03 Mini Avaliacao Nutricional
03 Mini Avaliacao Nutricional
03 Mini Avaliacao Nutricional
RESUMO
Ana Luiza Gonçalves Soares1
Thiago Durand Mussoi2 Introdução: A desnutrição é frequente em idosos hospitalizados e está relacionada a uma
série de complicações e aumento da mortalidade. Este trabalho teve como objetivo descrever
as prevalências de desnutrição e risco de desnutrição em idosos hospitalizados e relacionar a
desnutrição com fatores da triagem da Mini-Avaliação Nutricional (MAN). Métodos: Estudo
transversal, realizado em um hospital de média complexidade interior do Rio Grande do
Sul. Foram avaliados idosos com 60 anos ou mais, de ambos os sexos. Para classificação
do estado nutricional, foi aplicada a MAN. Medidas antropométricas (peso, altura, circun-
ferência do braço e circunferência da panturrilha) foram medidas ou estimadas. Análise de
variâncias (ANOVA) foi utilizada para avaliar diferenças de médias e a regressão de Poisson
para estimar razões de prevalências. O nível de significância adotado foi de 5%. Resultados:
Foram avaliados 89 idosos, sendo 55% do sexo feminino. Cerca de 40% dos idosos apresentou
risco de desnutrição e 18% estavam desnutridos. Diminuição da ingestão alimentar, perda de
peso e dificuldade de mobilidade apresentaram relação direta com a desnutrição. As médias
de índice de massa corporal, circunferência do braço e da panturrilha foram menores nas
categorias de menor pontuação da MAN. Conclusões: Foram observadas elevadas prevalên-
cias de desnutrição e de risco de desnutrição, indicando necessidade de maior atenção dos
profissionais de saúde ao estado nutricional de idosos hospitalizados. Informações simples
como diminuição da ingestão alimentar e perda de peso podem alertar para a possibilidade
de desnutrição de pacientes idosos.
Unitermos:
Avaliação Nutricional. Idoso. Hospitalização. ABSTRACT
Introduction: Malnutrition is common in hospitalized elderly patients and is related to
many complications and increased mortality. This study aimed to describe the prevalence of
Keywords:
malnutrition and risk of malnutrition in hospitalized elderly and relate malnutrition to scree-
Nutrition Assessment. Aged. Hospitalization. ning factors of the Mini-Nutritional Assessment (MNA). Methods: This cross-sectional study
was conducted from in an average complexity hospital of Rio Grande do Sul. Elderly of both
Endereço para correspondência: sexes, aged 60 or older, were evaluated. To determine nutritional status, MNA was applied.
Ana Luiza Gonçalves Soares Anthropometric measurements (weight, height, arm circumference and calf circumference)
Barão de Santa Tecla, 804, 401A – Pelotas, RS, Brasil. were measured or estimated. Analysis of variance (ANOVA) was used to assess differences
CEP: 96.010-140 in means and Poisson regression to estimate prevalence ratios. The level of significance was
E-mail: nutri.analuiza@hotmail.com set at 5%. Results: 89 elderly patients were evaluated, 55% were female. About 40% of the
elderly were at risk of malnutrition and 18% were malnourished. Food intake decline, weight
loss and difficulty in mobility were directly related to malnutrition. The mean body mass index,
Submissão:
arm circumference and calf were lower in categories with lower scores of MNA. Conclusions:
17 de janeiro de 2014 A high prevalence of malnutrition and risk of malnutrition were observed, indicating the need
for greater attention from health professionals to nutritional status of hospitalized elderly.
Aceito para publicação: Simple information such as food intake decline and weight loss can alert to the possibility of
3 de abril de 2014 malnutrition in elderly patients.
1. Mestre em Epidemiologia – UFPel. Programa de Pós-graduação em Epidemiologia. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
2. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana – UFSM. Centro Universitário Franciscano – UNIFRA, Santa Maria, RS, Brasil.
