Sociologia Aplicada A Administração
Sociologia Aplicada A Administração
Sociologia Aplicada A Administração
Sociologia
aplicada a
administração
Sociologia aplicada a
administração
COORDENADORES DE CURSOS
ADMINISTRAÇÃO Antonella Maria das Chagas Sousa
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Fabiana Rodrigues de Almeida Castro
CIÊNCIAS BIOLÓGICAS Maria da Conceição Prado de Oliveira
FILOSOFIA Zoraida Maria Lopes Feitosa
FÍSICA Miguel Arcanjo Costa
LETRAS PORTUGUÊS José Vanderlei Carneiro
LETRAS INGLÊS Lívia Fernanda Nery da Silva
MATEMÁTICA José Ribamar Lopes Batista
PEDAGOGIA Vera Lúcia Costa Oliveira
QUÍMICA Davi da Silva
SISTEMAS DE INFORMAÇÃO Leonardo Ramon Nunes de Sousa
112f.
ISBN: 978-85-7463-673-3
CDD 302.35
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O texto-guia que ora apresentamos à comunidade dos alunos da
disciplina Sociologia aplicada à administração, do curso virtual em administração,
constitui uma análise eclética dos fenômenos sociais que transcorrem no âmbito
das organizações, sejam elas formais ou informais. A Unidade 1 principia-se
por uma sucinta análise das circunstâncias históricas que culminaram com
o aparecimento das ciências sociais em geral, e da sociologia em particular,
dando conta da multiplicidade de seus recortes cognitivos, com destaque para
a sociologia aplicada à administração (ou sociologia das organizações). Esta
última é lastreada pela compreensão das inevitáveis motivações orientadoras
das condutas das pessoas em relação à satisfação de suas necessidades
eminentemente humanas.
O conteúdo da Unidade 2 versa sobre questões complementares ao
conteúdo da Unidade 1, enfatizando, então, que, de modo análogo ao que
transcorre no domínio mais geral da sociedade em que vivemos, também
observamos no contexto interno das organizações os mesmos fatores que
tendem a provocar instabilidades nos fundamentos de coesão e integração dos
componentes humanos que as compõem, assim como as suas condições de
adaptação às vicissitudes de uma sociedade centrada no mercado e exposta a
constantes turbulências.
Na Unidade 3, observaremos que as turbulências acima aludidas
resultam de uma concorrência desenfreada entre as empresas, provocando
incertezas e imprevisibilidades, o que demanda soluções que são vitais à sua
sobrevivência
enquanto subsistema social, por sua vez jungida a um sistema social que
o delimita e o condiciona, além da ampliação da divisão social do trabalho, na
esteira do incremento das práticas econômicas no âmbito do mercado. E neste
último, a busca pelo lucro estimula a proliferação de empresas que passam a
ofertar bens e serviços mais baratos e de maior qualidade. Em função disso, a
sociedade torna-se um conjunto amplo de complexas estruturas organizacionais
que tendem a multiplicar-se por suas arenas constitutivas, além de exibir uma
engenhosa e intrincada dinâmica de funcionamento. É na esteira, pois, dessa
dinâmica de funcionamento, que surgem as condições objetivas indispensáveis
à intervenção do Estado no mercado.
A Unidade 4, por sua vez, procura explicar as condições em que ocorre a
intervenção do Estado no mercado, lançando mão de duas outras instituições –
o governo e a administração pública. Entender como o Estado opera através do
governo e da administração pública deve ser uma tarefa central nos estudos das
ciências administrativas, sobretudo em um mundo cada vez mais marcado pela
globalização dos mercados. Daí a inclusão de uma unidade especificamente
voltada para o tema em apreço.
UNIDADE 1
9 A SOCIOLOGIA E O ADVENTO DA SOCIEDADE MODERNA
UNIDADE 2
33 INDIVÍDUO E SOCIEDADE
3.1 As organizações............................................................................... 59
3.1.1 Estrutura das Organizações..................................................... 61
3.1.2 As Organizações e seu Contexto Socioeconômico................... 66
3.1.3 Mudança nas Estruturas das Organizações............................. 68
3.1.4 Poder e Liderança nas Organizações....................................... 72
3.2 As Empresas enquanto grupos organizados.................................... 75
3.2.1 As Empresas e a Gestão do Conhecimento............................. 78
UNIDADE 3
87 SOCIEDADE, ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO
Resumindo
Esta unidade principia-se pela apresentação sucinta do contexto histórico em que ocorreu o surgimento
da sociologia. Discorre-se sobre os possíveis recortes cognitivos que a Sociologia faz da sociedade, ao
se ocupar do estudo acerca da diversidade das inter-relações sociais no âmbito do processo vital de
satisfação das necessidades humanas, assim como na determinação das causas e efeitos de tal processo
sobre a própria sociedade. Ao atribuir uma esmerada atenção aos desdobramentos das relações sociais
e suas motivações básicas no interior das organizações, essa empreitada passa a se constituir na vocação
intelectual da Sociologia Aplicada à Administração, ou das Organizações.
A SOCIOLOGIA E O ADVENTO
DA SOCIEDADE MODERNA
2º) Os fatos da realidade objetiva devem ser apreciados tendo como ponto
de vista prévio o afastamento das ideias ou juízos de valores preconcebidos
(os idola e as praeanotiones).
12 UNIDADE 1
matemática; a Renascença e a Reforma Protestante. O seu desenlace, por outro
lado, é multifário à medida que o processo concreto de constituição histórico-
estrutural se desenvolve, ainda que de forma desigual, nos diversos setores da
produção material e intelectual humana. O que determina tal desigualdade é
são as possibilidades criadas pelo avanço do conhecimento técnico racional,
conforme necessidade de expansão e acumulação ampliada nos termos da
produção capitalista.
Máquina a vapor
partir dos resíduos tradicionalista da ordem feudal em transição para a nova
utilizada nas minas de ordem socioeconômica que se anuncia – o capitalismo enquanto substrato
carvão no século XVIII. econômico da burguesia.
(www.historianet.com. Mas a referência ao capitalismo – enquanto resultante dos processos
br/conteudo/default.
correlatos de industrialização e urbanização sem precedentes na história
aspx?codigo=30)
da humanidade – não pode prescindir de um outro ingente processo de
transformação histórica, a saber, aquele que se consubstanciou na formação do
Estado moderno. Ocorre que o Estado moderno é um Estado racional, uma vez
que se apoia num direito racional e numa burocracia especializada. Logo, tais
atributos constituem condições indispensáveis à própria existência do sistema
capitalista, entendido este como doutrina e como formação social e econômica,
já que os direitos de propriedades não poderiam ficar a mercê de interpretações
alicerçadas em concepções “mágico-rituais”, e sim em “um direito que se
pudesse calcular como uma máquina” (WEBER, s. d.). Em outras palavras,
direito material e capitalismo são incompatíveis. Daí a afirmação e consolidação
do direito formal na condição de fundamento normativo e fiduciário daquilo que
hoje é chamado nos meios empresariais de marco regulatório14.
14 Conjunto de atos legais instituídos pelo poder público que servem para nortear e disciplinar as
ações das empresas quanto às mais diversas modalidades de exploração mercantil, assim como as
condições e garantias de oferta de bens e serviços e usufruto de rendimentos decorrentes de sua
atividade econômica. “A regulação identifica-se com um conjunto de regras ou ações específicas
impostas pelas agências administrativas que interferem diretamente no mecanismo de alocação
de mercado ou, indiretamente, através da alteração nas decisões das ofertas das firmas e das
demandas dos consumidores” (SPULBER apud GUTIERREZ, 1998, p. 2).
14 UNIDADE 1
1.2. O objeto de estudo da sociologia
16 UNIDADE 1
constituem perspectivas diferentes de análise – ou abordagens sociológicas
– das sociedades humanas que refletem as idiossincrasias pessoais de seus
formuladores e as influências decorrentes de suas filiações às multíplices
escolas de pensamentos sociológicos. Assim sendo, pode-se definir a sociologia
como o estudo científico dos fatos sociais que resultam das relações
que os indivíduos estabelecem entre si com vistas à satisfação de suas
necessidades materiais e espirituais de existência.
O caráter geral dessa definição enfatiza a indisfarçável natureza plural
do homem. Como todo animal inferior, o homem é um ente gregário, pois
não pode sobreviver em um ambiente desprovido de outros seres humanos.
Para a corrente
Significa dizer que a vida do homem é relacional, ou seja, o homem só sabe viver
histórico-crítica, ou
relacionando-se com outros elementos de sua própria espécie. A vida no interior marxista, a realidade
dos agrupamentos sociais pulsa graças às relações que se estabelecem entre última da sociedade
as pessoas na medida em que perseguem os seus interesses utilitaristas – seja humana é o conflito.
para fazer uma boa ou má ação, para si ou contra o outro. E nesse A ilustração acima
referente à Segunda
percurso utilitarista, fator indispensável à sua sobrevivência e
Grande Guerra Mundial
prosperidade, a ação social é a menor unidade de que se compõe – e pré- constitui um exemplo
requisito das relações do homem com outros indivíduos de sua espécie. dessa concepção.
Se o procedimento primeiro para atingir uma longa distância é dar o (www.pt.wikipedia.org/
wiki/segunda_guerra_
primeiro passo, como ensinou o filósofo chinês Lao Tsé (Lao Tsu)17, o primeiro
mundial)
movimento rumo à satisfação das necessidades do ser humano é a ação voltada
para a persecução dos objetivos de salvaguarda de sua existência no mundo. E
essa ação, por definição, somente pode ser uma ação social, visto que sempre
está orientada para os seus semelhantes ou elementos de sua própria espécie.
Daí a importância do sentido visado pelos indivíduos em suas ações intencionais,
pois elas sempre estão relacionadas, direta ou indiretamente, à conduta dos
outros indivíduos.
Por essa razão é que Weber (1991, p. 3), um dos clássicos da sociologia,
a define como “[...] ciência que pretende compreender interpretativamente a
ação social e assim explicá-la causalmente em seu curso e em seus efeitos”.
O consenso, na
Mas no que consiste a ação social? Consiste numa “[...] ação que, quanto a seu
concepção da corrente
sentido visado pelo agente ou os agentes, se refere ao comportamento de positivista-funcionalista,
outros, orientando-se por este em seu curso” (Ibidem). é a realidade última da
Um exemplo dado pelo próprio Max Weber esclarece a questão em sociedade humana.
apreço. Se pelo menos um dos condutores de uma bicicleta, em face de iminência (www.oikos.pt)
de colisão com outro ciclista, tentar evitar tal acidente podemos dizer que ocorreu
uma ação social. No entanto, se ambos não perceberem a iminência de uma tal
17 “Uma viagem de mil léguas inicia-se debaixo dos pés [...]”.
