RELATORIO de Marta Cabral
RELATORIO de Marta Cabral
RELATORIO de Marta Cabral
MESTRADO EM PSICOLOGIA
Aconselhamento
abril de 2018
Lisboa
“Enraizados e edificados nele, firmados na fé, como
foram ensinados, transbordando de gratidão”
(Colossenses 2:7).
I
Agradecimentos
Este relatório constitui uma parte importante de um processo de aprendizagem que
culminou com o estágio académico. Este conjunto de vivências e experiências que este
percurso proporcionou foi imprescindível para cimentar conhecimentos e formação na
perspetiva de futura psicóloga e simultaneamente ao nível pessoal. Este percurso, sendo
pessoal, não foi seguramente solitário. Assim, expresso aqui os meus sinceros agradecimentos:
Aos meus colegas de turma pela alegria, amizade e camaradagem.
A todos os professores que ao longo de 5 anos de formação tanto me ensinaram com a
partilha do seu saber e das suas experiências.
Um especial agradecimento à Professora Doutora Mónica Pires pelo apoio e
compreensão no processo de candidatura do estágio autoproposto e orientação nas aulas de
supervisão, onde a partilha de experiências funcionou como grande momento de aprendizagem,
mas essencialmente sentido como relação de ajuda.
Obrigada à Dr.ª Luísa Ferreirinho pela disponibilidade e espírito de ajuda.
Às minhas colegas do estágio pela alegria e paixão pelas aprendizagens e pelo espírito de
cooperação e amizade. A partilha do conhecimento e o quanto aprendi ouvindo outros modelos
teóricos em contexto laboral.
Ao Dr. Vítor Branco, orientador do estágio local, pelo acolhimento, disponibilidade,
confiança, sabedoria e ensinamento.
À Professora Doutora Paula Pires pela disponibilidade, incentivo e alegria na orientação
do relatório de estágio.
Aos meus amigos pelas palavras de incentivo e carinho.
À toda a minha família pelo carinho, compreensão e preocupação constante.
Aos meus filhos André e Gonçalo.
II
Resumo
Este relatório corresponde à parte final do percurso académico para a conclusão de
estudos e obtenção do grau de Mestre em Psicologia, Especialidade em Psicologia Clínica e de
Aconselhamento do Departamento de Psicologia da Universidade Autónoma de Lisboa.
O estágio realizou-se num Agrupamento de Centros de Saúde, na Unidade de Recursos
Assistenciais Partilhados, durante oito meses, perfazendo um total de 450 horas. Estes serviços,
têm como objetivo principal, a prevenção e a promoção da saúde nas diversas fases da vida do
indivíduo.
O trabalho desenvolvido durante este período foi fundamental para a prática
profissional e formação, tendo originado um importante desenvolvimento de competências
técnicas e relacionais.
Esta fase de aprendizagem, proporcionou a proximidade com a conjuntura profissional,
a prática das referências obtidas anteriormente e também estimulou momentos de pura reflexão
relativamente a execução das atividades desenvolvidas junto da população alvo da consulta de
psicologia desta instituição.
Está patente neste relatório o trabalho realizado no âmbito da psicologia clínica e
simultaneamente, relacionado com a ciência para um melhor entendimento e explanação das
problemáticas que surgiram e também no que concerne aos dois casos estudados e aqui
apresentados.
Salienta-se que os dois casos acima referenciados são distintos, sendo que um se
relaciona com o acompanhamento psicológico, registo das respetivas sínteses das sessões,
análise clínica e reflexão. O outro refere-se à avaliação psicológica, e apresentam-se os
resultados dos testes aplicados, análise e conclusão.
Assim, consideramos relevante organizar este relatório em quatro partes.
Na primeira parte apresentamos a contextualização do local do estágio.
A segunda parte refere-se ao enquadramento teórico da psicologia clínica e das
problemáticas mais comuns nos Cuidados de Saúde Primários.
A terceira parte dedica-se à atividade clínica desenvolvida durante o estágio.
A quarta e última parte, centra-se na apresentação detalhada dos dois casos estudados e
analisados: um em acompanhamento psicológico – mulher vítima de violência doméstica; e
outro em avaliação psicológica – depressão na mulher adulta.
III
Abstract
This report corresponds to the final part of the academic course for the completion of
studies and obtaining a master's degree in Clinical Psychology and Counseling from the
Department of Psychology of the Universidade Autónoma de Lisboa.
The internship took place in a Group of Health Centers in the Shared Care Resource
Unit for eight months, totaling 450 hours. These services have as main objectives the
prevention and promotion of health in the various phases of the individual's life.
The work developed during this period was fundamental to professional practice and
training, leading to an important development of technical and relational skills.
This period of learning provided the proximity to the professional context, the practice
of references obtained previously and also stimulated moments of pure reflection regarding the
execution of the activities developed with the population targeted by the psychology
consultation of this institution.
It is clear in this report the work carried out in the field of clinical psychology and
simultaneously, related to science for a better understanding and explanation of the issues with
regard to the two cases studied and presented here.
It should be noted that the two cases referenced above are distinct, one of which is
related to the psychological follow-up and respective synthesis of the sessions, clinical analysis
and reflection. The other one refers to the psychological evaluation, and the results of the
applied tests, analysis and conclusion are presented.
We therefore consider it relevant to organize this report into four parts.
In the first part we present the contextualization of the stage location.
The second part refers to the theoretical framework of clinical psychology and the most
common problems in primary health care.
The third part is dedicated to the clinical activity developed during the training.
The fourth and last part focuses on the detailed presentation of the two cases studied
and analyzed: one in psychological counseling - a woman victim of domestic violence; and
another in psychological evaluation - depression in the adult woman.
IV
Índice
Agradecimentos ........................................................................................................................... II
Resumo .......................................................................................................................................III
Abstract ...................................................................................................................................... IV
Índice............................................................................................................................................ V
INDICE DE FIGURAS.............................................................................................................. IX
Introdução ...................................................................................................................................11
V
5. Os Cuidados de Saúde Primários .................................................................................37
VI
6.2.4.1 Perspetiva biológica ......................................................................................68
7. Observação ...................................................................................................................75
8. Intervenção ...................................................................................................................76
VII
11.1 Identificação ........................................................................................................100
11.7 S.C.L. 90-R – Symptom Checklist (Derogatis, Rickels & Rock, 1976). ............106
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................117
VIII
INDICE DE FIGURAS
IX
INDÍCE DE QUADROS
X
Introdução
Este relatório1 faz parte integrante do processo de avaliação com vista à obtenção do
grau de Mestre em Psicologia – Especialidade em Psicologia Clínica e de Aconselhamento,
pela Universidade Autónoma de Lisboa.
Explana o trabalho realizado durante estágio no serviço de psicologia do Agrupamento
de Centros de Saúde que abrange dois concelhos do distrito de Setúbal. Integra-se na Unidade
Curricular de Seminário de Estágio I e II, e decorreu durante o período compreendido entre 14
de outubro de 2016 e 30 de junho de 2017, perfazendo um total de 450 horas.
A evolução do estágio foi acompanhada em aulas de supervisão na Universidade
Autónoma de Lisboa pela Professora Doutora Mónica Pires que muito ajudou e colaborou para
que o processo fosse concluído com êxito.
No local de estágio realizaram-se semanalmente reuniões de supervisão, conduzidas por
Dr. Vítor Branco, orientador institucional. Iniciou-se com uma vertente teórica que incluiu a
leitura e pesquisa, seguindo-se a observação que se prolongou até o final do estágio, e também
pela prática de intervenção.
Foram dois os objetivos que nortearam este estágio:
1) convocar as diversas abordagens teóricas nas múltiplas circunstâncias da realidade
psicológica, fomentando a proximidade e a aquisição de boas práticas e assim desenvolver as
competências profissionais adequadas e a autonomia;
2) adquirir formação complementar utilizando os instrumentos de avaliação psicológica
respeitante à aplicação, cotação e explanação de resultados.
O estágio possibilitou a aquisição de conhecimentos e prática no âmbito da psicologia
clínica e da saúde.
Este período permitiu realizar um trabalho de proximidade com a população alvo, e em
simultâneo, desenvolver competências no domínio da psicologia clínica nos Cuidados de Saúde
Primários, cuja curiosidade e interesse há muito se havia revelado.
Foi assim possível conhecer a população relacionada com as consultas de psicologia,
aprofundar conhecimentos acerca das problemáticas mais comuns no contexto laboral em que
se inseriu este ciclo de estudo.
Durante este período foi ainda possível aprofundar, especificamente, os seguintes
conhecimentos:
1
Este relatório foi escrito através do novo acordo ortográfico.
11
a) entendimento da avaliação psicológica; aprender a aplicar em contexto real os testes
cognitivos e projetivos;
b) desenvolver competências relacionais; definir o modelo teórico que melhor se
adequa; articular com elementos de outras especialidades; realizar acompanhamento
psicológico; realizar avaliação psicológica;
c) elaborar relatórios de avaliação psicológica; ajudar a ultrapassar as dificuldades que
surgiam no decorrer das atividades do estágio e inerentes à componente psicológica.
No decorrer do estágio, as atividades incluíram a observação de consultas de triagem,
acompanhamento e avaliação de casos clínicos, participação em ações de formação, reuniões
multidisciplinares, reuniões de supervisão, intervenção e avaliação psicológica individual.
Este relatório descreve com principal destaque dois casos estudados de forma detalhada,
quer em sessões de acompanhamento, quer em avaliação psicológica, realizadas em contexto
real de trabalho na consulta de psicologia clínica nos Cuidados de Saúde Primários.
Apesar de coexistirem outros modelos teóricos no local de estágio, a intervenção
utilizada e explanada neste relatório como referência, é a Abordagem Centrada na Pessoa de
Carl Rogers - Terapia Centrada na Pessoa, que ao longo do relatório se desenvolve e reflete.
