Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" Campus de São Paulo
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Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" Campus de São Paulo
São Paulo - SP
2022
ALINE SOUZA CORREIA
São Paulo - SP
2022
Ficha catalográfica desenvolvida pelo Serviço de Biblioteca e Documentação do Instituto de Artes da
Unesp. Dados fornecidos pelo autor.
C824e Correia, Aline Souza, 2000-
Enny Parejo: reflexões a respeito de sua prática pedagógica como
educadora musical / Aline Souza Correia. - São Paulo, 2022.
63 f. : il.
CDD 780.7
BANCA EXAMINADORA
.....................................................................................................
Prof. Dra. Monique Traverzim
Orientadora
Instituto de Artes da UNESP e FAMES
.....................................................................................................
Prof. Dra. Graziela Bortz
Instituto de Artes da UNESP
Chiquinha Gonzaga
RESUMO
O tema abordado no presente trabalho de conclusão de curso versa acerca das práticas
pedagógicas desenvolvidas pela educadora musical Enny Parejo em conexão com sua história
de vida. Localizar e atribuir os materiais da educadora abordada demonstrou ser relevante na
medida que se coloca em destaque a abordagem “Iniciação e Sensibilização Musical”, criada
por ela. Visa conhecer e estudar as práticas pedagógicas criadas por Enny Parejo para a
formação de educadores musicais e identificar as suas contribuições na área da educação
musical na contemporaneidade, evidenciando propostas que vão além das recorrentemente
mencionadas por educadores em cursos de Licenciatura em Música, como também, cursos para
formação continuada e capacitações. Para a abordagem destes assuntos foi utilizada a pesquisa
qualitativa configurando-se como estudo de caso e a elaboração da entrevista episódica. A
referida proposta didático-pedagógica se mostrou ser atual, visto que procura atender a
necessidades da sociedade contemporânea por meio de propostas que contribuem para o
desenvolvimento humano, além dos aspectos referentes à aprendizagem musical. Tendo em
vista a prática pedagógica de Enny Parejo como um novo paradigma filosófico possível para a
Educação Musical, pode-se enxergar em sua prática didática o estímulo da escuta musical
sensível como uma base importante para o desenvolvimento da expressão e aprendizagem
musical. Visando sua proposta de trabalho para formação de educadores, ela prepara o professor
para atuar expressiva e criativamente frente aos alunos e prepara um espaço de trocas e reflexão
sobre a própria prática, para que assim se possa repensar constantemente as necessidades
ligadas aos métodos de ensino e seu desenvolvimento.
Abstract: The theme addressed in this course completion paper is about the pedagogical
practices developed by music educator Enny Parejo in connection with her life story. Locating
and attributing the materials of the educator in question proved to be relevant to the extent
that the "Music Initiation and Sensitization" approach, created by her, is highlighted. The
objective was to get to know and study the pedagogical practices created by Enny Parejo for
the formation of music educators and to identify her contributions in the area of contemporary
music education, evidencing proposals that go beyond those recurrently mentioned by
educators in Music Education courses, as well as courses for continued education and training.
In order to approach these issues, qualitative research was used, being configured as a case
study, as well as the elaboration of an episodic interview. This didactic-pedagogical proposal
proved to be up to date, since it seeks to meet the needs of contemporary society by means of
proposals that contribute to human development, besides the aspects related to musical
learning. By presenting her pedagogical practice as a possible new philosophical paradigm
for Music Education, one can see in her didactic practice the stimulus of sensitive musical
listening as an important basis for the development of musical expression and learning. In her
work proposal for the formation of educators, she aims at preparing the teacher to act
expressively and creatively in front of the students, providing a space for exchange and
reflection on one's own practice, so that one can constantly rethink the needs related to
teaching methods and his or her development.
INTRODUÇÃO …………………………………............……………………………..…….11
OBJETIVO GERAL …………………………………………………………………….…...12
OBJETIVOS ESPECÍFICOS………………………………………………………………....12
METODOLOGIA ……………............………………………………………………...…….13
CAPÍTULO I: Experiências ……………..………………………………………….....…......15
1.1 Experiências na tenra infância …………………………………………………………....16
CAPÍTULO II: Prática Pedagógica ……………………………………………………….….22
2.1 História de vida profissional/formação musical em conexão com o fazer profissional ….22
2.2 O Cerne da Prática Pedagógica …………………………………………………………..25
2.2 Filosofia de Trabalho ……………………………………………...……………………..27
2.4 Aconselhamento do Impreciso para o Preciso …………………………………...………30
2.5 Objetivos da proposta pedagógica “Iniciação e Sensibilização Musical” …………….....32
2.6 Proposta Didática/Atividade ……………………………………………………………..34
CONSIDERAÇÕES FINAIS …………………………..............……………………….……40
REFERÊNCIAS …………..............………………………………………………………….42
APÊNDICES ………………………………..............………………………………….….…44
APÊNDICE I - TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA …………..............………………..…44
APÊNDICE II – MODELO DO TCLE …………………………................……………....... 61
ANEXOS ………………………………………………………................…………….…….63
ANEXO I – TERMO DE RESPONSABILIDADE DE AUTORIA ………................…....…63
11
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS
METODOLOGIA
Uma vez que “os métodos qualitativos consideram a comunicação do pesquisador com
o campo e seus membros como parte explícita da produção de conhecimento” (FLICK, 2004,
p. 22), a abordagem qualitativa foi escolhida com a finalidade de entender fenômenos sociais
envolvidos na concepção e prática pedagógica da educadora Enny Parejo.
Sendo assim, dialogando com a busca de conhecer o assunto a ser tratado com
profundidade, a metodologia escolhida foi o estudo de caso, que assim como descreve Yin
(2005), pode ser utilizado como importante estratégia metodológica para a pesquisa em ciências
humanas para que seja possível aprofundar-se em relação ao fenômeno estudado, favorecendo
uma visão abrangente sobre os acontecimentos da vida real.
A fim de obter um relato direto da educadora musical aqui estudada, a ferramenta de
coleta de dados utilizada foi a entrevista narrativa em conexão com a entrevista semi-
estruturada realizada por videoconferência. Houve a construção de um roteiro prévio de
perguntas a serem feitas, que, foram modificadas ou invertidas no decorrer da entrevista, de
acordo com os assuntos que foram surgindo, se adequando ao momento à maneira descrita por
Manzini:
A entrevista semiestruturada está focalizada em um assunto sobre o qual
confeccionamos um roteiro com perguntas principais, complementadas por
outras questões inerentes às circunstâncias momentâneas à entrevista. O uso
de gravador é comum a este tipo de entrevista. É mais adequada quando
desejamos que as informações coletadas sejam fruto de associações que o
entrevistado faz, emergindo, assim de forma mais livre. (MANZINI, 1991, p.
154)
[...] desse modo dos dois tipos de conhecimento que eles tornam acessíveis. A
entrevista episódica dá espaço para apresentações relacionadas ao contexto na
forma de narrativas, pois elas tratam as experiências em seu contexto original
de forma mais imediata do que outras formas de apresentação. Ao mesmo
tempo, as narrativas podem elucidar mais sobre os processos de construção
das realidades por parte dos entrevistados do que outras abordagens que se
concentram em conceitos e respostas mais abstratos.
Posto isto, é válido ressaltar que o processo de transcrição da entrevista realizada gerou
uma atenção em rever ou reviver aquele contexto em que, como bem descreveu Bailey (2008),
ao representar materiais auditivos e visuais na forma escrita passa-se por um processo
interpretativo, que envolve como primeiro passo para a análise de dados, fazer julgamentos,
podendo assim construir reflexões mais profundas no desenvolvimento da análise.
Por fim, foi realizada a transcrição da entrevista. Os dados obtidos foram utilizados
para se verificar a existência de alguma relação entre a trajetória de vida e carreira de Enny
Parejo, como também serem analisados cuidadosamente e entrecruzados com o uso da revisão
bibliográfica dos livros e materiais acadêmicos produzidos pela educadora entrevistada. Maura
Penna (2017) afirma que ao se levar em consideração todos os dilemas que poderão surgir no
processo de transcrição, será em função dos objetivos de pesquisa que os critérios de transcrição
precisam ser estabelecidos. Tornando possível que no estudo de caso possa se entrecruzar dados
de entrevistas aos de outras fontes com o objetivo de compreender mais a fundo o fenômeno
estudado.
15
CAPÍTULO I:
Experiências
O primeiro contato com a música foi lá na tenra Infância, aos quatro anos...
(Enny Parejo)
A partir da visão que experiência é algo que acontece ao indivíduo, que se dá em “um
encontro ou uma relação com algo que se experimenta” (LARROSA, 2002, p. 25), que o sujeito
da experiência é território de passagem, ou seja, pode ser formado ou transformado por ela
(ibidem), aponto as primeiras experiências, como estudante de música, de Enny Parejo, em
especial, na infância. Nesta fase, os acontecimentos podem deixar marcas que ecoarão para toda
a vida do indivíduo e poderão influenciar na trajetória de um educador que, a partir da base
musical que foi adquirida, sendo positiva ou negativa, pode vir a ser um ponto de reprodução
ou de desprendimento com relação às questões didático-pedagógicas de sua prática profissional.
