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I, EdtOra:EDÍTORADO BRASIL SA
L00. Uoleçao: 0187P1 8043 Cód. Livro: 0187P1 80431 031L
-

Titulo da Coleção: HISTÓRIA EM DEBATE


Titulo do Livro: HISTÓRIA EM DEBATE 3
Série: Terceira Componente: História
-

\ Autor(es): ROSIANE DE CAMARGO


História - Ensino Médio

Renato JVtoceitin
Bacharel em Direito e licenciado em História pela UFPR
Pós-graduado em História da Arte pela PUC-PR
Mestre em Educação pela UFPR
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná
Professor do Ensino Médio

Rosiane de Camargo
Licenciada em História pela UFPR
Pós-graduada em História do Brasil
pela Faculdade Bagozzi [PRi
Professora do Ensino Fundamental e do Ensino Médio

4ediçâo, São Pauto, 2016

A do
Editora
v Brasil
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Mocellin, Renato
História em debate 3 / Renaco Mocellin, Rosiane de Camargo. -4. cd. - São Paulo:
Editora do Brasil, 2016. -. (Coleção história em debate; v. 3)

t3ibhogra fia.
ISBN 978-85.10-06167-4 (aluno)
ISBN 978-85-1 0-06 1 68-1 (professor)

1. História (Ensino médio) 1. Camargo, Rosiane de. II. Título. III. Série.

16-03359 (:D13-907

Índices para catálogo sistemático:


1, História: Ensino médio 907

Z) Editora do Brasil S.A., 2016

lodos os direitos reservados

Direção geral: Vicente Tortamano Avanso


Direção adjunta: Maria Lúcia Kerr Cavalcante de Queiroz

Diretoria editorial: Cibele Mendes Curto Santos


Gerência editorial: Felipe Ramos Pole:ti
Supervisão editorial: Erika Caldin
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Supervisão de direitos autorais: Marilisa Bertolone Mendes
Supervisão de controle de processos editoriais: Marta Dias Portero
Supervisão de revisão: Dora Helena Feres
Consultoria de iconografia: Tempo Composto Col. de Dados Ltda. Visitantes olham para a instalação Breatlung Room /1/
(Sala de Respiração III). de Antony Gormley, durante a
Coordenação editorial: Priscilla Cerencio exposição Test Sues, na White Cube Manson's Yard, Londres,
Edição: Leandro dos Reis Silva Inglaterra, 2010.
Assistência editorial: Andressa Pontinha, Mariana Tomadossi e Rogério Cantelli
Coordenação de revisão: Otacilio Palareti
Copidesque: Ricardo Liberal
Revisão: Ana Carla Ximenes, Alexandra Resende, Andreia Andrade,
Elaine Pares e Maria Alice Gonçalves
Coordenação de iconografia: Léo Burgos
Pesquisa iconográfica: Douglas Cometti e Odete Ernestina
Coordenação de arte: Maria Aparecida Alves
Assistência de arte: Samira Souza
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Capa: Maria Aparecida Alves
Imagem decapa: (c) Cortesia do artista. Fotografia: Chrisjackson/Getsy Images
Ilustrações: Christ:ane Messias, Cristiane Viana, Departamento de Arte e Editoração (DAE)
e Paula Radi

Produção cartográfica: Alessandro Passos da Costa, Departamento de Arte


e Editoração (DAE), Sonisi Vaz e Studio Caparroz
Coordenação de editoração eletrônica: Abdonildo José de Lima Santos
Editoração eletrônica: Adriana Albano e Adriana Tami
Licenciamentos de textos: Cinthya Utiyama,JenniferXavier, Paula Harue e
Renata Garbeilini

Coordenação de produção CPE: Leila P. Jungstcdt


Controle de processos editoriais: Beatriz Villanueva, Ltruna Alves,
Carlos Nunes e Rafael Machado

Editora 1 'Em respeito ao moo ambiente, as folhas

v
deste livro 10(301 produzidas com fibras

do Brasil obtidas de ãrvores de florestas plantadas,


cons origem certificada."

Rua Conselheiro Nbiax, 887- São Paulo/SP - CEP 01203001


Fone: (11)3226-0211 - Fax: (11)3222-5583
svww.editoradobrasil.com.br
CARTA AOS JOVENS ESTUDANTES

Somos bombardeados diariamente com centenas de informações. Elas são como ruídos que
nos chegam pelos sentidos e são processados pelo cérebro. Já pensou se todas elas ficassem retidas
na memória? Seríamos como supercomputadores. Mas como isso não é possível, nem necessário,
elas são filtradas e apenas as mais relevantes permanecem.
A disciplina de História é repleta de informações. Elas não são dadas somente para você me-
morizá-Las, mas também para que você possa refletir sobre elas, mudar sua vida e, consequente-
mente, a sociedade em que vive. Esta é a grande mágica da aprendizagem: transforma informações
em conhecimento.
Este livro, por meio da abordagem temática, suscita diversas reflexões. Não são priorizados
dados como nomes, datas e fatos, que podem ser descartados pelo cérebro por não serem significa-
tivos ou até mesmo podem ser acessados na internet e armazenados no computador.
Refletindo acerca dos temas propostos neste material, você será capaz de confrontar a reali-
dade que conhece com outros contextos ou desenvolver uma nova maneira de olhar para a mesma
questão. Nesse processo, poderá aplicar as novas informações históricas à sua realidade e modificá-
-la ou reconstruí-la.
Esperamos que esta coleção, um entre tantos recursos disponíveis de informação, possa
auxiliá-lo nesse caminho.
Que ele seja agradável e proveitoso!

Os autores
Organização do livro
Este livro é dividido
em dez capítulos. No
início de cada capítulo,
você encontrará un
grande imagem, qu
representa o assunt
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que será trabalhad .

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em seguida, e umz L
introdução que inspir . fi
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uma reflexão iniciaL. '

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O texto principal, desenvolvido de forma clara e Na seção Organizando ideias, em questões que
objetiva, começa sempre em uma nova página, envolvem análise e interpretação de textos e
facilitando sua localização nas aulas e no estudo imagens, são retomados conceitos e assuntos
em casa. desenvolvidos no livro.

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9I1*ÓOfl 0. 9909490.1 01013:3

Os principais conceitos são


aprofundados em quadros que
favorecem o estudo e a compreensão.
Viajando pela história Conhtitos udeotógcos CRI MA MI.VAIO 1 ITALIA?
Á secao Viajando As mulheres e os Jovens
no noz ismo
pela historia traz
os acontecimentos ...,:...
organizados -
cronologicamente
facilitando assim
a compreensao do
tema estudado 1 FASCISMO

..................................

Na seção Pausa para investigação há


atividades de pesquisa e análise de
temas cotidianos.

Aspectos culturais específicos, relacionados ao


assunto abordado no capítulo, são explorados na
seção Resgate cultural.

Novos tempos da cuLtura:


democracia e globatizacao

O Glossário, ao trazer
a explicação dos
termos em destaque,
amplia o vocabulário.
Debate interdisciplinar
A seção Debate
interdiscipLinar tro7 Estado de
urna temática tratada
no capítulo que dialogo OO Q7o
com outras disciplinas,
possibilitando a
VOCê relacionar

os diferentes
conhecimentos
escolares entre si.

4'-
-.,

Questões do Enem e dos


principais vestibutares
do país são encontradas
na seção Testando seus
conhecimentos.

Nas seções Para você


Ler, Para você assistir
e Para você navegar há
sugestões de livros, filmes
e sites relacionados aos
temas tratados no capítuLo.
1 Nações e nacionalismos .. .,,, .10

Nação: a ideia de pertencimento ....... .............................................................................................. .12


As ondas revolucionárias na Europa ................................................................................................. 15
A nacionalidade na América ......................................................................................................... 20
A construção da nação brasileira ...................................................................................................... 23

Nação e identidade 27

Debate interdisciplinar: Bandeira Nacional e patriotismo ......................................................... 28


Testando seus conhecimentos 30

2 Osregimestotatitários........................................................... ....... ........32


UUU
I Ototalitarismo ............................................................................................................................ 34

Ofascismo na Itália .................................................................................................................... 36

Onazismo na Alemanha .......................................................................................................... 42

Fascismo em Portugal e na Espanha.......... ........................................................................................ ..... 50


Ostalinismo .......................................................................................... 56

Debate interdisciplinar: Arte totalitária: estética a serviço do Estado ....................................... 58


Testando seus conhecimentos . 60

3 Século XX: a era da guerra total... ... .. .............. ........................... ............ ........................... ..... 62

Asguerras na história ............................................................................................................... 64

APrimeira Grande Guerra ..................................................................................................... 66


Segunda Guerra Mundial: a maior de todas ........................................................................................ 73

Os horrores das grandes guerras....... ........... . ...................................................................... 83

Lutas por liberdade............... 87


Debate interdisciplinar: Guerra ........ . ................ ................. .... ......... . ............. ..
biológica ............. 88
Testando seus conhecimentos .................................................................................................. 90

" 4 O autoritarismo no Brasil .................................................................................................... 92


Autoridade: quem manda e quem obedece .................................................................................. 94
.................................................................................................. 96
AEraVargas...
No poder das fardas: a Ditadura Militar ............................................................................................ 107
.................................. ...116
Debate interdisciplinar: O eLeitorado brasileiro ... ............................ ........
Testando seus conhecimentos ..................................................................................................... 118
5 A Guerra Fria e a Nova Ordem MundiaL .............................................................................. 120
A Guerra Fria e o direito à liberdade ..................................................................................... 122
A Doutrina Truman e o Plano Marshall....
................................................................................. 127
A corrida armamentista .......................................................................................... 129
As intervenções internacionais ................................................................................................... 136
Movimentos sociais e contracultura .............................................................................................. 145
OBrasil e a Guerra Fria, ............. . ..................... . ........................................................ .148
AGuerra Fria e os esportes ......................................................................................................... 151
O fim da Guerra Fria ...............................................
153
Debate interdisciplinar: A Guerra Fria e a corrida espacial ........................................156
Testando seus conhecimentos .......................................... 158

6 Redemocratizacão no BrasiL: o Longo caminho .................................................................... 160


Caminhos e descaminhos da abertura política ........................................................... 162
Pluripartidarismo e anistia: passos para a democracia ............................................................. 165
O grito dos brasileiros: 'Diretas Já!" ............................................................................... 170
Liberdade, abre as asas sobre nós ........................................................................................... 175
Heranças da ditadura . ............................................................................ 178
Debate interdisciplinar: O BrasiL e a inflação .............................................................. 180
Testando seus conhecimentos ......................................................... . 182

7 Conttitos regionais, fundamentaLismo reLigios


A criação do Estado de Israel
Os conflitos árabe-israelenses
A questão palestina
A Revolução Iraniana .. . ..
O fundamentalismo islâmico e os Estados Uni
A Primavera Árabe
Movimentos separatistas pelo mundo
Debate interdisciplinar: Estado de Israel
Testando seus conhecimentos ... . .
8 África contemporânea: desafios, dificuldades e avanços ..... 218
África: um continente em transformação ... .........................................................220
A África contemporânea .................................................................................... .221
Argélia .............................................................................................................. 225

Congo. . ..............................................................................................................227
SudãoeSudâodo Sul .....................................................................................................................229
Etiópia..................................................................................................................232
O Renascimento Africano ..... ..................................................................... 234
Debate interdisciplinar: Literatura e africanidade .............................................................. 236

Testando seus conhecimentos . 238

9 Cultura, informação e poder.. ............... ....... ............ ................................................. . . . .240


O poder e suas manifestações ......................................................................................................242
Cultura e poder ....................................................................... 245
Cultura e liberdade no Brasil na Ditadura Militar .......................................................................247
informação: direito aos saberes ................................................................................258
O poder na sociedade da informação .................................................... 260

Debate interdisciplinar: As redes sociais e a Linguagem da internet ..................................262

Testando seus conhecimentos 264

10 Direito à liberdade: o desafio da tolerância . .... ................................ .............


O desafio da tolerância
O desrespeito aos nativos brasileiros
Escravidão e racismo ....................................................................
A questão da liberdade religiosa . ..
Debate interdisciplinar: O direito à terra: a demarcação de terras indígenas

Testando seus conhecimentos .

Referências 286
- - - -- -- - - -

Certamente você já ouviu, em tempos de conjunto de pessoas que torcem pela Seleção
Copa do Mundo de Futebol, frases como: Brasileira.
nação brasileira está torcendo pela seleção"; Nesse conceito está impLícita uma rela-
ou, diante das vitórias: "Nossa nação está or- ção afetiva e subjetiva: a paixão pelo futebol
gulhosa do desempenho de seu time"; e nas e a torcida pelo time. A ideia de nação é algo
derrotas: 'A nação brasileira chora por essa que liga a todos. Assim, o que há de comum
derrota". Nesse contexto, nação significa o entre os torcedores que os torna uma nação
a
F4j é
MrJ A'
_
a

é torcer pelo mesmo time de futebol, por Neste capítuLo serão apresentadas ai-
exemplo. gumas questões sobre a construção dos
E o que há em comum entre os milhões conceitos de nação e nacionalismo, o sentido
de brasileiros que moram em várias partes de pertencimento a uma nação. Abordaremos
deste imenso território? A nacionalidade, ou também alguns aspectos históricos corres-
seja, o sentimento de pertencer a uma nação, pondentes à formação das nações tal como as
a brasileira. conhecemos hoje.
Nação: a ideia de pertencimento
Construção recente na história da
humanidade, o conceito de nação não
é único. Esse termo adquiriu sentido
político no final do século XVIII - cujo
marco foi a Revolução Francesa - e foi
amplamente divulgado no século XIX.
A palavra nação, por sua vez, não
surgiu com a Revolução Francesa. Ela
já era utilizada na Antiguidade (natio,
em latim) e significava "raça" ou "ser
nascido de". No Império Romano, por
exemplo, diferenciava e discriminava
os cidadãos (aqueles nascidos de pai
romano e que herdavam a cidadania)
dos demais habitantes.
Com seus ideais de liberdade e
igualdade, a Revolução Francesa esti-
mulou sentimentos de busca de gover- Lugene Oelacroix, A Liberdade guiando o povo. 1030. Oleo sobre tela, 3.25 m > 2,60 rn.
nos independentes e projetos de for- Em meio a um combate, uma mulher que simboliza a liberdade marcha segurando a bandeira
francesa tricolor. As lutas pela liberdade no século XIX foram movimentos em busca do direito de
mar o que hoje chamamos de nação. ter urna nação. Os artistas do periodo retrataram as mudanças e os sentimentos nacionalistas.

Nação é um conceito político que pode ser


De fato, a partir de 1789, a Europa, ainda entendido como uma organização de habitantes
aristocrática, começa a ouvir a palavra nação de
de um território com um único governo e onde es-
uma nova maneira. Uma nova forma de orga-
ses indivíduos compartilham um passado coleti-
nização política se desenvolve, trazendo junto
com ela a promissora expressão de liberdade. A vo e fazem projetos para um futuro em comum.
revolução permitiu que os homens deixassem O que une essas pessoas é a identificação étnica,
de se pensar como uma simples continuação cultural e histórica, assim como a identificação -
da terra e como propriedade de um senhor. A tanto geográfica quanto afetiva - com o lugar
ideia de cidadão teoricamente igual em direitos onde vivem. Dessa afinidade surgem laços que
e obrigações encontrou na Revolução Francesa
contribuem para a formação de uma teia de rela-
sua expressão política mais universal.
ções que unem grandes grupos de pessoas em tor-
Finalmente, o Estado, que se constituiu como
a representação de todos os cidadãos da nação, no de ideais comuns de pertencimento e vivência
apareceu como a forma de organização política política, social e cultural.
que acompanha a República nascente. [ ... ] A
partir deste momento, os homens deixam de
A RevoLução Francesa foi um movimento
ser indivíduos de um tal lugar e propriedade
político e social ocorrido no fim do século XVIII,
de tal senhor, para se transformarem em cida-
marcado pela revolta da burguesia contra os
dãos abstratamente iguais, membros de uma
privilégios do clero e da nobreza. Em 1789, em
república única e indivisível, representada pelo
meio a uma crise econômica, membros da bur-
Estado. E é a partir deste momento também que
guesia contaram com o apoio popular para pôr
todos eles compartilham um mesmo atributo: a
fim à monarquia absolutista do país e exigir a
nacionalidade.
instauração de um novo regime de governo,
RUBEN. t3uittermo Raút. O que é nacionalidade inspirado nas ideias iluministas pautadas pelos
São Pauto: Brasiliense, 1984. p. 25 ideais de 'liberdade, igualdade e fraternidade".

- 12
Fruto da própria vivência comum entre os Portanto, percebemos que, por mais múl-
indivíduos, a identidade nacional está acima das tiplos que sejam os aspectos culturais de uma
particularidades, unindo a todos e criando a iden- nação, a junção de outras facetas comuns da
tidade comum, ou seja, uma identidade aceita história, a vivência, os hábitos e os valores de uma
pelas pessoas de uma mesma comunidade. Assim, população podem ser utilizados para criar a ideia
quando alguém se reconhece como membro de de unidade e identidade nacional, que por sua vez
uma nação, mesmo que viva fora dos limites ter- não é estática nem definitiva. Assim como surge
ritoriais dela, seu sentimento de pertencimento a da união de vários elementos, pode ser alterada
esse agrupamento não se altera. As nações podem pela modificação, acréscimo ou decréscimo de
ter várias línguas e religiões, sem, contudo, deixar outros elementos.
de identificar-se como tal.

Organizando idf ias .. .

Leia o texto a seguir e faça o que se pede uma ordem jurídica e política homogênea. A nação
ergue-se sobre a consciência da unidade cultural
O termo país não significou sempre o que e do destino de um povo, expressa nos símbolos
significa hoje. De origem medieval, país designa- da pátria e apoiada na distinção entre o natural e
va apenas uma coletividade limitada, ou ainda, a o estrangeiro.
população de uma região, os habitantes ligados por O Estado nacional é objeto de paixão e compe-
vínculos sociais e culturais que compartilhavam um tição. As guerras constituem o ponto extremo da
ambiente. [ ... ] exaltação patriótica, mas as rivalidades entre os
Nessa época, o elo entre o povo e a terra natal Estados se reproduzem nas "guerras em miniatura"
era unicamente um elo prático. [ ... } proporcionadas pelas disputas esportivas inter-
Atualmente, o elo entre uma população e seu nacionais. A execução do hino e o hasteamento
território é essencialmente ideológico: trata-se da bandeira pontuam as Olimpíadas, Copas do
do patriotismo, que é a sensação de pertencer a Mundo, corridas automobilísticas, lutas de boxe,
determinada entidade social, política e geográfica
torneios e rjxad ri sti c os, campeonatos de basquete
à qual chamamos de país. [ ... ]
e vôlei etc.
O patriotismo só existe através de uma me-
diação simbólica. Identificamos o nosso país pela MAGNOLI, Demétrio. A União Europeia: história e geopolítica.
bandeira, pelo hino, pelas figuras dos heróis, pelos São Paulo: Moderna, 2000. p. 55.

contornos de suas fronteiras nos mapas, pela moe-


da. Em resumo: por um conjunto de convenções 1 Com suas palavras, conceitue "nação" e
que penetraram nas consciências ao longo de várias "nacionalismo".
gerações, até produzirem a impressão de ser parte
da própria natureza. O que a expressão "guerras em miniatura"
Mas essas convenções não são parte da natureza - significa para o autor do texto?
são frutos da história. Foram os últimos séculos que
geraram essas ideias. [ ... ]
A que o autor se refere como um "conjunto de
Estado e nação surgiram paralelamente como
convenções que penetraram nas consciências
dimensões interligadas de um mesmo processo his-
tórico. O Estado contemporâneo ergueu-se sobre a ao longo de várias gerações, até produzirem a
delimitação precisa do território e a imposição de impressão de ser parte da própria natureza"?

A6 ossai'io
Enxadrístico: referente à prática do jogo de xadrez.

13
A identidade nacional A promoção de cerimônias cívicas, a criação
de feriados nacionais, a construção de monumen-
A construção da identidade nacional se faz tos com homenagens aos heróis, o nome de ruas e
pela arte, literatura, história e música, além de mais uma infinidade de exemplos também são for-
tradições que criam mitos e heróis possíveis de mas de criar ou reforçar uma consciência nacional.
justificar um passado glorioso e forjar uma ideia O sentimento de pertencimento, ou seja, o senti-
de nação. Trata-se da criação de uma identidade mento nacional, não é inato, mas faz parte de um
cultural que une o povo e proporciona a ilusão de processo histórico.
uma harmonia em sua formação, como .
se houvesse uma unidade nacional.
A educação, a cultura e o patriotis- s#f
mo são formas de reforçar a consciência A .
nacional e os laços entre os cidadãos. r' '--• -•(•
- -•- . . -. - ....s
- - -- .. .. . a •'

Desfile no Sambódromo
Anhembi em comemoraçt
ao 7 de Setembro. o
em que se celebr.
Independência do Eras!
São Paulo (SP), 201S

Organizando ideias .
Leia o texto a seguir e faça o que se pede histórico, as tradições "inventadas" caracterizam-
A invenção das tradições -se por estabelecer com ele uma continuidade bas-
tante artificial. Em poucas palavras, elas são reações
O termo "tradição inventada" é utilizado num a situações anteriores, ou estabelecem seu próprio
sentido amplo, mas nunca mdelmido. Inclui tanto passado através da repetição quase que obrigatória.
as "tradições" realmente inventadas, construídas
e formalmente institucionalizadas, quanto as que HOBSBAWM, Eric: RANGER, Terence, A invenção das
tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2012. p. 9-10.
surgiram de maneira mais difícil de localizar num
período limitado e determinado de tempo - às 'e-
zes coisa de poucos anos apenas - e se estabelece- O que é tradição inventada', segundo os
ram com enorme rapidez. [ ... ] autores, e como ela é criada?
Por "tradição inventada" entende-se um con-
junto de práticas, normalmente reguladas por re- Faça uma pesquisa e reflita sobre as tradi-
gras .ou abertamente aceitas; tais práticas, de ções de sua cidade ou estado. Dê exemplos
natureza ritual ou simbólica, visam rci certos
de algumas delas que se encaixem na defi-
valores e normas de comportamento através da
repetição, o que implica, automaticamente, uma nição de "tradição inventada".
continuidade em relação ao passado. Aliás, sem-
pre que possível, tenta-se estabelecer continuidade De que maneira as "tradições inventadas' se
com um passado histórico apropriado. [ ... ] Contu- relacionam com a criação de uma identidade
do, na medida em que há referência a um passado nacional? Justifique sua resposta.

A
Incutcar: gravar ou imprimir (algo) na consciência de alguém; repetir algo seguidamente.
Tácito: que não se revela, oculto.

14 1
As ondas revoLucionárias na Europa
Um dos princípios disseminados pela Re- Entre 1820 e 1848 ocorreram grandes revolu-
volução Francesa era que a soberania provinha ções, que culminaram na reformulação dos ideais
da nação, no sentido de "todo o povo". Dessa de nação. Entre elas podemos citar a onda de in-
forma, o Estado deveria ser a incorporação da dependências das colônias europeias - em especial
vontade do povo. Essa ideia desagradava às mo- as colônias na América-, a eclosão do movimento
narquias europeias, que, entre 1814 e 1815, reu- operário na Grã-Bretanha, de movimentos reivindi-
niram-se no Congresso de Viena com o objetivo catórios no oeste da Rússia e na América do Norte
de firmar acordos de paz, reorganizar as frontei- e da Primavera dos Povos. Apesar de terem sido
ras europeias, restabelecer o equilíbrio entre as reprimidas, essas iniciativas foram responsáveis
nações e reafirmar o domínio das monarquias pelo início da discussão a respeito da identidade
absolutistas. Nesse cenário, foi estabelecido que nacional nas colônias, impulsionadas pela busca
todo movimento popular que ameaçasse o pode- aos ideais de liberdade das populações.
rio dos monarcas deveria ser reprimido.
No entanto, essa ação não conseguiu conter Primavera dos Povos foi o nome dado às
os movimentos revolucionários do século XIX. Os revoluções ocorridas em 1848 na Europa com o
movimentos das primeiras décadas desse século objetivo de derrubar os governos absolutistas do
eram liberais e nacionalistas: liberais porque pro- continente. As manifestações começaram como
uma reação às medidas adotadas no Congresso
curavam romper com os grandes privilégios dos
de Viena, culminando em movimentos de resis-
monarcas e implantar regimes constitucionais
tência pautados em preceitos socialistas.
que garantissem a liberdade; e nacionalistas por-
que apoiavam-se na ideia de valorização dos inte-
resses da nação, formada pela
união dos cidadãos
Ç
NORSIL
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SUÉCIA«
A ideologia nacionalista, MARRO b.
R1ON
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NORTE - BÁLTIC
decerto, é bem anterior ao o
século XIX. Mas foi duran-
IMPERIO
te esse período que a Nação RUSSO -.
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passou a ser tomada como -

tema de análise e de reflexão, 1 + 10RO,en


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1 66 AUSTRIACO
e que foi erigida em argu-
AT T1COs 8dpe,t, 4Ç
mento destinado a justificar RRANA

um tipo de poder. É difícil 1 /30 900000 re fOO vQ-

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distinguir, nela, o que per- 6.0

tence à concepção política e


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que resulta do espírito da REIN
ESPAIIHA MONHA .'
época, expresso nas obras li- P A0060L ápoIA

terárias e nos sentimentos e 1 1 REINO 040 \ . ROI5OOP..

/
/
MAPMEO;TERPA NEO
DUUJSROLJA r --
-s.-- - -
movimentos populares. /
•'

/ÁMICA :.
CHÂTELET, François. História das
ideias poLíticas. Rio de Janeiro: FoNe- VICENTINO, Cltid:o. Atlas
Zahar, 1997. p. 96. Principais focos de insurreição das revoluções de 1848 histórico: qeral e Brasil. Súo Paulo:
Manifestações cartistas inglesas Sopione. 2011.1). 131.
Revolução Húngara de 1848 a 1849
- Limite da Confederação Germânica

Nacôce e n3ciona1ism 15
Tem havido um bom número de grandes re- so, 1848 foi a primeira revolução potencialmente
voluções na história do inundo moderno [...J. Mas global, cuja influência direta pode ser detectada
nunca houve uma que tivesse se espalhado tão rápi- na insurreição de 1848 em I'ernambuco (Brasil) e,
da e amplamente, alastrando-se como fogo na pa- poucos anos depois, na remota Colômbia. [... 1 Foi,
lha por sobre fronteiras, países e mesmo oceanos. ao mesmo tempo, a mais ampla e a menos bem-
Na França 1...j a república foi proclamada em 24 de -sucedida revolução desse tipo. No breve período
fevereiro. Em 2 de março, a revolução havia ganha- de seis meses de sua explosão, sua derrota universal
do o Sudoeste alemão; em 6 de março. a Bavária; era seguramente previsível; 18 meses depois, todos
em 11 de março, Berlim; em 13 de março, Viena, e os regimes que derrubara, com exceção de um, fo-
quase imediatamente a Hungria; em 18 de março, ram restaurados, e após 18 meses de sua irrupção,
Milão, e, portanto, a Itália. [ ... ] Em poucas sema- com a exceção da República Francesa, estava mnan-
nas, nenhum governo ficou de pé em uma área da tendo toda a distância possível entre si mesma e a
Europa que hoje é ocupada completa ou parcial- revolução à qual devia sua própria existência.
mente por dez Estados, sem contar as repercussões
HOBSBAWM, Eric. A Era do Capital: 1848-1875. São Pauto:
menores em um bom número de outros. Além dis-
PazeTerra, 2011. p. 32-33.

Organizando ideias
Leia os textos a seguir e responda às questões foram abolidos na Áustria e nos Estados alemães;
Texto 1 e parlamnentos, dominados, é certo, por príncipes
e aristocratas, foram estabelecidos na Prússia e em
[ ... ] Evitar uma segunda Revolução France-
outros Estados alemães. Nas décadas seguintes as
sa [... foi o objetivo supremo de todas as potências
reformas liberais se tornariam mais difundidas.
que tinharn gasto mais de vinte anos para derrotar
Essas reformas foram introduzidas pacificamente,
a primeira [_1. E, ainda assim, nunca na história da
poiso fracasso das revoluções de 184$ convenceu a
Europa e poucas vezes em qualquer outro lugar, o
muitos, inclusive os liberais, de que levantes popu-
revolucionarismo foi tão .. " L., tão geral, tão ca-
lares eram caminhos ineficazes para a modificação
paz de espalhar por propaganda deliberada como por
da sociedade. A era das revoluções, iniciada pela
contágio espontâneo.
Revolução Francesa de 1789, tinha terminado.
HOBSBAWM, Eric. AEra das Revoluções. 1789-1848.
SãoPauio: Paz e Terra, 2011. p. 183-184. PERRY. Marvin. As revoluções de 1848: uma avaliação.
In: . Civilização ocidental: uma história concisa.
São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 408.
Texto 2
Antes de 1848, os democratas idealistas ante- Por que as nações europeias tinham receio de
viam o nascimento de uma nova Europa, de pessoas
que, no início do século XIX, acontecesse uma
livres e nações emancipadas. As revoluções na Euro-
revolução nos moldes da Revolução Francesa?
pa central mostraram que o nacionalismo e o libera-
lismo não eram aliados naturais, que os nacionalis- Qual é o significado da última frase do texto 1?
tas eram frequentemente indiferentes aos direitos de
outros povos. [ ... ] Por que o autor do texto 2 afirma que a era
Os propósitos liberais e nacionalistas dos re- das revoluções, iniciada em 1789, terminou
volucionrios não foram realizados, mas os ganhos em 1848?
liberais não foram insignificantes. Todos os ho-
Atualmente os movimentos nacionalistas
mens franceses obtiveram o direito de voto; os
serviços prestados pelos camponeses aos senhores ainda são indiferentes aos direitos de outros
povos? Explique.

Endêmico: específico de determinada região ou população.


2 Viajando pela história
Itália e Alemanha: a formação dos Estados-Nações
Entre os séculos XIV e XVI, em diversas regiões Para Mazzini, a Península Itálica, apesar de com-
da Europa o poder foi centralizado. Essa centra- partilhar a língua, as crenças e os costumes - o
lização deu origem às monarquias absolutistas e que evidenciava a raiz e os ancestrais comuns de
aos Estados nacionais modernos. Uma das bases seus habitantes -, não tinha bandeira nem nome
da formação desses Estados foi a unidade territo- político, ou seja, estava desmembrada, não ti-
rial. Porém, até meados do século XIX, duas regiões nha os símbolos de unificação de um Estado-
da Europa não estavam unificadas: a Península Itá- -Nação, e essa situação precisava ser modificada
lica e a região denominada Antigo Império Roma- para que a Itália pudesse figurar entre as nações
no-Germânico. No decorrer do século XIX, a onda europeias.
de nacionalismo atingiu essas regiões promoven- Os defensores da unificação italiana fizeram
do mudanças e unificação política, o que resul- inúmeros protestos contra a divisão do território,
tou em duas novas nações. principal deles em 1848, quando as forças con-
trárias à unificação promoveram uma grande ma-
A unificação da Itália nifestação local. Apesar da pesada repressão por
parte das tropas austríacas, o evento serviu para
Após o Congresso de Viena, a Itália estava
impulsionar os ideais nacionalistas na Itália.
fragmentada em vários Estados independentes
O processo de unificação começou no Reino
entre si.
Sardo-Piemontês, dominado pela Áustria. Com o
Entre 1815 e 1870, ocorreu o movimento co-
ingresso da burguesia industrial do norte da Itá-
nhecido como Risorgimento, que, reunindo diversas
lia, patrocinada pelo primeiro-ministro piemon-
correntes ideológicas - de socialistas a nacionalistas-,
tês Camilo Benso di Cavour, o conde de Cavour,
buscava unificar os Estados independentes da Itália.
processo de unificação ganhou contornos mais
sólidos. O conde angariou apoio militar e político
de seus Estados vizinhos e de Napoleão III, rei da
França, iniciando assim a guerra contra a Áustria.
Na luta contra a Áustria, os revoltosos con-
seguiram, em 1859, anexar o Reino Sardo-Pie-
montês e os territórios da Lombardia, da Tosca-
na, de Parma e de Módena.
No sul da Itália, Cavour teve o apoio de Giu-
seppe GaribaLdi, que conseguiu reunir um exército
de voluntários conhecido como os "camisas-verme-
lhas". Com a ajuda deles, ocupou e anexou as Duas
À
Sicílias. Assim, a região sul foi incorporada ao territó-
rio italiano.

. xiJio;
Giuseppe GaribaLdi participou das revoluções
1848, c. 1849. Oleo sobre tela. 85cm x 82 em.
liberais de 1830 e 1848 e, no Brasil. da Revolu-
ço Farroupilha (1835-1845). Em Santa Catarina,
A iniciativa ganhou força, influenciada pelos
uniu-se a Anita Maria de Jesus Ribeiro, que se-
ideais da organização revolucionária jovem Itália, guiu com ele para a Itália e entrou para a histó-
que, sob a liderança de Giuseppe Mazzini, defen- ria como a heroína de dois mundos, passando
dia a independência do território italiano e sua a ser conhecida como Anita Garibaldi.
transformação em uma república democrática.

17
No final de 1860, a Itália já estava quase to- Ainda hoje podem ser identificadas grandes
talmente unificada sob a Dinastia Savoia. Falta- diferenças linguísticas, culturais e de cunho histó-
vam ainda Veneza (em poder da Áustria) e Roma rico, que representaram um entrave na consolida-
(em poder da Igreja Católica), anexadas respecti- ção de uma identidade cultural italiana comum.
vamente em 1 866 e 1870. Esta última tornou-se a
capital da nação italiana.
A Questão Romana foi um conflito entre o
A perda dos domínios territoriais da Igreja
Papado e a Itália devido à tomada dos Estados
Católica gerou rompimento entre ela e o governo
Pontifícios pelo governo no processo de unifi-
italiano, pois o papa Pio IX não aceitou essa nova
cação do país. Essa questão levou ao corte de
situação e considerou-se prisioneiro em um Esta- relações entre as duas partes quando as tro-
do "laico", fechando-se no Vaticano. Assim teve pas de Vítor Manuel II entraram em Roma e
início a Questão Romana, resolvida apenas em ele se instalou no palácio pontifício do Quiri-
1929, quando o então ditador Benito Mussolini nal (1870). O conflito perdurou até 1929, após
e o papa Pio Xl assinaram o Tratado de Latrão. passar pelos pontificados de Pio IX, Leào XIII,
Com esse documento, o governo italiano reco- São Pio X e Bento XV, resolvendo-se apenas
com o Tratado de Latráo, assinado em 11 de
nheceu a Soberania da Santa Sé (Igreja Católica)
fevereiro do mesmo ano.
sobre o Vaticano, declarado Estado soberano.
Após a unificação, a Itália enfrentou problemas
econômicos, sociais e políticos causados por rivali-
dades entre o norte, industrializado, e o sul, agrário,
além do aumento do banditismo organizado, repre-
A unificação alemã
sentado pela máfia. Por causa dela, muitos italianos Após o Congresso de Viena, a Alemanha era
deixaram o país e emigraram para a América. uma confederação de 38 Estados independentes,
dos quais se destacavam a Áustria e a Prússia.
A Áustria era economicamente forte graças
IRhN1IN0—_ a seu setor agrícola, já a Prússia tinha grandes
Trenro 'Udine'. interesses na unificação política, pois visava ao
o
SAvOlA
TuomIN
MdSo
OMBARDI
7' VENËCPAJTRIA
T Te i desenvolvimento econômico da região. Em 1834,
Ve,ona Veu
A. a Prússia deu um passo importante nesse senti-
PIEMI)NTE

do, criando uma união aduaneira, a Zoliverein,


que abolia as taxas alfandegárias entre os diver-
IOSCANA
sos Estados alemães. Essa solução impulsionou
crescimento industrial, promoveu a integração
econômica e, ainda, foi um passo importante no
s \POIO caminho para a integração política. A Áustria fi-
Ç.
-
cou de fora desse acordo.
ROENHA
Nesse período, as ideias de unificação eram
i difundidas amplamente tanto por nacionalistas
'
1 14400000 P4 /
— que almejavam uma unidade étnica e cultural,
''.SlCíLlA
já que falavam o mesmo idioma - quanto por
Ç
e empresários e industriais, que a viam como algo
necessário para a promoção do desenvolvimento
Reino do Sardenha-Piemoose Anexaçào es, 1866
(18591
- Terr,na anexado oro 1870
econômico.
Anenaçúns de 18591806,
decorrentes da guerra contra a AusIna -
Terroorr os preteodrdos pela
Temtorros Cedrdos à Fsonç, 11db, e só anexados em 1919
11860)
Terrônios incorporadas em 1061 —* Campanha de Gar,baldi União aduaneira constitui-se em uma área
em rae0o das campanhas de
Garrbaldr e de tropas piomooresas -+ Componho do tropas do Promonto de livre-comércio, sem barreiras internas e
Fonte; ARRUDA Ucbe Jni:-scn ii; A Atlas histórico bstco. 17
com tarifa externa comum.
S.e Pau,c
2011.p. 26.

18
A partir de 1860, a Prússia passou a
se engajar cada vez mais no processo de o
DINAMARC, SUÉCIA 1/
unificação, que ganhou força maior após a
Mar SAlbco
nomeação de Otto von Bismarck, defensor
SCHLESWIO - - , -
dessa causa, para primeiro-ministro. HOLS1EÓI
PÚSSIA
POMERA\I4 ORIENTAL
MECRostock
Em 1864, Prússia e Áustria entraram 16 rrbyg
KEMBIJRG
AL
OCtOENrAL
em guerra contra a Dinamarca para recu-
8
ASIS J r 'HANOVER .
RUSSIA

perar as províncias de Schleswig e Holstein, 8RANDEMBURGO

perdidas durante o Congresso de Viena. VÉSTEEÂIIA . TOJIIINGIA SA.x


HUN
POLÓNIA
O
' ti o
SILESIA
Bismarck usou a força militartambém contra 8818

a Austria, em 1866, e criou a Confederação


Alemã do Norte, que reunia todos os Estados EIAVIERA
O HUNGRIA
ERA NÇA
situados ao norte do Rio Reno e cujo centro
era o governo da Prússia. AIJSTRI\ O 147 294km

Em 1870, houve ainda um terceiro SUIÇA -.,. - 1:14700000

conflito, então contra a França, motivado -- Fronte,,, do moA,,, Serrnànrcr, em 1871 [- IncolpOraçân co, 1066

- - - Fronit,rs II, Conle'Ieraç8o GumámC3


por desentendimentos sobre a sucessão do doldonc co, 1615 [jJ o,nmS Est,4o, do ConledomçUo Se mAnco do NoR, em 967

P,úso,, em 1815 Ordens Esindor germãorcoo gin 1666


reino espanhol, entre os reis Guilherme 1, da
Fot s: L.CK, Jromy World history atlas L. cres Dor-: K cers. 20:8. L6-47.
Prússia, e Napoleão III, da França. A guerra
de A . f\tlis hlstorcobasco L' 1 rP1ito .,l, o
entre franceses e prussianos durou até 1871. Os
prussianos avançaram com suas tropas sobre
território francês e capturaram seu imperador, ga- Em 1871, Guilherme 1 foi proclamado kaiser
rantindo a vitória. Durante o conflito, formou-se um (imperador) da Alemanha. Com isso a Alemanha
governo provisório de resistência, constituído pelas tornou-se uma grande potência econômica e pas-
camadas populares e operárias francesas - a Comu- sou a lutar por algumas regiões coloniais até então
na de Paris -, que, apesar da tentativa de impedir o dominadas pela França e pela Inglaterra, acirrando
controle prussiano, foi reprimido pelos vencedores. ainda mais asjá existentes disputas.

I!MIl ':1i1i nt:flti-


Em dupla, leiam o texto sobre a anexação das princípio pelo qual as fronteiras das nações devem
regiões francesas da Alsácia e da Lorena pelos ser fixadas? [ ... ] Se os limites tiverem de ser fixados por
alemães. Depois, respondam às questões. interesses militares, as reclamações não terão fim, pois
toda linha militar é necessariamente defeituosa [...1
[ ... ] Não ousam afirmar que o povo da Alsácia e da além disso, limites jamais podem ser fixados de modo
Lorena anseia pelo abraço alemão; muito pelo contrário. definitivo e justo, pois têm sempre de ser impostos ao
A fim de punir o seu patriotismo francês, a cidade de Es- conquistado pelo conquistador e, por conseguinte, car-
trasburgo [ ... ] foi brutal e barbaramente bombardeada, regam consigo a semente de novas guerras.
durante seis dias, por granadas "alemãs" que a incen-
MARX, Karl. A guerra civt na França.
diaram totalmente e mataram um grande número de
São Pauto: Boitempo, 2011. p. 28-29.
seus indefesos habitantes! Ora, o solo dessas províncias
pertenceu, em um passado remoto, ao antigo Império Quais são as questões ironizadas por Marx no
Alemão. Sendo assim, o solo e os seres humanos que primeiro parágrafo?
sobre ele cresceram devem ser confiscados corno pro-
Para Marx, quais são os interesses que esta-
priedade alemã [ ... J. Os sabichões patriotas, entretanto,
riam por trás das delimitações de fronteiras
exigem a Alsácia e a parte germanófona da Lorena como
uma "garantia material contra a agressão francesa. entre os países?
Marx se posiciona favoravelmente ou critica
Mas, sinceramente, não é uma completa absurdida- princípios usados pela Alemanha para a
de e um anacronismo fazer das considerações militares delimitação das fronteiras? Justifiquem.

19
A nacionalidade na América
No continente americano, o século XIX ficou Na América Latina, as recém-independentes
marcado pelos movimentos de independência. repúblicas procuravam unificar-se e formar novas
As potências europeias foram perdendo suas co- nações, pois não bastava definir as fronteiras -
lônias na América como reflexo da disseminação era necessário construir a nacionalidade.
das ideias liberais da Revolução Francesa. De modo geral, a formação da nacionalida-
de na América Latina ocorreu por um processo di-
rigido por uma minoria aristocrática, que, depois
A especificidade do Brasil, que se manteve
de ascender ao poder com a independência, ga-
como a única monarquia em meio às repúblicas
criadas pela independência nas Américas, indi- rantiu legitimidade à população daquele territó-
ca as trajetórias diversas seguidas pelas colônias rio e conferiu-lhe a nacionalidade. Em outras pa-
americanas em sua transição para Estados inde- lavras, ela foi constituída pela delimitação de um
pendentes. Elas indubitavelmente compartilham território e a composição de um Estado dirigente.
de algumas características comuns importantes Entretanto, esse Estado dirigente era forma-
que as vinculam num processo que varreu o do por donos das terras e grandes mercadores,
mundo atlântico: todas nasceram no contexto de
que estavam mais ligados à economia externa e a
guerras entre potências coloniais; todas estavam
seus próprios interesses do que propriamente aos
relacionadas a reformas políticas que incitaram a
oposição colonial aos governos das metrópoles; habitantes das nações recém-formadas, o que
todas surgiram de crises políticas e constitucio- gerou pobreza para a maior parte da população e
nais que incitaram o descontentamento com a deficiências na estrutura interna.
distribuição do poder; todas se inspiraram em
ideias sobre direitos individuais e soberania po-
pular que, induzidas pela Revolução America-
na, encontraram nova forma de se expressar na
França revolucionária, e, combinadas ao pensa-
mento e método revolucionário francês, forne-
ceram inspiração e instituições para a revolução
política nas colônias da América Latina.
[...
A crise colonial em todos esses impérios estava
associada ao conflito instalado na Europa, com a
disseminação de novas noções de direitos naturais
e constitucionais e com o fracasso das metrópoles
em criar Constituições imperiais capazes de inte-
grar as colônias em termos igualitários. As revo-
luções políticas produziram resultados bem dife-
rentes, porém, já que o novo conceito de direito
à "vida, à liberdade e à busca da felicidade" foi iii-
troduzido em contextos culturais muito distintos.
MALERE3A, Jurandir lOrg.1. A independência brasiLeira:
novas dimensões. Rio de Janeiro: Editora rcv, 2006.
p.08e415.

Para as ex-colônias o primeiro passo estava


dado: a libertação em relação às metrópoles ga- Carmelo f-eírsindez. Notáveis da capital, Provincia de Santander,
Colômbia. c.1850-1859.Aquarela. Na América as elites controlavam
rantia o domínio de cada território por um gover- a maior parte do poder econômico, possuíam grandes propriedades
no local. Iniciava-se aí a construção das nações e dominavam as negociações comerciais, além de terem acesso à
eciucaçáo e às principais noticias vindas da Europa.
ame ri canas.

20
Os reflexos desse tipo de administração ain- Na América do Norte, a construção do es-
da estão presentes em muitas economias latino- paço nacional iniciou-se com a independência
-americanas. Portanto, a formação dos Estados das Treze Colônias, em 1776. Depois, por meio
nacionais latino-americanos se deu pelo viés da do Tratado de Paris (1783), o Reino Unido cedeu
dependência econômica, primeiro da Inglaterra, aos Estados Unidos os territórios a noroeste, e as
que apoiou as guerras de independência, e depois outras regiões foram sendo gradativamente ane-
dos Estados Unidos. xadas pela com pra, cessão ou conquista. No oes-
te, a Guerra de Secessão (1861-1865) entre os es-
tados do norte e do sul intensificou o processo de
A constituição da nacionalidade abriu seu
conquista das terras até então ocupadas por indí-
caminho a golpes de baionetas, demarcando
genas e pequenos produtores rurais. A chamada
territórios e populações que se incorporaram
a uma sociedade já dividida em classes sociais. Marcha para o Oeste, concluída em 1890, pos-
Às populações nativas se somaram os chamados sibilitou a ampla formação territorial dos Estados
povos exportados. Estes povos vinham da África Unidos da América.
negra e eram constituídos pelos escravos recém- Após a consolidação do território, os
-libertados e um grande contingente migratório, Estados Unidos, que vinham de um processo de
que tinha sido expulso da Europa e, entre 1870 e crescimento econômico, ingressaram no seleto
1914, foram incorporados nos diferentes países
grupo das potências econômicas. Depois da
da América Latina. [...1
Primeira Guerra Mundial, saíram ainda mais for-
RUBEN, Guiltermo RaúL O que é nacionaLidade. talecidos, assumindo um papel de liderança na
São Pauto: Brasiliense. 1984. p. 33-34.
economia mundial.

1 -
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MÉXICO
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OCEANO 392 784km
O
PACÍFICO
TEXAS .
Os uese estados originais,
antigas colônias inglesas
)LÓRIIda
Entadosadmitidos na Uniõo
de 1790a 1821

Golfo do México de 1821 a 1865


de 1865a 1914

J depois de 1914

Fonle: DUBY Gcnrçjcs Dir.). Atlas hist&ico mundial. 3. cd Borceona LroI,ssr E:lcral. 2W 1.). 251

Pausa para investigação . . .


Em grupo, pesquisem como se estruturaram as nações latino-americanas no período pós-inde-
pendência e procurem analisar de que maneira os reflexos desse processo perduram na atualidade.

21
patriótico e suas relações comerciais, sociais e
O nascimento e os culturais com os outros países.
renascimentos do O Dia da independência dos Estados Unidos

4 de julho é um feriado nacional, marcado por inúmeras


exibições patrióticas. É bastante comum, nesse
Dificilmente sabemos de cor a data da inde- dia, políticos fazerem aparições públicas para
pendência de outros países que não o nosso, elogiar a nação, as leis, resgatar a história do
mas o dia 4 de julho é peculiar, tendo em vista país e valorizar as melhorias sociais.
que se comemora o aniversário da primeira Para comemorar a data, é comum as fa-
independência e da primeira democracia no mílias se reunirem para um churrasco ou
Novo Mundo: os Estados Unidos da América. piquenique, decorarem suas casas com as
Para os estadunidenses, a independência cores da bandeira americana Ivermelha, bran-
está diretamente relacionada à formação da na- ca e azul), participarem de desfiles de manhã
ção, extremamente valorizada pelos cidadãos. e assistirem à exibição de fogos de artifício
A origem dessa lógica está ligada à Revolução à noite. Esses são costumes marcantes na
Americana, pautada nos preceitos do iluminis- cultura estadunidense.
mo e do liberalismo, considerada a primeira
reação colonial bem-sucedida da América e
uma das primeiras revoluções burguesas do
século XVIII.
Os Estados Unidos da América surgiram da
participação intensa da população, constituindo
um Estado democrático moderno e liberalista
cuja missão deveria ser defender os interesses
de seus cidadãos. Esse engajamento desde
a formação da nação fez toda a diferença na
construção da identidade nacional e em como
os estadunidenses vivenciam seu nacionalismo
'• •J

ji1íiÇ,O Cl) L)id 00 i iii0iiiCI0 OOS :i; COO üjiC Ciii


frente ao prédio do Arquivo Nacional, Washington, DC., em 4 de julho
de 2014.

Após analisar como os estadunidenses


comemoram o nascimento da nação norte-
-americana, faça o que se pede.

Em todos os países do mundo há datas co-


memorativas relacionadas à nação. Faça um
levantamento dos feriados nacionais no Brasil
e da origem de cada um deles.

Pesquise de que forma nós, brasileiros,


celebramos o feriado da Independência do
Fosta familiar iorte-americana em comemoração ao Dia da Brasil e levante hipóteses sobre por que
independéncia dos Estados Unidos.
nossa cultura comemora dessa maneira.

22
A construção da nação brasiLeira
Antes de o Brasil se tornar independente, a mudar no contexto de lutas contra o inimigo
em 1822, não havia unidade territorial na co- estrangeiro, mais precisamente na Guerra do
lônia. Havia, sim, vários núcleos coloniais sem Paraguai (1864-1 870). Durante a guerra e após
unidade política e econômica. Alguns deles, in- as primeiras vitórias em batalhas, alguns símbo-
clusive, chegavam a se comunicar diretamente los que demonstram sentimento cívico come-
com a metrópole, em Lisboa, sem qualquer liga- çaram a ser mais divulgados, como a Bandeira
ção com a sede administrativa da colônia no Rio Nacional, que passou a ser veiculada na impren-
de Janeiro. Após a independência foram dados os sa como símbolo da pátria, e o Hino Nacional,
primeiros passos para a formação da nação, ini-
ciada pela unificação do território.
Não havia um sentimento claro de pátria na Apesar de estarem relacionados a um mes-
colônia portuguesa, uma identidade nacionaL E essa mo conjunto de ideias, que diz respeito à noção
de pertencimento a uma nação, os conceitos de
situação não mudou pela instituição do império.
pátria, patriotismo e identidade nacionaL dife-
Esse fato fica bastante evidente quando estudamos
rem entre si.
as revoltas que ocorreram no Período Regencial No que tange à ideia de nação, a pátria é
(1831-1 840), como a Sabinada (na Bahia), a Ca- identificada como a terra natal, o país no qual
banagem (no Pará) e a Farroupilha (no Rio Grande se permanece como cidadão e, na maioria dos
do Sul), nas quais prevaleceu o que pode ser deno- casos, o lugar onde se nasce. Sendo assim, o
minado de patriotismo provincial, pois todas elas patriotismo pode ser identificado como a devo-
decorriam da luta pelos interesses das províncias e ção e a defesa exacerbada da pátria e dos ele-
mentos e ela relacionados.
não em benefício do Brasil como um todo unificado.
Nesse contexto, a noção de identidade na-
Quanto aos sentimentos de patriotismo e
cional refere-se ao conjunto de sentimentos e
civismo - relacionados, sobretudo o segundo,
laços responsáveis pelo fato de um indivíduo
à ideia de dedicação e fidelidade ao interesse sentir-se parte integrante de uma nação.
público de uma nação -, a situação principiou

U.-•

Oscar Pereira da SHva. Desembarque de Cabral em Porto Se9uro em 1500. 1922. Oleo sobre tela, 3,3 m x 1.9 m.

r: 1 23
então executado com mais frequência. E foi airl-
da nesse momento que se criaram os primeiros
heróis nacionais. Afinal, a identidade de uma IIISTORIA GERAL 110 BRAZIL
nação se faz não só pela união de um território
ou por um Estado forte e centralizado mas tam- 4od.wob,imfl,I,,CM4b,3ço,Iedw&o,4tKTÀITImtDtÕdCt*éCStSO.h*
niIa 0k1,,NkI,Ie, c•€flpIa li! ,npitG, ,iO,uflkttøt alt,liecs
d II,ib,b.
bém por uma memória comum, uma história, ,,,,ih id, o, fl,,,ii, d, I',rux. 1,

que forma a memória nacional.

A memória nacional é feita sistematicamen-


te a partir de uma série de instituições, da escola
aos arquivos, passando pelas festas e pelos monu-
mentos de comemoração. Da mesma natureza,
mas de alcance mais limitado, são as memórias de :

partidos ou de sindicatos. Não é porque aparecem


raramente nas conversas orais que elas deixam de
condicionar os comportamentos. Elas não dei-
xam, aliás, de parecer com as memórias coletivas
f ..
"orais"; elas simplificam, esquecem, organizam-
-se em torno de acontecimentos fundadores [ ... J. /

BURGUIERE, André. Dicionário das ciências históricas.


I)QdiItOi>
Rio de Janeiro: Imago. 1993. p. 628.

Quanto às artes, no Brasil Império foram Capa do livro História geral do Brasil, deAdolphoVarnhagen. 1854

pintados quadros que representavam as batalhas


e o heroísmo nacional; até mesmo algumas charges
já o Arquivo Público do Império tinha como
do período, publicadas na revista Semana Ilustra-
função recolher e preservar os documentos públi-
da, abordaram o patriotismo. E, ainda, poesias
cos para criar uma história documental da nação,
e canções popu lares foram escritas, recheadas de
ou seja, uma história científica. É preciso levar
declarações de amor à pátria. Vale ressaltar que
em conta que, até recentemente, apenas os do-
esse foi um dos momentos mais significativos,
cumentos escritos e oficiais eram considerados
durante o império, no que se refere à formação de
válidos para os estudos da História. Hoje, a rea-
uma identidade nacional.
lidade é outra: dispomos de documentos visuais,
Duas instituições, criadas em 1838, também
audiovisuais, sonoros, da cultura material, enfim,
foram muito importantes na construção da memória
de uma gama de fontes para estudá-la.
da nação brasileira: o Instituto Histórico e Geográfico
Outro instituto que contribuiu para a cons-
Brasileiro (IHGB) e o Arquivo Público do Império.
trução da identidade nacional foi a Academia
O IHGB ficou responsável por promover a Imperial de Belas Artes, por meio da chamada pin-
escrita da história do país. Em 1840, Januário da tura histórica. Com obras produzidas entre 1850
Cunha Barbosa propôs que a instituição premiasse e 1880, procurou valorizar o passado heroico da
com uma medalha de ouro aquele que elaborasse nação brasileira. Pintores como Victor Meirelles,
um plano de como escrever o que denominaram autor de A primeira missa no Brasil, Oscar Silva,
de História antiga e moderna do Brasil. Em 1847, a de Desembarque de Cabral em Porto Seguro em
comissão do concurso escolheu o texto "Como se 1500, e Pedro Américo, com o célebre Indepen-
deve escrever a história do Brasil", de Karl Friedrich dência ou morte, fizeram parte desse instituto,
Phillipp von Martius. Seguindo as sugestões deste, contribuindo com essas e outras pinturas para a
Francisco Adolpho Varnhagen publicou em 1854 a criação de um imaginário popular acerca de acon-
obra História geral do Brasil. tecimentos marcantes da história nacional.

24
Após a Proclamação da República, em 1889, têm Constituição,Justiça e força policial próprias,
Brasil passou por mudanças políticas significa- mas são subordinados ao poder central, a União.
tivas. Iniciou-se um sistema político baseado no Contudo, segundo muitos historiadores, fal-
princípio federativo. Na prática, isso significa que tou nesse processo a participação popular, o que
Estado republicano é composto de um poder dificultou a concepção de nação.
central e unidades federadas (estados). Os estados

A consciência ou falta de apoio levou os re- Pode-se concluir, então, que até 1930 não havia
publicanos a tentarem legitimar o regime por povo organizado e nem sentimento nacional con-
meio da manipulação de simbolos patrióticos e solidado. A participação na política nacional, in-
da criação de uma galeria de heróis republica- clusive nos grandes acontecimentos, era limitada a
nos. Mesmo aí foi necessário fazer compromis- pequenos grupos. A grande maioria do povo tinha
sos. A bandeira nacional foi modificada, mas com o governo uma relação de distância, de sus-
foram mantidas as cores e o desenho básico da peita, quando não de aberto antagonismo. Quando
bandeira imperial. A mudança do hino foi impe- povo agia politicamente, em geral o fazia como
dida por reação popular. Graças à guerra contra reação ao que considerava arbítrio das autoridades.
Paraguai, bandeira e hino já tinham adquirido Era uma cidadania em negativo, se se pode dizer
legitimidade como simbolos cívicos. isso assim. O povo não tinha lugar no sistema po-
Não teve muito êxito também a República em lítico, seja no Império, seja na República. O Bra-
promover seus fundadores, os generais Deodoro e sil era ainda para ele uma realidade abstrata. Aos
Floriano e o tenente-coronel Benjamin Constant, a grandes acontecimentos políticos nacionais, ele
heróis cívicos. [...] O único que se firmou como he- assistia, não como bestializado, mas como curioso,
rói cívico foi Tiraclentes [ ... ]. Pintores o retrataram desconfiado, temeroso, talvez um tanto divertido.
com aparência de Jesus Cristo, o que sem dúvida CARVALHO, José Murito de. Cidadania no BrasiL o 'ongo
contribuiu para sua popularidade. caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasiteira. 2007. p. 82-83.

7udro Ari:riuo. 1:l1:I1:;:: (:I mL:: 1 17. 77::, ::I:i, .1, 7:i1- 7,6 ri. Lss.s:: :m co:1:c ,::tr: :;:: ;:•::
canônica por alguns estudiosos, pois cria ou impõe unia visão sobre o fato ocorrido. A obra, que representa a cena da Independõncia do Brasil
com elementos contestados pelos historiadores, tornou-se tão famosa e reproduzida que foi incorporada ao inlaginario coletivo como 'retrato
do acontecimento de 1822.

25
Organizando ideias

Observe as imagens a seguir. Estas obras, A cena reflete confLito, harmonia ou drama-
ícones da pintura histórica, auxiliaram a cons- ticidade?
truir a ideia que temos hoje do passado de
nosso país. Que ideias e valores podem ser levantados

Primeiro, olhe atentamente todos os elemen- por meio dessa imagem?

tos que compõem cada uma das telas com base


A data da produção da tela corresponde à
nos questionamentos a seguir.
data do evento histórico retratado?
Que fato histórico está representado? Se ne-
Qual é a mensagem que essa obra passa?
cessário, procure informações sobre a data
do evento e os dados principais. Depois dessa análise, escreva de que manei-
ra cada imagem pode contribuir para a criação
Que elementos compõem a cena retratada? da identidade nacional. Apresente suas opiniões
Quem está em destaque na cena e qual é o a todos e elabore uma conclusão sobre o poder
papel dessa pessoa na descrição do evento? de convencimento desses documentos visuais.

Imagem 1

/ctor Meirelies. Primeira missa no Brasil. 1860.


eo sobre teia, 2.68 m x 3.56 m.

Imagem 2

... Pedro Bruno. A pátria, 1919.


Oieo sobre teia 278m xl 90m

26 'uo1
U Nação e identidade
Apesar do desejo comum de formar o senti-
mento de unidade e pertencimento entre as popu- ou mais línguas, reconhecer-se como diferentes
em vários aspectos. Mas há algo em que coin-
lações das jovens nações nascidas em decorrência
cidem: identificar-se, acima de suas particula-
dos processos emancipatórios do fim do século
ridades e sem prejuízo de que essas particulari-
XIX e século XX, a multiplicidade dos conceitos de lades continuem existindo, como membros de
territórios, raça e progresso e também as várias uma identidade superior, a identidade nacional.
etnias, línguas e religiões tornaram os processos de Os suíços constituem urna nação e falam várias
formação das nações únicos em cada novo país. línguas. Os alemães são uma nação e profes-
Se a formação de uma nação passa pelo crivo sam o protestantismo e catolicismo romano.
da identificação emocional entre seus indivíduos, em Nenhum suíço e nenhum alemão deixariam de
identificar-se como tal; sua ligação a determi-
alguns casos específicos a simples divisão territorial
nado culto e idioma não os coloca à margem da
de regiões antes subjugadas pelos europeus não foi
comunidade nacional.
suficiente para formar uma unidade cultural - como
Nos Estados africanos surgidos depois da
em certas regiões asiáticas e, sobretudo, africanas. Primeira Guerra Mundial - em alguns deles pelo
Muitos dos novos países surgidos na África menos - numerosos grupos tribais não assumi-
pós-emancipação abrigam povos de diferentes cul- ram urna identidade superior à de sua identidade
turas e hábitos, que, por mais que estejam unidos tribal. Esta continua primando sobre qualquer
em um território comum, jamais se sentirão como outra. Ainda que governantes de alguns países
pretendam que os seus sejam Estados nacionais,
parte do mesmo todo. Isso fica claro quando colo-
na verdade estamos na presença de Estados sem
camos em pauta a manutenção de distintas culturas
nações. Assim corno existem nações sem Estado:
seculares - e até milenares - antagônicas entre si
os curdos, [ ... ] os palestinos [ ... ].
dentro do mesmo espaço físico.
POMER, Léon. O surgimento das nações.
O inverso desse processo também é possível,
São Paulo: Atual, 1994. p. 11-12.
como no caso de algumas nações europeias que,
apesar da multiplicidade de línguas e costumes,
uniram-se em torno do território ou ideais comuns
para construir uma identidade única, aproximando L!ausa para investigação
as diferenças por meio da coexistência, sem excluir
uma ou outra cultura. Observe sua Certidão de Nascimento ou
A possibilidade de existência desses diferentes sua Carteira de Identidade. Nesses docu-
processos de formação das identidades culturais mentos estão anotados vários dados pes-
comuns e, consequentemente, dos elementos que soais, como nome de seus pais e seu nome,
constituem as novas nações reafirma que, apesar data de nascimento, além de sua naciona-
de a ideia de nação remeter a unidades, esses lidade, ou seja, o adjetivo referente à nação
processos não são únicos, e sim dependentes das onde você nasceu.
especificidades de cada povo, cultura, domínio, Qual é sua nacionalidade?
emancipação etc. Pense o que significa ser brasileiro. Para
você, o que torna uma pessoa pertencente à
nação brasileira? Anote suas respostas e, em
[...1 Nem todo agrupamento humano é uma na- seguida, troque ideias com os colegas sobre
ção. Não o é urna tribo, nem o foram os impé-
a questão: Como cada pessoa pensa sua na-
rios Inca e Romano. Na nação os homens po-
cionalidade?
dem professar uma ou mais religiões, falar uma

N3coes e nacionalisrn - 27
ffl Debate interdiscipLinar
Bandeira NacionaL
e patriotismo
Nossa pátria, nosso país, nossa nação, nosso reverenciá-los, como jurar lealdade à bandeira,
Estado... Bem, esses termos podem ser bastante ou, ainda, hasteá-la enquanto seu hino é cantado
abstratos: você compartilha os mesmos valores e pelos presentes. Até mesmo deixar uma bandeira
sentimentos com todos os mais de 205 milhões de hasteada em cada edifício público pode ser con-
brasileiros? siderado uma prática cultural relacionada à cons-
E provável que, ao pensar nessa questão, as trução da identidade nacional.
inúmeras diferenças entre nós tenham povoado Os sentimentos expressos nesses rituais e
sua cabeça por alguns instantes. Em algumas si- práticas culturais podem também ser evocados
tuações no entanto, nós somos levados a imagi- pelo Estado nacional de forma a obter o apoio da
nar que compomos uma grande comunidade. E população para medidas que seriam impopulares
as bandeiras nacionais têm muito a ver com isso, em um processo regular. A pesquisa dos psicólo-
como você vai ler a seguir. gos estadunidenses apontam bem essa questão:
Alguns meses após os atentados de 11 de se- um símbolo nacional, nesse caso a bandeira,
tembro de 2001, pesquisadores da Universidade provoca alterações na percepção das pessoas,
de Ohio (EUA) observaram um surpreendente au- podendo influenciá-las a apoiar ideias de prote-
mento da presença da bandeira estadunidense nas ção nacional que seriam mais bem avaliadas se os
fachadas das casas. sentimentos e emoções evocados pela bandeira
[ ... ] A fim de medir o sentimento de patriotismo dos não estivessem presentes.
participantes de uma pesquisa, foi pedido que eles mar-
cassem, em uma escala graduada, o acordo ou desacordo
a respeito de diversas afirmações. [... 1 Os participantes
tinham de preencher os diferentes questionários, in-
dicando a que ponto estavam de acordo ou não com
essas numerosas afirmações. Alguns responderam os
questionários em uma sala onde estava presente uma
grande bandeira estadunidense, outros em urna sala
sem a bandeira.
Os resultados revelaram que, no geral, a presença
da bandeira acentuou tanto o grau de nacionalismo
quanto o de dominação social. Em outras palavras, na
presença da bandeira, os participantes se identificam
mais com seu pais e expressam uma visão de socie-
dade mais desigual, em que aceitam as diferenças de
estatuto entre os diversos grupos sociais.
GUÉGUEN, Nicolas. Leffet drapeau. Cerveau & Psycho. n. 69,
jan.-íev. 2012. Disponivel em: <wv.cerveauetpsycho.fr/ewb
pages/a/artic[e-l-effel-drapeau-28608.php>.
Acesso em: abr. 2016. [Tradução nossa].
--

Os símbolos nacionais são parte funda-


mental do processo de construção da identida-
de nacional. Diversos rituais e práticas culturais
Bandeira brasileira na praça dos Girassóis, onde fica a sede do governo de
podem incluí-los ou mesmo serem criados para Tocantins, no centro da cidade de Palmas. 2015.

28
Cruz cristã
iL
cruz é um símbolo antigo, utilizado por
diferentes povos da Mesopotâmia, China,
Grécia e Escandinávia. Atualmente, ela é
riTíIIP
associada principalmente ao cristianismo.
Uma das mais antigas bandeiras com a
imagem da cruz foi a de Jerusalém - nela Dinamarca Reno Unido Suíça


havia cinco cruzes douradas sobre um fundo
branco. A Dinamarca foi o primeiro país a
adotar, em sua bandeira, o formato da cruz +_
fora da posição central, seguida por Suécia, dJ+ ,•

Noruega e Islândia. A Cruz de Malta 11561) é


uma variação complexa da cruz cristã.

Geórgia República Dominicana Malta

m1fl!T ri rwi
A Lua crescente também é um símbolo muito antigo: está em selos acadianos datados de 2300 aC. Foi apropriada por
mesopotâiToS e fenícios, que a levaram para Cartaqo. No século XII, os turcos transformaram a Lua crescente em
símbolo do Islã, acompanhada ainda de uma estrela.

gru Mauritânia Turquia


Q-
Argélia
l u wa
Paquistão Tunísia

'J 4'k,iI t-.Id -J -

No início da Revolução Francesa, em 1789, as milícias de Paris usavam uniformes com as cores vermelho e azul. O
marquês de Lafayette acrescentou o branco, cor-símbolo da realeza. A bandeira tricolor francesa ganhou, então, o
significado de 'cores da liberdade". O uso de três cores, na vertical ou na horizontal, tornou-se um símbolo republicano
em todo o mundo.

Bolivia

A bandeira mais antiga e mais conhecida a usar


a combinão de estrelas e listras é a dos Estados
Unidos - conhecida como The Stars and Stripes.
Estrelas e listras representam os ideais de liber-
Alemanha Itália

~M Chade

Argentina
Romênia

Libéria

dade e democracia. Em diferentes variações, elas


também foram adotadas por outros países.

1. Pesquise a respeito da versão atual da


bandeira brasileira, compare-a com a
versão do Período Imperial e responda:
Cuba Porto Rico Malásia Em que ela reflete a história nacional?
,4ufl,que: K'.eh i 2212.1,.

Nacões e naciona1is1: 29
Testando seus conhecimentos Responda no caderno

1. (UFSM-RS) Em 1830, a Europa é varrida por ci chamam a atenção para o caráter uni-
revoltas que têm suas origens lateral e autoritário das duas unifica-
1. no ideário da Revolução Francesa. ções, impostas pelo Piemonte, na Itália,
e pela Prússia, na Alemanha.
no socialismo da burguesia em ascensão.
di escondem suas naturezas contrastan-
nos princípios do liberalismo e do nacio-
tes, pois a alemã foi autoritária e aris-
nalismo.
tocrática e a italiana foi democrática e
no ideário da Santa Aliança. popular.
Estão corretas
e) tratam da unificação da Itália e da Ale-
apenas 1 e II. d) apenas III e IV. manha, mas nada sugerem quanto ao
apenas 1 e III. e) apenas II, III e IV. caráter impositivo de processo liderado
ci apenas II e IV. por Cavour, na Itália, e por Bismarck, na
2. (FGV-SP) A nova onda se propagou rapidamente Alemanha.
por toda a Europa. Urna semana depois da queda
4. IUEPG-PR) Na Europa, na primeira metade
de Luís Filipe 1, o movimento revolucionário to-
do século XIX, surgiram ideias nacionalistas,
mou conta de urna parte da Alemanha e, em me-
nos de um mês, já estava na Hungria, passando como afirmação dos princípios liberais apli-
pela Itália e pela Áustria. Em poucas semanas, OS cados à nação, entendida como um conjunto
governos dessa vasta região foram derrubados, e de indivíduos dotados de liberdades naturais
supostamente se inaugurava urna nova etapa da e unidos por interesses e idioma comuns,
História europeia, a Primavera dos Povos. constituindo uma "individualidade política"
[Luiz Koshiba, "História - origens, estruturas e processos"I com direito à autodeterminação. Na segunda
metade desse século, o panorama político
O texto faz referência:
europeu caracterizou-se pela política das
a) à Belte Époque. nacionalidades, e nesse contexto ocorreram
bi às Revoluções de 1848. as unificações da Itália e da Alemanha.
à Restauração de 1815. Sobre a unificação da Itália, assinale o que
à Guerra Franco-Prussiana. for correto.
às Revoluções liberais de 1820.
a) A ideia de unificação partiu das zonas
3. (Fuvest-SP) 'Fizemos a Itália, agora temos de crescente desenvolvimento indus-
que fazer os italianos". trial, correspondendo basicamente aos
"Ao invés da Prússia se fundir na Alemanha, interesses de setores da burguesia, de-
a Alemanha se fundiu na Prússia". sejosos de constituir um amplo merca-
Estas frases, sobre as unificações italiana e do nacional para seus produtos.
alemã: bi O processo de unificação se desenvol-

a) aludem às diferenças que as marca- veu no sentido norte/sul, a partir do Rei-


no do Piemonte-Sardenha,
ram, pois, enquanto a alemã foi feita em
ci O movimento nacionalista de Mazzini
benefício da Prússia, a italiana, como
foi derrotado em 1830, mas recuperou
demonstra a escolha de Roma para ca-
força em 1849, com a fundação da Re-
pital, contemplou todas as regiões.
pública Romana.
bi apontam para as suas semelhanças,
d) O caráter popular e a radicalização dos
isto é, para o caráter autoritário e in-
movimentos de unificação nos anos de
completo de ambas, decorrentes do
1848 e 1849 levaram a burguesia a reti-
passado fascista, no caso italiano, e
rar o seu apoio, o que favoreceu a con-
nazista, no alemão.
trarrevolução.

30
Responda no caderno

e) Concluído o processo de unificação, dois e sucessora do extinto Sacro Império,


importantes problemas permaneceram: capaz de eliminar as pretensões da Prús-
a Questão Romana - recusa de Pio IX e sia. Aliado da França, o país austríaco
seus sucessores em aceitar a perda de contou com o seu apoio para vencer as
seus territórios - e a existência de mino- resistências germânicas do sul.
rias italianas fora do território unificado. ci A constituição, redigida por Bismarck,
inaugurou uma era democrática nos es-
5. (UFRGS-RS) A Unificação Alemã, habil-
tados alemães, sob influência dos ideais
mente arquitetada por Otto Von Bismarck,
da Revolução Francesa, baseados na
realizou-se em torno de guerras bem-suce-
soberania e na participação popular.
didas contra potências vizinhas.
Assinale a alternativa correta em relação às As decisões do Congresso de Viena, ao
motivações e aos acontecimentos que de- reconhecerem o direito de independên-
sencadearam esse processo de unificação. cia da Alemanha, foram fundamentais
para a consolidação da unificação, pois
A fragmentação política obstaculizava o
inibiram as pretensões italianas aos
pleno desenvolvimento comercial e indus-
territórios do sul da Alemanha.
trial da região. A unificação promoveria
O processo de unificação alemã contou
um mercado ágil e ampliado, com condi-
com o apoio da França, que, acossada
ções de enfrentar a concorrência inglesa
pela supremacia britânica, via no novo
através da proteção governamental.
Estado um importante aliado na corrida
A unificação foi liderada pela Áustria, o
imperialista.
mais poderoso dos Estados germânicos

A Dama de Ferro, direção de Phyllida Lloyd. Reino


j Unido, 2011, 105 mm. Margaret Thatcher, ex-pri-
(Para você ter meira-ministra da Grã-Bretanha, reconstrói sua
trajetória de vida e relembra seus sucessos e fra-
O mito das nações, de Patrick J. Geardy. São
cassos em uma conversa com o marido, falecido.
Paulo: Conrad do Brasil, 2005. Nesse livro, para
demonstrar que as nações não têm bases tão Invictus, direção de Clint Eastwood. EUA, 2009,
sólidas como se imagina, o autor discute os con- 134 mm. Em seu primeiro mandato como presi-
flitos étnicos, as manifestações racistas dos gru- dente da Africa do Sul, Nelson Mandela se une ao
pos de extrema-direita e a luta pela defesa das capitão do time de rugby do país com o objetivo de
etnias e das tradições históricas na atualidade. vencera Copa do Mundo de F?ugby usando o espor-
te para unir a população dividida pelo apartheid.
Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Bar-
reto. São Paulo: Penguin & Companhia das Le-
tras, 2011. O livro conta a história de Policarpo
Quaresma, um sonhador nacionalista e idealista
(ra você navegar I

que luta para que o idioma tupi-guarani seja a


Governo FederaL do BrasiL. Disponível em: <wvw.
língua oficial do Brasil.
brasil.gov.br>. Acesso em: abr. 2016. Com o ob-
jetivo de facilitar o acesso à informação, o portal
do governo federal disponibiliza, além de notícias,
(Para você assistir . os mais variados serviços para o cidadão, como
emissão de documentos, resolução de dúvidas,
O patriota, direção de Roland Emmerich. EUA,
divulgação de campanhas, entre outros.
2000, 178 mm. Benjamin Martin, um herói de
guerra que renunciou à luta precisa deixar no-
vamente sua família para liderar uma rebelião
contra a invasão do exército britânico e pela in-
dependência de seu país.
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No século XX, alguns regimes políticos Em nome da "nação" cometeram-se


usaram a violência para chegar ao poder e muitos crimes, às vezes com a conivência de
submeter a popuLação. No caso dos regimes amplos setores das massas, que foram, de
nazifascistas, propagandas semeavam ódio alguma maneira, condescendentes com líde-
racial, de classe ou contra aqueles que fossem res carismáticos que se apresentavam como
considerados "diferentes". salvadores da pátria.
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Foram regimes que cercearam a liberda- Este capítulo traz uma síntese dos princi-
de e toda forma de expressão ou crítica ao go- pais regimes totalitários do século XX, propondo

L
verno, centralizaram o poder nas mãos de um uma reflexão sobre como o direito à liberdade
único partido político, entre outras caracterís- pode ser progressivamente eliminado, muitas
ticasautoritárias. Esses regimes despontaram vezes com argumentos a favor da redenção
após a Primeira Guerra Mundial, um período nacionaledo combateàsideologiastidas pelos
de crise em grande parte da Europa. líderes totalitários, como perniciosas.
O totaLitarismo
Após o fim da Primeira Guerra
Mundial, em 1918, teve início um cli- O totalitarismo é uma forma de opressão típica da moder-
ma de muita instabilidade nos países nidade revolucionária.
Expressivo, a propósito do fenômeno totalitário, é o
envolvidos. Grande parte da popu-
discurso de Mussolini, o Duce, no Scala de Milão, quando
lação de diversos Estados europeus
afirmou: tutto neilo Stato, niente contro lo Stato, nulia ai di
estava perdida, em meio a cidades e
fuori delio Stato (tudo no Estado, nada contra o Estado, nada
patrimônios destruídos e à morte de fora do Estado). O Estado totalitário, portanto, abrange toda
parentes e conhecidos, pois não ha- a vida social, e dirige até mesmo o pensamento das pessoas»
via um plano para a reconstrução do formando-lhes a consciência. Três aspectos importantes de-
país e da vida de cada um. vem ser considerados nos Estados totalitários: a) formação de
Em razão da falta de perspectiva uma casta dominante que tem nas mãos o aparelhamento do
Estado (na ex-URSS foi a Nomenkl atura); b) polícia política,
da população e da desesperança no
servindo-lhes habitualmente de métodos de tortura; c) su-
sistema liberal vigente, despontaram
pressão total da liberdade de pensamento e monopólio estatal
as ideias de líderes que propunham
da cultura, do ensino e dos meios de comunicação de massa.
um Estado Nacional forte e centrali- Há a absorção total e absoluta do homem em uma classe, no
zado, como alternativa à incerteza e Estado ou em uma raça. O Direito, a Moral» as Artes, a Ciên-
insegurança instaladas na Europa. cia e a Religião são ditadas pelo Estado, que é o instrumento
Surgiram, então, os Estados da classe ou da raça.
totalitários, cujas principais carac-
CARVALHO, Kildare Goncalves. Direito constitucionaL.
terísticas eram regimes políticos na- Belo Horizonte: Dei Rey. 2008. p. 216-217.
cionalistas, imperialistas, antiliberais
e antidemocráticos, mantidos por
meio da força, repressão ao indiví-
duo, censura e supressão dos direi-
tos individuais e coletivos, e ainda de .:.

muita propaganda ideológica. 1


v .' ...
,-
.'
1
..,ç 4 -.'k
. .. ... i
O totalitarismo pode ser enten-
dido como uma forma de governo na - »»•: •. . ..
qual o Estado se submete ao contro- -,,.-..,•-. -.. .-..
) .'...» !.-!iL-..,,... I ,•. . :. -
le de um único líder político, partido
ou classe, que regulamenta a vida
das populações em âmbito público e
privado por meio do autoritarismo e
da imposição de uma ideologia.
Entre as formas de afirmação dos
governos totalitários, podemos des-
tacar: um partido monopolista que
toma as decisões administrativas,
uma ideologia considerada verdade
absoluta, a monopolização dos meios
de comunicação para a difusão dos
ideais por meio de propaganda ma-
ciça, o controle das atividades econô-
micas e sociais e muita repressão a
quem se opõe aos regimes.
Adolt Hitler e Benito Mussolini inspecionando guardas militares em Berlim (Alemanhia), 1940.

_34
Foi na Itália que o movimento totalitarista passou a uti-
lizar denominação própria, tendo o fascio - o "feixe" de varas
dos iitores romanos - como símbolo. Leia o texto a seguir e depois
Em um sentido mais amplo, o fascismo que surgiu nesse responda às questões.
período representou uma reação das forças conservadoras da
Os movimentos totalitários ob-
Europa após a vitória do socialismo na União Soviética. Res- jetivam e conseguem organizar as
peitando a diversidade de implantação, o fascismo foi a base massas - e não as classes [ ... ], nem
de diversos movimentos totalitários europeus. os cidadãos com suas opiniões pc-
Desse modo, o vocábulo fascismo foi utilizado para de- culiares quanto à condução dos
signar formas diferentes de governo: negócios públicos [.1. Todos os
grupos políticos dependem da for-
o núcleo histórico original, constituído pelo fascismo italiano;
ça numérica, mas não na escala dos
o nacional-socialismo, também chamado de fascismo ale-
movimentos totalitários, que de-
mão. O vocábulo nazismo deriva das iniciais do Partido
pendem da força bruta, a tal ponto
Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (Natio- que OS regimes totalitários parecem
nalsozilistische Deutsche Arbeiterpartei - NSDAP), sigla da impossíveis em países de população
qual surgiu a abreviatura Nazi; relativamente pequena, mesmo que
o termo foi estendido a diversos movimentos que compar- outras condições lhes sejam favo-
tilharam - e alguns ainda compartilham - determinadas ráveis. l)epois da Primeira Guerra
Mundial, uma onda antidemocráti-
características ideológicas, modelo de organização e fina-
ca e pró-ditatorial de movimentos
lidades políticas do "fascismo histórico", como o franquis-
totalitários e sem i totalitários varreu
mo na Espanha e o salazarismo em Portugal.
a Europa: da Itália disseminaram-
-se movimentos fascistas para qua-
se todos os países da Europa central
4
e oriental [... ].

ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo.


São Pauto: Companhia das Letras, 2012.
p. 1,36.

•.. . .. .. . - 1. Por que a autora afirma que


'.'p •. 1
os movimentos totalitários or-
:
ganizam as massas, e não as
classes ou os cidadãos com
opiniões formadas? Justifique.

2 Comparando a definição de
totalitarismo apresentada nes-
te capítulo com os aspectos
levantados por Hannah Árendt,

r r
em que medida as massas são
fundamentais para a organiza-
iii.
ção de um governo totalitário?
General Franco discursando para organizações juvenis em Madri
(Espanha), 1939. Justifique.

3. O que a autora quer dizer ao


afirmar que. além das massas,
Litor: oficial que seguia os magistrados romanos levan- os regimes totalitários depen-
do na mão um feixe de varas e uma machadinha para as dem da força bruta? Explique.
execuções da justiça.

05 ryr(w 35 -
O fascismo na ItáLia
A Itália unificou-se na segunda metade do sé- aqueles que se contentavam com reformas do Estado
culo XIX, sob a forma de uma monarquia parlamen- burguês e os chamados maximalistas, que apostavam
tarista. A disparidade econômica entre as diversas em uma revolução. Em 1921, os descontentes com a
regiões, a forte influência da Igreja Católica, o ban- política moderada do Partido Socialista fundaram o
ditismo endêmico no sul, a crescente organização Partido Comunista da Itália, que se apoiava em um
dos operários das cidades industrializadas do norte, programa leninista (ou seja, seguia as ideias de Lênin,
a miséria do campesinato e as fortes disputas entre principal líder da Revolução Russa).
grupos políticos de tendências ideológicas diversas Foi nesse contexto de crise econômica e so-
marcavam o país no início do século XX. cial e de turbulência política que entrou em cena
Apesar de sua aliança com a Alemanha e com Benito Mussolini. Nascido em 1883, filho de pai
Império Austro-Húngaro, a Itália manteve-se anarquista, formou-se professor e, para não prestar
neutra quando eclodiu a Primeira Guerra Mundial, serviço militar, fugiu para a Suíça, onde viveu de
em agosto de 1914. 1902 a 1904. De volta à Itália, ingressou no Partido
No entanto, em 1915, em razão de promessas Socialista, e em 1912 foi nomeado diretor do jornal
territoriais e de pressão popular, o governo italia- Avanrie porta-voz do partido. Em 1914, juntou-se
no rompeu antigos tratados e entrou no conflito àqueles que queriam a participação da Itália na
declarando guerra à Áustria (maio de 1915) e à guerra, desobedecendo à diretriz partidária, que
Alemanha (agosto de 1915). A Itália passou a in- defendia a neutralidade. Essa desavença ocasionaria
tegrar o bloco da Tríplice Entente (Grã-Bretanha, desligamento de Mussolini do partido.
França e Rússia).
O país estava, porém, despreparado para
O fascismo nasceu oficialmente em março
enfrentar uma guerra moderna. As conquistas
de 1919, quando Mussolini fundou o Fasci di
territoriais foram poucas, e os custos humanos combattimfntO, em Milão, com um programa
(morreram mais de 600 mil pessoas) e materiais de nacionalismo, ataque à classe liberal, republi-
foram enormes. canismo» anticlericalismo e anseio de renovação
Após o fim da guerra, quando foram cele- social» encarnando, assim, as posições de uma
brados os tratados de paz, a Itália obteve bem pequena burguesia irrequieta e, principalmen-
te, dos ex-combatentes. Confluía para o movi-
menos daquilo que havia sido prometido pelas
mento uma base que havia passado por expe-
potências aliadas e mergulhou em uma crise eco-
riências diferentes: republicanos, sindicalistas
nômica, social e política de graves proporções. O revolucionários, nacionalistas, intervencionistas
aumento da inflação corroía o poder de compra democráticos, anarquistas, estudantes, todos
dos trabalhadores, o desemprego lançava multi- reclamando uma participação maior da peque-
dões às ruas, os sucessivos governos liberais não na burguesia no cenário político. Eram eviden-
tinham credibilidade e não conseguiam estancar tes no novo grupo o oportunismo e um estilo
a deterioração das crenças nos valores democrá- violento, que se manifestou já em abril de 1919,
com o incêndio do jornal socialista em Milão.
ticos. As greves violentas, a ocupação de fábricas
por operários ligados a socialistas e anarquistas, as TRENTO, Ângeto. Fascismo itaLiano.
Sào Pauto: Atica, 1993. p. 16,
invasões de terras por camponeses e o avanço das
agremiações políticas de esquerda amedrontavam
os conservadores. Temia-se pela "bolchevização"
da Itália, ou seja, que ocorresse uma revolução O Fasci di combattimento era uma espécie de
associação nacionalista íundada em Milão, no ano
como a que acontecera na Rússia em 1917.
de 1919, pelos veteranos da Primeira Guerra Mun-
Nesse contexto, houve um expressivo aumento
diaL entre eles Mussolini. Essa associação deu
dos eleitores do Partido Socialista Italiano, fundado origem, em 1922, ao Partido Nacional Fascista.
em 1892. Ainda assim, o partido estava dividido entre

36
Na primeira eleição disputada, os fascistas
tiveram desempenho fraco, obtendo um número A grande diferença entre a direita fascista e
a não fascista era que o fascismo existia mobi-
pequeno de votos. Mussolini, então, mudou de
lizando massas de baixo para cima. Pertencia
estratégia, procurando se aproximar das classes
essencialmente à era da política democrática e
dominantes e de setores da Igreja, deixando de popular que os reacionários tradicionais deplo-
lado alguns aspectos do programa fascista origi- ravam, e que os defensores do "Estado orgâni-
nal. Concomitantemente, formou grupos para- co" tentavam contornar. O fascismo rejubilava-
militares, os squadrisri, com suas camisas negras, -se na mobilização das massas, e mantinha-a
que praticavam atos violentos contra cooperativas, simbolicamente na forma de teatro público - os
jornais, gráficas, ligas camponesas, clubes socialis- comícios de Nuremberg, as massas na piazza de
Venezia assistindo os gestos de Mussolini lá em
tas, organizações culturais e pessoas consideradas
cima da sacada - mesmo quando chegava ao po-
esquerdistas ou que se opunham ao fascismo. Ape-
der; como também faziam os movimentos co-
nas em 1921, entre 5 e 6 mil pessoas morreram na
munistas. Os fascistas eram os revolucionários
Itália em decorrência da violência fascista. da contrarrevolução: em sua retórica, em seu
Chamado por seus seguidores de Doce (do la- apelo aos que se consideravam vítimas da so-
tim dux, que significa "comandante", "chefe"), Mus- ciedade, em sua convocação a urna total trans-
solini foi se tornando o protetor dos grandes proprie- formação da sociedade, e até mesmo em sua
tários de terra, dos capitães da indústria, de setores deliberada adaptação dos simbolos e nomes dos
do exército, da polícia e da cúpula da Igreja Católi- revolucionários sociais { ... J.
ca, todos irmanados no combate ao "perigo verme- HOBSBAWM, Eric Era dos Extremos: o breve século XX -
lho" (referência ao comunismo). Com isso, o Partito 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras. 2007. p. 121.

Nazionale Fascista já contava, em 1921, ano de sua


fundacão. com 200 mil filiados, dando ao
movirntonorme força Política.
Mussolini organizou, em 1922, a
-------------------------._.-
Ii Popolo d It !
Marcna sobre Roma, na qual elementos
fascistas oriundos de diversas regiões
convergiriam para a capital, em uma MUSSOII11I ricousacra I'Italia di Vittorio Veneto ]
demonstração de força para persuadir ('redfldole un 6overno deqno dei subi immancabili destini -
14 eefusMstiche accoglicoze dclIFscrdte, delle Mllizle tasciste e de Poole roteans
o rei Vítor Emanuel III a nomear o Duce ••
II nuou (,owno' -. Ii iii t ii F
como primeiro ministro Com a coni ---- -- - fl110YÜrimUihi
vencia de setores do exercito, da policia,
da classe politica, dos grandes empre
sarios e do rei,que, por razões diversas - =
não quiseram reprimir os camisas ne
.
gras, o "manifesto" funcionou e Musso- .
lini foi convidado a assumir o cargo de ii.. t
primeiro ministro Note se que os fascis-
tas não compunham maioria parlamen-
tar, mas se impuseram a força e com o
apoio de setores sociais nacionalistas - - -
e conservadores
rw i -'- -.- - '- -: -:: •"• =__ * *
Capa do jornal li Popolo d Italia em que a ascensio ia prima Olornta
de Mussolini ao poder e celebrada comparada a
vitoria dos italianos contra os iustro hungaros na
Batalha de Vittorio Veneto (Primeira Guerra Mundial) A ...-
manchete diz Mussolini reconsagra a Italia de Vittorio
Veneto criando um governo digno de seu invitavel
destino'. Milito (itália), 31 de outubro de 1922.

Os reain:c' tCJhtL 37 —
No poder, os fascistas paulatinamente pas- Mussolini tentou se aproximar da Igreja Ca-
saram a assenhorear-se das instituições estatais. tólica, que ainda não reconhecia o Estado italia-
Toda e qualquer oposição passou a ser reprimida. no. Em 1929,
foi assinado o Tratado de Latrão,
Em 1923, foi criada a Milícia Voluntária de Segu- que impôs o catolicismo como religião oficial do
rança Nacional (MVSN), subordinada diretamen- Estado; oficializou o ensino religioso nas escolas
te a Mussolini, constituindo um braço armado e o casamento religioso com validade civil; es-
do fascismo. Em 1924,
os fascistas obtiveram tabeleceu vultosa indenização à Igreja Católica
expressiva vitória eleitoral ao conquistar 65% das pela perda dos territórios pontifícios e a criação
cadeiras do Parlamento. A melhora da situação do Estado do Vaticano, que, agora, reconhecia
econômica, a sensação de maior segurança, a Estado italiano.
propaganda maciça, as fraudes eleitorais e o uso
da violência sistemática contra os adversários ex-
plicam tão expressiva votação.
fganizando ideias.
Em dupla, leia o texto a seguir e, juntos,
façam o que se pede.

GIOVENW RSCUTA J A natureza do fascismo

Os movimentos fascistas foram marca-


dos por um nacionalismo extrernado e pela
determinação de acabar com o liberalismo e
marxismo - de desfazer o legado da Revo-
lução Francesa de 1789 e da Revolução Boi-
chevique de 1917. Os fascistas acreditavam
que sua revolução era espiritual, que estavam
iniciando uma nova era na história e cons-
truindo urna nova civilização sobre as ruínas
da democracia liberal. "Somos por um novo
princípio no mundo", disse Mussolini. "So-
mos pela antítese total, categórica, definitiva
do mundo da democracia, [... ] do m iindo que
ainda segue os princípios fundamentais esta-
belecidos em 1 789".

PERRY, Marvin. Civilização ocidental: uma história concisa.


Sáo Pauto: Fvtartins Fontes, 2002. p. 566.

De acordo com o texto e com as informa-


ções anteriores, o fascismo era contrário
à democracia. Justifiquem. Se necessá-
Cava da revista Juventude Fascista. c. 1920. rio, procurem informações sobre o que é
democracia e como se organiza o regime
A partir de 1925 consolidou-se na Itália um de m oc rá ti co.
Estado totalitário. Os partidos políticos (com
exceção do Partido Fascista) foram declarados O fascismo bem como outros regimes tota-
ilegais, o sistema de governo foi reformado em litários caracterizam-se pela ausência de

sentido centralizador, a imprensa passou a sofrer liberdade individual. O que isso significa?
forte censura, um tribunal especial julgava e con-
Em sua região, há exemplos de cerceamento
denava de forma arbitrária, sendo reintroduzida a
da liberdade? Expliquem.
pena de morte. Diversos políticos, sindicalistas e
intelectuais foram presos ou exilados.

38
O Estado fascista
O Estado fascista italiano caracterizou-se
pela intenção de controlar totalmente a socieda-
de. O sistema educacional foi alvo de profunda
reforma, e a educação passou a ser elitista, auto-
ritária e alienante. Os professores tinham de jurar
fidelidade ao regime, e os livros didáticos eram
produzidos de acordo com a ideologia do fascis-
mo. Valorizou-se sobremaneira a cultura física
em detrimento da educação crítica. A juventude
foi enquadrada em uma série de organizações
subservientes ao regime.
Mussolini foi o primeiro político que soube
utilizar o rádio, o cinema e os esportes como
instrumento de propaganda. Para manter uma
imagem popular, o ditador italiano participava de
trabalhos voluntários, sempre acompanhado por :•ju:: :;:
muitos fotógrafos e cinegrafistas, e todo o mate- itúlia. 1939.
rial produzido era veiculado em jornais, revistas e
No plano econômico, a propriedade privada
filmes para exaltar o regime.
não foi atingida. Muitos dos grandes empresários
da época apoiaram Mussolini. Os sindicatos fi-
O fascismo se interessava especialmente pelo
caram atrelados ao Estado, as greves foram proi-
cinema, criando um órgão para promover os fil-
bidas e os membros mais combativos da classe
mes nacionais e até construindo os grandes es-
túdios da Cinecittà, em Roma. Na maioria, as fi- operária foram presos ou silenciados.
tas realizadas eram diversões escepstas - leves, Na política externa, Mussolini alimentava
pees e epotiiicas. Mas havia alguns filmes de sonhos expansionistas. Herdara do regime an-
propaganda: reconstituições da Marcha para terior três colônias na África: Somália, Eritreia e
Roma e da "epopeia" dos esquadrões fascistas, Líbia. Em 1935, os italianos atacaram a Etiópia,
documentários sobre as obras do regime, pasti- país soberano que fazia parte da Liga das Na-
ches da história romana ou medieval que pre-
ções. Mobilizando milhares de soldados, aviões,
tendiam pressagiar e glorificar o fascismo [ ... ].
couraçados e empregando até gases asfixiantes,
PÂLL.A, Marco.A Itália fascista. os agressores liquidaram a resistência etíope, sem
São Paulo: Ática, 1996. p. 68.
que a comunidade internacional tomasse medida
efetiva diante dessa flagrante violação do Direito
Internacional.
Sem a introdução do rádio, é improvável
que esses regimes totalitários pudessem ter con-
trolado a obediência do povo da maneira como
controlaram. Como Joseph Goebbels, ministro Oz
da propaganda política de Hitler, diria posterior- Apolítico: destituído de caráter político.
mente: "Não teria sido possível para nós tomar Escapismo: tendência a fugir da realidade
o poder ou usá-lo da maneira que usamos sem o
ou dos problemas.
rádio. [...1 o rádio é o intermediário mais fluente
Piegas: em que há excesso de sentimen-
e importante entre o movimento espiritual e a
nação, entre a ideia e o povo". talismo.
Subserviente: que concorda em servir as
GORE. AlberI. O ataque à razão.
Barueri: Manole. 2008. p. 84. ordens de outrem, servil.

39_
O regime fascista realizou intervenções
LA TRiBUNA ILLUSTRMA Sppfr.o!o iII.,t,Io le L Tribrn., .':::.;
nos Bálcãs, especialmente na Albânia e em
ilhas do Mediterrâneo. Mussolini também
interveio na Guerra Civil Espanhola (1936-
1 939), apoiando os falangistas de Francisco
Franco com homens, equipamentos bélicos
e recursos financeiros.
O Estado fascista procurava exaltar a
guerra. Slogans como "A guerra está para
o homem assim como a maternidade está
para as mulheres", "Melhor um dia de leão
do que cem anos de cordeiro" ou, ainda,
"Nada jamais foi ganho na História sem
derramamento de sangue!" eram repetidos
pela mídia subserviente ao regime.
No texto escrito por Mussolini para a
Enciclopédia italiana, organizada pelo filó-
sofo Giovanni Gentile, ele deixa claro a opi-
nião que tentava incutir na população italiana
sobre a guerra.

................ 1 IL..,...............................................,
ria Praça Venozo dwante as comemoraçoes do Decimo Aniversãi io da Revolução
Fascista. Roma (Itália). 30 out. 1932.

[ ... ] No que diz respeito ao futuro e ao desen- têm a virtude de enfrentá-la [ ... J A guerra é para o
volvimento da humanidade em geral, o fascismo, homem o que a maternidade é para a mulher [ ... ].
à parte quaisquer considerações de política con- O amor ao próximo não exclui a severidade
temporánea, não crê nem na possibilidade nem na educativa e necessária e menos ainda a disparidade
utilidade da paz perpétua. Portanto, rejeita o paci- e a diferença [ ... ] O fascismo afirma a irremediável
fismo, que só esconde uma renúncia à luta e uma desigualdade entre os homens [...].
covardia em face do sacrifício. Somente a guerra
MUSSOLINI, Benjio apud PALLA. Marco.
leva todas as energias humanas ao máximo de ten- A Itália fascista. Sào Pauto: Álica. 1996. p. 65.
são e imprime a marca da nobreza nos povos que

t Organizando ideias
Analise o texto escrito por Mussolini no quadro acima. Depois faça o que se pede.

Explique a frase: 'o fascismo [...1 não crê nem na possibilidade nem na utilidade da paz perpétua'.

Explique a comparação feita entre guerra e maternidade.

Você concorda com a afirmação de Mussolini de que 'a guerra é para o homem o que a mater-
nidade é para a mulher'? Justifique.

40
Conflitos ideológicos CHI HR SRLVRTO L'ITALIA? t
O regime fascista enfrentou, desde o início, uma oposi-
ção permanente. Os partidos de esquerda, apesar da repres-
são, opuseram-se terminantemente à ditadura de Mussolini.
Liberais, setores da Igreja Católica e alguns intelectuais se
arrependeram de ter apoiado o Duce. Mesmo isolados e
divididos, os antifascistas permaneceram atuantes. Muitas
pessoas foram presas, e algumas assassinadas. Porém, a resis-
tência não deixou de existir. No exílio ou na clandestinidade,
muitos italianos procuraram, das mais variadas maneiras, /tT iI
combater o fascismo. A luta pela liberdade perdurou por
todo o período fascista e teve papel fundamental para que,
depois da Segunda Guerra Mundial, a Itália se tornasse uma
nação democrática.

Propaganda fascista de 1920: Quem salvou a Itália? O


fascismo!'. A personificaçâo do boichevismo se afogou, enquanto
corajosamente um camisa-preta salva o pais do afogamento.
IL FR5CISMO!

Pausa para investigação

Por meio de intensa campanha propagan- É possível, por meio da propaganda, construir
dística na Itália, os fascistas italianos tentavam a imagem de um herói? Exemplifique com
angariar adeptos e convencer a todos de suas casos recentes, no Brasil e/ou no mundo.
intenções. Para isso, as propagandas passavam
a ideia de que Mussolini era um grande líder, Você já assistiu a propagandas eleitorais? Se

capaz de resolver todos os problemas do povo. ainda não, faça isso. Se não estiver em pe-
Portanto, pode-se afirmar que era realizado ríodo eleitoral é possível buscar informações
um poderoso trabalho de publicidade, que hoje na internet. Observe como os candidatos

chamaríamos de marketing pessoal, e do regi- constroem a imagem pessoal e como isso

me político. Marketing é a publicidade feita para influencia na eleição. Os profissionais de


favorecer a venda de um produto ou serviço, marketing especializados em campanhas
ou para influenciar o público favoravelmente políticas muitas vezes fabricam uma ima-
em relação a uma ideia, pessoa, empresa etc. gem que difere do real. Com isso em mente,

Essa estratégia é ainda comumente usada pesquise algum político que está lou esteve

por governos e governantes. Com base nisso, recentemente) em campanha para eleição e
verifique se a imagem real )história pública,
faça o que se pede.
trabalhos realizados etc.) corresponde à ima-
1. Observe campanhas governamentais vei- gem vendida nas propagandas. Apresente o
culadas na mídia. Analise qual é a intenção resultado em sala de aula e debata o tema
dessas campanhas e responda se, em sua
com os colegas.
opinião, elas conseguem ou não atingir seus
objetivos. Justifique sua resposta.