18 UNIDADE 1
eficazes e/ou eficientes; caso contrário tal padrão é condenado pelo desuso,
sendo substituído por outro capaz de produzir melhores resultados.
Para Bouthoul (1980, p. 105, 106; grifo nosso), há um relativo consenso
com relação a uma definição da sociologia quanto a seu objeto de estudo, a
saber:
20 UNIDADE 1
• A sociologia dinâmica se ocupa das transformações sociais e históricas no
decurso dos tempos.
• A sociologia estática, por sua vez, focaliza as ações sociais em um dado
espaço específico de tempo, compreendendo tais ações como inseridas
num sistema social total.
22 UNIDADE 1
“A realidade objetiva das instituições não fica diminuída se o indivíduo
não compreende sua finalidade ou seu mundo de operação. Pode achar
incompreensíveis grandes setores do mundo social, talvez opressivos em sua
opacidade, mas não pode deixar de considerá-los reais. Existindo as instituições
como realidade exterior, o indivíduo não as pode entender por introspecção. Tem
de ‘sair de si’ e apreender o que elas são, assim como tem de apreender o
que diz respeito à natureza. Isto é verdade, mesmo se o mundo social, como
realidade produzida pelos homens é potencialmente compreensível de um modo
que não é possível no caso do mundo natural” (BERGER, 1985, p. 86-89).
Para Berger (1977, p. 194) uma instituição pode ser definida como
“um padrão de controle, ou seja, uma programação da conduta individual
imposta pela sociedade”. Assim sendo, este autor aponta a linguagem como a
primeira instituição com a qual os indivíduos se deparam no curso de sua vida –
de criança a adulto. A linguagem é responsável pela objetivação da realidade,
ou seja, a linguagem faz com que a realidade seja compreendida como algo que
existe fora de nossas consciências, além de servir de meio operacional para que
possamos interpretar e justificar a própria existência de tal realidade. De um
modo geral, nós conhecemos o mundo à proporção que classificamos – através
da linguagem – aquilo que nele existe: árvores, animais, forças da natureza etc.
Saiba Mais
Berger (Ibidem) ensina que as instituições podem ser conhecidas a As cinco características
partir de cinco características fundamentais: fundamentais das
instituições sociais:
24 UNIDADE 1
sobrevivência. A solução desse problema requer o imperativo emergencial de um
ingente e permanente processo de construção do mundo em que vive, de modo a
transformá-lo segundo suas necessidades materiais e espirituais básicas. “Toda
sociedade humana é um empreendimento de construção do mundo” (BERGER,
1985, p. 15).
A construção social do mundo é uma expressão da atividade humana
Saiba Mais
objetivada na história – o homem no mundo. Uma vez produzido e construído Diferentemente dos
pelo ser humano, o mundo do homem constitui uma realidade objetiva dotada animais inferiores, o
de um estatuto de existência que difere de todos os outros produtos da atividade ser humano, graças
à sua faculdade
humana objetivada. E este mesmo mundo exerce sobre o responsável por sua
teleológica, constrói
produção e construção uma influência decisiva que recai diretamente sobre os socialmente o seu
padrões repetidos de comportamento – é o mundo no mundo, registra a sua
Homem. Logo, se produtor (o homem) e produto (o mundo social) são própria história, atribui
mutuamente influenciados, as perspectivas de explicação e compreensão da significados às suas
ações intencionais e tem
sociedade humana só podem ocorrer através da interação dialética entre três
a consciência de sua
momentos (BERGER, 1985, p. 16): própria finitude através
da inexorabilidade da
• Exteriorização - Projeção constante do homem sobre o mundo através morte.
26 UNIDADE 1
Interpretando essa máxima, significar dizer que os atores sociais, ao
realizar suas escolhas intencionais, tendem inexoravelmente a maximizar o
prazer e a minimizar a dor, ou, em outras palavras, “maximizar o saldo líquido
de prazer”. Tais atos de escolha e de decisão são impulsionados pela vontade,
a única faculdade do espírito capaz de tornar realidade o objeto do desejo, uma
vez que se projeta para o futuro, na esteira da concepção temporal linear (a
via recta) (ARENDT, 1993). Assim, a vontade é racionalmente orientada rumo à
minimização da dor, do sacrifício, do esforço, da perda, da carência, enfim, da
miséria; e, simultaneamente, na direção da maximização do prazer, do ócio, da
comodidade, do ganho, da fartura, em suma, da riqueza. Esse dualismo laico
que permeia a ação humana, na contracorrente da ética paternalista cristã,
conduz, pois, por um lado, ao cálculo racional de prazeres e dores, e, por outro,
ao repúdio à indolência, ao capricho, ao instinto, ao hábito, ao costume e às
convenções.
Por ser dependente de condições de vida que só ele mesmo pode
suprir, o homem vê-se constantemente obrigado a assegurar as condições
materiais (subsistência) e espirituais (compreensão de seu ser no mundo) de
que sua existência exige. No decurso desse empreendimento, a ação humana é
comandada pela satisfação das necessidades por suprimentos (um número de
necessidade igual à quantidade dos suprimentos requeridos, pelo menos),
fator este que garante a vida e a segurança da espécie.
A satisfação das necessidades básicas, como vimos, conduz à
multiplicação de outras necessidades. No âmbito desse processo, a ordem de
necessidades criadas pelo homem é regida por critérios norteadores de valores
que oscilam, numa linha de demarcação situada entre dois polos, dos mais
utilitaristas e tangíveis desejos de satisfação de necessidades às mais refinadas
sensações de bem-estar espiritual e às mais sutis percepções de sentido acerca
da vida20. Aqui, a ordem de necessidade em apreço é ordenada de modo a
sinalizar o grau de necessidade que os indivíduos têm por um bem de consumo,
um serviço, uma sensação de bem-estar físico ou não-físico, uma percepção de
contentamento, um sentimento de aceitação comunal, um estado de espírito:
28 UNIDADE 1
relação natural do homem com a natureza e uma relação social entre homens
e mulheres via processos sociais associativos. Desse modo, a produção dos
meios indispensáveis à satisfação das necessidades dos seres humanos
somente pode ser concretizada na medida em que homens e mulheres históricos
se relacionem com outros homens e mulheres históricos. Daí a importância de
se verificar o modo a partir do qual as relações se institucionalizam, ou seja,
Um paradigma se
tornam-se rotineiras, constituindo um paradigma.
mantém na medida em
Dá-se o nome de paradigma, a “uma relação estruturada e invariável, que não é substituído
que tende a se repetir sempre que se busca suprimento para uma por um outro que
necessidade determinada” (GOLIAS, 2006, p. 12). Pode-se, também, definir se expressa por um
novo modo de obter
paradigma (do gr. paradeigma) como um exemplo que serve como modelo.
a satisfação das
Assim, paradigma constitui um modelo de relação baseado numa conduta necessidades via
que obteve, ou não, êxito. Exemplos: paradigma da relação fome/suprimento economia de esforço.
alimentar – deve-se
evitar o consumo de carnes gordas como fator de prevenção a
problemas cardíacos; paradigma saúde/atividade física – exercícios físicos são
fundamentais para o perfeito funcionamento dos neurônios.
O paradigma é funcional à vida dos indivíduos. Quer dizer, o paradigma
contribui com a manutenção da ordem social na medida em que as regras de
convivências sejam respeitadas: o hábito de dar um “bom dia” ou um “muito
obrigado”; o respeito ao semáforo, a prática de boas maneiras, etc. O homem é um animal
O processo ou mecanismo fundamental a partir do qual as necessidades relacional na medida
em que só pode viver
por suprimentos materiais e espirituais são satisfeitas somente podem ser
se relacionando com
viabilizados coletivamente, através das relações que homens e mulheres outros elementos de sua
estabelecem entre si, para além da (básica) reprodução da própria espécie via espécie.
procriação. A sobrevivência do ser humano depende do caráter de sua relação
com outros seres humanos. Mas o que é relação? Em termos sociológicos,
significa a compreensão de que o homem, ao relacionar-se, dirige para o mundo
exterior a sua consciência, que, por sua vez, retorna a ele enquanto suprimento
ou carência de algo.
À medida que suas necessidades são satisfeitas, ou não, o homem
desenvolve, respectivamente, tanto sentimentos de satisfação e saciedade (o
número de necessidades é igual à quantidade de suprimentos requeridos)
como sentimentos de insatisfação ou carência (a quantidade de suprimentos
requeridos é inferior ao número de necessidades).22 Logo, a constante
procura por suprimentos, que o obriga a interagir constantemente com o mundo
30 UNIDADE 1
O conceito de cultura extrapola em muito os limites cognitivos impostos
pelo conceito de tecnologia. Ao lado da ciência em seus vários ramos, da filosofia,
do senso comum, do mito etc., a tecnologia constitui uma das muitas expressões
das assim chamadas obras de civilização. Ela é produto da capacidade humana A cultura expressa a
construção material e
a serviço de suas necessidades por suprimentos materiais e espirituais e de
imaterial da realidade
suas comodidades no trabalho, que, por sua vez, conduzem à ampliação de seu
humana em todos os
sentimento de satisfação. E como qualquer outra produção do gênio humano, a seus aspectos. Nesse
tecnologia, na condição de primeiro ato histórico do homem em prol de sua própria sentido, o homem
perpetuação, constitui uma das manifestações de um dos principais componentes desponta como criador
de si mesmo.
da cultura - as ideias. A cultura é geralmente concebida como a parte da natureza
inteiramente produzida pelo homem, mediante a operacionalização de um sem
número de meios físicos (ferramentas, instrumentos, máquinas) e não físicos
(conhecimentos, habilidades e competências; processos, técnicas, métodos,
estratégias e táticas de ação; dinheiro, tempo e os resultados alcançados). A
forjadura da cultura se inicia na medida em que o homem primitivo é obrigado
a desenvolver certas habilidades físicas e a fabricar instrumentos e ferramentas
(lança, arco e flecha; moinho, colheitadeira e calculadora) que facilitem o alcance O desenvolvimento
de seus objetivos existenciais (a caça, o domínio e a guerra), seja na satisfação de novos meios
de suas necessidades imediatas, seja nos modos de organização e divisão dos de satisfação das
necessidades humanas
produtos do trabalho.
implica na amplitude das
A constante luta pela sobrevivência leva o homem a revolucionar a estruturas de relações
criação de novos instrumentos e novos modos de organização do trabalho. As sociais.
consequências daí decorrentes recaem sobre a própria estrutura de relações
das sociedades em que se verificam tais transformações. Dessa maneira, os
paradigmas vigentes (modelos de relações vigentes) tendem a se modificar na
medida em que se sofisticam os meios necessários ao aumento da satisfação
das necessidades, em particular, e nos padrões – quantitativo e qualitativo – de Saiba Mais
vida, em geral. Em outras palavras, significa dizer que a intensificação do uso Consulte o sítio http://
www.wikipedia.org/.
de tais meios repercute diretamente sobre a estrutura de relações vigentes em
determinado grupo, organização ou sociedade.