Essa prática pode viabilizar, através da ressignificação dessas experiências, que práticas
pedagógicas possam ser alteradas ou mantidas em função do bem-estar do aluno e em busca de
não replicar condutas de ensino desfavoráveis para o pleno desenvolvimento dele.
Por esse motivo, optei por trazer, inicialmente, um trecho da entrevista para ser
discutida, que trata do contato inicial de Enny Parejo com a música aos quatros de idade, como
estudante de balé e piano, sendo essas experiências lembradas com pouca ludicidade. A
memória mais marcante, desta educadora, diz respeito ao ato da professora de dança que trazia
todo final de aula uma assadeira de sonhos, estabelecendo um vínculo com os alunos, e que
Enny Parejo usava como motivação para ir às aulas de balé; porém, ambos os estudos traziam
um teor de desenvolvimento técnico “pesado” para uma criança. Nessa idade, o mais apropriado
seria construir outros aspectos de estudo para o aluno, ligados à autopercepção, escuta e
experimentação de forma lúdica, ao invés de exercer um treinamento técnico que se torna
“pesante”, assunto que irei abordar com mais profundidade adiante. Diz-se isso, pois o ensino
mecanicista não atende às necessidades, potencialidades e interesses das crianças na fase da
primeira infância 1, a favor de seu desenvolvimento musical e integra. Fase pela qual Jean Piaget
(2006), caracteriza como pré-operatória, em que a criança expressa o domínio da linguagem, o
pensamento intuitivo e mistura entre realidade e fantasia.
Um estudo realizado pela educadora musical e pesquisadora brasileira Ana Lúcia
Gaborim (2005) sobre iniciação ao piano para crianças aponta que um dos pontos que fomentou
a realização de sua pesquisa foi o momento em que passou a se perceber como professora,
vivenciando um quadro significativo de evasão dos alunos, principalmente crianças. Desistentes
1
A primeira infância é caracterizada como a fase do ano de nascimento até os 6 anos de idade completos pela
criança.
17
do estudo antes mesmo que o trabalho começasse a despontar, a autora cita que passou a ter
consciência de que estava praticamente repetindo os procedimentos empregados por seus
professores. A partir dessa reflexão, ela buscou alternativas para melhor esclarecer a natureza
do problema e suas implicações, a fim de solucioná-lo ou reduzi-lo. Indo em busca também de
materiais didáticos adequados a essa fase inicial de aprendizado de piano, a professora reagiu
às experiências iniciais com o ensino do instrumento de modo semelhante à Enny Parejo.
As experiências relatadas por ambas as educadoras supracitadas corroboram a ideia de
que o ensino mecanicista, ou seja, aquele que desconsidera a prática e a percepção da criança
de seus próprios movimentos e de seu corpo, se torna “pesante” para a criança, uma vez que
não atende às características dessa faixa etária. Inês Rocha (apud GABORIM) diz que a escola
antiga introduzia elementos básicos de notação musical e na sequência a leitura no instrumento
sem “preocupação com fatores psicológicos e técnicos” (p. 65).
Em aspectos de como seria possível aplicar métodos técnicos de piano nessa fase de
desenvolvimento de coordenação motora e aspectos cognitivos da criança, Ermelinda Paz
(2000, apud GABORIM, 2005, p. 65) afirma que há de se considerar alguns aspectos da
pedagogia musical:
Apontando um aspecto básico de que a maioria das crianças começa a escolher por usar
a mão direita ou esquerda para as atividades manuais e ainda está em fase de assimilação ao
que elas têm como percepção de mundo, irei discutir nos próximos parágrafos alguns dos
impactos e consequências destes acontecimentos.
aturdimento imenso e de sair da aula com aquela sensação de que eu tinha estado na
frente de uma montanha marrom, eu saía aturdida com a minha visão, aturdida
mesmo. (Enny Parejo)
Sendo assim, acredito que se for definida uma boa base ou que se houver reflexão a
respeito dos aspectos positivos e negativos que possam ocorrer nos primeiros passos, as
mudanças necessárias poderão se dar de forma progressiva e consciente em busca de melhorias.
Considerando que constantemente somos expostos a padrões de ensino que nos perpassam de
forma prejudicial, ligados diretamente ao processo de descoberta e assimilação do fazer musical
e sua construção gradativa para o ato de ensinar. Paulo Freire (2003), educador e filósofo
brasileiro, diz que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua
produção ou sua construção, pensamento que se conecta adequadamente ao relato de Enny
Parejo ao se deparar, aos dezenove anos de idade, com as primeiras tentativas de dar aula de
piano que não foram bem sucedidas, por inicialmente serem propostas de ensino mecanicistas
19
em relação ao aluno, sendo possivelmente, neste momento, o ato de mera reprodução da prática
de seus professores.
propostas de ensino inadequadas aos alunos. Leda Maffioletti (2017, p. 133) traz reflexões
importantes acerca deste assunto:
Através disso, é possível trazer uma relação importante entre refletir sobre sua própria
experiência como aprendiz, identificando os aspectos positivos e negativos, a fim de corroborar
o nosso papel como educadores com a intenção de quebrar padrões que se aproximem de um
ensino não eficiente na aprendizagem do aluno. Cabe aqui ressaltar que a década de 1960, citada
por Maffioletti, constatado pela educadora musical Rosangela Lambert no blog Terra da Música
em a História da Educação Musical Brasileira, compunha-se o seguinte cenário de mudanças
na educação musical, em que os educadores musicais Liddy Chiaffarelli Mignone, Sá Pereira,
Gazy de Sá, Maria de Lourdes Junqueira Gonçalves, Cacilda Borges Barbosa, Carmen Maria
Mettig Rocha, entre outros, introduziram os métodos ativos de educação musical em escolas
especializadas no ensino de música, principalmente nas grandes cidades, como São Paulo, Rio
de Janeiro e Salvador, sendo os métodos ativos uma abordagem de ensino pensada a partir de
metodologias adequadas para os alunos, fortalecendo a relação entre professor, aluno e
conteúdo por vias criativas de se estabelecer esses métodos de ensino, conjuntamente em
conexão com as necessidades do aluno.
Ainda pensando nessas especificidades do trabalho apurado na formação de professores,
principalmente na educação musical infantil e em não sobrecarregar tecnicamente a criança,
Monique Nogueira (2011) afirma que o objetivo primordial da educação musical na infância é
formar bons ouvintes, bons apreciadores de música.
Dialogando também com a educadora Teca Alencar (2021), que constata que se deva
levar em conta, em relação à criança, aspectos relacionados à escuta e sua ideia de música,
dando prioridade ao seu potencial de criação, provocando transformações nos moldes
tradicionais de formação musical predominante. A partir disso, pode-se enxergar novamente a
importância do cuidado em estabelecer uma didática coerente para a educação infantil.
Entretanto, essa linha de ensino que Enny Parejo passou a fomentar desde o início de
suas percepções pedagógicas para não replicar os aspectos negativos que sofreu logo no início
de seus estudos ainda quando criança, são buscas que estimulam propostas de ensino que têm
se demonstrado efetivas em conexão com as vivências pessoais, acadêmicas e profissionais que
me deparei até os dias de hoje. Em discussão com professores e colegas da universidade, passei
a perceber que em diversos momentos, os paradigmas de práticas musicais ligados ao
tecnicismo exacerbado ainda se mostram presentes cotidianamente, prática esta que temos a
possibilidade de desconstruir em meio à trajetória profissional como educadores musicais.
22
CAPÍTULO II:
Prática Pedagógica
2
O livro referenciado Iniciação e Sensibilização Musical está em formato ebook, constando apenas a posição das
páginas no aplicativo Kindle de leitura.
23
Enny Parejo relata ter sido de grande importância os anos em que foi aluna de Hans-
Joachim Koellreutter3, pois conseguiu desenvolver aspectos importantes imersivos à escuta,
assunto que irei me aprofundar ao longo deste capítulo, pois influenciou fortemente a sua prática
pedagógica. Em uma época em que era difícil ter acesso à internet ou a computadores pessoais,
ela pôde estar conectada ao acervo musical de Koellreutter, que continha desde a discoteca de
música ocidental até a de música Indiana e do Japão, lugares em que esse educador viveu. No
trabalho O humano como objetivo da educação musical: o pensamento pedagógico-musical de
Hans Joachim Koellreutter escrito por Teca Alencar de Brito (2019, p. 5), há a seguinte
sentença transcrita por ela, pela qual Koellreutter havia citado em aula:
A melhor hora para apresentar um conceito, ou ensinar algo novo, é aquela em que o
aluno quer saber. O professor deve estar sempre atento e preparado para perceber e
atender às necessidades de seus alunos. Não é preciso ensinar nada que o aluno pode
encontrar nos livros. É preciso aproveitar o tempo para fazer música, para
improvisar, experimentar, discutir e debater. O mais importante é – sempre - o debate;
nesse sentido, os problemas que surgem no decorrer do trabalho são mais importantes
do que as soluções. (KOELLREUTTER, 1982, apud BRITO, p. 5)
Para além desses fatores, algo que me despertou a atenção foi a descrição com relação
ao que ele representava como educador, algo que dialoga também com a representação de
educadoras como a Enny Parejo na sua trajetória, trazendo constantemente mudanças para o
ensino e para futuros professores que sabiam se adequar às necessidades momentâneas de suas
épocas. Em seu livro, De tramas e fios, a educadora musical e pesquisadora brasileira Marisa
Fonterrada (2008) expressa que a ideia de que o valor da música e da educação musical sofrem
modificações a cada período histórico mobiliza a necessidade de refazer o percurso do
pensamento em diferentes épocas em busca dessas transformações.