12
PARTE I – CONTEXTUALIZAÇÃO DO LOCAL DE ESTÁGIO
13
1. Caracterização da Instituição
A instituição onde foi concretizado o estágio, assume-se como uma unidade
pertencente a um Agrupamento de Centros de Saúde (ACES). O Agrupamento de
Centros de Saúde insere-se na Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do
Tejo (ARSLVT).
O Dec. Lei 28/2008 preconiza que os serviços de saúde se constituam de várias
unidades funcionais com autonomia administrativa cuja missão é garantir a prestação de
cuidados de saúde primários à população de determinada área geográfica.
Segundo o Dec. Lei 157/99, os centros de saúde, ao abranger uma área
geográfica, privilegiam a melhoria do nível de saúde dessas populações.
O ACES formou-se tendo por suporte a portaria nº 394-B/2012 de 29/11 e
integra na sua área geográfica de influência dois concelhos.
Os objetivos gerais desta instituição, são: assegurar a acessibilidade aos cuidados
de saúde aos utentes com e sem médico de família; reorganizar as unidades funcionais
de saúde pública, recursos assistenciais partilhados e equipa de cuidados continuados
integrados; diminuir os custos de fornecimento e serviços.
Missão-Assegurar a promoção da saúde, a prestação de cuidados e a sua
continuidade através da racionalização da utilização de recursos, num quadro de
articulação entre entidades e de um processo de melhoria contínua, envolvendo o
cidadão.
Visão-Desenvolver capacidade para a elaboração de uma estratégia local de
saúde que permita o funcionamento integrado das unidades funcionais e outras
instituições com quem se articula.
Valores-Melhorar a acessibilidade, a qualidade e a efetividade; melhorar a
gestão dos recursos; promover o trabalho em equipa, em parceria e em
complementaridade; estimular o trabalho na comunidade; utilizar a avaliação como
ferramenta de motivação e envolvimento (Relatório Anual Sobre o Acesso a Cuidados
de Saúde, 2014).
1.1 Caracterização socioeconómica.
Os órgãos desta instituição constituem-se a partir do diretor executivo, conselho
executivo, conselho clínico e de saúde e o conselho da comunidade, sendo que o
conselho clínico e de saúde se compõem por um presidente (médico) e até quatro vogais
(pelo menos um médico, um enfermeiro e um outro profissional de saúde), todos em
14
exercício de funções. No caso deste ACES, este órgão integra também uma técnica
superior da área da Psicologia.
Existem serviços de apoio que dependem do diretor executivo: a Unidade de
Apoio à Gestão (UAG) e o Gabinete do Cidadão.
Na prestação direta dos cuidados de saúde, a sua composição inclui 25 unidades
funcionais que se interligam entre si, designadamente:
18 Unidades de saúde familiar que atuam segundo legislação própria;
3 Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados, sob a coordenação de médicos de
medicina geral e familiar;
2 Unidades de Cuidados na Comunidade, com localização individual nos concelhos
abrangentes e coordenadas por uma enfermeira, visando a prestação de cuidados de
saúde de âmbito domiciliário e comunitário. A equipa de cuidados continuados e
integrados atua em projetos da saúde escolar, preparação para o parto, entre outros.
1 Unidade de Saúde Pública que integra médicos de saúde pública e técnicos de saúde
ambiental. Funciona como observatório da saúde, assegurando atividades no campo da
proteção e promoção da saúde;
1 Unidade de Recursos Assistenciais Partilhados, onde se insere a Psicologia e outros
serviços tal como: Serviço Social, Fisioterapia, Nutrição, Terapia da Fala, Saúde Oral,
Cardiopneumologia, Ortótica e Pediatria médica.
O serviço de psicologia é composto por 10 Psicólogos do quadro dos técnicos
superiores de saúde e 6 estagiários do 2º ano de mestrado em psicologia clínica.
Encontram-se distribuídos por 4 polos com o objetivo de cuidar da população que
abrange estes concelhos (Decreto-Lei n.º 253/2012).
15
Este índice de envelhecimento de ambos os concelhos na última década, suscita
preocupações no sentido de que pode este fator ser determinante quanto ao estado de
saúde desta população como elemento importante para a procura dos serviços de saúde.
Salienta-se que em ambos os concelhos, o rejuvenescimento da população ativa
tende a baixar.
Além da fragilidade relacionada com a idade, outras causas se destacam na
saúde desta população. Os fatores biológicos são considerados importantes,
designadamente a gravidez na adolescência ou nas mulheres com idades acima dos 35
anos. Existe uma grande preocupação no sentido de disponibilizar a prestação de
serviços de cuidados de saúde de acompanhamento adequados ao planeamento familiar,
saúde materna e saúde infantil. A mortalidade em ambos os concelhos constitui também
motivo de preocupação. A taxa de mortalidade neonatal e infantil é baixa. No entanto,
destaca-se que a taxa bruta de mortalidade por doenças do aparelho circulatório num
dos concelhos variou entre 3,5%-4,1% e a taxa bruta de mortalidade por tumores
malignos cresceu 1,3% e 2,0% em ambos os concelhos (INE, 2011).
Em Portugal, a morbilidade e a mortalidade estão significativamente associadas
ao comportamento individual. É de tal forma relevante que o comportamento do sujeito
pode influenciar tanto o aparecimento da alteração do estado de saúde como a própria
evolução desta, podendo refletir-se na obesidade, diabetes mellitus, doença coronária e
enfarte do miocárdio, doenças sexualmente transmissíveis, e também nas dependências
com o álcool, doenças cancerosas, acidentes trabalho e de viação (Decreto-Lei nº
122/97).
É neste contexto sócio-económico que a psicologia intenta prestar cuidados de
saúde primários, designadamente ao nível da consulta psicológica individual, nos
projetos de saúde e nos diferentes tipos de problemas institucionais e humanos. O
serviço de psicologia está, por isso, interligado com todas as unidades funcionais, ao
prestar serviços de assistência e consultoria, estabelecendo contato com as unidades de
atendimento do hospital de referência.
Preconiza como objetivos principais:
a formação técnica;
a promoção para a saúde;
a intervenção na doença e na educação para a saúde.
Possibilita a inclusão da vertente psicológica de forma específica no que às
diversas fases do ciclo de vida diz respeito. Interfere de forma adequada e conveniente
16
no seio da clínica geral, saúde materna, saúde infantil, planeamento familiar e saúde
escolar. As atividades desenvolvem-se satisfazendo as solicitações das unidades
funcionais, escolas, Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ). Para tal houve
necessidade de adaptação aos objetivos do próprio serviço, tendo em conta o importante
papel do Psicólogo. Durante as atividades diárias aplicam-se abordagens teóricas
diferentes aos diversos contextos da atividade psicológica bem como a aprendizagem de
boas práticas, forma potenciando assim as competências para a autonomia e adequação
– Documento de Apoio aos Estágios Académicos do Núcleo de Psicologia Aplicada
(DAEANPC, 2013).
Os instrumentos de avaliação psicológica que este serviço dispõe são os
seguintes: Teste de Rorschach, Teste de Avaliação do Exercício Voluntário de Atenção,
Figura Complexa de Rey, Matrizes Progressivas de Raven (PM38), WAIS, WISC III.
17
de procedimentos para a melhoria da qualidade dos serviços prestados por estes
profissionais (Teixeira & Trindade, 2012)
Para Trindade e Teixeira (1998), nos centros de saúde a intervenção psicológica
constitui uma missão urgente e imperiosa. Desta forma, torna-se importante assinalar e
revelar a intervenção psicológica, essencialmente porque a colocação dos psicólogos na
carreira de técnicos superiores de saúde assim o exige. Torna-se tão revelante pois, os
próprios profissionais bem como os responsáveis políticos, desconhecem a realidade
local relativas à intervenção de Psicólogos nos serviços de saúde.
Excetuando os serviços de psicologia dos hospitais psiquiátricos e dos
departamentos de psiquiatria e saúde mental, em Portugal, verifica-se uma escassa
implantação dos Psicólogos nos serviços de saúde em geral e particularmente nos
Centros de Saúde e nos Hospitais centrais e distritais.
Corroborando com os autores acima, durante o estágio foi notório o número
insuficiente de profissionais na área da psicologia para fazer face às solicitações de
consultas.
A intervenção e o acompanhamento psicológico aos utentes teriam melhores
resultados com o aumento de técnicos de saúde nos quadros do Serviço Nacional de
Saúde, principalmente nos Cuidados de Saúde Primários.
18
predomínio não é emocional, deficiência mental, ou necessidades educativas especiais;
toxicodependência, comportamentos aditivos no geral, patologias avaliadas como
necessitando de exclusiva ou prioritária intervenção médicas ou medicamentosa
(DAEANPC, 2013).
19
No que concerne a esta instituição os pacientes que procuram o Psicólogo na sua
maioria são referenciados pelo médico de família. Rececionam-se também referências
de escolas e da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens. As intervenções são feitas
individualmente com crianças, jovens, adultos e idosos. No caso das crianças, o trabalho
é realizado em conjunto com os progenitores sempre que se achar conveniente. Os
princípios de intervenção clínica destacam-se pela intervenção psicológica com
crianças, adolescentes, adultos e idosos, de forma a complementar a intervenção
médica; pela resposta a solicitações de intervenção psicológica do centro de saúde e da
comunidade; pela intervenção preferencial no âmbito da psicologia da saúde e
psicoterapia, e pela intervenção restrita ao âmbito da psicologia clínica, com
encaminhamento externo de todas as outras condições (DAEANPC, 2013).
Neste sentido, as consultas de psicologia são regidas de acordo com os critérios
de preferência - para a intervenção psicológica; e de exclusão, as situações de
encaminhamento externo. Apresentam-se como critérios de preferência, nesta
instituição de saúde os indícios relacionados com questões psicológicas ao nível do
comportamento, estado emocional ou do pensamento; as reações infantis desajustadas
dos padrões de desenvolvimento; as perturbações psicofisiológicas ao nível de
alterações alimentares, do sono, encoprese e enurese; e nas crises pessoais ou familiares.