Atividades
32 UNIDADE 1
UNIDADE 2
Indivíduo e Sociedade
Resumindo
A unidade que se inicia ponteia de modo bem demarcado os pólos extremos da vida em sociedade
o indivíduo e a coletividade que o abarca. Nela, realiza-se uma superficial incursão nos meandros
teóricos da produção intelectual dos clássicos da Sociologia Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim.
Na seqüência, são didaticamente apresentados os principais conceitos ou categorias analíticas da
Sociologia: socialização, instituição social, papéis sociais, processos sociais, posição social (ou status),
cultura, cultura organizacional etc.. O trajeto aqui empreendido permite a aprendizagem dos conceitos
sociológicos supracitados, entendidos estes como ferramentas analíticas essenciais à compreensão da
estrutura e dinâmica das organizações.
Indivíduo e Sociedade
36 UNIDADE 2
socialização. Logo, por essa razão, ela só pode emergir em uma sociedade em
que as pessoas se comunicam e travam relações e intercâmbios diplomáticos, “Como um self pode
surgir somente em
comerciais, culturais, regulatórios; e celebram e cumprem (ou não) acordos,
uma sociedade onde
convenções e contratos etc. Compõe-se do Eu (conservador) e do Me haja comunicação, da
(progressista), e se alimenta da tensão constante existente entre eles quanto mesma forma a mente
às escolhas e às tomadas de decisão. De todo modo, a personalidade - Self - é só pode emergir em um
pré-condição ao surgimento da Mente. self ou personalidade
dentro da qual esta
A mente, por seu turno, forma-se e desenvolve-se na medida em que
conversação de atitudes
os indivíduos se relacionam com eles mesmos mediante o uso de símbolos ou participação social
significantes compartilhados. Assim, o surgimento da mente não pode prescindir toma lugar. É esta
da existência de uma personalidade e sua capacidade de viabilizar uma conversação, esta
interação simbólica,
comunicação intrapessoal, ou seja, uma comunicação, ou conversa, entre
interposta como uma
nós conosco mesmos. Trata-se do dois-em-um de Sócrates: eu conversando parte integral do
comigo mesmo, ponderando acerca de meus acertos ou erros, ou ambos. Esse ato, que constitui a
constante diálogo do homem com ele mesmo constitui um pré-requisito para mente” (MEAD apud
HAGUETTE, 1990, p.
a vida em sociedade. Ele permite que os significados culturais criados pelos
29).
indivíduos, grupos e sociedades em interação constante sejam aceitos como
parte do arsenal de conhecimentos, crenças e memórias de práticas e condutas
sociais que cada um de nós trás consigo – é o que podemos chamar de nosso
“Não é verdade que são
background.
as regras que criam e
A mente, como produto direto da intercomunicação social, expressa sustentam a vida em
tanto o que nós somos e temos de mais íntimo em nosso interior pessoal quanto grupo, mas, ao contrário,
o que nós permitimos que seja exibido (simulacro, justificado por razões de foro é o processo social de
vida grupal que cria
íntimo ou razões de Estado, por exemplo) no cotidiano do jogo do contato e
e mantém as regras”
relações sociais. A personalidade e a mente, então, constituem os mecanismos
(HAGUETTE, 1990, p.
fisiopsicológicos indispensáveis ao processo de socialização das pessoas 35).
(trataremos do tema mais adiante).
Simplificando a abordagem do interacionismo simbólico no âmbito
de relação indivíduo-sociedade, devemos levar em conta três princípios
elementares que lhe são de alta estima17: a) a ação do homem frente às coisas
ou circunstâncias encontradas e vividas no mundo circundante, em seu aspecto
físico e social, funda-se no sentido que tais coisas evocam em sua mente; b)
o sentido que estas coisas despertam na mente dos indivíduos é produzido
socialmente quando eles entram em relação uns com os outros; c) esses
mesmos sentidos, que são frutos da interação humana, tendem a modificar-
se em função do processo de interpretação suscitado pelas novas situações
compartilhadas pelos indivíduos, em virtude de desenvolverem atividades
17 Essa classificação é reconhecida como de autoria de Herbert Blumer.
38 UNIDADE 2
caráter conciliatório e não coercitivo (institucionalização do consenso) na relação
entre a sociedade e o indivíduo e se enquadram na quarta
opção teórica, qual seja, a de que “indivíduos socializados reproduzem
a sociedade traduzindo o meio social existente dentro do micro-domínio” –
reproducionismo (teoria positivista-funcionalista). O último dos clássicos, Max
Weber, defende uma posição intermediária entre as posições teóricas que
compõe a relação micro-macro – é a meso-análise sociológica.
Evitando-se a polêmica que certamente despertam as posições
As análises sociológicas
diametralmente opostas, ou que se pretendem opostas, sugere-se que o
de Émile Durkheim,
entendimento acerca da relação dinâmica entre o plano da ação cotidiana a exemplo de Karl
das pessoas (o simples ato de comprar um jornal ou pedir uma informação Marx, enfatizam a
qualquer) e o plano mais amplo e ‘distante’ da estrutura social (o fenômeno ideia segundo a qual
“indivíduos socializados
da transnacionalização extraterritorial do Estado na esteira do fenômeno da
reproduzem a sociedade
globalização) – entre os indivíduos e a sociedade, os funcionários e a organização, traduzindo o meio social
as partes e o todo, os elementos e o conjunto –, seja marcada pela convergência existente dentro do
de posições, senão pela garantia de uma certeza epistemológica, pelo menos microdomínio”.
40 UNIDADE 2
deles em sua estrutura de personalidade e que se realiza através dos mecanismos
da interação e identificação com as outras pessoas, ou seja, mediante a imitação
das condutas praticadas por pais, tios, irmãos, vizinhos etc., (grupos primários)
e demais pessoas
com as quais se estabelecem contatos esporádicos, de menor frequência,
(grupos secundários) e que, portanto, provoca um menor impacto de influência
na formação da personalidade dos indivíduos (BERGER e BERGER, 1977).
Para se compreender melhor o significado sociológico do processo, é
SOCIALIZAÇÃO.
necessário fazer referência à noção de pessoa social, condição fundamental
Processo pelo qual ao
à elucidação do processo de socialização. Afinal de contas, a pessoa social longo da vida a pessoa
constitui um indivíduo humano socializado detentor de status e papéis. humana aprende e
Todo ser humano ao nascer é uma pessoal social, mas é no decurso de interioriza os elementos
sua convivência com outras pessoas que ela é socializada, adquirindo assim sua sócio-culturais do seu
meio, integrando-
personalidade verdadeiramente social, em virtude das constantes mudanças e
os na estrutura da
adaptações sofridas ao longo da existência. Tanto a natureza quanto o ambiente sua personalidade
social são elementos externos à pessoa humana que igualmente favorecem a sob a influência de
socialização. Esta pode ser concebida a partir de dois pontos de vista: experiências de agentes
sociais significativos,
adaptando-se assim ao
Objetivamente - Com base na influência exercida pela sociedade ambiente social em que
sobre os indivíduos (imposição de padrões de comportamento social à conduta deve viver (Guy Rocher).
individual);
Subjetivamente - Com base nas respostas ou reações dos indivíduos
em relação à sociedade (aceitação dos padrões de comportamento social).
42 UNIDADE 2
governança administrativa não depende apenas que tais papéis sociais sejam
efetivamente cumpridos conforme critérios razoáveis de produtividade, avaliação
e aceitação social, mas, sobretudo, do grau de sincronia entre eles visando
atingir objetivos programáticos.
44 UNIDADE 2
2.2.2. As Instituições e os Papéis Sociais
46 UNIDADE 2
associado à sua função
no processo produtivo quanto às relações de trabalho e à propriedade).
Enquanto grupo de status, a estratificação social exprime-se a partir do
A empresa constitui um
estilo de vida que as pessoas levam em função do que fazem com seu dinheiro
exemplo de instituição
em termos de consumo (o tratamento dispensado a determinado funcionário na econômica em que o
organização e que se expressa por meio de uma alta remuneração salarial ou desempenho articulado
mesmo de uma generosa participação nos lucros constitui um indicador seguro de papéis visa ao
alcance de objetivos
da alta posição ocupada por tal funcionário na estrutura de prestígio da empresa).
utilitaristas, ou seja, visa
Enquanto estrato de poder, a estratificação social expressa-se a partir
à obtenção do lucro.
do grau de participação nas tomada de decisão estratégica da empresa ou
no núcleo de poder (a decisão de aprovar ou desaprovar a realização de um
investimento, por exemplo, expressa prestígio).
A noção de estrutura de poder evoca a ideia de desigualdade sócio-
As instituições podem
ocupacional, haja vista que a promoção de funcionário por mérito lhe faculta
ser classificadas
a oportunidade de maior capacidade de poder, de realização pessoal, de segundo sua natureza,
aceitação social e de elevada autoestima. Logo, a posição social ou de status estrutura e finalidade.
das pessoas não é, a rigor, determinada pela necessidade que a sociedade
tem de determinadas ocupações profissionais, cuja importância depende da
valorização dada pela sociedade a algumas atividades em detrimento de outras - A classe social dos
ou da avaliação positiva ou negativa que faz da competência de determinados indivíduos é determinada
pela sua função no
profissionais.
processo de produção
Em última instância, o que determina a posição das pessoas na estrutura e pelo seu poder
da sociedade, e mesmo na de uma organização específica, é a sua função no aquisitivo.
processo produtivo no que se refere às relações de trabalho (se é trabalhador ou
- O grupo de status é
empresário capitalista) e à propriedade (se é ou não proprietário dos meios de
definido em função do
produção, isto é, se é ou não dono de fábrica ou empresa).
estilo de vida adotado
Resumindo: As classes sociais são estratificadas em termos da produção pelas pessoas na
e aquisição de bens e serviços; e os grupos de status, em termos do consumo. sociedade.