3
Hans-Joachim Koellreutter (1915 - 2005) foi um compositor, professor e musicólogo de origem alemã que se
mudou para o Brasil em 1937.
24
Sendo assim, pode-se perceber que a expansão de mundo e de visão com relação aos
métodos de ensino estão em movimento e mudança de acordo com aquilo que há em termos de
necessidades, levando o conhecimento em suas construções e desconstruções que se adequam
com o passar do tempo. Ao conhecer as vivências mencionadas, compreendo que as
experiências de vida e aprendizagens que Parejo obteve ao longo de seus estudos iniciais,
perpetuaram-se em suas práticas futuras, assumindo então o lugar de construção e produção de
conhecimento como educadora, e a partir de suas práticas pedagógicas em conexão com as
necessidades dos alunos.
25
— Aline Souza: Você considera ter desenvolvido uma prática pedagógica própria? Se sim,
como a definiria?
— Enny Parejo: A essência foi a minha própria crítica da minha formação, como eu contei
pra você, uma formação de conservatório…
Com a resposta, Enny Parejo assume que a essência de sua prática pedagógica está em
sua reflexão crítica a respeito da própria formação musical e nota-se como suas experiências
foram formadoras e transformadoras no que diz respeito à sua constituição como educadora
musical.
Para dar continuidade a este capítulo, que será, portanto, a principal seção deste trabalho,
levarei ainda em consideração os apontamentos feitos no Capítulo I sobre a história de vida de
Enny Parejo, em reflexo ao fazer pedagógico que construiu ao longo de sua carreira até os dias
atuais. A educadora estudou piano no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde
constatou que havia uma metodologia de ensino muito tradicional, pouco criativa e
reprodutivista, em função da técnica do repertório consagrado. Ainda relata que após ter
passado pela experiência de não conseguir tocar Parabéns a você em um aniversário, que seria
algo mais simples do que o repertório técnico de piano que tocava, questionou-se a respeito de
seu processo de formação.
— Era proibido tocar de ouvido, era proibido tocar música popular e uma coisa que
acontecia no conservatório é que as referências musicais eram poucas, na verdade os
professores queriam que a gente tocasse Liszt, Chopin, as coisas mais difíceis do
repertório, mas eles não incentivavam a ida a concertos, por exemplo, e não
incentivavam ‘compre o disco de fulano de tal, escute o pianista tal’. Então, era um
ensino musicalmente no escuro, a gente perseguia um ideal, mas ele não era
claramente ilustrado, assim, apontando os exemplos. Não tinha por exemplo um
aparelho de som no conservatório inteiro para você ouvir música. Era uma
aprendizagem de música sem música. (Enny Parejo)
26
Percebendo essa enorme deficiência que constituía sua trajetória de formação, nos anos
seguintes, Parejo passou a ter aulas com o bailarino Rolf Gelewski4 que tinha grande interesse
pela escuta musical. Na Universidade Federal da Bahia, ele se deparou com certas dificuldades
em relação aos bailarinos que só sabiam dançar o repertório clássico tradicional. Vendo isto,
passou a propor atividades que não se baseassem em um pulso ou ritmo métrico. Foi, então,
nesse contexto que Gelewski criou o método Estruturas Sonoras, que se conecta também com
a audioanálise que Koellreutter utilizava, métodos pelos quais Enny passou a desenvolver,
tendo esta base com ambos. O método de audioanálise está totalmente conectado ao ato da
escuta imersiva, em que perceber e sentir o material sonoro traz conexões importantes para o
fazer musical e artístico, fazendo com que, a partir da escuta e suas percepções, surja a prática.
Sob suas experiências em ter contato com ambos os educadores, que tinham bases
semelhantes e relacionadas à ferramenta de audioanálise, Enny Parejo descreve a sensação do
que era estar em meio a esse desenvolvimento do trabalho da escuta imersiva nas aulas de
Koellreutter e Gelewski:
— A gente sempre ouvia a obra que íamos estudar e partíamos das percepções
intuitivas, do comentário intuitivo e em cima disso ele ia trazendo toda a estrutura
musical, e depois, num processo, assim, muito encantador, e entrando no detalhe da
estrutura musical, você saía flutuando da aula dele e o Rolf Gelewski, a mesma
questão (…) Então essas experiências entre os anos de 1979 e 1983 foram me
alimentando, foram me encantando e eu fui percebendo as minhas falhas e eu comecei
incluindo decididamente a escuta musical em tudo que eu fazia, se eu ia dar uma aula
4
Rolf Gelewski (1930 - 1988) foi um dançarino e coreógrafo de origem alemã que se naturalizou brasileiro.
Fundou a CASA Sri Aurobindo e foi diretor da Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia.
27
Através dessa perspectiva de Enny Parejo acerca das experiências que a alimentaram,
retomo o conceito de que a experiência é um saber, tendo tais experiências se tornado cada vez
mais raras. Corroborando a ideia de avanço da pobreza do ato de experienciar, Larrosa (2002)
expressa que, se a experiência é o que nos ocorre, sendo o sujeito da experiência um território
de passagem, a experiência é uma paixão, pois só se pode captá-la a partir de uma lógica da
paixão, através da reflexão do sujeito sobre si mesmo enquanto sujeito passional. E a palavra
paixão pode referir-se a várias coisas que, no caso de Parejo, acredito ser o ato de ensinar.
Para expressar sua filosofia de trabalho, a pesquisadora Enny Parejo escreveu o livro
Estorinhas para ouvir (2007), que traz sua gênese como formadora e educadora da escuta
musical no desenvolvimento de atividades que abordam o trabalho com alunos a partir da tenra
infância. Escreveu Iniciação e Sensibilização Musical (2018) que considera ser o livro mais
importante de sua trajetória, que também se conecta com as características da escuta musical
sensível, parte do cerne de seu trabalho, pelas quais, considera ter aberto todas as perspectivas
possíveis para que a escuta acontecesse em suas aulas.
A gênese dos princípios de ISM se deu inicialmente em 1987, ao chegar em Málaga na
Espanha, onde elaborou a oficina MUSICALIZAR- El niño y la vivencia musical. A oficina, na
época, não ocorreu, possivelmente por falta adequada de divulgação, mas o ato de ter pensado
em colocar em prática os processos de transformação da escuta em expressão, movimento e
improvisação musical, gerou frutos para o seu trabalho. O segundo momento marcante para
fruição deste trabalho se deu no último ano de trabalho na Espanha em 1991, onde ministrou
um curso para um grupo de professores de diversas áreas artísticas interessados em lecionar
música.
28
Pode-se constatar que a semente norteadora para o que se diz respeito à prática
pedagógica de Enny Parejo se trata da escuta imersiva, que gera essa prática e afirma que, onde
quer que a escuta aparente ser passiva, pode-se constatar que ela não é, pois possui aspectos
geradores de pura atividade interna na mente, e até mesmo no corpo físico6, através da música.
5
Foi utilizado um livro eletrônico que não possui numeração de página, mas sim a posição no documento digital.
Como não se tem normas da ABNT para o uso de materiais eletrônicos, foi colocada a posição no lugar o número
de páginas.
6
Como referência para aprofundamento deste assunto apresentado na neurociência, sugere-se o livro O Erro de
Descartes de Antônio Damásio.
29
— (...) se tem um corpo ele se move, pra ele se mover, você usa a sua imaginação e
você está ouvindo música, então partindo desse princípio eu posso dar aula numa ilha
deserta até porque a música pode ser feita pela própria pessoa que está em movimento.
(Enny Parejo)
Logo, percebi que obtive de forma orgânica a emissão vocal que procurava, pois meu corpo
reagiu de forma espontânea sem um uso de pensamento excessivo que por muitas vezes, no
meu ato de experienciar, trouxeram-me algumas tensões ligadas a um pensamento
extremamente técnico na aprendizagem do meu instrumento de estudo performático, que é a
voz cantada.
Koellreutter (2019 apud BRITO, p. 3), dizia: “Meu método é não ter método. O método
fecha, limita, impõe... e é preciso abrir, transcender, transgredir, ir além...". Sendo assim, pode-
se enxergar novamente a necessidade de repensar o ensino técnico tradicional e conservatorial
em busca da liberdade concebida no fazer artístico e de aprendizagem ao aluno.
