Amor em Dobro - Ariela Pereira
Amor em Dobro - Ariela Pereira
Amor em Dobro - Ariela Pereira
AMOR EM DOBRO
Ariela Pereira
Copyright© 2023 Ariela Pereira
Todos os direitos reservados de propriedade desta edição e
obra são da autora. É proibida a cópia ou distribuição total ou de
partes desta obra sem o consentimento da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°.
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
2º Edição
2023
ÍNDICE
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
CAPÍTULO III
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XII
CAPÍTULO XIII
CAPÍTULO XIV
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
CAPÍTULO XX
CAPÍTULO XXI
CAPÍTULO XXII
CAPÍTULO XXIII
CAPÍTULO XXIV
CAPÍTULO XXVI
CAPÍTULO XXVII
CAPÍTULO XXVIII
CAPÍTULO XXIX
CAPÍTULO XXX
CAPÍTULO XXX
CAPÍTULO XXXII
CAPÍTULO XXXIII
CAPÍTULO XXXIV
CAPÍTULO XXXV
EPÍLOGO
CAPÍTULO I
Lucy
É dia de comemoração e o apartamento está uma verdadeira bagunça. Há
garrafas de cerveja espalhadas por toda parte, uma camada de fumaça de
cigarros mais grossa que a habitual está pairada no ar, a música agitada toca
em volume alto, de modo que os jovens precisam alterar o tom da voz para
serem ouvidos uns pelos outros. Ninguém dança.
Como sempre, Rose e Annabelle disputam a atenção de Dylan, o líder da
turma. O cara que além de ser dono de uma beleza extraordinária, com
grandes olhos azuis e um físico atlético que nunca passa despercebido, é o
mais inteligente entre todos. Um verdadeiro herói aos olhos de quem abraça
nossa causa.
Há também o pequeno Joe com seus óculos fundo de garrafa, se
comportando como o melhor amigo de Melissa, quando na verdade só quer
tê-la por perto. Mas Melissa parece se sentir mais atraída por Kate.
Os outros rapazes, Jonathan, Tom e Jim conversam animadamente, cada
um segurando uma garrafa de cerveja, enquanto que Kevin — o cara com
quem namoro há dois anos e meio — e eu nos mantemos a um canto,
abraçadinhos, no maior clima de romance.
Alguns de nós moramos aqui mesmo, como é o meu caso e de Kevin,
outros continuam vivendo na casa dos pais, embora passem mais tempo
aqui que em qualquer outro lugar.
A sala onde estamos parece maior do que é, devido a falta de móveis.
Não há sofá nem estante, como em uma sala comum, apenas uma mesa ao
centro com cadeiras toscas em volta, onde nos reunimos diariamente, com
nossos computadores em mãos e fazemos uso dos diversos recursos
oferecidos pela internet para lutar por nosso único objetivo: derrubarmos
Lennon Rudolf, o atual presidente do país.
Cada um naquela sala luta por motivos patrióticos. São filhos de famílias
de classe média e alta que estão sendo prejudicadas pelo sistema socialista
que esse governo vem tentando implementar em Newhart, antigo sudoeste
da Inglaterra, desde que tomou o poder por meio do que se vem
denominando de um golpe parlamentar, há oito anos. Na verdade Rudolf
encontrou graves provas de corrupção contra o governo capitalista anterior
— aquele que conseguiu tornar nosso país uma república, emancipando-o
do Reino Unido —, e foi assim que conseguiu chegar ao poder.
A princípio, a população apoiou Rudolf, afinal o governo que ele
derrubou era corrupto, porém, o passar dos anos está revelando a crueldade
da sua autocracia, o povo começa a perceber que o socialismo não é um
sistema igualitário como os pensadores tentam pregar, mas sim um sistema
de governo que empobrece a população na mesma medida que enriquece os
governantes. Isso é fato, não há um só país socialista no mundo em que sua
população não viva na mais completa miséria e assim está se tornando
Newhart, um país que era rico quando foi emancipado há vinte anos.
O segundo aspecto que está levando a população a desaprovar Rudolf, é
o fato de ele não permitir que haja eleições diretas para presidente como
deveria haver em todo país republicano.
É nesses dois aspectos que o nosso movimento (JUD – Jovens Unidos
pela Democracia) está se baseando para trabalhar na tentativa de derrubar
esse governo autocrático, por meio da mobilização e manifestações da
população, à qual alcançamos via internet.
Alguns de nós, principalmente o líder, toma a frente e mostra sua face
representando o movimento, outros trabalham por trás das cortinas, como é
o meu caso, que sou muito boa em elaborar textos políticos e
argumentativos, mas nunca me mostro ao público, pois tenho motivos para
me esconder.
Diferente dos demais membros, não estou nessa luta por motivos
patrióticos, me inseri entre esses jovens porque quero a cabeça de Lennon
Rudolf a qualquer preço e essa foi a única forma que encontrei de obtê-la,
me juntando a esses garotos ricos entediados que abandonaram a faculdade
para aderir ao movimento, acreditando que vão entrar para a história por
meio dessa luta, sem que façam ideia de quem eu seja realmente, sequer
conhecem meu verdadeiro sobrenome.
Estou aqui porque preciso deles, afinal que outra forma eu encontraria de
destruir o presidente de um país que não vai nem até a esquina comprar
cigarros sem que esteja sendo vigiado por uma dúzia de seguranças?
Rudolf mantêm um sistema de segurança mais complexo que o do
presidente dos Estados Unidos à sua volta, pois os membros do antigo
governo, aqueles que lutaram para que Newhart se tornasse um país
independente, também querem a cabeça dele.
Hoje o JUD conseguiu mobilizar a população das maiores cidades de
Newhart em uma manifestação gigantesca que exigia eleições diretas assim
como o afastamento de Rudolf do poder. Foi a primeira grande
manifestação, aquela que teve a cobertura da imprensa de praticamente todo
o mundo e é por isso que estamos comemorando.
Tenho certeza de que nossa noite se estenderá até uma das boates da
cidade.
Kevin me aperta pela cintura, pressionando meu corpo no seu enquanto
sua língua entra na minha boca e fechos olhos, retribuindo ao beijo,
tentando a todo custo me convencer de que sinto alguma coisa por ele, de
que não posso estar em seus braços há tanto tempo apenas pelo interesse em
fazer parte do JUD.
— Vai mais cerveja aí? — A voz de Kate nos alcança de perto, nos
fazendo nos apartarmos. Ela está segurando duas garrafas de cerveja
intactas.
Kate sempre foi afim de Kevin e jamais escondeu isso dele ou de mim,
embora tenha desistido de tentar interferir no nosso relacionamento em
nome da boa convivência entre os membros do movimento.
— Obrigada Kate. — Kevin recebe uma das garrafas da mão dela e fixa
seus olhos brilhantes em mim, sem disfarçar a paixão contida na sua
expressão, enquanto bebe um gole grande.
— Trouxe a outra pra você, Lucy. — Kate declara, estendendo-me a
outra garrafa.
Kevin afasta o gargalo de sua boca em meio a um ataque de tosse,
fixando os olhos arregalados em Kate, embora não seja necessário que diga
uma só palavra para que saibamos o que está pensando.
Todos ali sabem o que acontece quando eu bebo, ou quando fico
estressada, ou emocionalmente abalada. Situações que preciso evitar e que
tenho conseguido com a ajuda de Kevin. Acho que por isso sou mais
apegada a ele que o necessário. Seu amor tem sido um verdadeiro bálsamo
para os meus problemas. Eu sou quase apaixonada por ele pelo simples fato
de que vem me protegendo de mim mesma desde que nos conhecemos.
Já faz meses que nenhum incidente acontece, talvez eu esteja curada e
não saiba. Talvez as longas sessões de terapia com o psiquiatra tenham
servido de alguma coisa, talvez tenham dado resultado. A única forma de
ter certeza é testando os meus limites e é por isso que recebo a garrafa de
cerveja das mãos de Kate.
— Obrigada Kate. — ela sorri de lado, vitoriosa, como quem acaba de
ganhar um jogo de cartas.
Levo o gargalo da garrafa à minha boca, mas antes que tenha a chance de
alcançá-la, Kevin a segura, tirando-a da minha mão.
— De jeito nenhum. — diz ele. — Você sabe que não pode beber.
Olha para Kate como se quisesse atear fogo nela e ela se fasta sem graça.
Abro um sorriso afetuoso, agradecida pelo cuidado que Kevin sempre
tem comigo e seguro sua face entre minhas mãos, carinhosamente, fitando-
o de perto.
Kevin é um sujeito bonito. Só perde para Dylan ali na casa. Tem a minha
idade — vinte e dois anos —, é moreno claro, com cabelos escuros cortados
bem curtos, os olhos são cor de mel e há sempre a sombra de uma barba
sem fazer emoldurando seu queixo másculo. Embora tenha me aproximado
dele com a intenção de me inserir no grupo de revolucionários, atualmente
não tenho dúvidas de que é o homem da minha vida, com quem pretendo
passar o resto dos meus dias.
— Já faz tanto tempo que não acontece. — falo, bem perto do seu rosto
para que me ouça sem que eu precise elevar a voz ao som da música. — E
se eu estiver curada? E se a psicanálise tiver dado resultado?
— E se não estiver?
— Precisamos testar. — dou de ombros.
Kevin demora alguns instantes para falar, embora não desvie seus olhos
dos meus.
— Tem certeza de que é isso o que você quer?
Eu não tenho certeza mais de nada, a não ser de que a coisa que mais
quero nessa vida é estar curada. Quero isso até mais do que a ruína de
Rudolf. Eu desistiria de tudo por uma cura. Se tivesse alguma coisa na vida,
daria tudo em troca de nunca mais correr o risco de mudar, de nunca mais
me tornar uma pessoa que não sou, de nunca mais me transformar em um
ser monstruoso, capaz de tudo pela devassidão e pela luxúria, capaz de
magoar os sentimentos de Kevin de forma tão dolorosa, de não ligar para
mais nada que não os prazeres da carne.
Acho que é isso o que mais me prende a Kevin: o fato de ter sido traído e
magoado tantas vezes e ainda assim continuar me amando e cuidando de
mim.
— Sim, eu quero testar. — falo, estendendo a mão para a garrafa que ele
segura, a esperança brotando dentro de mim, o desejo de ter certeza de que
estou bem incendiando em minhas entranhas.
Ele me entrega a cerveja de volta resignado, ciente do que vai acontecer
se eu estiver errada, de que no final será o mais magoado.
Bebo o primeiro gole, nada sinto. Sorrio para o meu namorado,
satisfeita, enquanto ele continua me encarando desconfiado, não
convencido.
Bebo outro grande gole e mais outro. Me sinto tonta, mas é só isso.
Estou feliz porque o pior não está acontecendo.
Dylan e os outros rapazes se aproximam de nós para falarem com Kevin,
estão um pouco bêbados, por isso não percebem que estou bebendo
também. Se mostram animados, sorrindo como não costumam sorrir com
muita frequência e precisam alterar o tom da voz para serem ouvidos além
da música. Estão combinando de irmos a uma casa noturna dançarmos e
continuarmos comemorando lá, exatamente como imaginei que fariam.
Kevin se distrai e me afasto, me sentindo tonta, com meu corpo mais
leve pelo efeito da cerveja. Me sinto bem, como nunca me senti antes com o
álcool, pois costumo me perder logo no segundo gole. Mas desta vez é
diferente, já estou terminando a garrafa e nada de ruim aconteceu. Minhas
esperanças aumentam.
Abandono a garrafa vazia sobre a mesa e vou até a caixa de isopor a um
canto pegar outra. Abro e bebo outro grande gole. Percebo que as outras
garotas estão me observando, de soslaio. Olho para Kevin, ele também está
de olho em mim. Todos estão esperando pela mudança. Isso me irrita,
porque dá a impressão de que sempre esperam o pior da minha parte.
Minha irritação se transforma em raiva, o sentimento queimando em
minhas entranhas, mais forte que o necessário para a circunstância. Posso
sentir minha face ficando vermelha e é então que sei estou perdida.
Nervosa, abandono a garrafa quase cheia no chão e corro para o quarto,
ciente do que vai acontecer. Olho para as paredes nuas, cor de creme, do
quarto grande desprovido de móveis, para as nossas roupas empilhadas
sobre algumas cadeiras, para os colchonetes forrados no chão, onde Kevin e
eu dormimos. Isso me causa náuseas violentas, a bili sobe pela garganta,
mas não vomito.
Minha mente é invadida por cenas bizarras de alguém entrando em meu
quarto, não aquele quarto, nesse estou em uma cama com dossel, usando
um conjunto de moletom, meio dormindo, meio acordada. O invasor senta-
se na beirada da minha cama, afundando o colchão com o peso dedo seu
corpo. Não sei distinguir se realmente são lembranças, como todos os
psicanalistas por quem passei disseram, pois não me lembro de ter sido
molestada sexualmente por ninguém.
Nessas “lembranças”, não sei onde estou ou quem é aquele homem, só
sei que posso sentir a mão grande e áspera dele percorrendo meu corpo por
sob minhas roupas, tocando diretamente minha pele e náuseas me tomam
violentamente.
Não quero abrir os olhos para ver quem é, só quero fugir.
Nas cenas que se projetam em minha mente em seguida, estou na chuva,
encharcada, uma porta se abre diante de mim, uma sala semiescura se
revela. Algo terrível acontece, não sei o que é, mas posso sentir o mesmo
nojo de quando aquele homem me toca e, então, a raiva me toma de tal
maneira que me faz querer gritar, querer matar aquele homem e ao mesmo
tempo querer morrer.
Dou um soco forte na parede e grito com a dor que causei no meu pulso.
“Merda. Ela está vindo” É o meu último pensamento antes que tudo se
perca na negra escuridão.
Samantha.
Porra! O que aquela louca fez com a merda do pulso? Está doendo
muito, pior que isso, está latejando.
Mas isso não interessa tanto. O importante é que estou aqui e pelo gosto
de cerveja em minha boca já sei como cheguei. Quanto tempo se passou
desde a última vez? Não faço ideia.
Fico quase deprimida ao olhar para o quartinho ridículo sem móveis, a
bagunça de roupas amontoadas nas cadeiras, os colchonetes horrorosos no
chão. Como alguém pode suportar viver assim, quando há a opção de ter
uma vida muito mais divertida?
Minha garganta queima com a necessidade de uma bebida mais forte e
de um cigarro, meu corpo ocioso clama por uma boa farra, por dançar até
doer meus pés, por saltar de bungee jumping, correr descalça na praia, voar
por sobre o mar em um hidroavião e depois pousar na água, por dirigir em
alta velocidade e por fazer sexo selvagem com um estranho qualquer, de
preferência que seja tatuado e musculoso, como o último.
São necessidades que me tomam como uma sede descontrolada que me
consome, a qual precisada ser saciada antes que me mate.
Para isto preciso arranjar um jeito de escapar daquele apartamento. Sei
que o ridículo do Kevin logo estará aqui, preciso sair depressa, antes que ele
possa me alcançar e tentar me impedir de fugir como sempre faz.
Corro para a janela de incêndio, minha velha aliada e solto um palavrão
ao constatar que colocaram uma grade nela, na certa para me impedir de
sair.
Não tem outro jeito, preciso sair pela frente, passar pelos amigos
nojentos da songa monga e ter que ouvir as lamúrias deles. Gente chata.
Deviam me deixar em paz.
Sei que minha aparência está ridícula, parecendo uma caipira com aquele
jeans surrado, a blusinha de malha com a imagem de um urso de pelúcia na
frente e tênis. Meus cabelos longos estão presos num rabo de cavalo e não
uso maquiagem. Posso dar um jeito nisso depois, antes preciso correr para a
minha liberdade.
Ao me dirigir para a porta, trombo com o patético do Kevin que vai
entrando no quarto. Eu podia fingir que ainda sou a songa monga da
namorada dele, para ganhar sua confiança até conseguir escapulir, mas sei
que ele nos difere pelo olhar, além do mais eu não teria saco para falar com
ele de mansinho e ainda por cima correr o risco de ser beijada por aquela
boca. Não que ele seja feio, só não vou com sua cara mesmo.
— É melhor você não tentar me impedir, cara. — falo. — Vou sair daqui
e você não pode fazer nada. Se insistir grito até que um vizinho ouça e
chame a polícia. Você sabe que sou capaz disso.
Ele me olha com desespero, como se fosse chorar a qualquer momento e
isso me dá nojo. Eu o odeio por ser tão fraco. Odeio demais.
— Lucy... por favor... — ele murmura e tenho vontade de dar-lhe um
soco no rosto.
Teria dado se meu pulso direito já não estivesse tão dolorido.
— Não me chama assim. Não sou a sonsa da sua namorada. Meu nome é
Samantha. E vou sair dessa merda de lugar queira você ou não. Agora sai
da minha frente, seu babaca.
Como eu esperava, ele termina de entrar no quarto e tranca a porta por
dentro, guardando a chave no bolso da sua calça.
— Daqui você não sai enquanto não me devolver a minha Lucy.
Minha nossa! Como ele é patético. Estou tremendo de raiva, mas só
consigo sorrir do quanto ele é ridículo. Gargalho alto, incessantemente,
enquanto ele me olha como se eu fosse louca. Acho que sou um pouco
mesmo.
— Foi você quem pediu. Eu te dei a opção de me deixar sair por bem. —
ameaço, com o plano B em mente.
Eu sempre tenho um plano B para tudo, porque não posso permitir que
nada me impeça de viver.
Procuro algo pelo quarto que possa atirar sobre ele e afastá-lo do meu
caminho, mas não há nada ali naquela pobreza, só roupas sobre cadeiras e
colchonetes. Corro para a janela de incêndio, enfio a cabeça por entre as
grades e começo a gritar por socorro como uma desesperada, enquanto o
pateta me pede para parar.
É início de noite. A rua está movimentada lá embaixo e parece me
chamar para viver. Sei que os pedestres que passam não podem me ouvir
daquela distância, mas as pessoas dos outros apartamentos podem e Kevin
sabe disso, pois logo destranca a porta.
— Está bem pode sair. Só pare de gritar, por favor. — ele diz, derrotado.
Olho para ele e vejo o quanto é fraco e ridículo e sorrio mais um pouco
da sua cara.
Saio do quarto quase correndo, a sede pela vida se intensificando dentro
de mim.
Ao passar pela sala, vejo os amigos da songa monga me olhando com
olhos incrédulos arregalados. São os mesmos de sempre: o cara moreno alto
com olhos prateados, lindo de viver — do tipo em quem eu daria uns
amassos se o encontrasse em outro lugar —; a menina de cabelos negros
escorridos e traços asiáticos; a ruiva com cara de riquinha; uma loira quase
sensual; outra com jeito de sapatão e outros três caras, um deles com óculos
fundo de garrafa e os outros dois com uma aparência bastante comum, até
parecidos, como se fossem irmãos. Estão todos bebendo cervejas, o que é
uma grande novidade, considerando que sempre que os vejo parecem um
bando de nerdes que deviam estar enfurnados em uma sala de aula de
alguma faculdade cara.
Dou gargalhadas da cara de espanto deles e passo direto, deixando o
apartamento. Ao alcançar o corredor, percebo que o imbecil do Kevin e o
cara com óculos de fundo de garrafas estão me seguindo.
— Vão ficar a noite toda atrás de mim, seus pirralhos? — pergunto, indo
depressa na direção do elevador.
— Não estamos atrás de você. É de Lucy. — Kevin diz, com desprezo.
Solto uma sonora gargalhada.
— Na boa, se eu fosse você ficava aí. Não vai querer ver sua
namoradinha sonsa trepando com um motoqueiro tatuado, fazendo coisas
que tenho certeza que você nunca fez com ela.
Vejo o rosto dele ficar vermelho, embora não fale nada.
Chamo o elevador e tento ser rápida ao fechar a porta depois que entro,
mas os dois babacas são ágeis e conseguem entrar.
“Merda! Preciso me livrar desses trastes.”
Na rua, Kevin gesticula para o seu carro vermelho conversível parado no
acostamento e oferece:
— Vem comigo. Eu te levo onde você quiser.
Sorrio alto. Como uma criatura pode ser tão fraca?
Vagarosamente, caminho até o ponto do ônibus ali perto, disfarçando
minhas intenções, tentando manter os dois distantes, pois sei que eles vão
grudar em mim se conseguirem entrar no mesmo ônibus que eu.
Penso em gritar, em fazer um escândalo para que os pedestres acreditem
que eles estão me atacando e os detenham enquanto posso fugir, mas vou
deixar isso para o plano B, afinal já agi assim antes aqui nesse mesmo lugar,
alguém pode desconfiar de que não estou falando a verdade.
Finjo estar pedindo carona, acenando para cada carro que passa na rua,
mas apenas para manter os dois panacas distantes, afinal que motorista
pararia para uma mulher que tem dois caras a secando de longe? Os
ingleses são precavidos.
Logo que o ônibus se aproxima, peço parada e entro. Como eu esperava,
os dois imbecis não conseguem alcançar a porta de entrada a tempo, ou não
quiseram entrar e assim ficam para trás. Sei que vão me seguir de carro,
mas isso já não importa tanto, estando dentro no ônibus estou quase
totalmente livre.
Meu primeiro objetivo é ir a uma casa noturna das boas, beber todas,
dançar bastante e quem sabe finalizar a noite em um motel com um homem
gostoso. Mas para isto preciso de roupas novas, pois não é possível ir a uma
boate das boas vestida como estou e, como sempre, não há dinheiro algum
nos bolsos da calça da songa monga.
Então, escolho o passageiro do ônibus que vou precisar roubar. Analiso
vários e decido pelo homem com terno caro, com cerca de trinta anos,
sentado perto da janela, olhando para o lado de fora, embora pareça
enxergar apenas dentro de si mesmo. Sento-me ao seu lado, perto o
suficiente para que meu corpo roce no seu, o que atrai seu olhar para mim.
Sorrio amplamente para ele e digo “oi”, jogando charme.
Ele se mostra empolgado com o flerte, da forma como os homens
sempre se mostram, acreditando piamente que vão conseguir uma transa
fácil e engatamos em uma conversa monótona sobre o calor que tem feito
nos últimos dias, do qual eu não sei nada, já que da última vez em que
estive aqui estava fazendo um frio horroroso.
Eu continuo me jogando para cima do homem, fingindo um interesse que
está longe de existir, enquanto o ônibus percorre as ruas do centro da
cidade. Quando há uma freada ligeiramente brusca no sinal vermelho, finjo
ter sido lançada sobre minha vítima e aproveito o fato de que ele ficou meio
retardado por acreditar que me joguei com a intenção de experimentar o
calor do seu corpo para assim enfiar a mão no seu paletó e pegar sua
carteira. Bingo! Era só o que eu queria.
Dou a ele um numero de telefone falso, pedindo que me ligue, para
disfarçar o súbito desinteresse e salto na próxima parada, uma esquina onde
há uma pub grande e movimentada.
Os pirralhos param logo em seguida no carro de Kevin.
“Merda! Estiveram me seguindo o tempo todo.”
Antes que eles tenham tempo de pensar, entro na pub e pergunto por uma
suposta saída pelos fundos, para minha satisfação, há uma, para onde a
garçonete me conduz e saio por lá, dando no beco escuro e sujo entre dois
prédios. Mas isso não importa, o importante é que estou livre como um
pássaro.
Caminho apressada pelo beco por alguns minutos e saio na rua
movimentada do outro lado, onde sou atingida por uma lufada de vento frio
que anuncia uma queda na temperatura.
Sob a claridade da rua, abro a carteira roubada a fim de checar quanto
dinheiro tenho. Não é muito, mas é suficiente para o que eu preciso até
achar outro babaca para roubar, o que não é nem um pouco difícil. Tiro o
chumaço de dinheiro, enfio no bolso da calça e jogo a carteira fora.
Pego um taxi e vou direto para uma loja de roupas que já conheço e sei
que está aberta nesse horário. Enquanto percorro as ruas claras e
movimentadas, sou invadida por uma inigualável sensação de liberdade,
como se tivesse todo um mundo diante de mim esperando para ser
descoberto. Eu preciso explorar esse mundo, tenho sede dele como alguém
no deserto tem sede de água e preciso fazer isso depressa porque não sei
quanto tempo tenho. A qualquer momento, posso não estar mais aqui. Isso
me enfurece. Não é justo que eu não tenha o direito de viver plenamente, de
ter uma vida só minha, de ter que dividir os meus dias com aquela songa
monga que sequer sabe viver. Um dia ainda arranjo um jeito de me livrar
dela.
Algumas horas depois estou entrando em uma das mais badaladas
danceterias da cidade. Onde há luzes coloridas — poucas delas, o que deixa
o ambiente meio escuro — um bar movimentado, pista de dança e garotas
seminuas dançando em pequenos palcos suspensos.
Agora estou vestida como quero, com um vestidinho minúsculo preto,
ligeiramente brilhante, com frente única e as costas nuas, cuja saia deixa
minhas coxas á mostra. As botas de salto alto e cano longo ajudam a me dar
sensualidade. Meus cabelos estão soltos como gosto, com as ondas loiras
ligeiramente frisadas, balançando enquanto caminho e meu rosto, antes
pálido, agora é ressaltado pela maquiagem escura, o azul dos meus olhos
em destaque pelos cílios longos.
Por onde passo sou alvo dos olhares masculinos e é disso que gosto, de
ser desejada, cobiçada. Isso me faz sentir importante, melhor que as outras
mulheres. Me proporciona também uma extraordinária sensação de poder,
de que posso manipular aqueles homens a fazerem tudo o que eu quiser.
Sento-me no bar, cruzo uma perna sobre a outra, exibindo as coxas
firmes que saltam do vestido e peço uma vodka com gelo, ciente de que sou
alvo de olhares maliciosos de todos os lados.
Estou saboreando minha bebida quando acendo um cigarro e me viro
para olhar em volta, inspecionando o ambiente, procurando um homem que
pareça aventureiro o suficiente para me proporcionar momentos de diversão
e selvagem o bastante para me dar uma noite de prazer. Preciso disso, não
como uma vontade, mas como uma necessidade.
Olho à minha volta e por um segundo, acho que escolhi o lugar errado
para entrar. A danceteria está cheia de homens caretas, usando terno e
gravata, parecendo uns almofadinhas tão sem graça quanto o namoradinho
da Lucy.
Mas que saco! Onde estão os caras tatuados usando jaqueta de couro e
um corte de cabelo excêntrico? Talvez ainda não chegaram, é cedo da noite.
Termino minha vodka e vou para a pista de dança, onde entrego-me
rapidamente ao sabor da música agitada, meu corpo balançado naquele
ritmo frenético que me deixa inebriada. A música parece penetrar em
minhas entranhas com a mesma intensidade com que a vodka passeia pelo
meu sangue, deixando-me solta e leve.
Minha nossa! Como sinto falta disso! Como queria poder viver isso
todos os dias! Como queria poder viver!
Logo uma rodinha de homens engravatados se forma à minha volta,
disputando entre si a minha atenção e sinto que tenho poder sobre todos
eles, que são capazes de fazer qualquer coisa por mim. O que me causa uma
sensação maravilhosa.
Mas não me sinto atraída por nenhum deles e não fico com um homem a
menos que ele desperte algo dentro de mim, não sou tão promiscua assim.
Não fico nem quando preciso roubar. Nesses casos eu apenas faço com que
acreditem que me levarão para a cama. Mas não preciso roubar agora, ainda
tenho o dinheiro da carteira que peguei no ônibus.
Danço, rebolo e bebo, bebo muito. A custa dos panacas que me cercam,
todos ansiosos para me pagar uma bebida. Jogo charme para todos, flerto
com um ou com outro, apesar de não ter a mínima pretensão de ir para a
cama com nenhum deles.
Já estou suada de dançar, ligeiramente tonta, deliciosamente agitada, do
jeito que gosto, quando uma das dançarinas deixa seu lugar e subo no palco.
Não sei ao certo o que estou fazendo, sei apenas que isso parece divertido e
quero fazer.
Ouço gritinhos e assovios dos homens me incentivando a tirar as roupas
como fazem as outras dançarinas. Não pretendo tirar, mas ameaço,
levantando um pouco a saia, mostrando um pouco mais do meu corpo
enquanto me esfrego de forma sensual na barra de ferro que há ao meio,
simplesmente por que isso me diverte.
Rodopio, rebolo, me esfrego na barra, levanto a saia do vestido e abaixo
de novo, ouço mais gritinhos e assovios.
Sinto que minha diversão é ameaçada quando enxergo os dois babacas
que me seguiam acomodados em uma mesa perto do bar, com os olhos
fixos em mim. Mesmo de longe posso perceber o quanto Kevin está furioso,
com a fisionomia retorcida.
“Mas que merda! Será que não vou conseguir me livrar desses dois?”
É sempre assim. Desde que Lucy começou a namorar aquele idiota, não
faço ideia de há quanto tempo atrás, ele vem atrás de mim, sozinho ou com
o mesmo amigo de hoje. Por vezes consegue me levar de volta para o
apartamento, geralmente quando fico bêbada demais para conseguir
continuar fugindo. Às vezes ele não consegue e me divirto por dias, até que
tudo se apaga e eu me perco de mim mesma.
Da última vez me lembro que arranjei um cara enorme para bater nele e
a surra foi feia. Depois passei a noite fodendo com esse cara em um quarto
de hotel. Seu pau enorme dentro de mim, quase me rasgando por dentro, é a
melhor lembrança que tenho daquela noite.
Antes de Kevin, quando ainda vivia no orfanato, ou mesmo depois que
saí e fui trabalhar como garçonete, ninguém me seguia, eu era livre para
fazer o que queria. Agora tenho que tolerar esse otário atrás de mim.
Preciso me livrar desse imbecil hoje, não posso permitir que estrague o
pouco tempo que tenho.
Com um plano em mente, desço do palco, sem parar de dançar, e vou até
ele. Ao me aproximar da sua mesa, coloco-me diante de si e danço de forma
ainda mais sensual, usando as mãos para mover os cabelos, me mexendo
dentro do vestido curto.
Kevin não resiste, logo seus olhos cor de mel passeiam pelo meu corpo,
sequiosos, arregalados e sua boca se abre para puxar o ar, evidenciando sua
excitação.
Não podia ser diferente, ele ama Lucy, é evidente que sente tesão por
mim.
Sem uma palavra, monto em seu colo, de frente para ele e rebolo os
quadris, sentindo sua ereção se formar sob meu corpo, sem que meu
organismo reaja minimamente. É como rebolar em cima de um objeto
inanimado. Embora ele esteja quente e latejante, eu nada sinto além de
aversão.
Me esfrego com mais afinco, meu sexo colado no seu, meus seios
espremidos contra seu tórax. Ele luta contra o que sente, mas perde a
batalha e leva suas mãos às minhas costas, apertando-me com mais força
contra seu corpo, tentando alcançar minha boca com a sua.
Aproveito seu momento de fraqueza e, sem que ele perceba, tiro a chave
do carro que está pendurada por em chaveiro no cós da sua calça. Era só
isso o que eu queria.
Vitoriosa, sorrio para ele e me afasto, deixando-o entre confuso e
constrangido, parecendo um menino fraco.
Volto para a pista de dança e me esfrego em outros homens para que ele
veja e perceba que deve desistir de mim. Tem um homem de terno e gravata
na minha frente e outro atrás, estão fazendo de mim um sanduíche e a
minha sensação mais prazerosa é ver a cara com que Kevin nos observa.
Não quero nenhum daqueles homens, só quero fugir dali e poder ir para
um quarto de motel, quando encontrar o homem certo, sem que haja
qualquer interferência. Tenho certeza de que vou encontrá-lo, talvez na
minha próxima parada: um bar desses frequentados por pessoas barra
pesada.
Bebo e danço mais um pouco. Disfarçadamente, vou na direção da saída.
Não sei se Kevin está olhando, de onde estou é impossível enxergá-lo. Mas
ele não é tão bobo, pode estar me rondando sem que o veja.
Do lado de fora, preciso correr até o carro dele, estacionado do outro
lado da rua, antes que tenha a chance de me alcançar. Abro a porta, entro e
arranco em alta velocidade pela rua já com pouco movimento devido ao
horário.
Estou a mais de cinquenta metros de distância quando olho pelo
retrovisor e enxergo os dois panacas parados na porta da boate, observando-
me partir e dobro a esquina para sumir de suas vistas.
— Wohooo!! — solto um grito vitorioso, a sensação de liberdade
tomando conta de mim.
Considerando que o próximo passo de Kevin será chamar a polícia para
denunciar o roubo do seu carro e ao mesmo tempo garantir que eu passe a
noite no xadrez em vez de nos braços de algum estranho, preciso sair da
cidade. Estou meio tonta, mas sei que consigo dirigir até Taunton, onde
posso encontrar um bar legal.
Dirijo em alta velocidade, com a capota do carro levantada, extasiada
com sensação de liberdade que o vento gelado, batendo em meu rosto e
esvoaçando meus cabelos, me proporciona. O frio não me incomoda, a
liberdade é mais importante.
Se eu soubesse que é tão bom dirigir um conversível pelas rodovias de
Newhart, teria roubado o carro de Kevin antes. Não sei como nunca pensei
nisso.
Procuro alguma coisa que preste entre os CDs românticos que há no
porta luvas e por fim encontro o de uma banda de rock americana, não é
grande coisa, mas é o melhor que tem ali. Coloco no volume máximo e piso
fundo no acelerador, enquanto canto junto com o vocalista.
Estou em um trecho totalmente deserto da estrada, a possibilidade de
aquilo ser perigoso para uma garota sozinha em um conversível, excita-me.
Mas não excita o suficiente para me manter de olhos abertos. Não tenho
ideia de por quanto tempo durmo, pode ter sido alguns minutos, ou apenas
por uma fração de segundos. Só sei que adormeço no volante e quando dou
por mim estou rodopiando na estrada, com o carro descontrolado, depois de
ouvir um estrondo violento.
De relance, vejo um carro escuro, muito grande, parado ali perto, no
acostamento, acho que bati nele e agora minha vida está em perigo, eu
posso capotar a qualquer momento.
Não há como parar uma coisa daquelas, na hora a pessoa nem consegue
pensar direito, só consegue sentir medo do que vem em seguida: a morte.
Em desespero, lanço um olhar para o outro carro, suplicando por ajuda,
mas afinal o que o outro motorista pode fazer? Parar um carro
desgovernado?
O conversível rodopia umas dez vezes na pista, descontrolado, até que
sai da estrada e é detido pelo tronco grosso de uma árvore, um baque feio
que me lança para o lado tão bruscamente que minha cabeça se choca com
violência contra a porta do carona e tudo se transforma no mais absoluto
silêncio.
Sei que não estou morta, mas estou perdendo a consciência e luto contra
isso com todas as minhas forças, pois sei que se permitir que a escuridão me
devore, corro o risco de não voltar mais, Lucy pode acordar no meu lugar e
ainda não quero partir, não tive tempo de fazer nada de interessante, ainda
não saltei de paraquedas, não corri na praia, não conheci um motoqueiro
selvagem, não voei sobre o mar.
Enquanto luto contra a inconsciência, sinto braços fortes me puxando do
interior do conversível, por cima, sem que a porta seja aberta. São braços
masculinos, cobertos pelo tecido caro de um paletó e me puxam como se
em câmera lenta. Em seguida, sou aninhada em um peito largo masculino e
carregada para uma direção qualquer.
Meu resgatador tem um cheiro bom, cheiro de perfume caro misturado
com suor masculino. O contato do meu rosto com o seu peito, protegido
pelo tecido do paletó, é tão agradável que sinto vontade de cochilar ali, no
conforto daquele tórax que me conduz para a segurança, mas eu não posso
dormir, se for, não voltarei mais e preciso voltar, preciso viver, preciso,
acima de tudo, ver o rosto daquele estranho.
Ele me deita sobre os assentos traseiros de outro carro e lamento que
tenha me afastado do seu contato. Estava tão gostoso.
— Vou colocar você aqui para que vá deitada. Tente não se mover. —
fala ele.
Sua voz é grossa, máscula e ao mesmo tempo doce. Tenho ainda mais
vontade de ver o seu rosto. Tento erguer meu olhar para vê-lo, mas minhas
pálpebras estão pesadas demais, estou quase adormecendo, ou perdendo a
consciência, não sei.
O carro se coloca em movimento, me fazendo balançar muito devagar,
como se me ninasse, mas como eu posso saber disso se nunca fui ninada?
Lucy talvez foi, mas não eu.
Continuo lutando contra a escuridão, mas ela é mais forte do que eu e
logo tudo se perde no infinito nada que me puxa para si.
CAPÍTULO II
Estou em uma cama grande e confortável quando acordo, em meio a
lençóis macios de cetim brancos. Sinto-me confusa, meio atordoada, sem
conseguir assimilar direito o que aconteceu. Pisco várias vezes tentando me
lembrar. Então as lembranças vêm. O acidente, o carro rodopiando na
estrada. Pode fazer dias que aconteceu, ou eu ainda posso estar aqui. Posso
não ter ido embora quando perdi os sentidos. Acho que não fui, ou teria
emergido da escuridão no apartamento onde vive a songa monga.
Tonta pela pancada que levei na cabeça, percorro os olhos ao meu redor,
tentando descobrir onde estou. Com certeza não é um quarto de motel onde
costumo ir com os homens que escolho para sair nas noites de farra, é um
cômodo enorme, cercado de luxo e sofisticação por todos os lados. Há
móveis ali que parecem ter saído direto da Idade Média, embora sejam
novinhos, como se tivessem sido restaurados. As paredes são de um
dourado claro, há cortinas grossas nas janelas enormes e um lustre de cristal
enfeita o teto. Um cheirinho gostoso de limpeza e de coisas novas parece
impregnado no ar.
Levo um susto quando vejo o homem sentado em uma poltrona perto da
parede, adiante dos pés da cama, ligeiramente oculto pelas sombras e sento-
me, vendo tudo girar à minha volta.
— Vá com calma. Você levou uma pancada feia. — ele diz, sem se
mover do seu lugar.
Observo-o atentamente e constato que é o homem mais intrigante que já
vi na vida. Não apenas por ser bonito, embora esse seja um traço marcante
nele, tem algo mais na sua aparência que captura a minha admiração, um
charme diferente, irresistível, presente na forma como ele me olha,
compenetrado, inexpressivo. Tem quase quarenta anos, uns trinta e sete
talvez, e embora eu jamais tenha me sentido atraída por homens mais
velhos, me sinto por ele. Sua postura altiva, seus olhos azuis em contraste
com os cabelos escuros, seu queixo másculo coberto pela barba rala, seu
rosto bem desenhado, tudo nele me deixa meio sem fôlego.
E não é só isso, eu tenho a estranha sensação de que o conheço, de que já
o vi antes, não recentemente, mas há muito tempo. Suas feições parecem
enraizadas em algum lugar obscuro da minha memória. Talvez ele seja
amigo da songa, não sei, mas posso descobrir assim que falar com ele.
Ou quem sabe seja apenas alguém que escolhi em algum bar, com quem
passei a noite. Mas se fosse, eu lembraria.
Como não gosto de pessoas fracas e menos ainda de ser uma delas,
ignoro a tontura e o peso em minha cabeça e levanto-me. Percebo que ainda
uso o vestido preto que comprei com o dinheiro roubado, então realmente
ainda não fui embora, ainda estou na mesma noite. Estou descalça, as botas
estão ao lado da cama.
— Quem é você? — pergunto, encarando aquele homem sem disfarçar o
fogo que emerge dentro de mim, enquanto ele me olha de volta sem
expressão alguma no rosto bonito.
— É sério que você não sabe quem sou eu? — ele parece se divertir com
a minha pergunta.
Me ocorre que talvez tenhamos passado a noite juntos e não lembro de
nada. Ou então ele deve ser algum artista famoso, cujo nome não me
recordo, por isso vi aquela estranha familiaridade em seu rosto.
— Não mesmo. — dou de ombros, atribuindo pouca importância a quem
seja ele.
Para mim é apenas um homem que pode me proporcionar momentos de
prazer e diversão.
Não é o motoqueiro tatuado que eu escolheria, aliás está mais para um
almofadinha, usando uma camisa branca com as mangas enroladas até os
cotovelos e calça social, mas exerce uma atração forte demais sobre mim.
Me movendo com uma sensualidade disfarçada e ainda lutando contra a
tontura, aproximo-me dele, ansiosa por tocá-lo, por ser tocada, meu corpo
parece inerte, ocioso, sequioso de luxúria.
Apesar de saber que a songa tem relações sexuais com seu namoradinho
insuportável, eu sinto como se meu corpo não fosse sexualmente saciado há
décadas. Existe uma necessidade quase urgente dentro de mim pelo prazer,
um prazer que aquele estranho pode me dar.
— Onde estou e como vim parar aqui? — pergunto, pouco me
importando com a resposta, satisfeita por ter capturado a atenção dele para
as minhas curvas.
— Você estava dirigindo embriagada. — fala com tom de acusação.
Levanta-se, vai até um frigobar que há a um canto e se serve de uma dose
de uísque.
Em pé é ainda mais charmoso, tem cerca de um metro e oitenta, é
esguio, embora tenha ombros largos. Sua postura é naturalmente altiva, o
que lhe confere uma elegância gritante. — Bateu no meu carro, rodopiou
várias vezes na pista e por fim bateu em uma árvore. Não se lembra disso?
Ele bebe um gole do uísque e usa sua língua para limpar o excesso da
bebida dos lábios, o que causa um comichão entre minhas coxas.
Instintivamente, passo a língua pelos meus lábios também, satisfeita ao
ver que seus olhos registram meu gesto.
— Não lembro. — Minto, antes de reduzir a distância entre nós, me
colocando tão perto que posso sentir o cheiro do uísque em seu hálito,
misturado com cheiro de cigarro, um verdadeiro afrodisíaco, pois me faz
lembrar de sexo. Muito devagar, ele desce o olhar cheio de luxuria pelo meu
corpo, examinando cada detalhe, antes de voltar a me encarar sem
expressão alguma. — E onde você entra nessa história? — sorrio de forma
sexy.
— Eu tirei você do carro e te trouxe pra cá. Estamos na minha casa. O
médico já examinou você e disse que não foi nada sério. Mesmo assim
recomendou que você descanse.
— Ah, mas eu não estou cansada. — elimino totalmente a distância entre
nós, encostando meu corpo no dele, passando a unha crescida, pintada de
cor de rosa, no primeiro botão da sua camisa. — Pelo contrário. Estou
muito a fim de me divertir e acredito que você e eu possamos fazer muitas
coisas divertidas aqui. — mordo meu lábio inferior e tento abrir o botão por
onde minha unha passou, mas ele sorri meio de lado, sem deixar
transparecer o significado daquele sorriso e se afasta.
Quando um homem se mostra difícil, só consegue me deixar ainda mais
interessada.
— Você não está em condições de fazer nada do que está pensando. —
estuda minha reação e faço um biquinho de contrariedade. — Pelo menos
não hoje.
— Mas eu estou bem e quero fazer.
Tento me aproximar de novo e novamente ele recua.
Mas que saco! Por que tudo o que vale à pena tem que ser difícil?
Aquele homem deve valer muito à pena. Qualquer outro no lugar dele já
estaria arrancando minhas roupas.
Ele abandona o corpo sobre uma mesinha com tampo de vidro, cruza os
braços na frente do corpo e sorri de novo, novamente de forma enigmática.
— Você costuma ser sempre direta assim?
— Só quando quero muito um homem.
— Mas a gente nem se conhece. Você acabou de dizer que não sabe
quem sou eu.
— E tem maneira melhor de nos conhecermos que nos divertindo?
— Sim. Nos apresentando.
Reviro os olhos diante de tanta caretice, mas cedo ao joguinho e lhe
estendo minha mão.
— Muito prazer, sou Samantha.
— Lennon Rudolf. — ele fala e seu nome me parece tão familiar quanto
seu rosto, familiar de um jeito estranho, ruim, pois cada pelo da minha nuca
se eriça, sem que eu compreenda a razão.
Entretanto, essa sensação desagradável deixa de existir quando ele
segura minha mão, o contato tão simples enviando correntes de calor que
descem pelo meu corpo e se acomodam dentro da minha calcinha.
Puta merda! Eu seria capaz de ter um orgasmo só segurando a mão dele.
— Pronto, agora que nos conhecemos, podemos pular para a etapa
seguinte? — pergunto.
Quero me aproximar, mas tenho a impressão de que ele se esquivará de
novo, então fico parada.
Lennon sorri, desta vez mais amplamente, exibindo dentes perfeitos.
— Hoje não. — examina minha reação de decepção. — Mas isso não
significa que não possa acontecer em outra ocasião. — pega seu uísque e dá
um grande gole, depois devolve o copo à mesinha.
— Por que não? Eu posso não estar mais aqui em outra ocasião. — eu
não quis dizer isso em voz alta.
— Porque você não sabe nada sobre mim e nem eu sobre você.
— Não preciso de muita informação para o que quero de você.
Ele sorri novamente e isso está começando a me afetar de verdade.
— Sim, precisa. Para começar, você deve saber que não sou o tipo de
homem que se envolve em um relacionamento afetivo com uma mulher.
Não gosto desse tipo de coisa, por isso não tenho namoradas só amantes.
Mulheres que precisam ter plena consciência de onde estão se metendo e de
que tudo estará acabado no instante em que eu decidir.
— Cara, você fala de sexo como se falasse de negócios. Relaxa. Curte a
vida. Eu não quero namorar com você. Só quero me divertir um pouco.
— Sexo não é muito diferente de um negócio. — não resisto e solto uma
sonora gargalhada. — Digo isso porque tudo tem que ser combinado antes,
para que não haja equívocos depois.
— Tá. Onde pego a senha para me tornar sua amante?
— Você é mesmo direta. Estou impressionado.
— Não vejo porque fazer rodeios se sei exatamente o que quero.
— E o que você quer, Samantha?
— Você.
— Assim, sem saber nada sobre mim?
— Pra desejar uma pessoa, eu não preciso pensar, mas apenas sentir. E
sinto que quero você, todo o meu corpo clama por isso agora. É o que me
basta.
Ele bebe outro gole de uísque.
— Qual a sua idade? Onde mora? Trabalha com o que? E o que fazia
dirigindo bêbada ontem a noite?
— Minha nossa! Isso está parecendo uma entrevista de emprego.
— Eu sou o tipo de homem que precisa conhecer bem todos os que estão
à minha volta.
— Ok. Tenho vinte e cinco anos, estou desempregada, fui despejada
ontem por não pagar o aluguel e por isso peguei um porre. Estou sem ter
onde morar atualmente. — minto, descaradamente.
Mentir é muito fácil. Faço isso tão bem que sou capaz de convencer
qualquer um do que eu quiser.
— De quem é o carro que você dirigia e o que ia fazer em Taunton?
— Do meu ex namorado. Terminamos há alguns dias, mas ele tem
dificuldade de aceitar isso. Decidi sair para me divertir ontem e ele me
seguiu. Então peguei o carro. — como se alguma coisa naquele homem me
puxasse para si, aproximo-me devagar e desta vez ele não recua. Meu corpo
está quase encostado no seu. Toco seu tórax musculoso, por sobre o tecido
da sua camisa e sinto uma energia intensa, deliciosa, partindo do seu corpo
sólido, um calor que me afeta, fazendo meu sangue esquentar nas veias. Sei
que vou me acabar de prazer quando estiver na cama com ele. — E então,
fui aprovada na entrevista?
Ele novamente abandona seu copo sobre a mesinha ao seu lado. Não se
afasta desta vez, como também não me toca, parece frio demais, apesar de
estar escrito em seu olhar que também me deseja.
— Vinte e cinco anos? — ele parece perceber que estou mentindo.
— Na verdade tenho vinte e quatro e meio. — com um passo, elimino a
distância entre nós, encostando meu corpo no dele, sem que desta vez ele se
esquive.
Quero me divertir com aquele homem enquanto posso, pois logo pode
ser tarde demais. Então, antes que ele tenha tempo de pensar abro o
primeiro botão da sua camisa ao mesmo tempo em que fico na ponta dos
pés para levar meus lábios até seu pescoço, onde planto uma trilha de
beijos.
Sua pele é suave e tem um cheiro gostoso que me excita.
Ele permanece imóvel e embora nada demonstre, sei que está lutando
para resistir. Só não entendo o porquê. Se é um homem que não gosta de
compromisso, devia aproveitar a oferta de sexo tão fácil e depois se livrar
de mim. É assim que os homens costumam agir, não é?
O cheiro dele é realmente muito bom, uma mistura de perfume caro com
uísque e cigarro, o que funciona como um tipo de afrodisíaco para mim, é o
cheiro da luxúria, pois onde há sexo há também o álcool e cigarros.
Enfio os dedos no botão aberto da sua camisa, extasiada ao tocar o tórax
rijo, sólido e quente. Imagino aquele tórax esmagando meus seios, sem o
empecilho das roupas e sou tomada por uma violenta corrente de tesão.
No entanto, ele se afasta de novo.
— Não podemos fazer isso. — fala, calmamente. — Você sofreu um
acidente e embora não tenha sido grave bateu a cabeça com força. Precisa
se recuperar antes.
— Antes? — aquilo já é um começo.
— Sim. Amanhã levo você para um apartamento que tenho em Taunton.
— É onde mantém suas amantes?
Me recordo de que ele voltava de Taunton quando bati no seu carro. Será
que vinha da casa de alguma amante?
— Você disse que não tem onde morar. Quero ajudar.
— Só isso? — mas que homem difícil!
Ele sorri de lado, de um jeito safado que seria capaz de deixar qualquer
mulher de cacinha molhada. A minha está desde que comecei a falar com
ele.
— Não é só isso.
— Então serei sua amante?
— Sim. Se concordar que seja da forma como falei: sem envolvimento
afetivo e ciente de que pode terminar quando eu decidir. Por outro lado,
você terá tudo o que precisar: roupas, cartões de crédito, carros e
empregados, desde que em troca esteja sempre à minha disposição.
Minha nossa, ele fala como alguém que está fechando um negócio. Isso
parece tão engraçado que gargalho alto.
Sexualmente falando, esse homem é muito parecido comigo: prático e
direto. Sua proposta é irrecusável, afinal que mulher não adoraria ter tudo o
que ele está oferecendo e de quebra ainda ser sua? Entretanto, eu não tenho
tempo para esperar, posso não estar mais aqui amanhã e duvido que a songa
troque seu namorado imbecil por um homem como aquele. Ela é puritana
demais, sensata demais, não se entrega à vida como deveria, não corre
riscos, não mergulha de cabeça naquilo que vale à pena, ela é o meu lado
que mais desprezo, o oposto de mim.
— Combinado. Amanhã serei sua amante. Tenho que discordar em
apenas um ponto: quero você neste momento.
Sob o olhar surpreso dele, dispo-me devagar do vestido, satisfeita ao ver
seus olhos azuis registrando cada um dos meus movimentos. Depois, tiro a
calcinha minúscula e ele me devora com o olhar.
Sei que não vai resistir, homem nenhum resiste a uma mulher
completamente nua, ansiosa por se entregar.
Lennon examina cada detalhe do meu corpo, demorando-se mais nos
meus seios e na minha intimidade, parecendo um animal faminto que
observa sua presa. Percebo que tenta lutar conta si mesmo, mas por fim é
derrotado pelo próprio desejo e solta um palavrão antes de avançar para
mim, atacando-me como uma fera no cio.
Seu braço forte enlaça minha cintura e ele me puxa com força, chocando
meu corpo no seu com uma brutalidade gostosa, para em seguida tomar
minha boca, beijando-me de forma selvagem, enterrando a língua na minha
boca, me deixando completamente sem chão.
Dominada pela luxúria, agarro-o pelo pescoço e me perduro nele,
esfregando meu corpo no seu, o contato me parecendo tão essencial quanto
o ar em meus pulmões.
Lennon é implacável. Com sua mão livre, segura meus cabelos atrás da
cabeça e puxa com força, sem apartar sua boca da minha, enquanto que
escorrega a outra mão para a minha bunda, infiltrando-a na fenda entre
minhas nádegas, alcançando minha intimidade. Quando acaricia a entrada
da minha vagina, toda melada, um gemido rouco, meio selvagem, parte da
sua boca e morre na minha, quando então ele me carrega para a cama,
deitando-me de costas, acomodando-se sobre mim.
Eu estou em chamas sobre o colchão, o tesão pulsando em minhas
entranhas com uma intensidade absurda. Abraço seus quadris com as
minhas pernas e esfrego minha intimidade lambuzada na sua ereção
protegida pelo tecido da calça, ansiosa, quase desesperada por senti-lo
dentro de mim. Todavia, sem que eu espere, ele simplesmente se afasta,
abandonando-me ali entre os lençóis, nua e trêmula de desejo.
— Não posso fazer isso. — ele declara, respirando pesadamente
enquanto jogo a barra da camisa sobre a protuberância na sua calça. —
Você está machucada, precisa descansar. Além do mais isso está indo muito
rápido, as coisas não podem ser assim. — ele fala depressa, sem me dar
espaço para protestar. — Fique aqui e descanse. Prometo que volto logo
cedo para te levar a Taunton. Boa noite.
Com isto, deixa o quarto, antes que eu tenha tempo de convencê-lo a
ficar.
Permaneço imóvel na cama, paralisada, incrédula, tentando aplacar o
fogo dentro de mim e fazer minha mente trabalhar em sobre o que fazer.
Por fim a fúria me toma com toda força e esmurro o colchão, como se
aquilo fosse capaz de me acalmar. Cogito ir embora daquela casa agora
mesmo e nunca mais voltar, só para que aquele homem se arrependa por ter
perdido a chance de me possuir. Embora seu motivo tenha sido nobre, me
fez sentir rejeitada e a rejeição não é algo com o que eu esteja acostumada a
lidar. Jamais antes desejei um homem sem que o tivesse conquistado.
Mesmo quando era ainda quase uma menina e morava naquele maldito
abrigo para menores, eu já me divertia com eles e tinha todos que desejava.
Costumava fugir e ficar fora por vários dias, aproveitando aquilo que a
vida tem de melhor a oferecer. Sempre fiz por prazer, pela emoção, pela
luxúria que existe em abundancia dentro de mim e nunca por interesse.
Embora recebesse propostas tentadoras de homens abastados que poderiam
ter me tornado uma pessoa rica, nunca quis o dinheiro de ninguém, nunca
fui para a cama com um homem sem que o desejasse. Mas ia com muitos,
com qualquer um por quem me sentisse atraída.
Me lembro que tinha dezesseis anos quando aconteceu um acidente com
um preservativo e fiquei grávida de um garoto qualquer com quem passei
algumas noites de farra. A songa monga certamente pretendia ter aquele
filho, pois quando voltei a mim ele ainda estava lá em meu corpo e me
apressei em me livrar dele antes que não tivesse mais a chance.
Quem ia querer ter um filho com dezesseis anos de idade?
Penso em ir até o frigobar no canto do quarto e me servir de um uísque,
mas está tão confortável na cama que desisto da ideia. Ajeito-me mais sobre
o colchão macio, ficando ainda mais aconchegada e minhas pálpebras se
tornam pesadas demais. Ainda estou meio tonta pela pancada na cabeça e
meu coração ainda bate forte pelo turbilhão de sensações que experimentei
quando aquele homem me beijou e me tocou. Poderia ir em busca de
satisfação nos braços de outro qualquer, mas estou tão cansada que não sou
capaz de ir a lugar nenhum esta noite.
Talvez Lennon tivesse razão quando disse que eu estou machucada,
talvez eu realmente necessite de uma noite de sono. Só espero que ainda
esteja aqui quando acordar, pois o quero demais para perder a chance de ser
sua amante como ele propôs, ou de pelo menos passar algumas noites em
seus braços. Vale a pena esperar por aquele homem.
Ainda tenho o gosto da sua boca na minha quando o sono me engole de
maneira fugaz.
CAPÍTULO III
Lucy.
Estou completamente nua, em uma cama grande e confortável quando
acordo. Não preciso pensar muito para ter consciência do que aconteceu,
embora não consiga me recordar de nada. O primeiro sentimento que me
toma é a culpa. Culpa por ter magoado Kevin mais uma vez, da forma como
ele não merece.
Sinto vontade de esmurrar a mim mesma por permitir que isso tenha
acontecido de novo.
É sempre assim quando ela vem: eu acordo nua em um quarto de motel,
ou por vezes em lugares piores, às vezes acompanhada de um estranho, às
vezes abandonada. Geralmente meu corpo está todo dolorido,
principalmente o colo do meu útero, pelo excesso de sexo. Isso sem
mencionar que estou sempre de ressaca e com gosto de cigarro na boca.
Procuro por qualquer um desses sinais em meu corpo, mas desta vez não
encontro nada a não ser uma leve dor na cabeça e uma ressaca muito
distante. Devo ter ficado fora de mim por pouco tempo ou aquele monstro
que vive em meu ser se satisfez com pouca coisa, o que eu duvido muito.
Fico deprimida em pensar nisso, sinto vontade de chorar por existir um
mal tão grande dentro de mim, um mal que não pode ser contido, nem com
terapias, nem com medicamentos, que vem me destruindo aos poucos desde
muito tempo e agora também a Kevin. No lugar dele eu já teria desistido de
mim e estaria com uma garota saudável e normal. Mas Kevin me ama a
ponto de suportar ser traído, humilhado e por vezes até machucado. Não me
considero merecedora do tanto amor e preciso ser grata a ele por amar
assim.
Levanto-me devagar, espreitando o ambiente com cuidado. Não faço
ideia de onde estou, só sei que não é um quarto de motel barato como na
maioria das vezes, pelo contrário, o ambiente é sofisticado e cercado de
luxo. Um quarto muito grande, com paredes douradas, móveis antigos
restaurados que parecem ter sido arrematados em leilões por uma quantia
absurda.
Meu Deus, que lugar é esse? O que aquela louca aprontou desta vez?
Procuro por roupas. Não estranho que estejam no chão, uma calcinha
minúscula, um vestido preto vulgar e botas. Visto-me, sentindo-me mais
nua que antes naquele traje indecente. Vou até o banheiro, tão luxuoso
quanto o quarto, e lavo a maquiagem escura do rosto. Os cabelos estão
soltos, emaranhados, os umedeço um pouco para domar o frizz e prendo-o
todo em uma trança de lado.
Volto para o quarto, exploro o ambiente tentando descobrir onde estou.
Olho no closet enorme, está completamente vazio, deve ser um quarto de
hóspedes. Abro as cortinas das gigantescas janelas em formato oval e fico
pasma ao observar o lado de fora. O lugar me é bastante familiar, o vejo na
televisão quase todos os dias e até já vi pessoalmente algumas vezes,
embora nunca tenha entrado. Estou no segundo andar do que parece ser o
palácio de Chambers, residência oficial de Lennon Rudolf, meu pior
inimigo.
Não pode ser. Esfrego os olhos só para ter certeza de que estou vendo
direito, mas não há como duvidar, está tudo lá: os seguranças armados com
armas pesadas; os guardas uniformizados que servem mais como um
enfeite; o enorme jardim muito bem cuidado; a famosa fonte com a estátua
de um anjinho melancólico derramando água de um jarro.
Minha nossa! Como vim parar aqui? Na certa devo ter sido sequestrada.
Não pelo presidente, porque ele está ocupado demais em arruinar o país
para ter tempo de perseguir revolucionários. Algum de seus ministros ou
seguranças deve ter me encontrado bêbada e me trazido a fim de me manter
em cativeiro para evitar que o JUD continue agindo contra o governo. A
manifestação de pessoas nas ruas que conseguimos organizar no meu último
dia de lucidez foi grande demais, deve ter tido um impacto enorme na
imagem de Rudolf pelo mundo afora e agora seus puxas sacos querem nos
destruir.
Por Deus! O que aconteceu com os outros? Será que pegaram Kevin
também?
“Preciso descobrir o que está acontecendo”
Exploro o quarto, procuro por um telefone, não há, nem mesmo uma
bolsa feminina onde poderia existir um celular. Tento a porta, surpreendo-
me ao constatar que está destrancada. Talvez um descuido do meu raptor.
Saio sorrateiramente, sem fazer barulho. Estou em um corredor largo,
enorme, com o teto muito alto, todo iluminado com luzes douradas, com
portas gigantescas ovais em ambos os lados.
Imagino que por trás de uma daquelas portas esteja o aposento de
Lennon Rudolf e o quanto é estranho que eu esteja tão perto do lugar onde
dorme o homem que destruiu minha família e arruinou minha vida, a quem
passei a odiar desde muito cedo. Se não fosse por ele, meu pai ainda estaria
vivo, minha mãe não estaria internada em um hospício, eu não teria sido
separada do meu único irmão e minha adolescência não teria se perdido em
um abrigo para menores. Se não fosse pela sede de poder daquele
miserável, eu teria uma vida normal, pois minha família ainda existiria, no
entanto, ele acabou com tudo, destruiu qualquer chance de existir felicidade
em minha vida.
Há um guarda uniformizado parado perto da escadaria, acredito que ele
vá tentar me deter, mas o cara não se move, parece uma estátua. Passo por
ele devagar, apreensiva, preparada para o pior, mas nada acontece. Então,
desço a larga escadaria, lentamente, dando em um gigantesco salão que
mais parece um museu, repleto de obras de artes, de esculturas a quadros de
artistas consagrados pendurados nas paredes douradas, os móveis são
também antigos e restaurados, como se viessem da idade média. O teto é
alto, com vários lustres caros pendurados.
Apesar de caminhar devagar, com cautela, meus passos ecoam no espaço
enorme. Não faço ideia de para que lado fica a saída, sigo para uma direção
qualquer, me deixando guiar por meus instintos, esperando que a qualquer
momento apareça alguém para me deter.
Atravesso outro salão como aquele, enorme, com uma decoração rústica
e cara. Neste há uma mesa com lugar para umas vinte pessoas, quadros
caros e teto alto com lustres extravagantes. Me pergunto porque alguém
precisa de tanto espaço para viver.
Dali, dou em outro salão. Este é menor, com uma decoração mais
modesta, há um jogo de sofá com mesinha de centro, uma janela ampla
escancarada que dá para o jardim dos fundos, por onde acredito que possa
sair. Há também uma lareira e diante dela uma mulher sentada em uma
cadeira de rodas, imóvel como uma estátua, apática, abatida.
Aproximo-me a fim de checar se está bem e fico surpresa ao constatar
que se trata de Ruth, a mãe de Rudolf. Não a mulher bonita e glamorosa
cujas fotografias estão sempre estampadas nas revistas e jornais.
Pessoalmente parece ser muito mais velha, com seus cabelos grisalhos
emaranhados caindo sobre o rosto pálido e enrugado. Tem a fisionomia tão
sofrida que sinto compaixão. Seu olhar está parado, fitando o vazio à sua
frente, como se não enxergasse nada além do seu próprio interior.
Mesmo quando me coloco bem perto, ela parece não notar minha
presença, como se estivesse em estado catatônico.
— A senhora está bem? — pergunto, só para ter certeza.
De súbito ela ergue seu olhar para o meu rosto e seus olhos se arregalam,
ganhando um novo brilho.
— Lindsay? — ela diz.
— Não senhora, sou Lucy.
A mulher faz um esforço imensurável para levantar-se da cadeira, mas
não consegue e fico ainda mais compadecida dela, porque parece sofrida
demais, solitária demais, abandonada ali naquela cadeira de rodas em uma
casa tão grande, onde não parece haver mais ninguém. Bem típico do filho
dela deixá-la assim.
— Lindsay, meu amor, me deixe ver você de perto. — percebo que ela
está trêmula e temo que passe mal.
Acho que ela está me confundindo com sua filha Lindsay, tão loira
quanto eu, que está desaparecida há mais de cinco anos, sem que ninguém,
inclusive a polícia, tenha qualquer pista de onde possa estar.
Foi um escândalo na época em que ela sumiu. Houve rumores de que
deixou o país para se livrar da ditadura do irmão; de que foi assassinada por
ele para que não revelasse segredos que pudessem interferir negativamente
na sua imagem e no seu governo; disseram também que ele a mantém cativa
em uma das muitas propriedades que possui espalhadas por toda a Europa.
Enfim, os rumores foram muitos na época, embora nunca se tenha tido
certeza de nada.
— Não sou Lindsay, senhora. — falo, sentindo muita pena pela forma
como ela me olha.
— Lindsay, meu amor, onde você estava durante todo esse tempo?
As lágrimas brotam dos seus olhos castanhos enquanto ela continua
tentando se levantar.
Comovida, não resisto e a ajudo a se colocar de pé, quando então ela me
abraça apertado, afetuosamente, toda trêmula de emoção, o rosto banhado
de lágrimas.
— Senti tanto a sua falta. Por favor não nos deixe de novo.
— Desculpe, mas eu...
— O que está acontecendo aqui? — a voz ríspida, feminina, parte de
muito perto e a velha mulher se afasta do abraço.
— Veja Diana, minha filha voltou. Ela não é linda?
Diana é uma mulher robusta, com cerca de cinquenta anos. Deve ser sua
cuidadora, pois se veste como tal.
— A senhora está bem, Sra. Rudolf?
— Nunca estive melhor. — Ruth Rudolf seca as lágrimas dos seus olhos
com a manga do pijama florido e esboça um sorriso muito suave,
ressaltando as rugas do seu rosto. — Nunca mais vou deixar minha princesa
ir embora.
Diana alterna seu olhar entre mim e Ruth, visivelmente confusa, sem
saber como agir diante da situação. Acho que não quer magoar a mulher
dizendo a verdade.
— Só um minuto Sra. Rudolf, tenho algo a falar com Lindsay. — Diana
declara com simpatia. Segura-me pelo braço e me puxa para um canto da
sala. Olha para Ruth, como se para se certificar de que estamos longe o
suficiente para não sermos ouvidas e sussurra: — Quem é você e o que faz
aqui?
— Sou Lucy e não sei como vim parar aqui. Acho que bebi além da
conta ontem a noite e não lembro de muita coisa. — ela me olha como se
adivinhasse que sou louca.
— Como assim você não sabe como veio parar aqui? Isso aqui é o
palácio de Chambers. — faz um gesto de mão anunciando a imensurável
grandeza do lugar. Não sei mais o que dizer a ela sem parecer ainda mais
maluca. Então ela continua: — A Sra. Rudolf não falava há dois anos,
estava muda, sem vida, nem mesmo se levantava da cadeira. Seja quem for
você, fez um grande bem a ela, então peço que continue por aqui.
— Eu não posso.
— Só mais um pouco. Daqui a pouco ela almoça e pega no sono aí você
faz o que quiser.
Diana me puxa de novo para perto da Sra. Rudolf, ciente de que sentirei
compaixão da forma como a velha mulher me olha e não conseguirei deixá-
la, como de fato não consigo.
— É muito bom ouvir a senhora falando e andando novamente depois de
tanto tempo, Sra. Rudolf. — Diana comenta.
Fico feliz por ser responsável pela melhora daquela mulher, mas preciso
sair daqui antes que meu suposto raptor se dê conta de que deixou a porta
do quarto destrancada.
— Eu sinto muito, mas tenho que ir. — declaro, muito sem graça.
Ruth aperta meu braço com mais força do que parece ter e novamente as
lágrimas marejam seus olhos.
— Por favor não vá. Não me deixe de novo, minha querida.
Olho para Diana sem saber o que fazer. Não posso ficar, mas ao mesmo
tempo não quero deixá-la. O estado em que estava antes de me confundir
com a filha era de cortar o coração.
— Por favor fique só mais um pouco. — Diana praticamente implora.
Será que sou mesmo capaz de arriscar minha liberdade em nome do bem
estar daquela mulher que na verdade eu deveria odiar tanto quanto odeio
seu filho? Pior que sou. Não conseguiria negar a ela a chance de acreditar
que tem a filha de volta depois de tantos anos sem ter notícias dela, seria
muita crueldade da minha parte sair assim de repente e permitir que volte a
piorar. Poderia ser a minha mãe no lugar dela.
Então, a abraço ternamente pela cintura e nos conduzo até o sofá,
sentando-nos diante do sorriso de satisfação de Diana.
— Diana, querida, nos traga um chá e aqueles biscoitos amanteigados
que Lindsay gosta. — Ruth fala.
— Sim senhora. — Diana parece emocionada ao responder, antes de
deixar o salão.
Ruth não me pergunta onde estive durante todos esses anos, como se em
seu subconsciente soubesse que não sou sua filha de verdade. Apesar disso
me mima, passando a mão em meus cabelos, dizendo o quanto estão
bonitos. Depois passa a agir como uma mãe preocupada, perguntando se
tenho cuidado da minha alimentação, se aproveitei o tempo longe para
concluir a faculdade, se estou feliz. Em seguida, fala sobre si mesma, em
como tem vivido entediada naquele palácio sem mim.
É impossível não me lembrar da minha mãe, em como ela era carinhosa
e dedicada a mim e ao meu irmão caçula antes de tudo acontecer, antes de
surtar com a morte do meu padrasto e ser internada em um hospital
psiquiátrico, onde se encontra até hoje, sempre dopada para evitar que tente
o suicídio de novo.
Penso no quanto seria bom se Rudolf nunca tivesse nascido, pois assim
eu ainda a teria ao meu lado, da mesma forma como teria meu padrasto e
meu irmão.
Não importa quanto tempo se passe, ou quanto amor vejo nos olhos
daquela pobre mulher, que parece ser tão vítima da tirania do seu filho
quanto eu e minha família, sempre vou odiar Lennon Rudolf.
Lennon.
Desde o início da reunião, cedo da manhã, não se fala em outro assunto
que não na repercussão da manifestação realizada pela população de várias
cidades de Newhart na tarde de ontem. Tanto os chefes de estado quanto os
ministros acreditam que esse tipo e atitude por parte do povo pode
prejudicar o meu governo. Claro que eles não estão preocupados comigo e
sim com o próprio pescoço, pois se eu cair eles caem junto.
Todos concordam que os responsáveis pela tal manifestação, assim como
pela divulgação de informações negativas sobre o meu governo na internet,
o que vem manchando cada dia mais a minha imagem perante o povo e
perante o mundo, são um grupo de jovens revolucionários que se
autodenominam de JUD – Jovens Unidos Pela Democracia, que por alguma
razão desconhecida se uniram para lutar contra mim.
Na verdade a razão deles não é tão desconhecida assim. São todos
descendentes de famílias que eram ricas no governo anterior e não suportam
terem se tornado apenas classe média, não suportam a ideia de que as
pessoas menos favorecidas, economicamente, tenham as mesmas
oportunidade de prosperidade que eles, de que aqueles que são miseráveis
por não possuírem condições psicológicas ou uma estrutura familiar
adequada para conseguir o próprio sustento, tenham um prato de comida na
mesa.
As famílias desses garotos, e de muitos outros, acusam-me de gastar o
dinheiro de seus impostos para sustentar essa gente que acredita ser
desmerecedora do dinheiro público, de condições iguais às deles, pois não
compreendem que não tiveram as mesmas oportunidades para alcançar uma
vida melhor.
As pessoas que atualmente vem levantando a bandeira contra o meu
governo, não acreditam naquilo pelo que venho lutando desde que me
tornei presidente: a igualdade de oportunidades e erradicação das diferenças
entre as classes sociais. Tudo pelo simples fato de que se recusam a se
tornarem menos ricos para que os demais tenham o mínimo possível.
É uma sociedade que sempre considerei egoísta, adeptos do capitalismo
selvagem, de acordo com o qual alguns têm mais que o necessário enquanto
que outros não têm nem o básico. Essa é a principal lei do Neoliberalismo:
o individualismo, a lei de acordo com o qual é cada um por si, vence o mais
esperto, só alcança o sucesso quem se destaca.
De acordo com os estudiosos, o capitalismo é o sistema que mais tem
dado certo no mundo inteiro, é o sistema cujos países adeptos são mais
próspero, isso porque nem mesmo os estudiosos olham para a classe menos
favorecida e seus milhões de miseráveis.
E com o auxílio de informações distorcidas fornecidas pela mídia, que
também é altamente capitalista, até os que venho ajudando a melhorar de
vida, dando-lhes oportunidades de estudar, ou fornecendo-lhes auxílio por
meio de programas sociais que lhes permitem ter uma moradia descente e
uma refeição por dia, começam a se virar contra mim.
Maldita mídia e maldita internet.
Ainda não se sabe ao certo quem são todos os integrantes desse JUD,
pois nem todos aparecem publicamente. A maioria deles trabalha às
escondidas, me atacando com a sua alta habilidade em lidar com os recursos
da internet e quanto mais obtêm sucesso, mais outros movimentos como
este se formam pelo país, todos determinados a me destruir.
Em outras circunstâncias, eu já estaria furioso com o acontecimento de
ontem, discutindo medidas drásticas para acabar de vez com a palhaçada
desses meninos, mas hoje não estou em condições de pensar em mais nada
a não ser na garota que deixei em um dos quartos do palácio durante a
madrugada.
Desde que saí daquele quarto, mesmo depois de tomar dois banhos frios
e olhar para a cara daquela gente com quem trabalho diariamente, ainda
estou de pau duro, me lamentando por não ter dado uma boa trepada com
ela quando tive a chance.
Acho que só consegui me segurar porque ela tinha batido a cabeça muito
forte e estava muito embriagada, podia não saber o que estava fazendo, ou
podia ainda sair machucada.
Apesar do meu arrependimento, foi melhor assim, afinal preciso ser
cauteloso ao lidar com as pessoas que surgem no meu caminho,
principalmente agora que um cerco parece estar se fechando ao meu redor.
Já fui inconsequente demais ao levá-la para o palácio, uma completa
estranha que pode facilmente ser uma espiã enviada pelos meus inimigos
para me prejudicar.
Pode ser que eu tenha me deixado seduzir pela sua beleza e sua
irresistível juventude, mas não acho que ela seja uma espiã, realmente
acredito que seja apenas uma jovem sem juízo perdida na vida, uma vida da
qual posso tirá-la, ao torná-la minha, deixando-a à minha disposição em um
apartamento, para a satisfação do meu prazer, como era com Meg, até
ontem à noite antes de eu dispensá-la e como foi com muitas outras.
Como todas as outras Meg também chegou á insuportável fase de querer
discutir em todos os nosso encontros, cobrando um compromisso afetivo
que não posso oferecer a ninguém, pelo simples fato de que não acredito
nesse amor que todas dizem sentir e não conseguiria viver de falsidades.
Tudo fica mais simples e prático quando um tem certeza do que o outro
quer e nunca quis mais que prazer sexual.
A meu ver, o amor é só algo que as mulheres inventaram para garantir
um bom casamento.
Mas não comigo. Prefiro ser livre para possuir a mulher que desejar até
me cansar dela e então arranjar outra sem que deva satisfação a ninguém
por isto.
Eu não posso imaginar nada que possa ser mais enfadonho do que enjoar
da cara de uma mulher e mesmo assim ter que conviver com ela todos os
dias, dormir na mesma cama todas as noites, fazer sexo do mesmo jeito e
ainda ser criticado se decidir dar uma variada de vez em quando. Esse
tormento se chama casamento, tudo o que as mulheres querem de um
homem e a única coisa que não posso oferecer a nenhuma delas.
Quanto à ninfeta que deixei nua, toda molhadinha, naquele quarto esta
madrugada, está mais do que preparada para se tornar minha nova amante,
pois logo de cara concordou com minhas condições, o que me deixou muito
satisfeito afinal ela parece ter saído dos meus sonhos mais eróticos. Não é
apenas linda, jovem e quente, tem algo mais nela que me seduz e seduz
demais, algo que não consigo decifrar. Não chega a ser uma lembrança,
visto que não me recordo de tê-la visto antes, é uma sensação forte e
estranha de que já a conheço de muito tempo. De que já ouvi aquela voz
sedutora, de que já vi aquele corpo cheio de curvas deliciosas, de que já fui
seduzido por ela antes. Até a sua juventude me parece familiar. Porém, por
mais que eu puxe pela memória, não consigo me lembrar de onde a
conheço. Estou quase acreditando que realmente é dos meus sonhos mais
secretos, provindo daquela parte do meu cérebro que projeta a mulher
perfeita: linda, quente e que não busca um compromisso afetivo.
Em todo caso, preciso me certificar de que ela é quem diz ser, afinal não
posso me arriscar trazendo uma completa estranha para a minha vida e foi
por isso que, ainda esta madrugada, telefonei para o um dos meus
investigadores e dei ordens para que ele a investigasse e descobrisse tudo
sobre ela.
Robert trabalha para mim há muitos anos, é muito bom em tudo o que
faz, principalmente em investigar as pessoas que me cercam. Ele é capaz de
descobrir até o tipo sanguíneo de qualquer um que eu mandar em questão
de horas. Por isso tenho certeza de que logo estará diante de mim com todas
as informações sobre quem é de fato aquela menina e só posso esperar que
ela realmente seja quem diz ser, pois assim a possuirei ainda esta noite.
— Lennon você não está nos ouvindo? — a pergunta parte de Karl, o
ministro das relações exteriores.
Na verdade eu não faço a mínima ideia do que eles falaram nos últimos
dez minutos, cada minúscula partícula do meu cérebro estava concentrada
na garota nua que deixei em um dos quartos de hóspedes do palácio, na sua
boceta pequena e molhadinha, pronta para ser comida.
E se não a encontrar mais lá quando retornar? Impossível, ordenei aos
seguranças que não a deixem sair antes que eu volte. Só não posso me
demorar tanto e pelo visto aquela reunião vai se estender pelo dia inteiro,
pois ninguém consegue pensar em uma solução para a revolução que, ao
meu ver, é mais uma modinha entre os jovens e como toda modinha, logo
será esquecida, deixando alguns estragos, claro.
Quanto a mim, não consigo me concentrar em nada. Acho melhor adiar
essa conversa para amanhã, pois conseguirei me concentrar melhor depois
de me refestelar de prazer no corpo gostoso daquela menina.
— Reunião encerrada, senhores. — declaro e há uma torrente de
murmúrios e lamentações, embora eu não espere para ouvi-las. — Amanhã
resolveremos este assunto.
Ignorando as reclamações, deixo a imensa sala de reuniões e sigo para o
meu gabinete, com Donald, meu segurança pessoal e amigo, me seguindo
de perto. Há outros dois seguranças armados e bem treinados parados um de
cada lado da porta, que me cumprimentam quando passo.
— Qual o problema com você? — Donald indaga, olhando pela fresta na
cortina puxada da janela do gabinete, um hábito que nunca deixa de repetir,
como se o tivesse automatizado.
Sento-me à minha mesa, com a bandeira de Newhart atrás de mim e
esfrego os olhos, afadigado pela noite mal dormida.
— Uma garota, meu caro. Não tem nem vinte e cinco anos completos e
não sai da minha cabeça. — Donald me encara surpreso. Não é segredo
para ninguém a forma como conduzo meus envolvimentos com as
mulheres, elas lá, sempre à minha disposição e eu aqui, sem que haja um
envolvimento afetivo.
— E a Meg? — ele pergunta.
— A dispensei ontem. Estava ficando insuportável com aquela história
de termos algo mais.
Uma ruga se forma no centro da testa de Arnold.
— Você foi sozinho a Taunton? Sem segurança alguma?
— Fui. Não acredito que meus inimigos possam premeditar todos os
meus passos.
Nesse instante, o interfone toca e atendo com mais pressa que o habitual,
satisfeito por receber a notícia de que Robert está lá fora querendo me ver,
certamente com as informações sobre Samantha.
— Manda ele entrar e não me interrompa com nada enquanto ele estiver
aqui. — dou a ordem e desligo.
Um minuto depois Robert adentra o gabinete, sério e compenetrado
como sempre. Cumprimenta Donald e a mim com polidez, para em seguida
sentar-se a minha mesa e entregar-me um grande envelope marrom.
— Descobriu muita coisa sobre ela? — pergunto, ansioso, enquanto abro
o envelope.
— Sim. Coisas que você não vai gostar nem um pouco. — ele está mais
sério que o habitual e isso me enfurece, porque prevejo que a garota andou
mentindo e minha trepada perfeita está perdida.
Tiro toda a papelada de dentro do envelope e fico ainda mais furioso
quando começo a ler. Samantha na verdade se chama Lucy Anderson, tem
vinte e dois anos de idade, cresceu em um orfanato, trabalhou durante
alguns anos como garçonete e é uma das integrantes do JUD, os malditos
revolucionários fanáticos que estão tentando me destruir.
“Maldição!” Ela bateu no meu carro propositalmente para garantir uma
aproximação comigo e esteve encenando durante todo o tempo esta
madrugada quando deu em cima de mim, fingindo estar louca para que eu a
possuísse, quando na verdade só queria garantir uma aproximação maior
para me prejudicar.