Em outros termos, a caracterização de uma classe social depende das origens
- O estrato de poder
de nosso dinheiro (fonte do poder aquisitivo); o status ou posição social que
ao qual se vinculam
adquirimos, por sua vez, depende do lugar para onde ele vai (destinação no uso os indivíduos é
de nosso dinheiro). Portanto, quando se evoca o princípio de hierarquia, traz-se determinado pelo grau
à discussão o tema da posição social das pessoas na sociedade ou qualquer de participação deles
nas tomadas de decisão
em estrutura organizacional. Numa palavra: a estratificação da sociedade em
de uma organização.
classes se processa conforme a participação dos indivíduos no processo de
produção (seja como trabalhador, seja empresário), de partilha e de distribuição
da riqueza no mundo; e quanto a sua disponibilidade ou não de propriedade.
48 UNIDADE 2
exaustão como tais papéis asseguram a provisão de suprimentos materiais e
O homem é um ser
espirituais, ao mesmo tempo em que garante a manutenção de padrões mínimos relacional, uma vez que
de interação entre os indivíduos na representação de respectivos papéis. No só revela sua verdadeira
decurso desse processo de sobrevivência, os papéis sociais se organizam natureza relacionando-
se com os outros.
em rede, produzindo crescentes teias de relacionamentos cuja motivação
finalista condiciona a sua orientação. Essas teias de relacionamento em ação
que assumem certas orientações, sejam elas positivas, sejam negativas, são
identificadas como processo sociais positivos ou conjuntivos (associativos) e/ou
como processos sociais negativos ou disjuntivos (dissociativos).
Os seres humanos são gregários por excelência. Para eles, ser gregário
é a condição de possibilidade de sua própria existência, é a consumação
de seu modo particular de ser, que se manifesta através de relações sociais
interdependentes.
Os seres humanos, ao contrário dos animais inferiores, são obrigados a
construir um mundo compatível com suas limitações e exigências existenciais,
pois não existe um mundo humano dado de uma vez por todas e rigorosamente
apropriado aos que nele vivem.
Enquanto os animais inferiores ao nascerem encontram um mundo
que lhe é apropriado, com os seres humanos isso não acontece, já que não
Judeus rezando na
existe um mundo genuinamente humano, a menos que seja construído por
sinagoga no Yom Kippur,
humanos. A construção desse mundo genuinamente humano levada a efeito por de Maurycy Gottlieb,
humanos implica na definição de papéis sociais, de padrões de relacionamento Viena, 1878. Tel Aviv
e de processos de agregação ou desagregação. Museum of Art.
Os grupos humanos e as pessoas em geral se relacionam em função do Grande parte da
população do Brasil
status (a relação que existe entre os indivíduos em conformidade com a posição
é constituída de
que ocupam na sociedade), do papel (a interação mútua que se verifica quando egressos da etnia
os indivíduos articulam os seus papéis sociais para atingir objetivos coletivos) judaica, paulatinamente
e do processo (relações recíprocas básicas que permeiam os distintos papéis assimilados à cultura
brasileira.
desempenhados pelas pessoas no curso de suas vidas cuja orientação se
(www.pt.wikipedia.org/
expressa enquanto fenômenos agregadores ou desagregadores). A relação no wiki/judeu)
processo alude aos padrões de interação entre dois ou mais indivíduos que
transcende o simples exercício de papéis sociais e o mero vínculo que existe
entre eles. A partir daí é possível classificar os processos sociais básicos
em processos sociais conjuntivos (associativos) e processos sociais
50 UNIDADE 2
A oposição constitui um tipo de processo social dissociativo em que
indivíduos ou grupos sociais procuram frustrar os planos de outros indivíduos
ou grupos sociais. Ex.: uma coligação de partidos políticos que, em disputa pelo
poder institucional em seus vários níveis administrativos, dedicam esforços para
Competição deriva
impedir que uma coligação de partidos políticos rivais logre êxito ou atinja seus do latim com, “junto”
objetivos. + petere, “pedir,
A competição caracteriza a forma de interação social em que dois ou propender a certa meta
ou objetivo”. Nessa
mais indivíduos ou grupos sociais fazem esforços vigorosos para atingir o mesmo
acepção equivale
objetivo. Trata-se de uma atividade rival em que duas ou mais pessoas ou grupos semanticamente à
procura suplantar seu oponente, seja através de um jogo de soma zero (o êxito concorrência e/ou
de um dos oponentes implica no insucesso de um outro) ou de um jogo de soma ao concurso. (www.
variável (a competição entre os participantes de um jogo que, não obstante pt.wikipedia.org/wiki/
boxe)
serem competidores, faculta o sucesso de todos os envolvidos na disputa). Ex.:
todas as disputas esportivas, a concorrência entre os candidatos a uma vaga em
um concurso público, as pugnas comerciais pela venda de mercadorias por parte “A cultura representa
valores, ritos,
de empresas que operam segundo os paradigmas de mercado etc.
mitos e modelos de
Os processo sociais acima descritos não são encontrados em seu comportamento que
estado puro na sociedade; o mais comum é encontrá-los imbricados entre si, visam a orientação
possibilitando inúmeras combinações possíveis. Como vimos, essas duas e o controle dos
comportamentos
categorias de processos sociais são opostas entre si, uma vez que uma se
individuais das pessoas,
vincula ao consenso, ao entendimento; e a outra, ao conflito, à divergência. fornecendo um sentido
comum voltado para
2.5. Cultura e sociedade a convergência
de objetivos na
organização”
Todo e qualquer membro normal de uma sociedade possui cultura, já
(MOTTA, 2003, p. 40).
que participa de grupos e da sociedade total, uma vez previamente submetido
ao processo de socialização. Socialização e cultura são conceitos indissociáveis
Os componentes
e centrais em sociologia. O conteúdo de que tratam em suas áreas temáticas de da cultura integram
estudo se articulam com o fito de compreender o processo total de reprodução uma totalidade
da sociedade. Essa articulação dos conceitos de socialização e cultura permite compreensível, coerente
e interdependente
que vislumbremos a sociedade mediante uma perspectiva caleidoscópica, ou
que é fundamental
seja, permite que encaremos a sociedade como um organismo vivo, a pulsar na intelecção de
cada vez mais freneticamente. Afinal, estamos, na expressão de Marc Auge, qualquer sociedade;
com a “história em nossos calcanhares” individualmente
A socialização é um processo, não passa disso. Seu modo de contribuir considerados,
conservam, não
para a compreensão da sociedade é demonstrar que a mudança em si mesma é
obstante, um mínimo de
um fenômeno irreversível. Apesar de sermos refratários a tudo aquilo que altera estrutura e organização.
52 UNIDADE 2
colheitadeira, material bélico etc. Constituem os elementos materiais de uma
cultura aos quais também nomeamos como cultura real, numa referência direta
às suas propriedades intangíveis.
Na cultura total das sociedades podemos constatar a existência de
A “cultura organizacional
variações culturais entre as regiões de determinados países, assim como a representa o conjunto
adoção de condutas e linguagens profissionais circunscritas a determinados de normas informais,
grupos sociais, os quais denominamos como subcultura. Esta, a exemplo da valores e atitudes que
cultura total, comporta as principais instituições básicas: as instituições familiares, as organizações tendem
a desenvolver, tais
educacionais, políticas, econômicas, militares e recreativas.
como formas de vestir,
A finalidade essencial da cultura é facultar aos indivíduos que vivem em tipos de padrões de
sociedade a organização da satisfação de suas necessidades básicas através comportamento, tais
das principais instituições. Embora tais instituições sejam os meios através dos como orientações para
o futuro ou passado
quais tais satisfações sejam supridas, as funções realizadas por elas coincidem
e expectativas de
com aquelas desenvolvidas pela cultura total. Existem, contudo, certas funções estilos de trabalho”
suplementares inerentes à cultura, quais sejam: a) caracterização da identidade (VASCONCELOS e
de uma sociedade em relação às outras; b) possibilidade de sistematização HEMSLEY, 2003, p.
106).
e interpretação dos valores de uma dada sociedade; c) fornecimento de um
lastro estratégico para a solidariedade e coesão sociais; d) articulação do
comportamento multifacetado da coletividade; e) aporte para a formação da
personalidade social dos indivíduos (socialização).
No âmbito das
A cultura expressa a construção do mundo do homem por ele mesmo,
organizações são
mas sob as condições disponibilizadas pela natureza. Pertencemos a uma
desenvolvidos
sociedade, e não a uma cultura. Manifestamos, porém, a cultura em nosso padrões repetidos de
comportamento quando adotamos condutas já consagradas pelas práticas comportamentos, pois
sociais dos indivíduos na sociedade. O que se aplica à sociedade total também seus integrantes: a) têm
certos procedimentos
se aplica ao universo administrativo, organizacional e social da empresa, já que
padronizados com vistas
a socialização é o mecanismo através do qual a empresa cria e mantém sua a um mesmo objetivo; b)
própria cultura organizacional (valores, práticas sociais, códigos de conduta, servem-se dos mesmo
ritos, mitos, modelos de gestão administrativa etc.) valores; c) utilizam-
se de tecnologias
Como já referimos antes, a socialização se processa por meio dos
apropriadas para os
mecanismos da interação e identificação com os outros, sejam eles concebidos objetivos que buscam; d)
como os outros significativos, sejam eles concebidos como o outro trabalham nos mesmos
generalizado. Logo, a socialização é o processo mediante o qual a sociedade espaços ao longo do
tempo; e) dispõem dos
consegue perpetuar-se no tempo e no espaço, ou seja, é o meio através do qual
mesmos recursos (Silva,
a sociedade se reproduz enquanto estrutura organizacional ou sistema social,
2006:74).
adquirindo um maior grau de complexidade em seus objetivos, valores, tecnologias
e padrões e modelos de relações. Mas esse processo de aprendizagem social
54 UNIDADE 2
comercial, sócio-organizacionais, políticos e econômico-financeiro) e estrutural
(infraestrutura física, compleição organizacional, organograma administrativo e
estrutura de poder) desta, possibilitando identificar as mudanças verificadas em
seu desenvolvimento como decorrência das mudanças observadas em seu meio
ambiente. Logo, o desempenho das organizações é condicionado pela forma
com que os componentes materiais e imateriais se articulam na configuração
de seu padrão cultural. Em suma, quanto maior o grau de articulação e de
harmonização entre os componentes materiais e imateriais que compõem a
cultura da empresa, maior o coeficiente de motivação dos seus membros.