Na formação de professores:
Na Educação Musical:
Quadro 1: Objetivos da metodologia de Iniciação e Sensibilização Musical descritos por Enny Parejo
(PAREJO, 2018, posição 1468-1479)
No Guia para o (a) educador (a) do Projeto Guri - Suplemento Fundamentos da Música
(2017), Enny Parejo traz materiais para corroborar com a instância de ensino desenvolvida no
Projeto Guri administrado pela Amigos do Guri. Mantido pela Secretaria da Cultura do Estado
de São Paulo, esse Projeto é considerado o maior programa sociocultural brasileiro e oferece,
nos períodos de contraturno escolar, cursos de iniciação musical, luteria, canto coral
infantojuvenil, instrumentos de cordas dedilhadas, cordas friccionadas, sopros, teclados,
percussão e outros cursos, todos voltados para crianças e adolescentes entre 6 e 18 anos de
idade. Mais de 49 mil alunos são atendidos por ano, em quase 400 polos de ensino, distribuídos
por todo o estado de São Paulo. Cerca de 280 polos localizados no interior e litoral, e mais de
60 polos da Fundação CASA7, são administrados pela Amigos do Guri, enquanto o controle
dos polos da capital paulista e Grande São Paulo fica por conta de outra organização social.
(PAREJO, 2017)
Iniciei meus estudos musicais aos 12 anos de idade no referido programa social e
acredito ser um importante parâmetro para discorrer sobre a proposta de Enny Parejo, visando
ser colocada em prática nas aulas das turmas que abrangem o período dos 6 aos 18 anos de
idade, contemplando a infância e a fase da adolescência.
O Suplemento de Fundamentos da Música é composto por três projetos pedagógicos:
PROJETO I – Para conhecer o som e criar
PROJETO II – Conhecer e praticar a linguagem musical
PROJETO III – Lendo e escrevendo música!
— Gosto muito dos materiais que eu escrevi para o Projeto Guri porque eles trazem
um percurso possível para o ensino, bem de acordo com o que eu acredito agora. É
claro que eu tive que me adaptar à filosofia do projeto, mas foi uma possibilidade de
falar das coisas, bem como eu acredito nesse material também, o melhor é que ele fica
disponível, qualquer pessoa pode acessar. (Enny Parejo)
7
A sigla CASA significa Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente, fundação criada pelo Governo
do Estado de São Paulo e vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania.
35
com o intuito de desenvolver o ensino de forma criativa e com maior âmbito de contemplação
e envolvimento artístico. (PAREJO, 2017, p. 3). A sigla corresponde aos seguintes parâmetros
a serem desenvolvidos:
C – Composição (Composition)
L – Literatura (Literature studies)
A – Apreciação (Audition)
S – Aquisição de habilidades (Skill acquisitions)
P – Performance (Performance)
Para apontar estes aspectos que se relacionam com as práticas didáticas de Enny Parejo,
discorro aqui alguns parâmetros de atividade que surgem no Suplemento referente a prática de
Workshop e algumas instruções que atendem sugestões de como utilizar as atividades
propostas, descritas por ela.
1. Faça com que os (as) alunos (as) comecem a trabalhar logo. Muita fala por parte do (a)
educador (a) ao princípio pode acabar com o entusiasmo.
2. Uma vez que os grupos estejam nos respectivos lugares de trabalho e que tenham
começado, visite cada um deles rapidamente para certificar-se de que sabem o que devem
fazer e que têm os recursos que necessitam.
3. Depois de uns minutos, pare a atividade e junte todos os grupos. Peça que informem o que
produziram até o momento. Não é ainda a hora de abrir o comentário para todos (as), mas sim
para as considerações do (a) educador (a) para que percebam como poderiam desenvolver as
ideias com mais proveito.
4. Peça aos grupos que voltem aos seus lugares e continuem as respectivas composições. Na
fase seguinte, passe mais tempo com alguns deles. A chave é fazer perguntas adequadas e,
sempre que seja possível, sobre a estrutura: Como começa a música? Como poderia terminar?
Conseguem pensar em como fazer essa ideia (técnica ou desenvolvimento) se transformar
numa característica muito especial dessa peça? (PAYNTER, 1999, p. 28. Tradução desta
autora.)
Quadro 2 - Desenvolvimento de Workshop para os alunos descrito no Guia para o (a) educador (a) do Projeto
Guri – Suplemento Fundamentos da Música Volume 1 (PAREJO, 2017)
Coloco outra atividade, que se relaciona com a proposta exposta no Quadro 4, do livro
Estorinhas para ouvir (2007, p. 12-13) escrito por Enny Parejo, pois percebo nele uma estreita
relação com a escuta musical sensível. A diferença observada nas atividades do livro se refere
a um caráter mais lúdico, ao conduzir as crianças à escuta por meio da contação de histórias.
Nele, Parejo diz ser um livro bem diferente de estórias e músicas, justificando utilizar “estória”,
pois antigamente, ao lembrar da sua infância, falava-se de contos de fadas e utilizava-se
“história” para se referir aos fatos ocorridos na cidade, ou no país, ou no mundo. Propondo que
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além de estórias e músicas, esse livro sugere que se faça muitas outras atividades como:
desenhos, poesias, esculturas... E assim, como base de repertório para a escuta, apresentar
músicas clássicas para a imersão das crianças neste repertório, podendo assim colaborar de
forma coerente para o interesse e imersão da criança nas atividades desenvolvidas.
Estória da Estrelinha
“Era uma vez um garotinho que adorava a noite porque o céu ficava cheio de estrelinhas
brilhantes que cintilavam assim...
O que ele mais queria era poder pegar uma delas e guardá-la dentro de uma caixinha para
poder ver sua luz também durante o dia.
Mas... o céu era muito alto, muito longe... e o menino não tinha uma nave espacial que o
levasse... Por isso, um dia, estava triste à janela e disse à sua mãe:
- Mamãe, estou triste, não posso pegar uma estrela do céu e guardá-la nesta caixinha para ver
sua luz também durante o dia... A mãe então respondeu:
- Filho, você não pode pegar uma estrela do céu, mas pode ouvir sua voz e ficar bem
quietinho, fechar os olhos e prestar atenção, ouça...
O menino então se deitou, fechou os olhos, ficou bem tranquilo e... ouviu a voz da
estrelinha...”
Música sugerida:
Antonio Ribeiro – VIII Miniaturas – “Valsa Triste” – Faixa 2
Para criar:
Como se sentiu ouvindo essa música?
Que imagens vieram à sua mente?
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Para encerrar este eixo, retomo aqui a reflexão acerca do desenvolvimento de ensino
coerente com a aprendizagem da criança que discorri em alguns momentos ao longo do
trabalho, podendo associá-la às propostas didáticas e atividades de Enny Parejo como fontes
que alimentam esta corrente pedagógica ligada às necessidades do aluno e sua expansão,
aspecto importante para fomentação e quebra de paradigmas do ensino não eficiente ao aluno.
Pode-se perceber nestas e outras atividades propostas, um caminho para uma boa base de
ensino, considerando as temáticas trazidas até aqui.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
● através do ato de entrevistar a educadora aqui estudada, foi possível compreender sua
trajetória de vida em conexão com suas práticas pedagógicas desenvolvidas;
● em busca de novas metodologias de ensino musical na contemporaneidade, foi possível
identificar o método ISM (Iniciação e Sensibilização Musical) como um novo
paradigma para a educação musical em conexão com as mudanças necessárias a serem
feitas na atualidade.
Novas formas de pensamento para um ensino musical não mecanicista apontam para a
construção de ensino e aprendizagem mais eficientes para suprir as necessidades dos alunos,
principalmente para a educação musical infantil, na qual vimos, através dos relatos de Enny
Parejo em diálogo com outros autores:
Pode-se enxergar que a história de vida de Enny Parejo está sempre presente em conexão
com o seu fazer profissional. Considerando as vivências pessoais e profissionais na
configuração das concepções e práticas em educação, foi possível compreender, através de seu
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próprio relato que a falta da escuta musical na sua formação universitária e conservatorial serviu
como trampolim para que essa prática se efetivasse como o cerne de seu trabalho.
Abordando a escuta musical sensível ligada à expressão musical e ao movimento
criativo em sua construção, foi possível observar a escuta musical como ato que afeta o ser
humano de diversas maneiras e aspectos. Sob sua percepção de mundo e seu contato com
educadores que fomentaram a escuta musical em sua trajetória, pôde-se perceber que
Koellreutter e Gelewski tiveram grande importância em sua aprendizagem quando foi aluna
deles.
A sua atuação nos projetos para a formação de professores na Espanha foram de suma
importância para o desenvolvimento de sua prática pedagógica e para a criação de Oficinas que
continuam a se perpetuar no Atelier Musical Enny Parejo.
Dentre suas obras escritas, foi possível constatar que o livro Iniciação e Sensibilização
Musical (2018) é sua obra lapidar. O livro Estorinhas para ouvir (2007) ressalta a sua
importância em desenvolver o trabalho da educação musical desde a tenra infância com
atividades adequadas. Em conexão com as práticas pedagógicas desenvolvidas por Enny Parejo
assim como os materiais que escreveu para o Projeto Guri, que trouxe um percurso possível
para o ensino de acordo com o que acredita como filosofia de trabalho.