Que ódio! Como fui cair em uma armadilha tão boba? Como me deixei
ser feito de tolo tão facilmente? E o pior nessa história é que eu a quis, a
quis demais, muito mais do que já desejei qualquer outra mulher.
Mas vou ensiná-la uma lição que jamais a deixará enganar outro homem
na vida.
— Isso aqui é verdade? — eu me apego a um fio de esperança muito
tênue.
— Sim. Infelizmente ela faz parte desses jovens arruaceiros que estão
fazendo baderna com o seu nome. — Robert fala. — Podemos processa-la
por terrorismo e se ela ainda estiver no palácio, por invasão também.
— Ela está lá. Pedi que me avisassem caso tentasse sair.
— Espera aí, tem uma garota do JUD dentro do palácio? — Donald
parece abismado com a constatação.
— Sim. — confesso e só não fico constrangido pelo tamanho da minha
mancada porque conheço esses dois há muitos anos.
— É a garota com menos de vinte anos que não sai da sua cabeça?
Ele tinha que dizer isso na frente de Robert?
— Infelizmente sim, meu caro. Mas vou ensiná-la a nunca mais brincar
comigo.
Levanto-me furioso. Ainda não sei o que vou fazer com aquela maldita
antes de mandá-la para a prisão. Dar-lhe umas boas palmadas na bunda,
talvez, para ensiná-la a nunca mais tentar enganar um homem na minha
posição. Depois a deixarei envelhecer na cadeia.
— Espera um pouco Lennon. — Donald me interrompe, sério. — Cara
você não percebe a oportunidade que tem nas mãos? Esses garotos não
sabem nada sobre você e sua forma de governo, eles acreditam naquilo que
a mídia e seus próprios pais os convencem a acreditar e têm um grande
poder de persuasão sobre a população, porque são inteligentes e conhecem
bem os recursos da internet através dos quais alcançam muito mais pessoas
que você com seus discursos. — eu o ouço, mas não sei onde ele pretende
chegar com aquilo, estou furioso demais para pensar com clareza. — Pensa
bem, cara. Se você fingir que não sabe quem ela é e a deixar ficar, pode
convencê-la de que não é o ditador ou tirano que todos a convenceram a
acreditar que é. Você pode mostrar a ela os objetivos da sua forma de
governo e a partir de então trazer esses jovens para o nosso lado. Imagina
como seria positivo para você tê-los como aliados.
Donald tem toda razão, o problema é que eu não conseguiria estar perto
dela sabendo que é uma traidora e fingir que está tudo bem. Por mais que a
deseje, não conseguiria beijá-la e deitar-me com ela sabendo que está
fingindo e que pretende me apunhalar pelas costas. Esses jovens que se
fodam e aprendam a aceitar a forma como governo o pais. Quanto àquela
fedelha, vou dar o que ela merece.
— Não posso fazer isso. Não conseguiria viver debaixo do mesmo teto
que uma hiena traiçoeira. — declaro.
Com passos largos e pesados, sigo pela passagem secreta cuja entrada se
encontra logo atrás da minha mesa, oculta pela bandeira de Newhart. Essa
passagem dá acesso direto ao palácio e é conhecida por pouquíssimas
pessoas, apenas aquelas de total confiança, como Robert e Donald.
Diariamente eu venho para o gabinete pela rua, fazendo a volta no
quarteirão inteiro para que ninguém desconfie de que aquela passagem
existe, venho no transporte oficial presidencial, cercado por seguranças,
como é de praxi. Só que neste momento estou furioso demais para fazer tal
percurso, quero logo pegar aquela pirralha de jeito e dar o que ela merece.
Vou deixá-la com a bunda tão dolorida do peso da minha mão que ela nunca
mais ousará enganar um homem de novo.
CAPÍTULO IV
Eu odeio aquela passagem secreta, é quente, abafada, mal iluminada e
tão pequena — com cerca de três metros de diâmetro —, que mais parece
um túnel. Foi construída para ser usada apenas em situações de emergência.
Atravessa todo o prédio onde fica o gabinete e passa por baixo do jardim
dos fundos de palácio, dando no meu escritório.
Já estou quase alcançando a metade do percurso quando percebo que
Donald e Robert me seguem. Será que estão pensando que não consigo me
defender de uma menina?
Embora contrariado, estou furioso demais para dizer qualquer coisa.
No escritório, encontro cada objeto em seu devido lugar, o que prova que
a fedelha ainda não andou bisbilhotando em busca de alguma evidência que
possa ser usada contra mim, se essa for a sua intenção e tenho quase certeza
de que é, afinal o que mais ela poderia querer?
Tão sorrateiramente quanto os dois homens que me seguem de perto,
atravesso o cômodo amplo, a sala de estar e outra de jantar. Ao atravessar a
porta que dá acesso à terceira sala, onde minha mãe gosta de estar por causa
da lareira, fico paralisado diante da cena com a qual me deparo.
Minha mãe, que não fala há dois anos, está conversando com a fedelha.
Ambas estão sentadas no sofá de dois lugares, muito próximas, sem se
darem conta da nossa chegada.
Permaneço imóvel, atônito, observando minha mãe fazer carinho no
rosto daquela menina que sequer conhece.
Desde quando voltou a falar? Por que parece gostar tanto daquela
criatura traiçoeira? Foi ela quem a fez emergir do poço de depressão no
qual vive mergulhada desde que minha irmã despareceu? Por que logo ela,
uma inimiga?
Ao mesmo tempo em que a perplexidade me deixa sem ação, sou
tomado pela emoção de vê-la se recuperando tão subitamente, mesmo que
de forma inexplicável, depois de passar pelos mais caros especialistas, os
quais chegaram ao consenso de que seu estado de demência não teria mais
retorno.
Donald começa a sussurrar insistentemente atrás de mim, mas não o
ouço, embora desconfie de que continue sugerindo que eu finja não saber
quem é aquela garota para mantê-la aqui até que consiga convencê-la a
mudar de lado e se tornar nossa aliada. Mas eu nunca fui bom em fingir,
principalmente no que diz respeito a sentimentos, não conseguiria ocultar o
meu desprezo por ela, por não passar de uma revolucionária imbecil que se
infiltrou na minha vida com o intuito de tentar me prejudicar, por ter me
enganado de forma tão suja.
Não estou em condições de pensar nisso agora, a cena diante de mim
toma toda a minha atenção. Parece surreal que minha mãe tenha voltado a
falar depois de tanto tempo e fala com uma completa estranha, que ainda
por cima é nossa inimiga.
Ainda sem saber como agir, aproximo-me das duas, devagar.
A reação da fedelha ao me ver é totalmente inesperada. Ela se levanta
depressa e crava seus olhos arregalados de pavor em meu rosto. Parece tão
desnorteada que começa a andar para trás sem desviar seus olhos de mim,
como se agisse por impulso, sem ver o que está fazendo, até que acaba
tropeçando em um puf que há ao lado do sofá e se estatela no chão, de
costas, com as pernas para o ar.
Percebo que tem dificuldade em se recompor, como se estivesse em
meio a uma crise de nervos. Quero que se ferre ali no chão, que bata a
cabeça de novo e desta vez a quebre, mas acabo ficando com pena de sua
surpreendente fragilidade e a ajudo a levantar-se, segurando-a pelo
antebraço.
Os líderes desse JUD devem ser uns covardes por mandarem uma
criatura tão frágil e indefesa vir atentar contra mim.
Uma vez em pé, a garota puxa o braço da minha mão com um safanão e
continua se afastando, ainda me encarando, não mais apenas com medo,
agora posso ver também um ódio mortal na sua expressão.
Percebo que é ainda mais bonita sem a maquiagem escura que usava
quando a encontrei, tem a pele de porcelana, o rosto delicado como o de
uma boneca, a boca é pequena e bem desenhada, as bochechas naturalmente
rosadas e os olhos possuem um tom azul cristalino, raro de uma forma que
não passaria despercebido a nenhum homem com sangue nas veias.
— Minha querida, assim você se machuca. — mamãe fala, sua voz fraca,
há muito não ouvida, me puxando de volta para a realidade, como se eu
tivesse mergulhado em uma espécie de transe. — Você está vendo, Lennon?
Nossa Lindsay voltou para casa.
Então é isso, aquela bandidinha está se passando pela minha irmã para
enganar minha mãe demente demais para ver a verdade.
— Ela não é Lindsay, mãe. — falo, com os dentes cerrados.
— Eu disse pra ela que não sou a Lindsay. Não fui eu quem inventou
isso. — a pirralha olha para Diana, que acaba de entrar na sala, como se
buscasse uma testemunha.
— É verdade Sr. Rudolf. É tudo fantasia da cabeça da sua mãe, mas pelo
menos ela está falando, um grande avanço em sua recuperação. Começou a
falar quando viu a garota e a confundiu com Lindsay, por isso pedi á
menina que ficasse. — Diana declara, quase em um sussurro para que sua
voz não alcance os ouvidos deteriorados de mamãe.
Merda! Com aquele jeitinho de anjo, que não percebi nela ontem, aquela
vigarista já tinha conquistou até a minha empregada.
Se minha mãe voltou a falar por sua causa, mesmo que por motivos
errados, agora eu tenho uma boa razão para mantê-la por perto, como
Donald sugeriu, afinal é melhor que minha mãe se recupere por causa dela
do que não se recupere de jeito nenhum, como vem acontecendo há dois
anos, mesmo sendo tratada pelos melhores médicos do país.
Sento-me ao lado da minha mãe, com vontade a abraça-la apertado, mas
sem saber como fazer isso depois de tudo pelo que passamos. Os anos
parecem ter destruído qualquer afeto ou intimidade que existia entre nós. A
mulher diante de mim já não parece a mesma que me trouxe ao mundo, que
me deu tanto amor durante toda a minha vida, mas sim uma completa
estranha. Acho que depois que ela mergulhou em estado catatônico, parei
de considerar que ainda estivesse viva. Mais um dos muitos erros que
cometi ao longo da vida.
— Mãe a senhora está se sentindo bem? — pergunto, sem jeito.
— Sim. Estou ótima. Estou feliz agora que minha filha está em casa.
Você também devia ficar.
Nunca achei justo que ela tenha se deixado abater pela depressão depois
que Lindsay desapareceu, como se não lhe restasse mais nada, nem mesmo
a mim, como se eu não significasse tanto para ela quanto minha irmã. E
agora esse sentimento tão idiota e sem sentido volta como um punhal que é
cravado em meu peito e retorcido.
— Ela não é Lindsay, mãe. — explico, para evitar que ela piore ainda
mais quando perceber que está enganada.
— Mas claro que é. Por que ficam todos repetindo isso? — sua voz se
altera, sua respiração fica irregular e temo pela sua pressão alta.
Quero insistir até convencê-la da verdade, mas acho que isso pode fazê-
la piorar. Talvez seja melhor deixar que continue se enganando, afinal foi
isso que a trouxe de volta, não foi? Depois que o médico a consultar,
pensaremos em uma forma de esclarecê-la sem corrermos o risco de
empurrá-la de volta para a depressão.
— E-eu preciso ir embora. T-tenho pessoas me esperando. — a maldita
garota fala, tropeçando nas próprias palavras, como se estivesse nervosa e
só então me dou conta de que mesmo que não queira, preciso mantê-la por
perto, pelo bem da minha mãe.
Parece cômico que há cinco minutos eu estava disposto a mandá-la para
a cadeia por tentar entrar na minha vida por meio de uma armação e agora
precise que ela fique, talvez até mais do que ela queira ficar ou precise.
— Só um minuto, precisamos conversar. — agarro-a pelo braço com
força, ignorando os esforços que ela faz para tentar se libertar. — Mãe,
Lindsay e eu vamos conversar um pouco em particular, mas já a trago de
volta. Você vai ficar bem?
Minha mãe solta um longo suspiro, como se minha atitude a
impacientasse.
— Sim, mas por favor não demore. Não a afaste de nós novamente com
seus assuntos sufocantes sobre política.
Então é isso que minha mãe pensa? Que afastei Lindsay de nós por causa
da política? Não estou em condições de pensar nisso agora.
Arrasto a garota direto para o meu escritório, ignorando completamente
os seus protestos. Chegando lá, olho em seu rosto de boneca e me lembro
de como se jogou para cima de mim durante a noite anterior, fingindo me
desejar com a intenção única de me prejudicar.
“Vadia!” Quero dizer isso em voz alta, mas não posso afastá-la agora
que preciso dela.
— Sente-se. — gesticulo para uma poltrona.
— Estou bem assim. Obrigada.
Há alguma coisa diferente nela que não consigo decifrar. Parece mais
tímida, menos à vontade dentro do vestido pequeno e já não demonstra me
querer como ontem à noite, pelo contrário, me encara como se estivesse
com medo e ao mesmo tempo com raiva de mim. Também parece mais pura
e sem maldade, do tipo que se eu visse na rua, juraria que é uma estudante
de um colégio de freiras.
Aquela estranha familiaridade ainda está lá, como se eu a conhecesse de
muito tempo, embora tenha quase certeza de que nunca a vi antes.
Os membros do JUD que sempre aparecem na televisão, nos jornais e na
internet, são todos homens. Eu nem imaginava que há garotas entre eles.
— Sobre nosso acordo, gostaria de mudar alguns termos. — falo, me
esforçando para manter a calma. Na verdade meu desejo é de deitá-la de
bruços sobre minhas pernas, levantar a saia curta do seu vestido e lhe dar
umas boas palmadas na bunda, por me fazer de bobo, mas preciso manter a
calma pelo bem da minha mãe. — Em vez de ficar em um apartamento em
Taunton, gostaria que você ficasse aqui no palácio, devido ao bem que
parece ter feito à minha mãe. O resto permanece igual. O que acha?
— Que acordo? Eu não sei do que o senhor está falando.
Agora ela me chama de senhor. Que cínica!
— Não se faça de desentendida! Ambos sabemos o que fizemos e
conversamos naquele quarto esta madrugada. — grito mais alto do que
pretendia e ela se encolhe, parecendo tão assustada que minha consciência
pesa um pouco. E isso porque eu nem sabia que tenho uma consciência.
— Sr. Rudolf, não me leve a mal, mas bebi demais ontem à noite, não
sou responsável pelo que fiz nem pelo que disse, da mesma forma como
não me lembro de nada. — ela se mostra inacreditavelmente meiga e ao
mesmo tempo desconcertada enquanto fala, nem parece a mesma pessoa
que quase me fez fodê-la durante a madrugada. — Então seja lá qual foi o
acordo que fizemos, não leve em consideração. Eu não estava agindo por
mim.
A estudo com curiosidade. Sua súbita falta de memória será uma nova
estratégia para me confundir e me enganar? Por que ela faria isso? Se
esforçou tanto para tomar o meu caminho, inclusive arriscou o próprio
pescoço quando bateu o seu carro no meu, devia estar dando saltos de
alegria porque estou lhe dando a chance de ficar no palácio, uma verdadeira
mina de informações que sua “quadrilha” poderia usar contra mim. Não
pode ter mudado de ideia assim tão depressa.
— Deixe-me lembrá-la sobre o que conversamos ontem à noite,
Samantha. — agindo por impulso, sem pensar direito, vou até ela, seguro-a
pela nuca e, antes que ela tenha tempo de se esquivar, puxo-a para mim,
trazendo sua boca linda até a minha.
Sua reação não podia ser pior. Tenho certeza de que se tivesse uma faca
em mãos, ela teria me esfaqueado, mas como não tem, crava seus dentes em
meu lábio superior com tanta força que sinto o sangue quente escorrendo.
— Awww! Você é louca? — pergunto, atônito, soltando-a, levando a
mão ao lábio ferido.
— Nunca mais se atreva a me tocar, seu... Canalha! — ela fala com os
dentes cerrados, os olhos azuis faiscando de raiva.
— O que aconteceu com você de ontem para hoje? Foi você quem tirou
as roupas e pulou em cima de mim. — Vejo sua face linda ruborizar
violentamente, seus olhos se arregalarem e começo a acreditar que aquela
garota tem um sério problema de amnésia, ou coisa pior. — Você realmente
não se lembra?
— Não! — retruca, com uma rispidez que me parece autodefesa. — Se
aconteceu alguma coisa entre nós foi em um momento de inconsciência da
minha parte. Como já disse, bebi demais e não sabia o que estava fazendo.
Agora se puder me mostrar a saída, ficarei grata.
Talvez a pancada na sua cabeça tenha sido mais forte do que o médico
percebeu e ela esteve delirando quando se atirou sobre mim e concordou em
se tornar minha amante. E embora isso já não tenha tanta importância, pois
se não tivesse contribuído para a recuperação da minha mãe eu a colocaria
na cadeia sem hesitar, não consigo evitar o desapontamento. Acho que no
fundo eu a queria para mim e não era nem tão no fundo assim.
— Nós combinamos que você se tornaria minha amante, Samantha. —
os olhos dela se arregalam ainda mais. — Você disse que não tinha um
emprego e nem um lugar onde morar. Eu ia te levar para um apartamento
em Taunton.
— E isso para me ajudar, claro. — solta, com escárnio, o que me irrita
mais que a mordida na boca, pois não suporto que me tratem com sarcasmo.
— Em primeiro lugar, não preciso de nada do senhor, em segundo, eu não
seria amante de um homem tão inescrupuloso e em terceiro, para de me
chamar de Samantha, meu nome é Lucy. Agora se não se importa, preciso
voltar para casa. Ah, aliás eu tenho uma.
Não compreendo sua atitude. Se se esforçou tanto para chegar a mim, se
fingiu tão bem me desejar, porque recua agora que lhe ofereço a chance de
alcançar seus objetivos? Não acredito mais que seja uma jogada para me
confundir, ela não iria tão longe, não arriscaria tanto perder essa
oportunidade, isso sem mencionar que me falou seu nome verdadeiro.
Talvez realmente estivesse bêbada demais ontem e não via nada do que
fazia.
Isso já não importa tanto. Eu preciso dela aqui pelo bem da mulher que
me trouxe ao mundo. Se foi a responsável pela sua recuperação, tudo pode
piorar se for embora agora.
— Ok, esquece tudo o que falamos e fizemos ontem, embora eu não te
prometa que vou esquecer também. Vamos começar do zero. Fique aqui
pela minha mãe, eu pago quanto você quiser, basta dizer o seu preço. Ela
não pronunciava uma palavra há dois anos, sequer saía daquela cadeira de
rodas e você ajudou na sua recuperação. — a expressão do seu rosto
suaviza. — Fique como companhia dela, pelo menos por um tempo.
Eu conheço o tamanho do risco que é colocar uma integrante do JUD
dentro do palácio, mas estou disposto a qualquer coisa pela saúde da minha
velha.
— Não estou procurando um emprego. — já não é tão dura ao dizer.
— Não estou te oferecendo um. Estou pedindo a sua ajuda. Por favor,
fique.
Eu não me lembro da última vez em que falei “por favor” a alguém.
Acho que nunca falei. Mas a recuperação de Ruth é mais importante que
qualquer outra coisa para mim, principalmente depois da sua insinuação de
que me culpa pelo sumiço de Lindsay.
A fedelha parece comovida, vejo isso na expressão do seu olhar.
— Eu realmente queria poder ajudar, mas ela pensa que sou sua irmã.
Vai ser pior se eu ficar e ela se der conta de que fingi o tempo todo.
— Não vai. Até lá os médicos dão um jeito na cabeça dela. O passo mais
importante já foi dado.
Ela fica em silêncio por um momento, como se escolhesse as palavras,
ou pensasse sobre o que fazer.
— Eu prometo que vou pensar nisso. Mas por enquanto preciso voltar
para casa. Meu namorado deve estar preocupado comigo.
Então ela é namorada de um dos desordeiros. Deve ser um covarde sem
tamanho e um grande imbecil por deixa-la solta por aí, bêbada, dirigindo
um conversível. Se ela fosse minha, isso não teria a mínima chance de
acontecer. Podia ter sido um pervertido a encontrá-la naquele estado, que
muito facilmente teria aceito sua oferta quando ela tirou as roupas, ou talvez
não teria nem esperado tanto.
Aquela situação me irrita, porque não ter o que quero não é algo com o
que esteja familiarizado, e agora quero aquela garota em minha casa, por
causa da minha mãe. Todavia, não tenho como força-la a ficar, mandá-la
para a cadeia seria pior, pois destruiria qualquer possibilidade de ela voltar.
— Então pense, mas tenha em mente que a saúde de uma mulher muito
boa depende de você. Vou mandar um dos meus motoristas te levar em
casa. Qualquer coisa me telefona. — tiro meu cartão pessoal, com o numero
do celular que pouquíssimas pessoas conhecem e entrego-lhe. — Até breve.
A acompanho até a saída. Não vamos passar pela sala onde está minha mãe,
não será bom se despedir dela agora, pois pode piorar se pensar que você
não vai voltar.
A acompanho até a saída, sem passar pela sala da lareira, percebendo
que Donald e Robert estiveram de guarda na porta do escritório o tempo
todo e nos seguem de longe.
— Adeus Sr. Rudolf. — é tudo o que Lucy diz quando a deixo do lado
de fora do palácio, na garagem, onde um motorista já a espera.
CAPÍTULO V
Lucy
A limusine luxuosa parece deslizar pelas ruas calmas de Newhart. É
manhã de sábado, o sol está forte, embora a temperatura ainda não tenha se
elevado o suficiente para que eu pare de me tremer dos pés à cabeça dentro
do vestido minúsculo de costas nuas.
Na verdade, não estou tremendo por causa do frio, meu corpo parece ter
virado gelatina depois do que aconteceu.
Eu ainda não consigo acreditar que estive cara a cara com Lennon
Rudolf e pior ainda: não posso acreditar que o mal que existe dentro de
mim me fez passar a noite com ele. Isso é terrível demais para ser aceito,
mas parece que de fato aconteceu.
Ele não deixou claro como fui parar no palácio, ou em seu quarto, mas
pelo que disse, o demônio dentro de mim, que se denomina por Samantha,
passou a noite em sua cama e não tenho nem como desacreditar nessa
verdade, visto que “aquilo” vai para a cama com qualquer homem que
atravesse o seu caminho, só que dessa vez ela foi longe demais.
Merda! Merda! Merda! Como isso foi acontecer? Como posso ter
permitido que meu corpo pertencesse ao homem que é meu pior inimigo?
Eu nunca tinha visto Lennon Rudolf de perto antes, embora venha
acompanhando sua vida pelos jornais, internet e pela televisão há oito anos,
desde que ele acabou com a minha vida e passei a odiá-lo mais que tudo,
mais até que ao monstro que vive dentro de mim.
Eu tinha quatorze anos quando aquele homem destruiu a minha família
em nome da sua sede descomedida pelo poder. Meu padrasto era o primeiro
ministro e tesoureiro do presidente Avery Green, um democrata que ajudou
na luta pela emancipação de Newhart do Reino Unido, de quem Rudolf
usurpou a presidência. Aconteceu na noite anterior ao seu golpe. Ele esteve
na casa onde meu padrasto mantinha minha mãe, sua amante de muitos
anos, meu irmão caçula e eu, a fim de roubar provas que incriminassem
Green de corrupção e assim promover a cassação do seu mandato. Apenas
meu padrasto tinha tais provas, portanto não há outra explicação para que
elas tenham ido parar nas mãos de Rudolf que não o fato de ele ter estado
na nossa casa naquela noite, embora isso nunca tenha sido provado, porque
é praticamente impossível acusar um homem de algum crime depois que ele
está no poder, principalmente Rudolf, que foi considerado um verdadeiro
herói ao provar a corrupção do governo cujo cargo usurpou.
Na manhã seguinte àquela noite, no dia do golpe, meu padrasto
amanheceu morto no sofá da nossa sala, com a garganta cortada e a perícia
laudou a causa da morte como suicídio.
Como uma pessoa ia conseguir cortar a própria garganta? Isso não faria
sentido algum se Rudolf já não fosse presidente quando foi apontado como
suspeito.
A polícia sequer investigou o caso direito, porque aquele assassino
estava sendo considerado o herói do país, por ter descoberto a rede de
corrupção. Mas todos sabem que ele entrou na nossa casa naquela noite e
assassinou o meu padrasto para roubar as provas de que precisava para dar
seu golpe, até porque ele não entregaria tudo de mãos beijadas.
Todo mundo sabe dessa verdade, mas se a polícia diz que foi suicídio, é
no que todos são obrigados a acreditar.
Rudolf agiu durante a madrugada, de modo que ninguém viu ou ouviu
nada. Deve ter telefonado antes marcando um encontro e por isso meu
padrasto desceu para o primeiro andar, para encontrar sua morte.
Como era apenas sua amante, alguém que meu padrasto tirou das ruas e
das drogas, minha mãe não teve direito a um centavo da sua herança,
mesmo Jack, meu irmão mais novo, sendo filho de sangue dele. Quanto a
mim, tinha cinco anos quando ele conheceu minha mãe, mas o amava como
se fosse meu pai de sangue e o considerava como tal.
Ao se ver na mais completa miséria, sem o homem que ela amava e sem
ter como sustentar os filhos, minha mãe voltou para as drogas e logo depois
cometeu sua primeira tentativa de suicídio. Hoje em dia está internada em
um hospital psiquiátrico, como maníaca suicida.
Meu irmão e eu fomos encaminhados para um abrigo para menores e
como Jack ainda era novinho, com apenas sete anos, foi adotado, sem que
eu tivesse o direito de continuar convivendo com ele e nunca mais o vi.
Mesmo depois que deixei o orfanato, ao atingir a maioridade, não consegui
localizá-lo, não faço ideia de onde mora a família que o adotou, pode ser
inclusive em outro país.
Ao deixar o orfanato, com dezoito anos, pintei meus cabelos de loiro e
mudei meu sobrenome, para não correr o risco de ser reconhecida e
apontada na rua como a filha da amante de um homem que além de casado,
mesmo depois de morto, passou a ser considerado inimigo do país por ter
participado de uma rede de corrupção e mesmo para não ser encontrada
pela imprensa.
Nesse período, trabalhei como garçonete por um ano e meio para me
sustentar, enquanto dividia um apartamento de dois cômodos no subúrbio
com uma amiga e quando soube que havia um grupo de revolucionários
caçando a cabeça de Rudolf, tratei de me juntar a eles, pois era a única
forma de conseguir derrubar o homem que destruiu tudo o que eu tinha. A
única maneira que encontrei de conseguir atingir um presidente que não vai
nem até a esquina sem uma comitiva de seguranças o seguindo.
O meio mais eficaz que arranjei de fazer parte do JUD, foi namorando
Kevin, aquele que parecia mais fácil de se apaixonar entre todos. No
começo ficava com ele apenas para ser aceita no grupo, mas hoje em dia já
gosto dele de verdade.
Eu sei que ser filha de uma ex prostituta viciada, que vive como amante
clandestina de um político casado e corrupto, com quem tem um filho, não
é exatamente o modelo perfeito de família, mas era a família que eu tinha e
a amava demais, e Lennon Rudolf tirou isso de mim, tirou tudo o que me
importava. Eu fiquei sem ninguém no mundo.
Durante todos esses anos, não houve um só dia em que eu não tenha
pensado em destruí-lo, em que não o tenha odiado e agora o monstro que
vive dentro de mim me fez passar a noite com ele.
“Isso não pode estar acontecendo.”
Como fui permitir que a coisa chegasse a esse ponto? A culpa é toda
minha, eu não devia ter tomado aquelas cervejas durante a comemoração no
apartamento. Fazia muito tempo que aquele mal não emergia dentro de
mim, mas tive que testar se estava curada. Acho que jamais estarei curada
desse distúrbio dissociativo de personalidade, portanto, só me resta evitar
que a mudança aconteça novamente, continuar com os medicamentos, não
ingerindo bebidas alcoólicas e evitar situações de estresse, como todos os
médicos recomendam.
Pelo menos desta vez estive fora de mim por uma noite apenas, se
permanecesse por mais tempo, aquele monstro acabaria me tornando
amante de Lennon Rudolf e eu não consigo pensar em nada que poderia ser
pior que isto.
Faltam quatro quadras para chegarmos ao prédio onde fica a sede do
JUD, quando peço ao motorista para me deixar na frente de um hotel
luxuoso que há naquela rua, pois não quero correr o risco de que aquele
homem, empregado de Rudolf, descubra onde fica nosso apartamento e em
um hotel eu posso entrar e permanecer até que ele vá embora acreditando
que me deixou no lugar onde moro.
Entro no prédio luxuoso, espero por algum tempo sentada na recepção,
como se fosse uma hóspede e quando saio o motorista não está mais lá.
Ótimo! Se algum dia Rudolf descobrir que uma integrante do movimento
que luta contra ele esteve no seu palácio, procurará naquele hotel.
Me apresso em caminhar as quatro quadras que faltam até o
apartamento, tomada pelo desconforto de ser alvo de olhares maliciosos
masculinos por causa do vestido vulgar, um ritual que se repete cada vez
que volto a mim.
Encontro o apartamento transformado numa bagunça ainda maior que
quando parti, com garrafas de cerveja e pontas de cigarro espalhadas por
todo lado, como se a farra tivesse se perdurado por toda a noite.
Alguns dos jovens que não moram aqui estão dormindo em colchonetes
no chão da sala, garotas e rapazes dividindo o mesmo espaço pequeno,
ainda usando as mesmas roupas que usavam na última vez que os vi.
Aparentemente estavam bêbados quando se deixaram dormir ali mesmo, o
que mostra sua pouca experiência com farras.
Apenas Kevin está acordado. Sentado à mesa, debruçado sobre o tampo
de madeira. Ergue-se para me encarar ao me ouvir entrar e a culpa percorre
minhas entranhas, dolorosamente, quando olho em seu rosto. Ele está
pálido, abatido e com a barba sem fazer. As feições cansadas evidenciam
que não pregou o olho durante a noite, a angústia no olhar mostra o quanto
está sofrendo por minha causa, porque embora não tenha visto, sabe que
dormi com outro homem. É sempre assim, todas as vezes que o mostro
dentro de mim toma conta do meu corpo.
— Eu sinto muito. — falo, imóvel diante da porta fechada, tomada pelo
remorso que me atormenta.
Eu não espero que ele me desculpe ou mesmo que me entenda, aliás se
ele decidir me deixar agora, vou entender e aceitar sem reclamar, embora
isso me doerá na alma, pois amo tê-lo por perto, cuidando de mim quando
consegue.
Sem uma palavra, Kevin deixa o seu lugar e se aproxima de mim,
abraça-me apertado pela cintura, colando meu corpo no seu, afundando o
rosto em meus cabelos.
— Não foi culpa sua. — sussurra, a voz tão angustiada quanto seu olhar.
— Isso não muda nada entre nós.
Por Deus! Eu não o mereço, não mereço nem um terço desse amor que
ele demonstra sentir por mim.
O abraço pelo pescoço com força e um soluço me escapa alto, quando só
então me dou conta de que meu rosto está banhado de lágrimas, um pranto
movido pela culpa, pelo remorso, pelo desejo infinito de que as coisas
fossem diferentes, de que não precisasse magoá-lo mais.
— Eu te amo Kevin. — falo, entre as lágrimas.
— Eu também te amo. — ele se afasta alguns centímetros e me examina
dos pés à cabeça. — Você está bem? Não está machucada?
— Não por fora.
— Se lembra de alguma coisa? Onde estava quando voltou a si?
Imagino sua reação quando me ouvir e o puxo pela mão de volta para
perto da mesa. Faço-o sentar-se e me acomodo ao seu lado, bem perto.
Acaricio seu rosto bonito, tomada pela imensa gratidão por tê-lo em minha
vida.
— Eu acordei em um quarto no palácio de Chambers. — os olhos dele se
arregalam atônitos. — Falei com Rudolf. Pelo que tendi parece que bati no
carro dele e fui levada desacordada. — Kevin continua me encarando com
perplexidade, esperando o desenrolar da história. — Sim, parece que passei
a noite com ele. — outro soluço me escapa. — Pelo que entendi, ele propôs
à Samantha que se tornasse amante permanente dele e ela concordou. Hoje
de manhã queria que eu ficasse lá como acompanhante da mãe dele.
Kevin permanece em silêncio, encarando-me boquiaberto. O monstro
dentro de mim já aprontou coisas piores com ele, inclusive já fez com que
seus homens batessem nele. Acho que só está demorando para digerir a
informação, ou inconscientemente decidiu me rejeitar depois de tanta
traição, o que é o certo a fazer.
— É sério isso que você está dizendo? — a voz alta e grossa parte da
direção do corredor, de Dylan, que aparentemente estava nos ouvindo às
escondidas e acorda os outros com seu tom de voz elevado, ao se
aproximar.
— Você estava ouvindo a conversa atrás da porta? — Kevin
praticamente grita.
— Não foi de propósito, cara, relaxa. — Dylan fala. Ele senta-se na
cadeira do outro lado da mesa, inclina-se para a frente e fixa seu olhar
astuto em meu rosto, como se tramasse algo. — Você tem ideia da
oportunidade que temos nas mãos?
— O que ta havendo aqui? — Tom pergunta, levantando-se do
colchonete junto com os outros.
— Lucy passou a noite no castelo de Chambers e pode voltar quando
quiser. O maldito ditador quer que ela seja cuidadora da mãe dele. — Dylan
explica. Pelo menos não está mencionando a parte mais constrangedora da
história. — É a oportunidade que estávamos precisando para conseguir
provas capazes de destruir aquele desgraçado.
— De jeito nenhum! — Kevin protesta, passando o braço em torno da
minha cintura em um gesto de proteção. — Lucy não vai se arriscar
voltando lá. Naquele lugar ela não volta e está acabado.
— Ela não vai estar correndo risco algum, o maldito não sabe quem ela
é. Para ele é só uma garota que encontrou na noite, de quem gostou a ponto
de fazer duas propostas seguidas. Além do mais, quem tem que decidir isso
é Lucy, não você.
Quando Dylan se cala, todos olham para mim, inclusive as meninas que
ouviram as vozes alteradas e vieram dos quartos sentarem-se á mesa, como
se estivéssemos em uma de nossas rotineiras reuniões. A única diferença
são as caras de ressaca de todos.
Quase todos os membros do JUD estão reunidos ali, concentrados em
mim a espera de uma decisão que pode garantir a tão sonhada vitória na luta
que há anos todos nós travamos contra Rudolf.
Eu ainda não tinha pensado nisso, devido ao abalo emocional que vem
me tomando desde que acordei naquele lugar, mas Dylan está coberto de
razão. Se eu estiver morando no palácio de Chambers, no ninho do nosso
inimigo, com todos os segredos dele à minha disposição, em pouco tempo
conseguiremos destruí-lo, da mesma forma como ele destruiu o governo
anterior. É a oportunidade perfeita de vingar a morte do meu padrasto, a
destruição da minha mãe e o distanciamento com meu irmão, talvez a única
oportunidade.
E não seria tão difícil assim, afinal ele não sabe quem sou, acredita que
sou apenas uma bêbada louca que bateu em seu carro durante a madrugada,
a quem levou para a sua cama. Como ele próprio colocou, eu não precisaria
me tornar sua amante para garantir minha permanência no palácio, basta
que eu sirva de companhia para sua mãe. A melhora que a pobre mulher
teve ao me confundir com sua filha desparecida, me garantiria minha
permanência lá, onde eu posso colher provas suficientes para levar Rudolf à
ruína, porque todo político tem o rabo preso com alguma questão legal, com
ele não pode ser diferente. É a forma mais rápida e eficaz que tenho de
alcançar meu objetivo de vida, que é destruí-lo.
Mas e se eu mudar enquanto estiver lá?
— E se eu mudar enquanto estiver lá? — faço a pergunta em voz alta e
Kevin arregala os olhos, horrorizado.
— Você não está pensando em fazer uma coisa dessas, não é? — indaga
ele.
— Ele me disse que posso ser acompanhante de sua mãe. — tento.
— Mas antes ele te disse outra coisa. — Kevin se altera e afasta-se um
pouco.
Olho para ele e não sei o que dizer.
Ele sabe que se eu não sair de mim de novo nada acontecerá entre mim e
Rudolf e se a mudança voltar a acontecer, não importa onde eu esteja, vou
ficar com outro homem e magoá-lo da mesma forma. Então não faz
diferença se eu for para o palácio ou não. Só que estando em Chambers
serei mais útil para todos.
— Enquanto Lucy for ela mesma nada vai acontecer entre eles Kevin,
relaxa. E se ela mudar, não importa onde esteja, algo sempre acontece. —
Dylan fala por mim e Kevin desvia seu olhar para o chão, derrotado.
Eu realmente gostaria de ter um meio de nunca mais voltar a magoá-lo,
mas não existe esse meio. Já fiz todos os tratamentos disponíveis para a
minha doença e nenhum deu resultado. Continuo do mesmo jeito e
enquanto eu for portadora de transtorno dissociativo de personalidade, estou
correndo o risco de assumir a identidade de uma garota promíscua como
Samantha ou de alguém pior, uma assassina, talvez. Não importa onde eu
esteja, esse risco sempre estará comigo e Kevin sempre será ferido. É
inevitável.
Depois de algum tempo de conversa, quando todos concordam com
Dylan sobre eu aceitar a proposta do nosso inimigo e me infiltrar no seu
palácio para colher provas contra ele, quando pesamos os pós e os contras
dessa infiltração, encontrando mais prós do que contras, Kevin finalmente
se acalma e volta a me tomar em seus braços, ciente de que se não
concordar com isto, o risco de me perder será ainda maior.
Ninguém mais faz nada durante aquela manhã a não ser ajudar a elaborar
aquele plano, todos se mostram muito otimistas e não se intimidam em dar
pitacos sobre como devo agir durante minha arriscada missão, sobre onde
procurar por provas, sobre como armar contra ele com a intenção de
prejudicá-lo de todas as formas possíveis, desde interferindo em suas
decisões, o que acredito estar muito longe do meu alcance, até a manchar
sua imagem perante a população, algo que já não acho tão difícil.
Alguém diz que se meu alter ego voltar, eu devo tomar cuidado para não
revelar a Rudolf que faço parte do JUD, ou tudo estará perdido, mas essa
pessoa não sabe que não tenho controle algum sobre esse alter ego.
À tarde, Kevin consegue localizar seu carro que bati na estrada que leva
á Taunton e o traz de volta.
No final do dia está tudo certo para que eu volte ao palácio na manhã de
segunda feira e aquela noite Kevin e eu nos entregamos um ao outro como
se fosse a última vez, embora ambos saibamos que é só uma despedida
temporária, logo eu darei um jeito de sair do palácio para vir vê-lo, não
ficaremos separados por muito tempo. Não n desgrudamos durante o
domingo e na manhã de segunda, telefono para o número do celular que
Rudolf me deu e ele concorda em me receber de volta como acompanhante
de sua mãe. Combinamos que seu motorista me apanhará no mesmo hotel
onde me deixou.
Quando deixo o apartamento, carregando minha mochila de roupas nas
costas, os membros do JUD ficam para trás com os olhos cheios de
esperança, com exceção de Kevin, que guarda uma agonia dolorosa na sua
expressão.
CAPÍTULO VI
Lennon.
Mais uma vez não consigo me concentrar no que dizem os vários chefes
de estado e ministros reunidos na grande sala. Sei apenas que estão todos
agitados devido a repercussão da manifestação na imprensa mundial, o que
possivelmente vai gerar uma investigação em nosso governo e como a
maioria ali tem o rabo preso com a justiça, estão todos com medo do
resultado.
Quanto a mim, consigo apenas pensar na situação em que minha mãe
ficou depois que a fedelha foi embora. Ao notar sua demora em retornar
para a sala, ela teve uma violenta crise nervosa e voltou ao estado
catatônico no qual vive quase que constantemente mergulhada depois que a
depressão pelo sumiço de Lindsay se agravou demais.
Foi realmente doloroso assisti-la se esvaindo em lágrimas, com o corpo
todo trêmulo, gritando pela filha desaparecida e sem poder fazer nada. É em
momentos como esse que me sinto o mais canalha dos seres, por ter sido
conivente com o que minha irmã fez, por ter permitido que se afastasse
desta forma. Eu fui seu cúmplice, não há perdão para o que a incentivei a
fazer e a maior vítima nisso tudo está sendo minha mãe.
Por vezes penso em contar a verdade e fazer Lindsay voltar, mas isto me
custaria o cargo de presidente e talvez até minha liberdade.
A ideia inicial era que forjássemos sua morte, porém, não concordei,
pois a esperança de que ela volte um dia é o que ainda mantém minha mãe
viva, mesmo que em estado de demência. Uma demência que vem se
agravando com o tempo, prova disto é o fato de ela ter confundido uma
completa desconhecida com Lindsay, embora isto tenha lhe feito bem. E
como disse o médico, se lhe fez bem não há necessidade de que a
contrariemos tentando fazê-la ver a verdade.
O que me consola no momento é saber que aquela garota vai voltar.
Como integrante de um movimento que vem tentando me destruir há anos,
ela não vai desperdiçar a oportunidade de se infiltrar no palácio de
Chambers, essa é uma certeza que tenho.
O ministro da educação está fazendo um discurso quando meu celular
particular vibra no bolso do meu paletó e sei que é ela. Afasto-me para
atender, sem a menor cerimônia, causando alguns bochichos entre os
presentes.
— Oi.
— Olá... aqui é... anh... Lucy. A proposta de cuidar da sua mãe ainda
está de pé?
— Sim. Onde mando o motorista te apanhar?
— Primeiro preciso ter certeza de que essa será minha única função no
palácio. Sobre ser sua amante...
— Eu já entendi. — a interrompo, impaciente. — Não precisa se
preocupar com nada. Se você acha que concordou com isto num momento
em que não estava assimilando as coisas com clareza por causa do álcool,
eu retiro o que disse. Apenas faça companhia à minha mãe. — eu
praticamente imploro e, considerando que ela é uma inimiga, isso me deixa
furioso.
Precisar das pessoas sempre foi algo que me enfureceu, precisar de
alguém que quer me destruir é o cúmulo do absurdo.
— Certo. Estou no mesmo lugar onde seu motorista me deixou ontem.
Pode mandar me apanhar.
— Ok, o motorista estará aí em alguns minutos. Estou trabalhando agora,
mas vou deixar os funcionários do avisados sobre sua chegada. — hesito
antes de continuar. — Se minha mãe continuar chamando você de Lindsay,
por favor, não a contrarie.
— Certo. Entendi.
Com isso, encerro a ligação e faço outra para que Robert vá apanhá-la
pessoalmente.
Falo também com Donald, para que ele deixe todos os seguranças do
palácio cientes de quem é aquela garota e do que pretende ao se infiltrar no
palácio, ordeno que ela seja constantemente vigiada e, considerando que é
muito jovem para ser uma profissional em qualquer coisa que não mentir,
não acredito que consiga alcançar seu objetivo que certamente é me
prejudicar. Em todo caso, é melhor que ninguém mais, além da equipe de
seguranças, saiba dessa história, apenas por precaução caso alguma coisa
venha a dar errado.
A reunião se estende até ao meio dia. Ao final da mesma ficou decidido
que investiremos mais dinheiro na divulgação da nossa imagem via internet,
pois esse está sendo o principal veículo de informações no mundo
atualmente. Contrataremos blogueiros, jornalistas independentes e jovens
que convençam a população a se manifestarem a nosso favor também, já
que eles parecem ter mais facilidade de serem ouvidos e de usarem os
recursos da web.
Por enquanto, não tomaremos nenhuma medida drástica contra os
manifestantes que foram às ruas, pois isso pode gerar ainda mais hostilidade
por parte do mundo em relação ao nosso governo.
Sou tão absorvido por esse assunto no gabinete, que me esqueço de tudo
mais. Quando retono ao palácio para o almoço, levo um susto ao me
deparar com a fedelha sentada à mesa de refeições junto com minha mãe,
ambas envolvidas em uma conversa animada.
Antes de ser visto, paro para observá-las de perto da porta e me dou
conta do quanto é maravilhoso ver minha Ruth falando de novo, sorrindo,
com a face mais corada, até um pouco mais saudável. Olho para aquela
menina e me pergunto o que ela tem de tão especial que foi capaz de causar
aquele efeito em minha mãe. Ela não se parece nem um pouco com
Lindsay, apenas os cabelos loiros têm um tom ligeiramente semelhante.
Lindsay é mais alta, com um metro e oitenta, mais corpulenta e menos
delicada. As feições também nem se comparam.
Mas o fato é que minha mãe viu alguma coisa nela.
Observo-a com atenção, a procura do que possa ser e percebo, mais uma
vez, o quanto é bonita. Ali, conversando com a outra mulher, muito mais
velha, parece completamente relaxada, como se não estivesse sob o teto de
alguém que certamente considera um inimigo, a quem obviamente almeja
prejudicar, até esboça um sorriso suave entre uma fala e outra. Seu rosto
sereno, delicado e sem maquiagem alguma, parece o de uma boneca de
porcelana, raro e intocado. Exala uma inocência meio angelical em seus
gestos, a qual, se eu não a tivesse visto bêbada, toda atirada, podia jurar que
existe.
Está usando jeans e uma blusa cor de creme muito comportada, com a
gola alta e mangas compridas. Os cabelos estão presos em um rabo de
cavalo.
Dou um passo adiante e pigarreio para que minha presença seja notada.
Ao me ver, a garota dá um salto da cadeira, colocando-se em pé,
completamente retesada, tensa, sua fisionomia se fechando como o céu
antes de uma tempestade.
— Olá, querido. Veja quem está de volta. Nossa menina. — minha mãe
fala, com a voz animada.
— Isso é muito bom, mamãe. — inclino-me e dou-lhe um beijo na testa.
Quando vou fazer o mesmo com a garota, apenas para convencer minha
mãe de que acredito que ela é minha irmã, esta se esquiva, como se tivesse
medo de mim. Dou uma piscadela e gesticulo para mamãe, fazendo com
que compreenda minha intenção e só então ela permite o contato. Quando
meus lábios encontram a pele macia do seu rosto, não querem mais sair de
lá.
Minha nossa! Ela parece ainda mais desejável que antes. É muito macia,
delicada, emana um calor gostoso que parece um convite à tentação. Tem
um cheiro delicioso, feminino, cuja fragrância não consigo reconhecer, só
sei que quero levá-lo comigo.
Acho que me demoro mais que o necessário com a boca colada na sua
face e a menina se afasta, séria como se estivesse chupando limão.
Definitivamente não parece a mesma garota atirada que se despiu para mim
naquela noite e começo a me arrepender por perder a oportunidade de tê-la
feito minha.
A imagem do seu corpo nu, deliciosamente cheio de curvas perfeitas,
com os seios empinados, os bicos rosados, a boceta lisinha, toda depilada,
se projeta em minha mente e preciso me sentar depressa para esconder a
ereção que se faz sob minha calça.
“O que está acontecendo com você, Lennon? Essa garota está aqui com
a intenção única de te prejudicar. Acorda cara!” Digo para mim mesmo.
Acomodo-me na cabeceira, enquanto a garota continua em pé, me
olhando assustada, como se eu fosse um ET de cinco cabeças.
Grande invasora ela é, parece ter pavor do cara a quem pretende fazer de
vítima.
— Você não vai se sentar, Lindsay? — falo, enfatizando o nome da
minha irmã.
A menina parece confusa e tímida como uma colegial no primeiro dia de
aula e mais uma vez me pergunto que espécie de revolucionária é ela.
— Sente perto de mim, minha querida. — minha mãe pede, seus olhos
brilhando ao observar a pirralha.
Para ela, a garota sorri, amavelmente, antes de sentar-se ao seu lado.
Como se estivessem apenas esperando minha chegada, duas empregadas
começam a servir o almoço, um verdadeiro banquete, com vários tipos de
carnes, gratinados, saladas e purês, como há muito tempo eu não via ali em
Chambers, aliás nem me lembro da última vez em que fiz uma refeição
naquela mesa, junto com minha mãe. Normalmente, eu almoço no gabinete
mesmo, enquanto Ruth é alimentada por Diana. Vim para o almoço hoje
apenas para ver como ela está e não poderia ficar mais satisfeito. Aquela
menina realmente tem o poder de lhe fazer bem. É verdadeiramente uma
pena que se trata de uma inimiga, ou poderia se tornar empregada
permanente da família. Porém, como sugeriu Donald, posso tentar trazê-la
para o nosso lado, mostrando-lhe qual é de fato a finalidade da minha forma
de governo. Qualquer pessoa com o mínimo de inteligência apoiaria nosso
sistema de governamental se o conhecesse de perto.
— E Diana, onde está? — pergunto, me servindo de uma coxa de frango
assado com batatas.
— Eu dei o dia de folga a ela. Quis passar algum tempo sozinha com
minha filha. — Ruth fala sorrindo, como não a vejo fazer há muito tempo.
Parece um milagre que a presença de Lucy a esteja recuperando tão
depressa.
— E você, Lindsay, o que está achando de voltar para casa? — não
podemos nos falar muito na presença de Ruth, pois corremos o risco de
dizermos algo que a leve a desconfiar que aquela menina não é Lindsay,
todavia, sinto uma necessidade latente de ouvir a voz dela, de saber como
foi o processo para deixar seu grupo de amigos e chegar até aqui.
Quero saber qual foi a reação deles ao descobrirem que o plano de se
aproximar de mim deu certo até mais do que esperavam, principalmente a
reação do tal namorado. O cara deve ser um completo idiota por permitir
que uma garota como aquela fique sob o mesmo teto que outro homem.
Aliás, muitos outros homens, levando-se em conta a quantidade de
seguranças que vivem aqui.
— Estou achando maravilhoso. — diz ela, com a voz meiga como a de
um anjo, porém posso sentir o veneno impregnado no seu timbre, muito
sutilmente, e tenho certeza de que quer dizer que está achando maravilhoso
poder se infiltrar aqui como uma cobra pronta para dar o bote a qualquer
momento.
— Querido, Lindsay me contou sobre os lugares maravilhosos onde
esteve na América. Você devia ouvir. — Ruth diz, comendo sozinha depois
de dois anos.
— Estou ansioso para ouvir. — tento não parecer sarcástico, pelo bem da
minha mãe.
— Bom... eu... anh... morei durante algum tempo na Austrália, depois
me mudei para os Estados Unidos, mais especificamente para Nova
Iorque... — a menina começa a narrar uma trajetória de vida cheia de
aventuras incríveis como se fosse tudo verdade, mas sei que não é. De
acordo com as investigações que Robert fez, ela cresceu em um orfanato no
interior do país, depois que atingiu a maioridade e saiu de lá foi trabalhar
como garçonete aqui mesmo em Bristol, para logo em seguida se afiliar ao
JUD e viver à custa dos seus fundadores, jovens integrantes de famílias
ricas que não fazem mais nada além de me infernizar.
Uma coisa eu tenho que admitir: ela mente muito bem, consegue
inclusive fazer uma expressão sonhadora enquanto inventa suas histórias,
como se realmente as tivesse vivido.
A princípio acredito que esteja mentindo simplesmente por prazer, mas
logo compreendo, pelo olhar com que minha mãe a observa, que está
tentando convencê-la de que teve uma vida feliz, para que Ruth fique
satisfeita e não a questione por não ter voltado para casa por tanto tempo. É
uma estratégia inteligente de sua parte para garantir sua permanência no
palácio.
Minha mãe está tão senil que acredita em tudo o que ela fala, não parece
ter a mínima dúvida de que aquela menina é Lindsay.
Ao final da refeição, continuamos ali na mesa conversando como se
fôssemos uma família despreocupada e aos poucos vou compreendendo
porque Lucy surtiu aquele efeito tão poderoso sobre Ruth, ela sabe ser uma
garota doce e carismática quando quer, sabe conquistar a atenção e o afeto
das pessoas, pena que seja tão falsa quanto uma nota de três libras.
Por fim, chega o momento em que Ruth costuma tirar seu cochilo da
tarde, quando Lucy ficará finalmente sozinha e poderá agir.
Tenho uma reunião marcada para aquele momento, com o ministro da
agricultura, mas mando cancelar só para ver o que ela vai fazer quando
estiver sozinha. Quero saber como Lucy pretende agir, qual será sua
estratégia de taque.
Assim, enquanto as duas sobem para o quarto de Ruth no segundo andar,
pela rampa adaptada, vou para a sala dos seguranças, um cômodo enorme,
repleto de aparelhos eletrônicos modernos, onde os rapazes, que trabalham
sob o comando de Donald, se encontram sentados diante e um painel de
monitores ligados, nos quais são exibidas as imagens de todas as
dependências do palácio. Há um monitor para cada câmera, e há uma
câmera em todos os cômodos da residência, nos jardins e nas ruas em volta.
— Como estão as coisas por aqui? — pergunto.
— Tudo tranquilo. — é Donald quem responde. — Você não tinha uma
reunião agora?
— Cancelei. Quero ver o que essa pirralha vai fazer.
— Cara, relaxa. Deixa que a gente tomar conta disso. Essa menina não
vai dar um passo sem que estejamos de olho nela.
— Eu sei, mas quero ver pessoalmente. — sento-me em uma poltrona na
frente do painel com dezenas de monitores. — O que ela já fez hoje desde
que chegou?
— Nada a não ser ficar com sua mãe. — Donald responde. — Após nos
fornecer seus documentos, como você ordenou, não desgrudou mais dela.
Passaram a manhã inteira conversando. Primeiro no jardim, depois na sala
da lareira.
— Sobre o que falaram?
— Lucy lhe contou as mesmas histórias que contou a você durante o
almoço e a Sra. Rudolf deixou claro o quanto esteve preocupada sem ela. A
moça parece gostar da sua mãe, cara. Não deu um passo sem ela durante
toda a manhã e a tratou com muito carinho.
— Não se engane com aquela cara de anjo, meu caro. — alerto-o. — Eu
sei que ela é tentadora, mas é falsa. E sei porque já vi a face verdadeira
dessa garota na noite em que bateu no meu carro, ela não é tão doce quanto
parece.
No monitor, vejo Lucy ajudando minha mãe a se acomodar na sua cama.
Tira seus chinelos com todo cuidado, como se realmente se preocupasse
com ela, mas a mim não engana. Em seguida, planta-lhe um beijo terno na
face e se dirige para o quarto ao lado, onde está instalada.
— Vocês olharam as coisas dela? — pergunto.
— Sim. Não há nada lá. Sem armas ou medicamentos perigosos.
Sozinha no quarto, Lucy tira as poucas peças de roupas que trouxe em
uma mochila e as organiza no closet. Olha em sua volta, examinando cada
detalhe do aposento, preocupada, como se procurasse por uma câmera, mas
nem desconfia onde está escondida. Então, começa a se despir de suas
roupas e todos na sala ficam mudos, com a respiração presa, os olhos
vidrados no mesmo monitor, esperando pelo espetáculo.
Mas que garota estúpida! Será que não passa pela sua cabeça que não
deixaríamos uma estranha sem observação dentro do palácio e de que há
meia dúzia de marmanjos loucos para se excitarem com seu corpo nu?
— Virem-se senhores. — ordeno. — Vamos dar um pouco de
privacidade à garota.
Todos obedecem sem protestar, mostrando-se desconcertados enquanto
dão as costas para os monitores, com exceção de Donald, que por ser meu
amigo pessoal se acha no direito de contestar minhas ordens.
— Ela pode estar tirando cianeto do sutiã enquanto estamos de costas. —
fala ele.
— Eu vou ficar de olho. Pode virar.
Lucy tira a calça e a blusa depressa, exibindo as curvas perfeitas do seu
corpo. Olha em volta mais uma vez, como se seus instintos lhe avisassem
de que está sendo obsevada e por fim se livra da calcinha e do sutiã de
renda cor de rosa.
Observo sua completa nudez, os seios pequenos, durinhos, com bicos
rosados, a pele lisinha, sem qualquer imperfeição, as penas longas e firmas,
o sexo depilado e sou arrastado para uma espécie de transe. Meu pau fica
tão duro dentro da calça que chega a doer.
Ela se move com leveza no quarto, colocando-se na frente do espalho na
prede do closet para prender os cabelos no alto da cabeça. Começo a
acreditar que sabe sobre as câmeras e está se exibindo de propósito com a
finalidade de seduzir algum dos seguranças, ganhar sua confiança e depois
usá-lo a seu favor, porém, de súbito, ela fica imóvel na frente do espelho.
Leva uma mão à lateral do seu seio esquerdo e seus lábios tremem,
enquanto as lágrimas marejam seus olhos.
Aproximo a câmera para ver o que tem ali e consigo enxergar a cicatriz
quase imperceptível, que parece ter sido feita a dentadas e fico curioso
sobre aquilo. Terá sido ela violentada?
É uma cicatriz tão pequena que não me lembro de tê-la notado quando a
vi nua da outra vez.
Lucy se enrola em uma toalha e entra no banho. Enquanto a espero sair,
fico imaginando quantas vezes por dia vai agraciar aquele bando de
marmanjos com a imagem da sua nudez tão encantadora que merecia
pertencer a um homem apenas. Mas o idiota a quem pertence não sabe dar o
devido valor e a entrega de bandeja ao inimigo mais próximo.
Ela sai do banho e mal consigo piscar enquanto veste roupas limpas,
novamente jeans e uma blusa mais leve, colorida. Seca os cabelos, loiros e
densos e prende-os em um rabo de cavalo. Caminha de um lado para o
outro do aposento, como se estivesse nervosa e por fim sai.
Ao sinal de Donald, que se virou de novo para o painel sem que eu
percebesse, todos os seguranças se colocam em total alerta, da forma como
certamente foram orientados com antecedência.
No corredor, Lucy olha para os dois lados, como se checasse se
realmente está sozinha e desce as escadas, sorrateiramente, sempre
averiguando os arredores.
Mergulhados em um silêncio tenso, a assistimos, através dos vários
monitores, vagar pelas dependências do palácio, em alerta, como se
tramasse algo. Percorre a biblioteca, onde mexe nos livros sem de fato
parecer se interessar por eles, averigua os salões de festas até que vai parar
no meu escritório e como já esperamos, começa a fuçar as gavetas dos
armários e da mesa.
— O que ela está querendo? — indago quase para mim mesmo.
— Provas contra você. Está na cara. — Donald diz. — Tem alguma
coisa lá que possa te complicar?
— Não. Eu não deixaria nada importante assim tão exposto. Mas acho
melhor ir até lá. Ela pode encontrar a passagem secreta e isso seria um
problema.
— Não acho que ela encontre. Acho melhor continuarmos observando
para vermos onde ela quer chegar.
— Não foi você quem sugeriu que eu a trouxesse para o nosso lado?
Então, vou fazer a minha parte e tentar convencê-la a se tornar nossa aliada.
Deixo um Donald contrariado para trás e vou para o escritório.
Quando atravesso a porta, a garota está atrás da minha mesa, inclinada,
fuçando as últimas gavetas e dá um pulo de susto. Encara-me paralisada,
sem uma gota de sangue no rosto, com os olhos arregalados de pânico.
Se é tão medrosa, por que concordou em vir até aqui, sozinha, me
enfrentar? Não consigo entender.
— Interrompo? — pergunto, aproximando-me devagar, sem desviar
meus olhos dos dela, vendo-a ficar mais pálida a cada passo que dou na sua
direção.
— Não. Claro que não. — ela está desconcertada, passa a mão pela nuca
tentando ganhar tempo para pensar sobre o que dizer, como se não cogitasse
que poderia ser apanhada bisbilhotando. — A Sra. Rudolf me pediu para
encontrar um porta retratos antigo, cor de prata e achei que pudesse estar
aqui.
Ela não é tão boa mentirosa quanto pensei, sua desculpa é esfarrapada
até demais.
Sinto-me tentando a continuar questionando-a só para vê-la ficando mais
nervosa e sem jeito, mas a tentação de tê-la como aliada, da forma como
Donald sugeriu, é ainda maior, então decido tentar.
— Você gosta de política? — indago, fingindo que não achei estranho
encontrá-la ali, fuçando minhas coisas.
CAPÍTULO VII
Lucy.
Meu coração bate tão acelerado que tenho a impressão de que vai sair
pela boca a qualquer momento. Acho que nunca senti tanto medo na minha
vida como neste momento.
Eu não esperava ser apanhada revirando as gavetas do escritório do
presidente logo na minha primeira tentativa de encontrar algo que possa
usar para incriminá-lo e assim destituí-lo do seu cargo. E menos ainda
esperava ser encontrada pelo próprio Rudolf. Ele não devia estar
trabalhando em seu gabinete agora?
Entretanto, ele não parece tão preocupado com a minha intromissão,
parece não desconfiar dos meus objetivos e age como se eu fosse uma
pessoa amiga, perguntando-me se gosto de política. Só que me recuso a
acreditar que possa ser tão ingênuo. Ele sabe que estou aqui bisbilhotando,
apenas não quer deixar transparecer, por que razão eu nem imagino.
— Mais ou menos. — respondo, sem saber mais o que dizer.
Na verdade, eu não entendo muito sobre o assunto. Ao contrário dos
outros membros do JUD, que sabem tudo sobre o tema e as diferentes
formas de governo, eu sei apenas o que ouço deles, pois não estou nessa
luta por causa do bem estar da nação, o país pouco me importa, eu quero a
ruína daquele desgraçado à minha frente porque ele precisa pagar pelo que
fez à minha família.
— Venha comigo, quero te mostrar uma coisa.
Sem esperar resposta, Rudolf dirigi-se para a saída, caminhando
depressa, com passos tão largos que quase preciso correr para conseguir
acompanhá-lo. Atravessamos dois grandes salões e entramos em uma sala
abafada, com poltronas acolchoadas e um telão pequeno, como uma sala de
cinema para poucas pessoas.
— Que lugar é esse? — pergunto, receosa de que ele possa estar
tramando algo contra mim.
Desde o instante em que concordei em me infiltrar no palácio, estou
ciente de que devo ficar sempre em alerta perto daquele homem, pois além
de um assassino, ele é sórdido, frio e cruel, pode me fazer mal a qualquer
momento, porque me neguei a me tornar sua amante depois de passar a
noite com ele. Homens assim dificilmente aceitam ser rejeitados por uma
mulher, principalmente por uma mulher a quem acredita ser uma bêbada
sem um emprego, como ele disse que o fiz acreditar e não estou convencida
de que sinta amor pela mãe a ponto de relevar tudo em nome do bem estar
dela.
— É só uma sala de projeções. Sente-se. — aponta para uma das
poltronas e me acomodo ali, tensa, atenta e apreensiva aos movimentos
dele.
A impressão que eu tenho é de que Rudolf pode fazer algo contra mim a
qualquer momento.
Ele prepara um data show para a exibição de um filme, apaga as luzes,
deixando o lugar banhado pela penumbra e senta-se ao meu lado, tão perto
que a manga do seu paletó roça levemente meu braço, o que me deixa tão
tensa e desconfortável que preciso mudar de posição para desfazer o
contato.
— Que filme é esse? A Sra. Rudolf pode acordar a qualquer momento.
Não posso me demorar aqui. — falo, pouquíssimo à vontade por estar
sozinha em uma sala escura com o sujeito que tirou a vida do meu padrasto
com as próprias mãos.
— Ela dorme praticamente durante toda a tarde. Relaxa. Aliás o que está
achando de trabalhar com ela?
— Bom. Sua mãe é uma mulher muito amável.
E eu estou gostando mesmo, porque a Sra. Rudolf me faz lembrar minha
mãe, não sua aparência, pois minha mãe é bem mais jovem, mas o fato de
ambas serem mulheres sofridas, que adquiriram problemas mentais por
terem perdido alguém. No caso da minha mãe, perdeu o meu padrasto e a
maior ironia nisso é que agora estou cuidando da mãe do seu assassino,
embora não consiga odiá-la, mas apenas àquele maldito.
Rudolf aperta um botão no pequeno controle remoto em sua mão e o
filme começa a ser exibido. São imagens em preto e branco, uma sucessão
de recortes de jornais onde há fotografias de crianças desnutridas e
maltrapilhas no colo de suas mães tão maltratadas quanto. Há também
imagens de corpos sem vida de bebês raquíticos; de garotos bem jovens
fumando craque; pessoas doentes amontoadas em leitos nos corredores de
hospitais; moradores de rua se aquecendo em fogueiras acesas em latões;
meninas bem jovens nas calçadas vestidas como prostitutas.
— O que é isso tudo? — pergunto, incomodada com a proximidade dele.
Aquele homem parece irradiar uma energia poderosa, tão intensa que
mesmo desfazendo o contato com a manga do seu paletó, ainda posso sentir
o calor que emana do seu corpo, tão presente que é como se o estivesse
tocando e isso me deixa desconfortável.
— São imagens da população economicamente desfavorecida de
Newhart antes do meu governo. Preste atenção.
As imagens continuam sendo exibidas, como numa apresentação de
slides. Agora são coloridas e mostram jovens ricos estudando nas
faculdades públicas do país; homens e mulheres bem vestidos em
aeroportos; outros viajando em carros de luxo.
— Eu não estou entendendo o que isso tem a ver comigo. — falo,
ansiosa para sair de perto dele.
Rudolf interrompe a apresentação e a sala fica ainda mais escura quando
o filme para.
— Tem tudo a ver com você, Lucy. — ele fala olhando-me diretamente
no rosto de tão perto que posso sentir o cheiro de cigarro em seu hálito. Não
é algo desagradável, mas me deixa ainda mais nervosa. — Me diga o que
você vê nessas imagens?
— Vejo pessoas pobres e pessoas ricas. O que tem de mais nisso? É a
ordem natural das coisas.
— A ordem natural das coisas? Você realmente acredita nisso?
De súbito, entendo onde ele quer chegar. Está tentando me convencer de
que sua forma de governo é melhor que a do governo anterior. Não entendo
muito disso, mas sei que ele quer propagar a igualdade entre as classes
sociais, algo impossível de acontecer no capitalismo e, de acordo com o que
ouço os membros do JUD dizendo, não há nenhum país que não mergulhe
na miséria sem praticar o capitalismo.
— Sim, eu acredito. Se uma pessoa se dedica às aulas na escola, se passa
as noites em claro estudando para conseguir ser aprovado em uma
universidade pública, se prefere trabalhar e investir em subir na vida ao
invés de ficar na farra é justo que ela mereça ter uma vida melhor, porque se
esforçou mais que os outros. — falo.
— E você nunca parou para pensar que essas pessoas miseráveis possam
estar em tais condições por falta de oportunidades?
— Não vejo como isso seja possível. A escola e a faculdade sempre
foram públicas.
— Sim, mas apenas quem tinha dinheiro para pagar por cursos
particulares ingressavam nas faculdades. — não tenho uma resposta para
isto, pois nunca tentei entrar em uma faculdade, mas lembro de ter ouvido
minha mãe dizer que as universidades públicas do país eram apenas para os
ricos. — Vamos ver o que mudou depois que me tornei presidente. — ele
aperta novamente o botão do controle remoto e são exibidas imagens
coloridas de crianças com aparência saudável, jogando futebol, nas
periferias da cidade. — A construção do ser humano enquanto cidadão
precisa começar ainda na infância. — ele fala — Desde que nasce, a criança
precisa ter uma alimentação saudável para conseguir ir à escola e absorver o
aprendizado necessário para as séries posteriores, porque como fome, sem
as vitaminas necessárias circulando pelo corpo, elas não aprendem nem o
básico. Então uni as duas coisas e criei o Auxílio Cidadão, um programa
social em que as famílias beneficiárias recebem uma determinada quantia
em dinheiro em troca da obrigatoriedade de que as crianças frequentem a
escola, assim elas estarão alimentadas e com a certeza de que receberão o
aprendizado necessário.
Eu me lembro desse Auxílio Cidadão, os membros do JUD dizem que é
uma forma que Rudolf encontrou de tornar os beneficiários reféns do seu
governo. Dizem ainda que muitas pessoas deixam de trabalhar par para
viver à custa do benefício e portanto são vagabundas, há também o
comentário de que fazer filhos se tornou um negócio, pois quanto mais
filhos a família tem, maior se torna o valor que recebe. É o programa
implementado por Rudolf que mais recebe críticas da oposição, pois para
que o governo tenha condições de entregar o benefício, foi necessário
aumentar o valor dos impostos e isso vem tornando as famílias abastadas,
aquelas que realmente trabalham, que estudaram para ter uma vida melhor,
menos ricas, com a sensação de que são obrigadas a sustentar os pobres do
país.
— Não vejo o que isso possa ter a ver comigo. — repito, tentando me
convencer de que ele está errado, embora seja meio difícil depois das
imagens que vi.
— Você é uma cidadã de Newhart, tem tudo a ver com isso. — As
imagens continuam aparecendo no telão. Agora é exibido um filme com
cenas de jovens negros, latinos e pobres saindo das universidades com um
sorriso largo no rosto, depois aparecem adolescentes nas periferias
praticando esportes em instituições governamentais e hospitais públicos
com mais médicos. E por fim o filme acaba. — É para programas sociais
como esses que você viu, com os quais os pobres também podem fazer
faculdade, os adolescentes podem praticar esportes ao invés de se
drogarem, moradores de ruas têm abrigos e os miseráveis têm direito a uma
saúde pública de qualidade, que estou investindo o dinheiro dos impostos
daqueles que têm mais, por isso meu governo está recebendo a reprovação
das pessoas ricas, que também têm mais voz, elas não querem que seus
impostos sejam gastos com os pobres. Você não acha justo que quem tem
mais possa dividir um pouco com quem não tem nada?
Eu não entendo porque ele está me perguntando aquilo. O que está
tentando provar? Por que precisa da minha aprovação para o seu governo?
Eu não estou aqui para isto. Além do mais, não posso acreditar que um
assassino, que tira a vida de um ser humano, friamente, como tirou a do
meu padrasto, possa estar preocupado com o bem estar de pessoas
miseráveis a quem nem conhece. Todos esses programas sociais devem ser
de fachada para que ele possa roubar o dinheiro dos impostos e se tornar
cada vez mais rico, pois sua ganância é imensurável.
É isso que as emissoras de televisão e todos os revolucionários contra o
seu governo dizem. Devem estar todos certos, visto que não acredito que
algo de bom possa partir de Lennon Rudolf.
— Eu não sei de nada, Sr. Rudolf...
— Me chame de Lennon. — ele me interrompe.
— Só sei, Sr. Rudolf, que tem muita gente neste país que está uma fera
com o senhor. Prova disto são as manifestações que vem acontecendo e se
tornando cada vez maiores.
— Manifestações promovidas pela mídia capitalista e por pessoas ricas
que não suportam o rumo que estou dando aos seus impostos.
Como ele pode saber que os integrantes do JUD e de outros grupos
revolucionários são todos ricos?
— E o senhor já viu algum país ir para a frente sem o capitalismo?
— Para de me chamar de senhor, que droga! — ele esbraveja e quase
caio da poltrona com o susto.
— Acho melhor eu ir ver se a Sra. Rudolf já acordou.
Tento me levantar, ele segura-me firme pelo braço com sua mão que
parece de aço, me forçando a continuar sentada.
— Ela dorme a tarde toda! Me diga, Lucy, você acha justo que alguns
tenham o suficiente para viajar todos os finais de semana, para usar um
terno que custa milhões, para comer caviar e beber champanhe caro,
enquanto outros morrem de fome porque não tiveram oportunidades iguais?
— Eu não sei de nada e não estou aqui para julgar isso. — tento puxar o
meu braço, ele continua segurando com força. — Isso que o senhor...
— Você!
— Isso que você está fazendo é implementando o socialismo em um país
cujos fundadores lutaram bravamente para emancipar da monarquia do
Reino Unido e o socialismo não dá certo em lugar nenhum. — apenas
repito as palavras que são proferidas com frequência pelos revolucionários,
pois não entendo deste assunto e nem me interesso em entender. — Por
favor, me solte, quero sair daqui.
— Qual o problema? Está com medo de ficar sozinha comigo? — sua
voz está carregada de insinuações e isso realmente me assusta, pois ele
conhece o monstro movido pela luxúria que existe dentro de mim, não sabe
que está diante de outra pessoa.
Me sinto sem ar, afadigada e levanto-me com um safanão, libertando
meu braço da sua mão. Caminho depressa para a porta, mas ele me alcança
antes que eu consiga abri-la e me encurrala, aprisionando-me, com um
braço de cada lado do meu corpo, as mãos espalmadas na porta fechada,
embora não me toque.
Viro-me de frente para ele e sinto um estranho tremor em meu corpo
quando me deparo com seus olhos me fuzilando de perto. São olhos
ferozes, penetrantes, de um azul claro excêntrico que parecem enxergar
minha alma.
— Você não estava com medo na noite em que nos conhecemos, pelo
contrário, estava doidinha pra ir pra cama comigo. O que mudou?
Eu deveria ficar ainda mais horrorizada com a forma vulgar como ele
coloca as coisas, mas o fato é que meu corpo reage de forma
completamente inesperada à selvageria impregnada em suas palavras,
minha pele arrepia-se, um calor agradável me percorre inteira, o cheiro de
cigarro em seu hálito me parece espantosamente gostoso e meu rosto
transforma-se em brasas.
Devo estar ficando louca, só pode. Esse homem é um assassino frio e
perigoso, como posso me sentir afetada desta forma por sua proximidade?
— Por favor, senhor Rudo...
— Lennon.
— Lennon. Aquela pessoa não era eu. Eu estava bêbada e, pelo que você
disse, tinha batido a cabeça. Se tivemos relações sexuais, não foi algo que
eu tenha feito de forma consciente.
Ele parece surpreso. Permanece em silêncio por instante antes de
declarar:
— Nós não tivemos relações sexuais. Infelizmente não sou o tipo de
homem que come uma mulher que acabou de sofrer um acidente de carro,
mesmo que ela insista.
— Não? — sinto-me confusa e ao mesmo tempo aliviada.
— Você realmente não lembra, não é? — parece ainda mais espantado.
— Como pode não se recordar de nada? — espera por uma resposta, como
não obtém, continua. — Mas bem que você queria. Ficou peladinha na
minha frente e pediu pra eu te foder.
— Eu estava fora de mim.
— Depois concordou em se tornar minha amante. — ele ignora minhas
palavras e continua falando, sem desviar aquele olhar penetrante do meu
rosto. — Eu ia te levar para um apartamento em Taunton, ia te dar
empregados, cartões de crédito, carros de luxo, para que você ficasse à
minha disposição. Tem ideia do quanto isso seria bom?
Então era isso o que ele pretendia: me transformar em sua prostituta
particular. É mesmo um bastardo!
— Eu jamais concordaria em me tornar a prostituta de um homem. —
declaro, entre dentes.
— Não seja precipitada, Lucy. Eu ainda nem te mostrei a melhor parte
desse negócio.
Sem que eu espere, ele elimina a pouca distância que há entre nós,
colando seu corpo grande e forte no meu, inclina seus joelhos e esfrega sua
ereção bem no meio das minhas pernas, com força.
Sinto-o duro, quente, pulsante, bem ali onde sou mais sensível e algo
inesperado acontece: uma violenta corrente de desejo percorre minhas
entranhas, a umidade se forma entre minhas coxas de forma abundante e
tenho dificuldade em puxar o ar para meus pulmões.
Lennon esfrega-se em mim novamente e desta vez lanço a cabeça para
trás, fecho os olhos e arquejo, deixando clara minha excitação.
Na sua terceira investida, percebo que abri mais a pernas para dar-lhe
espaço e o sinto tão intimamente, tão excitantemente que um gemido alto
me escapa.
Quando abro os olhos, seu rosto está muito perto do meu, a poucos
centímetros de distância, seu olhar está fixo em minha boca e posso prever
que ele me beijará. O pior nisso é que quero aquele beijo, com o desespero
de uma sedenta que precisa de água. Como pode ser isso? Aquele homem
assassinou o único pai que conheci, destruiu a minha família, portanto eu
deveria odiá-lo e não me render ao seu desejo de me tornar sua prostituta.
Penso nisso e a raiva cega toma conta de mim, se sobressaindo a tudo
mais. Sinto raiva de mim mesma por me permitir ser tão fraca, sinto raiva
dele por não respeitar a minha vontade.
A sensação de estar nos braços dele, entregue, é indescritivelmente boa,
mas a fúria dentro de mim é maior e me cega. Sem que eu seja capaz de
evitar, as imagens se projetam em minha mente: estou em uma cama com
dossel, em um quarto com papel de parede florido e há um homem, cujo
rosto não consigo ver, passando a mão em minha pele por sob meu conjunto
de moletom. O ódio dentro de mim se torna quase mortal, ódio de tudo o
que me cerca, o anúncio de que meu outro eu está chegando.
A mudança vai acontecer dentro de mim e então Lennon terá o que quer,
o assassino do meu pai finalmente possuirá o meu corpo, desta vez não
estou acidentada para que ele recue quando o monstro quiser se entregar.
— Não! — grito, com todo o meu desespero, um grito tão alto que
Lennon se assusta e dá um pulo para trás, desfazendo o contato comigo,
seus olhos arregalados presos aos meus.
— Fica calma. Não estou te forçando a nada. — diz ele, parecendo
realmente alarmado.
Aproveito sua distância para abrir a porta e sair correndo, o mais
depressa que minhas forças permitem.
Sem olhar para trás, atravesso os salões, subo a escadaria e entro em meu
quarto antes que ele me alcance. Só me sinto segura depois que tranco a
porta pelo lado dentro. Atiro-me na cama, respiro fundo, uma, duas, três
vezes e começo a me acalmar, agradecendo aos céus que desta vez não saí
de mim, ou teria virado a prostituta daquele maldito assassino.
É uma das raríssimas ocasiões em que fico perto de perder o controle,
mas não perco. Ainda sou eu em meu corpo, não foi desta vez que a doença
me venceu.
A Sra. Rudolf demora tanto a acordar que fico preocupada e vou ao seu
quarto checar se está bem. A encontro mergulhada em sono profundo e toco
sua testa para verificar sua temperatura. Está normal. Ainda assim,
acomodo-me em uma poltrona ao lado da sua cama e espero pelo seu
despertar.
Eu gosto da Sra. Rudolf, tenho piedade da sua demência como tenho da
demência da minha mãe, afinal aquela pobre mulher não tem culpa de ter o
filho demoníaco que tem. Aposto como não conhece metade dos atos de
crueldade dele. E aposto também como Lindsay fugiu do país por causa
dele, trazendo todo esse sofrimento para a mãe.
Depois que acorda, a Sra. Rudolf e eu passamos o resto da tarde
conversando no terraço cercado de flores no jardim dos fundos do palácio.
Só volto a ver Lennon quando nos reunimos em volta da grande mesa
para o jantar. Onde estão a Sra. Rudolf, Diana, que voltou do seu dia de
folga, ele, eu e as empregadas que ficam por perto à nossa disposição.
A Sra. Rudolf é a mais falante da mesa, o que deixa todos felizes.
Quanto a Lennon, quase não fala nada, parece preocupado com algo e
pelo canto do olho, posso ver que me olha de um jeito esquisito, como se
acreditasse que sou louca.
Eu não ligo para o que ela pensa. Se acha que sou louca é melhor, pois
assim fica longe de mim.
Depois do jantar, Diana, a Sra. Rudolf e eu assistimos um filme de
comédia romântica no salão da lareira para em seguida nos recolhermos aos
nossos aposentos. Enquanto espero que todos durmam, para que eu possa
me esgueirar pelo palácio a procura de qualquer coisa que incrimine
Rudolf, telefono para Kevin e o encontro quase em desespero, temendo pela
minha segurança, com medo de que aquele monstro faça algo contra mim.
Consigo acalmá-lo com a certeza de que estou bem e trocamos juras de
amor eterno. Quando encerramos a ligação, tento ocupar minha mente com
nossos momentos bons, mas é para Lennon que meus pensamentos me
levam, para o momento em que me agarrou na sala de projeções, para tudo
o que senti quando estava em seus braços.
O que foi tudo aquilo? Como um homem a quem odeio desde os meus
quatorze anos e que me trata como se eu fosse uma prostituta, pode ser
capaz de me despertar tanta luxúria? É algo que não consigo compreender.
CAPÍTULO VIII
Lennon.
Estou de pau duro há exatos cinco dias, desde que Lucy se instalou no
palácio e não consigo aplacar o tesão dentro de mim. Nem mesmo as três
modelos com quem transei ontem a noite, em Taunton, foram capazes se me
satisfazer. Na verdade eu teria trocado as três por Lucy, porque é ela que eu
quero, é por aquela menina, doze anos mais nova que eu, que o meu corpo
clama com um desespero desconhecido, é por ela que estou perdendo as
estribeiras. Tê-la em minha cama está se tornando quase uma obsessão.