Além do mais, a eficácia organizacional de uma empresa depende do grau
de tolerância desta em relação aos valores, códigos, padrões de relacionamentos
e modelos comportamentais compatíveis com o ambiente de formação cultural Os componentes
dos seus funcionários. Ex.: o uso da língua inglesa em um ambiente em que materiais e
os funcionários a dominem precariamente pode representar um problema de imateriais da cultura
organizacional podem
comunicação capaz de comprometer sua capacidade de alcançar as metas de
ser caracterizados como
produtividade de uma empresa. variáveis na medida
Uma vez definidos os objetivos gerais de uma empresa e a correspondente em que influenciam
criação de uma estrutura organizacional compatível que proporcione a a organização
através de arranjos
realização concreta de tais objetivos, o próximo passo administrativo é “impor”
culturais diferentes
uma homogeneidade nos modos de comportamento e de pensamento na
cuja percepção e
implementação de estratégias de ação. Em outras palavras, significa fazer compreensão são
com que os modos de operar de uma empresa sejam comuns a todos os seus distintamente captadas
funcionários, de maneira que os objetivos da empresa e dos que nela trabalham pelo público interno e
externo à organização.
sejam os mesmos ou guardem entre si uma relação de cooperação relativamente
permanente. Assim, se no âmbito de uma empresa são disseminada as ideias da
qualidade total e da gestão do conhecimento então os valores a ser cultuados
pelos funcionários da empresa possuem como lastro a execução de tais ideias,
o que pressupõe que toda organização possui uma cultura, ou seja, a cultura
desponta como uma variável organizacional importantíssima capaz de explicar o
seu sucesso ou fracasso.
Resumindo: A cultura organizacional se exprime pela interpretação que o
ser humano desenvolve acerca da realidade no contexto interno da organização.
Nesse sentido, ela não é nada mais nada menos do que a “cola” que mantém
unida a organização. A cultura organizacional influencia diretamente o padrão de
conduta e de pensamento das pessoas que integram e animam as empresas:
define o que deve ou não ser objeto de atenção, o significado das coisas, o modo
de reagir, assim como os procedimentos em face das múltiplas situações no
contexto de uma ordem contingente etc.
56 UNIDADE 2
UNIDADE 3
Sociedade, Estrutura e
Organização
Resumindo
No estudo dos ambientes organizacionais, descobriremos em que consistem, como se comportam e
como se desenvolvem as organizações; veremos como se verifica a interação entre elas e seu meio
ambiente, e como se modificam continuamente de forma cada vez mais frenética para dar conta do
ritmo de transformações da sociedade em que está inserida; discorreremos sobre a correlação estreita
existente entre as estruturas das organizações e os processos de tomada de decisão, fato administrativo
da mais alta importância para se compreender a dinâmica dos fenômenos do poder e da liderança; e
focalizaremos as empresas como grupos organizados, assim como a influência da gestão do conhecimento
na sinergia e eficácia das organizações em relação ao mercado extremamente competitivo
Sociedade, Estrutura e
Organização
3.1. As Organizações
O primeiro setor diz respeito àquelas organizações cujas ações são subordinadas
ao poder político, possuindo, portanto, a prerrogativa legal e legitima na
exclusividade do uso do poder coercitivo, por sua vez garantida por um texto
fundador, ou seja, uma Constituição.
O segundo setor alude às organizações de natureza mercantil cujo propósito e
motivação básica é a busca por ganhos econômicos e financeiros mediante a
troca de bens e serviços no mercado.
O terceiro setor concerne às organizações destituídas de autoridade legal para
o uso de força constrangedora e que desenvolvem atividades sem fins lucrativos
e de interesse público.
60 UNIDADE 3
“A administração é um
Portanto, administração, na condição de disciplina científica, tem processo de planejar,
por objeto o planejamento, a previsão, a estruturação de ações e meios organizar, dirigir e
controlar a aplicação
operacionais, a direção e o controle das atividades desenvolvidas no contexto
de recursos humanos,
interno da organização com vistas ao alcance de objetivos específicos. Ela materiais, financeiros
envolve grupos de pessoas especializadas na arte de tomar decisões acerca e informacionais,
dos objetivos, estratégias e uso dos recursos disponibilizados pela organização, visando à realização de
sejam eles designados como governantes, autoridades, dirigentes, gerentes ou objetivos”
(MAXIMIANO, 1985, p.
simplesmente administradores. Estes grupos de pessoas, uma vez integrados
23).
numa administração, diretoria, gerência ou em quadros dirigentes, deverão estar
submetidos a uma determinada estrutura de poder (hierarquia).
“Nas ciências sociais,
A interação destes grupos no interior das organizações constitui um
econômicas, em física,
dos objetos principais da Sociologia aplicada à administração, uma vez que as em química, etc., a
relações interpessoais entre tais atores administrativos são operacionalizadas sob estrutura é o modo de
a égide de um conjunto de objetivos, processos, doutrinas e valores específicos, ajustamento de um
conjunto de coisas, de
ou seja, sob a égide de uma cultura organizacional que lhe é pertinente.
partes ou de forças,
A cultura exerce um papel crucial na formatação de qualquer organização, que estão reunidas de
sociedade ou sistema social, ao interferir diretamente no modo como as pessoas modo a constituírem um
constroem e concebem o mundo em que vivem – do microcosmo da empresa ao todo específico. Cada
vez que se fala em
macrocosmo da sociedade globalizada. Através do trabalho e do conhecimento
estrutura é para designar
proporcionados pela cultura geral da organização a que se integra, o indivíduo
a forma de coerência
garante as suas condições materiais e espirituais de existência, desenvolvendo de um conjunto e a sua
suas potencialidades e realizando-se profissionalmente em conformidade com a heterogeneidade em
sua posição social na estrutura da sociedade. Afinal, as organizações formulam relação a outros. Numa
estrutura, cada parte
e implementam uma cultura compatível com seus objetivos, valores, tecnologias
ou elemento está em
e com a natureza das atividades que realizam para atingir as suas metas conexão ou em sinergia
programáticas e utilitaristas, visando à obtenção de vantagem comercial. com os outros e não
Mas as organizações também existem em função do estreitamento das pode ser o que é, a não
ser através da e na sua
relações que se instauram no ambiente de trabalho, gerando vínculos afetivos
relação com eles. A
semelhantes ao tipo de relação vigente entre os membros de uma família. Trata- estrutura é latente, está
se de transformar parte do outro generalizado (grupos secundários) em outros inscrita na realidade de
significativos (grupos primários), processo este que serve para caracterizar e modo bastante durável
e estável. È por isso
configurar o que chamamos de estrutura de relações. É o que veremos a seguir.
que a apreensão de
uma estrutura permite
3.1.1. Estrutura das Organizações destacar um modelo
de funcionamento. O
A configuração estrutural de uma organização é determinante no modelo deve mudar
quando a estrutura se
desempenho organizacional desta. Por essa razão trataremos da noção de
torna diferente” (BIROU,
1982, p. 148).
62 UNIDADE 3
funcional da vida em sociedade, mediante o paradigma da estrutura social ou
de relações, referimo-nos à articulação de todos aqueles papéis, relações e
processos dinâmicos que contribuem para a manutenção da coesão interna seja
da sociedade como um todo, seja de um sistema social como uma empresa.
Logo, dizer que alguma instituição é disfuncional à existência de determinada
sociedade ou organização significa dizer que tal instituição esgotou a sua
capacidade de contribuir para a estabilidade ou integração de tal sociedade ou
organização.
A falência do instituto da escravidão como modo de produção coadjuvante
ao capitalismo emergente tornou-se um obstáculo à mudança na estrutura da
sociedade agrária brasileira do fim do século XIX. Para o sistema econômico,
o modo escravista de produção, que antes contribuiu de forma decisiva para
a afirmação e consolidação do capitalismo no Brasil e no mundo, que antes
era uma fautoria, logo se torna um estorvo, um entrave à institucionalização
(aceitação, legitimação) do capitalismo, pois o funcionamento deste é lastreado
pelo trabalho assalariado.
Mas essa mesma instituição é funcional à determinada sociedade ou
organização na medida em que contribui para a sua coesão ou existência social.
A promoção de várias atividades esportivas e a política de concessão de auxílio-
saúde extensivo a toda a família dos funcionários é fundamental no estímulo
ao sentimento de pertença de uma organização; logo, contribui para a sua
estabilidade e manutenção.
As estruturas das
Numa outra perspectiva de análise, é preciso entender as organizações
organizações moldam
como estruturas frágeis decorrentes das vicissitudes das estratégias de poder a conduta dos
de seus integrantes. As perspectivas de coerência, coesão e integração de uma indivíduos; derivam
organização dependem da interveniência de uma séria de fatores: influência de experiências que
se institucionalizaram,
de elementos irracionais (emocionais e tradicionais), uso de racionalidades
transformando-se em
distintas, interesses conflitantes, rígidas estruturas de decisão etc.
princípios, valores,
A existência das organizações depende de um padrão mínimo de ordem normas de conduta e
e de cooperação, assim como de previsibilidade e regularidade nas relações crenças organizacionais;
interpessoais e na suas ações técnico-operacionais. Mas para que isso ocorra vivem em permanente
troca com o ambiente
é necessário o cumprimento de certos pré-requisitos: que sejam cumpridas
externo; e estão em
algumas expectativas mútuas da organização em relação aos seus participantes constante transformação
e vice-versa (fundamento contratual), que sejam internalizados normas e interna.
valores integrativos (socialização) e, sobretudo, que seus membros tenham
determinada capacidade de negociação no processo de troca de condutas que
sejam compatíveis com o desempenho de suas atividades, visando atingir seus
64 UNIDADE 3
de criatividade e de iniciativa. Várias características assinalam esse tipo de
estrutura, a saber:
MODELOS DE ORGANIZAÇÃO
66 UNIDADE 3
trama de relações, papéis e processos dinâmicos, aqui enquadrados no âmbito
do conceito de contexto social, são ativados pela persecução de determinados
objetivos organizacionais: a obtenção de algo de que carece (uma maior fatia
de mercado), a manutenção do que já possui (quadro executivo de alto nível) e
o repúdio ao que lhe desagrada ou compromete o seu funcionamento (acúmulo
desnecessário de cargos administrativos).