A vivência problemática da sexualidade no sujeito, e a emergência de queixas físicas e
somáticas apresentam-se como critérios fundamentais de referência para uma consulta
de psicologia. Para além destas variáveis, existem também as dificuldades na gestão de
doenças agudas ou crónicas, principalmente em estados terminais, diagnóstico ou
tratamento, na adesão a prescrições médicas ou tratamentos necessários, e nos
comportamentos de vida prejudiciais à saúde (DAEANPC, 2013).
Como critérios de exclusão destacam-se as dificuldades de aprendizagem
relacionadas com questões cognitivas, as deficiências mentais e as necessidades
educativas especiais. Nestes casos, faz-se um encaminhamento externo para as áreas da
psicologia educacional, ou de desenvolvimento. As situações de dependência,
comportamentos aditivos generalizados, ou mesmo as patologias que necessitam
prioritariamente de intervenção médica e/ou medicamentosa são encaminhadas para o
campo da saúde mental especializada, onde podem beneficiar de cuidados apropriados
às suas condições (DAEANPC, 2013).
Quanto à estrutura da consulta de psicologia, tem por base um processo de
triagem, no qual é feita: a identificação e avaliação das queixas que motivam a
20
referência, a informação acerca do possível acompanhamento a fazer, a informação ao
paciente sobre o plano para a intervenção e o envio de informação escrita de retorno
para o profissional que referenciou. À marcação da consulta de triagem antecede uma
referência para intervenção psicológica feita pelas unidades funcionais, ou um processo
de consultadoria feito em reuniões de articulação. Nestes casos é feito o preenchimento
e envio de uma ficha de referência para psicologia clínica via eletrónica, ou através de
entrega em papel no secretariado respetivo (DAEANPC, 2013).
Posteriormente, o psicólogo efetua o envio das informações de retorno para as
entidades envolvidas. Verificando-se a necessidade, segue-se um processo de
intervenção psicológica, e posteriormente um processo de encaminhamento. Aquando
do processo de intervenção psicológica, o utente pode seguir para atendimento imediato,
ou ficar na lista de espera. Este processo diz respeito à concretização da intervenção
psicológica avaliada como adequada em articulação com os outros profissionais de
saúde ou de áreas afins, em relação à partilha de informação, objetivos e procedimentos
de intervenção. O encaminhamento é feito e avaliado em conjunto com o médico de
família e com o envio da informação clínica escrita do paciente, que compreende a
descrição dos aspetos relevantes e a fundamentação do pedido de intervenção fora da
consulta de psicologia. Relativamente ao encaminhamento interno, nas consultas de
psicologia, existe intervenção direta do Psicólogo com o utente, atuando-se no campo
da psicologia da saúde, ou psicoterapia e os encaminhamentos para outros profissionais
internos ou externos: assistente social, a pedopsiquiatria e a nutrição (de forma indireta,
através do médico de família) e consoante e a circunstância. No momento do processo
de encaminhamento, considera-se a necessidade individual e observa-se a possibilidade
de inclusão em serviços externos nos recursos existentes na comunidade. A nível do
encaminhamento externo, destaca-se a escola, a CPCJ, o núcleo de apoio às crianças e
jovens em risco (DAEANPC, 2013).
Na consulta, é explorado o pedido com o utente. Tratando-se de uma criança,
pré-adolescente e adolescente, solicita-se a colaboração dos pais na primeira consulta
(triagem). As consultas posteriores são dirigidas à recolha da história clínica/anamnese.
Cunha (2000), afirma que a entrevista de devolução no caso das crianças, é
efetuada com os pais ou responsáveis e com a própria, posteriormente, sendo que os
aspetos positivos deverão dar início à entrevista seguindo-se com a exploração das áreas
problemáticas.
21
A utilização das provas psicológicas realiza-se nas consultas seguintes. Após
este procedimento, e postulando-se a necessidade de acompanhamento psicológico,
realiza-se uma consulta de devolução e é dado a conhecer o parecer do Psicólogo. Ao
profissional de saúde que encaminhou o utente, é dado uma devolução da informação
por escrito. De acordo com as diferentes faixas etárias do indivíduo, este processo pode
assumir formas diferentes. Conclui-se este processo com o adequado encaminhamento,
informação ao paciente sobre o plano para a intervenção e envio de informação escrita
de retorno para o profissional que deu origem ao pedido (DAEANPC, 2013).
Caso o utente falte duas vezes consecutivas sem prévio aviso, procede-se ao
cancelamento do processo clínico, enviando-se essa informação por escrito ao
profissional de saúde envolvido na referenciação. O tempo de espera para a primeira
consulta de triagem varia entre os 30 e os 45 dias, salvo exceções a situações urgentes
em que são marcadas consultas no decorrer de uma semana. O procedimento finaliza
com o encaminhamento interno ou externo e a avaliação adequada em articulação com o
médico de família e com o envio de informação clinica contendo a descrição dos
aspetos relevantes e a fundamentação do pedido de intervenção no caso do
encaminhamento fora da consulta de psicologia (DAEANPC, 2013).
Segundo Carvalho e Teixeira (2007), nos Cuidados de Saúde Primários, os
profissionais de psicologia devem prestar serviços a cidadãos e famílias, com o objetivo
de promover a saúde e o bem-estar, prevenir doenças e trabalhar a função assistencial
direta. Os Psicólogos têm que ser profissionais com competências no âmbito
comunicacional, educacional, social e organizacional, ligadas à saúde, e capazes de
promover uma compreensão das componentes psicológicas nas áreas da promoção da
saúde e prevenção, consulta psicológica, reabilitação, formação e investigação, através
de um paradigma holístico.
Pacheco (2005) salienta que a saúde e a doença constituem um estado contínuo
em que estão presentes fatores internos e externos, sendo que a capacidade de adaptação
do sujeito é de suma importância. Como forma de promover a saúde, o conceito de bem
estar deve estar presente, como orientação a um potencial de funcionamento mais
elevado, variando com as condições ambientais. Assim, o desenvolvimento das
profissões de ajuda, não deve ser visto apenas pela forma como o profissional exerce,
mas também na sua evolução enquanto pessoa. É dessa forma que se chega à relação de
ajuda de características rogerianas, segundo o autor, do livro Tornar-se pessoa -Carl
Rogers.
22
1.6 Funções do Psicólogo.
Segundo o Decreto-lei 241 (1º artigo, número dois), “o Psicólogo Clínico é o
profissional habilitado com grau de especialista que desenvolve funções científicas e
técnicas de avaliação, psicodiagnóstico e tratamento no campo da saúde.” (Decreto-lei
241/94 de 22 setembro).
As funções atribuídas a este profissional revestem-se de um relevante grau de
complexidade, responsabilidade no âmbito prevenção e promoção da saúde ao longo da
vida:
a) assistencial que consiste no acompanhamento psicológico individual ou familiar nas
situações cuja problemática se insere no contexto da psicologia clínica;
b) consultoria – informar sobre os critérios de intervenção para o acompanhamento
psicológico bem como formar sobre as questões psicológicas ligadas à saúde e à doença
no âmbito da psicologia da saúde;
c) articulação interna é feita com outros técnicos de saúde, principalmente com médicos de
medicina geral e familiar; externamente, esta função engloba outras instituições como a
Comissão de Proteção a Crianças e Jovens, escolas e no que às problemáticas
referenciadas à consulta de psicologia diz respeito, tem como objetivo, encaminhar,
orientar ou acompanhar, assim como promover a saúde e prevenir a doença no contexto
da psicologia da saúde;
d) envolvimento em projetos comunitários - para promover a saúde, prevenir e adaptar
situações de doença e acontecimentos de vida, nomeadamente, a saúde materna, a saúde
escolar, crianças em risco e cuidados na comunidade; articulação com outros recursos
da saúde – distingue redes de articulação para encaminhar ou acompanhar casos clínicos
no campo de ação da saúde mental;
e) orientação de estágios e projetos de investigação;
f) intervenção junto das populações com diversas faixas etárias e inúmeras problemáticas
e faz parte integrante em projetos com as equipas multidisciplinares, composta por
enfermeiros, higienista oral, médico e assistente social, intervindo junto de professores
com informação relevante e contribuindo para a promoção de hábitos saudáveis aos
estudantes dos diversos níveis de ensino, ou noutros projetos sempre que solicitado.
Junto das unidades funcionais do Agrupamento de Centros de Saúde, o trabalho é
realizado com utentes que apresentam problemas psicológicos, designadamente a
depressão e a ansiedade. A intervenção consiste na psicoeducação das patologias e no
seu controlo e prevenção em intervenções individuais (DAEANPC, 2013).
23
1.6.1 Contribuição.
A presença do Psicólogo nos serviços de Cuidados de Saúde Primários traz
contributo em diversas áreas:
possibilitar informação aos utentes sobre o seu controlo de saúde e integrar
ações de informação e educação para a saúde (escolas);
promover a saúde, em particular na implementação de práticas de saúde para
cooperação do bem-estar da saúde individual e coletiva; promover mudanças de
estilos de vida saudáveis;
procurar forma para que haja lugar a mudanças organizacionais e de
desenvolvimento comunitário; proteger a saúde, procurando medidas de
segurança no trabalho, precavendo os acidentes;
evitar ameaças ecológicas para a saúde em especial a saúde infantil, saúde
materna, saúde escolar, saúde ocupacional, saúde oral, saúde geriátrica, nas
doenças cardiovasculares, tumores malignos, programas de autocuidado e
comportamentos saudáveis, na prevenção das doenças sexualmente
transmissíveis e nas doenças crónicas (Trindade & Teixeira, 1997).