Mas Lucy é diferente de todas as garotas que já conheci, embora eu não
tenha dúvidas de que também sente algo por mim — o que ficou evidente
na sua reação no momento em que a agarrei na sala de projeções —, se
recusa a ceder aos seus sentimentos, sequer olha direito para mim e quando
olha é com aquele ódio que não compreendo.
Ela não é apenas mais uma típica garota que prefere se deixar guiar pela
razão ao invés de se entregar aos seus impulsos, há algo mais que a impede
de me deixar me aproximar, não consigo distinguir do que se trata, mas está
lá sempre que ela me encara, sempre que me flagra observando-a com
desejo quando nos encontramos no palácio.
O motivo da sua atitude não é apenas reprovação ou revolta à minha
forma de governo, razão pela qual a princípio acreditei ter se aproximado de
mim, já que faz parte de um grupo de revolucionários que luta contra meu
mandato, pois ela já deixou claro que não se interessa nem um pouco pelo
assunto, não está lutando contra mim por motivos patrióticos, aliás parece
estar se lixando para o país.
Entretanto, continua procurando uma forma de me prejudicar, fuçando as
gavetas e os armários do meu escritório — de onde já tirei todos os
documentos importantes —, à procura de algo que possa usar contra mim,
dia após dia, por qual razão eu nem posso imaginar. Não posso acreditar
que esteja agindo apenas a mando do namorado ou de qualquer outro dos
revolucionários, visto que parece obstinada demais em seu objetivo, sem
mencionar que tenho ouvido as conversas entre eles, pelo seu celular que
mandei grampear, é ela quem quer ficar aqui, enquanto o namorado insiste
para que volte.
Nesses últimos dias tenho observado-a bastante. Aliás tenho passado
mais tempo na sala dos seguranças, olhando-a pelos monitores, que em
qualquer outro lugar. Todas as noites ela espera que fique tarde o suficiente
para que todos estejam dormindo e sai do seu quarto para se esgueirar pelas
dependências do palácio em busca de alguma coisa e tenho certeza de que é
algo que possa usar contra mim. Não passa pela sua cabecinha jovem e
inexperiente que um homem poderoso como eu não se descuidaria a ponto
de deixar alguma evidência que me comprometa sob o mesmo teto que uma
completa estranha, como ela.
Todavia, há um lado bom em poder observá-la por meio das câmeras: o
prazer de vê-la totalmente à vontade, sem aquele ódio que sempre trás no
olhar e presenciar os seus momentos de total intimidade. Nesses instantes o
que vejo em seu semblante é uma tristeza devastadora que eu daria qualquer
coisa para ser capaz de dissipar, mas ela não permite minha aproximação.
Acho que é isso que está me deixando mais doido: vê-la tão intimamente
e não poder tocá-la.
Gosto de observá-la enquanto dorme também, não apenas por causa das
camisolinhas minúsculas que usa, mas pela paz e tranquilidade que
transmite em seu rosto sereno quando está completamente relaxado, com os
olhos fechados. Definitivamente é o rosto mais bonito que já vi, tão
feminino e delicado que parece ter sido esculpido por anjos malévolos com
o intuito de levar qualquer homem à loucura.
Os piores momentos são os telefonemas que ela dá para o namorado, os
quais faço questão de ouvir. O garoto se chama Kevin e tem a mesma idade
que ela. Todas as noites ambos falam por quase uma hora, quando trocam
juras de amor, embora ainda não tenham se encontrado depois que ela está
instalada aqui. Falam também sobre tudo o que estão armando contra mim,
quando Lucy deixa claro que está disposta a qualquer coisa para me
destruir, menos a ir para a cama comigo.
Durante essas conversas, ela engana o namorado ao fazê-lo acreditar que
compartilha da mesma preocupação que ele tem com o bem estar do país,
mas de alguma forma sei que não é isso que a motiva a lutar contra mim, a
buscar, dia após dia, alguma coisa com a qual possa me incriminar ou me
prejudicar de alguma outra forma.
De vez em quando ela telefona também para sua mãe, que parece estar
ainda mais senil que a minha, internada em um hospital psiquiátrico no
interior do país.
Durante as conversas com o namorado, um dos assuntos abordados é o
fato de ela correr o risco de mudar, mas ainda não entendi isso direito, pois
não falam claramente a respeito, até tentam evitar tocar no assunto. Tenho a
impressão de que estão se referindo à possibilidade de que ela pode ficar
fora de si quando ingere bebidas alcoólicas, como aconteceu na noite do
acidente. E não posso negar que gostaria que ela saísse de si novamente.
Me sinto um crápula quando penso assim, verdadeiramente um velho
depravado tentando me intrometer no relacionamento do jovem e belo casal
e estragar as coisas entre eles em nome do meu tesão descomedido.
Esta noite Lucy está mais triste que o habitual. Depois de vagar pelo
palácio, observando cada canto, olhando atrás dos quadros, se esgueirando
pelas sombras, como faz sempre que acredita que todos já foram dormir, vai
para o terraço dos fundos e se recosta na mureta que o separa do jardim,
pensativa, cabisbaixa, com seu olhar fixo no vazio à sua frente, parecendo
meio angustiada.
Desconfio que seu estado melancólico se deva à conversa que teve com a
mãe pelo telefone esta noite, quando disse estar com saudade, mas que não
podia ir visitá-la porque não seria bom que se ausentasse do novo emprego
logo nos primeiros dias. Sua mãe acredita que ela está em um trabalho de
cuidadora de idosos, só não sabe que é na casa do presidente do país.
Estou na sala dos seguranças, observando-a ao lado dos marmanjos que
já sacaram a minha situação em relação àquela menina, embora não se
atrevam a abrir a boca para dizer nada, pelo menos não na minha presença,
porque pelas costas já devem estar caçoando de mim há dias.
Mas que se fodam eles, sou eu quem paga seus salários.
Atraído pela infinita solidão em que Lucy parece mergulhada, deixo a
sala, vou até a adega, escolho uma garrafa de vinho, pego duas taças e me
dirijo até ela no terraço, tentando convencer a mim mesmo de que não
quero apenas persuadi-la a encher a cara para que se mostre a mulher
fogosa e atirada que conheci na noite do acidente, quando estava bêbada.
Eu não posso ser tão covarde a ponto de me aproveitar da sua dor para
conseguir a transa que tanto desejo.
Do lado de fora, a noite está agradável e silenciosa, com a temperatura
amena, típica do mês de julho.
A encontro na mesma posição, inclinada sobre a mureta, de frente para o
jardim florido que cerca a grande piscina e se estende até o campo de
futebol, imersa em seus pensamentos. Usa um conjunto de moletom folgado
e confortável, como se não tivesse dúvidas de que ninguém a vê quando sai
à noite do quarto. Nem passa pela sua cabeça que há mais de meia dúzia de
olhares sobre ela, inclusive agora há vários seguranças armados se
esgueirando pelas sombras do jardim.
— Você está bem? — pergunto, o mais calmamente possível e apesar do
tom gentil da minha voz, ela se assusta e se vira sobressaltada.
Fica pálida ao obsevar o meu rosto, como uma criança que acaba de ser
apanhada fazendo algo errado.
— Sim. Só fiquei sem sono hoje. — diz ela e engole em seco, nervosa.
— Eu entendo. Já trabalhei longe de casa quando era jovem também. —
e é verdade. Eu tinha mais ou menos a idade dela quando descobri que
minha mãe traía o mau pai e saí de casa revoltado, para ir trabalhar como
ajudante em uma loja de materiais de construções, onde também morava. —
Tire a tarde de folga amanhã, vá visitar sua família, isso vai lhe fazer bem.
Eu fico com mamãe.
Ela me encara incrédula.
— Tem certeza?
— Sim. Só uma tarde não vai fazer mal.
— Obrigada.
— De nada. Aceita uma taça de vinho? Isso pode ajudar a trazer o sono
de volta.
— Não, obrigada. Eu não bebo.
Ela se vira novamente na direção do jardim, dando-me as costas, como
se fosse capaz de adivinhar que quero embebedá-la para vê-la toda atirada
de novo.
Recosto-me na mureta ao seu lado, observando o jardim bem iluminado,
sem me lembrar da última vez que olhei para ele, aliás acho que nunca tinha
parado para reparar no quanto é florido e bonito. Sirvo-me de uma taça de
vinho e acendo um cigarro soltando uma grande baforada de fumaça.
— Quer um cigarro?
— Eu não fumo.
— Na noite em que nos conhecemos você estava bebendo e fumando. —
solto. — Como pode dizer que não faz nenhuma coisa e nem outra?
— Aquela noite foi uma exceção e estou feliz por não me lembrar de
nada. — há rispidez no tom da sua voz e entendo que está me jogando uma
dura indireta.
O que eu fiz a essa menina para que me despreze tanto?
Bebo um grande gole do vinho, o líquido parecendo mais amargo ao
descer pela minha garganta.
— Teria sido uma boa noite se tivéssemos nos conhecido em outras
circunstâncias. — falo.
— Talvez, mas ainda assim eu continuaria não me lembrando.
— Você sempre esquece tudo quando bebe?
Foi uma pergunta inocente, mas que parece tê-la irritado mais que o
necessário.
— Isso não é da sua conta! Com licença. — tenta se afastar, mas a
impeço, segurando-a pelo braço.
— Por que tanta hostilidade, Lucy? Será que não podemos conversar
como dois adultos?
Ela me encara com os olhos faiscando de raiva, respira fundo, várias
vezes e sua expressão ameniza.
— Está bem, pode me soltar. — solto-a e ela volta à posição inicial,
recostando-se na mureta, observando o espaço à nossa frente. — Sobre o
que você quer conversar?
— Sei lá, me fala de você. Como é sua família?
Ela respira fundo de novo e me arrependo por ter feito aquela pergunta.
Não deve ser fácil para alguém que cresceu em um orfanato e tem a mãe
internada em um hospital psiquiátrico falar sobre si mesma.
— Não há muito o que dizer. Meu pai morreu quando eu tinha quatorze
anos, minha mãe surtou e está internada em um hospício desde então. Tenho
um irmão mais novo que foi adotado por uma família que não conheço e
moro atualmente com o meu namorado no hotel onde seu motorista foi me
deixar e apanhar. — Minha nossa! A história dela é mais dramática do que
imaginei. — E você, como era sua vida antes de usurpar a presidência do
país?
Olho para ela e sinto vontade de sorrir. Então é isso que pensa? Que
usurpei a presidência? É engraçado vê-la sendo verdadeira pelo menos uma
vez.
Bebo outro gole de vinho e dou uma tragada no cigarro antes de
responder.
— Eu não roubei o cargo de presidente. O que fiz foi livrar o país de
uma quadrilha de corruptos. A presidência veio como uma consequência.
Você devia ler mais os livros de história.
— Nem sempre o que há nos livros é a verdade.
— No meu caso é.
— Ah, ta e você decidiu lutar contra a corrupção assim do nada porque
queria ser um grande herói e nada mais. A presidência nem lhe passou pela
cabeça. Acredito. — diz, com sarcasmo e isso me irrita, porque odeio ser
tratado com escárnio.
— Não foi isso. A verdade é que minha mãe estava tendo um caso com o
maldito presidente ladrão e corrupto, o que levou o meu pai ao suicídio,
então decidi fazer justiça com as próprias mãos e como matar é ilegal neste
país, tirei aquilo que era mais importante para ele, assim como ele tirou
tudo de mim. — Lucy me observa boquiaberta, o que não é de estranhar,
pois pouquíssimas pessoas sabem dessa história e agora a estou revelando a
uma inimiga que certamente a usará contra mim a qualquer momento. —
Mas não me arrependo de ter me tornado presidente, pois hoje trabalho pelo
meu país.
— Você realmente acredita que está fazendo bem ao país, não é?
— E não estou?
— De acordo com a opinião pública não está não.
— De acordo com a opinião publica dos ricos.
— São eles que pagam a maioria dos impostos, então têm o direito de
decidir que rumo dar aos gastos públicos. — ela faz o mesmo discurso
boçal que os meus inimigos e dá de ombros, como se não se importasse
com nada.
— Como uma pessoa que já sofreu tanto, você devia se importar mais
com as outras pessoas. — irritado, bebo todo o restante do vinho da taça e a
reabasteço.
Lucy encara-me com aquela expressão de ódio que já conheço bem.
— Não me fale sobre meu sofrimento, Lennon, você não conhece nem
metade dele. — diz, com os dentes cerrados, a mandíbula trincada e não
tenho mais dúvidas de que me culpa por algo.
— Então me diga para que eu saiba. — peço.
Ela continua me encarando em silêncio, seus olhos reluzindo uma fúria
mortal.
— Vou dormir. Boa noite.
Tenta se afastar e novamente a seguro pelo braço.
— Me fala o que você tem contra mim. — digo, olhando dentro dos
olhos dela para que não tenha chance de mentir.
— Nada. Só porque não quero ficar aqui conversando, não significa que
tenha algo contra a sua pessoa. — mente, desviando seu olhar para o chão.
— Não é só isso, Lucy. Seja franca comigo. Me diga o que fiz a você
para que eu tenha pelo menos a chance de me defender. — eu nunca tinha
implorado tanto pela atenção de uma mulher.
No geral eu sempre tive muita facilidade em possuir as mulheres que
desejei, depois que entrei para a política essa facilidade se tornou ainda
maior. Sem sombra de dúvida Lucy está sendo minha grande exceção.
— Nada. — fala, com os olhos faiscando de ódio.
— Se não fiz nada, por que então não assume que também me quer e
termina logo com a porra dessa distância que está acabando comigo!?
Merda! Eu não devia ter falado aquilo. Fiquei parecendo um desesperado
e dei a impressão de que vim falar com ela com segundas intenções. Isso é
péssimo quando se quer ganhar uma mulher, pois elas são muito sensíveis e
querem que estejamos sempre preocupados com seus problemas.
— Eu não quero você, já não deixei isso claro o bastante? — vocifera
com raiva e puxa seu braço com um safanão, arrancando-o da minha mão.
— Mas é claro que quer. Eu conheço as mulheres o suficiente para saber
disso.
— Não conhece a mim.
Sinto vontade de dar um murro na prede por causa daquela teimosia
dela.
— Você também me deseja, Lucy, da mesma forma como eu a quero.
Não tente negar. — dou um passo na sua direção e ela recua outro. — Isso
ficou claro na forma como você reagiu a mim na sala de projeções, lembra?
— dou outro passo e novamente ela recua. — Em como me atacou na noite
em que nos conhecemos. Você estava bêbada, tinha batido a cabeça, mas
ainda era você e sei que não foi tudo fingimento, seu corpo falava por si.
Então vamos conversar como adultos que somos: o que te impede de ficar
comigo? Não é por não concordar com o meu governo, eu sei que você não
liga para o país.
— Eu tenho um namorado e o amo. Mas você não pode entender isso,
Sr. presidente, porque não sabe o que é amar. Trata as mulheres como se
fossem um objeto de troca, dando bens materiais a elas em troca de que
sejam suas amantes, sem se importar se o amam ou não. Eu não sou e nunca
serei o objeto de um homem.
Processo suas palavras e a raiva pipoca em minhas veias. Então ela
pensa que todas as mulheres que tenho ficam comigo apenas pelo dinheiro?
Eu não me importaria de ouvir aquilo de qualquer outra pessoa, embora
duvide que alguém se atreva a dizer tais palavras na minha presença. Mas
vindo de Lucy aquilo me parece inacreditavelmente ofensivo, me passa a
impressão de que, ao seu ver, sou um homem incapaz de ser amado por uma
mulher, de conquistar alguém pelo que sou e não pelo que tenho.
Essa menina está realmente me tirando dos trilhos.
Fico tão descontrolado que quase jogo a merda no ventilador, dizendo
que se seu namorado se importasse minimamente com ela não a teria
deixado vir para os domínios do seu pior inimigo, que se ela é tão íntegra
quanto está tentando demonstrar, não teria tentado transar comigo no dia em
que nos conhecemos só para garantir seu passaporte para a minha vida, que
estaria sendo minha amante se não tivesse conquistado o afeto de minha
mãe e com isto garantido sua permanência no palácio.
— Isso não é pretexto, pois não estou te pedindo para deixar a porra do
seu namorado. Eu só quero foder com você, depois você volta pra ele,
simples assim.
Puta merda! Eu não devia ter dito isso. Meti os pés pelas mãos de novo,
agindo como uma adolescente idiota que dá o troco quando se sente
ofendido.
Ela sorri com escárnio, os olhos azuis reluzindo um ódio mortal.
— Você nunca vai ter o que quer de mim, Lennon Rudolf. — diz, com o
prazer de alguém que enfia um punhal no peito de um inimigo.
Suas palavras me fazem perder o pouco do controle que me resta e sei
que estou agindo como um garoto mimado que está acostumado a ter tudo o
que quer e fica frustrado quando recebe um não. Me sinto patético por isso.
— Se minha mãe não tivesse te confundido com Lindsay, você já estaria
na minha cama faz tempo, gemendo debaixo de mim, porque foi para isso
que você se aproximou naquela noite.
Vejo as lágrimas marejarem seus olhos, lágrimas de ódio e me arrependo
por ter aberto a boca.
Que merda! Eu não estou dando uma dentro.
— Eu nunca teria te deixado me tocar se estivesse sóbrio. — fala ela. —
Porque eu te odeio com toda a minha alma.
Há tanto veneno em suas palavras que fico meio desnorteado.
— Por que me odeia tanto? O que eu fiz a você? — pergunto pela
segunda vez, tentando compreender.
— Você nasceu. Foi isso que você fez.
Novamente, ela tenta se afastar, e mais uma vez a impeço, desta vez
tomando-lhe o caminho. Não posso deixar que aquela conversa se encerre
assim, preciso saber o que ela tem contra mim.
— Não vou deixar você sair daqui enquanto não me disser o motivo de
tanto ódio.
Ela me encara com tanto rancor, que chega a ser espantoso.
— Você sabe o que fez. Puxe pela memória e conte quantas vidas
destruiu por causa da sua sede pelo poder. Agora me deixa em paz!
Fico tão surpreso com aquela declaração que me distraio e a deixo passar
e entrar correndo para o interior do palácio.
Suas palavras continuam se repetindo em minha mente enquanto
permaneço sozinho ali no terraço, tomando vinho. Ela não pode saber o que
fiz no passado, pois quando aconteceu ainda era apenas uma adolescente
vivendo em um orfanato. Além do mais, ninguém além de Donald, meu
único e melhor amigo, conhece a verdade sobre o erro que cometi e que
vem me atormentando há tanto tempo. Lucy deve estar me acusando com
base nos boatos falsos que a imprensa e até seus amigos do JUD espalham
sobre mim, porque a verdade de fato nenhum deles conhece.
CAPÍTULO IX
Ou aquela menina é completamente louca, ou acredita em todos os
boatos que inventaram ao meu respeito na época em que me tornei
presidente, os quais não são poucos. Eu prefiro levar em conta a primeira
hipótese, porque seria muita injustiça da parte dela julgar uma pessoa sem
ter provas de nada. E o pior é que ela falou com uma certeza absurda.
É quase meia noite quando deixo o terraço e volto para a sala dos
seguranças. Ordeno que todos saiam e me deixem sozinho. Não é a primeira
vez que faço isso, a fim de olhar para Lucy em seus momentos de
intimidade e ao mesmo tempo impedir que aqueles marmanjos olhem
também, embora saiba que não tem como impedir que eles a vejam quando
não estou.
Sento-me na frente dos monitores e a observo. Já está adormecida em
sua cama, usando uma camisolinha de algodão lilás, tão curta que posso ver
grande parte do seu corpo. Está deitada de lado, com o lençol embolado
entre os braços, uma perna esticada e a outra encolhida, de modo que posso
ver seu traseiro empinado, as coxas firmes e o minúsculo pedaço de tecido
da calcinha que oculta o seu sexo.
Eu daria cinco anos da minha vida para poder entrar naquele quarto,
afastar aquela calcinha para o lado e dar uma lambida na sua boceta
pequena e depilada.
Mas pelo visto nunca vou poder fazer isso, porque Lucy me odeia sem
que eu saiba o motivo.
Minha vontade é de acordá-la e pressioná-la até que me explique do que
estava falando. Mas não acredito que isso a fará mudar de ideia ao meu
respeito, visto que parece muito convencida de que sou um mal feitor. Na
certa aqueles revolucionários desocupados com quem ela anda lhe
inculcaram uma péssima ideia ao meu respeito, obviamente pessoas tão
avessas ao meu governo quanto os empresários ricos que estão se doendo
pelo rumo que dou aos seus impostos.
Eu só queria saber o que andaram lhe dizendo, porque nenhuma verdade
sobre o que fiz no passado é conhecida pelos meus inimigos, se fosse eles já
teriam me destruído há anos.
Enfim, nunca fui homem de desistir do que quero, porém, me vejo
obrigado a desistir de Lucy, antes que meu desejo irrefreável a faça
abandonar o palácio e Ruth volte a piorar e o bem estar da minha mãe é
minha prioridade agora. Um dia, quem sabe, essa tara que sinto por essa
menina acabe. Até lá vou me distraindo com momentos como esse, em que
posso vê-la em seus instantes mais íntimos e cobiçar seu corpo gostoso, um
corpo que nunca será meu.
Esta noite não posso me demorar muito aqui, pois amanhã haverá uma
sucessão de reuniões fatigantes para debater os assuntos mais relevantes a
serem alavancados durante a recepção que acontecerá no próximo sábado
no palácio, a qual reunirá alguns líderes de países próximos, a solução mais
plausível que encontramos de melhorar minha imagem perante o mundo e
de não perder o apoio desses líderes depois de tantas manifestações nas ruas
realizadas contra mim. Nesse momento, quanto mais apoio de pessoas
influentes eu tiver, melhor.
Embora haja uma equipe especializada cuidando de tudo para que evento
seja impecável, preciso fazer várias reuniões ao longo dos próximos dias,
com a equipe integrante do meu governo, para me certificar de que tudo
ocorra como planejado.
Vai ser uma festa a rigor a qual tenho certeza que será um saco, pois terei
que me mostrar receptivo aos convidados, afinal não basta que se faça um
bom governo, é necessário também que se prove esses resultados aos outros
para garantir o apoio deles, mesmo que esses outros sejam, muitas vezes,
mais incompetentes que você e tudo por causa daquele bando de
revolucionários desocupados que continuam me atacando via internet,
jogando cada vez mais a população contra mim e minha imagem na lama.
E pensar que tenho um deles dormindo debaixo do meu teto e me
deixando louco de tesão.
Lucy tem a arma que poderia me destruir como eles tanto querem, só não
sabe disso, ou não quer usá-la mais contra mim, como quis na noite em que
entrou na minha vida.
Deixo a sala e os seguranças retornam aos seus postos sem reclamar.
Sinto uma pontada de inveja deles porque poderão olhar para Lucy durante
toda a noite e vê-la acordar na manhã seguinte.
Sozinho em meu quarto, não consigo dormir mais que duas horas e
levanto-me cedo para me reunir com todos com quem preciso falar.
A manhã é cansativa, fatigante, tão cheia de afazeres que não tenho
tempo de ir almoçar no palácio e me contento em comer um sanduíche ali
mesmo.
Por volta das duas horas da tarde Diana telefona para meu celular
particular para avisar que Ruth está passando mal. Não conseguiu dormir
depois do almoço e começou a ficar aflita depois que Lucy saiu para a sua
tarde de folga. Agora está em meio a uma crise nervosa.
Cancelo todos os meus compromissos daquela tarde e volto para o
palácio pela passagem secreta. Naquele instante me dou conta do quanto
Ruth está dependente de Lucy e do quanto isto pode ser prejudicial, pois
aquela menina pode ir embora de nossas vidas a qualquer momento e deixá-
la ainda pior que estava quando chegou.
Merda! Por que ela tinha que aparecer e me dar a esperança de que
minha mãe podia melhorar? Eu já estava conformado em perdê-la para a
doença, essa piora é só a renovação de uma dor antiga.
Encontro Ruth em prantos, sentada na cama, encostada no espaldar, toda
trêmula, perguntando por Lindsay, se lamentando, repetindo que foi
abandonada pela filha de novo. Diana está sentada ao lado dela, tentando
acalmá-la.
— Já chamou o médico? — pergunto.
— Sim. Está a caminho. A pressão dela está altíssima. — Diana diz e se
afasta para que eu tome seu lugar ao lado da minha mãe.
— Mãe, fica calma. Estou aqui. Sou eu, Lennon. Lindsay foi apenas
fazer algumas compras, logo estará de volta.
— Você tirou minha filha de mim uma vez e agora fez isso de novo. —
Ruth fala, muito nervosa. — O que você fez com ela, Lennon? Por que só
se preocupa com o poder e não com as pessoas?
Não entendo porque ela fala assim. Sim, fui eu quem afastou Lindsay de
nós, porque não tinha outra opção, mas ela não sabe disso e não acredito
que tenha como sentir. Ainda assim as acusações me ferem, me fazem sentir
ainda mais culpado.
Sem saber o que dizer, levanto-me e vou para perto de Diana.
— Lucy não avisou a ela que ia sair? — indago, num sussurro.
— Sim. Disse que ia fazer compras e que voltava logo. A Sra. Rudolf
concordou e ficou bem tranquila. Começou a passar mal algum tempo
depois. — Diana explica.
Ruth continua me desferindo acusações, mas não rebato, nem me
defendo, pois apesar de não ter sido o único culpado pelo sumiço da minha
irmã, não quero deixá-la ainda mais nervosa.
Logo o médico chega e depois de examiná-la dá-lhe um calmante que a
faz adormecer rapidamente. Depois me explica que a causa do seu mal estar
não foi de fato a distância de Lucy e sim a piora no seu estado de demência.
Que Lucy estando por perto ou não, essa piora é inevitável, faz parte do
quadro degenerativo da doença e por fim aconselha que a garota continue
fazendo companhia a ela, quanto mais tempo possível.
Ruth está profundamente adormecida quando o médico se vai e Diana
desce para o primeiro andar. Eu já poderia voltar para o trabalho, mas não
me sinto encorajado a deixá-la sozinha. É como se de súbito me desse conta
de que não cuidei dela com a devida atenção durante todos esses anos em
que esteve doente, porque estava ocupado demais com o meu trabalho,
dedicado demais a mudar este pais, a transformá-lo em algo melhor, em dar
oportunidades iguais aos menos favorecidos. Agora me pergunto se
realmente não estive apenas sedento pelo poder, se minha mãe não está
certa quando me acusa de ser ganancioso e de que essa ganância afastou
Lindsay de nós.
Tiro o paletó, afrouxo o nó da gravata e puxo uma poltrona para perto da
cama. Acomodo-me ali observando o rosto muito enrugado da minha mãe,
o rosto de uma mulher sofrida. Só que diferente de mim e talvez de Lucy,
foi ela mesma quem buscou seu sofrimento, quando começou a trair meu
pai com o chefe dele, que na época ainda era apenas o prefeito de Bristol e
posteriormente se tornou presidente do país.
Meu pai, assessor de Avery Green, deu um tiro na própria cabeça quando
descobriu que além de ter sido traído durante anos, Lindsay não era sua
filha. Foi nessa época que minha mãe começou a surtar e para sua piora, seu
maldito amante a abandonou e negou qualquer relacionamento com ela para
evitar o escândalo.
Eu tinha vinte e um anos quando isso aconteceu e jurei a mim mesmo
que não descansaria até destruir Green, como de fato destruí, tirando-lhe o
cargo de presidente e tornando-o inelegível a qualquer cargo político devido
ao crime de corrupção que cometeu.
O que aconteceu a Lindsay, há cinco anos, foi apenas reflexo da traição
da minha mãe, mas a culpa sempre recai sobre de mim, porque no final das
contas talvez eu seja o mais equilibrado da família e deveria me
responsabilizar por todos.
Como não dormi muito durante a noite, acabo cochilando ali na poltrona
e quando desperto, Lucy está sentada na beirada da cama, ao lado de Ruth
que ainda dorme profundamente. Parece uma miragem, linda demais dentro
do vestido rosa claro com rendas e gola alta, os cabelos soltos, bem
escovados, usando pouca maquiagem. Tem o rosto sereno e os olhos
carregados de compaixão enquanto observa minha mãe.
Na certa Diana já disse a ela o que aconteceu.
Olhando-a tão bonita, usando maquiagem pela primeira vez desde a
noite em que a conheci, me pergunto se não foi ver o maldito namorado em
vez de sua mãe.
— Diana me disse o que aconteceu. — ela sussurra, assim que abro os
olhos. — Eu sinto muito.
É a primeira vez que fala comigo sem medo ou ódio na expressão do seu
olhar.
— Não foi culpa sua. É uma doença degenerativa.
— Diana disse também que o médico recomendou minha presença perto
dela. Saiba que estarei aqui sempre que ela precisar. Nunca a abandonarei.
Eu prometo.
É tão bom ouvi-la fazer aquela declaração, dando-me a certeza de que
sempre estará ao lado de Ruth, embora eu duvide de que continue aqui
depois que conseguir me prejudicar como deseja, isso se conseguir. E
melhor ainda é ouvi-la falar comigo com doçura, sem aquele ódio todo,
cativando-me tanto que deixo escapar um suspiro e, seguindo a um impulso,
seguro-lhe a mão. Espero que ela puxe sua mão para desfazer o contato,
mas não acontece.
— Obrigado. — falo. — Ela precisa de você e fico feliz que esteja aqui.
Eu realmente estou agradecido, afinal mesmo que precisando da minha
mãe como garantia de sua permanência no palácio, uma menina na idade de
Lucy dificilmente se conformaria em ficar na companhia de uma mulher
idosa e senil durante praticamente todo o dia, como ela fica, sem reclamar e
até parece gostar.
— Eu gosto de estar com ela, porque me lembra de minha mãe. — tenho
vontade de perguntar se ela foi ver a mãe ou o namorado, mas não quero
parecer intrometido, além do mais, logo que ela der um telefonema do seu
celular, vou ficar sabendo de tudo. — E tenho certeza de que ela vai
melhorar.
Fico totalmente surpreso quando ela se levanta devagar, aproxima-se de
mim e me abraça ternamente. Como estou sentado, meu rosto alcança a
altura da sua cintura e o afundo no tecido delicado do seu vestido, inebriado
com seu cheiro gostoso e com o seu calor, enquanto a abraço de volta,
apertando seu corpo no meu.
É um abraço que dura apenas alguns segundos, mas que tem um
significado imensurável para mim, pois além de amenizar minha dor,
despertar a lascívia no meu interior, o desejo luxurioso de senti-la mais
intimamente.
Apesar de saber que Lucy está fazendo aquilo apenas para me consolar,
quero rasgar aquele vestidinho, jogá-la sobre o carpete e fazê-la minha ali
mesmo. Preciso de muito esforço para conseguir me controlar.
— Onde está Lindsay? Você já tentou encontrá-la? — Lucy indaga, com
sua voz doce e sussurrada.
A resposta que dou a todos àquela pergunta, inclusive à imprensa, que
me encheu o saco na época, é de que minha irmã desapareceu sem deixar
rastro, podendo inclusive estar morta. Penso seriamente em dizer a verdade
à Lucy, porém, me lembro de que ela é só mais uma inimiga.
— Ninguém sabe onde ela está. Desapareceu misteriosamente há cinco
anos. Já contratei os melhores detetives do mundo para procurá-la, mas
nenhum a encontrou. — repito a mentira que conto a todos.
— Eu sinto muito. —repete ela, com o olhar carregado de compaixão.
Lucy.
Olho para o homem desesperado sentando diante do leito de sua mãe
doente e vejo o reflexo de mim mesma sentada perto do leito de minha mãe.
Neste momento não consigo odiá-lo como deveria, só consigo sentir
piedade, porque sei exatamente como ele está se sentindo e queria ser capaz
de poder fazer alguma coisa a respeito, mas não posso, sequer minha
própria dor eu consigo cessar.
Há poucas horas eu estava exatamente como ele está agora: no aposento
de um hospital psiquiátrico, sentada ao lado do leito de minha mãe,
observando-a completamente sedada.
Os funcionários do hospital me disseram que há dias ela não tinha uma
crise e aconteceu logo que lhe disseram que eu estava indo visitá-la depois
de quase um mês sem aparecer.
Eu me recuso a acreditar que ela passou mal por minha causa e que, de
alguma forma, me culpa pelo que aconteceu no passado. Prefiro me
convencer de que ao olhar para mim ela se lembraria da nossa família
desfeita por uma tragédia e que foi esse o motivo da sua crise nervosa. Até
porque isso nunca aconteceu antes, ela nunca teve qualquer reação negativa
á minha proximidade, embora não fale muito comigo, devido ao efeito dos
remédios, jamais demonstrou não gostar de me receber.
Como a Sra. Rudolf, ela também está piorando na sua enfermidade, se
tornando cada dia mais louca. Acho que nunca vai se recuperar e isso me
machuca demais.
CAPÍTULO X
— Você já jantou? — Lennon pergunta, sussurrando para não acordar a
mãe.
Sua voz está meio rouca pelas horas de sono e é tão máscula e sensual
que me causa arrepios pelo corpo.
Seria hipocrisia da minha parte dizer que Lennon não me atrai, aliás tudo
naquele homem parece gritar por mim, seus olhos azuis penetrantes; a
forma luxuriosa como me olha; o rosto bem desenhado; o queixo másculo;
o corpo esguio e elegante. É impossível olhar para ele e não desejá-lo,
qualquer mulher com sangue nas veias se sentiria afetada, acho que por isso
meu alter ego se despiu na sua frente e pediu que a levasse para cama como
ele contou. Deve ser tudo verdade.
Dia após dia venho me esforçando para não deixar transparecer a atração
irrefreável que ele exerce sobre mim, para que não se sinta encorajado a
continuar tentando me levar para a sua cama, não apenas porque ele é meu
inimigo, mas porque homens como aquele são incapazes de amar uma
mulher. Como ele já deixou claro, sexo é apenas um negócio para si, um
acordo sem sentimentos e não nasci para esse tipo de coisa.
Apesar de me esforçar ao máximo para resistir a ele, há momentos em
que isso se torna quase impossível, como esse, por exemplo, em que está
frágil e vulnerável, em que posso ver meu reflexo na sua dor.
— Não. — respondo.
— Quer descer para comer alguma coisa? — indaga ele. — Está quente,
podemos comer um sanduíche no terraço. Mamãe não vai acordar tão cedo.
A tentação de ficar sozinha com ele diante de uma imagem tão bonita
quanto é a daquele jardim nos fundos do palácio é tão grande que me vejo
obrigada a relembrar o motivo pelo qual o odeio e então posso ver meu
padrasto dentro de um caixão sendo velado, minha mãe com os pulsos
cortados se esvaindo em sangue, meu irmão sendo levado para longe de
mim e todo o encanto daquele momento se desfaz no ódio que resurge com
toda força em minhas entranhas.
O motivo do sofrimento de Lennon é o destino, do meu é ele próprio e
ninguém mais. Se sua sede pelo poder não existisse eu ainda teria uma
família.
— Não, obrigada. — falo, com os dentes cerrados e vejo a decepção se
refletindo em seu olhar. Minha rejeição não é nada se comparada ao que ele
merece. — Vou para o meu quarto, se não se importa.
Pelo menos desta vez ele não tenta me impedir de sair, como costuma
fazer, parece que está desistindo.
A Sra. Rudolf acorda somente na manhã seguinte, quando se mostra
muito mais calma e age como se não lembrasse do que aconteceu. Está
abatida apenas porque dormiu sem jantar, mas logo a faço tomar um café da
manhã reforçado e ela fica mais revigorada.
A rotina no palácio não é das piores. Se não estivesse em meio a uma
operação que visa destruir Lennon Rudolf, eu poderia me acostumar com
essa vida. Aqui acordo cedo, mas nem tanto. Há empregados para tudo, até
para arrumar minha cama, o que acho um exagero, embora seja cômodo
encontrar minhas coisas sempre limpinhas, as roupas sempre bem lavadas e
engomadas.
Passo a maior parte do meu tempo na companhia da Sra. Rudolf, quase
sempre jogando cartas ou dominó, como ela tanto gosta. Às vezes leio um
livro de romance em voz alta para ela, devido ao cansaço em suas vistas,
outras vezes tomamos banho na piscina enorme dos fundos e muito de vez
em quando saímos para passear pela cidade, sempre cercadas por inúmeros
seguranças.
Não é raro que eu tenha a impressão de que ela sabe que não sou
Lindsay. Já deixou isso claro por mais de uma vez, quando cometo garfes
que denunciam o fato de que não sei nada sobre a sua filha, ou sua família e
ela simplesmente finge não perceber. Não sei se se trata de mais um traço
da sua demência degenerativa ou se ela realmente sabe que não sou sua
filha. Mas por que finge pensar que sou? Não consigo compreender.
Na verdade isso não importa muito, o importante é que seu afeto me
garante a minha permanência no palácio, onde posso investigar Lennon
livremente a procura de algo que seja capaz de incriminá-lo, embora ainda
não tenha encontrado nada durante todos esses dias. Ainda assim, me
recuso a desistir, sei que a minha hora de vingar a morte do meu pai vai
chegar, vou tirar tudo de Lennon Rudolf, assim como ele tirou tudo de mim,
se a presidência é o que mais lhe importa, é isso que ele merece perder e a
única coisa que lamento nessa história é ter que ir embora e deixar a Sra.
Rudolf depois que concretizar meu objetivo. Tenho certeza de que ela vai
piorar depois da minha partida e apesar disso me doer na alma, não posso
fazer nada para que as coisas sejam diferentes.
Os momentos mais tempestuosos dos meus dias ali são aqueles em que
Lennon está por perto, geralmente durante as refeições, que fazemos todos
juntos na grande sala de jantar. A forma como ele me observa, como se me
despisse com olhar, me deixa meio desnorteada, sem chão, por isso prefiro
quando está em seu gabinete.
O sábado seguinte é o dia mais movimentado que já vi no palácio, por
causa de uma recepção que acontecerá à noite. Há pessoas circulando por
toda parte, enfeitando o imenso salão principal, agora cheio de mesas, com
arranjos de flores lindos e laços de cetim. Há também um pequeno palco e
um bufê requintado, do tipo que só vi em filmes antes.
Ouvi dizer que os maiores líderes mundiais estarão presentes aqui hoje e
quando acredito que não serei bem-vinda entre os presentes, porque afinal
sou apenas uma empregada, me surpreendo ao entrar em meu quarto no
final da tarde e encontrar o vestido de seda preto sobre a cama ao lado das
sandálias de salto alto. Não é o mais comportado dos vestidos, aliás tem um
decote enorme e uma fenda na saia longa que parece ir até o ápice da coxa,
mas é o vestido mais lindo e sofisticado que já vi e é possível notar que
deve ter custado uma fortuna.
Ao lado dele há um bilhete escrito à caneta, que diz:
“Acho que vai ficar lindo em você. Quero
que use esta noite e se junte a mim e à minha
mãe na recepção. Lennon.”
Me sinto ligeiramente tentada a recusar, apenas para contrariá-lo, mas
nem morta vou perder a oportunidade de estar entre vários presidentes de
diferentes países, de procurar entre pessoas igualmente poderosas uma
fraqueza em Lennon Rudolf que eu possa usar contra ele.
Quando a noite chega, faço um penteado bonito nos cabelos, escovando-
os até a metade e deixando as pontas cacheadas, capricho na maquiagem e
visto o vestido que fica colado demais, decotado demais, sensual demais,
claramente escolhido com a intenção de revelar as curvas do meu corpo.
Desço junto com a Sra. Rudolf, que está muito elegante em um vestido
esvoaçante cor de creme, com os cabelos presos em o coque no alto da
cabeça e a maquiagem feita por um profissional.
Já no primeiro salão há alguns convidados, homens e mulheres vestidos
com sofisticação que conversam e bebem champanhe. Os cumprimentamos
com polidez e passamos para o salão principal, onde há a maior
concentração de pessoas ocupando as mesas que lhes foram reservadas. São
pessoas que tem a riqueza estampada em sua aparência, usam roupas
refinadíssimas, tão caras que se as vendêssemos todas juntas seria possível
sustentar um país de terceiro mundo com o dinheiro arrecadado.
Reconheço alguns rostos entre eles, muito familiares nas redes sociais,
são senadores de Newhart e de outros países, que certamente estão ali
representando sua nação; há também alguns presidentes de países da
Europa e até um dos filhos do príncipe Charles da Inglaterra, junto com sua
esposa.
Uma moça muito bem vestida conduz a Sra. Rudolf e eu para uma mesa
próxima ao palco, onde já estão acomodados o assessor pessoal de Lennon,
o vice presidente de Newhart e suas respectivas esposas, embora ainda haja
lugar para umas quatro pessoas ali.
Quero só ver o que todos vão pensar quando a mãe do presidente
começar a me chamar de Lindsay e a me tratar como se eu fosse sua filha.
Espero que Lennon tenha tomado a precaução de avisar, nos convites, que
será assim.
Percebo que há vários seguranças em volta dos convidados, muitos
deles, quase um para cada convidado, também vestidos a rigor,
comunicando-se entre si por meio de rádios.
Todos estão bebendo champanhe, quanto a mim, me contento com o
suco de uva que é servido pelos garçons uniformizados.
O salão já está abarrotado de gente quando o secretário de Lennon sobe
no pequeno palco e anuncia sua chegada. Um segundo depois ele entra e
todos colocam-se em pé para aplaudi-lo.
Está lindo demais dentro de um terno caro, feito sob medida, com os
cabelos lambuzados de gel, sem um fio fora do lugar. Parece um rei ali em
cima, com sua postura altiva, sua elegância de sempre e uma calma
impressionante mesmo estando diante de tantas pessoas importantes. Se
porta como se fosse o mais importante entre todos.
Quando a salva de palmas cessa e os convidados voltam a se sentar,
Lennon inicia seu discurso, com uma autoconfiança admirável ao
pronunciar cada palavra. Primeiro dá as boas vindas a todos, pronunciando
os nomes dos mais conhecidos, depois começa a falar sobre como tem
lutado, durante esses oito anos de governo, para acabar com a miséria, com
a fome e com a desigualdade social em Newhart, ressaltando que antes da
emancipação era a região mais pobre do Reino Unido e que passou a
prosperar após o seu governo. Fala sobre seus muitos programas sociais e
em como estes têm dado cada vez mais oportunidades de crescimento
àqueles que nunca tiveram nada.
Por fim, menciona a indignação dos membros da classe alta e da classe
média em relação às suas decisões, ressaltando que se trata de
inconformismo com o rumo que ele tem dado aos seus impostos, com o fato
de que a classe que sempre foi inferior, social e economicamente, possa ter
oportunidades iguais por meio de um dinheiro que deveria ser investidos no
bem estar deles, que são os que pagam os maiores valores em impostos.
Destaca, ainda, que as manifestações da população nas ruas, contra seu
governo, são um reflexo desse inconformismo das classes favorecidas, que
abrange também a grande mídia popular, capaz de manipular a opinião de
seus telespectadores.
Lennon fala por quase uma hora, exalando tanto carisma, tanto
magnetismo, que se torna impossível desviar os olhos dele e a atenção de
suas palavras. E não acontece apenas comigo, o silêncio é total entre os
convidados, todas as atenções estão voltadas para ele, as pessoas parecem
ter parado até de respirar para observá-lo.
Não é a toa que ele se tornou presidente tão jovem. É um homem muito
influente e inteligente, tanto para o bem quanto para o mal.
Ao final de seu discurso, novamente os convidados se levantam para
aplaudi-lo e quando desce do palco, com toda a sua elegância e altivez,
Lennon é rodeado por pessoas ansiosas pela sua atenção, inclusive por uma
garota morena, alta que esteve em pé perto do palco, com uma câmera
fotográfica nas mãos enquanto ele discursava, para quem ele parece atribuir
muita atenção.
Não consigo desviar meus olhos dele enquanto conversa com as pessoas,
em pé perto do palco, onde é cercado, depois percorrendo a mesa de cada
um, cumprimentando a todos, conversando com todos, mostrando simpatia,
sem que a tal morena saia do lado dele em nenhum momento.
Mas quem é ela afinal? E por que estou interessada em saber? Deve ser
uma de suas amantes. Um homem bonito, rico e poderoso como ele
dificilmente ficaria sozinho com tantas mulheres no mundo.
Depois de falar com todos, ele por fim vem se sentar em nossa mesa, no
lugar que está reservado para ele e, para minha surpresa, a morena senta-se
ao seu lado, tão perto que parece que vai pular para o colo dele a qualquer
momento.
De perto ela é ainda mais bonita, tem um corpo perfeito dentro de um
vestido banco colado, os cabelos selvagens, a pele impecável e os olhos cor
de mel.
Contudo, ninguém consegue ser mais bonito que Lennon naquela mesa,
naquele salão, ou naquele país. Ele está simplesmente irresistível esta noite,
com os cabelos impecáveis, os olhos azuis contrastando com o tecido
escuro do terno sofisticado, exalando poder e autoconfiança em cada
mínimo gesto seu.
— Vocês estão bem aqui? — ele pergunta, olhando para mim e sua mãe
ao mesmo tempo.
Apenas meneio a cabeça afirmativamente, em meio a uma dificuldade
súbita de encontrar minha voz.
— Estamos. Mas não vou conseguir ficar por muito tempo. Daqui a
pouco vou me recolher. — é a Sra. Rudolf quem fala.
— Está certo mãe. Quando quiser ir é só avisar.
— Foi um belo discurso, cara. — é Willian, o vice presidente, quem fala.
— Obrigado. Eu apenas falei a verdade. Agora é só esperar pelo
julgamento de todos. Vão ter que pesar entre o que eu disse e as ações
desses arruaceiros que atentam contra mim na internet, organizando as
manifestações.
Puta merda! Ele está falando do JUD. É a primeira vez que o ouço
mencioná-los. Sinceramente eu não imaginava que ele conhecia a existência
do JUD.
— Esses desordeiros não vão ter mais a mínima chance de serem
ouvidos, ou mesmo levados em consideração pelo povo depois do que estou
preparando para eles.
É a morena quem fala e sinto uma pontada no estômago. Embora eu não
ligue para as causas pelas quais os revolucionários lutam, eles têm sido a
minha família nos últimos anos e agora vejo uma completa estranha
confessar que está armando contra eles, mas armando o quê?
A resposta parte de Lennon:
— Esqueci de apresentar a vocês, essa é Melanie, minha nova
contratada. — o olhar que ele lança na direção dela é o mesmo que lança
para mim todos os dias: aquele misto de fome e de luxúria que me
desnorteia. E parece desnorteá-la também, porque a vaca retribui e ainda
umedece os lábios com a língua, como se estivesse dizendo sim ao seu
convite silencioso para a devassidão. Não sei porque, mas isso me deixa
uma fera. — Ela é especialista em marketing digital e vai trabalhar com a
minha imagem junto ao público via internet, usando as mesmas ferramentas
que os vândalos usam para me atacar, só que para me ajudar. — Lennon
continua. — Melanie, essas são minha mãe e a cuidadora dela. Os demais
você já conhece.
“Cuidadora?! Eu vou mostrar a ele quem é a cuidadora!”
— Como vai Sra. Rudolf? — Melanie diz, e para mim nem olha. — É
um prazer imenso conhecê-la. Lennon fala muito da senhora.
Puta merda! Já está até chamando ele de Lennon. Na certa já estão
dormindo juntos há dias e ele dando em cima de mim como se fosse
totalmente descompromissado. Que ódio!
— Ah, é? E o que ele fala de mim? — a Sra. Rudolf pergunta e a morena
fica desconsertada, como se não soubesse o que dizer, claramente pega na
mentira.
— Como funciona esse trabalho de marketing digital? — é Willian quem
pergunta, a fim de dissipar o mal estar que se instalou no ar.
— É muito simples. Sabendo que hoje a internet e as redes sociais são os
principais veículos de comunicação com o público, precisamos explorar
todos os recursos oferecidos para efetivar essa veiculação ao nosso favor.
Existe um movimento revolucionário, composto por vagabundos
desocupados, que vem manchando a imagem do presidente por meio desses
mesmos veículos. O que vamos fazer a princípio é desmoralizá-los perante
o público, para que não sejam mais levados em conta.
Ela continua falando, mas já não consigo ouvir, estou furiosa demais
pela forma como se referiu aos meus amigos. Está certo que eles são meio
desorganizados e podiam estar estudando ao invés de lutando pelo país, mas
chamá-los de vagabundos desocupados é um pouco demais, principalmente
para ela que parece querer dar uma de super inteligente na frente dos líderes
do país, especialmente do presidente.
Eu sei que devia ficar ali para ouvir o que ela está tramando contra o
JUD e assim poder deixá-los precavidos, mas aquela mulher me irrita
demais, não apenas pelo que diz, mas pela forma como troca olhares cheios
de insinuações com Lennon. Não que eu tenha algum direito de me sentir
ofendida com isto, apenas não consigo evitar. Estou furiosa e nem sei o
porquê.
— Com licença. — falo, sem deixar transparecer minha raiva, levanto-
me e deixo a mesa.
CAPÍTULO XI
Não tenho nenhum lugar específico para onde ir, sequer conheço alguém
ali, tampouco tenho a pretensão de ficar na festa e me divertir, mas não
posso abandonar a Sra. Rudolf, então vou para o outro lado do grande salão,
passando pelos convidados sem encará-los no rosto e recosto-me em uma
janela fechada. Só então percebo que a chuva cai forte lá fora, como há dias
não chovia em Bristol.
Um garçom passa carregando uma bandeja com taças de champanhe e
me oferece. Sinto vontade de aceitar, mas lembro das consequências e
recuso de imediato.
Fico ali apreciando o tamborilar da chuva na janela, ignorando as vozes
educadas dos convidados atrás de mim, esperando pelo momento em que a
Sra. Rudolf se cansará de ficar na festa e mandará alguém me chamar para
acompanhá-la até seu aposento. Ela sempre manda alguém me chamar
quando não estou por perto.
Não demora muito para que uma orquestra se organize sobre o palco
pequeno e comece a tocar melodias românticas, que embora pertençam a
outro gênero ficam lindas ao som instrumental. Me surpreendo com o bom
gosto na escolha desta trilha, pois achava que nesse tipo de festa só se ouvia
ópera.
Logo uma voz grossa, masculina, ressoa atrás de mim, de muito perto,
sobressaindo-se ao som da música.
— Devia existir uma lei que proibisse uma garota tão bonita de ficar tão
solitária. — diz.
Viro-me e me deparo com o rosto bastante conhecido, através das redes
sociais, de Stanley Hudson, o primeiro ministro de Flower Garden. É um
cara um tanto comum, com cerca de trinta anos, magro, alto, com cabelos e
olhos escuros, dono de uma elegância que jamais passaria despercebida.
— Talvez uma garota bonita possa ser também uma garota que goste de
ser solitária. — rebato.
— Não posso acreditar que alguém possa realmente gostar da solidão.
— Ia se surpreender com a quantidade coisas bizarras de que algumas
pessoas gostam.
— Acho que estou meio desatualizado no que se refere a pessoas
modernas. — ele sorri e estende-me sua mão. — Muito prazer sou Stanley
Hudson.
— Eu sei quem você é, Sr. primeiro ministro.
— Ah, minha nossa, a vida pública e a falta de mistério que ela nos traz.
Desta vez sou eu quem sorri e aperto a mão dele.
— Sou Lucy Anderson, cuidadora da Sra. Rudolf.
— Da mãe de Rudolf? — ele parece surpreso.
— Exatamente.
— Rudolf não é um sujeito muito inteligente. Se você fosse minha
funcionária, eu te pagaria só pra ficar te olhando dia inteiro.
— Acontece que nem toda garota gosta de ser olhada.
Novamente ele parece ficar surpreso e então sorri, com simpatia.
A orquestra começa a tocar Lost in Your Eyes, que fica linda no som
instrumental e Hudson, esvazia sua taça de champanhe com um só gole
antes de convidar:
— Me daria a honra dessa dança?
Meu primeiro impulso é o de recusar, mas considerando que ele quase se
engasgou com o champanhe só para estar com as mãos desocupadas caso eu
aceitasse, e que não estou fazendo nada mesmo, decido aceitar e nos
colocamos no centro do salão junto com outros poucos casais que dançam
agarradinhos.
Ele me abraça pela cintura, mas não me aperta, mostrando-se cavalheiro
e deixando-me confortável para a dança.
— Adoro essa música. Me lembra meus tempos de farras. — ele diz.
É realmente uma bela melodia, meio melancólica e ao mesmo tempo
romântica. Me desperta sentimentos contraditórios, de nostalgia, de saudade
de algo que não consigo decifrar o que é. Então me lembro do quanto
Lennon está bonito esta noite e sou invadida por um desejo absurdo de
olhar para ele. Dou asas ao meu impulso e meus olhos buscam a direção da
nossa mesa. Mas ele não está lá. Está dançando com Melanie, tão agarrado
a ela que tenho a impressão de que vai entrar em seu corpo a qualquer
momento. Estão se encarando de muito perto, olhos nos olhos, suas bocas
se aproximam, estão quase se beijando. Embora não haja a menor razão
para isto, me sinto mal, magoada e me recuso a continuar olhando.
Descanso minha cabeça no peito de Hudson e fecho os olhos.
— É realmente uma bela música. — concordo, com meu coração pesado.
Ele interpreta meu gesto como um suposto interesse e me aperta mais
forte. Não me esquivo, pois talvez isto me faça bem, o calor humano
sempre é bom e aquele homem é gentil e educado o bastante para que eu
tenha certeza de que não ultrapassará os limites.
A música termina e Hudson me encara sorrindo.
— Notei que você estava bebendo suco. Aceita mais um? — indaga ele.
Antes que eu possa responder, uma mão que parece de aço agarra meu
braço, afastando-me de Hudson e a voz inconfundível de Lennon alcança-
me como o estrondo de uma trovoada em um dia de tempestade.
— É a minha vez. — diz ele, como se falasse de um brinquedo no
parque no qual os usuários alternam as vezes. — Você se importa Hudson?
Até Hudson, que também é homem, percebe a sua petulância em
determinar que vou dançar com ele, sem me perguntar antes se quero e
parece desconcertado.
— Você tem que perguntar a ela. — Hudson diz e posso ver o brilho de
raiva atravessando a expressão dos olhos de Lennon enquanto o observa.
É mesmo o típico ditador a quem ninguém pode dizer o que fazer, pois
se sente ofendido.
— Você tem razão. — Lennon fala, forçando o sorriso. — Concede-me
essa dança, Lucy?
— Na verdade eu estava indo ver se a Sra...
— Ótimo. — Lennon me interrompe e me puxa para o meio do salão
com sua mão de aço, sem me dar a mínima chance de relutar sem parecer
uma escandalosa, visto que as pessoas já olham naturalmente para ele, sem
um motivo, imagina se eu puxasse meu braço da mão dele de supetão.
— Eu não disse que aceitava dançar com você. — falo, para que apenas
ele ouça.
Contudo ele ignora minhas palavras e passa o braço em torno da minha
cintura, me puxando para junto de si, com força, colando-se tanto a mim
que mal consigo respirar, enquanto me rodopia pelo salão, lentamente.
Estou furiosa com sua petulância, com sua falta de capacidade em aceitar
um não como resposta. Não é apenas um ditador, é também grosso e
arrogante, me apertando daquele jeito sem a minha autorização, minutos
depois de ter feito o mesmo com a tal da Melanie.
Entretanto, por mais que eu tente resistir, por mais que lute para manter a
raiva dentro de mim, não obtenho sucesso. Aquilo é inevitável e logo me
sinto afetada pela proximidade dele, pelo calor gostoso que emana do seu
corpo grande e parece penetrar minha pele.
De súbito meu coração está batendo em um ritmo mais acelerado, o ar se
torna difícil de ser puxado, o calor da lascívia toma conta de mim de tal
maneira que sinto a umidade se fazendo entre minhas pernas, sem que eu
possa fazer nada para impedir.
— Se você queria um homem em quem se esfregar, aqui está um. Não
precisa sair a procura dos convidados. — ele diz, asperamente.
Não posso acreditar no que meus ouvidos ouvem. Aquele cavalo
realmente acha que eu estava me esfregando em Hudson? Está insinuando
que eu estava a procura dos convidados?
— Não julgue as pessoas por si mesmo, Lennon. Nem todos se
aproveitam de uma dança inocente para dar uma sarrada.
— Não existe inocência quando um cara chama uma garota como você
para a dança. Eles só querem uma coisa. Não vê como todos te olham?
— Foi você quem me presenteou com esse vestidinho vulgar.
— Não é vulgar no seu corpo, mas confesso que não foi uma boa escolha
de minha parte. Eu queria que você se vestisse assim só pra mim.
— Escolheu o vestido da Melanie também?
— A Melanie não é nada se comparada ao que você significa para mim.
Eu não acredito em uma palavra do que aquele cafajeste diz. Só deixou a
Melanie de lado para vir me importunar porque se recusa a ser rejeitado e
mais ainda a ser trocado por outro. Mas eu sei muito bem como lidar com
tipinhos como ele. Lennon pode ser o homem mais poderoso daquele salão,
mas ainda é apenas um homem, com o orgulho de um conquistador barato a
zelar.
— Acontece que você não é nada pra mim. — provoco. — Aliás eu
preferia estar dançando com Hudson.
Ele me aperta com tanta força que tenho a impressão de que vai me
esmagar.
— Ele não é homem pra você. — fala, com os dentes trincados.
— Isso sou eu quem decide.
— Esse cara não fica com a mesma mulher por mais que uma noite. O
conheço muito bem.
— E daí? Eu posso estar interessada em apenas uma noite também. —
digo isso apenas para provocá-lo, pois seria incapaz de trair Kevin com
qualquer um daqueles homens, afinal meu namorado já foi ferido o bastante
pelo monstro que existe dentro de mim.
— Se está interessada em uma noite quente, baby, eu posso te dar essa
noite.
Merda! Eu devia ter ficado calada.
Sem aviso prévio, Lennon trás sua boca quente e úmida para a pele do
meu pescoço, onde planta uma trilha de beijos deliciosos e tudo dentro de
mim parece entrar em ebulição. Sinto o meio das minhas pernas
completamente lambuzado latejando e arquejo sem querer.
É o suficiente para que ele perceba o meu estado e com toda a sua
experiência me conduz, disfarçadamente, para um canto escuro do salão,
sem afastar seu corpo do meu, e é ali que me encurrala contra a parede,
prendendo-me com seu físico grande como um animal que abate sua presa.
Volta a afunda o rosto em meu pescoço, beijado, lambendo, mordiscando
e novamente arfo excitada.
— Você me deixa louco, menina. — diz, rouco, para no instante seguinte
atacar minha boca com a sua.
Tento de todas as formas impedir que o beijo aconteça, mas é
impossível, eu quero tanto aquilo que desisto de lutar muito facilmente e me
entrego, entreabrindo os lábios para que sua língua ávida explore minha
boca, impetuosamente, com uma fome descomunal, como jamais alguém
me beijou antes e as sensações que me tomam são enlouquecedoras.
Meu coração bate tão depressa que posso senti-lo contra as minhas
costelas, minha mente gira, libertando-se de qualquer pensamento racional e
tudo em mim se torna luxúria.
Estou perdida nos braços do homem a quem deveria odiar mais que tudo
na vida, inebriada de desejo, fervendo de tesão, tão louca por ele que seria
capaz de me deixar possuir ali mesmo, quase na frente de todos os
convidados.
Lennon inclina seus joelhos e esfrega sua ereção bem em cima da minha
intimidade molhada, o que torna tudo ainda mais gostoso, insano e
irrefreável.
Eu quero ser dele, com uma intensidade absurda, como jamais quis ser
de outro homem na vida. Mas eu não posso fazer isso, pois seria o mesmo
que trair toda a minha família destruída, seria o mesmo que trair a mim.
— Lennon, para. — tento, mas minha voz sai num sussurro tão abafado
e ofegante que não convence nem a mim mesma. — Não posso fazer isso.
— Não pode, mas quer. — é o que ele diz, a voz meio selvagem.
Sua língua se enterra novamente na minha boca, ao mesmo tempo que
sua ereção me empurra lá em baixo, deixando-me cada vez mais perdida. E
tudo piora, ou melhora, já nem sei mais, quando sua mão escorrega pelo
meu corpo e penetra a fenda na minha saia, indo direto para na minha
calcinha tão molhada que sinto vergonha, o que parece excitá-lo ainda mais,
visto que um gemido rouco parte da sua boca e morre na minha.
Seu dedo do meio escorrega para dentro do tecido delicado da peça
íntima e como se apenas meus instintos me guiassem, ergo um pouco uma
perna para me abrir para ele.
Parece loucura, mas tenho a impressão de que vou morrer se ele tirar
suas mãos de mim.
— Minha nossa... que delícia... tão quente e molhadinha... — ele
sussurra, para em seguida enterrar sua língua novamente na minha boca,
com lascívia.
Seu dedo é experiente e me toca de um jeito que quase me deixa louca.
Primeiro acaricia meu clitóris, em círculos, deixando-o completamente
inchado, para depois entrar na minha vagina e se mover dentro dela, em um
delicioso vai e vem.
Acontece muito inesperadamente, meu corpo se retesa e de repente estou
gozando no dedo de Lennon, bem ali, onde podemos ser flagrados a
qualquer momento pelos convidados.
Meus gemidos são abafados pela boca dele, enquanto meu canal
empapado lateja em volta do seu dedo, até que eu esteja totalmente
relaxada, quando então ele retira seu dedo lambuzado de mim e o enterra
em sua boca, provando o gosto da minha lubrificação com o rosto
contorcido de prazer.
— Que delícia, Lucy. — ele sussurra, sem desviar seu olhar luxurioso do
meu. — Vamos para a minha suíte, me deixa te provar todinha esta noite.
Sua proposta me atinge como uma lufada de vento gelado que me
desperta de uma espécie de transe. É indiscutivelmente maravilhoso estar
nos braços daquele homem, mas eu não posso esquecer nenhum minuto do
que ele fez. Eu não estou lidando com uma pessoa qualquer, antes fosse,
mas aquele é o assassino que tirou a vida do meu pai, que entrou em nossa
casa durante a madrugada e cortou a garganta de um homem inocente em
nome da sua sede pelo poder e agora estou aqui, toda derretida nos braços
dele.
Não posso acreditar que permiti que as coisas chegassem a esse ponto.
— Não posso fazer isso. — falo, como se deixasse um sonho bom para
entrar em um pesadelo.
Quase em desespero, o empurro com todas as minhas forças, mas ele não
se move do lugar.
— Por que não? Eu sei que você também me quer. Não tem mais como
você negar isso.
— Eu não te quero. Será que dá pra você me deixar em paz? — desta
vez eu quase grito, acarretando o risco de sermos notados pelos convidados
e entrarmos em uma situação constrangedora, ele mais do que eu, porque
afinal está agarrando a cuidadora da sua mãe.
Só que ele parece não ligar e continua me segurando firme no lugar, com
a facilidade de quem segura uma boneca de pano.
— Eu até te deixaria se você me desse uma boa razão pra isto.
— Eu não quero você. Existe razão melhor que essa? — não sei porque
minha voz sai trêmula, simulando uma incerteza que não existe.
— Não minta para si mesma! Isso está começando a ficar ridículo! —
ele esbraveja.
— Com licença. Está acontecendo alguma coisa aqui? — a voz parte de
trás de nós, de Hudson.
A posição em que estamos, com Lennon me segurando pelos dois braços
enquanto eu me debato tentando me afastar, passa a impressão de que ele
está me forçando a algo e pela forma escandalizada com que o ministro nos
observa, é exatamente isso que está pensando.
Aproveito que Lennon tem um segundo de distração com o outro homem
e escapo, caminhando depressa pelo salão, ciente de que estou descabelada,
com a maquiagem borrada e tenho a sensação de que todos notam o meu
estado, por isso vou depressa para os fundos do palácio, direto para o
terraço, em busca de um pouco de ar puro para tentar me acalmar e
esquecer o que acabei de deixar que acontecesse.
Não posso acreditar que fui fraca a ponto de desonrar o meu padrasto tão
vergonhosamente, que fui estúpida a ponto de decepcioná-lo, de fracassar
no objetivo de vingar sua morte. Mas pode não ser tarde ainda, nem tudo
está perdido.
A chuva continua caindo grossa do lado de fora. Recosto-me na mureta
do terraço, sem me importar que os respingos caiam em mim, eu só quero
ficar ali e respirar, voltar a mim e repensar no que fiz, medir a minha
imensurável fraqueza.
Quando penso que consegui me livrar de Lennon por esta noite, ele
adentra o terraço, caminhando depressa, com passos largos e precisos, sem
deixar de ser altivo e elegante como sempre.
— Precisamos conversar. — ele diz.
— Não temos nada pra falar. — merda! Eu não consigo nem olhar para
ele.
Mas Lennon é impulsivo, arrogante, prepotente e não aceita ser
ignorado, por isso segura-me pelo braço e me faz virar para encará-lo.
— Mas claro que temos! – diz ele. — Você pode me explicar o que
acontece com você? Eu sei que não é indiferente a mim como quer me
convencer. Acabou de deixar isso claro.
— Você está enganado, aquilo foi... foi... um equívoco.
— Um equívoco?! Claro que não! Aquilo foi maravilhoso e quero que
seja ainda melhor.
Merda! Quando ele fala sem a arrogância de sempre as coisas ficam
ainda mais difíceis. E é por isso que preciso me afastar, eu não confio em
mim quando esse homem está perto.
— Mas não vão ser. — falo, tentando convencer a mim mesma dessas
mentiras. — Você nunca mais vai me tocar. Agora por favor me deixa em
paz.
— Não!
Sem pensar direito, puxo meu braço da sua mão com um safanão e corro
para o jardim, sem me importar que a chuva me deixe encharcada, eu só
quero ficar longe de Lennon, antes que esteja gozando nos braços dele de
novo, porque aquele homem é a minha perdição.
Todavia, ele vem atrás de mim, se metendo debaixo da chuva também.
— Você ta louca? Vai adoecer nessa chuva.
— Antes ficar doente que perto de você.
— Para de se enganar, Lucy, eu sei que você me quer tanto quanto eu a
você.
Eu sei que ele está certo, mas não posso admitir isso e ficar perto me
coloca em risco de não resistir, então começo a correr, os saltos das minhas
sandálias deslizando na grama molhada do jardim.
Lennon tenta me deter, segurando-me por trás e é nesse instante que
meus saltos afundam na grama e acabamos caindo juntos, nos estabanado
no chão molhado, ele por cima de mim. Viro-me de frente e tento me
levantar, mas ele me aprisiona com o seu corpo pesado e sólido.
— Me solta! Eu te odeio! — grito, descontrolada.
CAPÍTULO XII
— Odeia nada. Você pode enganar a si mesma, mas não pode enganar a
mim.
— Sai de cima de mim! — tento lutar contra Lennon, mas é impossível,
sua força física é muito maior. — Eu te odeio! Eu te odeio!
O abalo emocional me puxa para a escuridão e as lembranças se
projetam em minha mente como flashes indefiníveis de um filme que
assisti. Não posso ver o rosto do homem, mas posso sentir sua mão nojenta
passeando pelo meu corpo, causando-me náuseas e um pavor indescritível.
Estou na beira do abismo, me perdendo dentro de mim mesma, sem que
nada possa ser feito para impedir a mudança.
— Me perdoa! — Lennon grita e sou completamente pega de surpresa.
— Eu não sei o que fiz a você, mas seja o que tenha sido, me perdoa.
Sua voz é gentil, tem um tom de súplica e possui o estranho poder de me
puxar de volta para a realidade. As cenas desaparecem da minha mente e
estou de novo no jardim do palácio, apenas Lennon e eu deitados no chão,
sob a chuva forte.
Já é a segunda vez que ele me leva à beira do abismo para em seguida
trazer-me de volta.
Eu nunca imaginei que um dia o ouviria me pedindo perdão, é uma coisa
com a qual não contava e o pior é que ele não sabe pelo que lhe devo o meu
perdão, pois nem desconfia que sou órfã de um homem que assassinou
friamente. Só que perdoá-lo seria fácil demais, ele merece pagar por tudo.
A constatação me deixa novamente aflita e as lembranças voltam,
projeções incertas de algo que não tenho certeza se aconteceu, o monstro
que habita dentro de mim está lutando para se exteriorizar, sinto-o muito
próximo.
É então que Lennon toma meus lábios em um beijo selvagem, quase
violento, sua língua explora minha boca avidamente, despertando-me a
luxúria e fico entre me perder dentro de mim mesma ou me perder naquele
beijo.
Opto pela segunda alternativa e o abraço pelo pescoço, puxando-o mais
para mim, chupando sua língua com lascívia, ao mesmo tempo em que o
abraço pelos quadris com minhas pernas, entregando-me ao desejo que
queima em minhas entranhas, não apenas porque isso parece me impedir de
mudar, mas porque é impossível resistir àquele homem. Eu desisto de
tentar.
Agora percebo que é perda de tempo tentar fugir do que sinto por ele, o
desejo que me toma é forte demais e é inevitável que eu seja sua. Não tenho
mais meios de escapar.
— Eu te quero tanto Lucy. — Lennon diz, sua voz arrastada pela
respiração ofegante, sua boca passeando pela pele da minha face e pescoço.
— Me diz que também me quer. Admita de uma vez.
— Eu te quero, Lennon. — falo, sem mais forças para continuar
resistindo.
Ele me beija de novo, com tanta selvageria que parece estar tentando me
devorar e sua mão passeia pela minha perna desnuda na fenda longa da saia.
— Vem comigo. Vamos sair dessa chuva. — ele diz e levanta-se,
puxando-me junto, erguendo-me em seus braços.
Como se estivesse mergulhada em uma espécie de transe, motivado pelo
desejo, deixo que ele me carregue para onde quer, só que em vez de
voltarmos para o palácio, seguimos na direção do vestiário que há perto do
campo de futebol, porque está mais próximo e entramos.
Lennon me coloca no chão, acende a luz e percebo que é um cômodo
único, grande, muito parecido com um bangalô, limpo e organizado, onde
há equipamentos esportivos muito bem arrumados em armários embutidos e
onde o silêncio é quebrado apenas pelo estrondo das trovoadas e pelo som
longínquo da música instrumental que toca na recepção.
Sem a proximidade com seu corpo, fico trêmula de frio, mas logo
Lennon me trás uma toalha de banho com a qual me ajuda a me secar,
esfregando-a em meus cabelos encharcados.
— Onde você estava com a cabeça para entrar nessa chuva? — ele
indaga, mas não respondo. Estou nervosa demais. — Eu conheço um jeito
melhor de te aquecer.
Com isto ele joga a toalha no chão e abraça-me apertado, colando seu
corpo no meu e me beija daquela forma erótica, meio selvagem, que me
deixa sem chão. Desce a boca pelo meu queixo, deslizando-a pelo meu
pescoço e colo, deixando um rastro de chamas por onde passa.
Ele estava certo quando disse que isto me aquece melhor, estou quase em
chamas.
Suas mãos vão para as minhas costas e abrem a o zíper do meu vestido,
devagar, escorregando a veste pelos meus ombros até que caia aos meus
pés, de modo que fico só de calcinha. Lennon se afasta alguns centímetros,
o suficiente para examinar o meu corpo inteiro, com olhos brilhantes de
luxúria.
— Linda! — sussurra.
Fico surpresa quando de súbito ele se ajoelha à minha frente, escorrega
minha calcinha para baixo, tirando-a pelos pés e contempla minha
intimidade com olhos brilhantes, para no instante seguinte trazer sua boca
para mim, colocando-a bem ali no meio das minhas pernas, plantando
beijos estalados na minha vulva depilada, tão gostosamente que lanço a
cabeça para trás, inebriada. Depois, me faz abrir mais as pernas, afasta
meus grandes lábios com os polegares, aspira profundamente, absorvendo
meu cheiro antes de enterrar sua língua em mim, movendo-a sobre meus
clitóris, em círculos.
— Ahhh... — o grito me escapa e preciso segurar-me em seus cabelos
curtos para não cair no chão, porque já não tenho o domínio sobre minhas
pernas, tudo em mim é luxúria, o tesão toma conta de todo o meu ser.
Puta merda! Como ele faz gostoso, como aquilo é bom.
Estou completamente perdida em sensações libidinosas, arrebatada de
desejo, a tal ponto que abro ainda mais minhas pernas, puxo seus cabelos
com força e movo meus quadris, esfregando minha intimidade na sua boca,
sem que nada mais nesse mundo pareça me importar.
Sem deixar de lamber meu clitóris, Lennon enterra seu polegar na minha
vagina escorregadia, massageando em cheio o meu ponto G e é assim que
mergulho no êxtase, gemendo alto e me contorcendo toda, tão
arrebatadoramente que minhas pernas falham e caio de joelhos diante dele.
Eu nunca tive uma visão mais magnífica que a expressão de Lennon
quando seu olhar encontra o meu, é um misto de prazer, selvageria e luxúria
que o torna o mais irresistível dos seres.
— Você é deliciosa, Lucy. — diz, com a voz meio rouca, para em
seguida segurar-me os cabelos molhados atrás da cabeça e levar minha boca
para a sua.
Enterra sua língua gostosa na minha boca, impetuosamente, numa ordem
silenciosa que obedeço de imediato e a chupo com volúpia, provando do
meu próprio gosto, quando tudo dentro de mim implora por senti-lo mais
intimamente e é seguindo a esse instinto, que levo minhas mãos trêmulas ao
botão da sua camisa, mas só consigo abrir o primeiro, pois Lennon levanta-
se e me puxa para cima.
— Eu faço isso mais depressa. — diz e é verdade, em questão de
segundos ele livra-se de todas as suas roupas molhadas.
Fico completamente sem ar ao observar seu corpo nu. É a criatura mais
magnífica sobre a qual meus olhos já estiveram. Tem os ombros largos, o
peito musculoso, desprovido de pelos, o abdômen é sarado, totalmente reto
e a pélvis ligeiramente peluda. O pênis é grande, grosso e está totalmente
duro, apontando para cima, com suas veias protuberantes e a glande
ligeiramente molhada.
Como se estivesse atraída por um ímã, volto a colar meu corpo no seu,
extasiada com o calor da sua pele em contato direto com a minha. Abraço-o
pelo pescoço e fico na ponta dos pés para alcançar sua boca, quando o beijo
vem, faminto e violento.
Lennon contorna minha cintura com um braço e aperta minhas nádegas
com a outra mão, pressionado meu ventre contra sua potente ereção, o que
me arranca um gemido de prazer.
Não resisto e levo minha mão àquela maravilha, masturbando-o,
sentindo-o latejar entre meus dedos, quando então minha vagina pulsa,
ansiando por tê-lo todo enterrado em mim.
— Eu te quero tanto... — minha voz sai trêmula e posso sentir seu corpo
estremecendo de encontro ao meu em reação às minhas palavras.
— Não mais do que eu a você.
Quando ele se afasta, é como se uma parte de mim fosse levada junto,
sinto frio e uma estranha solidão.
Observo-o forrando alguns colchonetes no chão e meu coração bate
descompassado no peito. Está muito perto de acontecer aquilo que tanto
tentei evitar e o pior é que quero que aconteça, quero tanto que tenho a
impressão de que serei capaz de morrer se ele não me fizer sua neste
momento.
Lennon tira um pacote de preservativos do bolso da sua calça, abre a
embalagem e cobre-se, para em seguida voltar para mim. Ergue-me em seus
braços e deita-me sobre os colchonetes, cuidadosamente, colocando-se
sobre mim, com o peso do seu corpo apoiado nos seus cotovelos, seus olhos
lindos presos aos meus.
É um momento tão íntimo, tão único, que tenho a sensação de que
conheço aquele homem há muito mais tempo, de que, de alguma forma, ele
faz parte de mim. É algo que não consigo compreender, afinal eu deveria
odiá-lo.
— Você é tão linda. — ele sussurra e me beija novamente na boca
enquanto encaixa seus quadris entre minhas pernas.
Segura seu pau pelo meio e esfrega a glande na entrada da minha vagina
melada, como se tentasse, deliberadamente, aumentar minha expectativa e
consegue.
Quando me penetra, é com um movimento rápido e brusco dos seus
quadris que o leva inteiro para dentro de mim, seu tamanho me esticando
toda, alcançado-me muito fundo, tão deliciosamente que deixo escapar um
grito agudo.
— Estou te machucando? — ele parece espantando.
— Não. Pelo contrário, isso foi gostoso demais.
O canto da sua boca se dobra em um sorriso muito sutil e ele faz de
novo, puxando os quadris para arremetê-los contra mim novamente, com
uma força absurda, como se sua intenção fosse me partir ao meio.
Ele está enterrado em mim até a raiz quando para de se mover e minha
vagina lateja em torno da sua rigidez, pedindo por mais.
Seu membro é muito grosso e longo. Se eu não estivesse tão excitada,
tenho certeza de que não aguentaria aquele tamanho todo, mas a verdade é
que meu corpo parece clamar por ele, por mais do que está me
proporcionando.
Sem desviar seu olhar selvagem do meu, Lennon passa a me penetrar em
vai e vem, sem pausas, entrando e saindo depressa, tão deliciosamente que
meus gritos ecoam altos. Estou muito perto da perdição quando ele nos gira
sobre os colchonetes e me coloca por cima, de modo que apoio minhas
mãos em seu peito largo, para ganhar equilíbrio, abro mais minhas pernas,
apoiando meus dois pés no chão e o cavalgo, movendo-me freneticamente,
para cima e para baixo, em círculos, sua pélvis peluda chocando-se contra
meu clitóris, intensificando o meu prazer.
Estou ensandecida, gemendo alto, às vezes gritando, apreciando tê-lo
todo enterrado em mim e ao mesmo tempo ansiando por uma libertação.
— Porra gata... que delícia... — Lennon diz e com um gesto muito
rápido, sai de mim, deita-nos de lado no colchonete, colocando seu corpo
atrás do meu, ergue uma de minhas pernas e me penetra assim, metendo
fundo, depressa, implacavelmente, acabando comigo, dando-me mais prazer
do que já tive durante toda a minha vida.
Movo meus quadris no mesmo ritmo que os dele, para a frente e para
trás, buscando-o, descontrolada, louca de tesão.
Sua mão escorrega para o meio das minhas pernas e me toca
intimamente, seus dedos massageando meu clitóris. Solto um grito de puro
prazer e viro meu rosto para ele, recebendo sua língua gostosa que entra
toda na minha boca ordenando que eu a chupe e obedeço de bom grado,
extasiada.
Aquilo é a minha perdição, quando penso que não, estou gozando no pau
dele, gemendo e gritando seu nome, me contorcendo inteira, deliciosamente
preenchida.
Sem que eu perceba as lágrimas brotam dos meus olhos e me dou conta
de que jamais vivi algo tão intenso, tão arrebatador. É como se eu jamais
tivesse existido por inteiro e isso me assusta demais. É algo que não
compreendo.
Lennon continua enterrado em mim até a raiz, duro, quente pulsante,
imóvel. Segura meu rosto com uma mão e me beija com uma selvageria
excitante, enfiando sua língua na minha boca e tirando, para em seguida
chupar a minha, numa promessa silenciosa do que acontecerá em seguida.
— Eu não sou um cara fácil de gozar, gatinha. — diz. — Espero que
você não se canse fácil.
Em resposta, seguro seus cabelos curtos e os puxo com força,
intensificando o beijo, sendo recompensada pelo seu gemido abafado.
Sua mão passeia por sobre os meus seios, massageia meu mamilo
esquerdo, depois o direito e é assim que Lennon volta a se mover dentro de
mim, lentamente, entrando e saindo, indo ainda mais fundo, esfregando
seus pelos púbicos na minha bunda.
— Fica de quatro. — ele ordena e me sinto meio safada por obedecer tão
depressa.
Lennon coloca-se atrás de mim, de joelhos, espalma uma mão em
minhas costas, fazendo uma leve pressão para abaixar o meu torso, até que
meu rosto encontre a maciez do colchonete e empina mais minha bunda.
Usa as duas mãos para abrir minhas pernas, deixando-me totalmente
arreganhada diante dos seus olhos famintos e sibila excitado antes de se
inclinar para colocar sua boca deliciosa em mim, por trás. Acaricia meu
ânus com a ponta da sua língua, para em seguida sugar o lábio direito da
minha boceta, com força, depois o esquerdo e finalmente lamber meu
clitóris, freneticamente.
— Ahhh... porra... que delícia... — deixo escapar, sentindo-me uma
safada, mas a sensação é boa.