Uma organização empresarial que vê no estímulo à qualificação
profissional permanente de seus recursos humanos um procedimento
administrativo que garante à empresa uma situação de destaque comercial no
mercado, está praticando uma conduta que é informada por valores associados
àquilo que chamamos de a era da informação e do conhecimento. Os objetivos de uma
organização são
Os valores que impelem à ação no âmbito de uma organização são
determinados pelas
aqueles que se encontram codificados em sua cultura organizacional sob a afirmações ideais
forma de sentidos e significados desejáveis ou indesejáveis por ela. Para a acerca de um objeto,
sociologia, os valores apresentam as seguintes características: a) constituem de um produto, de
uma estratégia, de um
algo que se compartilha; b) são socialmente reconhecidos pelas pessoas;
comportamento, de uma
c) são independentes do julgamento de uma pessoa específica. relação, etc., ou seja,
Em suma, um contexto social é formado na medida em que os indivíduos, pelos valores que lhes
grupos sociais e organizações definem metas ou objetivos que por sua vez são servem como lastro.
informados por valores socialmente construídos, seja na sociedade em geral,
seja numa organização em particular. Logo, a análise do contexto social de uma
empresa, que pretende compreender sua estrutura e dinâmica, deve levar em
conta quatro travejamentos norteadores, a saber:
Os valores exercem
uma função básica na
yy Direção - Um corpo administrativo organizado segundo uma
definição das condutas
específica estrutura de poder (hierarquia) e disciplina; compõe o organograma
de indivíduos, grupos e
administrativo em que se definem os papéis e prerrogativas de cada um dos organizações: fornecem
empregados especializados (burocracia); os critérios que atribuem
yy Projeto - Uma realização importante para a motivação sentido e significado à
cultura e à sociedade
estratégica da empresa em conformidade com expectativas de curto, médio e
como um todo.
longo prazos (a expansão horizontal e vertical da empresa nos mercados de
produtos e serviços);
yy Práxis - Um programa sistemático de ação informada pelo
conhecimento; a fusão da teoria à prática a serviço do planejamento estratégico,
tático e operacional;
yy Ideologia - Conjunto de ideias, representações, objetivos, metas,
valores, tecnologias, relações, modelos de gestão e doutrinas que fundamentam
•Cultura e Modelos
em diferentes níveis, a saber: identidade organizacional, relações interpessoais,
Culturais. processos empresariais e patrimônio empresarial. Os dois primeiros níveis são
responsáveis pela cultura da organização e a interação entre eles determina o
clima organizacional vigente (disposição psicossociológica que determina sua
conduta e capacidade de percepção da realidade em que se situa).
68 UNIDADE 3
Ocorre que o mau desempenho verificado em cada um desses níveis
gera modalidades de crises diferentes segundo o nível atingido, quais sejam, Os níveis ou dimensões
respectivamente: crise de identidade, crise de estratégia, crise de resultados em que se verificam
e crise de liquidez. Assim, pode-se observar as transformações que se as mudanças no
contexto interno das
desdobram no contexto interno das organizações a partir dos seguintes níveis:
organizações:
70 UNIDADE 3
realizar as metas e objetivos da organização;
III. Crescimento através de delegação – Fase de crescimento marcada Os estágios de
pela delegação de responsabilidades a técnicos especializados que assinala à crescimento/crises
profissionalização do quadro dirigente, porém precipita a crise de controle, que, correspondentes:
- Crescimento através
por sua vez, provoca uma mudança substancial nesse modelo de crescimento.
de criatividade/crise de
IV. Crescimento através de coordenação – Essa fase de crescimento liderança;
é marcada pelo esforço de coordenação das atividades internas e externas - Crescimento através
da organização, provocando uma crise de burocracia que desemboca na de direção/crise de
autonomia;
adoção de uma nova estratégia administrativa lastreada na gestão por objetivos
- Crescimento através
(resultados) e na cooperação dos membros da organização;
de delegação/crise de
V. Crescimento através de colaboração – Esse estágio de crescimento controle;
baseado na colaboração dos membros da organização quanto ao alcance - Crescimento através
das metas e objetivos da organização sofre uma inversão de rumo na medida de coordenação/crise de
burocracia;
que uma outra crise emergente possa dar azo a uma outra modalidade de
- Crescimento através
crescimento, ad infinitum. de colaboração/crise
emergente.
As mudanças que se verificam em distintas dimensões ou níveis nas
empresas – identidade organizacional, relações interpessoais, processos
empresariais e patrimônio empresarial –, associados aos estágios de crescimento
a que são submetidas no âmbito de um mercado cada vez mais competitivo,
conforme classificação de Greiner (ibidem), demonstram que as transformações
que incidem sobre a estrutura das organizações concorrem para a configuração
de um contexto social correspondente e mutável. Daí a necessidade analítica de
se compreender como os componentes (objetivos, valores, tecnologia e vínculos
entre as pessoas) de determinado contexto social articulam-se concretamente
na sociedade e nos sistemas sociais ou organizações.
ORGANOGRAMA DO MEC
72 UNIDADE 3
é chancelada por estatutos que prescrevem as suas atribuições e prerrogativas
específicas. A estrutura informal, por sua vez, se refere ao conjunto das definições
operacionais que se estabelecem de forma espontânea no jogo do contato dos “Temos uma associação
indivíduos ao manterem relações cordiais e respeitosas, ou conflituosas, nos de dominação na
seus respectivos ambientes de trabalho. Essas relações cordiais, supostamente medida em que seus
membros, como tais,
fundadas na cortesia e na urbanidade no trato – ou ainda nos fundamentos
estejam submetidos a
de civilização dos povos – formam aquilo que Max Weber denomina como relações de dominação,
racionalidade substantiva, conforme já vimos. Esta racionalidade substantiva em virtude de ordem
exprime as concepções e percepções que os indivíduos têm de seu ambiente vigente” (WEBER, 1991,
organizacional, tais como a sensação de aceitação a certos grupos ou instituição p. 33).
poder – capacidade que uma pessoa tem de impor a sua própria vontade
às demais pessoas no quadro de uma relação social, apesar de eventuais
resistências;
dominação – capacidade de que uma ordem dotada de determinado
conteúdo específico seja acatada por uma determinada coletividade; distingue-
se em dominação por interesse (mecanismo típico de mercado, como é o caso
do monopólio) e dominação por autoridade (mecanismo de poder fundado
nas relações entre a imposição da vontade de alguém (poder de mando) e o
compromisso tácito (dever de obediência), tal como na relação entre pai e filho,
patrão e empregado, por exemplo).
74 UNIDADE 3
a conduta humana, concedendo-lhe certa autonomia ante as suas próprias
necessidades, autonomia essa que é fator de imprevisibilidade no quadro de
uma ordem que é essencialmente contingente.
Os modelos administrativos acima tratados – tradicional e inovador
– são associados a formas distintas de liderança. Esta última constitui um
componente sócio-político fundamental, presente na condução dos destinos
das organizações perante os desafios colocados pela ordem contingente e sua
acentuada propensão à mudança. E falar de liderança implica em articular ações
estratégicas segundo os termos de uma direção compartilhada, numa maior ou
menor extensão e profundidade, o que envolve diversas formas de autoridade
e níveis de influência política exercidos pelos dirigentes no processo de gestão.
Podem-se distinguir duas formas básicas de autoridade no contexto
administrativo: a direção autocrática e a direção democrática. A direção
autocrática prioriza a realização das tarefas, exerce o poder e toma decisões “Grupo organizado é
de forma centralizada e autoritária, assumindo para si toda e qualquer [...] um conjunto de
indivíduos cujas inter-
responsabilidade administrativa. A direção democrática dá ênfase às relações
relações baseiam-se
humanas, adota um estilo administrativo descentralizado e estimula a na expectativa de se
participação efetiva de seus subordinados nas tomadas de decisão. processarem de acordo
A cada um dos tipos de direção supracitados corresponde um tipo com uma estrutura que
prevê valores, padrões,
específico de liderança, cujo estilo depende da articulação entre o líder, seus
modelos e normas,
subordinados e as variáveis sociopolíticas no interior da organização em que ou seja, relações
estão inseridos na qualidade de membros efetivos. Assim, tais estilos de liderança sociais padronizadas”
não se apresentam em estado puro, pois tendem a mesclar-se conforme refletem (CASTRO, 2003, p. 160).
as bases de poder no contexto interno da organização. Logo, esse estilo híbrido
de liderança depende das possibilidades de conduta e de poder ditadas pelas
condições situacionais vigentes tanto no contexto interno quanto no contexto
externo de qualquer organização empresarial.
76 UNIDADE 3
conciliar os interesses dos proprietários com os interesses dos empregados,
zelar pela imagem da organização, perseguir a eficácia e a eficiência).
A empresa é um grupo organizado que dispõe de um conjunto de recursos
materiais e humanos, financeiros e logísticos, cujo emprego visa o alcance de
objetivos determinados e definidos – econômicos, sociais, culturais, recreativos,
“O conceito de sistema
assistenciais etc. É uma entidade autônoma que possui personalidade jurídica
enfatiza dois pontos
e patrimônio próprio cuja existência depende da mobilização planejada de importantes:
múltiplos recursos visando produzir bens e serviços para o mercado. Desse 1) a sobrevivência última
modo a empresa, além de ser um organismo econômico, também se configura da organização depende
de sua capacidade de
como um sistema social.
adaptação às exigências
Segundo a perspectiva da teoria dos sistemas, o ponto de partida
do meio; e
básico na descrição da uma organização empresarial enquanto sistema social 2) ao responder a estas
é o feedback, (retroalimentação), ou seja, o mecanismo responsável pela exigências, o foco da
constante adaptação da empresa às exigências de seu meio ambiente. De um atenção administrativa
deverá ser o ciclo
lado, essa relação interdependente entre a empresa e seu meio circundante
total input – processo
ocorre na medida em que a empresa obtém os recursos naturais (ou insumos – output” (OLIVEIRA,
produtivos) e os recursos humanos de que necessita para operar no mercado, 2002, p. 288).
aos quais designamos mediante vocábulo da língua inglesa de inputs. De outro
lado, a empresa responde ao meio circundante mediante o suprimento de bens
e serviços, os chamados produtos de consumo duráveis e não duráveis, aqui
designados pela expressão inglesa outputs. Assim, a existência das empresas Existe uma estreita
é dependente de sua própria capacidade de converter os insumos produtivos relação entre o objetivo
(inputs) em resultados previstos (outputs), conforme a demanda do mercado estratégico da empresa
e sua estrutura de
capitalista. Mas apenas naquelas condições favoráveis em que os custos de
organização, no sentido
produção forem de tal monta que compense a sua comercialização no mercado
de que a definição do
a preços competitivos e, preferencialmente, em ritmo de economia de escala tipo de estrutura que se
(situação em que a unidade física da empresa funciona a todo vapor para necessita implementar
satisfazer as exigências de um mercado em ebulição). numa empresa face ao
mercado competitivo
Tais condições econômicas são indispensáveis à continuidade do ciclo
passa primeiro pela
do processo produtivo (o fluxo input – processo – output) realizado pela empresa. definição clara dos seus
A sua eficácia organizacional, contudo, depende de duas condições básicas de objetivos estratégicos
aferição, a saber: que o emprego dos critérios de eficácia leve em conta o ciclo ou programáticos.