Entretanto, as reflexões levantadas acerca das práticas pedagógicas de Enny Parejo
como mulher educadora refletem um importante trabalho referencial para a formação de
educadores musicais, trazendo a expansão do aluno como um todo para uma base de ensino
mais sensível em conexão com suas reais necessidades.
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REFERÊNCIAS
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______. Guia para o (a) educador (a) do Projeto Guri – Suplemento Fundamentos da Música
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PAULA, Eunice de; CAMPOS, Joana. História de vida: relação entre as vivências pessoais e
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YIN, Robert K. Estudos de caso: planejamento e métodos. 3ª ed. Porto Alegre, RS: Bookman,
2005.
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APÊNDICES
Aline: 1. Como foi o seu primeiro contato com a música e como você se descobriu como
educadora?
Enny Parejo: O primeiro contato com a música foi lá na tenra Infância, aos quatro anos. Eu
morava na Mooca e tinha uma escolinha de dança, e, eu me lembro que a minha mãe me
colocou; e uma professora de piano e ela também me colocou. As duas experiências eram
pesadas, assim tecnicamente pesadas, e eu não me lembro disso com nenhuma ludicidade, sabe?
Eu me lembro de um esforço acima do que eu podia no balé, mas como os tempos eram
outros, todo fim de aula a professora de dança fazia chegar uma assadeira de sonhos. Deliciosos!
Então a minha motivação pra fazer aula de balé era comer os sonhos (e é verdade isso!). E o
piano, eu não me lembro de nada que eu tenha tocado, de nada que soou, eu me lembro assim:
de um aturdimento imenso e de sair da aula com aquela sensação de [pausa] (peraí, é que entrou
uma interferência).
Eu saía da aula com aquela sensação de que eu tinha estado na frente de uma montanha
marrom, eu saía aturdida com a minha visão, aturdida mesmo. Então, foram essas experiências,
mas acho que de alguma forma isso correspondia ao que eu queria, porque dois anos depois
(estava morando na Barra Funda já, e isso que eu te contei foi no bairro da Mooca) e eu cheguei
pra minha mãe e falei “mãe, sabe quando você está com vontade de ir no banheiro e quer muito
fazer xixi e não pode? Eu queria estudar piano” e aí tinha uma escolinha na esquina de casa que
era o recanto de arte com a professora Elza Yone Passerini e ali eu fui muito feliz, comecei com
piano, depois fiz também balé, fiz órgão, fiz violão e aquilo me satisfez plenamente. Foi assim
que tudo começou.
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Enny Parejo: Eu fui me descobrindo sempre com interesses didáticos, interesses de ensino em
qualquer coisa que eu fazia. Tentei dar aula de piano aos dezenove anos, mas eu já tinha pelo
menos quatorze, quinze anos de contato com estudo de música, mas não era bem-sucedido
porque era muito tecnicista o que eu fazia, muito mecanicista, e a interface com o aluno era
insuficiente, não tinha escuta do aluno, sabe? Era bancário, bem na acepção de Paulo Freire. Eu
queria depositar o meu conhecimento no aluno de piano. Mas aí quando isso começou a não
dar certo eu já comecei a inventar o meu primeiro método de piano. Eu comecei a criar umas
liçõezinhas que no meu entender traziam melhor o aluno. Coisas de independência de dedos,
pequenas coisas assim e, de fato, eu fui conseguindo me aproximar mais daqueles dois alunos
que eu tinha, mas como já não tinha sido um bom começo isso também não foi pra frente.
Depois eu tive alguns alunos de treinamento auditivo que é uma área que eu gosto muito
e eu tinha um, em especial, com muitos problemas e eu sempre gostei dessa pesquisa de
entender por que será que ele não ouve? Por que será que quando ele ouve um som ele canta
um harmônico desse som? Essas coisas sempre me instigaram desde muito cedo, né? Mas eu
não caía de cabeça na educação musical porque acho que meu pai me fazia desconfiar um
pouco, meu pai era espanhol de Andaluzia e nunca me proibiu de fazer nada, mas ele contava
umas histórias e ele dizia que na terra dele quando alguém estava muito na pior e sem dinheiro
e muito sem perspectivas na vida dizia assim "estou músico", então, o primeiro trabalho que eu
tive foi um concurso que eu prestei no BANESPA que naquele tempo, dos anos setenta, era um
grande emprego, mas eu torrava todo o meu salário estudando música e correndo atrás de
música. Então eu tive esse começo.
Agora, o que foi decisivo pra eu me tornar formadora de professores foi a experiência
que eu tive na Espanha. Eu fui pra Espanha com vinte e seis anos, eu já tinha uma formação
musical de peso, vamos dizer assim, eu tinha conservatório completo, faculdade de música
completa, tinha estudado um grande repertório de piano, tinha conhecido Koellreutter e
estudado uns três anos com ele, então, eu tive uma grande experiência e na Europa, o solo era
muito fértil porque tinha um grande interesse, primeiro por eu ser brasileira e eles associam o
Brasil e música, né? E porque eu cheguei na Espanha num momento muito importante em que
eles estavam se preparando pra entrar pro mercado comum europeu, e eu pude trabalhar lá, de
improviso, em um projeto enorme e nacional de formação de professores porque eu tive a sorte
de conhecer uma das supervisoras de ensino que se encantou com as minhas ideias, com o que
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eu falei sobre Koellreutter, com a liberdade da música no Brasil e eu comecei assim. Foi esse
meu trampolim, né?
Aline: 2. Em algum momento você encontrou dificuldades por ser mulher neste processo?
Enny Parejo: Não. Não que eu tenha conscientizado. Eu sempre fui muito ousada, muito fora
da casinha, então se alguém tentou fazer isso comigo não foi bem sucedido e provavelmente
terminou em alguma confusão. Eu nunca fui de ir pra casa chorando porque não me deixaram
fazer alguma coisa. Eu até tive alguns eventos pitorescos, assim de me envolver com a polícia
e tudo quando pessoas se interpunham no meu caminho, sabe? Então eu não vivenciei isso, que
eu tenha percebido, que era pelo fato de eu ser mulher eu não percebi.
Aline: 3. Você considera ter desenvolvido uma prática pedagógica própria? Se sim, como
a definiria? Qual a essência de Iniciação e Sensibilização Musical?
Enny Parejo: A essência foi a minha própria crítica da minha formação, como eu contei pra
você, uma formação de conservatório, eu estudei no Conservatório Dramático e Musical de São
Paulo que ainda era muito tradicional, mas que vivia de um passado glorioso do Mário de
Andrade, do Mignone, mas era um ensino muito pouco criativo, muito reprodutivista, muito em
função da técnica do grande repertório, opressor para muitos alunos, era proibido tocar de
ouvido, era proibido tocar música popular e uma coisa que acontecia no conservatório é que as
referências musicais eram poucas, na verdade os professores queriam que a gente tocasse Liszt,
Chopin, as coisas mais difíceis do repertório, mas eles não incentivavam a ida a concertos, por
exemplo, e não incentivavam “compre o disco de fulano de tal, escute o pianista tal”. Então, era
um ensino musicalmente no escuro, a gente perseguia um ideal, mas ele não era claramente
ilustrado assim apontando os exemplos.
Não tinha por exemplo um aparelho de som no conservatório inteiro para você ouvir
música. Era uma aprendizagem de música sem música. Então, depois de uma experiência
traumática de não conseguir em um aniversário tocar parabéns a você no belo piano que tinha
lá na casa, porque não sabia o que fazer com a minha mão esquerda, e eu já ia fazer vinte anos,
eu falei “não, não é possível, isso não é possível!” e uma série de fatores confluíram.
Primeiro eu me vi com essa enorme deficiência musical e nos anos que se seguiram eu
conheci o trabalho do Rolf Gelewski que era bailarino e que tinha grande interesse pela escuta
musical, e, no mesmo ano, o Koellreutter que foi algo de revolucionário na minha vida. O
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Koellreutter começava sempre pela audioanálise. A gente sempre ouvia a obra que íamos
estudar e partíamos das percepções intuitivas, do comentário intuitivo e em cima disso ele ia
trazendo toda a estrutura musical e depois num processo assim muito encantador, e entrando no
detalhe da estrutura musical, você saía flutuando da aula dele e o Rolf Gelewski, a mesma
questão, ele encontrou sérias dificuldades na Universidade Federal da Bahia com os bailarinos
que só sabiam dançar o repertório clássico tradicional e ele queria que eles pudessem dançar
coisas que não se baseassem num pulso, num ritmo métrico, então Rolf criou o método
Estruturas Sonoras, que também era um método de audioanálise, então essas experiências entre
os anos de 1979 e 1983 foram me alimentando, foram me encantando e eu fui percebendo as
minhas falhas e eu comecei incluindo decididamente a escuta musical em tudo que eu fazia, se
eu ia dar uma aula de piano começava pela escuta, se eu ia fazer musicalização infantil, tinha
que começar pela escuta, então, foi por isso que eu desenvolvi assim sem intenção muitas
atividades de abertura de aula corporais, yoga, respiração, porque eu queria que os alunos
ficassem imersos numa atmosfera sonora, mas eles tinham que estar fazendo alguma coisa,
então eu comecei a trabalhar yoga, articulações funcionais, alongamento, não pelo próprio valor
desse trabalho corporal ou mental, mas pelo meu interesse na escuta musical.