41
U O nazismo na ALemanha
Após a unificação alemã, o país se tornou todas as correntes - não aceitaram as cláusulas
uma monarquia parlamentar. do Tratado de Versalhes e acusaram o governo de
Em 1914, as camadas dirigentes da Alema- traição. Muitos desses conservadores começaram
nha, contando com aprovação popular, apoiaram a acreditar que a Alemanha não fora derrotada
a entrada do país na Primeira Guerra Mundial militarmente, e sim traída por comunistas ejudeus.
acreditando que ela seria rápida e que o país Com isso, membros do governo passaram a ser
sairia vitorioso, possibilitando uma nova partilha alvo de atentados, culminando com o assassinato
do mercado mundial em condições que viessem de dois ministros.
a satisfazer antigos sonhos imperialistas. Não foi A situação econômica e social agravou-se
o que aconteceu, pois as Potências Centrais (Im- substancialmente quando, em 1923, França e
pério Alemão, Império Austro-Húngaro, Império Bélgica invadiram e ocuparam o Vale do Ruhr,
Otomano e Bulgária) foram derrotadas, tendo de com o objetivo de cobrar as cotas da dívida de
assinar tratados com cláusulas bastante restritivas,
guerra que a Alemanha não havia pago. O gover-
considerados por elas humilhantes. Pelo Tratado
no conclamou o povo a realizar uma resistência
de Versalhes (1919), os alemães perderam todas as
passiva contra as forças de ocupação, originando
suas colônias; foram proibidos de fabricar armas
uma campanha que colaborou para a dissemina-
e munições; sua força aérea foi extinta; a marinha,
ção do nacionalismo.
reduzida; perderam territórios fronteiriços e tive-
Contudo, em decorrência do desequilíbrio
ram de assumir uma gigantesca dívida de guerra.
orçamentário e da emissão desenfreada de papel-
Diante da derrota iminente, o kaiserGuilher-
-moeda, o país imergiu na hiperinflação. Entre
me II abdicou, colocando fim ao período monár-
agosto e novembro, o marco sofreu sucessivas
quico. Os socialistas moderados formaram um
desvalorizações, a tal ponto que um dólar chegou
governo provisório, assinaram a rendição incon-
a valer mais de 4 bilhões de marcos.
dicional e libertaram presos políticos. No mes-
mo ano de 1919, convocaram eleições para uma
Assembleia Constituinte por sufrágio universal,
dando, pela primeira vez, o direito de voto às mu-
lheres. Os socialistas radicais, liderados por Karl
Liebknecht e Rosa Luxemburgo, procuraram to-
mar o poder em Berlim, porém a sublevação foi
contida com violenta repressão, e os dois líderes
foram assassinados.
Após as eleições, o Partido Social Democra-
ta (SPD), que obteve a maioria dos votos, passou
a comandar o primeiro governo da República de
Weimar (assim chamada porque os constituin-
9'
tes, ao elaborarem a Constituição, em virtude das
agitações que ocorriam em Berlim, reuniram-se
na pequena localidade de Weimar).
Amplos setores da direita - nacionalistas, /

monarquistas, antissemitas e conservadores de Crianças fazem pipas com cedulas desvalorizadas, Alemanha 1922

A
_4
;j
00
-

Ántissemita: que ou aquele que se opõe aos judeus, bem como aos elementos culturais, étnicos
e religiosos a eLes associados.

42 -.-tu1o2
Em 1924, graças ao Plano Dawes, a Em 1919, entrou para o Partido dos
dívida alemã foi reescalonada e realizou- Trabalhadores Alemães, que logo mudou o
-se um ajuste financeiro. Nesse ano, sob nome para Partido Nacional-Socialista dos
a liderança de Gustav Stresemann (1878- Trabalhadores Alemães, conhecido tam-
1929), restabeleceu-se a estabilidade eco- bém como Partido Nazista. Graças a sua
nômica da República de Weimar. oratória e a seu carisma, em pouco tempo
A República de Weimar (191 9-1933) transformou-se no principal líder dessa
foi um período marcado por efervescência agremiação. O Partido Nazista apresentava
cultural nas artes, na literatura, no cinema em seu programa os seguintes pontos:
e nas ciências. No cinema, por exemplo, concentração de todos os alemães em
ocorreu o movimento conhecido como uma grande Alemanha (Deutschland
Expressionismo Alemão, que resultou em überAlles ou Alemanha acima de tudo);
filmes como Nosferatu, de E. W. Murnau; anulação do Tratado de Versalhes;
O gabinete do Dr. Caligari, de Robert reivindicação do Lebensraum ( o espaço
Weine; e Metrópolis, de Fritz Lang, que vital, à custa dos territórios eslavos);
revolucionaram a arte cinematográfica.
exclusão dos judeus da comunidade
Foi nesse contexto que entrou em
alemã;
cena um personagem de grande influência
fortalecimento da classe média;
na história da primeira metade do século
XX: Adolf Hitler. criação de um exército popular;
reforma agrária;
O Plano Dawes foi um conjunto de centralização do poder político com um
medidas de ajuda econômica elaborado governo forte;
pelo banqueiro americano Charles G.
punição aos usurários;
Dawes, após a Primeira Guerra Mundial,
com o intuito de reerguer a economia participação dos trabalhadores nos
alemã, dando assim ao país a possibili- lucros das empresas.
dade de pagar as dívidas assumidas no
Quando Hitlervislumbrou uma chance
Tratado de Versa lhes.
real de chegar ao poder, agiu politicamente
de acordo com as necessidades, fazendo
concessões aos aliados, especialmente ao
A ascensão de Hitler exército e aos grandes empresários.
Nascido em 20 de abril de 1889, na A exemplo de Mussolini, ele criou, em
cidade de Braunau, que pertencia ao Im- 1921, uma organização paramilitar, Sturm-
pério Austro-Húngaro, Hitler era filho de abteilungen - SA (Divisões de Assalto), que
um funcionário público e de uma dona praticava atos violentos contra os adversá-
de casa. De classe média baixa, enfrentou rios políticos. Em 1925,0 Führer (palavra
dificuldades econômicas e foi profunda- que significa "chefe", "líder"), como era
mente influenciado por círculos antissemi- chamado, criou a Schutzstaffel -55 (Tropas
tas e germanófitos, que se multiplicavam de Proteção), cujos membros formavam
na sociedade austríaca.
Quando estourou a Primeira Guerra A Glossár
Mundial, Adolf Hitler vivia em Munique, Germanófilo: aquele que tem extrema admiração
onde se alistou como voluntário no exér- pela Alemanha, por sua população e suas caracte-
cito alemão, pois menosprezava o Estado rísticas étnico-culturais.
multiétnico do Império Austro-Húngaro. Usurário: agiota, aquele que empresta dinheiro a
Com a derrota alemã, atribuiu o fracasso juros.
aos comunistas e aosjudeus.

43
um grupo de elite encarregado de proteger o alto
escalão do Partido Nazista. O homem que desconhece e menospreza as
Em novembro de 1923, Hitlertentou imitara leis raciais, em verdade, perde, desgraçadamen-
te, a ventura que lhe parece reservada. Impede a
Marcha sobre Roma de Mussolini, desencadeando
marcha triunfal da melhor das raças, com isso es-
o Putsch da Cervejaria, em Munique, numa tentati-
treitando também a condição primordial de todo
va de tomar o poder na região da Bavária, mas não
progresso humano. No decorrer dos tempos, vai
obteve sucesso. Uma segunda tentativa de tomada caminhando para o reino animal indefeso, embo-
de poder foi a Marcha para Berlim, abortada em ra portador de sentimentos humanos.
razão de um tiroteio no qual morreram 16 nazistas
HITLER, Adolf. Minha luta. São Paulo: Centauro, 2001. p. 214-215.
e três policiais. Adolf Hitler e os demais líderes
do movimento foram presos. Condenado a cinco
anos de prisão, o Führer cumpriu apenas nove Com a estabilização da economia, a par-
meses, na fortaleza de Landsberg. Nesse período, tir de 1924, os partidos radicais perderam força.
iniciou a produção de sua obra autobiográfica Apesar de toda a propaganda e do carisma de Hi-
Mein Kampf (Minha luta), na qual expôs ideias tler, os nazistas tiveram desempenho eleitoral in-
racistas, belicistas e expansionistas. significante até 1930. Contudo, a crise econômica
mundial de 1929, iniciada com a quebra da Bolsa
de Valores de Nova York, pôs fim a um período de
Tudo que hoje admiramos nesta terra - ciência relativa prosperidade, pois a Alemanha dependia
e arte, técnica e invenções - é o produto criador
financeiramente dos Estados Unidos. As falências
somente de poucos povos, talvez, na sua origem,
e o desemprego deram um fôlego novo aos parti-
de uma única raça. Deles também depende a es-
tabilidade de toda esta cultura. Com a destruição dos extremistas: de um lado, à direita, os nazistas;
desses povos baixará igualmente ao túmulo toda a do outro, à esquerda, os comunistas.
beleza desta terra. Por mais poderosa que possa ser Observe os números na tabela a seguir e re-
a influência do solo sobre os homens, seus efeitos flita sobre a ascensão do Kommunistische Partei
sempre hão de variar segundo as raças. [ ... ] Deutschlands (KPD) e do Nationalsozialistische
Deutsche Arbeiterpartei (NSDAP).

ELEIÇÕES LEGISLATIVAS SOB A REPÚBLICA DE WEIMAR (NÚMERO DE ASSENTOS)

<P L:SPD DDP BVP DVP DN\/P NSDAP


trjm

19 janeiro 1919 - 22 166 75 91 - 19 44 -

6junho1920 4 84 102 39 64 21 65 71 -

4 maio 1924 62 - 100 28 65 16 45 95 32

7 dezembro 1926 45 - 131 32 69 19 51 103 14

20maio1928 54 - 153 20 62 16 45 73 12

14 setembro 1930 77 - 144 20 68 19 30 41 107

31 julho 1932 89 - 133 4 75 22 7 37 230

6 novembro 1932 100 - 121 2 70 20 11 52 196

KPO Partidc Comurasla da Alemanha 13,1P Partido Populista Ovaro

USPD Partido Sacial.Demccrata Independente da Alemanha FVP Partido Populista

SPD Partido Social-Democrata W1,1*P Partido Nacional Alerno

DDP Partido Dernoc,ata Zeotrum - Centro Catolmco NS[J5P Partido Naconal-Soraalmsta dos Trabalhadores Alemàes IParoo Nazislal

Fonte: CARCL,Ann; CARRiGJLS, Jeur:; IVFME, Mra. Resumo de histõria do século XX I.isoa Plâtar:c. 1999. p. 16.

_44
O crescimento do Partido Nazista deveu-se a quando já estavam no
Em março de 1933,
vários fatores, sobretudo à crise econômica e so- poder e comandavam os recursos do Estado, os
cial. O medo do comunismo levou muitos a vo- nazistas obtiveram 43,9% dos votos, passando a
tar nos nazistas como um mal menor, e a falta de ocupar 288 dos 647 assentos do Reichstag.
união entre as forças de esquerda teve também um Contando com o apoio do Partido de Cen-
peso muito grande. A propaganda nazista era efi- tro Católico (Zentrum), os nazistas obtiveram os
ciente, bem como a determinação e o carisma de votos necessários para aprovar a Lei de Exceção,

Hitler. Tudo isso foi muito relevante no processo que deu a base legal para a ditadura hitlerista.
Novamente, o Reichstag foi dissolvido. Em no-
que os levou ao poder.
vembro de 1933, sem adversários, os nazistas
Em 1932, Hitler perdeu as eleições presiden-
elegeram um Parlamento que aprovaria sem dis-
ciais para Paul von Hindenburg, mas teve uma vo-
cussão atos do Poder Executivo. Os partidos de
tação expressiva, conseguindo pouco mais de 37%
esquerda foram colocados na ilegalidade, sob a
dos votos. Em janeiro de 1933 foi convidado pelo
alegação de traição; já os de centro-direita foram
presidente da República para formar um governo
cooptados pelos nazistas ou então obrigados a
de coalizão. Além do próprio Hitler como chance-
se autodissolver.
ler, havia mais dois outros nazistas no gabinete.
No poder, Hitler dissolveu o Parlamento
(Reichstag) e convocou novas eleições. Em 27 de A violência contra a esquerda era agora per-
fevereiro de 1933 ocorreu o incêndio do prédio petrada com plena cobertura jurídica. [...1 em
do Reichstag, cuja autoria foi atribuída aos co- torno de 500 a 700 oponentes políticos foram
munistas, o que proporcionou ao regime o pre- mortos na onda de terror que dominou a Ale-
texto para investir contra o Partido Comunista e
manha durante os seis meses subsequentes. Os
deputados e candidatos comunistas foram pre-
suspender suas liberdades civis em plena campa-
sos antes do dia da eleição. O Partido Comu-
nha eleitoral. nista não foi oficialmente dissolvido até depois
da eleição, a fim de evitar a possibilidade de
que os eleitores comunistas transferissem seu
apoio ao SPD (Sozialdernokratische Deutsche
Arbeiterpartei). A prisão dos candidatos comu-
nistas contribuiu para tornar possível a maioria
de dois terços no Reichstag, de que Hitler pre-
cisava para ter poderes ditatoriais.
STACKEL8ERG, Roderick.
A Alemanha de Hitler: origens, interpretações e legados.
Rio de Janeiro: Imago, 2002. p. 147.

Hitler assinou com a Igreja Católica um


acordo pelo qual os clérigos deveriam abster-se
de participar de qualquer atividade política. Em
contrapartida, as propriedades eclesiásticas não
seriam tocadas e a Igreja poderia exercer normal-
mente suas funções paroquiais.
Em 1934, Hitler foi pressionado pelo exército

,.
e pelos grandes empresários para que controlasse
a SA, que se tornara poderosa demais. O Führer,

~m . ..

Adolt Hitler descendo as escadas do paláca presidencial após ter sido


eleito chanceler do Reich pelo presidente Hindenburg, 30 jan. 1933.
então, ordenou o assassinato de antigos compa-
nheiros, como Ernest Rhm, no episódio que fi-
cou conhecido como a Noite dos Longos Punhais.

45_
Com a morte de Hindenburg, em agosto de O ministro da Propaganda -joseph Goebbels -,
1934, Hitler fundiu os cargos de presidente e de por meio do cinema, do rádio, das artes e das
chanceler, tornando-se também supremo coman- celebrações públicas, contribuía para que muitos
dante do exército. Graças às melhorias econômicas, alemães acreditassem estar vivendo um período de
a popularidade do regime - e, sobretudo, de seu renascimento nacional.
principal líder - aumentou extraordinariamente.

rOrgafflzando ideias .

Analise o texto e a imagem, depois faça o que se pede.

A política como "espetáculo"

A chave da organização dos grandes espetáculos era converter a própria multidão em peça essencial
dessa mesma organização. Nas paradas e desfiles pelas ruas ou nas manifestações de massa, estáticas, em
praças públicas, a multidão se emocionava de maneira contagiante, participando ativamente da produção
de uma energia que carregava consigo após os espetáculos, redistribuindo-a no dia a dia, para escapar à
monotonia de sua existéncia e prolongar a dramatização da vida cotidiana.
[ ... ] O impacto da política na rua em forma de espetáculo visava diminuir os que se encontravam fora do
espetáculo, segregá-los, fazê-los sentirem-se fora da comunidade maravilhosa a que deviam pertencer. [...]
Cada acontecimento era preparado minuciosamente pelo próprio Hitler. Cada entrada em cena, a mar-
cha dos grupos, os lugares dos convidados de honra, a decoração geral, flores, bandeiras, tudo era previsto.
Aos poucos, a forma foi sendo definida, os acontecimentos ganharam o sentido de um ritual religioso - um
ofício -, que se manteve imutável em sua forma. Florestas de bandeiras, jogos de archotes, a multidão dis-
posta disciplinarmente, a música envolvente, os canhões de luz [..j.
LENHARO, Atcir: Nazismo: o lriunfo da vontade'.
E
...........
.. . .
OUR ES SE
São Paulo: Álica, 1998. p. 39 e 41.

jU ST14Tj0 1. Descreva a imagem.

-lá semelhanças entre a imagem e a des-


crição dos comícios nazistas feita no texto?
Quais?

Por que o autor afirma que a política nazista,


em forma de espetáculo, fazia com que as
pessoas carregassem uma energia conta-
qionte" para seu dia a dia? Justifique.

Com base na descrição do texto e da imagem,


responda: De que maneira as pessoas que
não participavam dos rituais promovidos pelo
governo nazista se sentiam? Explique.

S. Por que o autor relaciona os espetáculos


nazistas a rituais religiosos?
Página da revista francesa Lillustration, publicada em 26 Íev. 1938.
A fotografia mostra a reação da audiência a um discurso proferido por
Hitler no salão principal do famoso edificio Opera KroIl.

46
O Estado nazista procurou aplicar uma polí-
A discriminação tica de domínio racial por meio de leis eugênicas
no nazismo que, de acordo com suas crenças, visavam melho-
rar a qualidade do que chamavam de raça pura,
Assim que chegaram ao poder, os nazistas
ou seja, os alemães.
fizeram um grande expurgo no serviço público.
Durante o nazismo, a eugenia foi usada como
judeus, homossexuais, social-democratas, com u-
controle populacional. Assim, mais de 400 mil
nistas e todos os que criticassem o regime eram
pessoas (com doenças mentais, algum tipo de
demitidos ou presos. As escolas e universidades
deficiência, doenças hereditárias ou antecedentes
foram duramente atingidas. Professores e pes-
criminais) foram mortas ou esterilizadas em nome
quisadores qualificados - Albert Einstein, por
da superioridade da "raça ariana". As leis eugê-
exemplo - emigraram para outros países, espe-
nicas proibiam o contato sexual de alemães com
cialmente os Estados Unidos. O clima de terror
judeus e o casamento de pessoas com transtornos
era tal que joseph Goebbels organizou uma ação
mentais, doenças contagiosas ou hereditárias.
em que milhares de livros de autores judeus, es-
A eutanásia involuntária - ou a morte mise-
querdistas, liberais - enfim, toda obra qualifica-
ricordiosa, como a chamavam - não era crime e
da como "subversiva" e "degenerada" - foram
foi muito praticada pelo regime nazista. Pessoas
queimados em praça pública.
com doenças ou fraquezas físicas e mentais fo-
Em 1935 foram outorgadas as Leis de Nurem-
ram vítimas de um programa secreto de elimina-
berg, que proibiam o casamento e a coabitação
de judeus e alemães. Os judeus foram proibidos ção, por serem consideradas um peso para a so-

de exercer certas profissões, como a medicina. ciedade produtiva. Em torno de 200 mil pessoas
Em síntese, passaram a sofrer forte segregação. pereceram em decorrência desse programa secre-
Um decreto de 1937 permitia a prisão de ciganos to de eutanásia.
com base em um suposto "comportamento antis- O regime nazista só chegou ao fim em 1945,
social". Antes ainda de começar a Segunda Guerra quando, como consequência das fortes investi-
Mundial, judeus, comunistas, ciganos e outros das expansionistas na Segunda Guerra Mundial,
considerados inimigos do regime foram enviados a cidade de Berlim foi ocupada por tropas sovié-
para o campo de concentração de Dachau. ticas. Num ato de desespero, Hitler cometeu sui-
cídio antes que seus domínios fossem tomados.
Assim como ele, outros líderes nazistas fizeram o
mesmo, o que culminou, ainda no mesmo ano,
na rendição oficial da Alemanha, que teve seu ter-
ritório dividido entre forças socialistas e capitalis-
tas envolvidas no conflito.

Eugenia é o controle da reprodução humana


para manter as características desejáveis e eli-
minar as consideradas indesejáveis ou inferiores.

A u;jH

Eutanásia: morte não natural, serena e sem


dor de pessoas com doenças incuráveis. Esse
tipo de morte não tem amparo legal.
Expurgo: eliminação de pragas ou de opo-
sitores. No texto faz referência à exclusão de
lo dO Paitido Nazista nublado Não confie nas
pessoas contrárias ao governo nazista alemão.
raposas e nos judeus, publicado aproximadamente em 1934. Na imagem
vemos um professor judeu e crianças judias sendo expulsos da escola.

Os reqmes tntlitzo 47
Organizando ideias

Em grupo, leia os textos e, com base nas A questão central, não respondida, é: por quê? [ ... J
informações neles apresentadas, bem como No cerne desse aparente mistério existia urna vi-
nas explicações fornecidas até agora, responda são de mii ndo ( Welt(znscha u ung) milenar, segundo
às questões. Depois, organizem uma mesa- a qual os "judeus" eram a fonte de todos OS males
-redonda para apresentar suas respostas e - especialmente o internacionalismo, o pacifismo,
debater o assunto. a democracia e o marxismo - e ainda responsáveis
pelo advento do cristianismo, do iluminismo e da
Texto 1
maçonaria. Foram tachados de "agentes de decom-
Gestapo - ou Gebeime Staatspolizei - posição" e "degeneração racial". Foram identifi-
Polícia secreta do Estado cados com a fragmentação da civilização urbana,
com o ácido solvente do racionalismo crítico e com
A Gestapo se aperfeiçoou nos requintes de per-
o relaxamento da moralidade. Estariam por trás do
versidade num Estado totalitário e beligerante. A
"cosmopolitismo desenraizado", característico do
intolerância de qualquer expressão de desacordo
capital internacional e da ameaça de urna revolução
levada ao paroxismo da repressão e do ódio. Com
mundial. Em suma, OS judeus eram o Weltfeind - o
todos os métodos e subterfúgios validados em
"inimigo do mundo", contra o qual o nacional-so-
nome de um Estado que se presumia detentor de
cialismo definia a sua grandiosa utopia racial, um
todos os poderes políticos, sociais e religiosos, fa-
Reich de mil anos.
zendo do ser humano um simples jogucte de pseu-
WISTRICH, Roberi S. Hitler e o Hotocausto.
doideais nacionais, um mero autômato inserido na
Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. p. 13-14.
engrenagem do Estado todo-poderoso.
Além disso, a Gestapo não era somente instru- Qual era o papel da Gestapo no Estado na-
mento de um Estado ditatorial, era especialmente zista?
a máquina predisposta para forjar terror e ódio na Há exemplos semelhantes nas sociedades
mente humana contra povos, raças e religiões. Tudo atuais, ou seja, organizações militares ou
em favor do Estado, do sistema do nazismo [ ... ]. policiais sendo usadas para coação e punição
BUTLER. Rupert. A Gestapo: a história da polícia secreta de sem limites? Justifiquem.
Hitler. 1933-1945. So Paulo: Larousse do Brasil. 2008. p. 5.
E na sociedade civil, há grupos que praticam
Texto 2
esse tipo de violência? Exemplifiquem.
O Holocausto
O regime nazista recebia muito apoio das
O Holocausto constituiu um crime sem precedente massas e de alguns setores poderosos, como
contra a humanidade, visando ao extermínio de toda a Igreja Católica, por exemplo. Elaborem
a população judaica da Europa, até o último homem, hipóteses que expliquem esse apoio.
a última muller, a última criança. Tratava-se de uma
S. Entre as ações nazistas, estava a segregação
política definida, arquitetada, por parte de um Estado
racial, que o Estado levou a cabo com leis
poderoso, o Reich nazista, que, com o propósito de des-
eugênicas. Qual era o objetivo dessas leis?
truir um povo, mobilizou todos os recursos disponíveis.
Os judeus não foram condenados à morte por causa O que significa Holocausto? Se julgar ne-
de crenças religiosas, nem de inclinações políticas. cessário, pesquisem em outros livros e na
'l'ampouco configuravam uma ameaça econômica ou internet para responder.
militar ao Estado nazista. Não forarri mortos pelo que
Relacionem o Holocausto à eugenia.
fizeram, mas pelo simples fato de existirem.
Nascer judeu, aos olhos de Adolf Hitler e do regi- De acordo com o texto 2, em que ideia os na-
me nazista, significava, apriori, não pertencer ao gé- zistas baseavam seu preconceito em relação
nero humano e, portanto, não ter direito à vida. [ ... ] aos judeus?

48 tuto2
2 Viajando pela história
As mulheres e os jovens O papel das mulheres na sociedade alemã
no nazismo oferece outro exemplo da contradição entre
ideologia e prática. Segundo a ideologia na-
Apesar de o caráter militar da sociedade nazis- zista, a estabilidade do Estado baseava-se na
ta estar relacionado apenas aos homens, o regime se unidade familiar, a esfera especial reservada
valeu de medidas especiais para conseguir o apoio às mulheres pela natureza e pela providên-
total da população, incluindo a simpatia das mulhe- cia. Como outros grupos conservadores, os
res e a absorção dos ideais nazistas pelas crianças. nazistas procuravam ressuscitar e fortalecer
a noção tradicional de que o lugar das mu-
Em síntese, as mulheres alemãs deveriam ser
lheres era em casa. Kinder, Kirche und Küche
mães e boas donas de casa. Aquelas que tivessem
(crianças, igreja e cozinha) representavam os
muitos filhos eram valorizadas por meio de gene- limites tradicionais dos domínios da mulher.
rosos benefícios. Campanhas incentivavam os ca- A esfera pública da política e das profissões
sais a ter mais de dois filhos. O aborto foi restrito era reservada aos homens. Os nazistas con-
a pouquíssimos casos, e o controle da natalidade sideravam que a emancipação política das
considerado antipatriótico. O divórcio era facili- mulheres era um erro. Não havia mulheres
tado para os casais que não tinham filhos, e as ocupando posições de liderança no governo
ou no partido, exceto em organizações des-
mães solteiras eram protegidas. Essas medidas
tinadas especialmente às mulheres, como a
produziram grande aumento da natalidade.
União das Mulheres Nacional-Socialista (Na-
As necessidades econômicas fizeram com
tionalsozialisiische Frauenschaft) ou a Liga
que cada vez mais mulheres tivessem de ingressar das jovens Alemãs (Bund Deutscher Madel).
no mercado de trabalho. Em 1939 havia 7 mi-
STACKELBERG, Roderick. AÂtemanha de HitLer:
lhões trabalhando fora de casa, cifra que subiu origens, interpretações e fegados.
para 14,5 milhões em 1944, em decorrência do Rio de Janeiru: Imago, 2002. p. 182.

esforço de guerra.

O regime nazista também dispensou especial


atenção à juventude. A educação, para Hitler, de-
' veria gravar no cérebro e no coração dos jovens o
sentimento de fidelidade e obediência ao Führer.
Com o intuito de imprimir neles a lealdade
ao regime, foi criada na Alemanha a juventude
Hitlerista, uma instituição paramilitar controlada
pelo partido nazista que treinava crianças e ado-
lescentes entre 6 e 18 anos para atender aos inte-
resses ideológicos do partido.
Tendo começado pequena, a organização se
fortaleceu e o alistamento dos jovens tornou-se
obrigatório a partir de 1936, numa medida que
procurava unificar a ideologia do povo alemão,
"ifdj
naz oioco i
em nome de uma "educação comum".
Meninas alemas se exercitam diante de espectadores em um comicio da
Juventude Hitierista durante a Segunda Guerra Mundial. c. 1940.A aptidão
fisica estava entre os ideais para a feminilidade na ideologia alemã.

HHH:H 49
Fascismo em Portugal e na Espanha
Nas décadas de 1920 e 1930 foram organi- aqueles que tinham interesses na manutenção do
zados partidos fascistas em diversos países eu- império colonial e pelos camponeses, e reprimiu
ropeus, e até mesmo em outros continentes. A todo tipo de oposição ao regime. Prisões arbitrárias,
maioria desses partidos não chegou ao poder ou desaparecimento de pessoas, assassinatos e torturas
só o conseguiu durante a Segunda Guerra Mun- foram práticas comuns. Transformou seu partido,
dial com o apoio de tropas nazifascistas; por a União Nacional - o único permitido -, em uma
exemplo, os da Noruega e da Croácia. De modo organização hierárquica e burocrática. Para prote-
geral, fora da Itália e da Alemanha, poucas agre- gero regime, organizou a Polícia Internacional e de
miações fascistas alcançaram sucesso eleitoral. Defesa do Estado (Pide) e, nos moldes dai uventude
Nos casos de Portugal e da Espanha, regimes Hitlerista, criou a Mocidade Portuguesa - cujos
com características fascistas chegaram ao poder, membros usavam camisas verdes - e uma organiza-
mas não pela via eleitoral. ção paramilitar chamada Legião Portuguesa.

O satazarismo
No começo do século XX, Portugal adota-
va a monarquia constitucional como forma de
governo. O país era atrasado econômica e so-
cialmente, e mantinha com dificuldade um de-
cadente império colonial. A Proclamação da
República, em 1910, não alterou substancial-
mente esse quadro. As lutas sociais se acirraram
e houve enfrentamento cada vez maior entre
o regime republicano laico e a Igreja Católica.
Nesse contexto de instabilidade, em 1926 foi
deflagrado um golpe militar, que pôs fim ao Es-
tado liberal português.
Convidado pelos militares para exercer o
cargo de ministro das Finanças, o professor de
Economia Política da Universidade de Coimbra,
Antônio de Oliveira Salazar, acabou se tornando
presidente do Conselho de Ministros. Durante o
tempo em que permaneceu na função, Salazar
instituiu uma série de medidas econômicas favo-
ráveis à grande burguesia portuguesa, o que lhe
garantiu forte apoio e possibilitou sua ascensão
ao governo do país em 1932.
Salazar redigiu então uma nova Constituição,
na qual instituía um regime corporativo e naciona-
lista semelhante ao que Mussolini acabara de im-
plantar na Itália. ;J
Obcecado pelas glórias portuguesas e avesso -. -. ,, •
• -
à modernização do país, Salazar era apoiado pela •.. .- ..2
•. •

Igreja, pelo exército, pelos banqueiros e industriais, ..


Membros da Mocidade Portuguesa em marcha durante feriado nacional.
pelas oligarquias de proprietários de terras, por
Portugal maio de 1936.

50
Apesar de admirar Hitler e Mussolini e de ha-
ver apoiado o general Francisco Franco durante a durante a campanha de propaganda eleitoral
do general Humberto Delgado, em 1958, que
Guerra Civil Espanhola, Salazar manteve seu país
obteve uma adesão de grande parte da pequena
neutro durante a Segunda Guerra Mundial. Após o
e média burguesia urbanas. [As eleições foram
fim do conflito, as autoridades dos Estados Unidos
fraudulentas e o general Delgado foi derrotado.] O
admitiram Portugal na Organização do Tratado do abalo sofrido pelo regime foi tão forte que, após a
Atlântico Norte (Otan) e apoiaram a ditadura de Sa- campanha, a Constituição Política foi modificada,
lazar, pois temiam uma aproximação do país com passando o presidente da República a ser eleito
a União Soviética no caso de queda do regime. por um restrito colégio eleitoral, para evitar fu-
turas crises. A alteração, proposta pelo Governo,
despertou oposições na Assembleia Nacional, mas
A Organização do Tratado do Atlântico não deixou por isso de ser aprovada.
Norte (Otan) foi uma aliança criada em 1949
SARAIVA, José Hermano. História concisa de Portugal.
sob a liderança dos Estados Unidos, cujo prin- Lisboa: Pubticações Europa-América, 2007. p. 363-364.
cipal objetivo era garantir a cooperação política
e militar entre os países envolvidos e inibir o
avanço do bloco liderado pela União Soviética,
grande adversária ideológica dos Estados Uni- Foi apenas com a morte de Salazar, em 1970,
dos no período. que o regime se enfraqueceu. Seu fim definitivo
ocorreu em 1974, quando um amplo movimento
liderado pelas Forças Armadas - a Revolução dos
Por ter imposto seu governo, Salazar teve de
Cravos - iniciou o processo de redemocratização,
enfrentar uma série de agitações internas. Em ou-
que restabeleceu o pluripartidarismo e a liberdade
tubro de 1936 conteve a Revolta dos Marinheiros
de expressão, implantando uma série de reformas
ou Motim dos Barcos do Tejo, na qual militares
sociais e pondo fim ao império colonial.
da marinha, ligados ao Partido Comunista Portu-
guês, tentaram, por meio de manifestações diver-
sas, a implantação da república em Portugal. Os O franquismo
revoltosos foram descobertos e duramente repri-
No início da década de 1920, a Espanha era
midos pelas forças salazaristas.
um país predominantemente agrário, onde 70%
da população vivia no campo e praticava uma
A oposição ao regime cresceu no mesmo ritmo agricultura de baixa produtividade. As poucas
que a expansão da classe média. As restrições aos indústrias concentravam-se no País Basco (meta-
direitos políticos, que tinham sido desejadas e lurgia) e na Catalunha (têxtil).
a seguir toleradas por uma classe média de raiz A Crise de 1929 agravou a situação econô-
agrária em fase de depressão econômica (que via mica no país, acirrando a disputa entre os setores
nas restrições uma política da ordem), começaram
de esquerda e de direita. Em 1931, em meio a
a ser sentidas como imposições insuportáveis pela
agitações políticas e sociais, foi implantado um
nova classe média industrial e mercantil em fase de
governo republicano com o objetivo de mudar
expansão. No novo quadro de valores, o conceito
de ordem era substituído pelo de liberdade, o de panorama das práticas políticas espanholas
segurança pelo de progresso. O desejo de liberdade e resolver os graves problemas econômicos.
marcou, a partir de 1945, quer a burguesia favo- Uma frente que reunia agremiações políticas
rável, quer a hostil ao regime; à primeira inspirou de centro-esquerda implantou uma série de re-
projeto da liberalização, à segunda o desejo da formas, como a Lei Agrária, que possibilitava a
revolução, embora uma revolução burguesa que distribuição de terras aos camponeses; o ensino
não fosse muito além do regresso às formas do
laico; a Lei do Divórcio e uma legislação social
parlamentarismo democrático e da garantia dos
inovadora. A Igreja Católica e o exército, insti-
direitos políticos de reunião e expressão. Essa
tuições conservadoras, fizeram forte oposição a
ideia de liberdade revelou todo o seu dinamismo
essas medidas. Os anarquistas e os comunistas,

51
que consideravam as reformas tímidas, do outro, os falangistas, que também se
também se opuseram ao que chamavam autodenominavam nacionalistas, represen-
de "Estado democrático burguês". tavam as forças conservadoras.
Em 1933, a Confederación de De- A Guerra Civil Espanhola acabou se
rechas Autónomas (Ceda), composta de internacionalizando. Hitler e Mussolini
vários grupos católicos monarquistas e re- apoiaram os nacionalistas com armas,
publicanos, venceu as eleições, formou um aviões, recursos financeiros e milhares de
governo que obstruiu as reformas e reprimiu homens, liderados por membros do exér-
com violência operários e camponeses. Em cito - em especial por Francisco Franco.Já
1936, a Frente Popular, reunindo partidos os republicanos receberam ajuda da URSS
de esquerda, obteve maioria no Parlamen- e, em menor escala, da França. Milhares de
to e pôde formar um novo governo, que jovens de vários países, incluindo o Brasil,
restabeleceu a política de mudanças. Essa formaram as Brigadas Internacionais para
medida amedrontou setores da sociedade defender a Repiiblica Espanhola. Houve,
espanhola, especialmente o exército, que por exemplo, combates entre italianos
iniciou uma série de insurreições, provocan- fascistas, que apoiavam os nacionalistas,
do uma guerra civil. De um lado, os repu- e italianos comunistas, que lutavam em
blicanos reuniram as forças progressistas; defesa da causa republicana.

Fotogratia que •.,


mostra um grupo
de simpalizantes
republicanos
(à esquerda)
rendido
pelas tropas
nacionalistas ,_-
(à direita), em
uma vila no
arredores de
Sevilha. durant . -. ;---v-
a Guerra Civil -1-
Espanhola
em 1936.

Os nacionalistas estavam em van- tas recebessem o apoio de muitos que, a


tagem, pois contavam com um exército princípio, eram simpáticos aos republi-
experiente e grande apoio dos alemães canos. Os embates ocorriam entre co-
e italianos. Já os republicanos careciam munistas e anarquistas, e mesmo entre
de materiais e estavam bastante dividi- membros do Partido Comunista Espa-
dos. Além disso, os anarquistas queriam nhol, subserviente a Stalin, e militantes
realizar uma profunda revolução social do Partido Operário Unificado Marxis-
concomitantemente à guerra civil. Essa ta (Poum), independente e próximo das
radicalização fez com que os nacionalis- ideias deTrotski.

52
Internacionairnente, foi uma versão em minia- da direita se mostrou muito mais efetiva que a da
tura de uma guerra europeia, travada entre Estados esquerda. Terminou em derrota total, com várias
fascistas e comunistas - esses últimos marcadamente centenas de milhares de mortos, várias centenas
mais cautelosos e menos decididos que os primeiros. de milhares de refugiados nos países que quiseram
As democracias ocidentais continuaram não tendo recebê-los [... 1.
certeza de nada, a não ser de seu não envolvimento. HOBSBAWM. Eric. Era dos Extremos: o breve século XX -
Internamente, foi uma guerra em que a mobilização 1914-1991. São Paulo: Companhia das Leiras, 2007. p. 162.

Os nacionalistas venceram a guerra em 1939 O direito à liberdade foi intensamente violado


Francisco Franco governou a Espanha até a morte, na Espanha durante a guerra e, principalmente, no
Esquivou-se de apoiar diretamente Hitler
em 1975. governo franquista. O número de mortos na guerra
durante a Segunda Guerra Mundial e assim se tor- civil varia nas fontes historiográficas, oscilando entre
nou aliado de confiança dos Estados Unidos. Teve 500 mil e 1 milhão de vítimas. O governo franquista
o beneplácito da Igreja, que lhe agradecia por ter caracterizou-se por uma economia arruinada. A
"salvado a Espanha do comunismo". Franco con- população conviveu com diversos problemas es-
tou com o apoio dos grandes latifundiários do sul, truturais, como escassez de alimentos, diminuição
dos fazendeiros e pequenos proprietários católicos da distribuição de combustível e péssimo sistema
do norte da Espanha e das classes proprietárias e de transportes. Além disso, o regime torturava,
industriais urbanas. prendia e matava seus opositores, considerados
inimigos da pátria.

[ ... ] A ditadura do general Franco foi uma das Espanholi não se deveria tentar integrar e mobilizar
mais cruéis do século XX na Europa. A fraqueza do as classes operárias. O inimigo tinha de ser derro-
Partido Fascista Espanhol não tornou a Espanha tado, preso ou aterrorizado em submissão como
Nacionalista menos repressiva ou vingativa. Na os nativos coloniais outrora. Uma Igreja cruzada,
verdade, deu-se o oposto. A perseguição brutal da por sua vez, abençoou o terror dominante, como
população local foi bem além da Alemanha nazista no período da Reconquista.
e da Itália de Mussolini. Ao contrário dos Esta- SALVADÓ, Francisco J. A Guerra Civ;t Espanhola.
dos fascistas, com a ordem pública nas mãos dos Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 244.
africanistas, [soldados que serviram no Marrocos

O fim do franquismo ocorreu em razão da passou por um processo de transição do governo


morte de Francisco Franco, que foi substituído autoritário franquista para um sistema político
pelo rei Juan Carlos 1. A partir de então, o país com base na democracia parlamentar.

Organizando ideias
Caracterize o sal.azarismo em Portugal.
O que há de comum entre o satazarismo e os regimes totalitários fascista e nazista?
Por que ocorreu a Guerra Civil Espanhola? Que grupos estiveram envolvidos no conflito?

Descreva o franquismo na Espanha.

Beneplácito: aprovação, consentimento.

53—
Expressões culturais do neonazismo
A permanência de nazistas em cargos públi- Os skinheads foram incentivados pela dis-
cos ou em empresas privadas, após a Segunda seminação da xenofobia advinda da perda da
Guerra Mundial, contribuiu para que, com o influência europeia nas ex-colônias. O aumento
passar dos anos, grupos nacionalistas resga- da população mundial - aliado às crises do ca-
tassem o nazismo e o adaptassem a um novo pitalismo e à contínua migração de povos das
contexto histórico e às características específi- ex-colônias localizadas na África, no Oriente
cas dos países em que estavam presentes seus Médio e no Golfo Pérsico em direção aos países
agentes remanescentes. Essa reorganização se europeus industrializados - só fez acirrar o
chama neonazismo. sentimento nacionalista, que encontrou abrigo
Na Europa, o advento do neonazismo ficou em partidos conservadores. Mesmo que de
marcado pela figura dos skinheads de extrema- forma não declarada, é notável o neonazismo
-direita. O grupo foi formado nos anos 1960 nos comportamentos xenófobo, homofóbico e
por jovens de subúrbios operários ingleses, racista e na adoção explícita de símbolos que
que raspavam a cabeça e apreciavam gêneros remetem à ideologia nazista.
musicais como o soul, o ska e o reggae. No geral, No Brasil, muitos jovens, frustrados com
as manifestações culturais dos skinheads não as perspectivas oferecidas pelo país durante
continham elementos políticos, mas alguns a redemocratização, aproximaram-se dos ski-
radicais promoviam confrontos em estádios de nheads neonazistas. Esses grupos brasileiros
futebol e agressões a imigrantes. Esses radi- reproduziam o nacionalismo e o sentimento de
cais racistas assumiram o papel da militância fraternidade que o nazismo propagava, mas, no
jovem nos partidos neonazistas em formação início, não se identificavam com o ideal de segre-
na Inglaterra, cujo maior expoente foi o Na- gação racial, justamente porque contavam com
tional Front, o qual, apesar de não se intitular pessoas pardas e negras em sua composição.
neonazista, defende abertamente, ainda hoje, Aos poucos, contudo, os símbolos nazistas e o
a supremacia branca. racismo foram sendo incorporados por correntes
do movimento, principalmente no Sul do país,
que passaram a ter como alvo punks, negros,
judeus, homossexuais e nordestinos.

C II )iLi5S OuUOO oivícsmcso 1OL


de Marcha do Homem Branco, em Newcastle upon Matosas dc cunho nazmta encontrados com jovens de Itajai iSC e
Tyne (inglaterra), 2015. apreendidos pela Polícia Clvii. 2014.

-54
w

Na contramão das manifestações neonazistas recentes contra a imigração de refugiados para a Europa, torcedores de time alemão estendem
faixa em inglês com os dizeres: "Refugiados, sejam bem-vindos. Bremen (Alemanha), 2015.

Como são proibidas a articulação partidária


e a divulgação de simbologia nazista no Brasil,
a maior parte da ação dos grupos brasileiros
está restrita à esfera virtual, principalmente nos
fóruns de discussão, além da produção de fanzi-
nes ('revistas de fãs"). Ainda assim, às vezes são
noticiadas ameaças ou mesmo atos de agressão
física contra os alvos de neonazistas.
Atualmente, neonazistas por todo o mundo se
aproveitam da liberdade de expressão garantida
pelos governos democráticos para propagar
seus ideais. A internet tem papel decisivo na
disseminação de conteúdo neonazista, uma vez
que permite o anonimato.

Quais as principais ideias propagadas pelos


nrca do gitipo neonazista conhecido como neonazistas?
Movniento de Res:stência Nõrdico foi combatida por uma ativista, que,
sozinha, protestou contra dezenas de homens que caminhavam pelas
ruas da região central de Borlãnge, na Suécia. No mesmo dia, partidos
Converse com os colegas e responda: Em sua
políticos e uma organização sem fins lucrativos organizaram protestos opinião, é possível manipular as ações das
contra a xenofobia e o racismo no país.
pessoas por meio de discursos e ideologias?
Por quê?

55 -
O staLinismo
No começo do século XX, a Rússia era um
gigantesco império (mais de 22 milhões de quilôme- Os botcheviques eram um grupo político rus-
tros quadrados), multiétnico, predominantemente so formado por ex-integrantes do Partido Operá-
agrário e com resquícios feudais. A Igreja Orto- rio Social-Democrata Russo EPOSDR), fundado
em 1898. O POSDR se dividiu após um congres-
doxa endossava o regime, que era uma monarquia
so realizado em Londres em 1903,
dando origem
autocrática.
a dois grupos, os bolcheviques e os menchevi-
Durante o regime czarista, havia grande repres-
ques. Os bolcheviques eram a maioria do antigo
são por meio, principalmente, da polícia secreta - a partido, por isso passaram a ser assim conhe-
Okrana -, que investigava a vida de todos. Prisões cidos - o nome deriva de bolscir,stvó, em russo.
arbitrárias, torturas, execuções e exílios em regiões "maioria" -, e defendiam a revolução socialista e
remotas da Sibéria eram riscos constantes para a implantação da ditadura do proletariado, numa
aqueles que se opunham ao regime. Quanto aos aliança entre proletariado e camponeses.
judeus, eram vítimas de pogroms (ataques a deter-
minadas pessoas e aos seus ambientes, como casas
e empresas), na maioria das vezes com a conivência
do Estado. Milhões de camponeses que viviam na
miséria e uma classe operária combativa ambicio-
navam fazer mudanças políticas profundas.
Os fracassos na guerra com ojapão, em 1904-
1905, a difusão de ideias liberais e socialistas, as
derrotas na Primeira Guerra Mundial, a crise eco-
nômica, as desigualdades sociais, o descontenta-
mento das diversas nacionalidades com o crescente
processo de russificação do império e as falhas do
governo do czar Nicolau II foram alguns dos fatores
Vladimir lIitch Lénia em discurso no Primeiro Miversãrio da Revolução
que propiciaram as duas revoluções de 1917. Esse Boichevique na Praça Vermelha. Moscou (Rússia). 7 nov. 1918.
período ficou conhecido como Revolução Russa, e
caracterizou-se por uma série de conflitos liderados No poder, os bolcheviques tiraram a Rússia da
por manifestantes contrários à autocracia russa. guerra, dissolveram a Assembleia Nacional Consti-
A Revolução mostrou sua força em duas fases tuinte, perseguiram dissidentes, reprimiram grupos
distintas. Na primeira, a Revolução de Fevereiro, anarquistas e implantaram um regime de partido
Nicolau li, o último czar a governar, foi derrubado, único. Em meio a conflitos internos, os exércitos
que deu margem para o estabelecimento de uma contrarrevolucionários praticavam atos de violência
república de cunho liberal, representada por um contra os que apoiavam os bolcheviques, e estes,
governo provisório. Empossado, o governo libertou por sua vez, respondiam também com repressão.
políticos, deu liberdade à imprensa e convocou elei- Depois da morte de Lênin, ocorreu acirrada
ções para a formação de uma Assembleia Nacional disputa pelo poder entre LievTrotski (1879-1940)
Constituinte. Contudo, o novo governo manteve a e Josef V. Stalin (1879-1953). Stalin assumiu o
Rússia na guerra mundial, não realizou uma reforma poder e paulatinamente foi impondo um regime
agrária, nem satisfez às reivindicações da classe ope- repressivo. O culto da personalidade marcou o
rária. As derrotas nas frentes de batalha agravavam período de 1924 a 1953. Stalin era apresentado
a crise econômica e social. como "guia", "líder do proletariado mundial".
Já na segunda fase, a Revolução de Outubro, A coletivização das terras de maneira força-
Partido BoLchevique, liderado por Vladimir llitch da gerou grande onda repressiva. Críticos do regi-
Lênin (1870-1924), derrubou o Governo Provisório me eram condenados como "inimigos do povo",
e implantou um governo socialista soviético. em processos cujas provas eram fabricadas, e os

56
mais elementares direitos eram desrespeitados. Alguns historiadores discordam desses da-
Nos gulagui, campos de reeducação com traba- dos, alegando que o número de mortos foi infla-
lhos forçados, morreram mais de 8 milhões de do por pesquisadores anticomunistas. É inegável,
pessoas. Trotski, que vivia exilado no México, foi contudo, que houve grande repressão durante o
assassinado por um agente de Stalin, em 1940. governo de Stalin.
O fim do stalinismo foi ocorrendo aos pou-
Urna história completa dos expurgos de cos, uma vez que a própria população deixou de
1937-8 registrara a prisão de 1372392 pessoas, apoiar o governo quando percebeu sua imposi-
das quais 681 692 foram mortas. Os números ção por meio da força, mas foi derradeiro com
fornecidos por Kruchev ao plenário do Comi- a decisão do dirigente soviético Nikita Khrushev
tê Central, em 1957, eram um pouco diferentes: (1894-1971), que passou a denunciar os crimes
mais de 1500000 presos e 68 692 mortos (as di-
cometidos no governo de Stalin, assim como a
ferenças derivam dos critérios empregados pelos
criticar o "culto à personalidade" imposto pelo
estatísticos do KGB). Dados relativos a 1930-53
líder. Tais denúncias resultaram na reavaliação
indicam 3778 000 presos e 786 mil executados.
do stalinismo, que, por sua vez, iniciou o processo
LEWIN, Moshe. O sécuLo soviético: da Revolução de 1917 ao conhecido como "desestalinização".
colapso da URSS. Rio de Janeiro: Record. 2007. p. 139.

Pausa para investigação ..

No decorrer da história política mundial, uma das


principais marcas dos ditadores é o culto à personali-
dade, que se constrói e se solidifica por meio da propa-
ganda e da promoção política.
A personalidade de Stalin foi uma das mais cultua-
das. Por meio da exaltação da imagem desse ditador,
o Partido Comunista procurava abafar as ações que
provocaram a morte de milhares de pessoas em toda
a União Soviética durante o governo dele.
As imagens apresentadas revelam muito sobre o
culto à personalidade de Stalin. Observem-nas e façam
uma pesquisa em outros livros e na internet sobre como
esse culto influenciou, e ainda influencia, urna parcela
considerável da população russa.

i1/FE P R U h i UT Iiõ

Propaganda do governo stalinista de 1936.

~ 4(,Fr ens carregam retratos de Stalin (à


u[iuerda) e Lênin (à direita) durante
)rnemoração do Dia do Trabalho nas
ruas de Moscou. Rússia. 2014.

57-
Debate interdisciplinar

Arte totaLitária: estética a serviço do Estado


Durante os regimes totalitários, alguns ar- massa, receberam atenção especial. Para isso,
tistas se dedicaram, e foram até incentivados, a Adolf Hitler contou com Paul Josef Goebbels,
criar obras de acordo com os interesses do Estado. ministro da Propaganda. Foi de Goebbels a inicia-
Esse tipo de produção foi difundido pela cultura tiva de investir e intensificar a propaganda, cujo
de massa, uma vez que interessava a esses regimes objetivo era difundir as ideias antissemitas e de
que o maior número de pessoas tivessem acesso a "limpeza étnica", além de convencer a população
suas ideias. Foram elaboradas, então, políticas de da importância de a Alemanha participar da Se-
incentivo e de censura a todo tipo de arte. A inten- gunda Guerra Mundial.
ção era usar as manifestações artísticas - imagens, No cinema alemão, um dos nomes mais reco-
moda, design, cinema - para manipularas massas nhecidos é o de Helene Bertha Amalie Riefenstahl,
e propagar o regime. ou Leni Riefenstahl. Membro do Partido Nazista
As produções mais comuns foram aquelas de Alemão, ela dirigiu O triunfo da vontade, um do-
maior alcance das massas, como a publicidade e o cumentário que retrata o 60 Congresso do Partido
cinema, mas outras manifestações também foram Nazista e a fidelidade dos alemães a Adolf Hitler.
incentivadas; por exemplo, a arquitetura. Como Trata-se claramente de uma propaganda políti-
interessava promover o regime dominante, houve in- ca; contudo, sua estética acabou por influenciar
vestimento em construções monumentais, grandio- outras produções do gênero, levando esse filme a
sas, que transmitiam a ideia de poder e soberania. ser premiado na Feira Mundial de Paris, em 1937.

Arco do Inurtio cru forniato de M. preenchido com jovens e criarrçan da


Organização da Juventude Fascista, que aguardam a chegada do Duce.
durante sua visita á província deAosta (Itália). 1939.

Entre as características da estética totalitária


estão o hiper-realismo, as linhas retas (inspiradas
na Arte Clássica), a valorização do coletivo (na
pintura e na música) e do corpo atlético e viril.
No caso específico do nazismo, a estética foi
configurada para reproduzir o estereótipo ariano Hitler durante evento realizado pelo Partido Nazista, em Nuremberg
de beleza genuína com o intuito de incentivar a (Alemanha), 10 set. 1934.
A cena faz parte do filme O triunfo da vontade.
Na produção. a cineasta alterna doses com panorêniicas que exibem
manutenção da "pureza da raça". A publicidade
blocos homogêneos de pessoas realizando atividades em conjunto.
e o cinema, por serem meios de comunicação de A massa' e a unidade' eram importantes na estética totalitarista.

58
Outro tipo de expressão também inserido
na comunicação de massa foram os cartazes,
oriundos do ramo publicitário. Apropriado pela
estética totalitarista, esse veículo de comunicação
tornou-se bastante utilizado para a difusão dos
ideais políticos do Estado.

ooLor OZiSki cmrrirj (OOÇiO pSÍO 5 C055iíJÇOO Ou


à juventude, c. 1939. Esse tipo de mensagem, bem como as de incentivo e
apoio aos combatentes, era bastante recorrente.

Observe a imagem ao lado. Ela faz parte da campanha pu-


blicitária do documentário alemão O eterno judeu, filmado
e divulgado pelo regime nazista com o intuito de depreciar a
imagem dos judeus - retratados no filme como preguiçosos,
trapaceiros e aproveitadores -justificando assim a segregação
e a violência contra deles.

1. Aque ideia são associadas as imagens de judeus presentes


no cartaz?

2 Que elementos da imagem identificam essa ideia?

3. Que contraponto podemos identificar ao comparar o car-


taz do documentário com os cartazes de propagandas a
favor do regime nazista?

Póstr rio fjiVL! :' LJ LUOO. 1940.


--

Os rrcme; tC.jLO. 59 -
Responda no caderno
Testando seus conhecimentos

1. (Unifesp-SP) Pacto Molotov-Ribbentrop, respeitado


Nós queremos, um dia, não mais ver classes nem até o final da guerra.
castas; portanto comecem já a erradicar isso em vo-
cês mesmos. Nós queremos, um dia, ver no Reich
uma só peça, e vocês devem já se educar nesse sen-
E As principais lideranç
a s desse extermí-
nio foram Adolf Hitler e Joseph Stalin.

tido. Nós queremos que esse povo seja, um dia, obe- O nacional-socialismo era a ideologia
diente, e vocês devem treinar essa obediência. Nós do regime stalinista.
queremos que esse povo seja, um dia, pacífico, mas
A 'terra de sangue" não se limitou à
valoroso, e vocês devem ser pacíficos.
cronologia da Segunda Grande Guerra
Adotf Hitler, no Congresso Nazista de Nuremberg, 1933.
in: O triunfo da vontade, filme de Leni Riefenstahl, 1935. Mundial.

O trecho identifica algumas das caracterís- A sequência correta de preenchimento dos


ticas do projeto nazista, que governou a Ale- parênteses, de cima para baixo, é
manha entre 1933 e 1945. Entre elas, a: a) F -V - F - V.
Defesa da adoção do comunismo, ex- b)V - F- E- F.
pressa na ideia de supressão de classes. cl F - V - V - F,
Recusa do uso da violência, expressa na V - E - V - V.
ideia de povo pacífico. E- F- F - V.
Submissão total da sociedade ao Esta-
3. (PUC-RS) Responda à questão com base
do, expressa na ideia de obediência.
nas afirmativas a seguir, sobre o fascismo
Ampliação do acesso ao ensino básico,
italiano e o nacional-socialismo alemão.
expressa na ideia de autoeducação.
Eliminação das divisões nacionais, ex- 1. O desemprego, a inflação galopante, as gre-
pressa na ideia de Reich (Império). ves operárias, o total distanciamento entre o
povo e os representantes parlamentares fize-
2. (UFRS-RS) Leia o texto abaixo.
ram crescer a oposição aos governos liberais,
Em plena Europa, em pleno século XX, os re- tanto no caso da Itália como da Alemanha.
gimes nazista e soviético assassinaram cerca de 14
II. Ambos são regimes totalitários de direita,
milhões de pessoas. O lugar onde todas essas vítimas
e tiveram como instrumentos de propa-
morreram, essa terra de sangue, se estende do centro
ganda o culto à personalidade do grande
da Polônia até o oeste da Rússia, passando pela Ucrâ-
nia, Bielorrúsia e os Estados bálticos. Durante a con- líder, o uso de uniformes estilizados e de
solidação do nacional-socialismo e do stalinismo símbolos, as festas patrióticas, os desfiles
(1933-1938), a ocupação conjunta da Polônia pelas militares e vários organismos de socializa-
forças alemãs e soviéticas (1939-1941) e, em seguida, ção ideológica.
durante a guerra entre Alemanha e União Soviética III. Os regimes - fascista e nazista - eram hos-
(1941-1945), a violência em massa de um modoja- tis aos princípios da democracia igualitária
mais visto na história se abateu sobre essa região. e ao sufrágio universal. O Estado assume o
SNYDER, Timothy. Terras de sangue. A Europa entre Hitler papel de "protetor dos fracos".
e Stalin. Rio de Janeiro: Record, 2013. p. 10.
Está/Estão correta(s)
Assinale com V [verdadeiro) ou F (falso) as af ir-
apenas 1
mações a seguir, referentes a esse período.
apenas II

LJ Em 1939, os governos da Alemanha e


da URSS assinaram um acordo de não
agressão que ficou conhecido como
apenas III
apenas 1 e III
1, II e III

60
Responda no caderno

4. (Enem) Os regimes totalitários da primeira b) pelas propostas de conscientização


metade do século XX apoiaram-se fortemente da população acerca dos seus direitos
na mobilização da juventude em torno da defesa como cidadãos.
de ideias grandiosas para o futuro da nação. ci pela promoção de um modo de vida
Nesses projetos, os jovens deveriam entender saudável, que mostrava os jovens como
que só havia uma pessoa digna de ser amada exemplos a seguir.
e obedecida, que era o líder. Tais movimentos
pelo diálogo, ao organizar debates que
sociais juvenis contribuíram para a implantação
opunham jovens idealistas a velhas li-
e a sustentação do nazismo, na Alemanha, e do
deranças conservadoras.
fascismo, na Itália, Espanha e Portugal.
pelos métodos políticos populistas e pela
A atuação desses movimentos juvenis carac-
organização de comícios multitudinérios.
terizava-se
a) pelo sectarismo e pela forma violenta e
radical com que enfrentavam os oposi-
tores ao regime.

O projeto sai do controle, e nele se revelam ca-


racterísticas que remetem ao passado alemão.
(Paravocê ler j
Capitães de abril, direção de Maria de Medei-
A revolução dos bichos, de George Orwell. São ros. Portugal/Espanha/Itália/França, 2000, 123
Paulo: Companhia das Letras, 2007. A obra de mm. O filme conta a história de dois capitães do
George Orwell satiriza a ditadura stalinista em exército envolvidos com o golpe que derrubou a
uma época em que os soviéticos ainda eram alia- ditadura portuguesa, sob o domínio da política
dos do Ocidente na luta contra o eixo nazifascista. fascista do ditador Antonio Salazar.

Mussolini e a ascensão do fascismo, de Donald Um ato de Liberdade, direção de Edward Zwick.


Sassoon. Rio de Janeiro: Agir, 2009. Conheça os EUÂ, 2008, 137 mm. Dois irmãos judeus no Les-
detalhes da ascensão de Benito Mussolini ao te Europeu ocupado pelos nazistas escapam do
poder, na Itália, e saiba como seu partido, mino- regime e fogem para as florestas da Bielorrós-
ritário e impopular, que não contava com o apoio sia, onde se juntam à resistência russa a fim de
dos militares, conseguiu permanecer no co- construir uma vila para abrigar judeus foragidos.
mando do governo italiano por mais de 20 anos.
O grande ditador, direção de Charles Chaplin.
Nazismo, política, cultura e holocausto, de EUA, 1940, 124 mm. O filme satiriza o nazismo
Mércia Mansor D'Atessio e Maria Helena Cape- por meio de dois personagens que vivem na To-
tato. São Paulo: Atual, 2004. As autoras situam mânia (referência à Alemanha): o primeiro é o
o nazismo no amplo contexto do entreguerras, ditador Adenoid Hynkel (inspirado em Hitler); o
redimensionando e reavaliando o papel de Hitler segundo é um barbeiro judeu, ex-combatente da
e do povo alemão. Elas defendem a ideia de que, Primeira Guerra Mundial, que sofre de amnésia
apesar de Hitler ter sido um líder autoritário, e passa a ser perseguido pelo regime.
suas decisões e forma de governo foram fruto
da sociedade alemã da época.
rPara você navegar
Museu do Holocausto. Disponível em: <www.mu
('ira você assistir çi
seudoholocausto.org.br>. Acesso em: abr. 2016.
O Museu do Holocausto visa promover um espa-
A onda, direção de Dennis Gansel. Alemanha, ço dinâmico de discussão e aprofundamento nos
2008, 103 mm. Quando um professor decide ini- temas relacionados à Shoá, aproximando a me-
ciar um experimento pouco ortodoxo para de- mória do Holocausto e servindo de elo entre a co-
monstrar como é a vida sob uma ditadura, os munidadejudaica paranaense e outras entidades
alunos se envolvem mais do que o esperado. judaicas espalhadas pelo Brasil e pelo mundo.

61
s r •o

1A i

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4 ;-
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.2 1

No século XX, ocorreram duas guerras Todavia, foi também um período de


mundiais, além de um grande número de enorme desenvolvimento econômico, social
-. conflitos locais. Milhões de pessoas foram e político, associado paradoxalmente a gran-
mortas e populações civis foram atingidas, des atrocidades. As guerras alimentaram
o que tornou esse século um marco de vio- progressos científicos que, embora tenham
lência para a história, trazido avanços, deixaram as armas mais
14

--

'AJ

Vr-

eficientes, contribuindo decisivamente para da história em que os direitos humanos, como


o aumento do morticínio. o direito à vida e à liberdade, foram violados.
Milhares de jovens enviados às frentes de Neste capítulo, são abordadas as guer-
batalha, cidades arrasadas, famílias destruídas, ras no século XX e os esforços de pessoas
pessoas mutiladas etoda sorte de perversidade e instituições para criar mecanismos com a
são exemplos do que ocorreu nesses períodos finalidade de evitar novos conflitos.
Âs guerras na história
Guerra é o conflito armado entre grupos an- Mais tarde, os assírios criaram uma organiza-
tagônicos. Ela pode acontecer entre países, entre ção de guerra que lhes possibilitou formar um grande
grupos em um mesmo país, entre partidos etc. império, que ia do Rio Eufrates ao Rio Nilo. O mé-
Pode-se afirmar que a guerra é quase tão antiga todo de organização militar dos assírios influenciou
quanto a humanidade. O que mudou ao longo da medos, persas, babilônicos e outros povos.
história foram os armamentos, a organização dos As cidades gregas, com seus cidadãos-solda-
exércitos, as estratégias de combate e os objetivos dos, demonstraram eficiência nas Guerras Médicas,
dos contendores. Registros pictóricos e achados contendo o expansionismo persa. Os choques de
arqueológicos demonstram que os conflitos arma- interesses entre as pólis gregas, especialmente
dos são recorrentes na história da humanidade e Atenas e Esparta, provocaram a Guerra do Pelopo-
podem ser citados vários exemplos. neso (431-404 a.C.), que enfraqueceu as cidades-
Na antiga Mesopotâmia, plaquetas de argila -Estado da Grécia, abrindo caminho para a invasão
em escrita cuneiforme informam-nos a respeito macedônica. Alexandre, o Grande, da Macedônia,
das vitórias militares de Sargão da Acádia, que, conquistou um gigantesco império, imbuído do
por volta de 2200 a.C., unificou a região e se espírito de liderança e favorecido pela conjun-
autoproclamou "rei dos quatro cantos da terra". tura e aperfeiçoamento de inovações táticas -
a falange macedônica.
Os romanos da Antiguidade formaram exér-
citos organizados, disciplinados, bem armados e,
Contendor: adversário, rival. sobretudo, eficientes. O sucesso romano deveu-se
Pictórico: referente à pintura. em grande parte a sua organização militar, superior
à dos outros povos da época.

Exército trolano partindo para o combate na Guerra de Troia. Miniatura do Codex Benito de Santa Mora, século XV.
Acervo da Real Biblioteca de San Lorenzo de El Escorial, Espanha.

- 64 tij!r, 3
[...] Os exércitos do Islã, e posteriormente OS dos dios da preponderância militar europeia. O sucesso
mongóis, souberam explorar muito bem a força dos do que se tornou conhecido como estilo ocidental de
cavalos, erigindo impérios imensos no Oriente Médio guerra dependeu de avanços tecnológicos, que possi-
e na Eurásia graças ao uso de grandes destacamentos bilitaram aos pequenos exércitos europeus altamente
de cavalaria. Apesar da invenção do estribo, que fa- treinados destruir forças muito maiores em pratica-
cilitou o controle dos cavalos e daí as formações de mente qualquer parte do mundo. Fundamental para
cavalaria, aumentando por conseguinte sua eficiência essa supremacia foi o poder naval transoceânico, o
nos campos de batalha, as armas de guerra haviam qual proporcionava riquezas econômicas pelo comér-
mudado pouco desde os tempos antigos: os homens cio internacional e permitia aos exércitos europeus
ainda eram chacinados por espadas, lanças, macha- atacar por todo o globo de acordo com sua vontade.
dos, dardos e arcos. Próximo ao fim do século XV,
GILBERI, Adrian. Enciclopédia das guerras: conflitos mundiais
contudo, a tecnologia da pólvora teve sua estreia nos através dos tempos São Pauto: M. Books do Brasil Editora.
campos de guerra ocidentais, assinalando os primór- 2005. p. 6.

A partir do século XIX a guerra incorporou do navio a vapor, da telegrafia e de balões tornou
avanços tecnológicos oriundos dos processos os conflitos ainda mais devastadores. A Guerra
industriais modernos, o que possibilitou a pro- Civil Americana (1861-1865) e a Guerra Franco-
dução em massa de armas cada vez mais so- -Prussiana (1870), por exemplo, demonstraram
fisticadas e letais: canhões, rifles de recarga e o poder de destruição dos novos armamentos,
metralhadoras. Além disso, o uso de ferrovias, que contribuíram para o aumento significativo
do número de mortos em combate.
E
Para alguns historiadores, como o britânico
John Keegan, a guerra é muito mais que a "conti-
nuação da política por outros meios", pois sem-
pre houve combates e eles continuam ocorrendo
até hoje.

A guerra é um fenômeno total, uma expres-


são condensada das formas de pensar, produzir
e consumir das sociedades, o espelho de um
tempo e um lugar.
KEEGAN, .John apud MAGNOLI, Demétrio lOrg.).
História das guerras. São Pauto: Contexto. 2006. p. 16.

Doo Trolani, O Primeiro Regimento de Voluntários de Minnesota em Letal: que se refere à morte ou a ocasiona.
Gettysburg. Pensilvânia (EUA), 2 de lulho de 1863. 1984. Õleo sobre teia.

Organizando ideias
Em dupla, reflita sobre os significados de guer- É possível evitar as guerras?
ra apresentados e depois, juntos, respondam às
questões sintetizando suas ideias a respeito. 6. Quais são, de forma geral, as consequências
das guerras?
Para vocês, o que significa guerra? Apresentem suas respostas para toda a turma
e debatam sobre esse assunto. Redijam um texto
O que leva pessoas, grupos e países a guerrear?
coletivo com as conclusões a que vocês chegaram.

65
A Primeira Grande Guerra
Os defensores da guerra que assolou Esse otimismo, porém, não corres-
a Europa e o resto do mundo entre 1914 e pondia aos interesses de todos os grupos e
1918 ajustificavam afirmando que aquela se- nações. No cenário das relações internacio-
ria a "guerra que acabaria com todas as guer- nais, a corrida imperial ista, o nacionalismo
ras". Não foi o que aconteceu, pois o conflito, e o revanchismo geravam atritos diplomá-
que depois foi chamado de Primeira Guerra ticos crescentes. A corrida armamentista
Mundial, gerou frustrações, rancores e crises e o estabelecimento de uma política de
que culminaram em outra disputa ainda mais alianças entre as nações também coloca-
devastadora: a Segunda Guerra Mundial. vam em xeque a paz europeia.
Entre 1871 e 1914, os europeus vive- Nesse contexto, algumas potências
ram um período de avanços científicos e tec- europeias firmaram acordos políticos e
nológicos, melhorias das condições de vida, econômicos que resultaram na formação
progressos democráticos, desenvolvimento de duas grandes alianças: a Tríplice Alian-
econômico, aumento do consumo e da ça (formada pelos governos da Alema-
internacionalização comercial, intelectual nha, Itália e Império Austro-Húngaro) e a
e religiosa. Era a chamada BeIle Époque Tríplice Entente (formada pelos governos
- expressão que designou esse período de da Inglaterra, França e Rússia). Os acor-
paz, progresso e realizações culturais -, dos previam apoio mútuo: o ataque a um
que possibilitava à burguesia europeia viver aliado seria considerado ataque aos de-
"dias felizes" usufruindo dos grandes cen- mais membros da aliança, que deveriam
tros urbanos, principalmente Paris. defendê-lo.

'ír-iijas Jeaino. O cha das cinco em Paris, 1893. AquareL i3nturas COmO essa retratam a Belie Epoque vwida pelos europeus.

- 66
o SLANOIA'
èrritéio
Dinamarca)

7 / LIIII1(1882)
Tríplice Aliança
e aliados

OCEANO - Tríplice Aliança


A TIÂNTICO ?
ardo'\f Países invadidos pelas
Norte ( forças alern8s e
392 784km
DINAMALJ' 9 austro-húngaras
:39200000
:7
PAI$ES' Tríplice Entente
IMPÉRIO RUSSO
ALEMANHA (1907) e aliados

Tríplice Entente

Estados neutros
FRANÇA ÍiJCAI' ÁUSTRIA-HUNGRIA
BULGÁ
OMÊNIA
IA
Mar /Vcriro
ftJIlIl Maio do 1915—Itália
entra na guerra, mas
ÉRvI do lado da
ç Tríplice Entente
ESPANHA tIO OTOMANO
11 LUlA— 1918)
1

1
1
AFRICA ) Mar' Mediterrâneo

Fonte: ARRIJDA. José Jobson de A. Alias histÓrico básico. 17. cd. Sáo Paulo: Alica, 2011.1). 27.

A Sérvia lutava para reunir os povos eslavos que


Os caminhos da guerra viviam no Império Austro-Húngaro e era aliada
Não há consenso entre os historiadores dos russos.
sobre as causas da Primeira Guerra Mundial. No
O nacionalismo exacerbado destilava em todas
entanto, alguns fatores podem ser considerados as camadas sociais a crença de que a guerra seria
principais, pois contribuíram para que ocorres- breve. O pacifismo foi abandonado até por par-
se o conflito ou o desenrolar dele. Veja alguns
tidos socialistas que, em tese, deveriam defender
exemplos a seguir. um internacionalismo pacifista.
O choque entre as potências imperialistas pelas
disputas de colônias e de mercados. A Alemanha,
por exemplo, que entrou tardiamente na corrida
O conflito
imperialista - em virtude de sua unificação -, Em 1908, a Bósnia e Herzegovina, de popu-
almejava uma nova divisão do mercado mundial lação majoritariamente eslava, foi anexada pelo
e, para isso, via como solução a luta armada. Império Austro-Húngaro, ferindo as ambições da
Sérvia, que pretendia reunir os povos eslavos da
Franceses nacionalistas viram na guerra uma
região e formar uma "Grande Sérvia". Com isso,
oportunidade de revanche contra os alemães,
surgiram organizações terroristas com o objetivo
pois haviam perdido a região da Alsácia-Lorena
de sabotar a dominação austro-húngara. Nesse
para os prussianos em 1871.
contexto, um jovem bósnio assassinou o arqui-
Os russos ambicionavam uma rota de saída duque Francisco Ferdinando - herdeiro do trono
pelos mares quentes através do território do Im- austro-húngaro - e sua esposa, no dia 28 dejunho
pério Otomano. Também pretendiam aumentar de 1914, em Sarajevo, capital da Bósnia e Herze-
sua influência nos Bálcãs, o que gerava crescente govina. Esse episódio, amplamente divulgado, foi
atrito com o Império Austro-Húngaro. estopim do início do conflito.

;écuto XX: a era ria guerra tci:. 67 -


judiciais com o objetivo de punir os sérvios en-
1
LDeMENIC.DEL@rmERE volvidos no atentado, pois havia uma série de
evidências de que o autor do duplo assassinato
pertencia a uma organização terrorista treinada e
financiada por autoridades sérvias. Como as exi-
gências austríacas não foram atendidas, a Áustria
atacou a Sérvia em 28 de julho de 1914.
Os russos, tradicionais aliados dos sérvios,
mobilizaram tropas. Os alemães, aliados dos
austríacos, declararam guerra à Rússia e à França,
e invadiram a Bélgica. A Grã-Bretanha declarou
guerra à Alemanha. Quando a guerra começou, a
euforia popular era enorme, pois muitos pensavam
que o conflito seria rápido e vitorioso. À medida
que a realidade da guerra - mortes e destruições
- impunha-se, o entusiasmo se dissipou e o coti-
diano tornou-se difícil.
As batalhas desenvolveram-se principalmente
em trincheiras - longas valas cavadas na terra e
protegidas por arame farpado, sacos de terra, toras
de madeira e entulhos. Os soldados ficavam sema-
nas amontoados em espaços muito pequenos em
meio a lama, neve e epidemias diversas e, muitas
vezes, centenas de dias entrincheirados lutando
Assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando e de sua esposa. Sofia.
em gravura publicada na primeira página do jornal italiano La Domenica pela conquista de pequenos pedaços de território.
difi Corriere. Milão (Itália), 12jul. 1914.
O conflito envolveu vários países. As Po-
tências Centrais - Alemanha, Áustria- Hungria,
O governo austríaco deu um ultimato ao Império Otomano e Bulgária - combatiam os
governo sérvio: ele deveria aceitar a colaboração chamados Aliados: Grã-Bretanha, França, Rússia,
de representantes do governo austro-húngaro, Bélgica, Sérvia, Itália, Romênia, Grécia, Japão e,
em território sérvio, para acabar com supostos mais tarde, Estados Unidos. O Brasil também par-
movimentos subversivos e iniciar procedimentos ticipou do conflito, porém modestamente.

[ ... ] Milhões de homens ficavam uns diante dos geralmente protegidos por rolos e teias de arame
outros nos parapeitos das trincheiras barricadas farpado, para a "terra de ninguém", um caos de
com sacos de areia, sob as quais viviam como - e crateras de granadas inundadas de água, tocos de
com - ratos e piolhos. De vez em quando, seus árvores c .:uodas, lama e cadáveres abandona-
generais procuravam romper o impasse. Dias e dos, e avançavam sobre as metralhadoras, que os
mesmo semanas de incessante bombardeio de ar- tu n, como eles sabiam que aconteceria.
tilharia [ ... ] "amaciavam" o inimigo e o mandavam
11013SI3AWM, Eric, Era dos Extremos: o breve século XX.
para baixo da terra, até que no momento certo
1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 33.
levas de homens saíam por cima do parapeito,

A-
Calcinar: queimar até reduzir a carvão ou Ceifar: matar, tirar a vida de atguém.
cinzas.

68 lr2.
Na frente Oriental, os
russos sofreram uma série de
reveses dos alemães, o que
contribuiu para agravar a cri-
se interna que culminou na
Revolução Russa de 1917. Em
1918, o governo socialista,
atendendo às reivindicações ' •-.-..,
populares, concluiu um acor-
.
do de paz separadamente com = *
os alemães.
Além da Europa, a guer-
ra atingiu o continente asiá-
tico, pois os povos árabes .,
tentaram tirar proveito da si-
tuaçao para, com o apoio das
potências aliadas, libertar-
-se da dominação turca. Na
África, os alemães mantinham
com grande dificuldade suas .
colônias - Togo, Camarões, .
África Sudoeste Alemã (Namí-
bia) e África Oriental Alemã
(Tanzânia) -, mas acabaram
vencidos.
Os Estados Unidos per-
maneceram neutros até 1 91 7.
O rompimento dessa neu-
tralidade deveu-se a ataques
de submarinos alemães, que SOd 1 ruiL LI

torpedearam diversos navios


norte-americanos. Os laços econômicos e finan-
O Brasil também rompeu relações diplo-
ceiros dos Aliados com os Estados Unidos tam-
máticas com a Alemanha em solidariedade aos
bém influíram na decisão do presidente Thomas
Estados Unidos e em razão do ataque alemão a
Woodrow Wilson de enviar tropas para combater
navios brasileiros.
as Potências Centrais.

A neutralidade brasileira foi decretada em 4 de {..j Em maio de 1917, dois outros navios co-
agosto de 1914, no começo da guerra, mesma data merciais brasileiros, o Tijuca e o Lapa, são torpe-
da decisão semelhante do presidente dos Estados deados próximo ao litoral europeu, acarretando a
Unidos, Woodrow Wilson (1912-1921). Essa pri- revogação da neutralidade brasileira e a decisão de
meira etapa iria até 11 de abril de 1917, quando apreender e utilizar 45 navios mercantes alemães
o Brasil, já governado por Venceslau Brás (19 14- ancorados em portos nacionais.
-1918), rompe relaçôes com a Alemanha devido ao RICUPERO. Rubens. Efeitos colaterais. Revista de História da
ataque, seis dias antes, ao vapor brasileiro Paraná, Biblioteca Nacional. Disponível em: <www.revistadehistoria.
torpedeado e afundado por um submarino germâ- com.br/secao/capa/efeilos-colaterais>. Acesso em: abr. 2016.

nico no litoral norte da França.

69
A entrada dos Estados Unidos — com poderio fronteiriços, teve sua Força Aérea extinta, sua
industrial, enormes recursos financeiros e tropas Marinha reduzida e ainda foi obrigada a assu-
descansadas, bem armadas e bem alimentadas — mir uma gigantesca dívida de guerra. O Império
desequilibrou o conflito. Em 1918, as Potências Austro-Húngaro se desfez, com a Áustria e a
Centrais, uma a uma, renderam-se. Hungria reduzindo-se a dois pequenos países na
Os países derrotados tiveram de assinar Europa central. O mesmo aconteceu com o Im-
tratados. A Alemanha, pelo Tratado de Ver- pério Otomano, que se desintegrou. A Bulgária
salhes, perdeu todas as colônias e territórios também perdeu territórios.

Na Conferência de Paz realizada ao término do assegurou também, por meio do artigo 297, que os
conflito, a delegação brasileira, chefiada por Epi- 70 navios alemães apreendidos em portos nacionais
tácio Pessoa, conseguiu solucionar duas questões fossem legitimamente reconhecidos como proprie-
de interesse direto do país. E também neste caso dade brasileira. Para completar, devido ao apoio do
valeu-nos muito a intervenção decisiva dos Esta- presidente Wilson, o Brasil foi eleito membro não
dos Unidos. A primeira decisão se referia ao café permanente do conselho da recém-criada Socie-
do estado de São Paulo que estava depositado na dade das Nações (precursora da ONU, esta criada
Europa, e acabou utilizado pelos alemães. Em seu após a Segunda Guerra).
artigo 263, o Tratado de Versalhes, feito em 1919,
RICUPERO, Rubens. Eleitos colaterais. Revista de História da
determinou que a dívida fosse cobrada à parte dos BibLioteca NacionaL. Disponível em: <www.revistadehistoria.
pagamentos de reparações de guerra. O Tratado com. br/secao/capa/eíeitos-cotaterais>.
Acesso em: abr. 2016.

Em síntese, osven-
cidos pagaram um preço
bastante elevado o que .1/1 e ÇJ1
fomentou, mais tarde — 'ISLANDIA
como no caso da Ale- 1 , j
manha -, sentimentos de 1 .' FINLÃNDJ
Çsuci: 5—
revanche, que foram en-
/ 1NORUEGA
cabeçados pelos nazistas
OCEANO
Mesmo para a Italia, que ATL4NT!CO
'Maroo '''., : ar
participou do bloco ven- /, 7 ;LETNIA -
1' orte ,,-.--- ..j UNIAO DAS REPUBLICAS
cedor, os ganhos ficaram RNDA G OINAMARCA 1lUiNiA SOCIAUSTASSOVItICAS
:-. pmjs .-1 (parte europeia)
aquem do esperado, o que 90ETANHA
" AR!jENTAL
PAS N
contribuiu para a ascensão . :BAl)OSi
ALEMANHA POLONIA O
do fascismo BELGIC'A'
- LUXEM000GS/ Tc '-
A guerra provocou 9LOVAdÚJÇ. s
mais de dez milhões de \0.'365 130km
FRANÇA 4UIÇA - .. UNGRIA 1 '
- ,J\J -1• 3S50 -
mortes, alem de grande k. ROMtNIA

numero de feridos e muti i- Mar Negro


IUGOSLÁVIA
PORTUGAL / _,•_ . 'BULGÁRIA
lados. As perdas materiais " IA - '' ' -,
i' ESPANHA '. ' 7-.» ''TURQUIA
também foram grandes / ALBANIA' iparteeuropciaI
l
o comercio e a industria '- GRÉcIA
Mar Mediterrâneo
europeus sofreram fortes - , •.--' r---
) -.-
abalos e, em alguns paí- Novos países

ses, a inflação disparou.


AHHUA. ,i:'..: .Jobscn A Atlas hisiórico básico, 17. ei. Sás Atice, 2011. p 27.

70
A crise econômica e social da
Europa teve diversos efeitos fora
do continente. Os Estados Uni-
dos, que já eram um país pode-
roso, consolidaram sua liderança -
econômica no mundo e torna-
ram-se credores de vencedores e
vencidos. Em escala menor, o Ja-
pão também se beneficiou com o
conflito, pois conseguiu acelerar
sua expansão imperialista após -
anexar ex-colônias da Alemanha.
O Brasil sofreu uma diminuição ..
na exportação de produtos agrí-
colas, sobretudo o café, e passou
por um grande crescimento indus-
trial motivado pela dificuldade de
importar produtos europeus.
fflOO 1 . L. d OS
Com a guerra, as mulheres, que vinham se soldados do exercito francês. França 1915.
organizando politicamente, ganharam força eco-
nômica e, em vários países, obtiveram conquistas
sociais. Contudo, para milhões de mães e viúvas,
a guerra foi uma terrível tragédia.
Busca pela liberdade
Diversos povos que lutaram na Primeira Guer-
ra Mundial reivindicavam liberdade. Os sérvios,
[ ... ] À medida que a guerra progredia, con- atacados pelos austríacos, procuraram preservar
tudo, necessidades financeiras, muitas vezes sua independência e também ambicionavam
causadas pela morte do provedor da família, "libertar" os povos eslavos que viviam sob o do-
conduziram grande número de mulheres ao
mínio do Império Austro-Húngaro. Já a Bélgica,
trabalho nas fábricas. [ ... j Urna das injustiças da
invadida pela Alemanha, lutou para recuperar sua
guerra era o fato de que uma mãe com crian-
independência.
ça recebia generoso auxílio do Estado enquanto
seu marido estivesse vivo. Sua morte em comba- Os povos árabes que viviam sob o domínio
te, porém, colocava um fim nos benefícios, res- do Império Otomano apoiaram os Aliados porque
tando a seus dependentes uma mirrada pensão. viram no conflito a oportunidade de se libertar
Em novembro de 1918, havia 630 mil viúvas de do poder turco. De forma semelhante, armênios
guerra na França e um número ainda maior na e curdos também aproveitaram a situação para
Alemanha. tentar, por meio de alianças políticas, conquistar
A maioria foi forçada a procurar emprego,
a liberdade definitiva.
muitas vezes do tipo mais servil e com salários
Os Estados que produziram os tratados de
baixos, para sustentar a si mesmas e às suas
paz em 1919 incluíram cláusulas para proteger
famiias.
as minorias; contudo, entre a intenção e a prática
KEEGAN, John. História iLustrada da Primeira Guerra
havia uma enorme distância, pois o chauvinismo
MundiaL. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. p. 168.
nacional continuou muito forte.

A
Chauvinismo: termo derivado da língua francesa para designar opiniões tendenciosas, exacerbadas
ou agressivas a respeito de uma ideia, grupo ou país.

71
E claro que os peaceniakers de 1919 come- Isso era coisa para seus sucessores. Quando veio
teram erros. Com seu desatencioso tratamento a guerra de 1939, ela foi o resultado de vinte anos
do mundo não europeu, criaram ressentimentos de decisôes tomadas ou não tomadas, e não das
pelos quais o Ocidente paga até hoje. Trataram disposições adotadas em 1919.
com enorme empenho das fronteiras da Europa,
MACMILLAN, Margaret. Paz em Paris, a Coníerência de
sem conseguir, entretanto, satisfazer a todos, Paris e seu mister de encerrar a Grande Guerra. Rio de
enquanto na África adotaram a velha prática de Janeiro: Nova Fronteira. 2004. p. 543.
distribuir territórios para comprazer às potências
imperialistas. No Oriente Médio, juntaram povos,
mais notavelmente no Iraque, que ainda não
Apesar da suposta intenção de muitos paí-
conseguiram unir-se numa sociedade civil. Mas
ses, ao entrar na guerra, de lutar pela liberdade,
se poderiam ter feito melhor, sem dúvida alguma
poderiam também ter feito muito pior. Tentaram, prevaleceram os interesses territoriais das grandes
até mesmo o velho cínico Clemenceau, construir potências envolvidas na disputa, que cercearam
uma ordem melhor. Não podiam prever o futuro as garantias de liberdade das minorias e permiti-
e, certamente, não podiam comandar o futuro. ram o surgimento de movimentos que gerariam
um conflito ainda maior.

orpanizando ideias
Leia atentamente os textos e, em seguida, Texto 2
responda às questões.
A verdade inequívoca é que se eu fosse obedecer
Texto 1 aos meus instintos animais inatos - e havia pouca
A frente é uma jaula, dentro da qual a gente tem esperança de qualquer outra coisa enquanto estive
de esperar nervosamente os acontecimentos. Estamos nas trincheiras -, voltaria a me alistar em qualquer
deitados sob a rede formada pelos arcos das granadas, guerra futura, ou tomaria parte em algum tipo
e vivemos na tensão da incerteza. Acima de nós pai- de combate, apenas para experimentar de novo
ra a fatalidade. Quando vem um tiro, POSSO apenas aquela voluptuosa excitação do animal humano ao
esquivar-me e mais nada; não posso adivinhar exa- reconhecer seu poder de tirar a vida de outros seres
tamente onde vai cair, nem influir em sua trajetória. humanos que tentam fazer o mesmo a ele. O que a
É este acaso que nos torna indiferentes. Há alguns princípio era aceito como um dever moral tornou-se
meses, eu estava sentado num abrigo jogando cartas;
um hábito [... 1 tornara-se uma necessidade.
muito tempo depois, levantei-me e fui visitar uns
amigos que estavam em outro abrigo. Quando voltei, Palavras de um ex-combatente belga apud PERRY, Marvin.
já não existia mais o primeiro: fora completamente Civilização ocidental: uma história concisa.
destruído por uma granada. Voltei ao segundo abrigo, São Pauto: Martins Fontes, 2002. p. 539.

e cheguei no exato momento de ajudar a desobstrui-


-lo, pois, nesse ínterim, também havia sido soterrado. Como o cotidiano da guerra é descrito em
No abrigo à prova de bombas, depois de dez horas cada texto?
de bombardeio posso ser estraçalhado, e posso não
sofrer um único arranhão; só o acaso decide se sou
Os dois textos abordam o assunto da mesma
atingido ou fico vivo. Cada soldado fica vivo apenas
por mil acasos. Mas todo soldado acredita e confia maneira? Explique.
no acaso.
Explique o último parágrafo do texto 1.
REMARQUE, Erich Maria'. Nada de novo no front.
São Pauto: Abril Cultural, 1981. p. 86.
Com base no texto 2, é possível afirmar que
O alemão Erich Remarque tutou na Primeira Guerra Mundial
o combatente expressa desejo de matar?
e publicou esse livro em 1929. Explique.

72
Segunda Guerra MundiaL:
a maior de todas
Os tratados assinados após a Primeira Guerra Na Conferência de Munique (1938), Hitler
Mundial não resolveram antigas disputas frontei- obteve o controle dos Sudetos (região daTchecos-
riças e, pior, criaram novas áreas de desacordo. lováquia habitada por descendentes de alemães),
Na Alemanha, territórios cujas populações eram com a condição de não reivindicar novos territó-
majoritariamente germânicas (como os Sudetos, rios. No entanto, a Alemanha não cumpriu o acor-
entregues à Tchecoslováquia) foram tomados da do e invadiu a Boêmia e a Morávia, além de ocupar
República de Weimar, que estava enfraquecida. o restante do território da Tchecoslováquia.
Os nazistas, com um discurso nacionalista, os alemães assinaram um tratado
Em 1939,
belicista e racista, tiraram proveito das frustra- de não agressão com os soviéticos, que passa-
ções e dos temores do povo alemão, atacaram o vam por agitações internas e temiam um avanço
comunismo ejustificaram o rearmamento alemão dos nazistas em seu território. Esse acordo, su-
(proibido pelo Tratado de Versalhes) como forma posto tratado de comércio e amizade, ocultava
de enfrentar o expansionismo soviético. Enquanto certos dispositivos: os alemães poderiam avan-
o
isso, os problemas decorrentes da Crise de 1929, çar sobre a Polônia sem que os soviéticos inter-
temor de revoluções apoiadas pelos soviéticos e a viessem; estes, por sua vez, poderiam invadir os
preocupação com um novo conflito armado leva- países bálticos (Letônia, Estônia e Lituânia) con-
ram a diplomacia das potências ocidentais a fazer tando com a passividade alemã. O Pacto foi as-
cada vez mais concessões a Hitler, num movimento sinado em 23 de agosto de 1939 e, poucos dias
conhecido como "política de apaziguamento". Essa depois, em 1° de setembro de 1939, tropas ale-
política, contudo, não obteve sucesso. mãs invadiram a Polônia.

!otítica de apaziguamento é uma mano-


bra política na qual os países envolvidos em
um conflito abrem mão de certos privilégios -I
para tentar acabar com as divergências. Foi
adotada pela França e pela Grã-Bretanha na
década de 1930, quando as duas potências re-
solveram sacrificar alguns territórios sob seu
1
domínio, como a Tchecoslováquia, com o intui- / / . - ....... :
to de manter a paz com a Alemanha.

4.

#.í) -

iI
Tropas germânicas recebem
as boas-vindas dos alemães
residentes de Lodz, na Polônia,
setembro de 1939 1
;rr
73_
Or9aIIiZafldoideias
Observe a imagem e responda às questões.

/ g

44

WONDER How LONG 1H[ HONEYMoM WILL LAST


Caricatura de 1939 que ironiza o pacto entre Hitler e Staliri. Abaixo se lê: Quanto tempo será que a lua de
mel vai durar?.

Descreva a imagem identificando os personagens retratados - como cada um deles é represen-


tado pelo artista?

Relacione a legenda com a imagem: O que o autor ironiza na charge?

O início da guerra
Em 1939, Hitler exigiu que a Polônia entregasse (destacamento de tanques blindados) e por último
à Alemanha o chamado "corredor polonês" (faixa de a infantaria. Os alemães mobilizaram 1,5 milhão
terra que garantia o acesso do país ao Mar Báltico) e de soldados na prática da bliczkrieg, uma bem-
a cidade portuária de Danzig, territórios perdidos pe- -sucedida "guerra-relâmpago". No dia 27 de se-
los alemães na Primeira Guerra Mundial. O governo tembro a cidade de Varsóvia foi tomada.
da Polônia, porém, recusou-se a atendê-lo, ciente do O próximo passo de Hitler foi invadir a No-
que havia acontecido com aTchecoslováquia. ruega, poiso minério de ferro importado da Suécia
Nas primeiras horas do dia 1° de setembro pelos alemães era enviado pelo porto norueguês
de 1939, os alemães invadiram a Polônia. Na de Narvik, o único da região que não congelava
primeira etapa, a Luftwaffe (Força Aérea Alemã) durante o inverno. A Noruega foi ocupada em
bombardeou portos, aeroportos, ferrovias, depó- abril de 1940. Concomitantemente, a Dinamarca,
sitos de muniçôes, cidades, enfim, a infraestrutura por fazer fronteira com a Alemanha, foi ocupada
polonesa, objetivando enfraquecer a resistência "preventivamente". Em seguida, Holanda, Bélgica
do país. Em seguida, vieram as Divisões Panzer e França foram invadidas.

-74
T
NORUEGA
SUECIA

OCEANO / ,? FINL&N0IA'
ATLÂNTICO ' •. N
UNIÃO SOVIËTICA
'na0n. J(4J\ 01L

.BRtTANHAi
1 0115 i.' f/Roa
______;•\J
_4"
)4•MOOOi
O 327 654km Ofensivas doseuércitns do Eixo

IRLANDA
dv
NO! r .4H'eI 132700000
Campanha da Polônia setembro 1939)
.—+ Campanha da Françi 1maio junho 1040)
CmorIrt. USSIA •Mnnk 1t0
- ,p4 irmr. Campanha da Dinamarca e do Nnruega
No,, PAISES •ymanrn
\RAI0S Berlim,. ___ uCarri 1
lerdos. )abril-junho 1940)
OinkOO I Ver me CprenI.lnn no Campanha da Grécia 1Outubro iMOle
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Eremanu s° M _-. Campanha dos BélcOs 1abril 1941)
Campanha da Rússia )jsmmlmn 1941 julho 1943)

1 .-ESL0VUI jV5taOfAna ROur cp FTJ Poises de Eixo em ide setembro de 1939

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Territórios cnnctuistados e ocupadas pelas
Forças de Defesa do 3 Rcich
SrbnnIaanIe ii: Terrmtóues dos Aliados
nMurodn* CAUCASO
Mrr ,V , - [_ Territórios que progressiaamente participaram
1100 rO,
ESPANHA ITÁLIA IUGOSLÁVIA - os voltaram a participar da nnerra
BULGÁRIA
Poises neutros
AL8IA - RÃ
-
TURQUIA FreetesnaURSS

Mar Medi)errá neo .' /


G1éIA
'r.4' ..
SIRIA
IRAQUE —
ide dezembro de 1941
Janeiro e março de 1942
-_-'
2. 29 , f Setembro de 1942

Fonte: DUBY, Geciges (Dr.). Grande atlas histórico. aris Lac.sse. 2011 g. 99

Organizando ideias
O texto a seguir é parte de um discurso feito não devem existir. Todos os representantes da classe
por Hitler, em 1940. Leia o texto e faça o que culta polonesa têm que ser exterminados. Isso parece
se pede. crueldade, mas é a lei da vida.
Os poloneses nasceram especialmente para o HITLER, Adotf apud ARNAIJT, Luiz; MOTTA, Rodrigo P. de Sã.
trabalho pesado [ ... ]. Não é preciso pensar em me- A Segunda Grande Guerra: do nazifascismo à Guerra Fria.
lhorias para eles. Cumpre manter, na Polônia, um São Paulo: Atual, 1994(1940]. p. 34-35.

padrão de vida baixo, não se permitindo que suba


[..j. Os poloneses são preguiçosos e é necessário usar No discurso de Hitler, é possível identificar
de força para obrigá-los a trabalhar [ ... Devemos I. ideias racistas. Identifique-as e explique qual
utilizar-nos do Governo Geral [da Polônia] simples- era o ideal racial de Hitler.
mente como fonte de mão de obra não especializada
[ ... J. Poder-se-iam conseguir ali, todos os anos, os Explique a opinião de Hitler acerca dos polo-
trabalhadores que o Reich pudesse necessitar. E ... ] neses no contexto dos propósitos nazistas.
Indispensável ter em mente que a pequena
nobreza polonesa deve deixar de existir; por mais Identifique as razões de Hitler para perseguir
cruel que isso possa ser, ela deve ser exterminada a nobreza polonesa.
onde quer que ela se encontre [ ... ].
Qual era a ameaça que a classe culta re-
Deve haver apenas um senhor para os poloneses:
presentava para Hitler? O que justificava o
o alemão. Dois senhores, lado a lado, não podem e
extermínio dessa classe na opinião dele?

75—
Ao tentar invadir a Grécia, a Itália foi venci-
A Itália na guerra da pela resistência grega. Mais uma vez, os ale-
A entrada dos italianos no conflito ocorreu mães entraram em cena e a Grécia foi ocupada
por interesses territoriais, uma vez que, assim por tropas germânicas. Durante a guerra, Musso-
como os alemães, eles sentiam-se prejudicados lini desempenhou papel secundário, sempre sob
com a partilha dos antigos territórios coloniais e as ordens de Hitler.
regiões europeias.
Alemanha, Itália e Japão, que tinham inte-
resses territoriais comuns, formaram uma aliança
A bataLha na Grã-Bretanha
política e militar, o Eixo Berlim - Roma -Tóquio, e Com o fracasso da política de apaziguamen-
combateram juntos na Segunda Guerra Mundial. to, o primeiro-ministro britânico Neville Chamber-
A situação política italiana era muito próxima lain foi afastado do governo, e Winston Churchill
à alemã, em decorrência da ascensão de governos tornou-se primeiro-ministro da Grã-Bretanha.
totalitários (Mussolini, na Itália, e Hitler, na Ale- Claramente antinazista, Churchill lutava contra os
manha). Apesar de ter menos peso nas disputas, a derrotistas, que acreditavam ser possível estabele-
Itália passou a articular com a Alemanha políticas cer um modus vivend, com os alemães.
de controle territorial. Hitler ordenou que a Luftwaffe bombardeasse
Com a França já praticamente derrotada intensamente regiões industrializadas da Grã-Breta-
e subjugada pelos alemães, Mussolini declarou nha. Apesar dos efeitos devastadores dos primeiros
guerra aos franceses, mas o exército italiano foi meses, pouco a pouco as ações dos alemães perde-
contido pelo que restava do exército francês. No ram força.
norte e nordeste da África, após algumas vitórias
iniciais, os italianos sofreram uma série de reveses,
rendendo-se. Para impedir a derrocada total dos
italianos, Hitler enviou o general Erwin Rommel
com os afrikakorps à região.

Âfrikakorps eram divisões das torças arma-


das alemõs enviadas à Líbia para socorrer as
forças italianas que estavam sendo derrotadas
pelo exército britônico.

1
1 ..
tri -.

Reqiio do centro de Londres destruida após bombardeio nazista.


em 25 de setembro de 1940.

G'ossário
Modus vivendi: expressão em latim, faz alusão
à noção de acordo, tratado de paz entre partes
Soldados alemães coniandados pelo general Erwin Rommel - os afrikakorps - discordantes.
desfilam ao entrar na cidade de Tripoli (Ubia), colônia italiana na Áfdca, 1941.

76
Organizando ideias -
O texto a seguir é um discurso de Churchill, nosso império de além-mar, armado e protegido pela
após a tomada
proferido em 4 de junho de 1940, esquadra britânica, prosseguirá a luta que, quando
da França pelos alemães. Analise-o e depois Deus o queira, o Novo Mundo, com toda a sua força
e poderio, avance a socorrer e a libertar o \Telho.
faça o que se pede.
Muito embora grande extensão da Europa e CHURCI-HLL, Winston apud JOLL, James.
muitos antigos e famosos Estados tenham caído ou A Europa desde 1870. Lisboa: Dom Quixote, 1995. p. 569.

possam cair ainda nas garras da Gestapo, nós não


nos deixamos desanimar nem quebrantar. Iremos Qual era a posição de Churchill em relação
até o fim. Lutaremos em França, lutaremos nos à guerra?
mares e oceanos, lutaremos nas praias, lutaremos
nos pontos de desembarque, lutaremos nos campos Considerando o fortalecimento dos Estados
e nas ruas, lutaremos nas colinas; nunca nos rende- Unidos após a Primeira Grande Guerra, expli-
remos; e mesmo que essa ilha ou grande parte dela, que o trecho: "o Novo Mundo, com toda a sua
que nem por um instante POSSO acreditar, venha força e poderio, avance a socorrer e libertar
a ser subjugada e esteja a morrer de fome, então o
Velho'.

A invasão da URSS Hitler [...] subestimava por completo a im-


portância de alianças, linha um lado pragmático,
O pacto assinado com a Alemanha deu à
como o provou o Pacto de Não Agressão com a
União Soviética a oportunidade de recuperar par-
União Soviética de 1939, mas esse pacto sempre foi
te do território perdido para a Polônia na Primei- visto apenas como uma medida de curto prazo. [ ... ]
ra Guerra Mundial. Além disso, o acordo ainda A ideia de permanecer fiel aos termos de um trata-
previa o aumento da influência da União Soviéti- do assim que ele deixasse de lhe ser vantajoso era
ca sobre a Finlândia e os países bálticos (Letônia, totalmente alleia ao modo de pensar de Hitler. Seu
Estônia e Lituânia). Assim, em novembro de 1939 objetivo ideológico de conquistar espaço vital para
os soviéticos atacaram a Finlândia, mas sofreram a Alemanha no leste pesava muito mais do que as
grande resistência e não obtiveram sucesso. No condições morais ou legais de seres inferiores.
ano seguinte a ofensiva soviética ocorreu contra ROBERTS, Andrew. Hitler & Churchill: segredos da Liderança.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. p. 120.
os países bálticos, que foram ocupados.
Enquanto os soviéticos organizavam ataques
no leste europeu, Hitler preparava a Operação As motivações da investida alemã contra a
Barbarossa (nome em homenagem ao imperador União Soviética eram basicamente econômicas (con-
germânico do século XII, Frederico Barbarossa), trole das reservas de matérias-primas e de produtos
com o objetivo de invadir a União Soviética. agrícolas), estratégicas (domínio de um grande ter-
ritório na Europa e na Ásia) e ideológicas (deprecia-
ção do bolchevismo, associado ao judaísmo).
As tropas alemãs mobilizaram milhares de
tanques, aviões e cerca de 3 milhões de homens.
Agentes de Stalin avisaram-no da possibilidade
.. ' • Áí :kI;.. de um ataque alemão, algumas fontes afirmam,
porém, que ele não acreditou. Em junho de 1941,
tropas alemãs atacaram a União Soviética.

" - -.-,' Coluna soviética derrotada após ataque aéreo aiernão


entre Biaiystok eVaukavysk (Rússia). 1941.

