necessidade: limitação do tratamento ao mínimo necessário
para a realização de suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não
excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados”.
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Referências
Article 29 Working Party (2014). Opinion 05/2014 on Anonymisation Techniques.
Disponível em: <https://ec.europa.eu/justice/article-29/documentation/opinion-
recommendation/files/2014/wp216_en.pdf>
CNIL (2018). Solutions for a responsible use of the blockchain in the context of
personal data. Disponível em:
<https://www.cnil.fr/sites/default/files/atoms/files/blockchain.pdf>
European Union Blockchain Observatory and Forum (2018). Blockchain and the
GDPR. Disponível em:
<https://www.eublockchainforum.eu/sites/default/files/reports/a.pdf>
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