Teixeira e Trindade (1994) sistematizam as contribuições do Psicólogo na
prestação dos Cuidados de Saúde Primários em três áreas fundamentais:
1) promoção da saúde, em particular na implementação de práticas de saúde e de
políticas de saúde que contribuam para o bem-estar individual e coletivo e
capacitem os sujeitos para aumentarem cada vez mais o seu controlo sobre a
saúde, designadamente mobilizando agentes sociais e autarquias e integrando
ações de informação e educação para a saúde (escolas, locais de trabalho), de
mudança organizacional e de desenvolvimento comunitário, visando a:
promoção de estilos de vida saudáveis;
2) proteção da saúde, designadamente na implementação de segurança no trabalho,
na prevenção de acidentes (profissionais, de viação e de lazer) e na luta contra as
ameaças ecológicas para a saúde.
3) Poderá também participar em programas de saúde ambiental, nos serviços
preventivos, nomeadamente de saúde materna, saúde infantil, saúde escolar,
saúde oral, saúde ocupacional, saúde dos idosos, prevenção das doenças
sexualmente transmissíveis, das doenças cardiovasculares, dos tumores
malignos, bem como nas contribuições que, no âmbito da cooperação com os
24
médicos de família possam ser úteis na mudança de estilos de vida e na
facilitação da adesão a programas de auto cuidados (em especial nas doenças
crónicas) e a comportamentos saudáveis e tratamentos.
Algumas estratégias são úteis para facilitar a colaboração dos Psicólogos com os
médicos de família como sejam: realização da consulta centrada em problemas, preparar
informações clínicas escritas e sucintas e dar resposta aos pedidos de informação dos
médicos; os Psicólogos serão tanto melhor sucedidos quanto melhor forem capazes de
adaptar os seus conhecimentos e competências ao contexto da saúde onde estão a
trabalhar. Em certos casos isto significa desenvolver conhecimento profundo sobre uma
doença ou uma população, enquanto noutros casos é necessário um conhecimento
genérico sobre uma ampla variedade de problemas médicos que podem ocorrer em
diferentes fases de vida (APA, 1998).
No contexto dos Cuidados de Saúde Primários, o Psicólogo presta os seus
serviços na consulta de psicologia. No entanto, deve também responder a vários tipos de
problemas institucionais e humanos. Assim, as competências do Psicólogo ultrapassam
a intervenção terapêutica individual e a avaliação clínica. Em Portugal devido às
especificidades dos cuidados de saúde primários urge a necessidade de definir o papel
do Psicólogo no seio das equipas de Cuidados de Saúde Primários, no próprio sistema
da saúde (Teixeira & Trindade, 1994).
1.6.2 O profissional de psicologia na instituição.
Trindade e Teixeira (2007) sublinham que nos Cuidados de Saúde Primários a
psicologia é a prestação de serviços psicológicos aos indivíduos, famílias e
comunidades, incluindo a promoção da saúde, a prevenção das doenças e a função
assistencial. Destacam ainda que neste âmbito, os Psicólogos são chamados a oferecer
serviços de consulta psicológica individual, mas também dar respostas ao nível de
projetos de saúde bem como aos problemas humanos e institucionais.
Deste modo, as principais áreas de intervenção da Psicologia Clínica nos
Centros de Saúde, dizem respeito à intervenção clínica, consultoria técnica, ou formação
e intervenção comunitária. Os modelos teóricos e de intervenção na área dos Cuidados
de Saúde Primários, são trabalhados nomeadamente ao nível da psicoterapia de apoio.
No entanto, atualmente prestam serviço neste local de estágio três Psicólogos Clínicos
na unidade de estágio, que neste contexto seguem os modelos teóricos e de intervenção
cognitivo-comportamental, e psicanalítico (DAEANPC, 2013).
25
Neste serviço, a intervenção clínica engloba: as consultas de psicologia em si, a
promoção da saúde a nível de grupos de risco e a ação de projetos internos específicos.
A intervenção psicológica é feita a crianças, adolescentes, adultos e idosos,
pretendendo-se uma articulação estruturada ao nível interno e externo. A participação e
colaboração no Núcleo de Apoio a Crianças e Jovens em Risco e também em projetos
na Unidade de Cuidados na Comunidade constituem objetivos a atingir, pese embora o
número reduzido de profissionais, que dificulta esta atuação (DAEANPC, 2013).
A intervenção a nível da consultadoria técnica ou formação é coordenada com a
intervenção clínica ou comunitária. A intervenção comunitária propõe uma intervenção
a nível da saúde escolar e de projetos específicos de intervenção comunitária. Este tipo
de intervenção dispõe de ações e educação para a saúde na vertente psicológica, de
acordo com os pedidos da saúde escolar dando assim resposta às solicitações locais e
articular a equipa da saúde escolar com os agrupamentos das escolas. Os profissionais
de psicologia desempenham funções de consultadoria, ações de educação para a saúde,
ações de formação e orientação e supervisão de estágios de psicologia clínica.
(DAEANPC, 2013).
Em síntese, no contexto do Centro de Saúde, o Psicólogo Clínico desempenha
regularmente uma função assistencial, no sentido em que fornece acompanhamento
psicológico a indivíduos e famílias com problemas a nível psicológico, participa em
projetos de âmbito comunitário internos e/ou externos, no qual intervém com indivíduos
ou grupos no sentido da promoção da saúde, prevenção da doença, e adaptação às suas
condições de vida (DAEANPC, 2013).
Envolve-se também com outros técnicos de saúde designadamente médicos de
medicina geral e familiar, e com os agentes sociais, nomeadamente, escolas, Comissão
de Proteção de Crianças e Jovens, ou outros parceiros da comunidade de forma a
fornecer serviços informativos e formativos acerca da saúde e doença, no sentido do
acompanhamento de indivíduos e famílias no âmbito da psicologia. Articula-se ainda
com outros recursos da saúde, nomeadamente cuidados referenciados no âmbito da
saúde mental, para definição de redes de articulação, no que diz respeito ao
acompanhamento e encaminhamento de casos clínicos. Para além disso, participa
ativamente em projetos de investigação, e orientação de estágios. As atividades do
Psicólogo Clínico passam também pela participação em reuniões com serviços
hospitalares, nomeadamente no que diz respeito ao encaminhamento e
26
acompanhamento, e pela organização e monitorização de ações de formação para
técnicos de saúde. (DAEANPC, 2013).
2.1 Objetivos
O estágio teve como objetivo principal, proporcionar a prática dos
conhecimentos anteriormente apreendidos, no âmbito da psicologia.
Desta forma, pretendeu-se, além da aquisição de conhecimentos e prática da nesta
área e em contexto real de trabalho, a apropriação dos conceitos e a sua aplicabilidade
no âmbito da clínica nos Cuidados de Saúde Primários.
2.1.1 Objetivos gerais.
Os objetivos gerais desta formação contínua visam:
conhecer a população alvo das consultas de psicologia;
aprofundar conhecimentos acerca das problemáticas mais comuns da população no
contexto dos Cuidados de Saúde Primários.
2.1.2 Objetivos específicos.
São objetivos específicos do estágio:
aprofundar conhecimentos acerca do entendimento da avaliação psicológica;
aprender a aplicar em contexto real os testes cognitivos e projetivos;
desenvolver competências relacionais;
definir o modelo teórico que melhor se adequa;
articular com elementos de outras especialidades;
realizar acompanhamento psicológico;
realizar avaliação psicológica; elaborar relatórios de avaliação psicológica;
ajudar a ultrapassar as dificuldades que surjam no decorrer das atividades do estágio e
inerentes à componente psicológica.
27
No decorrer do estágio, as atividades incluíram a observação de consultas,
participação em ações de formação, reuniões multidisciplinares, intervenção e avaliação
psicológica e individual.
As reuniões de supervisão constituíram a síntese de todo o trabalho desenvolvido
individualmente pelas estagiárias e que era colocado para discussão e orientação para as
sessões seguintes das situações de acompanhamento, avaliação psicológica, ou de
encaminhamento.
Salienta-se que muitos dos casos que passaram pelo processo de triagem, não
tiveram seguimento, por ausência à consulta marcada após o pedido pelo próprio.
Ainda assim, foram muitos os casos de indivíduos que compareceram às
consultas assiduamente.
Apresenta-se o cronograma ilustrativo das atividades realizadas ao longo do
estágio, efetuado duas vezes por semana entre as 8:00 h e as 16:00 h.
28
2.2 Cronograma do estágio curricular.
Quadro 1.
Cronograma das atividades desenvolvidas ao longo do estágio.
Meses 2016/2017
Etapas Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun
Revisão de
literatura
Observação em
consulta de
triagem
Distribuição de
casos para
Apoio
psicológico
Avaliações
psicológicas
Elaboração de
relatórios
Reuniões
multidisciplinares
Formação interna
Acompanhamento
de casos
Reuniões
multidisciplinares
Formação externa
Reuniões de
supervisão
30
PARTE II - ENQUADRAMENTO TEÓRICO
31
Nesta parte do relatório pretende-se introduzir a revisão literária relacionada
com a origem da psicologia clínica, o objetivo e desenvolvimento da psicologia da
saúde, os Cuidados de Saúde Primários, culminando com o enquadramento teórico
referente as problemáticas dos dois casos analisados de forma detalhada durante o
estágio.
3. A Psicologia Clínica
As origens da psicologia derivam da filosofia uma vez que anteriormente os
filósofos citaram e contestaram conteúdos relevantes que atualmente interessam à
psicologia (Papalia & Feldman, 2013).
No passado, vários foram os estudiosos (John Locke, Platão e Descartes) que
aclamaram que as crianças nascem com a mente em branco e que a sua personalidade se
regula consoante as suas vivências. Isto é o que em psicologia se designa como a “tábua
rasa” (Papalia & Feldman, 2013).
Descartes, prioriza o tema das relações da alma com o corpo, não separando a
psicologia da filosofia. Posteriormente, o termo psicologia é difundido por Wolf,
verificando-se então a distinção entre psicologia empírica e psicologia racional, com
Wundt e Fechener em pleno séc. XIX (Marques 1994 cit. por. Pinto, 2002).