Século XX: a era da guerra t. 77


[...1 Muitas pessoas perceberam a guerra
A entrada dos Estados
no leste como inevitável, mas Stálin, aparente- Unidos na guerra
mente, não era uma delas. Por mais suspeitas
que pudesse ter alimentado, Stálin honrou os Os Estados Unidos só entraram efetivamen-
termos do pacto assinado por Molotov e Von te na guerra em dezembro de 1941, quando os
Ribbentrop, que estabelecia que a Rússia su- japoneses, que pretendiam expandir seus domí-
priria a Alemanha com matérias-primas es- nios no Oceano Pacífico, desencadearam um ata-
senciais. Seus conselheiros disseram-lhe que
que aéreo contra a base norte-americana de Pearl
Hitler invadiria o país. Richard Sorge, espião
Harbor, no Havaí, que foi totalmente destruída.
comunista alemão baseado em Tóquio e um
dos agentes da União Soviética de inteligência
mais brilhante, avisou-o que Hitler ordena-
Em última análise, a decisão japonesa em favor
ria a invasão. Mais que isso: disse-lhe onde e
da guerra foi o resultado da convicção, baseada nas
quando, embora tenha dado a data como 20
medidas econômicas impostas pelos norte-ameri-
de junho de 1941. Até mesmo os britânicos
canos e pela política norte-americana na China [os
informaram a Stálin que a invasão viria. Ele
japoneses haviam invadido a China, cujo governo
não deu ouvidos a ninguém. Em 21 de junho,
recebia o apoio dos Estados Unidos], de que os Es-
as unidades alemãs concentradas receberam o
tados Unidos estavam decididos a reduzir o Japão
código "Dortmund", informando que o ata-
a uma posição de importância secundária. Tojo
que seria desfechado nas primeiras horas do
[primeiro-ministro] e seus seguidores sentiam que
dia seguinte.
país estaria condenado, se não enfrentasse o de-
DOUGAN, Andy. FuteboL & guerra: resistência, triunfo e safio. Para eles, o Japão não tinha outra alternativa,
tragédia do Dínamo na Kiev ocupada pelos nazistas. exceto fazer a guerra enquanto ainda tinha forças
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. p. 50.
para isso. O país podia perder, mas a derrota seria
melhor do que a humilhação e a submissão. Um
príncipe da família imperial escreveu: "O Japão en-
trou na guerra com uma disposição trágica e uma
Em poucos dias, um território imenso foi autorrenúncia desesperada". Se perder, "não have-
ocupado e grande parte dos aviões soviéticos foi rá o que lamentar, porque o país está condenado
destruída nos aeroportos. ao colapso mesmo sem guerra".
Em algumas regiões - países bálticos e parte
MORTON, Louis. Segunda Guerra Mundial: as grandes decisões
da Ucrânia -, os alemães foram recebidos como estratégicas. Rio de Janeiro: Bibtioteca do Exémito, 2004. p. 118.
libertadores, por causa da oposição ao boichevis-
mo. À medida que recuavam, os soviéticos adota-
ram a tática da terra arrasada e, por meio de uma Como resposta ao ataque, no dia seguinte
guerra de guerrilhas, atacaram os invasores pela então presidente dos EUA, Franklin Roosevelt,
retaguarda e pelos flancos. enviou tropas ao combate. Outro motivo para os
A população dos territórios ocupados pas- Estados Unidos entrarem no conflito foi a aliança
sou a ser alvo dos nazistas. Hitler ordenou per- com a Inglaterra - os dois países haviam assinado
seguições políticas a intelectuais comunistas e as um tratado contrário ao totalitarismo nazifascista,
ordens foram cumpridas à risca, o que resultou a Carta do Atlântico.
em grande número de mortos. Depois do ataque a Pearl Harbor, osjaponeses
A expectativa alemã de uma conquista rá- obtiveram muitas vitórias. Ocuparam as Filipinas,
pida não se efetivou. Com a chegada do outono invadiram Hong Kong, Malásia, Cingapura e Birmâ-
e, sobretudo, do inverno, o clima passou a ser nia. Dominaram a Indochina Francesa (hoje Vietnã,
um fator decisivo. Em dezembro de 1941, com Camboja e Laos), bem como ocuparam as Índias
tropas acostumadas ao frio intenso, os soviéticos Orientais Holandesas (atual Indonésia). Nas regiões
desencadearam uma contraofensiva que brecou a dominadas, implantaram um regime autoritário
maré vitoriosa das forças de Hitler, pondo fim à e exploraram ao máximo os recursos naturais em
invencibilidade alemã. benefício de sua máquina de guerra.

- 78
ALASA
SS -.

MONGOLIA

ASIA
COREIA
AFEGANISTÃÕ - CHINA
JAPAO
'TIBET
Midway
Kalewa
-Lashia
F0RMOs(Taiwan)
ÍNDIA hRMÂk,Ç» PearlHarbor>
HAINAN
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'TAtLÂNWA'
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\\ MALASIA llhas
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tJCEANO INDICO - Gijada/canaJ
f. Coral

-Limite da expansao-japonesa - Dezembro 1942 . N


-'Suva
Baía de
Aliados-Julho 1943 -Milne O -
Eixo - Julho 1943
AUSTRÁLIA
ET1 Estados neutros s
Base dos Aliados - O 1518 3036km

'ik-
Base do Eixo
Maiores batalhas r "" NOVA .
1 151 800000

730'L ZELANDIA

Fonte: BLACK, Jerelry. World history atlas. Londres: Doriing Kinndersley. 2008. p. 104.

• :V t1para i Vklb
Leia o texto a seguir. usados para experimentos com armas bacterio-
lógicas pela denominada Unidade 731. Aviões
atiravam sobre os prisioneiros germes (de peste
O direito internacional havia proibidoS antes bubànica e de cólera) para em seguida observar
do início da Segunda Guerra, o uso das armas quí- sua reacão.
micas e bacteriológicas. No entanto, após 1937 o
lapíno ignorou o direito internacional no que diz
Japào admite que, nI:ou arma quimica contra China na
respeito à ouerra que promoveu contra os guerri-
Segunda Guerra. Estadão.com.br, So Pauto, 27 ago. 2002.
lhuios de M u) 1 sc tung n o Maiwhin-ia. Dnsponn ei em <wo„-.N.-.estadao.com.br/,irqu;vo/muíid()/2002/
Segundo dados recolhidos recentemente, loi o not20020827p68718.tntm>. Aceneo em: abn: 2016.
imperador Hirohito em pessoa que, irritado e im-
paciente com OS escassos "progressos” contra os Pesquise o que são armas químicas e bac-
chineses, autorizou o exército a empregar "todos os tertológicas. Essas armas ainda são usadas ou
meios, incluindo armas químicas e bacteriológicas". produzidas? Apresente o resultado da pesqutsa
em sala de aula.
Centenas de prisioneiros chineses foram vivis-
seccionados (dissecados vivos) e milhares deles

79
O Brasil na guerra Em 1944, depois de muito protelar, o governo
brasileiro enviou tropas à Europa. A Força Expedi-
Quando eclodiu a Segunda Guerra Mundial, cionária Brasileira (FEB) se engajou no V Exército
Brasil vivia sob a ditadura do Estado Novo, im- Norte-Americano, que combatia na Itália. Pilotos
plantada por Getúlio Vargas em 1937. O governo da Força Aérea Brasileira (FAB) também atuaram
brasileiro simpatizava com os regimes totalitários no cenário de guerra italiano. Ao todo, foram en-
europeus, porém os laços econômicos com os viados 25334 homens, dos quais 15069 entraram
Estados Unidos eram mais fortes. Os norte-ame- em ação. Desses, 451 foram mortos.
ricanos fizeram pressão para que as autoridades A participação do Brasil na guerra teve con-
brasileiras rompessem com as nações do Eixo, o sequências políticas. Enquanto os "pracinhas" lu-
que ocorreu em 1942. A razão alegada foi o tor- tavam na Europa contra o fascismo, internamente
pedeamento de navios mercantes brasileiros por regime político brasileiro era repressivo, ferindo
submarinos alemães. sistematicamente o direito à liberdade.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil Uma onda nacionalista provocou altera-
foi um importante fornecedor de matérias-primas ções em nomes de clubes - o Palestra Itália, por
(ferro, borracha) e alimentos para o esforço de guer- exemplo, tornou-se Palmeiras -, levou à proibição
ra norte-americano. Do ponto de vista estratégico, do ensino da língua alemã em Santa Catarina
a localização da Região Nordeste, mais próxima à e promoveu a perseguição a imigrantes. Muitos
costa africana - onde ingleses e norte-americanos foram demitidos do serviço público, tiveram bens
lutavam contra alemães e italianos -, favoreceu a confiscados, estabelecimentos comerciais saquea-
instalação de uma base aeronaval em Natal (RN), dos, com a conivência das autoridades, e até foram
que selou a aliança com os Estados Unidos. proibidos de participar de festas carnavalescas.
A aliança entre Brasil e Estados Unidos foi,
aos poucos, expandindo-se para outras áreas do
cotidiano da população. A "ajuda" estadunidense O Brasil manteve em seu território, durante a Se-
gunda Guerra Mundial (1939-1945), vários campos
inicialmente visou ao treinamento de profissionais
de concentração. Não para judeus e outras mino-
e à implantação de políticas que poderiam ser úteis
rias, como ocorria no regime nazista, mas para cen-
à participação norte-americana na Segunda Guerra
tenas de imigrantes alemães, italianos e japoneses.
Mundial. Mais tarde, essa relação - conhecida como Cidadãos comuns, sem nenhuma atividade po-
"política de boa vizinhança" - geraria novos padrões lítica, esses estrangeiros sofreram restrições severas
de comportamento e de consumo no Brasil. de direitos, tiveram economias e bens confiscados
71
e foram submetidos a trabalho forçado. Muitos
permaneceram internados sem motivos - passa-
ram a ser tachados de "inimigos" dos brasileiros
simplesmente porque seus países de origem esta-
vam do outro lado no conflito global.
1
DETRICH, Ana Maria. Uma história sonegada. História Viva,
São Paulo, Duetto Editorial. o. 67, p. 60. 2009.

. ,,..

O período de participação do Brasil na Segun-


da Guerra Mundial foi marcado pela exacerbação
da política nacionalista e pela influência maciça dos
Estados Unidos na política e nos hábitos cotidianos
e de consumo dos brasileiros. Essa postura iniciou
Na decada de 1940 uma marca de refrigerantes norte americana foi uma nova fase de crescimento econômico e recria-
difundida no Brasil por meio do contato entre soldados brasileiros e ção da identidade da população por meio da noção
americanos. Na fotografia, de 1945, soldado concede entrevista na base
aérea de Parnamirim. no Rio Grande do Norte, enquanto segura uma garrafa de cordialidade e bom relacionamento com outras
de refrigerante. nações - em especial, com os Estados Unidos.

80
Organizando ideias

Analise as informações do texto e, em segui- sucos de frutas nas mesas da classe média brasileira
da, responda às questões. etc. etc. Apesar dos focos de resistência à sua ação,
OCIAA conseguiu erradicar a influência do Eixo
Tio Sam chega ao Brasil no Brasil e sedimentar o discurso pan-americanista
[... 1 Foi urna época em que gradativarnente o da solidariedade continental. Terminada a guerra, o
arnerican way oflife [modo de vida americano] foi governo dos Estados Unidos encerrou as atividades
ganhando espaço na sociedade brasileira, graças a da agência, deixando a cargo da embaixada americana
um cuidadoso plano de conquista. Esse plano fazia no Brasil a condução de algumas de suas atividades.
parte da estratégia dos Estados Unidos de promover
a cooperação interamericana e a solidariedade he-
misférica, enfrentar o desafio do Eixo e consolidar-
-se como grande potência. A campanha teve início
com a propagação dos "valores pan-americanos"
durante as conferências interamericanas. O passo
seguinte foi a criação, em agosto de 1940, de uma
superagência de coordenação dos negócios intera-
mericanos, [...] chamada Office ofthe Coordinator
ofinter-Arnerican Affairs (OCIAA). [...]
Na área de comunicação e informação, a
agência norte-americana procurava veicular na
imprensa brasileira notícias favoráveis aos Estados
Unidos e, nos Estados Unidos, divulgar o Brasil.
Procurava também difundir as técnicas mais mo-
dernas do jornalismo norte-americano, como por
exemplo a recepção e transmissão de radiofotos.
Mas nada se comparava, em termos de glamour
e apelo popular, aos programas radiofônicos e,
principalmente, às produções cinematográficas
Pato Donald e Zé Carioca em cena do filme A!ôAmigos (1942).
sob sua coordenação. E ... ]
Data dessa época o nascimento do conhecido Tio Sam chega ao Brasil. A Era Vargas: dos anos 20 a 1945.
CPDOC. Disponível em: <http:!/cpdoc.fgv.br/producao/dossieS/
personagem dos Estúdios Disney, o papagaio Zé
AEraVargasl/anos37-45/AGuerralloBrasillTioSam>.
Carioca. O filme Alô Amigos, que apresentou esse Acesso em: abr. 2016.
personagem ao mundo como amigo do Pato Donald,
enfatizava a política de boa vizinhança. [...]
1. Como e por que o Brasil foi influenciado pelos
Na área da saúde, a ação do OCIAA voltou-se
Estados Unidos durante a Segunda Guerra
basicamente para o controle da malária, o treina-
mento de enfermeiras e a educação médica. Esses Mundial?
programas não tinham apenas o objetivo político
de obter a aprovação da população à atuação da 2 O que significou, no contexto da guerra, a
agência no Brasil. Destinavam -se também a preparar criação do personagem brasileiro Zé Carioca,
terreno para o provável estacionamento de tropas da Disney?
norte-americanas em território brasileiro e para a
extração de materiais estratégicos a serem fornecidos 3. Reflita sobre a chamada "americanização"
aos Estados Unidos, ambas as questões presentes na atual. Em quais áreas e de que maneira
agenda da negociação do alinhamento brasileiro. somos influenciados pelos Estados Unidos
Foi nessa época que Carmen Miranda se tornou da América? Quais são os pontos positivos e
símbolo da cultura brasileira nos Estados Unidos, negativos dessa influência? O que permane-
que o Zé Carioca ajudou a construir o estereótipo do
ceu do período inicial da americanização?
brasileiro simpático, que a Coca-Cola substituiu os

81
A derrocada do Eixo testamento, designou o almirante Dbnitz como seu
sucessor. Em 8 de maio, o Alto Comando Alemão
No front soviético, após as derrotas sofridas deu ordens para a cessação de todas as operações
em Stalingrado e em Kursk, a situação dos ale- em curso. A guerra havia terminado na Europa.
mães tornou-se insustentável. Em todas as fren- No Japão, a resistência tornou-se obstinada
tes, o Exército Vermelho, graças à superioridade à medida que os norte-americanos se aproxima-
bélica e numérica, desencadeou uma forte con- vam do país. Com o propósito de causar grandes
traofensiva, libertando amplo território e debili- danos aos rivais, os camicases - pilotos suicidas
tando o exército do Terceiro Reich. japoneses, que chocavam seus aviões contra em-
Ao pulverizar suas forças - os alemães comba- barcações inimigas - obtiveram algum sucesso,
tiam no Norte da África, na Península Balcânica, mas logo foram neutralizados pela artilharia an-
na Escandinávia, na Europa Ocidental e na Itália-, tiaérea das forças aliadas.
Hitler enfraqueceu-se. Com o objetivo de conseguir uma rendição in-
Na Itália, depois do desembarque dos Alia- condicional dojapão, o presidente dos EUA Harry
dos na Sicília, o Grande Conselho fascista votou S. Truman (1884-1972) - Roosevelt havia falecido
uma resolução para restaurar a plena autoridade em abril - decidiu usar uma nova arma: a bomba
do rei Vítor Emanuel III; Mussolini foi preso. Em atômica. Em 6 de agosto, a cidade de Hiroshima
12 de setembro, os soldados alemães o resgata- foi atingida; em 9 de agosto foi a vez de Nagasaki.
ram e levaram para o norte do país, onde o Duce No dia seguinte, o imperador Hirohito aceitou a
fundou a República Social Italiana, totalmente capitutacão, assinada em 2 de setembro de 1945.
dependente dos nazistas.
Os fascistas enfrentaram a Re-
sistência - cujos membros eram, na
maior parte, comunistas -, bem como
a ofensiva dos Aliados, cada vez mais
ntensa. Diante da derrota iminente,
Mussolini tentou fugir para a Suiça
--
num comboio alemão. Foi descoberto,
julgado e executado.
A situação de Hitler não era me-
lhor, pois os soviéticos vinham do Leste,
enquanto norte-americanos e ingleses
avançavam pelo Oeste e Sul. Ciente da
investida do Exército Vermelho, que
pouco a pouco dominava Berlim, come-
teu suicídio no dia 30 de abril. Em seu Soldadosnazisias caturaclos em Leninorado I000SL 30 em 1944

r
Em dupla, pesquise os principais fatos que aconteceram no mundo entre a Primeira Grande Guerra e a
Segunda Guerra Mundial e, juntos, elaborem uma linha do tempo com esses dados. Pesquisem também
os acontecimentos ocorridos nesse mesmo período no Brasil e estabeleçam a relação entre os fatos.

Capitular: render-se, entregar-se.


Front: frente de batalha, linha de frente.

82
Os horrores das grandes guerras
As batalhas travadas nas grandes guerras dei- As agitações não cessaram. No fim do século
xaram um saido de milhões de mortos, fato que res- XIX, por meio de protestos, a população da Armê-
salta o caráter violento e desumano dos conflitos. nia reivindicava melhorias nas condições de vida e
Além disso, alguns episódios evidenciaram almejava o estabelecimento de uma nação cristã
a despreocupação das autoridades envolvidas no e independente. Na década de 1890, os protestos
conflito com as populações em geral - os interes- viraram tumultos, que resultaram no massacre de
ses políticos e ideológicos, colocados à frente da aproximadamente 200 mil armênios. Mais tarde,
visão humanitária, foram responsáveis por catás- em 1909, estima-se que mais de 20 mil armênios
trofes que dizimaram milhares de pessoas. tenham sido mortos por questões políticas.
Quando os turco-otomanos se envolveram na
Primeira Guerra Mundial ao lado da Alemanha, co-
O genocídio armênio meçou um período de grande violência no Império.
A Armênia é um pequeno país localizado na Armênios cristãos, apoiados pela Rússia, rebelaram-
região conhecida como Cáucaso, no limite entre -se contra a Turquia e passaram a perseguir violen-
a Europa e a Ásia. Considerada a primeira nação tamente os muçulmanos. Os otomanos enviaram,
a adotar o cristianismo como religião oficial, no então, exércitos com o objetivo de controlar a popu-
século IV, foi marcada por um passado conturba- lação armênia, o que agravou o conflito e aumentou
do, repleto de conflitos políticos e religiosos. o número de mortos.
A região onde hoje é a República da Armênia O episódio mais emblemático ocorreu no
foi conquistada pelos turco-otomanos no século dia 24 de abril de 1915, um Sábado de Aleluia.
XIV. Nos anos seguintes, apesar da convivência entre Na ocasião, cerca de 500 intelectuais, políticos
as populações, a submissão dos armênios ao Impé- e religiosos da comunidade armênia que viviam
rio Turco-Otomano não deixou de ser um problema no Império Otomano foram presos por causa de
para os dominados e uma ameaça aos dominadores. suas relações com a Rússia, acusados de conspi-
Ao longo do tempo, os cristãos armênios ração contra os aliados dos turcos e alemães.
contaram com o auxílio da Rússia em interven- Os presos foram executados na prisão de
ções que, muitas vezes, envolveram conflitos ar- Mehder-Hané, em Constantinopla - atual Is-
mados, como a Guerra da Crimeia, em 1854. Na tambul -, em um movimento que deu início à
ocasião, o czar russo proclamou seu país defen- matança desenfreada de armênios pelos turcos.
sor dos cristãos e dos lugares sagrados em terras Estima-se que o Império Otomano abrigasse
otomanas, o que provocou uma ofensiva dos tur- aproximadamente 2 milhões de armênios à épo-
cos contra os russos. ca, dos quais mais de 1 milhão foram mortos.

[ ... } Em 24 de abril de 1915, dia que ficou co- com péssimas condições de abrigo e alimentação
nhecido, desde então, como o Dia do Genocídio continuou a cobrar o seu preço, com homens, mu-
Armênio, centenas de intelectuais armênios que lheres e crianças morrendo aos milhares. Quase 500
viviam em Istambul foram presos e executados mil pessoas foram deportadas nesse processo, sem
arbitrariamente. Nesse mesmo ano, massacres e nenhum cuidado logístico ou humanitário. Viti-
deportações começaram de forma esporádica e, inados pela fome, exaustão, doenças ou ataques de
logo, se generalizaram por todo o território armênio, bandos armados, um a cada cinco armênios sobrevi-
levando a cerca de 600 mil mortes. Várias leis for- veu. Em 1918, finalmente, com o colapso do Império
malizaram a deportação dos armênios de suas vilas Russo, as tropas turcas avançaram pelo Cáucaso, e
e cidades no Cáucaso e seus bens foram confiscados. estima-se que mais 400 mil armênios foram mortos.
Ao chegarem na Síria, foram instalados em cam-
BERTONHA, João Fébio. Armênia, o primeiro genocídio. Leituras
pos de prisioneiros, e a combinação de maus-tratos da História EspeciaL, São Paulo, Escala, ano 1, n. 2, p. 36.

Século XX: a era da guerra tc: 83


Quando a Primeira Guerra Mundial chegou Os sobreviventes do genocídio se instalaram,
ao fim, os turcos foram forçados pelos Aliados a então, em diversos países, num movimento cha-
assinar o Tratado de Sèvres, que cedeu a indepen- mado de "diáspora armênia", no qual mais de
dência à Síria, ao Egito, ao Líbano, à Palestina e 8 milhões de armênios procuraram outro lugar
à Armênia. No entanto, apenas dois anos depois, para viver.
em 1920, a Armênia foi anexada à União Soviética. Atualmente, vários países reconhecem o geno-
Essa anexação fez com que a população armê- cídio armênio. A Turquia, entretanto, não admite
nia que regressava a seu território de origem fosse a tentativa do extermínio, alegando exagero na
perseguida, expulsa ou morta, restando apenas os contagem do número de mortos e a necessidade de
armênios concentrados em Constantinopla. defesa da soberania nacional à época do conflito.

-
-
Aefugaaos ai rieiiios nu Ge,,jue u .u,zduw frances que os resgatou do genooai 915

r Pausaparainvestigacão

Os curdos se consideram indo-europeus e inclusive, um forte grupo armado que atua na


falam uma língua do ramo iraniano. Ao longo Turquia. Já no Iraque, após a morte de Saddam
da história, estiveram sob o domínio de vários Hussein, os curdos obtiveram elevado grau
impérios. Após a Primeira Guerra Mundial, os de autonomia. O mesmo não ocorre na Síria
curdos, que viviam entre a Turquia e o Iraque, e no Irã, onde a minoria curda sofre diversos
foram vítimas de violenta repressão. Mesmo preconceitos.
assim, sobreviveram e mantiveram sua língua, Pesquise a situação dos curdos atualmente
sua cultura e suas instituições, e apresente suas conclusões à turma. Inclua
Atualmente, formam a maior nação do os seguintes aspectos na pesquisa: grau de
mundo sem Estado (cerca de 26 milhões de escolarização da população, condições de
pessoas), habitando Turquia, Síria, Iraque, Irã, trabalho e de moradia, saúde pública, religião,
Armênia e outros países do Oriente Médio. So- representação política e dados econômicos.
nham fundar um Curdistão independente; há,

84 7i1JtO3
Hiroshima e Nagasaki No dia 6 de agosto de 1945, precisamente às
oito e quinze da manhã, hora do Japão, quando
O fim da Segunda Guerra Mundial foi mar-
a bomba atômica explodiu sobre Hiroshima, a
cado por um episódio trágico que, além de matar
srta. Toshiko Sasaki, funcionária da Fundição
milhares de pessoas, destruiu duas cidades e seus
de Estanho do Leste da Ásia, acabava de sentar-
arredores e mostrou ao mundo a nova tecnologia -se a sua mesa, no departamento de pessoal da
em desenvolvimento - a bomba nuclear. fábrica, e voltava a cabeça para falar com sua
A bomba atômica, na época, era um tipo de colega da escrivaninha ao lado. 1... 1 Assim que
armamento ainda pouco conhecido, desenvol- virou a cabeça para o lado oposto ao das janelas,
vido pelos Estados Unidos por meio do Projeto um clarão ofuscante encheu a sala. O medo a
paralisou em sua cadeira por um longo momento
Manhattan, que reuniu os melhores cientistas
(a fábrica distava 1 440 metros do centro). Tudo
para conceber uma arma de guerra nunca antes
veio abaixo, e a srta. Sasaki perdeu a consciên-
imaginada. O projeto foi incentivado pelo Reino
cia. O teto desabou repentinamente, o piso de
Unido e pelo Canadá, com o propósito de atacar madeira do andar superior despencou, levando
a Alemanha nazista. Um primeiro teste da bomba com seus estilhaços as pessoas que lá se achavam,
já havia sido feito pelos Estados Unidos em julho e o telhado ruiu; as estantes que estavam atrás da
numa área deserta do estado americano
de 1945, srta. Sasaki caíram, e seu conteúdo a derrubou,
do Novo México. quebrando-lhe a perna esquerda. [...]
Após a rendição da Alemanha e da Itália, a Na manhã de 7 de agosto a rádio japonesa
transmitiu, pela primeira vez, um sucinto comu-
resistência do japão foi o pretexto para a realiza-
nicado que pouquíssimas (ou nenhuma) das pes-
ção de dois ataques com bomba atômica às cida-
soas diretamente interessadas - os sobreviventes
des japonesas de Hiroshima e Nagasaki, autoriza- da explosão - puderam ouvir: "Hiroshima sofreu
dos pelo presidente estadunidense Harry Truman danos consideráveis, em função de um ataque de
em agosto de 1945. A ação chocou o mundo alguns B-29. Acredita-se que se utilizou um novo
todo, que não imaginava a possibilidade de um tipo de bomba. Investigam-se os detalhes". Tam-
ataque de tal magnitude. pouco é provável que algum sobrevivente tenha
escutado uma retransmissão em ondas curtas de
um extraordinário pronunciamento do presidente
dos Estados Unidos, que identificou a nova bom-
ba como atômica:" Essa bomba era mais potente
que 20 mil toneladas de TNT. Tinha um poder
explosivo 2 mil vezes maior que o da Grand Slam
britânica, a maior bomba já utilizada na história
da guerra". As vítimas que tinham condições de
se preocupar com o que acontecera imaginaram
a causa da catástrofe em termos mais primitivos e
infantis - gasolina lançada de um avião, talvez, ou
: gás combustível, ou um bando de incendiários, ou
obra de paraquedistas. Ainda que soubessem a ver-
dade, a maioria estava atarefada demais, cansada
demais ou ferida demais para se importar com o
fato de que tinham sido objeto da primeira grande
experiência com o emprego de energia atômica que
(como apregoavam as vozes em ondas curtas) só
os Estados Unidos, com seu know-how industrial e
sua disposição de arriscar 2 bilhões de dólares num
importante jogo de guerra, poderiam ter realizado.
HERSEY, John. Hiroshima. São Pauto:
Companhia das Letras, 2002. p. h, 13 e 33.

Explosão da bomba atõmica. Ncck

YX. a ara cio aasa ra 85


O HoLocausto
Antes do início da guerra, o
governo alemão já discriminava
judeus, comunistas, homossexuais,
testemunhas de Jeová, ciganos
e todos aqueles que, segundo
critérios nazistas, eram conside-
g;-
rados "perniciosos" à nova ordem
estabelecida.
A "solução" encontrada .'
pelo governo foi enviar as pes-
...'
soas que não se enquadravam
no padrão nazista aos campos .
de concentração, locais em que L
todos os segregados eram presos
e forçados a trabalhos degra-
dantes e situações humilhantes.
Essas pessoas, na maioria, além
de presas, tiveram seus bens con-
fiscados e foram condenadas à
morte pelo regime nazista.
Chegaria de judeus liunaros no campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, na Polónia ocupada
Em Dachau, Auschwitz, Ber- pelos alemães, jun. 1944.0 comandante do campo de concentração deAuschwitz, Rudolf Hôss,
confirmou em sua autobiografia a morte de aproximadamente 400 mil judeus húngaros em câmaras
gen-Belsen e outros campos de
de gás durante o verão de 1944.
concentração, milhões de pessoas
foram executadas em câmaras de expostas pelas tropas francesas, britânicas e norte-
gás, enterradas ou incineradas. -americanas, que, depois de render os exércitos da
Mais de 6 milhões de judeus foram mortos Alemanha, julgaram seus principais líderes num
nesse processo. Alguns padeceram nas câmaras tribunal internacional sediado na cidade de Nu-
de gás, outros de fome, frio e inúmeras doenças remberg. Muitos dos líderes foram condenados à
contraídas nos campos de concentração, num morte sob a acusação de crimes de guerra.
processo que se intensificou com a Segunda
Guerra Mundial.
No fim do conflito, com a derrota alemã, Organizando ideias
as atrocidades cometidas pelos nazistas foram
Com base nos textos e imagens anterio-
res, explique o que caracterizou a Segun-
Muitas vezes, mulheres tentavam esconder da Guerra Mundial.
crianças sob suas roupas, mas, quando desco-
bríamos, as crianças eram enviadas, naturalmente, O que você já ouviu falar sobre campos de
ao extermínio. Deveríamos realizar o extermínio concentração? Escreva o que sabe sobre
em segredo, porém o fedor que exalava da cons- esse assunto.
tante queima dos corpos permeava a região, e
todos os que viviam nas comunidades próximas 3.0 que você entendeu sobre a bomba
sabiam que havia extermínio em Auschwitz.
de HiroshIma? Que efeito ela causou no
Depoimento de Rudolt Hbss, comandante de Auschwitz, contexto da guerra? Se julgar necessário,
durante o julgamento em Nurembery, em 5 de abril de 1946
pesquise em outros livros e na internet
apud II Guerra Mundial: 60 anos. São Pauto: Abril, 2005. v.
3. p. 101. para complementar sua resposta.

86
Lutas por Liberdade
Apesar do caminho de morte e devastação Embora os direitos e garantias individuais
tomado pelos países implicados nos grandes tenham sido duramente reprimidos pela ideolo-
conflitos mundiais, muitos povos envolvidos nas gia e pelas ações nazistas na Segunda Guerra, o
duas grandes guerras reivindicavam liberdade. movimento dos direitos humanos desenvolveu-se
A própria entrada de algumas nações na após o fim do conflito e vigora até os dias atuais.
guerra ocorreu em decorrência da luta por liber- O contraponto aos absurdos cometidos contra as
dade contra o expansionismo de outras. A França, populações minoritárias - judeus e homossexuais,
por exemplo, por meio das frentes da Resistência por exemplo - foi o fortalecimento da luta por di-
Francesa, envolveu-se no conflito direto contra a reitos igual itários para todos. Entretanto, apesar
Alemanha para se opor ao domínio dos nazistas dos avanços sociais, ainda há muito preconceito
em seu território. oriundo da propaganda nazista.
Os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, assim Nesse contexto de lutas por liberdade - políti-
como a França, lutaram contra o nazifascismo. ca, econômica ou ideológica-, a Organização das
Apesar de interesses políticos e econômicos terem Nações Unidas (ONU) fortaleceu-se ao defender
motivado a manutenção dos conflitos, o fim do a oposição à dominação das potências envolvidas
autoritarismo nos países do Eixo passou a ser uma na guerra e contrapor-se à subjugação das mino-
bandeira importante levantada pelos Aliados. rias, num movimento que culminou na definição
da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Organizando ideias

Em dupla, analise, juntos, o texto a seguir e níveis diferenciados de direitos, a saber, os direitos
depois respondam às questões. civis, os direitos políticos e os direitos sociais, além
de ter sido dado um decisivo passo na direção da
Declaração Universal dos afirmação dos direitos dos povos. Uma conquista
Direitos Humanos (1948) que pode muito bem ser compreendida como a
universalização do projeto histórico da Revolução
Ainda sob o impacto das atrocidades cometi- Francesa pela tríade liberdade, igualdade e fraterni-
das, entre 1939 e 1945, durante a Segunda Guerra dade, acrescido da vontade de construir um mundo
Mundial - quando o número de mortos foi cal- no qual a paz vencesse a guerra.
culado em torno de 60 milhões de pessoas e o de
rv1ONDAIN, Marco. Direitos humanos.
refugiados em 40 milhões aproximadamente -, a
São Paulo: Contexto, 2006. p. 168
Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou, em
10 de dezembro de 1948, aquele que viria a ser o Qual é a importância da Declaração dos Di-
ápice de um longo processo de lutas iniciado no reitos Humanos no que se refere ao direito à
decorrer das revoluções liberais-burguesas dos sé-
liberdade?
culos XVII e XVIII - a Declaração Universal dos
Direitos Humanos. Elaborada por uma comissão Qual é a relação entre liberdade e igualdade?
específica da recém-criada, em 1945, Organização
das Nações Unidas (ONU), a Declaração foi redigi- A Declaração Universal dos Direitos Huma-
da com o intuito de proclamar definitivamente os nos expressa um ideal comum a ser atingido
direitos fundamentais da humanidade, o respeito pela humanidade. Pode-se afirmar que os
inviolável à dignidade da pessoa humana. Com ela,
ideais expressos nessa declaração foram
passa a ter reconhecimento internacional a defini-
alcançados plenamente por todos os povos
ção de direitos humanos como o acimulo de três
e todas as nações do mundo? Expliquem.

87
5~ Debate interdisciplinar
Guerra biológica ser considerado uma catástrofe, pois causa deses-
tabilização econômica, mortes, deterioração da
Durante os grandes conflitos mundiais, al- saúde e de serviços básicos, o que afeta gravemen-
guns países estudaram a possibilidade de usar ar- te a população civil.
mas bacteriológicas contra seus oponentes. Isso Pela capacidade de provocar grandes da-
causou muitas dúvidas e medo na população em nos com um mínimo de logística, as armas bio-
geral, que não sabia ao certo os efeitos desses ar- lógicas são únicas. Além disso, são dificilmente
tifícios. Apesar de os Estados Unidos terem anali- detectadas e facilmente propagadas usando-se
sado essa possibilidade, a única utilização docu- insetos como vetores ou distribuindo-se material
mentada de armas biológicas durante a primeira contaminado. Portanto, é necessário conhecer e
metade do século XX foi a do Japão contra cida- estudar tais agentes para produzir diversas estra-
des chinesas, entre as décadas de 1930 e 1940. tégias de prevenção.
Na guerra biológica são usados, como armas, Esses microrganismos são classificados em
microrganismos ou seus produtos tóxicos, com o categorias, com base em critérios como infec-
objetivo de provocar lesões e enfermidades em ani- ciosidade, virulência, persistência no ambien-
mais, plantas e seres humanos ou a morte deles. te, facilidade de manipulação e disseminação
Esses agentes são capazes de se replicar e se pro- e acesso a meios de defesa para combater sua
pagar rapidamente, apresentando altas taxas de propagação e neutralizar seus efeitos. Entre os
transmissão. As armas biológicas, assim como as agentes mais conhecidos e divulgados estão o
químicas e as nucleares, incluem-se na categoria Bacilius anthracis (antraz) e a toxina do Clostridium
das armas de destruição em massa. Seu uso pode botulinum (botulismo).

- ---

.-.-.

..

-. -.. .:
•••Z, .A

'• .

Vista aérea do território da Unidade 731. A Unidade 731 foi uma instalação secreta de pesquisas japonesa que, durante a Segunda Guerra Mundial e a Guerra
Sino-Japonesa, desenvolveu armas biológicas utilizando inclusive seres humanos em seus testes.

88
4-
Antraz
O antraz, ou carbúnculo, é uma doença cau-
sada pelo Bacillusanthracis, bactéria que pode estar
presente no solo e nos vegetais. A enfermidade
acomete o gado, mas em algumas situações pode
afetar o ser humano, apresentando três formas
clínicas: a cutânea, mais comum e pouco agressi- 51
1

va, que causa um edema local; a inalatória, mais ' • 7k' ,f.
3 -
agressiva, pela qual a inalação da bactéria provo- --
ca um quadro de hemorragia, edema e necrose,
podendo levar à morte em poucas horas; e a gas-
SirnuLç. 1) 1. alh1 JL 11 . u;cu PIn Po Lo
trointestinal, causada pela ingestão de carne con- (RS). 2014. A realização de grandes eventos esportivos no Brasil, como
taminada, que acarreta severa dor abdominal e, a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. motivaram
diversas ações preventivas contra possíveis ataques que envolvam
ocasionalmente, a morte. Como os principais ve- contaminação de ambientes.
tores da doença são os animais, a melhor forma de
prevenção é a vacinação dos rebanhos, a esteriliza- contaminação: alimentar (ocorre por meio da
ção dos materiais contaminados e a higienização ingestão de alimentos contaminados e malcon-
ambiental. Em caso de contaminação, o tratamen- servados), por ferimentos (quando a toxina é
to é feito com antibióticos específicos. produzida em um ferimento infectado pela bac-
téria) e intestinal (por meio da produção da toxi-
BotuLismo na no intestino depois da ingestão de alimentos
contaminados). Uma vez produzida pelo micror-
O botulismo é uma doença causada por
ganismo, a toxina botulínica gera uma paralisia
uma neurotoxina produzida pela bactéria Clos-
flácida, com os seguintes sintomas: caimento das
tridium botulinum, presente no solo, em vegetais
pálpebras; dificuldades de deglutir, falar ou fe-
e nas fezes humanas e de outros animais. Nos
char a boca; paralisia dos braços e das pernas;
humanos são conhecidas três vias principais de
e paralisia dos músculos respiratórios, causando
disfunção respiratória.
O tratamento consiste na administração
da antitoxina nos casos mais graves e monitora-
mento constante dos pacientes, lembrando que
o diagnóstico precoce é de extrema importância
para a eficácia desses procedimentos. Com o sur-
gimento de novas terapias, a taxa de mortalidade
por botulismo alimentar, tipo mais comum, é in-
feriora 10%.

1. No texto, foram apresentados dois dos


mais conhecidos agentes usados como
arma biológica. Entretanto, hé outros
microrganismos utilizados em guerras
biológicas. Pesquise o assunto e cite pelo
menos mais três desses agentes e a prin-
Missão UNSCOM, Iraque, 1992. A comissão especial da ONU foi organizada cipal forma de transmissão deles.
para destruir as instalações de pesquisa e produção de armas biológicas
iraquíanas.

89
Testando seus conhecimentos Responda no caderno

(UFG-GO) Leia os documentos a seguir. Art. 232 - A Alemanha se compromete a re-


Os camponeses partem para ofront com incrí- parar todos OS danos causados à população civil
vel entusiasmo; e as classes superiores da socie- das potências aliadas e a seus bens.
dade, quer sejam liberais ou conservadoras, os MARQUES. Adhemar Martins et aI. História
aclamam, desejando-lhes boa sorte [ ... J Habi- Contemporânea: textos e documentos.
São Paulo: Contexto, 1999.
tualmente, os camponeses sentiam que não ti-
nham nada a fazer a não ser beber; mas agora De acordo com o texto e com seus conheci-
não é mais assim. É como se a guerra lhes desse mentos, é correto afirmar que o Tratado de
urna razão para viver [ ... J No ardor dos solda- Versa lhes:
dos russos se percebe o entusiasmo que agita o
encerrou a 2 Guerra Mundial, fazendo
coração dos antigos mártires se lançando para a
com que a Alemanha perdesse as colônias
morte gloriosa.
ultramarinas para os países dos Aliados.
LE BON, Gustave. 1916 apud JANOTTI, Maria de
Lourdes. A Primeira Guerra Mundial. O confronto
extinguiu a Liga das Nações, propondo
de imperialismos. São Paulo: Atual, 1992. p17. a criação da Organização das Nações
Após um ano de massacre, o caráter imperialista Unidas (ONU), em 1945, com o objetivo
da guerra cada vez mais se afirmou; essa é a pro- de preservar a paz mundial.
va de que suas causas encontram-se na política estimulou a competição econômica e
imperialista e colonial de todos os governos res- colonial entre os países europeus, cul-
ponsáveis pelo desencadeamento desta carnifici- minando na V Guerra Mundial.
na. [ ... ] Hoje, mais do que nunca, devemos nos permitiu que as potências aliadas divi-
opor a essas pretensões anexionistas e lutar pelo dissem a Alemanha no fim da 2 Guerra
fim desta guerra [...] que provocou misérias tão Mundial, em quatro zonas de ocupação:
intensas entre os trabalhadores de todos os países. francesa, britânica, americana e soviética.
impôs duras sanções à Alemanha, no fim
CONFERÊNCIA DE Z1MMERWALD - 5 a 8 de setembro
de 1915 apud JANOTTI, Maria de Lourdes. da l Guerra Mundial, fazendo ressurgir o
A Primeira Guerra Mundial. O confronto de nacionalismo e reorganizando as forças
imperialismos. São Paulo: Atual, 1992. [Adaptado].
políticas do país.
No início da Primeira Guerra Mundial (1914-
3 (Unifesp-SP) Para o historiador Amo J.
-1918), estabeleceu-se, sobretudo na Europa,
Mayer, as duas Guerras Mundiais, a de 1914-
uma disputa de ideias em torno do envolvimen-
to nesse conflito. Com base na leitura de cada -18 e a de 1939-45, devem ser vistas como
um dos documentos, explique as posições as- constituindo um único conflito, uma segunda
sumidas sobre a participação na guerra. Guerra dos Trinta Anos. Essa interpretação é
possível pelo fato:
[UFPeI-RS) Artigos do Tratado de Versalhes de as duas guerras mundiais terem en-
(séc. XX): volvido todos os países da Europa, além
Art. 45 - Alemanha cede à França a proprieda- de suas colônias de ultramar;
de absoluta [ ... ], com direito total de exploração,
de prevalecer antes da Segunda Guerra
das minas de carvão situadas na bacia do rio Sarre.
Mundial o equilíbrio europeu, tal como
Art. 119 - A Alemanha renuncia, em favor
ocorrera antes de ter início a primeira
das potências aliadas, a todos os direitos sobre
as colônias ultramarinas. Guerra dos Trinta Anos, em 1618;
Art. 171 - Estão proibidas na Alemanha a de, apesar da paz do período entreguer-
fibricaçâo e a importação de carros blindados, ras, a Segunda Guerra ter sido causada
tanques, ou qualquer outro instrumento que sirva pelos dispositivos decorrentes da Paz de
a objetivos de guerra. Versalhesde 1919;

90
Responda no caderno

di de terem ocorrido, entre as duas guerras autoritarismo militar e combater a tirania.


mundiais, rebeliões e revoluções como Claro que, em tempos de guerra, um gibi de
na década de 1640; um herói com uma bandeira americana no
e) de, em ambas as guerras mundiais, peito aplicando um sopapo no Führer só po-
o conflito ter sido travado por motivos deria ganhar destaque, e o sucesso não demo-
ideológicos, mais do que imperialistas. raria muito a chegar.

4. (Enem) COSTA, C. Capitão América, o primeiro vingador:


crítica. Disponível em: wvw.revistastart.com.br.
Acesso em: 27 jan. 2012 ladaptadol.

A capa da primeira edição norte-americana


da revista do Capitão América demonstra
sua associação com a participação dos Es-
tados Unidos na luta contra
ai a Tríplice Aliança, na Primeira Guerra
Mundial.
bi os regimes totalitérios, na Segunda
Guerra Mundial.
ci o poder soviético, durante a Guerra Fria.
o movimento comunista, na Segunda
Guerra do Vietnã.
Com sua entrada no universo dos gibis, o o terrorismo internacional, após 11 de
Capitão chegaria para apaziguar a agonia, o setembro de 2001.

rPara você Ler o (ira você assistii Ei


A Primeira Guerra Mundial, de Jayme Brener. A queda! As úLtimas horas de Hitler, direção de
São Paulo: Atica, 2000. Desvenda as intrigas Oliver Hirschbiegel. Alemanha/Itália/Austria, 2004.
que levaram o mundo à Grande Guerra de 1914, 150 mm. O filme acompanha os últimos dias do
desde suas raízes na corrida armamentista e no Rcich, quando Hitler se entregava à paranoia ao
imperialismo até a Revolução Russa, a vitória da .'ncarar a derrota iminente.
Enterite e o Tratado de Versalhes.
Cartas de Iwo uma, direção de Clint Eastwood.
A Segunda Guerra Mundial, de Antonio Pedro. EUA, 2007, 140 mm. O filme aborda a Segunda
São Paulo: Atual, 2004. Essa obra acompanha Guerra Mundial sob a ótica dos Japoneses, por
os acontecimentos da Segunda Guerra Mundial meio de cartas escritas por militares.
e examina as ideologias que emergiram no pe-
Olga, direção de Jayme Monjardim. Brasil, 2004.
ríodo, como o nazismo e o fascismo, questio-
141 mm. Olga Benárto, jovem judia, alemã e mili-
nando as heranças deixadas pelo conflito.
tante comunista, é perseguida pela polícia e foge
Os brasileiros e a Segunda Guerra Mundial, de para MOSCOLJ, onde recebe treinamento militar
Francisco César Ferraz. Rio de Janeiro: Jorge
A vida é beLa, direção de Roberto Benigni. Itália,
Zahar Editor, 2005. As circunstâncias que levaram
1997, 116 mm, O judeu Guido e seu filho, Giosué,
à entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial
são levados para um campo de concentração
são examinadas nesse livro, que também aborda
nazista, onde ele usa a imaginação para fazer o
as consequências do conflito na sociedade e na
menino acreditar que estão participando de uma
economia do país.
grande brincadeira.

91
1

3>2
;

Ç.:
:

Policiais reprimem
manifestação de
1 estudantes na região 1
central de São Paulo (SP),
3 de outubro de 1968.

r
Hoje, no Brasil, vivemos em um regime poderes independentes. Houve períodos,
democrático. Isso significa que a base do porém, em que o regime político apoiava-
sistema político é a soberania popular e a -se em princípios autoritários, e todos os
distribuicão equitativa do poder: ele não é poderes e instituições que governavam o
concentrado na mão de uma pessoa ou de país eram pautados por esses princípios.
um grupo político e sim dividido em três
-

Ao estudarmos a história mundial vimos usoabusivo do poder. Nos regimesautoritários,


que esses princípios autoritários fizeram e no Brasil ou em qualquer outro lugar do
fazem parte da trajetória de muitas nações. mundo, prevalece o cerceamento à liberdade.
O autoritarismo caracteriza-se por um Para entender o autoritarismo no Brasil,
regime político no qual o poder está concen- neste capítulo abordaremos a Era Vargas e o
trado nas mãos de um indivíduo ou de um grupo. Período Militar.
Nesses casos, geralmente, o governante faz
Autoridade: quem manda
e quem obedece?
Autoritário, de acordo com dicioná- Nas relações cotidianas é mais fácil
rios, é aquele que usa autoridade, ou seja, detectar o autoritarismo velado, como a
exerce o direito de mandar. No cotidiano, imposição de vestimentas ou comporta-
o autoritarismo é definido como a quali- mentos por um grupo a um adolescente
dade de quem é autoritário; já no campo para que ele seja aceito nesse grupo; a pres-
político refere-se à concepção ou à prática são psicológica para agir de determinada
autoritária do poder que limita as liberda- forma (por exemplo, mulher pressionada a
des individuais e públicas. Assim definida, não trabalhar fora por princípios machis-
essa palavra nos remete a pensar em poder, tas); a discriminação (étnica, de gênero,
em quem manda e como manda. religiosa etc.). Assim, é possível listar vá-
No viés político, o autoritarismo ocor- rias situações em que o autoritarismo se
re quando um grupo social ou partido polí- manifesta.
tico exerce de forma arbitrária a autoridade O poder está presente nas relações
sobre os demais membros de uma socieda- humanas - o dos pais sobre os filhos, dos
de. No Brasil, isso aconteceu no governo de médicos sobre os pacientes, dos patrões
Getúlio Vargas, entre as décadas de 1930 e sobre os empregados -, e pode ser consi-
1940, e no Período Militar, entre os anos de derado legítimo desde que provenha de
1964 e 1985. Em ambos os casos o país foi uma fonte também considerada legítima
governado por regimes ditatoriais. pela sociedade, como o conhecimento ou
Mas nem sempre o autoritarismo ocor- a tradição. No caso da tradição, podemos
re de maneira clara e definida como nas di- mencionar como exemplo a relação entre
taduras e em outros regimes repressivos. Por pais e filhos.Já no que se refere à autorida-
vezes, em governos democráticos são pratica- de proveniente do conhecimento é possível
das formas veladas de autoritarismo, como a citar os médicos, que indicam tratamentos
censura à imprensa e a coerção. Essas ações a serem seguidos.
se passam como se os princípios democráti- É a ideia da existência dessas fontes
cos não estivessem sendo violados ou nega- legítimas de poder que diferencia a ação
dos. Portanto, nem sempre o autoritarismo é autorizada da autoritária.
tão perceptível como se pode imaginar.

As fontes de poder Carisma - O líder carismático obtém a obediên-


cia porque seus seguidores acreditam que ele tem
[...] quando perguntamos sobre as fontes de
poder, a resposta não é tão simples. O poder tem algum poder sobre-humano [...].
Tradição - As pessoas se submetem porque na
várias fontes. Vejamos que fatores podem levar
uma pessoa a obedecer a outra. sua sociedade é costume obedecer a determinadas
Propriedade - [...1 a propriedade se transforma pessoas. j...j
Lei - As pessoas acreditam que as leis represen-
em poder na medida em que o detentor da pro-
tam uma decisão coletiva sobre a melhor forma de
priedade, por este fato, pode nos causar danos ou
nos garantir recompensas. [ ... ] os indivíduos conviverem em sociedade.
FERREIRA, Roberto Martins. Sociologia da educação.
São Paulo: Moderna, 1993. p. 162-163.

_94
!ausa para investigação

Como você percebe o autoritarismo em seu Apresente o resultado em sala e analise com
dia a dia? Faça uma Lista com atitudes cotidia- os colegas as atitudes autoritárias mais co-
nas que podem ser consideradas autoritárias, muns e por que elas acontecem.
corno proibições sem explicação, violência Depois, reflita sobre suas próprias atitudes: Em
física ou psicológica etc. Anote também em que momentos você é autoritário? O que pro-
que situações essas atitudes ocorrem e se elas voca em você reações autoritárias? É possível
se encaixam em alguma das fontes de poder não agir dessa forma? Como? Você consegue
perceber nesses momentos qual é a justifica-
citadas no texto.
tiva para esse tipo de comportamento?

O autoritarismo no Brasil.
O autoritarismo e o nacionalismo marcaram O chamado Período Militar (1964 a 1985)
o período compreendido entre 1930 e 1945, cujo foi outra fase dominada pelo autoritarismo no go-
personagem principal da política nacional foi Ge- verno brasileiro. Não houve nessa época a perso-
túlio Vargas, em razão de ter permanecido durante nificação da autoridade em uma pessoa, mas em
todos esses anos na Presidência da República. Essa um grupo - no caso os militares, que exerceram o
época ficou conhecida como Era Vargas. poder de maneira autoritária por intermédio de
Vargas presidiu o Brasil durante 18 anos cinco generais presidentes, que se sucederam no
(1930 a 1945 e 1951 a 1954), eo fez, na maior par- comando da nação.
te do tempo, de forma autoritária, centralizadora Esses dois períodos foram marcados pela ca-
e personalista. racterística principal de qualquer regime autoritá-
rio: a falta de liberdade individual.

Organizando ideias
Leia a definição de democracia a seguir e, depois, responda às questões no caderno.

Democracia: O que caracteriza uma democracia para o


autor?
Forma de governo na qual o poder supremo
está nas mãos do povo e é exercido diretamente
ou por intermédio de representantes eleitos; da pa- Analisando essa definição, pode-se afirmar
lavra grega que significa "governo do povo". Em- que o Brasilvive hoje uma democracia plena?
bora existam diversas formas de democracia e ela Justifique e exemplifique.
esteja sujeita a interpretações divergentes [ ... ], na
era moderna o conceito significa, em geral, gover- O que difere democracia de ditadura? Para
no da maioria, direitos individuais e minoritários,
responder, faça uma pesquisa em sites e
igualdade de oportunidades, igualdade perante a
dicionários sobre o conceito de ditadura.
lei, e direitos e liberdades civis. O ideal democráti-
co fundamenta-se nos conceitos de direito natural, Escreva uma definição de sua autoria para o
direitos naturais e dignidade humana, e igualdade. termo e depois estabeleça as diferenças.
"Democracia" é um termo mais amplo do que
"república", que denota governo não monárquico
por intermédio de representantes eleitos.
ROHMANN, Chris. O Livro das ideias.
Rio de Janeiro: campus, 2000. p. 96.

95—
ÂEra Vargas
Em 1930 a populaçao brasileira era de aproxima- t
damente 37 milhões de pessoas, das quais cerca de 70%
viviam em área rural. Havia um contingente de quase
2 milhões de desempregados em virtude da crise mun-
dial de 1929. . '.. . .

Na politica, o Brasil era dominado pelos grandes


proprietários de terra, com destaque para os produtores
de café de São Paulo, e pelos pecuaristas, produtores de
leite e carne de Minas Gerais. No período de 1902 a 1930,
houve uma alternância no poder entre esses dois grupos J
hegemonicos Essa prática ficou conhecida como Politica
/
do Cafe com Leite 1 ,
Nesse cenário, haveria eleições em março de 1930 o NOS
e pelo revezamento do poder preestabelecido o suces- MAS
PÇOJWtAna flI 51 - 5%-
sor do representante paulista, Washington Luis (1926- -

1930), na Presidencia do Brasil seria um mineiro. Mas -s -ViTAL 0/ES


o presidente, já em 1929, lançou a candidatura de Júlio -
Prestes, outro paulista. Assim, rompeu-se o pacto entre Cartaz da campanha de Júlio Prestes à presidência da
República, publicado na revista O Cruzeiro, 22 mar. 1930.
Sao Paulo e Minas Gerais, o que abriu caminho para o
surgimento de candidatos de outros estados, como o
governador do Rio Grande do Sul, o gaúcho e ex-minis-
tro da Fazenda Getúlio Dornelies Vargas, que concorreu
à eleição com o apoio dos mineiros e de opositores ao
governo oriundos de vários outros estados. .
As eleições de março de 1930 foram vencidas pelo
candidato do governo, Júlio Prestes, como previsto. Con- • ,
tudo, seus opositores não aceitaram o resultado e se orga-
nizam para impedira posse.
Em meio a essas articulações, um acontecimento
serviu para acirrar ainda mais os ânimos contra o go-
verno: o assassinato do paraibano João Pessoa, vice na , i . . .
chapa derrotada de Getúlio Vargas, ocorrido em 26 de
julho de 1930 , em uma con eitaria
. no Recif e. 0 crime
fora motivado por questões políticas regionais. Contu- IL1'UUOYARGA$eJOAO PUS
do, foi o estopim do levante que entrou para a história
com o título de Revolução de 1930. Propaganda politi i de Getúlio Vargas e seu vice. Joao P ssoa.
para as eleições presidenciais de 1930.
No dia 3 de outubro, simultaneamente no Rio Gran-
de do Sul, em Minas Gerais e na Paraíba estourou a revo-
lução, que avançou em direção ao Rio de Janeiro. No dia ARevoluçãodel93opõeflrnàhege-
24, os militares depuseram Washington Luís, e uma junta, monja da burguesia do café, desenlace ins-
composta dos generais Tasso Fragoso e Mena Barreto e crito na propna forma de mserção do Bra-
do almirante lsaías de Noronha, tomou posse no governo. silno sistema capitalista internacional. [...]
Vitoriosa a revolução, abre-se uma es-
Em 3 de novembro de 1930, a junta entregou-o a
pecie de vazio de poder, por força do co-
Getu 110 Vargas, que assumiu a chefia do governo proviso-
lapso político do café e da incapacidade das
rio com plenos poderes para comandar o país até a con- demais frações de classe para assumi-lo,
vocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

96
!

li

Moveis e eqLapamPiitos (:0 jnr1iod1Co,


Incéndio na sede do jornal go,'w lista A Noite. Rio de Janeiro (RJ). 1930. ivOU:d d :erillailõflCia de devo Piestes
no poder, foram clepiedados e irlcendiados por apoiadores de Gelúlio Vargas.

em caráter exclusivo, O Estado de compromisso O governo provisório e


é a resposta para esta situação. Embora os limites a Legalização do regime
da ação do Estado sejam ampliados para além da
consciência e das intenções de seus agentes, sob o No início do governo provisório de Getúlio
impacto da crise econômica, o novo governo re-
Vargas, o Congresso Nacional, as Assembleias
presenta mais uma transação no interior das clas-
ses dominantes, tão bem expressa na intocabilida- Legislativas e as Câmaras Municipais foram dis-
de sagrada das relações sociais no campo. solvidos. Além disso, foram criados dois ministé-
rios -Trabalho, Indústria e Comércio e Educação
FAUSTO, Bons. A Revolução de 1930: histoiiogralia e
hstóra. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 112-113. e Saúde Pública.

O que era para ser um governo provisório


O Governo Provisório chefiado por Getúlio
tornou-se permanente. Getúlio Vargas conseguiu
Vargas teve no grupo dos "tenentes" um dos
manter-se no poder fazendo uso de diversos meios seus principais pilares de sustentação política.
- da não convocação de eleições, passando pela Vários líderes tenentistas, como Juarez Távora,
Constituição de 1934, até o Golpe de Estado e a João Alberto e Juraci Magalhães, ocuparam
outorga de uma Constituição autoritária, ambos cargos de relevo na administração federal e
em 1937. E assim permaneceu como mandatário nos estados.
da nação até 1945.

97—
Desde 1932 estava em vigor uma lei eleito-
Os "tenentes" reivindicavam mudanças sig- ral que convocava eleições para uma Assembleia
nificativas na vida política e econômica brasi-
Constituinte. Esse novo código trazia algumas
leira que implicavam a permanência do poder
novidades, como o voto secreto, a Justiça Eleito-
nas mãos de Vargas e o adiamento da constitu-
cionalização do país. Esse projeto esbarrou na ral e o voto feminino.
forte oposição de importantes grupos regionais A Assembleia Constituinte foi eleita em 1933
interessados em retomar as posições que ha- e promulgou a nova Constituição em 16 de julho
viam perdido. O conflito político iria se aguçar, de 1934. Essa Carta Magna foi inspirada na Cons-
provocando, menos de dois anos depois da Re- tituição da República de Weimar, na Alemanha,
volução de 1930, um novo movimento revolu- e assegurou algumas conquistas sociais que be-
cionário em São Paulo: a Revolução Constitu- neficiavam os trabalhadores, como a criação da
cionalista de 1932. [..j
Justiça do Trabalho, o salário-mínimo, a jornada
O conflito se acirrou no ano de 1932. Em ju-
lho OS grupos políticos paulistas partiram para de trabalho de oito horas, férias anuais remurie-
um confronto armado com Vargas na Revolu- radas e descanso semanal. Entretanto, não mexeu
ção Constitucionalista. Porém, sem o apoio dos efetivamente nas estruturas econômicas e sociais,
outros estados, os rebelados foram derrotados mantendo a má distribuição de renda e de terras.
pelas forças legalistas. A "guerra paulista" teve A Constituição estabeleceu também que a
como principal resultado a aceleração do pro- primeira eleição presidencial após sua promulga-
cesso de constitucionalização. ção seria feita indiretamente, pelo voto dos mem-
A Era Vargas: anos de incerteza 1930-19371 - No país dos bros da Assembleia Nacional Constituinte, e as
tenentes. CPDOC. Disponível em: <http:/fcpdoc.fgv.br/
futuras seriam por voto direto.
producao/dossies/AEraVarqasi /anos30-37/
PaisDosTenentes>. Acesso em: abri 2016. No dia 17 de julho de 1934, Getúlio Vargas
foi eleito de forma constitucional.

Organizando ideias -
Analise a charge a seguir e responda às questões.

TOlilOil Posse liii NÍesifieBUíl do ReiiuhIia o si. kIão Varas 1


P011. OCCASIÃO l).% SOLENNII)MW REALIZãDA FST\ TMIDF: NO P li \( II) TIO lO! \ 1 t. II SI il' 1 ' li ..b HA 1 'l t\l.
FESTO t NACÃO. IIISTOR1\90 OS TRAI! 11.1105 LX) GOVER.NI1 1001 NilItIu
'O DroM.ma do Ilraod o i (.nsIquiço, Bni,de,r, Ii ,I- d.,.,,rn.o Ilr,r o im,.'Ijo oh.................. ......

.
.

H1LL

Charge do cartunisla Belmonte publicada no jornal Folha da Noite. São Paulo (SP). 20 de julho 1934.

O que está representado?

Qual é a principal mensagem transmitida pela charge?

Por que o autor das imagens satirizou esse momento? Formule hipóteses.

98
2 Viajando pela história
A participação poLítica feminina
na História do Brasil
No Brasil, assim como em muitas partes do •.. -
mundo, a mulher recebia uma educação diferen-
dada da dos homens. A ela cabia o papel de es-
posa, mãe e cuidadora da casa, e ao homem, o
de mantenedor; portanto, a ele cabiam os estu-
:
dos. A mulher solteira devia subordinar-se ao pai
e, depois de casada, ao marido. Esse padrão de
comportamento perdurou por muito tempo, e
resquícios dessa mentalidade ainda permanecem.
A partir da Constituição de 1824 começaram
a surgir escolas para mulheres. Essas instituições
ensinavam trabalhos manuais e cânticos, manten-
do a mulher afastada dos saberes formais. (&
No entanto, nem todas aceitavam essa con-
dição, e, já em meados do século XIX, desponta-
ram grupos que atuavam em busca da emancipa-
ção feminina. Destacaram-se como líderes desses
grupos Josefina Alves de Azevedo e Nísia Floresta
Brasileira Augusta.
Essas mulheres procuravam despertar em ou-
tras o desejo de trabalharfora do lar e, assim como
os homens, participar ativamente da sociedade.
VI
2
Oscar Pereira da Silva Hora de Música, 1901. O!eo sobre lela,
Logo após a Proclamação da República
65 cm x 50 cm. Entre os séculos XIX e XX, era comum que mulheres
(1889), começaram a surgir grupos que lutavam de familias ricas estudassem musica em ambiente doméstico.
também pelo direito ao voto feminino. Essa foi
uma das principais bandeiras levantadas pelos muitas, no papel de educadoras nas escolas, con-
movimentos feministas que se seguiram. quistaram espaço fora do lar. Elas começaram
O voto feminino foi discutido durante a As- a trabalhar também nas fábricas, mas recebiam
sembleia Constituinte de 1891, em um projeto tratamento e salário diferentes dos concedidos
encampado pelo deputado Joaquim Saldanha aos homens.
Marinho. Contudo, a maioria de seus compa- Em 1910 foi criado no Rio deJaneiro o Parti-
nheiros considerou que conceder à mulher um do Republicano Feminino, fundado pela professo-
papel na política, mesmo apenas como eleitora, ra Leolinda Daltro. Entre os objetivos desse partido
seria um risco à manutenção da estrutura tradi- estava o de reacender no Congresso Nacional o
cional das famílias. debate sobre o voto feminino, abandonado desde
Foi somente no século XX que as mulheres a Constituinte de 1891.Já em 1917 os integrantes
passaram a participar cada vez mais do universo do partido chegaram a organizar uma passeata
até então restrito aos homens, ganhando espa- para reivindicar o voto feminino. Mesmo não ten-
ços dos quais antes estavam alijadas. Como re- do conseguido alcançar esse objetivo, as mulheres
sultado de lutas e enfrentamentos, as mulheres obtiveram uma conquista importante: passaram
passaram a se destacar nas atividades culturais; e a ser aceitas no serviço público.

99—
Em 1919 foi dado mais um passo na luta fe-
minista ao ser instituída a Liga para a Emancipa- O Código Eleitoral promulgado em fevereiro
ção Intelectual da Mulher, que, em 1922, transfor- de 1932 concedeu pela primeira vez o direito de
voto às mulheres. [ ... ]
mou-se na Federação Brasileira para o Progresso
Muitas mulheres se candidataram à Consti-
Feminino, tendo Berta Lutz entre suas líderes.
tuinte de 1934, como Berta Lutz e Leolinda de
A partir de 1921, a campanha pelo voto fe- Figueiredo Daltro, mas apenas Carlota Pereira
minino intensificou-se quando Berta Lutz apresen- de Queirós conseguiu se eleger por São Paulo.
tou, em entrevista a um jornal, a emenda constitu- No Distrito Federal, Almerinda Farias Gama
cional de autoria dos deputados Bittencourt Filho participou como delegada sindical da eleição de
e Nogueira Filho, que inseria o voto feminino na representantes classistas. { ... )
Constituição. Lutz usou como exemplos a serem Em 1933, Berta Lutz [ ... j foi convidada pela de-
putada Carlota Pereira de Queirós para elabora-
seguidos países onde mulheres e homens tinham
rem em conjunto um trabalho para a Constituinte
os mesmos direitos políticos, entre eles Suécia
de 1934. Nele era defendida a eleição da mulher
(1862), Finlândia (1906), Noruega (1913) e Dina-
e a reforma do ensino de acordo com as deman-
marca (1915). das da nova sociedade urbano-industrial. Vários
Finalmente, em 24 de fevereiro de 1932, o artigos da Constituição de 1934 iriam de fato be-
movimento feminista sufragista saiu vencedor por neficiar a mulher, entre eles os que estabeleciam a
meio do Decreto n 21.076, Art. 2° - "É eleitor o regulamentação do trabalho feminino, a igualda-
cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, de salarial e a proibição de demissão por gravidez.
alistado na forma deste Código" -, instituído pelo Participação política feminina. A Era Vargas: dos anos
presidente Getúlio Vargas. 20 a 1945. CPDOC. Disponíve[ em: <http://cpdoc.fgv.br/
producao/dossies/AEraVargasl/anos30-37/Constituicao1 934/
ParticipacaoFeminina>. Acesso em: abr: 2016.

Organizando ideias
Observe a charge a seguir e responda às perguntas.

a enxergar a emancipação
feminina como ameaca à es-

2
tabilidade familiar.

2. Qual foi a importância da


Lei Eleitoral de 1932 para
as mulheres?

3. A charge foi publicada


há mais de cem anos.
Atualmente, em diversos
lugares do mundo, as
mulheres têm alcançado
o direito ao voto e à equi-
"0 voto às mulheres, charge publicada na revista O matho, jun. 1917.
dade nas condi ções de
1. Analise a charge e a relacione com o movi- trabalho. Sobre a igualdade de direitos, que
mento de emancipação feminina no contexto alterações podem ser observadas nos dias
de 1917. Depois, elabore hipóteses para enten- atuais em relação ao pensamento do início
der os motivos que levavam muitas pessoas do século XX?
2
100
Resgate cultural

Lutas e conquistas Quem agride?


Esses dados são resultado dos registros
femininas do SUS em atendimentos de violência contra
mulheres adultas lmaiores de 18 anos).
Os movimentos feministas influenciaram
diversas conquistas importantes para a luta das
mulheres pela igualdade de direitos e oportu-
nidades. Nesse sentido, um campo de atuação Pai-1 [
0,9%
— Mãe 1,0%
- Padrasto 0,4%
muito significativo é o combate à violência -

contra a mulher, em que duas leis merecem


destaque: a Lei Maria da Penha, de 2006, que acasales
25,4% Cdojuãe
elevou o rigor das penas para crimes contra 30,8%

cônjuges; e a Lei do Feminicídio, de 2015. 10,1%


O feminicídio pode ser entendido como Irmão Ea.cõojage
150%
as agressões cometidas contra uma pessoa do
L
sexo feminino no âmbito familiar da vítima que, Fãoo--I
4,9% Namorado 3,4%
de tormu intencional, causam lesões ou agravos /
Mapa da violicncca
sai.de que levam a sua morte.
-:':.'', :}ti-•--- --; :::> ''...::I:'I''r'. :1::.
WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2015: homicídio
de mulheres no Brasil, Brasília. 2015. p. 7. l)csponiveí em:
w.wmapadaviotencia.or'y.br'/mapa2ül ãrnulheres.php:>. Leia a seguir um trecho da Lei do Feminicídio.
Acesso em: abr. 2016.
Art. 1° O art. 121 do l)ecreto-Lei n o 2.848, de 7
A existência de leis específicas para crimes de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigO-
contra mulheres expressa uma reação da so- rar com a seguinte redação
ciedade brasileira à violência sofrida por muitas
mulheres. Essa violência é bastante grave no S 2"-A Considera-se que há razões de condição
país: em 2013, 4 762 mulheres foram assassi- do sexo feminiim quando o crime envolve:
nadas. Veja outros dados a seguir. - violência doméstica e familiar;
11 - menosprezo ou discriminação à condição
Onde ocorre?
dc mulher.
PERCENTUAL DE PESSOAS AGREDIDAS Aumento da pena
POR LOCAL E SEXO - BRASIL. 2013
§ 70 A pena do feminicídio é aumentada de 1/3
Local Feminino Masculino (um terço) até a metade se o crime for praticado:
Estabelecimento de saúde 25.2 26.1 - durante a gestação ou nos 3 (trés) meses pos-
Domicilio 27.1 10.1 teriores ao parto;
Via pública 31.2 48,2 II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos,
Outros 15.7 15,0 maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;
Ignorado 0.8 0.7 111 - na presença de descendente ou de ascen-
Total 100,00 100,00
dente da vítima." (NR)
Mapa da violência 2015 BRASIL. Lei n. 13.06, de 9 de março do 2015. Disponível
r:ii Srasl Braoia, 7(315 :.'J3. em: <w\,m.,.p[,-jnalto.gov.br/ccivit.03/ -- Alo20 15-2018/201 5/Leu
L13101,.htm>. Acesso em: abrI 2016.

O número de homicídios cometidos em casa


1. De que modo a Lei do Feminicídio pode con-
é cerca de três vezes maior para mulheres do
tribuir para a luta pela igualdade de direitos?
que para homens.

0 autoritarismo no Brrc'l 101


Crítica e apoio ao governo

Em 1935 foi criada, no Brasil, a Aliança Na-


cional Libertadora (ANL), organização política re-
lacionada ao recém-legalizado Partido Comunista
1444444 f il
Brasileiro (PCB), liderado por Luís Carlos Prestes.
Inspirada em grupos contrários ao nazi-fas-
cismo, a organização ganhou força rapidamente
e conquistou diversos simpatizantes ligados ao
socialismo, além de militares, operários e religio-
sos que tinham em comum a insatisfação com o
governo de Getúlio Vargas.

O programa básico da ANL tinha conteúdo


nacionalista. Nenhum de seus cinco itens se di-
rigia especificamente aos operários. Eram eles a
-• : ...

suspensão definitiva do pagamento da dívida ex-


terna; a nacionalização das empresas estrangei-
ras; a reforma agrária; a garantia das liberdades
populares; a constituição de um governo popu-
lar, do qual poderia participar "qualquer pessoa
na medida da eficiência de sua colaboração".
A formação da ANL se ajustou à nova orien-
tação do Comitern, defendendo a criação de
frentes populares em todo mundo contra a amea-
ça fascista. [ ... ]
Ao mesmo tempo, a criação da ANL foi faci-
litada pela transformação que ocorreu no PCB
a partir do ingresso de Prestes no partido, em
agosto de 1934. A organização deixou de ser um
pequeno agrupamento dirigido essencialmente
à classe operária para se converter em um orga-
nismo mais forte do ponto de vista numérico e
com uma composição mais variada.

FAUSTO, Bons. História concisa do BrasiL.


São Pauto: Edusp, 2011. p. 197.

Sede da Aliança Nacional Libertadora (ANL) na Rua Almirante


Barroso. Rio de Janeiro (RJ). 1935.
O crescimento da ANL e sua postura de
oposição fizeram com que o grupo fosse colocado O objetivo desse movimento, conhecido
na ilegalidade, o que motivou seus membros a como Intentona Comunista, era tomar o poder
preparar uma ação mais efetiva contra o governo. de Getúlio Vargas e instaurar um governo popular.
Assim, em novembro de 1935 ocorreram diversas Contudo, foi duramente reprimido pelas forças
manifestações contrárias à administração de oficiais, que prenderam milhares de pessoas.
Getúlio Vargas, com destaque para os levantes Após esse episódio, os movimentos de opo-
militares em Natal, Recife e Rio de janeiro, então sição se enfraqueceram e o regime de Vargas se
capital nacional. tornou cada vez menos tolerante.

102
Depois da Intentona Comunista, a Âco In- Simpático aos ideais fascistas, com o apoio
tegraLista Brasileira viveu seu período de auge dos integralistas e sob o pretexto de conter o avanço
político. dos grupos de ideologia comunista no Brasil, Vargas
Os integralistas, cujo chefe maior era Pl(nio juntou forças para a implantação de uma ditadura.
Salgado, passaram a ser colaboradores do gover-
no. Autoritários e nacionalistas, eles se inspiravam
...J Em meados de 1937 Vargas dava cla-
nos grupos da extrema direita europeia, até mes-
ros sinais de que cogitava adiar as eleições. Mas
mo em sua saudação: com o braço direito levanta-
prorrogar mandatos em desacordo com a Cons-
do, como na Alemanha nazista, falavam a palavra tituição seria um golpe, e não havia clima para
indígena anauê (no lugar de Hei! Hitler, a sauda- isso, já que a Intentona ficara distante no tem-
ção ao Führer) para saudar os companheiros. po. Então se construiu a farsa do Plano Cohen.
Em setembro de 1937, o capitão Olímpio Mou-
rão, oficial integralista, estava no Ministério da
A Âço Integralista BrasiLeira (AIB) foi Guerra datilografando um plano de ação comu-
fundada em 1932 sob a liderança do jornalista e nista de tomada do poder. O plano era falso e o
escritor Plínio Salgado. Pregando urna doutrina texto teria apenas função didática; seria levado
de cunho autoritário e nacionalista, a organiza- aos integralistas, que, diante da situação hipoté-
ção cresceu durante o primeiro governo Vargas tica, discutiriam estratégias. Cohen - um nome
(1930-1937), que nutria simpatia pelos modelos judaico não por acaso, dado o antissernitismo
europeus do fascismo. Mas a lua de mel durou dos integralistas - era o nome fictício do plano.
pouco. Com o golpe do Estado Novo (1937- E isso deveria ser tudo.
-1945) e a proibição de qualquer organização Mas Mourão teria sido surpreendido enquan-
partidária, a AIB foi ferozmente perseguida e to datilografava, e o "documento" foi parar nas
teve seus principais quadros exilados. mãos de Vargas [...]. Passados alguns dias, em 30
Integralismo renovado. Revista de História da Biblioteca de setembro, o plano teve ampla divulgação como
Nacional. Disponível em: <w,.revistadehistoria.com.hr/ se fosse real. O golpe começava a tomar forma.
secao/em-dia/integralisrno renovado>. [ ... ] No dia 10 [de novembro], policiais mi-
Acesso em: abr. 2016.
litares fecharam o Congresso, que seria em se-
guida dissolvido. O golpe tinha sido preparado
com tanta antecedência que, no mesmo dia, já se
anunciou a nova Constituição.
[ ... ] A Carta concentrou todos os poderes
nas mãos de Vargas, que passou a governar por

/
.* meio de decretos-lei. Garantias e liberdades in-
dividuais foram suspensas.

- .. PILAGALLO, Oscar. Tudo novo no (ront. In:


O Brasil em sobressalto: 80 anos de história contados pela
f'T Folha. São Paulo: Publifolha. 2002. p. 55.

Assim, as eleições foram canceladas, os par-


tidos políticos foram extintos, a imprensa foi censu-
rada e os estados perderam sua autonomia, sendo
governados por interventores nomeados por Vargas.
O novo regime foi intitulado Estado Novo,
nome copiado da ditadura de Salazar em Portugal
.id :
(1933). Iniciou-se um período de ditadura e auto-
Plinio Salgado (ao centro) e outros membros da AIB, conhecidos como
camisas-verdes, fazem a saudação anaue' em encontro no Rio de Janeiro rita ris m o.
(RJ) c. 1935. Em seus uniformes, os integralistas vestiam braçadeiras com
a letra grega sigma (). usada na Matemática como sinal de somatório.

103
Estado Novo: projeto autoritário de Vargas

O Estado Novo caracterizou-se como um regi- Entre 1937 e 1945, os brasileiros viveram
me de grande intervencionismo estatal. Como um anos de repressão ideológica, controle total dos
dos instrumentos reguladores do governo, foi criado sindicatos, censura, perseguição e torturas aos
o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), opositores políticos.
responsável por difundir a ideologia do novo regime Prisões e exílio eram os destinos de políticos
e valorizar o patriotismo. Para calar os opositores, o como Armando de Salles Oliveira, governador de
órgão agia com rigorosa censura aos meios de co- São Paulo, que havia manifestado sua intenção de
municação e realizava intensas campanhas publici- se candidatar à Presidência em 1938; de intelectuais
tárias para enaltecera figura do chefe da nação. como o escritor alagoano Graciliano Ramos; ou de
quaisquer desafetos ou adversários do ditador, as-
sim como de todos os que se opunham ao governo.
Durante todo o Estado Novo, estima-se que
houve mais de 10 mil presos políticos encarcerados
pela Polícia Política de Vargas. Nos presídios era co-
mum a tortura, o que causou mortes e mutilações.
E quem não era preso também era condenado, mas
ao exílio, ou seja, obrigado a viver fora do país.
Getúlio estabeleceu uma relação ambígua
com os trabalhadores: por um lado, concedeu di-
reitos até então inéditos, e por outro, manteve o
movimento operário sob seu controle. Em 1943,
já em um cenário de decadência do regime estado-
-novista, Vargas outorgou a Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT), que, embora garantisse muitos
benefícios aos trabalhadores, proibia as greves e es-
tabelecia a unicidade sindical.

Cartaz do DIP que exaltava o governo varguista, 1939.

A valorização da marca pessoal do presi-


dente foi constante durante a ditadura varguista.
Além de cartazes, diversos meios de comunicação
foram utilizados com esse objetivo, com destaque
para o rádio, que começava a se popularizar.
No rádio, Getúlio criou em 1934 a Hora do
Brasil, programa no qual era veiculada diaria-
mente a propaganda do governo.
Nem os carnavais ficaram de fora. A partir
de 1937, por decreto, ficou estabelecido que os
sambas-enredo deveriam ter cunho histórico e
patriótico. Com essa determinação, muitas letras Getúlio Vargas duranto concentração trabalhista em frente ao Ministeno
da Fazenda no dia em que a CLT entrou em vigor. Rio de Janeiro (RJ),
passaram a enaltecer a nação. 11 Out. 1943.

104
Com a participação do Brasil na Segunda A popularidade do Queremismo preocupou
Guerra Mundial, ocorreu uma contradição de- setores oposicionistas, que temiam a continui-
terminante para o fim do regime: internamente dade de Getúlio Vargas no governo. Além disso,
vivia-se uma ditadura, e na guerra lutava-se em algumas atitudes de Vargas indicavam a possibi-
prol das democracias. Era o começo do fim do lidade de uma nova manobra com o objetivo de
autoritarismo de Vargas. manter o poder.
As suspeitas de golpe aumentaram com a
nomeação de Benjamim Vargas - irmão do pre-
Nos primeiros meses de 1945, já no fim da sidente - para chefe de polícia do Distrito Fede-
guerra, estando clara a derrota do nazifascismo, as ral. Como reação, o Alto Comando do Exército,
manifestaçôes contra a ditadura Vargas se intensi-
liderado pelo ministro da Guerra e general Góes
ficaram em todo o país. Aliás, em todo o mundo
Monteiro, depôs Getúlio Vargas da presidência.
os ventos eram favoráveis à democracia. Diante de
O fim do Estado Novo, entretanto, não signifi-
mudanças na conjuntura internacional, e pressio-
nado pelas manifestações dos mais variados setores cou o fim da carreia política de seu chefe. Em 1950,
da sociedade, o governo se apressou então a adotar Getúlio foi eleito presidente pelo Partido Trabalhis-
uma série de medidas liberalizantes: suspendeu ta Brasileiro (PTB), criado por ele mesmo. Como ele
a censura aos meios de comunicação e concedeu havia declarado, voltou ao poder pelos "braços do
anistia aos presos políticos. Era necessário elaborar povo", por meio do voto direto. Nessa nova fase,
uma legislação adequada aos novos tempos.
seu governo foi marcado por uma forte campanha
PANDOLFI, Dulce Chaves. Voto e participação política nas nacionalista, embora ainda vivesse as contradições
diversas repúblicas do Brasil. In: GOMES, Ângela de Castro
da dependência do capital estrangeiro.
ei aI. A república no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
2002. p. 90-91. Apesar de eleito pela população, Vargas en-
frentou intensa oposição da União Democrática
Nacional (UDN), partido que criticava duramen-
Nos primeiros meses de 1945, Vargas final- te as ações do governo. Dentre os membros da
mente convocou eleições, que seriam realizadas U DN destacava-se Carlos Lacerda, jornalista pro-
em dezembro. Contudo, houve forte reação das prietário do jornal Tribuna de Imprensa.
pessoas que queriam a continuidade do governo. A situação do presidente ficou mais delica-
Esse movimento ganhou muitos adeptos e ficou da quando, em 1954, Carlos Lacerda sofreu um
conhecido como Queremismo. atentado, no qual foi relatada a participação de

Os dias finais do regime foram de intensa mo-


bilização popular. Enquanto a lei eleitoral e o alis-
tamento iam sendo providenciados, começava nas
ruas um movimento, incentivado pela burocracia
getulista, que pedia a continuidade do Getúlio no
poder. Esse movimento ficou conhecido como o
Queremos Getúlio, ou Queremismo, e foi am-
plamente apoiado pela máquina de propaganda e
de mobilização do Estado Novo. Alguns comícios
queremistas foram realizados [ ... ] sem que Getú-
lio os autorizasse. Tudo indicava que estava em
marcha um plano continuísta, desta feita não com
o apoio dos militares, como em 1937, mas com o
apoio das massas.

D'ARAUJO. Mariv Celina Soares, O Estado Novo.


Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. 2000. p. 59-60. Carlos Lacerda após o atentado na Rua Toneleros, Copacabana,
Rio de Janeiro (RJ), 5 ago. 1954.

0 autoritarismo no Br: 105


um membro da guarda pessoal de Vargas. Pres- O ex-ditador não resistiu às pressões e sui-
sionado pelo Ministério da Aeronáutica, que ge- cidou-se no dia 24 de agosto daquele ano, mas
ria as investigações do caso, Vargas se viu acuado, antes imprimiu sua marca pessoal em uma carta-
com a iminência da renúncia ou da deposição. -testamento.

[ ... J Nessa carta ficavam explícitas as razões que o tinham levado ao gesto extremo do suicídio e eram
indicados os responsáveis pelo desfecho trágico: grupos internacionais cujos interesses o governo contra-
riara, aliados a grupos nacionais que se opunham ao que Vargas definia como 'o regime de garantia do
trabalho". [ ... ] No texto, Vargas colocava-se, enquanto governante, no papel de defensor, representante e
libertador do povo. Com sua morte, buscava sagrar-se seu mártir e consolidar seu nome no panteão políti-
co brasileiro, associando-o definitivamente à bandeira dos interesses nacionais e do trabalhismo. Revelador
dessa intenção é o trecho em que se lê: "Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar
sugando o povo brasileiro, eu ofereço cm holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre con-
vosco... Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta".
HEYMANN. Luciana Qulilel. A Carta-testamento e o legado de Vargas. CPDOC. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/
producao/dossies/AEraVa rgas2/artiqos/AlemDaVida/CarlaTestamento>. Acesso em: abr. 2016.

Organizando ideias

Em dupla, analisem o texto e depois façam nas livrarias libelos terríveis contra a república novís-
que se pede. sima, às vezes com louvores dos sustentáculos dela,
indulgentes ou cegos. Não caluniemos o nosso peque-
Memórias do cárcere nino fascismo tupinambá: se o fizermos, perderemos
Resolvo-me a contar, depois de muita hesitação, qualquer vestígio de autoridade e, quando formos
casos passados há dez anos e, antes de começar, digo verazes, ninguém nos dará crédito.
os motivos por que silenciei e por que me decido. 1)e fito ele não nos impediu escrever. Apenas nos
Não conservo notas: algumas que tomei foram inu- suprimiu o desejo de entregar-nos a esse exercício.
tilizadas, e assim, com o decorrer do tempo, ia-me
RAMOS, Gracitiano*. Memórias do cárcere.
parecendo cada vez mais difícil, quase impossível, São Paulo: Record, 2008. p. 11-12.
redigir esta narrativa. Além disso, julgando a matéria
Graciliano Ramos toi preso em Maceió, em março de 1936, sem
superior às minhas forças, esperei que outros mais
processo e sob suspeita de ter participado da Intentona Comu-
aptos se ocupassem dela. 1...] nista em 1935; toi libertado em janeiro de 1937. Dez anos depois,
Restar-me-ia alegar que o DIP, a polícia, enfim, escreveu o livro Memórias do cárcere - publicado somente após
os hábitos de um decênio de arrocho, me impediram sua morte -. no qual descreve sua experiência na prisão,
trabalho, isto, porém, seria injustiça. Nunca tive-
mos censura prévia em obra de arte. Efetivamente Havia liberdade no Estado Novo? O texto
se queimaram alguns livros, mas foram raríssimos confirma sua resposta? Expliquem.
esses autos de fé. Em geral a reação se limitou a su-
primir ataques diretos, palavras de ordem, tiradas Relacionem liberdade e autoritarismo no
demagógicas, e disto escasso prejuízo veio à produ- Governo Vargas.
ção literária.
Expliquem a afirmação de Graciliano Ramos
Certos escritores se desculpam de não haverem
forjado coisas excelentes por falta de liberdade - tal- "Liberdade completa ninguém desfruta". De-
vez ingênuo recurso de justificar inépcia ou preguiça. pois analisem: Essa afirmação ainda é atual?
Liberdade completa ninguém desfruta: começamos
Ainda ocorre manipulação e/ou repressão
oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas com a
Delegacia de Ordem Política e Social, mas, nos estrei- da mídia por governantes ou candidatos a
tos limites a que nos coagem a gramática e a lei, ainda cargos públicos para promoção pessoal ou
nos podemos mexer. Não será impossível acharmos de um grupo? Justifique.

106 'iic4
No poder das fardas:
a Ditadura Militar
Entre os anos de 1946 e 1964, o Brasil Juscelino Kubitschek (1956-1961), a pas-
passou por uma fase em que se sucederam sagem rápida dejânio Quadros (1961), e
governos democráticos. terminou com a deposição deJoão Goulart
Esse período iniciou-se com as elei- (Jango) em 1964.
ções e a posse de Eurico Gaspar Dutra Foi com a deposição dejango que co-
(1946-1951), continuou como retorno de meçou o período mais autoritário da Histó-
Getúlio Vargas (1951-1 954) e com a posse ria do Brasil. Por meio de um golpe de Esta-
de seu vice, Café Filho (1954-1955), atra- do, instalou-se no país a Ditadura Militar,
vessou o período desenvolvimentista de que durou 21 anos (1964-1 985).

Para entendermos melhor o que ocorreu em 31 de março de 1964, precisamos recuar um pouco no tempo.
A renúncia inesperada de Jânio Quadros em agosto de 1961 provocou uma crise político-institucional, uma vez
que assumiria a presidência da República o vice João Goulart, que não era bem visto pelas elites econômicas e
setores das Forças Armadas. Com receio de que João Goulart não conseguisse assumir a presidência, alguns
setores da sociedade, sob a liderança do então governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, mobilizaram-se
pela manutenção da ordem e da legalidade, visando garantir sua posse no cargo maior do país, sendo adotado o
sistema parlamentarista de governo. Assim, Jango assumiria a presidência, tendo seus poderes limitados à chefia
de Estado. A curta experiência parlamentarista, entretanto, não logrou êxito e, em 1963, realizou-se um plebisci-
to nacional, que resultou no retorno do sistema presidencialista de governo. Jango retorna então seus poderes de
chefe de governo e anuncia a adoção de uma série de medidas, as chamadas "reformas de base".
Urna das propostas de Jango era a reforma agrária, o que, de imediato, desapontou empresários, usineiros,
proprietários de terra e a própria classe média, que, unida a esses segmentos sociais, temia um golpe de esquerda
que transformasse o país numa República Socialista, a exemplo de Cuba. [... ]

ORIÁ, Ricardo. Golpe de 1964-31 de março de 1964. In: BITTENCOURT, Circe lOrg.l.
Dicionário de datas da História do Brasil. Sào Paulo: Contexto, 2007. p. 73-7/..

Além de sofrer oposições internas,Jan- Liberdade - grande protesto organizado


go não agradava aos Estados Unidos, que, por membros da classe média, políticos e
em tempos de apogeu da Guerra Fria, não empresários, com apoio de setores da Igreja
toleravam sua política externa independente. Católica, contra a administração Goulart -,
Em 13 de março de 1964, Jango dis- que se concentrou na Praça da Sé, em São
cursou para cerca de 200 mil pessoas em Paulo, no dia 19 de março. Participaram
um comício na Central do Brasil, estação dessa passeata cerca de 500 mil pessoas,
ferroviária no Rio de janeiro (Ri). Em seu que acusavam o governo de promover a
pronunciamento, falou das reformas que instabilidade política no país. Muitos des-
pretendia implementar: agrária, tributária, ses manifestantes acreditavam que o Brasil
econômica. Enfim, deixou claro que pla- estava à beira de uma revolução comunista.
nejava mexer nas estruturas sociais e eco- Em meio a toda essa turbulência, João
nômicas vigentes. Esse discurso agradou a Goulart apoiou uma revolta de marinheiros
massa de trabalhadores presentes, mas foi ocorrida no Rio de janeiro, em 25 e 26 de
um dos acontecimentos centrais da crise março. Com mais esse episódio, completava-se
política que culminou no Golpe Militar. o quadro necessário aos conspiradores para
Nesse quadro já tumultuado ocorreu desencadear o movimento militar que forçou
ainda a Marcha da Família com Deus pela a deposição dejango, ocorrida no dia 31.

107
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- $ Greve geral em SOa Paulo por aomoots


- salarial -1963 -

Fonte: v-Ctrl\O, OlTu:I:. Atlas histórIco: íerai o Sao Pau13: S-C)IflT/ ?1 p 158.

O Regime Militar não foi implantado no Brasil. A princípio, as medidas tomadas


de forma inesperada ou abrupta. A tomada pelo governo foram instauradas por meio
do poder já se delineava desde a tentativa dos atos institucionais.
de golpe em 1961, concretizando-se em 31 No primeiro Ato Institucional (Al-1), de
de março de 1964, data que marca o início 9 de abril de 1964, já estavam aparentes as
do mais longo período de governo ditatorial pretensões do novo regime. Esse ato declarava:

Os atos institucionais foram normas elaboradas no período de 1964 a 1969 para legitimar o novo
regime por meio de poderes extraconstitucionais. Foram editados pelos comandantes das Forças Ar-
madas ou pelo presidente da República com o respaldo do Conselho de Segurança Nacional.

108 1 111104
a suspensão da Constituição por 6 meses e, Por esse documento, redigido pelajunta Mi-
com ela, de todas as garantias constitucionais; litar que assumiu o poder após o golpe, o poder
eleições indiretas para presidente da República. concentrava-se nas mãos do Executivo e legava
O presidente seria eleito pelos membros do ao Legislativo papel secundário. Assim, coube aos
Congresso Nacional; militares a escolha do novo presidente, e ao Con-
a suspensão de direitos políticos dos opositores do gresso apenas a ratificação dessa escolha. Em 15
regime, ação que gerou cassações, prisões, exílio. de abril de 1964 assumiu a presidência o general
Humberto de Alencar Castello Branco.

Organizandoideias

Em grupo, leiam os textos e respondam às alívio pelo governo norte-americano, satisfeito de


questões. ver que o Brasil não tomaria o mesmo rumo socia-
lista de Cuba. Os Estados Unidos acompanharam
Texto 1 de perto a conspiração e o desenrolar dos acon-
Logo nos primeiros dias após a queda de Gou- tecimentos: através da secreta "Operação Brother
lart, ficou claro que os militares estavam tomando 5am", haviam decidido dar apoio logístico aos mi-
a iniciativa na condução do processo político. Uma litares golpistas, caso houvesse uma longa resistên-
semana após ter assumido interinamente a chefia de cia por parte das forças de Jango [ ... ].
governo, ajunta militar composta por representantes CASTRO, Celso. A conspiração fardada. Nossa História,
das três armas (Costa e Silva, pelo Exército, Augusto São Paulo, Vera Cruz, ano 1, n. 5. p. 45, mar. 2004.
Rademaker, pela Marinha, e Correia de Meio, pela
Aeronáutica) baixou um ato institucional, que fica- Texto 3
ria conhecido como o de n. 1 (A1-1), definindo um
novo modelo institucional para o regime. Amplian- [ ... ) Com a queda de Goulart os cárceres se
do as atribuições do Executivo, dotando-o inclusive encheram. No Nordeste, os fazendeiros e seus
de instrumentos legais que permitiam a cassação de capangas chacinavam camponeses, o IV Exército,
mandatos e de direitos políticos (102 pessoas foram comandado pelo general Justino Alves Bastos,
atingidas) e a decretação unilateral do estado de sítio derrubou, simultaneamente, Arraes e Seixas Dó-
(isto é, sem a necessidade da concordância do Con- ria, governadores de Pernambuco e Sergipe [ ... ].
gresso), o AI- 1 garantia maior centralização do po- E, enquanto a repressão prosseguia, com a invasão
der, mas também estabelecia o prazo limite de sua de lares e atentados aos direitos humanos, 200 mil
vigência - 31 de janeiro de 1966, data da posse do pessoas (ponderável setor das classes médias e de
presidente a ser eleito em outubro de 1965. toda a burguesia) desfilaram pelas ruas do Rio de
Janeiro, em 2 de abril, na Marcha da Família com
FERREIRA. Maneta de Moraes: SARMENTO, Carlos Eduardo.
Deus e pela Liberdade. { ... ].
A República brasileira: pactos e rupturas. In: COMES, Ângela
de Castro et at. A república no Brasil. Rio de Janeiro: Nova BANDEIRA, Moniz. O Governo de João Goutart: as lutas sociais
Fronteira. 2002. p. 484. no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 185.

Texto 2 Qual é o assunto comum aos três textos?

Nos primeiros dias após o golpe, uma violen- Torturas e prisões estavam entre os pri-
ta repressão atingiu os setores politicamente mais meiros atos do governo militar. Formulem
mobilizados à esquerda no espectro político. Mi- hipóteses sobre por que isso ocorreu.
lhares de pessoas foram presas de modo irregular,
e a ocorrência de casos de tortura foi comum, es- Os textos citam cassações de políticos. O que
pecialmente no Nordeste. O líder comunista Gre- isso significa?
gório Bezerra, por exemplo, foi arrastado amarra-
do pelas ruas do Recife. Pode-se afirmar que após 31 de março de
O golpe militar foi saudado por importantes 1964 instalou-se um regime de terror no
setores da sociedade brasileira e recebido com Brasil? Justifiquem.

0 autoritarismo no Br 109
O autoritarismo na LegisLação

Entre os anos de 1964 e 1969 foram promul-


gados 17 atos institucionais, todos regulamen- pode-se imaginar o que farão agora que obtive-
tados por 104 atos complementares. Toda essa ram a sanção legal para suas violências [ ... ].
legislação conferia ao governo alto grau de centrali- CORREIO DA MANHÃ. Editorial, p. 6.14 mar. 1967, apud
zação política e administrativa. PAES, Maria Helena Simões. Em nome da Segurança
Nacional: do golpe de 64 ao início da abertura. São Paulo:
Al-2 - Decretado em 1965, ratificou a eleição in- Atual, 1995. p. 46.

direta para presidente, extinguiu os partidos po- + Dope: Departamento de Ordem Política e Social. Era o
órgão governamental encarregado de controlar e reprimir
líticos existentes e estabeleceu o bipartidarismo,
ameaças ao regime.
pois só havia dois partidos legalizados: a Aliança
Renovadora Nacional (Arena), representando a
situação, e o Movimento Democrático Brasileiro suspensa e todo o poder passou às mãos do presi-
(MDB), como representante da oposição. dente da República, ou seja, além do Poder Execu-
Al-3 - Decretado em 1966, estabeleceu elei- tivo ele passou a representar também o Legislativo e
ções indiretas para governador e a nomeação a controlar ojudiciário. Veja alguns artigos do Al-5:
dos prefeitos pelos governadores.
Al-4 - Definiu as regras a serem seguidas para
[ ... ] Art. 21' - O Presidente da República po-
discutir, votar e promulgar a Nova Constituição.
derá decretar o recesso do Congresso Nacional,
Quando Artur da Costa e Silva assumiu a Pre- das Assembleias Legislativas e das Câmaras de
sidência da República, em 15 de março de 1967, en- Vereadores, por Ato Complementar, em estado
trou em vigor a nova Constituição, que serviu para de sítio ou fora dele, só voltando os mesmos a
formalizar a estrutura de poder vigente desde 1964. funcionar quando convocados pelo Presidente
da República. [...]
A Carta Magna de 1967 seguia preceitos Art. 3° - O Presidente da República, no inte-
estabelecidos pela recém decretada Lei de Segu- resse nacional, poderá decretar a intervenção nos
rança Nacional, documento que, segundo o go- Estados e Municípios, sem as limitações previstas
verno, visava defender os "objetivos nacionais" na Constituição. [ ... ]
por meio da criminalização de greves e da cen- Art. 4° - No interesse de preservar a Revolu-
sura a manifestações de oposição via imprensa, ção, o Presidente da República, ouvido o Conse-
lho de Segurança Nacional, e sem as limitações
classificadas como "propaganda subversiva".
previstas na Constituição, poderá suspender os
Em dezembro de 1968, em meio a um cenário
direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo pra-
de protestos contrários ao regime ditatorial vigente
zo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais,
no Brasil, o presidente Costa e Silva fechou o Con- estaduais e municipais. [ ... ]
gresso e decretou o Al-5 - o mais longo e drástico Art. 101' - Fica suspensa a garantia de habeas
de todos os atos institucionais (revogado somente corpus, nos casos de crimes políticos, contra a se-
em 1978). Por esse novo decreto, a Constituição foi gurança nacional, a ordem econômica e social e a
economia popular. [ ... }

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil.


A nova Lei de Segurança Nacional consolida Subchefia para Assuntos Jurídicos. Ato Institucional n2 5 de 13
de dezembro de 1968. Brasilia, 1968. Disponivetem:
no Brasil um regime totalitário, onde a oposi-
<vv.ptanatto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-05-68.htm>
ção passa a inexistir em qualquer forma válida, Acesso em: abr. 2016.
desde a luta partidária ao simples protesto de
um manifesto: tudo é passível de prisão, varian-
do apenas as penalidades aos infratores. [ ... ] Se A. , Gtossár
os esbirros do DOPS* e oficiais atrabilirios
AtrabiLiário: raivoso, violento.
já usavam e abusavam da incomunicabilidade,
Esbirro: agente de polícia.

- 110
- ' -
tortura nos interrogatórios e o crescimento das
prisões ilegais.

[...] Num completo desrespeito a todas


as garantias individuais dos cidadãos, previs-
tas na Constituição que os generais alegavam
respeitar, ocorreu uma prática sistemática de
detenções na forma de sequestro, sem qual-
quer mandato judicial nem observância de
qualquer lei. [ ... ]
O emprego sistemático da tortura foi peça

do í.'.tu em Ianque de guerra na invas8o do Conjuoto


r essencial da engrenagem posta em movimento
pelo Regime Militar que se implantou em 1964.
Residencial da Universidade de So Paulo (Crusp), no dia 17 de dezembro Foi também parte integrante, vital, dos proces-
de 1968, quatro dias após o Al-5 ser decretado. Cerca de 800 estudantes sos pretensamente jurídicos de formação da
foram presos. culpa dos acusados. [ ... ]
O Al-5 foi o ato do recrudescimento do au- ARNS. Pauto Evaristo. BrasiL nunca mais.
toritarismo. Esse foi o período mais severo da di- PetrópoUs: Vozes, 1985. p. 77 e 203.
tadura, durante o qual as reações contrárias a ela
se acentuavam e, em maior medida, cresciam os Ao mesmo tempo que empregava a repres-
centros de tortura e repressão. Por esse motivo, o são para silenciar manifestações de oposição, o
governo Médici (1969-1974), sucessor do governo governo utilizava a mídia para propagandear as
Costa e Silva, entrou para a história como a época inovações e os investimentos feitos em telecomu-
dos "anos de chumbo". nicações, usinas hidroelétricas, estradas etc., alar-
A censura aos meios de comunicação não deando o desenvolvimento econômico que atingia
permitia que as arbitrariedades do regime fossem apenas alguns setores da população. A maioria
divulgadas, abrindo caminho para a instituição da continuava a viver na pobreza.

Organizando ideias

Por que o período da Presidência de Médici en- Brasil" e "Ninguém segura esse país". Anos
trou para a história como os "anos de chumbo? depois, essas mensagens ufanistas ainda
ecoam, mas agora em outra realidade.
O órgão de propaganda oficial, a Assessoria O cartunista Ziraldo produziu sua versáo
Especial de Relações Públicas (Aerp), fazia para uma dessas mensagens. Analise-a no
propagandas com s/ogans otimistas, como contexto citado.
'Brasil: ame-o ou deixe-o', "Pra frente,

Charge do cartunista Ziraldo para o jornal O pasquim. Rio de Janeiro, o, 1970.


As reações
o ao Regime Militar
Diversos movimentos de estudantes, trabalha- respondia com agressões e leis punitivas em nome
dores afetados pela política econômica e intelectu- da manutenção da ordem.
ais (como jornalistas, políticos e artistas) enfrenta- Com o objetivo de ampliar o controle ideo-
ram o regime e lutaram pela volta da liberdade. Por lógico, foram promovidas mudanças na educação,
meio de manifestações culturais, passeatas e até estabelecendo-se novos currículos escolares e in-
luta armada, essas pessoas combateram o governo cluindo-se "Educação Moral e Cívica" como disci-
vigente, mas foram duramente reprimidas. plina obrigatória. Essas ações estimulavam a obe-
Em resposta aos enfrentamentos, o gover- diência ao regime e visavam coibir e evitar críticas.
no agia rapidamente, desmontando e atacando Ainda assim, a partir do governo Costa e Sil-
essas "conspirações" com diversas leis de repres- va (1967-1969), as reações ao regime intensifica-
são e censura. Não havia negociação ou possibi- ram-se e contaram com grande participação dos
lidade de entendimento. Se ameaçado, o governo estudantes, cujas manifestações ganhavam força.

- 500
A guerrilha:~
Eu V5l3
T5RRITOQ PARA
TRRRITÕRIO 00 AMAP
OERORAIMA
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-
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Rio volrio ALAGOAS
DIUCO TERRITÓRIO Mos eio
SE RONDÔNIA SOa SaroU
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MINAS
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OCEANO
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Belo
Coniagevi. °°'°°"ESP)eiTo SANTO
VAóna
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SÃO PAULO
FAC/FICO - RIO 10 JANEIRO
Janeiro
PARANÁ Rodovias
Fase do fechamento político Coiiliba .' -
__._
Estradas abertas durante
Manifestações e conflitos estudant,s (1968) SANTA CATARINA
UPlononôpolis e depois da guerrilha
o WOO
Passeata dos Cem Mil - RIO GRANDE Quartel da Batalhão de
00 SUL,oPprio
O Congresso da UNE - Infantaria de Selva 09741
Greves (1968) Bases do apoio do Exército
5 mil operários
00' Destacamentos ojumrrrillieiros
15 mil operários IN

Guerrilhas rurais
o
Caporaó 19661
Vale do Ribeira (1970)
Araguaia (1972.1975)
O 483 966 km
Sequestros
1 :4O3O0O
® Embaixador dos Estados Unidos
(1969) -' RIODEJANEIRO
No caminho da abertura 5AOPAALO
)J Embaixador da Suíça Greves (0978)
100
11970)
Ib x. iiSa 1' GUANABARA
( CÔosul doJapáo)t97Q) ® Metalúrgicos

Embaixador da Alemanha l Professores


Ocidental (1970) Bancários - - ] A TA 'TÍ
lo 139
® Cônsul dos Estados Unidos r- Movimento Diretas
11979- tentativa frustrada) Já (1 903. 1904) 1:13900000
-- .- -

Fonte. VICENTINO, Cl(ir Atlas histórico: usral e Brasil. So Paulo: SCipIolle, 20)1.)). 159.