Assim sendo, a
total input – processo – output, e que tais critérios sejam capazes de exprimir
compleição estrutural
a interação da empresa com seu meio circundante. Porém, considerando a que uma empresa requer
precariedade de aferição do critério da eficácia organizacional, uma organização depende dos objetivos
empresarial é eficaz, em última instância, sempre que for capaz de manter o estratégicos desta em
relação ao mercado.
máximo de longevidade possível. Mesmo assim, deve se adotar mecanismos de
78 UNIDADE 3
Na época em que vivemos conhecimento é poder, e não um fator
de produção adicional, a exemplo do capital, do trabalho e da terra. Ele é
estrategicamente importante para os processos de adaptação das organizações
empresariais a seu meio ambiente. Esse processo adaptativo a que a empresa
se submete é fundamental para o êxito e a sobrevivência das organizações
empresariais no mercado, uma vez que elas dependem da valorização dos
recursos humanos, da troca de experiências e conhecimentos individuais e a
identificação e mensuração monetizada do capital intelectual.
Na era do conhecimento e da informação, as mudanças nas estruturas
das empresas resultam, além da tecnologia em geral, da articulação das
tecnologias da informação, das tecnologias da comunicação e da força de trabalho
dependente de expertise (experiência), ou seja, derivam da convergência entre
recursos tecnológicos e conhecimentos pessoais. E essa convergência de meios
tecnológico-operacionais e cognitivos garante o desenvolvimento de novos
métodos, estratégias e habilidades que são fundamentais às organizações que
adotam o conhecimento como uma vantagem competitiva – criação de novos
serviços, mudança no conceito de espaço físico e mercadológico, valorização
das marcas e patentes de tecnologia.
Mas o que é, afinal, conhecimento? Uma resposta a tal indagação
remete previamente aos conceitos de dado e de informação (ver quadro
ao lado). O Conhecimento é conjunto articulado de informações ordenado
segundo um específico critério de verdade, o que envolve reflexão, síntese e
contexto. Mas o conhecimento pode ser identificado como de natureza dóxica
ou epistêmica. Quando falamos de conhecimento como sendo de natureza
dóxica nos referimos ao conhecimento empírico de caráter ordinário, cuja origem
resulta das experiências ou práticas cotidianas comuns das pessoas, daí ser
caracterizado como assistemático e ametódico. Já o conhecimento epistêmico é
aquele dotado de uma verdade cientificamente comprovada. Ele é sistemático,
metódico e objetivo, uma vez que, no quadro de uma realidade empírica, visa
à descoberta de certas regularidades entre certos fenômenos, cuja operação
cognitiva se dá mediante juízos de realidade, e não de valor, a exemplo do
conhecimento filosófico.
No plano analítico da atual da teoria das organizações circunscrito à gestão
do conhecimento, o conhecimento pode ser concebido como “uma capacidade de
agir”, e sua expansão, diversamente do que ocorre como os recursos materiais,
é diretamente proporcional às possibilidades de compartilhamento por parte dos
membros de uma organização (SVEIBE, 1998).
80 UNIDADE 3
Socialização - Conversão do conhecimento tácito em
conhecimento tácito, baseado no compartilhamento de experiências (modelos
e habilidades mentais compartilhados), na apreensão cognitiva mediante ação
concreta (observação, imitação e prática);
Externalização - Conversão do conhecimento tácito em
conhecimento explícito, fundados na articulação dos conhecimentos tácitos em
conceitos explícitos, nos processo de criação do conhecimento perfeito;
Combinação - Conversão do conhecimento explícito em
conhecimento explícito conforme a combinação de conjuntos diferentes de “A organização que
for capaz de integrar
conhecimento explícito e o processo de sistematização de conceitos em um
eficientemente os
sistema de conhecimento. processos de criação de
Internalização - Conversão do conhecimento explícito em significados, construção
conhecimento tácito cuja operacionalização depende da incorporação do do conhecimento e
tomada de decisões
conhecimento explícito em conhecimento tácito, da assimilação do conhecimento
pode ser considerada
explícito (conhecimento estruturado) como modelo mental. uma organização do
conhecimento” (CHOO,
A percepção do conhecimento depende da aprendizagem organizacional. 2003, p. 30).
Esta, por seu turno, se traduz pela capacidade que uma organização possui para
manter ou melhorar seu desenvolvimento com base na experiência adquirida.
A organização do conhecimento dispõe de informações e conhecimentos
cuja utilização intuitiva e/ou racional é capaz de lhes garantir um diferencial
competitivo. Para que uma organização seja inteligente (i.e., uma organização
do conhecimento), é necessário que ela seja capaz de articular as três arenas
distintas do uso da informação a serviço do crescimento e capacidade de
adaptação de uma empresa (CHOO, 2003):
82 UNIDADE 3
As organizações bem sucedidas dispõem de aprendizagem grupal na medida
em que o Q.I. do grupo é superior à soma matemática dos Q.I.s individuais dos
membros desse mesmo grupo.
• Pensamento sistêmico - Permite analisar a realidade
organizacional a partir do enfoque na totalidade de seus componentes, suas
inter-relações, adaptação e mudança, efeitos de retroinformação etc.
84 UNIDADE 3
Capital social - Padrão de relações da empresa com a sociedade
“Para ‘enxergar’
em geral visando à solução de problemas sociais como a fome, a educação, o a organização do
trabalho e a prostituição infantis etc. (responsabilidade social); conhecimento, os
Capital ambiental - Reflete o compromisso da empresa com gerentes devem
procurar ver suas
o meio ambiente; se expressa pela aceitação de produtos cuja produção adota
organizações como
mecanismos que não implica na degradação da natureza; se elas consistissem
Capital de relacionamento externo - Alianças e ou consórcios de estruturas de
comerciais com clientes, fornecedores e demais empresas, investidores, conhecimento e não de
capital” (SVEIBE, 1998,
agências reguladoras e governos (PPPs).
p. 21; grifo do autor).
Atividades
6. Quais são os três tipos de dominação pura segundo Max Weber. Comente
cada um deles.
86 UNIDADE 3
UNIDADE 4
As Organizações
Governamentais
Resumindo
Após dissertar sobre as organizações em geral, vamos agora tratar da relação de interdependência entre
as principais instituições que conformam e animam as organizações governamentais - Estado, Governo e
Administração Pública. Pretende-se, aqui, explanar acerca das dimensões propriamente administrativas,
organizacionais e políticas de ditas organizações e sua interação com a sociedade em geral. Inicialmente,
definiremos cada uma das instituições supracitadas para depois relacioná-las entre si; analisaremos a
inter-relação entre elas e as demais organizações que caracterizam o mercado real e a sociedade civil; e,
por fim, realizaremos algumas reflexões sobre as relações internacionais e a importância da doutrina neo
liberal para a compreensão das transformações que assinalam o mundo contemporâneo globalizado.
4 AS ORGANIZAÇÕES GOVERNAMENTAIS
90 UNIDADE 4
em sistema e sob a influência de um centro propulsor e unificador de ideias-
“O Estado nem
forças e ações proativas – governo local, nacional e transnacional. Mas é pouco está a serviço nem
eloquente quando o assunto é descrever a performance dessas instituições no é ‘instrumento’ de
mundo concreto, como, aliás, propõe seu compatriota Claus Offe (1984). uma classe contra
Para Offe (1984), o fenômeno político denominado Estado deve ser outra. Sua estrutura e
descrito tendo por base de análise a sua ação – e/ou reação – frente aos atividade consistem na
imposição e na garantia
problemas estruturais que surgem no âmago do sistema capitalista. Assim,
duradoura de regras
busca-se, nessa linha de concepção teórica, compatibilizar as “razões concretas
que institucionalizam
e de conteúdo” que justificam a conduta estatal com os “resultados materiais” as relações de classe
alcançados por essa mesma ação. Logo, o conceito de Estado capitalista específicas de uma
diz respeito a uma forma institucional de poder público em sua relação com classe capitalista. O
a produção material, cuja caracterização é dada pela articulação entre quatro Estado não defende os
interesses particulares
determinações funcionais:
de uma classe, mas sim
os interesses de uma
yy Privatização da produção - Apenas a propriedade privada sociedade capitalista de
é capaz de garantir a produção de bens e serviços em conformidade com as classe” (OFFE, 1984, p.
demandas do mercado, já que “o poder público está estruturalmente impedido 123).
de organizar a produção material segundo seus próprios critérios ‘políticos’”
(Ibidem, p. 123; grifo do autor).
As quatro determinações
yy Dependência dos impostos – o funcionamento do setor estruturais-funcionais
público não pode prescindir do “volume da acumulação privada”, razão pela qual que configuram a
lança mão dos mecanismos de política fiscal propiciadores da chamada receita “política” do Estado
derivada (tributos, taxas e contribuições); capitalista, segundo
yy Acumulação como pronto de referência – Considerando Claus Offe:
92 UNIDADE 4
atividades de produção de bens e serviços ofertados pelo mercado, com base na
administração por objetivos e/ou resultados e na avaliação a posteriori- trata-se
do modelo de gestão gerencial.