Os dados foram digitados em planilha no programa pacientes contava com a presença de um cuidador durante
Excel, versão 2007 e analisados no programa Stata, versão a internação, sendo que em aproximadamente metade dos
12.1. As variáveis contínuas foram descritas por meio de casos este era filho(a) ou irmã(o). As principais causas de
média e desvio-padrão e as categóricas por proporções e internação foram as doenças crônicas não transmissíveis
seus respectivos intervalos de confiança de 95%. A análise de (DCNT), entre elas doenças cardiovasculares, doenças
variâncias (ANOVA) foi utilizada para avaliar as diferenças respiratórias e câncer.
de médias e a regressão de Poisson para estimar razões de A média de pontos na triagem, pela MAN, foi de 9,9
prevalências. O nível de significância adotado foi de 5%. pontos (desvio-padrão: 3,4) e 36 pacientes (40,4%) tiveram
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa a avaliação interrompida por apresentarem escore acima
do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA) de Santa de 12 pontos. A média do escore na avaliação total foi de
Maria – RS, protocolo 029.2009.02. Todos os participantes 17,7 pontos (desvio-padrão: 4,8 pontos), variando de 6,5
(ou responsáveis) assinaram Termo de Consentimento Livre a 25 pontos. A Figura 1 apresenta a classificação do estado
e Esclarecido. nutricional de acordo com a MAN. Cerca de 40% dos idosos
apresentavam risco de desnutrição e 18% estavam desnu-
RESULTADOS tridos. O risco de desnutrição foi maior nos idosos do sexo
feminino (51,0%, IC95%: 36,5 – 65,5) do que naqueles do
Foram avaliados 89 idosos, sendo 55% do sexo femi-
sexo masculino (22,5%, IC95%: 9,0 – 36,0), porém, não
nino. A média de idade foi de 73,1 anos (desvio-padrão:
houve diferença na prevalência de desnutrição entre homens
8,8), variando de 60 a 97 anos. A Tabela 1 apresenta as
(22,5%, IC95%: 9,0 – 36,0) e mulheres (14,3%, IC95%:
características demográficas da amostra e referentes à inter-
4,1 – 24,4).
nação hospitalar. A maioria dos idosos estava internada pelo
Sistema Único de Saúde (SUS) e cerca de um quarto deles A Tabela 2 apresenta a frequência das respostas na triagem
tinha algum plano privado de saúde. A grande maioria dos nutricional e a probabilidade de ocorrência de desnutrição
(<17 pontos na MAN), de acordo com estas. Os idosos que
apresentaram redução grave da ingestão tiveram três vezes
mais probabilidade de estarem desnutridos do que aqueles que
Tabela 1 – Descrição da amostra segundo características demográficas e não diminuíram a ingestão alimentar, enquanto os idosos com
referentes à internação hospitalar (n=89).
redução moderada apresentaram duas vezes mais probabili-
Variável N Frequência IC95% dade de desnutrição do que aqueles sem redução da ingestão.
Sexo Os idosos com perda de peso acima de 3 kg e aqueles que
Masculino 40 44,9% 34,4 – 55,5 não souberam informar sobre a perda de peso apresentaram
Feminino 49 55,1% 44,5 – 65,6 risco cerca de três vezes maior de apresentar desnutrição do
Idade que aqueles que não tiveram perda de peso.
60 – 69 anos 38 42,7% 32,2 – 53,2
Os idosos que apresentavam imobilidade ou dificuldade
70 – 79 anos 31 34,8% 24,7 – 44,9
de locomoção também apresentaram risco aproximadamente
≥ 80 anos 20 22,5% 13,6 – 31,3
2,5 vezes superior para desnutrição do que os idosos que
Plano de saúde
tinham mobilidade normal. Os pacientes com demência leve
Não 68 76,4% 67,4 – 85,4
apresentaram cerca de duas vezes maior probabilidade de
Sim 21 23,6% 14,6 – 32,6
Presença de cuidador*
Não 11 14,1% 6,2 – 22,0
Sim 67 85,9% 78,0 – 93,8
Grau de parentesco
Sem parentesco 25 37,3% 25,4 – 49,2
Filho(a) ou irmã(o) 33 49,3% 37,0 – 61,5
Neto(a) ou sobrinho(a) 5 13,4% 5,0 – 21,8
Motivo da internação
Cardiovascular/ neurológica 27 30,3% 20,6 – 40,1
Câncer 9 10,1% 3,7 – 16,5
Gastrointestinal 7 7,9% 2,2 – 13,6
Renal 4 4,5% 0,1 –8,9
Respiratória 20 22,5% 13,6 – 31,3
Outras 22 24,7% 15,6 – 33,8 Figura 1 – Estado nutricional de acordo com a MAN, na amostra total e
* 11 missings estratificado por sexo (n=89).