-112
As passeatas se multiplicavam. Protestava-se prédio foi invadido pelo pelotão de choque da Po-
contra a qualidade do ensino, contra as mensalida- lícia Militar. No confronto, voaram pedras de um
des, contra a comida servida em restaurantes uni- lado e, do outro, tiros foram disparados. Um deles
versitários, contra o imperialismo americano, con- acertou o peito de Edson Luís de Lima Souto, que
tra o fechamento da UNE, contra o regime militar. caiu morto. O incidente mexeu com a opinião pú-
As manifestações se tornavam rotina. Não exigiam blica. O corpo do estudante foi velado na Assem-
maiores organizações. Fazia-se uma rápida assem- bleia Legislativa e, no dia seguinte, 50 mil pessoas
bleia - e rua. Assim agiram os estudantes que fre- compareceram ao enterro. Era uma sexta-feira, 29
quentavam um restaurante no Rio, o Calabouço, de março - o dia em que 1968 começou { ... j.
subsidiado pelo governo. Num fim de tarde, progra-
1-1IIAI3ALI O. Oscar. Quatro estrelas e uns tropicalistas. In:
maram o que seria um ato-relâmpago, igual a tantos O Brasil em sobressalto: 80 anos de história contados
outros. Antes que pudessem ter saído, no entanto, o pela Folha. So Pauto: Publifotha. 2002. p. 114.

Com frases como "Mataram um estudan- profissionais liberais e mães dos estudantes, ocor-
te. Podia ser seu filho" e "Nesse luto começou a reu no dia 26 de junho, na Cinelândia, no Rio de
luta!", a contestação estudantil intensificou-se, e Janeiro, uma manifestação pública de oposição à
na mesma proporção veio a repressão, provocan- ditadura. A Passeata dos Cem Mil foi o maior pro-
do outras mortes e milhares de prisões em várias testo público contra o Regime Militar até então.
cidades brasileiras. Outros episódios protagonizados por estu-
Os estudantes não estavam sós. Com o apoio dantes ainda seriam notícia naquele ano de 1968,
de vários setores da sociedade, como professores, como o 30° Congresso da União Nacional dos Es-
artistas, representantes da Igreja Católica, tudantes (UNE).

Mariitestantes protcstsii ;: . ISCiUCi ColhO H:iSOlh

113
O encontro dos estudantes ocorreu Nos teatros exibiam-se peças que
clandestinamente, no município paulista de mostravam a realidade do Brasil. Nas sa-
lbiúna, mas foi descoberto pela polícia, que las de projeção ressurgia o Cinema Novo,
cercou o local. Mais de 700 estudantes, pe- com filmes inspirados no Tropicalismo,
gos de surpresa, foram presos e, alguns dias movimento artístico da década de 1960
depois, libertados para responder a inquérito que aliava elementos da cultura brasileira
por violação da Lei de Segurança Nacional. com as artes pop e vanguardista daquele
Contudo, alguns líderes do Movimento Es- período.
tudantil, como Viadimir Palmeira e Franklin Na música, campo de maior expressão
Martins, ficaram presos por mais tempo. do Tropicalismo, explodiam os grandes
No campo cultural foi um período de festivais, nos quais nomes como Geraldo
grande efervescência. Mesmo em tempo Vandré, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom
de censura às produções artísticas e aos Zé e tantos outros faziam sucesso com can-
meios de comunicação, as ações de repú- ções de protesto.
dio ao regime eram constantes.

Na música e ria literatura surgiram textos onde brinca irremida a infância da classe operária.
e canções que se tornariam símbolos da luta Estou aqui. O espelho
pela liberdade e contra a Ditadura Militar. As não guardará a marca deste rosto,
Letras foram censuradas, mas hoje são fontes se simplesmente saio do lugar
ricas da memória daquele período. ou se morro
se me matam.
Maio 1964
Estou aqui e não estarei, um dia,
Na leiteria a tarde se reparte em parte alguma.
em iogurtes, coalhadas, copos Que importa, pois?
deleite A luta comum me acende o sangue
e no espelho meu rosto. São e me bate no peito
quatro horas da tarde, em maio. como o coice de urna lembrança.
Tenho 33 anos e uma gastrite. Amo GULLAR, Ferreira. Melhores poemas de Ferreira Gultar.
Seleção e apresentação Alfredo Bosi. 7. ed. São Paulo:
a vida
Global, 2004. p. 81-82.
que é cheia de crianças, de flores
e mulheres, a vida,
Em grupo, identifiquem os trechos de crítica
esse direito de estar no mundo,
ao Regime Militar e os analisem consideran-
ter dois pés e mãos, urna cara
do o contexto em que foram produzidos.
e a fome de tudo, a esperança.
Esse direito de todos
Procurem exemplos atuais de músicas ou
que nenhum ato
textos de protestos contra a situação política
institucional ou constitucional
brasileira. Escolham uma música como repre-
pode cassar ou legar.
sentante da realidade atual.
Mas quantos amigos presos!
quantos em cárceres escuros Tragam os textos para a sala de aula e com-
onde a tarde fede a urina e terror. parem os dois momentos: ainda há censura?
Há muitas familias sem rumo esta tarde Há liberdade de expressão hoje? Debatam
nos subúrbios de ferro e gás essas questões.

- 114
A luta armada
O endurecimento do Regime Militar fez sur- operações. Muitas das organizações se formaram
gir no Brasil algumas organizações que viam na de dissidências de outras já existentes antes mes-
luta armada a forma mais viável de combatê-lo. mo de 1964, entre elas, vários partidos políticos de
As "guerrilhas urbanas e rurais", que atuaram esquerda.
no país no final da década de 1960 e início dos Por volta de 1971, a maior parte do movi-
anos 1970, procuravam derrubar a Ditadura Mi- mento de guerrilha já havia sido desmantelada, e
litar por meio de ações revolucionárias. Boa parte seus integrantes estavam presos, mortos ou tinham
desses grupos era composta de jovens entre 20 e fugido do país. Marighella havia sido morto em
30 anos, simpáticos ao comunismo, ansiosos por 1969, em São Paulo, e Lamarca, em 1971, na
mudar a situação vigente. Bahia, ambos atacados por oficiais do exército.
Entre as lideranças estavam o ex-deputado Car- Apesar do crescimento da oposição e de
los Marighella, na guerrilha urbana, e o ex-capitão grandes manifestações contrárias ao governo,
Carlos Lamarca, na guerrilha rural. cada vez menos popular, a Ditadura Militar só
Essas organizações que participaram da luta após um lento processo de re-
teve fim em 1985,
armada assaltavam bancos, sequestravam pessoas, democratização.
matavam policiais e soldados,
praticavam atentados a bomba
e "justiçavam" inimigos (mata-
vam os companheiros
dos de traição ou movidos por
acusa-
PRO CURAMSE
disputas políticas internas). Se v'ocê souber do paradeiro de algum
Grande parte das ações dêstes homens, telefone para 2-5898
guerrilheiras ocorriam nos ou dirija-se à Delegacia mais próxima
centros urbanos, com o obje-
tivo de conseguir dinheiro para
sustentar o aparato necessá-
rio, manter os guerrilheiros na
clandestinidade, alugar apar-
tamentos e financiar novas 1532I_
'A&PJÀ%T ...........
£3374&'7

Cartaz com os dizeres "Procura-se e


com a imagem, à direita do ex-capitào "-
(,LL 3,o,
"° '•"
W
-" "
,L ÍLLIÇI' L1
do Exercito que desertou e se tornou .....
'' L "I•

guerrilheiro, Carlos Lamarca, c. 1969.

Organizando ideias

Leia o texto e responda às questões.


Em 1964, a Nação recebeu um tiro no peito. Um tiro que matou a alma nacional [ ... J. Os personagens que
pareciam fazer parte da história natural brasileira, ou da História do Brasil como nós imaginávamos, esses per-
sonagens de repente sumiram. Ou fora do poder, ou presos e mortos. E em seu lugar surgiram outros, que eu
nunca sequer percebera existir. [...] Ai me veio a percepção clara de que o Brasil tinha mudado para sempre. [ ... ]

SOUZA, Hebert José de IBelinhol apud BARROS. Edgard Luiz de. Os governos militares. Sâo Paulo: Contexto. 1991. p. 13.

O que foi o tiro no peito que matou a alma nacional a que o texto faz referência?

Com base no que leu sobre esse período, você concorda com o autor do texto? Justifique.

. 115
Debate interdiscipLinar
O eLeitorado brasiLeiro
Os colonizadores portugueses trouxeram para Ano Populacão Eleitorado População!
o Brasil a tradição de votar para eleger os adminis- Eleitorado

tradores dos povoados. Desde essa época, as elei- 1975 108.665.878 36.265.560 33,373%

ções passaram por muitas mudanças e conquistas. 1985 135.563.101 69.371.495 51.171°h

Até o início do século XX, só podiam votar 1994 153.142.782 94.782.803 61,891%

homens brancos, maiores de 25 anos e com alto 1996 157.070.163 101.284.121 64,483%

poder aquisitivo. Hoje, votar é um direito de todos 1998 161.790.311 106.101.067 65,579%
2000 169.799.170 109.826.253 64,680%
os cidadãos a partir dos 16 anos (independente-
2002 175.381.795 115.254.113 65,716%
mente da cor, do sexo e poder aquisitivo). Mais do
2010 190.755.799 135.804.433 71,192%
que isso, segundo a Constituição de 1988, o voto é
2014 202.768.562 142.822.046 70.435%
obrigatório para maiores de 18 anos e facultativo
Fu'/ss: IBGE. Dis,': e'n' 'zI7Oc:/Isculoxs.ibqe c'cc.IiÍ/p33c12c on:sissc:ss-
para maiores de 70 anos ejovens de 16 a 18 anos.
:)c:.::case-cuIuros>. Acesso em: ate. 2Q16: TRIBUNAL SUPERIOR EEITCRAL.
Em 1986 iniciou-se a informatização do J.sRCflNet eia: <V'A's tSeus.br/etiscces/eIeicues-anteriores>. Acesso em: 21)7 2016.
processo eleitoral, quando foi feito um recadas-
As informações mais atualizadas acerca da
tramento eletrônico de aproximadamente 70 mi-
população brasileira são fornecidas pelo Instituto
lhões de eleitores. Em 1994 foi feita a totalização
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que
das eleições gerais pelo computador central, no
realiza anualmente estudos sobre a população,
Tribunal Superior Eleitoral.
os estados e as regiões do Brasil.
Em 1995 foi apresentado aos eleitores um
Além de estudos anuais, a cada dez anos o
protótipo de urna eletrônica cujo projeto contou
IBGE faz uma minuciosa pesquisa denominada
com uma comissão dejuristas, técnicos e especia-
Censo Demográfico. Essa pesquisa possibilita uma
listas de informática, eletrônica e comunicações
análise detalhada de diversos grupos da população,
da Justiça Eleitoral, das Forças Armadas, do
como a quantidade de homens, mulheres e crianças
Ministério da Ciência e Tecnologia e Ministério
de ambos os sexos residentes em cada lugar do país.
das Comunicações. Atualmente, todo o sistema
Ao comparar os dados coletados em censos
eleitoral brasileiro é informatizado.
diferentes, é possível observar as mudanças ocor-
A informatização também possibilita que, por
ridas entre um período e outro. Observe:
meio do acesso aosite doTribunal Superior Eleitoral
(www.tse.jus.br), qualquer pessoa possa conferir os
dados das eleições ao longo da história do país.
Podemos sintetizar a quantidade de eleito- Mais de 106 anos 10.423 0,0% 0,0% 14.153
95399 anos 19221 0.0% 0,0% 30.977
res, por décadas, nos últimos cem anos de histó- 90394anos 65.117 0.0% 10,1% 115.309 e
BOa 89 anos 208 088 0.1% 0.2% 326.783
ria do Brasil. A tabela a seguir mostra os números BOa 94 anos 428501 0.3%,i 0,4% 607.533
75 aiO anos 708.571 0,5% os 0,6% 999016
desde 1910. 70a 74 anos 1.229.329 0,7% 0,9% 1.512973
&5a69anos639.323 1,0% 1,1% 1.941.791
Ano Populacão Eleitorado PopulaÇão / 60a64anan 2.153209 1,3% ... 1.4% 2.447.720
SSaSOanos 2585244 1,5%,,,i 1,7% 2859.471
Eleitorado SOa 54 anos 3.415.678 2,0% -ããèiíW 2.1% 3646.923
45a 495nos 4216.416 2.5% 2.7% 4500123
1910 23.414.177 1.155.146 4,933% 40a44ar 5.116.439 3,9%_i . ' -'- 3,7% 5430395
35a39aoss 5.959,875 6205.654
1933 39.939.154 1.438.729 3.602% 38334anos 6.363.983 6.664.961
25a29anos 6814.328 7035337
1945 46.114.500 7.437.025 16,127% 2oa24anos 9.048.218 47% - .; ---------'4,9% 8.093.297
15a19snoo 9.019.130 5,3% ' - '5,3% 8.920.685
1955 58.360.000 15.240.397 26.114% 10a14anos 8.777.639 5,2%'- 8.570,428
Sa9anos 8.402353 49% 8.139.974
1960 70.070.457 15.543.332 22,182% 004 8508 8.328926 4391 4,7% 9.048.902
1965 80.729.000 22.032.395 27.291% 0087468W Muineres

Fünile: lESE, •DISpOOIVOI 0117: <WsW4.CCflSO2010.hge.guv.1o>.Acesso Cm: abr. 2016.

- 116
Assim:
F. 100
F= F
Ida,, de 150 anos 7.247 0.995 0.0% 16939
95,O9anos 31539 0.0% 00%
80,94 anos 114.064 0,1% 40.1% 211 505
No caso das eleições 2014, o valor da amos-
Sa6Oanos 319759 0.2%.a03% 533724
88 a 04 anos 660.623 0.49s W 0.5% 998 349
tra (Ft) é o total de eleitores do Brasil e o valor
754195a,a, 091516 0.6%.0.0% 14,7 2930
70 a 14 ono 1 651.373 0,9% ,,. 1.1% 2313234
da classe (F) é a quantidade de eleitoras mulheres
65a69aocs 2224.055 129, 2616145
601640880 3641034 1,6% 1,8% 3468055
entre 20 e 24 anos. Para calcular o percentual de
554597055 3932334 2,CN ..—.-'---23% 4373979
Soas4anos 4.034.995 2.5%e-"'" "2.8% 3.306407
eleitoras em relação à quantidade total, é realiza-
45a49ao 5692073 379• 6141 333
40a44anco 6.320.570 3,3% ,.,'___________ 3.59h
' - '

6108.797
da a operação a seguir:
3673970109 6766.660 356 .. — '' -'. 7121916
30a34anos 1.711.651 4.0% —' '' 4.2% 8926.555 8137 583. 100
23a293wa, 8,466,905 4AN éãéè1we~459 06,13418 F»
20a24anss 0.699.221 -'-'- ' 45',', 8614.903 142822046 5,70%
154195516 8659660 45• ' '--' -449 7433522
104148016 8,725.413 4,4% 8441.348 Esse cálculo pode ser realizado em diferentes
5a9anls 7.924 144 4,0% 397 7343231
0344016 1016.501 3,1% ' - 3,6% 6119112 situações, o que possibilita a relativização de dados
8~O a •Mdheses
coletados em uma pesquisa, bem como a elabora-
ção de tabelas e gráficos com mais informações.
Os gráficos apresentados revelam a distri-
buição percentual da população brasileira por
idade e sexo em dois momentos diferentes. Mas
você sabe como os órgãos de pesquisa calculam Com base nas informações fornecidas
esses percentuais? Usando a Estatística, ramo da no gráfico "Distribuição da população
Matemática que ajuda nessa tarefa. por sexo, segundo os grupos de idade"
Com base em um cálculo simples, é possível e na tabela da página 116, calcule sepa-
chegar a resultados como os apresentados nos grá- radamente o percentual de homens e de
ficos desta página e na tabela da página anterior. mulheres entre 20 e 24 anos em relação ao
Como exemplo, vamos calcular o percentual de mu- total de eleitores em 2010, considerando
lheres entre 20 e 24 anos em relação à quantidade de que todos os brasileiros dessa faixa etária
eleitores no Brasil em 2014 (142 822 046 pessoas), participaram das eleições do referido ano.
considerando que todas as componentes do gru-
Observe a tabela abaixo. Em seguida, com-
po são eleitoras. De acordo com o IBGE, esse gru-
pare os números de 2010 e 2014 e verifique
po correspondia a um total de aproximadamente
se houve aumento ou diminuição da fre-
8 137 583 mulheres em 2014 (dado disponível em:
quência relativa tanto de homens quanto
<www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/
de mulheres da faixa etária pesquisada
projecao_da_populacao/2008/piramide/piramide.
entre uma eleição e outra.
shtm>; acesso em: abr. 2016).
Inicialmente, define-se o valor total da POPULAÇÃO ESTIMADA DE HOMENS ENTRE
20 E 24 ANOS NO BRASIL (2014)
amostra (nesse caso é o número total de eleito-
r10r,5:1,1 em r71cao
res). A amostra é dividida em classes (aqui, o gru- t9 2o .:1L

po de mulheres citado). O valor de cada classe 20 1.652.622 1,16%


é chamado de frequência (F). Nesse caso, a fre- 21 1.637.238 1,15%
quência (E) corresponde ao número total de elei- 22 1.631.750 1,14%
toras entre 20 e 24 anos. A soma das frequências 23 1.6/3.972 1,15%
de todas as classes é chamada de frequência total 24 1.678.164 1,18%
(Ft), que corresponde ao valor total da amostra. 20 - 24 8.243.746 5.77%
Ao multiplicar por 100 a frequência E de BGE. Ds1lonlv e 611' <39'.'91',. 0.2J2Y.bí/9O1)efeStb7iS1c%/
1- OI1ICS:
Ç9O)L1flCi60íp;U6iCa3dL6,rXl13,1aV3uil2U/Ç%r003idEu/Ç)í3iflI(i0.S311lI>. A:OSSO
uma classe e dividir o resultado pela frequência
elo ab. 2 016. TRJP.UNAL S5JPER0R ELEORAL. 0:síjor:iv em: <hwIw.ts0.
total Ft, obtém-se um valor chamado de frequên- us.br/c:ccces/es661isttc:7m/estatis9ca9-oeI1ora1s.201 -í:el9orado>, Acesso

cia relativa (Fr), que corresponde ao percentual em: abi 2016.

que uma classe representa em relação à amostra.

117
Testando seus conhecimentos Responda no cademo

1. )Ibmec-RJ) Ao longo da Era Vargas (1930-1 945), e pelo seu conteúdo, é correto afirmar que
houve uma enorme preocupação na transfor- esta marchinha:
mação de Getúlio no pai dos pobres', o grande tratava-se de uma peça publicitária en-
protetor da classe trabalhadora. comendada pelo presidente Marechal
Sobre esse período são feitas as seguintes Eurico Gaspar Dutra.
afirmativas: tratava-se de um siogan da Revolução
1. A criação do imposto sindical foi uma das Constitucionalista liderada por Getúlio
formas encontradas de permitir uma li- Vargas.
vre atuação dos sindicatos durante esse ci comemorava o retorno de Getúlio Vargas
período. à cena política e lançava sua candidatura
II. A ação do DIP foi decisiva para efetivar presidencial às eleições daquele ano.
"culto à personalidade" que caracteri- tratava-se de peça da campanha Getú-
zou a administração getutista durante o lio Vargas à Assembleia Nacional Cons-
Estado Novo, tituinte, quando este foi eleito senador
por dois estados: Rio Grande do Sul, na
II. Os meios de comunicação, em espe-
legenda do Partido Social Democrático
cial o rádio, também tiveram um papel
(P50), e São Paulo, pelo Partido Traba-
importante nessa "aproximação" do lí-
lhista Brasileiro )PTB).
der junto às massas, como comprova a
tratava-se de uma marchinha política
criação da "Hora do Brasil".
da Era Vargas sem qualquer conotação
Assinale: eleitoral, já que na época vivíamos sob a
Se apenas a afirmativa 1 for correta, ditadura do Estado Novo.
Se apenas a afirmativa ((for correta. 3. (PUC-PR) Começava a ditadura envergonhada,
Se apenas a afirmativa III for correta.
como a batizou Elio Gaspari. (...) Mas, como tudo
Se as afirmativas 1 e II forem corretas.
na vida pode piorar, quem se queixava de 64 não
Se as afirmativas II e III forem corretas,
sabia o que nos esperava em 68. Aí sim, com o Ato
2. )FEI-SP) Para responder à questão, leia a Institucional no 5,o pau comeu.A ditadura esgotou o
letra da marchinha a seguir, de 1950: manual e criou em cima: implantou a censura, cassou
Bota o retrato do velho outra vez mandatos, fechou o Congresso, suspendeu o'habeas
corpus revogou a Constituição, instituiu a pena de
Bota no mesmo lugar.
banimento, liberou a tortura e tolerou as execuções
Bota o retrato do velho outra vez,
sumárias - tudo em defesa da segurança nacional.
Bota no mesmo lugar.
O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar (Bis) (Martins, Oswatdo. Aos nascidos em 1964.
Revista "Cutt", São Pauto, n. 78, março/2004. p. 541.
Eu já botei o meu...
E tu, não vais botar? A partir desse contexto, marque a alternati-
va INCORRETA:
já enfeitei o meu...
E tu, vais enfeitar? a) O Ato Institucional n° 5 foi um instru-

O sorriso do velhinho faz a gente se animar (Bis) mento que proporcionou amplos po-
deres ao Presidente da República, que
(Autores: Harotdo Lobo e Marino Pinto.)
podia inclusive fechar provisoriamente
Poucas músicas políticas marcaram época Congresso Nacional.
como esta, que foi interpretada por Francis- b) A economia brasileira desse período
co Alves, um dos cantores mais populares (1969-1973) vai ser marcada pelo cha-
da época. Pela conjuntura em que foi criada mado "milagre brasileiro".

— 118
Responda no caderno

c) Nesse período o governo ditatorial de- estados e controle militar do sistema de


clara que o país vivia uma guerra sub- informações.
versiva, sob esse pretexto aprova-se b) ampliação dos programas sociais volta-
inclusive a pena de morte. dos à saúde e à educação, crescimento
di O siogan BRASIL: AME-O OU DEIXE-O industrial e saneamento completo das
foi um grande instrumento de propa- contas públicas.
ganda dos grupos da guerrilha de es- ci limitação dos investimentos estrangei-

querda brasileira nessa fase. ros no país, erradicação da inflação e


pagamento da dívida externa brasileira.
e) A vitória do Brasil na Copa do Mundo de
fortalecimento do poder executivo, re-
1970 foi usada, junto aos efeitos do mi-
lativo esvaziamento do tegislativo e do
lagre econômico, como instrumento de
judiciário e aumento da participação
construção positiva do regime militar.
estatal na economia.
4. (Fuvest-SP) Durante o regime militar bra- modernização tecnológica nas comu-
sileiro (1964-1985), ocorreram: nicações, incremento dos transportes
a) fim do intervencionismo estatal na eco- aéreo e ferroviário e maior equilíbrio na
nomia, ampliação da autonomia dos distribuição de renda.

rPara você Ler o da época, a influência do governo dos Estados


Unidos flC) Golpe Militar de 1964.
Zuzu Ariget, direção de Sergio Rezende. Brasil,
Getútio: do Governo Provisório à ditadura do
2006, 104 mm. O filme narra a história de Zuzu
Estado Novo (1930-1945), de Lira Neto. São
Angel, estilista em ascensão, cujo filho, Stuart,
Paulo: Companhia das Letras, 2013, O livro é a
ingressa no movimento estudantil para lutar
segunda parte de urna trilogia dedicada á vida
contra a Ditadura Militar e, tempos depois, de-
de Getúlio Vargas e aborda, o período conhe-
saparece. O desaparecimento de Stuart provoca
cido corno 'Era Vargas" em seus diferentes
uma série de manifestações de Zuzu, que passa
momentos: Governo Provisório 11930-19351,
a ser vista como inimiga do regime.
Governo Constitucional [1934-1937) e Estado
Novo (1937-1945).
O Regime Militar brasileiro 1964-1985, de Marcos
rPara você navegar
Napolitano. São Paulo: Atual, 2008. O livro apresenta Dossiê Mortos e Desaparecidos PoLíticos no
essa fase da História do Brasil, desde a renúncia de Brasil. Disponível em: <www.desaparecidospo
Jânio Quadros [ainda em 1961) até a posse de José liticos.org.br>. Acesso em: abu. 2016. O site foi
Sarney, oferecendo uma visão organizada sobre a organizado com o objetivo de divulgaras investi-
política, a economia e a sociedade da época. gações sobre as mortes, a localização dos restos
mortais das vítimas da ditadura e identificar os

rPara você assistir U responsáveis pelos crimes de tortura, homicídio


e ocultação de cadáveres de dezenas de pessoas
durante o período do Regime Militar
Cara ou coroa, direção de Ugo Oiorgetti. Brasil,
2012, 110 mm. O filme narra a história de dois NúcLeo Memória. Disponível em: <www.nucle
irmãos cuja vida se divide entre o teatro e a luta omemoria.org/#!o-nucleo/cjg9>. Acesso em:
contra a ditadura. A rotina dos jovens revela que, abr. 2016. O Núcleo de Preservação da Memória
mesmo num período de repressão violenta, há Política visa apoiar políticas públicas em prol da
sempre esperança na juventude. memória política e dos direitos humanos, promo-
vendo ações educativas no Brasil e na América
O dia que durou 21 anos, direção de Camilo Tava- Latina, O site dá acesso a textos, vídeos, docu-
res. Brasil, 2013, 77 mm. O documentário mostra, mentos, fotos e links, possibilitando vasta explo-
por meio de documentos e gravações originais ração do assunto.

119
irr 1

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r4 • A.
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/
rt 1

O período que se estendeu do fim da Se- zes de praticamente destruir o planeta Ter-
gunda Guerra Mundial (1945) até a queda do ra. Na mídia e nas competições esportivas,
Muro de Berlim (1989) e o fim da Uniáo das travava-se uma guerra sem tréguas visando
Repúblicas Socialistas Soviéticas (1991) fi- desmoralizar o inimigo' e superá-lo. Nessa
cou conhecido como Guerra Fria. fase prevaleceu o temor de que a batalha fi-
Durante essa época, houve o desenvol- nal, leia-se a guerra nuclear', acontecesse
vimento de armas nucleares potentes, capa- a qualquer momento. Sendo assim, nenhuma
J - -1

r
r

:;
ieff• .r.

- Vista do Muro de Berlim,


1986. A fotografia mostra
o lado ocidental do
muro, onde é possivel

- --
ver inúmeros grafites. As
construçães e a torre de
vigia estão do lado oriental.

parte do mundo estava fora do conflito e de velado, marcado pela corrida armamentista e
suas possíveis consequências. pelo medo generalizado de que a qualquer mo-
As duas superpotências da época, Estados mento se iniciasse a Terceira Guerra Mundial.
Unidos da América (EUA) e União das Repúbli- Neste capítulo, abordaremos os fatores
cas Socialistas Soviéticas IURSS), mantinham que desencadearam essa situação, o perío-
uma disputa sem batalhas diretas ou enfrenta- do em que prevaleceu esse conflito velado e
mento em campos de guerra. Era um embate seu desfecho.
A Guerra Fria e o direito à Liberdade
O período entre 1945 e meados da década
de 1970 foi chamado pelo historiador Eric Ho- Os 45 anos que vão do lançamento das bom-
bsbawm de Anos Dourados, especialmente para bas atômicas até o fim da União Soviética não
formam um período homogêneo único na his-
os Estados Unidos, em virtude da extraordinária
tória do mundo.
prosperidade material e dos avanços sociais e tec-
[ ... ] Apesar disso, a história desse período foi
nológicos ocorridos no país após o fim da Segun-
reunida sob um padrão único pela situação inter-
da Guerra Mundial. Em menor escala, essa "Era nacional peculiar que o dominou até a queda da
de Ouro" teve reflexos em todos os países parcei- URSS: o constante confronto das duas superpo-
ros dos Estados Unidos. tências que emergiram da Segunda Guerra Mun-
Ainda assim, em grande parte dos países, te- dial na chamada "Guerra Fria".
nham eles adotado o socialismo ou o capitalismo, A Segunda Guerra Mundial mal termina-
ra quando a humanidade mergulhou no que se
havia sérios problemas políticos, econômicos e so-
pode encarar, razoavelmente, como uma Tercei-
ciais, com predomínio de guerras civis, ditadura,
ra Guerra Mundial, embora muito peculiar. [ ... J
concentração de renda e miséria.
Gerações inteiras se criaram à sombra de batalhas
nucleares globais que, acreditava-se firmemente,
podiam estourar a qualquer momento e devastar
a humanidade. Na verdade, mesmo os que não
acreditavam que qualquer um dos lados pretendia
atacar o outro achavam difícil não ser pessimistas,
pois a Lei de Murphy - do engenheiro aeroespacial
norte-americano Edward A. Murphy - é uma das
mais poderosas generalizações sobre as questões
humanas ("Se algo pode dar errado, mais cedo ou
mais tarde vai dar"). À medida que o tempo passa-
va, mais e mais coisas podiam dar errado, política
' [ecnologicamente, num confronto nuclear per-
manente baseado na suposição de que só o medo
da "destruição mútua inevitável" (adequadamente
expresso na sigla MAD, das iniciais da expressão
em inglês - mutually assured destruction) impe-
diria um lado ou outro de dar o sempre pronto
sinal para o planejado suicídio da civilização. Não
aconteceu, mas por cerca de quarenta anos pare-
ceu uma possibilidade diária.

HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve sécuto)O(, 1914-


-1991. São Pauto: Companhia das Letras. 2007. p. 223-224.

Os direitos humanos foram violados em di-


versos contextos durante a Guerra Fria, mesmo
nos países que justificavam seu regime com base
a na ideia de liberdade. Os Estados Unidos, por
exemplo, apoiaram regimes tirânicos em várias
Mulher usando urna niãquina de lavar roupas doméstica. 1969. partes do mundo, sobretudo na América Latina.
Durante a Guerra Fria, nos países da esfera capitalista, possuir Na União Soviética e em seus Estados aliados, em
eletrodomésticos e automõveis representava um modo de vida cujo ideal de
felicidade era pautado pelo consumo. A ideologia consumista e a revolução que havia o sistema de partido único, a impren-
tecnológica forai'n as grandes marcas dos "Anos Dourados". sa era controlada pelo governo, a oposição era

- 122
reprimida, havia frequentes expurgos polí- pró-soviético. Osama bin Laden (1957-
ticos e o regime era burocrático e ditatorial. -2011) - que, após os atentados de 11 de
A corrida armamentista disputada setembro de 2001, tornou-se o principal
entre estadunidenses e soviéticos gerou inimigo dos Estados Unidos - foi treinado
intensa produção e distribuição de armas nesse período pela Agência Central de Inte-
pelo mundo inteiro. Por causa das hostili- ligência (CIA) para enfrentar os comunistas
dades entre as grandes potências, grupos em defesa da "democracia".
guerrilheiros e terroristas receberam delas A Guerra Fria também atingiu o Bra-
treinamento e equipamentos sofisticados sil, que se aliou aos Estados Unidos. O di-
para atuar nas guerras civis que ocorriam reito à liberdade foi aqui amplamente cer-
nos respectivos países. ceado. Em 1947, por exemplo, o Partido
Como exemplo, podemos destacar Comunista foi colocado na ilegalidade; no
que em 1979, quando a União Soviética in- ano seguinte, seus parlamentares eleitos
vadiu o Afeganistão, os norte-americanos democraticamente foram cassados.
financiaram e armaram os guerrilheiros O Golpe Militar de 1964 teve o apoio
mujahedin - grupos diversos, com a pre- dos EUA. Atualmente documentos do próprio
dominância dos fundamentalistas islâmi- governo norte-americano revelam as ações
cos -, que se opunham ao governo afegão urdidas para apoiara ditadura brasileira.

Organizando ideias
Levando em consideração
o que você aprendeu sobre a O teste Rorschach através das décadas 13
Guerra Fria, observe a charge e
responda às questões: Anos 1960 Anos 2010

1. Considerando o caráter ideoló-


Uma árvore
gico da Guerra Fria, como ela
realmente se efetivou?

2 Na charge, a mesma imagem é


vista de formas diferentes nas
décadas de 1960 e 2010. Oque
se pode observar a respeito
das diferentes interpretações
em cada época abordada?

Charge de Chris Madden. Disponível em: <www.chrismadden.co.ukicartoon-gallery/


cartoon-seeing.a.nuclear-bomb-or-a-tree-in-a-rorschach-test/>. Acesso em: abr. 2016.

Pausaipara iVL T'

Quais eram os medos no período da Guerra Fria? Para saber como essa relação conturbada
entre as grandes potências afetava a vida de todos, entreviste três pessoas que viveram a adoles-
cência ou idade adulta nesse período. Na entrevista, faça-lhes perguntas sobre as informações e
os medos que pairavam naquele momento. Traga as respostas para a sala de aula e, em grupo,
analise como a Guerra Fria era vista e percebida pela população.

A Guerra Fria o a Nova Ordem Mw::: 123


2 Viajando pela história
A aliança se manteve durante a Segun-
Antecedentes da da Guerra Mundial. Em 1943, os Três Grandes
Guerra Fria (Roosevelt, dos EUA, Churchill, da Grã-Breta-
nha, e Stalin, da URSS) reuniram-se pela primei-
Após o triunfo dos boicheviques na Rússia,
ra vez, em Teerã, capital do Irã, para discutir as
em 1917, muitos países capitalistas apoiaram os
questões pertinentes à guerra e ao período após
grupos contrarrevolucionários (chamados de bran-
seu término, pois já era visível a ascensão dos
cos), que, por meio de uma guerra civil, procuraram
aliados. Em fevereiro de 1945, foi realizada em
restabelecer a antiga ordem. Com dificu Idades, o
Yalta (um balneário na atual Ucrânia) uma con-
Exército VermeLho venceu, mas o país estava exau-
ferência que previa a divisão do mundo em zonas
rido por destruições materiais, atos de sabotagem,
de influência: os soviéticos controlariam grande
isolamento internacional, inexperiência dos novos
parte da Europa Oriental, enquanto as potências
dirigentes, entre outros motivos. Esses fatores resul-
capitalistas manteriam sua influência nos países
taram em milhões de mortos por fome e epidemias,
da Europa Ocidental.
que se somaram às vítimas dos combates entre
vermelhos e brancos.
Na década de 1920, as potências ocidentais
procuraram isolar a União Soviética, com o obje-
tivo de impedir que o exemplo russo contagiasse
os trabalhadores em outros países. Esse período E:
de ostracismo internacional durou pouco, pois,
à medida que o regime se consolidava, vários Es-
tados estabeleceram relações diplomáticas com a
URSS. A chance de uma revolução mundial, con-
tudo, como sonhara Trotski, estava cada vez mais
distante, pois o "berço do socialismo" mergulhara
na burocratização, na repressão, no culto à perso-
nalidade de Stalin, nos privilégios para os subser-
vientes e na total falta de democracia.
Como vimos no Capítulo 3, Stalin e Hitler
firmaram um pacto que acabou sendo rompido
Da esquerda para a direita, o primeiro-ministro
pelo segundo, que invadiu a URSS em 1941. Mes-
o presidente estadunidense, Franklin D. Roosevelt; e o líder sovíetcu.
mo com as conhecidas restrições ideológicas ao Josepli Stalin, emYalta, 1945.
regime stalinista, a Grã-Bretanha e depois os Es-
tados Unidos aliaram-se aos soviéticos para ten-
Em abril de 1945, o presidente Roosevelt fale-
tar conter o nazismo. O anticomunista Winston
ceu e o vice-presidente, HarryTruman assumiu. Foi
Churchill percebeu que a URSS teria um papel
ele quem participou da Conferência de Potsdam,
vital no combate ao nazifascismo, devido a suas
entre julho e agosto de 1945, com a Alemanha já
reservas humanas e materiais, além de sua posi-
derrotada.
ção geográfica.
Dos Três Grandes, apenas Stalin participou
dessa conferência, pois Churchill, derrotado nas

Exército Verrnetho era o termo utilizado pa-


ra se referir ao exército do governo bolchevique, A Lossário
assim chamado como referência à cor verme- Ostracismo: no texto, refere-se a exclusào,
lha, símbolo do socialismo. isolamento.

124
eleições britânicas, fora substituído pelo traba-
lhista Clement Attlee. Em linhas gerais, decidiu-se mesma anedota, sobre a quem pertencia o urso
que a Alemanha seria desmilitarizada e dividida morto na caçada feita entre Roosevelt, Churchill
e ele. "Claro que a mim", dizia Stálin. "O Urso
em áreas de ocupação e que a União Soviética re-
é Hitler, e a pele do urso é a Europa Oriental.
ceberia uma indenização maior. Foi durante esse
Fui eu que matei o urso." Quanto ao desmem-
encontro que Truman comunicou a Stalin o bem-
bramento da Alemanha, Stálin percebeu que
-sucedido teste com a bomba atômica.
isso não aconteceria e deixou o assunto mor-
No geral, porém, Stalin obteve o que desejava:
rer. Foi lá, finalmente, que o ditador soviético
reconhecimento da ocupação dos países bálticos, pronunciou uma das suas frases mais famosas,
de territórios fronteiriços por meio de conflitos com quando Roosevelt e Churchill propuseram fazer
Alemanha, Romênia e Polônia e de uma área de se- também do Papa um aliado: "Muito bem", pon-
gurança com governos aliados, na Europa Oriental. derou Stálin, "Quantas divisões ele tem?".

WAACK. Wiltiarrt. Conferência de Yalta e de Potsdam.


In: MAGNOLI, Demétrio lOrg.l. História da paz. São Paulo:
No final da conferência, Stálin tinha todos Contexto. 2008. p. 281.
os motivos para estar satisfeito, pois as posições
soviéticas tinham prevalecido em quase tudo.
A única concessão aos anseios ocidentais foi a Contudo, em âmbito mundial, a Pax Ame-
Declaração da Europa Libertada, com a qual,
ricana foi se impondo, pois os Estados Unidos
conforme Stálin disse a Molotov, mais tarde
controlavam a maior parte da riqueza, domina-
lidaria à sua maneira. Para o resto de sua vida
Stálin consideraria Yalta uma espécie de vitória vam os mares e possuíam os melhores aviões de
pessoal. Anos depois da guerra, ainda contava a combate, além de bases aéreas e navais em todos
os continentes.

1./
OCEANO GLACIAL ÁRTICO
I

,tsamo
Pax Americana é uma expressão
IP echngal latina usada para se referir à hege-

:T monja norte-americana no mundo.


Sua origem vem do período áureo
Si LANOtA
do Império Romano, quando teria
.I.
SUÉCIA ocorrido a Pax Romana. Mais tarde
RUE
utilizou-se Pax Britannice. Embo-
do ra a expressão comece pelo termo
IR / Norte
"paz, isso não quer dizer que não
/ ROPU8UCA / LrõN,A
DEM050AT1CA
MAMA DHiRi
,.A ,--.-, houve guerras - pelo contrário, fo-
00. .'TIiMAOA , . -' uTubelo
/ UNIÃO ram muitas. O que houve foi a hege-
-BRETANH SOVIÉTICA
monia de Roma. da Grã-Bretanha e,
OCEANO POLOEIA neste contexto, dos Estados Unidos.
\ RWNIÂ . -- -
ATLANT!CO : L5XEMB 1 /sÃSÇvaPArlCA
SAROS

tRANÇA
- Frnnteirao em 1947
EJ Pretensões te,ritOrioio da união Soviética
ITAI IA ROMÉNIA
'T + Território livre de Trieste 19.1954t
Poll Siv/Vrqio Territórios italianos atribuidos á Iugoslávia
-" O O E RUO JA
Lasto, RASGARIA MERI0l0NA1' Á Retificações de fronteiras em boneficin da França
" ---ESPANHA
\, lLaaot
/ Sarre, integrado é República Federal da Alemanha em
-- 1957, mas vinculado economicamente á França até 1959
4GARÀLTAR
- T005IJIA EJ Aquisição da Bulgária
L Mar Mediterrâneo -
Divisão da Alemanha

OONEO J República Federal da Alemanha, R.F.A. 119491


S -. MAITASG8f CUlPES-'
O 338 676km República Democrática Alemã. R.D.A. (1949)
IAFRtCA -
t:338OO OM Divisão de Berlim
linha Ltder-Neisse Itronteiro entre Alemanha e Polônial
Fonte: DUBY, Gnoicjes Dr.. Atlas histórico mundial. 3. c. Barcelona: Larousse Eclitc-ral, 2W la. 293.

A Guerra Fria e a Nova Ordem Mur-......125


Por meio da Conferência de Bretton-Woods, O lançamento das bombas atômicas sobre
em 1944, da criação do Fundo Monetário Interna- o Japão durante a Segunda Guerra Mundial não
cional (FMI) e do Banco Mundial, consolidou-se a deixava de ser uma advertência a Stalin da superio-
crença no capitalismo liberal e o dólar foi impos- ridade militar dos Estados Unidos, pois Truman,
to como moeda internacional. A Organização das diferentemente de Roosevelt, não tinha esperança
Nações Unidas (ONU), criada para salvaguardar a de um acordo duradouro com os soviéticos. Os
paz mundial e a cooperação internacional, apesar conflitos de interesses, as diferenças dos regimes
da participação da União Soviética, acabou de- econômicos e sociais e as pretensões hegemônicas
monstrando forte inclinação para cooperar com das duas superpotências apontavam que a grande
as pretensões dos EUA. aliança firmada durante a guerra para combater o
nazifascismo estava se estilhaçando.

[.. A ONU era um organismo de grande relevância para os objetivos diplomáticos de Washington
no pós-guerra, uma vez que representou o instrumento jurídico, político e ideológico do internacio-
na]i.srno necessário a seus interesses. Este internacionalismo representava a formulação ideológica do
capitalismo de livre investimento articulado pelos EUA, a partir de 1933, como forma de superação
da Grande 1)epressão. O "capitalismo internacionalista" norte-americano opunha-se aos capitalis-
mos aliados e rivais que monopolizavam a exploração e impérios coloniais ou o domínio econômico
sobre determinadas regiões. Assim, a guerra serviu para derrotar os capitalismos de expressão regio-
nal (Alemanha, Itália e Japão) e para enfraquecer as velhas metrópoles coloniais europeias, que saíam
do conflito como devedoras dos EUA graças às leis de empréstimos e arrendamentos.

VIZENTINI, Pauto G. Fagundes. Da Guerra Fria à crise. Porto Alegre: UFRGS, 1992. p. 16-17.

Organizando ideias
Britânicos e norte-americanos ficaram alarmados com as pretensões geopolíticas de Stalin na Turquia
e no Irã. Nesse contexto, em 5 de março de 1946, em visita aos Estados Unidos, Churchill pronunciou,
na Universidade de Fulton e na presença de Truman, um discurso que caracterizou a Guerra Fria.
Uma sombra se estendeu sobre os cenários há tão pouco tempo iluminados pela vitória Aliada. Nin-
guém sabe o que a Rússia soviética e sua organização comunista internacional pretendem fazer num futuro
imediato, nem quais serão os limites, se é que existem, a serem respeitados por sua tendência à expansão
e ao proselitismo. De Stettin no Báltico até Trieste no Adriático, uma cortina de ferro desceu sobre o con-
tinente. Além dessa linha estão todas as capitais dos antigos Estados da Europa Oriental E...]. Todas essas
cidades notáveis, todas essas nações se encontram na esfera soviética; e todas estão submetidas, de uma for-
ma ou de outra, não apenas à influência soviética, mas ao controle extenso e sempre crescente de Moscou.
CHURCHILL, Winston, 1946, apud JOHNSON, Paul. Tempos modernos: o mundo dos anos 20 aos 80.
Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército: instituto Liberal, 1994. p. 368.

Após a leitura do discurso de Winston Churchill, faça o que se pede.

Levante hipóteses para explicar o sentido da expressão "cortina de ferro" no discurso de Churchill.
Depois, busque informações sobre o significado desse conceito no contexto da Guerra Fria,
Churchill era britânico, mas proferiu o citado discurso em uma universidade norte-americana
Qual é o significado político dessa atitude?

Por que esse discurso pode ser considerado caracterizador da Guerra Fria?
00
— 126
A Doutrina Truman e o PLano MarshaLL
Em março de 1947, o presidente Truman dis- dólares e grande quantidade de matérias-primas,
cursou dizendo que era dever dos Estados Unidos equipamentos e produtos aos territórios euro-
apoiar os povos livres na construção do próprio des- peus que necessitassem de ajuda. Stalin proibiu
tino. Em seguida, anunciou um substancial progra- os países do Leste Europeu de aceitar a ajuda
ma de assistência econômica e militar à Turquia e à norte-americana, pois acreditava que a iniciativa
Grécia, dois países que enfrentavam uma guerra civil. dos EUA era uma forma de cooptá-los para sua
Para ele, a melhor maneira de combater o órbita de influência. Mesmo assim, Tito, líder
comunismo era reduzir a fome e a pobreza. Por da resistência iugoslava, que era socialista e fora
essa razão, foram alocados cerca de 13 bilhões de aliado de Moscou, aceitou a ajuda.

29
107

_n)
ISLÂNDIA

254

Ttr -< SUÉCIA

NORUEGA
3176

o - REINO
UNIDO

1389
- ALEMANHA

FRANÇA -,

rrAuâ

2706
1474
Fontes: SCHAIN, Mardri A. The Marshall
Plan: hIty year alter. Nova 'fork: Pagrave.
2001: DIJBY, Georrjvs. Grand Atlas
Historique: [histotre dv monde vii 520
varIes. Pans: Larousse, 2011.1). 106.

A Guerra Fria e a Nova Ordem Munr 127


The European Recovery Program,
nome oficial do Plano Marshall, teve
como (cone um navio que leva prospe-
ridade à Europa. Em pouco tempo os
Estados Unidos recuperaram seus
'nvestimentos, pois, com o restabele-
cimento da economia, os países euro-
peus consumiam produtor e l.v:coe
de empresas estadunidens.
Em síntese, o plano
avanço dos partidos de esquerda na
regiões onde atuou e enriqueceu al-
guns Estados capitalistas. Os sovié-
ticos responderam com a criação do
Conselho para Assistência Econômi-
ca Mútua (Comecon), fundado em
1949, visando integrar os países d:
Leste Europeu atrelado; ccon nce e
politicamente a Mosco

Cartaz de divulgaçzie de
Europa, 1947. A tradução dos dizeres do cartaz
Europa, todas as nossas cores para o nastrc

Organizando ideias -
O texto a seguir é parte do discurso do pre- livres que estão resistindo à subjugação tentada por
sidente norte-americano Harry Truman, em minorias armadas ou por pressões vindas de fora.
sessão conjunta do Congresso dos Estados [ ... ] Os povos livres do mundo olham para nós em
Unidos, em 12 de março de 1947. Leia-o. busca de apoio na manutenção de suas liberdades.

TRUMAN. Harryapud SYRETI, Horotd (Orgi. Documentos


[ ... ] A fim de assegurar o pacífico desenvolvi- históricos dos Estados Unidos. São Pauto: Cultrix,
mento das nações, livre da coerção, os EUA desem- 1980. p. 315-316.
penharam um papel importante na fundação da
Explique a que "modos alternativos de vida" o
ONU. Esta se destina a possibilitar liberdade e iii-
presidente Truman se refere e o que, segundo
dependência duradouras a todos os seus membros.
ele, diferencia cada um deles.
Entretanto, não realizaremos nossos objetivos se
não estivermos dispostos a ajudar os povos livres a De acordo com esse discurso, explique com suas
manter suas instituições livres e sua integridade na- palavras o papel dos EUA no contexto da Guerra Fria.
cional contra movimentos agressivos que procuram Releia a frase final do texto e, considerando o
impor-lhes regimes totalitários [ ... ]. No momento contexto da Guerra Fria, explique se há ou não
atual da história do mundo, quase todas as nações respeito pela autodeterminação dos povos.
se veem na contingência de escolher entre modos
Ainda hoje os países em melhores condições
alternativos de vida. E a escolha, frequentes vezes,
apoiam financeiramente as nações em dificulda-
não é livre. Um dos modos de vida se baseia na des econômicas. Entretanto, não podemos ignorar
vontade da maioria e distingue-se pelas instituições os interesses econômicos daqueles que oferecem
livres, pelo governo representativo, pelas eleições ajuda. Forme uma dupla com um colega e, jun-
livres, pelas garantias de liberdade individual [ ... ]. tos, busquem informações sobre uma ação atual
O segundo modo de vida baseia-se na vontade da de ajuda internacional, anotem as informações
minoria, imposta pela força à maioria. [ ... ] Acredito coletadas e procurem identificar os possíveis
que a política dos EUA deva ser a de apoiar os povos interesses de quem está prestando ajuda.

128 :tiln5
 corrida armamentista
Quando terminou a Segunda Guerra Mun-
dial, os Estados Unidos eram a maior potência em 1961, ambos enviaram um home n ao espaço
- sendo que o russo Yuri Gagarin levou seis meses
econômica do mundo e o único país que possuía
de vantagem sobre o norte-americano John Glenn.
bombas nucleares.
Os estoques norte-americanos sempre foram mui-
A iminência do desenvolvimento de artefatos
to maiores do que os russos, e a superioridade dos
militares por outros países, sobretudo a utiliza- Estados Unidos foi aumentada no início dos anos
ção de material nuclear, levou os Estados Unidos de 1960, quando mísseis Polaris e Minuteman en-
a lançar, em 1946, uma primeira proposta de trarain em operação. Os temores infundados, por
regulamentação internacional do uso de energia parte dos norte-americanos de que a URSS assu-
atômica, conhecida como Plano Baruch. Ele misse a liderança em termos de mísseis, fizeram
sugeria a criação da Autoridade de Desenvolvi- com que os Estados Unidos ampliassem o que já

mento Atômico Internacional, que, sob a tutela era uma liderança em seu favor.

das Nações Unidas, supervisionaria a distribuição CALVOCORESSL Peter. Política mundial a partir de 1945.
de materiais de fissão nuclear e a operação de Porto Alegre: Penso, 2011. p. 46.

instalações capazes de produzir armas atômicas.


Apesar de originalmente objetivar a supervisão das
Os soviéticos, então, rejeitaram o Plano
atividades nucleares, o plano acabou enveredando
Baruch, exigindo o banimento do uso de armas
para o lado do controle e limitação de tais ações.
nucleares e a destruição dos estoques existentes. Os
norte-americanos se recusaram a destruir suas armas
enquanto não existisse um mecanismo internacional
de controle. A despeito de todas as discussões sobre
o assunto, o Plano Baruch não vingou.
A Guerra Fria provocou uma gigantesca cor-
rida armamentista por parte tanto dos Estados
Unidos como da União Soviética. A produção de
aviões, tanques e dos mais diversos aparatos béli-
cos aumentou de forma alarmante. Os investimen-
tos em armas cresciam ano após ano. Grã-Bretanha
-----—r -- - --..,.., ____•__:-.-, - e França, potências em declínio, não conseguiam
3
acompanhar soviéticos e norte-americanos. O
)1 :•) iu :;;1í. mundo caminhou para uma bipolarização.
Comissão de Energia Atômica das Nações Unidas realizado em Washington Nesse contexto de enfrentamento, foram
(EUA), 1946.
criadas as alianças militares. Em abril de 1949,
Estados Unidos, Canadá e mais dez países da Eu-
Em 1949, o ano da conclusão do Tratado do ropa Ocidental assinaram um tratado de defe-
Atlântico Norte, a URSS explodiu sua primei- sa coletiva. Nascia a Organização do Tratado do
ra arma nuclear e, no ano seguinte, abandonou
Atlântico Norte (Otan), comandada pelo general
a comissão de desarmamento da ONU (criada
Eisenhower. Os norte-americanos firmaram acor-
em 1948 pela fusão dos Comités de Armamentos
dos com Austrália, Nova Zelândia e vários países
Convencionais e Energia Atômica). Em 1952-53,
asiáticos com o objetivo claro de brecar a expansão
os Estados Unidos e a URSS explodiram suas pri-
meiras bombas termonucleares e de hidrogênio do comunismo, sobretudo no Sudeste Asiático.
com espaços de nove meses entre si. Ambos rapi- Mais tarde (1955), os soviéticos responde-
damente desenvolveram os meios para lançá-las e, ram com a criação do Pacto de Varsóvia - trata-
do assinado em Varsóvia, capital da Polônia, que

129
estabeleceu uma aliança militar entre URSS, Ale- Com o passar dos anos, a zona de influên-
manha Oriental, Bulgária, Hungria, Tchecoslová- cia dos dois blocos se expandiu por todo o globo,
quia, Albânia e Romênia. A Iugoslávia, por opo- como podemos observar no mapa a seguir.
sição de Tito, recusou-se a fazer parte do bloco.

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LOUUJNi . 000Üotic*/
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OCEANO ROAND
OCEANO
PERU CSNGUPUM "/
PACIFICO BRUSIL OCEANO -• jI
'0051510
ÍNDICO
A TLÂNTICO -:

AUSDR*LI*
UAZIIÃI0IA
BSCIIU*f**L),NCRA
DEItO tASD1OL4,ESIA
URUUAI
RUG(NTIEIA
'055v
URU5500lA

s
O 2337 4674 kor

1:233700003 -
EUA, aliados e Esta dos-satél ites URSS e aliados
j EUA e participantes originais da OTAN II Outras naçóes aliadas MURSS a Maiores bases
Países que ingressaram ao bloco capitalista Pacto de Varsóvia —1955 ultramarinas soviéticas
posteriormente na OTAN C Pacto OTC - 1959 Estados-satélites comunistas 4l Zonas de batalhas
Elili Dependências da OTAN —1960 Domínio dos EUA e bases da OTAN [j China durante a Guerra Fria
- Bases marinhas americanas

Fonte: BLACK, Je'emy. World history atlas. Londres: Dcrliirg Kinderslny, 2008. p. 108-109.

Os investimentos em tecnolo-
gia bélica eram constantes. Após a Enquanto a bomba atômica precedente (bomba A) baseia-
União Soviética dominar as técnicas -se na divisão, ou fissão, de um núcleo pesado, como do urânio
de fabricação de armas nucleares, os ou do plutônio, a bomba H baseia-se na fusão entre dois nú-
Estados Unidos desenvolveram um cleos leves: o do deutério e o do trítio, que são dois isótopos do
artefato ainda mais potente: a bom- hidrogênio. A reação de fusão libera uma energia ainda maior
do que a liberada pela fissão. Trata-se da reação que gera a ener-
ba de hidrogênio, cujo primeiro teste
gia solar, e se realiza a uma temperatura de vários milhões de
bem-sucedido ocorreria em 1952. Os
graus, como a que se encontra no interior do Sol. Para atingir
soviéticos, por sua vez, fabricaram a essa temperatura elevadíssima e deflagrar a reação de fusão,
bomba H em 1953. utiliza-se a explosão de uma bomba A, que serve de detonador.
MAI000HI, Roberto. A era atômica. Sâo Pauto: Ática, 1996. p. 42.
Pausa para investigação

1. Em grupo, faça uma pesquisa para responder contaminação por césio-137 em Goiânia
às perguntas a seguir. (1987); usina de Fukushima no Japão
(2011). Escolha um desses acidentes e
ai Como funciona uma usina nuclear? Quais explique quais foram suas consequên-
são as vantagens e desvantagens do uso cias para os seres humanos e para o
desse tipo de energia? meio ambiente.

b) Há casos de acidentes nucleares co- 2 Ainda em grupo, elabore hipóteses para jus-
nhecidos no Brasil e no mundo: usina tificar o temor de um conflito nuclear durante
de Chernobyl na União Soviética (1986); a Guerra Fria.

de destruição em massa - mas essa tese nunca foi


Venda de armas e comprovada. Essa operação militar causou pre-
incentivo aos conflitos juízos econômicos e mortes - inclusive de jovens

A produção de armas no período da Guerra norte-americanos -, alimentando uma crescente


Fria passou a ser um negócio muito lucrativo, onda de hostilidades em todo o mundo.
tendo em vista os conflitos indiretos que expIo- Em relação ao Afeganistão, os mesmos
diam à época e a crença na iminência de um novo grupos radicais que lutaram contra os soviéticos
conflito mundial. vêm sendo combatidos desde 2003 pelos norte-
Nos Estados Unidos, empresas privadas pas- -americanos. Tanto na década de 1980 como no
saram a produzir armas e aviões para o governo, começo do século XXI, os conflitos continuaram
obtendo lucros fabulosos. Com isso, por intermé- a sustentar os fabricantes de armas.
dio de setores da imprensa, procuraram superdi-
mensionar o "perigo vermelho" (fazendo alusão
à ameaça socialista representada pela URSS),
A corrida espacial
pois assim mais verbas seriam destinadas ao setor Outra manifestação da disputa entre EUA
armamentista. Poderosos Iobbies favoráveis às e URSS foi a corrida espacial, que, por meio de
ações armadas foram se cristalizando nas várias demonstrações de tecnologias cada vez mais
esferas governamentais norte-americanas. Esses avançadas, mostrava-se como mais uma faceta

grupos, chamados de "falcões", contribuíram para da competição por soberania ideológica e bélica.
A corrida espacial esteve intimamente ligada
o aprofundamento da Guerra Fria. As intervenções
à corrida armamentista. Os soviéticos desenvol-
dos Estados Unidos no Sudeste Asiático, as ações
veram de forma sigilosa um avançado programa
criminosas na América Central e o fornecimento
de mísseis. Para a surpresa dos norte-americanos,
de vasto material bélico a ditaduras e mesmo a
em 1957 eles colocaram em órbita o Sputnik, um
grupos posteriormente taxados de terroristas pelos
satélite artificial. Esse feito tinha grande significa-
próprios estadunidenses se inserem nesse contexto. do militar, pois, em vez de carregar um satélite e
Mesmo com o fim da Guerra Fria (1991), o ser direcionado ao espaço, o foguete poderia le-
quadro não mudou efetivamente. No início do sé- var uma bomba e ser lançado contra o território
culo XXI, sob o governo de George W. Bush (2001 inimigo. A segurança dos Estados Unidos, funda-
a 2008), os Estados Unidos invadiram o Iraque, mentada em sua superioridade aérea, começava
que, segundo informações da CIA, possuía armas a ser posta em xeque.

131
Em 1958, os norte-americanos colocaram
em órbita seu primeiro satélite, o Explorer. Nos
anos seguintes desenvolveram uma série de mís-
seis intercontinentais, que, instalados em subma-
rinos atômicos, poderiam atingir qualquer lugar
do planeta. Já os soviéticos continuaram traba-
lhando em seus mísseis e colocaram em 1961 o -.
cosmonauta Yuri Gagarin em voo orbital de 48
minutos a bordo da nave Vostok. A reação norte-
-americana veio com maciços investimentos na
National Aeronautics and Space Administration
(Nasa), feitos pelo presidente John F. Kennedy, "
que resultaram nas diversas missões cunhadas de
Apollo. Na Apolio 1, os três astronautas morre-
ram em uma missão de treinamento. O programa
espacial soviético também conviveu com vários .,
desastres, mas a maioria deles não foi divulgada.
Finalmente, a missão ApolIo 11 pousou na Lua
em 20 de julho de 1969, e os astronautas Neil
Armstrong e Edwin Aldrin caminharam na super-
fície lunar.
Apesar de, inicialmente, o interesse do inves-
timento em tecnologia espacial estar diretamen-
te relacionado à disputa pelo poder, a corrida
estadunidense e soviética para chegar ao espaço
não se limitou a isso, resultando em importantes
avanços tecnológicos para fins diversos. Ela foi
Lançamento do Sputnik 2, que carregava a cadela Laika, a primeira criatura
marcada pelo investimento em pesq u:sas funda- viva a ser enviada para a órbita da Terra. Tyura-Tam (IJRSS). 3 nov. 1957.
mentais para o desenvolvimento de áreas de in-
teresse de toda a sociedade, e essa tec- a
E
nologia foi repassada para o cotidiano.
Assim, surgiram invenções que fa- 'a

cilitaram a vida na segunda metade do


'3
século XX, com destaque para os pro-
dutos eletrônicos exportados pelos Es-
tados Unidos para diversas partes do
mundo, como o forno micro-ondas.
Essas iaes também
unonarad

de vida americano, simbolo do capi -----


talismo. Uma inovaçao importante .
criada no contexto da Guerra Fria foi a
internet, hoje uma das redes de comu- ,. ... -
nicação mais utilizadas no mundo.
-• -
-' ,-
nortc

os primeiros seres humanos a caminhar na Lua, durante


missüoApollo 11, em 20 de julho de 1969 P-

- 132 1
Observe a charge a seguir e responda às questões.

Q15t1)1tN0.)M C-
.MJo E. Voc- tiA-ÃoI
Pt UM
CARR.lMI.'O 5€
1 E.0 UM

Charge Origens!, de Pablo Carranza, publicada em 27 de julho de 2009.


Disponível em: <http://pablocarranza.com.br/origens!>. Acesso em: abr. 2016.

Que aspecto da Guerra Fria é ressaltado na De que forma as potências em disputa du-
charge? rante a Guerra Fria - Estados Unidos e União
Soviética - efetivamente combateram?
Qual era a importância da corrida espacial
e armamentista para as potências capita-
listas e socialistas após a Segunda Guerra
Mundial?

Os serviços de inteligência
A União Soviética tinha uma longa história organização passou a ter diversas atribuições: de
de serviço de espionagem e inteligência. Ainda espionagem a intervenção em países estrangeiros
na época do czar, havia a temida polícia secreta em defesa dos interesses norte-americanos.
Okrana. Com a vitória bolchevique, foi criada a Em dezembro de 1947, o Conselho de Se-
Tcheka, que depois mudou várias vezes de nome: gurança Nacional deu ordens para a CIA com-
OGPU, NVKD e por último KGB. Esses órgãos bater o comunismo na Itália, visando interferir
do governo colaboraram nas arbitrariedades e no resultado das eleições italianas por meio do
nos crimes praticados supostamente em defe- pagamento de altas quantias de dinheiro.
sa do comunismo, atos que se constituíram em Por meio da CIA, os EUA ajudaram os
violações dos direitos à liberdade e à vida. militares da Guatemala a derrubar o presiden-
Nos Estados Unidos, o presidente Harry te Jacob Arbenz, que se opunha aos interesses
Truman criou, em 1947, a Central Intelligence da United Fruit Company, uma empresa norte-
Agency (CIA), uma agência de inteligência civil a -americana. A CIA também ajudou a derrubar
serviço do governo, responsável por investigar e governo iraniano liderado por Mohammed
fornecer informações relacionadas à segurança Mossadegh. Abertamente, os norte-americanos
nacional do país aos senadores e ao presiden- apoiaram ditaduras na República Dominicana,
te da República. O objetivo de Truman era, por em Cuba, na Nicarágua, em Portugal e na Espa-
meio desse órgão, manter-se informado sobre nha, combatendo qualquer ameaça de consoli-
que acontecia no mundo. Entretanto, logo a dação comunista.

................. 133
de mobilizar ao lado da URSS todos os países
James Forrestal e seu bom amigo Alien ditos "anti-imperialistas".
Dulies recorreram a seus amigos e colegas de A propaganda ideológica produzida por
\,\Tall Street e Washington - homens de negó-
políticos das duas superpotências apresentava
cios, banqueiros e políticos - mas nunca era o
suficiente. Forrestal procurou então um anti- argumentos de "defesa do mundo livre" e "com-
go companheiro, John W. Snyder, secretário bate ao totalitarismo", do lado norte-americano,
do Tesouro e um dos aliados mais próximos e de "luta contra o imperialismo" e "defesa do
de Harry Truman. Ele convenceu Snyder a proletariado mundial", do lado soviético, jar-
utilizar o Fundo de Estabilização de Câmbio gões usados à exaustão durante a Guerra Fria.
criado na Depressão para sustentar o valor
No entanto, os Estados Unidos, embora se colo-
do dólar no exterior através do comércio de
moeda a curto prazo, e transformado durante cassem como defensores dos regimes democráti-
a Segunda Guerra Mundial num depósito para cos, apoiaram ditaduras em todos os continen-
espólios capturados do Eixo. O fundo tinha tes (por exemplo, Franco na Espanha, Salazar
US$ 200 milhões destinados à reconstrução em Portugal, Pinochet no Chile e os militares no
da Europa. I)istribuiu milhões de dólares nas Brasil). Já os soviéticos espoliaram os países do
contas bancárias de ricos cidadãos america-
Leste Europeu - não oferecendo bom exemplo de
nos, muitos deles ítalo-americanos, que então
enviaram o dinheiro para frentes políticas re- "combatentes anti-imperialistas" - e reprimiram
cém-formadas, criadas pela CiA. Os doadores a classe operária tanto na URSS como em suas
foram instruídos a colocar um código especial repúblicas-satélites. Em vez de "ditadura do pro-
em seus formulários de imposto de renda jun- letariado", conforme preconizara Marx, ocorreu
tamente com suas "doações de caridade". Os uma ditadura sobre o proletariado.
milhões de dólares foram entregues a políti-
cos italianos e a padres da Ação Católica, um
braço político do Vaticano. Malas cheias de
dinheiro mudaram de mãos no Hassler Hotel,
de quatro estrelas. "Gostaríamos de ter feito
isso de uma maneira mais sofisticada", disse
HE E

Wyatt. "Repassar malas pretas para interfe-


rir numa eleição política não é de fato algo
incrivelmente atraente." Mas funcionou: os
democratas cristãos da Itália venceram com
uma margem de votos confortável e formaram
um governo que excluía os comunistas. Teve
início um longo romance entre o partido e a
agência. A prática da CiA de comprar eleições
e políticos com malas de dinheiro se repetiu
na itália - e em muitas outras nações - duran-
te os 25 anos seguintes.
WEINER, Tim. Legado de cinzas: uma história da CIA.
Rio de Janeiro: Record, 2008. p. 46-47.

A resposta soviética foi rápida: em uma


reunião realizada na Polônia em setembro de
1947, delegados de nove partidos comunistas
europeus criaram o Kominform (Organização
de Informação Comunista). Nesse encontro, o
delegado Soviético Andrei Jdanov anunciou uma
Cartaz sovietico produzido em 1948. A tradução da frase do cartaz é:
doutrina que respondia à de Truman. Tratava-se Não mexa corlosco!',

- 134
Em dupla, teia o texto e depois, juntos, façam o irmãos da França, Inglaterra e Itália e outros países.
que se pede. Eles devem tomar nas mãos a bandeira de defesa na-
Quanto mais nos afistamos do final da guerra, cional e a soberania de seus próprios países.
mais claramente aparecem as duas direções principais AndreiJdanov, 1947, apud LEBRUN, François; ZANGHELLINI,Valéry
da política internacional do pós-guerra, corresponden- (Coord.). Histoireterrninates. Paris: BeUn, 1983. p. 105. (Tradução nossa(.
do à disposição em dois campos principais das forças
Façam uma pesquisa para descobrir quem
políticas que operam na arena mundial: o campo anti-
-imperialista e democrático e o campo imperialista. foi Andrei Jdanov e qual era a participação
Os Estados Unidos são a principal força dirigente dele na política soviética em 1947.
do campo imperialista. Inglaterra e França estão uni-
Como Jdanov definiu os lados opostos na
das aos Estados Unidos [.4. O campo imperialista é
apoiado pelos países que possuem colônias, como a Guerra Fria?
Bélgica e a Holanda, assim como os países dependentes
Definam os apoiadores de cada um dos lados.
política e economicamente dos Estados Unidos, como
os do Oriente Médio, da América do Sul e da China. Para Jdanov, qual seria o papel da União
As forças anti-imperialistas e antifascistas for- Soviética nessa disputa política mundial?
mam o outro grupo. A URSS e os países da nova de-
mocracia são seus alicerces. O campo anti-imperia- S. Pode-se afirmar que, assim como no discurso
lista em todos os países [é formado] pelo movimento de Churchill, essas palavras oficializam a exis-
operário e democrático, pelos partidos comunistas tência da Guerra Fria? Expliquem.

O armamentismo De acordo com representantes dos Estados


Após a Segunda Guerra Mundial, não foram Unidos e de Israel, tradicionais opositores políti-
apenas as duas superpotências que desencadea- cos do Irã, o país, que já utiliza energia nuclear
ram uma corrida armamentista. Ainda na dé- para fins pacíficos, estaria a caminho de fabricar
cada de 1960, Grã-Bretanha, França e China já armamentos nucleares. A acusação é negada pe-
possuíam arsenais atômicos. (as autoridades iranianas.
Apesar da assinatura de tratados de não Atualmente, após vários acordos de paz vi-
proliferação de armas atômicas, outros países as sando à redução dos armamentos, os gastos com
desenvolveram, como Israel, Índia, Paquistão e, material bélico ainda são elevados em diversas
recentemente, Coreia do Norte. partes do mundo.

Pausa para investigação •.


L

Em grupo, procure informações sobre o co- Vocês concordam com esses gastos volumo-
mércio mundial de armas atualmente e traga o sos em armamentos? Por quê?
conteúdo pesquisado para a sala de aula. Com
os colegas de grupo, organizem um debate Se fossem direcionados para necessidades
sobre o assunto. básicas, como educação, emprego, trans-
Na discussão, procurem elaborar hipóteses porte, saneamento básico e moradia, esses
ou refletir sobre as questões a seguir. investimentos resolveriam ou amenizariam
a desigualdade social do mundo? Expliquem.
1. O que justifica as enormes quantias de
dinheiro gastas pelos países na compra e
desenvolvimento de armas?

A Guerra Fria e a Nova Ordem Mur. 135


As intervenções internacionais
Embora não tenha havido um combate direto
entre as superpotências da Guerra Fria, muitos con-
flitos ao redor do mundo contaram com o apoio -
ou até mesmo com a intervenção militar direta -
dos Estados Unidos e da União Soviética.

Vietnã
Em 1954 foi realizada uma grande conferên-
cia internacional em Genebra, na Suíça, com o
Soldados norte-americanos evacuam vila de civis vietoamitas durante a
objetivo de encontrar soluções para os conflitos
Guerra do Vietnã. 1965.
na Ásia. Na ocasião, ficou decidido que o recém
independente Vietnã seria dividido provisoria- de napatrn e de fósforo, bem como bombas
mente em Norte (associado à União Soviética) e guiadas a laser, com grande precisão e poder
Sul (associado aos Estados Unidos) até a realiza- destrutivo. Além disso, usaram aviões para es-
ção das eleições, que ocorreriam em 1956. Con- palhar cerca de 80 milhões de litros de agente
tudo, essa divisão foi mantida após a declaração laranja (herbicida tóxico usado como desfolhan-
de independência do Vietnã do Sul, liderada por te) sobre o território vietnamita. Eles pretendiam
Ngo Dinh Diem, que passou a governar de forma matar a vegetação das florestas, de modo que
ditatorial e contou com apoio político dos Esta- os adversários não pudessem mais se esconder
dos Unidos. Assim, o país permaneceu dividido nas áreas rurais e tivessem dificuldade para se
em República Democrática do Vietnã (Vietnã do alimentar. Além de ser nocivo à flora, o agente
Norte), governada por Ho Chi Minh, comunista, laranja pode causar câncer e doenças genéticas
e República do Vietnã (Vietnã do Sul), capitalista. nos seres humanos.
Na década de 1950, com receio de que os paí- Em 1967, quando Nguyên Van Thieu foi
ses do Sudeste Asiático se tornassem comunistas, o eleito presidente do Vietnã do Sul, a situação do
governo dos Estados Unidos decidiu intervir na re- país era grave, a dependência econômica e militar
gião para impedir o avanço do comunismo, envian- era muito grande e os Estados Unidos não conse-
do, inclusive, armas e dinheiro ao Vietnã do Sul. guiam vencer os vietcongues, os quais, comanda-
Em 1960, no Vietnã do Sul, foi criada a Frente dos por Nguyên Giap, usavam táticas de guerrilha
Nacional de Libertação, composta de pessoas que e o conhecimento das florestas para desestabili-
combatiam o crescente intervencionismo norte- zar as estratégias estad u n idenses.
-americano no país. Os militantes ligados a ten- Apesar de resistir aos ataques norte-ameri-
dências comunistas, cada vez mais popu lares, eram canos, os vietcongues não tinham condições de
chamados de vietcongues. vencer militarmente os Estados Unidos. Ciente
Em 1965, o governo dos Estados Unidos de- disso, o comandante Giap esperava que, com o
cidiu ampliar a atuação no país e enviou tropas prolongamento do conflito e o aumento do nú-
ao Vietnã com o objetivo de apoiar o com balido mero de baixas, a opinião pública norte-america-
governo sulista. Com isso, teve início um período na pressionasse o governo a retirar as tropas.
de forte intervenção na região, que afetou sensi-
velmente o Vietnã do Norte. Napatrn é um agente espessante de líquidos
A ação militar estadunidense marcou a his- que, se misturado com gasolina, produz um gel
tória da humanidade com uma brutal violação pegajoso e incendiário, que adere à pele e pro-
dos direitos humanos. Os norte-americanos ata- voca queimaduras profundas.
caram a porção norte do Vietnã usando bombas

136
O refLexo da guerra
nos Estados Unidos
Influenciada por um discurso de
"luta em favor da democracia e da liber-
dade", inicialmente grande parte da po-
pulação estadunidense havia apoiado a
entrada do país no conflito vietnamita.
Entretanto, com o passar do tempo, o
número de jovens soldados mortos au-
mentou e começaram a ser divulgados os
atos de crueldade cometidos pelas tro-
pas estadunidenses, como os bombar-
deios indiscriminados, o uso de agentes
químicos e o massacre de civis. Conse- Manifestantes caminfram enquanto pedem o fim cfiis hornbardeios em protesto contra a Guerra
no Vietnã. Nova York (EUA), 1967.
quentemente, a população civil america-
na passou a repudiar a participação na guerra. a guerra em 1975, quando os norte-vietnamitas
Milhares de pessoas foram às ruas para pro- ocuparam Saigon, capital do Vietnã do Sul, que
testar contra a intervenção dos Estados Unidos passou a se chamar Cidade de Ho Chi Minh, em
no Vietnã, o que culminou em uma série de mo- homenagem ao famoso líder do Vietnã do Norte,
vimentos reivindicatórios. Foi um período de luta morto em 1969. O Vietnã foi então reunificado
não apenas contra a guerra, mas também por sob o nome de República Socialista do Vietnã.
melhoria nas condições das mulheres, dos negros A derrota da superpotência para uma nação
e da população americana em geral. bélica e economicamente menos provida gerou
O governo norte-americano, pressionado uma espécie de "trauma" aos Estados Unidos.
pela opinião pública e pelos fracassos na guerra, Por outro lado, o triunfo da guerrilha vietcongue
assinou o cessar-fogo em janeiro de 1973, re- inspirou movimentos dessa natureza em diversas
tirando a maioria de suas tropas. Sem a ajuda partes do mundo, como no caso das guerrilhas
estadunidense, o governo de Van Thieu perdeu socialistas da América Latina.

Organizando ideias
Agente Laranja: o legado fatídico dos Exatos 4() anos após o fim da guerra que,
EUA no Vietnã calcula-se, matou 3 milhões de pessoas, as questões
relativas à potência e alcance dessa substância tóxi-
1...] ca seguem em aberto. E são cada vez mais difíceis
Visando destruir as safras do inimigo e dizimar de responder, à medida que nascem no Vietnã uma
as selvas em que se escondiam os vietcongues e o segunda e, agora, uma terceira geração de crianças
Exército do Vietnã do Norte, cerca de 160% do ter- apresentando alta incidência de deficiências como
ritório do país foi bombardeado com toxinas. síndrome de Down, paralisia cerebral e desfigura-
Entre elas, a mais utilizada era a dioxina, apeli- ção facial extrema.
dada agente laranja. Os pilotos da Força Aérea dos
AGENTE LARANJA: o legado fatídico dos EUA no Vietnã. Carta
Estados Unidos o despejavam abundantemente so-
Capital, São Pauto, 1 maio 2015. Disponível em: <'Aww.csrta
bre a vegetação, na proporçào de até 14 quilôme- capital.com.br/internacional/agente-laranja-o-legado
tros em menos de cinco minutos. E. desse modo, fatidico-dos-eua-no-vietna-1631 html>. Acesso em: abr. 2016.
criaram um problema cujas raízes não eram ime-
De acordo com o texto, os efeitos do agente
diatamente visíveis: o impacto dessa carga tóxica
laranja são apenas imediatos? Explique.
sobre a saúde.
[...1 Explique o título da reportagem.

137
Coreia
No início do século XX, a Penínsu- alegando não reconhecer a legitimidade
la Coreana já despertava o interesse de da comissão, decidiu assumir a posição
outras nações, devido, principalmente, à de total controle político na região norte
sua localização estratégica - no Extremo da península. Os Estados Unidos, em con-
Oriente, entre a China e ojapão. Em 1905, trapartida, aumentaram sua influência na
a Coreia foi invadida pelo Japão, tendo parte sul. Essa nova ocupação criou dois
sido anexada formalmente em 1910. Em países: a Coreia do Norte (República De-
1945, com o término da Segunda Guerra mocrática Popular da Coreia, aliada da
Mundial e a derrota japonesa no Oriente, URSS) e a Coreia do Sul (República da Co-
a Península Coreana foi ocupada tanto reia, aliada dos EUA).
pelos Estados Unidos, no sul, quanto pela Em 1950, com o interesse de expan-
União Soviética, no norte. são ideológica e territorial, o Exército Po-
Em 1947, a ONU formou uma comis- pular da Coreia do Norte invadiu a Coreia
são com o intuito de reorganizar e unifi- do Sul. A ONU condenou a agressão e,
car as duas porções da Coreia por meio logo em seguida, sob a liderança dos Es-
de eleições. Entretanto, a União Soviética, tados Unidos, as Nações Unidas enviaram
tropas para a região a fim de expulsar os
norte-coreanos e devolver o comando da
capital, Seul, para os sul-coreanos.
Os Estados Unidos entraram no con-
flito ao lado da Coreia do Sul, enquanto
CHINA a China, com o auxílio da União Soviética,
COREIA
DO NORTE enviou tropas para a zona de combate em
Mar do Leste apoio à Coreia do Norte. A guerra durou
Pyongyang (Mar do Japão)
de 1950 a 1953 e terminou sem um vence-
dor. Os combates vitimaram cerca de 1,2
/ Z. milhão de pessoas, na maioria civis. Em 28
SouI - de março de 1953, as duas Coreias come-
çaram a discutir uma proposta de paz por
COREIA
Mar
intermédio da ONU. Em 27 de julho do
DOSUL
Amarelo mesmo ano, foi assinado o armistício e de-
cretada uma trégua entre elas. O armistício

JAPAO
assegurou um cessar-fogo, mas nenhum
tratado de paz definitivo foi assinado. O
: território coreano permaneceu dividido e
0±1 /Ç
os conflitos geopolíticos continuaram, em-
O 166 332km bora sem envolvimento militar direto.
-
1:16600 A Coreia do Sul, inferiorizada militar-
\_ c-
mente, recorreu à proteção dos Estados
Fmte: DLjBY. G-ys Di Atlas histórico mundial. 3 eci. Barcelone: Sarnosee
Edilonal, 2O 1 3.305. Unidos. Assim, o país obteve muitos recur-
sos dos estadunidenses, aplicados na edu-
A Gtossn:- cação e em desenvolvimento tecnológico.
Armistício: suspensão das hostitidades entre be- Além disso, foi paulatinamente modifican-
ligerantes, como resultado de uma convenção, sem, do seu sistema político, tendo passado por
contudo, pôr fim à guerra; trégua. diversas ditaduras até adotar medidas mais
democráticas de eleição e governo.

138 -tuto
Nos anos 1990,
as taxas de crescimento econômico. Mísseis de longo alcance e pos-
econômico sul-coreanas foram elevadas. sivelmente armas nucleares fazem parte do
A ascensão da economia nesse período evi- arsenal do país, que tem sido governado
denciou-se quando o país, em parceria com desde 1945 por membros de uma mesma
ojapão, sediou os jogos da Copa do Mundo família: Kim Il-Sung (1948/1994), KimJong-ll
da Fifa em 2002. Contudo, greves, escândalos (1994/201 1)e KimJong-Un, a partirde 2011.
financeiros, desnível social e descontentamen- Desde 2000, as duas Coreias nego-
to popular também se destacaram no país. ciam uma possível aproximação, mas a
Com um sistema educacional conside- região vive sob tensão constante. Em 2007,
rado muito eficiente, a Coreia do Sul se so- seus líderes chegaram a firmar um acordo
bressai como um grande centro de inovações definindo questões relativas à paz perma-
tecnológicas; por outro lado, parte da popu- nente, rompido, entretanto, quando a Co-
lação sofre com a falta de seguridade social, reia do Norte fez alguns testes de mísseis.
que atinge principalmente os mais idosos. Desde o incidente, intensificou-se o clima
A Coreia do Norte vive sob um regime de tensão entre os países.
fechado, inspirado no social is-
mo, fortemente militarizado e
com uma economia fraca. Ela
investe tanto em educação e
saúde quanto no desenvolvi-
mento de tecnologia bélica e
nuclear. Além disso, há poucas
informações disponíveis sobre
a vida na Coreia do Norte,
pois o governo limita as ativi-
dades da imprensa nacional
1'
e estrangeira no país, bem
como impõe restrições à ação
de diversos organismos inter-
nacionais.
Apesar das dificuldades
econômicas, grande parte do
orçamento norte-coreano é
gasto com as Forças Arma-
das. Para alguns especialistas,
as constantes ameaças aos Á 'i !

vizinhos é uma forma de os Estação do metrã de Seul (Coreia do Suã. 21) 1 t. O rnetrõ cio Seul é um dos mais movimentados do
mundo, chegando a transportar cerca de 8 milhões de passageiros por dia, o dobro aproximadamente do
governantes obterem auxílio
transportado pelo metrô de São Paulo.

Pausa para unvestigacão

Qual é a situação das Coreias hoje? Em grupo, pesquisem informações atualizadas sobre a região
nos aspectos político, econômico e social. Vocês podem dividir o assunto em tópicos, e cada integrante
será responsável por um deles.
Apresentem o resultado em sala de aula e elaborem um ou mais textos jornalísticos mostrando
aspectos que chamaram a atenção na pesquisa ou que resumam a situação atual.

139
Irã e Egito Estados Unidos, ele defendeu uma coexistência
pacífica, com a manutenção das respectivas áreas
No Irã, área de influência norte-americana, de influências de cada país. No bloco socialista,
foi derrubado em 1953 o primeiro-ministro Mo- retomou as relações com o Marechal Tito, gover-
hammed Mossadegh, que havia nacionalizado nante da Iugoslávia, e incentivou a derrubada de
a exploração de petróleo no país. Chamada de governantes comprometidos com o stalinismo na
Operação Ajax, a atuação conjunta do governo Europa Oriental.
britânico e da CIA foi vital para a deposição do Na Polônia, em 1956, em meio a agitações
governante iraniano. populares, a ala stalinista foi retirada do poder.
Foram realizadas reformas superficiais e não hou-
ve intervenção de tropas soviéticas.
Em meados de agosto, [Kermit] Roosevelt e
Na Hungria, após a queda do stalinista Má-
sua equipe de agentes iranianos estavam a pos-
tyás Rákosi e a ascensão do reformista Imre Nagy,
tos e prontos para atacar. Eles haviam empur-
rado o Irã para a beira do caos. Jornais e líde- a população, sobretudo operários e estudantes,
res religiosos exigiam a cabeça de Mossadegh. não queria a volta do capitalismo, mas sim um
Protestos e distúrbios organizados pela CIA socialismo democrático e o fim da dominação
haviam transformado as ruas em campos de soviética no país. Ocorreram manifestações po-
batalha. Propaganda antigovernamental, nas pulares que exigiam a retirada das tropas soviéti-
palavras de Wilber, "jorrava das impressoras cas de Budapeste e a realização de eleições gerais
da Agência e eram levadas por via aérea para
com candidatos de vários partidos.
feerã". Mossadegh estava mais fraco e isolado
As manifestações surtiram efeito. O novo
do que nunca.
governo húngaro radicalizou sua posição abolin-
KINZER. Stephen. Todos os homens do xá: o golpe norte-
-americano no Irá e as raízes do terror no Oriente Médio. Rio do o regime de partido único e declarando que o
de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p. 187. país se retiraria do Pacto de Varsóvia. A reação
da União Soviética foi imediata. A cidade de Bu-
dapeste foi invadida. O povo resistiu com armas,
No Norte da África, em 1956, eclodiu a mas foi vencido. Em torno de 20 mil pessoas fo-
Guerra de Suez, com a ocupação do recém- ram mortas, milhares deixaram o país e 350 fo-
-nacionalizado Canal de Suez, no Egito, por for- ram enforcadas. lmre Nagy foi condenado e exe-
ças israelenses, britânicas e francesas. A ação cutado em 1958.
não contou com o apoio do Estados Unidos e, Em 1949, o território da Alemanha foi di-
muito menos, da União Soviética, que era alia- vidido em dois Estados: República Federal da
da de Gamal Abdel Nasser, governante egípcio. Alemanha (Alemanha Ocidental), capitalista,
Diante do embate, a União Soviética ameaçou e República Democrática Alemã (Alemanha
usar armas nucleares caso os invasores não re- Oriental), socialista. A capital, Berlim, que fi-
tirassem suas tropas. Orientados pelos Estados cava na porção Oriental, foi dividida em quatro
Unidos, os invasores recuaram pouco tempo áreas de influência, controladas por estaduni-
depois, em 1957. denses, franceses e britânicos de um lado, e por
soviéticos, de outro.

Leste da Europa O rápido desenvolvimento econômico da


parte ocidental, graças aos aportes de recursos
Na União Soviética, a morte de Stalin (1953) norte-americanos, funcionava como um chama-
desencadeou um período de transição que du- riz aos alemães que viviam na parte socialista.
rou até 1956,
quando Nikita Kruschev assumiu o Diante da fuga em larga escala de mão de
poder. Na esfera política, Kruschev acenou com obra qualificada, o governo comunista da Ale-
a possibilidade de liberalização do regime ao de- manha, com o aval de Moscou, construiu em
nunciar diversos crimes cometidos no período 1961 um muro que separou a cidade. O Muro
stalinista. Quanto ao relacionamento com os de Berlim tornou-se um símbolo da Guerra Fria.

140
Foi sem dúvida um instrumento de propaganda modelo soviético. Na política externa, ensaiavam-
do Ocidente, pois o raciocínio era o seguinte: se -se passos no sentido de uma soberania efetiva do
o socialismo fosse melhor, deveria ser construído país. Buscava-se a construção de um "socialismo de
um muro para impedir que as pessoas entrassem rosto humano". Não foi o que aconteceu, pois esse
e não para impedir que elas saíssem. movimento, chamado de "Primavera de Praga", foi
esmagado por uma ação militar russa.
Mais uma vez, a intolerância venceu, repre-
sentada pela burocracia moscovita e por seus
aliados no país. Na noite de 20 de agosto de
1968, tanques, aviões e 200 mil soldados do Pac-
to de Varsóvia entraram em Praga, sob forte resis-
tência popular.

[ ... ] Homens e mulheres que tiveram par-


ticipação ativa na Primavera de Praga foram
"entrevistados" e convidados a assinar decla-
rações em que renunciavam às suas próprias
ações e rejeitavam as reformas de Dubcek. A
maioria assinou. Os que se recusaram per-
deram seus empregos e, ao lado de parentes
e filhos, se tornaram párias. Sem sombra de
dúvida, o grupo mais numeroso de vítimas era
constituído de pessoas (fosse dentro ou fora
do partido) que tinham desempenhado papéis
de destaque nos anos recentes: jornalistas,
apresentadores de televisão, ensaístas, roman-
cistas, dramaturgos, diretores de cinema e lí-
deres estudantis.

JUDT. Tony. Pós-guerra: uma história da Europa desde


1945. Rio de Janeiro: Objetiva. 2008. p. 449.

Casal que mora na parte ocidental de Berlim levanta seus filhos gêmeos
para que os avós possam vê-los do outro lado. setembro de 1961.

No Leste Europeu, as violações ao direi-


to de liberdade ocorreram em larga escala. Em
1953, na Alemanha Oriental, greves operárias
foram duramente reprimidas, o que evidenciou
as contradições de um Estado que se dizia do
proletariado.
Em abril de 1968, na Tchecoslováquia, houve
uma tentativa de liberalização do regime. Alexan-
der Dubcek anunciou que seu país realizaria im-
portantes reformas econômicas e políticas. Presos
políticos foram libertados, a imprensa tornou-se
mais transparente e a pluralidade ganhou força. Na Fumaça preta cobre a rua enquanto jovens escalam um tanque russo durante
economia, os tchecoslovacos deixaram de seguir o manif estação próxima à estação de rádio de Praga. em 21 de agosto de 1968.

141
Ascensão do sociaLismo em Cuba
Em Cuba, uma revolução popular causou Nesse contexto de enfrentamento, o gover-
vários problemas aos interesses norte-americanos. no dos Estados Unidos decretou um bloqueio
Antes dominada por Fulgêncio Batista, ditador econômico e rompeu relações diplomáticas com
apoiado pelos Estados Unidos, a ilha foi palco a ilha caribenha. A CIA treinou elementos con-
de ações de guerrilheiros, que, liderados por Fidel trarrevolucionários que deveriam desembarcar
em Cuba e derrubar Fidel Castro, que, diante de

_
Castro, Ernesto "Che" Guevara e Camilo Cienfue-
gos, tomaram o poder em janeiro de 1959. uma grande concentração popular em 16 de abril
de 1 961, havia proclamado o caráter socialista da
Sob a liderança de Fidel Castro, o governo re-
Revolução Cubana.
volucionário confiscou propriedades, expropriou
Em 17 de abril ocorreu a invasão da Baía dos
empresas norte-americanas e tratou com rigor os
Porcos, repelida pelo exército revolucionário em 72
membros do antigo regime, o que levou parte da
horas. Oitenta invasores morreram e 1179 foram
mídia internacional a criticar duramente Fidel, re-
presos. O jornal The New York Times divulgou que
presentando-o como um tirano que suprimia a de-
os invasores haviam sido treinados, equipados e
mocracia e feria os legítimos interesses da nação. financiados pelo governo norte-ame-
ricano. Soube-se ainda que a empresa
United Fruit cedera aos contrarrevolu-
- cionários dois navios mercantes para
o transporte de armas e homens. No
ano seguinte, por pressão dos EUA,
Cuba foi expulsa da Organização dos
Estados Americanos (OEA).
PEm outubro de 1962, um avião de
espionagem dos Estados Unidos, o U-2,
fotografou plataformas para mísseis
que os soviéticos estavam instalando
em Cuba. O presidente John Kennedy
decretou bloqueio naval à ilha governa-
da por Fidel Castro. Navios soviéticos,
apoiados por submarinos nucleares,
aproximavam-se da região. O mundo
esteve muito próximo de uma confla-
Líder cubano, Fian ,:irn, LSCin nn:etico. durante encon tíü na
Organização das Nações Unidas, em 1960.
gração nuclear. Felizmente, Kruschev e
Kennedy entraram em acordo.

[ ... } A perspectiva de um ou dois mísseis sovié- pelos dois lados durante a Guerra Fria representa-
ticos atingirem alvos na América foi suficiente vam para ambos uma ameaça maior do que os Es-
para persuadir Kennedy a se comprometer publi- tados Unidos e a União Soviética significavam um
camente, em troca da concordância de Kruschev para o outro. Esta inacreditável sucessão de even-
em retirar suas armas de Cuba, a não fazer novas tos, hoje vista universalmente como a que mais
tentativas de invadir a ilha. Kennedy secretamente perto levou, durante a segunda metade do século
também prometeu retirar os mísseis americanos de XX, a uma terceira guerra mundial, proporcionou
alcance intermediário da Turquia, o que Kruschev um relance de um futuro que ninguém desejava: o
queria que fosse anunciado ostensivamente como de um conflito que se projetaria além dos limites,
parte do acordo. E ... ] da razão e da possibilidade de sobrevivência.
Mas a crise dos mísseis em Cuba [...] conven-
GADDIS, John Lewis. História da Guerra Fria. Rio de Janeiro:
ceu a todos os envolvidos [... 1 que as armas criadas
Nova Fronteira, 2006. p. 75.

- 142 'nc 5
divulgadas ao mundo pelos norte-americanos.
Reação capitaLista Os excessos de McCarthy - que chegou a acusar
No começo da década de 1950, em razão de comunistas o general George Marshall e o fí-
da Revolução Chinesa de 1949 (episódio em que sico Robert Oppenheimer, chefe do projeto que
comunistas assumiram o poder na China), da ex- levou os Estados Unidos a desenvolver a bomba
plosão da primeira bomba atômica soviética e da atômica - provocaram sua queda, porém os da-
Guerra da Coreia, desencadeou-se nos Estados nos já eram enormes.
Unidos um temor crescente do chamado "pe- Na América Latina a ameaça de "cubaniza-
rigo vermelho". Nesse contexto foi criada uma ção", ou seja, de que o socialismo se espalhasse
subcomissão no senado norte-americano para pelo continente, levou os sucessivos governos
investigar pessoas supostamente envolvidas em dos Estados Unidos a apoiar regimes ditatoriais -
atividades contrárias aos interesses do país. Em como o de Somoza, na Nicarágua - e ajudar gru-
janeiro de 1951,0 senadorJoseph McCarthy as- pos reacionários a abalar regimes democráticos
sumiu a presidência dessa subcomissão e iniciou que estivessem fazendo reformas moderadas,
um conjunto de ações que ficou conhecido como mesmo sem questionar o sistema capitalista -
macarthismo. como João Goulart, no Brasil. Isso deveria ser
Começou então uma moderna "caça às bru- feito por meio das agências de notícias, do
xas": pessoas perderam os empregos, reduziram- cinema, da televisão, dos meios de comunicação
-se as liberdades civis, jornalistas mais críticos de forma geral, destilando uma visão manique-
foram perseguidos, políticos liberais sofreram ísta de mundo. De um lado, estava o mundo
acusações levianas, professores foram demitidos e livre sob a liderança dos EUA; do outro lado, o
até Hollywood sofreu consequências, com o afas- totalitarismo sob a égide da URSS e seus aliados.
tamento de atores, diretores, técnicos, roteiristas No contorno da Guerra Fria, o posiciona-
etc., considerados "perigosos" à democracia. mento crítico, tanto de um lado como do outro,
Apoiado por setores do Partido Republica- era desqualificado em virtude de seu viés ideológi-
no, o macarthismo foi um movimento conserva- co. No Brasil, durante a Ditadura Militar, qualquer
dor que depôs contra as credenciais democráticas pessoa podia ser classificada como comunista

lealdade de um
mericano... mais
rto do que a traição
munista." Pôster
lado pela Divisão de
::forfllaÇãü dos Estados
Unidos em 1956.

A
Maniqueísmo: filosofia religiosa pautada em preceitos dualistas, que dividem o mundo em bom e mau.

A Guerra Fria e a Nova Ordem Mun: 143


apenas por questionar as arbitrariedades do regi- brasileiros, uruguaios, bolivianos, argentinos e
me. Em Cuba, qualquer crítica aos burocratas já chilenos, que impuseram regimes tirânicos justi-
era tomada como um ato de traição ao regime. ficados pela política de "defesa do mundo livre".
Em resumo, o direito à liberdade foi oprimido tan- No Chile, o governo democraticamente elei-
to pelos "democratas" norte-americanos e seus to da Unidade Popular, liderada pelo presidente
parceiros como pelos "socialistas" da nada demo- Salvador Allende, adotou uma política que, no
crática União Soviética e de suas nações aliadas. âmbito externo, era independente dos interesses
Nesse contexto, marcado pela radicalização norte-americanos e, no interno, desfavorável a
da Guerra Fria, os norte-americanos utilizaram eles. Com isso, o presidente republicano Richard
a OEA para intervir na República Dominicana Nixon, por intermédio de seu secretário de Estado
(1965) com o objetivo de impedir que um governo Henry Kissinger, procurou desestabilizar o regime
progressista permanecesse no poder e executasse chileno, que enfrentava as mais diversas dificul-
reformas estruturais desaprovadas pelos grupos dades - da oposição dos capitalistas ao radicalis-
dominantes nacionais e estrangeiros. As auto- mo dos socialistas.
ridades estadunidenses apoiaram os militares O resultado foi um golpe militar, apoiado pe-
los EUA, desfechado no dia 11 de
setembro de 1973, que culminou
no bombardeio do Palacio de La
Moneda e no suicidio do presi-
dente Salvador AI lende. Milhares
de pessoas foram presas, tortura-
das e mortas.
O governo dos Estados
Unidos deu apoio integral ao
general Augusto Pinochet Ques
tionado sobre as violações aos
direitos humanos, Kissinger afir-
mou que era difícil conciliá-los
com os interesses geopolíticos
norte-americanos.
Presidente chileno Augusto
Pinochet (à esquerda)
.' cumprimenta o secretário de
Estado amehcano Harry Kissinger.
Chile. 8 jun. 1976.

' Organizando ideias -


Com base nas informações apresentadas, Após a Revolução Cubana, quais foram as
responda às questões. ações do governo norte-americano para conter
Por que o Muro de Berlim é considerado um a ameaça de cubanização da América Latina?
dos símbolos mais marcantes da Guerra Fria?
S. Como pode ser explicada a ação do governo
estadunidense no Chile?
O que foi a Primavera de Praga?
6. Considerando o panorama exposto nos textos
O que foi o macarthismo no cenário norte-
e analisado nas questões anteriores, como
-americano da Guerra Fria?
você relacionaria a Guerra Fria à violação do
direito à liberdade?

— 144 Hl,o 5
Movimentos sociais e contracuLtura
Entre as décadas de 1950 e 1960 houve gran- Após intensos conflitos, entre os anos de 1964
de expansão econômica, impulsionada pela evo- e 1967 diversas leis foram aprovadas com o intuito
lução tecnológica e pela sociedade de consumo, de dar um fim àquela situação. Foram gradativa-
principalmente nos países capitalistas. No entan- mente implantadas ações afirmativas, ou seja, po-
to, a distribuição de renda continuava desigual. líticas públicas destinadas a reduzir a desigualdade
Nos Estados Unidos, a maior potência ca- por meio da inclusão social dos afro-americanos.
pitalista, estima-se que em 1960 um quinto da
população estava abaixo da linha oficial da po-
breza. Afro-americanos, indígenas e imigrantes
O feminismo
latino-americanos formavam a maior parte desse O movimento feminista ganhou grande impul-
contingente, o que agravava a cultura de segrega- so nos EUA em meados do século XX. Em um perío-
ção racial do país. do de efervescência política, revolução dos costumes
e agitação cultural, as mulheres foram à luta em bus-
ca da emancipação, reivindicando maior espaço no
As Lutas contra o racismo mundo do trabalho e na sociedade em geral.
Um dos marcos desse período foram as lu- Os discursos contra a opressão e os diversos
tas em prol dos direitos civis da população afro- modos de exploração tomaram forma por meio
-americana. Nesse contexto destaca-se o pastor das lutas de muitas mulheres, que buscavam uma
Martin Luther Kingjr., que, inspirado nas ideias transformação na sociedade em sentido amplo:
de resistência pacífica de Mahatma Gandhi, or- social, econômico, político e ideológico.
ganizou manifestações não violentas e ações de Na busca pela liberdade e direito à cidada-
desobediência civil em prol da igualdade de direi- nia plena, o direito de votar e se candidatar foi
tos entre brancos e negros nos Estados Unidos. uma das primeiras demandas femininas. Por isso,
Na década de 1960 esse movimento cresceu durante muito tempo, o movimento feminista foi
com a adesão de jovens estudantes. Durante o pe- confundido com o movimento sufragista.
ríodo das manifestações houve intensa repressão, Outra bandeira de luta esteve centrada na
principalmente nos estados do sul, que não aceita- reivindicação dos direitos sociais, que englobam
vam o fim da segregação racial. Um dos episódios os direitos econômicos e culturais, o direito de re-
mais marcantes aconteceu em 1963: cerca de 200 ceber salários iguais aos dos homens e o acesso
mil pessoas realizaram a "Marcha sobre Washing- à educação escolar, que por séculos foi negada à
ton", durante a qual Luther King fez um discurso maioria das mulheres.
que se tornou símbolo dessa luta. A reação contrá- O movimento feminista ganhou as ruas e se
ria era comu mente marcada por intensa violência, espalhou para outros lugares, promovendo grande
com espancamentos, prisões e mortes. número de mobilizações pelo mundo. A partir de
1975 começaram a acontecer Conferências Mun-
diais, em que mulheres de várias partes do planeta
9
8 discutiam as políticas públicas específicas para as
mulheres no que se refere a direitos reprodutivos,
saúde de um modo geral, educação e representação
política. Essa internacionalização do movimento
, possibilitou a inserção de novas frentes de lutas.

Iartin Luther King em discurso na cidade de Selma, EUA, 1965. Luther King
foi um dos niais influentes defensores da igualdade de direitos entre brancos e
negros nos Estados Unidos. Vencedor do Prémio Nobel da Paz em 1964, foi um
dos muitos ativistas que se posicionaram contra a Guerra do Vietnã.