Lennon enfia sua língua na minha vagina, tira, volta a lamber meu
clitóris, e então a enterra novamente em meu canal, deixando-me cada vez
mais alucinada, perdidamente excitada.
Por fim, ergue-se e me penetra, sem a menor delicadeza, entrando em
mim com uma arremetida brusca, rápida, certeira, indo fundo, me abrindo
toda, se refestelando na minha carne molhada e eu gosto tanto disto que não
consigo parar de gemer e gritar, maravilhada, pedindo por mais.
Ele enche uma de suas mãos com os meus cabelos e mete em mim com
toda força, cada vez mais depressa, em vai e vem, até que o sinto ficar mais
duro em meu interior e sua voz rouca me alcança.
— Vou gozar gata, goza comigo...
Meu corpo reage de imediato ao comando da sua voz e todos os meus
músculos se retesam para que logo eu exploda em outro orgasmo, desta vez
junto com ele, seus espasmos se fazendo ao mesmo tempo que os meus,
tornando tudo mais gostoso, inesquecivelmente bom.
Quando a calmaria chega, sinto meu corpo pesado e me deixo cair de
bruços sobre o colchonete, exausta, como se tivesse corrido uma maratona.
Lennon se espalha ao meu lado, com seu corpo colado ao meu e acaricia
meus cabelos, suavemente, massageando meu couro cabeludo com a ponta
dos dedos enquanto sussurra palavras carinhosas ao meu ouvido.
Estou tão cansada e relaxada que acabo pegando no sono sem querer.
Não sei por quanto tempo dormi, só sei que estou sozinha sobre os
colchonetes, ainda nua, quando acordo. Fico meio confusa, sem entender o
que está se passando, pisco várias vezes, tentando assimilar a realidade e
então me lembro de tudo. Através do vidro da janela constato que ainda é
noite, ainda chove forte lá fora e ainda posso ouvir o som da música
instrumental partindo da festa, o que me leva a crer que devo ter dormido
por uma ou duas horas apenas.
Percorro meus olhos pelo cômodo amplo, à procura de Lennon, mas não
o vejo em parte alguma, estou completamente sozinha, abandonada e a
sensação que me toma é desoladora.
Não preciso pensar muito para saber que fui usada e depois descartada
em um estalar de dedos, como um objeto. O que aconteceu entre mim e
aquele homem foi maravilhoso, inesquecível, mas para ele foi só mais uma
transa, tão insignificante que não se deu ao trabalho sequer de me esperar
acordar para me acompanhar de volta ao palácio. Mas por que ele
esperaria? Agora que conseguiu o que queria, não tenho mais importância
alguma para si, sou apenas a cuidadora idiota que deu para ele dentro do
vestiário. A esta altura deve estar tentando convencer Melanie a fazer o
mesmo e como não precisa que ela cuide de sua mãe, certamente a levará
para seu apartamento em Taunton e a tornará sua amante. Ou talvez a
descarte logo que conseguir o que quer, como fez comigo.
Embora eu já imaginasse que as coisas seriam assim, a tristeza que me
toma é angustiante, sinto vontade de chorar e ao mesmo tempo de me
esmurrar, por ter sido idiota a ponto de me deixar ser usada pelo homem
que assassinou friamente o meu padrasto, que destruiu minha família,
deixando-me completamente sozinha no mundo.
Sinto vergonha de mim mesma por ter me permitido seduzir tão
facilmente por alguém tão sórdido. Tenho certeza de que de onde está meu
padrasto sente vergonha de mim também.
Lembro-me de quando eu era criança e ele costumava dizer que eu era
uma princesa, a sua princesinha, aquela que se tornaria uma mulher de
respeito quando atingisse a idade adulta, que para chegar perto de mim, um
homem teria que me tratar como uma verdadeira rainha, que apenas o
melhor dos homens seria digno de ser meu marido um dia.
E agora estou aqui, fodida até a exaustão e abandonada pelo homem que
tirou sua vida.
Esforço-me para não chorar, mas não consigo me conter e as lágrimas
descem abundantes pelo meu rosto, lágrimas de agonia, motivadas pela
constatação de que sou apenas uma fracassada e nada mais.
CAPÍTULO XIII
Engulo o choro e obrigo-me a me levantar, quando só então percebo o
quanto estou dolorida no meio das pernas. Visto o vestido molhado, ainda
jogado no chão e sento-me em uma coisa que parece uma maca, pensando
sobre o que fazer. Ir embora dali e nunca mais voltar, seria o mais sensato,
mas então Lennon teria me destruído por duas vezes. Por duas vezes teria
feito mal a mim sem receber um castigo. A vida não é mesmo justa.
Um soluço me escapa e nem tento entender como alguém pode ser tão
sórdido. Ele simplesmente é assim.
O tamborilar da chuva no telhado reduz e o som da música na festa se
torna mais audível. Imagino a quantidade de pessoas importantes presentes
naquele salão e é então que tenho a mais hedionda das ideias. Algo que
pode destruir a imagem de Lennon perante o mundo de forma irremediável.
Me sinto quase uma sádica por pensar nisto.
É algo sórdido, desprezível, mas é a minha última chance de obter
sucesso na vingança que planejei, afinal isto pode não apenas prejudicar sua
imagem, mas acarretará também o risco de destituí-lo do seu cargo de
presidente.
Sei que já é tarde o suficiente para que a Sra. Rudolf não esteja mais na
festa, então isso não poderá afetá-la.
Determinada, respiro fundo, buscando coragem no ódio que jaz dentro
de mim. Seguro a saia do vestido de seda com as duas mãos e puxo forte o
bastante para que a fenda se rasgue até em cima, apartando-o, depois junto
as duas brandas para esconder o meu corpo, cruzo os braços para segurá-lo
no lugar e deixo o vestiário correndo, descalça para não correr o risco de
cair de novo. Vou direto para a entrada de trás do palácio, atravesso os dois
salões dos fundos, completamente desertos e sigo até o salão principal, onde
a festa ainda acontece, embora com um número bem menor de pessoas.
Chegando lá, meus olhos querem procurar por Lennon, mas não posso
perder tempo, vou precisar de toda a minha coragem e de toda a minha
capacidade de representar para fazer isto.
— Alguém me ajude! — solto o grito estrangulado e isto é o bastante
para que eu tenha a atenção de todos os presentes, que param tudo para me
observar, chocados. — Por favor alguém me ajude! — repito e não é tão
difícil soltar um soluço. — Eu acabo de ser violentada, alguém chama a
polícia!
Deliberadamente, deixo minhas pernas fraquejarem e antes que meu
corpo atinja o chão, um homem gordo que está ao meu lado me ampara,
para que logo outras pessoas venham ajudá-lo a me segurar e sou amparada
por vários braços que me colocam sentada em uma cadeira.
— Fica calma, querida e nos diga, quem fez isso com você. — é uma
mulher com cerca de cinquenta anos quem pergunta, como vários outros
dos presentes, está me observando com piedade.
— Lennon Rudolf. — falo, forçando minha voz a sair trêmula, carregada
de horror.
Todos olham para a mesma direção e quando sigo seus olhares o vejo
entrando no salão, ainda usando as roupas molhadas, apenas e calça e a
camisa, sem o paletó, segurando um guarda chuvas nas mãos, observando a
cena com confusão.
O mais completo silêncio paira no ar, até a orquestra parou de tocar, os
olhares que jazem sobre Lennon são escandalizados e hostis.
— Você tem certeza de que foi ele? — um homem pergunta, muito sério,
observando Lennon com condenação.
Encaro-o por uma fração de segundos, o que é suficiente para que eu
hesite e até me arrependa pelo que estou fazendo, mas agora é tarde, a
merda já está feita, não posso voltar atrás, só preciso ser forte o suficiente
para seguir em frente, afinal isso é o mínimo que aquele assassino merece.
Por dias tentei encontrar alguma evidência no palácio que pudesse
incriminá-lo, mas não obtive sucesso, esta é a única forma que estou
encontrando de fazê-lo pagar por tirar a vida do meu padrasto.
— Sim, foi ele, lá fora, no jardim. — declaro para que todos ouçam.
— Eu o vi forçando-a ainda aqui no salão pouco antes de os dois
desaparecerem. — é Hudson quem fala e isso dissipa qualquer dúvida que
alguém ainda possa ter.
Uma enxurrada de murmúrios e vozes horrorizadas preenche o salão,
condenando Lennon, julgando-o, o que significa que consegui convencer a
todos da minha mentira.
— Como pôde fazer uma coisa dessas! — a exclamação parte de alguém
cujo rosto não reconheço e é seguida de outras, no mesmo sentido, que são
pronunciadas quase em uníssono.
Como eu esperava, todos ali o estão condenando, agora é questão de
tempo até que aquele maldito esteja desmoralizado perante o mundo. E
provas do seu falso crime não vão faltar, pois de fato tive relações sexuais
com ele.
— Eu não fiz nada! — a voz de Lennon se sobressai a todas as que o
acusam, parte tão furiosa que lembra o rosnado de um animal. — O que
aconteceu entre nós foi consensual. — Sei que ele está me observando com
tanta fúria que tenho medo de olhar de volta. — O que pensa que está
fazendo, Lucy? Acha mesmo que pode sustentar essa mentira por muito
tempo?
O ouço mais próximo e entro em pânico. Embora meu plano seja
brilhante, Lennon é poderoso demais e pode me destruir com a facilidade de
quem esmaga um inseto se assim desejar. Não posso permanecer no palácio
nem mais um minuto, a proximidade dele se tornará perigosamente mortal
daqui em diante.
É realmente lamentável ter que abandonar a Sra. Rudolf, mas preciso
sair daqui, o mais depressa possível.
Viro-me para Hudson, porque é o mais próximo a mim, é tão poderoso
quanto Lennon e é a única pessoa com quem conversei ali dentro.
— Por favor, me tira daqui. Não deixa ele chegar peto de mim. —
suplico e embora meus motivos sejam falsos, o pânico dentro de mim é real.
Tenho pavor do que Lennon pode fazer contra mim.
Hudson observa Lennon com condenação antes de passar o baço em
torno da minha cintura e me ajudar a levantar, enquanto eu mantenho os
braços cruzados na frente do meu corpo para impedir que meu vestido se
abra.
— Vem comigo. Vou te levar pra um lugar seguro. — Hudson declara e
Lennon toma nosso caminho, altivo e autoritário como costuma ser.
Estou tão assustada que não consigo olhar para ele.
— Ela não vai a lugar nenhum! — sua voz é um rosnado quase selvagem
e todo o meu corpo estremece de pavor. — Não até confessar que está
mentindo.
— Por favor. — suplico, tão baixo que apenas Hudson pode me ouvir.
— É melhor você sair da frente, Rudolf. A garota vai comigo. —
Hudson diz.
— Não se atreva a me confrontar. — Nunca vi Lennon tão furioso.
— Alguém pode ajudar aqui? — Hudson grita e várias pessoas, que até
então apenas nos observavam, se colocam no caminho de Lennon, acho que
o estão segurando, mas não olho para ter certeza, só quero sair dali o mais
depressa possível.
Hudson me segura em seus braços e me carrega para o lado de fora, pela
porta da frente, se enfiando debaixo da chuva que está mais fraca agora.
Percebo que cerca de meia dúzia de homens vestidos com terno e gravata
nos segue e sei que são seus seguranças.
Atravessamos o pátio enorme e entramos em uma limusine de luxo, com
dois dos seguranças tomando a frente do veículo, um deles o conduzindo,
enquanto os outros quatro entram em um Mercedes preto que segue atrás de
nós quando saímos pelos largos portões do palácio.
Estou acomodada em um assento largo, acolchoado, trêmula dos pés à
cabeça. Hudson está sentado em outro, diante de mim, observando-me.
Com gentileza, tira seu paletó e oferece-me. Aceito de bom grado, pois
não aguento mais segurar o vestido no lugar para não correr o risco de ficar
nua. Visto-o e fecho os botões, relaxando um pouco dentro da peça quente e
segura.
— Obrigada. — minha voz ainda está trêmula.
Não consigo acreditar no que fiz. Minha nossa! Eu tive mesmo coragem
de mentir tão convincentemente, diante de pessoas tão poderosas,
inventando que fui violentada pelo presidente do país? Não sei a
repercussão que isso vai ter, mas sei que vai ser grande e irremediavelmente
fatal para a carreira política de Lennon.
— Está se sentindo melhor? — Hudson indaga. — Mas que pergunta
idiota, como uma mulher pode se sentir melhor depois de passar por isso?
Me desculpe.
— Não precisa se desculpar.
— Eu tenho vinho e champanhe aqui. — ele aponta para o pequeno
frigobar que há dentro da limusine, enquanto deslizamos tão suavemente
sobre o asfalto que nem percebo que estamos em movimento. — Você quer
alguma coisa para ajudar a esquentar o frio?
— Não obrigada. — minha boca enche de água quando ele menciona o
vinho, mas as consequências do álcool em meu organismo são desastrosas.
— Você quer ir a um hospital? Está muito machucada?
— Não fisicamente. Não preciso de um médico. Só quero me afastar
daquele monstro. — e é verdade, não porque ele tenha me machucado, mas
porque estou apavorada com sua fúria.
— Meu jato particular está no aeroporto. Se você quiser, pode vir
comigo para Cardiff e ficar lá até a poeira baixar. As pessoas com quem
moro são muito hospitaleiras. — ele sorri meio de lado, como se estivesse
desconcertado.
— Com quem você mora?
— Ah, você sabe. Um batalhão de seguranças, alguns outros empregados
e uma irmã.
Sua proposta não podia ser melhor, afinal é a forma mais segura de me
livrar do ódio de Lennon e de quebra não ter mais que olhar para a cara
dele. Fico imaginando o que Kevin vai pensar ou como vai se sentir quando
essa história explodir nas redes sociais. Posso telefonar para ele e explicar
que o estupro foi apenas uma armação contra o presidente, entretanto, vai
ser difícil de ele entender porque aceitei a proteção de outro homem que
não a sua. Ele é romântico e ciumento demais para compreender que estarei
mais segura fora do país e ao lado de um homem poderoso como Hudson.
Não vai acreditar que não estou tendo nada com ele.
— Eu aceito ir com você. E agradeço demais pela ajuda.
— Não precisa agradecer. — ele desce seu olhar pelo meu corpo e
compreendo que em algum momento, talvez depois que me considerar
recuperada do trauma de ter sido violentada, vai cobrar por sua
hospitalidade e será então que eu partirei de sua vida sem olhar para trás.
Cansada, física e emocionalmente, recosto a cabeça no espaldar do
assento e fechos os olhos. Repasso mentalmente todos os acontecimentos e
minha cabeça gira. Foi muita loucura armar toda essa cilada, fazer todo esse
escândalo, sem planejar nada antes, mas foi uma loucura que deu certo.
Dificilmente Lennon Rudolf conseguirá se reerguer depois dessa. E o mais
irônico é que foi ele próprio quem começou com tudo, foi ele quem me
arrastou para a dança, depois para o canto escuro do salão e mais tarde para
aquele vestiário no jardim.
Tento não pensar nesses momentos, mas são exatamente com eles que
minha cabeça se ocupa. Posso sentir novamente o toque das mãos daquele
homem em meu corpo, o sabor da sua boca devorando a minha, o quanto
foi perfeito estarmos juntos, tão entregues um ao outro. Pelo menos foi
perfeito para mim. Não é algo que esquecerei facilmente, mas vou me
esforçar para isto.
A chuva passa e através do vidro vejo a linha amarelada do sol nascendo
no horizonte, banhando as ruas de tijolos e os edifícios antigos de Bristol,
enquanto alguns moradores já saem das suas casas para trabalhar.
Hudson está bebendo vinho e novamente minha boca enche de água por
vontade de dar um gole, mas não vou me arriscar.
Está completamente claro quando adentramos o aeroporto da cidade, a
limusine em baixa velocidade. Assim que paramos ao lado de um avião de
pequeno porte, totalmente moderno, o qual desconfio ser o jato particular de
Hudson, jipes do exército, carregados de homens armados com
metralhadoras, começam a surgir de todos os lados, cercando-nos, como se
estivessem atocaiados apenas nos esperando.
— Merda! Ele mandou o exército atrás de nós! — Hudson fala,
estupefato. Clica no botão que abaixa o vidro que nos separa do motorista e
dá a ordem: — Dê a ré, vamos sair por onde entramos. Não pare! Não pare!
Analiso a situação e me dou conta do quão absurda e perigosa é. Se
Lennon mandou o exército é porque está disposto a tudo para me deter, até
a atirar em nós, não que seja grandes coisas atirar em mim, mas Hudson é o
líder de um grande país, atentar contra a vida dele significaria declarar
guerra a Flower Garden.
— Acho melhor a gente desistir. — falo, apavorada.
A adrenalina corre tão solta em minhas veias que meu coração está a
ponto de sair pela boca.
— De jeito nenhum. Quem esse idiota pensa que é? — Hudson retruca.
— O presidente desse país.
Por mais incrível que possa parecer, um tanque do exército atravessa a
frente da limusine, nos obrigando a parar, ao mesmo tempo em que dois
jipes nos cerca, um de cada lado, nos encurralando.
— Estamos cercados, senhor. Devemos atirar? — o segurança no banco
da frente pergunta e fico gelada dos pés à cabeça.
Atacar todo um exército com seis homens apenas seria o mesmo que
pedir para morrer.
— Hudson, por favor. — eu falo, encarando-o com olhos arregalados.
Ele hesita, reflete, observa a movimentação de homens armados e
veículos à nossa volta e então pragueja.
— Merda! Será que esse idiota é louco? Primeiro violenta uma mulher
depois manda o exército atrás dela. — gesticula para que o segurança tire a
mão da sua arma ainda dentro do seu paletó e se vira para mim. — Me
desculpe por isto. Se o enfrentarmos agora não apenas seremos mortos,
como também estarei declarando guerra contra todo o país, pois estamos no
território dele.
— Eu entendo. Esse sujeito é louco. — “Ou capaz de tudo para não
colocar seu precioso mandato em risco.”
Droga! Não quero nem imaginar o que vai acontecer quando Lennon
colocar suas garras furiosas em mim.
O cerco está fechado à nossa volta. Há jipes abertos carregando vários
homens armados, com o uniforme do exército atrás de nós, dos dois lados e
na frente há o tanque com o canhão apontado direto para nossas cabeças.
Nem o super homem conseguiria escapar de uma emboscada como esta.
— Como devemos proceder? — o segurança volta a perguntar.
— O que eles querem?
— Que deixemos os veículos com as mãos para cima.
— Então façam isso.
O homem passa a instrução para os colegas do Mercedes atrás de nós e
em seguida deixa a limusine, colocando as mãos para cima em rendição.
Hudson e eu permanecemos dentro do veículo, tensos, pelo menos eu
estou tensa, sobressaltada, ouvindo o que parece ser uma negociação entre
soldados e seguranças do lado de fora.
Os minutos se passam e eles continuam conversando, sem que eu
compreenda claramente o que estão dizendo, tamanho é meu nervosismo.
Quando menos espero, a porta da limusine é aberta de supetão e mãos
bruscas me puxam para fora, pelo braço, machucando-me.
É Lennon. Parece um animal selvagem com sua face contorcida de fúria,
os olhos expressando o brilho demoníaco de um ódio assustador. Ainda usa
a mesma camisa molhada que vestia quando o deixamos o palácio e tem os
cabelos emaranhados.
Ele me segura pelos ombros e me sacode violentamente.
— O que você tem na cabeça pra me acusar de algo que não fiz?! —
grita, furioso, seu rosto muito perto do meu. Estou com tanto medo que não
sobrou nenhuma gota de sangue na minha face. — Você por acaso é louca?
Acha mesmo que não tenho como provar que não fiz aquilo?
Hudson deixa o carro e avança para cima de Lennon, empurrando-o com
violência, gritando:
— Solta ela, seu covarde! Por que não enfrenta alguém do seu tamanho?
Todos os soldados apontam suas armas direto para a cabeça de Hudson,
esperando a ordem para atirar, mas Lennon é sensato, sabe que se houver
um disparo, várias vidas serão perdidas, pois os seguranças também estão
preparados. Então, ao seu sinal, todos abaixam as armas.
— Não se mete nessa história, cara. — Lennon fala. — A garota fica
comigo. Não fiz o que ela diz. Tudo foi consensual. Tenho câmeras em
todas as dependências do palácio que podem provar isto.
Hudson fita-me perplexo e só consigo me encolher, envergonhada.
Minha cabeça gira, meu estômago embrulha. Estou tão nervosa que só
quero fugir daquela situação e a única saída é um caminho ainda pior, é a
minha perdição dentro de mim mesma, a exteriorização do mal que existe
em mim. Não é necessário que eu chame por ele, as cenas se projetam
sozinhas em minha mente, desta vez com força total.
Posso ver claramente o papel de parede florido do quarto, não sei qual
quarto; estou na cama com dossel; a porta se abre, ouço passos não olho
para ver quem se aproxima.
— Mesmo que tenha sido consensual, se ela te acusou é porque algum
mal você fez a ela. — ouço a voz de Hudson partindo de muito distante,
como se eu não estivesse mais aqui.
— Isso não é da sua conta, ela é minha e faço o que quiser. Agora some
do meu país você e seus homens. Se houver um só disparo da parte deles, a
guerra está declarada. — Lennon fala, mas o ouço como se estivesse muito
longe de mim, embora saiba que está ao meu lado.
Minha mente me leva de volta ao quarto, tento lutar contra a escuridão
que se aproxima, mas é impossível, desta vez as imagens estão reais
demais. Tenho a impressão de que meus olhos são vendados, essa é uma
cena nova, depois disso sinto aquela mão áspera e nojenta em meu corpo,
como já senti antes, como sinto sempre que estou me perdendo dentro de
mim. Funciona como uma fuga da realidade na qual pareço estar inserida
naquele momento. Do quarto, passo para a chuva, um temporal, estou
encharcada e uma porta se abre à minha frente. Tento enxergar o que há
além dela, mas tudo se perde na negra escuridão que me engole e então não
há mais nada.
CAPÍTULO XIV
Lennon.
Eu nunca me senti tão furioso na minha vida. Como se não bastasse
aquela louca me acusar de algo que não fiz, Hudson insiste em querer tirá-la
de mim. Só por cima do meu cadáver ele a leva embora. Não que eu a
queria por perto, o problema é que preciso dela, primeiro para retirar a
maldita acusação que me fez, admitindo ao mundo que inventou tudo
aquilo, antes que minha imagem seja manchada a ponto de não haver mais
como reverter a situação.
Eu poderia simplesmente usar as gravações das câmeras que há no
jardim do palácio e no vestiário onde estivemos, para provar minha
inocência, mas isso jamais seria suficiente, visto que a população precisa
apenas de um boato, uma pequena fagulha de uma história para transformá-
la em um escândalo. Além do mais, levar aquelas imagens a público seria
expor demais a garota e embora ela mereça coisa pior que isso, não me
sinto encorajado a fazê-lo.
“Lennon, você está ficando muito sentimental.” Digo para mim mesmo e
é verdade. Em um passado não muito distante eu já estaria espalhando
aquelas imagens pelos quatro cantos do mundo e processando Lucy por
calúnia. Mas o fato é que olho para ela e não consigo odiá-la, o que vejo é
apenas uma menina muito jovem com uma aparência tão frágil que me
desperta um instinto de proteção que eu nem sabia que existia dentro de
mim. Eu não quero fazer-lhe mal, não quero e não consigo, embora ela
mereça.
Talvez isso seja influência do que aconteceu entre nós naquele vestiário,
foi realmente magnífico vê-la tendo três orgasmos seguidos para mim.
Foder aquela bocetinha apertada como a de uma virgem pode ter me afetado
mais do que seja capaz de admitir.
“Lennon, seu idiota, não fique sentimental por causa de uma mulher,
mesmo que essa mulher seja a mais gostosa que você já comeu.” Repito,
mentalmente, tentando convencer-me de que ela não é nada além de mais
uma transa sem importância, como tantas outras que já tive.
Eu realmente queria saber o que se passava na cabeça de Lucy quando
tramou todo esse escândalo e armou tudo muito depressa, durante os poucos
minutos em que a deixei dormindo para ir ao palácio em busca de um
guarda chuvas para levá-la de volta sem se molhar mais do que já estava. Só
pode ser louca, essa é a explicação mais plausível.
E agora está aí, toda apavorada, como se só então se desse conta de que
não é páreo para enfrentar-me. Quem ela pensa que é? A mulher biônica?
Nem um presidente corrupto e toda a sua corja de ladrões foi páreo para
mim.
O dia já clareou faz algum tempo, estamos parados no meio da pista do
aeroporto, com alguns soldados do exército muito bem armados à nossa
volta. Eu sei que a presença do exército nesse caso só tornará o escândalo
ainda maior, mas não encontrei outra alternativa de impedir aquele imbecil
do Hudson de triar Lucy do país. Apesar do que ela fez, apesar de toda a
fúria que me toma, imaginar aquele imbecil colocando as mãos nela me
parece pior que todo o resto. Deve ser meu orgulho se recusando a ser
ferido.
E ele é teimoso, quer tanto tirá-la de mim que continua discutindo
enquanto o tempo se passa. Talvez ele pense que vou machucá-la, não sabe
que sou incapaz de fazer mal a uma mulher principalmente àquela. Tudo o
que quero é que ela admitia que mentiu diante da maior quantidade de
câmeras possível e que me dê uma boa explicação para tanto ódio. O fato de
estar ao lado do JUD, lutando pelo país, está me convencendo menos que
nunca.
Hudson continua falando, teimando comigo, tentando me convencer de
que o melhor para Lucy é ir com ele, mas de súbito paro de ouvi-lo para
prestar atenção em Lucy, algo está acontecendo com ela. Seu rosto está
muito pálido, suas pupilas dilatadas, seu olhar perdido no vazio à sua frente,
seu corpo está todo trêmulo e nem é mais por medo de mim, como se
mostrou antes, visto que parece mal me enxergar. Não sei se é impressão
minha, ou se está em meio a uma crise nervosa.
De repente, seus olhos se fecham, ela parece perder o domínio sobre o
próprio corpo e as pernas lhe faltam. Lentamente, começa a desabar e corro
a tempo de não deixá-la cair no chão.
Em meus braços, Lucy permanece imóvel por um instante, como se
estivesse desfalecendo e então da um pulo, se afastando de supetão. Encara-
me diretamente no rosto, com seu olhar completamente mudado, mais
agressivo, selvagem, enquanto um sutil riso de deboche brinca em seus
lábios. Percorre os olhos à sua volta e posso jurar que não sabe onde está,
ou o que está acontecendo, parece confusa e então solta uma gargalhada
estrangulada, como se fosse realmente louca.
— O que é isso?! A guerra começou e ninguém me avisou?! — fala com
escárnio, soltando outra gargalhada sonora e não há ninguém ali que não
esteja perplexo ao observá-la.
Subitamente, sou tomado pela estranha sensação de que já vi aquela cena
antes. Puxo pela memória e quase paro de respirar quando as lembranças
vêm, atingindo-me com a força de um furacão.
Aquela noite em que bateu no meu carro, não foi a primeira vez que vi
Lucy. Eu tive essa impressão de que já a conhecia, mas depois da raiva que
senti ao descobrir que faz parte do JUD, deixei para lá e não busquei saber
de onde. Ela é filha de Jonathan Carter e estava lá naquela terrível noite em
que ele morreu. Agora me lembro claramente. Era uma noite chuvosa, com
estrondos de trovoadas e relâmpagos se fazendo em sucessão. Jonathan era
o tesoureiro de Avery Green, então presidente de Newhart e me fornecia
informações sobre as ilegalidades cometidas pelo governo do qual fazia
parte, porque queria um cargo mais alto e eu o daria assim que me tornasse
presidente.
Naquela noite, ele prometeu me dar alguns documentos que serviriam de
provas definitivas para evidenciar a rede de corrupção encabeçada por
Green e marcamos de nos encontrarmos na casa da amante dele, bem tarde
da noite, quando a mulher e os filhos estivessem dormindo. Conversamos
por algumas horas no escritório dele no primeiro andar da casa modesta,
recebi os documentos que me prometera, mas fiquei com a impressão de
que ainda me escondia algo, de que não tinha me dado tudo. Então, ao me
despedir, decidi me esconder na sala, atrás da cortina, esperar que ele
subisse para o segundo andar e eu pudesse ir em busca de mais provas nas
gavetas da sua mesa.
Eu estava lá, no escuro, atrás da cortina, espreitando, quando a porta da
sala se abriu e a garota entrou, não tinha mais que quinze anos, talvez
menos. Estava encharcada da chuva e andava na ponta dos pés como se
estivesse retornando de uma saída clandestina. Antes que ela alcançasse a
escada que a levaria ao andar de cima, seu pai deixou o escritório e a
surpreendeu. Ela ficou pálida por ser apanhada.
Esperei que ele a repreendesse, ou até lhe desse uma surra, mas o que ele
fez foi completamente inesperado.
— Então a gatinha do papai já está namorando por aí. — ele disse, muito
calmamente.
— Não, pai. Eu só saí com algumas amigas. Eu estava voltando quando
começou a chover, estava esperando passar, por isso demorei. — era doce e
delicada como a Lucy que conheço.
— Não minta pro papai, docinho. — ele sentou-se no sofá e a chamou
com um gesto de mão. A menina sentou-se ao seu lado e então ele a
segurou pelo braço e a puxou bruscamente, sentando-a em seu colo.
Ela ficou assustada, surpresa, mas nada fez para impedi-lo quando ele
enfiou a mão no decote da sua blusa.
— Se tem idade pra dar pra esses vagabundos que tem por aí, já pode dar
pra mim também. — ele disse.
Quando a ficha dela pareceu finalmente ter caído, tentou se desvencilhar
do velho, exasperada.
— Do que o senhor está falando? — disse, quase chorando.
— Você sabe, docinho, não se faça de desentendida.
— O que eu sei? — ele enfiou a mão debaixo da sua saia e ela lutou para
tirá-la de lá.
Senti a bile subir em meu estômago, quis correr em socorro da garota,
quis estrangular aquele maldito por fazer isso com a própria filha, mas fui
covarde e me recusei a me deixar ser visto.
— Sabe que tenho acariciado você. Você está sempre dormindo, mas
sabe que é o papai, não é docinho? E sei que você gosta tanto quanto eu,
porque se contorce toda quando passo a mão nessa pele gostosa e macia. —
o maldito continuou falando, enquanto a garota lutava cada vez mais
desesperada, chorando, na fracassada tentativa de se livrar dos braços dele.
— Eu não ia te comer ainda, estava esperando você se tornar mais velha,
mas se já está dando por aí acho que também tenho o direito, não é?
Ele a apalpava toda, sem que ela tivesse a mínima chance de defesa,
enquanto eu os observava do meu esconderijo, cada vez mais cego de fúria
daquele maldito.
— Por que está falando assim? Por que faz isso? O senhor é o meu pai!
— ela falou, entre um soluço e outro.
— Eu não sou seu pai de verdade. Sou só o cara que tirou sua mãe
daquela vida e, considerando que se não fosse por mim você já estaria do
mesmo jeito, acho que tenho direito de fazer de você minha putinha. — ele
lambeu sua orelha e ela se contorceu de nojo. — Melhor eu do que vários,
pensa bem.
— Me solta. Eu não quero fazer isso. Por favor. — ela suplicou e estive
muito perto de ir até lá.
Não sei que espécie de força era aquela que me segurava no lugar
mesmo estando diante de uma cena tão bizarra, podendo socorrer uma
menina tão novinha de ser violentada, eu não fazia nada. Acho que estava
esperando para ter certeza de que realmente aconteceria antes de interferir.
— Chega de conversa. — Jonathan gritou e jogou a menina sobre o sofá,
deitada, para em seguida pular sobre ela, imobilizando-a. — Quero esse
corpinho gostoso há tanto tempo que acho que vou gozar antes de conseguir
meter. Puta merda! Isso vai ser muito rápido.
— Não! — ela gritou e cravou suas unhas crescidas no rosto dele. Em
resposta ele desferiu-lhe uma bofetada estalada, para em seguida rasgar sua
blusa de cima à baixo.
Era hora de eu interferir, não podia permitir que uma coisa abominável
como aquilo acontecesse bem diante de mim sem que eu fizesse nada,
precisava salvar aquela menina mesmo que isso custasse meu objetivo de
destruir Green da presidência.
Respirei fundo, uma, duas, três vezes, preparando-me para atacar,
quando então ouvi uma gargalhada bizarra partindo da menina e tive a
impressão de que tudo não passava de uma brincadeira erótica entre ambos,
um aquecimento pré foda, uma fantasia, mesmo ela sendo muito novinha
para isto.
Continuei observando e vi uma garota completamente diferente da de
antes, embora estivesse no mesmo corpo, essa era selvagem, sensual,
agressiva e abraçava o pai com pernas e braços, se esfregando toda nele,
excitando-o ainda mais.
— Vem paizinho, me come agora, faz de mim sua putinha. — ela dizia e
gargalhava alto, de forma escandalosa, igualzinho acabou de fazer bem aqui
diante de mim.
O velho ficou ainda mais assanhado quando ela levantou sua saia e levou
as mãos ao zíper da calça dele, abrindo-o, segurando seu membro entre os
dedos.
— Levanta papai, deixa eu te fazer um boquete. — ela disse e ele se
levantou depressa, sentando-se no estofado.
— Eu sabia que você não ia me decepcionar, eu sempre soube. Você é
safadinha igual sua mãe. — ele disse.
Como não percebeu que ela mudou de repente? Como não viu que não
era mais a mesma pessoa? Eu que não a conhecia reconheci a mudança,
aquela menina tinha transtorno dissociativo de personalidade e assumiu
outra identidade bem ali, debaixo dele.
Ela levantou-se também. Tirou a calcinha e começou a dançar na frente
dele só com a saia curta, parecendo mais um striper experiente que uma
adolescente. Não parava de gargalhar e Jonathan parecia enfeitiçado com a
rede de sedução que ela armava.
— Espera um pouquinho papai. Tenho uma surpresa pra você. — ela
disse e acariciou o rosto dele antes de deixar a sala, indo para outro
cômodo, sem que aquele sorriso diabólico deixasse seus lábios nem por um
segundo.
Eu pressenti que ela estava armando algo, só não me passou pela cabeça
que voltaria da cozinha com uma faca afiada na mão. Se aproximou de
Jonathan por trás, sorrateiramente, segurou-lhe os cabelos, puxando sua
cabeça para trás e antes que ele se desse conta do que acontecia, levou a
lâmina da faca à sua garganta, tão depressa que não lhe deu tempo de reagir.
Foi nesse instante que pulei de trás da cortina, a fim de tentar impedi-la,
mas era tarde. A menina fixou seu olhar em meu rosto, sorriu ainda mais
diabolicamente e cortou a garganta do pai.
O olhar dele ficou subitamente surpreso, por me ver e por saber que seria
morto por uma adolescente, mas isso durou apenas uma fração de segundos,
logo a vida se esvaiu do seu corpo e seus olhos e fecharam.
Fiquei paralisado, observando a cena, chocado ao ver tanto sangue e uma
menina que era quase uma criança matar o pai a sangue frio e ainda por
cima sorrindo. Não que ele não merecesse, mas acho que ela foi longe.
— O que você fez? — indaguei, atônito.
Ela soltou uma gargalhada e depois passou a ponta da língua no sangue
na faca.
— Eu? — disse. — Eu não fiz nada. Um estranho alto, bonito, de olhos
azuis entrou na minha casa e cortou a garganta do meu pai. — ao completar
sua fala, jogou a faca aos meus pés e sorriu com deboche.
Estava tentando me acusar de um crime que cometeu. Caraca! Como eu
ia me safar dessa? Ninguém deixaria de acreditar na filha sofredora de um
político conhecido, para acreditar no cara que carregava provas contra um
governo do qual aquele homem fazia parte.
Passei a mão pelos cabelos, aflito, sem conseguir pensar racionalmente.
Havia muito sangue na sala, Jonathan continuava sentado no sofá, a vida se
esvaindo do seu corpo através do liquido quente que jorrava abundante de
sua garganta.
— Não faz essa cara. — a menina disse. — Você é tão gatinho pra ficar
assim e além do mais ele merecia esse destino. Onde já se viu um pai querer
transar com a própria filha? Aposto como a songa monga deixava ele passar
a mão nela todinha. Mas comigo o negócio é diferente. Eu posso até sair
por aí dando a boceta, porque ela é minha, mas vou dar só pra quem eu
quiser. Pra você eu daria, se tivesse te conhecido em outras circunstâncias.
É realmente uma pena.
Processei suas palavras e fiquei meio confuso. Eu já tinha percebido que
ela tem o transtorno, mas nunca ouvi falar de alguém que sabe que tem
dupla personalidade, como ela demonstrava saber.
— Songa monga? — perguntei, quase para mim mesmo.
— Sim, a outra que existe em mim. Olha só, o papo está bom, mas tem
uma noite lá fora me convidando à diversão. Como é seu nome mesmo?
— Não importa. — falei.
— Pois é, “não importa”, se eu fosse você começava a correr, porque
temos um homem com a garganta cortada aqui e outro que veio falar com
ele tarde da noite. Não que eu esteja te acusando de algo, mas a polícia pode
tirar conclusões.
Ela pegou suas roupas rasgadas do chão, jogou sobre seu corpo e saiu
novamente para a chuva, sorrindo e cantando como uma alucinada.
Continuei ali parado, sem saber o que fazer. Pensei em chamar a polícia,
mas quem ia acreditar em mim se eu dissesse que o cara foi morto pela filha
adolescente? O crime certamente recairia sobre mim, então apenas abri a
porta e deixei a casa.
No dia seguinte, apresentei as provas que destituíram Green do cargo de
presidente e mesmo sendo um dos suspeitos pelo assassinato de Jonathan,
porque a polícia desconfiou de que eu pudesse ter roubado aquelas provas,
poucos dias depois, por meio de votação da população, me tornei presidente
de Newhart.
Depois que me tornei o homem mais poderoso do país, o caso foi
arquivado e a morte de Jonathan foi declarada como suicídio, embora seja
muita idiotia acreditar que alguém cortaria a própria garganta com tanta
precisão.
Depois que me tornei presidente, cogitei várias vezes contar a verdade à
polícia, porque a palavra de um presidente não pode ser contestada, mas o
fato é que não tive coragem de condenar aquela menina a passar a vida
inteira na prisão. Isso seria no mínimo crueldade da minha parte depois de
todo o abuso que ela sofrera daquele maldito. Então apenas a esqueci,
jamais procurei saber o que aconteceu com ela, e agora a tenho aqui diante
de mim e nem posso dizer que foi o destino que a trouxe, porque não
acredito em destino.
Não posso acreditar que Robert deixou passar uma informação tão
importante enquanto a investigava, tenho certeza de que investigou por alto,
com pressa e nem posso culpá-lo, pois fui eu quem o apressou.
Agora compreendo o motivo de tanto ódio de Lucy por mim, ela acredita
que sou o assassino de seu pai. Pelo pouco que sei sobre distúrbio
dissociativo de personalidade, um alter ego desconhece os atos e
pensamentos do outro, Lucy não sabe que foi ela mesma a cometer aquele
assassinato, há oito anos atrás, como também não sabe que o pai a
molestava, pois de acordo com o que ele deu a atender, pouco antes de ser
morto, costumava passar a mão nela durante sono.
Agora tudo fica claro como a luz do dia. Na época eu fui o único
suspeito do assassinato dele e como o caso jamais foi resolvido, Lucy acha
que fui eu.
Puta merda! Como ela conseguiu conviver comigo durante todos esses
dias, acreditando que tirei a vida do único pai que conheceu? De um
homem que amava, a quem desconhecia ser um estuprador. Agora posso
entender o motivo de tanto ódio.
Preciso trazê-la de volta e lhe explicar a verdade, não vai se fácil para ela
saber que matou aquele homem, mas pode entender quando souber o que
ele lhe fazia enquanto ela dormia e o que tentou fazer naquela noite. O
trauma deve ter bloqueado cada lembrança sua, ou não nutriria um desafeto
tão grande por mim.
CAPÍTULO XV
Lucy, ou seja lá quem ela for agora, caminha de uma lado para o outro
como um animal enjaulado, buscando passagem por entre os soldados. De
quando em quando, me olha de soslaio, com agressividade, como se me
acusasse por não deixá-la sair daqui.
— Você é filha de Jonathan Carter, não é? — indago, a fim de descobrir
até onde ela sabe sobre si mesma, sobre aquela noite.
Consigo capturar sua total atenção com a minha indagação, como
também consigo a de Hudson, que praticamente para de respirar enquanto
espera pela resposta dela.
Lucy para, fixa seu olhar agressivo em meu rosto e se aproxima.
— Eu sabia que te conhecia de algum lugar quando te vi na noite em que
bati em seu carro. — um sorriso debochado brinca em seus lábios. — Era
você quem estava lá quando matei o meu paizinho tarado. — diz, com uma
naturalidade assustadora.
— Como é? — Hudson quase se engasga com as próprias palavras e me
arrependo por ter tocado no assunto na frente dele. Droga! — Vocês estão
falando do antigo tesoureiro de Avery Green?
— Ele mesmo. É o que acontece quando um velho lambão tenta comer a
própria filha à força. — ela diz e solta aquela gargalhada bizarra que a faz
parecer uma pessoa capaz de qualquer coisa.
— Você é filha dele e o ma...
— Já chega desse assunto. — eu o interrompo no meio da frase. — Por
que você não entra na porra do seu avião e vai embora da porra do meu
país?
Lucy gargalha tanto que chega a convulsionar.
— Cara gostei de você. — diz. — Me lembro da última vez que nos
vimos. Eu queria tanto dar pra você, mas você ficou com penhinha e agora
perdeu a oportunidade de ter a foda da sua vida, porque se a anta ainda está
por perto significa que você vai me odiar. — gargalha novamente,
parecendo uma louca.
— Do que ela está falando? Quem é a anta? — Hudson indaga, quase
para si mesmo, tentando compreender.
— Não está vendo que ela mudou? Apenas o corpo é o mesmo.
— Mudei para uma versão melhor. — fala e sorri. — Com quem eu
tenho que me deitar pra conseguir sair daqui, héim?
— Você vem comigo. — gesticulo para ela e depois para Hudson. — E
você vai embora daqui.
— Mandão pra cacete você héim cara. — Lucy retruca, com sarcasmo.
— Eu não vou a lugar nenhum com você. Tenho uma vida pra viver e não
vou desperdiçá-la andando com quem aquela songa monga anda.
Adeuzinho.
Ela me dá as costas, tenta passar pelos soldados, mas ao meu sinal eles
formam uma barreira humana na sua frente, impedindo-a de seguir adiante.
— Aff! Mais um pra tentar me prender. Onde aquela garota arranja tanto
mala sem alça? — Vai na direção de Hudson, se movendo com sensualidade
dentro do paletó dele e sinto meu sangue ferver de raiva. — E você
gostosão, pode me tirar daqui? — apoia as costas no peito dele e começa a
se esfregar em seu corpo, o que atiça ainda mais a fúria dentro de mim. —
Prometo que você não vai se arrepender.
— Bem que eu queria, mas ele é o presidente do país. Não posso fazer
nada agora, o que não significa que não possa fazer depois.
Só faltou ele dar seu telefone a ela e marcarem um encontro romântico.
— Chega de conversa. Tivemos uma noite longa e preciso descansar. —
seguro-a pelo pulso e a puxo por entre os soldados, direto para a limusine
que me espera perto da entrada do aeroporto.
— Essa estória não acabou ainda, Rudolf. — Hudson grita atrás de mim,
mas sabe que não pode fazer nada, se me confrontar em meu território,
estará declarando guerra a toda Newhart.
Como se tivesse vindo ao mundo com o propósito único de me
enfurecer, aquela garota, que ainda há pouco era séria, meiga e recatada, se
joga para cima de todos os soldados por quem passamos, se comportando
como uma verdadeira puta profissional.
A empurro para dentro do veículo e ordeno ao motorista que nos leve de
volta para o palácio.
Sentada no banco acolchoado diante de mim, ela me olha de baixo para
cima, com aquela expressão carregada de agressividade e malícia. É a
mesma garota que bateu em meu carro na noite em que a levei para o
palácio, agora entendo porque estava tão mudada quando a reencontrei no
dia seguinte.
— Me dá um cigarro? — ela fala e tenho a impressão de que está
tramando algo contra mim.
Pode ser uma impressão causada pelas lembranças que tenho dela
matando o pai.
— Claro. — dou a ela um cigarro e o acendo. Ela da uma grande
tragada, seu rosto se contorcendo de prazer.
Em seguida, abre as pernas bem na minha frente, exibindo o pequeno
pedaço da calcinha que tirei do seu corpo há poucas horas, que oculta seu
sexo. Imediatamente fico de pau duro, não penas pela visão, mas pela
lembrança do que aconteceu entre nós e sei que estou seguindo por um
caminho perigoso.
— Gosta de olhar? — ela indaga e solta uma de suas gargalhadas
bizarras.
— E de comer também. — respondo. — Aliás comi tanto essa boceta
hoje que aposto como você está dolorida aí em baixo.
— Bastardo! — fala e fecha as pernas emburrada.
— Qual o seu problema comigo? Na última vez que nos vimos você
estava bem mais receptiva. Aliás estava receptiva até demais.
— Acontece que aquela songa monga te estragou. Se ela anda com você,
você não serve mais pra mim, o que é realmente uma pena. — ela gesticula
para o frigobar. — Tem alguma coisa pra beber nessa porcaria?
— Se falar com educação, eu posso verificar se tem.
— Por favor, senhor namoradinho da songa monga, pode me dar alguma
coisa pra beber? — seu tom é irônico.
Sirvo-a de uma dose de uísque e a mim de outra, pensando no quanto
essa situação é estranha. Lucy não fuma, não bebe e é muito comportada,
em contrapartida aquela louca age exatamente ao contrário. O que será que
a deixou assim? Terá sido o trauma causado pelo abuso que sofreu do seu
pai durante a infância? Será que existem mais personalidades dentro dela ou
só duas? Isso tem cura?
— Me explica como funciona esse lance de dupla personalidade. — falo.
— Muito simples. Eu tenho sede de viver e existe uma songa monga que
se apropria do meu corpo e não me deixa fazer nada. — ela bebe um gole
grande do uísque.
— Como você sabe que ela existe? Como você pode ter certeza de que
ela não é a verdadeira e você apenas alguém que ela criou para fugir do pai
estuprador?
— Criou para fugir e acabou matando! — ela fala e solta uma sonora
gargalhada, como se tudo não passasse de uma brincadeira.
— Acho que é isso. Você é o dispositivo de fuga que Lucy criou para se
livrar dele. Aquela noite em que o matou, foi a primeira vez que você
surgiu?
— Eu não tenho que responder suas perguntas. O que você é, mais um
psiquiatra tentando se livrar de mim?
— Não sou psiquiatra e embora Lucy esteja em dívida comigo, e em
uma dívida imensa, não quero me livrar de você.
Porra! O que estou dizendo? Mas é claro que preciso me livrar dessa
peste. Imagina ela perto da minha mãe? Minha velha ia ficar escandalizada.
Além do mais, preciso que Lucy retire a acusação que fez contra mim, que
se explique e muito bem explicada diante do maior número de câmeras
possível, pois a louca à minha frente jamais faria isso, parece ser tão
maligna e maldosa que aposto como é capaz de piorar ainda mais a
situação, inventar mais mentiras, porque agora me considera seu inimigo,
pelo simples fato de que acha que sou amigo de Lucy.
Eu poderia usar as imagens daquelas câmeras para provar minha
inocência, mas não exporia Lucy a tal ponto. Talvez pudesse mostrá-las
discretamente a um promotor, ou um juiz que me inocentassem, mas... Não,
eu não poderia fazer isso.
E não é apenas porque aquela menina parece estar me tornando um
babaca sentimental, mas também porque a população não me pouparia se
restasse a mínima incerteza de que o estupro aconteceu, portanto, preciso
que ela negue tudo e se explique para limpar minha imagem.
— Em dívida como? Por acaso ela roubou seu ursinho de pelúcia? —
ela indaga e sorri alto, para em seguida deitar-se no assento e pendurar as
pernas para cima, deixando que o paletó e os trapos do vestido molhado
subam até a altura da sua cintura, deixando o ventre achatado e as pernas
bem torneadas à mostra.
Puta merda! Se acha que sou seu inimigo por que fica me provocando
dessa maneira? Desse jeito não vou aguentar, meu pau está tão duro que
minhas bolas começam a doer.
Bebo um gole grande da bebida e respiro fundo, me esforçando para
controlar o meu tesão.
— Não. Na verdade ela transou comigo e depois disse, na frente de
vários líderes mundiais, que eu a violentei. E, considerando que sou o
presidente desse país, isso pode destruir a minha carreira.
Depois de me ouvir, a garota cai em uma crise de riso. Gargalha tanto
que todo o seu corpo sacode dentro do paletó grande demais para si.
— É sério que ela fez isso? Não consigo acreditar. — continua sorrindo
sem parar. Espantosamente, parece não dar importância ao fato de eu ter
dito que sou presidente. Espantosamente porque as pessoas dão importância
demais a alguém em uma posição de poder tão alta. — Não sei o que é mais
engraçado, ela ter traído o sonso do namorado ou ter inventado essa de
estupro.
— Então você conhece o namorado dela? — é muito estranho falar com
Lucy como se ela fosse outra pessoa, mais estranho ainda falar dela com ela
mesma. Daqui a pouco minha cabeça vai dar um nó.
— Claro. Ele vive me perseguindo é o corno mais consciente que existe
na face da terra. Só falto transar com os outros homens na frente dele e
mesmo assim ele não deixa a songa. Aliás era o carro dele que eu dirigia
quando bati no seu. — ela esvazia o copo com um último gole e me entrega,
pedindo mais.
A sirvo novamente e a observo beber com tanto prazer que sinto pena
por não poder usufruir de tais prazeres da vida em tempo integral.
— E por que você foge. Não gosta do cara também?
— Ahg! Claro que não. Ele me dá nojo. É um panaca e me persegue.
Tenta me manter presa, me impedir de viver, exatamente como você está
fazendo. Aliás, pra onde está me levando mesmo?
— Para o palácio de Chambers. Residência oficial do presidente.
— Para de ficar repetindo que é presidente como se isso fosse me
impressionar, porque não impressiona nem um pouco. — ela esbraveja. —
E por acaso pretende me manter em cárcere privado nesse maldito palácio?
— Sim. Até a Lucy voltar a desfazer a merda que fez.
— Ela pode passar dias sem aparecer, principalmente se não estiver
confortável com a situação e considerando que te acusou de estupro é
porque teve motivos para isto, portanto duvido que fique confortável na sua
companhia.
— Ela acha que matei o pai dela. Não sabe que era abusada por ele.
A louca escancara um sorriso.
— É sério isso?
— Estou deduzindo que sim. E preciso contar-lhe a verdade.
— Oh, coitadinha. Ela vai se odiar. — Solta uma gargalhada debochada.
— Tenho certeza que sim.
— Só tem uma coisa que ainda não entendi. Se ela acha que você matou
o tarado e que ele era um pai bonzinho, o que estava fazendo na porra do
seu palácio?
— Tentando se vingar. — dou de ombros.
— E mesmo assim vocês ficaram juntos. Depois eu que sou a louca. —
solta outra gargalhada.
Passamos por um grupo de jovens que parecem ter passado a noite na
rua bebendo e agora se reúnem em uma farra sob as sombras das árvores de
uma pracinha. São pessoas mal encaradas, tatuadas, rodeadas por
motocicletas. Lucy os observa e parece sair de si, esmurra o vidro da janela,
se agita e grita como uma desesperada, doida para se juntar a eles.
— Isso não adianta, o vidro é a prova de som.
— Me deixa ir cara, eu tenho uma vida e quero vivê-la. Quando a songa
voltar você a procura pra ela remediar o que fez. Eu não sirvo de nada pra
você.
— Talvez você possa se passar por ela e desmentir tudo na frente das
câmeras, o que acha?
Parece que consegui capturar sua total atenção. Ela se senta ereta e me
encara no rosto.
— E o que eu ganho se fizer isso?
— O que você quer?
— Liberdade. Quero viver minha vida sem ninguém me perseguindo,
nem você e nem o Kevin.
Deixá-la ir seria o mais sensato a fazer, afinal depois de desmentir toda
aquela armação não precisarei mais dela. Entretanto, deixá-la partir assim
como está, correndo o risco de encontrar todo tipo de gente pelo caminho,
de se meter em diversas enrascadas, sozinha, sem proteção alguma, parece
algo tão difícil que está quase fora do meu alcance.
Tento me convencer de que essa dificuldade em dar a liberdade que ela
quer se trata da necessidade em tê-la perto da minha mãe, mas sei que não é
isso. Aliás, uma coisa é certa: não posso deixá-la sozinha com minha velha
em hipótese alguma.
Além do que, Lucy precisa e merece ouvir a verdade sobre a morte do
seu pai e este é mais um pretexto que arranjo para mantê-la por perto. Não
sei o que vou inventar depois.
— Não posso deixar você sair por aí desse jeito, correndo o risco de se
machucar. Peça outra coisa. Dinheiro, imóveis.
— De que serve a porra do seu dinheiro se eu não puder gastar como
quiser?
— Peça qualquer coisa, menos que eu me responsabilize pelo que pode
acontecer a Lucy.
— Hipócrita! Diz que ela é sua inimiga, mas gosta dela. Vocês homens
me dão nojo. — ela coloca-se em pé, inclinada devido ao teto baixo, e
começa a caminhar de um lado para o outro no pequeno espaço entre os
dois estofados da limusine, não com impaciência, está simulando o
equilíbrio sobre uma corda bamba, como uma criança fazendo arte. — Cara
se eu fosse você tomava cuidado comigo. Você me viu cortando a garganta
de um homem. Sou capaz de inventar acusações bem piores contra você
sobre esse estupro. Pensa bem. Você não vai me querer por perto.
— Eu tenho provas de que não a violentei. Há câmeras por toda parte no
palácio. Tenho as imagens atestando que foi tudo consensual.
— É mesmo?! — ela gargalha com deboche. — Então porque precisa
que eu desminta tudo?
— Porque a mídia se baseia mais no que as pessoas dizem que em
imagens.
— Sério? Então torça para que eu não cruze com uma pessoa da mídia
por aí enquanto você me mantiver presa.
— Eu não vou te manter presa. Só estou zelando pelo seu bem estar.
— Sei. E isso não tem nada a ver com esse monte aí na sua calça.
— Eu nunca escondi o quanto te quero, Lucy.
— Não me chama de Lucy. Meu nome é Samantha.
— Por pouco tempo.
— Isso é o que vamos ver.
Ela se deita novamente, as roupas levantadas, os quadris de fora, a
calcinha apertada revelando os contornos do seu sexo pequeno e meu pau
lateja dentro da calça.
— Por que todo mundo se afeiçoa a uma criatura tão sem sal como
Lucy?
— Eu não disse que me afeiçoei a ela, é só tesão. Isso passa depois de
um tempo.
— Se fosse só tesão você já teria exibido as imagens fodendo com ela
pra se inocentar.
— Na verdade, preciso dela também por causa da minha mãe doente. Ela
sim se afeiçoou a Lucy, porque acredita ser minha irmã desaparecida.
— Esse assunto não me interessa. — encara-me com uma expressão
quase diabólica nos olhos azuis. — Só um conselho: não me deixa perto da
sua mãe não, tá? Eu não sou a Lucy.
Aquilo soa como uma ameaça e cogito seriamente mandar a limusine
parar para que ela desça, mas algo dentro de mim não permite, na certa esse
maldito tesão irrefreável que sinto por essa garota e me faz pensar apenas
com a cabeça de baixo.
Fico espantado ao ver a multidão que se forma diante do palácio quando
nos aproximamos, estão do lado de fora dos muros altos que são guardados
pelos seguranças. Em hipótese alguma poderão me alcançar, o que é um
alívio, pois parecem furiosos.
Trata-se de uma manifestação contra mim por causa da acusação de
estupro feita por Lucy, sei disso porque eles carregam cartazes com minha
foto e a palavra ESTUPRADOR logo abaixo. Não é nada que eu já não
esperasse, só estou espantado com o quanto a repercussão aconteceu
depressa, não faz nem cinco horas que Lucy me acusou e o circo já está
armado. Na certa alguém que estava dentro do palácio naquele momento
filmou todo o escândalo e publicou na internet, o que não é de estranhar,
visto que em todos os lugares há sempre alguém disposto a prejudicar
alguém.
Tenho certeza de que essa manifestação ainda é só o começo. A
população não perdoa um político quando ele comete qualquer deslize,
quando comete um crime tão hediondo então, o qual acreditam que cometi,
exigem sua cabeça e vão exigir a minha.
Merda! Maldita hora que Lucy foi fazer isso comigo, espero que se
arrependa quando souber que sou inocente do crime que me acusa e que
sofra quando descobrir que foi ela a matar o próprio pai.
Só que ficar me lamentando, não vai me ajudar em nada. Eu preciso
pensar com clareza e tomar decisões importantes sobre este caso, descobrir
uma forma de provar minha inocência sem precisar expô-la, o que não será
muito fácil se ela continuar transformada nessa porra louca.
CAPÍTULO XVI
— Olha! É o nojento do Kevin! — Lucy, ou Samantha, não sei como
chamá-la, fala e gargalha como um histérica, agindo como se tudo fosse
uma grande brincadeira.
Ela está apontando para um dos manifestantes, um sujeito magrelo,
muito jovem, integrante do JUD, que se encontra entre em meio às outras
pessoas, se agitando e gritando, parecendo o mais furioso entre todos.
Inclusive parece incitar a multidão a atirar pedras na limusine enquanto
atravessamos os portões de entrada do palácio.
— Ele deve ta puto porque acha que você pegou a songa de jeito.
— Ele que se foda. — rebato e ela sorri.
Ao alcançarmos a segurança da garagem do palácio, de onde não
podemos mais ser vistos pelos manifestantes, saltamos e caminhamos
depressa para a entrada, com cerca de uma dúzia de seguranças nos
rodeando, inclusive Donald, que chefia os demais.
Para que a louca me siga, preciso puxá-lá pelo pulso, enquanto ela se
debate tentando se libertar.
— Você por acaso ficou louco cara? — Donald fala, exasperado. — Por
que ainda trouxe essa garota aqui? E por que está puxando ela à força?
— Porque ela precisa desmentir o que disse.
— Ela não precisa desmentir nada. Você tem imagens que provam que
foi tudo consensual. Eu assisti tudo. Mostre ao promotor e ela não terá mais
como mentir.
Viro-me para ele tão furioso que preciso me segurar para não lhe dar um
murro na cara. De onde ele tirou que tinha o direito de assistir aquelas
malditas imagens? Elas são íntimas, mostram a porra da minha intimidade.
— Eu não te autorizei a assistir porra nenhuma! — praticamente grito.
Ele me encara espantado.
— Eu só estava tentando provar sua inocência.
— Quem mais assistiu?
— Ninguém. Só eu.
— Então não mostre a mais ninguém. E isso está encerrado.
— Você é que sabe, cara, mas acho que está jogando sua carreira política
na lama.
— Eu não perguntei o que você acha.
Porra! Donald não merece aquilo, pois sempre foi um amigo leal, mas
estou de cabeça quente demais agora para qualquer tipo de conversa.
Samantha por fim desiste de libertar seu pulso da minha mão e caminha
depressa ao meu lado enquanto avançamos pelo palácio.
Os convidados já foram todos embora, só restaram os empregados que
circulam por toda a parte limpando a sujeira deixada pela festa.
Tomo o cuidado de não passar com ela pela sala da lareira, onde minha
mãe pode estar, embora ainda seja muito cedo para que esteja acordada e
subimos direto para o quarto de Lucy. Ao entramos, tranco a porta e enfio a
chave no bolso, depois sento-me na beirada da cama e afundo o rosto entre
as mãos, me perguntando quando foi que perdi o controle a ponto de deixar
as coisas chegarem aonde estão.
Preciso convencer aquela doida a falar a verdade, preciso consertar toda
essa situação, mas antes de mais nada, preciso ir ver como está minha mãe.
— Você fica aqui. Não tente sair porque a porta e as janelas estão
trancadas, não grite porque ninguém vai te ouvir, e mesmo que ouvirem,
darei ordens para que não venham te ajudar. Fui claro?
— Nossa, que mandão. — ela percorre os olhos em volta. — Esse é o
quarto onde a songa dorme?
— Sim. É o quarto de Lucy. Tem roupas secas no armário, troque o
vestido molhado, se quiser.
— Como se fosse possível encontrar alguma coisa que preste para vestir
no meio das roupas daquela sonsa.
— Não me interessa se presta pra você ou não, apenas troque a porra das
suas roupas e pare de reclamar! — esbravejo, nervoso com a toda a
situação. — Tenho que ir resolver as coisas, mas daqui pouco venho te
trazer o que comer. Enquanto isso descanse, você está precisando.
— Nem pense que vai encontrar Lucy no meu lugar quando voltar! —
ela também é firme e não repondo àquilo, afinal eu nem tinha cogitado essa
possibilidade, minha cabeça está tão cheia e me sinto tão cansado que
sequer consigo pensar direito.
Sem dizer mais nada, deixo o quarto, tomando o cuidado de trancar a
porta por fora e parto pelo palácio a procura de Diana. A encontro no
terraço dos fundos, dando mingau de aveia na boca de Ruth, que parece
uma morta vida, sentada em sua cadeira de rodas, com o rosto muito pálido,
o olhar fixo no vazio à sua frente, em estado catatônico, do jeito que a vi
nos últimos dois anos e meu peito se enche de angústia.
— Ela teve outra crise nervosa? — pergunto, com o coração pesado.
— Não. Está assim desde que acordou. Não disse uma só palavra. Nem
perguntou pela garota.
— Ela ficou sabendo sobre o escândalo de ontem?
— Não. Já estava dormindo há horas quando aconteceu e ninguém além
de mim chegou perto dela desde então. Parece que ela está adivinhando que
alguma coisa ruim aconteceu.
Aproximo-me mais dela, agacho-me diante de si, chamo-a, mas ela
parece não me enxergar, parece estar em outra dimensão.
E agora, o que faço? Deixou a louca chegar peto dela? Não, isso seria
pior. Aquela garota é maligna e é capaz de qualquer coisa.
Me sentindo totalmente impotente diante da situação, deixo-as e sou
avisado por um funcionário de que pessoas me esperam em meu escritório.
Ao me dirigir para lá, outro funcionário me aparece com um buquê se flores
nas mãos, afirmando que são para a Srta. Anderson. Olho no bilhete que há
dentro do arranjo e descubro que são de Hudson, o maldito ainda não
deixou o país. Mas que bastardo! Está rondando Lucy! Só que não vou
deixar que chegue perto, por enquanto ela ainda é minha, depois que
resolver as coisa, ou quando me cansar dela, ele pode fazer o que quiser.
Pego as flores e as destroço entre minhas mãos.
Encontro o escritório abarrotado de deputados e senadores, estão todos
alarmados pelo escândalo, afinal isso afeta a todos nós. Me cobram uma
solução, me pressionam, me dizem o quanto estarei arruinado se não
conseguir provar ao mundo que não violentei aquela menina. De acordo
com eles, a situação está muito pior do que se possa imaginar, já há
inclusive alguns países da Europa ameaçando cortar relações com Newhart.
Se eu chegar a ir a julgamento por este caso, corro o risco de ir parar na
cadeia. Só espero que as coisas não cheguem tão longe.
Estou tão cansado, de cabeça cheia, que não consigo ficar ali por muito
tempo. Aliás sequer estou vestido descentemente para uma reunião tão
importante, ainda uso a camisa sem paletó que já secou em meu corpo.
A única forma que vejo de mudar o quadro lastimável em que as coisas
se encontram é convencendo a doida a desmentir tudo, mas como? A garota
mais parece uma sádica.
Vou até a cozinha em busca de algo para ela comer enquanto penso
nisso. Automaticamente, preparo uma bandeja com tudo o que vou
encontrando pela frente na geladeira, ignorando o olhar abismado das
empregadas e subo as escadas, ainda pensando no assunto até chegar à
conclusão de que não há outra forma de fazê-la falar que não dando o que
ela mais quer: sua liberdade, desde que eu esteja por perto.
Sinto o sangue fugir da minha face quando entro no quarto e não a vejo
em parte alguma. Será que conseguiu fugir? Como? Deixo a bandeja sobre
uma escrivaninha e corro para a janela, constatando que continua trancada.
Então a ouço entoando uma melodia dançante da direção do banheiro e,
sem conseguir me segurar no lugar, vou até lá.
A encontro imersa na banheira, com a espuma cobrindo-lhe o corpo até a
altura do colo, apenas os ombros de fora. Está tomando champanhe e
fumando um cigarro.
É inevitável e me imagino dentro da banheira com ela.
— Se é para ficar presa, que seja com estilo. — ela diz e solta uma
gargalhada. — Gostei da banheira e do champanhe. O que mais de bom tem
pra se fazer por aqui?
— Isso depende do que você considera bom.
Ela lança a cabeça para trás e respira fundo.
— Deixe-me ver. O bom da vida é curtir a aventura, sabe? Dançar em
uma boate lotada de motoqueiros selvagens, beber até cair, pular de
paraquedas, correr nua na praia sentindo a brisa batendo em seu corpo. Você
já experimentou essas coisas?
— Bom, acho que eu não ia gostar muito dos motoqueiros selvagens,
mas o resto se pode pensar.
Ela sorri alto. Depois me encara séria, com aquela agressividade meio
louca em seu olhar.
— E aí, quando vai me deixar sair?
— Na verdade, tenho uma proposta a te fazer.
— Então faça.
Vou até o quarto, pego uma cadeira e sento-me à cavaleiro, de frente para
o espaldar, bem diante dela. Acendo um cigarro e dou uma grande tragada
antes de falar:
— Eu te deixo sair daqui, mas com duas condições.
— Hum, quais?
— Você fica bem calminha, finge ser normal...
— Ei, cara! Eu sou normal, vocês todos é que são caretas demais. — ela
me interrompe para dizer.
— Ok, corrigindo: finge ser a Lucy e dá uma declaração à imprensa
desmentindo a acusação de que a violentei. Diga que estava bêbada e não
via o que fazia, que foi tudo consensual e me peça desculpas diante das
câmeras.
— Só farei isso se tiver certeza de que você realmente não violentou a
songa monga.
— Você pode ver as imagens das câmeras que ficam por toda parte. Está
tudo gravado.
— Certo, vou querer ver. E qual a outra condição?
— Que eu vá com você. — ela gargalha com deboche.
— Nem pensar. Isso não seria liberdade e sim liberdade vigiada.
— Pensa bem. Eu posso te levar pra qualquer lugar do mundo que você
queira ir, posso pagar por qualquer aventura que você sequer sonhou, posso
até te levar pro espaço, se você quiser, mas desde que eu esteja junto.
Ela processa minhas palavras, reflete por um instante e sorri.
— Está tentando me comprar?
— Sim. Por quê? Estou conseguindo?
— Mais ou menos. E se eu concordar, você vai aceitar ficar olhando
enquanto eu trepo com outros homens? — ela bebe um grande gole de
champanhe antes de continuar. — Porque se você ainda não sabe, eu não
me relaciono com os mesmos homens que Lucy, mesmo que esse homem
seja um gato como você. Absolutamente nada vai acontecer entre nós.
— Estou de acordo. Você pode ficar com quem quiser, pois não tenho
nada com você e nem com Lucy. O que aconteceu entre mim e ela foi
apenas uma transa e nada mais. Estaremos juntos na aventura, mas seremos
livres para nos relacionarmos com outras pessoas. Tanto eu quanto você.
— Se você não quer nada comigo, porque não me deixa ir sozinha?
— Porque eu preciso de Lucy. Quer dizer, minha mãe precisa. Quando
ela voltar, esclarecerei as coisas entre nós e a trarei para o palácio.
— E se ela não voltar?
— Esse é um risco que tenho que correr. Você não acha que a vida fica
mais excitante quando corremos riscos?
— Acho. — ela sorri e esvazia a taça de champanhe. — Sabe cara, até
que você não é tão ruim. Aceito sua proposta, mas com duas condições.
— Pode falar.
— Mesmo que Lucy volte ao meu corpo, você vai continuar me devendo
tudo o que está prometendo, de modo que quando eu retornar, porque eu
sempre retorno, vou ter o direito de te procurar para cobrar essa dívida.
— Fechado. Qual a outra condição?
— Quero ver as tais imagens de vocês dois.
— Sem problemas. Vou pedir que o meu segurança traga.
— Me passa a toalha? — dou a toalha a ela e quando espero que esconda
sua nudez, ela enrola a peça nos cabelos molhados e deixa a banheira,
completamente nua, o corpo escultural, delicioso, coberto por pedaços de
espuma que deslizam pela sua pele molhada.
Ao sair do banheiro, ela passa bem perto de mim, quase roçando seu
corpo no meu e chego muito perto de perder o controle, de agarrá-la, jogá-la
contra a parede e fazê-la minha mais uma vez.
Eu não sei qual o seu objetivo em me provocar desta forma, mas se for
me deixar louco, está dando certo.
Quando a encontro no quarto, já está vestida em um roupão, sentada a
mesa, comendo o café da manhã que lhe trouxe. Telefono para que Donald
traga o disco com as imagens e quando abro a porta para receber o pequeno
CD das suas mãos ele lança um olhar furioso na direção de Samantha e
depois me encara com condenação, na certa me julgando por acreditar que
estou jogando a presidência fora por causa de uma mulher. Na verdade acho
que todos os membros do governo estão pensando isso agora. Mas que se
fodam eles, a vida é minha e faço o que bem quiser. Além do mais não
estou com Lucy de forma alguma, quero apenas a confissão dela sobre
minha inocência.
— Você ta com cara de quem não comeu nada hoje. — a maluca fala,
apontando para a cadeira do outro lado da mesa. Está sentada como uma
trombadinha, com um pé pendurado na cadeira, a outra perna estirada.
Parece não ter a mínima noção de etiqueta, mas ainda assim consegue ser
tão linda que é difícil olhar para outra direção que não para ela. — Senta aí.
Come comigo. Tem muita coisa aqui.
É como a bruxa má oferecendo a maçã envenenada. Acho que por causa
do seu comportamento histérico, daquele olhar agressivo, aquela menina
não me parece nem um pouco confiável, porém, fui eu quem preparou a
bandeja, ela não teve tempo de envenenar nada. Então, aceito o convite e
sento-me diante dela para me servir de um sanduíche frio de filé de frango e
apenas ao morder o primeiro pedaço me dou conta do quanto estava
faminto.
— Você ta horrível se comparado a ultima vez que te vi. — ela fala e é
verdade, ainda uso a camisa amarrotada que secou em meu corpo, minha
calça ainda está molhada, meus cabelos parecem revoltados.
— É que tive uma noite longa sendo acusado de estuprador por uma
garota.
Ela gargalha como sempre faz.
— A songa não é uma revolucionária que luta contra o governo? Ela só
estava cumprindo a função dela. Bobo foi você que a deixou entrar aqui.
— Eu não sabia que você a defende.
— E não defendo, só estou sendo realista.
— Minha mãe teve uma grande melhora quando a viu. Foi só por isso
que a deixei ficar.
— Ela também concordou em se tornar sua amante pra conseguir se
infiltrar? — ela tem que sorrir a cada frase pronunciada. Impressionante.
— Não. Apenas aceitou cuidar da minha mãe.
— E o que sua mãe tem?
— Caiu em depressão desde o desparecimento da minha irmã há cinco
anos. Não falava e nem andava há dois anos.
— E como sua irmã desapareceu?
— Ninguém sabe. Sumiu sem mais nem menos.
Ela me observa em silêncio por um instante, seus olhos sagazes me
sondando.
— Qual é, príncipe Charles, seja franco comigo, somos amigos, lembra?
O presidente de um país não ia perder a irmã assim sem mais nem menos.
Você poderia contratar todos os detetives da Europa se quisesse realmente
encontrá-la. Vamos, me diga onde está a garota.
Eu tenho que admitir que apesar de louca, ela é inteligente, só que nesse
caso essa Inteligência pode me prejudicar.
— Que história é essa de príncipe Charles? — mudo de assunto
depressa.
— Você não me disse seu nome, então inventei um.
— Meu nome é Lennon Rudolf.
— Eu prefiro te chamar de Charles. Se importa?
— Me chame do que quiser. Agora chega de conversa. Vamos assistir o
vídeo para que depois eu marque uma coletiva de imprensa para você se
retratar pelo que fez.
— Pelo que Lucy fez. Não eu — ela reabate.
— Considerando que obviamente ela passa a vida se retratando pelos
seus atos, não custa retribuir uma vez.
Ela solta uma de suas gargalhadas, como se eu tivesse acabado de contar
uma piada.
Ela ainda está comendo uma maçã quando se acomoda em uma poltrona
diante do aparelho de TV, sentando-se com um pé pendurado, como uma
moleca. Não usa mais a tolha em volta dos cabelos, deixando-os soltos em
ondas douradas que caem pelos seus ombros, parecendo uma cachoeira
cristalina que emoldura seu rosto perfeito.
Coloco DVD no aparelho e me sento em outra poltrona. Aperto o play e
as imagens começam quando Lucy já está no terraço dos fundos, como se
Donald tivesse editado para que, deliberadamente, iniciasse naquele
momento. A câmera que nos foca está a uma distância propícia para que
ambos sejamos vistos com clareza e nossas vozes sejam ouvidas.
Tudo o que aconteceu se repete diante de mim. Lucy corre para a chuva,
visivelmente abalada, a alcanço, caímos no chão, eu peço perdão sem saber
pelo quê e agora sei que foi por algo que não fiz, depois vamos para o
vestiário e ela se entrega a mim de um jeito que me deixa a beira da
loucura.
Fico de pau duro observando nós dois transando sobre os colchonetes,
seus gemidos ecoando pelo quarto. E não sou o único, Samantha também
está excitada com as imagens, posso ver isso na forma como abre a boca
para puxar o ar, na vermelhidão que tomou conta do seu rosto, no modo
como aperta suas pernas uma na outra.
Sem desviar seu olhar da tela, ela se levanta e se aproxima devagar do
monitor, para observar mais de perto.
As imagens mostram tudo com detalhes, sem deixar espaço para a
suspeita de que houve um estupro ali caso o vídeo seja exibido a um júri em
um tribunal, o que jamais permitirei que aconteça.
— Você é muito bom no que faz. — Fala ela, com a respiração ofegante.
Luto para me segurar no lugar, mas perco a batalha contra mim mesmo e
me levanto também, colocando-me atrás dela, muito perto, extasiado com o
calor que emana do seu corpo e com o cheiro de sais de banho que parte
dela.
Acho que nunca quis nada na vida com a intensidade que desejo arrancar
aquele roupão do corpo dela, jogá-la sobre a cama e fodê-la até deixá-la
dolorida no meio das pernas de novo.
— Gostaria de experimentar?
— Sim, gostaria muito. — ela responde sem se virar. — Você sabe que
quero isso desde aquela noite em que você me trouxe aqui. — coloco
minhas mãos sobre seus ombros e levo minha boca à sua orelha, mas antes
que a alcance, ela se esquiva, dando um passo à frente, desfazendo o
contato. — Mas não vai acontecer. Jamais. Não é nada pessoal, só não
transo com os mesmos homens que ela.
Nervoso, passo os dedos pelos meus cabelos.
— O que é isso? Algum tipo de regra?
Ela vira o rosto para mim e me encara muito séria.
— É a minha única regra.
Volto a me sentar, antes que perca de vez o controle, enquanto ela
permanece em pé perto da TV.
Nas imagens, quando Lucy adormece em meus braços, deixo-a no
vestiário para vir ao palácio em busca de um guarda chuvas para que ela
volte sem se molhar novamente. Não faz nem cinco minutos que saí quando
ela acorda, olha em volta à minha procura, fica apática e então começa a
chorar, desoladoramente, me fazendo compreender que se sentiu
abandonada, que acreditou que eu a tivesse deixado depois do que
aconteceu.
É possível perceber que ela achou que eu tivesse usado e depois a
descartado, o que pode tê-la incentivado a fazer o que fez, embora o real
motivo tenha sido o fato de desejar me destruir por acreditar que matei seu
pai.
Lucy ainda está chorando, quando seu alter ego leva a mão até a tela e
percorre a ponta dos dedos por sobre sua própria imagem, como se tentasse
consolar sua outra identidade. É a primeira vez que vejo uma expressão em
seu olhar que não seja malícia ou deboche, ela sente compaixão de Lucy e
isso é muito estranho.
— Você a magoou, seu energúmeno, por isso ela te acusou! — ela fala,
secamente.
— Mas eu não fiz nada. Só saí para vir buscar um guarda chuvas para
ela.
— Você não sabe que as mulheres são sensíveis? Devia ter deixado um
bilhete avisando que voltaria.
— Como eu ia saber que ela acordaria tão depressa?
— Devia ter deduzido.
Assistimos Lucy rasgando seu vestido, correndo para a festa e fazendo o
escândalo que está destruindo minha imagem.
— Então é isso. Agora que você sabe que foi tudo consensual, vai dizer a
verdade diante das câmeras? — falo, quando o vídeo acaba com Lucy sendo
carregada para fora do palácio por Hudson.
Samantha se joga na poltrona e pendura as pernas sobre o descanso de
braço, deixando o roupão subir até o ápice das suas coxas lisas e bem
torneadas.
— Tem certeza de que vou poder escolher qualquer lugar do mundo pra
gente ir?
— Qualquer lugar.
— E se você não cumprir com sua palavra?
— Então você reúne novamente os repórteres e diz que foi obrigada a
desmentir tudo.
Ela solta aquela gargalhada estrangulada que ecoa pelo quarto.
— Isso parece divertido. — deixa um perna escorregar para baixo de
modo que apenas um minúsculo pedaço do tecido do roupão fica entre
minha visão e sua bocetinha pequena e gostosa. Parece se divertir com isso,
com o rumo que dou ao meu olhar. — Está certo. Pode chamar as câmeras.
— Ótimo. Em algumas horas tudo estará pronto. Agora vista uma das
roupas comportadas de Lucy e comece a agir como ela.
— Certo chefe. Eu sei representar uma songa monga.
Apesar de ter conseguido alcançar meu objetivo de fazê-la falar, quando
saio daquele quarto, tenho a impressão de que estou metido em uma
enrascada ainda maior do que uma acusação de estupro. Não faço ideia de
para onde aquela louca pretende nos levar, ela pode cismar que querer
desfilar de biquine na Arábia Saudita e eu serei obrigado a providenciar,
afinal lhe dei a minha palavra e se não cumprir corro o risco de que ela
invente um escândalo ainda pior. Só me resta torcer para que Lucy volte o
quanto antes, para que possamos resolver tudo, esclarecer as coisas. Para
que eu possa lhe dizer que sou inocente do crime que me acusa e convencê-
la voltar a tomar conta de minha mãe.
Quando ouvir a verdade, ela se sentirá tão culpada por ter me acusado
injustamente que fará tudo o que eu quiser. Eu a tornaria minha amante, se
não precisasse dela para cuidar do bem estar da minha velha, embora isso
não nos impeça de nos divertirmos de vez em quando pelos vestiários do
palácio. Por falar nisso, não vejo a hora de me divertir com ela de novo,
acabar de vez com esse tesão irrefreável que me consome.
CAPÍTULO XVII
Samantha.
Me sinto ultra desconfortável dentro daquela roupa ridícula da songa
monga. Quem na face da terra usaria um conjunto de terninho e saia justa
rosa bebê? Dizem que eu sou a louca, mas acho que essa garota é que
precisa de terapia. A educação das freiras do orfanato deve ter influenciado
de forma negativa na formação da personalidade dela, começando pelo fato
de que no seu armário só tem roupas esquisitas, que vão desde vestidos
floridos a conjuntinhos como esse. E para piorar, não achei nenhum sapato
de salto alto que pudesse pelo menos dar um toque de elegância ao traje.
Pareço uma lagartixa presa em uma lata de sardinha. E meus cabelos? Para
desempenhar o papel “dela”, o mandão me disse para prendê-los em um
coque que me deixa parecendo uma beata mal comiga. Ahg! O que ele vai
me dar em troca terá que valer muito à pena por todo esse sacrifício, e vou
fazer valer. Vou me divertir como nunca à custa do dinheiro dele.