A psicologia como disciplina cientifica surge no séc. XIX com Wundt na
Alemanha e concomitantemente a James em Massachusetts, inaugura-se o primeiro
laboratório de psicologia destinado às manifestações psicológicas, cujo objetivo visava
o estudo da formação da mente humana em blocos, ou o estudo da psicologia como
sendo uma experiencia consciente, tendo como foco a perceção, as emoções, o
pensamento, a consciência como elementos principais, bem como outras formas e
dinâmicas mentais. Desta forma, concedeu-se à psicologia a condição plena de ciência
(Papalia &Feldman, 2013).
Wundt (1832- 1920), funda o primeiro laboratório de pesquisa em 1879. A
psicologia deixa de ter como pretensão o estudo da alma. Tem como propósito a
experiencia imediata do individuo, ou seja, a consciência. Contudo, o experimentalismo
de Wundt circunscreveu-se à análise dos componentes da consciência e do modo como
estes se relacionam (Marques 1994 cit. por. Pinto, 2002).
Segundo os autores Hilgard e Atkinson (1976) a psicologia define-se como
sendo uma ciência que estuda o comportamento do homem e de outros animais. Por
32
comportamento, compreende todas as ações observáveis de uma pessoa, utilizando um
instrumento da observação direta ou aplicando outro tipo de meios.
Pode-se então alegar que a psicologia é uma área cuja pesquisa abrange um
diversificado conjunto de matérias, sendo a definição como ciência do espirito para uns,
e como ciências do comportamento para outros. Uma outra compreensão, esclarece que
a psicologia é o estudo das perceçoes, emoções, pensamentos sensações e ações do
homem. Ainda assim, importa salientar que o seu foco recai no como e no porquê
daquilo que o corpo concebe em detrimento do que resulta do comportamento
(Gleitman; Fridlund & Reisberg, 2009).
Duas perspetivas fundamentais para o estudo da psicologia, surgiram no século
XX, sendo que uma recai na eclosão de grandes escolas de psicologia científica –
funcionalismo, gestalt, behaviorismo, reflexologia e psicanálise, manifestando-se como
oposição a Wundt. E de outro lado, a perspetiva que compreendia aspetos de
diferenciação em áreas especializadas dentro do que é geral na psicologia – diferencial,
geral, normal fisiológica, patológico, animal, social, cognitiva, desenvolvimento,
aprendizagem, personalidade, motivação, psicometria. Desta forma, surgiu a
necessidade de incluir estes argumentos nos campos de aplicação destes pontos de vista
como a saúde, a educação, justiça, organizações ou orientações (Marques, 1994 cit.
Pinto, 2002).
A psicologia não reconhece o homem com uma construção espontânea e
definitiva. Interessa-se, pois, pelo ser concreto que se posiciona num determinado meio
com o qual intervém e define e em simultâneo, este meio também é por ele estabelecido
e influenciado (Abrunhosa e Leitão, 1985).
Mueller (2001) afirma que independentemente do método aplicado, a psicologia
é sobretudo um projeto de intenção de uma melhor compreensão sobre o homem e a sua
conduta.
A psicologia pode ser definida como a ciência que estuda o comportamento do
homem e de outros animais, sendo que comportamento se entende por todas as
atividades observáveis de um organismo sob forma de observação direta, ou recorrendo
a recursos técnicos, como instrumentos. No fundo, pode dizer-se que é um campo de
pesquisa abarcando um variado leque de definições, sendo que alguns a definem como a
ciência do espírito, outros como a ciência do comportamento (Hilgard & Atkinson,
1976).
33
Assim, considerando o objeto de estudo, Diniz (2008), afirma que a psicologia
se preocupa com o funcionamento psíquico, origem e desenvolvimento, bem como a
sua relação com os processos psíquicos e a realidade objetiva e o próprio
comportamento individual. Desta forma, o objetivo da Psicologia, prende-se com
questões de personalidade, dimensões psíquicas, físicas e sociais partindo da
criatividade até à ética. Importa, pois, compreender o significado da expressão clínica e
subsequentemente verificar o trajeto histórico.
Como conceito, a palavra “clínica” do latim “clinicus”, significa visitar o doente
na cama. De acordo com Doron e Parot (1998), “originariamente, a atividade clínica (do
grego klinê – leito) é a do médico que, à cabeceira do doente, examina as manifestações
da doença para fazer um diagnóstico, um prognóstico e prescrever um tratamento”.
Não é apenas a visita ao doente que está acamado, mas também a atitude de
atendimento prático e personalizado. O objetivo do método clínico é a recolha de dados
referentes a todas as doenças que possam exercer influência no ser humano ou que
restringem a sua vida em aspetos como a satisfação, poder e duração (Mucchielli, 1969).
Marques (1994 cit. por Pinto, 2002), afirma que com Wundt “a psicologia
deixou de ter como pretensão o estudo da alma para ter como objeto a experiência
imediata do sujeito, ou seja, a consciência. Em compensação este autor sublinha que o
experimentalismo de Wundt se encontra limitado à análise dos elementos da
consciência e de como os mesmos se associam.
Foi Lightner Witmer no final do séc. XIX que utilizou pela primeira vez o termo
psicologia clínica, com a fundação da primeira clínica de psicologia, onde eram tratadas
crianças cujas situações recaiam sobre queixas escolares (Ribeiro & Leal, 1996).
A Psicologia Clínica é a subdisciplina da psicologia que se preocupa com o
estudo dos transtornos mentais e as suas manifestações psíquicas. Assim, inclui a
psicoterapia, aconselhamento, encaminhamento, prevenção e promoção. Distingue-se
das outras áreas da psicologia pela forma de pensar e atuar. A personalidade, as normas
de ação e os seus desvios, o comportamento, as relações interpessoais, os processos
grupais, evolutivos e de aprendizagem são objeto de estudo também das ciências
humanas no geral (Macedo, 1984).
Assim, a Psicologia Clínica surgiu, como alternativa ao modelo médico,
propondo-se procurar e explorar explicações para os comportamentos de certos
pacientes que eram até então desconhecidas (Ribeiro & Leal, 1996; Brito, 2008;
Miranda, 2013).
34
Teixeira (2007), inicialmente caracterizou a psicologia clínica como um sistema
de atenção direcionada ao indivíduo, onde o atendimento ainda se mantinha ligado ao
modelo médico. Esta conceção clássica tem como preocupação o ajuste psicológico do
indivíduo, e como princípios a terapia de grupo ou individual, o psicodiagnóstico, tendo
como principal foco o aspeto intra individual, salientando os processos psicológicos,
numa relação dual onde a pessoa é particularmente percebida.
Leal, Pimenta e Marques (2012), explicam que a expressão psicologia clínica
usada pelos profissionais da psicologia, tem o mesmo significado que é dado em
medicina, designado um atendimento individualizado, personalizado e prático.
A psicologia até a década de setenta tinha como objetivo, a utilização da análise,
observação e medição dos comportamentos para promover a adaptação do individuo
(Leal, 2008).
Segundo Diniz (2008) o desenvolvimento das questões da personalidade, bem
como as dimensões psíquicas, sociais e físicas, passando pela ética e criatividade,
constituem o objetivo da psicologia. Por outro lado, a realidade objetiva do
comportamento dos indivíduos e a sua relação com os processos psíquicos,
funcionamento, origem e desenvolvimento, compõem aquilo que é o objeto da
psicologia.
A linha teórica utilizada influencia a escolha das técnicas e objetos de
intervenção terapêutica. Assim, o objeto de estudo da psicologia clínica, define-se pelo
modelo teórico de conhecimento e formação que o terapeuta tem como suporte (Leal,
2008).
A psicologia clínica considera o indivíduo na sua singularidade e em função do
seu contexto de vida e da sua história analisa os comportamentos e as atitudes de forma
aprofundada (Monteiro, & Ribeiro, 1999).
4. Psicologia da Saúde
A Psicologia da Saúde tem como objetivo compreender como os fatores
biológicos, comportamentais e sociais influenciam os indivíduos na saúde e na doença
(APA, 2003).
A psicologia interessa-se pela forma como o sujeito experiencia e vivencia o seu
estado de saúde ou de doença, a relação com os outros, com o mundo e consigo. Tem
como objetivo ajudar as pessoas a incluírem-se no seu projeto de vida, a promover a
saúde e prevenir a doença através de atitudes e comportamentos ativos, bem como
35
aperfeiçoar técnicas para utilizar no ajustamento do processo do adoecer, da doença e
nas suas consequências (Barros, 1999).
A Psicologia da Saúde procura compreender o papel das variáveis psicológicas
sobre a manutenção da saúde, o desenvolvimento de doenças e os comportamentos
associados. Além de desenvolver pesquisas sobre cada um desses aspetos, os Psicólogos
da saúde realizam intervenções com o objetivo de prevenir doenças e ajudar a refletir
sobre a forma de conviver com as diversas situações (Miyazaki, Domingos & Caballo,
2001).
O desenvolvimento da psicologia da saúde decorreu a partir da década de 70,
sendo assim uma área recente. A atuação e compreensão das pesquisas e aplicações, tem
como objetivo compreender e atuar sobre a inter-relação entre comportamento e a saúde
e comportamento e doenças (Barros, 2002).
De acordo com De Marco (2003), a utilização do termo Psicologia da Saúde,
tem sido usado para designar o agregado de tarefas executadas por profissionais do
âmbito da psicologia na esfera da saúde, tanto no contexto do ensino como na pesquisa
e assistência.
Trindade e Teixeira (1998) afirmam que o papel da psicologia, enquanto ciência
e profissão, na área da saúde e da doença, inclui a saúde física e mental, abarcando toda
a área da medicina. Todavia, a psicologia estende-se, ao inserir os fatores sociais,
culturais e ambientais respeitantes à saúde e à doença, na medida em os sentidos e os
discursos sobre a saúde e as doenças divergem consoante a situação socioeconómica, o
género e a pluralidade da cultura. Deste modo, dando enfase à manutenção e promoção
da saúde e à prevenção da doença, o objetivo primordial da psicologia da saúde é dar o
contributo para a melhoria dos sujeitos e das comunidades assim como o bem-estar
através das intervenções psicológicas e sua compreensão.