A Guerr3 Fnie e e Nove Orcic'm Mun. 145


Os jovens e a contracuLtura
O final da década de 1960 foi marcado pela Em 1968 um grande movimento começou
mobilização de milhares de jovens ao redor do mun- com as reivindicações de jovens estudantes fran-
do. Muitos deles pediam, por meio de inúmeras ceses pelo fim da intervenção das tropas do país
manifestações, mudanças sociais concretas, entre na Argélia, que, somadas às queixas de operários
as quais, a voz ativa da população, direitos iguais quanto aos baixos salários, deram início a uma
entre sexos e etnias e a igualdade econômica. greve geral, instaurada em 18 de maio de 1968.
Ao conjunto de manifestações espontâneas e/ Os manifestantes formaram barricadas nas
ou organizadas que aconteceram nas décadas de ruas de Paris e enfrentaram a repressão policial -
1960 e 1970 foi dado o nome de contracultura. comandada pelo então governante francês Charles
Os planos de reconstrução e todo o capital de Gaulle. Essa revolta representou não apenas um
investido na Europa nos anos posteriores à Se- enfrentamento ao governo, mas uma revolução
gunda Guerra geraram um contexto de acesso a cultural, tendo em vista o fortalecimento de movi-
bens antes negados a boa parte da população. mentos que clamavam por liberação sexual e igual-
Houve, então, uma grande explosão demográfi- dade de gêneros, temas até então nunca discutidos
ca, o crescimento do número de jovens com aces- abertamente pela sociedade parisiense.
so às universidades, a popularização da televisão A revolução foi aos poucos se espalhando para
e a democratização de outros meios de comuni- outros países da Europa, que, a exemplo da França,
cação, que possibilitaram a formação de opinião viram na mobilização reivindicatória a possibilidade
de uma população antes forçadamente alienada. de transformar a sociedade controladora e limita-
dora instaurada à época das guerras.
Na Alemanha, o movimento explodiu após
a morte de um estudante durante uma manifes-
tação contra ações do governo, fortalecendo-se
0ELA
com a adesão de muitos intelectuais, escritores e
editores de jornais, que passaram a fazer propa-
gandas dos novos ideais de igualdade.
Na Itália, a iniciativa estudantil era chamada
de maggio rampante - maio desenfreado -, tendo
conseguido grande integração com o movimento
operário. Lá, a ação teve início em 1966 e só ter-
minou em 1969. Diferentemente do que ocorreu
na França, os governantes mostraram-se abertos
ao diálogo com os manifestantes, criando espaço
para a discussão de novos parâmetros de leis e
convivência em sociedade, o que, apesar da força
do catolicismo no país, possibilitou a regulamen-
tação do divórcio e do aborto, por exemplo.
As iniciativas também ecoaram nos Estados
Unidos. Com mais acesso à informação, propor-
cionado pela difusão dos meios de comunicação
eletrônicos - como o rádio e a televisão -, a popu-
lação começou a se mobilizar contra a presença
Manifestação dos trabalhadores em greve rias ruas de Paris. maio de 1968.
Nos cartazes estão. entre outros. os dizeres: Defesa da Segurança Social e americana na Guerra do Vietnã. Iniciou-se então
Redução do tempo de trabalho sem perda de remuneração" uma série de manifestações referentes a outros

146
.:omício pela paz e
eIo fim da Guerra
do Vietnã no Central
Park, Nova York. 27
abr. 1968.

temas na luta por mudanças, desencadeando o ganharam força com a difusão de movimentos po-
movimento conhecido como contracultura, que líticos e culturais, como o Tropicalismo.
visava a maior liberdade social, sexual e ao fim do Independentemente de locais, tipos, reivindi-
preconceito contra negros e homossexuais, entre cações e resultados dos movimentos deflagrados
outras mudanças. em 1968, sua visibilidade serviu como alerta para
Essas reações e os novos conceitos a respei- a necessidade de revisão de padrões políticos, eco-
to da vida em sociedade que ecoaram pela Europa nômicos e comportamentais em muitos lugares,
e Estados Unidos repercutiram em muitos outros o que estimulou uma reorganização das relações
países, inclusive os da América, que aderiram às sociais pelo mundo. Tal fato abriu espaço para a
reivindicações pela revisão dos direitos dos cida- discussão - que permanece atual - acerca da cons-
dãos. No Brasil, a contracultura e as manifestações trução de uma sociedade mais tolerante.

Organizando ideias -

Leia o texto e faça o que se pede. relações de poder e hierarquia nos âmbitos público e
O feminismo que eclode nas décadas de 1960 e privado que estavam sendo desafiadas.
1970 nos Estados Unidos e na Europa está estreita- PINTO, CéU Regina Jardim. Uma história do
mente relacionado com toda efervescência política feminismo no Brasil São Paulo: Editora Fundação
e cultural que essas regiões do mundo experimenta- Perseu Abramo, 2003. p. 41-42.

ram na época, quando se formou um caldo de cultura Relacione os movimentos sociais ocorridos
propício para o surgimento de movimentos sociais.
nas décadas de 1960 e 1970 com as questões
[.1 O movimento jovem da década de 1960 não
políticas e econômicas do período.
foi apenas altamente inovador em termos políticos;
foi, talvez, antes de tudo um movimento revolucio- De acordo com a autora, como pode ser
nário na medida em que colocou em xeque os va- entendido o movimento jovem da década de
lores conservadores da organização social: eram as
1960? Explique.

147
O BrasiL e a Guerra Fria
Em 1947, o Brasil atrelou-se à política populista e anti-imperialista, não agradou
externa dos Estados Unidos, e como reflexo aos empresários nem às autoridades dos
dessa subordinação o governo do presidente Estados Unidos, gerando pressões, prin-
Eurico Gaspar Dutra (1946-1950) rompeu cipalmente de natureza econômica, sobre
relações diplomáticas com a União Soviética, ele. Nesse período, grupos oposicionistas
decretando a ilegalidade do Partido Comu- receberam dinheiro para ridicularizar o
nista do Brasil (PCdoB). Os parlamentares governo na mídia. Nas eleições, candidatos
eleitos pela legenda comunista tiveram seus conservadores eram contemplados com
mandatos cassados. Um ministro de Dutra recursos diversos para, quando eleitos,
chegou a dizer que tudo que "era bom para defenderem posições em consonância com
os Estados Unidos era bom para o Brasil". Washington.
Na ONU, os votos brasileiros fortaleciam os Com o triunfo da Revolução Cubana,
interesses dos que coordenavam a política grau de interferência aumentou. O Brasil,
exterior estadunidense. assim como os demais países da América
O Tratado Interamericano de Assistên- Latina, participou da chamada "Aliança
cia Recíproca (Tiar), assinado em 1947 pelos para o Progresso" (programa de cooperação
norte-americanos e pelos países da América política e econômica), concebida pelo presi-
Latina, no Rio dejaneiro, era um instrumento dente Kennedyvisando impediro avanço do
militar de ajuda coletiva em caso de agressão comunismo no continente.
externa a qualquer signatário. Esse acordo A Aliança fracassou, pois os problemas
também era uma maneira de atrelar os econômicos e sociais nas Américas só se agra-
países latino-americanos à política externa de varam. Mais tarde, em 1969, ela foi extinta
Washington. A formação de militares durante pelo presidente Nixon.
a Guerra Fria tornou conservadoras as Forças Em 1955, representantes de diversos
Armadas da maioria dos países do continen- países asiáticos e africanos reuniram-se em
te, muitas vezes confundindo movimentos Bandung, na Indonésia, em um evento que
reformistas com movimentos comunistas. ficou conhecido como Conferência de Ban-
Nesse sentido, grande parte dos golpes dung. Na ocasião, os participantes posicio-
militares foi desfechada com o discurso de naram-se publicamente contra o racismo e a
"salvar o mundo livre da ameaça comunista". dominação colonial. Além disso, defenderam
O segundo mandato de Getúlio Vargas princípio da autodeterminação dos povos,
(1951-1954), por seu caráter nacionalista, dando início ao Movimento dos Países Não
Alinhados, ou seja, que não estavam atrela-
dos nem a Moscou, nem a Washington. Essa
visão teve impactos na América Latina.
Em 1961,0 presidente eleitojânio Qua-
dros procurou adotar uma política externa
independente, mantendo plenas relações
diplomáticas e comerciais com os países do
bloco socialista, inclusive se aproximando
Encontro entre do então fechado regime chinês liderado por
os presidentes Mao Tsé-Tung.
Truman (à
esquerda) e Suas relações cordiais com Fidel Castro
Dutra em visita e a condecoração do guerrilheiro argentino
do mandatário
norte-americano Ernesto Che Guevara, líder da Revolução
ao Brasil. Rio Cubana, foram marcos da crise que culmi-
de Janeiro (RJ),
1947. nou em sua renúncia.

148 ijlü'3
O governo do presidente João Goulart
(1961-1 963) caracterizou-se pelo clima de en- ocidental se tornasse urna segunda Cuba.
Começou a fluir dinheiro da CIA
frentamento entre as forças conservadoras e as
para a vida política do Brasil. Um dos
progressistas. As Reformas de Base, sobretudo canais era o Instituto Americano para
a agrária, preocupavam setores da sociedade Desenvolvimento de I'rabalho Livre
brasileira contrários a tais mudanças. A classe Brasileiro, da AFI.-CIO. [ ... j
média, os empresários, os grandes veículos de Outro era o Instituto para Estudos de
comunicação, amplos segmentos da Igreja Pesquisas Sociais, uma recém-formada or-
Católica e das Forças Armadas, bem como as ganização de líderes empresariais e cívicos
do Brasil. Os receptores eram políticos e
em presas estrangeiras e o governo dos Estados oficiais militares que se opunham ao pre-
Unidos, opunham-se a tais reformas e procu- sidente Goulart e que mantinham íntimo
ravam combatê-las de várias maneiras. contato com o novo adido militar ameri-
A fim de conter "a onda esquerdizante", cano no Brasil - Vernon Walters, futuro
a direita organizou-se para disputaras eleições vice-diretor da central de inteligência. O
de 1962. O Instituto Brasileiro de Ação Demo- retorno desses investimentos seria pago
em menos de dois anos.
crática (Ibad) e a Ação Democrática Popular As fitas da Casa Branca, transcritas
(Adep), com o apoio dos empresários, da CIA em 2001, registram conversas diárias so-
e das multinacionais, financiaram a campanha bre os planos de ação secreta que ganha-
de vários deputados e governadores. ram forma no Salão Oval.
O golpe que derrubou o presidenteJoão WEINER um. Legado de cinzas: urna história da
Goulart em 1964 teve suas causas internas; CIA Rio de Janeiro: Record, 2008. p. 219.

porém a conspiração vinha sendo apoiada


de diversas formas pelas autoridades de
O golpe ocorreu em 31 de março de
Washington desde 1962, conforme revela o
1964. Não houve uma reação armada. Se
pesquisador norte-americano Tim Weiner.
houvesse, os golpistas teriam o apoio de
uma força-tarefa norte-americana, que esta-
Na segunda-feira, 30 de julho de va próxima do litoral brasileiro. Era a Opera-
1962, John F. Kennedy entrou no Salão ção Brother Sam.
Oval e ligou o moderno sistema de grava-
ção novo em folha que mandara instalar
no fim de semana. A primeira conversa DIABJO DE PERNAMB13C0
que gravou foi sobre uma conspiração FORÇAS MILITARES DE MINAS REBELA M.SE
para subverter o governo do Brasil e tirar CONTRA JOÁO COULART E OS COMUNISTAS

do poder o presidente João Goulart.


Kennedy e seu embaixador no Brasil,
Lincoin Gordon, discutiram o gasto de US$
8 milhões para interferir nas eleições se-
guintes e preparar o terreno para um golpe
militar contra Goulart - "para expulsá-lo, se
necessário", disse o embaixador Gordon ao CARVALHO PINTO MANDOU Krooi Tio EoórcIto
Co,,tro Os Comuolstos
ONTEM (MISSORIO o M. P.
presidente. O posto da CIA no Brasil dei-
xaria "claro, discretamente, que não somos
necessariamente hostis a qualquer tipo de
ação militar, em absoluto, se ficar claro que
motivo da ação militar é [ ... ]"
"[ ...1 Contra a esquerda", completou o Joi, SorN
Ordeo, A Todo Custo
A -

Primeira página do
presidente. Ele não deixaria que o Brasil
jornal Diário do
ou qualquer outra nação do hemisfério Pernambuco, 1" de
abril de 1964.

149 ffl
O governo militar não decepcionou seus fi- Washington não houve críticas às violações aos
nanciadores. A reforma agrária foi desprezada. direitos humanos e muito menos ao sepultamen-
As multinacionais tiveram autorização total para to das liberdades democráticas. Todas as armas
agir no país. No plano externo, o Brasil rom- eram consideradas válidas no constante ataque
peu as relações diplomáticas com Cuba e Chi- ao "perigo vermelho", personificado na figura
na, votando na ONU de forma subserviente aos dos opositores "comunistas".
norte-americanos. Por parte das autoridades de

Organizando ideias

Leia a reportagem e responda às questões a aproximadamente 290 no Uruguai, 360 no Brasil,


Operação Condor: Ditaduras se uniram 2 mil no Paraguai, 3 100 no Chile e impressionantes
para perseguir adversários 30 mil na Argentina - a ditadura latino-americana
que mais vítimas deixou em seu caminho. Estimati-
A Operação Condor foi uma aliança estabe- vas menos conservadoras dão conta de que a Opera-
lecida formalmente, em 1975, entre as ditaduras ção Condor teria chegado ao saldo de 50 mil mortos,
militares da América Latina, O acordo consistiu 30 mil desaparecidos e 400 mil presos.
no apoio político-militar entre os governos da
região, visando perseguir os que se opunham aos A participação do Brasil
regimes autoritários. Na prática, a aliança apagou O Brasil participou ativamente das duas primeiras
as fronteiras nacionais entre seus signatários para fases da Operação Condor. Não há, contudo, evidên-
a repressão aos adversários políticos. cias que comprovem seu envolvimento com o exter-
O nome do acordo era uma alusão ao condor, mínio de adversários políticos fora da América Lati-
ave típica dos Andes e símbolo do Chile. Trata- na. O Brasil apoiou os golpes militares em pelo menos
-se de uma ave extremamente sagaz na caça às três países da região: Bolívia, em 1971; Uruguai, em
suas presas. Nada mais simbólico do que batizar 1973; e Chile, no mesmo ano. Já existiam, portanto,
a aliança entre as ditaduras de Operação Condor. estreitas ligações entre as ditaduras latino-americanas.
Não à toa, foi justamente o Chile, :oh o: A Operação Condor veio apenas reforçar os laços
governo de Augusto Pinochet, que assu- políticos e militares, reorientando a aliança entre os
miii a dianteira da operação. governos da região para a perseguição a seus oposito-
Além do Chile, fizeram parte da aliança: Ar- res.[ ... }
gentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai. Nos ANGELO. VitorAmorim de. Operação Condor: Ditaduras se
anos 1980, o Peru, então sob uma ditadura militar, uniram para perseguir adversários. 001 Educação, 2 set.
2008. Disponível em: <htlp://educacao.uol.com.br/disciptinas/
também juntou-se ao grupo. Pode-se dizer que a
historia- brasit/operacao-condor-d itaduras- se- uniram -para -
operação teve três fases. A primeira consistiu na perseguir-adversarios.htm>. Acesso em: abr. 2016.
troca de informações entre os países-membros. A
O que foi a Operação Condor?
segunda caracterizou-se pelas trocas e execuções
de opositorcs nos territórios dos países que for- Forme uma dupla com um colega e, jun-
mavam a aliança. A terceira ficou marcada pela
tos, pesquisem os desdobramentos dessa
perseguição e assassinato de inimigos políticos no
operação nos anos posteriores: julgamento
exterior - muitas vezes no próprio exílio.
de acusados, busca de desaparecidos etc.
Calcula-se que, apenas nos anos 1970, o número Depois, registrem os resultados da pesquisa
de mortos e «'desaparecidos" políticos tenha chegado e os apresentem em sala de aula.

Sob os auspícios de: com o patrocínio de; com o apoio de.

150 tJ(O
A Guerra Fria e os esportes
O uso dos esportes com objetivos políticos
não era novidade, pois Hitler fizera isso nosJogos Enquanto isso, jornais se concentravam nas "ba-
Olímpicos de 1936 (os alemães obtiveram 32 me- talhas de gigantes" e publicavam estatísticas diá-
rias do número dos pontos não oficiais ganhos
dalhas de ouro, enquanto os norte-americanos
pelos Estados Unidos e pela União Soviética.
ficaram com 24 delas). Mussolini havia feito
As comparações do número de medalhas
a mesma coisa nos campeonatos mundiais de olímpicas ganhas pelos Estados Unidos e pela
com a Itália sagrando-se bicampeã
1934 e 1938, União Soviética - ou, seguindo a admissão de
de futebol. Durante a Guerra Fria, soviéticos e equipes separadas da Alemanha Ocidental e Ale-
norte-americanos usaram as competições espor- manha do Leste nos Jogos Olímpicos de 1968,
tivas, sobretudo os Jogos Olímpicos, para "pro- as medalhas ganhas pelas duas Alemanhas -,
var" que seus sistemas econômicos e sociais eram vieram a ser muito importantes, porque ganhar
medalhas tornou-se um símbolo não somente
superiores. Por meio de grandes investimentos
do orgulho nacional mas também da superio-
nas mais variadas categorias, muitas delas sem
ridade de um sistema político sobre o outro.
tradição em seus respectivos países, tentavam Como muitos governos passaram a encarar o
suplantar o oponente, pouco importando o tão sucesso como uma arma da propaganda na bri-
decantado espírito olímpico. ga entre Leste-Oeste, assim aqueles atletas que
As drogas legítimas e ilegítimas foram am- emergiram como vencedores foram tratados
plamente empregadas, sendo hoje impossível como heróis nacionais, com todas as recompen-
precisarmos em que escala. Na verdade, o que sas - fornecidas às vezes por governos nacionais.
importava era ganhar, mesmo que a saúde dos WADDINGTON, Ivan. A história recente do uso de drogas
atletas fosse colocada em risco e a competição nos esportes: a caminho de uma compreensão sociológica.
O: GEBARA, Ademir; PILATTI. Luiz Alberto (Org.l. Ensaios
se tornasse desleal. sobre história e sociologia nos esportes. Trad. Viviane Car-
valho Bejarano. Jundiaí: Fontoura. 2006. p. 29.

Os Jogos Olímpicos de Helsinque de 1952


foram os primeiros jogos olímpicos em que os
atletas ocidentais competiram com os atletas
da União Soviética. Assim, os jogos olímpicos,
como nota Guttman, tomaram uma dimensão
política nova, que seria cada vez mais importan-
te nas décadas futuras. Os atletas estavam cla-
ramente cientes desta dimensão nova. (juttman
sugere que o vencedor americano do Decatlo
naqueles jogos olímpicos, Bob Mathias, falou
por muitos quando escreveu: "Havia muito mais
pressão nos atletas americanos por causa da par-
ticipação dos russos [.] Eram de certo modo
um inimigo real. Você simplesmente amava
vencê-los [...] Este sentimento era forte no time
inteiro". Os atletas soviéticos, por sua vez, foram
abrigados não na vila olímpica, onde poderia: \tleta
ter interagido com os atletas do resto do munr ostadunidense.
Gari Lewis.
mas em seus próprios quartos isolados pert comemora
base naval soviética em Porkkala, enquanto após receber
ciais soviéticos pareciam importar-se some medalha de
}l.Iro nos Jogos
com medalhas de ouro necessárias para cerli Limpicos de
car a superioridade do novo homem sociali OS Angeles
LUA). 1984.

151
76_80 83\
/

—22
/
/

0'

EUA URSS

Com a vitória do republicano Ronald


Reagan à Presidência dos Estados Unidos,
em 1980, a Guerra Fria retornou com toda
força. Usando como pretexto a invasão so-
viética ao Afeganistão, os norte-americanos
boicotaram osJogos Olímpicos de Moscou
em 1980. A URSS revidou em 1984, não
participando dos Jogos de Los Angeles.
A crescente comercialização dos espor-
tes levou diversos atletas do chamado blo-
co socialista a abandonar suas delegações
quando em viagens aos países ocidentais.
Quando isso ocorria, havia intensa propa-
ganda, na qual se exaltavam a liberdade e
as oportunidades oferecidas pelo sistema
capitalista. Atletas soviéticos, húngaros,
romenos, tchecoslovacos e principalmente
cubanos foram seduzidos pelo Ocidente e
cooptados para atuar nele. Uns tiveram su-
Marina Kosireveya. campeã olímpica de natação, acende a tocha
cesso, outros caíram no ostracismo. oImpica. xxii Jogos Olímpicos. Moscou, 18 jul. 1980.

Organizando ideias
Com base nas informações anteriores e em Havia grande influência da política sobre os
seus conhecimentos, faça o que se pede. esportes. Isso ainda ocorre? Explique sua

1. Sempre ouvimos que o importante é com- resposta com base em exemplos.

petir. Contudo, analisando o contexto dos


Em sua opinião, os Jogos Olímpicos podem
esportes durante a Guerra Fria, essa frase
servir como prova de superioridade de um ou
pode ser modificada para . Q importante é
de outro regime político? Explique.
vencer". Explique essa afirmação conside-
rando o contexto da época.

152
o fim da Guerra Fria
Na década de 1980, o presidente Ronald Reagan, que pautava suas atitudes no chamado
Reagan reaqueceu a Guerra Fria: acelerou a corrida "combate ao comunismo".
armamentista, chamou a União Soviética de "Impé- O conservadorismo estava em alta. A eleição
rio do Mal" e anunciou a instalação de um sistema do polonês Karol Wojtyla como papa, sob o nome
antim(sseis, chamado de "guerra nas estrelas". de João Paulo II, trouxe problemas para o regime
Reagan também apoiou com armas grupos polonês, haja vista a luta ocorrida nos anos 1950
contrarrevolucionários que combatiam o go- entre católicos - liderados por Karol - e socialistas,
verno progressista instalado na Nicarágua em que, quando construíram a cidade de Nowa Huta
1979 (a Frente Sandinista de Libertação Nacio- ("nova fábrica de ferro"), deixaram de lado qual-
nal derrubara a ditadura de Anastásio Somoza, quer espaço para os cultos religiosos, enfrentando
aliado de Washington). Além disso, armou os grande resistência da população católica. Tal fato
militares salvadorenhos, que impediram a Fren- enfraqueceu a imagem do governo socialista.
te Farabundo Martí de Libertação Nacional de Ronald Reagan nos Estados Unidos, Margaret
chegar ao poder, e invadiu a ilha de Granada Thatcher no Reino Unido e João Paulo li no Va-
para evitar que uma "nova Cuba" aparecesse no ticano desempenharam papéis significativos na
cenário caribenho. aceleração do processo de decomposição do já
O apoio aos mujahediri que enfrentavam os enfraquecido "socialismo real" (expressão criada
soviéticos no Afeganistão e aos diversos governos em oposição ao socialismo tal como esboçado
- ditatoriais ou não - contrários aos movimentos por seus teóricos, que previam o fim das grandes
revolucionários também esteve no programa de desigualdades entre os seres humanos).

Roiiad

153
Do lado soviético, a situação geral não era queda do muro representou a possibilidade de
boa. Em 1964, Nikita Kruschev fora afastado em circulação livre da população alemã por seu
virtude do fracasso de sua política agrícola. Emer- país, numa tentativa de assimilação de outra
giu então a figura do estadista Leonid Brejnev. forma de vida. Ao mesmo tempo, representou o
A Era Brejnev caracterizou-se pela crescente bu- desmoronar do maior símbolo de resistência ao
rocratização, pela gradativa estagnação econô- capitalismo e, para muitos, o fim do chamado
mica e por uma corrupção acentuada. Enquanto "socialismo real".
os trabalhadores enfrentavam filas para comprar
gêneros de primeira necessidade e raramente ti-
nham acesso a bens de consumo duráveis, a elite O desmantelamento do Muro de Berlim por
partidária consumia produtos importados, vivia seu povo precipitou a reunificação da Alema-
nha. As consequências foram controladas por
em casas de campo confortáveis, gozava as férias
Kohl (Primeiro-Ministro da Alemanha Ociden-
ciden-
em balneários caros e aproveitava o luxo de ho-
tal) e Gorbatchev. O primeiro aproveitou sua
téis em viagens oficiais. A credibilidade do regime
oportunidade. Depois de alguma hesitação ini-
se esva(a gradativamerite.
cial e incentivado por Washington, ele aprovou
A falta de competitividade econômica, os a queda do muro, anexou a Alemanha Oriental
gastos da corrida armamentista, o financiamento à Ocidental e avançou, para colocar nos bol-
de aliados falidos e os rancores de grupos nacio- sos de alemães orientais, marcos reais no lugar
nalistas foram minando o regime. A invasão do dos marcos sem valor, à taxa de um por um. A
Afeganistão e os gastos crescentes provocados Alemanha Oriental foi transformada em cinco
pelo acirramento da Guerra Fria levaram a União Linder [países] da República Federal e as outras
Soviética a uma grave crise. A ascensão de Mi- quatro potências de ocupação renunciaram a
seus poderes em Berlim. [ ... J
khail Gorbatchev em 1985 trouxe esperanças de
Mais coisas tinham vindo abaixo além do
recuperação pela peresrroika (reestruturação) da
muro, também desabara a economia da Alema-
vida econômica e social. Os principais objetivos
nha Oriental. Os salários no leste cresceram a
eram produzir mais, melhorar a qualidade das níveis ocidentais, completando a destruição das
manufaturas, desburocratizar o processo produ- indústrias dessa região, enquanto os custos da
tivo, descentralizar as decisões, dar flexibilidade República Federal foram inesperadamente al-
às empresas estatais, democratizar as decisões tos (aproximavam-se de 200 bilhões de dólares
e desacelerar a corrida armamentista. "Precisa- por ano) e os alemães orientais que recebiam
mos de mais manteiga e menos canhões", afir- deutschmarks [ marcos alemães] também perde-
mava Gorbatchev. Ele também implementou a ram seus empregos. A unificação era uma desig-
glasnosc (transparência), que consistia em uma nação equivocada. A Alemanha Oriental era não
só muito mais fraca como muito menor do que
abertura política.
sua equivalente ocidental. Dezessete milhões
As reformas econômicas não deram os re-
de pessoas foram mescladas com 63 milhões, e,
sultados esperados. O agravamento da crise eco-
mesmo depois de 10 anos e enormes subsídios,
nômica e social, associado à abertura política a produção em uma Alemanha unificada era
em um país que estivera fechado durante mais de apenas 10% acima da que existia na Alemanha
70 anos, teve consequências catastróficas para o Ocidental, e a contribuição da unidade para as
regime, que entrou em colapso. exportações era de meros 2%.
No Leste Europeu, os Estados socialistas en-
CALV000RESSI, Peter. PoLítica mundiaL a partir de 1945.
frentavam uma crise de identidade e, sobretudo, Porto Alegre: Penso, 2011 p. 257-2513.
de credibilidade. Um a um desses regimes manti-
dos pela força caíram de forma pacífica, com exce-
ção da Romênia, onde o presidente Nicolau Ceau- Após a queda do muro, na década de 1990,
cescu resistiu e acabou sendo executado. a Rússia vivenciou caos econômico e social. A Era
O ápice desse declínio ocorreu com a Gorbatchev era bem vista no Ocidente, mas pouco
queda do Muro de Berlim em 1989, entendi- popular nas repúblicas que formavam a ex-União
da como marco do término da Guerra Fria. A Soviética, o que levou a seu fim.

- 154
Primeira parte cio Muro de Berlim sendo demolida por urna multidao era 10 de novembro de 1 dod

Como alternativa ao regime socialista, o capi- Cuba, onde os governos procuraram manter regi-
talismo foi restaurado. Uns poucos, em sua maio- mes inspirados nas ideias socialistas.
ria ligados ao antigo regime, tornaram-se do dia
para a noite empresários ricos. A maior parte da 1 i. El iT 1rk1 iTi ri-r P-'L

população Ficou em péssima situação econômica.


Das antigas repúblicas que formavam a Analisando o conteúdo exposto neste ca-
União Soviética, a Rússia era a mais representa- pítulo, responda às questões.
tiva. Bóris léltsin, seu presidente, teve um papel O que foi a Guerra Fria e quais foram suas
fundamental na queda de Gorbatchev e no Fim consequências para o mundo?
do regime socialista. Apesar do inicial apoio
popular, seu governo enfraqueceu-se devido a Quais são as semelhanças e as diferenças
vários fatores, entre eles a instabilidade política nas ações dos Estados Unidos e da União
que se instalou na Rússia, a crise econômica e os Soviética durante esse período?
graves conflitos por independência na Chechênia.
Atualmente, ainda prevalecem ações de
Assim, léltsin foi substituído por Vladimir Putin
domínio de um país sobre outro? Explique
no comando do país em 2000.
e exemplifique.
A partir da década de 1990 os ideais capitalis-
tas passaram a ser incorporados pela maioria dos Hoje, qual é a situação dos Estados Unidos
países até então dominados por governos socialis- e das ex-repúblicas soviéticas no panora-
tas, numa ampla mudança política e econômica ma político e econômico mundial?
vista como acesso à "liberdade" por grande parte
da população. S. A Guerra Fria foi uma disputa pelo poder.
A despeito da forte adesão dos antigos países Como essa situação se processa nas re-
socialistas ao regime capitalista, permaneceram lações internacionais atuais?
alguns representantes daqueles, como China e

155
Debate interdisciplinar
Além disso, é preciso manter a estabilidade
A Guerra Fria e a do foguete para que ele não saia de sua trajetó-
corrida espaciaL ria. Dois aspectos são fundamentais para isso: o
centro de massa (CM) e o centro de pressão (CP).
O clima de rivalidade da Guerra Fria gerou,
O CP deve estar abaixo do CM, o qual, por sua
além da batalha pela influência ideológica no
vez, deve estar localizado mais perto da ponta do
mundo, uma disputa acirrada no meio tecnoló-
foguete. Assim, mesmo que sofra alguma turbu-
gico-científico conhecida popularmente como
lência, o foguete manterá sua trajetória estável.
corrida espacial. Pesquisas científicas voltaram-se
O CP é o ponto onde a resultante das forças
para a construção de mísseis de longo alcance,
aerodinâmicas atua (vamos considerar apenas a for-
levando ao desenvolvimento da tecnologia que
ça de atração gravitacional, pois o nariz do foguete
criou os foguetes e deu início a essa corrida.
diminui a resistência do ar). Esse local depende do
comprimento da ponta do foguete, do comprimento
do foguete e do formato e dimensões das aletas.

nariz

torça de impulsâo

Forças 1 isicas
IM
presentes no
lançamento de
um foguete.

torça de arrasto

Lançamento do loquete americano ApoDo 11. Flóiida (EUA Julho de 1969.

aleta

Lançando foguetes
Aproveitando a análise desse contexto histórico,
podemos nos voltar ao campo da Física envolvido no Agora que você já conhece um pouco da física
lançamento de foguetes. Considerando o momento envolvida no lançamento, pode construir e lançar o
de lançamento de um foguete, temos uma aplicação próprio foguete. Atenção: antes de realizar o lança-
direta da terceira lei de Newton, também conhecida mento, observe as normas de segurança elaboradas
como lei de ação e reação. O combustível é injetado pela Agência Espacial Brasileira, disponíveis no sire:
em uma câmara de combustão, a qual expele os ga- <http://aebescola.aeb.gov.br/index.php/cursos/1 0
ses para trás numa abertura traseira (ação). No mo- -aeb-escola/58-cod igo-foguete> (acesso em: abr.
mento em que são expelidos, os gases dão impulso 2016). É importante escolher um lugar aberto, distan-
ao foguete, impelindo-o para a frente (reação). te de pessoas, casas e fios elétricos.

— 156
Encha a garrafa que não foi cortada com
Materíat:
aproximadamente 5 dedos (ou 400 ml)
2 garrafas descartáveis de refrigerante (PET) de água.
de dois litros;
cartolina ou papel-cartão; Fure a rolha com a agulha da bomba e co-
loque-a na abertura da garrafa que ficará
fita adesiva transparente;
1 rolha de cortiça grande; para baixo.

tesoura; S. Em um lugar aberto, posicione o fogue-


1 bomba de encher bola; te com o bico direcionado para o alto e
400 ml de água. bom beie ar para dentro da garrafa.

6. A compressão do ar na garrafa fará com


Montagem e Lançamento
que a rolha saia de um lado e o foguete
do foguete seja lançado de outro. Quando a rolha
sair, vazará água da traseira do foguete.
Caso não queira se molhar, mantenha
certa distância da garrafa.

Um foguete real é impulsionado pela quei-


ma de combustível. A explosão que acontece em
seu interior ejeta gases no sentido contrário ao de
seu movimento, impulsionando-o para a frente.
Neste experimento, a água substituirá os gases, e
a impulsão do foguete será possível pela ejeção
do ar comprimido que empurrará a rolha.

ar comprimido

agulha
agua da bomba
bomba

T± base '

rolha
, da bomba
Lançamento do foguete.

Montagem do foguete.

Atenção: antes de começar, observe as reco- Qual conceito físico está diretamente liga-
mendações de segurança na página anterior. do ao lançamento do foguete?
Corte a parte de cima de uma das garrafas
Durante o lançamento, você consegue iden-
e encaixe-a na outra, colando-a com a fita
tificar alguma força atuando nele? Qual?
adesiva.
Com a cartolina ou o papel-cartão na Por que as aletas e o nariz de um foguete
forma de trapézio, faça os suportes que são importantes no lançamento?
manterão o foguete em pé.

157
Responda no caderno
Testando seus conhecimentos

1. (UFSC-SC) Ao final da Segunda Guerra, muitas verdadeira batalha contra o senador Joseph
foram as negociações entre os vencedores e, McCarthy e expor publicamente sua conduta
nesse contexto, a Europa foi dividida em duas duvidosa.
áreas: a parte oriental ficou sob a influência Historicamente, o macarthismo é definido
da então União Soviética, enquanto a parte como:
ocidental, sob a influência norte-americana.
a disputa entre democratas e republica-
Em relação à Segunda Guerra e ao período
nos pelo controle do senado norte-ameri-
que a sucedeu, é CORRETO afirmar que:
cano após a Segunda Guerra Mundial.
A 'doutrina Truman" foi colocada em uma política de aproximação entre EUA
prática visando à expansão da influência e URSS liderada pelos senadores de-
soviética. mac ratas.
Os judeus não foram os únicos alvos de a criação no senado norte-americano de
perseguição do nazismo: ciganos e so- um comitê para investigar atividades an-
cialistas, entre outros, também sofre- tiamericanas e passou a perseguir seto-
ram as atrocidades do regime. res intelectuais da sociedade acusados
de defenderem ideias comunistas.
(04) A OTAN (Organização do Tratado do
Atlântico Norte) foi formada por um blo- ações do senado norte-americano para
co de países que defendiam a ideologia impedir que revoluções comunistas ti-
comunista. Em contraposição a este blo- vessem êxito na América Latina.
co, os EUA lideraram a criação do Pacto campanha à presidência da república
de Varsóvia, cujo objetivo era ampliar os do senador Joseph McCarthy, que tinha
interesses capitalistas na Europa. como principal plataforma a defesa das
ideias comunistas nos EUA.
(08) Visando ajudar na recuperação dos paí-
ses europeus, em grande medida de- 3. (Enem) Os 45 anos que vão do lançamento das
vastados pela guerra, e para evitar a bombas atômicas até o fim da União Soviética não
expansão do comunismo, foi elaborado o foram um período homogêneo único na história
Plano Marshall, por meio do qual o go- do mundo. [ ... ] Dividem-se em duas metades, ten-
verno norte-americano destinou bilhões do como divisor de águas o início da década de 70.
de dólares para os países da Europa. Apesar disso, a história deste período foi reunida sob
um padrão único pela situação internacional pecu-
(16) China e Inglaterra foram países que saí-
liar que o dominou até a queda da União Soviética.
ram fortalecidos desse conflito, estabe-
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve sécuto xx:
lecendo, a partir de então, os dois polos 1914-1991. são Pauto: Companhia das Letras, 1996.
que redefiniriam a política mundial.
O período citado no texto e conhecido por
(32) A entrada oficial dos EUA no conflito se Guerra Fria pode ser definido como aquele
deu em 1939, ocasião em que o "eixo" momento histórico em que houve:
recebeu apoio na forma de armamentos
corrida armamentista entre as potên-
ultramodernos.
cias imperialistas europeias ocasionan-
2. (UERGS-RS) O filme "Boa Noite e Boa Sorte', do a Primeira Guerra Mundial.
de 2005, é ambientado na década de 1950, domínio dos países socialistas do Sul do
momento em que os EUA viviam os dramas globo pelos países capitalistas do Norte.
do macarthismo. O tema central do filme é a ci choque ideológico entre a Alemanha
história do repórter Edward Murrow e seus Nazista/União Soviética Stalinista, du-
colegas da rede CBS que decidem travar uma rante os anos 1930.

158 1u(o5
Responda no caderno

disputa pela supremacia da economia resultou de uma longa disputa diplo-


mundial entre o Ocidente e as potências mática, que culminou com a entrada da
orientais, como a China e o Japão. Alemanha no Pacto de Varsóvia;
constante confronto das duas super- expressou os esforços da ONU que, por
potências que emergiram da Segunda meio de acordos bilaterais, colaborou
Guerra Mundial. para reunificar a cidade, dividida pelos
4. lUnesp-SP) Sobre a queda do Muro de Ber- aliados;
lim, no dia 10 de novembro de 1989, é cor- constituiu-se num dos marcos do final
reto afirmar que: da Guerra Fria, política que dominou as
a) o fato acirrou as tensões entre Oriente relações internacionais após a Segunda
e Ocidente, manifestas na permanência Guerra Mundial;
da divisão da Alemanha; marcou a vitória dos princípios liberais
e democráticos contra o absolutismo
prussiano e conservador.

Adeus, Lenin!, direção de Wolfgang Becker.


(para você Ler j Alemanha, 2003, 117 mm. Depois que sua mãe
acorda de um longo coma, o jovem Alex tenta
protegê-la de um choque fatal escondendo dela
Da Guerra Fria à Nova Ordem Mundial, de Mônica fato de que sua querida Alemanha Oriental
Liz Miranda e Ricardo de Moura Faria. São Paulo: passou por profundas transformações e não é
Contexto, 2003. O livro apresenta uma versão crítica mais do jeito que ela conhecia.
das interpretações sobre a "paz armada' que mar-
cou a reta ção entre os EUA e a ex-URSS a partir do Boa noite e boa sorte, direção de George Clooney.
final da Segunda Guerra Mundial. Os autores não EUA, 2005, 90 mm, Edward Morrow é um apre-
pretendem identificar mocinhos e vilões e sim mos- sentador de TV que luta para ser imparcial em
seu jornal durante o período do macarttisrno.
trar que aquela foi uma guerra travada também
Quando revela as mentiras usadas pelo senador
no cotidiano dos cidadãos comuns, submetidos à
Joseph McCarthy em sua caça aos comunistas,
grande propaganda ideológica veiculada pelos dois
senador começa a intimidá-lo e dá início a um
lados em disputa.
confronto público que trará sérias consequências
História da Guerra Fria, de John Lewis Gaddis. para a recém-implantada TV nos Estados Unidos.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. Durante a Treze dias que abalaram o mundo, direção de
segunda metade do século XX pairava sobre o Roger Donald5on. EUA, 2000, 145 mm. Em 1962,
mundo a possibilidade de haver uma guerra en- fotografias tiradas por um avião americano reve-
tre os países capitalistas e os países comunistas. lam que a União Soviética está prestes a instalar
Esse livro examina esses anos de tensão e ame- uma plataforma nuclear em Cuba. O governo
aça, trazendo também uma coleção de foto gra- dos EUA, liderado por John Kennedy, precisa
fias que retratam a época. agir rápido e conter a Crise dos Mísseis de Cuba
antes que a guerra seja deflagr'ada.

(Para você assistir Para você navegar


A vida dos outros, direção de Florian Henckel The Cotd War Museum. Disponível em: <www.
von Donnersmack. Alemanha, 2007, 132 mm. Em coldwar.org>. Acesso em: abr. 2016. O museu tem
Georg Dreyman é considerado o maior dra-
1984, objetivo de preservar a história da Guerra Fria,
maturgo da Alemanha Ocidental, servindo como trabalhando junto a museus físicos e memoriais.
modelo de cidadão perfeito do regime político. O site, disponível em inglês, dá acesso a informa-
Mesmo assim, um ministro envia um espião para ções sobre o museu e suas atividades, além de
vigiá-lo 24 horas por dia, a fim de descobrir o que tornar possível conhecer detalhes sobre o período
por meio de uma linha do tempo e de bibliografias.
ele e sua companheira têm a esconder.

159
1

o
:

Al

* 4 '

A. I' IMc.$uL, ?.. - .. lIIII.;;UIlI'.ÍhJIP'JFui


"IS . MOV,MENTP NEflF'

Depois de anos de autoritarismo, o Bra- Ao assumir a Presidência da República,


sil entrou no processo de abertura política. Geisel anunciou que começaria uma lenta,
Esse processo iniciou-se no governo do ge- gradual e segura abertura política. Isso sig-
neral Ernesto Beckmann Geisel (1974-1979) nificava que durante seu mandato iniciaria
e acelerou-se durante a gestão do general retorno à democracia - mesmo que de
João Baptista de Oliveira Figueiredo (1979- forma conturbada e com inúmeros atos que
1985), o último presidente do Período Militar. contrariavam esse propósito.
Figueiredo assumiu a presidência em comunicação, o término das perseguições po-
1979 e reafirmou o compromisso de fazer líticas, as mudanças no cotidiano da população
do Brasil uma democracia. E assim aconte- ocasionadas por essa abertura - bem como
ceu. Em 1985, após um longo processo, um a participação do povo em reivindicações por
presidente civilfoi indiretamente eleito para mudanças políticas, pela liberdade de votar,
governar o Brasil. de ir e vir, de se comunicar e de se organizar
A forma pela qual ocorreu a abertura em sindicatos e partidos políticos -, são os
política, o fim da censura aos meios de assuntos abordados neste capítuLo.
Caminhos e descaminhos
da abertura política
Ao iniciar seu mandato, em 15 de março de
1974, Ernesto Geisel estava disposto a efetuar O governo começou a travar nos bastidores
as mudanças necessárias para o restabelecimen- uma luta contra a linha dura. Ao mesmo tem-
po, permitiu que as eleições legislativas de no-
to das instituições democráticas no Brasil. No
vembro de 1974 se realizassem em um clima de
entanto, esse caminho não foi assim tão rápido
relativa liberdade, com acesso dos partidos ao
nem contínuo.
rádio e à televisão. Esperava-se um triunfo fácil
da Arena, mas os resultados eleitorais surpreen-
deram o governo [ ... ].
O governo Geisel se associa ao início da
abertura política, que o general-presidente de- FAUSTO. Bons. História concisa do BrasiL. So Pauto:
finiu como lenta, gradual e segura. Na prática, Edusp, 2011. p. 270-271.

a liberali2 ação do regime, chamada a princípio


de distensão, seguiu um caminho dificil, cheio
de pequenos avanços e recuos. Isso se deveu a Com o acesso da oposição aos meios de
vários fatores. De um lado Geisel sofria pressões comunicação, a eleição ao Legislativo, em 1974,
da linha dura, que mantinha muito de sua força.
resultou na vitória do Movimento Democrático
I)e outro, ele mesmo desejava controlar a aber-
Brasileiro (MDB), partido que concentrava toda
tura, no caminho de uma indefinida democracia
a oposição ao governo militar. Esse partido
conservadora, evitando que a oposição chegasse
muito cedo ao poder. Assim, a abertura foi lenta, conseguiu 16 das 22 vagas para o Senado. E,
gradual e insegura, pois a linha dura se manteve na Câmara, apesar de ainda manter um maior
como uma contínua ameaça até o fim do gover- número de deputados, a Aliança Renovadora
no Figueiredo. Nacional (Arena), partido do governo, perdeu a
A estratégia da distensão foi formulada pelo maioria necessária para a aprovação de emendas
presidente e pelo general Golbery, chefe do Ga-
constitucionais. Diante dessa derrota, houve o
binete Civil da Presidência. Por que Geisel e
primeiro retrocesso no prometido processo de
Golbery decidiram promover a liberalização do
abertura política com a aprovação, em 1976,
da
regime? Teria sido ele fruto de pressões da opo-
sição? Sem dúvida, em 1973 a oposição come- Lei Falcão. Essa lei proibia o debate, as críticas
çara a dar claros sinais de vida independente; o ao regime e a exposição de propostas nos pro-
confronto entre a Igreja Católica e o Estado era gramas eleitorais televisivos, que podiam apenas
também muito desgastante para o governo. A mencionar a legenda, o currículo e o número do
equipe de transição de Geisel tratou de estabele- registro do candidato na Justiça Eleitoral, citar
cer pontes com a Igreja a partir de um ponto co-
datas, horários e locais de comício e mostrar
inum de entendimento - a luta contra a tortura.
fotografias dos candidatos. Mesmo com as res-
Mas a oposição e a Igreja não eram termôme-
trições, o MDB conseguiu bons resultados nas
tro mais sensível a indicar a necessidade da dis-
tensão. Esse termômetro se localizava nas rela- eleições municipais de 1976.
ções entre as Forças Armadas e o poder. O poder Diante desse quadro e temendo o resultado
fora tomado pelos órgãos de repressão, produ- das eleições de 1978 - sobretudo para governa-
zindo reflexos negativos na hierarquia das For- dor, que, segundo estipulava a Constituição em
ças Armadas. As funções e os princípios básicos vigor, deveriam ser diretas -, a presidência preci-
da instituição eram assim distorcidos, trazendo
sava tomar medidas urgentes para não perder as
riscos a sua integridade. Para restaurar a hierar-
rédeas do poder. Dentre elas, destacava-se uma
quia, tornava-se necessário neutralizar a linha
emenda constitucional que mantivesse as elei-
dura, abrandar a repressão e, ordenadamente,
promover a "volta dos militares aos quartéis". ções indiretas, o que visava garantir a vitória da
Arena. Entretanto, o governo não contava mais

162
com os dois terços necessários para a aprovação
de emendas. O presidente, então, endureceu no-
vamente o regime e suspendeu o Congresso nos
primeiros dias de abril de 1977. Nessa ocasião,
decretou algumas mudanças na Constituição,
que ficaram conhecidas pelo nome de Pacote de
Abril. Constavam desse pacote:
manutenção de eleições indiretas para gover-
nadores;
eleição indireta de um terço do Senado (os
chamados senadores biônicos) pelo mesmo
colégio eleitoral que escolhia os governado-
res, visando garantir o controle da Casa pelo
partido do governo;
ampliação do mandato do presidente de cinco
para seis anos;
manutenção da Lei Falcão;
alteração do quorum - de dois terços para Leonel do Moura d zoa chegando a Suo LorAl AS) na volta do extito puvtico, 1579,

maioria simples - para a votação de emendas


Durante todo esse processo de liberalização
constitucionais pelo Congresso.
do regime, algumas ações ainda mostravam a
atuação da chamada "linha dura", ou seja, de
O Pacote de Abril não impediu contudo que setores do governo mais radicais e contrários à
MDB participasse das eleições de 1978 e delas abertura política.
saísse vitorioso nos estados mais importantes Os assassinatos do jornalista Vladimir
da federação. Mas foi graças a ele que a Arena,
Herzog, em 1975, e do operário Manoel Fiel
embora por uma estreita diferença de votos,
Filho, em 1976, foram demonstrações de que a
conquistou a maioria no Congresso Nacional.
Além disso, dos 23 governadores então eleitos, repressão, nessa época, continuava atuante.
apenas um, Chagas Freitas, do estado do Rio de Em outubro de 1975, Vladimir Herzog foi
Janeiro, era do MDB. Sentindo-se fortalecido chamado a comparecer no Destacamento de
apesar de todas as dificuldades, o MDB passou Operações de Informações - Centro de Operações
a negociar com o governo temas considerados de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo,
tabus, como a concessão da anistia e a convocação para prestar depoimento e esclarecer sua ligação
de uma Constituinte. O regime militar estava se
com o Partido Comunista Brasileiro (PCB). No
desgastando [ ... ].
dia seguinte foi encontrado morto em uma cela.
PANDOLFI. Dulce Chaves. Voto e participação política nas Segundo a versão oficial da época, ele havia co-
diversas repúbticris do Brasit. In: DOMES. Angeta de
Castro et ai. A RepúbLica no BrasiL. Rio de Janeiro: metido suicídio.
Nova Fronteira. 2002. p. 106-107. Em janeiro de 1976 foi a vez de o operário
Manoel Fiel Filho ser torturado e morto no mesmo
local, por suspeita de subversão e participação no
Mas o retrocesso não interrompeu a disten-
Partido Comunista do Brasil (PCdoB). O DOI-Codi
são do Regime Militar e, em 1978, o Congresso
também declarou que ele cometera suicídio em
votou a Emenda Constitucional n° 11, que revo-
sua cela. Após mais esse episódio, Geisel demitiu
gou o Al-5, pôs fim à censura prévia no rádio e
comandante do li Exército.
na televisão e restabeleceu o habeas corpus para
crimes políticos. Com a suavização da Lei de Segu- A
rança Nacional, houve a permissão de regresso ao
Distensão: ação de relaxar, afrouxar, diminuir
país de 120 exilados políticos. Foram mais alguns ou eliminar as tensões entre grupos opostos.
passos no lento processo da abertura política.

163
y
IWI az"
1-
4
O retorno de alguns di-
reitos civis e politicos repre
sentou um passo importante
para a retomada da demo
cracia, mas alguns aspectos
nda permaneceram sob o
z cia. Era uma administração
4 mais liberal, porém compro-
- : metida com algumas ações
autoritárias próprias do re-
- ' gime implantado em 1964 e,
também, pressionada pelos
militares mais radicais.

Dom Paulo Evaristo Anis e o


abino Henry Sobel realizam
-- celebração ecumênica no
sepultamento do jornalista
Vladimir Herzog, Cemitério
Israelita do Butantã, São Paulo
(SP), 1975.

'Organizando ideias
Leia o texto a seguir, parte de uma entrevista presidente da República, a decisão e a responsabili-
concedida pelo ex-presidente Geisel na década dade passam a ser dele. (omo responsável, ele tem
de 1990, e depois responda às questões. o direito de fazer o que lhe parecer mais adequado.

Por que o senhor não deu a anistia no seu DARAUJO, Maria Celina; CASTRO,
Celso lOrg.). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro:
governo? rov, 1997. p. 398.
Não dei porque achava que o processo devia ser
gradual. O que significa anistia? Se necessário, pes-
Era necessário, antes de prosseguir, inclusive
quise em um dicionário e responda.
com a anistia, sentir e acompanhar a reação, o
comportamento das duas forças antagônicas: a área
Por que Geisel considerava a anistia um pro-
militar, sobretudo a mais radical, e a área política da
blema de solução progressiva? Analise a fra-
esquerda e dos remanescentes subversivos. Era um
problema de solução progressiva. O compromisso se no contexto do Regime Militar.
que o Figueiredo tinha comigo era de prosseguir
na normalização do país. Como fazer, a maneira O que significa a expressão "normalização do
de fazer e quando era problema dele. A anistia país', usada por Geisel?
passou a ser assunto do governo dele, no qual eu
não interferia. 1.. Para o general, o presidente da República
tem o direito de fazer o que lhe parecer mais
O senhor não deixou nem indicações?
adequado". Analise essa frase e responda: O
Não. Do ponto de vista ético era contraindicado.
que isso significa? Você concorda com essa
Médici também não deixou. Escolhido o
opinião? Justifique.

— 164 do
Piuripartidarismo e anistia:
passos para a democracia
Como sucessor de Geisel na Presidên- cometer crimes contra a segurança nacional
cia da República, foi empossado, em 15 de e aos agentes de segurança, ou seja, os que
março de 1979, o generalJoão Baptista de haviam prendido, torturado e matado os
Oliveira Figueiredo, que ficou conhecido oponentes do Regime Militar. Era também
como o presidente da transição. Seu gover- restrita, uma vez que muitos brasileiros não
no durou seis anos e encerrou um período podiam se valer dos benefícios dessa lei.
de autoritarismo no Brasil, pondo fim à O segundo parágrafo deixava isso claro:
Ditadura Militar. "Excetuam-se dos benefícios da anistia
Já no início de sua administração, em os que foram condenados pela prática de
28 de agosto de 1979, o Congresso apro- crimes de terrorismo, assalto, sequestro e
vou uma lei cujo artigo 12 concedia anistia atentado pessoal". E também não previa
"a todos quantos, no período entre 2 de o retorno aos quartéis dos militares que
Ato público pela
setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, haviam sido cassados ou reformados (apo- anistia de presos
cometeram crimes políticos ou conexos a sentados) antes da hora, políticos realizado
esses". Foi uma lei polêmica, pois estendia Outra medida liberalizante foi o res- Rode jaflefroR,
a anistia aos dois lados - aos acusados de tabelecimento do pluri partidarismo. 26jul. 1979.

165
nas quais ocorreria, além do pleito municipal, a
A reforma dos partidos políticos acompanha- escolha dos governadores de forma direta. Tudo
va a orientação limitativa da anistia. Conforme parecia favorecer a nova e fortalecida oposição.
a Lei n 6.767, de 1979, aboliram-se o MDB e a
Porém, o Brasil ainda era uma ditadura, e isso
Arena, gerados pelo Ato Institucional n" 2, de
11 ficou claro quando o governo instituiu o voto
1965, impondo-se o uso da palavra partido nas
denominações das novas agremiações. O registro vinculado, ou seja, o eleitor teria de escolher
do partido político implicava requisitos como seus candidatos todos de um mesmo partido. E,
convenções regionais e municipais. Registrado naturalmente, essa regra favoreceria a situação,
provisori am ente, o partido precisava obter 5% pois naquele período o PDS tinha muita força nos
dos votos nas eleições para deputados federais e municípios, o que poderia alavancar a escolha
senadores, com pelo menos 3% em cada um de de outros candidatos do partido. Outra medida
nove estados. Estavam proibidos os partidos liga-
restritiva para a oposição foi a proibição de coli-
dos à fé religiosa, ao racismo ou aos sentimentos
gações partidárias.
de classe social, assim como estavam proibidas as
alianças partidárias nas eleições para deputado Nessas eleições, tanto oposição como gover-
federal, para deputado estadual e para vereadores. no puderam se considerarvencedores. Na Câmara
os senadores biônicos, selecionados no colégio e no Senado, a oposição conseguiu a maioria dos
eleitoral, perduravam. votos; mas, graças à representação parlamentar
1)a reforma eleitoral de 1979 originaram-se o vigente, o PDS ficou em vantagem não numérica,
Partido Democrático Social (1'I)S - antiga Arena), mas representativa. Nos estados, a situação ficou
Partido do Movimento Democrático Brasileiro
com a maioria dos governos, mas a oposição saiu
(PMDB - antigo MDB), o Partido Popular (PP),
fortalecida com algumas importantes vitórias:
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o Partido
Democrático Trabalhista (PDT) e o Partido dos PMDB - São Paulo, com Franco Montoro; Mi-
Trabalhadores (PT). nas Gerais, com Tancredo Neves; Paraná, com
José Richa; Pará, com Jader Barbalho;
VIEIRA, Evaldo. Brasil: do golpe de 1964 à redernocratização.
In: MOTA, Carlos Guilherme (Org.). Viagem incompleta. PDT- Rio de janeiro, com Leonel Brizola.
A experiência brasrleira 115002000l: a grande transação. O PDS ainda manteve a hegemonia, mas essas
2. ed. São Paulo: Senac, 2000. p. 205.
eleições desestabilizaram ainda mais ojá fragiliza-
do governo do presidente Figueiredo.

A reforma partidária dividiu


a oposição em quatro partidos.
Portanto, a realidade para as elei-
ções municipais seguintes, pro-
gramadas para ocorrer em 1980,
era desfavorável ao governo,
que, sob essa perspectiva, adiou-
-as para 1982, alegando que os
partidos não teriam tempo de se
estruturar. Essa manobra favore-
ceu o PDS, que detinha a maioria
das prefeituras, proporcionando
dois anos adicionais de mandato
para prefeitos e vereadores. Com
isso, o governo ganhou tempo
para se articular e tentar manter
a situação.
O desafio dos novos parti-
dos seriam as eleições de 1982, Policiais vigiam as urnas eleitorais utilizadas na eleição de 1982. na cidade de São Paulo (SP).

- 166
Organizando ideias

Leia os textos e, depois, faça o que se pede O bêbado e a equilibrista


Texto 1 Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto
A anistia foi urna espécie de aspiração nacional,
Me lembrou Carlitos...
desde o golpe de 1964. Logo após a derrubada do
E ... ]
governo constitucional de João Goulart, a palavra
O bêbado com chapéu-coco
anistia já era citada, mesmo que, inicialmente, por
Fazia irreverências mil
vozes isoladas [ ... j.
Pra noite do Brasil.
A primeira manifestação pública pela anistia
Meu Brasil!...
ocorreu em abril de 1977, em Porto Alegre, num
Que sonha com a volta
ato de protesto contra prisões políticas. A partir daí,
Do irmão do Henfil.
a mobilização expande-se através da organização de
Com tanta gente que partiu
dias nacionais de protesto e Luta pela Anistia e pela
Num rabo de foguete
formação de comitês Primeiro de Maio pela Anistia.
Chora!
A nossa Pátria
Em fevereiro de 1978, é fundado no Rio de
Mãe gentil
Janeiro o CBA (Comitê Brasileiro pela Anistia),
Choram Marias
na sede da ABI (Associação Brasileira de Impren-
E Clarisses
sa). O governo acena com propostas de reformas
No solo do Brasil...
políticas, como a revisão da LSN (Lei de Segurança
Mas sei que uma dor
Nacional), revogação de punições e anistia parcial e
Assim pungente
gradativa. O movimento popular, em resposta, rea-
Não há de ser inutilmente
viva a palavra de ordem "anistia ampla e irrestrita"
A esperança...
E...]. Dança na corda bamba
Nos dias que antecederam a votação do projeto,
De sombrinha
milhares de pessoas participaram de atos públicos,
E em cada passo
passeatas ou comícios nas principais capitais do
Dessa linha
país, em favor da anistia. E ... ]
Pode se machucar...
Entre as 305 emendas que o projeto recebeu,
Azar!
uma delas, do deputado arenista Djalrna Marinho,
A esperança equilibrista
tornava a anistia irrestrita, pois suprimia os pará-
Sabe que o show
grafos do artigo 10 do projeto original, que trazia
De todo artista
restrições aos condenados por terrorismo. E ... ]
Tem que continuar.,.
[ ... J Com as galerias do Congresso tomadas pelo
público durante todo o debate, a anistia aprovada BOSCO, João; BLANC, Aldir. O bêbado e a equilibrista.
é geral, porque trata de todos os episódios ocorri- Intérprete: Elis Regina. In: ELIS REGINA. Elis Regina.
São Paulo: univeal, 1999. Faixa 2. [Série Milennium).
dos até aquele ano, mas não é irrestrita, porque não
atinge condenados por terrorismo e impõe certas
condições [ ... ]. De acordo com o texto 1, por que a anistia era
uma aspiraçâo nacional? Explique.
CARTA, Mino; PEREIRA, Raimundo. Retrato do Brasil: da
monarquia ao Estado Militar. São Pauto: Três: Política, 1984. v. 1
Os anseios populares com relação à anistia
p. 31-34.
foram atendidos? Explique.
Texto 2
Analise a letra da música (texto 2) e indique
A música "O bêbado e a equilibrista ", com- em que versos foram descritas as questões
posta por João Bosco e Aldir Btanc em 1979 referentes ao período da anistia.
e interpretada por Etis Regina, tornou-se um
4 Em sua opinião, por que essa música pode
hino à anistia.
ser considerada um hino à anistia?

167
Um movimento musicaL de jovens na ditadura
Na década de 1970, inúmeros habitantes de Márcio Borges, um dos principais composi-
Belo Horizonte, assim como de muitas outras tores do Clube da Esquina, escreveu diversas
cidades brasileiras, organizavam-se em movi- letras em parceria com Milton Nascimento. Em
mentos que propunham mudança das condições um depoimento, ele revela detalhes da adoles-
do país. cência sob a ditadura em sua cidade. Veja.
Um grupo de jovens da capital mineira, deno-
"A minha juventude foi debaixo de di-
minado Clube da Esquina, destacou-se nacional-
tadura"
mente por suas canções. O artista mais conhecido
do grupo é Milton Nascimento, que iniciou sua [ ... ] De 64 para frente, isto é, a partir do Gol-
carreira de músico e cantor ainda adolescente. pe Militar, a gente se uniu pra dar conta das ad-
Além de Milton, outros artistas do grupo tiveram versidades. A grande argamassa que juntou os
destaque, como os irmãos Lô e Márcio Borges, tijolinhos foi a ditadura. Não vejo nenhum valor
Ronaldo Bastos, Fernando Brant, Tavinho Moura, positivo nisso, mas a ditadura nos incitou a fi-
Beta Guedes, Flávio Venturini e Toninho Horta. carmos cada vez mais unidos, a sermos cada vez
mais corretos nas nossas decisões, para que, cada
vez mais, nós nos colocássemos como uma opo-
] sição a essa afronta aos direitos humanos, aos di-
reitos civis. Que nós nos colocássemos cada vez
mais contra a violência e, principalmente, con-
tra a violência promovida pelo próprio Estado.
I.se Estado era um Estado de falência total dos

1 dores. Aquilo que teria que zelar pelos seus ci-


.y'
adãos estava conspirando contra eles. É terrível
viver uma situação dessas, principalmente quan-
dose éjovem. 1...] A minha juventude foi debaixo
Alouns dos jovens que fomiavam o chamado Clube da Esquina. Da da ditadura. [...J
esquerda para a direita: Ló Borges, Duca Leal, Márcio Borges e Milton
Nascimento. Diamantina (MD). 1971. BORDES. Márcio. História. Museu da Pessoa. 19 nov. 2004.
Disponível em: <wvwrnuseudaposoi.net/pt/conteudo/
historia/marcio-borges-45546>. Acesso em: abr. 2016.
Sobre o Clube da Esquina, leia o texto a
seguir.
As letras das canções do grupo revelavam

As letras das canções em geral revelam uma in- parte do sentimento desses jovens, cujo direi-
clinação a construções mais abstratas, imagens ou to de expressão passou a ser constantemente

metáforas que talvez sejam mais soltas de uma tra- cerceado. Muitas delas, como Clube da Esquina

dição poética da canção brasileira que as costumei-


n5 2, Nada será como antes e Credo, traziam
ras da época, e mesmo depois. Pouco se encontra embutidas em suas letras mensagens de repú-

da estrutura de romance ou de narrativas, histórias dio às perseguições durante o regime ditatorial.

ou situações das quais se pode tirar alguma moral Essas canções foram difundidas em um
ou mensagem. contexto já conturbado pelo forte autoritaris-
mo da Ditadura Militar, em que as censuras
vILElA, Ivan. O movimento. Museu Clube da Esquina.
Dmponívet em: <vv.museucIubedaesquina.org.br/ passavam a ser executadas de forma cada vez
o-movimento>. Acesso em: abr. 2016. mais rigorosa.

- 168
Leia agora um trecho do depoimento de Então a gente usava nossas músicas como as
Márcio Borges sobre esse momento. nossas metralhas, como as nossas bombas. Foi uma
época que a gente fazia shows para quatro, cinco,
"Aí as músicas começaram a ser censura-
dez mil estudantes, e os próprios presos políticos
das, veio todo aquele período de obscuran-
escutavam as obras do "Clube da Esquina" como
tismo terrível"
obras libertárias, como obras que tinham a ver com
[ ... j Era urna época muito ativa, o movimento aquele momento político que estava sendo vivido
estudantil muito florescente, a gente aprendendo as ali. Eram bandeiras de liberdade ali, dentro daquele
ideologias, estudando os livros de Karl Marx, livros oceano de escuridão que era a ditadura. [...
dificílimos que a gente entendia mais ou menos de BORGES, Márcio. Depoimento. Museu CLube da Esquina.
orelha. Mas sentíamos que ali tinha uma grande jus- Disponível em: smuseuc1ubedaesquna.org.br/museu/
depoimentos/marcio -borges>. Acesso em: abr 2016.
tiça, tinha uma grande verdade ali dentro, um gran-
de sonho que não era utópico, mas realizável - pelo
menos a gente achava. Então isso foi nos mantendo
ali, e eu participando do movimento estudantil. Co-
mecei a frequentar umas reuniões clandestinas da
..-
POLOP, que era a Política Operária, os estudantes su ,, 4v..

juntando com os operários. Comecei a frequentar 1?


primeiros núcleos de resistência armada à ditadur.,
mas não tive coragem. Eu falei: "Bom, meu altruísn
tem limite". Eu não tenho vocação para mártir, eu
não tinha vocação para o martírio, e sabia que aquilo
ia terminar em martírio, como realmente terminou.
Eu falei: "Não, eu vou ter que arranjar outra trinchei-
ra pra lutar contra a ditadura. Essa trincheira vai s
essa, que já está armada, que é esse barraco musie.:
que a gente já está armando". Foi quando eu come-
cei a dar um cunho cada vez mais panfletário para Mjlton Nascimento (ao centrO nu pnssnatn dcc 1 flí) mil. rnanitestaçao
contrária ao Regime Militar. Rio de Jmeiru NA. 26 de Junho de 1968.
as minhas letras, cada vez mais mal arranjadas, mais
mal acabadas; eu fui largando para trás aquela preo-
Assim, os integrantes do grupo procuraram
cupação de rima, de ser bonitinho, de ficar falando de
resistir à ditadura por meio de suas canções,
amor e flor. Foi a época de coisas como "Gran Circo",
com letras repletas de metáforas e mensagens
"Lona Suja", "O osso que vai se quebrar", "1-loje é dia
embutidas. Na década de 1980, músicas como
de El Rey". Eram metáforas mais violentas. Aí as mú-
Coração de estudante e Menestrel das Ala-
sicas começaram a ser censuradas, Veio todo aquele
goas, gravadas por Milton Nascimento, foram
período de obscurantismo terrível. [ ... 1
amplamente divulgadas por pessoas que se
A gente vendo nossos amigos se envolvendo em
opunham ao regime militar, que perdia força
aventuras cada vez mais perigosas, depois alguns
a cada ano.
deles desaparecendo, simplesmente sumindo do
mapa, outros reaparecendo nos porões das cadeias. 1. Agora, com base nos textos e em seus co-
Foi um avanço quando a gente começou a desco- nhecimentos, pesquise em livros, discos e
bri-los nos porões dos quartéis, que foi quando co- na internet as letras das canções citadas em
meçamos a lutar pela legalização dos status deles busca de referências ao autoritarismo polí-
como prisioneiros políticos - porque não existia tico vivido durante a Ditadura Militar. Apre-
nem o status de preso político, eles eram simples- sente a pesquisa em sala de aula, converse
mente dados como desaparecidos. [.] com os colegas e registre suas conclusões.

169
O grito dos brasiLeiros: dDiretas Já! pio

A anistia e a reforma partidária foram eram mais alguns grupos isolados de es-
vitórias importantes para a retomada da tudantes ou entidades organizadas, mas
liberdade individual e política dos cidadãos um movimento de massa que agregava
brasileiros. Mas ainda faltava uma etapa partidos políticos, organizações, movi-
imprescindível para o retorno da demo- mentos sociais e diversos outros setores
cracia: eleições diretas para presidente. da população brasileira.
O primeiro passo havia sido dado com a Essa campanha começou tímida,
posse dos governadores de oposição em pois ainda era vigente o Regime Militar,
importantes estados da federação. e as manifestações contrárias a ele eram
punidas severamente. Mas, após 22 anos
sem eleições diretas para presidente - o
[...J Os governadores de oposição que acabavam
último eleito pelo povo havia sido Jânio
de tomar posse nos estados mais poderosos do
Brasil (Franco Montoro, em São Paulo; Tancredo Quadros em 1960 -, era preciso mudar
Neves, em Minas Gerais; e Leonel Brizola, no Rio esse quadro para redemocratizar o país.
de Janeiro) representavam um novo patamar na Não haveria liberdade política sem
evolução da oposição. Eram líderes da oposição eleições diretas para presidente. E essa
que não se restringiam às tribunas oratórias de mudança foi proposta ao Congresso
Brasília. Haviam sido legitimamente eleitos para
no início de 1983 pelo deputado mato-
ocupar cargos executivos com algum controle
-grossense Dante de Oliveira.
sobre as polícias nos seus estados. Os novos gover-
nadores tinham um grande "poder convocatório", Esse projeto de emenda constitucio-
isto é, uma capacidade de levar grande número de nal teve pouca repercussão na imprensa,
seguidores para apoiarem uma agenda específica. mas a ideia foi tomando forma. Assim, em
A campanha maciça das Diretas Já!, em 1984, por junho do mesmo ano, em Goiânia, ocor-
eleições diretas para presidente, é vista como um reu o primeiro dos muitos comícios em
extraordinário testemunho do ressurgimento da prol das eleições diretas para presidente, e
sociedade civil brasileira. E foi. Mas, na maioria
o slogan "DiretasJá" começou a ecoar.
das manifestações mais concorridas, a iniciativa
do evento, a ordem dos oradores, o controle da
multidão, a encenação e legitimação desse cenário
couberam àqueles líderes da sociedade política Não.
recém-empossados: os governadores Montoro,
Neves e Brizola, os quais, durante o processo, co- dia`mais
meçaram a transcender a prévia separação entre a
sociedade civil e a política, e a congregar a oposição
numa arena maior e mais poderosa.
priasegurar.
STEPAN, Alíred. Os mititares: da abertura à nova república.
São Pauto: Paz e Terra, 1986. p. 75-76.
O DOVO
O autor do texto observa que a
campanha Diretas Já, ou seja, a ação em
prol das eleições diretas para presidente
"é vista como um extraordinário teste-
munho do ressurgimento da sociedade
civil brasileira". Isso ocorreu porque a Da 21,1deIria, às 16 horas.
mobilização em busca dessa mudança
Cartaz pelas Di: elas Ja convocando o povu pra o çjrznde
fez a diferença naquele momento. Não comício da Candeidria, Rio de Janeiro (RJ). 1984.

— 170
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Vista aerea da multidao concentrada na Praça da Sd. em São Paulo SP). durante comício para a campanha Diretas Já, em 2h de janeiro de 1984.

Os comícios passaram a acontecer e a com a situação política e econômica. Nessas


atrair mais e mais pessoas. Em 25 de janeiro de ocasiões, todos gritavam palavras de ordem
1984, na Praça da Sé, em São Paulo, ocorreu pedindo eleições diretas, aumento salarial, solu-
uma grande manifestação popular pela apro- ções para o desemprego e o não pagamento da
vação da emenda que garantiria a todos os dívida externa. Essas reivindicações eram fruto
eleitores brasileiros a possibilidade de eleger da intensificação da crise econômica que vinha
o novo presidente. Nesse comício reuniram-se ocorrendo desde o final da década de 1970.
cerca de 300 mil pessoas, que, nas palavras do O quadro era de inflação alta, desemprego e ar-
então governador de São Paulo, Franco Mon- rocho satariat. E a crise só fez aumentar a tensão
toro, sintetizavam a esperança de 130 milhões social e a oposição ao Regime Militar.
de brasileiros (população estimada do país na Entretanto, apesar das manifestações, não
época). Em 16 de abril ocorreu um comício foi dessa vez que o povo pôde voltar a eleger seu
ainda maior, com cerca de 1,7 milhão de mani- representante maior. A emenda Dante de Oliveira
festantes, também em São Paulo. foi rejeitada pelos parlamentares em março de
Esses eventos eram grandes festas populares 1984, e a definição do novo presidente da Repú-
nas quais, com muita alegria e disposição, polí- blica ficou nas mãos do Colégio Eleitoral. Mas,
ticos, artistas, representantes de organizações e apesar da derrota, a campanha foi importante
pessoas comuns manifestavam sua indignação para o encaminhamento das eleições.

AF &ossárii)
Arrocho saLariaL: contençáo de aumentos satariais, geralmente para controlar despesas ou impedir a
subida de preços e da inflação.

171
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Multidao coar faixas durante manitesraç o cia campanha Diretas Ja Brasilia (OH. 6 jun 1984.

Com vistas à eleição indireta, era vitoriosa a chapa Tancredo-Sarney. Era o


preciso que os partidos definissem seus fim de 21 anos de Ditadura Militar.
candidatos a presidente. A oposição se uniu Durante sua campanha, Tancredo
em torno do nome Tancredo Neves, em Neves conclamava o retorno do regime de-
chapa cujo vice era o dissidente governista mocrático no que chamou de Nova Repúbli-
José Sarney (ex-presidente do partido do ca, mas não pôde ver esse objetivo realizado.
governo, PDS). Essa composição, a Aliança Acometido de grave enfermidade, morreu
Democrática - uma parceria entre o PMDB no dia 21 de abril, sem ter tomado posse.
e a Frente Liberal (partido criado pelos dis- Em seu lugar, assumiu o vice-presidente,
sidentes do PDS) -, enfrentou a candidatura José Sarne>', que governou o país até 1990.
governista de Paulo Maluf, ex-governador Sarneyfoi empossado presidente como
de São Paulo. Em 15 de janeiro de 1985 compromisso de fazer do Brasil novamente
ocorreu a eleição indireta, da qual saiu uma democracia. E, para que isso ocorresse,
em 1986 foi convocada uma Assembleia Na-
cional Constituinte, cuja missão era elaborar
uma nova Constituição para o país com base
nos princípios da democracia.
Em outubro de 1988, pelas mãos da-
quele que foi apelidado de "Senhor Diretas",
o deputado Ulysses Guimarães, presidente da
Constituinte, foi promulgada a nova Consti-
tuição brasileira. O país entrava em uma nova
era, alicerçada sobre princípios da liberdade.
Eram os primeiros passos da democracia.

uputriíJo U(yssus Guiiriaiaes (a direitu(.


residente da Assembleia Nacional
Constituinte, na promulgação da
Constituição. Brasilia (DF), 5 out. 1988.

172 iro6
As desejadas eleições diretas para presidente só O conjunto de medidas não foi bem-aceito
ocorreram cinco anos após o movimento Diretas Já. pela população, fato que, somado às acusações de
Em 1989, 22 candidatos concorreram à presidência, corrupção e desvio de dinheiro envolvendo políti-
em pleito vencido por Fernando Colior de Meilo num cos, amigos e familiares do presidente, ocasionou
segundo turno de disputa com Lula (Luiz Inácio Lula intensas manifestações populares - como o cha-
da Silva), que chegaria ao cargo em 2002. mado Movimento dos Caras-Pintadas. Foram essas
Apesar de eleito, Colior renunciou dois anos iniciativas que culminaram na renúncia de Colior,
depois, numa tentativa de evitar um processo de então substituído por seu vice, Itamar Franco.
impeachment motivado por acusações de corrup-
ção. O período de seu governo foi marcado por
inúmeros problemas econômicos, que se esten- Impeachment é um termo inglês utilizado
diam do governo anterior, dentre os quais po- para se referir à cassação de mandato de um
demos destacar o grande aumento da inflação, presidente ou chefe de Estado, independente-
que chegou a mais de 1 700% ao ano. Visando mente do motivo.
Movimento dos Caras-Pintadas foi o nome
solucionar a questão, Colior lançou mão de um
dado às manifestações contrárias à adminis-
pacote de medidas chamado Plano Brasil Novo
tração vigente. Nelas, multidões de jovens,
- popularmente conhecido como Plano Colior -,
principalmente estudantes, saíram às ruas com
que envolvia mudança de moeda, congelamento o rosto pintado de verde e amarelo pedindo o fim
de salários e confisco de depósitos bancários do governo do então presidente Collor.
superiores a 50 mil cruzeiros (moeda da época).

NI(TL)LAU

173
Analise o texto e responda às questões. Um último susto: o carro de bombeiro liga a
sirene, mas é só para poder levar uma jovem que
Tancredo, 342.
desmaiou de alegria, primeira vítima da democracia
O povo reunido desde cedo em frente ao Con-
nascente. A festa no gramado encharcado continua.
gresso Nacional começa a cantar o Hino Nacional
Velhos e novos gritos de guerra se sucedem:
em ritmo de samba.
"Acabou, acabou a ditadura".
Tancredo, 343.
"O povo unido jamais será vencido".
Espoucam rojões, a emoção cresce, é chamado para
"Chora Figueiredo, Figueiredo chora. Chora Fi-
votar o deputado federal João Cunha (PMDB-SP).
gueiredo que chegou a sua hora".
Tancredo, 344.
"Arroz, feijão, saúde e educação".
Às 11h 34min deste 15 de janeiro [de 1985],
"Ia, ia, ia, acabou a mordomia".
explode o grito parado no ar durante 21 anos. Ë o
Entre um coro e outro, um pol-pourri cívico-
voto da vitória, o fim do regime militar. A multidão
-carnavalesco.
se abraça e chora, ergue os braços e pula, rompe os
"Ou ficar a Pátria livre, ou morrer pelo Brasil".
cordões de isolamento, atravessa rampas proibidas e
escala a cúpula do Senado, agitando faixas e bandeiras.
Trio elétrico, bumba meu boi, charanga do Atlé- KOTSCHO, Ricardo. Rojões, samba. Hino nacional, é o desabafo.
tico Mineiro, samba, frevo e maracatu, bandeiras Folha de S.Pauto, São Paulo. 16 jan. 1985. Primeiro caderno.
do Brasil, do Corinthians, dos partidos comunistas, p. 7. Fornecido pela Folhapress.

do PMDB, do Flamengo, gente moça e gente velha,


de terno ou de calção, cantando e dançando, um
O que representou o momento da eleição de
homem grita:
Tancredo Neves para o povo brasileiro?
"A liberdade chegou".
A frieza e a apatia de Brasília nos dias que antece-
deram a eleição indireta agora já eram passado: co- Explique os "gritos de guerra" do povo no
meça o grande carnaval da vitória contra a ditadura. contexto do período.

Pausa para investigacão . ..

Em grupo, pesquise os governos do Brasil após a volta à democracia. Juntos, busquem informações
básicas sobre economia, políticas públicas, popularidade, principais lutas sociais, traçando um pano-
rama sobre cada governo. Apresentem os resultados em sala de aula.
Cada grupo ficará responsável por um dos temas a seguir (ou um mesmo tema poderá ser dividido
entre dois ou três grupos).

Itamar Franco: o vice que assumiu e o Plano Real.

Fernando Henrique Cardoso (FHC): primeiro mandato.

3 FHC: segundo mandato.

4. Luiz Inácio Lula da Silva: primeiro mandato.

S. Lula: segundo mandato.

Dilma Rousseff: a primeira mulher na presidência.

Dilma: segundo mandato.

— 174
Liberdade, abre as asas sobre nós
A volta da democracia se fez pela abertura um passo importante na tentativa de criação de
política colocada em prática pelos dois últimos uma central sindical que agregasse esses movimen-
presidentes militares, mas também teve a partici- tos do país inteiro, ou seja, uma entidade nacional
pação efetiva da sociedade civil, que, reunida em de luta dos trabalhadores. Naquele momento, ha-
organizações, pediu pela volta do estado de direito, via uma divisão entre as lideranças do sindicalismo
responsável por garantir o governo democrático. brasileiro, e essa divergência de opiniões fez surgir,
Com relação às organizações da sociedade após dois anos de discussões, dois blocos distintos:
civil que se opuseram à Ditadura Militar, destaca- a Central Única dos Trabalhadores (CUT) - grupo
ram-se membros da Igreja Católica, da Ordem dos dos que se consideravam autênticos, eram vincula-
Advogados do Brasil (OAB), do Comitê Brasileiro dos ao PT e utilizavam estratégias de enfrentamento
da Anistia (CBA), da Associação Brasileira de Im- - e a Central Geral dos Trabalhadores (CGT) - que
prensa (ABI) e do movimento sindical. reunia sindicatos menores e mais tradicionais, com
O movimento sindical renovou-se ainda no Re- uma postura de negociação.
gime Militar, sobretudo com base nos novos setores O número de sindicatos rurais também au-
da economia (bens de consumo durável e bens de mentou consideravelm ente entre o fim da década
capital) estabelecidos durante o governo Médici. Os de 1970 e início dos anos 1980.
metalúrgicos das multinacionais automobilísticas e
das empresas nacionais de siderurgia, produção de
máquinas e equipamentos foram os responsáveis aE
' 1
por essa renovação. Localizadas na área industrial .. ... .
da Grande São Paulo, na região do ABC paulista
(Santo André, São Bernardo e São Caetano), essas
1 CONrLA'
companhias empregavam um número grande de ' &
trabalhadores que se uniram em torno da reivindi-
cação por mudanças em sua situação, reocupando
seu espaço de luta reprimido pelo regime ditatorial.
O chamado "novo sindicalismo" tomou for-
ma por meio da campanha salarial ocorrida em
1977 e se fortaleceu com as greves de 1978 e 1979,
que se espalharam por outros cantos do país.
O que diferenciava esse movimento sindical
de outros era sua organização, que partia da base.
Primeiro os operários formavam comissões de
negociação dentro das próprias fábricas; depois,
Congresso Nacional da Classe Trabalhadora )Conclat), evento em que foi
reuniam os colegas de trabalho e deliberavam
fundada a CUT. São Paulo (SP), 1983.
em conjunto. Essa época também ficou marcada
pela ascensão de líderes carismáticos - como Luiz
Iriácio da Silva, o Lula - que conseguiam unir os o estado de direito é a condição de um país
trabalhadores em prol de causas comuns. rio qual prevalece o respeito aos direitos indivi-
Essa nova forma de sindicalismo se mantinha duais e políticos das pessoas, de modo que ne-
nhum indivíduo, presidente ou cidadão comum,
independente do controle estatal. Portanto, repre-
está acima da lei. Nos governos democráticos,
sentava com mais autenticidade os interesses dos
a autoridade é exercida por meio da Lei, e os
trabalhadores, e não dos patrões ou governantes. próprios políticos estão sujeitos às sanções
Em 1981 ocorreu o 1 Congresso Nacional da previstas por ela.
Classe Trabalhadora (Conclat), que representou

175
que podemos afirmar ter sido ele extremamente
No campo, onde a estrutura fundiária permane- proveitoso e rico em experiências sociopolíticas.
cia intocada, houve o ressurgimento da luta em prol Mais tarde, nos anos 1990, novos movimentos
da defesa do trabalhador rural. Data de 1975 a Co-
sociais surgiriam, acompanhando uma crescente
missão Pastoral da Terra, criada pela Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para atuar diversificação das demandas populares.
nas questões agrárias, e de 1979 a formação do Mo- Um dos traços marcantes das sociedades de-
vimento dos Traballadores Sem Terra (MST). [ ... ] mocráticas é a criação de entidades com diversas
finalidades, ou seja, agremiações de luta por uma
LUCA. fânia Regina de. Direitos sociais no Brasil. In:
PINSKI, Jaime; PINSKI, Carta Bassanezi Org.l. História da causa. Os movimentos sociais são formas de luta
cidadania. São Paulo: Contexto, 2005. p. 487. organizadas, adotadas pela população a fim de
promover ações coletivas diversas. Essas ações po-
dem ser viabilizadas com a utilização de estratégias
Mas não foi somente na área sindical que a diversas, como a pressão direta, que ocorre por
sociedade civil se articulou. Vários movimentos so- meio dos diferentes tipos de manifestações (pas-
ciais acompanharam as mudanças que se delineavam seatas, marchas etc.), e a pressão indireta, que usa
no Brasil. Predominava um clima de esperança pela abaixo-assinados, cartas, manifestos, declarações.
retomada da democracia, e isso fortalecia a união
dos indivíduos para as lutas reivindicatórias.
Mulheres, moradores de periferia, estudantes Os anos 90 redefiniram novamente o cenário
das lutas sociais no Brasil, assim como deslocaram
e professores, entre outros, organizaram-se e ini-
alguns eixos de atenção dos analistas. Os movimen-
ciaram ações cuja finalidade era transformar sua tos sociais populares dos anos 70/80 se alteraram
realidade. São exemplos dessas iniciativas: substancialmente. Alguns entraram em crise: de
os movimentos feministas da década de 1970; militância, de mobilização, de participação coti-
o movimento estudantil ressurgido por volta diana em atividades organizadas, de credibilidade
de 1977; nas políticas públicas, de conflabilidade e legiti-
midade junto à própria população. Surgem novos
o movimento das favelas de São Paulo e de Belo
movimentos sociais, centrados mais em questões
Horizonte, em 1979; éticas ou de revalorização da vida humana. A vio-
o movimento dos desempregados de São Paulo, lência generalizada, a corrupção, as várias modalida-
em 1983; des de clientelismo e de corporativismos, os escân-
o movimento de luta pela moradia, também dalos na vida política etc, levam a reações no plano
em 1983. da moral. Criam-se movimentos nacionais a partir
Nesse período foram tantas as organizações de instituições e organizações de espectro plural,
ou de figuras carismáticas, como o caso do Betinho
populares, principalmente na década de 1980,
na Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria,
Pela Vida. Ou, ainda, estruturam-se movimentos
nacionais a partir de questões sociais dadas pela pro-
blemática geracional, de idade, como o Movimento
Nacional de Meninos e Meninas de Rua, ou o Mo-
vimento dos Aposentados. Ou, ainda, movimentos
de revalori7.ação da cidade como locus de vivência e
sociabilidade, e antiviolência, como o Movimento
Viva Rio. Cumpre destacar que as mobilizações
coletivas nos anos 90 partem de um chamamento à
consciência individual das pessoas e elas, usualmen-
te, têm se apresentado mais como "Campanhas" do
que como movimentos sociais.
GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e Lutas
sociais: a construção da cidadania dos brasileiros.
Passeata de mulheres da Frente Brasil Popular ria Aveirida Rio Branco. São Paulo: Loyola. 2003. p. 127-128.
Rio de Janeiro (RJ). 7 nov. 1989.

176 uln6
A participação popular tem sido, desde a pri- celulares ou qualquer outra forma de mídia móvel.
meira década do século >0(1, cada vez mais ativa na Assim é possível unir pessoas de diferentes lugares
gestão pública, na forma de conselhos, como o Con- do mundo, com perfis socioeconômicos distintos
selho Nacional de Saúde e o Conselho Tutelar. São e orientações ideológicas diversas. Essa nova for-
conselhos comunitários, normatizados, que servem ma de mobilização social está associada ao con-
de ponte entre a população e o governo, uma vez que, ceito de participação cidadã.
por meio de fóruns e audiências públicas, aproximam
ambos e permitem ações conjuntas para melhorar
toda a comunidade. Essas instituições representam A participação cidadã é lastreada num conceito
novas formas de integração social, de democratiza- amplo de cidadania, que não se restringe ao direito
ao voto, mas constrói o direito à vida do ser humano
ção da coisa pública e de exercício de cidadania plena
como um todo. Por detrás dele há um outro con-
e ativa pela população. Assim, a redemocratização e
ceito, de cultura cidadã, fundado em valores éticos
o fim do Regime Militar trouxeram de volta ao Brasil universais, impessoais. A Participação Cidadã fun-
a participação dos indivíduos nas lutas sociais. da-se também numa concepção democrática radical
Hoje os movimentos podem ocorrer sem que as que objetiva fortalecer a sociedade civil no sentido
pessoas se unam diretamente em uma organização de construir ou apontar caminhos para uma nova
específica. Um exemplo é o frequente uso das redes realidade social - sem desigualdades, exclusões de
sociais e outras ferramentas da internet para promo- qualquer natureza. Busca-se a igualdade, mas reco-
nhece-se a diversidade cultural. Há um novo pro-
ção de campanhas e organização de passeatas e mo-
jeto emancipatório e civilizatório por detrás dessa
bilizações. A estrutura organizativa é própria dessa
concepção que tem como horizonte a construção de
nova realidade, que trouxe facilidade e agilidade para uma sociedade democrática e sem injustiças sociais.
a comunicação e difusão de ideias. Alguns pesquisa-
GOHN, Maria da Glória lorg.). Movimentos sociais
dores nomeiam essa nova realidade de ciberativismo. no início do século XXI: antigos e novos atores sociais.
A característica principal desses manifestan- Petrópolis: Vozes. 2011. p. 18.

tes é a comunicação on-line, por computadores,

Organizando ideias ..,.- 1 2


Em dupla, reflita sobre as informações ante- igualar os tesouros que há na terra, nem os que o mar
riores e, juntos, façam o que se pede. encobre; pela liberdade, da mesma forma que pela
honra, se deve arriscar a vida; e, pelo contrário, o ca-
Qual é o papel dos movimentos sociais no
tiveiro é o maior mal que pode acudir aos homens.
contexto democrático?
CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de. Dom Quixote de La Mancha:
Vocês participam ou já participaram de mo- livro segundo. Porto Alegre: L&PM, 2010. p. 401-402.

vimentos sociais e campanhas em prol de Texto 2


alguma causa? Por quê?
A liberdade do outro, longe de ser um limite ou a
As lutas sociais podem ser consideradas negação de minha liberdade, é, ao contrário, sua con-
lutas pela liberdade? Expliquem. dição necessária e sua confirmação. Apenas a liber-
dade dos outros me torna verdadeiramente livre, de
Leiam os textos a seguir e os relacionem
forma que, quanto mais numerosos forem os homens
com as questões abordadas neste capítulo.
livres que me cercam, e mais extensa e ampla for sua
Apresentem suas conclusões a todos e ela-
liberdade, maior e mais profunda se tornará minha
borem um texto argumentativo com o tema:
liberdade. [ ... ] Minha liberdade pessoal assim confir-
liberdade e participação social.
mada pela liberdade de todos se estende ao infinito.
Texto 1 BAKUNIN, Mikhail. Textos escolhidos.
A liberdade, Sancho, é um dos dons mais precio- Porto Alegre: L&PM, 1983. p. 32-33.

sos que aos homens deram os céus: não se lhe podem

177
Heranças da ditadura
Oflcialmente, o término da Ditadura Militar aos direitos humanos e, assim como a própria di-
ocorreu em 1985, com a eleição de um presiden- tadura, não foram exclusividade do Brasil.
te civil e, em 1988, com a promulgação de uma
nova Constituição, que consolidou a democracia.
Mesmo assim, ainda é possível perceber heranças Essa modalidade especial da justiça, fortemen-
da ditadura em nossa sociedade. te marcada pela política, tem a incumbência de
promover a reparação das vítimas de regimes arbi-
Após a queda do regime, diversos movimen-
trários, de buscar a verdade e a defesa da memória
tos de contestação partiram da sociedade civil.
dos vencidos, de reformar as instituições do Estado
Algumas entidades não governamentais iniciaram que possibilitaram as violações dos direitos huma-
investigações para obter informações sobre os nos e de restabelecer a igualdade dos indivíduos
desaparecidos, saber a causa das mortes e os res- perante a lei. Ela existiu em muitos países que vi-
ponsáveis por elas. Assim, sindicatos, familiares veram os chamados "eventos traumáticos", sendo
de vítimas do regime e comitês formados em uni- emblemático o que se deu em relação às violações
versidades se mobilizaram em busca de respos- dos direitos humanos durante a Segunda Guerra
Mundial, sobretudo com o Holocausto. Os julga-
tas, esclarecimentos e justiça. Um desses proje-
mentos de Nuremberg inspiram essas iniciativas,
tos, o "Brasil: nunca mais" foi desenvolvido pelo
mas, ao contrário deles, a justiça de transição não
cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, o rabino Henry costuma ser militar e internacional, como ocorreu
Sobel e o pastor presbiteriano Jaime Wright. na cidade alemã. Desde então, muitas iniciativas
Essa investigação resultou em um dos principais de reparação foram implementadas por países que
dossiês sobre as atrocidades da repressão política viveram graves violações dos direitos humanos,
no Brasil entre os anos 1961 e 1979. sendo muito conhecidas as experiências da África
Somente dez anos após o fim do Regime do Sul, com sua Comissão da Verdade e da Recon-
ciliação, que atuou entre 1995 e 1998, liderada pelo
Militar o governo brasileiro reconheceu a respon-
bispo Desmond Tutu, e da Argentina, a Comissão
sabilidade do Estado pelos muitos mortos e de-
Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas,
saparecidos ao longo do Período Ditatorial. Em
que atuou entre 1983 e 1984, sob a presidência do
1995, durante o governo de Fernando Henrique famoso escritor Ernesto Sabato.
Cardoso, foi criada a Comissão sobre Mortos e
FICO, Carlos. História do Brasil contemporâneo: da morto de
Desaparecidos. Foi o primeiro passo na esfera Vargas aos dias atuais. São Pauto: Contexto, 2015. p. 137-138.
governamental de reconhecimento de mortos
e desaparecidos políticos. Ainda que com uma
missão relativamente simples, o estabelecimento Com o objetivo de revelar aspectos enigmáti-
dessa comissão demandou negociação com os cos da Ditadura Militar, foi instaurada em 2011 a
militares, que temiam algum tipo de represália. Comissão Nacional da Verdade (CNV). Esse pro-
Estava aberta assim a primeira possibilidade de jeto foi responsável pela investigação das viola-
os familiares terem ao menos a constatação das ções de direitos humanos cometidas por agentes
mortes e a possibilidade de obter o atestado de do Estado entre 18 de setembro de 1946 e 5 de
óbito dessas pessoas. A falta desses documentos outubro de 1988. Apesar de não abarcar somente
muitas vezes era razão de problemas práticos, o período do Regime Militar, ele foi certamente o
como reinvindicação de herança. principal foco da comissão.
O trabalho dessa comissão resultou em uma Outras comissões oficiais ou extraoficiais
série de documentos com dados sobre os mortos e foram criadas na América Latina com o objetivo
desaparecidos, o que possibilitou o início do paga- de desvendar a verdade sobre as violações dos di-
mento de indenização aos familiares das vítimas da reitos humanos cometidas durante as ditaduras
ditadura. Essas iniciativas de reparação represen- no continente. Cada país teve uma trajetória dife-
taram um significativo avanço quanto ao respeito rente nessa busca.

-178
Em seu relatório, a CNV propôs a punição dos
Por que o nome "comissões da verdade" se torturadores, alegando que a Lei da Anistia não pode
generalizou? A explicação é mais simples que apagar o crime cometido. De fato, os agentes do Es-
parece, longe de qualquer conceito filosófico.
tado que participaram das violações dos direitos
Era preciso produzir uma verdade que corres-
humanos sequer foram nominados ou intimados
pondesse aos fatos objetivos da repressão, e não
aos fatos alegados pelas "verdades oficiais" das oficialmente a prestar esclarecimentos. Além disso, a
ditaduras, que sempre negaram qualquer tortu- CNV concluiu que violações persistem nos dias atuais,
ra ou desaparecimentos forçados de militantes. pois, ainda que ocorram em um contexto diferente,
Quando muito se falava em "excessos" de alguns as práticas de detenções ilegais e arbitrárias, torturas
agentes sem controle, mas jamais os Estados en- e mesmo ocultação de cadáveres ainda fazem parte
volvidos assumiram as práticas criminosas que da realidade brasileira. Para os integrantes da CNV, a
abrigaram. Na ausência de arquivos oficiais que impunidade dos criminosos da época da ditadura dá
documentassem as violências, a forma mais ób-
condições para a perpetuação dessas práticas.
via era promover e incentivar o testemunho dos
sobreviventes. Assim, o testemunho se transfor-
mou, a um só tempo, em peça jurídica e docu-
mento histórico para recompor a verdade.
NAPOLITANO. Marcos. 1964; história do Regime Militar
brasileiro. São Paulo: Contexto. 2014. p. 288.

Em dezembro de 2014 a presidente Duma


Rousseff recebeu o relatório final da Comissão
Nacional da Verdade. Esse ato representou a res-
tituição do direito à memória coletiva sobre as
violações dos direitos humanos cometidas duran- Cansao Nacional da Verdao
presidente Duma Roussefi. em cerurnonia realizada no Palacuo do Planalto.
te a Ditadura Militar. Brasilia (DF), 10 dez. 2014.

L Organizando ideias
Leia o texto e depois faça o que se pede atravessa diferentes classes sociais, não sendo
monopólio de um grupo ou estrato.
Por fim, se a tortura, desde os anos 1980, não
SCHWARCZ. Litia Monta; STARLING. Heloisa M. Brasil: uma
é mais uma política de Estado, ela continua dis- biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 507.
seminada nas práticas privadas ou mesmo aco-
bertada nas delegacias e nas investidas policiais Você concorda com as autoras do texto e com
em bairros da periferia, onde a escala de violên- os relatores da CNV sobre a permanência de
cia e de humilhação é ainda maior e, sobretudo, violações de direitos humanos? Justifique
contra jovens negros. Diante dessas situações, sua resposta.
fica exposta a cidadania precarizada de certos Em dupla, busque exemplos de situações
grupos sociais, e as práticas de segregação a que que justificam a afirmação das autoras. A
continuam sujeitos. É nesses momentos que a busca pode ser feita em mídias impressas ou
regra democrática permanece suspensa. Até pa- on-line. Juntos, tragam o material pesquisa-
rece que o passado escravocrata mais distante do para a sala de aula e realizem um debate
e o autoritarismo nem tão longínquo deixaram sobre a violação dos direitos humanos em
uma marca incontornável do arbítrio do ajuste nossa sociedade. Depois, pode ser elaborado
de contas privadas, ou delegados ao outro que e divulgado na internet, na escola e no bairro
incorpora a autoridade. O pior é que a prática um texto coletivo sobre o assunto.

179
Debate interdisciplinar
O Brasil e a inflação
No mundo todo, desde que foram adotados economia. Ela ocorre devido a vários fatores, e
os diversos modelos econômicos que utilizam toda o mais importante deles é o alcance dos níveis
e qualquer moeda como valor de troca, perdura um máximos de consumo de um produto, relacionado
problema em comum: a inflação. à capacidade produtiva máxima. Isso incentiva os
A inflação é a medida do aumento dos produtores a aumentar os preços.
preços dos bens e serviços de consumo de uma

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ahrnenos

Por exemplo, se determinado bem é produ- por exemplo, o que ocasiona a ausência do pro-
zido na quantidade de dez por dia e seu consumo duto, elevando seu preço.
chega a nove por dia, o produtor vê uma oportu- Outros fatores menos relevantes que podem
nidade de aumento de preços, já que o consumo causar inflação são a variação cambial e a infla-
está acima do esperado. Pois bem, a porcenta- ção de outros países.
gem desse aumento é chamada de inflação. A inflação pode ser classificada em dois ti-
Outro fator que causa inflação é a queda pos: a de demanda e a de custos. A de demanda
repentina do volume produzido de determinado ocorre quando a procura por um produto é maior
bem. Isso ocorre no setor agrícola quando lavou- que sua oferta, sendo necessário, para controlá-la,
ras são perdidas devido a problemas climáticos, promover a redução da procura agregada ou o

180
r

Placas indicam os preços dp vegetais na Mercado Municipal de Sâo Paijir 1Pr 21112. As variações na economia e nas condições naturais fazem com que os
preços dos vegetais sejam alterados frequentemente.

aumento da produção.Já a inflação de custos está explicação é que o Estado, assim como as famí-
associada ao aumento do preço dos produtos lias e o setor privado, é um importante deman-
devido à elevação do custo de produção. Sendo dante de tudo o que se produz na economia. Só
assim, o aumento de capital empregado em pro- que, ao contrário dos outros dois, o setor público
dutos ou na mão de obra na fase de produção é pouco reage à alta dosjuros e dificulta o trabalho
repassado ao consumidor final. do Bacen de controlar a elevação dos preços.
No Brasil, o principal instrumento para Os governos ao redor do mundo utilizam
combater a inflação é a política de juros, cuja diversas técnicas de combate à inflação - desde
taxa básica (a Selic) é fixada pelo Banco Central a diminuição da quantidade de moeda em circu-
(Bacen), que ao aumentá-la eleva o custo do lação nos países e o aumento dos impostos co-
dinheiro, tornando mais caro o crédito para o brados sobre determinados produtos até o corte
consumo e para expandir a capacidade produtiva. de gastos governamentais a fim de injetar mais
Com menos pessoas e empresas consumindo bens capital na economia -, na tentativa de controle
e serviços, os preços tendem a cair. de preço dos produtos que sofrem o aumento
A redução dos gastos públicos também de custos.
pode contribuir para o combate da inflação. A

tivÍde.. ...... ..

1. No estado de São Paulo, em janeiro de 2015, o quilo de tomate custava em média R$ 432, e o
salário mínimo era R$ 78800. Suponha que uma família, com essa renda, consumisse por mês
uma média de 10 kg de tomate. Em janeiro de 2016, o quilo do produto subiu para R$ 5,50, e o
salário mínimo passou a ser R$ 880,00. Com base nessas informações, calcule o percentual de
inflação sobre o preço do tomate e a porcentagem de salário que foi gasta na compra de 10 kg
do produto em cada ano.