Sou conduzida pelo mandão e pelo segurança pessoal mal encarado dele
através do palácio enorme. Para que alguém precisa de um palácio tão
grande para morar? Realmente não entendo os seres humanos.
Em um dos salões, onde há um palco e várias mesas com cadeiras, sou
conduzida ao palco e sento-me em uma poltrona com o mandão e seu
segurança, um de cada lado. As mesas estão ocupadas por pessoas da
imprensa com câmeras fotográficas que logo disparam, seus flashes em
nossa direção.
Sou irresistivelmente tentada a fazer poses sensuais para que aquelas
fotos fiquem mais legais, mas isso me faria perder a mamata de me divertir
a custa do presidente milionário e nem morta vou perder essa chance de
fazer tudo o que sempre sonhei e nunca tive dinheiro.
O mandão faz um discurso diplomático, explicando que a coletiva foi
organizada para que eu, Lucy Anderson, me retrate pelo mal entendido que
aconteceu durante a recepção no palácio esta madrugada e sinto vontade de
sorrir de tanta seriedade da parte dele, mas me lembro que preciso me
comportar como uma santinha recatada e permaneço quieta.
Ele passa a palavra para mim e aposto minhas bolas metálicas do prazer
como prendeu a respiração por medo do que vou falar. Novamente sinto
vontade de sorrir e me contenho.
Então, representando o papel da songa monga, recito o discurso que me
foi apresentado previamente, dizendo a todos que o acusei falsamente, que
inventei toda aquela mentira de estupro porque estava magoada, com
ciúmes de outra mulher e queria me vingar, afirmei que tudo o que
aconteceu entre nós foi consensual e por fim pedi desculpas a ele em alto e
bom tom.
Senti vontade de acrescentar que ninguém tem nada a ver se uma mulher
gosta de um pouco de violência durante o sexo, mas acho que a songa não
diria uma coisa dessas, então me contive a dizer apenas o que me foi
instruído.
Na minha frente os repórteres não me repreenderam, mas o mandão já
me avisou que receberei duras críticas e julgamentos nos jornais e nas redes
sociais por Lucy ter inventado aquele estupro, portanto será melhor que eu
fique longe do noticiário por uns dias.
E quem disse a ele que estou interessada no noticiário? Nunca estive e
nunca estarei e o julgamento dos outros pouco me importa, nunca liguei e
nunca vou ligar para o que pensam de mim. Se fosse dar trela para isto não
viveria minha vida como gosto.
O problema das pessoas é que elas levam a vida a sério demais e isso me
irrita profundamente.
Depois da coletiva, estou em outro salão menor, cercada por homens
feios e gorduchos — com exceção do gostoso do mandão, que é uma
verdadeira perdição e só tenho a lamentar que foi se envolver logo com a
songa —, que usam terno e gravata, quando uma empregada me surpreende
ao me trazer o telefone dizendo haver uma ligação para mim.
Atendo e sinto o olhar do presidente queimando como brasa sobre mim.
É o tal do Hudson que estava no aeroporto, aparentemente ajudando a
songa a fugir, quando voltei a mim, cercada por soldados armados.
Ele quer saber se estou bem e se fui forçada a dar aquelas declarações à
imprensa. Tenta parecer gentil e preocupado, mas eu sei que homens
poderosos como ele só querem uma coisa de garotas como eu. Eu poderia
dizer a ele que fui forçada a falar e que estou em cárcere privado, para que
venha me resgatar, mas estou muito a fim de gastar o dinheiro do presidente
com as minhas loucuras. Já até sei por onde começar. Só espero ter tempo
de fazer tudo o que quero.
— O que Hudson queria com você? — o mandão pergunta, assim que
entramos sozinhos no quarto da songa.
Olho para ele e novamente preciso conter um suspiro. O cara parece uma
miragem dentro do terno feito sob medida, não que eu goste de homens que
usem terno, nunca gostei, mas aquele só não me faz perder a compostura
porque se envolveu com a pessoa errada. É lindo como ninguém, alto,
elegante, com o corpo esguio, os ombros largos e aqueles olhos que
parecem me devorar todas as vezes que me focam.
Ah, como eu queria quebrar minha regra com ele, mas não o farei de
jeito nenhum, ou estarei ainda mais presa a ele e minha liberdade está em
primeiro lugar sempre.
— Nada só saber se eu estou bem, se não fui forçada a dar aquelas
declarações à imprensa.
— Bastardo! — ele esbraveja e até isso fica lindo nele.
— Relaxa. Por enquanto eu estou com você, mas só porque você me
deve. — coloco malícia no tom da minha voz.
Ele repira fundo e senta-se em uma poltrona.
— E então, o que você vai querer de mim?
Ergo a saia colada demais até o ápice das minhas coxas, satisfeita por ver
que seus olhos azuis registram o gesto, porque provocá-lo simplesmente me
dá prazer e sento-me mais à vontade na outra poltrona.
— Por enquanto, quero saltar de paraquedas de um avião.
Os olhos dele se arregalam.
— Você está louca?
Solto uma gargalhada da sua reação exacerbada.
— Louca eu sempre fui e nunca neguei isso. Além do mais não é tão
difícil assim, é só um salto das alturas. Confesso que sempre quis fazer isso.
— Você pode morrer!
— E daí? É isso que quero e você prometeu. Agora cumpra.
Ele se mostra nervoso, passa a mão pelos cabelos, suspira pesadamente e
então declara.
— Vou com você então. Mas não pode ser aqui em Newhart, pois seria
outro escândalo se o presidente fosse visto saltando de paraquedas.
Precisamos sair do país.
— Por mim tudo bem.
— Espere aqui que vou providenciar as coisas para me ausentar por uns
dias. Não demoro.
Ele se dirige para a porta e corro para tomar-lhe o caminho.
— Não é assim que funciona. — falo. — Você sabe que posso não ter
muito tempo ou tempo nenhum. Não quero ficar aqui presa enquanto posso
viver.
— E o que você quer que eu faça? Não posso sair assim sem
providenciar as coisas.
— Me dá um cartão de crédito para eu comprar roupas decentes
enquanto você faz isso.
— Não vou te deixar sair daqui sem mim.
Eu sabia! Ele diz que vai me dar liberdade, mas é uma liberdade parcial.
Estará sempre no meu pé e nunca serei totalmente livre. Que ódio! Eu podia
voltar lá naquela sala e desmentir tudo o que acabei de dizer.
— Você prometeu que eu seria livre. Cumpra sua maldita promessa. —
exijo, com os dentes trincados.
Ele me encara em silêncio por um momento antes de falar.
— Ok, você tem razão. Vou só dar uns telefonemas e saímos em meia
hora.
Ele deixa o quarto e comemoro exultante.
Ele demora muito mais que meia hora, mas pelo menos vem.
No início da noite, estamos no aeroporto particular do palácio entrando
em um avião de grande porte tão luxuoso que mais parece um hotel. Não é
um avião comum, para muitos passageiros, esse é particular e tem sala de
estar com poltronas de couro confortáveis, frigobar e mesinha de centro;
três cabines que se parecem com quartos e até uma cozinha.
Uma comissária de bordo uniformizada vem nos atender e pedimos
carne grelhada para o jantar.
— Posso saber para onde estamos indo? — pergunto, enquanto
comemos.
— Para a França. É um país onde não vão reparar em um presidente
pulando de paraquedas.
Não resisto e solto uma gargalhada. Aquele homem é tão carismático
que consegue ser engraçado mesmo quando não tenta ser.
— Eu não posso ir a lugar nenhum vestida desse jeito. — gesticulo para
o conjuntinho careta cor de rosa da songa que ainda uso.
— Ouvi dizer que em Paris tem excelentes lojas de roupas femininas.
Basta você escolher em quais deseja ir.
Minha nossa! Fazer compras em Paris sem limite de gastos?
Definitivamente bater no carro desse sujeito foi a melhor coisa que já fiz.
Pensando nisso, me dou conta de que o conheci primeiro que a songa,
portanto teria o direito de tê-lo para mim. O problema é que todas as
pessoas, sem exceção, que gostam dela, sempre acabam me odiando. Não
que eu me importe com isto, não ligo para o que sentem por mim, ou pelo
menos não ligava até conhecer o mandão gostoso sentado à minha frente.
Por alguma razão que desconheço, não quero que ele me odeie.
Estou tão exausta por ter passado a noite em claro, que após a refeição
começo a cochilar ali mesmo sentada na poltrona de couro. O mandão
oferece-me uma das cabines, mas tenho que recusar, pois não quero
mergulhar em sono profundo e correr o risco de acordar apenas depois de
vários dias, como sempre acontece. Então, durmo ali mesmo sentada
durante toda a viagem, sem que ele saia de perto de mim.
É madrugada quando aterrissamos em solo francês. Uma limusine
grande e luxuosa já nos aguarda no aeroporto e se aproxima do avião para
nos apanhar. Nos acomodamos nos assentos traseiros e somos conduzidos
pelas ruas de Paris seguidos de perto por outro carro, cheio de seguranças
armados.
Ao alcançarmos o centro da cidade, não resisto, abro a pequena capota
do veículo luxuoso e coloco meu torso para o lado de fora, apreciando a
imagem dos primeiros raios do sol banhando a cidade, que aos poucos tem
suas luzes noturnas apagadas.
Paris é realmente linda. Tem as ruas muito largas e limpas; os prédios
possuem um desenho arquitetônico antiquado, embora tenham um aspecto
de novinhos; é tudo muito organizado por ali, apesar de também chamar
para a diversão.
Passamos por uma rua na qual há uma fileira reta de árvore, com
folhagens verdes de um lado e outra fileira retinha com folhas amareladas
do outro lado, proporcionando um verdadeiro espetáculo. Em outros países
toda aquela organização já teria ido por água abaixo.
Continuo com a metade do corpo do lado de fora da limusine, enquanto
esta desliza pelas largas avenidas pouco movimentadas devido ao horário.
— O seu salto está marcado para apenas daqui a algumas horas. Você
gostaria de ir a um hotel descansar um pouco antes da sua grande aventura?
— o mandão precisa alterar o tom da sua voz para que eu o ouça aqui de
fora.
— Descansar? Só morta! Quero mais é viver. Vamos ao shopping,
preciso de roupas novas.
— Os shoppings ainda não abriram a essa hora.
— Dá um jeito de fazê-los abrir, você é um presidente.
Ouço-o dando alguns telefonemas e em poucos minutos estamos
adentrando o estacionamento do gigantesco Forum dês Halles, na famosa
Chatelet-Les-Halles, uma das áreas mais cools de Paris, pelo que já ouvi
falar. O lugar é imenso e tem uma estrutura futurística que enche os olhos.
— Não se empolgue muito, apenas uma loja concordou em abrir para
nós. É uma boa loja, vende roupas de grifes famosas e tem tudo para
garotas. — o mandão fala, quando paramos no estacionamento.
Saltamos e somos seguidos por três seguranças ao entrarmos. A loja fica
no terceiro piso e é maravilhosa, com a logomarca de vários estilistas
famosos espalhadas por todos os lugares. Somos recebidos por um sujeito
magrinho, bem vestido, com um sorriso largo na boca, que se apresenta
como gerente e por uma mulher muito elegante, na casa dos quarenta anos,
também muito sorridente.
Aposto como se eu entrasse ali sozinha, usando meus trajes casuais, eles
nem olhariam para a minha cara.
Somos conduzidos para uma sala confortável, onde o gerente nos oferece
chá e aceitamos.
— E então, o que a senhorita quer olhar primeiro? — o magrelo
pergunta.
— O que você tem de melhor aí? — eu quero saber.
— Tudo o que a mademoiselle imaginar.
— Eu quero tudo.
Ele olha para o presidente, como se adivinhasse que será ele a pagar a
conta e o mandão apenas dá de ombros enquanto toma tranquilamente seu
chá.
E é então que começa a diversão. É a primeira vez que me divirto
fazendo compras, pois pela primeira vez não estou com medo de ser
apanhada por roubo, nem estou com pressa e posso comprar absolutamente
tudo o que eu quiser. A atendente começa a mostrar-me roupas sofisticadas
demais, então lhe pergunto pelos trajes radicais e ela me apresenta várias
coleções de peças despojadas desenhadas por estilistas mundialmente
famosos.
Experimento todas e a cada troca, venho pedir a opinião de Lennon, mas
só para que ele não se sinta entediado enquanto me espera. Não que eu me
preocupe com ele, só não quero que se canse de esperar sem fazer nada e
comece a me apressar de repente. Mentira, na verdade eu quero chamar a
atenção dele, simplesmente porque seu olhar me cobiçando me seduz.
Levo tudo o que me agrada, desde vestidos de noite, shortinhos para o
dia a roupas de praia. Acessórios e calçados das melhores marcas também
fazem parte do conjunto.
Após as compras, quando já é tarde o suficiente para que tudo esteja
aberto por ali, dou uma passada no salão da loja para fazer uma hidratação e
escovar os cabelos, deixando as ondas douradas e brilhantes caindo pelos
meus ombros, do jeito que gosto e depois de algumas horas deixamos o
shopping com os seguranças carregando dezenas de sacolas com roupas que
custaram o suficiente para sustentar uma família inteira de um país
subdesenvolvido. Já saio de lá usando o vestidinho Prada preto curtinho em
estilo surfista e com as sandálias de salto de Louis Vuitton, sentindo-me
muitíssimo satisfeita por ter toda a atenção do mandão.
Na limusine, sento-me diante dele e cruzo uma perna sobre a outra, de
forma sensual e provocante, contente por ver seu olhar me devorando
dentro do vestido pequeno.
— Agora vamos para Chamonix, porque tudo o que consegui pra você
foi um salto de parapente. Não se pode saltar de paraquedas sem o mínimo
de preparo. — ele diz.
— Eita, como você é sem graça. Já está mudando meus planos.
— Especialistas me garantiram que a emoção é a mesma, assim como os
riscos. Ainda da tempo de desistir, se quiser.
— Desistir jamais. Esse é o meu maior sonho. — aponto para o frigobar.
— Tem alguma coisa pra beber aí?
— Sim, mas ainda é cedo para bebermos. Vamos tomar o café da manhã
primeiro.
Reviro os olhos e ela bufa, contrariado. Então essa é a liberdade que ele
quer me dar, a de ficar me vigiando o dia inteiro. Só não fujo porque estou
adorando gastar o dinheiro dele e sua companhia também não é das piores.
CAPÍTULO XVIII
Paramos para tomarmos o café da manhã em um bistrô a céu aberto
localizado em uma pracinha limpa e organizada como tudo por ali. O fato
de sermos seguidos por seguranças nos torna o centro das atenções,
algumas pessoas até tiram fotos, só por nos acharem esquisitos e isso me
diverte tanto que não consigo parar de sorrir.
Por fim o mandão é reconhecido por uma mulher que tem mais ou
menos a idade dele, se veste com elegância e se diz moradora de Newhart.
Ela pede para tirar uma self com ele e se mostra tão oferecida que fico
esperando pular no seu pescoço a qualquer momento. E mulherengo como
é, Lennon dá toda atenção a ela. Acho até que pegou o seu número.
Observando-os me pergunto quantas amantes ele mantém às escondidas
em apartamentos de luxo fora da cidade, como propôs fazer comigo na
noite em que bati no seu carro. Aposto como tem várias e como faz cada
uma delas sofrer com sua entrega parcial, com sua falta de afeto, afinal
como ele mesmo disse, não se envolve afetivamente com uma mulher e se
há algo que considero quase impossível é uma mulher conviver com um
homem como ele, ter momentos de intimidade e não se apaixonar. Ainda
bem que não sou dessas e nem pretendo ter esses momentos com ele.
É o tipo de homem com o qual eu jamais imaginaria que a songa fosse
capaz de se envolver, embora seja compreensível que ela tenha perdido a
cabeça, o cara é charmoso demais, que mulher não se perderia?
Após a refeição, seguimos para um pequeno heliporto particular, onde
pegamos um helicóptero para Chamonix Mont Blanc. É uma viagem rápida,
porém divertida. Primeiro porque eu nunca tinha voado de helicóptero e
estou achando o maior barato, segundo porque posso apreciar a vista
magnífica dos Alpes franceses.
Aterrissamos no ponto mais próximo ao Monte Branco, o pico mais alto
da Europa, para onde seguimos a pés, com os seguranças atrás de nós.
Ali a vista é simplesmente deslumbrante, estamos próximos à fronteira
entre a França, Suíça e Itália, rodeados por montanhas rochosas, altas e dali
podemos enxergar a pequena cidade de Chamonix, muito pequena lá em
baixo.
Lennon me explica que durante o inverno este lugar fica coberto pela
neve e é quando se acumula o maior número de turista que vêm em busca
do esqui e também do voo de parapente.
Ao alcançarmos o pico do monte, de onde a vista se torna ainda mais
magnífica, somos recebidos por um simpático instrutor que parece estar nos
esperando.
Vejo outras pessoas saltando para o voo penduradas em cestinhas, todas
acompanhadas por instrutores. É necessário que se corra alguns metros
antes do salto para se ganhar impulso.
Nosso instrutor nos explica cada passo do processo antes de me amarrar
toda com cintos de segurança e colocar um capacete pequeno em minha
cabeça. Ele pretende me levar no voo, como é de praxi, só que Lennon
cisma que eu estarei mais segura se for com ele e então o instrutor lhe
explica detalhadamente o processo antes de cobri-lo com cintos de
seguranças também.
Somos colocados em cestinhas de tecido que se parecem com bebês
conforto e, seguindo as instruções, corremos os poucos metros até a beira
da montanha de onde saltamos, dando início ao voo.
Essa é a melhor aventura na qual já embarquei, a sensação que tenho é
de que realmente estou voando. Aqui em cima é silencioso, tranquilo e
sossegado apesar do ar rarefeito. Aos nossos pés estão as montanhas
rochosas, muitas delas, das quais passamos muito próximos, inclusive quase
tocamos nossos pés em uma.
Lennon conduz o voo por meio de cabos, como o profissional lhe
instruiu e não posso negar que estou gostando de tê-lo comigo, como
alguém com quem dividir esse momento tão magnífico. Sem mencionar que
a proximidade dele é realmente deliciosa. Estou praticamente sentada em
seu colo e posso sentir uma energia gostosa partindo dele, inebriando-me.
Se não fosse pelo fato de eu detestar o namorado da songa, diria que o que a
motivou a ir para a cama com ele está começando a me afetar também.
— Está gostando? — ele pergunta.
— Sim. Demais! — mais que isto, eu estou maravilhada.
Voar por sobre as montanhas é um sonho tão bom que eu nem tinha me
atrevido a sonhar.
O voo dura cerca de meia hora e por fim aterrissamos no campo
gramado onde estão aterrissando os outros turistas, próximos a casinhas
fabulosas em estilo colonial.
Apenas ao estarmos em terra, percebo que Lennon está trêmulo dos pés à
cabeça e solto uma gargalhada.
— O que é isso? Medo? — Pergunto, sem deixar de sorrir.
— Imagina. É só a adrenalina por pilotar essa coisa.
Algo mais forte do que eu me impulsiona e quando dou por mim o estou
abraçando. Acho que esta é minha forma de agradecer por estar me
proporcionando aquele momento tão inesquecível. Ao colar meu corpo no
seu, novamente sinto aquela energia gostosa que me puxa para ele, que
praticamente me impede de soltá-lo.
— Obrigada. Isso foi muito bom. — agradeço, afastando-me.
— Aí está uma coisa que nunca esperei ver: você agradecendo alguém
por alguma coisa.
— Isso só prova que você não me conhece nem um pouco.
— Tem alguns outros pontos turísticos por aí, uma caverna, um
teleférico. Quer dar uma olhada ou prefere voltar para Paris?
— Chega de montanhas por hoje. Vamos pra civilização.
Ao sinal dele, um dos jipes que ficam por perto se aproxima e nos leva
para Chamonix, a cidade mais charmosa que já conheci. Tem todas as
características de uma cidade pequena do interior, só que é mais bonita,
com suas cassinhas bem construídas parecendo casas de bonecas; há jardins
floridos por toda parte e até um lago pequeno com uma ponte mimosa. De
qualquer ponto da cidade é possível enxergar a cordilheira rochosa com
todo o seu esplendor.
Como já passa do meio dia, decidimos almoçar ali mesmo e comemos o
delicioso bouillabaisse com o mil-folhas de sobremesa em um charmoso
bistrô perto do lago.
Ao contrário do que eu imaginei quando Lennon exigiu vir comigo em
minhas aventuras, não falta assunto entre nós, até gosto de conversar com
ele. É como se nos conhecêssemos há muito mais tempo. Aliás acho que ele
é a pessoa com quem já conversei por mais tempo durante toda a minha
conturbada existência e a cada instante em sua companhia eu a aprecio
mais, o que me assusta um pouco porque sei que mais cedo ou mais tarde
ele me odiará, é sempre assim, e não deve ser nada fácil ser odiada por
alguém de quem se gosta.
Nós até pareceríamos um casal normal ali, se não fosse o bando de
seguranças ocupando outra mesa.
— Por que esses seguranças têm que nos seguir o tempo todo? —
pergunto.
— Porque sou um homem poderoso demais para ficar desprotegido.
— Quanta modéstia. — solto, com sarcasmo.
— Não é soberba. Não há tanta vantagem em ser poderoso, isso significa
apenas que há sempre alguém a fim de lucrar com a sua cabeça.
Quando ele diz isso, novamente me lembro da sua irmã desparecida. A
malícia que existe dentro de mim me impede de acreditar que ele realmente
não sabe do paradeiro dessa garota, pois como ele mesmo acabou de dizer, é
um homem poderoso, se quisesse a teria encontrado e mesmo que estivesse
morta, teria meios de desvendar o caso. Mas me recuso a ficar pensando
nisso, tenho muito ainda a aproveitar. Quero viver intensamente cada
minuto da minha existência enquanto posso, usufruir de tudo de bom que a
vida tem a oferecer.
Eu nunca tive tanto tempo livre e dinheiro para me divertir, estou sempre
correndo para roubar alguém ou fugir da vítima do roubo e agora tenho todo
esse tempo livre para fazer o que quiser. Já sei que à noite quero ir a um bar
movimentado em Paris, dançar, encher a cara e pegar alguns gatinhos, mas
o que fazer com o resto da tarde?
Em busca de respostas, pego o iPhone de Lennon, peço que ele
desboquei e navego pela internet em busca de coisas radicais para se fazer
na frança. Como está quente, acredito que correr na praia, descalça, talvez
nua, dependendo de quem estiver por perto, é uma excelente ideia. É algo
que eu sempre quis fazer, mas nunca tive oportunidade.
Parece hilário que alguém de quem a songa monga goste esteja me
proporcionando isso tudo, realizando todos os meus sonhos.
Na internet, encontro uma praia que parece boa, na comuna Touville-sur-
mer, a qual, segundo a descrição do site, fica a apenas duzentos quilômetros
de Paris, para onde poderemos ir facilmente à noite.
Digo a Lennon que quero ir até lá e ele coloca mil dificuldades antes de
concordar, talvez por temer que eu corra nua pela areia, como disse que
queria fazer e o faça passar vexame. E vou correr mesmo, ele quis vir
comigo, agora que aguente.
De helicóptero chegamos a Touville-sur-mer rapidinho. Aterrissamos no
heliporto de um hotel luxuoso que fica à beira mar e seguimos à pés para a
praia. O lugar é simplesmente deslumbrante, com quilômetros e mais
quilômetros de areia branca onde morrem as ondas da água azul turquesa do
mar. Eu nunca tinha visto o mar de perto antes e estou simplesmente
emocionada.
Embora ali não seja uma comuna muito habitada, há vários turistas
tomando sol nas areias da praia, principalmente casais de namorados.
Assim que alcanço o enorme tapete branco, tiro as sandálias de salto e
corro até a beira do mar, extasiada com a textura da areia sob meus pés
descalços.
— Você não pretende mergulhar de vestido não, né? — Lennon indaga e
só então me dou conta de que ele veio correndo atrás de mim, também
descalço, com a calça enrolada até a metade das canelas.
Olho mais adiante e vejo os seguranças nos rondando de longe, atraindo
a atenção dos banhistas por usarem terno e gravata e, pela primeira vez
naquele dia, isso me incomoda, pois parece tirar toda a minha privacidade.
— Eu faço o que me der na telha. Não existem regras na minha vida. —
solto, com aspereza e ele me encara espantando.
— O que houve? Tem algo te incomodando?
Gesticulo na direção dos seguranças.
— Sim. Eles. Não dá pra mandá-los embora?
— Não mesmo. Seria muito arriscado.
— Nesse caso, espero que eles apreciem o espetáculo. — solto uma
gargalhada e entro na água, de roupa e tudo, o vestido negro se colando
ainda mais ao meu corpo, tornando-se totalmente transparente.
Contudo, a seminudez apenas acentua a sensação de liberdade que me
toma assim que sou envolvida pelas águas agitadas e salgadas. Está meio
fria, mas ainda assim é deliciosa, porque me embala junto com o balanço
das ondas.
Há alguns outros poucos banhistas ali e vou até onde está o último deles,
a água alcançando-me a altura do colo. Mergulho e volto várias vezes,
nado, me esbaldo, me divirto, embora ache que tudo se tornaria ainda
melhor se Lennon estivesse comigo como esteve durante o voo de
parapente.
Viro-me e o enxergo parado na areia, com as mãos enfiadas nos bolsos
das calças, observando-me. É realmente a imagem mais magnífica naquele
lugar, sua postura altiva, sua elegância, seu charme irresistível, tudo nele
parece gritar por mim e, tentada, o chamo com um gesto de mão.
Ele diz que não com a cabeça. Mas conheço uma forma de atraí-lo. Se
ele se preocupa tanto com o meu bem estar, ou pelo menos com o de Lucy,
virá ao meu socorro se acreditar que estou em perigo.
Nado por mais alguns metros na direção do mar aberto, e quando paro
para olhar para trás, Lennon já está entrando na água, vestido, vindo à
minha direção. Nado de volta e o encontro a meio caminho.
— Você está tentando se matar? — ele pergunta.
— Não. Só queria te fazer entrar na água e deu certo. — falo e solto uma
gargalhada.
— Você é mesmo louca.
— E você tinha dúvida disso? — sorrio de novo. — Se solta garanhão.
Você tem cara de quem está sempre estressado, não deve se divertir muito,
então aproveita pra fazer isso enquanto estou aqui.
— Você fala como se fosse embora para nunca mais voltar.
— Se vou voltar eu não sei, mas que vou embora, isso é uma certeza. —
eu tenho a vaga impressão de que ele sente pena de mim e meu coração
pesa como nunca pesou antes, pela perspectiva da partida que virá em
algum momento. — Chega de conversa, vamos nadar.
Dou largas braçadas na água gelada, para a direita e Lennon me segue, a
princípio meio sem jeito, porém logo se solta e se diverte como eu nadando
ao balanço das ondas.
Há veleiros para aluguel ali perto e cogito convidá-lo a um passeio, seria
magnífico, mas já está quase anoitecendo e estou mais ansiosa pela noitada
na balada que por qualquer outra coisa.
Um surfista que pega ondas por ali, avança na minha direção em alta
velocidade. Está quase me acertando quando Lennon me puxa com sua mão
forte, com um safanão, tirando-me do caminho e meu corpo vai parar junto
ao dele. Nossa pele fica em contato quase direto sob nossas roupas
molhadas e aquela é a sensação mais gostosa que tenho entre todas que
estou espreitando nesta tarde. Apesar da água gelada, sinto o sangue ferver
em minhas veias, o calor me percorre inteira, se instalando entre minhas
coxas.
— Foi por pouco. — ele diz e abro a boca para puxar o ar, excitada.
Percebendo minha reação, Lennon me encara surpreso e me abraça pela
cintura, colando ainda mais seu corpo sólido no meu, de cima à baixo. Seu
tórax esmaga meus seios, sua ereção de faz quente e potente contra meu
ventre e sou tomada por uma corrente de tesão tão violente que preciso
morder meu lábio inferior para conter um gemido.
O que aquele homem tem que me deixa assim? Ele nem é o meu tipo!
— Me solta. — falo, séria.
— E se eu não quiser?
— Eu grito.
— Isso seria péssimo para a minha imagem pública. Outro escândalo e
com a mesma garota.
— Então zele pela sua reputação. Ela parece bastante preciosa pra você.
Olha só onde ela te trouxe.
Me contorço tentando sair dos braços dele, mas isso só piora as coisas.
Meu corpo esfrega no dele e me sinto a ponto de incendiar, tão excitada que
meus mamilos doem.
— Não estou aqui só pela minha reputação. Eu tinha outros meios de te
fazer falar.
— Está certo. Agora me solta. Isso não tem graça.
— Eu te solto se você me der um beijo.
— Não sou uma garota que se deixa coagir.
— Não estou te coagindo. Só quero um beijo. Só um.
Estreito meus olhos sobre os dele. Beijá-lo pode ser facilmente a coisa
que mais quero neste momento, não apenas beijar, como também baixar sua
calça, subir meu vestido e dar para ele bem ali dentro da água, isso seria
inesquecível, o problema é que ele dormiu com o meu alter ego e me recuso
a me envolver com os mesmos homens que ela, porque depois eles sempre
vão amá-la e me odiar, tentar se livrar de mim para tê-la de volta. É assim
com o traste do Kevin e foi com outros namoradinhos que tivemos na época
do orfanato. Não sou obrigada a passar por isto de novo, existem muitos
outros homens no mundo.
— Está bem, só um beijo. — falo, com uma ideia em mente.
Os olhos dele brilham de uma forma tão fascinante que sinto vontade de
beijá-lo de verdade, mas me recuso a me deixar iludir por um olhar e
quando ele trás sua boca até a minha, cravo meus dentes em seu lábio com
toda a força, até sentir o sangue quente escorrer.
— Awww — ele grita e me solta, levando a mão à boca ferida enquanto
eu tenho uma crise de riso. — Eu vou te fazer pagar por isso, sabia?
— Nossa! Vai mandar me prender? — solto, com escárnio, sem
conseguir parar de sorrir.
— Não. Te fazendo gemer no meu pau até você ficar dolorida. Esse foi o
castigo de Lucy e também será o seu.
— E o que aquela songa fez pra merecer esse castigo?
— O mesmo que você acabou de fazer. — o encaro em silêncio por um
instante, processando aquela informação com a mesma perplexidade de
alguém que presencia o holocausto e acabo tendo outra crise de riso.
— Não posso acreditar que a mesma mulher te fez sangrar por duas
vezes. — sorrio tanto que minha barriga dói.
— Serei ainda mais cruel com você, só porque está sorrindo.
— Ai que medo. E vai fazer o que?
— Você vai ver. Agora vamos sair dessa água, estou começando a
congelar.
Quando deixamos a água, ele devora meu corpo seminu dentro do
vestido molhado com seu olhar lindo e isso me agrada mais que a aventura
do banho de mar.
“Sam, o que está acontecendo com você, garota?” Pergunto-me.
CAPÍTULO XIX
A praia já não está tão lotada quanto antes, acho que posso realizar
minha fantasia mais absurda que é correr nua pela areia. Levo minhas mãos
à saia do vestido, a fim de puxá-lo para cima e me despir, mas Lennon as
segura no lugar.
— Nem pense em fazer isso. — diz ele e solto uma gargalhada.
— Você sabia que eu faria.
— Escolha outra loucura. Essa não.
Eu estou abrindo a boca para protestar, quando um dos seguranças se
aproxima de nós correndo. Apesar de usar paletó e gravata e de o sol ainda
estar aparecendo, o cara não fica nem ofegante.
Lennon me solta depressa e se coloca em total alerta.
— Senhor, tentei seu celular, mas não chamou. — o homem diz.
— Eu acho que mergulhei com ele no bolso. O que houve?
— Percebemos que havia um carro nos vigiando de longe desde que
pousamos aqui e quando fomos averiguar descobrimos que se trata de um
detetive particular.
— O quê?
— Ele confessou ter sido contratado por Stanley Hudson.
— Como é? — Lennon está perplexo e eu só consigo pensar na balada
que pretendo ir em Paris daqui a pouco.
— Sim. Disse que tem ordens de seu contratante de averiguar se a garota
está bem. — ele gesticula na minha direção. — Se está sendo bem tratada.
E desconfiamos que o Sr. Hudson possa ter mandando outras pessoas antes,
que nos passaram despercebidas.
— Que loucura! O que Hudson está pensando? O que tem a ver com a
nossa vida? — Lennon parece furioso.
— Depois dizem que eu é que sou louca. — falo, sem conseguir conter o
riso.
— O detetive ainda está em nosso poder, o senhor gostaria de falar com
ele?
— Não. Acho melhor evitar a exposição desnecessária. Por favor, dobre
a segurança, contrate mais homens e fiquem mais atentos. Não quero aquele
palhaço com o focinho enfiado na minha vida. Vamos Sam. — ele segura a
minha mão e caminhamos pela areia, na direção do hotel, como se fôssemos
dois namorados.
Só deixo que ele me conduza porque achei fofo ouvi-lo me chamando de
Sam. Acho que é a primeira vez que pronuncia meu nome verdadeiro.
O cara que está se tornando meu presidente favorito, quer alugar uma
suíte no hotel onde aterrissamos para que possamos trocar de roupas, mas
consigo convencê-lo de que estou bem confortável e de que para um voo
que durará apenas alguns minutos, podemos apenas jogar um casaco por
cima das roupas molhadas. E assim fazemos.
É noite quando aterrissamos em Paris, no heliporto de outro hotel
luxuoso. Desta vez Lennon aluga suítes para nós dois, que seria apenas uma
se eu não tivesse protestado na hora. Nem morta vou ficar no mesmo quarto
que ele, pois no final da balada pretendo trazer um gatinho para passar o
resto da noite comigo. Mesmo que isso não o agrade nem um pouco, esse
foi o nosso acordo e ele vai ter que se conformar em me ver com outro
homem sem o direito de interferir.
Na minha suíte enorme,
totalmente sofisticada, de onde tenho uma vista privilegiada da torre Eiffel,
tomo um demorado banho de banheira, para em seguida me produzir de
acordo com a noite quente que pretendo ter. Todas as compras que fiz esta
manhã estão aqui e são tantas opções de roupas, calçados e acessórios, que
não sei nem o que escolher.
Depois de experimentar vários trajes, acabo optando por um vestidinho
creme, com riscas transparentes, cujo decote nas costas desce até o
bumbum, de onde parte a saia curta e colada e combino-o com uma sandália
plataforma preta. Deixo os cabelos soltos, com o frizze que ganhou nas
águas do mar, faço uma maquiagem, clarinha nos olhos, coloco cílios
postiços e passo um batom vermelho sangue, porque é assim que gosto. A
bolsa estilo carteira combina com tudo, pena que não haja nada dentro dela,
nem um centavo.
Observo-me no espelho e aprovo totalmente a produção. Estou pronta
para dançar a noite toda, encher a cara e pegar uns gatos. De preferência um
motoqueiro selvagem, musculoso, cheio de tatuagens pelo corpo.
Obviamente a presença de Lennon e seus seguranças vai me atrapalhar e
é por isso que preciso fugir enquanto estou sozinha. Está certo que o
dinheiro dele pode me proporcionar aventuras incríveis, mas eu sempre fui
dura e mesmo assim sempre me diverti horrores. Não preciso dele para isto.
Não tem outra saída dali que não a porta e é por onde tendo escapar,
todavia, como eu já esperava, dois de seus seguranças mal encarados estão
vigiando e não me deixam passar.
Droga! Vou fazer Lennon pagar por me privar da minha liberdade de
forma não autorizada. Ele não perde por esperar.
Acho que os seguranças avisaram-no que tentei escapulir, pois não se
passam nem cinco minutos até que ele bata na porta e vou abrir. Apesar da
raiva, não consigo não ficar excitada quando o olhar faminto dele passeia
pelo meu corpo, de cima à baixo, com uma cobiça luxuriosa que me
devora.
— Você está linda. — ele diz.
— Não gosto de ser tratada como uma prisioneira e você está fazendo
isso. — falo rispidamente.
— Não estou. O que estou fazendo é zelando pelo seu bem estar. Paris
pode ser uma cidade perigosa para uma garota jovem e bonita como você.
— Eu sei me cuidar e por favor, me poupe da sua hipocrisia, você não
está nem aí para o meu bem estar, está zelando é pela songa monga da Lucy.
Ele fica em silêncio por um instante, me observando como se
subitamente não soubesse lidar com uma garota que tem duas
personalidades distintas. Parece confuso, como se procurasse as palavras.
— Você e Lucy são a mesma pessoa para mim. — é o que ele diz e fico
surpresa, afinal é a primeira vez que alguém que a conhece não me odeia
por achar que estou tomando seu precioso corpo.
Só que não me odiar, não significa que ele goste de mim ou me queira
por perto, pode estar apenas garantindo sua presença quando a songa voltar.
— Chega de conversa. Vamos aproveitar a noite porque hoje eu quero
beber todas.
— Mas não sem antes forrar o estômago com um bom jantar. — Lennon
fala.
— Nem pensar. A gente belisca alguma coisa na boate mesmo.
— Não vamos a lugar nenhum sem um bom jantar antes. — ele fala com
uma autoridade absurda, de um modo que se torna quase impossível
contestar e quando dou por mim estou caminhando de mãos dadas com ele
pelos corredores do hotel.
Mas que merda! Isso não está bom. Eu não devia ter concordado com
nada disto. Devia ter fugido dele quando tive a chance, ainda no palácio.
Agora estou presa em uma gaiola de ouro disfarçada de gentilezas.
Vamos de limusine, com os seguranças nos seguindo, para o Kong, um
restaurante que parece um sonho. Fica no quinto andar de um prédio
luxuoso, tem as paredes todas de vidro transparente, com vista para o Sena.
Tudo ali tem um toque de sofisticação e de muito bom gosto, inclusive a
comida.
Não consigo sustentar meu mau humor por muito tempo, pelo contrário.
Não sei porque a companhia de Lennon me diverte, não é apenas o lugar,
mas a presença dele mesmo. Tudo naquele homem deveria me despertar
repulsa, por tantos motivos que não sei nem por onde começar a enumerar,
mas a verdade é que tudo nele me agrada. Eu gosto do som da sua voz, dos
assuntos que ele aborda, da simplicidade que demonstra apesar de ser um
milionário e de ter um cargo político de poder, do jeito como sorri das
minhas piadas, — nas raras ocasiões em que faço uma, claro —, de como
não se estressa com as minhas ironias. Gosto do cheiro dele, da forma como
me olha, como se quisesse me devorar, do jeito como parece se preocupar
comigo, mesmo sabendo que não sou Lucy, a quem todos direcionam seu
afeto sempre.
Acho que não existe nada nele que eu não goste e sinto que estou ferrada
por isso.
Depois do magnífico jantar, permanecemos a mesa, jogando conversa
fora, saboreando o vinho delicioso, apreciando o ambiente, embora eu mal
consiga desviar os olhos dele para olhar em volta, quando ele tira uma
caixinha quadrada de veludo preta do bolso do seu paletó e entrega-me.
— Isso é pra você. — diz. — Comprei enquanto você estava na sua
suíte.
Antes mesmo de abrir, fico emocionada, pelo simples fato de que nunca
ganhei um presente antes. Eu não sei o que Lennon está querendo com
aquilo, mas seja o que for, está dando certo.
Abro a caixa e fico deslumbrada com os brincos de diamante, pequenos,
porém lindos e tenho certeza que muito caros.
— Minha nossa! Isso deve ter custado uma fortuna.
— Nada perto do que você mereça.
— Por que está fazendo isso? — pergunto.
— Fazendo o quê?
— Sendo tão agradável comigo. Você já teve o que queria de mim e já
sabe que nunca vou ser sua amante.
— A palavra nunca não existe no meu vocabulário. — ele dá uma
piscadela e apesar de parecer irresistivelmente sedutor, jamais vou cair na
sua teia.
— Bem, o dinheiro é seu, gaste como quiser. — tiro os brincos de strazz
que uso e coloco os que ele me deu. — Obrigada.
Após esvaziarmos a garrafa de vinho, voltamos a percorrer as ruas
iluminadas de Paris na limusine. Desta vez o lugar que iremos foi escolhido
por mim, via web, pelo iPhone dele e fico exultante quando estacionamos
diante da Le Cabaret, uma das melhores boates da cidade, pelo menos é de
acordo com a descrição da internet. Nem de longe se parece com os lugares
que estou acostumada a frequentar, este é sofisticado até demais e como
tenho alguém que está a fim de gastar comigo, por que não?
Apesar de ser uma terça-feira, a fila que se estende na entrada é grande,
formada por pessoas bonitas e bem vestidas. Basta que Lennon converse
por cinco minutos com o cara da portaria para que ele nos deixe entrar na
frente, seguidos pela renca de seguranças.
Do lado de dentro o lugar é ainda mais lindo que nas imagens da
internet, tem uma decoração moderna, totalmente futurística, com área vip e
camas espalhadas nas laterais, aliás essa foi a parte que mais gostei.
Lennon e eu subimos para a área vip, enquanto os seguranças se
espalham por toda parte. Ocupamos uma mesa e pedimos vodka em drinks
coloridos, mas não consigo ficar parada por muito tempo, logo vou para a
pista de dança e fico surpresa que ele não me siga.
Ótimo, parece finalmente ter entendido como as coisas vão funcionar
entre nós.
Na pista, abarrotada de dançarinos, me esbaldo ao som de um remix
eletrônico de What Is Love, Haddaway, balançando-me freneticamente ao
sabor do ritmo da música, do jeito que gosto.
Minha nossa! Como isto é bom, como é magnífica a sensação de
liberdade e de euforia que me toma. É em momentos como este que mais
desejo ter uma vida só minha, para jamais ter que me privar de tais
prazeres.
Em instantes me torno o centro das atenções masculinas, há homens me
olhando de todo lado, inclusive os malditos seguranças. Percorro os olhos
em volta, a procura de alguém interessante e constato que os franceses até
que são bonitos, há um ou dois ali que eu poderia levar para a minha cama,
porém, não há nenhum homem ali dentro que me atraia mais que Lennon
Rudolf. Eu demoro a perceber que ele está me observando, de lá em cima,
da área vip, debruçado sobre as barras metálicas de proteção, com seu drink
na mão.
Sua atenção me afeta de um jeito que me assusta, como jamais fui
afetada antes por um homem e mexo o meu corpo com ainda mais
sensualidade, como se, inconscientemente, dançasse para ele.
Contudo, não é com ele que vou para a cama esta noite, isso está fora de
cogitação. Não vou trepar com um sujeito que em breve estará me odiando,
se é que já não odeia, por eu estar ocupando o lugar da sua doce e meiga
songa monga.
Pensando nisso, deixo a pista e sento-me no bar. Peço uma vodka e cruzo
uma perna sobre a outra, enquanto espreito ao meu redor, analisando as
opções. Tem homem de todo jeito ali, loiro, ruivo, moreno, magro,
bombado. O que todos têm em comum é que são franceses, estão bem
vestidos e parecem ser muito ricos.
Vários deles olham fixamente para mim e encaro de volta aquele que
mais me chama a atenção, um moreno alto, forte, que tem uma barba bem
feita e olhos negros bonitos. Pisco para ele e em questão de segundos ele
abandona sua turma para vir se sentar ao meu lado.
De perto, percebo que é ainda mais bonito. Não é nenhum motoqueiro
tatuado, mas acho que serve para me dar uma noite de prazer, pela qual
estou muito ansiosa.
A conversa entre nós é a de sempre: ele pergunta se venho sempre aqui,
de onde sou, se estou gostando do lugar, me oferece outra bebida, me faz
sorrir das suas piadas bobas e por fim me convida para dançar. Está tocando
uma versão remixada de Play Hard, de David Guetta, o que é perfeito para
balançar o corpo e volto a me entregar totalmente ao ritmo da música.
Marion, como se chama minha possível transa de hoje, me acompanha
no mesmo ritmo, se mostrando um excelente dançarino e logo estou
esfregando meu corpo no dele, de forma sensual, buscando a excitação que
é tão prazerosa em momentos como esse.
Não há nada mais gostoso que beber vodka, dançar e sentir tesão, tudo
ao mesmo tempo. É realmente a combinação perfeita. O proprietário da
boate sabia o que estava fazendo quando colocou aquelas camas ali. Já há
inclusive vários casais se pegando sobre elas e tenho a impressão de que
logo serei eu e aquele grandão.
Marion está voltando do bar com duas vodkas, quando a musica
eletrônica dá lugar a uma melodia lenta e romântica e sei que vou me
esbaldar me esfregando toda nele enquanto dançamos. Porém, antes que ele
me alcance, Lennon entra entre nós dois e me agarra pela cintura, me
puxando para junto do seu corpo.
— Desculpa a demora, querida. O trânsito está um inferno. — Lennon
fala e Marion alterna o olhar entre nós dois, especulativamente.
— O que você pensa que está fazendo?! — esbravejo, minha voz se
sobressaindo ao som da música e o empurro, sem que ele se mova um só
milímetro. — Não é o que você está pensando. — Digo para Marion. — Eu
nem conheço esse cara.
Percebo que falei merda só quando o grandalhão deixa os copos com
vodka caírem no chão e avança para cima de Lennon, puxando-o de
safanão, arrancando-o de mim.
Puta merda! Sei que vai fazê-lo em pedaços. Cadê os malditos
seguranças?
Eu ainda os estou procurando com o olhar, pelos arredores, quando ouço
um baque violento e quando penso que Lennon foi derrubado pelo grandão,
vejo o corpo enorme de Marion se estatelando no piso ao meu lado. Por
incrível que pareça, Lennon conseguiu nocauteá-lo com um soco apenas e
os dançarinos estão tão loucos na pista que não se dão nem ao trabalho de
interromper a dança para observar a briga.
Marion se levanta e avança para Lennon como um touro feroz. Sei que é
agora que vai acabar com ele, porém, para minha surpresa, Lennon mais
uma vez mostra uma agilidade impressionante e uma habilidade espantosa
para a briga, dando vários socos no estômago do outro cara, sem ser
atingido nenhuma vez.
Marion está apanhando como um moleque, em total desvantagem, apesar
de ser muito mais novo e maior que Lennon.
Vendo o que se passa, alguns caras da turma dele avançam para cima de
Lennon e é nesse instante que os seguranças interferem, colocando-se na
frente dos caras, de forma ameaçadora, quando então eles recuam e levam o
amigo, possesso, embora.
Estou perplexa com o que acaba de acontecer. Como um sujeito careta e
certinho igual aquele pode brigar tão bem?
Os seguranças se afastam e Lennon volta a me agarrar pela cintura, nos
embalando pela pista, no ritmo da musica lenta, como se nada tivesse
acontecido.
— O que você pensa que está fazendo? — eu indago, atônita.
— Aquele cara não serve pra você. — ele diz, ainda ofegante pela luta.
— E quem serve, você?
— Pois é, eu sirvo. — ele dá de ombros.
Tento me soltar, ele me aperta mais forte e traz sua boca gostosa para a
minha orelha, mordisca-a e desce pelo meu pescoço, beijando e lambendo
minha pele e é assim que começo a amolecer em seus braços, tomada pelo
mais furioso desejo que me impede até de pensar direito.
Ai meu Deus! Estou perdida. Como posso resistir a esse homem se cada
célula do meu corpo implora por ele?
Lennon mantém um braço em torno da minha cintura para garantir que
eu não lhe escape, leva a outra mão aos meus cabelos, segurando-os atrás da
minha cabeça e puxa-os até que meu rosto se erga para ele. Fita-me
diretamente nos olhos por um instante, me deixando ainda mais sem fôlego
e trás a sua boca para a minha.
Não consigo evitar o beijo. Acho que a música e o efeito da vodka
contribuem para isto e quando dou por mim sua língua está dentro da minha
boca, se movendo contra a minha, o que me faz perder de vez todas as
minhas resistências.
CAPÍTULO XX
De súbito, tudo à nossa volta deixa de existir: a boate, a música, as
pessoas, meu mundo, meu corpo, meu tudo parece se resumir a Lennon
Rudolf e às sensações que aquele beijo me despertam.
Tudo em mim se transforma em luxúria, o desejo que me toma jamais foi
tão insano, intenso, feroz e deixo isso claro quando o abraço pelo pescoço,
puxando-o mais para mim, apertando mais meu corpo no seu, chupando sua
língua com lascívia, experimentando a ereção firme e poderosa contra meu
corpo que parece muito frágil perto do dele.
Eu nem lembrava que tenho um coração e agora ele bate tão depressa
que posso senti-lo contra as minhas costelas, assim como sinto as batidas do
coração dele.
— Vamos para o hotel. — Lennon sussurra, escorregando sua boca pela
minha face até alcançar meu ouvido.
Só então me dou conta de que paramos de dançar há algum tempo. Tento
pensar, me lembrar do que me impede de me entregar àquele homem se isso
parece ser tudo o que eu quero nessa vida. Então me lembro de que pode
não ser a mim que ele realmente quer.
Eu podia jogar todos aqueles pensamentos para o alto e viver a mais
deliciosa aventura nos braços dele, afinal não passaria de uma aventura,
como foi com tantos outros, como quase aconteceu com Marion, mas eu
simplesmente não consigo esquecer de que aquele homem só está aqui
comigo porque quer minha outra metade, uma metade que me recuso a
assumir e que se eu for em frente, logo ele estará me odiando pelo fato de
eu não ser quem ele quer e tentará se livrar de mim, mas eu preciso de vida.
— Não posso. — respondo, perdida, toda mole em seus braços.
Sinto seu corpo grande e esguio estremecer de encontro ao meu. Acho
que aquele homem não está acostumado a receber o não de uma mulher. Só
que ele precisa aprender.
— Só me diz o porquê. — ele exige, puxando meus cabelos com mais
força, quase me machucando.
— Eu não te quero. Agora me solta, se não vou fazer um escândalo.
— Você ia transar com um cara que você nunca viu na vida. — ele está
inconformado.
— Por isso eu ia, porque não o conheço. Ele não sabe que sou alguém
que vai deixar de existir em alguns dias, ou algumas horas. Não vai exigir
que eu parta para que Lucy esteja de volta.
— É isso que você acha eu vou fazer?
— Eu não acho, tenho certeza. Agora me solta.
Ele está indignado, seu olhar carregado de fúria, mas por fim me solta.
Passa os dedos pelos cabelos, se mostrando nervoso e diz:
— Está certo. Não vou mais insistir. Arranje outro brutamontes e divirta-
se. Só não desaparece depois.
— Por que você precisa de Lucy? — aquela constatação nunca me doeu
tanto.
Que merda! Esse cara está mexendo com emoções que eu nem sabia que
tinha.
Ele não responde, visivelmente nervoso, me da as costas e desaparece
em meio aos dançarinos.
Minhas pernas estão tão trêmulas que tenho dificuldade de chegar até o
bar para me sentar um pouco.
Que beijo foi aquele? Que homem é esse? Por isso a songa não resistiu,
ele é gostoso demais, sensual demais, atrevido e sedutor demais. Por pouco
eu não resisto também.
Ainda sinto o gosto daquela boca na minha, o latejar do seu corpo contra
o meu, a umidade no meio das minhas coxas, quando peço outra vodka e
não quero nem saber se ele foi embora e eu não tenha como pagar. Arranjo
um babaca que faça isso.
Bebo duas doses de vodka enquanto me recomponho e enquanto espero
as músicas românticas acabarem. Então, volto para a pista de dança com
todo gás e me balanço com tudo ao som das músicas eletrônicas.
Eu preciso voltar a Paris mais vezes, aqui é realmente o melhor lugar
para se divertir.
Espreito à minha volta, a procura de algum gatinho que me interesse. Há
muitos deles me observando com segundas intenções, mas depois daquele
beijo nenhum homem parece ter graça, nenhum consegue me atrair, eu só
consigo pensar em Lennon.
Percebo que ele ainda não foi embora quando vejo seus seguranças por
todos os lados, mas onde está? E por que eu quero saber?
Olho na direção da área vip e não o vejo. Tento esquecer, não consigo.
Continuo dançando, mas com aquele homem na cabeça.
Por fim o enxergo do outro lado da pista, dançando no ritmo da musica
agitada, com tanto charme e perfeição que é impossível não ficar com água
na boca. E parece que eu não sou a única a notar aquilo, visto que há um
círculo de mulheres oferecidas se formando em volta dele.
Continuo observando de onde estou, sem saber se ele está me vendo,
acho que não.
Uma das mulheres, uma ruiva alta, linda, dentro de um vestido cor de
prata, parece atrair mais a atenção dele que as outras e é dela que ele se
aproxima, dançando tão perto que estão quase se tocando.
Minha nossa! Como ele dança bem. É sem sobra de dúvidas o homem
mais atraente naquela boate e a ruiva parece ter se dado muito bem, porque
foi escolhida por ele e já estão quase se esfregando na pista. Daqui a pouco
irão para uma das camas, tenho certeza. Ninguém dança daquele jeito a
menos que esteja a fim de trocar uns amassos, conheço bem o ritual.
A mulher parece uma desesperada se jogando para cima dele, daqui a
pouco os dois estarão se comendo ali mesmo.
Tento afastar minha atenção deles, olhando para um loirinho que não
desvia seu olhar de mim. Pode ser minha próxima conquista, pois é
bonitinho, mas não chega aos pés de Lennon.
Olho novamente para ele e vejo a ruiva com as costas coladas no seu
peito, rebolando a bunda no pau dele. Mas já?
Percebo o quanto estou sendo idiota de entregá-lo assim de mãos
beijadas a outra mulher, de não me render ao desejo mais intenso que já
senti na vida e é então que decido que está na hora de quebrar a única regra
que impus na minha existência.
Determinada, vou até Lennon, puxo-o pela gola da camisa, afastando-a
da periguete ruiva e agarro-o pelo pescoço, ficando na posta dos pés para
alcançar seus lábios com os meus.
Ele não hesita e retribui ao beijo, quase devorando minha boca, me
deixando completamente sem fôlego.
Minha nossa! Que homem é esse? Parece ter sido feito para enlouquecer
uma mulher.
Sinto a mão da periguete ruiva cutucando meu ombro. Deve estar
inconformada e quer Lennon de volta, só que esta noite ele vai ser meu.
— Fala pra essa garota parar de me cutucar se não vou nocautear ela
igual você fez com o grandalhão. — falo, sem desviar meus olhos dos dele
e sem desfazer o abraço.
— Não vai ser preciso. Os seguranças estão instruídos a dar um jeito em
qualquer um que tocar um dedo em você.
Surpresa, olho para trás e vejo um dos seguranças conduzindo,
gentilmente, a mulher para longe.
— Que doideira. Até parece que você já sabia que eu viria.
Ele acaricia minha face com o polegar.
— Eu não sabia, mas estava torcendo muito para que acontecesse.
O tom da sua voz é rouco, sensual e não tenho dúvida nenhuma de que
quero ser sua.
— Quero ir pro hotel com você. — declaro.
— O hotel está muito longe. Vem cá.
Ele segura-me a mão e me conduz para uma das camas da boate, a
última e mais escondida delas. Puxa uma cortina escura, cuja existência eu
desconhecia, que nos separa da movimentação de pessoas, nos deixando
relativamente sozinhos. Pelo menos sem sermos vistos, embora possamos
ver a silhueta dos dançarinos do outro lado.
— Tem certeza de que quer fazer isso aqui? Alguém pode entrar de
repente. — mal posso acreditar que fui eu a fazer esta pergunta, visto que
sou a louca entre nós dois.
— A única certeza que tenho é que quero você pra mim e não posso
esperar nem mais um minuto.
Com isto, ele ataca minha boca com a sua e abraça-me apertado, colando
seu corpo no meu de cima à baixo, intensificando o desejo selvagem que
fez nascer dentro de mim desde o primeiro beijo.
Ele chupa minha língua com lascívia enquanto enfio minhas mãos sob
sua camisa e acaricio os músculos do seu abdome e do seu tórax, fascinada
com o quanto são duros e bem definidos. Minhas mãos parecem ter vida
própria e passeiam pelo seu corpo com um desejo descomunal de explorá-
lo, vão para as suas costas, depois descem pelo seu colo até encontrarem e
ereção firme e enorme por sobre a calça.
Minha nossa! Como é grande e grosso! É hoje que vou me acabar de
tanto gozar.
Lennon escorrega suas mãos pelas minhas costas desnudas e as enfia sob
a saia minúscula do vestido, deixando escapar um gemido quando encontra
minha intimidade úmida e lisa, desprovida de calcinha.
— Ai, meu Deus... sem calcinha... — ele geme rouco novamente na
minha boca e aperto seu pau mais forte entre meus dedos.
Com um gesto muito rápido, Lennon me vira de frente para a cama e me
faz inclinar o corpo, minhas mãos apoiadas na lateral do espaldar, minha
bunda empinada. Arrasta a saia curta do vestido até minha cintura, abre
mais minhas pernas e alisa a fenda entre minhas nádegas antes de me dar
um tapa estalado na bunda.
— Eu te disse que ia te fazer pagar por me morder. — ele fala, sua voz
rouca entrecortada pela respiração ofegante. — Agora vai ter que aguentar.
Meu corpo vibra em expectativa e permaneço naquela posição, ansiosa
pelo está por vir.
Ele se agacha atrás de mim, me dá um tapa na outra nádega e trás sua
boca para meu corpo, ali atrás, sua língua gostosa dança freneticamente
sobre meu anus, tentando abrir caminho, enquanto suas duas mãos apertam
minha bunda.
Sua boca escorrega para a minha boceta e quase solto um grito de prazer
quando a ponta da sua língua alcança meu clitóris, movendo-se sobre ele,
rapidamente, em círculos, me enlouquecendo de prazer. Quando meu ponto
mais sensível está inchado com suas lambidas deliciosas, ele o segura entre
os lábios e suga devagar, me deixando ainda mais excitada.
— Ahh, delícia... — o gemido me escapa alto.
É incrível como tudo se torna mais intenso pelo fato de estarmos dentro
de uma boate abarrotada de gente, podendo ser apanhados a qualquer
momento, ouvindo a música alta como se estivéssemos na pista e vendo os
jogos de luzes coloridas bailando do lado de lá da cortina. É como transar
dentro da balada.
— Gosta disso? — indaga ele.
— Sim... muito... — e gosto mesmo, especialmente do jeito que ele está
fazendo.
Ele me suga mais forte antes de voltar a me lamber, sua língua se
movendo depressa sobre meu clitóris, enquanto suas mãos apertam minha
nádegas com força e o orgasmo vem arrebatador, rasgando tudo dentro de
mim, me fazendo gemer alto e me contorcer inteira.
Lennon enterra sua língua na minha vagina para saborear os resquícios
do meu prazer antes de se levantar.
Tento erguer-me também, mas suas mãos fortes me seguram pelas
costas, mantendo-me naquela posição.
— Ainda quero você assim, fica quietinha.
Olho parta trás e o vejo descer sua calça e a cueca até os joelhos,
desnudando o pau duro, grande e grosso, que me parece a oitava maravilha
do mundo e faz minha vagina lambuzada latejar desejosa.
Ele tira um pacote de preservativos do bolso da sua camisa, abre a
embalagem com os dentes e se cobre. Novamente, agacha-se atrás de mim e
coloca sua língua sobre meu ânus, acariciando-o em movimentos circulares,
lubrificando-o. Em seguida, introduz um dedo, devagar, abrindo passagem.
— Vou te foder aqui atrás. Esse é o seu castigo. — ele diz e sibila
excitado.
Meu corpo parece reagir sozinho à sua voz e meus quadris se movem na
mão dele, buscando-o mais.
— Que delícia... — falo, excitada.
Lennon enterra outro dedo ali atrás, com cuidado para não me machucar,
move-os em vai e vem dentro do meu orifício pequeno e volta a lamber um
clitóris, me fazendo gemer alto, ensandecida de desejo.
Puta merda! Eu já imaginava o quanto ele é gostoso, mas não pensei que
fosse tanto.
Novamente se levanta, coloca-se em pé atrás de mim, segura seu pau
pelo meio e esfrega sua glande na entrada da minha vagina, me deixando
ainda mais quente e lambuzada, loucamente excitada, ansiosa por tê-lo todo
dentro de mim. Mas ele não parece ter pressa alguma, calmamente,
escorrega seu pau da minha vagina para meu anus, espalhando meus
líquidos ali atrás até que eu esteja bem melada, preparada para recebê-lo.
Por fim, pressiona a glande sobre meu orifício mais estreito, devagar,
abrindo passagem e quando o primeiro centímetro escorrega para dentro a
dor lancinante me toma tão fortemente que solto um grito agudo.
Puta merda! Ele é grande demais. Acho que não vou aguentar.
Tento me esquivar, mas Lennon não permite, em vez disso, me segura
firme no lugar, suas mãos agarrando os dois lados dos meus quadris.
— Quietinha. Você me deve isso. Relaxa e não tente lutar. Daqui a pouco
seu corpo se acostuma comigo.
— É muito grande. Não vou aguentar.
— Claro que vai. Te garanto que você vai até gostar e pedir por mais.
Sem mais mover seus quadris, ele da um tapa na minha bunda e inclina
seu corpo sobre o meu. Sua boca vai para a minha orelha, mordisca o
lóbulo, depois escorrega para a minha nuca, onde planta mordidas
deliciosas, ao mesmo tempo em que suas mãos vão para a parte da frente do
meu vestido, escorregam-no para baixo, até a minha cintura e seguram
meus dois seios, massageando meus mamilos entre seus dedos.
Minha nossa! Que delícia! Aquilo é suficiente para que eu esteja
novamente em chamas, louca por senti-lo e movo-me para trás, seu membro
gigantesco escorregando mais para dentro de mim.
— Ah... delícia... — Lennon geme no meu ouvido e fico ainda mais
perdida de tesão.
Movo-me novamente e ele se enterra mais um pouco. Devagar, o tesão
vai se sobressaindo à dor. Continuo me movendo até que sinto seus pelos
púbicos roçando na minha bunda e sei que o tenho todo enterrando em
mim. A sensação é de que serei partida ao meio a qualquer momento, mas é
uma sensação boa, de que tenho por completo.
Lennon ergue seu torso, segura meus quadris dos dois lados novamente e
começa a mover-se dentro de mim, em vai e vem, entrando e saindo,
primeiro devagar, para então acelerar os movimentos, indo cada vez mais
fundo, sua pélvis peluda se chocando contra minha bunda.
Estou extasiada, dominada pela luxúria, tão ensandecida de prazer que a
dor deixa de existir e tudo o que quero é que ele se mova ainda mais
depressa, que meta com força no meu canal. Quero que o tempo pare aqui
mesmo para que esse momento nunca mais termine.
Jamais antes experimentei algo que se igualasse a isso. Seu corpo parece
ter sido moldado na medida certa para me dar prazer, nunca mais quero
parar.
Ensandecida, começo a arremeter meus quadris contra ele, pedindo por
mais, rebolando no seu pau gostoso e sou recompensada por um gemido
selvagem que parece partir do fundo da sua alma.
— Porra... que delícia... — as palavras me escapam.
— Que cuzinho apertado do caralho. — Lennon solta.
— Come ele, benzinho, é todo seu, me deixa toda esfolada com esse pau
gostoso... ahhhh
Ele enche sua mão com meus cabelos, atrás da cabeça, e me puxa para
cima, minhas costas encontrando seu tórax ainda protegido pela camisa, sua
boca tocando minha orelha, mordendo-a, enquanto sua outra mão escorrega
para minha boceta, seus dedos massageando meu clitóris, sem que ele pare
de se mover dentro de mim.
— Ahhh! Porra! — o grito sai da minha boca sem que eu tenha controle
algum.
Abro mais minhas pernas para que ele tenha mais acesso ao meu clitóris
e seguro um lado do seu quadril, puxando-o mais para mim. Estou muito
perto de gozar quando a ordem é sussurrada no meu ouvido.
— Goza pra mim, gatinha...
É o suficiente, logo estou explodindo em um orgasmo arrebatador, me
esvaindo em lágrimas, gritando alto, enquanto ele se mantém enterrado em
mim até a raiz e seus dedos continuam me massageando onde sou mais
sensível.
Quando e êxtase passa, me sinto toda mole, com meus membros
pesados, meu corpo lânguido. Só não caio de bruços na cama porque
Lennon me segura, contornando seu braço na minha cintura.
Ele se retira de mim e me vira de frente. Suga meu lábio inferior, depois
o superior, para em seguida morder o meu queixo, devagar, gostosamente.
— Isso foi pra você aprender a nunca mais me morder. — ele escorrega
aquela boca deliciosa pelo meu pescoço, onde planta uma trilha de beijos e
lambidas. — E nem pense em ficar cansada agora, porque estamos só
começando.
Eu o abraço pelo pescoço e o beijo no queixo e na face.
— E quem disse que estou cansada? — falo. — Agora eu vou querer
esse pau gotoso toda hora.
CAPÍTULO XXI
Sua mão escorrega para o meu sexo, dois dos seus dedos deslizam para
dentro da minha vagina lambuzada, fodendo-a em vai e vem.
— E eu vou te dar, ah, se vou... — ele diz, num sussurro rouco.
Sem aviso prévio, volta a me abraçar pela cintura e segura meus cabelos
atrás da cabeça, puxando-os com força, me fazendo inclinar para trás,
debruça-se sobre mim e abocanha um dos meus seios.
Ele não mama o peito como os outros homens, que vão direto chupando.
Primeiro brinca com o mamilo sob a ponta da sua língua, depois segura o
bico intumescido entre seus dentes, sem apertar, e faz uma deliciosa
massagem, para só então começar a sugar, como um esfomeado e isso me
deixa doida, totalmente tomada pelo tesão, toda quente, ainda mais
molhada, prontinha para dar para ele de novo.
Lennon parte para o outro peito e repete a proeza, quando então enterro
meus dedos em seus cabelos curtos e o empurro ainda mais para mim, me
empinado mais para ele, porque me sinto tão dele que chega a ser
assustador.
Ele me solta e se afasta o suficiente para tirar sua camisa, a calça e a
cueca.
Observo-o e fico fascinada com o quanto é gostoso, com aquele corpo
longo, esguio, os ombros largos, as coxas peludas. Os flashes dos jogos de
luzes coloridas que partem da pista de dança bailam sobre ele e o tornam
ainda mais bonito, tão atraente que ficar longe se torna impossível e volto a
abraça-lo e beijá-lo na boca.
Beijo-o no queixo, no pescoço e continuo descendo minha boca pelo seu
corpo sólido e gostoso. Sento-me na beirada da cama, nivelando minha face
ao minha face ao seu pau enorme, totalmente ereto, ainda vestido com a
camisinha vazia. Tiro-a com cuidado e seguro aquela maravilha entre meus
dedos, me lambuzando com os seus líquidos.
Definitivamente é o maior que já vi e também o mais bonito, todo
retinho, com a grande rosada e as veias protuberantes.
Sequiosa, o coloco na boca. Primeiro passo minha língua em torno da
cabeça, inebriada com sua maciez, com o gosto salgado do liquido que
escorre da ponta, depois levo minha língua até a raiz, trago de volta e por
fim o engulo, levando-a até minha garganta, trazendo de volta, com cuidado
para não tocar os meus dentes.
Ele é delicioso e macio, seu gosto me deixa ainda mais excitada.
Passo a língua pelas suas bolas limpas e depiladas antes de colocá-las na
boca e segurar devagar, quando sou recompensada pelo seu gemido rouco.
Volto a chupar o seu pau, depressa, depois devagar, novamente depressa,
enquanto o masturbo na base com uma mão, masturbando e chupando ao
mesmo tempo, do jeito que gosto. Mesmo quando levo-o até a minha
garganta, ele não entrou todo, porque é grande demais.
— Ahhh, isso é muito bom, mas agora quero essa bocetinha como prato
principal. — Lennon segura meus cabelos e me puxa para cima, toma-me a
boca, chupa minha língua e me faz chupar a sua, com lascívia.
Ele tira outro preservativo do pacote jogado no chão e coloca. Ergue-me
em seus braços, deita-me de costas na cama e monta-me, encaixando seus
quadris entre minhas pernas. Não usa de nenhuma gentileza ao me penetrar,
entrando em mim com um golpe único e violento, para em seguida parar,
todo enterrado no meu canal e me beijar na boca de um jeito ainda mais
selvagem. Aparta sua boca da minha, ergue-se e torna a me golpear, com
força, indo fundo, me abrindo toda, seu tamanho me esticando as paredes da
minha vagina, tão deliciosamente que meus gemidos vão se transformando
em gritos ensandecidos.
Estou me acabado de prazer debaixo daquele homem que me faz parecer
pequena sob seu corpo grande, me dando e recebendo o que há de melhor.
Abraço seus quadris com minhas pernas e rebolo, esfregando minha pélvis
na dele antes da próxima estocada. Passo minhas unhas crescidas pelos
músculos das suas costas e nádegas, extasiada com sua masculinidade viril.
Sem deixar o meu interior, Lennon inverte as posições, deitando-se e
colocando-me por cima dele. Apoio os pés no colchão, as mãos em seu
peito largo e me movo para cima e para baixo, freneticamente, depois
rebolo e subo e desço de novo, sem em nenhum momento desviar meus
olhos do rosto dele, fascinada com sua expressão de prazer, sua boca aberta
para puxar o ar, sua face contorcida. Eu ainda não tinha presenciado um
espetáculo tão magnífico quanto aquela expressão.
Suas mãos habilidosas passeiam pelo meu corpo, pelas coxas, quadris,
cintura e por fim seguram meus seios, apertando-os devagar, me deixando
ainda mais doida, quase a ponto de explodir em outro orgasmo.
Sem sair de mim, ele se senta e contorna minha cintura com um braço,
me apertando contra seu corpo, seu peito rochoso esmagando meus seios,
deliciosamente. Com a outra mão segura meus cabelos e guia minha boca
até a sua. O beijo vem selvagem e brusco, quase violento, denunciando o
estado da sua excitação.
— Sam... — ele geme meu nome e quase vou à loucura. — Eu não quero
gozar agora, mas você me deixa louco...
— Não goza ainda... não quero parar...
— Não precisamos parar.
Ele me joga na cama, sobe em mim e pendura minhas pernas em seus
ombros. Mete com tanta força, tão bruscamente, que acho que vou ser
partida ao meio a qualquer momento. Cada estocada é um grito que solto,
posso senti-lo muito fundo e isso é enlouquecedor.
— Goza comigo, Sam... — sua voz parece um rosnado e é o comando do
meu corpo.
Logo estou explodindo novamente, convulsionando na cama, gozando
junto com ele, minha vagina se contraindo e relaxando em torno da sua
rigidez, seus espasmos se fazendo contra minhas paredes, nossos corpos
ondulando juntos até ficarem imóveis, lânguidos.
Lennon deixa o peso do seu corpo cair sobre mim e posso sentir seu
coração batendo depressa contra meu peito, assim como posso ouvir o som
da sua respiração muito ofegante.
Enterro meus dedos em seus cabelos curtos, acariciando seu couro
cabeludo, com um afeto genuíno transbordando em meu peito e ele me
retribui com um beijo calmo e demorado na boca.
— Isso foi perfeito. — eu falo e é verdade. Eu sempre gostei de sexo,
mas nunca tinha sido tão bom antes.
— Foi perfeito para mim também. — ele diz, sem desviar seus olhos dos
meus.
Lennon se retira de mim e estende seu corpo grande ao lado na cama.
Está tirando o preservativo cheio quando dá um pulo da cama, de repente.
Assustada, sigo a direção do seu olhar bem a tempo de ver o vulto de
uma pessoa, que estava atrás da cortina, sair correndo.
— Tinha alguém nos observando. — ele diz alarmado.
— Estamos em uma boate cheia de gente. Isso era o mínimo que podia
acontecer. — tento tranquilizá-lo, mas não adiante, logo ele está tirando seu
iPhone do bolso da calça e falando com um dos seguranças.
— E então? Outro detetive do Hudson? — indago, quando ele desliga,
esticando-me sobre a cama, preguiçosamente, observando-o vestir suas
roupas.
— Eles não viram o cara, da pra acreditar? — ele diz, nervoso. —
Precisamos sair daqui, não é seguro.
— Mas já? Está tão gostoso.
— Vamos pro hotel, vai ser gostoso lá também.
Fico emburrada, mas não tem jeito, Lennon é muito mandão e quando
decide por alguma coisa, nada o faz mudar de ideia. Então, levanto-me,
ajeito meu vestido no corpo e estou pronta para sair.
— Ainda te devo umas palmadas por andar por aí sem calcinha. — ele
diz, com irreverência.
— Jura? Acho que vou gostar disso.
Ele sorri e deixamos a proteção da cortina de mãos dadas, como dois
namorados.
A boate continua lotada de pessoas que se agitam ao sabor da música.
Agora as cotinas em volta das camas estão quase todas puxadas e sorrio ao
imaginar o que estão fazendo lá dentro, aposto como há mais de duas
pessoas na maioria delas. É o que acontece quando as pessoas estão na
balada, bêbadas e largadas.
Ao passarmos pelo bar, não resisto, solto a mão de Lennon e aproximo-
me a fim de tomar mais uma vodka.
— O que você está fazendo, vamos sair daqui. — ele diz atrás de mim,
autoritário como sempre.
Viro-me e fico fascinada com sua aparência. Está mais irresistível que
nunca com os cabelos curtos emaranhados, a camisa de seda de mangas
compridas toda amarrotada, com a bainha jogada por cima da calça. É sua
aparência pós foda e isso nunca me pareceu tão fascinante em um homem.
— Vamos tomar só mais uma vodka. — falo e vou logo pedindo ao bar-
man.
— No hotel tem vodka. — ele contesta.
Sento-me totalmente de costas para o bar, com os cotovelos apoiados no
balcão e cruzo uma perna sobre a outra.
— E que graça tem beber trancada em um quarto?
Ele respira fundo, derrotado.
— Pelo menos se senta direito, você está sem calcinha. — diz, olhando
em volta.
Sua atitude me arranca uma gargalhada sonora.
Ele se senta ao meu lado e não resisto, viro-me de frente para ele e
descruzo as pernas, afastando-as um pouco e fico satisfeita quando seu
olhar vai direto para a minha intimidade desnuda.
— Está tentando deixar todos os homens da boate de pau duro? — ele
indaga e solto outra gargalhada.
— Não. Só você mesmo. — ele volta a percorrer seu olhar ao redor,
espreitando.— Relaxa, só você pode ver. — falo.
A vodka chega e a saboreamos devagar.
Vejo Lennon transpirando, a protuberância se fazendo na sua calça. Sinto
vontade de despi-lo ali mesmo e chupar o seu pau na frente de todo mundo.
Quero muito aquele pau na minha boca. Quero tanto que dispenso a balada
e concordo em irmos embora quando ele chama de novo.
A limusine conduzida por um dos seguranças, seguida por outro carro
cheio deles, nos apanha na saída da boate e nos conduz pelas ruas
iluminadas e calmas, quase sem trânsito, de Paris.
Assim que entramos, Lennon me joga deitada sobre o assento e pula
sobre mim, me beijando na boca até que eu esteja sem fôlego, esfregando
sua ereção, protegida pela calça, sobre meu sexo desnudo, me deixando
louca de tesão.
Em questão de segundos, meu vestido está enroscado na minha cintura e
a boca dele está em um dos meus peitos, chupando gostosa, brincando com
o mamilo duro entre seus dentes, enquanto sua mão massageia o meio das
minhas coxas, ora no meu clitóris, ora na entrada da minha vagina, me
levando muito perto do êxtase.
Eu enfio minhas mãos trêmulas sob sua camisa, percorrendo o contorno
dos seus músculos firmes e bem definidos. Depois as levo ao fecho da sua
calça, abro e seguro o pênis duro e grosso entre meus dedos, sentindo-o
pulsar, quente e gostoso.
Não posso mais esperar, eu preciso tê-lo agora dentro de mim, não é
apenas um desejo, é quase uma necessidade e Lennon parece saber disso,
pois atende-me ao se sentar, abaixar sua calça, tirar sua camisa e me puxar
para si, sentando-me à cavaleiro sobre suas coxas peludas. Tira outro pacote
de preservativos do bolso da calça e entrega-me.
Não precisa dizer nada para que eu tire um dos preservativos da
embalagem e o desenrolo sobre sua masculinidade, com minhas mãos ainda
trêmulas.
— Senta no meu pau, gostosa. — ele diz e dá um tapa estalado na minha
bunda, apertando o lugar em seguida.
Sem pensar duas vezes, coloco-me sobre seu colo, uma perna de cada
lado, os joelhos apoiados no estofado. O encaixo na minha entrada e vou
descendo devagar, experimentando, extasiada, cada centímetro da sua
masculinidade escorregando para dentro de mim, sem desviar meus olhos
dos dele nem por um segundo.
— Ahhh Lennon... — as palavras me escapam quando o tenho todo
enterrado no meu canal, me preenchendo ao extremo, sua pélvis peluda
tocando o meu clitóris, magnificamente e começo a rebolar como uma
ensandecida, meus gemidos se transformando em gritos.
Eu movo-me sobre ele, para cima e para baixo, depois em círculos,
levando-o muito fundo no meu interior, seu tamanho me deixando à beira
da loucura, uma loucura da qual me recuso a sair.
— Delícia... que bocetinha apertada... — ele sibila, leva as mãos aos
meus seios, massageia meus mamilos, depois segura-me pelos quadris e me
ajuda a me mover, levando-me para cima e para baixo.
Estou muito perto de explodir, quando Lennon me tira de cima dele, me
beija na boca com lascívia, chupando minha língua, para depois nos deitar
de lado no assento estreito, se colocando atrás de mim. Ergue minha perna e
penetra-me por trás, sua rigidez invadindo minha vagina escorregadia com
um golpe brusco, seguido de outro e mais um. Ele não para de se mover
desse jeito, em vai e vem, entrando e saindo, me proporcionando tanto
prazer que me sinto totalmente perdida, ouvindo meus próprios gritos
ecoando alto dentro de veículo.
Sua boca gostosa vem para a minha orelha, mordiscando-a e sua mão
escorrega para a minha boceta, seus dedos se movendo com habilidade
sobre meu clitóris, deixando-me ainda mais doida.
Ergo mais minha perna, para dar mais acesso à sua mão e arremeto meus
quadris para trás, contra ele, com força, depressa, dando-me, recebendo-o e
é assim que mergulho no mais profundo êxtase, um orgasmo tão arrebatador
que as lágrimas fogem dos meus olhos, meu corpo sacode todo, meus gritos
partem incessantes.
Quando alcanço a calmaria e meu corpo fica imóvel, lânguido sobre o
assento, Lennon se retira de mim, ainda duro, pulsante, deita-me de frete e
me beija na boca, com selvageria, exigindo que eu chupe sua língua e faço
de bom grado. Depois desce seus lábios pelo meu corpo trêmulo, beijando
meu pescoço, chupando meus peitos até que a chama do tesão esteja reacesa
dentro de mim, fazendo minha pele arder, o meio das minha coxas pulsar.
Sua boca escorrega para a minha intimidade e sua língua mergulha entre
meus grandes lábios, movendo-se sobre meu clitóris, arrancando-me um
grito, do mais insano prazer. Abro mais minhas pernas para dar-me mais a
ele e, sem deixar de me lamber, Lennon enterra seu polegar na minha
vagina, ao mesmo tempo que seu dedo indicador entra no meu ânus, me
fodendo desse jeito, em vai e vem, duplamente.
Puta merda! Eu estou quase explodindo de novo, nem parece que acabei
de gozar. Que poder é esse que Lennon tem sobre mim?
Antes que meu corpo mergulhe novamente no êxtase, ele para. Ergue seu
corpo e ordena com uma autoridade meio selvagem:
— De quatro. — a voz soa em um tom que não deixa espaço para
contestação e meu corpo vibra em expectativa.
Obedeço prontamente, me colocando de quatro na frente dele,
empinando minha bunda e o sinto se encaixar atrás de mim, para que logo o
golpe venha violento e ele está todo enterrado na minha vagina.
— Ahhh... — eu grito alto e minhas paredes lambuzadas o apertam,
contraindo e relaxando em torno da sua rigidez, involuntariamente.
— Assim... delícia... morde o meu pau com essa bocetinha... ahhh — ele
geme e arremete seus quadris contra mim cada mais depressa, indo tão
fundo que posso senti-lo me empurrando por dentro, tão firme que nada
mais me parece faltar nesse mundo, apenas aquele homem me basta.