Marks (1996) e Rodriguez-Marín (1995) afirmam que a Psicologia da Saúde é a
aplicação das teorias, métodos de investigação psicológicos à saúde, à doença e aos
cuidados de saúde, preocupando-se com os aspetos psicológicos da promoção e da
manutenção da saúde, do confronto com a doença e dos próprios cuidados de saúde nos
contextos individual, familiar, laboral, organizacional, cultural e comunitário.
Assim, o grande desafio é o de colocar a Psicologia da Saúde no contexto
cultural, sociopolítico e comunitário e segundo (Schmidt, 1994), compreender o seu
impacto em diferentes fases do ciclo de vida. Estes aspetos consideram-se primordiais
nos Cuidados de Saúde Primários quando se considera a intervenção psicológica.
36
Matarazzo (1980), explanou que a Psicologia da Saúde forma um aglomerado de
contribuições científicas, profissionais e educacionais, com características específicas da
psicologia, cuja utilização se reflete na promoção e manutenção da saúde, prevenção e
tratamento das doenças, distinção da origem e diagnóstico de questões associados à
saúde, doença e disfunções, para a observação dos procedimentos de atenção à saúde e
criação das suas políticas.
A saúde é um constructo que conjuga vários fatores. Engloba vários elementos
ou dimensões que embora distintas se relacionam entre si, tais como os fatores sociais,
físicos, espirituais, culturais, psicológicos e biológicos, pelo que a sua manutenção e
promoção implica vários processos psicossociais na interação entre o sujeito, o sistema
de saúde e a sociedade (OMS, 2001).
Em Portugal, o desenvolvimento da Psicologia da Saúde associa-se a fatores
como a pressão interna da psicologia como ciência e por outro lado, o progresso e a
evolução da medicina que tem como consequência a falta de resposta às necessidades
sociais daí resultantes. A industrialização e a urbanização foram responsáveis pela
introdução de profundas alterações nos sistemas de tradição que suportam a família e a
parte social. De forma simultânea, impulsionaram o surgimento de fatores de stress que
se refletiram com maior relevância nas crianças, adolescentes, idosos, bem como nos
indivíduos cujas condições sociais são mais desvantajosas. Assim, a Psicologia da
Saúde tem granjeado maior relevo quer ao nível da investigação quer também ao nível
da intervenção sobre os aspetos psicológicos associados à prevenção, manutenção e
promoção da saúde, bem como no tratamento e reabilitação do doente, tendo como
preocupação cimeira, o contributo para uma melhoria da qualidade dos cuidados e
favorecer a humanização dos serviços (Teixeira, 2002).
Papadopoulos e Bor (1998) referem que no caso específico dos cuidados de
saúde primários há evidências de que disponibilizar aconselhamento psicológico pode
aumentar a satisfação dos utentes bem como a qualidade dos cuidados de saúde.
37
Em Portugal, a morbilidade e a mortalidade estão significativamente associadas
ao comportamento individual. É de tal forma relevante que o comportamento do sujeito
pode influenciar tanto o aparecimento da alteração do estado de saúde como a própria
evolução desta, podendo verificar-se o aparecimento de problemáticas como a
obesidade, diabetes mellitus, doença coronária e enfarte do miocárdio, doenças
sexualmente transmissíveis, e também nas dependências com o álcool, doenças
cancerosas, acidentes trabalho e de viação (Ministério da Saúde, 1997).
Tal como noutros países, têm-se vindo a verificar esforços na reestruturação dos
serviços de saúde mental, com uma substituição gradual dos cuidados baseados no
hospital psiquiátrico, para cuidados mais diversificados e próximos das populações,
como é o caso do apoio fornecido ao nível dos cuidados de saúde primários (Ministério
da Saúde, 2007).
Segundo os autores Trindade e Teixeira (2007), o Psicólogo não é um mero
técnico de saúde mental. Além da psicopatologia e da doença mental, este profissional,
preocupa-se também com a saúde global do indivíduo ao longo do seu ciclo de vida,
incluindo a família e a comunidade. Está atento e sensível à promoção do bem-estar
psicológico, ajuda na adesão à toma de medicamentos, na utilização de serviços e
recursos de saúde, nos comportamentos, e nos processos de adaptação à doença.
Afirmam também que a presença de Psicólogos nas equipas multidisciplinares nos
Cuidados de Saúde Primários, garante um entendimento melhor dos aspetos
psicológicos associados à humanização dos serviços, à intervenção comunitária, à
saúde, à prestação de cuidados e à gestão de recursos.
Para uma melhor compreensão dos casos clínicos apresentados, fazemos uma
contextualização teórica das problemáticas associadas, nomeadamente no que concerne
à violência doméstica e à depressão.
38
6.1 A Violência doméstica.
Nos últimos anos, a sociedade tem-se deparado com um problema que afeta de
um modo geral todos os indivíduos e cuja resolução depende da mudança de
mentalidades: a violência doméstica. Os seus efeitos fazem-se sentir ao longo dos
tempos, atravessando fronteiras de países e tornando-se uma preocupação na vida
política mundial (Blay, 2003).
A violência doméstica perdura no tempo e atravessa os regimes políticos e
económicos. Em todo o mundo, as proporções assumidas pelo fenómeno da violência
doméstica são muito elevadas. A partir da década de 60/70, os movimentos feministas
iniciam as primeiras denúncias. Evitar ou apostar no combate à violência doméstica,
representa custos económicos per capita e por ano elevados, segundo estudos efetuados
em países pertencentes ao Conselho da Europa. Em Portugal, as discussões sobre este
tema surgem em finais de 1980 e princípio da década de 1990 pela sociedade civil, com
especial destaque para as organizações e movimentos feministas (Lisboa et al, 2006).
Costa (2003), afirma que por ser composto por fatores sociais, culturais,
psicológicos, ideológicos, económicos, etc. a violência doméstica, é um fenómeno
muito complexo. Vários agentes do setor público e político, bem como instituições
governamentais e estatais têm mantido a discussão e reflexão deste aflitivo problema
social.
A violência doméstica é um grave problema de saúde pública e de violação dos
direitos humanos que frequentemente acontece nos lares. Constitui uma dura realidade,
mas a casa, é o local privilegiado para este tipo de violência, considerando-se na
sociedade atual, um dos lugares mais perigosos (Fernandes, 2002).
Segundo os autores Machado, Gonçalves e Abrunhosa (2003), é considerada
violência doméstica, qualquer ato, conduta ou omissão que sirva para infligir,
reiteradamente e com intensidade, sofrimentos físicos, sexuais, mentais ou económicos,
de modo direto ou indireto (por meio de ameaças, enganos, coação ou qualquer outro
meio) a qualquer pessoa que habite no mesmo agregado doméstico privado (pessoas –
crianças, jovens, mulheres adultas, homens adultos ou idosos – a viver em alojamento
comum) ou que, não habitando no mesmo agregado doméstico privado que o agente da
violência, seja cônjuge ou companheiro marital ou ex-cônjuge ou ex-companheiro
marital. Assim, este tipo de violência, priva a vítima da sua liberdade e direitos. A curto
ou longo prazo, afeta a saúde, a qualidade de vida, a dignidade e a integridade física, e
ou sexual.
39
Para Cavalcanti (2007), a violência doméstica é a violência, explícita ou
encoberta, praticada dentro de casa ou no ambiente familiar, entre indivíduos unidos por
parentesco civil - marido e mulher, sogra, padrasto, filhos, ou parentesco natural - pai,
mãe, filhos, irmãos, etc.). Estão incluídas as mais diversas práticas, como maus-tratos
contra idosos, o abuso sexual, a violência contra as crianças, violência contra a mulher e
contra o homem geralmente nos processos de separação litigiosa, além da violência
sexual contra o parceiro.
Segundo a Direção Geral da Saúde (2003), o termo violência doméstica é
utilizado para fazer a descrição das ações e omissões que acontecem nas diversas
relações. Em sentido restrito, pode referir-se aos incidentes de ataque físico, enquanto
que globalmente abrange todas as violações de caracter físico e sexual, tais como
beliscões, pontapés, estrangulamento, cuspidelas, empurrões, espancamento, murros,
queimaduras, estrangulamento, agressão com objetos, esfaqueamentos, uso de ácido,
fogo e água a ferver. Os resultados da violência física podem ir de pequenos ferimentos
até à própria morte. O que aparentemente começa por ser um ataque de pouca gravidade
pode aumentar de frequência e de intensidade.
Segundo Magalhães (2010), a violência é considerada uma questão social muito
grave. Os seus prejuízos são diversificados, podendo atingir áreas psicológicas e físicas,
cujas implicações se revelam importantes ao nível socioeconómico para a sociedade,
famílias e obviamente para a vítima.
Segundo dados da APAV (2010), a violência doméstica, não só afeta as várias
classes sociais e faixas etárias, como também pode afetar o género masculino ou
feminino e refere ainda que esta temática tem dois sentidos: o sentido estrito, ligado à
definição que existe na Lei do Código Penal Português, no seu artigo 152°, cujo
conteúdo explicita o tipo de comportamentos considerados no quadro desta legalidade, a
saber:
1 – Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus-tratos físicos ou psíquicos,
incluindo castigos corporais, privações de liberdade e ofensas sexuais: a) Ao cônjuge
ou ex-cônjuge; b) A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha
ou tenha mantido uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação; c) o
progenitor de descendente comum em 1.º grau; d) A pessoa particularmente indefesa,
em razão de idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com
ele coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe
não couber por força de outra disposição legal.
40
2 – No caso previsto no número anterior, se o agente praticar o facto contra
menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima é punido
com pena de prisão de dois a cinco anos.