Então a grande impulsão pro que eu comecei fazer, que eu vinha denominar anos depois
de Iniciação e Sensibilização Musical foi o meu interesse pela escuta e abri todas as
perspectivas possíveis pra que ela acontecesse nas minhas aulas, foi mais ou menos isso. Agora
lá na Espanha eu encontrei um ambiente ultra mecanicista de formação, então quando eu
apliquei essas ideias em curso de formação de professores, a escuta musical se transformou em
expressão corporal, vocal e eu fui percebendo como a escuta era alimentadora para um músico
poder se expressar musicalmente, acho que foi assim.
Aline: Então você pensa nesse contexto de uma prática pedagógica imersiva na escuta,
né?
Enny Parejo: A escuta gerando essa prática porque a escuta, ela é aparentemente passiva, ela
não é passiva, já que o que acontece no ser humano que escuta música é pura atividade interna
na mente, na psiquê, e até mesmo, no corpo físico, a música mexe com tudo isso, mas as pessoas
não veem quem ouve música fazendo concretamente alguma coisa, então essa escuta precisa
encontrar o seu caminho para expressão. E o primeiro tipo de expressão que eu desenvolvi na
minha prática foi a expressão pelo movimento criativo, depois a voz foi entrando e os
instrumentos nessa ordem do que é mais intrínseco ao ser humano, à pessoa, se tem um corpo
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ele se move, pra ele se mover, você usa a sua imaginação e você está ouvindo música, então
partindo desse princípio eu posso dar aula numa ilha deserta até porque a música pode ser feita
pela própria pessoa que tá em movimento.
Aline: 4 - Como foi sua relação com os cursos que fez na Europa? Como foi o processo de
volta da Europa para o Brasil e o que viu de necessidade para a formação dos Educadores
aqui? Você via que era necessário ter algumas adaptações pro ensino?
Enny Parejo: Bom, em princípio era fácil, né? Porque essas histórias minhas europeias… eu
fui pra Europa em 87. Então era muito fácil para um brasileiro, aquele momento na Europa, até
por causa de todo o estigma que cerca o brasileiro. “Brasileiro é musical. A música brasileira é
isso, é aquilo”. Então, eu sempre ganhava competições em currículo pra dar aula em escolas
por ser brasileira e eu tive oportunidades de atuar num ambiente que era muito fechado, muito
forte o mecanicismo e a opressão do aluno. Era muito forte! Então, de certa forma era libertador
pros alunos estudarem comigo. Era lúdico. Era uma experiência muito diferente porque eu era
de outra cultura e porque eu trazia uma forma de trabalhar em que eles vivenciavam a própria
expressão, a liberdade. A minha escuta dos alunos era muito maior do que a que eles tinham
com os professores lá, então isso foi um diferencial importante.
Inclusive, eu também morei na França e tive muitos alunos de piano adultos numa
associação de bairro, uma associação cultural de bairro. Então, os adultos chegavam com
vergonha dizendo: “eu sou velho pra estudar piano” (pessoas de vinte e oito, trinta anos), “eu
sou muito velha, e agora o que eu faço?” então antes tinha esse trabalho de reabilitação da
pessoa, “não, você pode estudar piano, qualquer um pode estudar piano” e eu ia convencendo
e abrindo ludicamente, humanamente, de uma forma agradável, fortalecendo a autoestima, a
autoconfiança antes de falar do piano e de estudar piano. Então, isso era um diferencial muito
importante, a relação humana que se estabeleceu entre eu e os alunos, isso foi sempre assim.
Depois quando eu comecei com o curso de formação de professor de música, eles se
divertiam demais, porque agora não é novidade nenhuma você usar movimento para ensinar
música, mas eu te garanto que era há trinta anos atrás, quem fazia isso era Dalcroze, mas
Dalcroze tinha entrado muito pouco no Brasil ou não tinha entrado. Então, era uma coisa
bastante revolucionária a minha prática, posso dizer sem modéstia. E aconteceram coisas
incríveis na Espanha por causa disso, porque as pessoas se sentiam bem, se desbloqueavam, se
expressavam, né? E ao voltar pro Brasil, aquele mecanicismo que eu tinha sentido na minha
formação, ele diminuiu muito em relação ao mecanicismo que eu vi na Espanha, porque aqui
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no Brasil você pode ter uma prática mecanicista, reprodutivista, tecnicista, mas você fala de
igual pra igual com as pessoas. Então a gente tinha esse paradigma conservatorial, tradicional,
mas até pelas próprias características da nossa cultura, o professor, ele nunca consegue ser tão
autoritário e dominar tanto as intenções do aluno quanto eu vi acontecer na Espanha.
Mas então aquela experiência de desbloqueio expressivo, de libertação das pessoas que
eu tinha podido experimentar na Espanha, aqui foi se ampliando, se ampliando, se ampliando e
eu nem me divulguei, o boca a boca me divulgou e eu fui dando curso, dando curso, dando
curso e isso foi crescendo, até que eu cheguei a dar um curso no SESC Vila Mariana, que não
fazia cursos de longa duração, mas decidiu fazer o meu com três meses, e vieram quarenta e
cinco professores de educação infantil e música e ali começou o meu ateliê porque quando esse
curso no SESC acabou, as pessoas não quiseram parar. E aí por um tempo eu fiquei procurando
“pra onde que eu levo essas pessoas, o que eu faço?” Fiquei olhando lugares pra eu alugar, era
tudo complicado, caro, até que uma grande amiga falou "por que você não faz aqui na sua
casa?”.
Eu morava num apartamento antigo lá na Barão de Limeira em São Paulo e levei essas
pessoas do SESC pra minha casa e foi assim que começou o ateliê e durante pelo menos uns
quinze anos eu tive um diferencial muito importante com essa questão da escuta que se
transforma em movimento e que se transforma em improvisação, poucas pessoas faziam isso.
Depois começou a crescer vários movimentos e Dalcroze chegou mais forte no Brasil, mas o
começo tinha um pioneirismo grande, uma novidade grande no que eu podia oferecer, né? Que
foi isso aliás que fidelizou pessoas interessantíssimas como a Monique Traverzim.
Enny Parejo: Eu acho que educação musical, primeiramente, é educação, é uma forma de
educação, ou seja, de transformação do ser humano, mas essa transformação se dá por meio de
propostas musicais. Eu procuro não me esquecer disso porque entra muito nessa formação que
visa o ser humano integral, questão dos valores, a questão da relação humana, a questão do
diálogo aberto com o aluno, então facilmente você pode se confundir e se transformar numa
espécie de professor de sociologia, de valores, de religião, do que for e eu procuro não me
esquecer de que eu sou professora de música e fui procurando desde o início como desenvolver
esse tipo de atitudes humanas por meio da música.
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Enny Parejo: Com certeza, é certo que existem mais homens no foco do que mulheres, mas
também é certo que as mulheres que fizeram coisas interessantes não se consolidam com
facilidade no espaço e isso deve ser mesmo machismo. Aqui por exemplo na América Latina,
a Violeta Gainza que já é uma pessoa que ficou idosa, que tem um trabalho fantástico, ela vai
entrando com dificuldade nos programas. Deveria estar nos programas de educação musical de
todas as faculdades, talvez na UNESP ela esteja porque a Marisa Fonterrada sempre valorizou
demais o trabalho dela, mas sim, eu acho que o trabalho das educadoras deve ter sido ofuscado.
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Veja o caso de Orff, né? A gente tem uma devoção por Orff, mas quem realmente se
empenhou na divulgação de Orff foi a Gunild Keetman, se não fosse ela, Orff não estava
preocupado com isso, ele quis fazer o programa de rádio, mas era ela que punha a mão na massa,
né? Que levava isso concretamente à sala de aula. Então isso pode ter acontecido em muitas
outras situações. E, certamente, no Brasil atual deve acontecer porque talvez a gente tenha, aqui
no Brasil, mais educadoras em evidência do que educadores homens, e esse movimento - é a
segunda ou terceira vez que alguém faz um trabalho sobre o meu trabalho - ele é bem importante
porque junto com esse movimento geral da sociedade de valorização das mulheres, assim como
de todas as minorias, as mulheres consolidam seu espaço aqui também como formadoras, como
educadoras, como compositoras e trabalhos como os seus são muito importantes pra que isso
se solidifique. Veja, a Teca é uma educadora com um papel crucial da nossa cultura musical de
educação musical. É um papel muito importante, né? Então sim mulheres, avante mulheres!
Enny Parejo: Eu acho que o Koellreutter… primeiro a gente tem que voltar nesses quarenta
anos atrás. E o que era o mundo? É difícil pra você imaginar um mundo que não existia internet
e não existiam celulares e muito menos computadores pessoais, eu tive o meu primeiro
computador pessoal em noventa e cinco, mas as pessoas começaram a ter computadores
pessoais no Brasil no início dos anos noventa. Aliás, quando eu estava na Europa, em noventa
e um, a minha ex-cunhada teve o primeiro computador pessoal e eu poderia ter tido logo que
cheguei no Brasil em noventa e dois, mas eu tinha tantos mistérios quanto a isso que não tive.