O som da sua pélvis se chocando contra a minha bunda ecoa alto, se
misturando aos meus gemidos e não demora muito para que eu me
aproxime do êxtase de novo. Desta vez ele vem comigo, posso sentir na
forma como fica mais duro no meu interior. Então, explodimos juntos,
gozando gostoso, seus espasmos contra as minhas paredes deixando tudo
mais intenso, ensandecedor.
Ainda estamos gozando quando caio de bruços no assento e Lennon se
deixa cair sobre mim, nossos corpos suados ondulando juntos, até ficarem
imóveis.
Quando a calmaria nos toma, o mais completo silêncio se faz no interior
do veículo e só então percebemos que estamos parados.
Olhamos ao mesmo tempo através do vidro e enxergamos o prédio
luxuoso do hotel do lado de fora, quando então damos início a uma crise de
risos.
— O motorista deve estar horrorizado. — falo, sem conseguir parar de
gargalhar.
Sem pressa alguma, Lennon se retira de mim, vira-me de frente e espalha
beijos pela minha face e meu pescoço.
— Ele que se foda. O salário que pago é alto o bastante para que me
espere trepar.
Sorrimos um pouco mais e por fim conseguimos nos apartar.
Na suíte do hotel, não arranjamos tempo nem para cochilar, tudo o que
conseguimos é transar. É como se existisse uma fome dentro de nós que
esperou a vida inteira pelo outro para ser saciada. Pelo menos é como me
sinto e tenho a impressão de que não é diferente com ele.
Aquele homem me completa de uma forma espantosamente perfeita,
como jamais foi com outro. A cada minuto que passo com ele, o desejo de
tê-lo comigo parece aumentar.
Já é dia quando meu corpo alcança a completa exaustão e adormeço
agarradinha com ele, completamente nua, sem saber se ainda estarei aqui
quando acordar, mas o cansaço é tanto que não tenho tempo nem de me
despedir. Mesmo que eu não volte, aqueles dois dias valeram à pena, por ter
conhecido aquele homem, estou levando seu cheiro e seu gosto junto
comigo e tenho certeza de que vai ser a primeira coisa que sentirei quando
retornar.
CAPÍTULO XXII
Para minha total satisfação, ainda sou eu quando acordo completamente
nua na cama, abraçada a Lennon, que ainda dorme. Estou toda dolorida,
principalmente no meio das pernas, mas é um dor que vale á pena, pela
forma como foi adquirida.
Os dois dias seguintes são os melhores da minha existência. Apesar de
estar pendurado no telefone a cada cinco minutos, Lennon não sai do meu
lado para nada. Ainda naquela manhã, leva-me em seu avião particular para
conhecer a Itália. É onde encontramos uma praia deserta, linda demais, com
areias brancas e a água azul turquesa, na qual posso correr nua como
sempre desejei fazer e nunca tive a oportunidade, com a brisa do mar
acariciando meu corpo todo, embora a melhor parte seja quando fazemos
amor ali mesmo, na água do mar, como se pertencer àquele jomem fosse o
último resquício de oxigênio da terra.
Passeamos de gôndola em Veneza abraçadinhos como dois namorados e
saltamos de bungee-jumping na ponte Valgadena, em Vicenza, quando
tenho a impressão de que Lennon não teve uma infância e uma adolescência
adequadas, pois se comporta como alguém que não tem o menor costume
de se divertir e faz isso pela primeira vez em sua vida.
Apesar de eu estar amando realizar aquelas loucas aventuras ao lado
dele, nenhum momento é mais gostoso que quando estamos sozinhos,
entregues ao desejo louco que existe dentro de nós. Nenhuma aventura que
já vivi foi melhor que transar com aquele homem até a exaustão, para
depois dormir agarradinha ao seu corpo nu.
Na noite do terceiro dia, estamos abraçadinhos na cama da luxuosa suíte
do hotel em Sardenha, com nossos corpos ainda trêmulos pelo êxtase,
quando sinto que desta vez não voltarei depois que adormecer. Sinto isto
porque estou feliz, em paz, como sempre estou quando Lucy decide que é
hora de voltar, porque ela foge nos momentos de problemas e retorna
quando sente que está tudo bem. Houve ocasiões da minha vida em que
arranjei problemas que me aporrinhassem só para ficar mais tempo aqui.
Porém, é impossível ficar aborrecida perto de Lennon.
Eu sempre fico triste quando sinto que tenho que partir, no entanto nunca
antes essa tristeza foi tão dolorosa como agora, porque tenho que deixar
Lennon, sem saber quando voltarei a vê-lo. Só sei que quando voltar, não
quero outro destino que não estar ao lado dele e nem sei como vai ser isso,
visto que ele já deixou claro que não se envolve afetivamente com uma
mulher e tenho certeza de que a songa monga não vai concordar em se
tornar amante dele.
Droga! O que posso fazer? Eu não quero perdê-lo.
— Como vão ser as coisas entre você e Lucy quando ela voltar? —
pergunto e ele parece surpreso.
— Por que você pergunta, ela está perto de voltar?
— Acho que não passo desta noite. — falo, com tristeza. Tento dizer a
ele que quero voltar a vê-lo, que quero que me torne sua amante no seu
apartamento em Taunton, como me propôs na noite em que bati no seu
carro, mas não sei como me expressar sem parecer ridícula. Acho que
nunca gostei de ninguém antes e não faço ideia de como expressar esse
sentimentos. — Eu quero te ver de novo. — declaro e quase esmurro a mim
mesma por minha voz ter saído trêmula.
— Eu sempre estarei por perto. — é o que ele diz.
— Lucy não vai concordar em se tornar sua amante secreta e sem
compromisso, como você faz com as mulheres que quer possuir. Ela é
certinha demais.
— Há outros meios de mantê-la por perto. Ela pode ser paga para cuidar
da minha mãe.
— E é só isso que você quer dela?
Ele demora um segundo para responder e fico gelada por dentro.
— Não. — sua resposta é seca e firme. — Mas eu não me envolvo em
um relacionamento sério como ela certamente vai exigir se decidir ficar
comigo. Embora, se ela esquecer todo o ódio que sente por mim, possamos
nos divertir, como estamos nos divertindo agora.
Ele apenas confirma o que eu já sabia.
— Ela não é uma garota que curte esse tipo de diversão. É capaz de se
casar com aquele asqueroso do Kevin sem amor, só por achar que é a coisa
certa a fazer.
Sinto o corpo dele estremecer de encontro ao meu e tenho certeza de que
não é tão indiferente aos sentimentos quanto quer acreditar. É então que
tenho uma ideia que pode ajudá-lo a se aproximar mais de Lucy. Algo que
nunca cogitei fazer antes e está além de tudo em que sempre acreditei.
— Me empresta seu iPhone. — falo.
— Pra que?
— Vou gravar um vídeo explicando à Lucy que fui eu quem matou o pai
dela e não você.
Lennon senta-se na cama, meio perplexo.
— Isso é possível? Você falar com você mesma?
Sento-me também, o lençol escorregando até o meu ventre.
— Eu não sei. Nunca tentei, mas sempre há uma primeira vez para tudo,
não é o que dizem?
— E se ela surtar com isto?
— Ela não vai. A louca aqui sou eu, esqueceu?
— Se você está dizendo.
Ele me dá o aparelho e ajeito meus cabelos rebeldes antes começar a
gravar. Ainda estou nua, sentada na cama, mas não preciso mostrar além
dos meus ombros.
— Olá, Lucy. Acho que dispensamos apresentações, não é mesmo? —
começo o meu discurso, na frente da câmera, pela primeira vez na vida
escolhendo as palavras com cuidado. — Estou fazendo esse vídeo pra te
dizer que não foi Lennon Rudolf quem assassinou seu padrasto, fui eu. Eu
não sei se você se lembra, mas aquele velho maldito costumava entrar no
seu quarto à noite, enquanto você dormia e passava a mão em você. Ele
confessou isso pouco antes de morrer. Na noite em que tudo aconteceu,
você estava chegando em casa de algum lugar, era uma noite chuvosa, tente
se lembrar. Ele se zangou porque achou que você estivesse com algum
garoto e tentou nos violentar, acho que você me criou para fugir daquela
situação, mas não colocou apenas sua dor em mim, colocou também o seu
ódio e foi por isso que cortei a garganta dele. Eu me lembro de cada
detalhe, acredite, não estou inventando isso. Eu cortei a garganta daquele
maldito para que ele não violasse o nosso corpo. — olho para o rosto
perplexo de Lennon e hesito antes de continuar. — Lennon estava lá
naquela noite, tinha ido em busca de provas para incriminar Avery Green,
ele não roubou essas provas, seu padrasto deu a ele porque queria um cargo
mais alto no governo. Ele assistiu tudo, no último minuto tentou me
impedir, mas foi tarde. Por favor, não o culpe por nada. Se ponha no lugar
dele, se você assistisse um verme tentando estuprar a própria filha de
quatorze anos, você impediria que ela o matasse? Foi o que aconteceu com
Lennon. Você deve estar se perguntando porque o estou defendendo e vou
te dizer: é porque eu gosto dele, se algum dia eu voltar, é pra perto dele que
correrei, então se você se mantiver por perto, vai facilitar bastante a nossa
vida. Acho que é só isso. Ah, e pare de tomar aquele chá de camomila, isso
está nos deixando lerdas. Se você quiser gravar um vídeo pra me dizer
alguma coisa, que não seja para me repreender por tudo o que fiz, fique à
vontade. Até mais. — e desligo o aparelho.
— Isso é verdade? — Lennon me encara com a maior cara de safado que
já vi na vida.
— Qual parte?
— Que quando você voltar vai vir correndo para mim?
— Claro que é. — eu olho dentro dos olhos dele para dizer: — Foi com
você que eu tive os melhores momentos da minha vida. Não espero que
você tire férias do seu trabalho para me trazer em outra viagem como esta
todas as vezes que voltar a mim, mas quero ser sua sempre que estiver aqui,
mesmo que seja no seu apartamento em Taunton.
Ele não diz nada, apenas me puxa pelo braço, me joga na cama, e pula
em cima de mim, fazendo-me sua mais uma vez, levando-nos para aquele
delicioso mar de luxúria que me arrebata.
O dia está quase clareando quando adormeço nos braços dele, com meu
coração cheio de paz e acho que posso chamar o resto de felicidade, algo
que jamais experimentei antes e é naquele instante que desejo ardentemente
poder continuar vivendo e sentindo tudo isso, mas sei que as coisas não
funcionam assim e mergulho na mais infinita escuridão quando o sono
chega.
CAPÍTULO XXIII
Lennon.
Acordo com o toque insistente do meu celular. Mas que droga! Aqueles
cretinos do governo não sabem se virar sem mim nem por um dia? E ainda
por cima têm que me incomodar a essa hora da manhã? Não deve ser muito
cedo, mas para quem passou praticamente toda a noite trepando com uma
garota louca e gostosa demais, meio dia ainda é madrugada.
Por falar em louca, onde ela está? Sento-me sobressaltado quando apalpo
o colchão e não a encontro do meu lado. Estou começando a acreditar que
possa estar tentando passar pelos seguranças lá fora quando a vejo em pé
perto da janela, e solto um suspiro de alívio.
Está diferente, muito quieta, usando uma de minhas camisas de mangas
compridas por cima do vestido curto e decotado, tem os cabelos presos em
um rabo de cavalo, os braços cruzados na frente do corpo, como se
estivesse na defensiva e me observa com os olhos cheios de pavor.
Demoro um instante para compreender e então me dou conta de que
Samantha se foi, aquela garota diante de mim é a doce e meiga Lucy. A
diferença em seu olhar é impressionante, parece os olhos de outra pessoa,
aquela agressividade e aquele ar de deboche, com os quais eu já estava até
me acostumando, deixaram de existir para dar lugar a uma expressão serena
e ao mesmo tempo carregada de sentimentos.
Não sei nem por onde começar a explicar tudo a ela. Para começar ela
deve estar se perguntando como saiu de Newhart e veio parar na Itália tão
depressa.
Calmamente, sento-me na beirada da cama e os olhos dela se arregalam
ainda mais quando o lençol escorrega para baixo, revelando minha total
nudez.
— Fica calma. Eu explico. — falo, cobrindo meu sexo com o tecido
macio do lençol.
— Onde estamos? O que está acontecendo? — ela indaga, aflita. — Por
que aqueles brutamontes lá fora não me deixam sair daqui?
— Estamos na Itália, em Sardenha. Faz três dias que estamos aqui, quer
dizer, o primeiro dia passamos na França, então tecnicamente falando faz
dois dias na Itália. — Acho que não estou indo muito bem na explicação,
pois quanto mais eu falo, mais os olhos dela se arregalam. — Você estava
ligada no modo Samantha até esta madrugada antes de adormecer.
— E você fala como se isso fosse uma brincadeira? — me reprende,
asperamente e começo sentir saudade da descontração do seu alter ego.
— Eu sei que deve ser difícil pra você. — tento remediar.
Sonolento, levanto-me e desligo o celular que continuava tocando
insistentemente. Preciso de um café puro e bem forte pra dizer àquela
garota que quem matou o padrasto dela foi ela mesma e não eu, como
acreditou durante toda a sua vida.
— Vou pedir um café pra mim. O que você quer comer? — pergunto.
— E você acha que vou conseguir comer alguma coisa nessa aflição?
Sem saber o que está acontecendo?
— Não está acontecendo nada de mais. Samantha estava comigo, eu
cuidei bem dela, quer dizer, de você, sei lá, de vocês duas? — eu nem sei
mais o que dizer nessa situação confusa.
— Ela foi para a cama com você?
— Lógico. Por três dias.
Vejo sua face perfeita ruborizando e percebo o quanto gosto disso nela.
Suas duas personalidades têm características distintas e todas parecem me
agradar.
— Como pode ser isso? Ela odeia todo mundo que chega perto de mim.
— Eu sou a exceção. Café puro ou com leite?
— Tanto faz.
Ligo para o serviço de quarto e peço o café da manhã completo.
— Precisamos conversar. — declaro, após desligar o interfone.
— Com certeza. Se há algo que precisamos é conversar. Você não tinha o
direito de me trazer pra esse fim de mundo enquanto eu estava fora de mim.
Isso foi muito abuso da sua parte, onde está o respeito?
— Para com isso. Você sabe que aquela doida teria aprontado coisa pior
se eu não estivesse por perto.
Novamente, sua face linda fica vermelha.
— E o que ela aprontou?
— Nada de que eu não tenha gostado. — Seus olhos azuis se arregalam
sobre os meus, perplexos. — Quer tomar um banho antes do café? —
pergunto.
— Nem morta.
Aproximo-me dela, fitando-a de perto, diretamente nos olhos e falo:
— Eu já conhecia seu corpo antes de você mudar e agora conheço ainda
mais. Aliás não há nenhuma parte desse corpinho lindo que não tenha sido
meu, que eu não tenha beijado ou tocado. Então tomarmos banho juntos é o
de menos agora.
— As coisas não funcionam assim. Eu não estava consciente quando fui
sua.
— Estava na primeira vez.
— Aquilo foi um equívoco.
— Deixa de ser mentirosa, isso está começando a ficar ridículo. Eu já sei
tudo sobre você, sei porque se enfiou no palácio de Chambers, quais
motivos acha que tem para me odiar, sei que faz parte do JUD e sei que não
teria permitido que eu a tocasse se não estivesse muito a fim. É por isso que
precisamos conversar. Você está enganada a meu respeito.
— Sabe quem sou? — ela fica pálida.
— Sim. — desisto do banho, pois temo que ela tente fugir novamente
enquanto eu estiver no banheiro. Então jogo o lençol sobre a cama e me
visto do roupão do hotel. — Você é enteada de Jonathan Carter, o homem
que acredita que eu matei.
Ela leva a mão à boca, como se para sufocar um gemido e seus olhos se
enchem de lágrimas, o que me faz me arrepender por ter pronunciado
aquelas palavras assim tão de repente, sem nenhuma preparação. Eu devia
ter sido mais cauteloso, Lucy é muito sensível, exatamente ao contrário de
Samantha. Não entendo como um mesmo ser humano pode possuir
personalidades tão distintas e entendo menos ainda onde ela estava com a
cabeça quando decidiu entrar no palácio acreditando que podia me
confrontar com toda essa fragilidade.
— Se você sabe quem sou, sabe que quero acabar com você. Por que
ainda não se livrou de mim como fez com meu pai? — ela praticamente
grita, as lágrimas descendo pela sua face.
— Ele não era seu pai, apenas padrasto.
— Eu o amava como pai. Laços de sangue nada significam. Mas um
assassino frio como você jamais entenderia isso.
Descontrolada, ela corre para a porta e a alcanço bem a tempo de
impedi-la de abrir.
— Eu não o matei Lucy. Por que você não me escuta? — seguro-a pelos
pulsos enquanto ela se debate, tentando se soltar.
— Porque mentir é só o que você sabe!
— Se acalma. Eu não estou mentindo. E posso provar. Sam deixou um
vídeo gravado pra você.
Por fim, ela se aquieta e fita-me fixamente, com os olhos avermelhados
pelo choro.
— O que você disse?
— Isso que você ouviu. Ela gravou a verdade sobre tudo o que
aconteceu.
Ela puxa seus pulsos das minhas mãos e, percebendo que está mais
calma, a deixo livre.
— Se não foi você, então quem foi?
Eu posso jurar que ela sabe a verdade, pela forma desconfiada, meio
culpada, como pronuncia aquela pergunta. Aposto como sempre soube,
apenas nunca quis admitir.
— É melhor você se sentar.
— Eu não quero me sentar. Por favor me diz logo a verdade.
— Foi você. Quer dizer, Samantha.
Ele pisca confusa, como se eu tivesse falado em um idioma que não
compreende.
— Como é?
— Eu sei que não vai ser fácil, mas estou aqui do seu lado para o que der
e vier. Puxe pela memória. Estava chovendo naquela noite, você tinha
saído. Pra onde você foi Lucy? — Vejo o terror se estampando na expressão
dos seus olhos muito lentamente e ela não precisa dizer nada para que eu
saiba que está se lembrando.
— Fui ao cinema com algumas amigas da escola. — diz, num fio de voz.
— Quando você entrou em casa, encharcada de chuva, ele estava saindo
do escritório e te fez sentar no colo dele. — ela leva as duas mãos à boca,
como se tentasse conter um enjoo violento, seu olhar se perdendo no vazio
à sua frente, as lágrimas voltando a encher os seus olhos. Acho que se
Samantha não tivesse acabado de partir, a tomaria nesse momento de novo.
— Depois enfiou a mão na sua blusa e tentou te violentar. — completo.
— Eu lembro... — sua voz sai num murmúrio, ao mesmo tempo em que
suas pernas parecem falhar e corro para segurá-la antes que caia no chão.
Carrego-a até uma poltrona e a sento confortavelmente.
— Você está bem? — pergunto.
— Sim. Agora eu me lembro de tudo. Aquela não foi a primeira vez que
ele me molestou. Tinha entrado no meu quarto antes. Eu tinha essas visões
quando me perdia dentro de mim, mas não tinha certeza se eram
lembranças. Agora tenho. Aquela noite em que me agarrou, foi a primeira
vez que perdi minha identidade. Só voltei a mim no dia do enterro e não
lembrava de nada.
Me compadeço da sua dor e me sento do braço do estofado, para puxá-la
para mim e abraçá-la. A princípio ela reluta, se esquivando ao contato, mas
logo abandona suas resistências e aninho sua cabeça em meu peito,
enquanto ela se esvai em lágrimas, chorando tanto que seu corpo chega a
balançar.
Aperto-a mais forte contra meu corpo, inundado por um afeto genuíno
que parece transbordar dentro de mim e enterro meu rosto em seus cabelos,
inebriado com o cheiro que parte dela. Por mais que ela tenha mudado,
aquela ainda é a mesma garota com quem passei esses últimos dias, os
melhores da minha existência. Como a própria Sam colocou, eu não tive
uma infância plena, pois comecei a trabalhar muito jovem e nunca tive
tempo para me divertir. Foi com ela que aprendi a regozijar dos prazeres da
vida. Foi uma menina doze anos mais jovem que eu, a me ensinar o lado
bom da vida, a me mostrar porque realmente vale a pena estar vivo.
E embora não seja mais ela em meus braços, para mim nada mudou, eu
ainda a quero com todas as minhas forças, com cada célula do meu corpo,
com cada batida do meu coração e vou dar um jeito de nunca mais deixá-la
ir.
Lucy chora em meu peito por um longo tempo. Posso imaginar como
está se sentido e me sinto um inútil por não poder fazer nada para ajudá-la a
superar aquilo. Imagina a pessoa descobrir, assim de repente, que o homem
a quem sempre amou como um pai não passava de um verme estuprador e
que foi a responsável por tirar a vida dele. É realmente de cortar o coração.
Sou obrigado a soltá-la para ir receber o café da manhã quando a
campainha toca. Dou passagem ao garçom que deixa a bandeja farta sobre
uma mesinha de centro antes de se retirar em silêncio.
— Come alguma coisa. Isso pode te fazer melhorar. — Eu nunca fui
muito bom com sentimentos e nunca sei dizer a coisa certa nessas horas.
— Não estou com fome. — ela seca as lágrimas do rosto com a manga
da minha camisa que fica grande demais em seu corpo. — Eu gostaria de
assistir o vídeo. Posso?
— Claro. — entrego o iPhone a ela, desbloqueado.
— Você pode me deixar um pouco sozinha?
Não sei se isso é uma boa ideia, mas não irei muito longe.
— Está bem.
Sirvo um prato com sanduíches e café e vou para a antessala. Termino de
comer, espero algum tempo e então volto ao quarto. Lucy ainda está
assistindo ao vídeo, pela décima vez, eu suponho, já que não tem mais que
vinte minutos de duração. Seu rosto está muito sério e inchado pelas
lágrimas, mas pelo menos ela não está mais chorando.
— Você estava lá naquela noite. — afirma, trazendo seu olhar triste para
o meu rosto.
— Sim, eu estava. Tudo aconteceu exatamente como Sam falou.
Lucy se levanta e aproxima-se de mim.
— Por que não me denunciou à polícia por assassinato? Era a coisa certa
a fazer.
— Não me pareceu certo na época e nem me parece agora. Era só um
verme tentando violentar uma adolescente. Você tinha o direito de se
defender.
— Eu sempre achei que tinha sido você. — sua voz sai trêmula.
— Foi o que eu pensei quando me lembrei de tudo.
— Quando você se lembrou?
— Quando vi você se transformando em Samantha. Foi do mesmo jeito
naquela noite.
— E desde quando sabe que faço parte do JUD?
— Desde a manhã em que você chegou ao palácio.
— Se sabia, porque me deixou ficar lá?
— Por minha mãe e porque achei que podia trazer você para o meu lado
do governo.
— Eu não estava no JUD por motivos patrióticos.
— Foi o que pensei. Você só queria me destruir.
Suas sobrancelhas arqueiam, uma angústia profunda se estampa na
expressão do seu olhar.
— Me perdoa. — diz, a voz saindo em um fio trêmulo. — Por acreditar
que foi você, por toda aquela armação durante a festa no palácio, por te
odiar tão injustamente durante tanto tempo.
— Eu perdoo. — falo e ela corre para os meus braços.
Aperto-a pela cintura, colando meu corpo no seu e ela me agarra pelo
pescoço, descansando sua cabeça em meu peito. Ficamos assim por um
longo momento e quando o calor da lascívia se faz mais forte que tudo
dentro de mim, causando-me uma ereção, levo meus lábios aos seus cabelos
dourados e perfumados, beijo-os e escorrego minha boca para o seu rosto,
plantando beijos e mordiscando sua pele macia. Ela arqueja excitada,
entretanto, quando busco sua boca com a minha, vira o rosto e se
desvencilha do abraço, afastando-se.
— Não é certo que façamos isso. — diz, sem me encarar no rosto.
Mas que merda! Será que todas as vezes que ela mudar de personalidade
terei que convencê-la de que me quer tanto quanto eu a ela? Fico frustrado,
queimando de tesão sem poder me saciar, com vontade jogá-la à força sobre
a cama, rasgar suas roupas e fazê-la minha até que ela não tenha mais
condições de negar o quanto me quer.
— Por que não? — respiro fundo para sufocar as emoções violentas.
— Eu tenho um namorado. O Kevin. Não sou como Samantha que não
se importa com as pessoas. Não posso magoá-lo desta forma. — fita-me
fixamente nos olhos antes de continuar. — Preciso conversar com ele antes
de assumir alguma coisa com outro homem.
Ela não precisa dizer mais nada para que eu compreenda que está me
testando, tentando descobrir se quero um compromisso ou apenas algumas
trepadas. Já passei por esse tipo de teste antes e nunca sou aprovado,
simplesmente porque não acredito nessa porra de compromisso. O bom da
vida é sermos livres para vivermos o que há de melhor, sem que haja uma
obrigação ou uma promessa no meio, pois assim, quando tudo acabar,
porque sempre acaba, o outro não sairá magoado. Não vejo porque
depositar toda a felicidade de uma vida nas mãos de outra pessoa, isso
significaria se tornar dependente dessa pessoa e esse tipo de coisa nunca
acaba bem, tenho muitos exemplos disto, o principal deles é o casamento
dos meus pais. Se eles fossem livres para se relacionar com outras pessoas,
sem um maldito compromisso no meio, muitas desgraças teriam sido
evitadas.
— Eu entendo. — é tudo o que consigo dizer e nem mais olho no rosto
dela. — Por favor, tome seu café. Precisamos voltar para Newhart.
Ele senta-se diante da mesa e me acomodo na poltrona do lado de cá.
Um silêncio estranho, meio tenso, toma conta do ambiente e de repente não
estou mais tão à vontade quanto antes e nem sei o porquê.
— O que você quer de mim, Lennon? — Lucy indaga, servindo-se de
pão fresco e café com leite.
— Preciso que você cuide de minha mãe. — Percebo que ela está
engolindo a comida à força enquanto me encara em silêncio. — Agora que
você sabe que não precisa mais do JUD, tenho a impressão de que vai se
desligar deles e precisar de um emprego. Posso te contratar como cuidadora
permanente de Ruth e te pagarei muito bem por isto.
Vejo a decepção se estampar na expressão do seu olhar e quase esmurro
a mim mesmo por ser tão covarde.
— Desde os meus quatorze anos meu único objetivo de vida foi destruir
você, agora que isto acabou pretendo recomeçar. Quero voltar a estudar,
arranjar um bom psiquiatra que me livre de uma vez de Samantha. Não sei
se posso fazer tudo isso ficando presa em seu palácio.
— E por que você ia querer se livrar de Samantha?
Ela me encara surpresa.
— Porque ela é perigosa. Tirou a vida de um homem. É promíscua e
vulgar.
— Ela apenas se defendeu daquele safado. E o resto pode ser controlado.
— Por você?
— Eu não disse isso. — ela fica em silêncio por um longo momento e
temo que não concorde em voltar comigo para Chambers, o que seria ruim
para a saúde da minha mãe. — Por favor, Lucy. Você não vai arranjar um
emprego que ganhe melhor que cuidando da minha mãe e ela precisa de
você.
Ela continua em silêncio e estou a ponto de implorar, quando diz:
— Tudo bem, eu aceito, mas não vou ficar morando no palácio. Chego
pela manhã e volto pra casa a tarde, como todo emprego.
— Por que isso?
— Por que quero liberdade e privacidade para recomeçar minha vida.
É a minha vez de ficar encarando-a sem dizer nada, imaginando o que
ela quer dizer com recomeçar sua vida. Seria arranjar outro namorado?
Alguém que assuma o tal compromisso? Que se case com ela? Serei forte
ou fraco o bastante para deixá-la livre para outro homem?
Imaginá-la com outro homem me irrita mais que qualquer outra coisa.
Antes que ela tenha a chance de fazer isso a convencerei a ser minha da
forma como desejo, da única forma que me interessa, porque não desisto
fácil daquilo que quero e tê-la no palácio diariamente já é meio caminho
andado para o alcance do meu objetivo.
O mau humor me acompanha pelo resto do dia e se torna ainda pior
quando volto a ligar o telefone e sou bombardeado por uma centena de
telefonemas dos parlamentares que não se cansam de me atormentar.
Aqueles dias de folga foram excepcionais, não posso negar, mas os
problemas se acumularam no meu gabinete, problemas que só podem ser
resolvidos com a minha presença.
CAPÍTULO XXIV
Lucy.
A vista das praias de Sardenha são ainda mais deslumbrantes de dentro
do helicóptero que nos leva até o aeroporto onde está o avião de Lennon. O
clima também é irresistível: nem muito quente, nem muito frio, de um
modo que convida a um delicioso banho de mar, seguido de um passeio em
um dos muitos veleiros que posso enxergar aqui do alto.
Porém, nem toda aquela beleza é capaz de dissipar a angústia que pesa
em meu peito, acho que nunca nada a dissipará. A culpa por ter destruído a
minha família pesa sobre mim como se eu estivesse sendo esmagada por
um caminhão carregado com toneladas de concreto. Sou eu a responsável
pela morte do meu padrasto, pela loucura da minha mãe, por afastá-la do
meu irmão.
Está certo que aquele velho maldito era um pervertido, um verme
estuprador, mas se eu não o tivesse atraído, ou se tivesse fugido ao invés de
matá-lo, nada de mal teria acontecido, minha mãe e meu irmão ainda
estariam juntos e felizes, aquele maldito ainda estaria vivo e minhas mãos
não estariam sujas de sangue.
O monstro que vive dentro de mim é ainda pior do que eu imaginava,
não é apenas capaz de trair, de roubar e de se entregar à promiscuidade, é
também capaz de matar e agora, mais que nunca, preciso me tratar e
impedir que ela retorne.
Olhos para Lennon, que está sentado diante de mim, falando ao telefone
com seus parlamentares, como faz desde que deixamos o hotel, e me
pergunto como um homem na posição dele, que pode ter qualquer mulher
que desejar, pode ter se deixado envolver por Samantha. É algo que não
consigo compreender. Pela primeira vez alguém que me conhece não quer
me estrangular quando assumo a identidade dela e o que mais me espanta é
que esse alguém seja Lennon, um homem que além de rico e poderoso é
irresistivelmente atraente e charmoso, poderia ter passado aqueles dias na
praia com qualquer modelo mundialmente famosa.
Olho para ele e percebo o quanto o quero. O quero mais do que já desejei
qualquer outro, só que não posso aceitar que as coisas sejam como ele
impõe. Não posso concordar em me tornar a transa casual de um homem
que a qualquer momento pode decidir se casar com outra e fazer de mim
sua amante ou me descartar como se eu nada fosse para ele. Nem morta vou
cair nessa furada. Basta eu ter passado toda a minha infância vendo minha
mãe ser discriminada e humilhada por ser amante de um homem casado,
não vou seguir os passos dela e tampouco vou me expor ao risco de me
apaixonar por alguém que não quer nada sério comigo.
A vida não precisa ser tão complicada assim. Estando livre, eu posso
conhecer outra pessoa, uma pessoa que me leve a sério, que queira
realmente se envolver e assim serei feliz.
Eu só queria não sentir pena da Sra. Rudolf e ter coragem de me
distanciar dela, pois ficar tão perto de Lennon, vê-lo diariamente, é um risco
grande demais a correr, visto que ele me atrai mais que tudo nessa vida e
resistir vai ser praticamente impossível, mas vou tentar conseguir.
Lennon mal fala comigo quando deixamos o helicóptero e entramos no
avião. Está ocupado demais em resolver seus negócios por telefone. Pelo
que posso entender do que ele diz, as coisas se tonaram uma bagunça em
Bristol sem a sua presença, mas pelo menos o trabalho que a tal de Melanie
está fazendo na internet está dando resultados, pois sua imagem está
melhorando perante o público. Parece que o índice de aprovação ao seu
governo está crescendo e posso imaginar o quanto os membros do JUD
estão putos com isso.
É fim de tarde quando aterrissamos no aeroporto particular do palácio de
Chambers, de onde Lennon parte direto para o seu gabinete, explicando que
tem coisas demais para resolver, e dá ordens para que um dos motoristas me
leve até a sede do palácio. Chegando lá, vou direto para o quarto onde fui
instalada, trocar aquele vestido curto e decotado demais por uma roupa
decente. Escolho jeans, camiseta de malha e tênis. Como está calor,
dispenso o suéter e ajeito a rabo de cavalo dos cabelos.
Estou pronta para ir falar com a Sra. Rudolf e desempenhar meu papel de
deixá-la acreditar que sou Lindsay. Só concordo com essa palhaçada
porque, como todos dizem, inclusive o médico, foi a única melhora que ela
teve em anos.
A encontro no terraço dos fundos, perto do jardim florido, sentada em
sua cadeira de rodas, imóvel, ao lado de Diana, que ocupa uma das cadeiras
em torno da mesa enquanto folheia uma revista de moda. Após
cumprimentá-la, percebendo a satisfação estampada eu seu sorriso, falo
com a Sra. Rudolf, mas ela não responde, sequer olha em meu rosto.
Permanece imóvel, com o olhar fixo no vazio à sua frente, como se não me
enxergasse, o que é estranho, considerando que ela jamais deixou de falar
comigo.
Agacho-me diante dela, nivelando nossos rostos e volto a falar.
— Sou eu, mamãe. Lindsay. — tendo e mais uma vez não obtenho
resposta.
A Sra. Rudolf permanece imóvel, silenciosa, presa ao seu mundo
particular.
— O que está acontecendo? — Diana pergunta.
— Eu não sei. Parece que ela não acha mais que sou Lindsay.
— Acho melhor chamar o médico.
Diana tira seu celular do bolso e faz a ligação enquanto eu continuo
tentando reanimar a Sra. Rudolf, sem obter qualquer sucesso. A mulher age
comigo da forma que age com todos: sem esboçar qualquer reação. Ela está
tão quieta que parece nem respirar, só sei que está viva por causa do calor
em seu corpo.
Sinto compaixão do seu estado e queria realmente que ela voltasse a me
tratar como filha, pois assim eu estaria ajudando na sua recuperação, porém,
parece que seu estado de demência não permitirá mais que isso aconteça.
Continuo tentando fazer com que ela fale comigo, mas nada parece
adiantar. Logo que o médico chega e a examina, dá a notícia que eu já
esperava.
— O fato de ela ter te confundido com a filha foi uma ilusão causada
pela doença. Infelizmente essa conexão foi interrompida e as chances de a
ilusão voltar são praticamente inexistentes. — o médico declara e me sinto
dolorosamente culpada por ter inventado aquela história de que Lennon me
violentou, de ter me afastado dela e permitido que a conexão fosse
interrompida.
Minha proximidade, essa ilusão que ela criou, era sua única chance de
melhora e eu estraguei tudo por causa da minha estupidez em achar que
Lennon matou o crápula do meu padrasto.
Agacho-me novamente diante da velha mulher, com o peito carregado de
angústia, a culpa me corroendo a alma.
— Eu sinto muito. — murmuro, encarando seu rosto enrugado, as
lágrimas marejando meus olhos.
— Não adianta. Ela não pode ouvir. — o médico diz.
— Não há nada que possa ser feito? — pergunto.
— Não pela ciência. A demência degenerativa é uma doença muito
complexa e subjetiva. Ela pode acordar caminhando e falando amanhã,
como também pode nunca mais voltar a fazer uma coisa nem outra.
— E essa mudança depende do quê?
— Ninguém sabe. Isso é subjetivo a cada paciente. Mas não depende
mais de você. Se ela não reagiu desta vez, dificilmente voltará a reagir. —
ele olha no relógio em seu pulso. — Tenho que ir. Você fala com o Sr.
Rudolf, Diana?
— Claro. — Diana concorda e o homem de meia idade se vai.
Se eu não sirvo mais para a melhora da Sra. Rudolf, então não tenho
mais o que fazer aqui. Não sou mais útil ao cargo que Lennon me ofereceu,
como também não sou a mulher que ele escolheu para assumir um
relacionamento sério diante do público, portanto, está na hora de partir,
esquecer tudo o que estou deixando para trás e recomeçar minha vida.
Ainda não sei exatamente por onde começar, mas sei que aos poucos as
coisas vão se ajeitando. Não posso mais ficar no apartamento do JUD, isso
não seria certo, nem com eles nem com Lennon, visto que não estou do lado
de nenhum dos dois nesta luta pelo país e tenho informações que seriam
valiosas para os dois lados.
Até conseguir me estabelecer, vou passar uns dias no apartamento de
Dayse, a garota com quem eu dividia o aluguel na época em que trabalhava
como garçonete. Por muito tempo eu vivi dormindo no sofá da sala dela,
posso voltar a viver assim.
Mais tarde, no quarto, enquanto arrumo minha mochila, com as poucas
peças de roupas que trouxe quando vim para o palácio, a tristeza que me
toma é imensurável. No fundo, eu queria o que todas as garotas querem:
que Lennon assumisse um compromisso comigo. Não um casamento,
lógico, pelo menos não de início, mas um namoro sério, com direito a
encontros públicos, respeito e fidelidade. Mas esperar isso de um homem
como ele é sonhar alto demais. Ele até já teve as mulheres mais bonitas,
ricas e elegantes da Europa e se nunca assumiu nada com nenhuma delas,
não é comigo que vai acontecer, afinal não sou nada além da filha de uma
ex prostituta suicida e de um homem casado, pedófilo e estuprador, não
tenho estudo, nem um emprego, não tenho onde morar e ainda pro cima
tenho transtornos mentais. Um homem como Lennon jamais ficaria
seriamente com uma garota como eu. Ele pode até me querer para algumas
trepadas em seu apartamento em Taunton, mas logo se cansaria de mim,
como se cansou de todas as outras, e então eu estaria apaixonada e sairia
magoada. O melhor é mesmo cortar o mal pela raiz e procurar uma vida
afetiva menos fadada ao fracasso.
Estou pronta para sair, quando a porta do quarto se abre e ele entra. Está
meio descabelado e muito ofegante, como se tivesse subido as escadas
correndo.
— Onde você pensa que vai? — ele indaga, fechando a porta atrás de si.
— Vou pra casa. Não tenho mais o que fazer aqui. Sua mãe...
— Diana me disse que ela não reagiu, mas isso não significa que você
precisa ir embora.
— Claro que preciso. Tenho que cuidar da minha vida, recomeçar,
procurar o meu lugar no mundo.
— O seu lugar é aqui.
— Nunca foi e nunca será. Mas não se preocupe com informações, não
vou voltar a morar no apartamento do JUD, vou ficar com uma amiga.
Ele se aproxima de mim devagar, sem desviar seus olhos dos meus.
Enquanto que eu recuo alguns passos, simplesmente porque sei o quanto
sua proximidade me afeta e não quero que meus sentimentos interfiram na
minha decisão.
— Fica comigo. — diz ele. — Fica no meu apartamento em Taunton.
Você terá tudo lá. Empregados, dinheiro e um lugar confortável pra morar.
— Sei, e de vez em quando você passaria pela minha cama para uma
visita.
— Não coloque as coisas dessa maneira. Não precisa ser visto assim.
Nós somos solteiros, somos adultos, estaríamos juntos. Não da forma
convencional, mas estaríamos.
— Eu sei que é uma boa proposta para uma garota como eu, mas não
quero, obrigada.
— Me diz só o porquê.
— Eu gosto que as coisas sejam da forma convencional. — Espero que
ele diga algo, mas fica calado, encarando-me. — Tenho que ir, está ficando
tarde.
Quando tento passar por ele, sua mão forte me impede, segurando-me
pelo braço.
— Sam concordou em se tornar minha amante.
Processo suas palavras e a raiva pipoca em minhas veias de forma tão
violenta que sinto minha face ficar vermelha. Não sei o que é mais
ofensivo: ele admitir que me quer apenas como sua amante, como se eu não
fosse digna de outra coisa, ou se sua insinuação de que prefere que eu seja
Samantha, certamente porque aprecia sua promiscuidade.
— Estão espere por ela. Em algum momento ela virá, ela sempre vem. E
como disse no vídeo, irá correndo pra você. Agora me deixa em paz. —
digo, com os dentes trincados e puxo meu braço com um safanão,
libertando-o de sua mão para em seguida caminhar depressa para a porta.
Só que Lennon não desiste fácil e logo está tomando-me o caminho.
— Por favor, fica. Só por essa noite. Está tarde. Deixa para ir amanhã.
— Ainda são sete horas da noite, já chamei um taxi e já telefonei para
minha amiga me esperar, então o horário é irrelevante.
— Fica. Por mim. Por nós. Me dá essa última noite, como uma
despedida.
— Não existe “nós” e nunca vivemos nada juntos para que haja uma
despedida. Eu sei que você queria que eu fosse Samantha, porque ela é tudo
o que você deseja, mas acontece que eu não sou.
— Ela não é tudo o que eu desejo, você é, porque vocês são a mesma
pessoa pra mim e eu gosto desse jeito.
Por um instante eu hesito na minha decisão, porque pela primeira vez na
vida alguém que conhece o meu transtorno me diz que me aceita do jeito
que sou e não tenta me forçar a mudar. Isso é tão inesperado que chega a ser
espantoso. É como se finalmente, pela primeira vez, eu fosse aceita no
mundo.
Entretanto, minhas convicções são maiores que tudo.
— Não dá. Eu tenho que ir. — falo.
Novamente tento ir para a porta e novamente ele me impede. Desta vez
age de forma ainda mais inesperada ao me agarrar pela cintura e prender
meu corpo contra o seu.
— Me solta! — falo e começo a esmurrá-lo no peito, com tanto esforço
que minha mochila cai do meu ombro, embora ele pareça nem sentir os
meus golpes.
— Não! — esbraveja e me empurra até a parede, encurralando-me,
prendendo-me com seu corpo grande, segurando-me firme no lugar até que
eu esteja cansada de me debater e fique imóvel. — Quando você vai
perceber que é inevitável lutar contra o que sente? — sua voz sai sussurrada
e no instante seguinte sua boca está fuçando meus cabelos, para logo descer
pela minha face e escorregar para a minha orelha, a medida que o calor do
seu corpo atravessa a barreira das roupas e me atinge com a intensidade de
um tornado, despertando o desejo irrefreável que existe dentro de mim.
Pouco a pouco vou amolecendo nos braços dele, entregando-me à
luxúria que me envolve por completo.
— Nunca... — sussurro, porém, minha respiração ofegante denuncia
meu estado de excitação.
— Não minta para si mesma. Você me deseja tanto quanto eu a você. Só
falta você decidir descomplicar as coisas.
Quero discutir aquele termo “descomplicar”, mas, inesperadamente,
minha boca é tomada pela sua em um beijo que me deixa sem fôlego, que
me faz perder os parâmetros, a compostura e é assim que o abraço pelo
pescoço, rendida, entregue à lascívia que queima em minhas entranhas e se
torna ainda mais intensa quando ele inclina os joelhos e esfrega sua ereção
entre minhas pernas, fazendo meu sexo latejar em expectativa, a umidade
acontecendo dentro da minha calcinha, me lambuzando.
Minha nossa! Como é bom ser beijada por ele, senti-lo tão meu, tão
íntimo. Como foi boa aquela noite no vestiário! E basta que eu concorde
para que tudo se repita e sejamos novamente um do outro de forma
arrebatadora.
Entretanto, eu não posso fazer isso, não posso entregar-me àquele
homem toda vez que sou tentada, preciso ser sensata e ter em mente que ele
quer apenas me usar, para depois de um tempo me descartar, como
certamente já fez com muitas outras. Eu posso estar sendo careta ou fora de
moda em acreditar que as coisas funcionam de outra forma que não seja a
que ele me propôs, mas é assim que penso e não vou me deixar mudar,
simplesmente porque tenho certeza de que se entrar nessa vou sair
magoada.
— Não posso fazer isso. — falo, desviando o rosto para interromper o
beijo.
— Mas você quer. — ele diz, sem deixar de me beijar no pescoço e
mordiscar minha orelha.
— Quero, mas não vou fazer. Me solta. — espalmo minhas duas mãos
em seu peito largo e faço pressão. Ele nem se move.
— Só esta noite. Me da essa despedida. Você me deve isso, por ter me
acusado de tantas coisas que não fiz.
E ele está certo, eu o acusei injustamente de forma cruel, mas ainda
assim me recuso a ceder, pois sei que corro o risco de me apaixonar e
arruinar minha vida com isto.
— Eu arranjo outra forma de te compensar. Meu corpo não é uma
mercadoria. — eu sei que fui longe demais com as palavras, mas pelo
menos consigo que com isto ele me solte.
— Eu não disse que era. — fala, afastando-se.
— Mas insinuou.
Não espero pelo argumento dele em relação àquilo. Aproveito que está
analisando minha afirmação, pego minha mochila do chão e saio correndo
do quarto, pois se ficar sei que não sairei nunca mais, a não ser para seu
apartamento em Taunton.
Corro como uma louca, sem olhar para trás até alcançar os portões de
saída, onde sou abordada por um dos motoristas do palácio.
— O presidente me ordenou a levá-la para onde desejar. — ele diz,
muito sério.
Sei que é inútil dizer que prefiro ir de taxi, afinal é de Lennon que
estamos falando, o cara que acredita que tudo tem que ser do jeito dele.
Claro que não me deixaria sair sem mandar um de seus funcionários
descobrir para onde vou.
Nem discuto com o brutamontes, pois sei que seria inútil. Além do mais,
é perda de tempo tentar me esconder de Lennon, se ele quiser descobre o
endereço onde estou em um piscar de olhos.
Entro na limusine confortável e atravessamos os portões de saída do
palácio, avançando pelas ruas bem iluminadas e pouco movimentadas de
Newhart.
À medida que me afasto do palácio, um vazio absurdo me toma de forma
tão devastadora que sinto as lágrimas marejando os meus olhos. Não
compreendo a razão disto, mas tudo o que quero é voltar, me entregar
àquele homem, esquecer todos os meus princípios e nunca mais sair de
perto dele.
A impressão que tenho é de que tomei a decisão mais errada da minha
vida ao deixá-lo. E o que tem de mais em me tornar uma amante clandestina
se o homem a ficar comigo é Lennon?
Parece loucura, mas a única explicação que vejo para tudo o que estou
sentindo agora, para essa falta absurda que ele está me fazendo, é o fato de
que me apaixonei, sem esperar, sem premeditar, sem sequer me esforçar
para isto. Acho que nenhuma mulher com sangue nas veias ficaria imune a
Lennon, não apenas por ser lindo e charmoso demais, mas porque é uma
pessoa solidária em priorizar os menos favorecidos na sua forma de
governo; se preocupa com o bem estar da mãe a ponto de aceitar uma
inimiga dentro do palácio por causa dela; é altruísta a ponto de não ter me
denunciado pelo assassinato do meu padrasto, mesmo sendo acusado; me
perdoou por todas as acusações injustas que lhe fiz a ainda por cima aceita
meu distúrbio dissociativo de personalidade sem tentar me mudar por isto.
Seu único erro, foi não corresponder aos meus sentimentos, pois se
sentisse o mesmo me inseriria em sua vida de outra forma que não do jeito
que propôs.
O motorista me deixa em frente ao prédio de dois andares e só vai
embora depois que entro e tranco a porta por dentro.
Dayse está trabalhando no turno da noite, como garçonete, mas me
revelou o esconderijo onde se encontra a chave extra. Ela gosta de me
receber porque sabe que pago a metade do aluguel mesmo concordando em
dormir no sofá da sala.
O apartamento é minúsculo, com apenas um quarto, banheiro e uma sala
que é divida ao meio por um balcão, sendo que o lado de lá é usado como
cozinha. O cheiro de cigarros e comida estragada, como sempre, está
impregnado no ambiente. Porém, nada disso importa, eu só preciso de um
canto qualquer onde possa descansar e pensar sobre tudo.
É o que tento fazer, mas só o que consigo é abandonar minha mochila no
chão, deitar-me no sofá e chorar.
CAPÍTULO XXVI
Lennon.
O ministro do interior está fazendo um discurso na sala de reuniões
imensa e lotada como sempre. Tento me concentrar no que ele diz, mas
simplesmente não ouço uma só palavra. Meus pensamentos estão todos
voltados para a mesma direção em que estiveram nesses últimos sete dias:
para Lucy.
Por alguma razão que desconheço, não consigo tirar essa garota da
minha cabeça. Já tentei de tudo, até uma noite de sexo selvagem com
Melanie, que é linda, quente e faz de tudo na cama, mas não passou de uma
noite sem graça.
Pensei em tentar com outras garotas, mas sei que não seria bom como
com Lucy. É por ela que meu corpo clama noite e dia, é seu gosto que
minha boca quer sentir, é do seu cheiro, da sua voz, do sei jeito meigo e até
do seu jeito louco, que assume quando está no modo Samantha, que sinto
falta. Parece um tipo de fixação, tão perturbadora que às vezes acho que
vou surtar.
Como se não bastasse tudo isso, Robert está começando a me olhar torto,
como se achasse que estou ficando louco, porque mando que ele a siga para
onde quer que ela vá. Diariamente ouço as ligações que ela faz do celular
que levou grampeado e mando que ele vá constatar se ela realmente foi
fazer o que disse. Como na ocasião em que marcou com o tal Kevin, em
uma lanchonete de quinta categoria, para terminar o namoro. Robert tinha
ordens de me avisar caso eles tomassem outro rumo, que não suas casas,
quando saíssem de lá, mas não tomaram.
Mandei também que ele desse um jeito de ouvir a conversa quando o
líder do JUD lhe telefonou pedindo para terem um conversa em particular.
O safado queria que ela voltasse a sustentar a acusação de estupro que me
fez e ainda dissesse que foi forçada a desmentir tudo. Ainda bem que ela
não concordou, até deu um “chega para lá” no maldito.
Há quatro dias ela está trabalhando como subgerente em um restaurante
no centro da cidade e isso porque eu tive o cuidado de comprar o lugar,
anonimamente, e dar um jeito de que ela assumisse o cargo, ou estaria
servindo as mesas com um uniforme curto, como as outras garçonetes, à
mercê daqueles tarados que comem lá. Ainda assim, não está livre do
perigo e do assédio, pois às vezes faz hora extra, permanecendo no lugar até
tarde da noite, como se isso fosse adequado para uma menina da idade dela,
que na verdade deveria estar estudando.
Já cogitei seriamente fechar as portas da porra daquele restaurante só
para ter certeza de que ela ficará segura em casa, se é que se pode chamar
aquele cubículo onde ela está vivendo de casa. Mas isso não ia adiantar
nada, pois existem milhares de restaurante espalhados pela cidade, logo ela
estaria trabalhando em outro.
Nem mesmo o fato de eu ter tirado sua mãe do hospital deplorável onde
vivia, para interná-la em uma clínica particular, onde ela receberá um
tratamento muito melhor, fez com que Lucy concordasse em viver no meu
apartamento em Tauntum. Tudo o que recebi dela foi um telefonema de
cinco minutos com um agradecimento apático.
Quando ela vai enxergar que sou o melhor para sua vida? Vivendo
comigo ela não vai precisar fazer mais nada que não estudar, e estar à minha
disposição, claro. Teria quantos empregados quisesse a servindo, as
melhores lojas da cidade fechariam suas portas para lhe dar atendimento
prioritário. Esse seria o melhor negócio que ela poderia fechar na vida, no
entanto, prefere trabalhar em um restaurante barato, por um salário
miserável e viver em um buraco, em situações deploráveis.
Como se não bastasse tudo isso, aquele imbecil do Hudson não para de
dar em cima dela, parece um dos tarados do restaurante esperando uma
chance de tomar aquilo que me pertence, ou pelo menos eu queria que
pertencesse. Logo no dia em que ela saiu do palácio, ele lhe telefonou
convidando-a para jantar. Ela recusou, mas o bastardo é insistente, mandou
flores, continuou ligando, até que por fim conseguiu convencê-la a sair com
ele.
A barreira policial que mandei organizar na noite em que eles jantariam
juntos, com o objetivo único de apanhá-lo por qualquer motivo e impedi-lo
de levar minha garota para a cama no final da noite, — porque sei que é só
isso que ele quer — não foi suficiente para detê-lo, apesar de não terem
conseguido chegar ao restaurante naquela noite, ele continua ligando,
insistindo.
Ela concordou em sair com ele novamente esta noite e desta vez não há
nada que eu possa fazer para impedi-los, pois Hudson procurou a
embaixada e conseguiu passe livre para dirigir pelo meu país. Se eu
continuar perseguindo-o acabarei declarando guerra a ele e embora valha à
pena entrar numa guerra por uma garota como Lucy, Newhart não está
preparada para um combate desses e muito inocentes morreriam.
— Cara, deixa de ser louco e vai logo atrás da sua garota! Para com essa
frescura de amante e assume logo ela vez. — é Donald quem diz, enquanto
comemos sanduíches no meu gabinete no horário do almoço, isso depois
que o mandei preparar uma armadilha para que aquele safado do Hudson
não conseguisse sair do seu hotel onde está hospedado. Nada de muito
criminoso, eu só queria os pneus do carro dele e dos seguranças furados e o
tanque sem gasolina.
— Por que as pessoas acham que devem assumir alguma coisa para
ficarem juntas? — faço aquela pergunta que trago na mente há dias. — Eu
não acredito em compromisso. Se isso fosse bom meus pais não teriam se
destruído.
— Eu também não acredito, mas é isso que as mulheres querem e se
você não der a ela, logo outro vai dar e você pode se arrepender pelo resto
da sua vida. Vai por mim.
Aquelas palavras atormentaram minha mente pelo resto da tarde e à
noite elas ainda estão na minha cabeça. Caminho de um lado para o outro
do meu escritório no palácio como um animal enjaulado, ciente de que
preciso fazer alguma coisa, mas sem saber exatamente o quê.
Dentro de minutos Hudson estará jantando com Lucy. Já mandei que
Robert fosse vigiar os dois, discretamente, como sempre, porém, não tenho
certeza se dessa vez conseguiremos impedir que aquele maldito a leve para
a cama como vem tentando todos esses dias com aquele mimimi de flores,
chocolate e palavras idiotas. Se ele fizer com que ela beba e se transforme
em Sam, então as chances disso acontecer são quase certas, porque Sam é
quente e liberal demais, bem o oposto de Lucy, pelo menos na parte liberal.
Já são nove horas da noite. De acordo com o último telefonema de
Robert, eles ainda estão no Desire, um dos restaurantes mais sofisticados de
Newhart, o qual Hudson reservou inteiro, para que os dois pudessem ficar a
sós, algo que um homem só faz quando está muito a fim de trepar com
umamulher.
Diana já levou minha mãe para seus aposentos e se recolheu. Estou
praticamente sozinho no palácio, isso porque as dezenas de seguranças se
esgueiram por aí quase sem se mostrarem, dando a falsa impressão de que
se tem alguma privacidade por aqui.
Nem mesmo o uísque, ingerido em grandes goles, é capaz de me
acalmar, não consigo parar de andar de um lado para o outro, impaciente,
com raiva daquele bastardo. Se ele não interferisse tanto, em algum
momento Lucy viria para mim, da forma como desejo. Só que ele joga sujo,
promete o que ela quer apenas para convencê-la a se entregar. Os homens
da família dele jamais se casariam com uma moça que não tem sangue real.
O problema é que nunca se pode descartar a chance de haver uma primeira
vez e ele pode tirá-la de mim para sempre.
Merda! Por que simplesmente não a esqueço? Existem centenas de
garotas que venderiam até a mãe para viverem comigo do jeito que quero.
Em um ataque repentino de fúria, atiro o copo longe, estilhaçando-o
contra a parede, os cacos voando para todos os lados. Pouco a pouco vou
me dando conta de que parte disso que me toma é medo de perder Lucy,
porque ela é mais importante para mim do que eu possa ou queira admitir.
Apesar de todas as acusações que me fez, ela é a melhor coisa que já me
aconteceu e nem posso acreditar que estou aqui parado enquanto outro cara
tenta tomar o meu lugar. Onde já se viu?
Que se foda a porra da minha liberdade, que foda tudo o que aconteceu
com meus pais e tudo o que aprendi a creditar, se Lucy quer a merda de um
compromisso, se quer um anel em seu dedo, é isso que vou dar a ela. O
resto pouco me importa.
Decido, jogo meu paletó de volta sobre os ombros e deixo a palácio
quase correndo, mas não sem que haja tempo de Donald me alcançar ainda
na garagem. Ele é o segurança pessoal mais dedicado que já conheci, tão
dedicado que chega a ser pegajoso.
— Não me diga que ia sair sozinho. — ele fala, já chamando seus
homens pelo rádio.
— Não preciso de vocês para o que vou fazer.
Não espero que ele responda, entro na minha Land Rover e arranco em
alta velocidade. Como infelizmente preciso esperar que os seguranças dos
portões confirmem que sou eu ao volante antes de abri-los, o Mercedes
abarrotado de seguranças consegue me alcançar e me seguem pelas ruas de
Newhart.
Não preciso pedir instruções a Robert sobre onde fica o tal restaurante,
pois o conheço muito bem, costumava levar minhas garotas lá antes de me
tornar presidente, quando ainda podia sair com elas em público sem que os
tablóides e a internet fizessem disto a notícia do mês. Eu aposto como o que
está prestes a acontecer hoje vai estar em todos os jornais amanhã, pois não
saio daquele restaurante sem Lucy e tenho certeza de que Hudson não vai
facilitar as coisas.
Acho que meu coração nunca bateu tão depressa quanto no instante em
que estaciono diante do Desire, me sinto como um adolescente que vai
convidar uma garota para sair pela primeira vez, o que é estranho,
considerando que nunca tive dificuldade em lidar com as mulheres.
Como o restaurante não está aberto ao público, o manobrista não vem
me atender e estaciono de qualquer jeito antes de avançar direto para a
entrada, porém, antes que consiga alcançá-la, sou barrado por meia dúzia de
homens que me observam com hostilidade. São os seguranças de Hudson,
obviamente.
— Está fechado hoje, senhor. — um deles diz.
— Não me importa que esteja, eu vou entrar e está acabado.
Avanço mais um passo e um dos homens saca uma arma. Antes que
tenha a chance de dizer ou fazer qualquer coisa, é atirado no chão, com o
ataque feroz de Donald, que parece ter saído do Mercedes antes mesmo de
ele parar.
Em questão de segundos, todos os meus seguranças estão à nossa volta,
empunhando suas armas, inclusive Robert que estava por ali fazendo sua
vigília.
— Senhores, deem passagem ao presidente de Newhart. — Donald
ordena, com aquele tom ao mesmo tempo frio e ameaçador, que dá sinal de
que ele é bem preparado e não hesitará em atirar caso seja necessário.
Os seguranças de Hudson se entreolham e por fim abrem caminho,
embora venham atrás de mim quando entro, junto com os meus homens.
Do lado de dentro, o ambiente não podia ser mais romântico. O salão
enorme, com vários ambientes, está semiescuro, com apenas a luz fraca e
amarelada de um lustre cortando a penumbra. A única mesa ocupada é a
deles, está sob o lustre e há um garçom uniformizado servindo vinho a
Hudson enquanto Lucy bebe água.
Parecem atônitos com a invasão inesperada e meu sangue ferve nas veias
quando os vejo tão próximos, aparentemente íntimos.
— Olá, Lucy. Podemos conversar? — indago, aproximando-me.
Seus olhos lindos arregalam de perplexidade e meu coração acelera um
pouco mais.
Ela está mais linda que nunca, usando um vestido branco com renda
transparente nos ombros e os cabelos presos em uma única trança. Tem
aquele ar angelical e ao mesmo tempo delicado que desaparece quando seu
alter ego emerge do seu ser, dando lugar ao fogo que existe em Samantha.
— Ela está ocupada, não está vendo? — Hudson retruca, abruptamente e
minhas veias queimam de raiva.
— Não se mete cara, o assunto é entre mim e ela. — rebato. — Podemos
Lucy?
— Acontece que ela está comigo! — ele não permite que ela responda.
— Vai se foder, cara! — esbravejo, à beira do descontrole. — Volta pra
merda do seu país e deixa minha garota em paz!
— Cuidado como fala, Rudolf. — o tom dele é raivoso e ameaçador.
— Falo como quiser. Você pode ser Primeiro Ministro lá onde mora, mas
este é o meu país, portanto me deve respeito.
— O país pode ser seu, mas a garota não é. Se fosse não estaria aqui
comigo.
Perco o pouco do controle que me resta e avanço para ele, disposto a
quebrar sua cara de merda, todavia, sou agarrado por trás pelos meus
próprios seguranças, Donald de um lado, Peter do outro.
— Não faça nada do que possa se arrepender depois, cara. — Donald
fala.
— O que você quer Lennon? — Lucy levanta-se e Hudson faz o mesmo,
enquanto os seguranças me soltam e se colocam em total alerta.
Basta que eu olhe um pouco mais de perto para ela para que me sinta
ainda mais abalado, fúria e desejo conflitando-se dentro de mim com a
mesma intensidade, arrebatando-me. Sinto raiva de mim mesmo por não tê-
la feito minha quando tive a chance e assim permitir que aquele babaca
chegasse perto.
— Quero você. — digo, com a voz mais calma, embora por dentro eu
queira gritar. — Não do jeito que te propus, quero que você seja minha
mulher, unicamente minha, com um compromisso, como você deseja. —
posso ver a surpresa na sua reação. — Eu sinto muito por não ter te falado
isso antes, mas acho que quero passar o resto da minha vida ao seu lado.
Ela sorri, ao mesmo tempo em que uma única lágrima escapa pelo canto
do seu olho.
— Você tem certeza do que está dizendo? — indaga, quase em um
sussurro.
— Eu nunca tive tanta certeza de alguma coisa na minha vida. —
aproximo-me e a toco na altura dos ombros, é então que o imbecil do
Hudson avança com tudo para cima de mim, esmurrando-me no peito com
os punhos cerrados, a fim de me afasta e coloca-se entre nós dois.
Os seguranças dele nada fazem para detê-lo, mas empunham suas armas
depois que os meus o fazem. Os meus estão em maior número, mantém
suas armas apontadas direto para a cabeça de Hudson e confio no
treinamento deles. Sei que morreriam ali para que eu escape com vida,
estão apenas esperando uma ordem minha. Só que depois do primeiro
disparo, a coisa não teria mais fim, muitas vidas inocentes seriam perdidas.
— Sai daqui, cara! Você teve sua chance, deixa a garota ser feliz. Ela
merece alguém melhor que um golpista que tomou a presidência por meio
da força, como você. — Hudson está tentando me fazer perder a cabeça,
pois não se importaria com uma guerra entre países, até porque toda a
Europa ficaria do seu lado e os inocentes a serem sacrificados seriam os
cidadãos de Newhart.
— Deixa que ela decida o que quer. — ambos nos viramos para Lucy a
espera da sua decisão.
Ela parece aflita, cruza os braços na frente do corpo, alterna seu olhar
entre mim e Hudson.
Os segundos que se seguem parecem se transformar em horas. Acho que
não tinha cogitado a possibilidade de ela me dizer não, de escolher ficar
com ele e agora meu coração está quase parando de bater com essa
possibilidade, minha respiração está suspensa.
— Lennon. Nós estamos jantando. Podemos conversar depois? — ela
fala e meu mundo parece desmoronar, a fúria me ataca ferozmente de novo.
— Você está dizendo que prefere ele à mim? O que aconteceu entre nós
nada significou pra você? — o risinho de vitória na cara daquele bastardo
só atiça o ódio em mim.
— Não estou dizendo isso. Só não seria educado sair assim depois de
aceitar o convite dele. E é claro que significou.
Minha vontade é de pendurá-la no meu ombro e tirá-la dali à força, mas
sei que isso seria o estopim para o primeiro tiro.
— Não tem depois, Lucy. — lanço minha última carta, a mais perigosa
de todas. — Ou você vem comigo agora, ou não vem nunca mais.
Ela permanece em silêncio, encarando-me. Um longo momento se passa
e decido não mais insistir. Quando dou-lhe as costas, pronto para partir e
esquecê-la de uma vez, a dor me dilacera por dentro de forma devastadora,
como eu jamais experimentei antes. É nesse instante que percebo o quanto
ela significa para mim e quero esmurrar a mim mesmo por ter me permitido
perdê-la.
Vou na direção da saída sem ver o caminho. Estou quase alcançando a
maçaneta da porta quando a ouço chamar o meu nome atrás de mim e me
viro. Lucy corre para na minha direção e se atira em meus braços,
abraçando-me pelo pescoço e meu coração dispara no peito de novo.
Com tantas emoções em um espaço tão curto de tempo, vou acabar tendo
um ataque cardíaco.
— Eu também te quero. — ela diz, fitando-me de perto, direto nos olhos.
— Estou apaixonada por você. Só não queria...
Eu não espero que ela conclua a frase, o que disse foi o bastante para que
minha boca vá de encontro à sua, desesperada pelo seu gosto e o
experimento com toda a paixão que ferve dentro de mim, beijando-a de
forma visceral, carnal, impaciente.
Lucy enterra seus dedos nos meus cabelos, fica na ponta dos pés e se
aconchega mais a mim, nossos corpos se unindo com perfeição. Enterra sua
língua na minha boca, com lascívia, daquele jeito safado que me deixa
doido. Esse jeito de beijar e de fazer amor, é a única coisa que ela tem em
comum com seu alter ego, e percebo o quanto sou um cara de sorte, porque
é o que mais gosto nela.
— Isso não vai ficar assim, Rudolf! — a voz de Hudson ecoa pelo
restaurante como o rosnado de um animal ameaçador e interrompemos o
beijo, embora não deixemos de nos encarar diretamente nos olhos.
— Vamos sair daqui. — convido e ela sorri lindamente.
— Vamos.
Seguro na mão da minha garota e damos os últimos passos que restam
até a saída. Não resisto e antes de atravessar a porta me viro para Hudson
pela última vez, só para provocar.
— Volta pro seu país, cara. — digo.
A fúria reluz no seu olhar, mas não espero pela resposta, em questão de
segundos estou entrando no Land Rover acompanhado de Lucy e deixamos
o lugar com o Mercedes nos seguindo.
Trafegamos pelas ruas calmas e bem iluminadas da cidade envolvidos
por um silêncio gostoso, envoltos por uma aura de paz e felicidade. Acho
que nunca me senti tão bem antes e percebo que Lucy é a mais valiosa de
todas as minhas conquistas, até mais que a presidência do país.
— O que vai acontecer agora? — ela pergunta, rompendo o longo
silêncio.
— Você vai para o palácio comigo, onde é o seu lugar. Vai voltar a
estudar e nunca mais vai colocar os pés naquele restaurante de quinta onde
trabalha.
— Nossa! Vejo que você tem minha vida toda planejada. Espera — ela
se interrompe. — como você sabe onde trabalho?
— Eu sei tudo sobre você. — acho que dizer agora que mandei um
detetive particular vigiar cada um dos seus passos pode assustá-la, então
decido omitir parte da verdade. — Seu telefone está grampeado desde que
você chegou ao palácio. Fiz isso por medidas de segurança e continuo
ouvindo suas conversas.
Ela me encara de queixo caído.
— Acho que isso explica como você encontrou o lugar onde minha mãe
estava. Aliás obrigada por tê-la transferido para aquela clínica. Lá é
maravilhoso.
— Eu conheço uma forma mais eficaz que você pode usar para me
agradecer. — desço meu olhar pelo seu corpo, com malícia e ela sorri.
— Você não acha que essa coisa de eu ir pro palácio está muito
precipitada? — indaga.
— E pra onde você quer ir?
— Pra casa da minha amiga.
— Nada disso. Agora você é minha e vai ficar debaixo do mesmo teto
que eu. Você queria um relacionamento sério, estou disposto a isto e até
mais, mas a quero do meu lado.
Ela sorri, lidamente.
— Está bem, mandão, mas pelo menos vamos passar lá pra pegar minhas
coisas.
— Você nem é tão diferente assim do seu alter ego, ela também me
chama de mandão. — Lucy fica séria, uma ruga se forma no meio em sua
testa e me arrependo por ter tocado no assunto. — Sobre suas coisas, mando
alguém ir buscar depois. Preciso ficar sozinho com você. Eu esperei demais
por isso, não posso esperar mais.
Novamente, seus lábios rosados, bem desenhados, se curvam em um
sorriso lindo, desta vez carregado de malícia e é o bastante para que eu
tenha uma ereção.
CAPÍTULO XXVII
A minha vontade de estar dentro de Lucy é muito maior que minha
capacidade de esperar até chegarmos no palácio, afinal eu já esperei demais,
desde que a deixei partir não penso em outra coisa. Então, desvio do
caminho e pego a uma avenida mal iluminada que leva a um motel
estrategicamente localizado para encontros caldestinos. Não é nada muito
sofisticado, mas deve ter uma cama e isto basta para o que tenho em mente.
— O que você está fazendo? — Lucy indaga quando adentramos os
portões do motel.
Está estupefata, mas seu sorriso não nega que também gostou da ideia.
— Quero te comer agora, não da mais pra esperar.
— Mas os seguranças vão saber.
— Lá no palácio eles iam ver.
— Como assim?
— Tem câmeras pra todos os lados.
Desta vez os olhos dela se arregalam.
— Você me viu nua por meio destas câmeras alguma vez?
— Muitas vezes e infelizmente eles também viram.
Estaciono na garagem da suíte presidencial, salto, dou a vota, abro a
porta do carona e seguro Lucy em meus braços, carregando-a para dentro.
O tesão irrefreável toma conta de mim de forma tão descontrolada que
não há tempo de chegarmos até o quarto, ali mesmo, na antessala, sento-a
sobre a mesa com tampo de mármore, me encaixo entre suas pernas,
seguro-a pelos cabelos, para que não tenha a mínima chance de escapar e a
beijo na boca até que ela esteja sem fôlego, chupo sua língua gostosa e faço
com que ela chupe a minha, ao mesmo tempo em que esfrego minha ereção
sobre seu sexo protegido pelas roupas e quase enlouqueço imaginando o
quanto ela deve estar molhadinha ali dentro da calcinha.
Suas mãos tentam abrir o fecho da minha calça, com ansiedade, as
minhas vão para as suas costas, a procura do zíper do vestido, como não
encontram, descem pela sua silhueta bem feita até alcançarem suas coxas
firmes e lisas e as infiltro sob a saia rodada do vestido, erguendo o tecido
delicado até a altura dos seus quadris, observando o contorno do seu sexo
sob o tecido minúsculo e delicado da calcinha.
Puta merda! Que delícia. Como ela é gostosinha. Como senti saudade de
vê-la assim, toda minha.
Dominado pela luxúria, enfio a mão dentro da calcinha pequena e toco
sua bocetinha totalmente lisa e depilada, enterrando meu dedo do meio
entre seus lábios delicados, massageando a entrada da sua vagina.
Ela, geme, arfa e abre mais as pernas. Já está molhadinha, mas ainda não
o suficiente para me receber, sei disso porque conheço o meu tamanho.
Todavia, não posso mais esperar, a urgência em torná-la minha fala mais
alto que tudo dentro de mim e preciso de apenas um gesto da minha mão
para rasgar o tecido frágil da calcinha e arrancá-la do meu caminho. Em
seguida, tiro o paletó e a camisa, apressadamente e fico satisfeito pela
forma luxuriosa como Lucy observa meu peito desnudo. Desço a calça
junto com a cueca até a altura dos meus joelhos, cubro-me com o
preservativo que encontro sobre a mesa e me encaixo de volta entre suas
coxas, segurando os dois lados dos seus quadris só para me certificar de que
ela não vai me escapar. Faço pressão na sua entrada, tentando abrir
passagem, mas encontrado dificuldade em penetrá-la, porque é muito
apertada e não está suficientemente molhada.
— Ai! — Lucy reclama e tenta se esquivar, mas não deixo, seguro-a
firma no lugar. — Isso está muito rápido. — diz.
— Eu sei, mas não posso parar. Esperei demais por isso. Tenta aguentar.
Ela suspira, se esforçando para relaxar. Abraça-me pelo pescoço me
beija, enterrando sua língua na minha boca, com lascívia, me convidando a
sugá-la e o faço.
Volto a me mover contra ela, cuidadosamente, embora minha vontade
seja me enterrar todo de uma vez. Aos poucos vou encontrado espaço no
seu canal estreito, deslizando devagar para dentro, sentindo-a me apertando
bem gostoso, até que estou todo enfiado nela e dou a primeira estocada,
indo fundo, sua vagina pequena quase esfolando meu pau.
Lucy solta um grito agudo, depois sibila, sei que está entre o prazer e a
dor, mas não posso fazer nada por ela que não comê-la até que a dor vá
embora, pois parar está além do meu alcance, seu corpo vai ter que se
acostumar.
Movido pelo descontrole, meto novamente, saindo todo e me enterrando
com força, abrindo-a aos poucos, sentindo-a cada vez mais molhadinha,
quente e pulsante em volta da minha rigidez. Fecho minhas mãos nas suas
coxas lisas e me enterro nela um pouco mais, até a raiz, quando então giro
meus quadris, fazendo com que minha pélvis massageie seu clitóris, meu
pau se movendo em círculos dentro de si, tão esmagado por suas paredes
que quase chega a doer.
— Ah... Que delícia... — minha voz sai como um grunhido. — Que
bocetinha apertada... Me diz que ela é só minha.
— Sim... só sua...
Dou outra estocada violenta, minha pélvis se chocando contra a sua e
posso ver suas pupilas dilatando, evidenciando o crescimento da sua
excitação.
— Diz que nunca mais será de outro.
— Nunca mais.
Meto nela novamente, implacavelmente e desta vez não consigo mais
parar, meus movimentos se tornam repetitivos e incessantes, cada vez mais
apressados, a medida que sinto sua umidade aumentando, seus gemidos se
intensificando, suas paredes contraindo e relaxando em volta do meu pau,
como se ela me chupasse com a vagina e essa é a melhor sensação que um
homem pode experimentar na vida, a melhor que já tive.
E imaginar que aquele bastardo queria tomar o que é meu.
Pensar nisso me enfurece e meus movimentos se tornam ainda mais
bruscos, quase violentos dentro de Lucy, mas ela não reclama, pelo
contrário, parece tão descontrolada quanto eu.
Sua boca linda está aberta, seus gemidos ecoam alto pela sala pequena o
que me deixa ainda mais doido, viciado, quase fora de mim.
Ela inclina seu corpo para tás, apoiando as duas mãos na mesa e abre
mais as pernas, movendo seus quadris contra os meus, incessantemente. É
então que sinto todo o seu corpo se contrair e sei que ela vai gozar.
— Lennon... eu vou... ahhh...
Sem desviar seus olhos dos meus, ela explode em um orgasmo, seus
gemidos se transformando em gritos, seu corpo sacudindo todo, as lágrimas
fugindo dos seus olhos.
Tento me segurar, mas não consigo e me esvaio dentro dela, gozando
como nunca gozei na vida, meus espasmos se fazendo junto com os seus,
um único gemido escapando-me da boca.
Eu nunca tinha gozado tão depressa e nunca tinha sido tão bom. Acho
que toda essa intensidade foi motivada pela saudade, pela espera.
Quando nossos corpos se aquietam, tomo sua boca e a beijo com a toda a
paixão que explode em meu peito, desta vez mais devagar.
— Me desculpa. — falo, sem me retirar de dentro dela, simplesmente
porque me recuso a sair.
— Pelo quê?
— Por ter agido como um animal.
Ela sorri, seus olhos brilhando como duas joias preciosas.
— É, você agiu mesmo, mas eu gostei. Não há nada que você faça que
eu não goste.
— E não há nada em você que eu não venere. — e é verdade.
— Nem meu alter ego?
Fico surpreso pela forma natural e espontânea como ela toca nesse
assunto que acredito ser delicado para si.
— Eu a venero porque ela é parte de você.
— A pior parte de mim.
— Não. Apenas diferente. Não existem duas de você, para mim você é
só uma.
— Você pode não conseguir domá-la um dia.
— Acho que já passei dessa fase.
Lucy sorri amplamente.
— E saiu sem nenhum arranhão?
— Uma pequena dor no pulso. Nada grave.
— Você é a primeira pessoa que eu conheço que não a odeia.
— Como eu posso odiar uma parte de você se eu te amo?
— Ama?
— Sim, Lucy. Eu estou apaixonado.
Ela sorri tão lindamente que sinto vontade de morder seus lábios
rosados.
— Eu também te amo, Lennon.
Já ouvi esta frase de muitas mulheres antes e nunca vi nenhum
significado nela, nunca encontrei nenhum sentido, entretanto, ouvir isso da
boca de Lucy mexe com cada uma das minhas terminações nervosas, faz
com que meu corpo reaja de imediato, pedindo pelo dela, numa súplica
silenciosa e meio desesperada. Sem que eu compreenda o porquê, meu
coração assume um ritmo mais acelerado no peito, como se eu fosse um
adolescente que conquista a primeira namorada.
Sem que eu perceba, estou duro novamente, me movendo devagar dentro
dela, meu pau escorregando na abundancia do seu gozo, enquanto minha
boca busca pela sua, sequiosa. Mas isso não vai dar certo, preciso trocar o
preservativo cheio antes que ele rompa e preciso dar um pouco de conforto
à minha garota.
Assim, sob seus protestos, me retiro do seu interior, livro-me do
preservativo usado, da calça e da cueca, ainda enroscadas nas minhas
pernas e carrego Lucy nos braços para dentro da suíte.
É um quarto de motel como qualquer outro, com uma luz fraca, cama
redonda, espelho no teto, frigobar, hidromassagem, talvez uma piscina com
cascata no cômodo seguinte, um filme pornô sendo exibido na televisão de
tela plana e uma poltrona erótica.
Mas eu não presto atenção em nada daquilo, estar com Lucy é tudo o que
me importa, só enxergo ela dentro do quarto.
Cuidadosamente, estendo-a sobre a cama redonda, tiro seu vestido e o
sutiã, detendo-me ao lado para observar sua completa nudez.
Definitivamente seu corpo parece ter sido esculpido por anjos. Suas curvas
são perfeitas, tem a silhueta fina, bem torneada, os seios pequenos e
empinados, o ventre reto, o sexo pequeno, com lábios rosados que estão
sempre depilados e as pernas firmes e bem torneadas.
— Linda... — sussurro, fascinado, extremamente excitado.
— Você também é. — ela diz, examinando atentamente minha nudez.
Subo na cama e sento-me entre suas pernas. Ergo uma de suas pernas,
trazendo seu pé lisinho e delicado até minha boca. Começo chupando seu
dedão para depois fazer o mesmo com os outros, satisfeito ao vê-la arfando
sobre a cama, tão convidativa quanto um oásis no deserto.
Parto par seu outro pé e o acaricio com a minha boca, mordendo e
lambendo seus dedos finos, para em seguida subir pela sua panturrilha,
beijando e mordiscando sua pele aveludada até alcançar sua boceta lisa.
Faço-a afastar mais as pernas e uso meus polegares parar abrir seus lábios
rosados, fascinado com a visão do seu clitóris pequeno, todo melado da sua
lubrificação. Aproximo meu rosto e aspiro o cheiro, inebriado com o quanto
é bom.
Experimento-o com a ponta da minha língua, com uma lambida apenas,
extasiado com o sabor, é o gosto da luxúria, do tesão irrefreável, como tudo
mais nela.
Lucy reage com um gemido alto, o que me incentiva a continuar e movo
minha língua freneticamente sobre seu botãozinho, até que ele esteja
inchado, quando então o coloco entre meus lábios e sugo devagar, enquanto
ela se contorce toda sobre a cama, gemendo alto, puxando meus cabelos
com seus dedos delicados.
Sei que está muito perto de gozar, basta mais algumas lambidas para que
exploda, mas estou disposto a prolongar aquilo, para o meu e para o seu
prazer. Então, escorrego minha língua para a sua vagina lambuzada e a
penetro, experimentando aquele sabor de luxúria que me deixa doido. Volto
para o clitóris e a provoco um pouco mais, lambendo, para depois chupar e
então parar antes que ela exploda. Ergo suas pernas e dou umas boas
lambidas no seu cuzinho pequeno, relembrando a noite na boate, quando me
enterrei todo ali, o quanto foi gostoso. Acho que vou experimentar de novo,
mais tarde.
O pensamento me causa uma violenta corrente de tesão e volto a mover
minha língua sobre o clitóris de Lucy, ao mesmo tempo em que enterro um
dedo na sua vagina e outro em seu anus, deixando que ela mergulhe no
êxtase, fascinado por ouvi-la gemendo meu nome, repetidamente, enquanto
goza na minha boca.
Quando ela fica lânguida, toda molinha sobre a cama, levo minha boca
até a sua, fazendo com que chupe minha língua e se farte com seu próprio
gosto, depois, procuro por outro preservativo. Encontro-o no painel da cama
e me cubro. Minha vontade é de montá-la daquele jeito mesmo e meter na
sua boceta até me esvair dentro dela, mas minha cota de animalia já se
esgotou por hoje. Então, olho para a poltrona erótica e tenho várias ideias
maliciosas.