Mas a compreensão adequada acerca da natureza do Estado depende
de sua articulação com o instituto do governo, já que este último é o responsável
pelo direcionamento político e pela conformação jurídica do próprio Estado, Governo atual (2007-
assim como de sua própria dinâmica no mundo concreto da realidade social, 2010).
política e econômica. Grupo coeso de pessoas
que exercem o poder
de governo e que
4.1.2. Governo
determinam a orientação
política de uma
A palavra governo deriva do termo grego kyberntes, cujo significado determinada sociedade.
semântico é “piloto ou timoneiro de uma embarcação”. Em linhas gerais,
governar alude a um processo continuado de ação através do qual a autoridade
de um indivíduo ou grupo é exercitada com vistas à persecução de determinado O governo é o órgão
objetivo. decisório por excelência,
O governo é, ao mesmo tempo, representante e expressão do Estado. é o centro propulsor e
Ele age sempre por procuração deste último, sendo a contrapartida concreta unificador do Estado.
da mera formalidade estatal. Consequentemente, falar de governo é, desde a Não se pode falar de
Estado, ensina Bobbio
Antiguidade, referir-se à arte de dirigir, conduzir.
(2000), se não se pode
Como organização institucional do Estado, o governo é o princípio
formular a seguinte
unificador deste, o instrumento mediante o qual os objetivos do Estado são pergunta: “Afinal, quem
elaborados e implementados. governa?”.
Pode-se definir governo sob duas perspectivas: constitucional e
sociológico. Segundo a perspectiva constitucional, define-se governo como a
instância institucional em que o poder do Estado se exprime de forma plena.
Sob a perspectiva sociológica, constata-se que nos Estados modernos o partido
ou a coalizão de partidos constituem os núcleos de poder em torno do quais
o governo gravita. Em suma, o governo é “uma forma de poder relativamente
autônomo em relação aos vários grupos sociais, com a função específica de
realizar a integração política da sociedade e a sua defesa no confronto com os
grupos externos” (LEVI, 2000, p. 554).
As referências às condutas governamentais implicam na
operacionalização dinâmica de duas categorias conceituais, a saber, governança
e governabilidade.
Governança refere-se à capacidade administrativa e financeira
das instituições públicas em dar cabo de seus objetivos estratégicos.
Governabilidade, por seu turno, diz respeito à capacidade governamental em
garantir a estabilidade do sistema político de maneira a viabilizar apoios políticos
(institucionais ou não) a seus propósitos de governo, geralmente sob a forma de
94 UNIDADE 4
sobre as decisões estratégicas de governo e aqueles que apenas pontualmente
se insere na cadeia de decisão administrativa (agentes internos). Mas tal sistema
de decisão central também comporta a interferência periódica (as eleições) ou
ocasional (comoção social nacional e/ou internacional) de agentes externos que “A Administração
se situam na periferia das decisões de Estado ou de governo (a desestabilização Pública constitui o
instrumento a partir do
do governo Collor, por exemplo). Assim, pode-se distribuir os participantes
qual o Estado almeja
institucionais do processo global de decisão governamental em sete círculos14:
a sua objetividade na
história – seu veículo
I. O primeiro círculo é composto pelo presidente da República e os ou hospedeiro -, uma
atores responsáveis pelo comando de sua estrutura institucional de apoio, que, vez que este último
por sua vez, são lotados nos órgãos essenciais, nos órgãos de assessoramento não passa de uma
imediato e nos órgãos de consulta; invenção jurídica que,
por sua vez, se funda
II. O segundo círculo de decisão é formado por organismos referentes
em um texto fundador; o
às organizações setoriais de apoio, ou seja, ao conjunto das administrações
governo, uma bússola a
setoriais representados pelos Ministérios com seus titulares diretos e corpo de guiar as suas ações, já
assessoria imediata; que, para o bem ou para
III. Os aliados externos do Estado compõem o terceiro círculo de o mal, deve contar com
decisão (os sindicalistas e as associações patronais de classe); uma direção, um projeto,
um práxis (BUENOS
IV. O quarto círculo de decisão é integrado por instituições de natureza
AYRES, 2004, p. 462).
política, conformadora do Poder Legislativo e por instituições de natureza
jurisdicional, isto é, o Poder Judiciário;
V. A sociedade civil organizada representa o quinto círculo de decisão
(periférico);
VI. A população eleitoral, por sua vez, representa o sexto círculo de
decisão (periférico).
VII. O sétimo círculo de decisão é representado pela sociedade civil
organizada internacional (periférico).
96 UNIDADE 4
A nova administração pública é resultante da articulação de um amplo
No âmbito da burocracia
rol de princípios administrativos que procedem de múltiplas origens cognitivas, o quadro administrativo é
e embora possua um forte componente de indefinição, é possível compreendê- formado por funcionários
la a partir de quatro modelos ideais, a saber: 1) impulso para a eficiência; 2) individuais que:
downsizing e descentralização; 3) persecução da excelência; e 4) orientação • São livres;
para o serviço público, sendo que a combinação entre tais modelos é comum. •São nomeados;
•Têm competências
Osborne e Gaebler (apud FERLIE et al., 1999), por exemplo, rejeitando o modelo
funcionais fixas;
inicialmente adotado pelo Governo americano, no âmbito do programa de Ronald
•São contratados;
Reagan, o modelo 1, o substitui pela associação entre os modelos 2 e 3 da nova •Possuem qualificação
administração Pública, contido no Relatório Gore, durante a vigência do governo profissional;
de Bill Clinton. •São assalariados;
De todo modo, como toda classificação, esta também é dotada de um •Desempenham
profissão no exercício de
determinado quantum arbitrário, e decerto tais autores não o ignoram. Alguns
seu cargo;
elementos dos conteúdos dos modelos em apreço são coextensivos, às vezes
•São destituídos dos
fronteiriços. Podemos mesmo dizer que no caso brasileiro esses quatro modelos meios administrativos;
estão articulados numa maior ou menor medida; uma garimpagem aleatória •Integram uma carreira
aqui, outra acolá. Mas não resta dúvida de que o modelo predominante é o no 1, específica;
uma vez que ele dispõe de um altíssimo teor de compatibilidade com a política •São submetidos à
governamental atual de equilíbrio das contas públicas. disciplina e controle de
serviço.
Abstendo-se de se estender mais nessa discussão sobre a nova
administração pública, em termos de seu híbrido conteúdo programático,
convém acrescentar que a sua aplicação empírica em terreno administrativo A transformação das
concernente aos vários aparatos estatais nacionais tem demonstrado a sua organizações públicas
deficiência – ou mesmo ineficiência - em diversas áreas de atuação, a saber: em organizações do
na garantia de uma proteção efetiva dos direitos dos cidadãos; na prevenção à conhecimento depende:
Garantir a distribuição
da renda e da riqueza; 4.2. Estado e sociedade
98 UNIDADE 4
garante a situação ótima de recursos – é a teoria do equilíbrio geral.
Segundo Musgrave (apud Riani, 2002), existem três razões que justificam
a intervenção pública, que, por sua vez, exigem o exercício de três funções
básicas previstas na política orçamentária: alocação (correção de equilíbrios
parciais), redistribuição (correção da dinâmica do mercado e prevenção do
aumento das desigualdades sociais) e estabilização (correção do equilíbrio
geral ou equilíbrio macroeconômico).
Uma vez que não existem condições políticas para uma alocação
ótima de recursos e bens a cargo do mercado, em virtude de o setor privado
ser incapaz de gerar uma produção ótima de bens e de serviços, o governo
desponta então como fator de intervenção na alocação de produção de bens e
serviços de acordo com as necessidades da sociedade. Quatro características
principais são apontadas como falhas do mecanismo do mercado na persecução
da produção ótima de bens e serviços:
100 UNIDADE 4
É importante destacar a existência de uma distinção importante entre
reforma estatal e reforma administrativa. A primeira sempre abarca a segunda.
Assim, por um lado, a reforma estatal lato sensu alude à redefinição do papel
e função do Estado em relação ao mercado e reestruturação do aparelho
ou aparato estatal (administração pública): privatização, desestatização,
desregulamentação, desburocratização.
Por outro, reforma estatal stricto sensu concerne à reforma da
administração pública propriamente dita – criação e extinção de órgãos públicos,
descentralização, desconcentração, reimplantação de plano de cargos e salários
etc. Portanto, toda reforma da administração pública supõe uma reforma estatal,
assim como toda reforma estatal está diretamente vinculada a uma reforma da
administração.
102 UNIDADE 4
ao desequilíbrio fiscal provocado pelo aumento dos níveis de desemprego,
A política pública
sobretudo a partir do choque do petróleo, no início da década de 1970. A política consiste em um
do pleno emprego, que vigorava desde 1945, é substancialmente esvaziada, processo de mediação
conduzindo à perda da centralidade do trabalho como princípio da política social cujo propósito
econômica (a crise previdência social). A perda da centralidade do trabalho é evitar as distorções
coincide com a afirmação e consolidação da centralidade da política de combate que podem surgir entre
um setor e os demais
à inflação associada à valorização financeira do capital.
setores, ou mesmo entre
No que respeita ao papel do Estado e as políticas públicas, e numa
um determinado setor e
perspectiva mais essencial do debate filosófico e doutrinário, inexiste diferença a sociedade global, de
entre o liberalismo do século XVIII e o liberalismo dos séculos XX e XXI (Fiori, maneira que seu objeto
1997). não é mais do que a
As teses e as propostas centrais do velho e do novo liberalismo continuam administração racional
da relação global-setorial
as mesmas, podendo ser enumeradas ou decompostas em número de três:
(MULLER, 1990).
104 UNIDADE 4
Atividades
ALEXANDER, Jeffrey et al. From reduction to Linkage: the long view of micro-
macro debate. In: ALEXANDER, Jeffrey. The Micro-Macro Link. California, USA:
University of California Press, 1987b.
BIROU, A. Alain. Dicionário das ciências sociais. Lisboa, PT: Publicação Dom
Quixote, 1982.
CHINOY, Ely. Sociedade: uma introdução à sociologia. São Paulo: Cultrix, 1975.
FERLIE, Ewan et al. A nova administração pública em ação. Brasília, DF: Editora
Universidade de Brasília/ENAP, 1999.
LEVI, Lúcio. “Governo”. In: BOBBIO, Norberto et al. Dicionário de política. vol.
1. Brasília: Editora Universidade de Brasília: São Paulo: Imprensa Oficial do
Estado, 2000.
SOUZA, Herbert José de. Como se faz análise de conjuntura. Petrópolis: Vozes,
1985.
WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. 02. Brasília: Editora da UnB, 1999.
______. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva.
Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991.
WEBER, Max. História geral da economia. São Paulo: Editora Mestre Jou, s. d.