Então esse era o mundo, se você queria um disco de música contemporânea, você não
achava, no vinil não existia, pra comprar o primeiro disco que eu tive de Stravinsky, a Sagração
da Primavera, foi um professor que trouxe quando ele foi pra Europa. Então esse era o mundo.
E de repente você chegava na casa do Koellreutter, você tinha ali toda a música ocidental que
se fez nesse mundo, de todas as épocas, inclusive do presente, e você tinha toda a discoteca dele
da música Indiana, do Japão, lugares em que ele viveu. Então, era como entrar numa outra
dimensão, você entrar na casa do Koellreutter tanto em São Paulo no apartamento dele, quanto
no Rio, na casa que ele tinha na Urca que você tinha o acesso à informação, o acesso precioso
à informação.
E aí, o Koellreutter, ele é era um polemista. O Koellreutter não era alguém que aceitava
o mundo do jeito que ele era, ele transformava as coisas, ele incomodava. Ele já chegou no
Brasil incomodando, fazendo acordar aquele mundo adormecido, aquele mundo que deixava
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entrar com muita dificuldade as linguagens novas, ele introduziu essas linguagens no Brasil.
Então ele buscava o novo. O Koellreutter, ele podia fazer a coisa tradicional, ele ensinava
harmonia com o Hindemith, um livro tradicional, mas o que ele obtinha desse Hindemith era
pura inovação, você não harmonizava um exercício do Hindemith e acabou, não, ele fazia você
mexer naquilo como se fosse um arranjo, como se fosse uma composição. Então era um
alimento muito forte.
Agora, a experiência do Koellreutter era ampla demais, completa demais, tanto no que
ele tinha como formação de ter estudado na terra dele, depois no conservatório de Genebra, ele
tocou com esses músicos que a gente ficava admirando. Você falava de um músico, falava do
Satie, “Ah, sim, Satie, toquei uma vez com ele”. Aí você falava do Hindemith “Ah, sim,
Hindemith, estive com ele não sei onde” Então ele tinha vivido a música. Imagine o significado
disso, né? A importância disso. E quando ele começava a falar, era a fonte de sabedoria, era
encantador mesmo e você saia flutuando da casa do Koellreutter, onde tinha todo aquele
conhecimento que não estava em outro lugar, estava dentro da cabeça dele e dentro dos
materiais que ele tinha, livros, vinis, era fantástico, mas ninguém fez essa volta completa porque
o Koellreutter era um filósofo da música, ele era compositor, ele era educador, ele era um
polemista, ele era um criador.
Acho que nenhuma pessoa discípula de Koellreutter fez essa volta completa para
substituir ou pra continuar Koellreutter, a gente foi continuando por partes. O Carlos Kater é
importantíssimo para continuar Koellreutter filosoficamente, a Teca levou o que ele faz pra sala
de aula, escreveu os modelos de improvisação dele com a ajuda dele, eu também levei pra sala
de aula as ideias de Koellreutter. Então, cada um, eu acho que cada um pegou assim e fez crescer
uma parte, uma vertente, desse grande mestre que reunia em si várias vertentes. Era um tipo de
conhecimento assim do homem renascentista, todos os conhecimentos numa pessoa só.
A nossa época é fragmentária, é muito difícil ser como Koellreutter, ele podia te falar
de filosofia, de sociologia, de antropologia, de história da música, de física quântica, da teoria
da relatividade, ele podia te falar de todos esses assuntos e isso realmente foi bombástico. Foi
difícil eu perceber quando fui fazer o mestrado coisas que eram descobertas minhas e coisas
que eram a presença do Koellreutter em mim, mas eu só ganhei com isso porque é um mestre,
foi um mestre! E o mestre, ele tá acima do professor, eu acho; porque o mestre você não apenas
estuda, você se transforma pelas atitudes da vida.
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Enny Parejo: Naquele momento, no mestrado, eu tive que fazer o levantamento dos pontos de
mutação da minha vida. Então eu fui percebendo várias coisas importantes: a minha primeira
professora que abriu perspectivas para eu interagir com outras artes, que era uma pessoa muito
inclusiva, aberta. Depois o Rolf Gelewski, o próprio Koellreutter, e eu acho que a influência ela
frutifica de uma tal maneira que fica difícil mesmo saber depois, mas o que o Koellreutter trouxe
de determinante, primeiro, foi essa questão do novo, de você ter que abrir espaço pras coisas
novas, e que mesmo dentro da tradição você pode inovar, quando você usa a tradição você pode
inovar em cima de uma canção tradicional da infância com procedimentos novos, com
perspectivas novas, que você vai olhar pra aquela canção e se ela for harmonizada com clusters?
Como é que fica? Então, tudo isso são possibilidades que estavam presentes no pensamento do
Koellreutter, nos modelos de improvisação do Koellreutter, em toda a filosofia que ele deixou.
O que mais me marcou, é que eu consegui encontrar caminhos para introduzir esse novo
e algo que fosse além da música clássica e romântica que eu tinha estudado na minha formação
e que ultrapassasse, que fosse além de Debussy e Schoenberg, que entrasse para música dos
ruídos, que depois entrasse pra paisagem sonora como sugere o Schafer (Murray Schafer).
Todas essas possibilidades pra mim se abriram quando eu conheci o Koellreutter e o que ele
pensava porque a gente é formado de uma forma muito reducionista e que te leva a acreditar
que a música são aqueles trezentos anos de barroco, classicismo e romantismo. Nem a música
brasileira consegue entrar nesse campo fechado. Atualmente, eu tenho um discurso importante
em cima da necessidade de valorizar a música brasileira, a gente conhece pouquíssima música
brasileira erudita, pouquíssima música brasileira tradicional, nosso olhar está sempre lá fora.
Então, esse amor que o Koellreutter ensinou a ter pelo novo e pelo questionamento do que está
estabelecido, acho que foi a coisa mais importante pra todo o meu trabalho. Isso foi muito
importante! Não fazer como eu sempre fiz. “Como é que eu posso olhar de um jeito diferente
pra isso?” Imagina, isso é enorme. Só isso que já seria enorme!
Enny Parejo: A coisa mudou bastante, por várias razões, como eu te disse, as ideias que eu
trazia tinham um pioneirismo muito grande, quando eu comecei a usar como referencial teórico
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Enny Parejo: Isso aí é também algo que Koellreutter magistralmente me ensinou. A gente, no
estudo tradicional, parte da precisão, praticamente, e um primeiro elemento rítmico que se
estuda é o pulso. E o pulso já te conduz a uma métrica. Aí você já está no compasso. Na
melódica a mesma coisa, você vai aprender a nota dó, em seguida a escala de dó e vai sair em
busca de o aluno cantar perfeitamente bem afinado e em uníssono essa escala de dó. Quando
você parte do impreciso para o preciso, isso tudo não é importante, o Koellreutter tinha uma
qualificação do ritmo, ritmos não métricos, ritmos métricos e ritmos amétricos. Então o não
métrico era importantíssimo porque é a vida do ritmo. (demonstração visual através do vídeo):
“Eu faço isso com a minha mão (realiza um movimento de ondas com o braço e mão
interligados), isso não tem pulso, mas isso tem ritmo.”
Então, eu não sabia lidar com isso, eu não sabia que isso existia e que esse ritmo que é
vida já pulsava em mim e que poderia pulsar nos meus alunos. “Então se você começa assim e
depois você quer transformar isso num pulso. (novamente realiza o movimento de ondas com
o braço e mão interligados). Você pode. Mas se você começa assim (bate palma com as mãos
em um pulso rítmico preciso) e fica anos nisso e aí você quer que surja algo assim (o movimento
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de ondas), é uma complicação dos diabos”. Então, esse caminho que vai do impreciso para o
preciso é o caminho da expressão plena, da expressão livre, da expressão desbloqueada, e que
te abre pra você fazer o que quiser depois, quer tocar com ritmo, quer tocar na métrica? quer
improvisar com ritmo livre? Você pode porque você começou na liberdade.
A mesma coisa com a melódica. Se eu fizer (a entrevistada entoa uma melodia atonal,
uma série de sons) E se eu fizer … Eu nem era capaz de inventar um negócio assim, eu não era
capaz de inventar nada que escapasse de uma escala diatônica, eu não era nem capaz de lidar
com modos eclesiásticos ou Palestrinianos, tamanha prisão, prisão mesmo, da melódica e da
rítmica na minha formação. Então, o Koellreutter ensinou que você podia fazer coisas que
quisesse com a melódica e o que quisesse com a rítmica, partindo do impreciso pra chegar no
preciso, e tudo foi ficando assim.
Eu fui aplicando isso na minha prática em tudo, indo do impreciso para o preciso, que é
um caminho de evolução, agora do preciso para o impreciso você tem que desconstruir tantas
coisas que é muito difícil, algumas pessoas nunca alcançam se desconstruir quando foram
formatadas nessa precisão para entender por exemplo a beleza de uma melodia que use quartos
de tons, microtons, uma melodia que não está sujeita a um pulso, né? Então isso daí é bárbaro.