— Vem comigo. — levanto-me e a convido.
Lucy me segue até a poltrona, com os ombros encolhidos, como se
caminhar nua pelo quarto, diante dos meus olhos sequiosos, a
envergonhasse.
— O que é isso? — ela pergunta, gesticulando para a poltrona erótica.
— Você vai já saber.
É uma poltrona das simples, apenas um móvel ondulado estofado.
Verifico se está higienizado e mando que Lucy se deite de bruços, de modo
que fica com os pés apoiados no chão, um de cada lado, com as pernas bem
abertas, a bunda empinada e o torso estirado. Desmancho a trança em seus
cabelos, deixando as ondas fartas e douradas caírem pelas suas costas e faço
a volta em torno de si, devagar, admirando-a.
É realmente a visão mais bela que já tive. Seu corpo esguio, feminino,
totalmente exposto para mim, esperando minha decisão sobre o que
acontecerá em seguida, me deixa louco de tesão. Paro atrás de si,
examinando sua boceta inchada, ligeiramente avermelhada pelo que fiz
quando chegamos. Antes do amanhecer ela estará ainda mais inchada e
vermelha.
Dou um tapa estalado na sua bunda, depois passo a mão na fenda entre
suas nádegas e por fim toco sua bocetinha, massageando o clitóris e a
entrada da sua vagina, extasiado com a forma como ela reage, gemendo
dengosa, movendo os quadris para buscar mais minha mão.
Coloco seu botãozinho rosado entre meus dedos e massageio até que
esteja bem duro, então o deixo. Dou outro tapa na sua nádega, deixando a
marca da minha mão e me coloco à sua frente, meu pau diante do seu rosto
lindo, contorcido de prazer.
— Chupa. — ordeno.
Ela obedece de imediato, colocando meu pau na boca, sem deixar aquela
posição que me enche os olhos. Percebo que não demonstra a mesma
experiência que tem quando está no modo Samantha, mas tenta. Passa a
língua em torno da glande, e o enfia na boca, quase se engasgando.
Encho minhas mãos com seus cabelos, imobilizando-a, e empurro meu
pau ainda mais fundo, indo até sua garganta, metendo e tirando, fodendo-a
assim para que ela aprenda.
Como se deixasse se guiar por seus instintos de fêmea, ela o segura pela
raiz e começa a masturbar ao mesmo tempo em que chupa, exatamente
como Sam fez e isso me leva muito perto da loucura, estou a ponto de gozar
de novo, o que é espantoso, considerando que nunca fui um cara fácil de
gozar, pelo contrário.
Lucy aprendeu depressa, está chupando meu pau como mais experiência,
socando e tirando da sua boca, depressa, depois devagar, passando a língua
pelo saco, sugando a glande, sem jamais deixar de me masturbar com a
mão.
— Ah! Porra! Assim você me deixa doido! — praticamente rosno.
Estou quase enchendo sua boquinha de leite, quando sou obrigado a
fazê-la parar, porque quero mais da sua boceta apertando meu pau.
Assim, vou em busca de outro preservativo no painel da cama e me
cubro. Coloco-me em pé atrás dela, inclino os joelhos para alcançá-la entro
nela com um golpe único e certeiro, seu canal pequeno me apertando da
forma que me enlouquece. Puxo os quadris e meto de novo, com força,
sendo recompensando pelo seu gemido alto.
— Gosta disso? — pergunto, com dificuldade em puxar o ar.
— Sim.
— Então me pede pra te fo.der.
— Me fode Lennon, me fode muito, me deixa toda dolorida com esse
pau enorme e gostoso...
Seu tom é de súplica, sua voz é meiga e dengosa, o que me deixa ainda
mais excitado.
Passo e me mover dentro dela em vai e vem, com força, depressa, indo
cada vez mais fundo, observando seu cuzinho pequeno e rosado se contrair,
como se ela quisesse tomar ali também.
Não resisto e enfio meu dedo indicador nele, movendo-o devagar, para
dentro e para fora.
Lucy geme ainda mais alto e rebola na minha mão o que me incentiva a
enfiar o segundo dedo.
Puta merda! Como é apertadinho.
Estou com três dedos enterrados nela, sem deixar de enfiar o meu pau até
a base na sua bocetinha, quando ela começa a gemer o meu nome,
ensandecida, rebolando como uma cadelinha no cio e isso me deixa doido.
Tento me segurar, mas não consigo, retiro-me do seu canal e me agacho
atrás dela, levando minha boca ao seu ânus minúsculo, lambendo-o até que
esteja lubrificado e pronto para me receber.
Quando volto a me levantar, é ali que coloco o meu pau, fazendo
pressão, tentando entrar.
Lucy fica toda tensa e tenta escapar, mas a seguro firme no lugar, pelos
quadris.
— Quietinha. Vou comer esse cuzinho e não há nada que você possa
fazer pra me impedir.
— Não vou aguentar, seu pau é muito grande. — ela diz, dengosa.
— Você já aguentou uma vez. Basta relaxar e deixar o resto comigo.
Ela respira fundo, obrigando seus músculos a relaxarem e descansa a
cabeça sobre a poltrona.
— Se machucar você para.
— Certo. Agora relaxa.
Abro suas nádegas com as duas mãos e volto a fazer pressão. Quando a
cabeça entra, ela solta um grito e novamente tenta escapar, mas não deixo.
— Ai! Ta doendo! — reclama.
— Quietinha. Daqui a pouco a dor passa.
Passo a mão por baixo do seu quadril e começo a massagear seu clitóris,
isso faz com que ela relaxe de imediato, e se abra mais para mim. Assim,
vou escorregando devagar par o seu interior, seu anelzinho apertando meu
pau, até que estou todo enterrado nela, latejando contra sua rigidez, meu
pelos púbicos acariciando sua bunda.
Sem deixar de masturbá-la, passo a me mover dentro dela, em vai vem,
tirando e enfiando de novo, devagar para não machucá-la ainda mais.
A princípio Lucy se contrai, tenta fugir, mas logo está entregue, tão cheia
de tesão quanto eu e começa a rebolar, gemendo meu nome, pedindo por
mais. É então que passo a estocar duro e fundo, cada mais depressa e ela
geme alto, ensandecida, arremetendo sua bunda contra meus quadris, seu
corpo totalmente entregue ao meu, acostumando-se ao meu tamanho.
Inclino-me sobre ela e planto beijos e mordidas em sua nuca e na orelha,
faço com que ela vire o rosto e enterro minha língua na sua boca, para que
ela chupe e é assim que explodimos, gozando juntos, nossos corpos
ondulando ao mesmo tempo, minha boca bebendo seus gemidos, meus
espasmos se fazendo no seu canal mais estreito, seus líquidos banhando
minha mão com abundância, até que ficamos imóveis e lânguidos, o
silêncio profundo se fazendo no quarto.
CAPÍTULO XXVIII
Estou tão lânguido, com meus membros pesados, que só não me deixo
cair sobre Lucy porque sei que isso a machucaria de verdade, já que a
poltrona não é tão macia quanto o colchão. Então, me retiro com cuidado do
seu interior, livro-me da camisinha cheia e ergo-a em meus braços para
carregá-la de volta para a cama. Deito-a no colchão e me aconchego ao seu
lado, descansando sua cabeça em meu peito, quando então ela joga uma
perna e um braço sobre mim.
— Isso foi muito louco. — ela diz, a voz preguiçosa.
— Eu devia ter te preparado melhor, acho que me precipitei. Desculpe.
— Foi louco, mas foi bom.
— Eu sabia que você ia gostar, porque foi assim da outra vez.
— Nós fizemos isso antes?
— Sim, em uma boate em Paris.
Ela ergue a cabeça e fita-me perplexa.
— Uma boate?
— Sim, nessas que têm camas espalhadas por todos os lados.
— Minha nossa. Eu nem sabia que esse tipo de coisa existe. — ela fica
em silêncio por um instante, antes de disparar: — Que loucuras mais nós
fizemos?
— As mais deliciosas que você possa imaginar.
— Me conta?
— Gostaria de comer ou beber alguma coisa antes?
— Não. Só quero saber como sou quando não estou em mim.
— É louca, fogosa e apaixonante.
— Mais apaixonante que o meu normal?
— É um complemento. Sua outra parte a torna perfeita.
Lucy faz outro momento de silêncio, como se hesitasse em continuar.
— Você sabia que eu posso apresentar outras personalidades? Tipo,
acordar um dia achando que sou uma terrorista ou uma assassina em série e
nem me lembrar de você.
— Se você está dizendo isso para tentar me fazer desistir de você, não
está dando certo. Eu te quero do jeito que você é e não acredito que exista
maldade dentro de você o suficiente para trazer à tona uma personalidade
tão ruim.
— E se eu trouxer alguém que não sabe quem é você?
— Eu me apresento e a convenço de que sou o homem da sua vida.
Lucy solta uma gargalhada e me lembro do quanto gosta de fazer isso
quando está ligada no modo Samantha.
— Você é mesmo corajoso.
— É porque estou apaixonado.
— Eu também estou. Agora me conta o que você e aquela louca
aprontaram.
Narro-lhe cada momento que passei consigo mesma quando estava
ligada no modo Samantha. Falo sobre o voo de parapente, o salto de
Bungee Jumping, o passeio de gôndola, o banho de mar e tudo mais. Ao
final da minha narrativa ela está estupefata, não apenas porque consegui
manter-me ao lado de Sam o tempo todo, mas porque curti as aventuras
para as quais fui arrastado por ela.
Passamos o resto da noite ali no motel, fazendo amor, loucamente, sem
que eu consiga controlar a selvageria que o desejo irrefreável que sinto por
Lucy aflora dentro de mim. Depois, dormimos abraçadinhos completamente
nus e, como sempre, sou acordado pelo toque insistente do meu celular que
ainda está na antessala.
Levanto-me na ponta dos pés para atender. É o secretário do gabinete
que vem me relatar a avalanche de problemas que minha ausência, durante
as primeiras horas do dia, acarretou.
Mas não quero saber de problemas agora, só quero saber de Lucy e é por
isso, que desligo o telefone quando volto ao quarto e a observo ainda
adormecida, completamente nua, de bruços, com o bumbum empinado, as
pernas meio abertas, de modo que posso ver sua boceta completamente
vermelha e inchada, resultado de uma noite bastante movimentada.
Imediatamente tenho uma ereção e, dominado pela luxúria, me debruço
sobre seu corpo e beijo sua nuca e sua orelha, para em seguida descer minha
boca pela maciez da sua pele. Mordo sua bunda de leve e abro mais suas
pernas e alcanço sua vulva com a ponta minha língua. Saboreio seus
grandes lábios, antes de invadi-los e atacar seu clitóris, lambendo-o com
movimentos frenéticos, até que esteja duro.
Ainda dormindo, Lucy se contorce toda, geme, arfa e me pergunto se o
que estou fazendo não é algum tipo de abuso sexual, afinal ela está
adormecida.
Tento parar, mas o vício no seu gosto é mais forte do que eu e continuo
chupando-a, ora lambendo o clitóris, ora sugando-o, até que por fim Lucy
acorda e só tem tempo de clamar pelo meu nome antes de explodir no
orgasmo, gozando gostoso na minha boca, presenteando-me com seu
líquido viçoso e salgado.
— Bom dia. — falo, sorrindo para ela.
— Nossa, Lennon, você é um pervertido. — ainda bem que ela diz isso
sorrindo.
— E a culpa é toda sua, por me deixar louco de tesão.
— Mas eu não fiz nada. — Lucy se vira de frente e levo minha boca até
a sua para que ela chupe minha língua e saboreie o próprio gosto.
Sei que devia mostrar um mínimo de gentileza e lhe oferecer um café da
manhã, mas minha mente entorpecida de desejo está elaborando outros
planos e é pensando nisso que monto sobre ela, sobre seu colo, com os
joelhos apoiados no colchão, uma perna de cada lado, aproximando meu
pau, duro como uma pedra, do seu rosto lindo.
— Chupa. — ordeno e ela obedece, colocando-o na boca, sugando-o
com mais experiência, levando-o até a garganta sem bater os dentes,
lambendo o saco, saboreando o líquido que escorre pela glande.
Louco de tesão, apoio as mãos na parede e arremeto meus quadris contra
seu rosto, fodendo sua boca desta forma, enterrando-me muito fundo e
tirando.
— Caralho... vou ter que encher essa boquinha de leite... você está muito
inchada lá em baixo pra tomar na boceta agora... — murmuro.
— Enche... me da seu leite todinho... — ela geme como uma putinha e
isso só me deixa mais excitado.
Sua mão delicada segura a base do meu pau, masturbando-o, ao mesmo
tempo em que continuo enterrando-o em sua boca, sem a menor piedade,
com força, empurrando até a garganta. É assim que o gozo vem, abundante
e arrebatador, fazendo meu pau ondular, meu esperma se esvaindo na sua
garganta, até que não reste uma só gota.
Estou mole quando me retiro dela, porém, quando a vejo engolir minha
porra, para em seguida lamber os lábios, com lascívia, sinto vontade de
voltar e continuar fodendo-a até não poder mais. Todavia, há todo um
mundo cheio de problemas a serem resolvidos me esperando lá fora e
preciso voltar para ele.
Me afasto, mas não sem antes beijar a boca da minha garota, apaixonada
e demoradamente, para que ela não ouse duvidar do quanto é importante
para mim.
— Vou pedir o café. O que você vai querer? — pergunto, pegando o
interfone.
— Qualquer coisa está bom. — é sua resposta.
Peço tudo o que tem de melhor no cardápio.
Enquanto esperamos, tomamos um banho rápido, sem tempo para mais
nada além de alguns amassos debaixo da água quente e logo depois do café
deixamos o lugar.
Não me surpreendo que o Mercedes cheio de seguranças esteja
estacionado diante da entrada da suíte, nos esperando e posso apostar como
interditaram o motel, puxaram a ficha criminal de todos os funcionários e
revistaram até as calças dos garçons.
Essa é a minha vida.
Ordeno que Donald dirija a Land Rover para que eu possa atender à
enxurrada de telefonemas e me acomodo junto com Lucy no assento
traseiro.
Fico perplexo quando converso com um dos meus assessores e este
relata que há fotos do que aconteceu ontem a noite no Desire e várias
versões da história circulando pelas redes sociais e até na televisão. Não se
fala em outra coisa, em toda a Europa, que não na suposta rixa entre mim e
Hudson por causa de uma garota, a mesma garota que me acusou de estupro
durante uma festa, para logo depois retirar a acusação. Até nossa
permanência no motel chegou ao conhecimento público e posso apostar que
há uma multidão do lado de fora nos esperando sair.
Mas que merda! Não se pode ter uma vida íntima sem ser questionado e
julgado o tempo todo?
— Algum problema? — Lucy indaga, ao me ver proferir alguns
palavrões ao telefone.
— O de sempre: fofocas e mentiras.
— Sobre nós dois?
— Sim. Mas não se preocupe, tudo será resolvido.
Ela me encara com tristeza, como se se culpasse por tais problemas e
isso me incomoda, porque me deixa inseguro.
Depositar minha felicidade nas mãos de outra pessoa é uma merda
mesmo, mas é uma merda que vale à pena, estou aprendendo isso aos
poucos.
Lucy.
Lennon me deixa na segurança do palácio de Chambers e parte para
direto para o seu gabinete, sem ao menos trocar as roupas amarrotadas que
usa desde ontem. Posso perceber o quanto está preocupado e estressado e
embora diga que são coisas do trabalho, acredito que se deva às fofocas
sobre nós dois que estão rolando na internet, o que me faz sentir meio
culpada por lhe trazer tais problemas, apesar do que a escolha foi dele.
Como passa das dez da manhã, vou direto para a sala da lareira, onde sei
que encontrarei a Sra. Rudolf. Como sempre, ela está imóvel na sua cadeira
de rodas, com o olhar perdido no infinito, os olhos enrugados desprovidos
de qualquer expressão. Diana está sentada em uma poltrona ao seu lado e
me cumprimenta com satisfação.
— Como ela está? — pergunto.
— Como sempre. Não fala, não anda e não faz nada sozinha. — Diana
diz.
Agacho-me diante da velha mulher, nivelando nossos rostos e falo com
ela, chamo-a de mãe, digo que sou Lindsay, mas nada parece adiantar. Ela
não esboça mais qualquer reação a mim, o que é realmente lamentável, pois
gosto dela e queria vê-la se recuperando.
Lennon está tão absorto com os assuntos do seu trabalho que não vem
almoçar no palácio, embora telefone para avisar e se desculpar.
Como eu não trouxe minhas roupas e levei todas as peças que estavam
aqui quando me mudei, sou obrigada a vestir um dos trajes caros e vulgares
que Samantha comprou em Paris e estão no closet do meu antigo quarto,
organizadas como se Lennon nunca tivesse deixado de ter certeza de que
eu, ou meu alter ego, voltaríamos. Ou é isso, ou terei que passar o dia com
aquele vestido desconfortável que Dayse me emprestou para ir jantar com
Hudson, porque não se pode ir jantar com o Primeiro Ministro de Flower
Garden usando qualquer roupa.
O motivo disso, é a advertência que Lennon me fez de não deixar o
palácio, em hipótese alguma, sem a companhia dos seguranças e não quero
ir às comprar com um bando de brutamontes me seguindo.
O resto dos meus problemas resolvo por telefone, pedindo demissão do
restaurante e avisando Dayse que não vou mais voltar ao apartamento. Ela
está eufórica pelo que viu na internet, diz que a cidade inteira está falando
sobre Lennon e eu.
Com Kevin não preciso mais falar, pois terminei o namoro no dia em
que deixei o palácio, e embora tenha tentado me convencer de que o motivo
foi o fato de não achar certo continuar com ele depois do que aconteceu
entre mim e o presidente, sei que foi porque não preciso mais dele, já que
minha constante luta pela destruição do homem que eu acreditava ter tirado
a vida do meu padrasto acabou.
O resto do dia no palácio é entediante. A Sra. Rudolf não fala mais
comigo, Diana só da atenção a ela, os outros empregados estão sempre
ocupados, de modo que não tenho com quem conversar. Então só me resta
ir fuçar as redes sociais e fico perplexa com tudo o que estão inventando a
nosso respeito. Cada site tem uma versão mais bizarra que a outra para a
nossa história e nenhum deles diz a verdade, porque uma paixão simples e
casual que acontece entre dois seres humanos não atrai comentários nem
visualizações.
Quando o assunto se torna maçante nas redes sociais, meu dia fica ainda
mais entediante, não tenho nada para fazer que não olhar para o teto e para
as paredes douradas do palácio. Lembro-me de que Lennon disse que tem
câmeras por toda parte e isso me deixa pouquíssimo à vontade.
Sinceramente, eu amo estar com Lennon, mas não vou aguentar uma
vida assim por muito tempo. Preciso me ocupar com alguma coisa ou vou
acabar surtando. Talvez voltar a estudar seja a solução.
Quando o horário em que ele costuma chegar ao palácio se aproxima,
decido fazer uma surpresa. Já que não estou fazendo nada mesmo, vou pelo
menos me divertir. Uso a chave que ele me deu e pela primeira vez entro
em seu quarto. Juro que esperava encontrar uma suíte luxuosa, com espelho
no teto e lençóis de cetim em uma cama redonda, mas não passa de um
quarto sem graça, grande, porém com a decoração rústica e sem charme
algum. Tem a cama imensa, forrada com lençóis cinza, o closet enorme
abarrotado de ternos caros, uma mesa com cadeiras, um jogo de estofados,
uma escrivaninha com computador e mais nada, nenhum porta retratos,
nenhum quadro na parede.
Tento ignorar o fato de que estou cercada por câmeras e troco o conjunto
de saia e blusa colado, pela lingerie sexy, preta, com renda transparente e
fio dental, que encontrei em meio às coisas que Samantha comprou e mais
enfeita o corpo que o cobre de fato. Solto os cabelos, escovo-os até ficarem
brilhantes, passo um pouco de maquiagem e deito-me na cama, o mais
sensual possível.
Eu nunca agi assim com outro namorado antes, nem mesmo com Kevin.
Não sei o que está havendo comigo, deve ser pura falta do que fazer.
Depois de uma longa espera, por fim a porta se abre e Lennon entra. Tem
a fisionomia cansada e grandes olheiras sombreiam seus olhos. Assim que
detém seus olhos em mim, fica parado perto da porta, observando-me
minuciosamente, devorando meu corpo com o olhar e o estresse na sua
expressão dá lugar ao fogo da luxúria.
— Olá, querido. Como foi o seu dia? — pergunto e levanto-me para ir
encontrá-lo. Tiro a valise de couro da sua mão, abandonando-a no chão, ao
seu lado e o abraço pelo pescoço, aproximando meu rosto do seu.
— Foi um saco. — ele me abraça pela cintura e me aperta tão forte que
tenho dificuldade de respirar. — Mas tudo vale à pena quando se pode
voltar para casa e encontrar você. — diz, e no instante seguinte sua boca
cobre a minha, em um beijo selvagem, carregado de luxúria e de paixão,
que desperta o desejo primitivo dentro de mim.
Enquanto chupo sua língua, aconchego mais o meu corpo ao seu,
pressionando meu ventre na firme e poderosa ereção que se forma sob suas
roupas, o tesão me incendiando de dentro para fora, a lubrificação se
fazendo entre minhas coxas.
É impressionante a intensidade com que quero aquele homem, jamais
antes foi assim com outro, acho que porque jamais antes estive apaixonada.
Com mãos ansiosas, tiro o se paletó e tento abrir o nó da sua gravata,
mas Lennon não espera, logo está descendo sua boca deliciosa pelo meu
corpo, lambendo minha pele com lascívia, primeiro no pescoço, depois no
colo, até colocar um dos meus mamilos entre seus dentes, por sob o tecido
delicado da lingerie e fazer aquela pressão gostosa antes de massagear e
sugar.
É o que basta para que eu esteja perdida em seus braços, completamente
entregue ao mar de sensações libidinosas, tudo de mim latejando,
implorando silenciosamente por ser possuído por ele.
Sua boca continua descendo pela minha pele, mordiscando, beijando,
lambendo. Como fez na primeira vez em que fizemos amor, ele se ajoelha
aos meus pés, afasta o tecido minúsculo da lingerie para o lado, observa
meu sexo por um instante e então aspira meu cheiro, seus olhos se
fechando, sua face se contorcendo de prazer. Seus polegares afastam meus
grandes lábios e sua língua mergulha entre eles, atingindo em cheio o meu
clitóris, lambendo-o freneticamente, tão deliciosamente que preciso me
segurar em seus cabelos para que minhas pernas não fraquejem.
Ensandecida de prazer, abro mais minhas pernas para ele e solto um
gemido alto quando então seus lábios se fecham sobre meu ponto mais
sensível e o sugam com experiência.
Estou muito perto de mergulhar no êxtase quando Lennon para, levanta-
se e volta a atacar minha boca, inserindo sua língua gostosa entre meus
lábios. Empurra-me até a parede mais próxima e me encurrala com seu
corpo grande.
Com mãos apressadas, ele abre o fecho da sua calça e a desce junto com
a cueca até os joelhos, desnudando o pau enorme, completamente ereto, tão
delicioso que me dá água na boca. Tira um preservativo do bolso, coloca e
volta a me encurralar, segura-me pelos quadris para erguer-me do cão e me
penduro nele, abraçando-o com as pernas e os braços e é assim que a
penetração acontece, dura, firme, implacável, deliciosa.
— Nunca vou me cansar de comer essa bocetinha apertada.... — ele
sussurra, meio rouco, sem desviar seus olhos dos meus.
Sinto-o se movendo dentro de mim com estocadas abruptas, fundas, e
praticamente vou ao delírio, ensandecida de prazer, meu mundo se
resumindo àquele homem de uma forma que não compreendo, como se
nada mais me importasse que não pertencer a ele.
Quanto mais depressa ele se move, mais altos se tornam meus gemidos,
mais gostoso é o contato das minhas paredes escorregadias com a sua
rigidez. A luxúria me domina de forma implacável e passo a arremeter-me
contra ele no mesmo ritmo, até que meu corpo todo se contrai, anunciando
o gozo e ele mete com mais pressão para que logo estejamos explodindo
juntos, gozando gostoso, nossos corpos ondulando no mesmo ritmo, nossos
gemidos se misturando, meus líquidos escorrendo com abundância pelas
minhas coxas, seus espasmos e fazendo deliciosos dentro de mim.
Aquilo foi tão intenso que as pernas dele parecem fraquejar e vamos os
dois parar no chão, meu corpo sobre o seu e começamos a gargalhar de nós
mesmos, sem nos apartarmos e sem que ele deixe o meu interior.
CAPÍTULO XXIX
— Eu não tenho mais a sua idade, Lucy. — Lennon fala, o rosto muito
sério enquanto seu polegar desliza pela minha face.
— Mas é tudo o que quero. — dou uma mordidinha em seu dedo. — O
que sinto quando estou com você é mais do que um dia esperei de um
homem.
Ele me encara em silêncio por um longo momento, uma ruga se
formando no centro da sua testa.
— E você é tudo o que eu sempre quis e não sabia. — Ele segura-me
pela nuca e me puxa para si, tomando minha boca em um beijo demorado e
apaixonado. — Agora vamos jantar enquanto Ruth ainda está acordada.
Ele se retira de mim, levanta-se e me ajuda a fazer o mesmo.
— É verdade que têm câmeras aqui? — pergunto, me sentindo pouco à
vontade.
— Sim. Provavelmente estamos sendo assistidos por meia dúzia de
tarados agora. — cruzo meus braços na frente do corpo, horrorizada. — Por
isso nunca tinha ficado com uma garota aqui antes. Mas amanhã mando
tirar tudo, não se preocupe.
— Não é arriscado tirá-las? Se estão aqui é porque existe uma razão.
— Exagero do chefe de segurança. Ele deve ter premeditado que uma
coisa linda como você ia bater no meu carro em alguma noite dessas. — ele
altera o tom da voz e entendo que quer ser ouvido, o que me faz sorrir. —
Onde estão suas coisas? — Lennon indaga, quando abre a porta do
gigantesco closet e vê só suas coisas.
— Estão no meu quarto.
— Mas o seu quarto é aqui. — não sei o que dizer. Ainda acho que
estamos indo muito rápido. É muito cedo para que estejamos morando
juntos, mal nos conhecemos. Lennon se coloca diante de mim, fitando-me
fixamente nos olhos. — Você ainda tem alguma dúvida de que quer ficar
comigo?
— Claro que não. Ficar com você é tudo o que quero.
— Então traga suas coisas pra cá.
— Depois faço isso
Tomamos banho juntos e descemos para um silencioso jantar na
companhia de uma estática Sra. Rudolf e de Diana. Percebo o quanto
Lennon muda quando está na companhia da mãe, seu bom humor
desaparece, a depressão o toma de forma devastadora. Mas quem pode
culpá-lo por se sentir assim?
De volta ao quarto, que agora é nosso, fazemos amor até a exaustão, para
então permanecermos abraçadinhos um ao outro, nossos corpos ainda
trêmulos, apenas o som da nossa respiração ofegante enchendo o ambiente.
— Você realmente tentou todos os meios possíveis de encontrar sua
irmã? — faço a pergunta que não quer calar desde a hora do jantar.
Sinto seu corpo estremecer de encontro ao meu e sei que toquei em um
assunto delicado.
— As coisas são mais complicadas do que você pensa. — ele diz,
secamente.
— Me conta.
Lennon ergue o rosto para me encarar antes de falar.
— Você vai me odiar se eu te contar.
Puta merda! O que ele fez?
— Prometo que não vou.
— Promete mesmo?
— Sim.
Ele respira fundo. Volta a deitar a cabeça no travesseiro e fecha os olhos
como se buscasse as lembranças no fundo de sua memória.
— Lindsay tinha quinze anos quando começou a namorar Billy, o filho
de Avery Green.
— Espera. Mas ela também não é filha de Green? Fruto do caso que sua
mãe teve com ele?
— Sim, mas na época ninguém sabia de nada, só o casal de adúlteros e
eles se calaram. Quando a verdade veio à tona, Lindsay tinha dezenove
anos e os dois se deixaram. Mas estavam apaixonados demais, não
conseguiram ficar afastados por muito tempo e começaram a sair às
escondidas, até que ela ficou grávida. — a medida que ele fala, um nó vai
se formando em minha garganta, pois quase posso adivinhar onde ele entra
nessa história. — Eles iam assumir o relacionamento perante a sociedade
mesmo sendo irmãos, por causa da gravidez, mas eu não pude permitir,
porque isso se tornaria um escândalo e prejudicaria minha carreira política.
O nó na minha garganta está quase me sufocando.
— Por Deus, Lennon! O que você fez?
— Eu os ameacei. Disse que não os apoiaria se fossem condenados pela
justiça por incesto e ainda estipularia uma lei que levasse esse tipo de crime
à pena de morte. Eu queria que ela fizesse um aborto e esquecesse Billy,
mas ela optou por ter a criança e os dois desapareceram sem deixar rastro.
— Meu Deus! — estou estupefata. — E você realmente não sabe onde
eles estão?
— Sei. O segundo detetive que contratei para encontrá-los os localizou.
Estão vivendo nos Estados Unidos, como marido e mulher, usando nomes
falsos e a filha deles tem quatro anos. Não deixei que eles soubessem que os
encontrei. Acham que estão bem escondidos.
Processo toda aquela informação e então me lembro da Sra. Rudolf em
estado catatônico naquela cadeira de rodas. Se Lennon quisesse, poderia
acabar com o sofrimento dela, levando-a para viver com a filha, por
exemplo, pois isso não o prejudicaria, mas ele age como se apenas a
presidência do país lhe importasse e nada mais, como se o poder fosse mais
importante para si do que a felicidade da sua mãe e da sua irmã. Eu não
entendo como alguém pode pensar assim. Será que os membros do JUD
estão todos certos sobre ele ser um monstro que só pensa em dinheiro? Que
coloca o poder acima de tudo? Ao que parece, sim.
Não consigo permanecer ao seu lado na cama e levanto-me com
movimentos mecânicos, enrolando o lençol em torno do meu corpo,
afastando-me.
— Você prometeu que não me odiaria se eu te contasse. — Lennon diz,
vindo atrás de mim.
Não consigo olhar em seu rosto.
— Como você pode viver sabendo que sua mãe está daquele jeito por
causa da sua sede pelo poder e pelo dinheiro!? — ele permanece em
silêncio atrás de mim e posso ver a angústia em seu olhar quando me viro
para encará-lo. — Será que a presidência do país é mais importante pra
você que a mulher que te colocou no mundo?
— Não é tão simples assim. A demência é uma doença sem precedentes.
Não há garantias de que ela estaria diferente se Lindsay estivesse aqui.
— Mas é claro que estaria! Você mesmo disse que ela adoeceu na
ocasião em que sua irmã desapareceu e você viu como ela melhorou quando
me confundiu com Lindsay.
— A situação fugiu do meu controle, Lucy.
— Mas você podia remediar tudo. E ainda pode.
Ele desvia seu olhar para os próprios pés, como se já não tivesse
capacidade de encarar-me no rosto.
— Eu não posso. É assim que sou.
Já não tenho certeza se consigo voltar a permitir que ele me toque um
dia. Com meu coração quebrado, o que vejo diante de mim é nada mais que
um covarde, ambicioso e egoísta que coloca os próprios interesses acima de
tudo, inclusive da família. Eu não acredito que uma pessoa como ele seja
capaz de amar de verdade e na primeira oportunidade, vai me colocar em
segundo plano em sua vida em nome do poder. Eu não posso viver assim,
sou incapaz de aceitar tudo o que ele é.
— Desculpa, mas não posso viver assim. — as palavras saem trêmulas e
movendo-me mecanicamente, caminho para a porta, porém Lennon se
coloca em meu caminho antes que eu alcance a porta.
— Você prometeu Lucy.
— Como eu ia adivinhar que você me diria uma monstruosidade dessas?
— Tenta se colocar no meu lugar. Se Lindsay tivesse se casado com o
irmão dela aqui, se tivesse tido o bebê em Newhart, os dois estariam presos
ou mortos e a criança estaria num orfanato. Mesmo que eu tivesse tentando
ajudar, não ia adiantar, as leis são claras sobre o incesto na Europa. Se eles
não tivessem fugido, não estariam felizes como estão e eu já teria perdido o
meu cargo. A saúde da minha mãe não estaria melhor se as coisas fossem
assim. — olhando por esse lado, é possível entendê-lo, mas ainda assim é
difícil aceitar que ele trocou tudo pelo poder. Se não se preocupasse tanto
com o cargo, já teria levado a Sra. Rudolf para ver Lindsay na América. —
Por favor, Lucy, me dá uma chance, tenta me entender.
— Eu preciso pensar. — Falo. — O que você está fazendo com sua mãe
é muito grave.
— Eu devia ter ficado calado. — diz, quase para si mesmo e percorre os
dedos pelos cabelos.
— Foi bom você falar, pois assim te conheço melhor.
— Você vai me deixar?
Olho para ele e já não sei se sinto amor, raiva, ou saudade, só sei que não
posso ficar perto agora.
— Não sei, mas que não posso dormir nesse quarto hoje. Vou para o
outro. Amanhã a gente conversa.
Antes que ele tenha tempo de me deter de novo, passo depressa e
atravesso a porta, indo para o outro quarto.
Tenho uma noite agitada, acordando várias vezes com a sensação de que
estou sendo observada. Deve ser por causa das câmeras escondidas.
Quando acordo na manhã seguinte, levo um susto ao ver Lennon sentado
na poltrona diante dos pés da cama, observando-me atentamente, imóvel
como uma estátua.
Prece uma miragem dentro da camisa de seda preta com mangas
compridas. Tem os cabelos molhados, bem penteados, a barba bem feita e
um delicioso cheiro de loção pós barba parte da sua direção. Porém, tem o
rosto cansado, ainda com olheiras, como se não tivesse pregado o olho
durante a noite.
— O que você está fazendo aqui? — pergunto, meio atordoada, ainda
tentando me localizar.
— Te observando. — sinto o cheiro de café fresco e só então vejo a
bandeja com comida em cima da mesinha perto dele. — E trazendo seu café
da manhã.
Ele coloca a bandeja sobre o colchão, diante de mim, para em seguida
sentar-se ao meu lado, muito perto.
— Não vai trabalhar hoje? — pergunto, estranhando que esteja sem o
paletó.
— Não. Hoje o dia é todo nosso. — lembro-me de tudo o que ele disse
sobre Lindsay e não consigo sustentar seu olhar. Mesmo sem sentir fome,
me sirvo de um pedaço de bolo, só para ter outra direção para onde olhar
que não seja seu rosto. Entretanto, ele segura minha face e me faz voltar a
encará-lo. — Lucy, por favor, me perdoa. — segura minha mão, pousando-a
sobre seu peito. — Não permita que os meus erros do passado destruam o
que existe entre nós. Eu sei que o que fiz é imperdoável, mas fiz coisas boas
também.
— Como não me denunciar à polícia quando matei meu padrasto?
— Eu não ia dizer isso.
— Mas estava pensando.
— Você passou toda a sua vida me condenando por algo que não fiz,
depois tentou me destruir inventando aquela história de estupro, mas no fim
eu te perdoei e te perdoo, porque sei que errar é humano.
Ele está certo, eu errei feio com ele e mesmo assim fui perdoada e estou
ao seu lado, o mínimo que posso fazer é retribuir, porque o amor e o perdão
precisam caminhar juntos.
— Você tem razão, estou sendo injusta. — o abraço pelo pescoço,
emocionada, meu coração batendo em um ritmo descompassado no peito,
todo o meu ser me dizendo o quanto ele é importante em minha vida, o
quanto seria impossível suportar os dias sem tê-lo. — Me desculpe.
— Não há o que desculpar. — ele me abraça de volta e afunda o rosto
em meus cabelos, aspirando profundamente. — Termine seu café, tem um
bando de repórteres nos esperando lá em baixo.
Fito-o perplexa.
— Pra quê?
— Para esclarecermos o que aconteceu no restaurante. — ele dá de
ombros, consternado. — Infelizmente a vida de uma pessoa pública tem
esses problemas. Precisamos dar satisfação da nossa vida a quem não tem
nada a ver com ela. Mas prometo te compensar depois. Tenho duas
surpresas que acho que você vai gostar.
— O que é?
— Surpresa. Não posso falar.
Em algumas horas estamos no salão do palácio, o mesmo onde houve a
festa, sobre o palco, sentados em confortáveis poltronas, com seguranças
nos rodeando e uma multidão de repórteres ocupando as mesas na parte
mais baixa. Somos bombardeados por uma enxurrada de perguntas a
respeito do nosso caso. Todos querem saber há quanto tempo estamos
juntos; porque fui jantar com Hudson; se ainda sou membro do JUD; se
pretendemos nos casar; por que o acusei de estupro e depois retirei a queixa
e há até uma pergunta sobre uma suposta gravidez.
Após esclarecermos tudo, com pelo menos parte de uma verdade que não
pode ser revelada sem que eu perca minha liberdade, saímos do palácio na
limusine, seguidos pelo Mercedes com os seguranças. Lennon não revela
nosso destino até adentrarmos os imponentes portões da University of the
South-west, uma das mais caras e bem conceituadas do país.
— O que vamos fazer aqui? — indago, com medo de acreditar no que
estou pensando.
— Você me disse que pretendia voltar a estudar, então mandei meu
investigador particular procurar seu histórico escolar e consegui marcar
uma entrevista. Só não te matriculei ainda porque não sei qual curso você
quer fazer.
— E quando você fez isso?
— Há alguns dias.
Processo suas palavras e sou tomada por tão grande euforia que me atiro
em seus braços para um abraço apertado, seguido do beijo, que se torna
inevitável cada vez que nos tocamos.
Embora eu não esteja nem um pouco preparada para uma entrevista cujo
objetivo é minha aprovação em uma universidade, até que consigo me sair
bem, o que, unido ao fato de que estou acompanhada pelo presidente do
país, me garante uma vaga para o início do semestre no curso de jornalismo
que sempre sonhei fazer.
Agora entendo porque tantas pessoas lutam pelo poder, ele realmente
abre portas.
Dali, seguimos para fora da cidade, onde Lennon afirma estar minha
segunda surpresa. Não faço ideia do que seja e ele se recusa a me dar
qualquer pista. Gloucester é o nosso destino.
Atravessamos o centro da cidade marcado pela presença das imensas
catedrais, percorremos mais alguns quilômetros para o norte, até um bairro
tranquilo, quase sem tráfego nas ruas largas, onde há gigantescas mansões
com a fachada antiga, porém restauradas. Paramos diante de uma delas,
onde há uma fonte com a estátua de dois leões imponentes jorrando água
pela boca.
— Quem mora aqui? — pergunto, me roendo de curiosidade.
— Você já vai ver.
São os seguranças que saltam primeiro, parecem fazer um tipo de
barricada, se posicionando pelos arredores, enquanto que um deles toca a
campainha da imponente construção. É atendido por uma empregada
uniformizada e ao seu sinal Lennon e eu saltamos.
Somos recebidos por um casal de meia idade, que parecem
estranhamente aflitos e nos conduz para o salão imenso, decorado em estilo
medieval, com lustres gigantescos no teto.
Lennon nos apresenta e ocupamos as poltronas enquanto a emprega vai
em busca de alguém que está no andar de cima. Não estou entendendo nada,
apenas me deixo levar pelas circunstancias. Porém, a compreensão vem no
momento em que a emprega retorna segurando a mão do garoto pré
adolescente.
Muitos anos se passaram desde que o vi pela última vez, mas de
imediato reconheço o rosto do meu irmão, loirinho, cheio de sardas, muito
parecido comigo.
Quase sem sentir minhas pernas, com todo o meu corpo trêmulo de
emoção, levanto-me e me aproximo dele devagar. Quero abraçá-lo, sentir o
calor do seu corpo juvenil, chamá-lo de cabeça de repolho como fazia na
infância, mas não tenho ideia de como ele vai reagir. Não sei se se lembra
de mim.
— Oi Jack. Sou eu, Lucy. — falo, minha voz saindo em um sussurro
trêmulo.
Percebo a emoção se refletindo em seus olhos azuis e sei que me
reconhece, é então que o tomo em meus braços, apertando-o forte, deixando
que as lágrimas banhem meu rosto.
— Onde você estava durante todo esse tempo, Lucy? — ele pergunta,
apertando-me forte, chorando comigo.
— Estava te procurando, meu amor. Senti tanto a sua falta. É tão bom te
ver de novo. Minha nossa, como você cresceu. — afasto-me um instante
para observá-lo e o abraço novamente, tomada de emoção. — Está se
tornando um belo rapaz.
— E mamãe, onde está? Ela veio com você?
Afasto-me de novo e seco as lágrimas do meu rosto com as costas da
minha mão.
— Não. Ela está doente. Mas vai ficar feliz em ver você.
— Nada disso. O combinado foi que você viria vê-lo. Ele não vai sair
daqui. — a mulher que nos recebeu fala, asperamente.
Observo-os e chego à conclusão de que são o casal que adotaram meu
irmão. Parecem estar dando uma vida boa à ele e pela sua aparência
saudável, parece ser muito bem cuidado, portanto, não tenho o direito de
sentir raiva deles.
— É só uma visita rápida. — falo, me esforçando para conter o pranto
que ameaça voltar. — Vai fazer bem pra ele.
— Nada disso. O que fará bem pra ele é não ter contato com vocês. —
desta vez é o homem quem diz, rispidamente.
— O garoto vai ver a mãe e o assunto está encerrado. — Lennon
interfere, levantando-se, sua voz grossa e alta, soando com tanta autoridade
que é impossível ser contestada. — Aliás, ele vai conosco agora mesmo.
Pode arrumar as malas. Se ele decidir que quer voltar depois que ver a mãe
e matar a saudade da irmã, então o traremos de volta. Por enquanto ele fica
sob minha guarda, legalmente.
O casal se entreolha com tristeza e sei que amam meu irmão tanto
quanto eu e estão sofrendo por terem que vê-lo se afastando. Se Jack provar
que também os ama, não tirarei a guarda deles, afinal o criaram durante
todos esses anos.
— Sim senhor presidente. — o marido fala.
Encaro meu irmão diretamente nos olhos antes de perguntar.
— Mas é só se você quiser ir, Jack.
— Eu quero. — ele vai até os pais adotivos e os abraça. — Mas vou
voltar eu prometo.
Esperamos até que suas malas estejam prontas e deixamos o lugar, Jack
indo conosco na limusine, achando “irado” que tenhamos tantos seguranças
nos seguindo.
Parece surreal que eu esteja diante dele depois de tantos anos, que ele
esteja tão crescido, tão bonito e pareça tão feliz. Estou feliz por saber que
sua vida é boa, que é bem tratado e que nada lhe falta, nem amor.
— Como você conseguiu encontrá-lo? — pergunto a Lennon.
— Meu investigador é muito bom.
Não preciso perguntar como conseguiu convencer os pais adotivos a me
deixarem ver o garoto, pois sei que com o poder que tem é capaz de tudo.
Embora já seja noite quando chegamos de volta a Bristol, levamos Jack
para ver nossa mãe na clínica particular na mesma hora. A comoção é geral
quando os dois se encontram. Pela primeira vez minha mãe se mostra
realmente comovida com alguma coisa desde que está internada. Apenas
não permitimos que Lennon entre em seu quarto, pois não seria fácil tentar
convencê-la de que não foi ele quem assassinou seu amante e acredito que a
verdade só pioraria seu estado.
À medida que as lembranças do passado, que bloqueei da minha mente
quando tirei a vida daquele verme vão voltando, tenho a impressão de que
minha mãe sempre soube que ele me molestava e nunca fez nada por medo
de perdê-lo, por isso de vez em quanto demonstra sentir raiva de mim, mas
não vou lhe cobrar nada depois de tanto tempo e de tanto sofrimento,
deixarei que ela pague por seus erros da forma como já está pagando, sendo
mantida viva à custa de medicação controlada.
Com seu jeitinho nada sutil e democrático de agir, Lennon consegue
firmar um acordo com os pais adotivos de Jack para que ele passe o restante
das férias de verão conosco no palácio de Chambers e que eu tenha direito
de ir visitá-lo quando quiser depois que ele retornar, que é quando
começaram também minhas aulas.
Naqueles dias, ao lado dos do homem que amo e do meu irmão, eu
finalmente conheço o significado do termo felicidade. Nem nos meus mais
secretos sonhos minha vida poderia ser mais perfeita.
CAPÍTULO XXX
Eu nunca esperei encontrar a verdadeira felicidade naquilo que nunca
quis ter: um relacionamento. Lucy não é apenas minha companheira de
todos os dias, a amante que fode gostoso, ou a companhia para os eventos
sociais, ela também parece me trazer sorte na carreira política, pois desde
que se mudou para o palácio, durante o verão, o período turbulento vem se
acalmando mais a cada dia.
As críticas ao meu governo estão diminuindo, assim como as
manifestações nas ruas e a perseguição da mídia, isso graças ao fato de que
essas mesmas manifestações levaram um país da América do Sul a um
golpe parlamentar, cujos articuladores, atuais detentores do poder, estão
tomando medidas que visam, unicamente, prejudicar a população
economicamente carente em favorecimento dos ricos. Acho que tais
antecimentos, amplamente disseminados pela mídia mundial, estão servindo
de exemplo para os críticos do socialismo e integrantes da extrema direita.
Com isto, tenho liberdade de continuar trabalhando da forma que
acredito que deve ser: criando programas sociais para erradicar a fome e a
extrema pobreza e tomando medidas que visam a igualdade das classes
econômicas por meio da oportunidade igualitária para todos.
Com a chegada do fim das férias, levamos Jack de volta à casa dos pais
adotivos, deixando a promessa de que estaremos com ele em todos os finais
de semana. O casal não está satisfeito com isto, mas não são corajosos o
bastante para enfrentar um processo jurídico contra quem estipula as leis.
É nesse período que Lucy inicia seu curso de jornalismo e embora eu a
tenha convencido a deixar que os seguranças a acompanhem até o campus
universitário todas as noites, aquela sensação de que meus inimigos
políticos, antigos membros do governo anterior, podem fazer mal a ela para
me atingir, só me deixa quando a tenho de volta ao palácio depois da aula.
Essas são algumas das aflições que se enfrenta por amar: o medo de
perder e de magoar. Porém, é um preço pequeno que se paga pelo júbilo que
se tem de volta.
O outono chega e com ele o aniversário do prefeito de Bristol. Como
acontece todos os anos, o cara vai comemorar em grande estilo, fazendo
uma grande recepção na cidade, para a qual foram convidados grandes
nomes do governo dos países vizinhos.
No salão principal do palácio, espero por Lucy e fico fascinado ao vê-la
descendo as largas escadarias. Está simplesmente linda em um vestido
longo, com alças finas, colado na cintura, todo em rendas delicadas, com
folhas prateadas e os cabelos soltos escovados em fio reto. É
impressionante como ela consegue se tornar mais linda a cada dia.
— Minha nossa, vou ter que ficar de olho para que não me roubem você
durante a festa. — falo, com irreverência, ao recebê-la, plantando-lhe um
selinho nos lábios.
— Você não precisa disso. Aliás pode se sentir o homem mais seguro da
face da terra, porque não tenho olhos para outro.
A beijo com mais paixão, sugando seu lábio inferior, para depois enterrar
minha língua na sua boca e o calor da lascívia me percorre tão
arrebatadoramente que sinto vontade de desistir da festa e ficar em casa
fazendo amor com ela.
— Se minha presença não fosse tão necessária, eu ia rasgar esse
vestidinho aqui mesmo e te fazer minha. — sussurro em sua boca e ela
arqueja.
— Não precisamos demorar lá. Nós nunca demoramos nesses lugares.
E ela está certa, depois que estamos juntos estou sempre apressado para
voltarmos para o palácio e fazermos amor.
A recepção acontece em um dos clubes mais sofisticados da cidade e já
está abarrotado de gente quando chegamos. Como sempre, as pessoas vêm
ao meu encontro antes mesmo que eu consiga achar a mesa que me foi
reservada, pessoas falsas, puxas saco que forçam o sorriso ao me verem
porque sou o presidente. A maioria delas queria estar no meu lugar.
Lucy e eu estamos cercados quando Anthony, o aniversariante, vem me
receber, com aquele sorriso largo e falso. Ele nos encaminha até nossa
mesa, posicionada em um lugar de destaque perto do palco, porque daqui a
pouco serei obrigado a fazer um discurso que já decorei.
Suspiro aliviado quando toda aquela gente se afasta e posso saborear o
champanhe gelado na companhia de Lucy, que bebe suco de laranja. Porém,
minha tranquilidade dura pouco, pois logo avisto Stanley Hudson vindo em
nossa direção. O que ele quer? Há semanas tenta marcar uma reunião
comigo, telefona diariamente para o meu gabinete, dizendo ter um assunto
urgente a tratar, mas não quero proximidade com qualquer marmanjo que
cresça o olho para cima da minha garota.
Agindo como um sem noção que não sabe quando deve se manter
distante, ele se aproxima da nossa mesa sorrindo e se atreve a beijar a mão
de Lucy ao cumprimentá-la, além de lançar uma olhada cobiçosa para ela,
sem ao menos disfarçar, o que faz meu sangue ferver de raiva. Como ele se
ateve a tocá-la depois de tudo o que aconteceu e ainda por cima devorá-la
com o olhar?
— Finalmente nos encontramos, Lennon. Como vão as coisas? — fala
ele, com um sorriso cínico.
— Estavam boas até você chegar perto. — falo, porque não sou homem
de meias palavras.
— Nossa! Mas que agressividade é essa? — ele solta, com escárnio.
— Costumo ser agressivo com quem deseja aquilo que me pertence.
Com o canto do olho, vejo Lucy se ajeitar na cadeira, desconsertada.
— Guarde sua agressividade para quando precisar dela. — aquilo parece
uma indireta. — Bem, vou voltar para minha mesa, foi um prazer rever
você, Lucy.
— Igualmente. — ela diz e ele se afasta, indo se juntar a um grupo de
pessoas em torno de outra mesa. — Você não precisa tratá-lo assim. Ele
nunca deu em cima de mim depois que estamos juntos. Só me convidou
para jantar aquele dia porque eu estava sozinha. — Lucy me repreende.
— Não deu em cima porque não teve oportunidade. — retruco.
— E você acha que se ele vier com gracinha vou corresponder? — ela
parece ofendida.
— Você aceitou o convite dele para jantar duas vezes, não foi? — me
arrependo por ter aberto a boca no instante em que a fecho, pois percebo
que Lucy está magoada.
— Eu estava livre e desimpedida.
— É, mas não fazia nem uma semana.
Desta vez ela me fuzila com olhos faiscando de raiva.
— Quer saber? Vai pro inferno, Lennon. — dispara e, sem mais nem
menos, levanta-se e deixa a mesa, caminhando depressa em meio aos
convidados.
Bebo o último gole do meu champanhe e vou atrás dela, mas antes que
consiga alcançá-la, Hudson tem a ousadia de tomar-me o caminho.
— Precisamos conversar em particular. — ele diz.
— Agora não, estou ocupado.
— É urgente.
— Eu já disse que não! — minha irritação me faz alterar o tom da voz, o
que atrai a atenção de alguns convidados que estão mais próximos.
— É sobre Lindsay e o assassinato do padrasto de Lucy.
Estou me afastando, mas aquilo definitivamente me faz voltar.
— Não fala bobagem na frente de tanta gente. — sussurro, verificando
se alguém mais o ouviu. Aparentemente não.
— Não me culpe por falar na frente de todo mundo. Há dias tento
conversar com você e você se recusa a me receber.
Merda! O que ele quer com esse assunto? O que sabe sobre Lindsay? Por
que está falando sobre a morte do padrasto de Lucy? Eu já nem me
lembrava mais que Lucy confessou o assassinato na frente dele quando
estava ligada no modo Samantha.
Só de imaginar o que ele pode fazer com esta informação, sinto meu
peito pesado de angústia.
— Ok. Vamos conversar em particular. Vem comigo. Deve ter uma sala
por aqui. — falo e gesticulo para que o bastardo me siga.
O salão do clube é enorme e está abarrotado de mesas ocupadas pelos
convidados. Ignoro todas as pessoas que falam comigo enquanto o
atravesso, com Hudson me seguindo de perto. Adentramos a sede principal,
onde há poucas pessoas, passamos por um largo corredor, ao longo do qual
há várias portas trancadas, até que por fim encontro uma delas aberta e
entramos. Trata-se de um vestiário com vários armários. Verifico se não tem
mais ninguém lá e me volto para o cretino.
— O que você quer? — vou direto ao assunto.
— Quero Lucy.
Minha vontade é de socar a cara dele até que esteja desacordado. Como
se atreve?
— Nunca! — é minha resposta.
— Se você a ama, deixe-a. Ou contarei à polícia que ela assassinou o
padrasto.
— Isso aconteceu quando ela tinha quatorze anos, a policia não pode
fazer mais nada. — falo, mas no fundo sei que se uma denúncia como essa
partir de um homem como ele contra uma garota que está comigo, a polícia
será obrigada a mostrar serviço, porque o escândalo seria grande e eles não
iam querer parecer incompetentes ou partidários perante o mundo.
A fúria me toma de forma tão avassaladora que começo a transpirar.
Estou prestes a atacar aquele maldito e se o fizer corro um sério risco de
matá-lo ali mesmo, mas o fato é que preciso me controlar, pois é a vida da
mulher que amo que está em jogo agora.
— Será a sua palavra contra a dela. — tento.
— Não só a minha, mas de todos os soldados do exército que estavam lá
naquela manhã. Eles têm um código de honra que não lhes permite mentir
sob juramento caso sejam chamados para depor em um tribunal e darei um
jeito de que sejam chamados caso seja necessário. — meu coração ameaça
parar de bater enquanto o ouço. — E não é só isso. Já sei que você se livrou
da sua irmã porque ela cometeu crime de incesto. Imagina o escândalo que
será se essa história vier à tona. Acho que vai te levar ao impeachment,
afinal você é cúmplice e incesto é um crime gravíssimo.
— Maldito! Como se atreve? — praticamente rosno, cego de ódio.
— Sou um homem que não desiste fácil do que quer e no momento não
há nada que eu queira mais que a garota que está com você.
— Você nunca a terá.
— Você sabe que terei. Basta que ela esteja livre de você. E se você
sente alguma coisa por ela, ou se realmente se importa com sua carreira
política, deixe-a, ou destruirei os dois com um piscar de olhos.
— Desgraçado! Como pode ser tão baixo?
— Não seja dramático, Lennon. É só uma garota. Em pouco tempo você
arranja outra.
— Lucy não é uma garota qualquer. É a garota que eu amo.
— Se a ama, então a deixe, pelo bem dela. Evite que ela passe o resto da
vida na cadeia e que sua carreira seja arruinada.
Eu não sei mais o que dizer, estou enjoado, a bili subindo pela garganta.
Se eu continuar ali, vou acabar perdendo o controle e acabando com a raça
daquele maldito. E o pior é que nem mesmo confrontá-lo eu posso, pois ele
é capaz de cumprir o que está dizendo e perder meu cargo de presidente por
Lucy não é nada, porém, não posso deixar que ela vá para a cadeia, eu
jamais me perdoaria. Prefiro ficar sem ela, saber que está com outro
homem, mesmo que esse homem seja o desgraçado diante de mim, a ter que
entregá-la à polícia. No fundo, eu sei que me resta opção, terei que ceder à
sua maldita chantagem.
— Preciso sair daqui. — falo, e caminho para a porta, enojado,
angustiado, enfurecido.
— Você tem dois dias para se decidir. Se na terça-feira Lucy não estiver
solteira, de volta àquele apartamentozinho no subúrbio, vou denunciá-la à
polícia e contar ao mundo sobre sua irmã.
— Mesmo que eu a deixe, ela jamais ficará com você.
— Você sabe que ficará. Nós estávamos no meio de um jantar romântico
quando você apareceu pra infernizar, lembra? Em pouco tempo eu a terei na
minha cama, como quero.
Suas últimas palavras são o estopim para que eu perca o pouco do
controle que me resta. Cego de ódio, avanço para ele e o derrubo no chão
com um soco apenas. Quero montá-lo e esmurrar sua face até que esteja
transformado em uma mancha de sangue, mas respiro fundo, buscando o
controle, pois sei que se fizer isso será pior. Aquele verme é capaz de tudo.
Antes que o mate, viro-me e caminho novamente para a saída. Quando o
ouço atrás de mim.
— Não tenta nada contra mim, pois tenho um vídeo gravado sobre isso
guardado com uma pessoa de confiança. E não conta nada à Lucy. Eu vou
saber se você fizer isso.
Estou quase passando mal quando deixo aquela sala e volto para o local
da festa. Atravesso o grande salão sem ver os convidados à minha frente.
Procuro por Lucy e quando a avisto encostada a uma pilastra em um canto,
tudo dentro de mim se transforma em agonia, a dor me dilacera a alma de
forma tortuosa, como se a ponta de mil punhais fossem cravados em mim
ao mesmo tempo.
Eu nunca chorei na vida, mas nesse instante é tudo o que quero fazer.
— Precisamos conversar. — falo ao meu me aproximar dele, e minha
voz saindo trêmula.
A abraço pela cintura e a aperto contra meu corpo, experimentando o seu
calor, me perguntando como vão ser meus dias sem ela depois de ter
experimentado a melhor fase da minha vida ao seu lado.
— Claro que precisamos. — ela me abraça de volta, se aconchegando ao
meu corpo, como costuma fazer, se aninhando toda a mim. — Lennon, por
que você está tremendo? Você está passando mal?
— Não. Vem comigo. Precisamos sair daqui. — seguro-lhe a mão e a
guio na direção da saída.
Não preciso fazer nada para que os seguranças me sigam para o lado de
fora, pois são treinados para irem onde eu for.
Sem me despedir de ninguém, ou mesmo sem enxergar as pessoas pelas
quais passamos, vamos direto para a limusine estacionada do lado fora,
entramos e dou a ordem para que o motorista nos leve de volta ao palácio,
imediatamente.
Estou tão desnorteado, chocado, que só quero ficar sozinho com Lucy e
mais nada.
— Lennon o que você tem? Está pálido, suando frio e saiu da festa sem
avisar ninguém. Aconteceu alguma coisa? — Lucy está aflita.
— Sim. Quer dizer, não. Deixo o meu assento para me acomodar ao lado
dela, bem perto e lhe seguro a face entre minhas mãos, tomado por um
desespero doloroso.
— Lucy, não importa o que aconteça, eu quero que você saiba que eu te
amo de verdade. Acho que a amei na primeira vez em que a vi, quando você
tinha quatorze anos.
Ela fica séria.
— Eu sei. Eu também te amo. Mas por que você está falando assim? O
que há de errado?
Eu quero dizer que não há nada, a fim de tranquilizá-la, mas não vou
mentir, então em vez de falar eu a beijo, colocando toda a minha angústia,
toda a minha dor, toda a saudade que sei que vou sentir dela, naquele beijo.
E quando Lucy corresponde, com a mesma intensidade, o desejo
irrefreável aflora dentro de mim, tomando-me com toda força, se
misturando às emoções que se conflitam no meu interior.
Sem pensar direito, me deixo guiar unicamente pelos meus instintos e
enfio a mão sob a saia longa do seu vestido, alisando sua perna firme,
tocando seu sexo quente por sobre a calcinha, antes de enterrar os dedos no
tecido delicado de renda, mergulhando um deles entre seus grandes lábios,
me deliciando com a sua maciez, com a sua umidade.
— Eu te quero, Lucy. E quero agora. — falo, contra a sua boca e volto a
enfiar minha língua nela, implacavelmente.
Eu preciso de um gesto apenas da minha mão para rasgar o tecido frágil
da sua calcinha e arrancá-la do seu corpo. Com outro gesto rápido, abro o
zíper da minha calça e desnudo meu membro, completamente duro, para
depois voltar a beijá-la na boca. Inclino-me sobre ela, deitando-a no
assento, encaixando-me entre suas pernas. Pressiono o membro na entrada
da sua vagina pequena, procurando espaço, tentando deslizar para dentro,
com dificuldade, porque ela ainda não está suficientemente lubrificada.
— Lennon, a camisinha. — Lucy fala, a voz arrastada pela respiração
ofegante.
— Quero sentir você Lucy. — falo, sem saber ao certo porque estou
fazendo aquilo. O preservativo está no meu bolso, eu podia colocá-lo. Acho
que quero tê-la por completo antes de deixá-la.
Lucy não protesta e abre mais as pernas, pronta para me receber. Abraça-
me pelo pescoço e me beija com lascívia, chupando minha língua, enquanto
suas mãos delicadas passeiam pelos meus cabelos.
Penetro-a devagar para não lhe causar dor, escorregando centímetro por
centímetro para dentro do deu canal, até que esteja todo dentro dela e
começo a estocar forte, sentindo sua lubrificação aumentar, suas paredes
estreitas me apertarem, deliciosamente, enquanto bebo seus gemidos.
— Eu te amo, Lucy, nunca duvide disso... — falo.
— Eu também te amo, Lennon.
Arremeto meus quadris contra ela cada vez mais depressa, extasiado
com a sensação da sua carne macia e molhada em contato direto com a
minha, sem o empecilho do preservativo. Sem me retirar dela, sento-me,
trazendo-a junto e a faço cavalgar o meu pau, uma perna de cada lado, seus
quadris se movendo freneticamente sobre mim, enquanto mantenho meu
olhar fixo ao seu.
Tento não pensar que em dois dias eu não a terei mais, mas é inevitável e
o desespero me toma, de forma tão devastadora que seguro seus quadris dos
dois lados, com uma ferocidade absurda e a movo sobre mim, bruscamente,
com força, apressadamente, enterrando-me fundo nela, até que o clímax se
aproxima e fico mais duro no seu interior.
— Não goza dentro de mim Lennon. Eu não tomo anticoncepcional. —
Lucy diz, ofegante e quando tenta sair de cima de mim e seguro ainda mais
forte pelos quadris, mantendo-a firme no lugar.
— Não quer ter um filho meu?
— Quero muito, mas Samantha já fez um aborto.
— Ela não fará de novo. Agora goza comigo.
Com ferocidade, movo-a bruscamente sobre mim, para cima e para
baixo, estocando forte, até que juntos mergulhamos no êxtase, meu esperma
enchendo-a pela primeira vez, nossos gemidos se misturando, nossos corpos
ondulando juntos. E quando ficamos imóveis, lânguidos sobre o assento,
sou tomado por uma abominável vontade chorar, embora me recuse a deixar
as lágrimas caírem, pois é o pior sinal de fraqueza que um homem pode
demonstrar.
Eu queria acreditar que há uma forma de escapar da chantagem de
Hudson, mas sei que não há. Se ele tivesse ameaçado apenas falar sobre
Lindsay e o incesto, eu jamais cederia, optaria por renunciar à presidência,
porém, não posso arriscar que Lucy seja levada para a cadeia. Por
assassinar um membro do antigo governo, ela seria condena à morte, ou no
mínimo à prisão perpétua.
Lucy continua em cima de mim, beijando-me no pescoço enquanto se
move devagar para cima e para baixo, meu pau semiereto escorregando no
meu gozo e no seu, suas paredes lambuzadas contraindo e relaxando em
volta dele, tão deliciosamente que o tesão é reaceso de imediato.
— É muito gostoso sentir você assim, carne com carne... — ela sussurra,
sua respiração pesada evidenciando sua excitação.
— Eu também acho.
Dominado pela luxúria, seguro seus cabelos atrás da cabeça e puxo-a
para trás. Desço minha língua pela sua pele macia, da garganta até o colo e
uso a outra mão para descer as alças do vestido, desnudando seus seios
pequenos, lindos demais, com os bicos rosados. Provo o mamilo com a
ponta da minha língua, antes de fechar minha boca sobre ele e mamar com
força, enquanto ela geme dengosa, rebolando gostoso no meu pau. Passo
para o outro peito e o abocanho, chupando até que esteja duro.
Novamente, estou louco de tesão, completamente duro dentro dela.
Coloco-a de quatro sobre o assento, me ajoelho atrás de si e a fodo com
toda força, até me esvair dentro do seu corpo de novo e até que estejamos
esgotados, trêmulos pelo gozo abundante.
Já estamos parados no estacionamento do palácio quando conseguimos
nos apartar, o que dura apenas até que cheguemos ao quarto, onde
reiniciamos os movimentos, entregues ao desejo a caminho da exaustão que
nos toma e adormeçamos nos braços um do outro.
Não consigo dormir por muito tempo, acordo ainda antes do amanhecer,
atormentando pela chantagem daquele maldito.
Observo Lucy completamente adormecida sobre a cama, o corpo nu em
meio ao emaranhado de lençóis, os cabelos espalhados selvagemmente
sobre o travesseiro, o rosto lindo, totalmente relaxado e chego à conclusão
de que não posso perdê-la, preciso lutar contra aquele cretino e farei isto.
Permitir que ele a tire de mim significaria o meu fim.
O dia ainda não amanheceu e mesmo sendo domingo, convoco uma
reunião urgente com todos os meus advogados de confiança, ali mesmo no
escritório do palácio. Conto tudo a eles sobre o distúrbio de personalidade
de Lucy, como assassinou o padrasto durante uma dessas crises quando
tinha quatorze anos e sobre Lindsay e o incesto.
Eles passam horas analisando a situação, debatendo ente si, fazendo
pesquisas nos documentos referentes à lei e por fim me dão a notícia que eu
não queria receber: se Lucy for denunciada por esse assassinato, nada a
livrará da cadeira e eu ainda corro o risco de ser preso como cúmplice,
porque presenciei tudo e não disse nada. Como Hudson falou, os soldados
do exército têm um código de honra que não lhes permite mentir durante
um julgamento, portanto não haverá como inocentá-la se o caso for parar
em um tribunal.
Cogito uma fuga para um país distante, mas os advogados me alertam de
que uma figura pública conhecida como eu, um líder mundial, dificilmente
conseguiria se esconder em algum lugar sem ser reconhecido, portanto, não
há outra saída que não deixar Lucy, pelo menos até que encontrem uma
brecha na lei que possa livrá-la da acusação de assassinato.
CAPÍTULO XXX
Lucy.
Há dois dias, desde que fomos à festa de aniversário do prefeito, Lennon
está agindo de forma estranha. Não saiu do palácio para nada, e mesmo
sendo final de semana, ele sempre sai, sempre tem alguma coisa para
resolver em algum lugar, mas desta vez não foi a lugar nenhum e só me
deixou por alguns momentos quando se reuniu com seus advogados ali
mesmo no seu escritório.
Me pediu que não fôssemos apanhar Jack neste final de semana,
alegando que queria passar mais tempo comigo e tive que concordar, pois
acho que ele está com algum problema. Está muito deprimido, triste, como
nunca o vi antes.
Se pelo menos ele se abrisse comigo, talvez eu pudesse fazer mais que
lhe dar todo o meu carinho.
Apesar de toda a tristeza que o assola, são dois dias maravilhosos,
porque passamos a maior parte do tempo fazendo amor, ou apenas
abraçadinhos sobre cama, quando posso sentir, mais que nunca, que ele é
todo meu, pois não preciso dividi-lo com o seu trabalho. Não há nada na
vida que eu aprecie mais que estar em sua companhia, da forma como
estamos agora, apenas nós dois, como se o país lá fora não existisse.
Desde a noite da festa, não usamos mais preservativos e como não tomo
anticoncepcional, acredito que possa estar grávida e embora haja o risco do
meu alter ego fazer outro aborto, vale a pena arriscar quando a recompensa
é ter um filho do homem que amo.
Na segunda feira, quando acordo pela manhã, Lennon está sentado na
poltrona diante da cama, observando-me completamente apático, com os
olhos avermelhados, grandes olheiras sombreando-os, uma angústia
profunda presente em sua expressão.
Tenho a impressão de que ele não dormiu à noite.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunto, com um mau pressentimento.
— Sim. — ele diz e esfrega os olhos com as mãos, depois passa os dedos
pelos cabelos. — Não podemos continuar juntos, Lucy.
Processo suas palavras e meu coração falha uma batida. Um bolo
violento se forma em meu estômago.
— Como assim? — é o que consigo dizer.
— Eu não sou homem de me prender a um relacionamento, eu te disse
isso quando nos conhecemos e já estamos juntos há tempo demais. Eu
preciso da minha liberdade, preciso experimentar novas aventuras e não
quero te magoar. Espero que entenda.
A medida que ele fala, a dor vai me tomando de forma devastadora,
como se me rasgasse por dentro. Me recuso a acreditar no que ele está
dizendo, o que vivemos juntos foi intenso demais para ter sido uma grande
mentira, eu sei que ele me ama, não posso estar tão enganada.
Levanto-me com o lençol enrolado em torno do corpo e me aproximo
dele. Olho dentro dos seus olhos e posso ver o seu desespero. Ele está
mentindo, alguma coisa aconteceu e não quer me contar.
— Me fala o que está acontecendo Lennon. Eu sei que você está
mentindo. O que há entre nós não pode ter sido falso.
Ele se levanta e me da as costas, como se tentasse evitar me olhar nos
olhos.
— E não foi falso, só que já acabou. Não podemos continuar.
Sinto as lágrimas marejando meus olhos ao perceber que realmente é o
fim. Como ele pode ser tão covarde? Por que não assume o que sente?
Prefere viver na farra que ter o amor de uma mulher apenas? Eu não
entendo.
— Me explica só o porquê. — falo, me esforçando para não deixar as
lágrimas caírem.
— Eu já disse: quero ser livre como antes. Eu tentei, mas não me
acostumei a viver assim, com uma mulher apenas. — vira-se para mim e
não consegue disfarçar a angústia em seu olhar. Estou convencida de que
está me escondendo algo, mas não vou ficar ali insistindo para que diga do
que se trata. — Mas não se preocupe com nada. Vou continuar pagando sua
faculdade e te darei um apartamento no centro da cidade.
— Eu não quero nada. Pode pegar sua faculdade e seu apartamento e
enfiar onde você achar melhor.
Com a alma dilacerada de dor, abandono o lençol no chão e corro para o
closet em busca de algo para vestir. Quero sair dali o mais depressa
possível. Se não sou digna de conhecer seus verdadeiros motivos para estar
me dispensando, também não sou de viver com ele. Não quero um homem
assim ao meu lado.
Ele entra no closet atrás de mim.
— Não fala assim, Lucy. Não guarda ressentimento de mim. Ainda
podemos ser amigos.
Eu o fuzilo furiosa, magoada, humilhada.
— Amigos?! Você me dispensa assim sem mais nem menos e vem me
dizer que quer ser meu amigo? Nem pensar Lennon. Se é para terminar que
seja definitivamente.
Escolho um conjunto de calça e blusa de seda creme e jogo um suéter
por cima, prendo os cabelos em um coque, sem me dar ao trabalho de
penteá-los e corro para a porta.
— Suas coisas. — ele diz atrás de mim.
— Não quero nada de você, nem essas coisas. Pode dar tudo pra sua
nova puta. Não é assim que você gosta das mulheres? Que te sirvam por um
tempo e depois te deixem em paz? Como se fossem todas putas que
precisam estar à sua disposição?
Estou abalada demais, angustiada demais e temo me perder dentro de
mim mesma, dando lugar à minha outra personalidade, porém, desta vez
não tenho as visões que precedem a mudança. Talvez o conhecimento da
verdade sobre a morte daquele verme e dos motivos pelos quais o matei
tenham me curado.
— Não é assim Lucy. Tenta entender.
— Eu entendo perfeitamente. Você gosta de mulheres descartáveis. Pois
bem, não posso te obrigar a ficar comigo só porque te amo. Adeus Lennon.
Desço as escadas correndo em uma velocidade tão absurda que não sei
como não tropeço e caio. Até que eu gostaria que isso acontecesse, só para
não ter que passar por isso, só para não ter que perder o único homem que
já amei de verdade, só para não ter que constatar que talvez jamais fui
amada por ele como acreditei, que talvez não passei de mais uma qualquer
que ele fez sua até se cansar, como foi com todas as outras que levou para
seu apartamento em Taunton. Se eu tivesse concordado em ir morar lá,
como ele me propôs de início, era de onde estria saindo agora. Fui uma tola
em me sentir especial porque ele me deixou ficar no palácio, quando na
verdade não passava de mais uma na sua cama, apenas o lugar onde estava
a cama foi diferente.
Agora começo a me perguntar se realmente fui a única durante todo esse
tempo, como ele me fez acreditar, se não houve sempre outra em seu
apartamento a quem ele visitava clandestinamente.
Já estou do lado de fora quando não consigo mais conter as lágrimas e
deixo que elas banhem meu rosto, abundantemente.
Como era esperado, um dos motoristas coloca a limusine entre mim e a
saída. Eu queria poder recusar, mas sei que ele não sairá da minha frente,
então entro e peço que me leve ao apartamento de Dayse.
Chegando lá, não encontro a chave extra no esconderijo de sempre e
toco a campainha com desespero, torcendo para que ela esteja em casa, pois
não tenho outro lugar para onde ir. Por fim, o portão é destrancado e entro.
A encontro de camisola, com cara de sono e os cabelos negros afarofados,
como se tivesse acabado de acordar.
— Desculpa te acordar. — falo, fungando, me esforçando para não
continuar chorando.
— Não se preocupa com isso. Mas que cara é essa? Me fala o que
aconteceu.
— O esperado: Lennon me dispensou. — a última frase soa trêmula e
Dayse me toma em seus braços, abraçando-me apertado, calorosamente.
— Esses malditos homens são todos iguais mesmo, só mudam de status
e de endereço. Não fica triste não, isso passa. Demora mas passa, eu
prometo. — ela se afasta do abraço. — Vou fazer um café pra gente aí você
me conta como tudo aconteceu.
— Não precisa se incomodar. Volta pra cama, eu sei que você deve ter
trabalhado a noite toda, precisa descansar.
— Pois é, eu trabalhei. Estou de canela dura de tanto andar naquele
restaurante. Não tolero mais essa vida. — confessa, consternada.
— É a única vida que sobra para garotas como nós. Ainda hoje vou
procurar outro emprego. Você acredita que aquele verme comprou o
restaurante onde eu estava só pra me colocar como gerente?
— Mas que coisa! Pena que o que é bom dura pouco.
— Pois é, prefiro limpar o chão em outro lugar do que voltar a trabalhar
lá.
— E a faculdade, você pretende deixar?
— Sim. Ele disse que pretendia continuar pagando, mas me recuso a
aceitar, porque isso daria a impressão de que ele está me remunerando pelos
meses que passamos juntos.
Dayse solta um longo bocejo e sei que em poucos dias seremos duas
bocejando pela casa.
— Pensa bem amiga. A oportunidade de fazer uma faculdade não é para
todos. No seu lugar eu não perderia essa chance. E daí se ele estiver te
remunerando? Nada mais justo, afinal ele está te fazendo sofrer. Mas é você
quem sabe. Vou voltar pra cama, daqui a pouco pego no batente de novo.
Fica a vontade aí e qualquer coisa é só chamar.
— Obrigada.
Ela volta para o quarto e tento não me abater mais do que já estou.
Vagarosamente, preparo café e torradas e faço a refeição pensando sobre
como vai ser minha vida de agora em diante. Não há muito sobre o que
pensar, vou voltar a servir mesas como sempre fiz. Pelo menos agora eu
tenho a alegria de ir ver meu irmão de vez em quando, isso se aquele casal
ainda permitir minhas visitas depois que todo o país souber que não sou
mais a garota do presidente. É assim que todos me chamam por onde vou,
principalmente na faculdade.
Depois do solitário café, busco forças dentro de mim para sair a procura
de um emprego, mas tudo o que consigo é me deitar no sofá da sala e
chorar, mergulhada em um doloroso estado de nostalgia que me impede de
sair do apartamento e isso dura dois dias.
No terceiro dia, consigo sair. Com os classificados em mãos, faço várias
entrevistas de emprego e acabo pegando uma vaga no caixa de um
supermercado, uma grande sorte, considerando que o desemprego assola o
país. Acho que parte dessa sorte foi o fato de o gerente ter me reconhecido
como sendo a garota do presidente e tive que ser firme ao dizer-lhe que já
não tenho esse título, mas o importante é que fui contratada e começo
amanhã de manhã.
Trabalhar durante o dia vai ser bom porque poderei conviver por mais
tempo com Dayse, que trabalha à noite.
Estou de volta ao apartamento bem a tempo de preparar um almoço e
decido fazer também uma faxina, depois da macarronada com queijo, pois o
lugar está simplesmente imundo.
O macarrão está quase pronto quando meu celular toca e fico surpresa
por ver o número de Hudson. Já reconheço aquele número porque ele me
ligou várias vezes quando deixei o palácio de Chambers na primeira vez. É
impressionante como ele só me procura quando estou só, dá a impressão de
que fica espreitando, esperando as coisas darem errado para mim para
lançar o bote e isso me parece meio agourento, desagradável.
— Oi Hudson. — digo ao atender.
— Olá Lucy. Quanto tempo.
— Não faz tanto tempo assim. Nos vimos na festa de aniversário do
prefeito, lembra?
Me lembro daquele encontro e algo parece muito errado, embora eu não
consiga distinguir do que se trata.
— Verdade. Digo isso porque é tão bom te ver que sempre parece muito
tempo desde a última vez. — fico calada, prevendo onde ele quer chegar
com essa conversa. — Fiquei sabendo que você e Lennon terminaram e
gostaria de dizer que estou aqui caso você precise de um amigo nesse
momento.
— Como você ficou sabendo dessa história se ainda não está nem na
mídia? — fico intrigada.
— Os boatos na realeza correm mais depressa que na mídia. — ele sorri
como se o que disse fosse engraçado, mas não vi graça nenhuma. — Você
gostaria de sair para tomar um chá?
Nunca fui uma pessoa puritana demais, mas a atitude de Hudson me
anoja. Ele sabe o quanto amo Lennon, sabe que nos separamos há apenas
três dias, que certamente estou magoada e mesmo assim tem a cara de pau
de vir dar em cima de mim. Eu sei que não se trata apenas de uma saída
casual para um chá, foi assim que ele agiu da outra vez, como se não
quisesse nada e quando dei por mim estava em um restaurante escuro
sozinha com ele.
É muita falta de noção da sua parte não respeitar esse momento que
estou atravessando. Deve ser como Lennon, que trata as mulheres como
seres descartáveis, sem sentimento algum e por isso espera que nós
mulheres sejamos da mesma forma. Ledo engano.
— Agradeço pelo convite, mas não vai dar. Não estou com astral para
sair esses dias. Só quero ficar sozinha.
Ouço seu longo suspiro do outro lado da linha. Homens ricos e
poderosos como ele, ou como Lennon, não estão acostumados a ouvir não
de uma garota e posso imaginar que aquele suspiro foi de pura frustração.
— Tudo bem. Eu entendo. Posso pelo menos te ligar para saber quando
você vai estar melhor?
Eu pareceria grosseira se dissesse que não.
— Claro, quando quiser.
Eu devia ter falado que não, pois o cara me liga todos os dias, duas vezes
por dia, há uma semana. Sempre querendo dar uma saída, não se cansa de
ouvir não como resposta e quanto mais ele insiste, menos vontade de sair
com ele eu sinto.
Não sei por qual razão meus instintos me dizem que ele pode ter alguma
coisa a ver com o fato de Lennon ter me dispensado, pode ter sido porque a
mudança tempestuosa em Lennon aconteceu naquela festa onde nós três nos
encontramos e estou relacionando as coisas. Eu posso estar sendo
terrivelmente injusta com Hudson, mas meus instintos nunca me
enganaram. Além do mais, mesmo que eu ainda simpatizasse com ele, estou
decidida a nunca mais me envolver com um homem poderoso e importante,
porque esse tipo de homem não leva mulher nenhuma a sério, como Lennon
não leva. Se tiverem que se casar um dia, será por conveniência e nunca por
amor. E eu sou apenas uma trabalhadora braçal, não tenho nada de
conveniente a oferecer a ele, portanto só posso deduzir que quer me usar e
depois me descartar, como Lennon fez.
Com uma semana longe de Lennon, eu ainda sinto a dor da saudade, mas
estou menos deprimida e decido voltar à faculdade, afinal se ele é rico e
quer pagar, o problema é dele. Como Dayse vive dizendo, não vou perder
essa chance única de me tornar alguém na vida por causa do orgulho.