3 – E dos factos previstos no n.º 1 resultar: a) Ofensa à integridade física grave,
o agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos; b) A morte, o agente é
punida com pena de prisão de três a dez anos.
4 – Nos casos previstos nos números anteriores, podem ser aplicadas ao
arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de
uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de
frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica.
5 – A pena acessória de proibição de contacto com a vítima pode incluir o
afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento pode ser
fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância.
6 – Quem for condenado por crime previsto neste artigo pode, atenta a concreta
gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do
exercício do poder paternal, da tutela ou da curatela por um período de um a dez
anos”.
No sentido lato, encontram-se outros crimes que se associam à violência
doméstica, a referir: violência bissexual, roubo, dano, furto, homicídio, violação da
obrigação de alimentos, subtração de menores, violação de domicílio ou perturbação da
vida privada, devassa da vida privada, violação da correspondência ou
telecomunicações (APAV, 2013).
A violência doméstica define-se como “qualquer ação ou omissão de natureza
criminal, entre pessoas que residam n mesmo espaço doméstico, ou não residindo,
sejam ex-cônjuges, ex-companheiro/a, ex-namorado/a, progenitor de descendente
comum, ascendente ou descendente, e que infrinja sofrimentos: físicos, sexuais,
psicológicos, económicos “(APAV, s/d).
Tendo em conta as repercussões e o seu impacto na qualidade de vida e na saúde
das pessoas, bem como a sua grandeza ao longo dos anos a violência tornou-se um tema
fulcral na saúde pública (Pesce, 2009).
6.1.1 Ciclo da violência.
Walker (1979), após ter entrevistado um número significativo de casais em
relação à dinâmica relacional, representou a violência em três ciclos diferentes (Tijeras,
Rodríguez & Armenta, 2005).
41
A primeira fase, de acumulação da tensão, distingue-se pelo fato de o agressor
mudar repentinamente o seu temperamento. Afetado pela frustração reage de forma
negativa, estimulando ou importunando a vítima. Sem razão aparentemente entendível,
a ira do agressor para com a vítima vai aumentando e aparecem então os primeiros
episódios de violência verbal que podem transpor para uma tensão maior. Isto pode
durar dias ou anos, na medida em que o ciclo pode não evoluir e a relação ser definida
por desentendimentos e oscilações não ocorrendo a violência física. A vítima tenta
apaziguar o agressor mostrando-se flexível e solícita considerando poder conter a sua
fúria (Borin, 2007; Rosmaninho, 2005).
A segunda fase, da explosão, sendo mais curta, evidencia-se pelo
descarregamento físico da violência. Predomina a descarga sem controlo das tensões
que se acumularam na primeira fase e termina quando o agressor se apercebe da
proporção dos seus atos, podendo a vítima necessitar de ajuda médica ou se alguém
exterior surgir. O agressor tem como objetivo nesta fase demonstrar poder sobre a
vítima que percebe não ter nenhum tipo de controlo sobre a situação. Surge também
pausa de tempo de choque marcado pela recusa e explicação ou relativização dos atos
(Tavares, 2008).
A terceira fase, que se denomina de lua de mel, configura-se pelo arrependimento e
reorganização da relação conjugal. O agressor apercebe-se dos danos causados à vítima
e tenta reparar a situação. Esta fase sendo desejada por ambas as partes é também neste
ciclo que a vitimização acontece, pois, o agressor pede perdão, e a vítima perdoa por
crer que não irá acontecer novamente embora tema o contrário, encontrando-se numa
grande ambivalência. Como seria de esperar, a tensão tende a diminuir para voltar a
transbordar, repetindo-se assim o ciclo (Falcke, Oliveira, Rosa & Bentancur, 2009).
Este ciclo mostra que tem três particularidades básicas: quanto mais vezes um
ciclo se completar, futuramente, menos tempo demora a chegar ao fim; a veemência e a
gravidade da violência aumentam gradualmente ao longo do tempo; a última fase, no
tempo, tem tendência a ficar mais curta e desaparece (Tijeras, Rodríguez & Armenta,
2005).
6.1.2 Tipos de violência.
Azeiteiro (2007), refere que no decorrer das relações violentas, podem
desenvolver-se simultaneamente várias formas de violência sendo que com o tempo, se
tornam mais frequentes, graves e com efeitos perturbadores.
42
Segundo os dados da APAV s/d, são vários os tipos que a violência doméstica
pode incluir, a saber: a violência sexual, social, financeira, física e emocional. A
violência sexual, acontece quando o agressor obriga a vítima a praticar atos sexuais que
a mesma não deseja, mantendo relações sexuais desprotegidas, utilizando a pressão, a
força para obrigar a ter relações com outras pessoas. A violência social, tem como
componente, os comportamentos de controlo social que são exercidos sobre a vítima.
Podemos referir como exemplos atos como o impedir a vítima de visitar os amigos e a
família, controlo de chamadas e contas telefónicas, impedir o outro de ter acesso a
partes de casa ou trancar em casa.
Na violência financeira, é comum o controlo financeiro sem permissão da
vítima, sendo o ordenado a parte mais visível neste contexto, na medida em que o
agressor pode perseguir a vítima até ao local de trabalho, utilizando manobras de
intimidação ou temor. Na violência física, é a ameaça física ou uso da força com o
intuito de provocar dor a outra pessoa ou injuriá-la. Inclui a agressão física, na forma de
pontapés, queimaduras, esmurrar ou impedir a obtenção de tratamentos ou
medicamentos.
Na violência emocional são comuns as atitudes que provocam a sensação de
inutilidade, intimidação e medo, bem como no seio de amigos e familiares, fomentar
situações que originem a humilhação, ameaças aos filhos e maltratar animais de
estimação. Muitas são as formas que a violência doméstica abrange para atingir
companheiros, cônjuges, filhos e idosos. Assim, a violência pode ser:
a) negligência, um ou mais membros da família omitem a sua responsabilidade
relativamente a outro, deixando de cumprir os desejos e as necessidades de forma
deliberada (McCue, 2008).
b) sexual, pode ser entendido como um subtipo da violência física. Clinicamente, refere-se
a qualquer tipo de ato sexual não desejado (Flury, Nyberg &Riecher-Roossler, 2010).
Pode este tipo de violência ser apresentado em três categorias: contato sexual abusivo; o
uso de violência física para submeter a atos sexuais não desejados; atos sexuais
completos ou tentativas que envolvem alguém sem capacidade de assentir o contato
sexual (Lipsky & Caetano, 2009);
c) física (cortes, estrangulamentos, queimadura ou empurrões), quando alguém através da
utilização de arma ou instrumento ou arma, para causar lesões quer sejam externas,
internas ou ambas e impondo a força física cause ou tente causar danos. Muitos são os
atos de violência ao longo do tempo que a mulher pode vivenciar. Este tipo de violência
43
reflete-se no aspeto físico, sendo assim difícil de encobrir. Considera-se violência física,
toda a ação que implique força contra a mulher, em qualquer circunstância, idade,
utilizando qualquer ato contra a integridade física podendo ou não produzir marcas
corporais (Aliaga, 2003).
d) psicológica (exploração, insultos, chantagem, humilhação), inclui todas ações e
omissões que possa causar dano ao desenvolvimento da pessoa, à identidade e à sua
autoestima. A violência psicológica é dificilmente detetada na medida em que as
cicatrizes não se comprovam nem se podem observar. Manifesta-se através de ameaças
de espancamento à mulher e aos filhos, impedir à mulher de trabalhar, sair e ter amigos
(Alves, 2005; Alarcão, 2008).
Wynter (2001), numa pesquisa efetuada no Chile, mostra que a violência
psicológica pode ter diversas manifestações:
-ameaças – matar, levar consigo as crianças, ferir, suicidar-se;
-abuso económico - impedir a mulher de trabalhar ainda que seja necessário para o
sustento da família, impor castigos monetários ou recompensas e controlo abusivo das
finanças do outro;
-desprezo - inferiorizar o outro, tomar decisões importantes sem a consulta do outro;
intimidação - destruir a propriedade ou jogar objetos, assustar com gestos, gritos ou
olhares;
-isolamento - vigiar os movimentos e atos do outro, impedir o cultivo de amizades,
escutar conversações, controlo abusivo da vida do outro. Geralmente, o abuso
emocional ou psicológico, antecede o abuso físico e acompanha-o, não obstante, na
relação pode constituir o único presente. A pluralidade das vítimas, refere ser este o
abuso mais difícil de ultrapassar, uma vez que afeta de forma profunda o sentido da
realidade do self.
Para os autores Machado, Matos e Moreira (2003), a violência doméstica
manifesta-se de forma diversa para atingir os companheiros ou cônjuges, conforme se
pode observar no quadro que a seguir se apresenta.
44
Quadro 2.
O exercício da violência doméstica (Machado, Matos & Moreira, 2003).
Desvalorizar a violência e não levar em conta as
preocupações doutro; afirmar que a agressão ou a
Minimizar, negar, condenar violência nunca tiveram lugar; transferir para o
outro a responsabilidade pelo comportamento
violento; afirmar que a culpa é do outro.
45
6.1.2.1 Violência conjugal.
Quando circunscrita à conjugalidade, a violência doméstica, acontece
repetidamente e ou de forma intensa, com o objetivo de causar sofrimento emocional,
físico, económico e sexual, sendo que os cônjuges ou ex-cônjuges utilizam meios
diretos ou indiretos. É testado o poder de quem inflige estes atos, utilizando a força ou
outras formas, com o objetivo de magoar e impor a sua vontade, marcando uma posição
na vida da pessoa em causa (Azeiteiro, 2007).
Esta forma de demonstração de poder, perante o outro, é uma consequência das
desigualdades que existem entre os géneros e /ou entre o ofensor e a vítima. A
desigualdade de género, consiste em hierarquizar o acesso às oportunidades entre
homens e mulheres, tornando-se mais relevante nas posições sociais onde as questões
culturais adotam as mais diversas formas de preconceito. Assim, este primado verificou-
se ao longo do tempo e alguns conceitos como a opressão, falta de poder e submissão,
estavam ligados à mulher, enquanto que ao homem era dado o domínio, a
independência e afirmação (Amâncio, 1994).