181
Testando seus conhecimentos Responda no cadsmi

{Unifesp-SP) Nos últimos anos do regime e o movimento operário, com a greve de


militar (1964-1985), a gradual abertura polí- São Bernardo.
tica implicou iniciativas do governo e de mo- Assinale a alternativa CORRETA.
vimentos sociais e políticos. Um dos marcos
Somente as afirmativas 1 e II estão cor-
dessa abertura foi:
retas.
a) A reforma partidária, que suprimiu os
Somente as afirmativas 1 e III estão cor-
partidos políticos então existentes e
retas.
implantou um regime bipartidário.
Somente as afirmativas 1, II e III estão
bi O chamado milagre econômico", que per-
corretas.
mitiu crescimento acentuado da economia
di Somente as afirmativas 1, III e IV estão
brasileira e aumentou a dívida externa.
corretas.
c) A campanha pelo "impeachment" de
e) Todas as afirmativas estão corretas.
Fernando Collor, que fora acusado de
diversos atos ilícitos no exercício da 3. (UFMG-MG) A reforma partidária, que im-
Presidência. plantou o pluripartidarismo no Brasil, no
di O estabelecimento de novas regras governo Figueiredo, tinha por objetivo:
eleitorais, que determinaram eleições consolidar os resultados das eleições de
diretas imediatas para presidente. 1974 que deram ampla vitória ao partido
e) A lei da anistia, que permitia a volta de do governo, o PDS.
exilados políticos e isentava militares que
levar os liberais, concentrados no PP,
haviam atuado na repressão política.
para engrossar as fiteiras do PRS e for-
(PUC-RJ) Sobre o processo de abertura polí- talecer o apoio ao governo.
tica, iniciado no governo do general Ernesto ci quebrar o monopólio que o MDB exer-
Geisel (1974-1979), ANALISE as afirmativas cia na oposição, fragmentando-o em
a seguir. inúmeros partidos e evitando a sua
1. O processo de abertura política foi mar- ascensão ao poder.
cado por avanços e recuos, sendo o cha- di revigorar o PDT para que esse pudesse
mado Pacote de Abril um conjunto de enfrentar o PT nas eleições majoritárias.
medidas que representou um passo
e) utilizar os antigos militantes da UDN
atrás" na liberatização do regime.
nos quadros da ARENA para que essa,
A liberalização do regime militar ocor- fundindo-se com o PDS, vencesse as
reu na prática de forma tranquila, sem eleições para governadores.
que o governo enfrentasse a oposição
4. (FGV-SP) Em 28 de agosto de 1979, foi sancio-
de grupos que fossem contrários ao
nada pelo general João Baptista Figueiredo a
projeto de abertura política "lenta, gra-
chamada Lei da Anistia. Medida importante
dual e segura.
no processo de abertura política, tal anistia foi:
O Congresso aprovou o fim do AI-5, o fim ampla, geral e irrestrita, como reivindi-
da censura prévia e o restabelecimento cavam os setores da oposição ao regime
do habeas corpus para crimes políticos, militar.
consolidando-se, deste modo, a liberali- restrita aos militares envolvidos em as-
zação do regime. sassinatos e tortura de presos políticos
Ao longo do governo Geisel, os grupos de esquerda.
de oposição voltaram a se mobilizar, ci extensiva aos integrantes dos órgãos
destacando-se o movimento estudantil de repressão envolvidos na tortura de
presos políticos.

— 182
Responda no caderno

di extensiva aos opositores do regime con- eleições diretas depois da renúncia de


denados por crimes de sangue, seques- Jânio Quadros.
tros e atos considerados terroristas. o fim doAI-5, a volta dos direitos políticos e
e) restrita aos exilados cujos direitos po- retorno das eleições pelo voto universal.
líticos haviam sido cassados antes da ci o fim das torturas e a aprovação da lei
promulgação do AI-5. de anistia política.
di a anistia política e o retorno dos exilados
5. (Fatec-SP) O movimento denominado "Diretas
políticos para o Brasil.
já!', que começou reunindo poucos milhares
e) o fim da ditadura militar e eleições di-
de pessoas nas principais cidades brasileiras,
retas para presidente.
acabou ganhando a simpatia da maior parte
da população do país e tomou proporções
gigantescas. Esse movimento exigia:

rPara você Ler j Depois da chuva, direção de Ctáudio Marques e


Marítia Hughes. Brasil, 2013,97 mm. Em 1984, en-
quanto a população brasileira vai às ruas exigir a
volta das eleições diretas para presidente da Re-
O sindicalismo brasiLeiro após 1930. de Marcelo
pública, Caio, um jovem baiano de 16 anos, perce-
Badaró Mattos. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. O
be que vive um período de mudanças tanto em sua
livro apresenta uma análise do movimento sin-
vida pessoal quanto no contexto político do país.
dical brasileiro, desde a Era Vargas, nos anos
1930, até o surgimento do Novo Sindicalismo", Cabra cega, direção de Toni Venturi. Brasil, 2005,
movimento intimamente ligado ao processo de 107 mm. Tiago, um revolucionário que luta contra
redemocratização do Brasil. a ditadura no Brasil, é ferido em uma emboscada
da polícia e isolado no apartamento de Pedro, um
Cidadania no Brasil: o Longo caminho, de José
sim palizante da causa. Seu único contato com o
Murilo de Carvalho. Rio de Janeiro: Civilização Bra-
mundo é Rosa, que, com o passar do tempo, co-
sileira, 2010. Nesse livro, o autor relata o processo
meça a desconfiar que Pedro possa ser um traidor
de formação da cidadania no país, com enfoque na

r
luta por direitos civis, sociais e políticos.
O fim da ditadura miLitar, de Bernardo Kucinski. Para você navegar
São Paulo: Contexto, 2001. Por meio da análise Memórias ReveLadas. Disponível em: <www.memori
de acontecimentos como a campanha pelas elei- asreveladas.arquivonacional.gov.br>. Acesso em: abr.
ções diretas, as greves do ABC e o colapso do 2016. O Centro de Referência das Lutas Políticas no
'milagre brasileiro', essa obra explica por que Brasil, chamado Memórias Reveladas, procura de-
a transição política brasileira demorou 15 anos mocratizara informação contida nos arquivos sobre
para se concretizar período de 1960 a 1980 e as lutas de resistência à
Ditadura Militar Os acervos digitalizados estão sob

rIara você assistir U a administração do Arquivo Nacional.


MemoriaL da Resistência de São Paulo. Disponí-
O ano em que meus pais saíram de férias, dire- vel em: <www.memorialdaresistenciasp.org.br>.
ção de Cao Hamburguer (Brasil, 2006, 106 mm). Acesso em: abr. 2016. O Memorial da Resistência
Mauro é um menino de 12 anos que adora futebol de São Paulo é uma instituição dedicada à preser-
e jogo de botão. Em 1970, quando seus pais saem vação da memória da resistência e da repressão
de férias repentinamente, ele é deixado na casa política no Brasil Republicano [1889 à atualidade).
de seu avô. Enquanto espera o retorno dos pais O site do memorial disponibiliza diversas informa-
- que na verdade eram perseguídos políticos -, o ções sobre atividades culturais, exposições e pes-
menino acompanha os jogos da Copa do Mundo e quisas realizadas pela instituição, sobretudo no
movimento dos militares nas ruas. que se refere ao Período Militar

183
1

1
1

O direito à liberdade tem sido negado a Os palestinos vivem em campos de refu-


diversos povos, sobretudo aos que habitam giados, os curdos são perseguidos, as popula-
a região que, de forma genérica, chamamos ções vivem com medo de ataques terroristas,
de Oriente Médio. Minorias étnicas, grupos seja de homens-bombas', seja de Estados
religiosos, agremiações políticas, grande que usam a força para se impor, bombarde-
parte das mulheres e outros grupos des- ando territórios e atingindo civis inocentes. Os
favorecidos têm, em pleno século XXI, seus poucos ricos vivem de forma luxuosa, enquan-
direitos elementares negados. to muitos estão imersos na miséria.
II-

$y 4gf

Grafites com imagens de


AC soldados israelenses e
manifestantes palestinos ao
longo do controverso muro da
cidade de Belèm, 2015.

Regimes autoritários, corrupção, injusti- Neste capítulo serâo abordadas algu-


ças fLagrantes mostradas diariamente pelos mas das questões enfrentadas por diferen-
meios de comunicação revelam um quadro tes povos, trazendo algumas informações
desolador. Em muitos lugares, os direitos sobre os principais conflitos que ocorreram
civis, políticos e sociais estão longe de ser na história recente e que estão no cerne de
respeitados. A cidadania, em uma acepcão grandes problemas atuais.
plena, é ainda um ideal a ser conquistado, hoje
distante da realidade.
A criação do Estado de IsraeL
Até o fim da Primeira Guerra Mundial na Síria-Líbano (país que então englobava
(1918), parte da região que atualmente for- a Síria e o Líbano).
ma o Oriente Médio pertencia ao Império No caso da Palestina, havia um com-
Otomano. Com a derrota turca, a região plicador para a estabilidade; a crescente
foi repartida entre Reino Unido e França. presença de judeus.
Muitos árabes passaram então a resistir por Expulsos da região pelos romanos

Grupo de meio de movimentos nacionalistas, que se durante a Segunda Diáspora (aproxima-


iigrantes desencadearam em manifestações violentas damente 136 a.C.), os judeus se estabe-
judeus em
Nova York contra essas nações europeias. No início leceram em diferentes regiões. Na Europa
(EUA), 1908. da década de 1920, o Iraque e o Egito, que Feudal foram vítimas de chacinas, espe-
A violência
estavam sob tutela da Grã-Bretanha, obti- cialmente na época das Cruzadas. Quan-
contra os judeus
ao longo da veram a independência formal. O governo do o continente europeu foi assolado pela
história levou-os
britânico, porém, continuou atuando na peste negra (1348-1351), muitos judeus
a diversos
movimentos Palestina, e o governo francês permaneceu foram assassinados sob a acusação de ter
migratórios.
- envenenado os poços de água.
A saga desse povo prosseguiu;
em 1492, foram expulsos da Espanha
e, em 1496, de Portugal. Em muitos
períodos da história, os judeus foram
segregados ostensivamente na maior
- parte do mundo ocidental. Na França,
- por exemplo, só foram reconhecidos
como cidadãos com a Revolução Fran-
cesa, no final do século XVIII. Mesmo
após esse episódio, o antissemitismo
jj
'9( continuou muito forte na França, bem
como na Alemanha.
Além disso, na Europa Orien-
tal, especialmente na Rússia czarista,
ocorreram terríveis pogroms contra
comunidades judaicas, com apoio
das autoridades oficiais.

Árabe é a denominação dada ao integrante de qualquer dos povos semitas de origem arábica que
habitam a Península Arábica (localizada no sudoeste asiático, próxima ao norte da Africa) e as regiões
circunvizinhas.
O nome Palestina foi dado pelos gregos a uma região do Oriente Médio e significa, literalmente,
terra dos filisteus'. Nos dias atuais, usamos esse termo para designar os árabes que viveram ou vivem
no território da antiga Palestina, do qual grande parte pertence, atualmente, ao Estado de Israel. Há
palestinos que seguem o islamismo, os que são cristãos, os que seguem outras crenças e aqueles que
não seguem nenhuma crença religiosa.
Não há um consenso sobre a questão de quem é ou não judeu; podem ser considerados critérios étnicos,
religiosos, genealógicos e culturais para estabelecer uma definição. Há, contudo, uma proposição que, por
ser subjetiva, parece ser a melhor: judeu é todo aquele que, por uma razão ou outra, se considera judeu.

186 ::jlo7
No século XIX as ideias nacionalistas para a Liberdade de Israel), cujas ações se
estavam em voga. Nesse contexto, Theodor caracterizaram por assassinatos e atos de
Herzl (1 860-1 904),jornalistajudeu vienense, sabotagem, os repudiados até mesmo por
conseguiu projetar o movimento sionista no muitos judeus.
cenário mundial. Ele acreditava que seria No final da Segunda Guerra Mundial,
possível, por vias diplomáticas, a obtenção com a evidência dos horrores praticados
de um lar nacional judaico. contra os judeus pelo regime nazista e por
Em 1882, a comunidade judaica na seus aliados, a imigração para a Palestina
Palestina era de apenas 24 mil pessoas, aumentou substancialmente. A causa ju-
em uma população total de cerca de 600 daica despertou crescente simpatia na opi-
mil palestinos. Com a segunda imigração, nião pública internacional, o que deixou a
denominada a/já (subida a Israel), a popu- administração britânica em situação de-
lação de origem árabe percebeu as ações licada, ao mesmo tempo em que as ações
efetivas do movimento sionista e passou a terroristas dos grupos Haganah, Irgun e
pedir providências ao governo otomano; Stern passaram a ser intensificadas.
contudo, cada vez mais judeus chegavam à
Palestina, o que aumentava a tensão entre Movimento sionista é a denominação de um movi-
eles e os árabes da região. mento de defesa do direito à autodeterminação do povo
Na década de 1920, agravaram-se os judeu em um Estado judaico, a Terra de Israel. O nome
sionismo vem de Sion, um monte localizado nos arredores
conflitos entre as comunidades judaicas e
da cidade antiga de Jerusalém, na Palestina. Foi usado
árabes. Parte do movimento sionista criou
em alusão ao anseio milenar dos judeus de, após o exílio
a Haganah ("defesa", em hebraico), força forçado, retornar à terra dos seus ancestrais bíblicos. A
paramilitar que passou a atuar contra os organização política desse movimento tomou impulso
árabes e depois contra os britânicos, que, em 1897, quando Theodor Herzl organizou um encontro
por sua vez, administravam a região desde o em Basileia (Suíça), no qual foi criada a organização que
fim da Primeira Guerra Mundial e buscavam ficou conhecida como Congresso Sionista. O principal
controlaraimigraçãojudia. Em 1931, uma objetivo da organização era a obtenção de um "pedaço
de terra" para o estabelecimento de um lar nacional
cisão deu origem ao Irgun (em hebraico,
judeu. A princípio, o Estado judeu poderia ser criado em
"organização"), que incentivou a imigração
qualquer parte do mundo. O Congresso Sionista, porém,
ilegal para a Palestina e realizou ataques
decidiu que o sionismo não teria sentido longe de Sion. Os
terroristas contra árabes e britânicos. Em sionistas incentivaram os judeus a se estabelecerem na
1940, Avraham Stern, radical sionista, criou Palestina, comprando terras e formando comunidades.
a Lehi (Lohamei Herut Israel - Combatentes

2500

f 2000

1500

1000
E
E
o,
500

o
1882 1914 1931 1935 1947 1948
FontO: MASSOULIE, Fracçois. Os
conflitos no Oriente Médio. So
Porcentagem de judeus em relação à população total
Paulo: Atica, 1994. p. 65.

Conflitos regionais, fundamentaltsmo reirqioso e terrorrsmn 187


[ ... ] Em 1944, Lord Moyne, principal autoridade britânica na Palestina, foi assassinado
pelo Irgun, cujo líder, Menachem Begin, seria mais tarde primeiro-ministro de Israel. Em
1946, o Hotel King David, em Jerusalém, principal centro social e administrativo do mandato
inglês, foi atacado pelo Irgun. Uma ala inteira do prédio foi destruída por explosivos. Mor-
reram entre 91 e 99 pessoas - ingleses, árabes e judeus. Em 1947, uma bomba colocada por
militantes radicais judeus nas proximidades da Porta de 1)amasco, em Jerusalém, vitimou
15 árabes. Os árabes responderam com um atentado que matou 52 pessoas.
No ano seguinte, com a fase da guerra civil em pleno curso, um ataque conjunto do Irgun
e da Gang Stern autorizado pelo Haganá ao povoado árabe de I)eir Yassim causou a morte de
254 pessoas [ ... I. Mais que incentivo à intervenção árabe, a notícia do massacre de Deir Yassim
resultou em terror entre a população de vários vilarejos árabes, que começou a abandonar
suas casas, dando o pontapé inicial ao fenômeno dos refugiados palestinos.
SCALERCIO, Márcio. Oriente Médio: urna análise reveladora sobre dois povos condenados a conviver.
Rio de Janeiro: Campus, 2003. p. 37.

A comoção mundial em razão do Liga Árabe não aceitaram a partilha, o que


Holocausto deu à causa judaica grande gerou a Primeira Guerra Árabe-Israelense.
apoio na recém-criada Organização das Graças ao farto material bélico rece-
Nações Unidas (ONU). Em 1947, os países- bido do Ocidente, Israel venceu os países
-membros aprovaram, por ampla maioria, a árabes (Egito, Iraque, Síria, Líbano e o
partilha da Palestina. Deveriam ser criados exército da Legião da Transjordânia) e
um Estado árabe e um Estado judeu na re- ocupou terras que, de acordo com a re-
gião.Jerusalém, por ser uma cidade sagrada solução da ONU, deveriam fazer parte do
para três religiões (judaísmo, cristianismo e Estado palestino. Foi oficializado então
isLamismo), teria status internacional. o Estado da Jordânia (antiga Transjordâ-
Em 14 de maio de 1948, foi criado for- nia), e Jerusalém foi dividida entre israe-
malmente o Estado de Israel. Os países da Lenses ejordanianos.

IsLamismo é a religião muçulmana, o mesmo que Islã. O lslà é formado por dois
grupos básicos: os sunitas - maioria de 90%, governo de um consenso comunitário; e
os xiitas - minoria de 10%, dirigidos por um imã, um sucessor de Ali - genro e primo do
profeta Maomé, considerado pelos xiitas seu herdeiro legítimo. É importante lembrar que
nem todo árabe é muçulmano, e nem todo muçulmano é árabe.
IsraeLense é todo cidadão do Estado de Israel. Há israelenses árabes que, por sua vez,
podem ser muçulmanos, cristãos, agnósticos, ateus etc.

Unidade de batalha
do Haganah
posicionada na
fronteira com a
Libia. em 28 de
maio de 1948.

— 188

i,z,_ _._,,
'_ i
o
A ocupação de territórios árabes
pelos israelenses deu início ao drama dos
refugiados palestinos. Aproximadamente
750 mil pessoas saíram de casa e de suas
terras, que foram ocupadas por judeus.
De acordo com a resolução da ONU de
dezembro de 1948, os palestinos teriam
direito a retornar a suas casas, mesmo em
território de Israel, mas o primeiro-ministro
israelita, David Ben-Gurion, mostrou-se
Iviembros do recem-criado Estado de Israel reunem-se para escutar o primeiro-ministro
David Ben-Gurion ler a Declaração de lndepondi1nria Tel Aviv lsraeã. 11 raio 1 948. contrário ao regresso dos refugiados.

Organizando !dei

Leia os textos e, em seguida, faça o que se de Lamia, ou nos territorios ocupados por Israel. No
pede. entanto, quase todos os que morrem diariamente,
baleados nos confrontos de ocupação, são menores
Texto 1 de 20 anos; nasceram depois de 1967, ano em que
Acho que é preciso reconhecer a existência de uma Israel ocupou militarmente a Cisjordânia e a Faixa
terrível história de antissemitismo - principalmente de Gaza, na Guerra dos Seis Dias [veremos adiante].
um antissemitismo europeu e cristão. Na Europa, esse Alguns meios de comunicação já os chamam de "a
antissemitismo culminou no holocausto. É inaceitável geração de ocupação".
que se negue a pavorosa experiência do antissemitis- Para justificar a implantação do Estado judeu em
mo e do holocausto. Não queremos que a história do um território já ocupado por milhões de palestinos,
sofrimento de ninguém seja ignorada e não registrada. alguns dirigentes israelenses chegaram a afirmar
Por outro lado, há uma grande diferença entre se re- que a solução é uma questão de paciência, pois o
conhecer a opressão aos judeus e usar isso como um problema chegaria ao fim com a morte da geração
pretexto para a opressão de outro povo. É preciso ser expulsa de suas terras em 1948 (ano em que foi
capaz de distinguir entre o que aconteceu aos judeus criado o Estado de Israel). Equivocaram-se.
na Segunda Guerra Mundial e na Europa nos séculos "Atiramos pedras neles porque não temos ar-
de antissemitismo aberto e institucionalizado e o que mas", disse Kassam, de 18 anos, ao explicar a razão
as pessoas sentem a respeito dessa terrível ocupação pela qual arrisca sua vida enfrentado desarmado
militar e despojamento da Palestina [ ... ]. as patrulhas israelenses. Kassam nasceu no campo
de refugiados de Jebalya, em Gaza, mas seu pai já o
SAIO, Edward W. Cultura e resistência, Rio de Janeiro:
levou várias vezes, junto com seus irmãos, ao alto
Ediouro, 2006. p. 179.
do morro em Israel, para mostrar-lhe o lugar onde
ele nasceu e sua família viveu durante gerações, até
Texto 2
ser arrasada pelas autoridades israelenses, que já
O drama dos refugiados palestinos destruíram, e literalmente apagaram do mapa, mais
de mil antigos povoados palestinos.
"Não posso morrer sem voltar a Haifa e ver a casa
em que nasci." Essa frase, dita com lágrimas nos olhos BISSIO. Beatriz. Nada serã como antes. Cadernos do Terceiro
por Lamia - urna senhora idosa, que vive com a filha Mundo. Rio de Janeiro, o. 107, p. 12. 1ev. 1988.

e netos no campo de refugiados de Burj-el-Barajne,


em Beirute ao perguntarmos sobre o maior desejo O que significa antissemitismo?
de sua vida, resume o drama palestino: todo um povo
condenado ao desterro ou a viver sem identidade sob O que foi o Holocausto, citado no texto?
o jugo militar de Israel, vendo sua cultura, seu mundo,
suas casas ancestrais serem confiscadas. Os dois textos tratam de um assunto em
A maioria das crianças e jovens palestinos não comum. Que assunto é esse?
nasceu em sua pátria, mas no exílio, como os netos
Explique o termo refugiado.

189
Os confLitos árabe-israeLenses
A criação do Estado de Israel acar- países árabes conservadores, apoiou a in-
retou uma significativa mudança na re- surreição argelina e pregou o pan-arabismo
gião da Palestina, onde a tensão passou a - a necessidade de os árabes se unirem para
ser constante entre árabes muçulmanos e enfrentar o imperialismo e o sionismo.
israelenses. Além disso, Israel passou a ser Em 1955, Nasser fez um acordo militar
visto como inimigo por diversos países vizi- com a União Soviética, que forneceria aos
nhos, sobretudo Egito,Jordânia e Síria. No egípcios 120 aviões de combate, entre ou-
caso do Egito, mudanças na política inter- tros artefatos bélicos. O governo soviético
na do país aumentaram ainda mais a aver- também ajudou a financiar a construção
são ao Estado judeu. da barragem de Assuã, no Rio Nilo, com o
O Egito foi governado pelo rei Faruk objetivo de dar ao país segurança nas áreas
de 1936 a 1952, quando o monarca passou de energia e produção de alimentos.
a ser acusado de comandar um regime cor-
rupto, ineficiente e subserviente às ações es-
trangeiras no país, sobretudo de britânicos
A Guerra de Suez
e franceses. A oposição crescente culminou No aniversário da queda do rei Faruk,
em um golpe militar desfechado por oficiais em 26 de julho de 1956, Nasser anunciou
nacionalistas, que transformaram o país em a nacionalização do CanaL Marítimo de
uma República, com ambições revanchistas Suez, assim como da empresa que admi-
em relação a Israel. nistrava o canal, uma companhia anglo-
-francesa. Os governos da França e do Rei-
no Unido reagiram, chegando a comparar
Nassera Hitler.
É importante lembrar que dois terços
do petróleo destinado à Europa passavam
pelo canal, o que explica a reação das an-
tigas potências colonialistas. Além disso, o
fato de Nasser apoiar os guerrilheiros arge-
linos incomodava o governo francês, que
desejava manter uma "Argélia francesa".
O governo israelense também se sentia
ameaçado por Nasser, que, além de apoiar
incursões de palestinos em ações armadas
contra o Estado de Israel, havia adquirido
armas soviéticas.

o CanaL Marítimo de Suez é uma via


Tanques do navegável que liga o Mar Mediterrâneo
exército egípcio Carnal Abdel Nasser, o segundo pre- ao Mar Vermelho e separa o continente
em frente ao africano do asiático. Foi construído por
Banco Nacional sidente republicano do Egito, tornou-se a
do Egito após franceses, ingleses e egípcios no século
figura dominante do novo regime e anun-
a queda do rei XIX com o objetivo de encurtar as rotas
Faruk. Cairo, ciou o não alinhamento em relação às duas das viagens marítimas entre a Europa e
Egito. 27 jul. superpotências (Estados Unidos e União a Asia.
1952.
Soviética), fomentou golpes de Estado em

— 190
Reino Unido, França e Israel Firmaram aliança
visando derrubar o governo de Nasser, pois acredi- garantindo a Israel uma pausa de dez anos, traz
em si o germe de um novo conflito, já que o Egi-
tava-se que uma derrota militar desmantelaria seu
to não aceita a diferença de tratamento aplica-
poder. Para manter as aparências, em um acordo
da aos beligerantes. Os capacetes azuis da ONU
diplomático secreto, essas três nações combinaram não acampam no território de Israel, o agressor,
que Israel atacaria os egípcios, cabendo à França mas sim no do agredido [ ... I.
e à Inglaterra intervir para pôr fim à contenda. O
MASSOULIÉ, Francois. Os conflitos no Oriente Médio.
acordo foi efetivado na França, na localidade de São Paulo: Ática, 1994. p. 79-80.
Sêvres, e por isso recebeu o nome de Protocolo
de Sèvres. Com o objetivo de evitar novos conflitos na
No dia 29 de outubro de 1956, colunas de região, a ONU criou a Força de Emergência das
tanques israelenses irromperam na fronteira egípcia, Nações Unidas (Fenu), inicialmente com cerca
vencendo as forças de Nasser com certa facilidade. de 6 mil homens cedidos por vários países, inclu-
A Grã-Bretanha e a França, conforme combinado, sive o Brasil, onde o grupo enviado para a região
exigiram um imediato cessar-fogo, porém não ficou conhecido como Batalhão Suez.
atacaram Israel, a nação agressora, mas o Egito. Apesar de derrotado militarmente, Nasser
Aeroportos foram bom bardeados e a zona de Suez obteve importante vitória diplomática, emergin-
foi ocupada. Mesmo com a condenação da ONU, do como o grande líder do pan-arabismo. Sua
os invasores não se retiraram. crescente inserção no cenário internacional, como
Para a União Soviética, o conflito em Suez uma das principais vozes do Movimento dos Países
foi oportuno, pois desviou a opinião pública da Não Alinhados, conferiu-lhe grande popularidade.
repressão que as tropas do Pacto de Varsóvia
promoviam na Hungria. Diante da tensão criada,
rtormnç5o 34
os soviéticos ameaçaram atacar israelenses, fran- franco•h,itãnj Mar
C, Ido no,d'4b,O
ceses e ingleses com armas nucleares. Mediterrâneo
04
Nesse contexto, Israel, França e Grã-Breta-
1
nha recorreram à aliança com os Estados Uni- ric
dos. Contudo, o presidente norte-americano,
Dwight Eisenhower, em represália por não ter
sido consultado sobre o acordo, negou apoio
à expedição. Eisenhower estava em campanha
para a reeleição e um de seus lemas era a paz,
Kaloat
por isso não poderia apoiar a agressão de france- ol-Nakhel
ses, ingleses e israelenses, que recuaram.
Ácaba

SIt'AI

[ ... I Isoladas, a Inglaterra e depois a França t./


recuam. Vencidos nessa queda de braço pia- Dahab')
o /
netria, os dois países são afastados da região EGITO 'El-Tor
e relegados à categoria de potências mundiais s
fjn eel
528km
de segunda classe. [ ... ] No Oriente Médio, seus O 64

1:6400000
lugares serão tomados pelos Estados Unidos e
pela União Soviética. Ao contrário de seus alia- '. Colunas israelenses blindadas Controle completo do
dos de ocasião, Israel alcançou seus objetivos. Itinerários
- Sinai —3a 5de novembro

Seu exército não aceita retirar-se do Sinai e de Respostas egipcias


zonas controladas >.
Posições da ONU em 1857
Gaza a menos que seja substituído pelas forças 1De 29 a 30 de outubro
da ONU: a linha de frente com o Egito torna-se LII De 30 a 31 de outubro
-Canal de Suez
neutralizada e fica assegurada a navegação no Li De 1 a 2 de novembro
golfo de Ácaba. Porém esta semivitória, mesmo Fomu: 3lJ3'i Ge cs i3i: Atlas histórico mundial. 3. mi Barcelom: Larousse
Eclitcral. 20:1. o. 31

--: HH ................. '191


A Guerra dos Seis Dias
Na década de 1960,
enquanto os Es- A Jordânia era acusada de apoiar
tados Unidos enfrentavam dificuldades no palestinos, que faziam incursões contra o
Vietnã e os soviéticos procuravam esten- território de Israel e, muitas vezes, execu-
der sua influência no Oriente, as relações tavam cidadãos israelenses. A Síria, após
do governo israelense com seus vizinhos a ascensão do partido Baath, adotou, em
permaneciam tensas. 1966, uma postura antissionista, apoian-
do o movimento popular pela libertação
da Palestina. Já o Egito, comandado
Monte HmonÀ60 LÃ por Nasser, estreitava cada vez mais a
' •AL-Qunaytirah relação com a União Soviética, de onde
4.Aatid
comprava material bélico.
o o ISR,\EL 7
•:
Para Nasser, o controle do Sinai
Damiya
pela ONU e a internacionalização do
Mar
Mediterriiríeo
•CiSJORDÂNlA Golfo de Ácaba feriam a soberania egíp-
AIlenby
Jerúsalém cia. Além disso, preocupado com um
Port Said
Gazí
4 possível ataque israelense, ele enviou
1 Port Fuad
Ramapr - - --
Rata(Í./
militares para o sul da Península do
1
' B)t'i'i.Hommet
8irLhfan

\ ISRAEL
Sinai com o objetivo de controlar o Es-
JORE)ÂNIA
treito de Tiran, localizado entre o Golfo
Bira(a de Ácaba e o Mar Vermelho. A resposta
R0/
Suez_-i_\_.. -8irelTlIo)..
israelense foi uma guerra que começou
em 5 de junho de 1967, marcada pela
EGITO Kalaat Eilas
el-Nakhel Ácaba
rápida ofensiva israelense contra Egito,
Jordânia e Síria.
SINAl

operações israelenses
A De 5a 8 de junho (combates no Sinail
ARABIA
SAUDITA De 60 8 de junho (combates na Cisjnrdânial
, EI-Tor
$(arni De 9 a 10 de junho (combates em Golã(
128km 41 Sheikh
k::::::
- Canal de Soez
1:6400 000
Principais combates

Di.Y. :cR:es
11 ti Atlas histõrjco mundial 3. ed Barcelona: Larousse Editorial, [J Dispositivos egípcios
2fl . 3 1. em 5 de junho de 1967

A Guerra dos Seis Dias foi um conflito que ne- liberdade de navegação no estreito de Tiran e no
nhuma das partes desejava e que, ao contrário do que canal de Suez; a desmilitarização da península do
possa parecer, careceu de planejamento político e Sinai e das colinas de Golã e a não interferência no
estratégico por parte de Israel, embora muitos analis- escoamento de água das nascentes do rio Jordão. Em
tas árabes acreditassem que o conflito fora delibera- relação à Cisjordânia — que na época já tinha uma
damente provocado pelos israelenses para expandir população de 1,2 milhão de palestinos -, o gabinete
território. Contudo, a conquista da Cisjordânia e das ficou dividido entre a opção de dar autonomia aos
colinas de Golã foi definida ao longo das batalhas palestinos, mas manter o território sob controle
e não estava nos planos iniciais dos estrategistas israelense, ou devolver parte dele à Jordânia.
israelenses. Tanto é que, em 19 de junho, o gabinete
CAMARGO, Ctáudio. Guerras árabe- israelenses. In: MAGNOLI.
israelense reuniu-se e decidiu propor um acordo Dernélrjo lOrg.). História das guerras. São Paulo: Contexto,
de paz com o Egito e a Síria, retirando suas tropas 2006. p. 441-442.
das áreas ocupadas desde que fossem garantidas a

192 ríto7
Em apenas seis dias, a vitória de Israel
era incontestável. O cessar-fogo ocorreu
graças às intensas atividades diplomáticas
de soviéticos, norte-americanos e da ONU.
8 Em novembro de 1967 o Conselho de
Segurança da ONU votou a Resolução 242,
que exigia "a retirada das Forças Armadas
israelenses dos territórios ocupados". Isso
acabou não acontecendo: Israel ocupou o
Sinai e a Faixa de Gaza, territórios perten-
1 'z 1 centes ao Egito; as Colinas de Golã, que
pertenciam à Síria; e a Cisjordânia, então
sob o domínio dajordânia.

Pr:sionecro 08 ipao o olso iodo por ou do is: wiso duraste a


Guerra dos Seis Dias. Deserto do Sinai (Egito), 8 jun. 1967.

gaim udo ideias


Leia o texto e, em seguida, faça o que se pede (h) de se alcançar uma solução justa para o pro-
blema dos refugiados;
Resolução 242 do Conselho de Segurança da (c) de se garantir a inviolabilidade territorial e a in-
ONU dependência política de cada Estado da região, com me-
O Conselho de Segurança, didas que incluam a criação de zonas desmilitarizadas.
- exprimindo sua contínua preocupação com a Requer ao secretário-geral que designe um
grave situação no Oriente Médio, representante especial para ir ao Oriente Médio
- assinalando a inadmissibilidade da aquisição de com o objetivo de estabelecer e manter contatos
território pela guerra e a necessidade de trabalhar com os Estados envolvidos, a fim de favorecer um
por uma paz justa e duradoura em que cada Estado acordo e ajudar nos esforços para se alcançar uma
da região possa viver em segurança, solução pacífica e aceita, de conformidade com as
- assinalando ainda que todos os Estados-Mem- disposições e princípios desta Resolução;
bros, com a aceitação da Carta das Nações Unidas, Requer ao secretário-geral que apresente
assumiram o compromisso de agir de acordo com ao Conselho de Segurança, logo que possível, um
o artigo número dois da Carta, relatório sobre o progresso dos esforços do repre-
1. Afirma que o cumprimento dos princípios da sentante especial.
Carta exige o estabelecimento de uma paz justa e
CONSELHO da ONU. Resolução 242 do Conselho de
duradoura no Oriente Médio, que inclui a aplicação Segurança da ONU apud BISHARA, Marwan, Palestina/Israel:
dos seguintes princípios: a paz ou o aparlheid. São Paulo: Paz e Terra, 2003. p. 189-190.
a retirada das Forças Armadas de Israel dos
territórios ocupados durante o recente conflito; Comente a participação da ONU nos conflitos
II. a cessação de qualquer declaração ou estado de do Oriente Médio até a publicação do texto,
beligerância, respeito e reconhecimento da sobera- em 1967.
nia, integridade territorial e independência política
de cada Estado da região e de seu direito de viver em Qual é o objetivo do texto publicado pela
paz no interior de fronteiras seguras e reconhecidas, ONU?
livres de ameaças ou de atos de força.
Afirma ainda a necessidade: Em sua opinião, o que significa 'Uma paz
(a) de garantir a liberdade de navegação pelas justa e duradoura' no Oriente Médio? Essa
vias marítimas internacionais na região; paz já foi consolidada? Explique.

193
2 Viajando pela históra
De onde surgiu o Entre os séculos XI e XIII, o grupo co-
nhecido como Assassinos ficou marcado
terrorismo?
por atuar de maneira violenta em ações
A palavra terrorismo tem vários signi- contra a ordem política e religiosa vigente
ficados. no Oriente Médio. A fama do grupo cresceu
Terrorismo pode ser entendido como nos séculos seguintes, o que pode serjustifi-
coação, ameaça ou influência de outras cado pela associação da organização a prá-
pessoas por meio da imposição de sua von- ticas terroristas e pelo fato de seus integran-
tade ou pelo uso sistemático da violência, tes serem considerados fanáticos religiosos
e também como uma ação política que radicais, dispostos a fazer qualquer coisa em
combate o poder estabelecido mediante o defesa de suas crenças.
emprego de atos violentos. Muitos governos A origem da palavra assassinos está
já recorreram ao terror - portanto, à vio- nos termos árabes assaci, assasiou hassassi,
lência - para se manterem no poder, assim que significam haxixe, ou seja, assassinos
como grupos de diversas correntes ideológi- eram aqueles que consumiam haxixe, um
casjá usaram a estratégia da violência para alucinógeno. Conta-se que, sob o efeito
promover a luta em torno de uma causa. de haxixe, o futuro fedayiri (aquele que se
Ao longo da história, grupos diversos sacrifica) era levado para um ambiente
usaram métodos terroristas. Quando os paradisíaco formado por belas mulheres,
romanos ocuparam aJudeia no século 1 da jardins floridos e fontes de águas límpidas.
Era Cristã, surgiram os sicários, homens que Durante ojuramento de lealdade, garantia-
usavam adagas curvas chamadas de "sicas". -se que aquele que morresse pela causa
Eles objetivavam abalar o domínio romano viveria nesse local eternamente.
por meio do terror. Incitavam rebeliões, A seita sobreviveu por cerca de 166
executavam autoridades romanas e assassi- anos, até que os mongóis tomaram a for-
navam indiscriminadamente todos que com- taleza, considerada o centro de operações
pactuavam com a dominação estrangeira. da organização.

Quanto ao lugar dos Assassinos na história do e violência intencional, não teve nenhum para-
Islã, quatro coisas podem ser ditas com razoável lelo nos tempos antigos ou posteriores; a quarta
segurança. A primeira é que seu movimento - o questão, e talvez finalmente a mais significativa,
que quer que sua impetuosa força possa ter sido é o seu fracasso final e completo. Os Assassinos
- foi encarado como uma profunda ameaça à or- não derrubaram a ordem existente; não tiveram
dem existente, política, social e religiosa; a segun- êxito em conservar sequer uma única cidade de
da é que eles não são nenhum fenômeno isolado, qualquer tamanho. [ ... ] No entanto, a propensão
fazendo parte de uma longa série de movimentos oculta de esperança messiânica e a violência re-
messiânicos, a um tempo populares e obscuros, volucionária que os iinpelira continuaram, seus
impelidos por angústias profundamente enrai- ideais e métodos encontraram muitos imitadores.
zadas e, de quando em quando, explodindo em Para estes, as grandes mudanças do nosso tempo
sublevações de violência revolucionária; a terceira proporcionaram novas causas para a ira, novos
é que Hassan bin Sabbah e seus seguidores foram sonhos de realização, e novos instrumentos de
bem-sucedidos em reformar e dar um novo senti- ataque.
do aos vagos desejos, às crenças rebeldes e à raiva
LEWIS. Bernard. Os Assassinos: os primórdios
sem objetivo dos descontentes, em uma ideologia
do terrorismo no Islâ. Rio de Janeiro:
e em uma organização que, em coesão, disciplina Jorge Zahar Editor. 2003. p. 156.

194 iito 7
Organizando ideias
Leia ostextos e, em seguida, faça o que se pede atento não apenas para meus próprios preconcei-
tos, mas para qualquer generalização.
Texto 1
Alguns muçulmanos que conheci acreditavam
Quem são e o que querem os grupos efetivamente que o Corão, o seu livro sagrado, era
extremistas que propagam o terror? um projeto para a sociedade que podia e precisava
Grupos como Estado Islâmico, Al-Qaeda, Ta- realizar-se na Terra. Outros amavam e admiravam
libã e Boko Haram geralmente se consolidam em os ensinamentos do Profeta Maorné, mas compre-
regiões de minorias excluídas, dentro de países endiam a impossibilidade de implementá-los no
que até hoje são ditaduras, monarquias absolu- mundo moderno. Havia aqueles desprovidos de
tistas e com histórico de violação dos direitos uma genuína fé, mas que se alimentavam do lega-
humanos, afirma Jorge Mortean, professor de do cultural e histórico do Islã, de que se sentiam
relações internacionais da Fundação Armando orgulhosos em compartilhar.
Álvares Penteado (Faap) e mestre em estudos re- [... ] Urna quantidade ainda menor buscava a ex-
gionais de Oriente Médio pela Academia Diplo- pansão da sua religião por todo o mundo. E muitos
mática Iraniana. punham-se na defensiva, preocupados com o im-
Eles são a origem de outras células terroristas e pacto do que consideravam um "Ocidente" agres-
também formam alianças ou dão apoio institucio- sivo e belicoso contra suas culturas e sociedades.
nal uns aos outros. Mas uma proporção igualmente grande - muitas
vezes as mesmas pessoas - também se sentia atra-
II ... ]
Em comum, esses grupos têm o fundamen- ída e inspirada por esse "Ocidente". Poucos eram
talismo religioso, baseado em uma interpretação levados à violência. Comecei aos poucos a me dar
radical da lei islâmica. "Porém eles para nada re- conta de que o "Islã" era um rótulo que se podia
presentam o Islã", enfatiza Mortean. "O problema aplicar a muitas coisas, sem que descrevesse ade-
não é o Islã, são as forças políticas que usam o Islã quadamente nenhuma delas.
para se manterem ditatoriais e que, majoritaria- BURKE, Jason. A caminho de Cabul e Bagdá:
relatos dos conflitos no mundo islâmico.
mente, foram financiadas pelos países que hoje Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 29-30.
sofrem com esses grupos."
Reflita e responda: Porque esses grupos são
Gi, 27
nov. 2015. Disponível em: <http://g.gtobo.com/
mundo/noticia/201 5/1 1/quem-sao-e-o-que- chamados de extremistas?
querem-os-grupos-extremistas- que- propagam-
o-terror.htmt>. Acesso em: abr. 2016. Existe uma relação entre os grupos citados
Texto 2 tEstado Islâmico, AI Qaeda, Tatibã, Boko
Haram)? De acordo com os textos, eles
Uma visão sem preconceitos podem ser considerados representantes do
[ ... ] Hoje vejo que a viagem ao Curdistão foi o Islã? Justifique.
início de um longo processo de aprendizado, cuja
grande lição é que a expressão "mundo islâmico" 3.A reportagem do texto 1 foi feita em 2015.
não se refere a um bloco monolítico uniforme em Esses grupos continuam agindo atualmente?
que criaturas esquisitas chamadas muçulmanos Faça uma busca on-line sobre as ações des-
levam suas vidas de acordo com uma religião mis- ses grupos no mundo e anote as principais
teriosa e reacionária, mas a uma imensa entidade informações. Apresente-as em sala de aula.
variada, dinâmica, espiritual, cultural e política
4. Qual é a visão apresentada pelo autor do
que desafia uma definição geográfica, étnica ou
texto 2 sobre o Islã?
racial. A experiência também me ensinou a estar

Conflitos regionais, fundamentalismo religioso e terrorisr: 195


Da Guerra do Yom Kippur aos acordos
de Camp David
Em 1970 o presidente do Egito, Ga- ria demonstrar ao governo de Israel que
mal Abdel Nasser, faleceu e o vice-presi- Egito estava fortalecido militarmente
dente, Anwar el-Sadat, assumiu o poder. - com uma prova de força seria possível
Em 1971 Sadat começou a falar em paz conseguir um acordo de paz.
e estabeleceu contatos secretos com a Em 6 de outubro de 1973, no feriado
diplomacia norte-americana. Para provar judeu do Yom Kippur (Dia do Perdão), um
suas intenções, em julho de 1972, anun- ataque aéreo organizado por Egito e Síria
ciou que os assessores soviéticos não deu início a outro conflito armado. Conco-
eram mais necessários. Paulatinamente, mitantemente, tropas egípcias começaram
país se afastou de Moscou. Contudo, a cruzar o Canal de Suez. Em outro cenário,
enfrentou problemas, pois o governo tropas sírias atacaram Golã. Pegos de sur-
israelense não atendeu aos apelos do presa, os israelenses tiveram de recuar. Em
presidente egípcio, e os norte-americanos Israel, os serviços de segurança e o governo
pouco ajudaram o novo aliado. Sadat sofreram duras críticas, pois desconheciam
acreditou que, por meio da guerra, pode- as ações do inimigo.

341 LÍBANO ÁMnte Hermon


AL-Quanytir.ah/.
Zona controlada pela /
ONU —5 de junho de 1974
o i.GOLÃ
ISRAEL
Mar SlA 7-
Mediterrâneo

Zona controlada pela CISJORDÂNIA


ONU —18 de janeiro de 1974 /
'TóJerusalém
Gaza.
Port Said •. :/ ,

[J Territórios ocupados por


Israel desde o final da
JORDÂNIA
isrnaijiaI—
\ [Õ~r
Guerra dos Seis Dias
Posições da ONU em 1974
operações
3OA
Su? Do Egito no canal -
6 a 15 de outubro
Eilat W / caba Da Síria no Galã -
6 a lide outubro
respostas israelenses
EGITO
No Gola - 11 de outubro
N
0e15 a20 de outubro -

O- 1 _/-' ARÁBIA exércitos egipcios


SAUDITA Posições israelenses a
oeste do Canal de Soez
km
Intervenções da ONU
- Canal de Sues

Forno: )J3 Geo: es ;. Atlas histórico mundial. 3. ad. Barcelona: Larousse Editorial. 2011. p. 311.

196 .to7
, v

tI

/ / 1

--

-
-
Misseis lis abíicdçao 50. eLca Es 5 cxi oicso durante parada wiHar no bali o. Lgito ao aniversario de Ires anos do inicio da guerra
com Israel. Ao fundo, o Monumento ao Soldado Desconhecido, 7 out. 1976.

Enquanto os sírios foram apoiados pela Egito e Israel, sem alterar imediatamente a situa-
União Soviética, tendo recebido um armamento ção dos territórios ocupados, pois Israel apenas
sofisticado, os israelenses contaram com o apoio devolveria o Sinai em 1982.
do Estados Unidos, que atenderam ao pedido Uma importante consequência da Guerra
da primeira-ministra israelense, Golda Meir, e do Yom Kippur foi a Crise do Petróleo. Os países
enviaram armas de última geração a Israel. Esse árabes, diante do apoio dos países capitalistas a
auxílio estadunidense foi importante para que os Israel, usaram o petróleo como arma econômica e
israelenses pudessem rapidamente organizar uma diplomática, boicotando a distribuição do produ-
poderosa contraofensiva. Assim, sírios e egípcios to. Os preços dispararam de 2,90 dólares o barril,
sofreram sucessivas derrotas até que o conflito em setembro de 1973, para 11,65 dólares o barril,
fosse interrompido graças a novas negociações em dezembro do mesmo ano. Em 1974, os efeitos
de paz, que ocorreram, mais uma vez, com forte da crise causaram a desestabilização da economia
intervenção dos EUA, da URSS e da ONU. mundial e forte recessão.
A Guerra do Yom Kippur não alterou territó-
rios, pois os israelenses continuaram ocupando as Organizando ideias
áreas invadidas em 1967. Contudo, o Egito provou
O que foi a Guerra do Yom Kippur?
que tinha uma força militar respeitável. Em par-
te, Sadat conseguiu seu principal objetivo: definir Explique e coritextualize a frase de Sadat:
uma posição de relativa força para negociar. "Não pode haver felicidade para ninguém
Em 1978, os líderes do Egito, Anwar el-Sa- à custa da miséria de outrem.
dat; de Israel, Manachem Begin; e dos Estados
Unidos,Jimmy Carter, reuniram-se em Camp Da- De acordo com as observações do último
vid (EUA) para negociar um acordo entre árabes parágrafo do texto, o petróleo é uma rique-
e israelenses. Os acordos de paz de Camp David za usada em benefício de todos? Explique.
foram assinados em 1979 e selaram a paz entre

197
 questão paLestina
Com a criação do Estado de Israel e a Primeira causa palestina por meio de ações armadas. Entre
Guerra Árabe-Israelense, cerca de 750 mil refugia- seus principais fundadores estava o engenheiro
dos foram instalados, em caráter provisório, em Yasser Arafat.
território jordaniano. Nos anos seguintes, milhares Os palestinos atacavam alvos israelenses lo-
de palestinos passaram a viver na Síria, no Egito, calizados em Gaza e na Cisjordânia. Muitas vezes,
no Líbano e nos demais países da região. Muitos a repressão foi desproporcional ao ataque sofrido,
também emigraram para a Europa e para o con- como em 1953. Na ocasião, um grupo palestino
tinente americano. atacou o território, vitimando uma mulher e seus
A resistência palestina começou antes da dois filhos. O Mossad, serviço secreto de Israel,
formação do Estado de Israel e passou por várias fundado em 1951, descobriu que os atacantes
etapas, até chegar ao estágio atual. Durante longo haviam saído de Qibya, na Jordânia, e então a
período, os grupos palestinos não aceitaram a Unidade 101, comandada pelo majorAriel Sharon,
partilha do território pela ONU, negando, por- atacou o lugarejo explodindo casas e matando 69
tanto, o direito de um lar nacional para os judeus. civis, a maioria mulheres e crianças. Ações como
Em 1959,
foi criada a AI Fatah ("vitória" ou "con- essa aumentaram ainda mais as tensões entre os
quista"), cujo principal objetivo era manter viva a dois grupos ao longo dos anos.

Ç Mulheres palestinas exibem


cartazes com o retrato de Yasser
Arafat em manifestação em favor
de palestinos presos em Israel.
Faixa de Gaza, nov. 2014.0 mês
de novembro marca o aniversário
da morte do líder palestino, ainda
muito lembrado.

Ações do Mossad cientistas alemães que desenvolviam um programa


O Mossad, criado praticamente em paralelo balístico no Egito, vários dos quais foram assassi-
com o Estado israelense, ficou conhecido por suas nados. Mas muitas de suas missões notoriamente
missões arrojadas, como o sequestro na Argenti- fracassaram, entre elas o ataque a instituições dos
na, em 1960, do criminoso de guerra nazista Adolf Estados Unidos no Cairo, que visavam torpedear a
Eichmann, levado a julgamento em Israel; a solu- aproximação entre os dois países, e mais recente-
ção do sequestro de um avião por terroristas árabes mente a tentativa de envenenamento de um líder
no aeroporto de Entebbe, Uganda, em 1976; e a in- palestino na Jordânia.
filtração de um espião junto às forças de segurança
FELDBERG, Samuet. Terrorismo contemporâneo. História Viva.
egípcias, que permitiu a descoberta da atividade de São Paulo, Duetto Editorial, ano III, n. 28, p. 35.

198 '1107
Em 1964 foi criada no Cairo, capital do Egito, a
Organização para a Libertação da Palestina (OLP), 1H
de cunho nacionalista, com o objetivo de reunir os
diversos grupos palestinos e apoiadores em uma 1H =
frente única a favor dos palestinos e contra Israel.
A liderança de Ahmad Chukeiri foi logo superada
por Yasser Arafat, que, por meio de ações armadas,
procurava chamar a atenção do mundo para o pro-
blema palestino. Contudo, os palestinos estavam
longe de unir-se. Por motivos ideológicos, pessoais
e também em razão das divisões entre os países
árabes, surgiram grupos rivais entre os próprios
palestinos, como a Frente Popular para a Liberta-
ção da Palestina (FPLP), em 1967, de inspiração
marxista-leninista e liderada por George Habash.
Em setembro de 1970, os palestinos que
viviam najordânia tentaram impor sua política
ao rei Hussein. Estabeleceu-se um conflito entre
os guerrilheiros palestinos e o exército jordania-
no, no qual cerca de 10 mil palestinos foram
mortos. A OLP foi expulsa dajordânia e o epi-
sódio passou a ser chamado pelos palestinos de
Setembro Negro.
No final da década de 1960 e durante a
Terrorista árabe do grupo Setembro Negro em ataque às acomodações de
década de 1970 o terrorismo internacional foi Israel na Vila Olímpica de Munique (Alemanha). em 5 de setembro de 1972.
bastante atuante. A maioria dos grupos era da
esquerda radical, como as Brigadas Vermelhas na
Itália; a Fração do Exército Vermelho (em alemão, Israel soube usar o atentado em Munique para
Rote Armee Fraktion - RAF), também conhecida incriminar os palestinos e aplicar uma política de
como grupo Baader-Meinhof, liderado por Andreas retaliação crescente. A primeira-ministra do país,
Baader e a jornalista Ulrike Meinhof, e grupos de Golda Meir, criou um comitê governamental que
cunho emancipacionista como o ETA, na Espa- encarregou o Mossad de matar todo membro do
nha, e o IRA, na Irlanda do Norte. Setembro Negro que estivesse envolvido direta ou
Algumas organizações palestinas optaram indiretamente no atentado - era a vingança israe-
por ações terroristas. A Frente Popular para a lense. Foram assassinadas 36 pessoas. Nem todas
Libertação da Palestina sequestrou aviões e as- elas, porém, tinham vínculo direto com o grupo.
sassinou personalidades ligadas a Israel, além de
executar palestinos dissidentes.
Durante os Jogos Olímpicos de 1972, em
L Pausa para investigação
5 de setembro, oito terroristas invadiram o Organize-se em grupo e, juntos, Localizem
alojamento israelense na Vila Olímpica, em Mu- em jornais, revistas e na internet reporta-
nique, autodenominando-se Setembro Negro. gens, artigos e imagens sobre a situação
Mataram dois membros da delegação israelense atual na região de conflito Israel/Palestina.
e fizeram nove reféns. Exigiram a libertação de Escolham no méximo três fontes de infor-
234 palestinos presos em Israel e mais dois líde- mação e façam um trabalho escrito, incluindo
res do grupo Baader-Meinhof. As negociações as reportagens e, em seguida, as conclusões
fracassaram. O saldo foi de 11 atletas e cinco do grupo a respeito do assunto.
terroristas mortos.

199
IsraeLenses e paLestinos em confronto
Em dezembro de 1987 a frequente opressão luta armada e aceitou o direito de existência do
sofrida pelos palestinos fez irromper a Primeira Estado de Israel. Contudo, a invasão iraquiana
Intifada nos territórios ocupados por Israel. Ata- do Kuwait, em 1990, colocou as negociações
cados por pessoas comuns, na maioria jovens, em pausa. Na ocasião, Arafat apoiou o gover-
sem nenhum preparo militar, os israelenses res- nante iraquiano, Saddam Hussein, atitude que
ponderam com violência. Imagens do ocorrido impossibilitou o diálogo com os EUA. Além de
foram veicu ladas em diversos lugares do mundo e ter afinidades religiosas com Saddam Hussein,
atraíram a atenção internacional para a causa pa- os palestinos questionavam a imparcialidade dos
lestina, o que aumentou as pressões sobre Israel. Estados Unidos e da ONU quando se tratava das
A lntifada provocou mudanças significativas ações israelenses na Palestina. Leia, a seguir, os
no movimento político palestino. Considerada argumentos de um palestino sobre essa questão.
omissa por parte da comunidade palestina, a OLP
perdeu popularidade e foi fundado, na Faixa de
[ ... ] As massas árabes percebiam que os EUA
Gaza, o Hamas (Movimento de Resistência Islâ-
impunham um padrão duplo. As violações das
mico), de caráter mais radical.
leis internacionais pelo Iraque foram punidas
Em 1988, objetivando obter apoio dos Es- sem misericórdia e as resoluções da ONU foram
tados Unidos para a causa palestina, o Conselho impostas à força, mas a desobediência das reso-
Nacional da Palestina, órgão da OLP, abdicou da luções da ONU por Israel, que fazia troça das
Nações Unidas desde 1949, era ignorada. Israel
vinha ocupando território ilegalmente, anexan-
do terras e desafiando a ONU havia décadas,
mas nenhuma sanção punitiva era imposta ao
país. Além do mais, Israel tinha capacidade nu-
clear, que não havia sido sujeita às mesmas in-
vestigações por inspetores de armas impostas ao
litardolraque.

OHN-SHERBOK, Dan; EL-ALAMI, Oawoud.


O conf1to lsraet-Palestina: para começar a entender...
o Pauto: PaUndromo, 2005. p. 191.

O então presidente dos Estados Unidos,


\'»/jlliam jefferson Clinton (conhecido como BilI
Clinton), procurou resolver antigas pendências
no Oriente Médio, pois as principais negociações
haviam sido estabelecidas em Madri, Oslo e Wa-
shington durante o governo de seu antecessor,
George Bush (1989-1992).
Em setembro de 1993, Clinton reuniu na Casa
Soldados israelenses enfrentam manifestantes palestinos nas ruas de Branca o primeiro-ministro israelense, Yitzhak Rabin,
Nablus. Cisjordânia. 1988. e o líder da OLP, Yasser Arafat. De um lado, o acordo
procurava fortalecer a segurança de Israel; de outro,
aumentava a expansão da área de controle palestino
As intifadas foram rebeliões popu lares de
palestinos que, munidos de pedras e pedaços na margem ocidental do Rio Jordão. O líder palesti-
de madeira, enfrentavam o exército armado no reconheceu o Estado de Israel, e o israelense, por
israelense. sua vez, deixou em aberto para uma próxima etapa a
discussão sobre a formação de um Estado palestino.

- 200
No ano seguinte, a Jordânia assinou um tratado sociedade israelense, e Arafat, por sua vez, não
com Israel e autoridades israelenses demonstraram tinha poder para controlar os radicais palestinos.
a intenção de devolver as colinas de Golã à Síria. Em Israel, a oposição cresceu, culminando com
Apesar das limitações, era um bom começo para um assassinato de Rabin (em 4 de novembro de
acordo de paz. 1995) por um estudante judeu ortodoxo.
Para muitos palestinos, Arafat fizera muitas O novo primeiro-ministro israelense, Shimon
concessões e pouco obtivera, pois mesmo nos Peres, tentou, sem sucesso, levar adiante o pro-
territórios devolvidos os palestinos continuavam cesso de paz. Leia a análise de um judeu sobre
subordinados, econômica e militarmente, a Israel. essa questão.
O problema dos refugiados, dos assentamentos
judeus e da soberania palestina estava longe de Apesar do luto, o processo de paz foi in-
qualquer solução. terrompido quando um graduando da uni-
Já em Israel, o Partido Likud (conservador), versidade da Margem Ocidental foi morto na
os partidos religiosos e grupos partidários de um cidade de Gaza, em 5 de janeiro de 1996. No

"Israel grande", como nos tempos bíblicos, viram mês seguinte, em um atentado suicida, um ter-
rorista matou 25 pessoas num ônibus em Jeru-
nas ações de Rabin um sinal de fraqueza, colocan-
salém. Mais tarde, no mesmo dia, outro suicida
do o Partido Trabalhista na defensiva.
explodiu-se num ponto de ônibus, matando
Para agravar a situação, multiplicaram-se um israelense. O conselheiro de Arafat, Ahmed
os atentados em território israelense realizados Tibi, condenou os assassinatos, insistindo que
pelos movimentos integristas, especialmente o a onda de terrorismo deveria chegar ao fim.
Hamas e a Jihad Islâmica. Homens-bombas ex- Apesar de seu apelo, treze israelenses foram
plodiam em locais públicos matando civis. Em mortos em 13 de março num atentado suicida
em Jerusalém. No dia seguinte, outro atacante
um atirador israelense abriu
fevereiro de 1994,
suicida explodiu-se em meio a uma multidão,
fogo contra palestinos que estavam em uma mes-
matando dezoito pessoas.
quita na cidade de Hebron, matando 25 pessoas.
COHN-Sl-IERBOK, Dan, EL-ALAMI, Dawoud.
Os partidários de uma solução negociada,
O conflito Israel-Palestina: para começar a entendee..
de ambos os lados, perderam popularidade. São Paulo: Palíndromo. 2005. p. 191.
Rabin foi pressionado por amplos setores da

Nas eleições de maio de 1996 em Israel,


vencedor foi Benjamin Netanyahu, do Par-
tido Likud, o que agravou ainda mais as re-
lações com os palestinos. A transferência de
territórios foi interrompida e o círculo vicioso
dos atentados terroristas palestinos, segui-
dos das ações bélicas de Israel, tornou-se a
tônica. Em 1999, a volta dos trabalhistas ao
poder, com o primeiro-ministro Yehud Barak,
representou a retomada das negociações.
Contudo, a visita do conservador ministro
israelense Anel Sharon, com soldados arma-
dos, a al-Haram al-Shanif(Haram é uma pla-
taforma onde estão situadas duas grandes
mesquitas, Al-Aqsa e o Domo da Rocha) deu
início à Segunda lntifada, em 2000.
Anel Sharon venceu as eleições e tor-
nou-se primeiro-ministro de Israel em 2001.
Estudantes acendem veles em homenagem ao primeiro-ministro israelense, Yitzhak
Rabin. no Museu da Tolerância. Los Angeles (EUA). 6 de novembro de 1995. A Intifada continuou por todo o verão

201
daquele ano e Sharon tentou desacreditar a Auto- deveriam pertencer aos palestinos. Pior ainda,
ridade Nacional Palestina e seu líder, Arafat, afir- novos assentamentos foram construídos.
mando que ele não tinha controle sobre seu povo. A construção de um muro de segurança de
Era uma forma de brecar as negociações. mais de 700 quilômetros, erguido por Israel
Após os acordos de 1993,
o processo de paz na Cisjordânia, isolando milhares de palesti-
pouco avançou. Yasser Arafat faleceu em 2004. nos. Segundo as autoridades de Israel, a razão
Anel Sharon deixou o cargo em dezembro de é evitar a entrada de terroristas no país. Já os
2005. Novas tideranças surgiram. A invasão de palestinos afirmam que essa ação visa conso-
Israel ao sul do Líbano em 2006 (que resultou em lidar o domínio de assentamentos ilegais de
mais de mil mortos, dez árabes para cada israe- colonos judeus em territórios que deveriam ser
lense) e os confrontos entre o Hamas e a Fatah entregues aos palestinos.
são episódios que indicam que a paz está longe de A questão dos refugiados palestinos e seu so-
ocorrer. Algumas razões estão descritas a seguir. nho de retornar à pátria não tem sido objeto
A oposição de Israel à evacuação dos territórios de discussão.
ocupados desde 1967, como determinado em O Hamas não reconhece a existência do Estado
uma resolução da ONU. de Israel. Ao visitar Gaza, em 8 de dezembro de
Os palestinos não aceitam a formação de um Es- 2012, o líder do movimento islamita Khaled
tado constituído por uma série de enclaves, se- Meshaal fez um discurso convocando seus se-
parados uns dos outros por território israelense. guidores a "libertar toda a Palestina" e descar-
A recusa de Israel em desmantelar assenta- tando a possibilidade de reconhecer o direito
mentos ilegais construídos em territórios que de Israel ser um Estado soberano.

. H
-

-
!b -

Paes[inos queinnm pneus e atuam pedras contua meíabros das forças de segurança israelenses na Faixa de Gaza, 2015.

A Glossário- -----..------- -- --

Enctave: terreno cercado por território alheio.

202 Cratulo7
Em 29 de novembro de 2012 a Assembleia que, de acordo com o direito internacional, os as-
Geral da ONU aprovou a Palestina como Estado sentamentos são ilegais.
observador. Esse reconhecimento dá a seu governo o Apesar dos poucos avanços nos últimos anos,
direito de participar das agências da ONU e doTri- já existem representações diplomáticas da Pales-
bunal Penal Internacional, com sede em Haia. Como tina em diversos países. No âmbito esportivo, os
Israel tem violado sistematicamente as normas mais palestinos têm participado de várias competições
elementares do Direito Internacional, deverá, no oficiais, como as eliminatórias asiáticas para a
futuro, responder por suas ações, especialmente as Copa do Mundo de Futebol. Ainda assim, as
que afetam indiscriminadamente a população civil. perspectivas para o futuro da região são incertas.
No mesmo dia, o primeiro-ministro de Israel, A necessidade de uma solução para essa
Benjamin Netanyahu, declarou que "nada vai questão se torna cada vez mais evidente, tanto para
mudar" e anunciou a retomada das obras israelenses quanto para palesti nos. A obtenção de
em assentamentos nos territórios ocupados. um acordo definitivo de paz é possível, mas não
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, lembrou sem que haja um grande esforço diplomático.

Organizando ideias
L

Leia o texto e faça o que se pede. pessoas de temperamento racional e capazes dccxc-
cutar tarefas sem se deixar paralisar por emoções. Os
Os que se matam por uma causa
famosos camicases japoneses dalI Guerra Mundial
Ninguém discute sua eficácia. Eles são mais pre-
tinham o direito de recusar, sem nenhum demérito
cisos e letais que os mísseis guiados por satélites e
para sua honra pessoal, a missão suicida de atirar seu
refinados sistemas de navegação. 1...] Mas o que faz
avião carregado de bombas contra os navios inimi-
um homem ou, cada vez mais agora, uma mulher
gos. Os chefes do esquadrão camicase, tecnicamente
anular o instinto mais forte, o da sobrevivência, e
chamado de Unidade de Dano Corporal, aceitavam
aceitar se matar por uma causa? [ ... ]
apenas pilotos absolutamente convencidos de seu
O suicida político não se parece em nada com
papel divino de entregar a vida para defender o im-
aquele que, em um ato solitário, tira a própria vida por
perador. Não faltavam voluntários. Só na batalha de
não mais suportá-la. O arcabouço psicológico dos que
Okinawa, em abril de 1945, 2 mil deles se lançaram
se matam por uma causa também não tem paralelos
com seu avião contra trezentos navios americanos,
com o fanatismo religioso de seitas cujos seguidores se
causando mais de 5 mil mortes.
imolam em busca de um atalho que apresse sua che-
gada a algum plano espiritual superior. Como define RIBEIRO, Antônio. Estudo mostra como funciona a
cabeça dos suicidas polêmicos. Veja, São Pauto, Abril
historiador francês [François Géré], o extremista ComunicaçõesS/A, n. 1841. p. 60-61, íev. 2004.
político se mata não porque ele esteja mal, mas porque
mundo precisa ser modificado. "Nesse particular, Quem são "os que se matam por uma causa"?
ele é um otimista, um bravo, um combatente cujo ato
Por que o autor do texto compara os homens-
ele vê aparentado com a bravura militar", disse Géré a
-bombas a mísseis?
Veja. Uma das características comuns mais marcantes
do suicida com causa deriva dessa condição, e ela tem 3 Diferencie o suicida comum do suicida político.
fundas razões econômicas. Os legionários romanos
possuíam as próprias brigadas suicidas, formadas 4. Levante hipóteses sobre por que essas pes-
por escravos e condenados que aceitavam morrer em soas se propõem a morrer pela causa que
troca de garantia de uma vida econômica segura para defendem.
seus familiares. A recompensa à família do suicida na
S. Observe nos noticiários se houve recentemen-
Palestina não vem também apenas na forma de exal-
te casos de atentados terroristas provocados
tação póstuma do mártir. Os serviços secretos de Israel
afinnam que os familiares chegam a receber de 100.000 por homens-bombas e onde ocorreram.
a 150.000 dólares pela entrega de um mártir à causa. Depois converse com os colegas a respeito e
Por essa razão também o terrorista que se explo- anote suas conclusões sobre o terrorismo e
de para infligir dano ao inimigo é recrutado entre os suicidas políticos.

203
 RevoLução Iraniana
O lrã era governado desde 1925 pela Dinas- mento estava o aiatolá (significa "espelho de Deus",
tia Pahlevi. Em 1941, Mohammed Reza Pahlevi perito em religião e direito islâmico) Ruhollah Kho-
substituiu seu pai, Reza Khan, que demonstrara meini, que partiu para o exílio em 1964.
simpatia pelas nações do Eixo (Alemanha, Itália Entre 1963 e 1973, a economia iraniana
e japão) na Segunda Guerra Mundial. Reza Pah- desenvolveu-se, mas a maioria da população não
levi, por sua vez, permitiu o avanço dos interesses usufruiu desse progresso. A repressão era a res-
ingleses e, depois, dos norte-americanos no país, posta a todo e qualquer protesto contra o regime.
especialmente no setor petrolífero. Na clandestinidade, oTudeh (Partido Comunista
Na década de 1950, o primeiro-ministro Iraniano) tentava, sem sucesso, desestruturar o
Mohammed Mossadegh nacionalizou o petróleo governo. Com a crise do petróleo, a renda petro-
iraniano, mas foi deposto e preso. A partir de en- lífera iraniana saltou de 3,5 bilhões de dólares em
tão, o xá (monarca iraniano) Reza Pahlevi passou 1973 para 30 bilhões de dólares em 1977. Todo
a governar de maneira cada vez mais autoritária, esse dinheiro era gasto na compra de armas e para
reprimindo os movimentos populares. manter o luxo de uma restrita classe dominante,
Na década de 1960,
com o apoio dos Estados que vivia de modo similar aos ocidentais, enquanto
Unidos, país para o qual vendia petróleo e do qual as grandes massas viviam na pobreza.
comprava armas, o xá iniciou um programa de ino- Entre outubro de 1977 e fevereiro de 1978,
vações, que incluía uma reforma agrária e intensa intensas manifestações popu lares propagaram-se
campanha educativa e sanitária. Seu objetivo era no Irã. Estavam contra o xá: o clero islâmico; os
tornar o país laico e desenvolvido, em uma ótica partidos de esquerda, especialmente oTudeh; os
modernizadora, o que desagradou ao clero islâmico. estudantes; a classe trabalhadora; a classe média;
Reagindo às "reformas ocidentalizantes" do muitos intelectuais; e até uma oposição burguesa
xá, religiosos de Qom (cidade sagrada do xiismo) moderada. Aproximadamente 90% da população
propuseram, em 1963, uma greve geral, mas foram queria a deposição do governante, que em 16 de
duramente reprimidos. Entre os líderes do movi- janeiro de 1979 partiu para o exílio.

Manifestantes invadem e
destroem bancos e órgãos
governamentais em Teerã
durante a Revolução
Iraniana, em 4 de novembro
de 1978.

- 204
A direção do país foi entregue à Frente Na- governo iraniano apoiava diversos grupos con-
cional da Oposição Liberal, liderada por Chapour siderados fundamentatistas islâmicos, mas isso
Bakhtiar. Por falta de apoio popular, o novo nem sempre ocorreu, uma vez que as divergências
comando não conseguiu se manter no poder e eram comuns entre as várias lideranças árabes.
renunciou em favor da formação de um governo
da confiança dos militantes da linha de frente
na luta contra o xá. Entretanto, os elementos Originalmente, o termo fundamentaLismo
designava um movimento religioso conservador
progressistas foram logo excluídos, e o clero
entre os protestantes dos Estados Unidos, no
islâmico, comandado pelo aiatolá Khomeini,
início do século XX, que enfatizava a interpre-
paulatinamente impôs um regime teocrático e
taçâo literal da Bíblia, utilizando-a em todos
ditatorial. Antigos aliados foram reprimidos, os aspectos da vida. Atualmente, o vocábulo é
e o regime desencadeou assassinatos contra a usado para denominar qualquer movimento,
esquerda e os trabalhadores de vanguarda. Uma corrente ou atitude que evidencie a obediência
rigorosa conduta de acordo com preceitos islâmi- rígida a um conjunto de princípios básicos.
cos foi imposta à população. As mulheres foram Portanto, existem fundamentatistas em todas
obrigadas a usar o véu. As minorias religiosas, as religiões: fundamentalismo cristão, judaico,
islâmico. hindu etc.
como os zoroastrianos, baha'is, os muçulmanos
sunitas, além de minorias étnicas, como os cur-
dos, sofreram perseguições ainda mais severas
que as da época do xá.

ConfLito Irã x Iraque


A criação da República Islâmica teve sig-
Com o fim do Império Otomano, a fragmen-
nificado amplo. Apesar de xiita, a maioria dos
tação do Oriente Médio interessava às potências
muçulmanos dos outros países percebeu que o
imperialistas para que o petróleo não ficasse sob
islamismo político tinha capacidade para che-
gar ao poder. Com o descrédito sofrido pelo o controle de uma nação árabe unificada. A re-
nacionalismo árabe durante a década de 1970, gião onde hoje é o Iraque ficou sob o domínio
as sociedades muçulmanas assistiram, gradual- britânico até 1932, quando ocorreu a indepen-
mente, à substituição do pan-arabismo pelo dência do país.
pan-islamismo como ideologia política de mas- Em 1958, a monarquia iraquiana foi abo-
sas. Depois de tomar o poder, Khomeini pregou lida por um golpe que resultou na morte do rei
a "revolução islâmica" universal.
Faisal II e de sua família, originando a República
COI3GIOLA. Osvaldo. A revolução iraniana. do Iraque. O novo governo fez algumas refor-
São Paulo: Unesp, 2008. p. 90.
mas sociais e democráticas, nacionalizou o pe-
tróleo e iniciou uma reforma agrária. Na década
A Revolução no Irã teve repercussão em di- de 1960, o país foi palco de uma sucessão de
versos países. Na Arábia Saudita militantes islâ- golpes de Estado, até que o partido Baath, de
micos ocuparam a Grande Mesquita de Meca em Saddam Hussein, chegasse ao poder. Em 1979
protesto contra a situação política do país. No Saddam Hussein tornou-se o líder máximo do
Afeganistão, onde a oposição ao governo crescia, Iraque e passou a reprimir violentamente os
houve interferência militar da União Soviética, opositores políticos.
que temia perder a influência que exercia no país No âmbito internacional, o governante ira-
em caso de mudança no regime. No Líbano, as quiano via na Revolução iraniana uma ameaça à
ações do grupo Hezbollah receberam apoio do estabilidade de seu governo. Assim, preocupado
governo iraniano. após as mudanças no país vizinho, Saddam Hus-
A política iraniana em relação aos Estados sein ordenou a invasão do Irã em setembro de
Unidos foi de distanciamento. No início da dé- 1980, sob o argumento de reivindicar o controle
cada de 1980, a CIA passou a suspeitar que o de terras na região da fronteira entre os países.

205ffl
A reação iraniana foi pos . .
sivel graças a venda, de forma
secreta, de peças de reposição
para aviões, tanques e outras
armas de fabricação norte ame
ricana ao regime de Khomeini
4;...
O presidente dos Estados Uni
dos, Ronald Reagan, afirmava
querer evitar o fortalecimento -'
do Irã na região, mas forneceu
armas aos iranianos, a quem
denominava de "fanaticos reli
-- - . -J
viais tarde, aianre aa
giosos .
:--.
possibilidade de vitoria do Irã,
países ocidentais, inclusive os Exercito do Irã se prepara para açoes na regian montanhosa de fronteira entre iraque e Irã , em juritro
Estados Unidos, forneceram de 1988.

grande quantidade de material


bélico para Saddam Hussein.
A Guerra do GoLfo
J ¶0 --
Em julho de 1990, Saddam Hussein acu-
[...} As forças armadas do Iraque eram supe- sou a política econômica do Kuwait de causar a
riores às do Irã em tanques, artilharia e aviões,
queda dos preços do petróleo e retomou antigas
mas os iranianos eram inspirados pelo zelo reli-
questões de limites. Além disso, argumentava que
gioso e patriótico, e revidaram com total descaso
pelas perdas humanas. A Guarda Revolucionária Arábia Saudita e Kuwait não haviam colaborado
Iraniana, consistindo dos seguidores mais leais com o bloqueio da revolução islâmica no Irã e
de Khomeini, investia com vagalhões humanos partiu para o confronto invadindo o Kuwait em
contra posições iraquianas, expulsando as forças agosto do mesmo ano.
do Iraque para além da fronteira. O Conselho de Segurança da ONU, com
GILBERT, Adrian. EncicLopédia das guerras: conflitos apoio dos EUA, impôs um boicote econômico
mundiais através dos tempos. São Pauto: M. Books do Brasil ao Iraque e autorizou o uso da força caso o país
Editora. 2005. p. 296.
não retirasse suas tropas do Kuwait até 15 de
janeiro de 1991. Saddam Hussein esperava que a
URSS e a China, tradicionais aliadas com poder
Em meados dos anos 1980, nenhum dos la- de veto no Conselho, impedissem uma resolução
dos tinha condição de obter uma vitória decisiva. tão rigorosa, mas isso não aconteceu. Mikhail
Mas o cessar-fogo só foi acertado por meio de Gorbatchev, presidente da União Soviética, pre-
intensa mediação da ONU, em agosto de 1988, tendia superar a crise de seu país por meio de em-
após o conflito ter deixado pelo menos 1 milhão préstimos de países capitalistas e por isso votou
de mortos. Ao fim da guerra, o Iraque havia au- a favor da moção norte-americana. Já a China,
mentado seu poderio bélico e contraído diversas com o prestígio abalado pela repressão aos es-
dívidas, situação que piorava com as sucessivas tudantes da Praça da Paz Celestial, absteve-se,
quedas de preço do petróleo. Com o objetivo de
procurando agradar aos Estados Unidos, pois as
amenizar esses problemas econômicos, Saddam relações sino-americanas estavam estremecidas.
Hussein decidiu invadir o Kuwait.
Saddam não recuou. Dias depois de expi-
rado o prazo, as forças aliadas lideradas pelos
AS Glossario norte-americanos iniciaram o ataque. A supe-
Moção: proposta, ato de mover algo. rioridade tecnológica dos aliados acarrretou na
derrota das forças iraquianas em todas as frentes.

206 ::itulo7
part

i IRAQUE Iraque
Invasâo do Kuwait pelo Iraque
____ Linhas de defesa subterrânea
m Posições iraquianas
Baqdá Aliança Internacional
para
!srae1 Forças torrestres
: •Rutba
50 arba\ IRÃ
o
\) TT14 Olensiva terrestre, 24-28 fev. 1991
* ( tropas aerotransportadas e missões anfibias
- Lançamento de rnisseis iraquianos
'4' Operações aéreas da Aliança Internacional
AISalmãn Basia
base KUWAIT
<temporária
Operação tKuwait
Rafhâ
Oaguef
(França
Estados Unidos) EUA Tropas aerotrans
Missões anfibias

+
Estados Unidos! Forças/ as-Al-Halgi
ARÁBIA ..

Era-Bretanha Árabes Estados


SAUDITA Unidos
N
Estados Unidos
0
Q
Arábia Saudita
e
E.A.0

5
Ohahara
O 158 316km
TAR
40<E 1: 15800000 -Riade ~
íone: DUBY. Georcís [) Atlas histórico mundial, 3 . Bccn: Larousso Fdiloral, 2011. a. 32E

As forças lideradas pelos estadunidenses po- Unido invadiram o território iraquiano. O partido
deriam ter derrubado Saddam Hussein do poder, Baath, de Saddam, foi dissolvido, e seu líder cap-
mas não o fizeram, pois temiam a desintegração do turado e julgado, sendo condenado à morte por
Iraque e o fortalecimento do Irã. Com sua Guarda enforcamento em 2006, acusado do assassinato
Republicana intacta, o governo do Iraque conse- de grupos xiitas.
guiu ainda acabar com a rebelião dos curdos ao O fim do regime de Saddam Hussein pos-
norte e a dos xiitas ao sul. Mesmo enfraquecido, sibilitou uma nova conduta nas relações entre
Saddam continuou no poder. lrã e Iraque. Em janeiro de 2010, os dois países
O governo do ditador só chegou ao fim em assinaram dezenas de acordos de cooperação
2003, quando, sob os pretextos de que o Ira- política e econômica, consolidados, inclusive, pela
que produzia armas de destruição em massa e visita dos líderes aos antigos países rivais, como a
de que Saddam tinha ligação com grupos terroris- ida, em 2008, do presidente iraniano, Mahmoud
tas, tropas lideradas por Estados Unidos e Reino Ahmadinejad, ao Iraque.

Pausa para investigação

Em grupo, divida com os colegas os assuntos çáo dos dois países em relaçáo a guerras internas
para pesquisar sobre o Irá e o lraque atuais. A pro- ou externas. O grupo deve entregara pesquisa em
posta é investigar os aspectos sociais, políticos, forma de trabalho escrito e depois apresentar os
econômicos, culturais e turísticos, além da p051- principais aspectos em sala de aula.

207
O fundamentaLismo islâmico e os
Estados Unidos
As origens do fundamentalismo islâmico atual fundamentalismo islâmico. De acordo com essas
remontam às décadas 1950 e 1960, nas ideias de pessoas, seriam elas: ideologização e politização da
escritores como o egípcio Sayyid Qtub e do paquis- fé; expansionismo; dualismo simplificador (luta do
tanês Abul Ala Mawdudi; o pensamento ganhou bem contra o mal); separatismo (os puros devem
força com a Revolução Iraniana, e adquiriu contor- se separar da sociedade para salvá-la); disposição
nos violentos com as ações de grupos radicais, que ao sacrifício (a jihad - originariamente "esforço
popularizaram o uso de homens-bombas. em prol de Deus" - ganha o sentido exclusivo de
Os fundamentalistas adéquam seus objetivos "guerra santa") e monismo (intolerância a qualquer
de acordo com a região onde atuam, bem como diversidade).
com o grupo a que pertencem. Uns defendem O dia 11 de setembro de 2001 ficou marca-
causas nacionais, porém impregnadas de concep- do por uma série de atentados terroristas contra
ções religiosas; outros procuram preservar valores os EUA. Em Nova York, dois aviões sequestrados
quejulgam ameaçados pelo Ocidente, considerado atingiram as torres gêmeas do World Trade Center,
materialista e imperialista, aliado do sionismo. In- famoso complexo financeiro dos EUA. Em Washing-
dependentemente dos objetivos específicos de cada ton, outro avião sequestrado chocou-se contra o
grupo, há um propósito comum a todos: a instaura- Pentágono (sede do Departamento de Defesa do
ção de um Estado teocrático, fundamentado no Islã. EUA). Esses ataques foram responsáveis pela morte
Alguns historiadores, como o holandês Peter de milhares de pessoas.
Demant, tentaram listar algumas características do Após os atentados, o então presidente dos
Estados Unidos, George Walker Bush, colaborou
para a construção da imagem de que os talibãs
(membros doTalibã, organização política de origem
afegã) do Afeganistão e fundamentalistas do lraque
seriam os grandes responsáveis pelo ocorrido. Nesse
sentido, a ofensiva contra esses países seria uma
forma de "combater o terror", pois era necessária
uma "cruzada" contra os que davam abrigo aos
terroristas. Assim, Bush ordenou a invasão do Afega-
nistão, considerado inimigo da democracia e da paz.
Assim como ocorrera com os talibãs, o regime
autoritário de Saddam Hussein foi associado à
figura de Osama bin Laden, considerado mentor
dos ataques de 11 de setembro. Além disso, o gover-
no estadunidense acusou o Iraque de possuir armas
de destruição em massa - fato jamais comprovado.
Com essa justificativa, Bush obteve amplo apoio
da opinião pública dos Estados Unidos contra os
supostos terroristas, embora esse apoio não se
estendesse a órgãos internacionais como a ONU.
Em 2003, à revelia da ONU, os EUA prosse-
guiram com a invasão do Afeganistão e ocuparam

WtTU LW _ o Iraque. Os regimes do Talibã e de Saddam Hus-


World liade Ceilter apos ataque terrorista. Nova York (Estados Unidos. sein foram derrubados. Fora do poder, o ex-líder
11 sei. 2001. iraquiano foi preso, julgado e morto em 2006.

208 tu(07
A perseguição a Osama bin Laden seguiu até 2011,
quando ele foi encontrado e morto no Paquistão.
Apesar do poderio militar do Estados Unidos,
a insurgência de iraquianos e dos talibãs provo-
cou muitas baixas norte-americanas, revertendo
apoio de grande parte da opinião pública. Em
pouco tempo, os que apoiaram a intervenção no
Iraque passaram a acusar o presidente Bush de
transformar o país em um "novo Vietnã" (em refe-
44':3 7
rência ao grande número de jovens estadunidenses
mortos no conflito com o Vietnã nos anos 1960).
Em 2009, Bush deixou a presidência dos Estados
Unidos com a popularidade baixíssima. Foi suce-
dido por Barack Obama, o primeiro presidente
negro a governar o país. Em 2011, Obama retirou
as tropas norte-americanas do Iraque sem que a Sob o governo de Barack Obama os Estados Unidos iniciaram operaçoes
situação política do país estivesse bem organizada, de retirada de tropas do Oriente Médio. Na fotografia, soldados norte-
-americanos se preparam para deixar uma base militar localizada ao sul do
que gerou um cenário político muito conturbado, Afeganistão em 2014, um dia apõs a coalizão internacional ter fechado as
marcado por diversos conflitos internos. instalações militares, que foram entregues às forças armadas do país.

Organizando ideias

Leia o texto e, em seguida, responda às possível. Alguns compreendiam que os seus atos
questões. eram parte de um programa político cuidadosa-
mente articulado. A maioria acreditava que seriam
Qual é a razão?
elogiados como herói em sua,-, comunidades. Poucos
Pensei mais de uma vez em todos OS militantes não se importavam com o que poderiam pensar seus
que conheci ou entrevistei: no Talibã, nas pessoas semelhantes. Por um longo tempo tentei descobrir
que conheci no Paquistão, em Didar - o homem- alguma espécie de teoria geral que desvendasse o
-bomba de Suleimaniyah que gostava de futebol -, segredo da "militância islâmica", e subitamente me
em Abu Mujahed em Bagdá, nos milicianos xiitas dei conta de que era impossível fazer isso. Não havia
de Najaf, nos homens das prisões da Caxemira e de uma resposta única. Na verdade, o ponto exatamen-
Kandahar, em todos os outros. Não havia nenhuma te era não haver uma resposta única.
regra determinando por que os diversos argumentos
BURRE, iason. A caminho de Cabul e Bagdá: relatos dos
da ideologia radical "islâmica" funcionaram com conflitos no mundo islâmico. Rio de Janeiro: Zahar. 2008. p. 304.
eles. O caminho que cada um seguira era diferente.
Uns tinham buscado uma solução para o que con-
sideravam injustiças sociais e econômicas; outros Segundo o autor, há como definira mititância
queriam vingança contra uma humilhação ou uma islâmica com exatidão? Por quê?
ofensa real ou imaginária; outros simplesmente
queriam amizade, ou respeito próprio, ou aven- No que diz respeito ao ingresso das pessoas
tura. Outros queriam combater o que viam como na luta pela causa islâmica, qual das razões
ocupação de sua terra natal. Alguns claramente
apresentadas no texto você considera mais
tinham sido homens brutais, endurecidos pelo ódio
relevante? Explique.
e enfurecidos desde o início, pessoas que apenas
gostavam do sentimento de poder proporcionado
pelo prejuízo causado aos outros. Outros queriam Há indícios de luta pela liberdade nessa
apenas demonstrar sua fé de maneira mais extrema militância? Justifique sua resposta.

209
,
A Primavera Árabe
Durante o século XX, o "mundo árabe" foi As razões dos movimentos variaram de país
fragmentado em vários pequenos Estados, como para país. Na Tunísia, por exemplo, jovens diplo-
Barein, Omã, Emirados Árabes, Catar, Kuwait, mados e desempregados foram os detonadores
e alguns países de grande superfície geográfica, dos protestos; na Líbia, as populações de regiões
como a Arábia Saudita. oprimidas pelo ditador Muammar Kadafl (espe-
Ao ficarem independentes, os países árabes cialmente da Cirenaica) se insurgiram contra uma
organizaram-se política e socialmente de formas ditadura iniciada em 1969.
No Egito, a crise econô-
diversas. Alguns optaram por regimes naciona- mica e social, a corrupção e a falta de democracia
listas, seculares, modernizantes e com discursos foram as principais razões que levaram multidões
progressistas, objetivando mudanças econô- a lotar a Praça Tahir, no Cairo, exigindo a queda
micas e sociais, como Egito (após a Revolução do regime de Hosni Mubarak. De forma geral, um
Nacionalista de 1952), Tunísia, Argélia e lemen. clamor por democracia foi a tônica em todos os
Por outro lado, Arábia Saudita, Emirados movimentos, tanto os que agitaram o Marrocos
Árabes, Kuwait, Barein, Catar, Jordânia, Líbia como os que derrubaram as ditaduras do Egito,

(até 1969) e Marrocos tornaram-se monarquias Tunísia, Líbia e lemen.

co n se rvad oras. A desestabilização desses regimes se deve a

Após longo período de aparente imobilismo um fenômeno relativamente recente naquela re-

civil, em 2011 surgiram movimentos de contesta- gião: o uso em larga escala das novas mídias - te-

ção em maior ou menor escala nos países árabes. lefones celulares, internet, Twitter e Facebook. O

Essa onda de revoltas ficou conhecida como Pri- regime de Hosni Mubarak, por exemplo, tentou

mavera Árabe. abafar a internet; contudo, a censura não impe-


diu a queda da ditadura egípcia.
Ainda assim, as consequências da Primave-
Como um rastro de poeira, as revoltas árabes ra Árabe têm sido pouco animadoras, pois ape-
se propagaram da Tunísia ao Egito e em seguida nas a Tunísia efetivamente se democratizou. No
ao conjunto do mundo árabe. Nenhum país foi Marrocos e na Jordânia ocorreram reformas su-
poupado e, apesar das dificuldades, um período perficiais. Nas monarquias conservadoras do gol-
sombrio na história da região começa a dissipar-
fo, como Arábia Saudita e Barein, houve violenta
-se. As mudanças não afetarão somente a vida
repressão aos movimentos de oposição. Mesmo
dessas pessoas, mas também a dos vizinhos e,
em países onde as ditaduras foram derrubadas,
em primeiro lugar, a da Europa. A geopolítica da
região será reconfigurada. Se os exércitos desem- antigas e novas formas de opressão foram instau-
penham uma função importante nesse processo, radas e diversos conflitos regionais eclodiram.
foram os movimentos sociais e populares que, do
Poputaçâo egípcia em manifestaçâo contrária ao governo do presidente
Egito à Argélia, passando pela Tunísia, prepara-
Hosni Mubarak, Cairo (Egito). 10 fev, 2011
ram o terreno para os acontecimentos atuais. O
-19
mundo inteiro sublinhou o papel fundamental
das redes sociais nas revoluções árabes, porém
1
outros aspectos remetem a características mar-
cantes de movimentos revolucionários do passa-
do, como os da França e da Rússia. Seja como for,
os levantes árabes expressam a vontade de virar
a página da partilha colonial que traumatizou
profundamente esses povos no século passado.

ORESH. Alain. O despertar do mundo árabe. Oossiê Le Mon-


de Diptomatique Brasit, n. 6. p. 8, ano 1, juL/ago. 2011

210
A Líbia, com um governo dividido e enfraque- sos conflitos no país e originou o Exército Livre da Sí-
cido, mergulhou em uma grave disputa que envol- ria, grupo de militares desertores que defendem um
ve a ação de inúmeras milícias e de grupos extre- regime democrático.
mistas, cada um lutando por suas próprias causas. Além dos sírios, muitos grupos internacionais
No Egito, após um curto período democráti- se envolveram no conflito. Dentre os grupos de opo-
co, eclodiram graves choques entre partidários da sição, destacam-se os fundamentalistas, como a
islamização do país e os defensores de um Estado Frente al-Nusra, ligada à AI Qaeda, e o Estado Islâ-
laico. Em 2013, os que haviam perdido o poder mico, defensor da aplicação radical da sha ria (lei is-
tiraram proveito da situação e organizaram um lâmica). Com o apoio da Arábia Saudita e de outras
golpe militar que depôs e prendeu o presidente monarquias do golfo, esses grupos impuseram uma
Mohamed Morsi e colocou o general Abdul Al-Sisi série de reveses às forças governistas e sobrepujaram
em seu lugar. A Irmandade Muçulmana, grupo o Exército Livre da Síria, que contava com o apoio
político de Morsi, foi colocada na ilegalidade. de Turquia, Estados Unidos e União Europeia. Em
No lemen passou a ocorrer uma violenta guer- 2015 as tropas do governo partiram para a contra-
ra civil. Um conflito envolvendo Houthis (militantes ofensiva contando com o apoio da Rússia, do Hez-
xiitas), facções leais ao ex-presidente Abd Rabbuh bollah (grupo radical de xiitas libaneses) e do lrã.
Mansur Hadi e grupos fundamentalistas islâmicos A entrada de grupos estrangeiros nos con-
fragmentou o país. A intervenção da Arábia Saudita flitos dificulta o estabelecimento da paz na Síria,
apoiando as forças de Hadi e a ajuda dada pelo Irã pois a autonomia do país foi gravemente abalada
aos Houthis complicaram ainda mais a situação. após tantas intervenções. Além disso, com a cres-
A Síria, governada desde o início da década de cente onda de violência, muitos sírios deixaram o
1970 pela família Assad, passou a viver graves ten- país em busca de segurança. Estima-se que mais
sões em 2011, quando uma série de protestos con- de 2 milhões de sírios tenham procurado abrigo
tra o governo do presidente Bashar a?-Assad foram internacional em decorrência desse conflito, que
violentamente reprimidos, o que desencadeou diver- ultrapassou a marca de 250 mil mortes.

Pausa para investigação

Leia a reportagem a seguir. também índices pouco mencionados, que, vistos


em conjunto, mostram urna geração cosmopolita,
"Primavera árabe criou uma geração en-
educada e empreendedora ainda comprometida
gajada", diz pesquisadora canadense
com a niudança politica, apesar dos recentes fra-
Conflito civil na Síria e no Jémen, atentados ter- cassos em países como Síria, Líbia e lêmen.
roristas no Iraque, atrito entre Arábia Saudita e Irá 1-lá altas porcentagens de jovens matriculados
e fracasso na criação de um Estado na Líbia. Não na universidade em paises como a Arábia Saudita,
são poucos os indícios que justificam um mau au- por exemplo.
gúrio em relação ao Oriente Médio. No Líbano, mais de um terço dos empreende-
Mas a professora canadense Bessma Momani dores são mulheres. As populações estão [.] com
está otimista. [ ... j niaísac eSS() à internet [... 1.
Momani, pesquisadora no Centro para Inova- Folha de S.Pauto. 1 O 1ev. 2016. Disponivel em: <wvN1 folha.
ção na (;overiança Internacional, conversou com uoLcorn.bi /rnurrdo/2() 16/02/1738269-primavera -arabe-criou -
umqeracao-engajada-diz-pasquisadora-canadense.shlml>.
a reportagem durante uma passagem recente por
Acesvo em. ,br: 2016.
Madri, enquanto promovia seu livro "Arab L)awn"
Procure em jornais e na internet informa-
("Alvorecer Árabe", em tradução livre), unia análi-
ções sobre a situação atual dos países citados
se da demografia no Oriente Médio.
e escreva um pequeno texto sobre as conse-
A obra reconhece que há desafios imensos
quências da Primavera Árabe nesses lugares.
para a segurança e a economia da região, mas há

211
Movimentos separatistas peLo mundo
Os conflitos regionais não são uma exclusi- Com o fim da URSS, a Crimeia continuou
vidade do Oriente Médio. Ao redor do mundo, a fazendo parte da Ucrânia, mas o desconten-
ocorrência de tensões regionais foi comum nos tamento da população russa era latente. Em
últimos anos, sobretudo nas áreas marcadas por 2014, como reação ao novo governo ucrania-
ações de diversos movimentos de caráter separatis- no, que havia se afastado da Rússia e se apro-
ta, como os movimentos de independência da Ca- ximado da União Europeia, os crimeanos con-
talunha e do País Basco, na Espanha, o movimento vocaram um referendo para que a população
emancipacionista de Quebec, no Canadá, e o movi- optasse pela permanência ou não da região
mento pela autonomia da Crimeia, na Ucrânia. como parte da República da Ucrânia. A maioria
optou pela secessão e, com a aceitação do Par-

A questão da Crimeia lamento Russo, a Crimeia passou para a tutela


russa, fato visto internacionalmente como uma
A Crimeia, península localizada entre a Rússia e significativa vitória política do presidente russo
a Ucrânia, com amplo acesso ao Mar Negro, foi um Vladimir Putin.
Estado habitado sobretudo por tártaros de religião
muçulmana entre os séculos XV e XVIII. Nesse perío-
do, apesar de manter certa autonomia, a Crimeia
O País Basco
pagava tributo ao Império Otomano. No fim do sé- Os bascos habitam uma área entre a Es-
culo XVIII, após um confronto entre turcos e russos, panha e a França desde tempos muito remotos,
a região passou afazer parte do Império Russo. Com de modo que a grande maioria dessa população
isso, ao longo do século XIX muitos russos e ucrania- está localizada na Espanha. Os habitantes do
nos deslocaram-se para a Crimeia. País Basco tiveram certa autonomia política até
Após a Revolução Russa, em 1921, os boI- a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), quando
cheviques conseguiram fazer da Crimeia uma das parcela significativa do povo basco apoiou os Re-
repúblicas da Rússia soviética, que, em 1922, publicanos, que saíram derrotados. Com isso, a
passou a se chamar União das Repúblicas Socia- região foi duramente castigada pelas forças na-
listas Soviéticas (URSS). cionalistas durante a ditadura do general Francis-
Durante a Segunda Guerra Mundial, muitos co Franco, fato que contribuiu para alimentar as
habitantes da região foram convocados para in- ideias nacionalistas entre os bascos.
tegrar as tropas soviéticas. Contudo, quando a Em 1959 dissidentes do Partido Naciona-
região caiu sob o domínio da Alemanha nazista, lista Basco - fundado em 1895 - criaram o ETA
alguns crimeanos colaboraram com os alemães. (Euskadi Ta Askatasuna - Pátria Basca e Liberda-
Em 1944 o Exército Vermelho conseguiu retomar de), que logo se tornou uma organização param i-
território e Stalin ordenou que grande parte da litar separatista. Ataques terroristas (assassinatos
população fosse deportada, alegando o crime de de autoridades, por exemplo), sequestros e ações
co la bo ra c io n ism o antigovernamentais pautaram as ações do ETA.
Com a deportação em massa dos cri meanos de Em 1978, com a redemocratização da Espanha,
origem tártara, os eslavos (russos e ucranianos) tor- país basco recuperou autonomia política, o
naram-se hegemônicos na região. Em 1954, quando que enfraqueceu significativamente o poder do
ucraniano Nikita Kruschev estava se tornando o ETA. Mais tarde, a prisão dos principais líderes e
homem forte da URSS, a Crimeia, apesar de a po- crescente isolamento político levaram a organi-
pulação ser majoritariamente constituída de russos, zação a emitir, em 2011, um comunicado pondo
passou a fazer parte da República da Ucrânia. fim às suas atividades.

212
Quebec Livre A CataLunha
O Canadá, ex-colônia francesa e inglesa, é um A Catalunha, situada no nordeste da Penín-
dos países mais extensos do planeta e atualmente sula Ibérica, faz parte do Reino da Espanha des-
pertence ao G7 (grupo de nações consideradas de meados do século XV. Com tradições culturais
mais industrializadas e desenvolvidas do mundo). próprias e forte apego a sua identidade, os cata-
Inicialmente colonizado por franceses, o país lães em diversas ocasiões se rebelaram contra o
passou a ser controlado por ingleses até a conquis- que chamavam de dominação castelhana.
ta definitiva da autonomia. Após a Segunda Guerra Em 1914 a região obteve uma relativa autono-
Mundial, um movimento separatista ganhou força mia, que, no entanto, acabou em 1923 com a ins-
em Quebec, maior província do país, marcada por tauração da ditadura de Primo de Rivera.
uma forte herança francesa. Em 1967, o presidente Em 1932 foi aprovado um estatuto que con-
da França, Charles de Gaulle, finalizou um discurso cedia à Catalunha a condição de Comunidade
público em Quebec com o antigo e emotivo slogan Autônoma dentro da Espanha. No entanto, com
"Québec libre", alimentando os anseios de indepen- a ascensão do general Franco ao poder, essa auto-
dência de significativa parcela da população. nomia foi abolida. Durante a ditadura chegou-se a
O crescimento do sentimento separatista na proibir o uso do idioma catalão, foram banidas ins-
população possibilitou o surgimento de partidos tituições catalãs e houve violenta repressão.
com esse propósito. Havia aqueles que acredita- A crise econômica que atingiu a Espanha no
vam que a secessão seria possível de forma pací- início da década de 2010 fez com que os nacio-
flca, como o Partido Quebequense (Parti Québe- nalistas da Catalunha ganhassem força. Mesmo
cois), e outros, como a Frente de Libertação de contrariando a Constituição Nacional, foi mar-
Quebec (Front de Libération de Québec), que re- cado na Catalunha um referendo que deveria ser
correram à violência por meio de assaltos a ban- realizado em 2013, mas o pleito foi proibido pelo
cos, sequestros e ações terroristas. governo espanhol. Ainda assim, em 2014 foi feita
Com o passar do tempo, os quebequenses uma consulta popular, na qual, apesar da eleva-
conseguiram uma ampla autonomia. A língua da abstenção, a maioria absoluta foi favorável a
francesa passou a ter um status especial no Ca- uma Catalunha independente.
nadá, que se tornou oficialmente bilíngue. Apesar O impasse permanece. O que se observa é
disso, a proposta de separação da província, co- que a população catalã se encontra bastante di-
locada sob votação popular em 1980 e 1995, não vidida. Enquanto uns querem a separação total
foi aprovada em nenhuma das ocasiões. em relação à Espanha, outros acreditam que uma
Em 2014, as eleições indicaram uma significa- ampliação da autonomia resolveria a questão,
tiva mudança na política da província. Após anos sem a ncccssidade de uma secessão.
no poder, o Partido Quebequense, tradicionalmen-
te separatista, foi derrotado pelo Partido Liberal
Quebequense, que defende uma política de alinha-
mento com o governo canadense. Esse resultado
indica um enfraquecimento do movimento separa-
tista, mas está longe de significar o fim da causa.
O sentimento separatista ainda é marcante
na província de Quebec. Contudo, a maioria da
população se mostra reticente em relação a essa
questão, por julgar que a província e o país têm
outros assuntos mais delicados a serem tratados.

Manifestantes exibem a bandeira e pedem a independência


Catalunha durante ato na capital catalã, Barcelona (Espanha), 201.

213
Debate interdisciplinar

Estado de

1928-1949
Mandato britânico

Mo,
Meci,trrãr,eo
—'k
Mandato
britânico da
Palestina
P
1947
Proposta da Organização das Nações
Unidas para a partilha da Palestina

Estadoiudeu

Países árabes
'SÍRIA
1
:.J 1948-1949
Guerra Árabe-Israelense

Estado de Israel ao
final da guerra
c(oIs

LÍBANO LF8NO. Cisjordânia


Área internacional
SÍRIA (sob controle
da Jordânia)

PALESflNÀ - Mor - tvlar


Mediterrâneo Mediterrã,,eo

Jerusalém * Faixa de
Gaza (sob
controle
egípcio) - \ lSRÂEL,
\RDÂNlA EGITO
JORDÁNIA

o O EGITO
+I

O 94 188km ARÁBIA 94i 188km 1 ARÁBIA 94i. 108km 1 ARÁBIA


?
1:9 400 000 SAUDITA 1:940000\, SAUDITA 1940000 SAUDITA

•\I.

Oriente Médio em meados do século XX

Abandonando o passado colonial, a região deu lugar a novos estados altamente instáveis politicamente.

Palestina População palestina (1922-1942) Evolução da população da Palestina por religião


.1920-1948: (em % da população total)
mandato 1620005 Muçulmanos Judeus Cristãos
britânico.
.1948:
78
1023734
liI
mandato 29,9
britânico: 752048 9 M 7,9

Israel. 1922 1 1931 1 1942 1922 1931 1 1942 1922 119311 1942 1922 1 1931 11942

— 214
ISRAEL CISJORDÂNIA FAIXA DE GAZA

População: 7821 850 (inclui colonos População: 2731052 (sem contar os População: 1 816379 (sem contar os
israelenses na Cisjordânia, nas Colinas de colonos israelenses). colonos israelenses).
Golã, na Faixa de Gaza e em Jerusalém Regime político: ocupado por Israel, o Regime político: ocupado por Israel, o
Oriental). governo é da Autoridade Nacional governo é da Autoridade Nacional
Regime político: República parlamentarista Palestina. Palestina.