No campus, talvez por ser um lugar fechado, onde todo mundo se veste
de forma despojada, percebo a presença de um dos seguranças de Lennon
rondando por ali, disfarçadamente, o tal do Donald, que também é amigo
pessoal dele e tenho certeza de que estive sendo vigiada sem perceber
durante todo esse tempo, com que intuito eu nem posso imaginar, mas isso
pouco me interessa, se o cara não vier me incomodar, pode olhar de longe
até ficar ruim das vistas.
Se antes eu já chamava a atenção na faculdade por ser rotulada de garota
do presidente, agora então, que a notícia da nossa separação foi parar em
todos os sites de notícias e jornais, não há um só ser ali dentro que não me
encare com curiosidade quando passa por mim, embora apenas Noah tenha
coragem de vir falar comigo. Somente ele me trata com naturalidade e não
como se eu fosse uma celebridade que desfila por ali em busca de holofotes.
É o único com quem converso desde que iniciei o curso. Acho que por ser
homossexual ele é meio solitário, como eu.
Na noite de sexta feira, estamos deixando o campus no final da aula,
prontos para irmos juntos até o ponto de ônibus, quando me surpreendo ao
me deparar com a limusine luxuosa estacionada do lado de fora dos portões,
pena que quem esteja do lado de fora, encostada nela, segurando um grande
arranjo de flores, usando um terno caro e impecável, seja Hudson e não
Lennon. Na verdade eu preferia que não fosse nenhum dos dois.
Diante de todos, ele acena para mim e sorri, como se eu precisasse de
mais motivos para ser observada o tempo todo.
— Aquele é o Primeiro Ministro de Flower Garden? — Noah indaga
perplexo, como se estivesse olhando para um ET recém-aterrissado na terra.
— Infelizmente sim. — respondo, acenando de volta para Hudson.
— Criatura, você é a mulher com mais sorte pra homem gostoso e rico
que já conheci.
— Eu não quero um homem gostoso e rico, quero um que me ame e esse
ainda não encontrei. O que tem de sorte em ser usada e depois jogada fora?
— Quem sabe com esse seja diferente.
— Você já viu um nobre se casando com uma pebléia?
— Não, mas pra tudo tem uma primeira vez.
Despeço-me dele com beijinhos na bochecha e vou ao encontro de
Hudson. Não sei porque, mas me certificar de que o segurança de Lennon
está me observando agora e obviamente relatará ao seu chefe o que está
vendo, me traz um pouco de satisfação.
— Olá garota difícil. — Rudolf diz quando me aproximo.
— Olá garoto insistente. — ele sorri, como se isso tivesse a mínima
graça e me entrega as flores.
— Para você.
— Obrigada. São lindas.
A multidão de alunos que deixa o campus passa por nós, sem que
nenhum deles deixe de olhar em nossa direção. Não é apenas a limusine ou
quem ele é que atrai a atenção de todos, mas o bando de seguranças que
deixa o carro logo atrás para se posicionarem aos arredores.
Eu não me importava tanto com isto quando estava com Lennon porque
o amava, mas não sou obrigada a tolerar esse tipo de alegoria por causa de
um homem que não me desperta o mínimo interesse. Tudo o que quero é
que Hudson vá embora, que saia de perto para que eu possa me tornar
invisível, apenas mais uma aluna entre tantos, sem toda aquela alegoria à
minha volta.
— Quais os seus planos para o final de semana? — ele pergunta,
sorridente.
— Ficar em casa e me atualizar nos conteúdos que perdi nos dias em que
faltei na aula.
Isso porque os pais adotivos de Jack inventaram uma viagem para a
França e posso apostar como o objetivo é afastar meu irmão de mim.
— Mas você é muito jovem pra ficar trancada em casa em pleno fim de
semana.
— Eu gosto de ficar sozinha.
— Quer sair daqui? Está frio.
E está mesmo, o inverno deste ano promete ser um dos mais gelados,
mas não estou a afim de sair com ele, isso poderia encorajá-lo a continuar o
que está fazendo. Tudo o que quero é deixar claro que nada vai acontecer
entre nós.
— Vamos caminhar um pouco, isso ajuda a esquentar. — proponho.
— Tem coisa que podemos fazer que esquenta mais. — ele fala e sorri,
agindo como se fosse um privilégio para uma pobretona como eu ouvir
aquela proposta de alguém como ele. Isso só faz com que eu o despreze
ainda mais. — Ok, vamos caminhar. — ele concorda depois de observar
minha expressão.
Está um gelo aqui fora e abraço o meu próprio corpo para suportar a
baixa temperatura.
Caminhamos devagar pela calçada do campus com o bando de
seguranças nos seguindo de longe, disfarçadamente.
— E você, o que vai fazer neste final de semana? — pergunto, tentando
não parecer ranzinza.
— Vou para a Austrália. Lá é bem quente nessa época do ano e tenho
uma casa bem perto da praia. — ele para e se vira para me encarar antes de
continuar. — Foi por isso que vim aqui esta noite. Gostaria que você viesse
comigo e gostaria muito.
Puta merda! Ele não podia ser mais direto. Quer me levar pra sua casa na
praia, me foder até cansar e depois me dispensar. Sei que as intenções de
Lennon foram as mesmas desde o início, mas pelo menos ele fingia sentir
alguma coisa. Hudson já vai deixando claro o que quer. Por outro lado, pelo
menos ele está sendo sincero e já não sei qual dos dois é pior.
— Não vai dar. — respondo.
— Por que não? Você disse que não tem outro compromisso.
— E não tenho. Apenas não quero sair com você.
Ele fecha uma carranca e acho que fui grossa demais, mas só assim para
ele entender e parar de tentar me seduzir. Isso já está ficando chato.
— Posso saber o porquê? — indaga, muito sério.
— Não tem uma razão específica. Apenas não quero ninguém em minha
vida neste momento.
Ele fita-me em silêncio por um instante e então força um sorriso, sem
que seu olhar acompanhe o gesto.
— É por causa de Lennon, não é? Você ainda gosta dele.
Eu poderia dizer que não, só para não dar uma de pateta ao admitir que
gosto de um homem que não da a mínima para mim, mas talvez a verdade
seja capaz de afastá-lo, pois homem nenhum suporta ser rejeitado por causa
de outro.
— É por causa dele sim. Eu ainda o amo e não vou ficar com outro até
esquecê-lo.
Novamente, Hudson sorri com escárnio, só que desta vez seus olhos
assumem um brilho de ódio que é quase assustador. Posso jurar que ele e
Lennon têm alguma rixa por causa de mulher.
CAPÍTULO XXXII
— Você está sendo ridícula por gostar de um homem que não te quer. —
Hudson diz, rispidamente e a raiva queima em minhas entranhas.
— E você não tem nada com isso! — rebato no mesmo tom.
— Acho que tenho quando a pessoa em questão é a garota que eu quero.
— Não estamos tão diferentes afinal, não é? — Vejo seu olhar faiscando
de raiva e tenho a impressão de que pode não ser bom para mim ficar
confrontando uma pessoa importante como ele, não porque ele não mereça,
mas porque não está acostumado a ser confrontando e o resultado pode ser
desastroso. — Tenho que ir, está ficando tarde. — tento dar meia volta, mas
ele me segura pelos ombros, ameaçadoramente.
Olho para os dois lados, em busca de alguém a quem possa pedir ajuda,
caso seja necessário, mas com exceção dos seguranças dele, a rua está
completamente deserta e mesmo que não estivesse, quem enfrentaria
aqueles brutamontes que certamente estão todos armados?
— Você quer saber porque Lennon te deixou? — Hudson indaga,
parecendo um sádico na forma como me encara.
— Acho melhor você me soltar. Está tarde e tenho que traba...
— Porque eu o chantageei. — ele me interrompe e suas palavras
capturam minha total atenção.
— Como assim? Do que você está falando?
— Eu nunca desejei ter uma mulher como desejo você, Lucy, mas
Lennon estava no caminho então o forcei a te deixar. Eu disse a ele que
traria à tona a verdade sobre Lindsay, o crime de incesto que ela cometeu,
do qual ele foi cúmplice. Isso o faria perder a presidência do país, porque
ninguém ia aceitar um presidente que tem uma irmã incestuosa, uma
sobrinha que é fruto desse crime e ainda por cima é conivente com tudo
isso.
Processo suas palavras e minha cabeça gira.
— O que você está dizendo?
— O que você está ouvindo. Ele dispensou você pra não ter que deixar
de ser presidente, te trocou pelo poder, da mesma forma como fez com a
irmã, com a mãe doente e com todo mundo que o rodeia. A única coisa que
importa pra ele é o poder, as pessoas são descartáveis. E é por esse tipo de
homem que você está apaixonada?
A princípio me recuso a acreditar em tudo o que ele diz, porque é terrível
demais, mas então me lembro do quanto Lennon mudou depois daquela
festa onde os dois se encontraram, a chantagem foi feita naquela noite e
tudo o que aconteceu depois foi parte de uma despedida.
Dizem que a verdade dói, mas para mim ela nunca foi tão massacrante.
Eu preferiria viver na ignorância a ter a certeza do que eu já sabia: Lennon
não liga para as pessoas, mas apenas para o poder. Quando ele me contou
sobre Lindsay, sobre como permite que a mãe fique naquela cadeira de
rodas em nome da sua sede pelo poder, eu temi que um dia pudesse ser eu a
pessoa a ser trocada pelo seu precioso cargo, só não imaginei que doeria
tanto.
Embora sua atitude não seja mais do que eu já esperava dele, a dor que
me toma é lancinante e me dilacera por dentro. Tento não chorar, para não
admitir o quanto sou tola, mas as lágrimas escorrem dos meus olhos sem
que eu consiga evitá-las.
— Vamos sair desse frio. Eu te levo pra casa. — Hudson diz e como se
eu tivesse me transformado em um robô, deixo que ele me abrace pela
cintura e me conduza até a limusine.
Não vejo o percurso da faculdade até em casa, tampouco ouço uma
palavra do que Hudson diz. Tudo o que eu consigo é sentir e sinto como se
o punhal que já estava cravado em meu peito fosse retorcido, e retorcido, e
retorcido.
— Pensa sobre irmos pra Austrália. O sol e o mar vão te fazer bem. —
Hudson diz e só então percebo que já estamos parados na frente do prédio
de dois andares onde moro.
Ele só pode estar brincando se acha que há a mínima possibilidade de eu
sair com ele depois do que fez. Não que eu tenha achado ruim que
chantageou Lennon, isso serviu para provar o que eu já sabia, só que provou
também que é tão mau caráter quanto o outro.
— Faz um favor pra mim, Hudson. Para de me procurar. Não me liga
mais e nem aparece na minha frente. Não existe a mínima possibilidade de
acontecer alguma coisa entre nós.
Ele suspira fundo, mas nada diz, enquanto me observa saltar da limusine.
Dayse não está em casa e posso deitar-me no sofá e chorar sem correr o
risco de despertar a pena de ninguém. É o que faço durante praticamente
toda a noite, chorar, e no sábado, mal consigo levantar do sofá, a depressão
me tomando de forma absurda, sem que eu ao menos compreenda a razão,
pois o que Hudson revelou sobre Lennon não é nada menos do que eu já
esperava.
A noite de sábado chega e eu ainda não consegui me levantar do sofá.
Ainda bem que o supermercado não abre hoje, eu seria demitida por falta.
Hoje é a noite de folga de Dayse e ao invés de descansar, ela deixa seu
quarto toda produzida, dentro de um vestidinho curto, brilhante, com botas
cano longo e salto alto, com um sobretudo jogado por cima.
— Ei primeira dama suburbana, está na hora de levantar desse sofá e
sacudir a poeira. Vamos dançar e beber todas na Prowler hoje.
A Prowler é uma das boates mais badaladas do subúrbio, onde meu alter
ego é bastante conhecida por sua promiscuidade e vulgaridade, além do
gosto pelo álcool.
— Você sabe o que acontece quando eu bebo. Nem devia estar me
chamando.
— Não precisa ingerir álcool. Fica só no refrigerante mesmo. Mas pelo
menos dança e conversa com as pessoas. Ficar deitada aí nesse sofá não vai
resolver sua vida, pelo contrário.
Ela está certa. Eu não posso passar o resto dos meus dias me lamentando
por minhas escolhas erradas, preciso erguer a cabeça e recomeçar. Sair e me
divertir um pouco pode ser um começo. Tenho a impressão de que não vai
adiantar muita coisa, mas pelo menos estarei tentando.
— Você me espera tomar um banho?
— Claro. Não precisa nem ter pressa. —eu já estou a caminho do seu
quanto, onde guardo minhas poucas roupas, quando ela me chama atrás de
mim. — Você tem dinheiro pra um taxi? — pergunta.
— Tenho.
— Ótimo. — diz, com um sorriso largo.
Minhas peças de roupas são as mesmas que eu possuía quando ainda
vivia no apartamento do JUD. Não tem nada sofisticado ou mesmo
adequado para uma festa. Então, escolho um vestidinho simples, florido,
com alças largas e saia até o meio das canelas. Para combinar, faço uma
única trança nos cabelos e calço as sapatilhas sem saltos.
Fito-me no espelho e constato que tenho a aparência de uma
trabalhadora braçal, nada parecido com quem vai a uma festa. Jogo um
casaco por cima e está tudo certo.
Dayse e eu deixamos o apartamento de taxi e como ela é bastante
conhecida por ali, não precisamos enfrentar a fila enorme para entrarmos na
danceteria. Do lado de dentro o lugar parece o inferno disfarçado de
diversão, há luzes coloridas bailando no teto, embora nenhuma ilumine
direito o lugar; a música é absurdamente alta; há garotas seminuas se
esfregando nos garotos; outras estão dançando sobre pequenos palcos
redondos e a pista de dança está lotada, assim como as mesas que há em
volta dela.
Nós duas seguimos direto para o bar, onde Dayse pede um gim tônica
para ela e um refrigerante para mim.
— Wohoo! Está cheio de gatinhos aqui hoje. Vamos nos esbaldar. — ela
diz, ao ingerir um gole da sua bebida e me sinto tão contagiada pela sua
animação que abandono meu refrigerante de lado e peço gim para mim
também.
Não acredito que Samantha volte a tomar o meu corpo novamente, talvez
o conhecimento da verdade sobre meu passado realmente tenha me curado e
para ter certeza eu preciso testar.
— O que você está fazendo? — Dayse indaga, observando a bebida em
minhas mãos com olhos arregalados.
Ela já presenciou várias vezes minha mudança de personalidade e tenho
certeza de que é algo que não quer ver de novo, simplesmente porque meu
alter ego hostiliza todos aqueles que me cercam. Lennon foi sua grande
exceção.
— Só quero me aventurar um pouco. Preciso ter certeza de que estou
curada. — “e mesmo que não esteja, sair de órbita um pouco vai aliviar
minha dor”. Completo, mentalmente.
— Você é quem sabe. O importante é se divertir.
Terminamos nossas bebidas e vamos para a pista de dança lotada, nos
misturando aos demais dançarinos, nos balançando no ritmo da musica
agitada e, para minha total surpresa, me flagro me divertindo como nunca
aconteceu em um lugar como esse. Posso sentir o efeito do álcool em meu
organismo, me deixando mais leve, mas sem me levar à escuridão. Acho
que posso realmente estar curada e isso é magnífico.
Lennon.
Lucy se foi há quase duas semanas e a dor se recusa a me deixar, como
se tudo tivesse acontecido ontem. A cada instante sem ela, tenho mais
certeza de que nada é capaz de preencher o vazio que ficou dentro de mim.
Já tentei conhecer outras garotas, mergulhar no trabalho e principalmente
no álcool. Aliás nem me lembro mais quando foi a última vez em que estive
sóbrio. Mas nada adianta.
Ainda bem que os meus assessores são eficientes e estão conseguindo
esconder da mídia o fato de que estou me tornando um alcoólatra, assim
como a cada dia inventam um pretexto diferente para que eu não compareça
ao gabinete. Na certa todos por lá já estão acreditando que estou à beira da
morte, porque cada dia eles inventam uma doença diferente, ou dizem que
piorei de uma doença já existente.
Com a minha ausência, as campanhas por eleições diretas organizadas
pelos membros do antigo governo da direita estão crescendo mais a cada
dia. Mas eu não ligo, que se foda o país e que se foda o cargo de presidente,
ele não significa mais nada para mim, pois só depois de perder Lucy
aprendi que o que importava em minha vida era ela, o resto é só o resto.
E imaginar que a essa altura ela está na cama daquele safado só piora a
minha angústia. Ele demorou para agir, mas logo na primeira vez em que a
procurou pessoalmente, depois de dar vários telefonemas, conseguiu
convencê-la a entrar no seu carro e deixar que a levasse em casa. Assim
Donald me informou e, como ela saiu esta noite, a essa altura devem estar
juntos.
Saber disso tudo está acabando comigo. Talvez eu não devesse ter
mandando Donald vigiar os passos dela, ou pelo menos não me manter
informado sobre os mesmos, porque sem segurança ela não pode ficar, a
sede pelo poder dos meus adversários políticos é infinita e temo que possam
usar Lucy para me afetar, preciso me certificar de que ela está segura.
Estou em meu escritório, mergulhado no mais completo silêncio,
pensando em Lucy, como quase sempre. A dose de uísque no copo em
minha mão é a terceira da noite, se for contar com o que bebi durante todo o
dia, vai dar umas duas garrafas. Mas ainda não estou bêbado o suficiente
para esquecer, acho que nunca vou estar.
Novamente o celular toca, com uma chamada de Donald e me apresso
em atender porque sei que ele vai me falar alguma coisa sobre Lucy.
— Fala cara. — digo ao telefone, minha voz ligeiramente pastosa pelo
efeito do uísque.
— A Lucy não foi se encontrar com Hudson como imaginamos. Ela está
em uma danceteria com a amiga com quem divide o apartamento. — a voz
de Donald se mistura ao som estrondoso da musica agitada que toca ao
fundo.
— Só elas duas? — mil possibilidades se passam em minha mente, na
primeira delas posso ver Lucy bebendo e mudando para o modo Samantha.
Tento expulsar da minha mente a imagem que vem depois.
— Sim, só as duas.
— Lucy está bebendo?
— Pior que está, cara.
— Merda!
Eu não espero que Donald responda, porque sei que vai me dizer para
manter a calma e não ir até lá e isso é algo que não está ao meu alcance no
momento. Preciso evitar que Samantha tome vida dentro de uma boate
cheia de homens, rodeada por bebidas alcoólicas. Não posso permitir que
ela deixe que seu corpo seja usado por qualquer vagabundo, como Lucy me
disse que ela costuma deixar que seja.
— Merda! — praguejo, entre dentes, e só tenho tempo de correr até o
quarto para pegar um casaco.
Sei que estou horrível, quase irreconhecível, com a barba crescida e o
rosto abatido, mas não da tempo de melhorar isso, se demorar muito a
garota que eu amo estará fora de si, trepando com um ou mais vagabundos
que lhe pagarem uma bebida e ainda colocando sua vida em risco, como
aconteceu na noite em que bateu no meu carro.
Eu sei que se estiver por perto, Samantha não fará nenhuma dessas
loucuras, pois está ligada à mim e não sabe o que aconteceu entre mim e
Lucy, porém, ela é impulsiva, se deixa guiar por instintos e não vai se dar
ao trabalho de abandonar a gandaia para vir me procurar.
Já estou na limusine quando me dou conta de que não faço ideia de onde
fica a tal boate e preciso telefonar para Donald pedindo o endereço.
— Não me diz que você pretende vir até aqui. — ela fala, espavorido.
— Já estou a caminho. Não posso deixar que Lucy mude de
personalidade em um lugar como esse.
— Será pior pra ela se Hudson souber que vocês se encontraram.
E ele está certo. Se Hudson desconfiar que procurei por ela, pode
cumprir sua ameaça e colocá-la na cadeia.
Maldição! Por que esse idiota tinha que nascer!?
— Eu vou ficar olhando de longe.
— Deixa que eu cuido disso irmão.
— Se ela mudar, não vai te ouvir. Ela não ouve ninguém.
Ele respira fundo do outro lado da linha.
— Está certo. Vou acionar alguns dos meus homens para ficarem de
olho em algum suposto detetive de Hudson. Quando chegar aqui, tenta pelo
menos ficar longe dela.
— Ok. — concordo, mas sei que não conseguirei me manter distante
quando a vir.
Donald me dá o endereço e dispenso a limusine um quarteirão antes de
chegar, para não atrair a atenção de alguém que possa estar vigiando-a a
mando daquele safado. Ordeno que os seguranças fiquem por ali também e
faço o restante do percurso quase correndo.
Na entrada da danceteria, ninguém me reconhece, deve ser por causa da
barba e da aparência abatida. Encontro Donald logo na entrada, do lado
dentro e ele me aponta Lucy.
Está mais linda que nunca dentro de um vestido florido, com uma trança
nos cabelos, dançando animadamente entre os demais jovens da sua idade.
Olhar para ela é como experimentar um cálice de vinho gelado depois de
dias passando sede no deserto e meu organismo reage de imediato, meu
coração disparando como um louco no peito, os pelos do meu corpo se
arrepiando.
Apesar da euforia que ela demonstra ali naquela pista, sei que ainda é
Lucy, pois Sam jamais usaria um vestido longo como aquele ou prenderia
seus cabelos em uma trança, portanto, ela inda está segura. Talvez o
conhecimento da verdade sobre o que aconteceu ao seu padrasto e o que ele
lhe fez, tenha sido sua cura, talvez Sam nunca mais volte, o que é uma pena,
pois amo também essa parte dela.
Embora me sinta aliviado por constatar que ela está segura, não consigo
me afastar, não consigo parar de olhar para ela, admirar sua beleza, o
quanto parece feliz e solta ali em meio a pessoas da sua idade, se divertindo
como se já não pensasse mais em mim, como se nada signifiquei em sua
vida e embora isso me pareça doloroso demais, é melhor assim, pelo menos
um de nós dois não está destruído.
Em vez de ir embora como deveria, sento-me em uma mesa
discretamente localizada, um pouco mais próxima à pista, de onde posso
observá-la sem ser notado.
Entre uma musica e outra, sua amiga vai ao bar e volta com garrafas em
miniatura de gim tônica para as duas.
Um cara alto, muito musculoso de aproxima de Lucy, jogando-se para
cima dela e meu coração fica menor que um grão de areia dentro do peito,
mas Lucy da as costas a ele, ignorando-o.
“Essa é a minha garota!”
Donald me informa de que não há sinal de nenhum investigador de
Hudson pelas redondezas e que meus seguranças estão espalhados pelos
arredores da danceteria, o que me deixa ainda mais à vontade e continuo
observando minha Lucy de longe, hipnotizado, tomado por um desejo
absurdo de ir falar com ela, mas ciente de que é um desejo que precisa ser
contido, para o bem dela.
Todavia, seria muito da minha parte esperar não ser reconhecido e logo
uma garota começa a disparar os flashes do seu celular na minha direção
enquanto grita em alto e bom tom que o presidente está ali. É questão de
segundos para que uma pequena multidão de pessoas se forme à minha
volta, o que atrai a atenção de todos, inclusive de Lucy, que sai em
disparada, quase correndo, na direção dos fundos da boate no instante em
que me enxerga.
CAPÍTULO XXXIII
Merda! Ela está abalada e há álcool em seu sangue, as chances de se
transformar agora são muito maiores e preciso estar ao seu lado nesse
momento, para domar Samantha e não deixar que faça besteira.
Ignorando as pessoas à minha volta, passo direto por elas e corro atrás de
Lucy, sem enxergar mais nada diante de mim. Consigo alcançá-la poucos
segundos antes que consiga entrar no banheiro feminino, onde certamente
pretendia se refugiar. Seguro-a pelos ombros e encaro diretamente seu
rosto, mergulhando em uma espécie de transe ao fitar seus olhos azuis, ao
mesmo tempo confusos e angustiados.
— O que você ta fazendo aqui? — ela indaga, tão aflita com a minha
proximidade que começo a acreditar que deveria ter ficado longe.
— Eu só vim ver se você está bem. Fica calma, não se abale.
— Não me abalar?! Eu estaria calma se não precisasse olhar pra sua
cara. — ela praticamente grita, ficando cada vez mais nervosa e me
arrependo por ter me aproximado, pois definitivamente sei que estou
aumentando suas chances de mudar.
As pessoas se aglomeram à nossa volta, flashes de câmeras são
disparados aos montes, meus seguranças interferem, afastando os curiosos,
apenas uma garota se recusa a sair de perto, aquela com quem Lucy está
morando.
— Você está certa por me odiar, eu também me odeio pelo que fiz. Só
vim me assegurar de que você não se tornará Samantha aqui nesse lugar,
não era pra ter chegado perto, mas não consegui ficar longe.
Acho que minhas palavras estão piorando as coisas, pois posso ver o
brilho de ódio se refletindo em sua expressão a medida que falo.
— Vai embora daqui, cara. Lucy já sabe porque você dispensou ela, seu
ordinário ganancioso. — é a amiga de Lucy quem fala.
— Do que você está falando? — pergunto.
— Hudson me contou sobre a chantagem. — é Lucy quem responde e
minha respiração fica suspensa.
— Então você entende os meus motivos, não é?
— Claro que entendo, aliás eu sempre soube que um dia você ia me
trocar pela sua sede de poder, porque você é um maldito ganancioso que
troca até a mãe por um cargo político. — ela grita, furiosa e não consigo
compreender.
— O que Hudson te disse?
— A verdade. Que ia trazer a história de Lindsay á tona se você não me
deixasse.
— Miserável! — praguejo entre dentes, furioso. Além de me chantagear,
o maldito ainda tenta jogar Lucy contra mim. Se ele quebrou as regras
falando isso a ela, eu também posso quebrar, dizendo-lhe a verdade. Só não
sei como as coisas vão ser depois. — Não foi só isso, Lucy. Ele ameaçou
você. — olho em volta e vejo algumas pessoas perto o suficiente para nos
ouvir, não posso falar sobre isso aqui. — Precisamos sair daqui. — falo.
Só que é tarde demais, sem que eu tenha percebido o momento em que
ela mudou, olho em seu rosto e vejo a malícia, a agressividade e aquela
sede de vida que apenas Samantha carrega em seu olhar. Não é mais Lucy a
garota que eu seguro pelos ombros.
— Oi gostoso. Sentiu minha falta? — ela fala e solta uma gargalhada
alta. Depois se atira em meus braços, agarrando-me pelo pescoço, quando
agradeço aos céus que meus seguranças conseguiram impedir as pessoas de
nos fotografarem ou no dia seguinte Hudson veria uma foto dessas na
internet e a entregaria à polícia.
— Olá Samantha. — falo.
Ela se afasta com um gesto brusco, franze a testa e me olha diretamente
nos olhos.
— O que você fez? Por que estou sentindo tanta raiva de você?
Mais uma vez, fico impressionado com o aquela mudança, sua voz está
mais grossa, muito mais agressiva, as atitudes mais decididas. Aquela
meiguice e delicadeza que fazem parte de Lucy simplesmente deixaram de
existir.
— Ele a deixou Samantha. — quem fala é sua colega de apartamento.
Sam a fuzila com hostilidade. — Ele a dispensou para não correr o risco de
perder a presidência.
— Isso é verdade? — Sam recua um passo, seu olhar naturalmente
agressivo se tornando furioso sobre o meu.
— Parte disso é. — mas que droga! Eu não devia ter vindo aqui, só
piorei as coisas. Se não lhe contar a verdade agora, ela vai se entregar a
qualquer um vagabundo só para me magoar, da forma como está se sentindo
magoada. E se eu contar tudo, Hudson a coloca na prisão. Já não sei o que
fazer, preciso convencê-la a se acalmar, me perdoar e não deixar que
cometa nenhuma loucura. — Sam, precisamos conversar. Eu posso explicar
tudo.
— Explicar o quê, seu cretino?! — ela grita e desfere-me uma bofetada
no rosto. — Eu confiei em você, a songa monga ficou com você e olha o
que você fez!
— Eu posso explicar, me deixa falar.
— Explicar o quê? Por acaso isso é mentira? Você não dispensou Lucy?
— meu silêncio me denuncia e ela se afasta furiosa.
Quando tento detê-la, sou agredido por ela com chutes e socos no
estômago, o que atrai a atenção da multidão, pois dá a impressão de que a
estou forçando a ficar comigo e sou obrigado a recuar. Imóvel, observo a
garota que amo dar-me as costas e desaparecer em meio à multidão, já
desfazendo a trança em seu cabelo e é impossível não imaginar o que ela
vai fazer depois.
Me sinto ainda pior que antes quando deixo a danceteria. Estou tão
arrasado e desalentado que não consigo entrar na limusine e após ordenar
que Donald não tire os olhos de Samantha, caminho até uma pracinha cheia
de árvores que tem ali perto. A noite está congelante, mas não sinto o frio,
tudo o que me toma é dor e a angústia. Sento-me em um dos bancos de
cimento e afundo o rosto entre as mãos.
Sei que meus seguranças estão me rondando, mas pelo menos ficam de
longe, para que eu tenha a impressão de que estou sozinho.
Não tenho noção de há quanto tempo estou sentado aqui, imóvel,
cabisbaixo, congelando sem sentir frio, quando sinto sua mão macia em
meus cabelos e ergo-me para ver Samantha sentando-se ao meu lado,
tentando distinguir se é ela mesma ou se trata-se de uma alucinação.
Está bastante diferente de quando a vi há pouco na boate. Agora tem os
cabelos soltos, meio emaranhados, a saia do vestido mais curta, como se ela
tivesse enrolado ou rasgado, usa um batom vermelho sangue e uma jaqueta
de couro preta jogada sobre os ombros.
— Decidi te ouvir, mas espero que você tenha uma explicação muito boa
pra me dar, porque não sou boba nem sonsa como a Lucy, disso você pode
ter certeza. — ela se encolhe dentro da jaqueta, como se sentisse frio. —
Além do mais não achei nenhum gatinho interessante naquela bosta de
boate. Por enquanto você está em primeiro lugar nos meus planos, então
cuidado com pra não perder o posto.
— Vamos pra dentro do carro, está muito frio aqui. — falo, vendo-a
bater os dentes.
— Eu aguento. Isso é bom pra me deixar em alerta. Agora fala e fala a
verdade.
O que eu posso dizer? Se não disser a verdade agora, ela acreditará na
versão que Hudson deu da chantagem à Lucy e a perderei agora mesmo, de
modo que antes do amanhecer ela estará com um motoqueiro qualquer em
um quarto de motel barato. Não tenho opção que não contar tudo, mesmo
que depois seja necessário enviá-la para um país distante para livrá-la da
cadeia.
— Hudson realmente me chantageou como disse à Lucy, mas não da
forma que colocou, quer dizer, não apenas daquela forma. — viro-me para
fitá-la diretamente nos olhos antes de continuar. — Você se lembra de
quando nos encontramos naquele aeroporto cheio de soldados do exército?
— Lembro, o que tem isso?
— Foi lá que você confessou ter assassinado seu padrasto, na frente de
Hudson e de todos os soldados. — ela leva a mão ao rosto, boquiaberta. —
E aquele maldito está usando isso pra nos separar. Ameaçou denunciar você
à polícia se eu não te deixar, foi por isso que terminei com Lucy, para
protegê-la.
— Ah, meu Deus! Eu lembro desse dia. Mas que safado!
— Se ele fosse apenas um cidadão comum, eu poderia dar um jeito de
comprar alguns jurados, ou algum promotor responsável pelo caso, mas ele
Primeiro Ministro de um grande país, sua acusação vale muito.
— E por que esse imbecil quer nos separar?
— Ele quer você. Está obcecado. Passou a semana inteira ligando,
mesmo Lucy recusando os convites dele para sair. Chegou a procurá-la
pessoalmente na faculdade ontem. A chantagem é para me tirar do caminho.
— Agora eu entendo tudo. — ela descansa as costas no espaldar do
banco e fita fixamente o vazio à sua frente, com uma expressão quase
diabólica, um sorriso macabro marcando seu rosto lindo. Permanece em
silêncio por um longo momento antes de falar. — Você fez bem em não
contar nada a Lucy, ela é emotiva, ia se deixar colocar na cadeia. Mas eu sei
exatamente como resolver isso e de quebra ainda dar uma lição nesse
babaca.
— Como?
— Conheço um lugar, não é muito longe daqui, onde eu costumava
comprar comprimidos para não dormir e não deixar Lucy voltar. Lá é como
um ponto de tráfico de drogas, só que vendem drogas mais sofisticadas,
alucinógenas.
— E como isso pode impedir que Hudson atente contra você?
— Simples. Eu o atraio para um lugar previamente selecionado, tipo um
quarto de motel onde haja muitas câmeras, coloco o alucinógeno na bebida
dele e quando ele estiver doidão, sem ver o que está fazendo, colocamos ele
pra transar com uma criança e gravamos tudo. Um homem na posição dele
não vai querer ser acusado de pedofilia e então o teremos em nossas mãos.
Fico impressionando com a astúcia com a qual ela elabora esse plano tão
depressa, porém, permitir que uma criança seja molestada, definitivamente
está além do meu alcance.
— É um bom plano, mas não podemos usar uma criança, isso é muito
bizarro. — reflito por um instante e tenho uma ideia. — Que tal um
travesti? A gente pode contratar um.
— Ué, mas o que tem de mais em transar com um travesti. Todo mundo
faz isso, ele não ia se importar se as imagens fossem divulgadas.
— Um homem na posição dele pode até fazer isso, mas ele iria se
importar e muito se as imagens fossem divulgadas. Ele é da realeza, não
pode nem transar com mulher feia sem que seja reprovado, imagina com
outro homem.
— Então teremos que contratar um travesti bem feio, bem masculino e
bem dotado, e mandar que ele sodomize o cara.
— Meu Deus! Eu quero morrer seu amigo. Que mente pervertida.
— Só estou tentando resolver nosso problema. Será que isso vai dar
certo?
— Eu tenho certeza que vai.
— Vamos precisar conversar com o recepcionista do motel para nos dar
a chave certa do quarto onde estão as câmeras.
— Sim e eu vou ficar de olho nos monitores para o caso de ele tentar de
agarrar.
— Tudo bem, mas não vai surtar se eu precisar deixar ele excitado
enquanto a droga faz efeito.
— Como assim deixar ele excitado?
— Ah, bobagem, nada de mais.
— Vai trepar com ele?
— Claro que não. Só vou deixar ele acreditar que vamos. — ela faz
outro momento de silêncio. — Vou ter que deixar que ele pense que sou
Lucy quando procurá-lo.
— O número dele está gravado no telefone dela. O cara está tão
obcecado que só vai bastar um telefonema.
— Ah, meu Deus, vou ter que me disfarçar de Lucy de novo e fazer
aquela trança horrível no cabelo.
Não consigo me conter, solto uma gargalhada e fico satisfeito por vê-la
sorrindo comigo.
Parece inacreditável que há poucas horas eu estava mergulhado no mais
profundo desespero e agora esteja me divertindo com a situação.
— Senti sua falta, gostosão. — Sam fala, séria e coloca a palma de sua
mão em meu rosto.
Espalmo minha mão sobre a dela, maravilhado com o contato e toco sua
face linda com a outra mão.
— Eu também senti a sua.
— Tem certeza disso? Não prefere estar com a songa?
— Você é parte dela e como já disse, amo tudo em você, até essa
duplicidade.
Sua boca linda, pintada de vermelho, se abre em um sorriso largo.
— Você ainda não disse a mim.
— Estou dizendo agora. Eu te amo, Sam, da forma como você é. Amo o
seu sorriso, o seu jeito louco de ser, a sua inteligência, sua sede pela vida, o
jeito como você dança e como faz amor. Tudo faz parte do conjunto pelo
qual me apaixonei.
— Eu estou apaixonada também, seu bobão.
No instante em que se cala, ela pula sobre mim, montando em meu colo,
uma perna de cada lado e ataca minha boca com a sua, sugando meu lábio
inferior, com lascívia, para em seguida enterrar a língua na minha boca.
Imediatamente fico duro dentro da calça e ela mexe os quadris,
esfregando seu sexo na minha ereção, por sobre as roupas, fazendo com que
o tesão me tome de forma arrebatadora, o calor da luxúria se espalhando
depressa pelas minhas veias, o desejo selvagem aflorando dentro de mim
com uma voracidade impressionante.
Talvez seja a saudade, mas nesse instante eu a quero com uma
intensidade absurda, ainda mais que antes.
Levo minhas mãos às suas costas e a aperto mais contra mim,
experimentando seus seios pequenos se espremendo contra meu peito. Não
consigo resistir e levo minha boca a um deles, mordiscando o mamilo
intumescido por sobre o tecido do vestido.
Sam arqueja, lança a cabeça para trás e segura minha nunca, apertando-
me mais contra seu corpo. Com a outra mão, tenta abrir o zíper da minha
calça, ansiosamente, como se sua urgência em me sentir se equiparasse à
minha em estar dentro de si.
— Aqui não Sam, tem seguranças nos observando de todos os lados. —
falo, minha voz arrastada pela respiração pesada.
— E daí? Deixa que eles vejam, assim se aquecem um pouco.
Ela é mesmo louca, mas é uma loucura impossível de não amar.
Percorro os olhos em volta só para me certificar que não tem ninguém
por perto além dos seguranças, que não se deixam ser vistos e a ajudo a
abrir o zíper, desnudando o membro duro, para em seguida afastar o tecido
frágil da sua calcinha para o lado e a encaixar sobre mim, as pernas abertas,
minha glande encontrando a entrada lambuzada da sua vagina pequena.
— E o preservativo? — ela indaga, a voz entrecortada pela respiração
ofegante.
— Não usamos mais. — planto uma trilha de beijos em seu pescoço e
ela arfa, toda mole, excitada.
— Estão tentando engravidar sem a minha permissão?
— E dessa vez você não vai fazer uma aborto.
— Sendo seu, eu não faço. Agora chega de conversa, me come logo
antes que eu entre em combustão.
Ela segura no espaldar do banco para se equilibrar e vai descendo os
quadris devagar, sua vagina melada engolindo meu pau, apertando-o tanto
que um gemido me escapa. Logo, estou todo enterrado nela e não posso me
lembrar se já experimentei sensação melhor na vida. Certamente não.
Jogo a saia curta do vestido sobre nossos sexos, para que não fiquemos
tão expostos e seguro seus quadris dos dois lados, movendo-a para cima e
para baixo, bruscamente, me enterrando fundo no seu canal, indo e
voltando, me acabando de prazer.
— Puta merda! Que delícia... — sussurro, mal conseguindo puxar o ar
para meus pulmões, tamanha é minha excitação.
Nossos rostos estão nivelados e posso ver o fogo da luxúria em seu olhar
preso ao meu, sua boca linda está aberta, gemendo alto, puxando o ar com
dificuldade, enquanto move os quadris contra mim, ora rebolando, ora
deslizando para cima e para baixo, no ritmo de minhas mãos.
Descontrolado, seguro seus cabelos atrás da cabeça e puxo com força,
fazendo com que seus seios fiquem empinados na minha direção e
novamente coloco um deles na boca, por sobre a barreira do vestido,
ansioso por senti-lo diretamente. Mordo o mamilo devagar, para depois
sugar com força e Sam rebola ainda mais depressa, gemendo mais alto,
ensandecida.
Sinto seus músculos se retesarem contra meu corpo e a ajudo a se mover
ainda mais depressa, para que logo gozemos juntos, meu esperma esvaindo
dentro de si, suas paredes contraindo e relaxando em volta da minha
rigidez, meus espasmos se fazendo contra sua carne macia, até que ficamos
imóveis, apenas nos encarando.
CAPÍTULO XXXIV
Eu quero recomeçar os movimentos, mas preciso de privacidade para
que possamos ficar mais à vontade. Então, antes de mais nada, chamo o
motorista pelo celular e peço que traga a limusine até a praça, para que não
precisemos caminhar até ela e corrermos o risco de sermos vistos, afinal
Hudson ainda nos tem em suas mãos.
— Pra onde vamos, Baby? — Sam indaga e desliza sobre mim
lentamente, provocando-me, deixando-me duro de novo, louco para
continuar ali mesmo.
— Pra um lugar mais confortável.
Tiro-a de cima de mim e fecho o zíper da calça depressa.
Em poucos minutos estamos entrando na limusine que avança pela praça
para nos apanhar e se coloca em movimento sob minhas ordens, na direção
do palácio de Chambers.
— Vocês também já transaram aqui dentro?
— Sam pergunta, enquanto observa o interior do veículo.
— Muitas vezes.
— E foi bom como foi conosco em Paris?
— Sempre é.
Nos acomodamos nos assentos de frente um para o outro. Sem desviar
meus olhos dela, tiro o meu casaco e a vejo fazer o mesmo.
— Quer beber alguma coisa? — pergunto.
— Não. Esta noite eu só quero você.
Sam tira sua calcinha e com uma sensualidade que deixaria qualquer
homem perdido, deita-se sobre o assento, de frente, os cabelos dourados
espalhados no estofado e desliza a saia do vestido para cima, até o ápice das
coxas, deixando as pernas longas em bem torneadas à mostra. Fita-me no
rosto e morde o lábio de uma forma safada que me deixa com o pau a ponto
de explodir dentro da calça.
Vou até ela e me ajoelho ao seu lado, contemplo-a com verdadeira
veneração, fascinado com sua feminilidade. Depois, levo minha boca à sua
e a beijo até que esteja sem fôlego. Escorrego as alças largas do seu vestido
pelos seus ombros, até a cintura, desnudando os seios pequenos e levo
minha boca a um deles, brincando com o mamilo antes de chupá-lo bem
devagar, ouvindo-a arquejar, toda entregue, excitada. Ao mesmo tempo,
levo uma mão para o seu sexo e mergulho um dedo entre seus grandes
lábios. Está muito lambuzada ali em baixo, pelo seu gozo e pelo meu.
Excitado, deslizo o dedo para dentro da sua vagina e a fodo assim, bem
devagar, para em seguida massagear seu clitóris enquanto ela geme alto.
Me farto com os seus seios, alternando entre os dois, mamando gostoso,
até que os bicos estejam ainda mais duros, sensíveis e escorrego minha boca
para baixo, em busca da sua intimidade deliciosa. Uso as duas mãos para
abrir bem suas pernas, pendurando uma delas na parede do carro, a outra
para baixo e fico fascinado ao observar seu sexo arreganhado, todo melado,
lisinho e depilado, o clitóris tão inchado que parece chamar por mim.
Aproximo meu rosto dele e aspiro seu cheiro, antes de saboreá-lo com a
ponta da minha língua, movendo-a freneticamente, enterrando-a e tirando
do seu canal, experimentando a mistura do seu gosto com o meu.
Sam geme alto, enterra os dedos nos meus cabelos e puxa com força, se
contorcendo toda sobre o estofado de couro.
Quando começa a chamar meu nome, repetidamente, sei que o gozo está
se aproximando e enterro um dedo na sua vagina e outro em seu ânus sem
deixar de lamber seu clitóris doce, e é assim que ela explode,
convulsionando tanto que suas costas deixam o estofado por alguns
segundos, seus gemidos se transformando em gritos altos, seu líquido
jorrando abundante, até que tudo se aquieta.
— Que delícia Lennon... — ela sussurra, toda molinha sobre o assento,
lânguida.
— E isso é só o começo. — prometo.
Tiro meu pau de dentro da calça, levanto-me e me coloco quase em pé
diante do rosto dela, seguro-a pelos cabelos e guio sua boquinha até a
minha ereção.
— Agora chupa bem gostoso.
Ela é tão safadinha que leva a mão à boceta enquanto abocanha meu pau
quase até a raiz, abre mais as pernas e começa a se masturbar enquanto me
chupa com experiência, mas sinto ciúmes daquilo e logo me estico para
frente, tomando o lugar da sua mão com a minha, tocando sua carne macia
e melada, quando então sou recompensado pelos seus gemidos de encontro
a minha virilidade.
Pode ter sido a saudade, ou simplesmente o crescimento da fome que
sentimos um pelo outro, mas aquela noite não conseguimos mais nos
desgrudar. Nem vimos quando chegamos ao palácio e adormecemos ali
mesmo dentro da limusine, sobre o carpete macio, agarradinhos.
É dia quando acordamos e fico feliz por ver que a equipe de segurança e
motoristas trocaram de turno, assim não preciso encará-los e me lembrar
que eles me viram fodendo no banco de uma praça ontem à noite.
Samantha e eu tomamos um banho revigorante e delicioso juntos, antes
de pedirmos que o café da manhã seja servido no meu escritório, onde nos
reuniremos com Donald e seus homens de confiança para elaborarmos
nosso plano contra Hudson.
Depois de horas de conversa, fica combinado que faremos tudo ainda
hoje. Sam telefonará para ele, fingindo ser Lucy, o convidará para jantar,
porque uma garota como Lucy não iria direto para a cama com um homem
sem que antes houvesse todo um ritual romântico, o fará acreditar que está
carente e arrasada pelo fim do nosso relacionamento e por fim o convidará
para irem a um motel da cidade.
Essa é a parte mais perigosa do plano, pois ele pode querer ir para outro
lugar, mas Sam garante que conseguirá convencê-lo.
No motel, estará tudo organizado para recebê-lo. Um dos nossos homens
estará na recepção e dará a ele a chave do quarto certo, onde estarão as
câmeras. Donald, sua equipe e eu estaremos no quarto ao lado assistindo
tudo. Outra equipe estará com o travesti no corredor interno e ao nosso sinal
abrirá a porta para que ele entre no quarto.
Donald ficou responsável também por ir até o ponto de vendas de drogas
conseguir uma grande dose de LSD e lítuim, que, segundo Sam, é a mistura
perfeita para que Hudson perca as estribeiras e faça tudo o que ela mandar.
No meio da tarde está tudo arranjado, Sam está com a droga, já ligou
para o maldito marcando em um restaurante no centro, o travesti já foi
contratado e o motel está preparado. Agora tudo depende de Sam e é na
hora que ela precisa voltar ao apartamento no subúrbio, onde o maldito a
apanhará, que meu coração aperta no peito, tomado de angústia e medo de
que algo saia errado e ela acabe machucada.
— Talvez seja melhor desistir disso tudo — falo, enquanto a acompanho,
junto com minha equipe de seguranças até o lado de fora, onde um taxi a
aguarda, porque a limusine chamaria a atenção.
— Ta doido? E viver o resto da vida nas mãos daquele crápula? Nem
morta.
Eu a detenho, viro-a de frente para mim e a abraço forte, já com o peito
cheio de saudade.
— E se alguma coisa der errado? — pergunto.
— Seja otimista. Vai dar tudo certo. E se algo não sair bem, eu saberei
que você está logo ali no quarto ao lado, olhando por mim.
— E não sairei de lá enquanto tudo não acabar.
— Eu sei.
Beijo-a com toda a minha paixão e então a deixo ir, meu coração ficando
muito pesado no peito.
Samantha.
Olho para as peças de roupas emboladas em uma gaveta no quarto de
Dayse e não consigo parar de me fazer duas perguntas. Primeira: a criatura
paga a metade do aluguel e só tem direito a usar uma gaveta, como pode se
conformar com isso? Segunda: como alguém pode ter um gosto tão péssimo
para roupas? Não tem nada ali que seja minimamente adequado para se ir
jantar com um Primeiro Ministro, mas se o cara está obcecado por uma foda
é possível que não repare no visual.
Depois de revirar tudo, acabo optando por um vestido soltinho rosa bebê,
sandálias rasteiras e um suéter de lã do tempo da vovó. Só não vou prender
meus cabelos em uma trança, já estou ridícula o suficiente. Então, apenas o
escovo até ganharem brilho e estou pronta para Hudson.
São quase sete da noite, hora em que combinamos de ele vir me apanhar
e Lennon já telefonou umas trinta vezes. Ele liga de cinco em cinco minutos
e só não me estresso porque acho essa preocupação muito fofa, embora
desnecessária, pois Hudson não é páreo para mim.
Não vejo perigo algum no que vamos fazer, acho até que será divertido.
No horário combinado, a campainha toca e desço para encontrar a
limusine preta, tão grande quanto a do presidente, estacionada na frente do
prédio. O carro cheio de seguranças está logo atrás.
O panaca está do lado de fora do veículo, encostado na porta, segurando
um buquê de rosas brancas, com um sorriso largo estampado no rosto.
“Sorria enquanto pode, imbecil”.
Imediatamente o reconheço daquela manhã no aeroporto, quando
confessei o meu crime, mas tenho que fingir que o conheço muito melhor, o
que não vai ser nada difícil, já que, modéstia parte, posso ser uma excelente
atriz quando quero.
Até que ele não é feio, serviria para uns amassos se não fosse um
ordinário e se eu não estivesse apaixonada por Lennon.
— Como vai? — indago, me aproximando, forçando minha voz a soar
meiga e baixa como é a de Lucy.
— Melhor agora que estou com você. — que cafona! — São para você.
— me entrega as flores e preciso conter uma gargalhada da sua tentativa
inútil e ridícula de parecer romântico.
— Obrigada. São lindas. — eu mereço um óscar.
Hudson abre a porta da sua limusine e entro, sendo seguida por ele.
Do lado de dentro o veículo também é muito parecido com o de Lennon,
com dois assentos estofados grandes nas laterais, outro menor aos fundos e
um tapete felpudo no chão. Esse é todo cor de creme, enquanto que o de
Lennon é vermelho e mesmo assim não consigo deixar de me lembrar de
todas as deliciosas loucuras que cometemos dentro dele ontem à noite, o
que me arranca um longo suspiro, que não passa despercebido ao imbecil
sentando à minha frente.
— Vejo que você está mais animada. — ele franze a testa, parece
desconfiado, mas não vou me concentrar nisso para não perder o verdadeiro
foco.
— Acho que finalmente caiu a ficha de que Lennon não vale nenhum
minuto dos meus pensamentos e decidi seguir em frente com a minha vida.
— falo.
Sua boca se curva em um largo sorrio.
Como é fácil de ser enganado. Pobre garoto rico da realeza.
— Quer beber alguma coisa?
Estou abrindo a boca para dizer que sim, quando me lembro de que Lucy
não pode beber e ele certamente sabe disto.
— Não obrigada.
Jantamos em um restaurante que ele escolhe, porque eu quero ter o
direito à escolha do lugar onde iremos a seguir. Aquela ladainha melosa
sobre sentimentos, recomeços e bal bla bla, típica de um canalha que quer
foder uma mulher mas não sabe mandar o papo reto, se perdura durante
todo o jantar e estou quase virando uma estatua de sal de tanto ficar parada,
fingindo que sou a songa e que estou prestando atenção no que ele diz.
Por fim, depois da sobremesa, chega o momento crucial, quando preciso
convencê-lo a me levar para o motel que está preparado.
— Sabe, Hudson, eu andei pensando esses últimos dois dias. — começo,
fazendo aquela cara de mulher carente que não faz parte de mim, mas que
todo homem adora. — e decidi que quero me aventurar mais, sair mais, me
divertir, esquecer que Lennon passou pela minha vida e acho que você é o
homem certo pra embarcar comigo nessa aventura.
Os olhos dele assumem um brilho ao mesmo tempo luxurioso e
vitorioso.
— Você tem toda razão. Não fique presa a um passado que te magoou.
Viva a vida e seja feliz.
Seguro-lhe a mão e tomo cautela ao pronunciar a próxima frase.
— Tem um motel aqui perto, se você não se importar em frequentar um
lugar como este. — ele permanece em silêncio e minha respiração fica
suspensa. — Eu passo sempre lá em frente e fico imaginando o que tem lá
dentro, mas Lennon nunca quis me levar, porque acha que é vulgar. Então
pensei se nós dois podíamos...
— Claro. — ele me interrompe. — Eu poderia te levar para o meu iate,
porque é muito mais confortável e discreto, mas se você tem a fantasia de ir
a esse motel eu te levo lá com o maior prazer.
Bingo!
Em questão de minutos, estamos adentrando os portões do motel, com os
seguranças nos seguindo em outro carro. Sei que recebemos a chave da
suíte certa quando vejo as câmeras escondidas por todos os lados. É hora de
agir.
Calmamente, pego um refrigerante no frigobar, divido em dois copos,
com quantidades diferentes para que eu possa distingui-los, peço que
Hudson procure um filme pornô na televisão, para que se distraia e não veja
o que estou fazendo, tiro a dose de lítium misturado a LSD do papelote em
meu decote e derramo tudo no copo que será dele.
— Já que não posso beber, gostaria de te propor um brinde, ao começo
dessa nova etapa da minha vida, com refrigerante mesmo. A esse momento
que espero ser o primeiro de muitos. — falo, quando ele se coloca diante de
mim.
O babaca recebe o copo da minha mão sem prestar atenção em mais
nada que não em meu olhar forçosamente interessado.
— Claro. O primeiro de muitos. Tenho certeza. — brindamos e ele bebe
um gole grande, mas não é suficiente.
Ingiro toda a bebida do meu copo, esperando que ele me imite e ele faz,
agindo como um patinho idiota. Agora é só esperar a droga fazer efeito.
Como era previsto, Hudson avança para cima de mim, cheio de tesão e
como preciso representar que também o quero, pelo menos até que ele
esteja vendo alucinações, permito que me beije na boca e enfie sua mão sob
minhas roupas, agarrando um dos meus peitos, apertando com tanta força
que tenho vontade de dar um murro na cara dele.
Sei que a essa altura Lennon está nos observando e soltando fogo pelas
ventas, mas não posso fazer nada, já que é necessário deixar o idiota
excitado para o que pretendemos fazer. Então, viro-me de costas para ele e
rebolo minha bunda na sua ereção, porque isso pode ao mesmo tempo
excitá-lo e prolongar a demora em tirarmos as roupas.
Mas Hudson é impulsivo e está obcecado por um foda, assim, me agarra
por trás e enfia uma mão sob minha saia, infiltrando-a na minha calcinha
enquanto continua apertando meu peito com a outra mão.
— Lucy, você não pode imaginar o quanto esperei por isso. — ele
sussurra na minha orelha. — Está sentindo o quanto te quero? — e como eu
ia deixar de sentir aquele pau duro cutucando minha bunda? — Estou assim
há dias, só pensando em você e agora estamos aqui.
— Por favor, Hudson, vamos com calma. Não sou uma garota que teve
muitas experiências. — tento não chegar ao ponto de precisarmos tirar
nossas roupas.
Mas é inútil, o safado está tarado e logo tira meu suéter, para em seguida
abrir o zíper do meu vestido e deixá-lo cair aos meus pés, de modo que fico
apenas com a calcinha e o sutiã. Depois, livra-se de suas roupas, ficando de
só de cueca, a ereção quase a ponto de rasgar o tecido preto da Calvin
Klein.
Espero que dê tempo de ele sair de si antes que Lennon perca as
estribeiras e venha até aqui estragar todo o plano.
Tento nos manter em pé, mas o cara me vira de frente e nos atira na
cama, pulando em cima de mim, me beijando na boca enquanto esfrega seu
sexo no meu.
Puta merda! Ele não está facilitando as coisas.
— Hudson, espera. Quero fazer uma dança sensual para você. — falo,
tentando desviar minha boca da sua.
— Depois você faz isso, agora quero sentir meu pau dentro dessa
bocetinha. Eu esperei demais por isso.
Ele me prende na cama com seu corpo grande e leva a mão à minha
calcinha, está quase tirando-a e se o fizer dificilmente conseguirei evitar a
relação.
Caramba! Daqui a pouco Lennon aparece aqui e o tira de cima de mim.
— Ai! — grito e, como esperava, ele se afasta em um sobressalto.
— O que foi? Te machuquei?
— Preciso fazer xixi. — é só o que me vem à mente na hora.
Visivelmente frustrado, ele passa as mãos pelos cabelos.
— Claro, vai lá. Eu te espero.
Corro depressa para o banheiro e me sento no vaso. Agora só preciso
esperar. Quanto tempo essa droga leva para fazer efeito?
— Lucy, você está bem? — Hudson me chama, impaciente.
— Sim, já vou sair.
Espero por vinte minutos, ele me chama por mais duas vezes, até que se
silencia e deixo o banheiro. O encontro em pé, no canto quarto, sorrindo
para a parede, com os olhos avermelhados, semicerrados, na maior viagem.
Finalmente. Agora podemos começar a brincadeira.
O agarro pelo pescoço, esfrego meu corpo no dele e o beijo na boca até
que esteja excitado de novo é então que o deixo para ir abrir a porta interna
do quarto.
— Tenho uma surpresa pra você. — falo e escancaro a porta, dando
passagem ao travesti, muito alto, magro, usando uma peruca loira barata e
uma lingerie de quinta categoria. — Essa é minha amiga Antonella, ela é
italiana e veio brincar com a gente.
— Veio? — Hudson diz, com a voz pastosa, os movimentos lentos,
como se seu corpo pesasse toneladas. — Eu preferia que fosse só nós dois,
se você não se importa.
— Relaxa gato, você vai gostar de Antonella.
Solto uma sonora gargalhada, porque já não preciso fingir que sou a
songa monga da Lucy. Hudson não me distinguiria nem da Madona agora,
pois está completamente fora da casinha.
CAPÍTULO XXXV
Como foi instruído a fazer, o travesti o agarra e o beija na boca, vira-se
de costa para ele e esfrega a bunda no seu pau, como fiz há pouco.
Hudson está tão doido que não percebe que não é uma mulher e logo está
no maior clima com o traveco, deixando que ele chupe seu pau em cima da
cama.
É o início do espetáculo e pego meu celular para gravar meu próprio
filme, porque as câmeras escondidas podem ter pegado o momento em que
coloquei a droga na bebida dele, o que poderia ser usado em sua defesa,
entretanto, se eu gravar apenas seus momentos de intimidade com o
travesti, ele não terá chance de defesa.
Com a câmera ligada, sento-me na poltrona perto da cama e gravo a
transa mais nojenta que já presenciei.
Hudson está muito fora de si e deixa que o traveco faça tudo o que quiser
com ele, inclusive enterrar o pau enorme na sua boca. Ele reluta em chupar,
mas acaba fazendo e de bom grado, até que sua boca esteja cheia de
esperma. Porém, o pior momento, é quando o travesti se enterra no ânus
dele. Há gritos, lamúrias e por fim a aceitação, acho inclusive que ele está
gostando.
Difícil mesmo, é ter que presenciar aquilo.
São quase quarenta minutos de foda, ambos agindo de forma passiva e
ativa, fazendo de tudo que dois homens fazem na cama. Quando o travesti o
deixa, Hudson está apagado, não sei se dormiu ou se perdeu os sentidos.
Acho que desmaiou, afinal não é todos os dias que se é sodomizado por um
pau daquele tamanho.
Visto minhas roupas e aceno para uma das câmeras escondidas para que
Lennon e sua equipe venham.
Assim que entra no quarto, acompanhado por Donald, Lennon corre para
me tomar em seus braços e me entrego ao abraço com todo contentamento.
— Eu estava quase vindo aqui quando esse bastardo te agarrou. — diz
ele.
— Foi o que imaginei. Mas como você viu, acabou tudo bem. O plano
deu certo.
— Vamos esperar para ver a reação dele quando acordar.
— Na boa, eu não queria estar no lugar desse cara. — Donald fala.
— Então nunca arranje uma briga com Samantha. — Lennon responde.
Enquanto o resto da equipe permanece em seus postos espalhados pelo
motel e outros se responsabilizam em levar o travesti de volta ao seu ponto
no subúrbio, Lennon, Donald e eu nos acomodamos à mesa perto do
frigobar a espera de que Hudson acorde. Mostro a eles o filme que fiz e
decidimos que este será usado para coagir nossa vítima, pois passa a
impressão de que aquilo não foi uma armadilha e sim um encontro a três do
qual a pessoa a filmar não participou.
Uma hora se passa e nada de Hudson despertar. Impaciente, encho uma
taça com a água da torneira e jogo no rosto dele, fazendo com que desperte
completamente atordoado. Ele olha à sua volta, tentando se localizar, depois
observa a sua própria nudez e finalmente nos enxerga diante da cama.
— Lennon, o que você está fazendo aqui? — Hudson diz, com a voz
ainda meio embargada pelas drogas, enquanto cobre sua nudez com um
lençol, para em seguida levar a mão à cabeça, como se sentisse dor.
— Vim te dizer que não deixarei Lucy. E se você ousar a abrir a boca pra
denunciá-la, vou espalhar pelos quatro cantos da Europa o que foi gravado
aqui esta noite.
— O que foi gravado? Do que você está falando?
— Ahh tem certeza que não lembra? — provoco, com escárnio. — Você
parecia estar gostando tanto.
Solto uma gargalhada e ele fica surpreso, obviamente notando que estive
fingindo o tempo todo.
Ao sinal de Lennon, Donald liga o cabo de USB na TV de tela plana do
motel e as imagens que gravei começam a ser exibidas. À medida que o
filme passa, Hudson vai ficando mais pálido, nervoso e visivelmente
desconcertado.
Quando levanta-se da cama, solta um gemido e, involuntariamente, leva
a mão ao seu traseiro, como se a dor partisse dali e todos nós caímos na
gargalhada.
— O que vocês fizeram?! — ele rosna, os olhos brilhando de um ódio
mortal. — Eu fui drogado e violentando! Não posso ser responsabilizado
pelo que aconteceu.
— Drogado até que você foi, mas dizer que foi violentando é um pouco
demais. Olha só como você está gostando. — aponto para a tela, onde ele
geme de prazer enquanto é sodomizado.
— O que vocês pretendem com isso?
— Simples: que você nos deixe viver nossas vidas em paz. Que nunca
mais volte a nos ameaçar. — é Lennon quem responde. — Se mencionar a
mais alguém o que Lucy fez no passado, essas imagens serão divulgadas
pro mundo todo. Quero ver você convencer alguém de que fez isso contra a
vontade, você parece estar se divertindo tanto.
— Malditos! Vocês armaram tudo isso pra me ferrar.
— Foi você quem começou.
— E você não passa de uma vadia fingida, Lucy. — a fúria em seu olhar
é descomunal.
— Posso até ser vadia e fingida, mas não sou Lucy. — seguindo a um
impulso, vou até ele e dou um chute entre suas pernas, onde sei que vou
causar mais dor. — Me chama de Samantha, seu otário. E nunca mais se
mete comigo, porque sou capaz de coisa bem pior que isso.
Hudson geme e se debate enquanto mantém as duas mãos pressionadas
sobre suas bolas.
— Vão embora daqui, seus doentes. Nunca mais quero ver vocês na
minha frente. — ele diz.
— Nós vamos, mas não se esqueça da nossa conversa. Se você abrir a
boca sobre Samantha, essas imagens serão exibidas no mundo todo. Adeus.
Espero nunca mais ter que ver sua cara na minha frente.
Com isto, Lennon passa o braço em torno dos meus ombros e deixamos
a suíte, junto com Donald, pela porta interna para que não sejamos vistos
pelos seguranças de Hudson.
Lennon.
Samantha passa uma semana comigo, vivendo do seu jeito louco como
sempre e me arrastando junto para as suas loucuras, para as noitadas nas
boates da cidade, passeios ao ar livre e até para as compras. Só que ela não
faz apenas aquelas compras de roupas e joias como as outras garotas, ela
quer uma Ferrari vermelha e lhe presenteio com todo o prazer.
Apesar de movimentada, a rotina ao lado dela é também intensa,
divertida e inesquecível, principalmente porque sua loucura se estende
também aos nossos momentos de intimidade, que acabam acontecendo nos
lugares mais inusitados e é sempre melhor que a vez anterior.
Depois daquela semana, Lucy está de volta e junto com ela a calmaria,
embora isso não faça com que eu a ame menos, para mim são duas metades
do mesmo ser que se completam, o ser dono de todo o meu amor.
Novamente Sam deixa um vídeo gravado explicando como armou para
cima de Hudson e Lucy compreende tudo com mais facilidade, entende
porque tive que deixá-la, me perdoa e volta a morar no palácio.
De volta, ela precisa retornar à faculdade e recuperar os dias de aula
perdidos e no final de semana vamos em busca de Jack para passar os dois
dias conosco, de modo que nossa rotina volta a ser como antes.
Minha vida está novamente nos trilhos, minha garota está feliz, meu
governo tem uma boa aprovação pela população e a pobreza extrema
continua sendo erradicada do país. Porém, existe algo quase insignificante
que está sempre entre mim e Lucy, algo que é quase imperceptível, mas que
me incomoda. Acontece sempre que nos reunimos com minha mãe,
geralmente à mesa durante as refeições, quando Lucy faz questão de
discutir com Diana o estado de saúde dela e depois me lança aquele olhar
acusador.
Ela não precisa dizer nada para que eu saiba que, embora
silenciosamente, ainda me culpa pela doença de Ruth e isso sempre estará
entre nós enquanto eu não tomar uma atitude, só que nesse caso, terá que
ser uma atitude radical, pois a única forma de remediar o que fiz e tentar
fazer com que Ruth melhore, é procurando por Lindsay na América e para
isto precisarei, antes de mais nada, renunciar ao meu cargo de presidente e
cortar qualquer ligação com o poder público, pois a irmã incestuosa de uma
figura pública sofreria mais perseguição e teria muito mais chances de ir
parar na cadeia que a irmã incestuosa de um trabalhador comum, ou um
empresário. Isso sem mencionar que eu também seria perseguido pelos
meus adversários por ter compactuado com o crime dela durante todos esses
anos.
Para que esteja sempre tudo bem entre mim e Lucy, eu seria capaz de
renunciar, porém, ainda não me sinto preparado para isto, afinal foram
muitos anos no poder, um poder que conquistei com unhas e dentes. Não sei
se sou capaz de deixar tudo para trás assim de uma hora para outra.
Entretanto, quando o destino tem algo reservado para nós, ele se
encarrega de encontrar os meios para que as coisas aconteçam. E a minha
decisão acontece alguns meses depois, quando decidimos passar o natal em
família aqui mesmo no palácio, apenas nós dois, Jack e Ruth, no salão da
lareira que Lucy se encarregou de enfeitar com a ajuda apenas de Diana e
de seu irmão, de modo que o lugar está parecendo um lar de verdade, com
árvore de natal, muitos presentes em volta dela e meias penduradas na
lareira.
Pouco antes da ceia, nos reunimos em volta da árvore para trocarmos os
presentes, algo que não faço há muitos anos, na verdade nem me lembro
quando foi a última vez que me reuni com alguém perto de uma árvore de
natal.
É ao receber o presente de Jack, que Ruth começa a passar mal. Primeiro
pergunta por Lindsay, isso depois de vários meses sem pronunciar uma só
palavra e depois que tento remediar a situação de todas as formas,
explicando que minha irmã está em outra casa, com um novo marido, ela
sai de si, começa a gritar, chorar e se tremer toda, em meio a uma crise
nervosa, como já aconteceu outras vezes.
Ela fica tão mal que sou obrigado a chamar o médico e após examina-la
ele lhe dá o calmante de sempre que a faz pegar no sono, mas nos alerta
sobre a importância de evitar que tais episódios se repitam, pois há o risco
de que ela tenha um derrame cerebral ou um ataque cardíaco devido ao
nervosismo, o que pode ser fatal.
Depois que ela adormece e o médico se vai, estou sozinho com Lucy em
nosso quarto, percebendo o quanto ela está quieta, me olhando daquele jeito
acusador, embora nada diga.
— Só Lindsay pode fazer com que ela melhore e a única forma que vejo
de procurá-la sem condená-la a ir para a cadeia é renunciando à presidência.
— falo, depois do longo e tenso silêncio.
Lucy está perto da janela, observando a neve caindo lá fora.
— E você vai conseguir ser feliz sem o poder que tanto ama? — ela
indaga sem encarar-me, ainda me condenando por acreditar que priorizo o
poder em detrimento da minha família.
Vou até ela e a abraço pela cintura, aconchegando sua cabeça em meu
peito.
— Ao seu lado eu sempre serei feliz, não importam as circunstâncias.
Vou renunciar.
Ela me abraça de volta, aninhando seu corpo ao meu, me presenteando
com o seu calor gostoso e amado.
— Você tem certeza disso? E se Lindsay tiver se mudado? E se você não
a encontrar mais?
— Donald falou com ela há poucos dias.
Lucy me encara surpresa.
— Sério? E falou o quê?
— Nada de mais. Ele fingiu ser um funcionário do seguro social para
colher algumas informações básicas e se certificar de que ela continua
morando no mesmo lugar.
— E continua?
— Sim e está grávida de novo. De cinco meses.
— Se você realmente pretende renunciar, precisa telefonar para ela antes
e descobrir se ela vai querer te receber depois de tudo o que aconteceu no
passado.
— Ela vai. Lindsay nunca foi uma pessoa de guardar rancor.
— E o que vai ser de nós? Vamos ter que morar na América?
— Não. Só se você quiser.
— Não posso, pois tenho Jack e minha mãe aqui. E a faculdade.
— Então nós vamos visitá-la, deixamos Ruth lá e depois voltamos para
Newhart.
— E vamos viver do que se você vai estar desempregado?
Sorrio da sua ingênua insegurança e afundo o nariz em seus cabelos,
inebriando-me com o seu cheiro gostoso.
— Não se preocupe com isso, tenho ações em várias empresas e dinheiro
suficiente para abrir a minha própria se assim decidir.
— Andou metendo a mão no dinheiro público, senhor presidente?
— Claro que não. O governo arca com todas as minhas despesas, apenas
investi meu salário em ações que deram certo.
Lucy me encara muito séria.
— Você tem certeza de que não vai se arrepender depois?
— Tenho. Faz dias que penso nisso. Acho que vai ser bom mudar um
pouco. Se não conseguir ficar longe, me candidato a um cargo menos
relevante.
— Nesse caso, tem algo que preciso te contar. — ela sorri nervosa e se
afasta do abraço.
— E o que seria?
Ainda nervosa, segura minha mão entre as suas e a pousa sobre seu
ventre achatado.
Prevejo o que ela vai dizer e minha respiração fica suspensa.
— Estou grávida. — seus olhos não desviam dos meus, a espera da
minha reação.
E é claro que sou inundado pelo mais perfeito júbilo. Não poderia haver
perfeição maior que ter um filho com a minha garota, o primeiro de muitos.
— É sério?
— Sim. Estou de quatro semanas.
— E por que não me contou antes?
— Estava esperando o momento certo, como esse, porque será um novo
começo para você em vários sentidos.
Tomado por uma emoção nunca antes experimentada, ajoelho-me aos
pés dela, nivelando meu rosto ao seu ventre e o beijo, apaixonado por ela e
pela parte de mim que está dentro de si.
— Eu te amo Lucy e vou amar essa criança com todo o meu coração.
Ela se ajoelha também e me abraça pelo pescoço.
— Eu também te amo, Lennon. A maior felicidade que tive na vida foi
conhecer você.
Levanto-me e a puxo para comigo, tomo-lhe os lábios em um beijo
apaixonado, carregado de luxúria e de paixão, para logo levá-la para a
cama.
No dia vinte e seis de dezembro, levo minha renúncia a público e poucos
dias depois, sem dever mais satisfação da minha vida a ninguém, viajamos
para os Estados Unidos. Lucy, Ruth, Diana, Jack — que está passando as
férias conosco — e eu.
Como telefonei antes para avisar que estávamos indo, Lindsay já está a
nossa espera. Ela ficou emocionada ao ouvir minha voz e foi bastante
receptiva. Ao contrário do que alguns esperavam, não demonstrou rancor
algum, pelo contrário, se mostrou bastante ansiosa em nos ver.
É quase meio dia quando chegamos a sua casa em Los Angeles. Uma
construção típica americana, espaçosa, sem muito luxo, mas que tem a praia
como quintal, o que é magnífico.
Antes mesmo que eu toque a campainha, a porta é aberta e a reconheço
de imediato. Apesar dos anos, continua a mesma garota loira de olhos azuis,
alta e linda. Só não está mais tão esguia por causa da gravidez.
— Lennon, é você! — ela sussurra, seus olhos marejados de lágrimas.
— Olá Lindsay.
Nos abraçamos apertado e ela mergulha no pranto, seu corpo trêmulo de
emoção.
Quando me deixa para se aproximar da cadeira de rodas de nossa mãe,
vejo minha velha se levantar pela primeira vez depois de meses e tomar a
filha entre os braços, chorando junto com ela, emocionada, repetindo seu
nome.
A cena é tão comovente, que Lucy também começa a chorar e vou
abraçá-la para que não fique muito abalada.
Naquela casa simples, perto do mar, somos recebidos com calorosidade
também pelo marido de Lindsay e sua filha Sara, uma menina linda de
cinco anos. E quando nos reunimos na varanda dos fundos, para o almoço,
apreciando a brisa que parte do mar, olho para todos os rostos felizes à
minha volta, inclusive o da minha mãe, que agora sorri e conversa
normalmente, pela primeira vez sinto que faço parte de uma família de
verdade, que vive em paz e feliz, sem as brigas constantes do passado e só
então posso compreender porque minha irmã optou por assumir aquele
relacionamento apesar de todos os riscos. Ela tomou a decisão certa.
EPÍLOGO
Itália, quatro anos depois.
Lennon.
Com a chegada do verão deixamos nossa casa em Newhart para
passarmos as férias na casa de praia na Toscana. Encontramos esse lugar na
internet, é simplesmente incrível, a casa é antiga, enorme, porém bem
restaurada e conservada. Fica a poucos metros de distância da praia e alguns
quilômetros da cidade mais próxima, portanto o sossego é garantido.
Esse ano Jack veio conosco e hoje ele e eu acordamos mais cedo para
prepararmos o veleiro para um dia de pesca. Como todo adolescente, ele é
um garoto aventureiro e a pesca certamente vai ser a maior diversão.
Lucy e nossa princesa Amy, de quase quatro anos, ainda dormem, mas
sei que vão querer vir com a gente, por isso não precisamos ter pressa em
organizar as coisas.
Abastecemos a embarcação com tudo o que vamos precisar: iscas,
anzóis, uma rede pequena para o caso de termos a sorte de encontramos um
cardume, caixas térmicas com água, comida e refrigerante, além de roupas
de mergulho e protetor solar.
Ao encerramos a tarefa, abrimos refrigerantes e ficamos ali papeando
enquanto as garotas não acordam, quando, subitamente, um grito agudo
parte do interior da casa e partimos em disparada, abandonando os
refrigerantes no chão.
Entramos e logo na sala encontramos Lucy, usando uma de minhas
camisas de mangas compridas por cima da camisola transparente, com os
cabelos soltos caindo pelos ombros, segurando o taco de baseball, como se
estivesse se defendendo de algo ou de alguém.
Aflito percorro os olhos em volta, a procura do suposto perigo, mas não
vejo nada.
— Lucy o que houve? — pergunto, com o coração disparado no peito
por causa da adrenalina.
Inesperadamente, ela aponta o taco na minha direção, de forma
ameaçadora.
— Fica longe de mim! — grita, assustada. — Quem são vocês? O que
estou fazendo aqui? Por acaso isso é um sequestro?
Demoro um instante para entender e por fim compreendo que ela sofreu
uma mudança de personalidade, está apresentando alguém que não é Lucy e
nem Samantha, alguém que não faço ideia de quem possa ser. Observo-a
atentamente e percebo o quanto está diferente. Seu olhar, apesar de
assustado, está muito mais perspicaz, os modos são mais ágeis e firmes, até
sua postura é outra, está muito mais altiva.
— Caramba! Ela não é Lucy e nem Samantha! — Jack faz a mesma
constatação só que em voz alta, perplexo.
— Quem é Lucy e quem é Samantha? — ela indaga. — Me falem o que
está acontecendo aqui ou vou chamar a polícia.
— Fica calma, eu posso explicar. — falo. — Você é Lucy Anderson,
uma garota que tem transtorno dissociativo de personalidade. Desde que
nos conhecemos, há cinco anos, você tem apresentado dupla personalidade
e é a primeira vez que está apresentando uma terceira, mas isso já era
esperado.
— Você ficou louco? Não sou quem está dizendo, sou Nora Stewart,
pediatra no Hospital Central de Newhart.
— Uma médica, que maneiro! — Jack está se divertindo com a situação.
— Quem são vocês?
— Eu sou Lennon Rudolf, seu marido e esse Jack, seu irmão.
— Marido?! Irmão?! Você está louco?
— Não Nora. Olha a aliança em seu dedo. Você é Lucy. A minha Lucy.
Ela olha a aliança e abaixa o bastão, mas não o solta.
— Espera, Lennon Rudolf não é o presidente de Newhart?
— Sim, só que agora sou ex presidente. Renunciei ao cargo pouco antes
de nos casarmos. Agora somos donos de uma construtora.
Ela pisca confusa e neste instante a pequena Amy surge correndo dos
fundos da casa, se enrosca nas pernas dela, sorrindo com euforia,
chamando-a de mamãe.
— E essa é nossa filha Amy.
— Ai meu Deus. — ela abandona o bastão no chão e agacha diante da
menina, observa-as por um instante, depois segura-a no colo, visivelmente
sem jeito e senta-se no sofá, colocando-a sobre suas pernas. — Ela é mesmo
minha filha? Será que sou louca?
— Não, você não é louca, só tem distúrbio de personalidade. Isso dura só
alguns dias, logo você volta ao normal.
— Mas esse é meu normal.
— Não é Lucy.
— Para de me chamar de Lucy.
— Olha mamãe, colhi uvas pra você lá no quintal. — Amy diz e lhe
entrega um pequeno cacho de uvas rochas.
— Obrigada. — Lucy diz sorrindo e fita nossa menina com tanto afeto
que tenho certeza de que não a rejeitará. — Você é linda. Qual o seu nome?
— Amy. — a pequena responde e sorri, uma riso muito parecido com o
de Samantha.
Lucy a abraça, aspira seu cheiro e se levanta com ela nos braços.
— Ok, estou convencida, essa menina é minha filha, mas você fica longe
de mim. — diz, apontando na minha direção.
Jack solta uma gargalhada, zombando de mim.
— Vai rindo moleque. Em vinte e quatro horas eu a convenço de que sou
o homem da vida dela. — sussurro, achando que apenas Jack meu ouviu,
mas Lucy se vira para dizer:
— Não convence não. — caminha até a porta com Amy nos braços. —
Que lindo! Que lugar é esse?
— É a Toscana e essa é nossa casa de veraneio.
— Acho que posso me acostumar com isso.
Ela avança pela areia com a criança no colo. Após caminhar alguns
metros, para, coloca Amy no chão, tira a minha camisa do seu corpo,
ficando só de camisola, pega Amy novamente e caminha rumo ao veleiro,
sem que eu e Jack deixemos de segui-la de perto.
— Nós estamos saindo para pescar. Está a fim de vir junto? — convido,
segurando nas cordas do veleiro.
Ela se vira seu rosto para na minha direção e seu olhar lindo vai direto
para os músculos dos meus braços, depois descem pelo meu tórax, oculto
apenas pelo tecido fino de uma camiseta e continuam até minhas coxas
desnudas, fazendo um rápido intervalo sobre meu sexo, quando então sua
boca linda se abre para puxar o ar, evidenciando sua excitação ao mesmo
tempo em que seu rosto fica muito vermelho e sorrio de pura satisfação.
Tenho certeza de que essa noite vai ser muito interessante, porque estarei
com uma mulher que acreditará estar sendo minha pela primeira vez. A
estarei conquistando pela terceira vez e não posso pensar em nada que
possa ser mais desafiador e excitante que isto.
Aquela mulher realmente nasceu para ser minha, porque o seu pior
defeito – pelo menos o que ela própria julga ser um defeito — é o que mais
amo nela. Essa diversidade surpreendente e imprevisível me fascina,
embora eu tenha consciência do quanto pode ser perigosa se uma
transformação repentina como esta acontecer quando ela estiver sozinha,
longe de casa. Por isso jamais deixarei que ela esteja só, tampouco longe de
casa.
— Bem, eu gostaria, mas não podemos sair sem antes alimentarmos a
criança. Posso preparar alguma coisa. Vocês estão a fim?
— Pô, na hora. — é Jack quem diz.
— Estamos sim. Ainda não comemos nada hoje.
— Então essa tal de Lucy não está cuidando direito de vocês.
Jack solta uma gargalhada e o cutuco sem que Lucy veja.
— Venham. Vou preparar alguma coisa.
Ela segue de volta para a casa, sem soltar a nossa pequena, que devora as
uvas em seu colo e nós dois a seguimos de perto, Jack ansioso para tomar o
café da manhã e eu para conhecer melhor o novo alter ego da mulher que
amo mais a cada dia, com todo o meu coração.
FIM
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