Tabela 2 – Descrição da triagem nutricional e associação das variáveis com a desnutrição do que aqueles sem problemas psicológicos e
desnutrição (n=89). aqueles idosos com IMC inferior a 19 kg/m2 tiveram risco
2,4 vezes maior de desnutrição do que aqueles com IMC
Variável N Frequência RP (IC95%) igual ou superior a 23 kg/m2.
Diminuição da ingestão alimentar
A média de IMC nos idosos foi de 26,4 kg/m2 (desvio-
Grave 11 12,4% 3,14 (1,42-6,92) padrão: 6,13), da circunferência braquial de 28,0cm (desvio-
Moderada 34 38,2% 2,32 (1,20-4,44) padrão: 5,07) e da circunferência da panturrilha de 33,6cm
(desvio-padrão: 5,08). A maioria dos idosos (77,4%) tinha
Sem diminuição 44 49,4% Referência
o perímetro braquial superior a 22 cm, no entanto, 43,4%
Perda de peso deles apresentava a circunferência da panturrilha inferior a
Superior a 3kg 14 15,7% 3,07 (1,42-6,62) 31 cm. Observa-se menor média de IMC nas categorias de
Não sabe informar 17 19,1% 2,92 (1,39-6,13) menos pontuação da MAN (Tabela 3). As médias de circun-
De 1 a 3 kg 15 16,9% 1,98 (0,85-4,64)
ferências do braço e da panturrilha foram também inferiores
quando os idosos apresentavam risco de desnutrição e ainda
Sem perda de peso 43 48,3% Referência
menores quando os idosos estavam desnutridos, comparadas
Mobilidade aos idosos com estado nutricional normal.
Restrito ao leito ou à cadeira 15 16,9% 2,80 (1,37-5,74)
de rodas
DISCUSSÃO
Deambula mas não é capaz de 26 29,2% 2,31 (1,19-4,45)
sair de casa Este artigo descreveu as prevalências de risco de desnu-
Normal 48 53,9% Referência trição e de desnutrição em idosos hospitalizados e identificou
fatores da triagem da MAN relacionados com a desnutrição.
Estresse psicológico ou doença aguda nos últimos 3 meses
Observa-se que mais da metade dos idosos apresentaram
Sim 33 37,1% 0,52 (0,30-0,89) risco de desnutrição ou desnutrição e fatores como modifi-
Não 56 62,9% Referência cação da ingestão alimentar, perda de peso, dificuldade de
Problemas neuropsicológicos mobilidade e problemas psicológicos estiveram diretamente
relacionados com a desnutrição.
Demência ou depressão graves 3 3,4% 2,63 (0,79-8,81)
As prevalências de risco de desnutrição e de desnutrição
Demência leve 28 31,4% 2,35 (1,32-4,17)
encontradas neste estudo foram elevadas, porém, inferiores
Sem problemas psicológicos 58 65,2% Referência a outros estudos realizados no Brasil e na Espanha, que
Índice de massa corporal também utilizaram a MAN7,14. Estudo brasileiro, realizado
< 19 kg/m2 11 12,4% 2,36 (1,16-4,80) em São Paulo10, encontrou prevalências bem menores de
risco de desnutrição e desnutrição, sendo de 30,3% e 8,3%,
19 - 20,9 kg/m2 10 11,2% 2,12 (0,99-4,55)
respectivamente. Não há consenso na literatura quanto à
21 - 22,9 kg/m2 9 10,1% 1,31 (0,51-3,42) associação do risco nutricional com o sexo7,10,14, porém, nos
≥ 23 kg/m2 59 66,3% Referência trabalhos nos quais foi evidenciada alguma diferença, as
prevalências de risco de desnutrição e de desnutrição também
foram superiores no sexo feminino15,16. Embora se saiba que
alterações fisiológicas do processo de envelhecimento inter-
Tabela 3 – Média de índice de massa corporal (IMC), circunferência do braço
(CB) e circunferência da panturrilha (CP), conforme estado nutricional (n=89). firam no estado nutricional3,17 e que as prevalências de risco
nutricional são elevadas na população idosa, sobretudo nos
Variável Normal Risco de Desnutrido p pacientes hospitalizados6,10,14-16, a desnutrição e as consequ-
Média (IC95%) desnutrição Média ências desta são subestimadas pelos profissionais da saúde.