Grupos étnicos Religiões Grupos étnicos Religiões Grupos étnicos Religiões


judeus judaismo islamismo arabes palestinos i51amismo árabes palestinos islamismo
Cristianismo

o
75% 75% 17,5% 83% 98%
e outras

Lo 2%

judaísnso
jdeus outras _..I judeus
17%
13%
outras
1%
1 cristianismo
25%' 5,5% cristianismo
2% la&uImrwanBntI
PI!aÜphI!,'cIe Á!?.I)PS

M 1967
Guerra d sSeisDia
1973
Guerra do Yom Kippur
2000
Israel e os territórios ocupados

Territórios ocupados Território devolvido Territórios ocupados


por Israel SÍRIA ao Egito SIRIA por Israel

0+ Colinas

04.._L Colinas
LIBA NO
o4i Colinas
UBANO

de Gola

SMar
94 188 kn
Mar 1:9400000 SIRIA
Medite,rãneo Medirerrônec
Mar
TeIAvi7 ''•'-.'.
Med;rerraneo
C sjordânia
NO C jordânia
Jerusalém Jerusalém
• Jerusalém
Faixa de Gaza _._7.> L.- Faixa de Gaza -? Faixa de Gaza

\ISRAEL
\\ISRAEL/
EGITO
.:wi\ / JORDÂNIA
Península Peninsula
\ Ç JORDÁNIA A Faixa de Gaza e
\ )
doSinaí\ a Cisjordãnia são
do Sinal
territórios ocupados
por Israel com
condições sujeitas
ARÁBIA ARÁBIA a acordos internos ARÁBIA
0 51 188km o 91 588km
SAUDITA SAUDITA entre Palestina SAUDITA
i9locns 5 94O0O5'
e Israel.
EGITO
EGITO

Fonte: Central Intelligence Agency - CIA. Disponivel em: <www.cia.gov/libraryl publications/thoworld-facthook>. Acesso em: maio 2016.

Observe os mapas e gráficos apresentados e estabeleça uma associação entre o sionismo e as


mudanças na população da palestina.

Que relação pode ser estabelecida entre a ideia de liberdade política e religiosa e a questão
palestina?

215
Testando seus conhecimentos Responda no caderno

1. (UEG-GO) O Oriente Médio é, atualmente, dl A ação dos governos de Washington e


a região de maior instabilidade política no Moscou foi decisiva para o cessar-fogo
mundo. que pôs fim ao primeiro conflito árabe-
São fatores que historicamente explicam esta -israelense.
turbulência, exceto: e) Apesar das sucessivas vitórias milita-
A criação do Estado de Israel, em 1948. res, Israel mantém suas dimensões
O interesse internacional pelas reservas territoriais tal como estabelecido pela
de petróleo da região. resolução de 1947 aprovada pela ONU.
ci A Revolução Islâmica, no Irã, em 1978.
3. (UEL-PR) Leia o texto a seguir:
dl A ausência do Estado laico nos países
islâmicos. As religiões, que em princípio deveriam servir
para aperfeiçoar o ser humano, aproximando-o
2. (Enem) Em 1947, a Organização das Nações
da divindade, têm sido responsáveis por manifes-
Unidas (ONU) aprovou um plano de partilha
tações acabadas de fanatismo. Massacres, tortu-
da Palestina que previa a criação de dois
ras, guerras, perseguições, intolerância e outras
Estados: um judeu e outro palestino. A re-
atitudes e práticas deploráveis têm testemunhado
cusa árabe em aceitar a decisão conduziu ao
o que de pior o ser humano apresenta, e muitas
primeiro conflito entre Israel e países árabes.
vezes tais atrocidades são feitas em nome de I)eus.
A segunda guerra (Suez, 1956) decorreu da
PINSKY, Jaime; PINSKY, Carta Bassanezi (Org.).
decisão egípcia de nacionalizar o canal, ato Faces do fanatismo. São Pauto: Contexto. 2004. p15.
que atingia interesses anglo-franceses e
israelenses. Vitorioso, Israel passou a con- Sobre os conflitos históricos e religiosos
trolar a península do Sinai. O terceiro con- que ocorrem no período contemporâneo, é
flito árabe-israelense (19671 ficou conhecido correto afirmar:
como Guerra dos Seis Dias, tal a rapidez da
vitória de Israel. ai A derrubada pelos aiatolás xiitas da mo-
narquia iraniana protegida pelo governo
Em 6 de outubro de 1973, quando os judeus
estadunidense reacendeu na região uma
comemoravam o Yom Kippur (Dia do Perdão),
série de conflitos de caráter religioso,
forças egípcias e sírias atacaram de surpresa
político e cultural, tendo se desdobrado
Israel, que revidou de forma arrasadora. A in-
em um conflito contra o Iraque.
tervenção americano-soviética impôs o ces-
b) Os cristãos ortodoxos radicados em Is-
sar-fogo, concluído em 22 de outubro.
tambul são resultantes da diáspora ára-
Com base no texto, assinale a opção correta.
be e utilizam-se de sua concepção polí-
a) A primeira guerra árabe-israelense foi tica e religiosa para combater, ao lado
determinada pela ação bélica de tradi- dos aliados, a presença militar sionista
cionais potências europeias no Oriente que ocupou a Cisjordânia para explorar
Médio. os poços de petróleo da região.
bi Na segunda metade dos anos 1960, quan- ci No período da Guerra Fria, a URSS,
do explodiu a terceira guerra árabe-israe- aliada dos talebans, infiltrou-se no
lense, Israel obteve rápida vitória. Afeganistão com uma ideologia religio-
c) A guerra do Yom Kippur ocorreu no mo- sa e, ao dominar o país, construiu um
mento em que, a partir da decisão da corredor de transporte seguro para o
ONU, foi oficialmente instalado o Estado escoamento de sua produção de petró-
de Israel. leo para o Golfo Pérsico.

216
Responda no caderno

d) A concepção religiosa politeísta da Índia e) No conflito da Bósnia e Herzegovina, os


traduziu os textos divinos, Devas, em sérvios, em sua maioria muçulmanos,
ensinamentos apreendidos por cristãos entraram em guerra contra os albane-
e muçulmanos que os utilizaram na ses, por estes terem ocupado militar-
realização de uma guerra de cisão in- mente a região da Eslovênia e realizado
terna, levando à criação dos estados do um massacre contra os habitantes que
Paquistão e do Sri Lanka. professam o islamismo.

e feridos, além de resgatar soldados perdidos em


rpara você Ler j território inimigo; mas, quando o helicóptero é
atingido por um míssil, todos ficam feridos e a rea-
As diversas faces do terrorismo, de Paulo Sutti lidade da guerra se torna ainda mais traumática.
e Sílvia Ricardo. São Paulo: Harbra, 2002. Nos
Paradise Now, direção de Hany Abu-Assad. Fran-
últimos cem anos, o terror vem sendo utiliza-
ça/Palestina/Alemanha/HoLanda, 2005, 90 mm.
do cada vez mais como mecanismo de acão es-
Amigos de infância, os palestinos Said e Khaled
tratégica e política. Saiba como torturas físicas,
são recrutados como homens-bomba para reali-
assassinatos, coerção e ameaças são usados
zar um ataque suicida em Tel Aviv. Depois de pas-
como recursos para a concretização de objetivos
sar os últimos momentos com as famílias, eles
diversos, seja eles ideológicos, seja religiosos, e
são levados até a fronteira e se separam. Distan-
para a manutenção do poder.
tes um do outro, passam por conflitos pessoais
IsraeL x Palestina: origens, história e atuaLi- morais e religiosos.
dade do conflito, de Maria José Aragão. Rio de
Promessas de um novo mundo, direção de
Janeiro: Revan, 2010. Nesse livro, a autora exa-
Justine Shapiro, B. Z. Goldberg e Carlos Bola-
mina os mecanismos históricos por trás do con-
do. EUA/Palestina/Israet, 2001, 106 mm. O do-
flito entre palestinos e israelenses, desde suas
cumentário retrata a história de sete crianças
origens históricas até o século XXI.
israelenses e palestinas que moram no mesmo
Palestina: uma nação ocupada, de Joe Sacco. lugar. Jerusalém, mas vivem realidades distin-
São Paulo: Conrad, 2000. A obra é uma grande tas, marcadas por diferenças sociais, culturais
reportagem em forma de quadrinhos, produzi- e religiosas. O filme mostra uma visão interes-
da após uma viagem do autor ao Oriente Médio. sante do conflito no Oriente Médio ao abordar a
Na Palestina, Sacco conversou com militantes e questão sob a perspectiva de crianças e jovens
pessoas já conformadas com a situação, velhos da região.
e crianças. Durante dois meses, coletou histó-
rias nas ruas, nos hospitais, nas escolas e nas
casas dos refugiados. Presenciou violentos con-
frontos dos soldados com a população e entre-
vistou vítimas de tortura.
r Para você navegar

Agência de Notícias Brasil-Árabe. Disponível


em: <www.anba.com.br >. Acesso em: abr. 2016.
(a você assistir Osite da Agência de Notícias Brasil-Arabe reúne
notícias que conectam o Brasil ao mundo árabe
Dia do Perdão, direção de Amos Gitai. IsraellFran- por meio da economia e da política, fornecendo
ça, 2000, 117 mm. Em 1973, quandoa Guerra do também sugestões de filmes, livros, exposições
Yom Kippur é declarada, dois amigos vão às Co- fotográficas e outras manifestações culturais
linas de Golã e se juntam a uma unidade da força que permitem conhecer melhor o mundo árabe
aérea israelense. Sua missão é transportar mortos e suas relações com nosso país.

Coniiit.os reglon3is, 1undainent31srn.o ruqH::e tc-r:r: 217


1
o .r1.

• 'Z

* '4 "",J • .••

: .

Neste capítulo procura-se abordar como unidade africana por meio da cooperação entre
os países africanos, após os processos de in- as nações e do combate à segregacão.
dependência, organizados em fronteiras defi- A África é um continente de identida-
nidas pelo imperialismo, precisaram construir des plurais, complexas, que demandam di-
democracias, pôr fim às guerras civis, prote- ferentes olhares. Por causa de um passado
ger-se de conflitos futuros, assegurar seu de- colonial conturbado, os diversos povos que
senvolvimento econômico e estabelecer uma habitam o continente estão em frequente
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V Mulheres caminham
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pelo mercado da cidade


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de Segou, no Mali.
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mudança e ainda têm muitas questões po- e graves conflitos regionais. Mas também é
t.íticas a serem resolvidas, o que faz a África um lugar onde existem enormes riquezas na-
ser conhecida como um conjunto de territó- turais e povos lutando em prol do desenvolvi-
rios em constante movimento. mento econômico, da democracia, da justiça
Atualmente, o continente africano tem social e do respeito a suas culturas. O 'Re-
problemas de naturezas diversas, como dita- nascimento Africano" ainda é um dos objeti-
duras, corrupção, miséria, pandemia de aids vos a serem concretizados no século XXI.
,
Âf rica: um continente
em transformação
Após a Segunda Guerra Mundial, especial-
mente nas décadas de 1950 e 1960, diversas ex-co-
lônias europeias no continente africano conquis-
taram a independência. O processo completou-se
nas duas décadas seguintes, com o fim do Império
Colonial Português, a tomada do poder pelos afri-
canos na antiga Rodésia (hoje Zimbábue) e a inde-
pendência da Namíbia.
Os desafios apresentados aos novos diri-
gentes eram enormes. Devido aos anos de opres-
são e exploração, muitos africanos sonhavam em
romper completamente com as potências coloni-
zadoras; contudo, a realidade não era como ima-
ginavam. Os problemas eram muitos: disputas saneamento basco las com que o acesso a agua seja dificultado. Como
regionais, escassez de capital, carência de mão de não há grandes redes de abastecimento de água. as pessoas precisam se
deslocar para lavar roupas e encher baldes com água potável. Na fotografia,
obra especializada, conflitos e impasses políticos e pessoas lavam roupas na favela de Kibera. em Nairôbi (Quênia). 2014.
questões sociais, como a fome e a falta de mora-
dias adequadas à população. profissionais especializados, tanto nas áreas ad mi-
A economia da maioria das novas nações nistrativas como na de prestação de serviços pú-
baseava-se na exportação de produtos primários e blicos. Nesse panorama, a nomeação para cargos
na industrialização limitada, o que as deixava ain- importantes se fez por meio de acordos políticos, e
da à mercê das antigas metrópoles. Nos partidos não por competência para a função, gerando, em
políticos, não havia identidades nacionais, e sim muitos casos, governos mal organizados.
étnicas, o que dificultava os ajustes para a com- Na área social, a realidade também não era
posição de novos governos. Além disso, os novos agradável aos novos governos. O crescimento
Estados soberanos herdaram o aparato político e populacional trouxe urbanização desordenada,
administrativo colonial, que, mesmo após a mu- ocasionando falta de emprego, moradia e infraestru-
dança, mantinha as características repressivas an- tura. Para agravar a situação, na década de 1980 a
teriores. Para formar os novos governos faltavam epidemia da aids se expandiu no continente.

Or9anizando ideias
Leia o texto a seguir e faça o que se pede.

Apesar das esperanças, a dcscolonizaçào não resolveu nenhum dos problemas pendentes. Traduziu-se
em uma série de sobressaltos, destinados a eliminar os pontos conflitivos de uma evolução que, de fato,
havia permanecido incompleta. Uma vez conseguida a independência política, tratava-se de tornar viável
um regime que não somente era marcado por uma terrível herança econômica, mas que também era pri-
sioneiro das coações do imperialismo neocolonial.
COQIJERY-VIDROVITCH, Catherine; MONIOT, Henri. África negra: de 1800
a nuestros dias. Barcelona: Labor, 1985. p. 147. )Trad. nossal.

De acordo com os autores, quais eram os principais entraves para as novas nações africanas
após a independência?
Com base nas informações anteriores, explique a que se referem os sobressaltos citados nesse texto.

— 220
 África contemporânea
A unidade africana era um sonho cultivado
por muitos, ao longo das lutas contra os coloniza-
Mudanças após
dores. Kwame Nkrumah, de Gana,Julius Nyerere, as emancupaçoes
da Tanzânia, Léopold Sédar Senghor, do Senegal,
A emancipação política dos países africanos
e Sékou Touré, da Guiné, entre outros, foram di-
não significou uma completa soberania, pois a re-
rigentes que perceberam quão necessária era a
lação de dependência com as antigas metrópoles
união dos africanos para enfrentar os inúmeros
foi mantida. Com a Guerra Fria, apesar de alguns
desafios nas novas nações, especialmente os de
países africanos optarem pelo não alinhamento,
natureza econômica e social.
ficava difícil uma completa neutralidade diante da
Depois de várias conferências, em 1963, na
crescente influência dos Estados Unidos e da União
cidade de Adis-Abeba, na Etiópia, foi criada a
Soviética no continente. A bipolarização tornou-se
Organização da Unidade Africana (OUA), com o
uma realidade. Houve casos em que governantes
objetivo de coordenar e harmonizar a política dos
souberam tirar proveito das rivalidades entre as
Estados africanos nos mais diversos campos: po-
grandes potências, mas o que predominou foi um
lítica, diplomacia, economia, transportes, educa-
atrelamento compulsório em troca de ajuda eco-
ção, saúde, defesa, segurança, nutrição, higiene,
nômica e militar.
ciências e tecnologia. Apesar das boas intenções
Os caminhos políticos e os modelos econô-
da OUA, as divergências políticas e a escassez de
micos trilhados pelos governantes africanos va-
recursos financeiros fizeram com que os princípios
riaram. Havia ditaduras personalistas, militares e
da Carta da OUA perdessem força. partidárias - os regimes efetivamente democráticos
Mesmo com limitações, em muitos momen-
foram poucos. No plano econômico, uns optaram
tos a organização revelou-se eficaz na solução
pelo liberalismo, como Félix Houphouet-Boigny,
de conflitos fronteiriços e nas pressões sobre a
presidente da Costa do Marfim, incentivando a
ONU em prol da completa libertação do con- iniciativa privada e estreitando os laços com os
tinente. Em 2002, a OUA foi substituída pela
países capitalistas centrais. A maioria, porém, pelo
União Africana (UA), cuja proposta era reforçar
menos até o final da década de 1970, priorizou a
os princípios da antiga OUA, valorizar ainda mais
interferência do Estado na economia.
a democracia, o desenvolvimento
econômico e a resolução de conflitos
por meios pacíficos, além de aumen-
tar a representatividade dos países -
africanos perante a ONU. Mesmo 1'
ainda longe do ideal, nos últimos . I
anos a UA tem sido mais enfática em
suas ações nos campos diplomático, -ç-
econômico e militar, buscando inter-
vir em países em guerra civil, além de .
oferecer cooperação técnica e ajudar
de várias formas as nações atingidas .
por catástrofes naturais.

Reunião da Assembleia da
União Africana em Adis-Abeba,
(Etiópia). 2016.

... ,.,.. ,. ,.. 221


O termo socialismo foi usado por diversos Nas décadas de 1960 e 1970 houve um grande
Estados africanos - Senegal, Quênia, Tanzânia e crescimento das exportações no continente. Gana e
Gana, entre outros, sem que isso significasse uma Costa do Marfim (cacau); Quênia (chá e café); Zaire
cópia do modelo soviético ou chinês, O "socialis- - hoje República Democrática do Congo - e Zâmbia
mo" aplicado no Quênia e no Senegal repudiava (minerais); Gabão, Nigéria e Angola (petróleo) en-
o comunismo, a violência para a tomada do po- traram para o hallde países exportadores. Entretan-
der e a luta de classes, instituindo-se por meio da to, segundo estudiosos do período, o crescimento
ascensão de partidos únicos autodenominados dos setores produtores de renda se fez à custa do
"socialistas islâmicos", que atrelavam aspectos decréscimo do setor agrícola de subsistência, que
religiosos aos preceitos de igualdade defendidos. até então servia como meio de sobrevivência da
Já no Congo, no Benin, na Etiópia, na Guiné- população. A distribuição da renda proveniente das
-Bissau, em Cabo Verde, Angola e Moçambique exportações, por sua vez, era desigual, beneficiando
procurou-se aplicar um regime conforme o mo- apenas uma pequena elite, que controlava os prin-
delo soviético. Nesse contexto, apenas o gover- cipais segmentos econômicos e políticos.
no de Julius Nyerere, na Tanzânia, e o de Kwame Na época da colonização, o continente fora
Nkrumah, em Gana, procuraram elaborar um dividido pelas potências europeias sem que os inte-
discurso que levasse em consideração as peculia- resses dos africanos fossem levados em considera-
ridades da História da África. ção. Tal fato fez com que, em muitos casos, povos
Independentemente da opção ideológica ou de uma etnia ficassem separados, distribuídos por
das alianças estabelecidas, os desafios e as dificul- mais de um país após as independências. Como as
dades enfrentadas foram mais ou menos comuns fronteiras delimitadas pelos colonizadores foram
à maioria dos países africanos: pobreza extrema; em geral respeitadas, a mistura de algumas etnias
guerras civis; golpes militares; conflitos étnicos; em desarmonia entre si, em alguns casos, e a se-
fracassos das democracias e corrupção. As na- paração de etnias, em outros, geraram diversos
ções que se diziam socialistas, governadas por movimentos separatistas ou autonomistas que
partidos únicos - "marxistas-leninistas" -, não muitas vezes desembocaram em guerras civis. Essas
eram muito diferentes das "capitalistas" e pluri- mobilizações foram mais acentuadas em países
partidárias, pois o peso da herança colonial atin- com territórios maiores, como Congo, Nigéria e
gia de forma brutal os novos Estados africanos. Sudão (hoje separado em Sudão e Sudão do Sul).

No Congo e em
Zâmbia muitas
pessoas recorrem
à mineração como
/ terma de renda.
Na fotogratia,
homem e mulher
trabalham na
i extração de
cobalto entre
as cidades de
Lubumbashi
e Kolwezi,
na República
Democrática do
Congo, 2015.

222 Htuto8
Como herança da dominação impe- colonização africana. Diante do peso ex-
rialista, a demarcação das fronteiras na- cessivo do poder central, grupos em que
cionais aglutinou povos diferentes e mui- se congregavam diferentes etnias - que se
tas vezes rivais. A disputa pelo poder em sentiam prejudicadas -, categorias sociais
vários Estados africanos gerou conflitos. e agrupamentos territoriais com aspirações
Elikia M'Bokolo, historiador congolês, su- reprimidas procuraram tomar o poder por
gere que os conflitos por independência e meio de levantes armados. Houve também
agrupamento ou separação de etnias não casos de grupos políticos que, aproprian-
começaram apenas com o enfraquecimen- do-se de discurso e sentimento autonomis-
to das potências europeias, mas sim ga- tas, assumiram o controle de Estados em
nharam visibilidade nesse período, tendo formação sob o pretexto da conquista de
a resistência existido desde o momento da liberdade - caso do Congo e da Nigéria.

Organizando ideias

Leia o texto a seguir e depois faça o que se que também agem em grupo quando tratam com
pede. os outros países - detém as alavancas das finan-
Os países recentemente descolonizados, as- ças e das trocas comerciais internacionais e dispõe
sim como os países mais antigos da África, ti- também das riquezas acumuladas por séculos de
nham todos herdado, da cultura euro-americana colonização e de diplomacia das canhoneiras, e
dominante, a mesma ideia: trabalhai duramente ainda graças a um avanço inicial nas técnicas de
e tornar-vos-ei prósperos. Pouco a pouco, todos produção de massa. Também neste ponto se trata
descobrimos que não havia relação causa e efeito de fatos e não de juízos morais. Se a moral tem
entre o ardor no trabalho e a prosperidade: pare- algum papel a desempenhar neste assunto, e esse
cia haver sempre alguma coisa exterior a nós que é o meu entendimento, esse papel diz respeito ao
rompia essa suposta relação! A pretensa neutrali- futuro. Pois nós, o Terceiro Mundo, exigimos ago-
dade do mercado mundial vinha a ser a neutrali- ra que se mudem os sistemas que enriquecem os
dade entre o explorador e o explorado, entre a ave ricos e empobrecem os pobres, e isso na época das
de rapina e a sua vítima. Se, quando procurávamos outras mudanças surgidas no mundo: o fim do co-
recursos para a nossa sobrevivência, não falando já lonialismo, os progressos da tecnologia e a nova
do nosso desenvolvimento, aplicássemos à letra os aspiração da humanidade à igualdade e à dignida-
meios preconizados para reunir capitais, parecia de humanas.
que acabávamos sempre quer por cair, ou pratica- Alocução de Mwa(imu Julius Nyerere, presidente da República
mente cair, sob o jugo das firmas transnacionais, Unida da Tanzânia, em 12 de fevereiro de 1979, apud M'BOKOLO.
quer por sofrer as políticas deflacionistas do FMI, Elikia. Africa Negra: história e civilizações. Salvador: Edufba:
Casa das Áfricas, 2011. p. 644-645. Tomo II: do século XIX
quando não aconteciam as duas coísas ao mesmo
aos nossos dias).
tempo. Mesmo procurando apenas assegurar as
nossas exportações e importações tradicionais,
constatávamos que, ao trabalharmos cada vez 1.. Na opiniâo do presidente da Tanzânia, a ideia
mais duramente, o nosso poder de compra dimi- de trabalhar duramente para alcançar a pros-
nuía cada vez mais. peridade se efetivou nos países africanos?
É por essa razão que nos reunimos para nego- Explique.
ciar com os Estados industrializados as alterações
a serem introduzidas nas regras e práticas que re- A que ele atribui a dificuldade de esses países
gem as finanças e as trocas comerciais mundiais. se desenvolverem?
O sistema atual foi instituído pelos Estados indus-
trializados para servir os seus interesses. Trata-se Explique a questão moral citada pelo presidente
de um fato histórico e não de um juízo moral! Daí referente a melhorias para as nações africanas.
resulta que o grupo das nações industrializadas -

223
o extremismo e o terrorismo na África
Grupos extremistas têm atuado no a onda de violência, sobretudo devido aos
continente africano de forma cada vez mais significativos avanços de organizações
intensa nas últimas décadas. O fundamen- como o Boko Haram, originário da Nigéria,
talismo religioso já estava presente em mui- que promoveu seguidas perseguições a cris-
tos países mesmo antes das emancipações. tãos no país e em outras nações próximas,
Contudo, a criação de grandes organizações como Camarões.
radicais, como a AI Qaeda - originária do Essa ascensão do radicalismo religioso
Afeganistão -, fez com que as ações violen- na África se deve, em grande parte, ao de-
tas aumentassem consideravelmente. sencanto de amplas parcelas da população
No norte da África surgiram grupos com os poderes constituídos. Em virtude de
ligados à AI Qaeda, cujo objetivo principal fatores como a impotência do Estado, a cor-
era a imposição da sha ria a qualquer custo. rupção dos grupos dirigentes, o desrespeito
Esses grupos têm sido mais atuantes na aos valores tradicionais e a crise econômica e
Mauritânia, Marrocos, Argélia, Tunísia, social, entre outros, o extremismo se tornou
Líbia, Níger e Mali. Enquanto eles se proli- a opção de muitos daqueles que não foram
feram, os governos ainda procuram conter beneflciados após as independências.

7/ 1

.-,
Tropas da Missão de Assistencia da Organizaçao das Nações Unidas para a Somalia (UNSOM) patrulham regrao onde um carro bomba explodiu ao atingir um
comboio da ONU perto do aeroporto internacional de Mogadíscio, capital da Somália, em 2014. O atentado foi atribuido ao AI Shabaab, grupo fundamentalista
ligado àAl Qaeda.

ausa para investigação .


Em grupo, pesquise a ação de extremistas na África atualmente. Juntos, busquem ações recentes
em periódicos impressos (jornais e revistas) e em sites. Analisem as reportagens do ponto de vista
local (causas e consequências, ações do governo etc.) bem como possíveis iniciativas internacionais;
por exemplo, interferência militar ou negociaçõo. Apresentem o resultado em sala de aula.

224 :tuo8
Argélia
A Argélia foi uma colônia da França até mea- Realizadas as eleições, a Frente Islâmica de
dos do século XX. Ali viviam mais de 1 milhão de Salvação (FIS) - partido político fundamentalista e
franceses que se opunham à entrega do poder aos de oposição - obteve vitória com ampla vantagem.
nativos por causa das enormes reservas de petróleo Diante da derrota, o então governante Benjedid
e de outras riquezas existentes na região. Na década renunciou, mas a FIS foi declarada ilegal pela FLN,
de 1950, a intransigência dos franceses em nego- que estava no poder. Os militantes da FIS partiram
ciar uma saída pacífica motivou os nacionalistas, para ações armadas, e a Argélia viveu entre 1992
reunidos na Frente de Libertação Nacional (FLN), e 1999 uma guerra civil que resultou em cerca de
a iniciarem uma guerra de guerrilhas, marcada por 100 mil mortos.
diversas ações terroristas. A repressão francesa foi O sucessor de Benjedid, Muhammad Boudiaf,
dura, porém a inviabilidade de manter a Argélia sob considerado herói da Guerra de Independência, foi
seu domínio levou o governo francês a reconhecer assassinado seis meses depois de ter assumido o
a independência do país em 1962. cargo. O novo presidente passou a ser o general
Após a independência, houve uma acirrada Liamine Zeroual, que governou num período tur-
luta pelo poder. Ahmed Ben Bella governou até bulento. O aumento da repressão, as dificuldades
1965, quando foi deposto por seu ministro da de- econômicas e a ineficácia da administração fede-
fesa, o coronel Houari Boumédienne, que adotou ral abalaram fortemente o prestígio de Zeroual,
as seguintes medidas: que não concorreu à reeleição em 1999. Com
fortalecimento de um capitalismo de Estado; baixa participação dos eleitores e desistência
nacionalização dos recursos naturais, com des- dos outros seis candidatos, o general Abdulaziz

taque para as jazidas de petróleo e gás; Bouteflika foi eleito presidente, e depois três vezes
reeleito, em 2006, 2009 e 2014. Nestes últimos
relações amistosas com a URSS e a França;
pleitos, a mídia e a oposição acusaram-no de
associação mais ativa com os países árabes
irregularidades na eleição. Em 2014, houve con-
contra Israel;
frontos entre a polícia e manifestantes contrários
esforços visando à industrialização;
à reeleição, tendo como consequência urnas in-
regime de partido único. cendiadas e mais de 45 feridos.
Durante 13 anos, Boumédienne governou
a Argélia de forma autoritária. Nesse período, a
FLN dissolveu-se em várias facções, e a corrup-
ção e a pobreza aumentaram drasticamente.
Nesse contexto de grande insatisfação da
-
TLT
população e dos opositores, em 1978 ocor- 1:
reu um golpe de Estado, com a deposição de
Boumédienne e a ascensão do coronel Chadli
Benjedid. O novo presidente procurou fazer
moderadas reformas políticas, econômicas e
sociais, além de combater a corrupção.
Apesar das tentativas do presidente, a si-
tuação econômica não era boa. Em 1988, a
taxa de desemprego atingiu valores elevados,
e a população se manifestou. No ano seguin-
te, Benjedid modificou a Constituição, que
passou então a assegurar a liberdade de im- Mulher argelina exerce o direito ao voto nas prilie ias elerções livros
prensa, o pluri partidarismo e as eleições livres. realizadas no país desde a independência. Argel (Argélia), 1990.

O 225
Leia a reportagem e responda às questões. A abrupta queda dos preços no último ano
Argélia aprova criticada reforma consti- obrigou o governo a recortar as subvenções e a
tucional em momento de crise aplicar novas políticas de austeridade que já fize-
ram aflorar as primeiras manifestações de cunho
As duas câmaras do parlamento argelino apro- social no país.
varam neste domingo [7/2/2016], por arrasadora À parte do artigo 86 sobre a designação do go-
maioria, a criticada reforma da Constituição, or- verno, o novo texto destaca a recuperação da nor-
denada pelo presidente da Argélia, Abdelaziz Bou- ma que limita a dois o número de mandatos pre-
teflika, há cinco anos, quando o espírito das agora sidenciais, reformada por Bouteflika em 2008, e a
fracassadas "primaveras árabes" ameaçava conta- suposta ampliação da liberdade de expressão.
giar o país. Além disso, reconhece a língua de origem ber-
No total, 499 dos 517 deputados presentes vo- bere amazigh como oficial no país, junto ao árabe,
taram a flivor do projeto, dois contra e 16 se abs- e impede àqueles que têm dupla nacionalidade de
tiveram em uma sessão de mero trâmite, já que a concorrer a um alto cargo na administração do es-
Frente de Libertação Nacional (FLN), o partido de tado, mudança que engloba os argelinos que man-
Bouteflika, conta com maioria absoluta em ambas têm a nacionalidade francesa desde os tempos da
as câmaras. [ ... ] colonização.
A reforma, adotada em um momento no qual A nova norma começou sob a sombra da deten-
o protesto social revive no país por causa da queda ção 1...] de seis membros da Liga Argelina de Defe-
dos preços do petróleo e da política de austeridade sa dos Direitos Humanos, entre eles seu diretor, o
adotada, foi apresentada aos deputados pelo [ ... ] advogado Salah Debouz.
primeiro-ministro, Abdelrnalek Sela], cujo gabinete
Argélia aprova criticada reforma constitucional em
fica agora pendente. [ ... I
momento de crise. Terra. 71ev. 2016. Disponível em:
O pacote de reformas [...] inclui uma nova nor- <http://noticias.terra.com.br/mundo/africa/argelia-aprova-
criticada-reforma-constitucionai-em-momento-cje-crjsed
ma que, segundo os constitucionalistas, obriga o
d7fb983e300a4a08e321 ef466484acdst7qiljy.html>.
governo a renunciar uma vez que seja adotado. E ... ] Acesso em: abr. 2016.
A Argélia está envolvida na incerteza sobre a su-
cessão do idoso Bouteflika, cujo verdadeiro estado 1. Explique por que a reforma indicada na re-
de saúde é um mistério desde que em 2013 sofreu portagem foi alvo de crítica de alguns grupos
um acidente cardiovascular que o retirou dos atos argel i nos.
públicos.
A incerteza fez com que nos últimos meses te- 2.. O texto cita aspectos tanto de uma reforma
nha surgido uma guerra interna que teve como um política que previa mudanças na sucessão
dos episódios mais visíveis a cessação do general presidencial quanto da crise do petróleo
Mohamad Mediam, conhecido como "Tawfik", que o país enfrentava em 2016. Busque
chefe dos serviços secretos durante 25 anos e um informações sobre essas duas questões e
dos homens favoritos para a sucessão. informe:
A sucessão de Bouteflika, de 78 anos e no poder
desde 1999, é fundamental para a estabilidade de
ai quem está no governo e como se proces-
saram as reformas políticas citadas na
um país que é o maior exportador de petróleo do
reportagem de 2016;
Norte da África, mas que tem uma economia muito
frágil por causa das subvenções estatais proceden-
bi como foi o desenrolar da crise do petróleo
tes da venda de petróleo, que representa 97% de
e quais foram as consequências para a
suas exportações. Argélia.

- 226
Congo
O Congo, colonizado pela Bélgica, abrangia depois da independência iniciou-se um motim no
um território de mais de 2,5 milhões de km2 , habi- exército congolês. Ao mesmo tempo, na província de
tados por uma enorme diversidade de povos, des- Katanga, rica em jazidas de cobre, MoiseTshombe,
tacando-se os bacongos, os balundas e os balubas. um político congolês, deflagrou um movimento de
Na década de 1950 começou a se organizar secessão, com o apoio de uma empresa belga que
um movimento político, consolidado com o surgi- controlava a indústria de mineração de cobre.
mento - em 1956 - do grupo Conscience Africaine, Ao defender políticas socialistas, Lumumba
que reivindicava a emancipação do território. O fim passou a ser considerado perigoso pelos norte-
da década foi marcado por muitos conflitos, in- -americanos, belgas e britânicos. Temia-se que o
cluindo combates de rua, que levaram a Bélgica a líder congolês atrelasse seu país à União Soviética.
conceder a independência ao país em 1960. Diante da secessão de Katanga, Lumumba pediu
Entre os principais personagens do processo a intervenção da ONU, mas teve seu pedido ne-
de independência estava Patrice Lumumba, que gado. Em meio a conflitos étnicos internos e sem
liderava o Movimento Nacional Congolês, parti- conseguir apoio externo, Lumumba foi preso e
do defensor de um sistema centralizado de poder assassinado.
e da nacionalização dos serviços e cargos públi- Com o agravamento da situação, em setembro
cos. Patrice tinha posições anti-imperialistas, o de 1961 tropas da ONU invadiram Katanga. No ano
que desagradava aos Estados Unidos e aos líderes seguinte, a província foi dominada e Tshombe re-
locais congoleses. nunciou à secessão. Contudo, a situação continuava
Com a emanci-- dramática, graças à piora da crise socioeconômica
e à intensificação das lutas entre etnias.
mou-se um governo o Em 1965, com a ajuda de mercenários e o apoio
Lu- dos governos belga e norte-americano, o general
mumba como pri- Joseph Mobutu assumiu o poder. Com extrema
meiro-ministro e o violência conteve todas as resistências e estabeleceu
aristocrático Joseph ' já consolidado no
um governo ditatorial. Em 1971,
Kasavubu (membro poder, renomeou o país como Zaire.
da Associação do
Baixo Congo, organi- /

zação pró-indepen- t
Motim: revolta popular.
imumba p aia o ministro
dencia) como presi- da Republica do Congo. em 3 de julho Secessão: movimento de separação.
dente. Poucos dias de 1960.

[ ... } Nas três décadas em que Mobutu governou, a popular e ostensivamente socialista. Esse domínio
maioria dos zairenses foi ficando mais pobre e a vida começou a se expandir na década de 1980, e, na de
do cidadão médio no país terminava aos 40 anos, 1990, Kabila era um entre vários líderes que busca-
enquanto o próprio Mobutu e sua família iam fi- vam uma forma de derrubar Mobutu e o suceder.
cando cada vez mais prodigiosa e escancaradamente Ele recebeu um impulso quando os banyamulenges-
ricos. Durante a maior parte desse período, Mobutu -tutsis que viviam em Kivu há alguns séculos, mas
parecia irremovível, mas, em 1990, os mercados e as que o governo de Kinshasa [refere-se à capital]
universidades estavam em ebulição, e uma oposição queria expulsar e tinha privado de cidadania em
aberta explodia de tempos em tempos, mesmo na 1981 - uniram-se a ele.
capital [ ... ]. Na distante província de Kivu, Laurent CALVOCORESSI, Peter. Política mundiaL a partir de 1965.
Kabila manteve, desde os anos de 1960, um bailiado Porto Alegre: Penso. 2011. p. 558.

África contemporânea: desafios, dificuldades e avan 227


Em 1997, o regime de Mobutu começou a Com novas eleições previstas para 2016, a
decair. Laurent Kabila tomou o poder e prometeu ONU e outros órgãos, como a União Africana (UA)
instalar uma ordem democrática. O país voltou e a União Europeia (UE), acompanharam o proces-
a se chamar República Democrática do Congo so com atenção, visando ao respeito à democracia
(RDC). Com o tempo, conflitos com nações vi- e ao Estado de direito, já que, de acordo com a
zinhas, presença de forças estrangeiras para sus- Constituição da RDC, o presidente Kabila, no po-
tentar o regime e dificuldades administrativas der desde 2001, não poderia permanecer no cargo
fizeram Kabila perder apoio. Assassinado em após 2016, apesar dos indícios de que ele pretendia
2001, foi substituído por seu filho Joseph, que adiar as eleições e estender seu mandato.
procurou conciliar as forças em conflito.
Em 2006 ocorreram eleições e, por ampla
" '1
maioria,Joseph Kabila foi eleito presidente da Re-
pública do Congo. Apesar dos avanços na políti-
ca, o Índice de Desenvolvimento Humano (!DH)
do país é um dos mais baixos do mundo, os con-
flitos étnicos são constantes, há corrupção em
larga escala e a democracia formal está bastan-
te distante dos padrões considerados legítimos
- nas eleições presidenciais de 2011, o segundo
_________

L. - •1 ..
-- " Li
U trbaU o viCe til aind,í e um grave problema social no Congo Na totogralia
cnanças vendem peixe cozido em folhas em um mercado na cidade de Dongo
turno foi cancelado e Kabila, reeleito, (República Democrática do Congo). 2015.

"Organizandoideias -

Leia a reportagem a seguir que faz referência Integrantes da policia congolesa nacional e da
ao processo eleitoral no Congo em 2016. agência de inteligência nacional - Agence nationa-
Em dezembro, ONU alertou para repres- le de renseignements, ANR - são responsáveis pela
são relacionada ao processo eleitoral maioria das violações dos direitos humanos docu-
mentadas no relatório.
Em dezembro, um relatório da ONU alertou
para a repressão sofrida pela oposição, pela mídia e O documento da ONU também adverte contra a
pela sociedade civil na RDC desde o início de 2015. manipulação do Judiciário. "A interferência política
O documento destacou a necessidade de "garantir no decorrer dos julgamentos e a falta de progressos
os direitos civis e políticos antes das eleições-chave". no julgamento de alguns dos acusados demonstra
O relatório, elaborado pelo Escritório Conjunto a instrumentalização da justiça, a fim de silenciar
de Direitos Humanos da ONU no país, documen- aqueles indivíduos e, como resultado, intimidar a
tou violações dos direitos humanos em relação ao sociedade civil corno um todo", diz o relatório.
processo eleitoral entre janeiro e setembro de 2015
ONU e parceiros acompanham esforços por eleições na
- incluindo execuções sumárias, ameaças de mor- República Democrática do Congo. Nações Unidas no Brasil,
te, prisões e detenções arbitrárias, uso excessivo da 21 fev. 2016. Disponível em: <hitps://nacoesunidas.org/onu-e-
parceiros-acompanham-esforcos-por-eleicoes-na-republica -
força pelas forças de segurança e restrições do diiei- democratica-do-congo>. Acesso em: abr. 2016.
to à liberdade de expressão e reunião pacífica.
"Esta tendência de restringir a liberdade de ex- Quais são os problemas apontados nessa
pressão e de violar a segurança daqueles com urna reportagem e como afetam os congoleses?
posição crítica sobre as ações do governo indica
Pesquise em noticiários da internet a atual
um encolhimento do espaço democrático que pode
situação política do Congo e elabore uma
comprometer a credibilidade do processo eleito-
atualização para a reportagem com base em
ral", advertiu o relatório.
sua pesquisa.

228 rito8
Sudão e Sudão do SuL
Na Antiguidade, grande parte do ter- pelos islâmicos, impôs, em 1983, a sharia
ritório onde hoje estão o Sudão e o Sudão em todo o país, gerando uma nova onda
do Sul fazia parte do Reino da Núbia. de revoltas no sul, predominantemente
De 1898 até 1955, a região esteve sob cristão e animista. No início de 1985, cerca
o domínio britânico. Durante o período co- de um terço da população passava fome e
lonialista ocorreram diversas reações, que os serviços públicos estavam paralisados.
foram duramente reprimidas. Somente em Em abril daquele ano, Nimeiry foi deposto.
1956, devido às pressões de nacionalistas Novamente um regime democrático
sudaneses e do novo contexto internacio- não se sustentou. Em 1989, o exército reto-
nal, o governo do Reino Unido concordou mou o poder tendo à frente o general Omar
em conceder a independência ao país. al-Bashir, da Frente Islâmica Nacional. Em
Com um vasto território - mais de 1991, o caráter radical do regime tornou-se
2,5 milhões de km2 -, o Sudão era um Es- explícito com a implantação ainda mais se-
tado pouco habitado, com grande hetero- vera da sharia. Al-Bashir permitiu que Osa-
geneidade étnica e ampla variedade de lín- ma bin Laden se estabelecesse no Sudão,
guas. A maioria da população do norte fala onde passou a treinar os militantes da AI
árabe e tem como religião o islamismo; já Qaeda. As ações da AI Qaeda na Tanzânia
as populações do sul são de outras etnias, e no Quênia levaram os Estados Unidos a
algumas adeptas do cristianismo, e outras bombardear o Sudão e impor-lhe sanções
de religiões animistas. econômicas.
Com a independência estabeleceu-se
no Sudão um governo democrático-par-
lamentar que durou até 1958, quando o
As guerras civis
exército, sob a liderança do general lbrahim sudanesas
Abboud, instaurou um regime militar. O De 1955 a 1972 ocorreu a Primeira
novo governo aplicou uma política repres-
Guerra Civil Sudanesa. A população do
sora, perseguiu missionários cristãos e aban-
sul, de etnias diversas (dinka, nuer, zande,
donou o sul do país. Em 1964, Abboud foi shiluk etc.), majoritariamente cristãs e ani-
destituído. mistas, opunha-se ao governo central, que
Depois de um curto período demo- adotava uma política favorável aos árabes
crático, em 1969 um grupo de oficiais
e à religião muçulmana. O conflito provo-
liderados pelo general Gaafar Muhammad cou a morte de mais de 500 mil pessoas.
Nimeiry tomou o poder e estabeleceu um Em 1972 foi firmado um acordo de paz,
governo progressista, que prometia refor- que acabou fracassando.
mas profundas na sociedade sudanesa. A Segunda Guerra Civil Sudanesa
A realidade, contudo, foi bem diferente.
começou em 1983, quando o governo
Nimeiry enfrentava uma guerra civil no sul, do norte procurou novamente impor a
uma situação econômica difícil, protestos sharia em todo o país. O conflito causou
estudantis, má administração e uma série a morte de aproximadamente 2 milhões
de golpes para derrubá-lo. Pressionado de civis, além de um grande número

: G'ossário
Animista: adepto da crença segundo a qual todas as pessoas, plantas, animais e fenômenos da
natureza têm alma.

Afr I 1-~ íc cesaio;, clfpcuidade vn: 229


de refugiados nos países vizinhos. Em
2005 foi assinado um acordo de paz. Pelo
Tratado de Naibasha, estabeleceram-se
EGITO
o flm das hostilidades, a autonomia do
118 IA
Sudão do Sul, um cronograma para a
retirada das tropas do governo central da
região e, após seis anos de autonomia,
um referendo no qual a população pôde
optar pela manutenção do status de re- N
CHADE
gião autônoma ou pela independência. Cartunio
O-L.L ERITREIA
Em julho de 2011, o Sudão do Sul
SUDÃO
tornou-se um Estado independente re- s
/
O 246 492km
conhecido pela Organização das Nações 1
1 :24 600000 _/
Unidas. As disputas com o Sudão ainda
persistiram devido à partilha do petró-
leo e outras pendências. O novo país
apresenta um quadro econômico e so-
REPURLICA D Capitais
cial de extremas dificuldades. Carência CENTRO.
-AFRICANA SUDÃO oo sui
alimentar, deficiências de infraestrutura
ETIÓPIA
e saneamento, analfabetismo, miséria e
Juba
/
condiçôes precárias de saúde são alguns REP. DEMOCRÁTICA -. -
DO CONGO QUERIA -
dos desaflos que as autoridades têm en- 1 UGANDA
frentado nos últimos anos. Fonte: Atlas geográfico escolar. Rio te Janeiro: SOL, 2012. p 45.

rI
.

ci. ãc ::,cio do referendo que definiu a criação do Suduo do Sul. jan. 2011.

- 230
A questão de Darfur
A questão de Darfur é um conflito armado um dos mais altos níveis de deslocamento de ci-
na região oeste do Sudão. De um lado estão as vis já registrados até então. Além disso, os grupos
milícias Janjawid, recrutadas entre povos de lín- em conflito dificultam o acesso das organizações
gua árabe; do outro estão povos não árabes que de ajuda humanitária e da missão da ONU pre-
vivem na região. Não se trata de um conflito es- sentes na região às áreas afetadas pela violência,
tritamente religioso, pois a maioria da população descumprindo obrigações previstas no direito in-
é muçulmana, mas de uma disputa política com ternacional humanitário. A ONU continua com
fortes contornos étnicos e culturais. esforços e pedidos de paz para a região.
A seca, a desertificação, a super-
população, as disputas pelas poucas
terras férteis e o apoio do governo cen-
tral às milícias vêm provocando um
[
genocídio na região, o qual tem sido Trópico de Cãncer
denunciado e condenado por diversos EGITO
- '—' '-
paises e organismos internacionais. LÍBIA
Em 2009, o Tribunal Penal Interna-
cional emitiu um mandado de prisão
contra o presidente Omar Hassan aI- 1
-Bashir por crimes de guerra. Em meio
a essa situação, os interesses econô-
DARFUR
micos têm grande peso. A China, por CHADE DO NORTE
exemplo, tradicional aliada do governo Cartuma ERITREIA
-- --
sudanes, tem bloqueado na ONU de- AiFshir Capitais
s UD À o / nacionais
cisoes mais incisivas contra o regime
ç'Geneina-' z . Capitais
de Al-Bashir. Mesmo assim, em 2007 regionais
FUR NiaIa
• / N-
o Conselho de Segurança da ONU en- OOESTE'
viou 20 mil soldados à região com o DO SUL /L JO_LL
objetivo de por fim a guerra civil 1
Apesar de um acordo de paz ter 1 0 208 416km
sido assinado em 2011, ela parece estar 1 20800000
REPÚBLICA
distante de Darfur, pois a região ainda CENTRO -
-AFRICANA SUD AO D O S Ii 1 -
tem diversos focos de batalha: grupos
ETIOPIA
rebeldes que enfrentam o governo; di-
Juba D
ferentes grupos etnicos que lutam entre
si por territórios e influência política; REP DEMOCRÁTICA -
DO CONGO QuENIA
7 UGANDA
quadrilhas de criminosos e milícias di- -
F3nic. ONU. Dso vel em: <,:- ue : Dej: ira:
., ae c-r1:aa;ret; Di:r%2OHeqEcPa'i2:lofIIo.
versas financiadas pelo governo.
- Pdf> A(;essoen::atI.21ui.
A presença de varios grupos com
interesses e ideologias diferentes dis-
Pau_±1para _nvestigação
putando o controle da região dificulta
a paz definida no tratado. Em 2016, Pesquise a presença das forças da ONU na região do
a Unamid — sigla em inglês da missão conflito de Darfur. Que ações vêm sendo organizadas para
conjunta da UA e ONU em Darfur — amenizar a situação da população local e que tipos de
alertou sobre a intensificação dos investidas são incentivadas pela organização para que o
conflitos em algumas regiões, desta- conflito chegue ao fim9
cando que essa situação ocasionou

231
Etiópia
A Etiópia é um país extenso e o mais lio na Inglaterra, Selassié governou o país até
populoso do nordeste da África. Etnica- 1974. Nesse período liderou o movimento
mente é um conjunto de mais de 50 gru- nacionalista, responsável pela anexação da
pos que falam uma grande variedade de Eritreia (território vizinho, com saída para o
línguas. O idioma amárico é o principal. mar), praticou uma política africanista que
No que diz respeito à religião, o cristia- culminaria, em 1963, na criação da OUA
nismo e o islamismo dividem quase igual- e reprimiu com extrema violência todas as
mente a preferência dos etíopes. mobilizações oposicionistas.
Apesar da diversidade cultural, a Apesar de tais medidas, a crise eco-
Etiópia tem uma identidade nacional bas- nômica, a pobreza extrema, a ineficácia
tante acentuada, a qual pode ser atribuída do governo, os movimentos separatistas
a sua longa história de independência, e uma grande fome foram fatores que
que elevou o país a símbolo da resistência contribuíram para sua deposição por um
política e cultural africana. No final do sé- golpe militar em 1974.
culo XIX, o imperador Menelik II derrotou O novo regime militar desencadeou
os italianos, preservando a independência uma violenta repressão às iniciativas oposi-
etíope. Entretanto, rompendo com acor- cionistas. Em 1977, Mengistu Haile Mariam
dos travados pelo antigo governante, de tornou-se presidente da República, estreitou
1935 a 1941 a Itália do ditador Mussolini os laços com a URSS e procurou implan-
ocupou a Etiópia, provocando a fuga do tar o socialismo. A maior parte das terras,
então imperador Hailé Selassié. indústrias, comércios, bancos e finanças
Salvo o período de domínio italiano na passaram para o controle do Estado, mas os
Etiópia, durante o qual permaneceu em exí- resultados ficaram longe do esperado.

[ ... ] Infelizmente, a política agrícola do regime se deparou com os mesmos problemas da coletivização
de Stalin na URSS. Em 1984 e 1985, houve escassez terrível de alimentos e o desastre só foi evitado pela
pronta ação de outros países, que enviaram suprirnentos emergenciais de alimentos. O principal problema
de Mengistu era a guerra civil, que se arrastou por todo o seu período no poder e engoliu seus escassos
recursos. Apesar da ajuda da URSS, ele estava lutando urna batalha já perdida contra a Frente de Liber-
tação Popular da Eritreia (Eritrean People's Liberation Front), a Frente de Libertação Popular do Tigre
(Tigray People's Liberation Front) e a Frente Democrática Revolucionária do Povo da Etiópia (Ethiopian
People's Revolutionary Dcrnocratic Front). Em 1989, o governo perdeu o controle da Eritreia e de Tigre, e
Mengistu admitiu que suas políticas socialistas tinham fracassado e renunciaria ao marxismo-leninismo.
A URSS o abandonou. Em maio de 1991, com forças rebeldes fechando o cerco a Adis Abeba, Mengistu
fugiu para o Zimbábue e os rebeldes assumiram o poder.

LOWE, Normari. História do mundo contemporâneo.


Porto Alegre: Penso, 2011. p. 588.

Após a deposição de Mengistu, sob a um Estado federalizado, permitindo que os


liderança de Meles Zenawi (da etnia tigre) grupos étnicos deixassem a Etiópia se assim
novo governo prometeu preservar certos desejassem. A Eritreia declarou sua inde-
aspectos do socialismo, realizar privati- pendênciaem 1993. Em 1998, por questões
zações, instituir um regime democrático, de fronteiras, houve uma nova guerra entre
assegurar a liberdade religiosa e estabelecer etíopes e eritreus. O primeiro-ministro,

- 232
Zenawi, líder da Frente Democrática Revolucioná-
ria do Povo da Etiópia (EPRDF), venceu as eleições
nacionais em 2000, foi reeleito em 2005 e governou
até 2012, quando faleceu.
Zewani foi sucedido por Hailemariam De-
salegn, que assumiu o governo prometendo dar
mais espaço para a oposição. Contudo, o novo
governo sofreu graves acusações de autoritarismo
e de violenta repressão política, que incluíam pri-
sões arbitrárias e desaparecimentos.
Do ponto de vista econômico, a Etiópia vi-
veu um grande desenvolvimento na primeira dé-
cada do século XXI, tendo recebido investimentos
externos, aumentado substancialmente as expor-
tações e investido em grandes obras públicas. En-
tretanto, o IDH do país ainda está entre os mais Acs ÂoJtja, Capital da Etiópia. 2015.A cidade tem passado por grande
baixos do mundo. desenvolvimento econômico nos ultimos anos.

Organizando ideias

Leia a reportagem. Depois, faça o que se pede. Entre as mulheres que aparecem no documen-
tário, muitas são divorciadas ou simplesmente de-
Mulheres de Quênia e Etiópia obtêm au-
cidirani não se casar, uma ideia que no Quênia ou
tonomia financeira e subvertem papéis de
na Etiópia ainda soa insólita. I)essa forma, o atletis-
gênero por meio do atletismo
mo lhes brinda uma liberdade e um sentido muito
[ ... ] Na Etiópia e no Quênia, o machismo pode amplo: podem marcar seu futuro profissional e co-
ser combatido com tênis de corrida. O dinheiro meçam a decidir sua posição no campo profissional
obtido nas pistas traz às mulheres a estabilidade sem obstáculos. Apesar disso, o machismo conti-
econômica que lhes permite ser independentes nua latente. "Os homens parecem aceitar a nova
para decidir como administrar suas contas, e, con- configuração, mas, quando começam a elaborar,
sequentemente, seu futuro. Ao voltar para casa de- deixam transparecer as contradições. É algo que le-
pois da competição, a situação mudou: as mulheres vará muitos anos", acrescenta Javier Triana.
levam o sustento e os maridos se encarregam das
DOMINGUEZ. Hugo. Mulheres de Quênia e Etiópia obtêm
tarefas domésticas. autonomia tinanceira e subvertem papéis de gênero por meio
Um documentário mostra esta incipiente revolu- do atletismo. Opera Mundi. 20 mar. 2015. Disponível em:
<http://operamundi.uoLcom.br/conteudo/samuetJ39851/
ção. O atletismo como veículo de emancipação femi- mulheres+de+quenia+e+etiopia.shtml>. Acesso em: abr 2016.
nina está retratado no filme "01:05:12. Una carrera
de fondo" (em tradução livre, "01:05:12. Uma cor- O texto revela uma inversão de papéis de
rida de longa distância"), dirigido pelos espanhóis alguns homens e mulheres em relação à
Javier Triana e Ruben San Bruno. Nas terras áridas estrutura familiar tradicional da região.
do Quênia e da Etiópia, o protagonismo é das atletas
vencedoras em grandes competições internacionais. ai Que inversão é essa?
O roteiro revela como grandes passadas e medalhas
bi Em sua opinião, quais são as possíveis
estão removendo os obstáculos que freiam a igual- consequências dessa mudança?
dade de gênero. "É apenas o começo, porém alguma
coisa começa a mudar", assegura Triana. Relacione o conteúdo do texto às ideias de
igualdade e liberdade.

233
O Renascimento Africano
De forma geral, após as emancipações na-
cionais, o continente africano vem passando por
um processo que pode ser denominado de renas-
cimento: diversos países unidos, com o objetivo
de promover a visibilidade de suas várias etnias,
culturas e tradições artísticas por meio da apre-
sentação dessa multiplicidade e riqueza, intentam
assim acabar com a ideia de atraso que muitos têm
a respeito da África.

4/ø
CeJehruçdo J uÍIÍIORa Rastafãri em Jarínu ISP) 2015. E iLni i urguí41
jamaicana, o movimento rastafâri se espalhou pelo mundo no sáculo XX.
Esse movimento tem raízes nas ideias pan-africanistas de Marcus Mosiah
Garvey, que incentivava os descendentes de imigrantes africanos a voltar
para a Africa.

Mesmo diante das influências externas, na


maior parte do continente os africanos procuram
manter ou resgatar sua diversidade cultural como
forma de resistência e também como afirmação da
africanidade.
Por esse sentimento, os diversos países africa-
nos têm procurado reafirmar suas ricas identidades
culturais, expressas em diferentes manifestações,
como a música, o cinema, as artes plásticas (pintu-
ra, escultura) e a literatura.
É importante ter em vista que a África não é
-':
um todo homogêneo, mas um continente dividi-
-
. do em mais de 50 países, nos quais se encontram
•.». 4
-
grupos étnicos que, embora culturalmente distin-
•' -TOi'5 _\..-'
tos, são englobados em um único adjetivo pátrio
- africanos. Apesar de único, esse termo carrega
.7
em si uma enorme diversidade, que, quando di-
Monumento ao Renascimento Africano, estatua de bronze de 49 m de fundida, pode livrar a África do estigma e do pre-
altura, que representa um homem, uma mulher e uma criança africanos
em direção ao futuro. Dacar (Senegal). 2013 conceito decorrentes do imperialismo cultural,
social e econômico.
Por meio de ideologias como o pan-africa-
nismo, da noção de unificação dos povos e da ideia Pan-africanismo é a ideologia que defende
de africanidade, almeja-se ressaltar a origem afri- a unidade e a solidariedade entre os países
cana de diversos movimentos não apenas culturais africanos, e o termo africanidade refere-se ao
sentimento de afinidade ou amor pela África, bem
mas também políticos, e dos vários povos de ori-
como aos movimentos de valorização da cultura
gem negra espalhados pelo globo em decorrência
africana.
do processo escravista e de migrações posteriores.

- 234
Observe as imagens e depois responda às questões
E
8

-
- . -

-
Grupo de elefantes é observado por pessoas no Parque Nacional Chobe. Dança do Tambor Adjogan no Festival Vudu de Owdah, Uldã (Benin).
em Kímie (Ftsuanii 21 2014.

. ...- .- .

de Assega, montado pelas Nações Unidas para


..... n ,.m da Nigéria ameaçadas pelo Boko Haram. Fotografia
de 2015.

Essas imagens sáo comumente utilizadas para representar a África. Diante do exposto neste
capítulo, pode-se tomá-Las como representativas de todo o continente? Justifique sua resposta.

Quais dessas imagens podem ser relacionadas ao termo africanidades? Por quê?

África contemporânea: desafios, dificuldades e avancos 235


~Q Debate interdisciplinar
Literatura e africanidade
No continente africano, a literatura foi um dos O escritor moçambicano Mia Couto, por
meios utilizados para consolidar a ligação entre exemplo, pauta suas obras na construção e
os povos, servindo como suporte para a efetivação na consolidação da identidade nacional de seu
da ideia de africanidade por meio do retrato da país. Os primeiros poemas do escritor foram
multiplicidade cultural e, ao mesmo tempo, da publicados, quando ele tinha 14 anos, no jornal
importância da união. Notícias da Beira. Mia Couto é considerado um
Fora da África, a literatura africana também é dos nomes mais importantes da literatura afri-
utilizada para darvisibilidade às múltiplas culturas cana. Em suas obras, utiliza muitas expressões
do continente - a maioria desconhecida da popu- regionais e recursos do realismo fantástico,
lação ocidental -, o que contribui para a desmis- como mitos e lendas do folclore moçambicano.
tificação do ideário criado em relação às práticas Sua obra é tão rica em especificidades culturais
culturais e religiosas nas sociedades africanas. que é constantemente comparada à de escri-
Stuart Hall, um importante estudioso jamai- tores consagrados, como o colombiano Gabriel
cano, defende que a cultura nacional funciona García Márquez e os brasileiros Guimarães
como um sistema concebido por meio da adoção Rosa e Jorge Amado.
de práticas e símbolos socialmente criados pela Ao escrever suas obras, Mia Couto preocupa-
população ou por seus representantes, que assim -se principalmente com a identidade dos povos
constroem a identidade nacional de um povo. africanos. Alguns de seus textos tratam da luta
Nesse sentido, a literatura serve também para pela consolidação da independência de seu país,
ressaltar esses aspectos, estabelecer laços entre o que contribui para que suas histórias mostrem
as pessoas que se identificam com os persona- os conflitos que resultam da imposição dos
gens retratados e mostrar um pouco da realidade valores coloniais sobre os valores e costumes
contada para quem não a vivencia. tradicionais regionais, que, mesmo reprimidos,
Muitas obras literárias produzidas no continente conseguiram sobreviver. O título Terra sonâm-
africano, ao retratar o dia a dia de seu povo, con- buLa, por exemplo, original.mente publicado em
seguem romper com a herança colonial, criando 1992, foi considerado um dos melhores livros
novos estilos de escrita e narrativa e mostrando africanos do século XX.
aspectos socioculturais
ora abafados, ora repudia-
dos pela cultura ocidental.
1
Deixam claro assim que a
autonomia cultural africa-
na está fortemente vincu-
lada à liberdade de utiliza- ,

ção das diferentes línguas


e linguagens presentes
no continente e à vivência
da cultura popular como
forma de resistência aos
padrões comportamentais,
culturais e de consumo
impostos pelas sociedades
colonizadoras. uc Paris (França). 2015.

-236
Vamos ler um trecho dessa obra:

E
a

O tempo passeava com mansas len- Aos poucos, eu sentia a nossa farní-
tidões quando chegou a guerra. Meu pai lia quebrar-se como um pote lançado no
dizia que era confusão vinda de fora, tra- chão. Ali onde eu sempre tinha encontra- j
zida por aqueles que tinham perdido seus do meu refúgio já não restava nada. Nós
privilégios. No princípio, só escutávamos estávamos mais pobres que nunca. Junhi-
as vagas novidades, acontecidas de lon- lo tinha os joelhos escapando das pernas,
ge. Depois, os tiroteios foram chegando cansado só de respirar. Já nem podíamos
mais perto e o sangue foi enchendo nosso,-, machambar. Minha mãe saía com a enxa-
medos .A guerra é uma cobra que usa os da, manhã cedinho, mas não se encami-
nosso,,; próprios dentes para nos morder. nhava para terra nenhuma. Não passava
Seu veneno circulava agora em todos os das micaias que vedavam o quintal. Ficava
rios da nossa alma. De dia não saíamos, de a olhar o antigamente. Seu corpo emagre-
noite não sonhávamos. O sonho é o olho cia, sua sombra crescia. Em pouco tempo,
da vida. Nós estávamos cegos. aquela sombra se ia tornar do tamanho de
toda a terra.
COUTO, Mia. Terra sonâmbula.
<-'>ão Paulo: Companhia de Bolso. 2015. p. 15-16.

Outros escritores, como os angolanos Pepetela e o escritor é um ser que deve estar aberto a via-
Ondjaki, o egípcio Naguib Mahfouz e a sul-africana jar por outras experiências, outras culturas, outras vi-
Nadine Gordimer, vêm sendo amplamente divulga- das. Deve estar disponível para se negar a si mesmo.
dos pelo fato de retratarem, por meio da literatura, Porque só assim ele viaja entre identidades. E é isso
as realidades e especificidades culturais de seu que o escritor é - um viajante de identidades, um con-
respectivo povo, ajudando assim a desmistificar trabandista de almas. Não há escritor que não partilhe
as culturas africanas, condenadas à exclusão e ao dessa condição: uma criatura de fronteira, alguém que
preconceito durante o processo de colonização. vive junto à janela, essa janela que se abre para os ter-
Esse novo movimento literário ressalta a ideia ritórios da interioridade.
da exportação da africanidade, segundo a qual, O nosso papel é o de criarmos os pressupostos de
por meio da difusão de informações a respeito um pensamento mais nosso, para que a avaliação do
das culturas africanas, desmancham-se os pre- nosso lugar e do nosso tempo deixe de ser feita a partir
conceitos e ideias limitadas a respeito dos povos de categorias criadas pelos outros. [.1
africanos, por tanto tempo sustentadas. Sobre o COUTO, Mia. Pensatempo: textos e opiniões.
Atfragide: Caminho. 2005. p. 59.
papel do escritor nesses processos, Mia Couto
afirma que:

1. Para Mia Couto, o papel do escritor é avaliar o lugar retratado em suas obras sem a limitação das
categorias criadas por quem não vivencia aquela realidade. Pesquise trechos de obras literárias
africanas em que elementos culturais e sociais são retratados. Procure estabelecer uma relação
entre o tratamento de determinados aspectos culturais na obra escolhida e na sociedade brasileira.

237
Testando seus conhecimentos Responda no caderno

1. (UFSC-SC) A África é tão pouco uniforme cul- os países africanos, estabelecidas pela
tural quanto geograficarnente. Os africanos não Conferência de Berlim (1884-85), tive-
são uma raça de pretos primitivos, nem é a Áfri- ram que respeitar as questões étnicas
ca um continente sem uma velha história, como e culturais por determinação da Orga-
ainda se pensa geralmente. [ ... ] São marcantes nização das Nações Unidas (ONU).
suas diferenças culturais, étnicas e linguísticas. Os processos de independência na Áfri-
Seu passado, embora não raro obscuro, não é a ca, intensificados logo após a década de
crônica de um isolamento. Desde o tempo dos 1950, ocorreram através de acordos pa-
primeiros hominídeos que viveram há um mi- cíficos que promoveram o endividamen-
lhão de anos no desfiladeiro de Olduvai, a África to e a dependência dos novos países,
desempenhou importante papel na história da mas evitaram a deflagração de conflitos
humanidade [... e guerras civis.
LOMMEL, Andreas. A arte pré-histórica e
primitiva. Encyclopedia Britarinica do Brasil 2. (ESPM-SP) Na Batalha de Argel, em 1957, as
Publicacões. 7. ed. Rio de Janeiro: Expressão
forças francesas, que chegaram a contar com qui-
e Cultura, 1979. p. 140-141, 143, 162. In: FARIA,
Ricardo de Moura. Estudos de História. v. 1. nhentos mil soldados, conseguiram desmantelar
São Paulo: FTD, 2010. p. 37. a organização clandestina da Frente de Liber-
Em relação à história da África e de seu povo, tação Nacional (FLN), na capital do país. Uma
assinale a(s) proposição)ões) CORRETA(S). sangrenta repressão à população civil árabe, no
entanto, consumou a divisão entre a minoria
a) Além dos egípcios, vários outros povos
francesa e a maioria muçulmana. A Guerra da
habitavam o continente africano no pe-
Argélia produziu uma crise no governo francês e
ríodo correspondente à chamada Idade
levou à queda da IV República.
Antiga.
(Leonel Itaussu. História Moderna e Contemporânea)
bi A expansão marítima europeia dos
séculos XV e XVI transformou a costa O texto aborda problemas enfrentados
africana em espaço privilegiado para a pela França na África, antes da Segunda
formação de feitorias e, consequente- Guerra Mundial.
mente, em fonte de mão de obra e ma- O texto aborda a Guerra de Independên-
téria-prima. cia da Argélia, em plena descolonização
ci O neocolonialismo europeu sobre o da África, onde foram adotadas táticas
continente africano no século XIX esta- de guerrilha rural e urbana contra o co-
va relacionado à ideia de missão civili- lonialismo europeu.
zadora e às ideologias de progresso e A queda da IV República francesa signi-
superioridade racial branca. ficou o afastamento definitivo do poder
Com a expansão islâmica, todo o norte do general Charles de Gaulle.
africano foi dominado pelos árabes atra- di A Argélia havia se tornado uma colônia
vés da fundação de diversos califados; francesa após a Segunda Guerra Mun-
entretanto, durante a Idade Média, o dial em meio às tensões da Guerra Fria.
avanço das cruzadas recuperou definiti-
e) A Argélia tinha sido uma colônia alemã,
vamente a região para o domínio cristão.
mas passou ao domínio da França como
Mesmo a contragosto das principais resultado dos tratados que se seguiram
potências europeias, as fronteiras entre à Primeira Guerra Mundial.

— 238
Responda no caderno

3. (Fuvest-SP) Na província sudanesa de Darfur, em


territórios do antigo Estado de Rabah,
trava-se, hoje, uma sangrenta guerra
civil, envolvendo, entre outros, diferen-
tes grupos étnicos e religiosos.
Nas antigas possessões zanzibaritas
vêm ocorrendo, há vários anos, violen-
Kartum
MOUROS
15011104
tas disputas entre diversos grupos tri-
- .CALIE050
.TUCULOUF
-
EST000 DE
11013011 EflOP!A bais em torno do controle da produção
-
LIBÉRiA, ..
Ads-Abottt de petróleo.
logos -
Ao norte dos antigos estados Bôeres,
Ri'r -
) região então conhecida como Bechua-
. Zanobar
.47ÍÂNT/C1J
lvanda• nalândia, travou-se, há poucos anos,
violenta luta, envolvendo os grupos ét-
' Madagasca, nicos tútsis e hútus.
África Negra: 1884/1890 <f' No extremo ocidental do Golfo da Guiné,
Fronteoas / Limdes dos Estados -
ir Possessões Zanzibaritas . ao sul da região anteriormente controla-
Possessões Europóias Cobo . -
da pelos mouros, os conflitos atuais es-
1Estados Soares
tão relacionados à disputa pelo controle
Frfl: Açdi Ca;c:s R:id:r:j:s Pequena História da África das ricas jazidas de prata ali existentes.
Negra, H1i10.
A Etiópia, que sempre teve fronteiras re-
Tomando por base o mapa acima, aponte a lativamente bem definidas, foi, por essa
alternativa que descreve corretamente a si- mesma razão, o único país africano capaz
tuação atual da área questionada. de manter a paz interna até nossos dias.

que vive em um campo de refugiados no Sudão,

rIaravocêLer j finge ser judeu a fim de fugir para Israel. Lá, é


adotado por uma família judia e precisa se adap-
África e Brasil africano, de Marina de Meilo e Souza. tar à nova vida.
São Paulo: Atica, 2013. Esse livro traz um panorama
HoteL Ruanda, direção de Terry George. Reino
da formação do continente africano e das diversas
Unido/EUA/Africa do Sul/Itália, 2004, 120 mm.
sociedades locais, com toda sua complexidade cul-
No ano de 1994, em Ruanda, um conflito políti-
tural. Também retrata o comércio de escravos para
co levou à morte quase 1 milhão de pessoas em
a América e a integração de seus descendentes à
apenas 100 dias. O filme conta a história de Paul
sociedade brasileira.
Rusesabagina, gerente de hotel que abriu as
Para quando a África?, de Joseph Ki-Zerbo. Rio portas do estabelecimento para abrigar pessoas
de Janeiro: Pailas, 2006. Nesse livro, o historia- desamparadas e conseguiu, assim, amenizar o
dor examina a situação da África nos tempos da sofrimento de centenas de pessoas.
globalização e o que o futuro reserva para o con-
O jardineiro fieL, direção de Fernando Meireiles.
tinente, um vagão do trem do desenvolvimento
EUA, 2005. 128 min. Justin Quayle, um britânico
desde o século XVI.
que vive na África, é diplomata por profissão ejar-
dineiro por hobby. A vida de Ouayle muda quando

rPara você assistir LIJ sua esposa, uma ativista humanitária, é brutal-
mente assassinada. Decidido a investigar o que
Um herói do nosso tempo, direção de Radu Mihai- houve, ele descobre que o crime foi comandado
leanu. França/Bélgica/Israel/Itália, 2005. 140 mm. por uma grande empresa farmacêutica, que usa
Salomão, um menino cristão etíope de 9 anos, africanos como cobaias para lestes de remédios.

239
o
JuuF

\\J\IllI
T
EDGE

Para entender as manifestações cul.tu- As relações de poder também influen-


rais de uma sociedade, é preciso discutir as ciam sobremaneira a forma pela qual a in-
maneiras pelas quais se manifestam as re- formação se processa nas sociedades - até
I.ações de poder. Nesse sentido, é necessário porque ela faz parte do processo de cultura
entender de que modo a cultura influencia geral de uma sociedade e, portanto, também
as relações de dominação e até que ponto está intrinsecamente ligada às relações de
está inserida nelas, poder.
'IoN
'=
wantyou to J'J'

#AtTheEdge

FL.

Na medida em que cultura e informação informação influenciam ou manipulam as


são influenciadas pelas relações de poder e sociedades?
também representam formas de poder so- Essas e outras questões são abordadas
bre as pessoas, emergem as questões rela- neste capítulo, em que são fornecidos al-
tivas à liberdade. Como o direito à liberdade guns subsídios para refletir a respeito da li-
cultural e à liberdade de expressão é asse- berdade expressa nas várias manifestações
gurado? Como a cultura e a transmissão de culturais e na transmissão de informações.
O poder e suas manifestações
Manifestações de poder estão presen- como esse exercício sempre fascinou (e
tes em muitas situações de nosso dia a dia, ainda fascina) os seres humanos no de-
influenciando diferentes tipos de ativida- correr da história. Portanto, as relações
des, desde ações culturais à transmissão de sociais estão permeadas pelo exercício do
informações na sociedade, refletindo-se em poder.
nossas relações pessoais e cotidianas. Este pode ser classificado, segundo
Existem diversas formas de conceituar alguns estudiosos, com base nos meios
poder. Em boa parte delas seu significado empregados para sua manifestação. Por
remete ao controle e à imposição de pontos essa classificação, há o poder econômico,
de vista, opiniões ou comportamentos. que se manifesta pela riqueza; o poder ideo-
O poder se manifesta quando alguém lógico, cujo meio de exercício é o saber; e
ou um grupo impõe sua vontade, seus obje- o poder poLítico, associado ao controle do
tivos e/ou desejos aos outros. Essa imposi- uso da força, legitimado pela população.
ção pode ocorrer mesmo quando esses ou-
tros se mostram relutantes ou contrários,
pois o poder pode ser exercido na forma de O que caracteriza o poder poLítico é a
submissão, com o uso da força, e também exclusividade do uso da força em relação
pela manipulação ou autoridade. E, nessa à totalidade dos grupos que atuam num
relação, quanto maior for a capacidade de determinado contexto social, exclusi-
impor a vontade para alcançar determina- 'idade que é o resultado de um proces-
do objetivo, maior será o poder. so que se desenvolve em toda sociedade
organizada, no sentido de monopoliza-
Esse objetivo pode ser relacionado,
ção da posse e uso dos meios com que se
por exemplo, a questões de ordem econô-
pode exercer a coação física.
mica, social, religiosa e doutrinária. Mas
também, por vezes, ele é somente o exer- BOBBIO, Norberto; MAT[EUCCI, Nicota; PASQUINO.
Gianfranco lürg.l. Dicionário de poLítica.
cício do poder, seja em que situação se Brasítia: UnB, 2004. v. 2. p. 956.
apresentar. Existem inúmeros exemplos de

J -

/ tT
1
''-'--. ------ ?- - -----.! - .---------.----
t1 - •
Barack Obarn
1 -.
em discurso na,
sede da Uniae, . r ----------
Africana em Adis- ,
Abeba (Etiopid)
2015 Obam ...
foi considerado .. ..
um dos tiomero . . .. .-, .-
mais poderosos . .•'r
do mundo ;,
Fi
enquanto esteve
napre:idenciados •,

1
i..
- 242
O poder político pode ser entendido como Entretanto, cabe salientar que a ordem so-
uma forma de manter a ordem e assegurar a esta- cial não é determinada apenas pelo poder insti-
bilidade política de determinado grupo em busca tucionalizado, mas também por costumes, pre-
do bem-estar comum. É possível identificar a atu- ceitos, crenças, paixões coletivas e organizações
ação desse poder em diversas sociedades ao lon- sociais, como família, escola etc.
go da história, sobretudo naquelas organizadas
em Estados, organismos baseados na existência O poder das ideias
de um poder político forte.
Para entender como o poder influencia o Durante a Guerra Fria, surgiram formas al-
processo cultural das sociedades e a transmissão ternativas de construção da identidade pessoal,
de informações, devem-se considerar os instru- social e nacional, bem como se desenvolveram
mentos pelos quais ele é exercido e as fontes de outras formas de fazer política. Nesse contexto,
direito para esse exercício. De forma sucinta, Po- emergiram movimentos sociais como os feminis-
dem-se definir três instrumentos para o exercício tas, os ambientalistas e outros que mexeram nas
do poder: a coação, a recompensa e a persuasão. estruturas tradicionais da prática da política, tan-
No caso da coação, a submissão de um ao to interna quanto externa. Essas modificações es-
outro ocorre pela imposição de normas. No Bra- tiveram baseadas no conjunto de ideias que pre-
sil, por exemplo, o Estado usa sua soberania para valeciam no momento.
estabelecer leis e impor o cumprimento delas a
toda a população, que, se não as cumprir, corre o
risco de receber punição. Ideias são a força motriz do processo cul-
A recompensa é o uso do poder de forma tural que dá consistência (ou resistência, ou
compensatória, o que leva à aceitação da submis- ambas) à afirmação de indivíduos ou grupos
são em troca de algo, que pode ser uma recom- na realidade histórica das sociedades. Não é
pensa financeira ou social. Pode-se exemplificar relevante ou decisivo defini-las concretamente
com a questão do pagamento de impostos: neste ou julgá-las boas ou más. O fundamental é re-
caso a população deve receber uma compensa- conhecer sua ação e sua inércia. Entendidas de
modo estritamente formal, "ideias" é aqui um
ção social - estradas, saúde pública etc. -, que a
termo que designa o conjunto de convicções,
leva a aceitar o pagamento do tributo.
crenças, opiniões, interesses, motivos, que,
Já a persuasão é a submissão gerada pelo
adotado pelo agente racional humano, indivi-
convencimento do que é apropriado, ou seja, as
dual ou coletivamente, determina o seu agir.
pessoas são conscientizadas ou convencidas de As ideias desempenham numerosas funções,
que determinado comportamento e certa ação na vida pessoal, na vida social e na vida cultural.
são mais adequados do que outros e por isso de- A perspectiva com base nas ideias aqui tratadas
vem ser praticados. Um exemplo é o conceito do diz respeito a seu desempenho no contexto das
trabalho individual para grande parte da popu- redes culturais cuja resultante são formas de po-
lação. Muitas pessoas são convencidas de que, der na sociedade e no Estado, que interferem na
mais do que pelo salário, trabalham para desem- formulação e na prática de condutas individuais
penhar seu papel na organização da sociedade, e sociais. Essas condutas incluem, por certo, as
ou seja, cumprem seu dever para com todos. Ou- políticas públicas definidas pelos Estados, como
institucionalizações da sociedade.
tros exemplos desse instrumento de poder são o
[...1 A articulação entre o plano das ideias,
patriotismo e a fidelidade partidária.
formador do campo cultural, com o da ação,
De forma geral e resumida, é assim que o po-
estruturador do exercício do poder, mede as re-
der se manifesta nas sociedades quando analisadas lações pessoais ou sociais, sempre que estas afe-
pelo viés das relações de domínio institucionaliza- tam o quotidiano de cada um, seja ele individuo,
das, ou seja, na relação com o poder do Estado. grupo ou comunidade.
Para podermos analisar a influência do po-
MARTINS, Estevão Chaves de Rezende. ReLações
der na cultura e na transmissão de informação, internacionais: cultura e poder. Brasília: Ibri, 2002. p. 23.
precisamos compreender sua forma institucional.

o: 243
A partir da década de 1990, com

!J jL Ji
as mudanças nos processos políticos e

LL kí
econômicos e, sobretudo, com a rees-
truturação dos movimentos sociais, o
papel das ideias passou a ser cada vez
maior na definição das políticas públi-
cas. As ideias - e seu conjunto, a cul-
tura - são influenciadas pelas relações
de poder formal e as influenciam, uma
vez que há uma relação direta entre

i. elas (formadoras do campo cultural)


e a ação (exercício do poder). Assim,
a ação na política é sempre um reflexo
das ideias como crenças, opiniões e
NN, interesses. Nessa visão, a definição de
políticas públicas é influenciada pelas
ideias presentes na sociedade em de-
terminado momento.

indigenas dos grupos Guararu Kaiowã. Kadimeu e Terena em manilestação pela niellroria
nos processos de demarcação das terras indígenas no Brasil. Campo Grande (MS), 2015.

Organizando ideias
Em dupla, analise os textos e, juntos, façam agir, até à capacidade do homem em determinar o
que se pede. comportamento do homem: Poder do homem sobre
homem. O homem é não só o sujeito mas também
Texto 1
objeto do Poder social. É Poder social a capacidade
poder não é um ser, "alguma coisa que que um pai tem para dar ordens a seus filhos ou a
se adquire, se toma OU se divide, algo que se deixa capacidade de um Governo de dar ordens aos cida-
escapar". É um nome atribuído a um conjunto de dãos. Por outro lado, não é Poder social a capacidade
relações que formigam por toda a parte na espessura de controle que o homem tem sobre a natureza nem
do corpo social (poder pedagógico, pátrio poder, a utilização que faz dos recursos naturais.
poder do policial, poder do contramestre, poder do
BOBBIO. Norberto; MAUEUCCI, Nicota; PASQUINO,
psicanalista, poder do padre etc., etc.). j ... j. Giantranco Org.l. Dicionário de política. Brasília:
UnO. 2004. v. 2. p. 933.
LEBRUN, Gérard. O que é poder.
São Paulo: Brasiliense, 2004. p. 20.
De acordo com os textos, o que é poder?

Texto 2
A que poderes o autor do texto 1 faz referência?
[.1 a palavra Poder designa a capacidade ou a Como esses tipos de poder se efetivam na
possibilidade de agir, de produzir efeitos. Tanto sociedade? Exemplifiquem.
pode ser referida a indivíduos e a grupos humanos
como a objetos ou a fenômenos naturais (como na Expliquem a expressão poder do homem
expressão Poder calorífico, Poder de absorção). Se sobre o homem citada no texto 2.
entendermos em sentido especificamente social,
ou seja, na sua relação com a vida do homem em De que modo o exercício do poder influencia
sociedade, o Poder torna-se mais preciso, e seu es-
a vida de vocês?
paço conceptual pode ir desde a capacidade geral de

— 244
Cuttura e poder
As diferentes formas de manifestação cultu- ções, como pinturas, canções, inscrições, escultu-
ral de determinados grupos ou comunidades são ras e livros.
a chave para o entendimento de suas visões de Na história dos diferentes povos e sociedades,
mundo, de suas atividades cotidianas e das cren- a produção cultural é sempre rica e dinâmica.
ças que fundamentam suas ações. Elas podem Além disso, a produção e a disseminação desses
servir como ponto de partida para o estudo de bens culturais tendem a sofrer a interferência das
suas hierarquias sociais e relações de poder, este- relações de poder. Nas sociedades surgidas após
jam elas relacionadas a um papel desempenhado, a Idade Moderna e nas contemporâneas, em geral
a um gênero ou a valores econômicos. o poder está relacionado ao controle político e
Historicamente, cada povo encontrou formas econômico representado pelo Estado e outras
de preservar suas ideias expressas em memórias e instituições, mas isso não significa que as pessoas
tradições. Dessa maneira, por meio da memória não tenham poder. As pessoas e as coletividades
cultural, ou melhor, do legado de seus antepassa- também têm muito poder nas sociedades atuais,
dos, as sociedades construíram suas identidades. uma vez que podem exercer pressão sobre as insti-
tuições em diferentes âmbitos.
Antropólogos, historiadores e outros cien-
A memória ...j é um processo permanente de
tistas sociais costumam definir cultura como "o
construção e reconstrução, um trabalho [ ... ]. O es-
forço com que costumam investir grupos e modo de vida de um povo". Assim teríamos di-
sociedades, para fixá-la e assegurar-lhe estabilidade, visões como cultura africana, cultura europeia,
é por si indício de seu caráter fluido e m a ava. As cultura indígena etc. Entretanto, na globalização,
sociedades de comunicação oral, por exemplo, de- esses rótulos perdem força, pois, pela informati-
senvolveram sofisticadas e eficientes técnicas m se zação da sociedade, as identidades culturais in-
mõ s c a para evitar variações: o ritmo, a conven-
dividuais ou coletivas (das sociedades) acabam
ção formular, os sistemas de associação etc. Nem
sendo influenciadas por elementos globais.
por isso, revelam os especialistas, a tradição se deixa
cristalizar: a comunicação nunca se faz rigorosa-
mente palavra por palavra, mas absorve variações
de escala díferenciada. O caso das culturas orais é - .ç3
interessante porque, nelas, o processo de registro e -4 (

conservação de informação coincide inteiramente ,

com o processo de sua comunicação, socialização.

MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. A história, cativa da


memória? Revista do Instituto de Estudos Brasileiros,
IEB USP, São Pauto, o. 34. p. 10-11 e 22, 1992.

Em diversas sociedades, a cultura é transmi-


tida de forma oral entre as gerações. Além disso,
ela pode ser registrada em diferentes manifesta-

A &ossaiia
Ingente: que é muito grande.
Mnemônico: técnica para facilitar a memori-
zação por meio de exercícios como a combinação
de elementos associáveis.
Mutável: que se pode mudar ou que tem a A transmissão da cultura por meio da oralidade é marcante na Africa, Na
capacidade de transformar-se. fotografia, membros do grupo pigmeu Batwa compartilham histórias em
vila de Mukono (Uganda), 2015.

245
Assim, a cultura particular ou gru paI pode ser
Pausa para investigação
moldada e manipulada pelo Estado e também - ou
ao mesmo tempo - pelo mercado (entendendo-se
Em grupo, pesquise as tradições culturais
mercado como o sistema de circulação de ideias e
dos povos nativos do Brasil no passado e no
produtos entre as diversas sociedades mundiais).
presente. Juntos, busquem traços indígenas na
Assim se justifica a ideia da existência de uma
língua, nos costumes, nos hábitos alimentares
indústria cultural, em que a cultura, como qualquer
da sociedade brasileira e verifiquem de que
mercadoria, pode ser comercializada, receber i nves-
modo essa cultura está presente atualmente.
timentos empresariais ou estatais e ser consumida.
Depois, apresentem o resultado aos colegas.
E, como produto, pode ser usada como instrumen-
to de dominação política e econômica.

OElanizando ideias
Em dupla, leia o texto e faça o que se pede Da mesma forma, sabemos perfeitamente como
Cultura como mercadoria se constrói um forte apache típico do oeste ameri-
cano, mas não temos a menor ideia de como era
Na sociedade capitalista, comida não serve ape- uma cidade brasileira do século passado, como
nas para alimentar as pessoas: serve também como Sorocaba das feiras de muares, para não falar dos
produto tanto para aquele que planta e vende quanto acampamentos dos bandeirantes ou do mobiliário
para o consumidor que paga um preço por ela, sem das "casas grandes" do período açucareiro.
falar nos atravessadores, intermediários, que nem Isto tudo ocorre porque a informação cultural
produzem e nem consomem, apenas comerciam. transforma-se em mercadoria com etiqueta, preço
Da mesma forma que a comida, tudo na socie- e tudo. Só o desenvolvimento de uma consciência
dade capitalista, além do seu valor intrínseco ou uti- histórica bastante crítica poderá permitir às pessoas
litário, é mercadoria: tem um preço, uma estratégia se darem conta disso e eventualmente lutarem pelo
de venda, pessoas que podem ou não comprá-la e direito à cultura desejada e não à cultura imposta.
assim por diante. Não é difícil pensar em outros pro-
dutos com os quais se dá o mesmo fenômeno: um P1NSKY, Jaime. Cultura como mercadoria. in: - tOrg.l.
História da América através de textos.
automóvel, um apartamento, roupas etc. Em nossa São Pauto: Contexto, 2001. p. 135-136.
sociedade, ter acesso a estes produtos não depende
de quão necessários eles possam ser para alguém e
O autor cita filmes, livros e músicas como
sim que condições de pagar por eles as pessoas têm.
Em relação à cultura ocorre o mesmo. exemplos de produção cultural transformada
Um filme para ser produzido e visto depende de em mercadoria. Sobre esse assunto, respon-
verbas, técnicas competentes, bom esquema de dis- dam às perguntas a seguir.
tribuição, além da simples "ideia na cabeça". Um
ai Que outros exemplos vocês podem citar?
livro também sofre um processo de industrializa-
ção e de comercialização. Quanto à música nem se b) De que modo esses objetos ou manifes-
fala! Sai mais barato comprar nos EUA uma matriz tações são usados como mercadoria na
já gravada e reproduzi-la aqui, do que juntar mú- sociedade?
sicos num estúdio e pagar os custos de uma grava-
ção original. No caso da música há ainda o fato de A existência de uma 'cultura imposta" na socie-
que para muitos a melodia é suficiente, tornando-
dade atual é umas das principais ideias do texto.
-se desnecessária a tradução, enquanto livros ne-
cessitam de traduções caras e produções editoriais ai Citem um dos casos utilizados pelo autor
próprias. 1)aí a enorme facilidade da penetração para exemplificar essa imposição cultural.
cultural por intermédio da música.
Através de repetições frequentes molda-se o bi Vocês concordam com a existência dessa
gosto tanto de apreciadores de música como de te- 'cultura imposta"? Por quê?
lespectadores. f...

— 246
Cu[tura e Liberdade no BrasiL
na Ditadura MiLitar
São consideradas manifestações culturais
todas aquelas que caracterizam, identificam e atrasado, como se houvesse "dois brasis".
representam a cultura de um povo ou de uma Essas ideias eram disseminadas pelos teóricos
...]. E circulavam especialmente nos meios
nação. Abordar a cultura popular brasileira é
intelectuais e artísticos comprometidos com o
uma tarefa muito ampla e complexa, pois o país que se convencionou chamar de projeto "na-
conta com uma gama imensa e variada de mani- cional-popular". A proposta era revolucionar
festações culturais. A cultura popular brasileira não só a sociedade, mas a própria arte. Era o
constitui-se, segundo definição do Ministério da que pretendia o Cinema Novo, que geraria o
Cultura, das maneiras de ser, agir, pensar e se famoso manifesto de Glauber Rocha, "Estética
expressar de diferentes segmentos da sociedade, da fome".
que podem ser observadas tanto nas áreas urba- Exem plos artísticos dessa "brasilidade revo-
lucionária" são a dramaturgia do Teatro de Are-
nas como nas rurais.
na de São Paulo e de autores como Dias Gomes;
Na década de 1960, as manifestações cul- a trilogia clássica do Cinema Novo (Vidas secas,
turais no país foram extremamente influenciadas de Nelson Pereira dos Santos, Deus e o diabo na
pelos acontecimentos políticos. Foi um período terra do sol, de Glauber Rocha, e OsJizis, de Ru),
de intensa movimentação, durante o qual artistas Guerra, os três rodados antes do golpe e exibi-
e intelectuais engajados nos movimentos políti- dos depois); a canção engajada de Carlos Lyra e
cos buscavam conscientizar a população sobre a Sergio Ricardo; e a agitação e propaganda (agi-
real situação de falta de liberdade. Pode-se perce- trop) dos Centros Populares de Cultura (CPCs)
ber que procuravam também conclamar o povo a da União Nacional dos Estudantes. [...]
uma ação que mudasse essa realidade. RIDENTI, Marcelo. Uma década de sonhos e
mudanças. Nossa História. São Paulo: Vera Cruz.
ano 3, n. 26, p. 63-64, dez. 2005.

Um sentimento de brasilidade ao mesmo tem-


po romântico e revolucionário floresceu no início
da década de 1960. Buscava-se, no passado, uma deus e o diabo
cultura popular cujas raízes dariam sustentaçâo a na terra do sol
uma nação moderna, que acabasse com o subde-
senvolvimento e as desigualdades. Combatia-se
o latifúndio; propunha-se a reforma agrária; e o
"povo brasileiro" era glorificado e conclarnado Cartaz do filme
a realizar sua revolução [ ... ], enquanto artistas e Deus e o Diabo
na Terra do
intelectuais denunciavam as péssimas condições Sol, de Glauber
de vida nas grandes cidades e no campo (simboli- Rocha, elaborado
zadas pelos migrantes nordestinos). por Rogério
Duarte, 1964.
Os artistas engajados defendiam uma arte O personagem
nacional -popular que reduzisse a alienação Corisco.
das consciências e identificava nos deserda- representado por
Olhon Bastos,
dos - camponês sem terra ou migrantes nas segura um punhal
cidades - a principal personificação do povo que divide seu rosto
brasileiro (a quem seria preciso ensinar a lutar entre a sombra
e a luz. As cores
politicamente). [ ... J quentes e as formas
Difundia-se o "dualismo" que apontava a áridas remetem
sobreposição de um Brasil moderno a outro ao sol e o calor do
Nordeste brasileiro.

247
Com a implantação do Regime Militar em
1964,
ativistas políticos, sindicalistas, organizações senados eram líderes de audiência no seu horário,
populares e parlamentares passaram a ser alvo dire- destinados a públicos diferentes. [ ... ]
Mas foram os Festivais da Canção os pro-
to de perseguição, pois representavam uma ameaça
gramas que mais agitaram a sociedade brasi-
à nova ordem constituída. No entanto, intelectuais
leira entre 1966 e 1968. Nestes anos, a fórmula
e artistas tiveram um período, de 1964 a 1968, de
"festival da canção" imperou na TV brasileira,
relativa liberdade de criação artística e expressão tornando-se os programas de maior audiência.
cultural - relativa porque, estando sob um regime [ ... ] O festival era um tipo de evento que reu-
ditatorial, a vigilância era sempre constante. nia um conjunto de músicas inéditas, de 36 a 40,
Nessa conjuntura, a oposição à ditadura espa- dependendo da emissora, em que se escolhiam
lhou-se pelo movimento estudantil e pelos setores entre estas algumas finalistas que disputavam
relacionados à cultura, como a música, o cinema, o os principais prêmios, sobretudo o de "melhor
canção". Entre 1966 e 1968, principalmente, os
teatro, a literatura. Assim, a militância política bra-
festivais acabaram sendo os principais veículos
sileira encontrou na cultura uma forma de atuação.
da manifestação da canção engajada e naciona-
Ainda no início da ditadura, em dezembro lista, voltada para a discussão de problemas que
de 1964, estreou o espetáculo Opinião, conside- afligiam a sociedade brasileira. [ ... ]
rado até aquele momento a reação mais contun- O ano de 1967 marcou o auge da popularidade
dente ao Regime Militar. Apresentado por Nara da "arte engajada" brasileira. No cinema, na músi-
Leão, jovem de classe média, Zé Kéti, sambista ca, no teatro, na televisão, a impressão era de que
da favela, e João do Vale, camponês do Nordes- Brasil todo havia se convertido para a esquerda.
Esse fenômeno cultural contrastava com a reali-
te, o espetáculo caracterizava-se por seu caráter
dade política do país, cada vez mais controlado
nacionalista e popular, constituindo um dos es-
por um regime que deixava clara sua disposição
paços culturais que reuniram parcela importante
para ficar no poder, dissipando as ilusões daqueles
da sociedade na resistência ao Golpe Militar. Ou- que achavam que a ditadura era transitória. [ ... J
tro espetáculo musical de grande importância foi
NAPOLITANO, Marcos. CuLtura brasileira: utopia e massif i-
Arena conta Zumbi (1965 a 1967), que criticava cacão (1950-1980). São Pauto: Contexto. 2008. p. 55-56 e 59.
passado escravocrata brasileiro e a ditadura do
Regime Militar.
Mas o grande salto de popularização do
movimento cultural foi a chegada, à televisão,
da Música Popular Brasileira (MPB) - que ga-
nhou sigla em letras maiúsculas, como se fosse
um partido político. A programação musical foi
um sucesso, abrindo caminho para os até hoje
lembrados festivais da canção. Esses grandes
festivais tinham forte conotação de crítica à Di-
tadura. Traziam ao público canções com letras
que expunham a visão dos artistas sobre o regi-
me e sua indignação contra ele. Foi o período da
música de protesto.

O lançamento do programa Fino da Bossa (maio


de 1965)
foi seguido do Bossaudade, com Eliseth
Cardoso e Ciro Monteiro (julho de 1965) e do lo vem
Guarda (setembro de 1965), com Roberto Carlos,
Erasmo Carlos e Wanderleia. Todos esses musicais Arnaldo Ilaptista, Rita Lee e Sérgio Dias, integrantes do grupo Os Mutantes.
no 3: Festival de Música Popular Brasileira da TV. São Paulo (SP). 1967.

- 248
Entre os anos 1967 e 1968 surgiu o Tropica-
Pausa para investigação
lismo, movimento cultural que abrangia diversas
áreas, como música, teatro, cinema, poesia e ar- Para entender melhor a cultura da déca-
tes plásticas, espalhando-se entre a juventude. da de 1960, em grupo, pesquise os temas a
Ele universalizou a linguagem da MPB, quan- seguir e, juntos, organizem-se, de modo que
do incorporou à música a guitarra elétrica do rock. cada tema seja apresentado por apenas um
As ideias propagadas por esse grupo de artistas grupo. Durante a pesquisa, coletem infor-
influenciaram a cultura nacional. O Tropicalismo mações sobre locais e momentos em que
trazia nas letras das canções e em outras áreas da esses temas ganharam força, quem eram
arte um quadro crítico e complexo do país. Por as pessoas envolvidas e que ideias eram
ter sido um movimento de oposição e crítica ao transmitidas por meio dessas manifestações.
Regime Militar, foi reprimido pelo governo. Cinema Novo.
O Tropicalismo teve maior visibilidade na
Manifesto 'Estética da Fome, de Glauber
música, sobretudo com Caetano Veloso, Tom Zé,
Rocha.
Gilberto Gil, Gal Costa, Torquato Neto, o grupo
Teatro de Arena.
Os Mutantes (Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio
Dias) e o maestro Rogério Duprat, mas também Centro Popular de Cultura (CPC) da
influenciou os representantes do Cinema Novo, União Nacional dos Estudantes UNE).
como Glauber Rocha. No teatro, apareceram Festivais da canção.
peças anárquicas deJosé Celso Martinez Corrêa e as
montagens do grupo do Teatro Oficina. Na poesia,
destacaram-se nomes como Augusto de Campos e
Décio Pignatari. A cultura sob as ordens
Também chamado de Tropicália, o movi-
mento foi uma proposta de mudança na lingua-
da censura
gem e no comportamento vigentes, não só quan- Essa efervescência cultural passou a ser direta-
to à música e à política mas também à moral, ao mente reprimida após 1968. O Al-5 provocou um
corpo, ao sexo e ao vestuário. golpe na vida cultural brasileira, que passou a convi-
ver com o aumento da censura às artes e à imprensa.
Foram anos difíceis, durante os quais muitas
pessoas foram proibidas de exercer suas funções
e algumas deixaram o país, em exílios voluntários
ou impostos. São vários os nomes que podem
ser citados como exemplos, e em diversas áreas:
arquitetos como Oscar Niemeyer; cientistas so-
ciais como Darcy Ribeiro e Celso Furtado; músi-
cos como Chico Buarque, Gilberto Gil e Caetano
Veloso; educadores como Paulo Freire; cineastas
como Glauber Rocha; e muitos outros. Quem
não se retirou do cenário cultural teve o trabalho
e a vida vigiados pela polícia. Em alguns casos,
como ocorreu com professores engajados e críti-
cos, a polícia inflltrava informantes entre os alu-
nos para que nada escapasse do controle militar.
Mesmo nesse contexto, havia um públi-

Capa do disco Tropicália ou Panis et Circensis. de Caetano Veloso, Gilberto


co relativamente grande que frequentava cine-
Gil e vários artistas. 1968. mas e teatros, que comprava livros; enfim, que

- 249
consumia várias formas de cultura. Tam- Em tempos de censura, o governo foi
bém data desse período um aumento no ao mesmo tempo o carrasco e o mecenas
número de universitários, o que fazia cres- da cultura. De um lado, controlava e cen-
cer a quantidade de críticos do regime e surava a produção cultural e, de outro,
consumidores de cultura. criava instituições como a Fundação Na-
Foi uma época de expansão dos cional de Artes (Funarte), o Serviço Nacio-
meios de comunicação e da indústria cul- nal de Teatro (SNT) e a Empresa Brasileira
tural. Produtos como telenovelas e notici- de Filmes (Embrafilme), que favoreciam a
ários garantiam a audiência na televisão, produção artística e cultural por meio de
e revistas, coleções de livros e fascículos financiamentos ou divulgação.
consumidos em larga escala mostravam o O cinema que na década de 1970
crescimento da difusão cultural. entrou definitivamente
' na era industrial,
foi um dos grandes beneficiados

r
com essa "ajuda" governamen-
tal. Com a Embrafilme como

r -
produtora, financiadora e distri-
buidora, conseguiu crescimento
acentuado. Data também desse
período a criação do Festival de
Cinema de Gramado (Rio Gran-
de do Sul). Realizado anualmente
desde 1973, o evento é destaque
na premiação dos melhores fil-
mes e diretores no Brasil.
No teatro, a censura tam-
bém foi atuante, sobretudo entre
1973 e 1975. Como as peças com
teor político e crítico eram proi-
bidas, espetáculos musicais, de
dança e dramáticos, assim como
os shows humorísticos, garan-
tiram a continuidade do teatro
:t e a manutenção da carreira dos
atores. No humor destacaram-se
Chico Anísio eJô Soares.

- .lwlifestação de atores noTheatro


Municipal de São Paulo contra a
r4' censura ao teatro durante a Ditadura
Militar, 1968.

A
Mecenas: termo que se refere ao incentivo e patrocínio à cultura. Faz referência a Caio Cilino
Mecenas (68 a.C.- 8 a.C.), conselheiro do imperador romano Augusto, que apoiou o desenvolvimento
artístico em Roma.