E eu adorei um dia estando na casa do Koellreutter, chegou um aluno que tinha ido passar as
férias em Minas Gerais e ele chegou com uma cachacinha mineira e ele tinha feito um rótulo
assim: “Imprecisa e paradoxal, a cachaça do mestre”.
Aline: 10 - Qual a importância da BNCC para a educação? Acredita que ela tem sido
colocada em prática de forma ativa atualmente?
Enny Parejo: O que a BNCC tem que eu gosto muito é um discurso sistêmico. Ela tem um
discurso sistêmico, de formação integral do aluno, que como é o meu discurso também, eu só
posso gostar. Agora, não vejo nenhuma política pública oferecendo possibilidades de um
professor vivenciar e entender o que é isso. “O que é essa formação sistêmica? Quando eu falo
de ser humano integral estou falando de quê? O que significa a música que forma o ser humano
integral na educação infantil? Que procedimentos didáticos trariam pro campo da minha sala
de aula esse ser humano integral?” Eu não vejo essa discussão séria, eu vejo indicações.
A BNCC com a questão de se basear nas competências, desenvolvimento de
competências e habilidades, é uma proposta interessante, mas aí eles elencam uma tal gama de
competências e habilidades, que a pessoa facilmente se perde na fragmentação dessas
competências e habilidades. Tem lá alguns campos, por exemplo, os campos de experiência da
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educação infantil, aquilo é muito interessante pra você vislumbrar como um todo, mas a questão
da escolha dos conteúdos, o que se vai ensinar, essa é uma questão que não é bem discutida.
“O que se vai ensinar depende do campo epistemológico da música? O que se deve
ensinar quando se estuda música?” Essa é uma discussão. “Mas o que você deve ensinar em
música quando eu moro na região norte do Brasil? O que é importante? E se eu morar lá no
extremo sul? O que é importante?” Porque a música tem uma função social, Koellreutter dizia
isso. Então como um documento de diretrizes para esses níveis básicos, é até um documento
interessante nessa perspectiva que abre um discurso sistêmico e que propõe a integração de
linguagens. mas aí a ideologia, porque se a gente não consegue nem fazer trabalhos
interdisciplinares por falta de reunião nas escolas para que os diferentes métodos dialoguem e
a gente possa realizar a interdisciplinaridade, imaginem o mesmo professor voltando a integrar
todas aquelas áreas artísticas, então, aí pra mim isso entrou no campo do “blá blá blá”.
E quando você vai subindo pros anos finais do fundamental, pro ensino médio, aí você
vê mesmo, no meu entender, uma esterilização do pensamento. A arte está ausente desse
documento. É como se um jovem brasileiro só tivesse que pensar em trabalho, em técnica, em
mercado, aí o documento fica zerado no meu entender. E eu acho que enquanto esses
documentos não forem feitos com uma base social sólida de consulta à sociedade, escuta dos
professores, escuta até mesmo do aluno e com tempo pra gestar isso... os documentos são feitos
para atender determinações de fora, de bancos, de investimento, de financiamento do País,
etcetera; “Aí Plim, surge um documento”. Já foi assim de certa forma com os documentos
anteriores PCNs e RCNs, mas naquele momento se você compara com o momento atual, era
muito mais qualitativo, no meu entender, faltou também mais escuta das bases para fazer os
PCNs e RCNs. Mas agora não, agora foi a pura racionalidade técnica, uma equipe sentou, fez
o documento, baixou e eu não acho que é um documento que vai ter vida longa. Sinceramente,
eu não acho.
Enny Parejo: No ensino superior, eu ministrei aulas sempre de treinamento auditivo, percepção
e teoria e depois de metodologias, abordando pedagogos da primeira e da segunda geração e
também sobre currículo e planejamento. Sempre em licenciaturas. Eu não fui professora do
bacharelado, muito embora se eu tivesse sido, acho que teria havido uma contribuição
importante.
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desorientados “Como assim? O que é isso professora? O que você quer dizer com valores?” Eu
falava: “No dicionário genérico, valores são coisas que valem. Então o que eu estou
perguntando é o que é válido pra você na sua prática? O que é mais importante pra você na sua
prática?” Aí começava o processo. E eu avaliava por portfólio, o aluno fazia o portfólio, no
começo, semanalmente e eu dava retornos por escrito via e-mail sobre o portfólio reflexivo do
aluno. Depois começou a não dar mais tempo, ficou quinzenal e depois mensal, mas isso era
um jeito do aluno ficar engajado no processo do que ele estava aprendendo. Era a forma de
avaliação, e eu não fazia provas, cheguei a fazer provas algumas vezes com consulta a tudo que
eles quisessem, podiam consultar a internet, livro, caderno, o que quisessem, e ainda assim eles
ficavam mortos de medo da prova porque pra responder o que eu tava perguntando eles tinham
que pensar. Eles não estavam tão acostumados com isso. Então foi uma experiência muito legal
e eu lamento muito não ser mais agora professora universitária, na Cantareira acabou o curso.
Estou aí disponível caso apareçam outras possibilidades, acho que foi importante pros alunos
desenvolverem uma mentalidade de educador, se tornarem mais dialógicos e entenderem que
eles também aprendem com os alunos deles. Esse foi o meu mote.
Aline: 12 - Dentre suas obras publicadas, qual você considera ser mais importante?
Enny Parejo: Eu passei a vida toda tentando publicar o livro da filosofia de trabalho de
Iniciação e Sensibilização Musical como um livro concreto de papel. O tempo foi passando,
não consegui fazer isso, até porque em Iniciação e Sensibilização, as práticas envolviam muitos
áudios. Há mais de vinte anos atrás eu tentei fazer um processo pela Lei Rouanet de liberação
do uso desses áudios e era complicadíssimo, então eu acabei editando no formato e-book e pra
mim é muito difícil saber qual é o alcance do e-book. E eu ainda gostaria de ter esse livro que
se chama Iniciação e Sensibilização Musical editado em papel. Talvez ainda faça isso. Então
esse é o cerne, é o livro mais importante de tudo que eu já fiz.
Agora, eu acho que o Estorinhas para ouvir é um livro muito importante, justamente
porque ele traz essa minha gênese como formadora e educadora da escuta musical, é ali que
tudo começa, com as criancinhas de dois a quatro anos com a ajuda da mãe ou da professora.
Os maiores vão fazendo isso sozinho. Então esse livro procura traçar esse caminho. Eu não
escrevi muito, gosto muito dos materiais que eu escrevi para o Projeto Guri porque eles trazem
um percurso possível para o ensino, bem de acordo com o que eu acredito agora. É claro que
eu tive que me adaptar à filosofia do projeto, mas foi uma possibilidade de falar das coisas, bem
como eu acredito nesse material também, o melhor é que ele fica disponível, qualquer pessoa
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pode acessar. Mas acho que a obra lapidar mesmo é o Iniciação e Sensibilização Musical que
está no formato e-book.
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Sua participação constará em uma entrevista via plataforma de chamada de vídeo que será
gravada e transcrita posteriormente, a transcrição será enviada para revisão caso você queira
modificar algo.
Sendo sua participação voluntária, você não receberá benefício financeiro. Os gastos
necessários para a sua participação na pesquisa serão assumidos pelos pesquisadores.
Os benefícios que esperamos como estudo são evidenciar o trabalho desenvolvido por
educadoras musicais, dando maior visibilidade e foco para as suas trajetórias e contribuições.
Você tem garantida a possibilidade de não aceitar participar ou de retirar sua permissão a
qualquer momento, sem nenhum tipo de prejuízo pela sua decisão.
Durante todo o período da pesquisa você terá a possibilidade de tirar qualquer dúvida ou pedir
qualquer outro esclarecimento. Para isso, entre em contato com algum dos pesquisadores.
As informações desta pesquisa serão confidenciais e poderão ser divulgadas em eventos ou
publicações.
Autorização
Eu, ________________________________, após a leitura deste documento e ter tido a
oportunidade de conversar com o pesquisador responsável, para esclarecer todas as minhas
dúvidas, estou suficientemente informado, ficando claro para que minha participação é
voluntária e que posso retirar este consentimento a qualquer momento sem penalidades ou perda
de qualquer benefício. Estou ciente também dos objetivos da pesquisa e dos procedimentos aos
quais serei submetido. Diante do exposto e de espontânea vontade, expresso minha
concordância em participar deste estudo e assino este termo em duas vias, uma das quais foi-
me entregue.
Assinatura do voluntário
________________________________
Assinatura da responsável pela pesquisa
________________________________
Local e data: São Paulo, __/__/____
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........................................
Eu,..............A..l.i..n..e...S..o..u..z.a....C..o.r..r..e..i..a ,
..............................
aluno/a do Curso de ..................L..i..c.e..n..c..i.a..t..u..r.a....e..m...M..ú..s..i.c..a ,
que o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) é de minha autoria e atende às normas técnicas
Assinatura/aluno/a