Média (IC95%)
(IC95%) Alguns fatores da triagem nutricional apresentaram
relação com a pontuação inferior a 17 pontos na MAN.
IMC 29,2 kg/m2 26,6 kg/m2 19,6 kg/m2 <0,001
Aqueles pacientes com redução moderada ou grave da
(27,6 – 30,8) (24,5 – 28,7) (17,8 – 21,4)
ingestão alimentar e com perda de peso superior a 3kg apre-
CB 29,9 cm 28,6 cm 22,1 cm <0,001 sentaram maior risco de desnutrição do que os pacientes sem
(28,9 – 31,0) (26,7 – 30,5) (20,3 – 23,9) modificação da ingestão e sem perda de peso. A redução
da ingestão alimentar esteve relacionada à desnutrição
CP 36,7 cm 33,0 cm 27,6 cm <0,001
(35,4 – 37,9) (31,6 – 34,4) (25,7 – 29,6) em pacientes hospitalizados15 e, em idosos saudáveis, esta
relação foi encontrada com a perda de peso18. Estes fatores
Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): 105-10
108
Mini-avaliação nutricional na determinação do risco nutricional e de desnutrição em idosos hospitalizados
13. Chumlea WC, Roche AF, Steinbaugh ML. Estimating stature from 17. Campos MTFS, Monteiro JBR, Ornelas APRC. Fatores que
knee height for persons 60 to 90 years of age.J AmGeriatr Soc. afetam o consumo alimentar e a nutrição do idoso. Rev Nutr.
1985;33(2):116-20. 2000;13(3):157-65.
14. Albuquerque MFB, Veruska AP, Carvalho NA, Apolinário LF, 18. Ribeiro RS, Rosa MI, Bozzetti MC. Malnutrition and associated
Oliveira CP, Vieira LL, et al. Estado nutricional de idosos hospi- variables in an elderly population of Criciúma, SC. Rev Assoc
talizados por meio da Mini Avaliação Nutricional. Rev Bras Nutr Med Bras. 2011;57(1):56-61.
Clin. 2009;24(3):184-8. 19. Campos SF, Chagas ACP, Costa ABP, França REM, Jansen AK.
15. Azevedo LC, Fenilli M, Neves L, Almeida CB, Farias MB, Fatores associados ao desenvolvimento de úlceras por pressão: o
Breitkopf T, et al. Principais fatores da mini-avaliação nutri- impacto da nutrição. Rev Nutri. 2010;23(5):703-14.
cional associada a alterações nutricionais de idosos hospitali- 20. Cuervo M, Ansorena D, García A, González Martínez MA,
zados. Arq Cat Med. 2007;36(3):7-14. Astiasarán I, Martínez JA. Valoración de la circunferencia de la
16. Reyes JG, Zúñiga AS, Cruz MG. Prevalencia de desnutrición del pantorrilla como indicador de riesgo de desnutrición en personas
adulto mayor al ingreso hospitalario. Nutr Hosp. 2007;22(6):702-9. mayores. Nutr Hosp. 2009;24(1):63-7.
Local de realização do trabalho: Centro Universitário Franciscano (UNIFRA) de Santa Maria. Santa Maria, RS, Brasil.