250 :tijto9
Na literatura, a década de 1970 foi 1976 tiveram mais visibilidade, e vários
a era dos besr-sellers de escritores inter- outros, como Elis Regina, Milton Nas-
nacionais, como Gabriel García Márquez, cimento, Belchior, Fagner, MPB4, Clara
Agatha Christie e Richard Bach. Na litera- Nunes, Ney Matogrosso etc., passaram a
tura nacional fizeram sucesso livros de fic- fazer parte da renovada MPB.
ção, poesia, ensaios jornalísticos, entrevis- Ainda na música, outros gêneros se
tas e contos, que alavancaram a indústria destacaram, como o samba tradicional de
editorial local. O que explica esse boom Beth Carvalho, Martinho da Vila, Paulinho
literário foi o crescimento da classe média da Viola. O rock nacional também ganhou
e o aumento no nível de escolaridade. Há espaço, com destaque para Raul Seixas e
que se considerar também a existência de Rita Lee.
uma literatura marginal, composta de li- Os programas de auditório, chama-
vros mimeografados, vendidos em portas dos de cultura popular de massa, apresen-
de museus, teatros, cinemas e nas mesas tados por Chacrinha, Silvio Santos, Boli-
de bares. nha, entre outros, também tiveram espaço.
A partir de 1975, a censura ficou Com a revogação do Al-5 em janeiro
mais branda, e o apoio direto à cultura de 1979, abriu-se uma nova era para a cul-
nacional aumentou. Tudo isso ocorreu tura brasileira. Sem a censura ideológica,
dentro da estratégia do governo do gene- peças de teatro, músicas, livros de ficção,
ral Geisel (1974-1979), que previa uma reportagens e ensaios históricos puderam
abertura "lenta, gradual e segura". Havia ser livremente publicados e consumidos
também uma clara política nacionalista pela população. No mercado editorial,
na cultura, visando salvaguardar a cultura essa liberdade significou a produção de
nacional do imperialismo, sobretudo nor- cerca de 249 milhões de exemplares (mais
te-americano. de 13 mil títulos) em 1979.
Com esse abrandamento da censura,
os compositores de MPB puderam voltar
a compor canções de crítica ao regime.
Pela música, eram passados recados ao
governo e à população, com temas como
liberdade e justiça social compondo a tri-
lha sonora da abertura política. Nomes
proibidos no início da década (Chico Bu-
arque, Caetano Veloso etc.), a partir de

A Glcissárki
Mimeografia: técnica de cópia de
textos e desenhos feitos em papel
estêncil, um tipo de papel parafinado,
por meio da utilização de uma máquina
chamada mimeógrafo. Nessa técnica, o
papel estêncil é perfurado ou recortado
e fixado no mimeógrafo, por onde passa
a tinta que reproduz a mensagem ou
desenho recortado no estêncil para
outras folhas de papel. c-ravoçdo do prograoia Clube do 8otiiiia. idoio Co:
como Bolinha. São Paulo (SP), 1976.

251
Novos tempos da cuLtura:
democracia e gLobaLização
Nas décadas de 1980 e 1990 aumentou o nú- eletrônica, hip-hop e outros ritmos locais, que fo-
mero de bandas de rock nacional, que deram um ram ganhando espaço e destaque, como o forró pé
novo direcionamento à música no país. Surgiram de serra e o calipso (ritmo caribenho que ganhou
nomes como Blitz, Barão Vermelho, Paralamas do novos contornos no Brasil). A música brasileira,
Sucesso, Legião Urbana, Titãs, além de cantores na passagem para o século XXI, tornou-se cada
e cantoras que deram um impulso definitivo à in- vez mais eclética.
dústria do disco e dos shows no Brasil. No cinema, a década de 1980 foi marcada
pelo fim da Embrafilme, em 1987. A falta de incen-
tivo governamental fez a produção cínematográfica
passar por tempos difíceis. Sem dinheiro e com os
vários planos econômicos dificultando ainda mais,
o cinema nacional foi bastante prejudicado. Mas
na década de 1990, gradativa mente, foi tomando
novos rumos. A partir de 1994, o governo criou
leis de incentivo, possibilitando uma retomada de
sucesso para o cinema nacional.
Ao final do século XX, com a aceleração no
ritmo das mudanças e no contexto de uma socie-
dade globalizada e tecnológica, que proporciona
maior proximidade entre as diferentes culturas
mundiais, os hábitos, os costumes e o consumo
de cultura alteraram-se em escala global.
Hoje, encontramos cada vez mais oferta de
cultura a ser consumida, e as possibilidades de
Primeiro festival de música Rock in Rio, Rio de Janeiro (RJI, 1985. trocas virtuais acabam interferindo no comporta-
mento cultural.
Do ponto de vista musical, a década de 1990
A
pode ser considerada a primeira realmente demo-
crática desde o Golpe Militar de 1964. Diversos EcLético: que inclui uma mistura de elemen-
ritmos passaram a conviver: axé-music, pagode ro- tos selecionados em várias fontes.
mântico, sertanejo, lambada,grur'ige, funk, música

Organizando ideias
1. Relacione seus conhecimentos com o texto a descartável, todas as esferas da sociedade perdem
seguir e escreva um texto argumentativo sobre a vitalidade. Num mundo globalizado, lembrar das
a importância das manifestações culturais para
obras que os flOSSOS cidadãos escreveram, compu-
diferentes povos.
seram, filmaram, pintaram, esculpiram, encenaram,
Em qualquer sociedade, o campo cultural é um
significa dizer ao mundo que existimos e que temos
dos elementos estruturais básicos, tão importante
muito a oferecer para a cultura da humanidade.
quanto a vida política e econômica. Quando negli-
NAPOLITANO. Marcos. Cultura brasileira:
genciamos o passado da nossa cultura ou a vivemos
utopia e massificecâo [1950-19801.
unicamente dentro da esfera do lazer imediato e Sâo Paulo: Contexto, 2008. p. 129.

— 252
Resgate cuLtural
Mas se você quiser fazer rock 'n 'roil em português, isso
Rock brasileiro? é totalmente possível. Você pode até subverter a na-
O Brasil da década de 1980 foi marcado pelos tureza de um código. Se você tem um código mais...
movimentos urbanos. Uma grande parte da po- mais inadequado, você tem corno subverter isso atra-
pulação jovem das cidades mais populosas do vés do uso que você faz. A língua, você sempre pode
país nasceu em áreas urbanas, diferentemente torcer ela como você quiser. Essa torção é o traballo
das gerações anteriores, que em geral vinham artístico, na verdade.
do campo para se estabelecer nas cidades. Arnaldo Antunes. ln:ALém-mar: língua. Produção: IV Escola.
Nas cidades, as redes culturais conectam Brasil, 1999. Disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/vid-
eo/atem-mar-tingua>. Acesso em: abr. 2016. [Começa em 30:381.
as pessoas a ideias e movimentos de lugares
muito distantes, como o rocknro11, ritmo mu- Sobre o uso de língua nativa na música, leia
sical originário dos Estados Unidos. A produção o trecho de uma entrevista com jovens rappers
artística desse período, no entanto, pôde se de Cabo Verde a respeito da importância do
distinguir por traduzir as inquietações e as criolo, língua cabo-verdiana, nas suas canções.
visões em relação ao Brasil de grande parte Começou com uns rapazes aí de São Vicente
da juventude nacional. [ilha de Cabo Verde], o Ice Company. Depois a
Influenciados por grupos de rock dos Estados gente ouviu eles a cantar, então a gente decidiu fa-
Unidos e da Europa, esses jovens criaram can- zer música em criolo também. Nós, antes, a gente
ções originais, nas quais destacam-se questões fazia música em inglês e tentava fazer nosso som,
sociais e políticas do país - e em língua portu- mas era mais ou menos difícil fazer o nosso som e
guesa! Sobre o uso do português em um ritmo demorava muito. Então a gente pegou aquele ins-
tão identificado com a língua inglesa, assim trumental e a gente metia nossas letras.
falou Arnaldo Antunes:
Black Naturo. In: Além-mar: língua. Produção: 1V Escola. Brasil,
1999. Disponível em: <h(tp://tvescota.mee.gov.br/ive/video/a[em-
Essa história de fazer rock ou fazer qualquer ou-
mar-linguci>. Acesso em: abr. 2016. [Começa em 26:501.
tro gênero... é muito mais urna questão de lingua-
gem do que urna questão de língua. Não é o código 1. Qual é o efeito da adaptação de produções es-
que vai determinar e sim o uso dele. trangeiras às línguas nativas das populações?
O inglês e o portu-
guês têm caracterísUca
diferentes, né? O inglês ' •
mais sintético e tem um -,
número muito maior dc
monossílabos, tudo isso.

Apresentação dos Titãs


programa de televisão Cassino l:
Chacrinha, no Rio de Janeiro (RJ).
1984. Arnaldo Antunes (à direita
integrou o grupo de 1982, ans
de fundação da banda, até 1992
As canções, que se destacararr
por um trabailio muito cuidados,
com as ietras, abordava:'
temas como injustiça social
autoritarismo.

253
2 Viajando peLa história
A história da comunicação
graças a mensagens mais detalhadas, ou seja, ao
Desde os tempos mais remotos, a comuni- imprevisto. Antes da época da escrita existia ape-
cação esteve presente nas sociedades. A difusão nas um canal: a palavra apoiada na memória.
da informação por meio da transmissão dos sa- O acontecimento mais simbólico dessa for-
beres sempre foi muito importante para o conví- ina de comunicação é o episódio do corredor
vio das pessoas. de Maratona, em 490 a.C.: após a vitória dos
Gregos sobre os Persas, o mensageiro percorreu
Os meios e as técnicas utilizados para comu-
42,195 quilômetros até Atenas onde, depois de
nicação partiram de uma fórmula básica: a lingua- anunciar de um sopro o sucesso da sua pátria,
gem do corpo humano, a voz e os gestos. E, com morreu de esgotamento.
base nisso, surgiram inúmeras formas de expressão,
JEANNENEY, Jean-Nãet. Uma história da comunicação
de transmissão de informações. A escrita é uma de- sociaL Lisboa: Terramar, 1996. p. 15-16.
las, porém, mesmo antes de seu advento, as infor-
maçõesjá eram transmitidas. Os povos sem escrita
utilizaram, como forma de comunicação, imagens Quando os seres humanos desenvolveram
— como as pinturas rupestres — e também a oralida- a escrita - e isso ocorreu de diferentes maneiras
de, transmitindo mitos e lendas para gerações. Foi e em diferentes tempos e espaços —, a memória
assim com os indígenas brasileiros, por exemplo. passou a não ser mais a única forma de guardar
informações. Aos poucos, com o desenvolvimen-
to do alfabeto, que variava de língua para língua,
Partamos de uma observação simples. A dife-
tornou-se possível registrar e transmitir diversos
rença principal entre o animal e o homem é que o
primeiro reage sempre a um acontecimento exte- saberes não só a seus contemporâneos mas tam-
rior de forma instintiva, enquanto que é próprio bém às gerações que viriam depois.
do homem tomar decisões para as quais se serve Entre os exemplos de utilização da escrita na
da razão, a par do instinto. Portanto, apoia-se for- Antiguidade, há o dos egípcios - que em 3500 a.C.
çosamente sobre o mais preciso conhecimento usavam hieróglifos, sistema baseado em símbolos
possível do inundo exterior, que os seus sentidos — e o dos chineses — que por volta do ano 4000 a.C.
não podem perceber diretamente, um mundo em já contavam com um sistema de correio.
que intervêm incessantemente modificações nas-
cidas quer das mudanças inesperadas da natureza,
quer da agressão de grupos exteriores. [ ... ] &Ç.' .Zt7'
.r
Se começarmos pelo mais primitivo, pela
origem, o primeiro dos meios de comunicação ---
'
social é a indicação pública de um fato muito
-
simples e que podemos prever num tempo em j
que a escrita não existe. Um corte numa árvo-
si t5t
re, uma pedra colorida, um ramo quebrado
significam aos olhos dos homens primitivos a r ii-,seL -°'-
aproximação do inimigo ou, então, que a caça
passou por ali ou irá passar por ali. Vários sinais iJjti '4 V'bl
1 ÍL l 1
ópticos figuram na mesma categoria, por exem- .J1

plo, a fumaça durante o dia, ou a chama do fogo


durante a noite, ou também os sinais acústicos, , 7i5
fl*
como o tam-tam familiar entre os africanos.
Efetivamente, depressa se procurou acrescen- rR. j1iUl-
2
6-ti
tar informações próprias a estes conhecimentos
elementares fundados sobre uma escolha binária, F agmorito do um papiro coei texto do Livro dos Mortos
em escrita hierática Egito. c. 525 a.0 . 343 a.C.,

— 254
O correio foi uma das formas mais eficazes veicular temas que pudessem incitar o povo contra
empregadas para vencer distâncias. Diferentes so- os governantes. A Suécia foi a pioneira na contes-
ciedades da Antiguidade utilizavam esse serviço. tação dessa prática, quando em 1776 promulgou
Cerca de 2400 anos antes de Cristo, os faraós egíp- uma lei que protegia a liberdade de imprensa.
cios usavam mensageiros para difundir ordens e Com a invenção do telégrafo, por Samuel
decretos entre a população. Já os cretenses e os fe- Morse, em 1835, a transmissão de informações
nícios desenvolveram um sistema postal que utiliza- ganhou impulso. Era possível enviar mensagens a
va pombos e andorinhas como mensageiros. Entre qualquer lugar. Com isso, os jornais se beneficia-
os romanos, a vasta rede de estradas possibilitou ram e se espalharam pelo mundo inteiro, pois o
um sistema postal bastante desenvolvido. novo sistema propiciava a transmissão de infor-
Durante a Idade Média, em geral as comu- mações em longa distância, e as notícias fluíam
nicações eram feitas em praça pública, e já havia mais rapidamente.
livros, transcritos um a um pelos copistas. No sé- Inspirado no invento de Samuel Morse,
culo XV, com a invenção da imprensa, foi possível em 1876 o escocês Alexander Graham BeIl apro-
iniciar a reprodução em série. A prensa, finalizada priou-se dos estudos do italiano Antonio Meucci
por Gutenberg em 1447, possibilitou a reprodução para patentear um invento revolucionário para
dos escritos de forma mais rápida e eficaz. Assim, a comunicação: o telefone, que se tornou rapida-
uma mensagem escrita podia ser repassada a mui- mente um acessório muito desejado.
tas pessoas ao mesmo tempo. Outro invento importante foi o rádio, que
até hoje é um dos mais popu lares veículos de co-
municação. Em 1888, o físico alemão Heinrich
Hertz conseguiu produzir as primeiras ondas de
rádio. Essa descoberta foi tão importante que
o sobrenome dele nomeia a unidade de medida
dessas ondas. Mas foi o italiano Guglielmo Mar-
coni, em 1894, que concretizou essa descoberta.
Estimulado pelos escritos de Hertz e com equipa-
mentos similares, ele produziu o primeiro aparelho
de rádio da história.

Philip Gaile. O desenvolvimento da prensa, c. 1600. Gravura.

Na primeira metade do século XVII, os jornais


passaram a figurar como publicações periódicas
e frequentes. Os primeiros países da Europa a ter
jornais circulando foram Alemanha (1609), Bélgica
(1616), França (1631) e Inglaterra (1665). Essas
publicações noticiavam fatos ocorridos na Europa
e raramente algo fora desses limites. Em outras
regiões, publicavam-se notícias desses países; os
assuntos locais só começaram a ser noticiados a
partir da segunda metade daquele século. A cen-
Homem nos painÓis de controle da rádio Daily News WMAO de Chicago.
sura era comum nos primeiros jornais, proibidos de Illinois (EUA), 1925.

255
Na primeira metade do século XIX, Loius- aparelho de telefone celular foi desenvolvido por
-Jacques Daguerre e Joseph Nicéphore Niepce uma empresa norte-americana em 1956, com o
criaram a fotografia, e no decorrer do século, em intuito de ser instalado em porta-malas de carros.
1895, os irmãos Louis e Auguste Lumière inven- Em 1973 surgiu, também nos Estados Unidos, o
taram, na França, o cinema, que revolucionou a primeiro aparelho de telefonia realmente móvel,
produção artística da época e serviu de trampo- que media 25 cm e pesava cerca de 1 kg.
lim para outras invenções. Atualmente, a tecnologia empregada na pro-
Outra grande revolução na comunicação dução dos celulares avançou muito, e os apare-
foi a invenção da televisão. Em 1923, o cientista lhos, utilizados em conjunto com a internet, vêm
russo Viadimir Zworykin foi contratado pela em- tornando cada vez mais instantânea a comunica-
presa norte-americana RCA para produzir o pri- ção entre as pessoas.
meiro tubo de TV baseado em seu iconoscópio. Apesar disso, grande parte da população não
Em 1935 ocorreu a primeira transmissão oficial tem acesso a esse tipo de tecnologia, tendo em
na Alemanha e, no mesmo ano, na França. vista o padrão econômico necessário para que as
Uma grande inovação nas telecomunicações pessoas paguem os valores exigidos pelas empresas
ocorreu no contexto da Guerra Fria. Nos Esta- que administram o acesso à internet, por exemplo.
dos Unidos, a corrida tecnológica possibilitou a Isso também ocorre com os aparelhos eletrônicos.
fabricação de computadores cada vez mais avan- Nenhuma forma de comunicação eletrô-
çados, que passaram a funcionar também como nica funcionaria hoje se não fossem os satélites
meios de comunicação por causa do desenvolvi- artificiais que circulam ao redor da Terra com a
mento da Internet entre os anos 1960 e 1970. função de enviar e receber mensagens. Se essa
A telefonia móvel começou a ser pensada tecnologia não existisse, também não seria pos-
com o desenvolvimento de tecnologias destina- sível a existência da internet, a rede mundial de
das à propagação de mensagens pelo ar, inicial- computadores que revolucionou a comunicação
mente voltadas às emissoras de rádio. O primeiro e encurtou distâncias.

.o. Aparelhos como esse são utilizados na transmissão de dados para diversos locais do planeta.

Aj GLossário
Iconoscópio: tubo de elétrons utilizado em televisores para converter a imagem em sinais elétricos.

256 HuIo9
rgafl
T FT rfr ._--- _,_--
1. Depois de ler a história em quadrinhos, responda õs questões.

A MENSAGEM É: GRANbE URSO-SENTADO, "GRANbE URSO-SEM-MATO,


ESTAMOS FELIZES POR SEU ANIVERSARIO ESTAMOS FELIZES POR SEU

wI Ã O
o
(Qo

-,J_--

GRANDE URSO-SEM-TATO, O QUE ELE


DISSE? BEM, É MELHOR
Á ESTAMOS FEROZES POR FALAR PELO
SERMOS AbVERSÁRIOS CELULAR!

'o
LI

ri

ai Quais foram os meios utilizados inicialmente para transmitir a mensagem?

bi Esses meios foram eficientes? Justifique.

2. Cite exemplos de meios de comunicaçào atuais que no usam tecnologias modernas.

Faça um levantamento dos meios antigos e modernos de transmissão de informações recorrendo a sua
memória e perguntando sobre eles a pessoas mais próximas. Você pode citar os que viu em filmes ou
na televisão, em revistas, livros etc. Compare os meios de transmissão de informações modernos
e antigos considerando o número de pessoas beneficiadas e a eficiência da informação.

257
Informação: direito aos saberes
A informação e a transmissão dos saberes Por outro lado, a função da comunicação
fazem parte da cultura e da identidade histórica ainda é a mesma dos tempos mais remotos, ou
de todos os povos. A maneira pela qual ocorre a seja, integrar o indivíduo na sociedade em que
comunicação e o domínio das formas de trans- ele vive. Não há nenhum tipo de integração -
missão de conhecimentos estão intrinsecamente econômica, social, política ou cultural - sem que
relacionados com o poder, sobretudo, atual- haja comunicação.
mente, com o poder político representado pela Por isso, o desenvolvimento da imprensa
figura do Estado. Esse domínio da informação teve papel de destaque como agente de transfor-
serviu tanto para construir formas democráticas mação das comunicações.
de convivência como para criar ou manter regi- A novidade iniciada no século X"v' possibilita-
mes totalitários. va uma rapidez antes não imaginada para trans-
Na sociedade atual, as possibilidades de mitir as informações. O acesso aos saberes foi gra-
troca de informações e de conhecimento assu- dativamente facilitado, visto que, com a produção
miram uma proporção gigantesca em virtude em série, o custo dos livros passou a ser menor.
das inovações tecnológicas, como a rede mun- O desenvolvimento da imprensa acompa-
dial de computadores, a internet. Entretanto, nhou as mudanças ocorridas com o avanço in-
a transmissão de saberes, principalmente por dustrial e capitalista. A própria imprensa acabou
meio da tecnologia, não atinge todos da mesma se tornando uma indústria capitalista, transfor-
forma; sendo assim, o direito à informação é um mando assim a informação em um tipo de merca-
dos direitos humanos a serem pleiteados por to- doria. Hoje isso fica patente quando literalmente
das as nações no século XXI. pagamos pelas informações.
Hoje é comum o convívio com as novas tec- Com as inovações tecnológicas desenvolvi-
nologias usadas no tratamento e na transmissão das pela sociedade industrial, o processo de edi-
de informações. Pode-se afirmar que a tecnologia ção e impressão de publicações periódicas, como
vence as barreiras de tempo e espaço. jornais e revistas, modificou-se. Com o surgimen-
to da máquina a vapor, houve o
RI
aumento na tiragem e diminuição
no intervalo entre as edições dos
jornais; assim, reduziram-se os cus-
tos e houve aumento do número de
leitores.
O desenvolvimento de ou-
tros meios de comunicação, como
o telégrafo e o telefone, foi grande
facilitador na transmissão de in-
formações, encurtando espaços e
diminuindo o tempo. Hoje, com as
novas tecnologias, podemos acom-
panhar até mesmo uma guerra que
ocorre do outro lado do mundo em
tempo real.

Os avanços tecnolôgicos produzem novidades que


costumam ser assimiladas iiuito rapidamente pelos
jovens. Na foto, jovem e idosa fazem uso de tab/et.

258
Leia o texto e responda às questões. forma como toda aFrça toma consciência da
mi portància deste episódio e imediatamente o
A imprensa e a Revolução Francesa institui como símbolo. [ ... ]. O 14 de julho de 1789
em Paris é totalmente diferente. Já existem vários
No século XVIII, a Revolução Francesa pro-
diários livres. Ao que parece, o primeiro a falar
tagoniza uma profunda mudança, instalando
deste assunto é o Courrier de Versailles €i Paris,
três importantes ideias, que vão marcar toda a
de Antoine-Louis Gorsa, no número que é publi-
ação dos jornalistas desse tempo.
cado na aurora do dia 15 de julho. O jornalista
A primeira ideia é de que o segredo é sempre trabalhou a noite toda, ainda dispõe de poucas in-
detestável, é a proteção dos privilégios, a mura-
formações exatas, mas afirma a sua convicção de
lha que as monarquias absolutas erguem a sua
que os acontecimentos que tiveram lugar na vês-
volta para dissimular as iniquidades que ainda
pera são de importância capital. Escreve: "Recor-
conservam. O segredo é, por esséncia, contrar-
daremos sempre o dia de ontem, talvez abra ca-
revolucionário. Consequentemente, o novo re-
minho para as maiores e mais felizes revoluções".
gime tem como primeira ambição permitir e
[ ... ] A velocidade com que o 14 de julho de 1789
merecer a transparência dos assuntos públicos.
foi julgado como fundador é surpreendente para
Não é suficiente dizer que doravante a soberania
qualquer reflexão sobre a relação que se instaura
já não é imposta de cima e que provém do povo;
entre fatos, o reflexo que a imprensa dá a estes e,
é necessário que tudo se passe em público, sob o
finalmente, a influência deste mesmo reflexo so-
olhar atento e severo do cidadão. A Constituinte
bre seu lugar posterior na memória coletiva.
afirma desde o início que o povo tem direito a
ter acesso a tudo o que é dito nos seus comícios. JEANNENEY, Jean-Noel. Uma história da
Em segundo lugar, a Revolução presta cons- comunicação social. Lisboa: Terramar, 1996. p. 50-53.
tantemente homenagem a um modelo domi-
nante: o da Antiguidade, e às formas de demo- No contexto, o que significa "correio de
cracia direta que existiam nas cidades gregas ou leitores"?
na antiga Roma [ ... ]. Compreende-se melhor
que, num tal clima, os contemporâneos tenham O autor considera a imprensa o ator central
encarregado a imprensa da tarefa de estabelecer no processo revolucionário francês. O que
um contato direto com os leitores-cidadãos. O isso significa? A imprensa brasileira tem
fato de o "correio de leitores" ser muito mais esse papel atualmente?
abundante nos jornais da época da Revolução
Francesa do que o é atualmente é muito signifi- Para o autor, qual é a importância da di-
cativo. Trata-se de um vaivém de trocas entre os vulgação imediata das informações sobre
jornalistas e seu público. [ ... ] Isto mostra que se a Tomada da Bastil.ha?
descobriu que os jornais são, de longe, os laços
mais eficazes entre os representantes do povo e O que a Tomada da BastiUia significa na
o próprio povo, os únicos que permitem que a memória coletiva e como o autor posiciona
soberania popular se exerça concretamente, que a imprensa francesa nessa questão?
não seja um logro. [ ... j
A terceira ideia que rege a história da impren- S. Forme um grupo com uns colegas e, jun-
sa na França durante a Revolução é o fato de não tos, analisem e debatam as questões a
constituir apenas um espelho do jogo político, seguir. Depois, registrem suas respostas.
mas ser também um ator central, ao contribuir
para dar aos acontecimentos este ritmo acelera- Existe liberdade de imprensa no Brasil?
do, essa precipitação nas emoções que surpreen-
A liberdade de imprensa tem o mes-
deu OS contemporâneos e à qual os historiadores
mo significado para quem divulga as
continuam a ser muito sensíveis. [ ... ]
Sob esta luz, o primeiro grande momento é o informações e para quem as recebe?
da Tomada da Bastilha. É-se surpreendido pela Justifique.

Cultura, informacão e po 259


O poder na sociedade da informação
É fácil encontrar na história casos em que a a forma de censura, mas é a apropriação dessas
transmissão de informações pelos meios de co- ferramentas para restringir e monitorar o fluxo de
municação é utilizada para influenciar as pessoas informações.
- por exemplo, as propagandas das ações dos go- As empresas que têm na informação um ne-
vernos. Basta observar a mídia impressa, a tele- gócio lucrativo na maior parte das vezes também
visão, as rádios ou a internet para constatar que não são destituídas de parcialidade, exercendo
isso é muito comum. poder sobre os consumidores de seus produtos.
Com o avanço da tecnologia, os meios de co- Por mais que isso não seja evidente e proclame-
municação estão cada vez mais acessíveis e atin- -se o contrário, toda produção midiática contém
gem um número maior de pessoas. Além disso, mensagens ideológicas e juízos de valor. Explici-
ocorre um considerável aumento na quantidade tamente ou não, os meios de comunicação vei-
de informações em circulação. culam mensagens que influenciam os receptores
Em uma democracia, o poder está nas mãos em seus valores, crenças, opiniões, e até mesmo
do povo, que, pelo voto, escolhe seus represen- no modo de vida. Nesse sentido, os meios de co-
tantes. Portanto, para que os candidatos a car- municação podem ser diretamente associados ao
gos eletivos conquistem os eleitores, o melhor uso do poder ideológico.
instrumento é a mídia. Isso também ocorre para
quem já está no poder e quer mantê-lo para si ou
para seus pares. Essa é uma das maneiras de veri-
ficar de que forma a mídia pode ser usada como
instrumento de poder.

Jogue as embalagens
/ de papel, plástico e
Para o exercício continuado do poder, faz-se
fundamental dispor de meios de comunicação metal no
de massa comprometidos com a manutenção do
"sistema" e de um sistema educacional que per-
petue o pensamento dominante, de forma que Faça de seu gesto um exemplo de cidadania
o condicionamento seja cada vez mais implíci-
to que explícito - mais aceito como natural que
aceito por convencimento. O poder da impren-
sa, do rádio e da televisão deriva, como o da reli-
gião, da organização; seu principal instrumento Propaganda de incentivo à reciclagem em Vahnhos (SP). 201
de imposição, como o da religião, é a crença - o
condicionamento social.

SILVEIRA. Henrique Flávio Rodrigues da.


O poder ideológico é aquele que se vale
Um estudo do poder na sociedade da informação.
Ciência da Informação, Brasítia. v. 29, n. 3, sei/dez. 2000. da posse de certas formas de saber inacessíveis
Disponível em: <www.scioto.br/pdf/ci/v29n3/a08v29n3.pdf>. aos demais, de doutrinas, de conhecimentos,
Acesso em: abr. 2016. até mesmo apenas de informações, ou então
de códigos de conduta, para exercer uma in-
fluência sobre o comportamento de outrem e
Podemos dizer que vivemos hoje em um mun-
induzir os componentes do grupo a agir de um
do midiático. Nessa realidade, se, por um lado, determinado modo e não de outro.
os avanços tecnológicos possibilitam livre fluxo
BOBBIO, Norberto. Teoria gerat da política: a filosofia e
de informações, por outro, empresas e governos
as tições dos ctáss:cos. Trad. Danieta Beccaccia Versiani.
ampliam demasiadamente o controle sobre os Rio de Janeiro: Campus, 1999. p. 221.
meios de comunicação. Não é um controle sob

— 260
Assim, faz-se necessário analisar os meios de Portanto, é importante analisar as informa-
comunicação como detentores de poder social e ções e os saberes transmitidos por eles, procuran-
político, que servem para legitimar ou condenar do captar nos discursos o que realmente é dito, o
valores e práticas sociais. Esse é o caráter perigo- que não é dito, como e por que é dito. Tudo isso
so da comunicação. para que seja possível identificar a realidade e per-
A informação favorece e gera poder. Por isso, ceber quais são as ideologias explícitas e implícitas
cabe aos receptores fazerem uso das capacidades no conteúdo comunicado.
crítica e reflexiva para analisar os meios de comu- Ainda assim, os meios de comunicação de
nicação tanto como produtos criados com um massa proporcionam o acesso a diversos saberes,
propósito quanto como responsáveis por grande ampliando sobremaneira a democratização do
parte de nosso entendimento da realidade. conhecimento.

rganizando ideias
Leia os trechos da Letra da música a seguir De que forma os compositores descrevem a
e, depois, faça o que se pede. televisão?

Televisão Relacione essa letra ao poder da televisão


como mídia de massa.
A televisão
Me deixou burro Organize-se em grupo. Cada grupo deve
Muito burro demais escolher um gênero de programa televisivo:
Oi! Oi! Oi! jornalístico, esportivo, infantil, de auditório,
Agora todas coisas humorístico, reality show ou dramaturgia
Que eu penso
(novela). Para realizar o trabalho, siga as
Me parecem iguais
orientações.
Oi! Oi! Oi!
E ... ]
a) Sozinho ou em grupo, assista ao programa
E que a televisão
Me deixou burro anotando os detalhes: horário, duração,
Muito burro demais público-alvo, formato, valores transmi-
E agora eu \7j\ro tidos (por exemplo, liberdade sexual,
Dentro dessa jaula consumo etc.).
Junto dos animais...
Oh! Cride, fala pra mãe bi Juntos, analisem como o programa pode
Que tudo que a antena captar influenciar no comportamento ou em
Meu coração captura hábitos de seu público.
Vê se me entende
Pelo menos uma vez
cl Apresentem o resultado em sala de aula.
Criatura!
Oh! Cride, fala prá mãe!...
dl Para finalizar, realizem um debate sobre
A mãe diz prá eu fazer
a influência da televisão analisando que
Alguma coisa
padrões de comportamento podem ser
Mas eu não faço nada
Oi! Oi! Oi! transmitidos por ela.

ANTUNES, Arna(do; FROMER, Marcelo; BELLOTTO, Tony.


Televisão. Intérprete: Titãs. In: TITÂS. Televisão. São Paulo:
WEA, 1985. Faixa 1.

261
~o Debate interdiscipLinar
As redes socïais e a Linguagem da internet
Todos os anos a editora da Universidade de A ideia foi concebida para resolver um mal-enten-
Oxford, no Reino Unido, elege uma palavra que dido. Na época [19821, o professor [Scott Fahlman, da
representa os sentimentos e acontecimentos mais Universidade Carnegie Meilon, nos EUA] fazia parte
significativos do ano que passou. Em 2015, a es- de urna plataforma de mensagens on-line rudimen-
colha dosjurados foi esta: tar, formada por colegas do departamento de física da
universidade. O grupo de discussões tinha por hábito
propor enigmas científicos para que outros membros
resolvessem.
Um deles lançou o seguinte problema: "Um eleva-
dor tem uma vela acesa presa na parede e uma gota de
mercúrio do chão. O cabo do elevador se rompe e ele
cai. O que acontece com a vela e o mercúrio?". Outro
colega respondeu com uma mensagem brincalhona,
que dizia: "ATENÇÃO! Devido a um experimento de
física recente, o elevador mais à esquerda está conta-
minado com mercúrio. Há também um dano super-
A evolução da comunicação foi tão incrível nos úl- ficial causado por fogo. A descontarninação deve ser
timos anos, que a palavra do ano de 2015 escolhida concluída até 8h de sexta-feira."
pelo dicionário de Oxford não foi urna palavra, mas O texto era irônico, mas muita gente na institui-
sim o emoji tears ofjoy (lágrimas de alegria)! ção levou a sério. Por essa razão, os usuários da pla-
1...1 taforma de mensagens começaram a sugerir simbolos
I)esde 2004, todos os anos a equipe do dicionário que deixassem claro quando o conteúdo era brinca-
mais um grupo de léxicos, o pessoal do editorial, mar- deira. Foi então que o professor Scott Fahlman pro-
keling e propaganda se reúnem para discutir as opções pôs o ícone :-) para identificar mensagem de piada e
e escolher a palavra/ expressão/emoji que reflete o ca- :-( para as sérias.
ráter, humor ou preocupações do ano.
E a palavra do ano é... um Emoji! Exame, 21 nov. 2015. Disponível Já os Emojis surgiram no Japão da década de 90
em <http://exame.abriLcom.br/tecnologia/noticias/e-a-palavra - e são caracterizados por pertencerem a uma biblio-
do-ano-e-um-emoji>. Acesso em: abr. 2016.
teca de figuras prontas. Eles foram concebidos por
Quando falamos com alguém, parte da Shigetaka Kurita, que elaborou a palavra a partir das
comunicação reside em elementos não verbais, expressões japonesas "e" (imagem) e "moji" (perso-
como o tom da voz, os gestos, a velocidade da nagem), significando em português "pictograma".
fala, entre outros. Esses elementos integram um Por essa razão, os emojis também agrupam o smiley
largo conjunto de estratégias para aproximar o e outros simbolos originalmente considerados erno-
interlocutor em uma comunicação que ocorre a tícons, porém apenas em suas versões em desenho.
distância, como no caso da internet, na qual o [ ... j. A primeira biblioteca reuniu 176 imagens
uso de emojis e emoticons é muito frequente. com 12 x 12 pixeis de resolução, tendo em comum a
capacidade de expressar as emoções humanas.
Enioticon é um termo criado a partir das palavras
FREIRE, Raquel. Entenda a diferença entre smiley, ernoticon e emoji.
inglesas emotion (emoção) e icon (icone). Em outras pa-
Techtudo, 31 jul. 2014. Disponível em: <www.techtudo.com.br/noti
lavras, eles servem para expressar emoções, o que se dá cias/noticia/201 é/07/entenda-diferenca-entre-smiley-emoticon-e-
essencialmente por meio de caracteres tipográficos. [ ... ] emoji.html>. Acesso em: abr. 2016.

-262
Na internet, ao utilizar a
linguagem escrita, o usuário põe
a favor de sua comunicação al-
guns recursos para aproximar o
texto da oralidade (escrever "cê
tá" em lugar de 'você está" é um
exemplo desse recurso), apres-
sar a leitura (como ao escrever -
-.: 1
em lugar de "também") e/
ou, ainda, expressar emoções -
a ironia pode ser registrada, por
exemplo, no emoticon ";)" colo- Ás
cado no fim da frase.
Ernoticons e emojis são parte
da linguagem pictográfica - em
lugar de textos verbais, usam-
-se os pictogramas. Como pode Em 2. co' LoHrm IP II', 1151111', o il,1r11 1 (0J o ombro lo.'r 105
- cartazes elaborados o ou dc r',UujS los - mc in S e,uo/;,c oniecaram 1 11111 00 1 OtPi 111
ser visto, eles estao muito rela- para ocupar novos esjzaços
cionados à expressão de afeto e
de emoção em comunicações virtuais. Há, ainda, da língua falada pelo leitor e de sua cultura. São,
outra razão para o uso desses pictogramas ser portanto, recursos visuais perfeitamente ajustá-
cada vez mais intenso: seu significado é constru- veis às condições de circulação de informação em
(do globalmente e, em geral, independentemente redes globais, como a internet.

11) (2)

44
-

1
iII )

511

Cartaz aiusivo
ao estado de

ucil
i:
o (i hIso.hol vendidas como suvenir na cidade de Nov. Yoik MG
1.4 figura 1 mostra uma frase muito utilizada em souvenirs comprados por turistas na cidade de
Nova York. Há alguns anos, os dicionários de língua inglesa registraram o verbo to heart devido
ao grande uso desse (cone de coração com o significado de gostar de'. Nesse contexto, como
você caracteriza o uso do (cone do pão de queijo no cartaz número 2?

2. O cartaz número 2 faz uma referência explícita à frase da cidade de Nova York. Como você avalia
esse uso quanto à globalização da comunicação?

263
Testando seus conhecimentos Responda no caderno

1. (Enem) realização de produções de custos re-


duzidos, caracterizadas pelo uso de no-
vas linguagens e inovações cênicas.

3. (Enem) O sociólogo espanhol Manuel Cas-


j tells sustenta que a comunicação de va-
lores e a mobilização em torno do sentido
são fundamentais. Os movimentos culturais
(entendidos como movimentos que têm
como objetivo defender ou propor modos
próprios de vida e sentido) constroem-se
em torno de sistemas de comunicação -
essencialmente a internet e os meios de
LIULU.. UtSpOflIVe em: v.ww.cautos.com. comunicação - porque esta é a principal
Acesso em: 24 set. 2011. via que esses movimentos encontram para
O cartum faz uma crítica social. A figura chegar àquelas pessoas que podem even-
destacada está em oposição às outras e re- tualmente partilhar os seus valores, e a par-
presenta a tir daqui atuar na consciência da sociedade
no seu conjunto.
opressão das minorias sociais.
carência de recursos tecnológicos. DisponíveL em: v.vwcompoULica.org.
Acesso em: 2 mar: 2012 ladaptadoL
falta de liberdade de expressão.
defesa da qualificação profissional. Em 2011, após uma forte mobilização po-
reação ao controle do pensamento co- pular via redes sociais, houve a queda do
letivo. governo de Hosni Mubarak, no Egito. Esse
evento ratifica o argumento de que
2. (UFMG-MG) O Cinema Novo e o movimento
a internet atribui verdadeiros valores
de renovação teatral liderado pelo Teatro
culturais aos seus usuários.
de Arena e pelo Grupo Oficina foram ex-
a consciência das sociedades foi esta-
pressões artísticas, com objetivos e carac-
belecida com o advento da internet.
terísticas comuns, afinadas com o contexto
a revolução tecnológica tem como prin-
brasileiro das décadas de 50 e 60 do século
cipal objetivo a deposição de governan-
passado.
tes antidemocráticos.
Entre as características desses movimentos
os recursos tecnológicos estão a servi-
culturais, NÃO se inclui a
ço dos opressores e do fortalecimento
vincu(ação a grandes estúdios cinema- de suas práticas políticas.
tográficos e a companhias teatrais já os sistemas de comunicação são meca-
estabelecidas.
nismos importantes de adesão e com-
concepção da obra de arte como meio partilhamento de valores sociais.
de conscientização política, influencia-
da por tendências de esquerda.
crítica à realidade brasileira, aos seus
problemas e contradições, com forte
conteúdo social.

— 264
O informante, direção de Michael Mann, EUA,
(para você ler ío 1999, 157 mm. Baseado em uma história real, o
filme parte da entrevista de um ex-funcionário
da indústria do tabaco a uma grande rede de
Cultura brasileira: utopia e massificação (1950-
TV para mostrar corno empresas poderosas
1980). de Marcos Napolitano. São Paulo: Contexto,
conseguem interferir na veiculação de infor-
2008. Essa obra delineia a história da producão
mações, mesmo que o compromisso com a
cultural brasileira mapeando os vários caminhos
verdade seja afetado.
pelos quais transitou a vida cultural do país entre
1950 e 1980. Aborda o processo de socialização O mercado de notícias, direção de Jorge Fur-
e massificação da cultura e a arte como meio de tado. Brasil, 2014, 94 mm. Documentário sobre
representação dos desejos da sociedade e como jornalismo, o filme traz depoimen (os de reno-
ferramenta na luta contra a Ditadura Militar. mados jornalistas brasileiros sobre o sentido e
a prática de sua profissão, as mudanças na ma-
Indústria cultural; uma introdução, de Rodri-
neira de difusão e consumo de notícias, o futuro
go Duarte. Rio de Janeiro: FGV, 2010. Por meio
do jornalismo, e também sobre casos recentes
de uma revisão histórica, o autor mostra que
da política brasileira, em que a cobertura da im-
a demanda por entretenimento já existia antes
prensa teve papel de grande desta que.
mesmo de surgirem os meios típicos da primei-
ra fase da indústria cultural, como o cinema e Tropicália, direção de Marcelo Machado. Bra-
o rádio. De modo simples e direto, discute as sil, 2012, 89 mm. O documentário analisa o
práticas e os produtos dessa indústria e reflete movimento musical conhecido como Tropicá-
sobre a atualidade e a possível pertinência das lia, liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil
críticas feitas a ela, tendo em vista as trans for- nos anos 1960, e a cena musical e política do
mações provocadas pela globalização. período da Ditadura Militar, que levou os dois
músicos ao exílio.
O nascimento da imprensa brasileira, de Isa-
bel Lustosa. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. O livro
aborda o poder da imprensa no Brasil. Do sur-
gimento do primeiro jornal brasileiro, em 1808,
ao princípio do Império (1822), esse volume
mostra como a imprensa influenciou o proces-
r
Para você navegar

so de independência da nação, em um período Anos 60: a época que mudou o mundo. Dispo-
em que política e imprensa se confundiram de nível em: <http://almanaque.folha.uol.com.br/
forma radical. anos60.htm>. Acesso em: abr. 2016. O site res-
gata a história dos anos 1960 no Brasil e no mun-
do, período em que a prosperidade econômica e
rPara você assistir LJWIN
a euforia do pós-guerra trouxeram mudanças ao
comportamento e à cultura dos jovens, influen-
Consuming kids: a comercialização da infância, ciados pelos ideais de liberdade delineados no
direção de Adriana Barbaro e Jeremy Earp, EUA, livro Pé na estrada, do americano Jack Kerouac.
2008, 66 mm. O documentário explica como Observatório da imprensa. Disponível em: <www.
grandes corporações aproveitam-se da infância observatoriodaimprensa.com.br >. Acesso em:
para promoverações de marketing cujo objetivo abr. 2016. O Observatório da Imprensa é uma
é maximizar os lucros de qualquer modo. Isso entidade que tem o objetivo de acompanhar o de-
é feito por meio do incentivo a padrões de vesti- sempenho da mídia brasileira. Funcionando como
menta, alimentação e diversão, afetando direta- um fórum permanente em que os usuá rios da
mente o desenvolvimento físico e intelectual de mídia podem participar ativamente no processo
crianças e jovens. de construção da notícia, a entidade atua como
mediadora entre a mídia e a sociedade civil.

265
1 Direito à liberdaC
LJ osatio da e ai
, ~,, -,.,. ,

'rJT1
r
Qv

&

r' *

Neste livro, o eixo de discussão são as O desrespeito ao outro ainda prevale-


lutas pelo direito à liberdade. Como vimos, ce por meio de diversas ações. Com base
infelizmente, inclusive na história recen- nessa questão, considera-se que os prin-
te, esse direito tem sido negado a vários cípios de tolerância são condição necessá-
grupos. Mesmo em países que se dizem ria para a efetivação de uma cultura de paz
democráticos, as pessoas sofrem precon- no mundo, em que reine a liberdade entre
ceitos e são discriminadas, povos e indivíduos.
Neste capítulo são abordados alguns A aceitação e o respeito à diversidade hu-
exemplos históricos de direitos violados. O mana permanecem como o grande desafio do
preconceito, a discriminação contra os nativos século M. Compreender as raízes históricas
brasileiros,osafricanoseosafrodescendenteS de questões problemáticas de nossa socie-
assim como a intolerância religiosa, são ques- dade é uma das formas de nos capacitarmos
tões identificadas no Período Colonial que têm para combater a intolerância e o desrespeito
V
permeado nossa sociedade até os dias atuais. às liberdades individuais e coletivas.
O desafio da toLerância
No mundo inteiro, um dos grandes historicamente de não aceitação do outro,
empecilhos à efetivação da liberdade ple- seja por qualquer motivação.
na é a atitude de desrespeito ao outro; Com o objetivo de promover essas
portanto, a falta de tolerância. mudanças, em 1995 a Organização das
Entende-se que ser tolerante é aceitar Nações Unidas para a Educação, a Ciência
o outro e conviver com ele respeitando sua e a Cultura (Unesco) aprovou a Declaração

forma de ser, agir e viver; enFim, é respeitar de Princípios sobre a Tolerância.

a diversidade humana.
Pode-se afirmar que este é um dos A tolerância é o respeito, a aceitação
principais objetivos da humanidade: o e o apreço da riqueza e da diversidade das
respeito e a aceitação à diversidade. Na in- culturas de nosso mundo, de nossos modos
tenção de superar esse desafio, governan- de expressão e de nossas maneiras de expri-
tes e organismos internacionais procuram mir nossa qualidade de seres humanos. É
estabelecer regras, tratados, acordos que fomentada pelo conhecimento, a abertura
de espírito, a comunicação e a liberdade de
possam levar ao fim da intolerância.
pensamento, de consciência e de crença. A
O modo mais efetivo de construir
tolerância é a harmonia na diferença. Não
uma sociedade pautada nos princípios
só é um dever de ordem ética; é igualmen-
da tolerância se faz pela educação, seja te uma necessidade política e jurídica. A
ela escolar, seja familiar, social, religiosa; tolerância é uma virtude que torna a paz
enfim, partindo de todos os grupos de possível e contribui para substituir uma
convivência social. cultura de guerra por uma cultura de paz.
Um dos meios para disseminar os
UNESCO. Artigo 1" da Dectaraçáo de Princípios
princípios da tolerância é a promoção de sobre a Tolerância. In: KUNSCH, Margarida Maria
ações i mpetradas por governos, organismos Kroh[ing; FISCHMANN, Roseti. Midia e tolerância:
a ciência construindo caminhos de liberdade.
internacionais e também pela sociedade Sâo Pauto: Edusp. 2002. p. 157.
civil, visando mudar a mentalidade vigente

E
8

v
iS...,
r.,.
E.

Estudantes de origens
- étnicas diversas reunidos
L em escadaria.

ntoterância: atitude agressiva ou repressora de uma pessoa para com a outra, motivada
pela diferença, seja ela étnica, religiosa, seja de gênero, de opinião, no modo de ser etc.
O preconceito e a discriminação são manifestações de intolerância.

268 tuto 10
Essa declaração foi escrita com base nos prin-
cípios da Declaração Universal dos Direitos Hu- sua liberdade de opinião e de expressão, todos
comportamentos que ameaçam a consolidação
manos, que estabelece ser toda pessoa livre e igual
da paz e da democracia no plano nacional e
em relação a direitos. Portanto, todos têm direito
internacional e constituem obstáculos para o
à liberdade de pensamento, consciência e religião,
desenvolvimento. [...}
opinião e expressão.
UNESCO. Preâmbulo da Declaração de Princípios sobre
Partindo do pressuposto de que a educação
a Tolerância. In: KUNSCI-1. Margarida Maria Krohling;
deve ser efetivada visando à compreensão e à to- FISCHMANN, Roseli. Mídia e tolerância: a ciência
lerância, temos direito à amizade entre todas as construindo caminhos de liberdade. São Paulo:
Edusp, 2002. p. 157.
nações e todos os grupos étnicos ou religiosos.
Sendo assim, a Declaração foi um passo impor-
tante na recomendação da aceitação e do respei-
De acordo com esse documento, a efetivação
to à diversidade, por instruir as pessoas a agirem
dos princípios de tolerância é urgente e necessária
dentro desses princípios.
para a humanidade, pois busca o reconhecimento
O preâmbulo da Declaração de Princípios
e a aceitação dos direitos universais e das liberda-
sobre a Tolerância deixa claro o que motivou a
des fundamentais de todos os seres humanos.
aprovação desse documento:
É preciso ter consciência de que a tolerância
não é um privilégio concedido a alguém, bem
[A] intensificação atual da intolerância, da como não é um benefício ou consentimento.
violência, do terrorismo, da xenofobia, do Trata-se de atitudes efetivas que devem ser pratica-
nacionalismo agressivo, do racismo, do antis- das por todos. É, antes de tudo, uma mudança na
semitismo, da exclusão, da marginalização e forma de ver e de pensar, de agir com relação ao
da discriminação contra minorias nacionais, outro. É compreender que todos são livres e iguais
étnicas, religiosas e linguísticas, dos refugiados,
em direitos, aceitando e respeitando a realidade
dos trabalhadores migrantes, dos imigrantes e
da diversidade humana em todos os seus aspectos.
dos grupos vulneráveis da sociedade e também
Um dos grandes desafios do século XXI é pôr
pelo aumento dos atos de violência e de intimi-
dação cometidos contra pessoas que exercem fim ao preconceito e à discriminação e garantir a
todos o usufruto da liberdade plena.

Organizando ideias
Leia o texto a seguir, faça o que se pede e De acordo com o conteúdo exposto até ago-
depois debata o assunto com os colegas e o ra e complementado no texto, todos são ao
professor. mesmo tempo iguais e diferentes. Explique
o que isso significa.
Articular o direito de igualdade com direitos de
diferença é uma questão fundamental no momento
O que significa lutar contra as formas de
presente. Atualmente não podemos falar de igual-
dade sem incluir as questões relativas à diversida- desigualdade, preconceito e discriminação?
de, nem podemos falar de diferença dissociada da A quem cabe esse papel e como isso deve
afirmação de igualdade, o que supõe lutar contra ser feito?
todas as formas de desigualdade, preconceito e
discriminação. [...] Como é possível concretizar a afirmação da
primeira frase do texto? Converse com os
CANDAU, Vera Maria. Educação em direitos humanos no
Brasil: gênese, desenvolvimento e desafios atuais. n: PAIVA, colegas e o professor e levantem hipóteses.
Angela Randolpho (Org.l. Direitos humanos em seus
desafios contemporâneos. Rio de Janeiro:
PUC-Rio, PalIas, 2012. p. 33.

269
2 Viajando pela história
organização, a ordem e a racionalidade; já
O desrespeito ao outro os persas representavam a desorganização,
O preconceito e a discriminação são o caos e o misticismo. A pesquisa histórica,
quase tão antigos quanto a humanidade. porém, revela-nos que, na sociedade grega,
São vários os exemplos, em diversas socie- havia a escravização de gregos; mesmo em
dades, no decorrer da história que podem Atenas, a democracia era para poucos (es-
sustentar essa afirmação. Nesta seção cita- cravos, mulheres e estrangeiros estavam ex-
mos alguns deles. cluídos do processo); Esparta tinha um go-
Documentos do Egito Antigo relatam verno oligárquico e totalitário, e na maioria
que no reinado de Snefru, da 1V Dinastia, das cidades gregas predominavam regimes
por volta de 2680 a.C., o faraó viu suas tirânicos. O Império Persa, em comparação
tropas regressarem com 7 mil prisioneiros a outros regimes da Antiguidade, caracteri-
oriundos da Núbia, os quais passaram a ser zou-se por certa "tolerância" para com os
escravos. O número de escravos era relati- vencidos. Mas isso não significa que, entre
vamente pequeno e, embora não haja docu- os persas, não tenha havido preconceito.
mentação comprovando que a escravidão A exemplo dos gregos, na Roma An-
era étnica - como na História Moderna -, tiga os que eram considerados cidadãos
havia tensão, e o "estrangeiro" era visto também se posicionavam como superio-
com reservas. A sociedade egípcia conside- res a outros povos e, por isso, nas regiões
rava viver na terra dos deuses e nutria certo conquistadas, procuraram difundir a
desprezo por habitantes de outras terras. romanização, ou seja, impor sua cultura,
Data da Grécia Antiga o uso do vo- que consideravam melhor que a dos outros.
cábulo bárbaro para se referir ao "outro". Não eram, contudo, inflexíveis, pois muitas
Heródoto de Halicarnasso, que viveu no vezes incorporavam aspectos culturais dos
século V a.C., ao relatar o conflito entre povos vencidos. Os romanos conquistaram
gregos e persas, estabeleceu uma distin- a Grécia, por exemplo, pelas armas, porém
Escravos ção muito clara: os gregos eram homens foram profundamente influenciados pela
servindo em
um banquete, livres; enquanto os persas, escravos, pois cultura hetenistica.
Mosaico do tinham de se submeter a uma autoridade É importante destacar que em Roma
Da despótica. Entre os gregos, Heródoto via a e na Grécia pessoas de qualquer etnia,
condição social, nível intelectual ou cre-
do religioso podiam ser escravizadas. Na
Roma Imperial, por exemplo, era possível
encontrar entre os escravos um médico
grego, um gladiador originário da Arábia,
uma cozinheira germânica ou uma dan-
çarina africana. Na escravidão, não havia
predominância do componente étnico.

., .-

O vocábulo bárbaro, hoje, significa


rude, selvagem, cruel. Mas, entre gre-
gos e romanos, dizia-se da pessoa de
outro povo ou etnia, de língua e cultura
. .J'_ estrangeiras.

270 u10 10
Na Idade Média, no mundo europeu, ser concorridos autos de fé - ou durante as guerras
cristão era essencial para ter direitos mínimos. Os religiosas na França, culminando, por exemplo,
judeus eram segregados, forçados a viver em bair- no massacre de huguenotes na Noite de São Bar-
ros separados e a usar sinais distintivos. Na França tolomeu (24 de agosto de 1572).
governada por Luís XI (1 214-1 270), o símbolo dos O que caracteriza todos esses exemplos é o
judeus era uma estrela amarela, que reapareceu na desrespeito às diferenças, seja elas culturais, sociais,
Alemanha nazista (1933-1 945). econômicas, seja religiosas; enfim, são exemplos de
Os que divulgavam concepções que não es- intolerância.
tavam em concordância com os dogm da Igreja
eram chamados de hereges. Para combatê-los, foi
Os autos de fé eram solenidades celebradas
criada a Inquisição, que funcionou em países católi-
pelo Tribunal da Inquisição. Nelas, os peniten-
cos até o começo do século XIX. Com isso, os pi'.gaos
ciados do Santo Ofício tinham suas sentenças
e os hereges eram discriminados e perseguidos. proclamadas e eram executados: os arrepen-
Na Idade Moderna, com a conquista da Amé- didos eram mortos por estrangulamento, antes
rica, os povos nativos foram dominados econômica, de serem queimado5 na fogueira; os considera-
política e culturalmente. Suas terras foram tomadas dos hereges, bruxas etc. eram queimados vivos.
pelos europeus, seu modo de vida alterado e sua
cultura, desprezada. Por dominarem determinadas
técnicas, os europeus acreditavam que a civilização
que representavam era superior. No plano da religião,
por exemplo, os membros da Igreja Católica conside-
ravam que deveriam "salvar a alma dos indígenas",
sem, contudo, entender que esses povos já tinham
suas próprias crenças e práticas religiosas.
Os europeus que chegaram à América se
horrorizavam com práticas como as da religião
asteca, que exigia o sacrifício de pessoas ao deus
da guerra (Huitzilopchtli), com os hábitos dos
tupinambás e de outros povos, que praticavam
a antropofagia, ou ainda com os costumes dos
maias, que eram ferozes guerreiros, e em nome
dessas diferenças praticaram várias ações, como
a destruição e a catequização dos nativos. Con-
bruxis de Sa(cn uma menina enfeitiçada em 1 (392.
tudo, esses mesmos religiosos não reconheciam
Litografia colorida.
intolerâncias presentes em sua própria religião,
como as praticadas pela Inquisição espanhola
- que investigava, julgava e condenava pessoas
Organizando ideias
consideradas hereges, judaizantes e bruxas em
1. De acordo com as informações do texto, o
que é possível afirmar sobre a intolerância
A1 GLoss ao longo da história?
Dogma: ponto básico de doutrina religiosa.
HeLenístico: relativo à civilização grega no 2 O texto revela uma contradição da Igreja
período anterior à dominação romana. Católica ao destacar a postura da entidade
Herege: pessoa que professa ou sustenta na América e na Europa.
alguma doutrina que se opõe ao que a Igreja
estabelece em matéria de fé. a) Que contradição é essa?
Pagào: adepto de qualquer religião que não ado-
ta o sacramento do batismo ou adota o politeísmo.
bi De que modo ela é apontada no texto?
2
271
O desrespeito aos nativos brasiLeiros
Na História do Brasil, como já citado, tam-
bém houve o desprezo pelo outro. Após a che- os animais domésticos que encontravam e des-
gada dos portugueses nações inteiras de nativos truído as pontes.

desapareceram em virtude de escravização, MATTOS, Izabel Missagia. CiviLização e revolta: os


guerras e doenças. Isso não quer dizer que não botocudos e a catequese na província de Minas.
Bauru: Edusc, 2004. p. 362.
houve resistência; mas, ainda assim, os nativos
sofreram com a intolerância e o preconceito
dos europeus. Essa revolta foi violentamente reprimida. Os
Podem ser citadas várias lutas entre indí- colonizadores contaram com o apoio de indíge-
genas e colonizadores. De forma geral, essas nas aliados para atacar de surpresa os revoltosos
lutas tinham, de um lado, os nativos em defesa e retomar o controle da região.
de suas terras e de sua liberdade e, de outro, os Os colonizadores, nos embates com os
colonizadores assegurando a posse das terras e o nativos, usavam o conceito de guerra justa, que
direito sobre tudo o que havia nelas, incluindo os era autorizada pela Coroa ou pelos governado-
habitantes nativos. No século XVI, a Confedera- res por considerarem o conflito legítima defesa
ção dosTamoios colocou em xeque a dominação dos colonizadores contra os ataques indígenas.
portuguesa de uma ampla região que corres- No início do conflito, a resistência dos tapuias,
ponde aproximadamente aos atuais estados de mais numerosos e habituados ao território, levou
São Paulo e do Rio de Janeiro. No século XVII, vantagem. Após o final do século XVII, porém,
no nordeste, ocorreu aquela que os portugueses com a adoção de um plano de escravização dos
chamaram de Guerra dos Bárbaros, uma guerra rebeldes, os rumos da guerra mudaram e os in-
de resistência efetivada pelos nativos, que viam dígenas foram vencidos.
os colonizadores portugueses avançarem sobre
suas terras.
Outro exemplo de luta dos indígenas para Se existe uma guerra justa, há de ser aquela
manter a liberdade aconteceu em Minas Gerais, no travada contra o próprio demônio. E era uma
final do século XIX. guerra assim que os portugueses acreditavam
estar lutando nos sertões brasileiros.
O demônio, no caso, eram os índios tapuias.
Um dos primeiros registros sobre a revolta Divididos em várias etnias, espalhadas pelo
dos índios é datado de 10 de junho de 1893. Tra- Nordeste da Colônia, numa enorme faixa de
ta-se de correspondência enviada pelo diretor da terra que ia da Bahia ao Ceará, eles ganharam
3" Circunscrição dos Índios da Província e juiz a fama de bárbaros já no momento em que fo-
de paz em exercício, coronel Antonio Onofre, ram batizados. "Tapuias", para os tupis, eram
ao diretor-geral dos Índios, na qual se mostrava todos os não tupis. Diferiam destes não só pela
visivelmente impactado pelas "cenas verdadei- língua, mas por habitarem o sertão, o interior.
ramente horrorosas" testemunhadas no aldea- Como os colonizadores se instalaram primeiro
mento do Itambacuri, que "até bem pouco foi no litoral, foi com os tupis que se comunicaram
o ponto mais próspero do nordeste de Minas": e se misturaram antes. Por mais que também se
sublevando-se contra os missionários, os índios dividissem em vários povos, alguns deles agres-
haviam cometido assassinatos, utilizando-se das sivos, os tupis eram os índios "conhecidos". já
armas de fogo fornecidas pelos sacerdotes; fle- os tapuias eram "os outros". E quando chegou
chado pessoas que iam trabalhar nas lavouras; a hora de enfrentá-los, sua fama se confirmou.
queimado "todas as casas de roça e com estas
GERONAllO, Soraya. Quem tem medo dos bárbaros?
todos os depósitos de mantimento pertencentes Revista de História da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro,
aos nacionais ali estabelecidos"; matado todos ano 4, n. 46, p. 64, ju. 2009.

272
Entre os religiosos europeus havia um gran- mitações, muita coisa já foi feita. Algumas áreas
de conflito interno. Enquanto uns defendiam os foram demarcadas, e a posse desses territórios foi
direitos dos indígenas e sofriam por causa da vio- garantida aos nativos. Embora ainda ocorram in-
lência empregada contra eles, outros apoiavam vasões e arbitrariedades, os indígenas têm se or-
uso da violência pelos colonizadores em defesa ganizado e lutado por seus direitos.
da soberania dos direitos dos portugueses sobre Por preconceito ou falta de informação,
território ocupado. muitas pessoas ainda questionam as mudanças
Em todos os períodos políticos da História de hábitos dos indígenas, que, com o passar do
do Brasil - Colônia, Império e República -, o direi- tempo, assimilaram vários aspectos de culturas
to dos indígenas à vida e à liberdade foi desrespei- diferentes, influenciados pela convivência com
tado. Em muitos conflitos, a tônica foi a posse da outros povos. Mas é claro que eles não deixam
terra, pois, ao expulsar ou matar grupos indígenas, de ser indígenas por causa disso. Assim como
os europeus e seus descendentes poderiam usu- qualquer pessoa, eles têm direito a usar roupas
fruir desse pedaço de chão sem resistências. Isso diversas, utilizar aparelhos eletrônicos, acessar a
ocorreu em todo o território que hoje forma o Bra- internet, frequentar escolas e universidades, entre
sil. Podem ser citados vários exemplos, como o dos outras coisas comuns à sociedade atual.
imigrantes que, ao chegarem à região sul do país,
foram autorizados pelo imperador a dizimar as
O destino de cada cultura e de cada povo
populações nativas e a se apossar das terras para
pertence a eles; só eles podem dizer o que querem
colonizá-las e fazê-las produzir. Há indícios inclusi- fazer. Os índios têm todo o direito de se modificar
ve de que os imigrantes distribuíam aos indígenas como nós nos modificamos. O brasileiro de hoje
roupas infectadas com o vírus da varíola, contra o não é o brasileiro do século XVIII.
qual os nativos não tinham resistência.
Dl FELICE, Massimo. Sociologia Ciência & Vida.
A Constituição de 1988 garantiu aos indíge- São Paulo, ano 1, o. 3, p. 45. 2007.
nas a demarcação de suas terras. Apesar das li-

Joaquim José de
Miranda.
A expedição do
tenente-coronel
Afonso Botelho
e Souza aos
sertões do Tibagi.
c. 1771-1773.
Aquarela.
42,5cm x 55cm.
A imagem destaca
a suposta gentileza
dos portugueses
com os indígenas, j
que se mostram 1
interessados nos
objetos oferecidos
a eles. Assim.
procurava-se
divulgar uma imagem
de colonização
pacífica empreendida
pelos portugueses na
América.

Drito c. iberddo: c clesifio d tol€rn. ; 273


Portanto, os indígenas de-
vem ter acesso às novas tecno-
logias, sem que, com isso, dei-
xem de ser indígenas. É evidente
que não serão como foram seus
antepassados, pela mesma ra-
zão que qualquer pessoa não é
e não vive como foram e vive-
ram seus avós.

- L-
cs0iqenns na Universidade Federal do Acre (Ufac). Rio Branco AO;. 201 4

Organizando ideias

Leia os textos e, em seguida, faça o que se Foi durante o funcionamento do SPI que ocorreu o
pede. Massacre do Paralelo Onze (1963). Havia interesses
em expandir o capital até a região de Aripuanã - MT,
Texto 1
para isso pensou-se em montar diversas expedições
História sobre os Maxakali e a terra colonizadoras, capazes de atrair nligrantes de outras
Antigamente os maxakali mudavam muito. Foi- or regiões do Brasil para Mato Grosso. Como nessa área
que os maxakali mudavam muito? Há muito tempo almejada habitavam os índios Nambiquara, neces-
atrás tinha muita terra. A terra maxakali era muito sário se fez cuidar de sua expulsão. Naturalmente,
grande e os maxakali viviam mudando de um lugar os índios se negaram a deixar suas terras.
para outro. Os poucos antepassados que ainda exis- Certo dia, foram surpreendidos por aviões que
tiam vieram de uma parte e de outra e se encontraram dinamitaram suas aldeias e por indivíduos que
aqui [ ... ]. Enquanto os maxakali estavam aqui, com praticaram uma série de atos violentos contra a po-
as terras grandes para eles» vieram os fazendeiros, pulação que sobreviveu. Após tais atos de terror, os
tomaram as terras e dividiram-nas entre si. índios sobreviventes foram levados para outras terras,
cedendo lugar a interesses do capital. Nessa ocasião,
MAXACALI. Gilberto et ai. O Livro que conta histórias de
antigamente. BeLo Horizonte: MEC; Secretaria de Estado da
deputados denunciaram publicarnente este bárbaro
Educacáode Minas Gerais; Projeto Nordeste/Pnud. 1998. p. 71. assassinato, chegando mesmo a chamar os Nambi-
quara de "biafras brasileiros", tal o nível de pobreza e
Texto 2 miséria a que ficaram reduzidos depois do episódio.
SIQUEIRA, Etizabeth Madureira; COSTA. Lourenço Alves da;
O massacre do Paralelo Onze
CARVALHO, Cathia Maria Coelho, O processo histórico de Mato
O SPI (Serviço de Proteção ao Índio, criado em Grosso. Cuiabá: U[MT, 1990. p. 280.
1910) funcionou até 1967, momento em que foi cria-
da a Funai - Fundação Nacional do Índio. Quando
Qual é o assunto comum aos dois textos?
SPI encerrou seus trabalhos, várias denúncias ha-
viam sido feitas com relação às corrupções, vendas
Situações como as citadas nos textos ainda
e concessões ilegais de terras indígenas. Foi aberta
uma sindicáncia para se apurar as denúncias e na ocorrem? Exemplifique.
ocasião foi montada uma Comissão de Investigações
que tentou, através de inquéritos, detectar e identifi- Relacione a questão de terras indígenas com
car os responsáveis por tais irregularidades e crimes. direito à liberdade.

274 tutolO
Escravidão e racismo
A escravização ocorreu desde a Antiguidade, Sem dúvida, a pior herança que a escravidão
mas ganhou os contornos que a caracterizaram a deixou para o Brasil foi o racismo, nem sempre
partir do século XVI com o comércio internacional explícito, o que levou alguns mais ufanistas a pro-
de seres humanos. O tráfico provocou um dos clamar que, em nosso país, havia uma "democracia
maiores deslocamentos populacionais de toda a racial". O racismo esteve presente - e infelizmente
história humana. Do século XVI ao XIX, mais de ainda está - em nossas relações sociais.
12,5 milhões de africanos foram retirados à força Juridicamente, o racismo é crime no Brasil
de seu continente e levados principalmente para desde a Lei Afonso Arinos, de 1951. A Consti-
a América. Destes, cerca de 4,9 milhões vieram tuição de 1988, no artigo 5 inciso XLII, passou a
para as terras que hoje formam o Brasil, ou seja, considerar a prática do racismo crime inafiançável
mais de 45% do total de escravizados. e imprescritível. Apesar do rigor da lei, as conde-
O apogeu do tráfico de escravos ocorreu em nações ainda são raras.
meados do século XVIII. Entretanto,já no final desse O crime de injúria racial está previsto no ar-
século começou sua decadência, em virtude da Re- tigo 140 do Código Penal entre os crimes contra
volução Francesa (1789) e da Revolução Haitiana. a honra, que são aqueles que atingem os atribu-
No Brasil, o tráfico só foi formalmente proibido em tos intelectuais, físicos e morais de uma pessoa,
1850 e, em 1888, foi abolida a escravatura. desmerecendo-a perante a coletividade.Já o crime
de racismo, regulamentado em lei
especial, somente será aplicado
quando as ofensas menospreza-
rem determinada raça, cor, etnia,
religião ou origem, agredindo
um número indeterminado de
pessoas. Preterir um candidato
a um emprego por causa de sua

etnia é crime de racismo, enquanto
ofender alguém com expressões
racistas é injúria racial.
Em 2003, o governo federal
criou a Secretaria Especial de Pro-
moção de Políticas para a Igua Ida-
de Racial, que procura desenvolver
- políticas públicas visando reparar
desníveis sociais por meio de
- ações afirmativas compensatórias.
Um exemplo dessas políticas é o
- -
estabelecimento de cotas para a
O trato dos escravos, imagem integrante da obra Diário da descoberta dos recursos do Nilo entrada de afrodescendentes nas
do cotonizador John Hanning Speke, publicada em 1863.
universidades públicas.

A GLossáro
Imprescritível: que não caduca, que não perde a força, que não envelhece.
Inafiançável: que não pode ser objeto de fiança.
Injúria: ato insultuoso, ofensivo.
Ufanismo: patriotismo exagerado; exaltação extrema de algo.

Direito ibcrdjdc o doscifio d folc-ran. i,, 275


Organizando ideias

Forme uma dupla com um colega e, juntos, da, no Brasil, e sobre a consequente pobreza que
leiam os textos. Depois, façam o que se pede. assola a maioria da população nacional precisa ser
compreendida em sua dimensão etnorracial. E isto
Texto 1
porque, segundo eles, a divisão da sociedade bra-
Tez de cor azeitonada sileira entre brancos e não brancos sempre existiu.
O trem parara e eu abstinha-me de saltar. Urna Na defesa de seus pontos de vista, lembram os
vez, porém, o fiz; não sei mesmo em que estação. partidários das ações afirmativas que, no Brasil, a
Tive fome e dirigi-me ao pequeno balcão onde havia ascensão pela miscigenação, quando se deu, foi em
café e bolos. Encontravam-se lá muitos passageiros. ocorrências isoladas.
Servi-me e dei urna pequena nota a pagar. Como se Aqui, pelo menos até o fim da época imperial,
demorassem em trazer-me o troco, reclamei: "Oh!" a mestiçagem entre "brancos" e "não brancos",
Fez o caixeiro indignado e em tom . j . "Que quando aconteceu, foi, em geral, no âmbito da
pressa tem você. Aqui não se rouba, fique sabendo!" superioridade dos primeiros sobre os outros, enco-
Ao mesmo tempo, a meu lado, um rapazola alourado berta sob o manto do temor reverencial, através da
reclamava o dele, que lhe foi H en- imposição do poder sobre o corpo: do estupro, real
tregue. O contraste feriu-me, e com os olhares que os ou presumido. Sem falar dos momentos em que a
presentes me lançaram, mais cresceu a minha indigna- miscigenação foi vista como uma solução eugênica,
ção. Curti, durante segundos, uma raiva muda, e por como possibilidade de resolução de um problema,
pouco ela não rebentou em pranto. 1 pqo e tonto, dentro da perspectiva que tinha a sociedade brasi-
embarquei e tentei decifrar a razão da diferença dos leira de "melhorar a raça" - para usar a expressão
dois tratamentos. Não atinei; em \'ão passei em revista empregada, ainda em 2008, por um senador da
a minha roupa e a minha pessoa. Os meus dezenove República em relação ao casamento interétnico de
anos eram sadios e poupados, e o meu corpo regular- um colega seu afrodescendente.
mente talhado. Tinha os ombros largos e os membros [ ... ]
ágeis e elásticos. As minhas mãos com dedos O caso é que, na sociedade brasileira, salvo ra-
afilados e esguios, eram herança de minha mãe, que ríssimas exceções conhecidas, a efetiva mestiçagem
as tinha tâo valentemente bonitas que se mantiveram da população só se verifica nos estratos mais baixos,
assim, apesar do trabalho manual a que a sua condição entre aqueles que não têm acesso à mobilidade social
obrigava. Mesmo de rosto, se bem que os meus traços ascendente. Então, ela é sempre um fator de perpetua-
não fossem extraordinariamente regulares, eu não era ção da exclusão - diz a moderna militância negra.
hediondo nem repugnante. Tinha-o perfeitamente
LOPES, Nei. História e cuLtura africana e afro-brasiteira.
oval, e a ez de cor pronunciadamente São Paulo: Barca Planeta, 2008. p. 138-139.
LIMA BARRETO, Afonso Henrique de. Recordações do escrivão
tsaías Caminha. São Paulo: Escala, 2007. p. 24-25.
Na descrição do texto 1, vocês consideram
que houve preconceito? Expliquem.
Texto 2

A defesa de ações afirmativas Expliquem o que são ações afirmativas.


os defensores das ações afirmativas argumentam
que é impossível desvincular-se da questão social, Quais passagens do texto 2 demonstram que
que toda discussão sobre a má distribuição da ren- há preconceito étnico no Brasil?

Azeitonado: diz-se do que tem cor ou aspecto Prazenteiramente: de modo a demonstrar alegria,
parecido com o da azeitona. No sentido utilizado no prazer.
texto, refere-se a pessoas de pele negra. Tez: pele, em especial a do rosto.
Desabrido: agressivo, tempestuoso. Trôpego: que tropeça, que não se sustenta nas
Fidalgo: aquele que tem título de nobreza. pernas.

276 lulolO
A questão da Liberdade reLigiosa
A perseguição de pessoas em decorrência de
suas crenças religiosas também é uma forma de não é pecado), ao conteúdo dos livros canônicos
(Deus não criou o céu e a terra; Jesus não man-
preconceito. Os adeptos do cristianismo, por exem-
dou nenhum discípulo pregar). Ou seja: aquele
plo, foram perseguidos pelas autoridades romanas
que recusa OS símbolos da fé, os decretos da Igre-
durante os três primeiros séculos da Era Cristã.
ja e os livros sagrados. Isso significa que herege
Sabemos que, de forma geral, o Império Romano qualifica quem se opõe ao clero, aos padres, aos
tolerava as crenças dos povos dominados. Contu- bispos, ao papa [.1.
do, os cristãos foram perseguidos pelo fato de não
ONFRAY, Michet. O cristianismo hedonista. Sào Pauto:
cultuarem o imperador como uma divindade; por Martins Fontes, 2008. p. 76. IConfra-História da Filosofia, v. 21.
integrarem uma religião que, em seus primórdios,
congregava os oprimidos (estrangeiros, mulheres,
libertos, escravos e pobres); por condenarem o mi- A Idade Média é chamada por alguns histo-
litarismo e o modo de vida dos romanos (lutas de riadores de "Idade da Fé". De fato, foi um período
gladiadores, banhos públicos, liberalidade sexual, marcado por extrema religiosidade e também intole-
divórcio etc.); e por praticarem seus cultos em lo- rância. Em "nome de Deus", cristãos e muçulmanos
cais secretos. Em outras palavras, os cristãos, para se digladiaram nas Cruzadas. No mundo ocidental,
o Estado romano, eram subversivos e, como tais, heréticos, "bruxas", rebeldes e doentes mentais foram
deveriam ser punidos. executados. Pensar criticamente ou viver de forma al-
Mesmo com a repressão, o cristianismo se ternativa era considerado demasiadamente perigoso.
expandiu. A crença na imortalidade da alma, o
zelo dos cristãos, a moralidade pura e austera, a
unidade do Império e a misericórdia para com os
necessitados foram alguns dos fatores que contri-
buíram para a propagação do cristianismo.
Além disso, o imperador Constantino (2 72-
-337) passou a favorecer o cristianismo, que, com
Teodósio (346-395), tornou-se a religião oficial
do Império Romano. Ao longo do século IV, cul-
tos pagãos foram proibidos, textos queimados,
sacerdotes assassinados, tudo com a anuência
do Estado e da Igreja. A Igreja cristã passou de
perseguida a perseguidora.

Os cristãos continuam sua expansão e suas


exaçôes. Os valdenses, os maniqueus, mais tarde
OS cátaros são queimados a pretexto de que obe-
decem a doutrinas hereges. Em 1324, Bernardo
Gui redige seu Manual dos inquisidores, comple-
tado por Nicolau Eymerich em 1376. O herege
é definido como o indivíduo que se opõe a um
artigo de fé (a Trindade ou a Encarnação, por
exemplo), a uma verdade declarada pela Igreja
(o Espírito Santo não procede do Pai; a usura
Batalha entre cruzados e sarracenos. Miniatura do livro História. de William
de Tyre. Biblioteca de Genebra, Suiça, c. 1460.

277
No mundo islâmico também houve a adoração a outras divindades. Ojudaísmo
embates, entre sunitas e xiitas, e guerras de acabou influenciando sobremaneira duas
conquistas consideradas "guerras santas". novas religiões monoteístas: o cristianismo
Em meio a tantas calamidades, os judeus e o islamismo. Apesar da origem comum
também foram vítimas de perseguição, prin- dessas três doutrinas, podemos observar
cipalmente em remos considerados cristãos. que, com o triunfo das religiões monoteístas,
A imposição da crença em um único ocorreu a imposição de dogmas, correntes
deus já gerou inúmeros conflitos ao longo antagônicas foram perseguidas e surgiram as
da história. No Egito, por exemplo, quando "guerras de religiões", a maioria provocada
o faraó Amenófis lV(1363 a.C.-1 347 a.C.) por questões não apenas religiosas mas tam-
fez de Aton (o disco solar) a única divinda- bém econômicas, políticas e sociais.
de, templos de outros deuses foram fecha- No século XVI, entre outras transfor-
dos, cultos suprimidos e os sacerdotes dos mações, ocorreu a Reforma Protestante,
"deuses falsos" sofreram graves consequên- cujos personagens mais expressivos foram
cias. O atonismo - culto a Aton -, porém, Martinho Lutero, Ulrich Zwingli eJoão Cal-
não sobreviveu à morte desse faraó, e o vino. Nessa época, também predominou a
politeísmo foi restabelecido. intolerância contra as religiões. Além dos
O deus dos hebreus, conforme as pas- conflitos entre protestantes e católicos,
sagens do Antigo Testamento, não tolerava foi durante a Idade Moderna que ocorreu
a caça às bruxas que vitimou
em torno de 60 mil mulheres.
Foram executadas mulheres
na Inglaterra anglicana, na
Alemanha protestante e na
Espanha católica.
Nessa época, os portu-
gueses iniciavam a coloniza-
ção do Brasil. Missionários
católicos, a maioria jesuítas,
começaram a catequização
dos nativos. Colonização e
catequese andavam juntas.
Nos primeiros tempos havia
uma crença na Igreja de que
a mente dos ameríndios era
como um papel em branco e
que seria fácil torná-los "bons
cristãos". No entanto, muitos
indígenas resistiram e manti-
veram suas antigas práticas
sociais e religiosas.

C. Legrand. O padre Antônio


Vieira. c. 1839. Litografia colorida.
20.3cm x 15,2 em. Famoso por seus
sermões escritos, padre Vieira foi membro
da Companhia de Jesus, grupo formado por
religiosos cristãos cujo objetivo era preservar
e difundir a fé católica no Periodo Colonial.

278 :0uo 10
Quanto aos africanos trazidos para o Brasil
como escravos, havia uma grande variedade étnica como supersticiosas e ofensivas à "moral pública",
- congos, mandingas, manjacos, saracolês, iorubás, à "ordem" e às leis; mas havia sempre os casos dos
que chegavam a tolerar, seguindo uma tradição
jejes, fantis, axantis etc. - e, por isso, a diversidade
colonial, certas danças e festas, de preferência se
religiosa era enorme. Praticava-se o culto às di- fossem "honestas", objetivando evitar males maio-
vindades iorubás (os orixás), bem como a religião res -, caso fossem drasticamente cerceadas.
slâmica. Contudo, o escravo era considerado pro- A tolerância de muitas autoridades e os meca-
priedade de seu senhor, sendo, por isso, obrigado nismos de pressão de vários grupos de candomblé
a "converter-se" ao catolicismo. foram os canais de sua afirmação ao longo do
Apesar dos esforços dos religiosos católicos, século XIX.
foi intenso o sincretismo religioso, não só das re- ABREU, Martha. In: VAINFAS, Ronaldo IDir).
ligiões africanas com o catolicismo como também Dicionário do Brasil Imperial (1822-1889).
Rio de Janeiro: Objetiva. 2002. p. 115.
entre crenças africanas e indígenas. O candomblé,
por exemplo, abrange um conjunto de religiões de
origem africana que foram recriadas aqui. Cabe Com a República, mesmo após o Brasil se
salientar que há diferença entre o sincretismo (fusão tornar um país laico, as perseguições continuaram.
de elementos de diferentes religiões) e a dissimula- O escritor Jorge Amado, em sua obra ficcional
ção como estratégia contra a opressão. Tenda dos milagres, baseia-se em fatos reais para
O candomblé ficou conhecido como batu- discorrer sobre como a religiosidade popular era tra-
que, no Rio Grande do Sul, e xangô, em Pernam- tada pela elite das primeiras décadas do século XX.
buco.Já a umbanda é um exemplo de sincretismo,
pois funde elementos das religiões africanas, do Uma guerra santa: os cruzados partiram naque-
catolicismo e do espiritismo (doutrina criada na la noite de Xangô para acabar com infiéis. Além
França no século XIX por Alan Kardec). dos quatro intrépidos da batida no reduto do bi-
Durante o Período Colonial, os encontros cheiro, formavam nas hostes latinas da civilização
religiosos de africanos e afrodescendentes, como os nobres cavaleiros Leite de Mãe, assim chamado
os calundus, eram reprimidos, pois as autoridades por ter o costume de bater na própria mãe, e Beato
Ferreira, especialista em sovas de facão nos presos,
relacionavam-nos à feitiçaria. Durante o Império,
igualmente lídimos representantes da cultura
apesar de a Constituição de 1824 assegurar a li- defendida a ferro e fogo pelo delegado auxiliar.
berdade de culto religioso, isso de fato não ocorria. Saíram cedo, cada qual com seu cacete, pau de
criar bicho, moderna lança daqueles beneméritos
[ ... ] No cotidiano repressivo, entretanto, fo- cruzados, e fizeram bom serviço. Nas três primei-
ram os códigos das posturas municipais os mais ras casas de santo que invadiram, foi-lhes fácil a
sistematicarnente acionados. A partir de 1830, tarefa: axés pequenos, terreiros modestos, festas em
legislaram sobre a proibição ou o cerceamento começo. Baixaram o porrete, os gritos de velhos e
de candomblés, batuques, zungus, maracatus, mulheres, música maviosa, animavam os guerreiros
"danças de pretos", "casa de dar fortuna" etc. As no prosseguimento da missão civilizadora. Quando
penas envolviam multas, um certo tempo de cadeia já não tinham a quem espancar, divertiam-se na
e mesmo açoites, se o infrator fosse escravo. As destruição dos atabaques, dos pejis, das carnarinhas.
opiniões e ações sobre os candornblés, assim como A notícia da diligência começou a andar na
sobre os batuques negros, nunca conseguiram una- frente dos policiais, emudecendo orquestras,
nimidade, expressando os impasses das estratégias dissolvendo rodas de feitas e iaõs, apagando as
de controle sobre escravos e libertos. luzes, terminando obrigações e festas. Cabisbaixos,
Algumas autoridades consideravam os encon- homens e mulheres recolhiam-se às suas casas
tros religiosos propícios a sublevações, posto que enquanto os orixás retornavam à montanha, à
podiam criar solidariedades entre os negros, entre floresta, ao mar, de onde haviam vindo para a
escravos e libertos, entre crioulos e africanos; outras dança e o canto nos terreiros.
não suportavam as livres apropriações negras dos AMADO. Jorge. Tenda dos milagres.
santos católicos através de danças e músicas vistas Rio de Janeiro: Record, 2001. p. 231.

Direito à Liberdade: o desafio da tolerán::, 279


Ao longo do século XX, a liberdade de
crer ou não crer continuou duramente amea- elas vejam seu público encolher. É cada
çada em vários outros países. Na União Sovié- vez maior o número de fiéis que deixam
de respeitar as normas ditadas pela
tica governada por Stálin (1924-1953), igrejas
hierarquia, notadamente em matéria
foram demolidas, e clérigos presos e assassi-
de comportamento moral, sexualidade
nados. Na Europa Oriental do pós-Segunda e controle da natalidade, enquanto o
Guerra Mundial, em nome do socialismo, o sacerdócio é vítima de uma profunda
direito à liberdade foi sumariamente limitado. crise de vocações. Em compensação,
Privilegiava-se o ateísmo e consideravam-se as essa tendência é acompanhada pelo
religiões apenas "superstições". aprofundamento e enriquecimento do
No Irá dos aiatolás, os baha'istêm sido sentimento religioso, que volta cada vez
vítimas de intensas perseguições. Na Caxemi- mais à prática e à espiritualidade, ter-
minando muitas vezes no engajamento
ra indiana, hinduístas reprimem muçulma-
social e político.
nos; já no Sudão são os muçulmanos que
perseguem os cristãos. Muitos dos conflitos BERSTEIN, Serge; MILZA Pierre lCoord.l.
História do século XX: de 1973 aos dias atuais - a
tidos como religiosos têm motivações eco- caminho da globalização e do século M. São
nômicas e políticas, sendo a religião usada Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007. p. 466.
como um fator de aglutinação.

No Brasil, a Constituição de 1988


A angústia que as pessoas sentem garante a plena liberdade religiosa em seu
hoje diante das incertezas sobre o futuro artigo 50, inciso VI:
e da crise das ideologias faz com que elas
se voltem para os valores tradicionais.
Esse fenômeno manifesta-se inicial- É inviolável a liberdade de consciên-
mente pelo renascimento do sentimento cia e de crença, sendo assegurado o livre
religioso dentro das igrejas constituídas, exercício dos cultos religiosos e garanti-
embora seja verdade que, especialmente da, na forma da lei, a proteção aos locais
nos países ricos do mundo ocidental, de culto e suas liturgias.

Já o Código Penal, em seu artigo 208,


estabelece:

Art. 208 - Escarnecer de alguém pu-


blicamente, por motivo de crença ou
função religiosa; impedir ou perturbar
cerimônia ou prática de culto religioso;
vilipendiar publicamente ato ou objeto
de culto religioso:
Pena - Detenção de um mês a um
ano, ou multa.
Parágrafo único - Se há emprego de
-.. / •, :
violência, a pena é aumentada de um
-. terço, sem prejuízo correspondente à
violência.

Homenagem a lemanja no bairro de Rio Vermelho. em Salvador (SA). 2015. Embora


ainda sejam alvo de preconceito, as religiões de matriz africana possuem muitos Mesmo no século XXI percebemos
seguidores em todo o Brasil. Em 2 de fevereiro, adeptos de religiões afro-brasileiras
prestam homenagens a lemanjá. rainha das águas. Como sinal de devoçáo, eles que a liberdade religiosa ainda está dis-
oferecem artigos como flores, perfumes, enfeites e bebidas. tante de ser uma realidade para todos.

280 fulo LI
Leia os textos a seguir e faça o que se pede
Eis o que diz um dos principais trechos do texto:
Texto 1
"A palavra Deus é, para mim, nada mais do que
Um dos aspectos mais revolucionários da re-
a expressão e o produto das fraquezas humanas, e a
ligião no mundo moderno é a transformação das
Bíblia uma coleção de lendas honradas, ainda que
religiões mundiais na medida em que foram trans-
primitivas, e que de qualquer maneira são bastan-
portadas ao redor do globo. O próprio significado
te infantis. Nenhuma interpretação, por mais sutil
de "religião mundial" mudou, já que o judaísmo,
que seja, é capaz de (para mim) mudar isso. Essas
hinduísmo, o ioruba e outras religiões identifi-
interpretações cheias de sutilezas são muito varia-
cadas com culturas ou comunidades particulares
das, de acordo com sua natureza, e não têm quase
também se espalharam [..j junto com o movimen-
nada a ver com o texto original. Para mim, a reli-
to de pessoas. E ... ]
gião judaica, assim como todas as outras religiões,
Das primeiras evidências da consciência hu-
é uma encarnação das mais infantis superstições.
mana e da comunicação com forças espirituais,
E o povo judeu, ao qual fico muito feliz de perten-
as pessoas buscaram se localizar como indivíduos
cer e com cuja mentalidade tenho uma profunda
e comunidades no universo. As religiões têm sido
afinidade, não tem nenhuma qualidade diferente,
construídas como maneiras múltiplas de se ter
para mim, do que qualquer outro povo. Até onde
acesso ao poder divino com a intenção de buscar
vai a minha experiência, eles não são melhores do
benefícios para os vivos e conforto para os mortos.
que qualquer outro grupo humano, embora este-
Pregadores e profetas carismáticos atraíram segui-
jam protegidos dos piores cânceres por sua falta de
dores para suas ideias e as instituições se desenvol-
poder. Fora isso, não consigo ver nada de 'escolhi-
veram para promover novas fés. Até mesmo para
do' neles."
os movimentos religiosos no mundo contemporâ-
neo que se focam em uma experiência individual, Anônimo arremata carta de Einstein sobre religião por
US$3 mithôes. FoLha de S.PauLo, São Pauto, 26 out.
como o pentecostalismo, a habilidade de alcançar 2012. Ciência. Disponível em: <http://f5.folha.uot.com.br/
grandes audiências em lugares distantes por meio estranho/li 75652-anonimo-arremata-carta-de-
de comunicação eletrônica expandiu drasticamen- einstein-sobre-religiao-por-us-3-milhoes.shtmt>.
te as comunidades de fiéis e moldou identidades Acesso em: abr. 2016.

coletivas ao longo de fronteiras culturais e nacio- O que significa intolerância religiosa?


nais globais [ ... ]. As religiões inspiraram conflitos e
deram suporte à opressão, mas elas também provi- Relacione intolerância religiosa e liberdade.
denciaram visões poderosas e convincentes da pos-
sibilidade humana. Apesar de a modernidade ter De acordo com os autores do texto 1, qual é
sido associada, no século XX, com a secularização
papel das religiões nas sociedades?
e o presumido declínio da religião, no século XXI
estava claro que a religião era uma potente força
4. De acordo com o texto 2, qual é a visão de
política, social e cultural como nunca havia sido na
Einstein sobre a religião e a segregação
história mundial.
religiosa? Levante hipóteses sobre o porquê
OQUCHER. Candice; WALTON, Linda.
História mundiaL: jornadas do passado ao presente. dessa visão.
PortoAlegre: Penso. 2011. p. 128e 130.
S. Os autores dos dois textos têm a mesma visão
Texto 2
sobre a religião? Explique.
Anônimo arremata carta de Einstein so-
bre religião por US$ 3 milhões Qual é o papel da religião em sua vida?

Um comprador anônimo arrematou E ... ] uma Você já sofreu discriminação religiosa ou dis-
carta do físico Albert Einstein (1879-1955), na qual criminou alguém por esse motivo? Justifique.
gênio alemão de origem judaica ataca a ideia de
Deus, a Bíblia e o próprio judaísmo.

Direito à liberdade: o desafio datoterân:: 281


~o Debate interdisciplinar
O direito à terra: a demarcação de terras indígenas
Ao longo do processo de colonização, mui- Durante esse processo de expansão, muitos
tos indígenas decidiram migrar para o interior do indígenas foram mortos no enfrentamento com
Brasil buscando preservar a vida e a cultura de seu os colonizadores, e outros morreram em decor-
povo. As matas fechadas, pensavam eles, garanti- rência do contato com as doenças trazidas pelos
riam a proteção contra os invasores europeus, ten- europeus, como a gripe, a varíola e o sarampo.
do em vista o desconhecimento dos portugueses Os que conseguiram sobreviver permanecem, até
em se embrenhar pelas florestas, correndo o risco os dias de hoje, lutando pelo respeito à sua terra,
de se perder ou até mesmo de ser atacados por al- cultura e liberdade. A demarcação das terras indí-
gum animal típico da região ou grupo indígena. genas pelo governo federal é uma demonstração
Apesar desse movimento migratório, os co- de que as lutas dos nativos não têm sido em vão.
lonizadores estenderam seu domínio, que de iní- O artigo 231 da Constituição Brasileira de
cio era circunscrito ao litoral, e com o passar dos 1988 aborda e define os padrões para o reconhe-
anos avançaram para o interior do Brasil. cimento das terras indígenas.

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360 720km
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Ri
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Homologadas
mapas2.funai.gov.br/
Regulariradas
portaLmapas/pdf/
terrajndigena.pdf>.
Acesso em: abr. 2016.

-282
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organiza- sobre o assunto, tem competência para fazer um
ção social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os estudo técnico sobre aquela comunidade.
direitos originários sobre as terras que tradicionalmente Esse estudo compreende uma série de eta-
ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fa- pas: ida ao local da possível demarcação, análise
zer respeitar todos os seus bens.
da documentação referente à terra e entrevistas
DisponíveL em: <wwi.pLanalto.gov.bc/cciviiO3/constituicao/cons1i- com os moradores da região (principalmente
tuicao.htm>. Acesso em: abc 2016.
com as lideranças mais antigas). Com base nes-
De acordo com esse artigo, as terras indígenas sas informações, é elaborado um relatório cir-
tradicionalmente ocupadas são aquelas necessá- cunstanciado de identificação e delimitação das
rias à reprodução física e cultural dos nativos e, por terras. Esse relatório é submetido a uma aprecia-
isso, são destinadas à posse e ao usufruto perma- ção da Funai e, se aprovado, é encaminhado por
nente da comunidade indígena, garantindo a seus despacho ao Ministério da Justiça para que o mi-
membros o direito à vida e à diversidade cultural. nistro declare a posse permanente da terra àquela

Cabe à Fundação Nacional do Índio (Funai), comunidade indígena. A partir do momento em

que é uma autarquia vinculada ao Ministério da que a terra é demarcada, ninguém pode invadi-
Justiça, constituir um grupo de trabalho que in- -la (e é competência do governo federal garantir
vestigará se a área reclamada pela comunidade direito dos indígenas a ela), e os nativos não
indígena é mesmo tradicionalmente ocupada por podem ampliar a área demarcada (por exemplo,

ela. Esse grupo de trabalho é sempre coordenado anexando terras que a princípio não constavam

por um antropólogo que, devido à sua bagagem no relatório encaminhado à Funai).

Da chegada dos europeus até o século XX, a paisagem natural brasileira passou por inúmeras
modificações que resultaram na migração de vários povos indígenas para as cidades. No entan-
to, com a política de demarcação de terras indígenas, os nativos e seus descendentes puderam
retornar aos locais de origem de suas etnias, preservando assim suas especificidades culturais.
1.0 gráfico a seguir traz dados dos censos de 1991, 2000 e 2010 sobre o número de indígenas no
Brasil e a localização da residência deles (zona rural ou urbana). Com base na observação dele,
faça o que se pede.

Com o passar dos anos, a quan-


tidade de pessoas consideradas
1.000.000
indígenas vem aumentando ou di-
1991
minuindo? Que motivos têm levado - ] 2000
750.000
a esse fenômeno? 2010

O que os dados da tabela demons- 500.000 •. --.


tram sobre a relação entre popu-
lação indígena urbana e rural no 250000

período de 2000 a 2010?


o
Total Urbana Rural
Que fatores podem justificar a mu-
dança do número de indígenas na Lc5tc AGE asporn:e: em; <bi1ç//1(çenas.ibge.gocl/0rOs-e-teis-2In:$:.

zona rural brasileira? Aímsso eu': abr 2G1 G.

d) Faça uma pesquisa sobre a demarcação de terras indígenas enfocando os conflitos de terra
que envolvem fazendeiros e nativos. Apresente os resultados ao restante da turma em forma
de seminário.

283
Testando seus conhecimentos Responda no caderni

[Enemi Na América inglesa, não houve ne- di as culturas indígenas sobreviventes,


nhum processo sistemático de catequese e de atualmente, vivem de modo similar há
conversão dos índios ao cristianismo, apesar centenas de anos, mantendo costumes
de algumas iniciativas nesse sentido. Bran- de seus ancestrais, como daqueles que
cos e índios confrontaram-se muitas vezes viviam aqui em 1500.
e mantiveram-se separados. Na América e) os povos indígenas permanecem com o
portuguesa, a catequese dos índios começou direito de reivindicarterras e outros direi-
com o próprio processo de colonização, e a tos à condição de índio, mesmo quando
mestiçagem teve dimensões significativas. alteram aspectos no seu modo de viver,
Tanto na América inglesa quanto na portu- por influência da sociedade ocidental.
guesa, as populações indígenas foram muito
3. (Unesp-SP) Sobre o emprego da mão de
sacrificadas. Os índios não tinham defesas
obra escrava no Brasil colonial, é possível
contra as doenças trazidas pelos brancos,
afirmar que
foram derrotados pelas armas de fogo destes
apenas africanos foram escravizados,
últimos e, muitas vezes, escravizados.
No processo de colonização das Américas, as porque a Igreja Católica impedia a es-
cravização dos índios.
populações indígenas da América portuguesa
as chamadas guerras justas" dos por-
ai foram submetidas a um processo de
tugueses contra tribos rebeldes legiti-
doutrinação religiosa que não ocorreu
mavam a escravização de índios.
com os indígenas da América inglesa.
interesses ligados ao tráfico negreiro
b) mantiveram sua cultura tão intacta quan-
controlado pelos holandeses forçavam
to a dos indígenas da América inglesa.
a escravização do africano.
ci passaram pelo processo de mestiça-
os engenhos de açúcar do Nordeste
gem, que ocorreu amplamente com os
brasileiro empregavam exclusivamente
indígenas da América inglesa.
indígenas escravizados.
di diferenciaram-se dos indígenas da
apenas indígenas eram escravizados nas
América inglesa por terem suas terras
áreas em que a pecuária e o extrativismo
devolvidas.
p red o minavam.
e) resistiram, como os indígenas da América
inglesa, às doenças trazidas pelos brancos. 4. (Fuvest-SP) O Brasil ainda não conseguiu
(Ufscar-SP) Há muitas representações er- extinguir o trabalho em condições de es-
rôneas na história sobre as populações in- cravidão, pois ainda existem muitos traba-
dígenas brasileiras. No entanto, é correto lhadores nessa situação. Com relação a tal
reconhecer que modalidade de exploração do ser humano,
todos os índios são iguais, porque pos- analise as afirmações abaixo.
suem a mesma cultura e descendem de 1. As relações entre os trabalhadores e seus
populações que chegaram à América há empregadores marcam-se pela informalidade
40 mil anos. e pelas crescentes dívidas feitas pelos traba-
os índios pertencem gloriosamente ao lhadores nos armazéns dos empregadores,
passado da história brasileira, mas, in- aumentando a dependência financeira para
felizmente, hoje em dia, já foram todos com eles.
a c u It u rad os. II. Geralmente, os trabalhadores são atraí-
ci as comunidades indígenas precisam ser dos de regiões distantes do local de traba-
preservadas porque são representantes lho, com a promessa de bons salários, mas
da infância da humanidade, ou seja, de as situações de trabalho envolvem condi-
um estágio inicial da história. ções insalubres e extenuantes.

— 284
Responda no caderno

II. A persistência do trabalho escravo ou se- nas áreas social, econômica e política pertinentes à
miescravo no Brasil, não obstante a legis- História do Brasil, além de instituir, no calendário
lação que o proibe, explica-se pela intensa escolar, o dia 20 de novembro como data comemo-
competitividade do mercado globalizado. rativa do "Dia da Consciência Negra'

Está correto o que se afirma em l0isponívet em: http:/Awwptanalto.yov.br.


Acesso em: jan. 206. (adaptadol).
1, somente.
ii, somente. A referida lei representa um avanço não só
1 e II, somente. para a educação nacional, mas também para
II e III, somente. a sociedade brasileira, porque

1, II e III. a) legitima o ensino das ciências humanas


nas escolas.
S. (Enem) A lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, in-
bi divulga conhecimentos para a população
clui no currículo dos estabelecimentos de ensino
afro-brasileira.
fundamental e médio, oficiais e particulares, a
obrigatoriedade do ensino sobre História e Cultura c) reforça a concepção etnocêntrica sobre

Afro-Brasileira e determina que o conteúdo pro- a África e sua cultura.

gramático incluirá o estudo da História da África e di garante aos afrodescendentes a igual-


dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura dade no acesso à educação.
negra brasileira e o negro na formação da sociedade e) impulsiona o reconhecimento da plura-
nacional, resgatando a contribuição do povo negro lidade étnico-racial do país.

rpara você ier j f'ira você assistir


Quanto vaLe ou é por quiLo, direção de Sérgio Bian-
Brasil de Todos os Santos, de Rona Ido Vainfas e chi, Brasil, 2005. 95 mm. O filme mostra as diferen-
Juliana Beatriz de Souza. Rio de Janeiro: Jorge ças e semelhanças entre duas épocas distintas,
Zahar Editor, 2002. O livro mostra como as tenta- com destaque para a persistência de grandes con-
tivas de imposição do catolicismo no Período Co- trastes socioeconômicos. Assim, embora a socie-
lonial se relacionaram com as outras crenças no dade seja marcada por frequentes mudanças, o
Brasil, o que propiciou um quadro religioso mar- filme foca na permanência da desigualdade social
cado pelo sincretismo. como um dos maiores problemas do Brasil.
Coisas de índio, de Daniel Munduruku. São Paulo: Vista a minha pele, direção de Joel Zito Araújo. Bra-
CaIlis, 2010. /ndicado para a pesquisa de diferen- sil, 2004, 23 mm. Nessa história, em que os negros
tes culturas indígenas do Brasil, o livro compila re- são a classe dominante e os brancos foram escra-
ferências a diversos aspectos desses povos. Além vizados, Maria, menina branca pobre e estudante
de abordar a história brasileira anterior à coloniza- bolsista em um colégio particular, é hostilizada pe-
ção, a obra destaca as condições de vida, os valo- los colegas por causa de sua cor e posição social.
res e as influências culturais dos povos indígenas.
Nem preto nem branco, muito peLo contrário: cor
e raça na sociabilidade brasileira, de Lilia Moritz
(ira você navar I
Schwarcz. São Paulo: Claro Enigma, 2012. O livro Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade
aborda a questão do racismo no Brasil, das origens Racial. Disponível em: <www.seppir.gov.br>. Acesso
coloniais aos dias de hoje. Por meio de uma inte- em: abr. 2016. A secretaria tem por objetivo formu-
ressante pesquisa em diversas fontes históricas, lar, coordenar e articular políticas para a promo-
a autora mostra que a valorização do branco em çào da igualdade racial, participando de poli'ticas
detrimento do negro é um problema persistente na públicas afirmativas, acompanhando programas
história do país. de cooperação com organismos nacionais e inter-
nacionais e elaborando, executando e avaliando o
Programa Nacional de Ações Afirmativas.

285
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