O autor Azeiteiro (2007), afirmam que “A violência conjugal atravessa todas as
classes, sociais, embora assuma configurações diferentes consoante o estatuto da
família, estando sempre ligado ao desrespeito do outro enquanto indivíduo, dotado de
razão, vontade e sujeito de direitos.”
Embora as mulheres desempenhem outras funções para além da sua função
laboral, a Comissão de Igualdade no Trabalho e no Emprego - CITE, fornece dados que
demostram que a taxa de atividade das mulheres portuguesas é superior à média
europeia. Na vida laboral e no que diz respeito aos cargos de direção, é notório o
desequilíbrio entre homens e mulheres (CITE, 2013).
Durante muito tempo, as mulheres não usufruíam de direitos tão básicos como a
igualdade, a segurança, a proteção e a liberdade, pois a violência praticada no circuito
doméstico não era considerada como sendo violência doméstica. Desta forma, os atos
agressivos praticados sobre as mulheres prolongaram-se no tempo (Neves & Nogueira,
2004).
A violência conjugal ocorre no seio familiar. Pela ambivalência da relação
afetiva e sua especificidade, é notória a dificuldade na intervenção técnica e na própria
abordagem. É um fenómeno especialmente complexo cujas características se compõem
de diversos fatores de âmbito psicológico, social, económico, ideológico ou cultural
(Costa, 2003).
46
6.1.2.2 Violência de género.
As autoras Casique e Furegato (2006) citam a violência doméstica e a violência
no trabalho como sendo as que se destacam através de manifestações de agressões
sociais, físicas e psicológicas. Neste tipo de violência os maus tratos físicos,
económicos, psicológicos e o abuso sexual, assumem uma grande importância. Este
grave problema, gera-se devido à relação desequilibrada de género, sendo esta, a que
definem como violência de género e que é exercida pelos homens contra as mulheres,
em que o género do agressor e o da vítima estão intimamente ligados à explicação desta
violência. Afeta-as pelo simples fato de serem mulheres, ou seja, é a violência efetivada
pelos homens, mantendo o controlo e o domínio sobre estas.
A violência de género foi influenciada pelos movimentos feministas nos países
ocidentais por denúncias aos que de alguma forma degradavam através da violência a
dignidade das mulheres. Surge então a diferenciação da violência contra as mulheres.
Aos grupos feministas, associam-se organizações internacionais e associações de defesa
dos direitos humanos com o objetivo de diminuir e analisar esta questão. Ao entender-se
o conceito de violência de género, deve ter-se em conta os traços concedidos aos
homens e às mulheres no contexto social. A maior parte destes traços, não provindo
necessariamente da natureza, são construções culturais, produzidos pela sociedade
(Alberdi, 2005).
Caracteriza-se a violência de género, como aquela é exercida pelos homens
contra as mulheres, sendo que o agressor e a vítima estão profundamente ligados a este
fundamento. Deste modo, este tipo de violência perpetrado pelos homens, afeta as
mulheres, mantendo-as sob o seu controlo e domínio. Socialmente, alguns
comportamentos e papéis como as respostas violentas são bem vistas em detrimento do
choro que pode ser desvalorizado; o trabalho doméstico que apesar de ser necessário e
imprescindível, passa quase que despercebido aos homens e justificam-se como sendo
tarefa mulheres (Inmujeres, 2003).
Segundo Fonseca (1997), compreender o género, pressupõe interpretar as
relações estabelecidas na sociedade entre os sexos. O sexo biológico, reporta-se às
diferenças anatómicas e fisiológicas entre mulheres e homens enquanto que o sexo
social se refere à forma como essas diferenças se comportam ao longo da história, nas
diferentes sociedades. Assim, temos que o género é constituído por dois níveis: o género
como meio que constitui as relações sociais em que a base são as diferenças notáveis
47
entre os dois sexos e o género como pilar de representação de relações do poder sendo
que as ações que dominam se expõem como inquestionáveis e naturais.
Também existe violência de género contra os homens. Whitaker, (2007), afirma
que alguns estudos comparativos da prevalência da violência entre parceiros (Intimate
Partner Violence) demonstram que a violência entre parceiros heterossexuais é
maioritariamente iniciada por mulheres.
Assim, define-se como violência de género, “todos os atos que resultem, ou
possam resultar, em danos ou sofrimentos físicos, sexuais, psicológicos ou económicos
para as mulheres, incluindo ameaças de tais atos, a coação ou a privação arbitrária da
liberdade, tanto na vida pública como na vida privada” (Azeiteiro 2007).
Constituindo um problema de saúde pública, a violência de género é também
uma forma de violação dos direitos humanos (Lisboa et al., 2006; cit. In Neves, Cunha,
Grangeia & Correia, 2015).
6.1.2.3 Homens vítimas de violência.
A literatura descreve como desconhecido o tema sobre a violência doméstica
contra homens. Sustenta este acontecimento os sentimentos de vergonha e do medo
entre outros, que o homem tem face à esta condição e simultaneamente demostra
relutância ao pedido de ajuda oferecido por mediadores. Preso aos preceitos culturais
patriarcais, teme ser humilhado e desconceituado, mantém o silêncio. A denúncia do
crime não é feita uma vez que o homem também receia sofrer represálias por parte da
agressora, contrariamente ao que se possa pensar. Deste modo, o medo de se expôr e a
vergonha e as próprias fragilidades da pessoa constituem fatores determinantes para a
permanência em silêncio, mantendo-se assim em relacionamentos violentos (Zuleta,
2006).
A violência doméstica é também cometida por mulheres com frequência e fora
do contexto da autodefesa, pese embora o fato de as taxas de agressão serem maiores
quando praticadas pelos homens. Contudo, a violência masculina é vista sempre como
improcedente, sendo a violência feminina justificável seja ela cometida alegando a
autodefesa ou infundada. Recentemente, estudos indicam que nos relacionamentos
íntimos, os homens vivenciam comportamentos de controlo, coação, impedimento do
acesso aos filhos e ameaças de suicídio ou morte por parte da agressora e na presença de
autoridades, este é falsamente acusado de crime, obrigando-o a abandonar a relação.
Homens referem ainda ter suportado experiências de desalento ao constatarem como
48
serviços e instituições de apoio às vítimas de violência domestica se organizam ao
acolherem esta situação (Hines & Dunning, 2007).
6.1.2.4 Violência contra mulheres.
A Organização Mundial de Saúde, através da declaração sobre a eliminação da
violência contra as mulheres, define a violência contra as mulheres, como “qualquer ato
de violência baseado no género do qual resulte, ou possa resultar, dano ou sofrimento
físico, sexual ou psicológico para as mulheres, incluindo as ameaças de tais atos, a
coação ou a privação arbitrária de liberdade, que ocorra, quer na vida pública, quer na
vida privada” (OMS, 1993; Gonçalves et al., 2005).
Todo o ato que resulte em lesão física, sexual, psicológica ou morte de mulheres,
quer na esfera pública ou privada, denomina-se violência contra mulheres. Esta
violência pode assumir formas perversas e ou subtis como o assédio sexual,
discriminação, desvalorização do trabalho doméstico, com os filhos, entre outras
(Gonçalves et al., 2005).
Em referência concreta aos atos, verificamos que a violência contra as mulheres
não se limitando aos mesmos, abrange-os:
a) violência física, sexual e psicológica ocorrida no seio da família, incluindo os maus
tratos, o abuso sexual das crianças do sexo feminino no lar, a violência relacionada
com o dote, a violação conjugal, a mutilação genital feminina e outras práticas
tradicionais nocivas para as mulheres, os atos de violência praticados por outros
membros da família e a violência relacionada com a exploração;
b) violência física, sexual e psicológica praticada na comunidade em geral, incluindo a
violação, o abuso sexual, o assédio e a intimidação sexuais no local de trabalho, nas
instituições educativas e em outros locais, o tráfico de mulheres e a prostituição
forçada;
c) violência física, sexual e psicológica praticada ou tolerada pelo Estado, onde quer
que ocorra (OMS, 1993).
Citando o Conselho da Europa (2011), verifica-se que ao longo da história a
violência contra as mulheres se manifesta de forma desigual nas relações homens e
mulheres, de tal modo que se traduz na descriminação. A situação de dependência e
submissão, impossibilita o processo de desenvolvimento progressivo das mulheres.
Entende-se assim que a essência da violência contra as mulheres é um dos recursos
socialmente utilizados de forma conveniente para manter as mulheres numa posição de
subalternidade relativamente aos homens. Assim, as mulheres estão em constante
49
exposição a formas de violência doméstica, assédio sexual, violação, abuso sexual,
mutilação genital e tráfico sexual.
Atualmente, a violência contra a mulher, constitui uma preocupação a nível
internacional. Face a este problema, torna-se urgente a necessidade de efetuar estudos e
análises sobre este flagelo que leva à deterioração da saúde individual mental e física,
bem como a degradação da saúde familiar nos casos em que a mulher resiste a uma
relação violenta por tempo indefinido. A desigualdade social das mulheres
relativamente aos homens é vivenciada em todas as culturas do mundo e a sua grandeza
é manifestada de diferentes formas (Fonseca, 1997).
Segundo a Organização Mundial de Saúde, 7% das mulheres foram vítimas de
violência sexual por desconhecidos e 30% relata ter sido vítima de violência física ou
sexual por parte do companheiro.
No que concerne à mulher, esposa, companheira, a violência doméstica tem
maior relevância, principalmente nas relações de intimidade, associando-se assim à
violência de género e consequentemente a questões socioculturais (OMS, 2002).
É factual que a violência contra a mulher tem por base a forma transgeracional
das crenças, comportamentos e valores que são característicos de certas sociedades e
culturas, cujas raízes remontam a uma sociedade patriarcal. Na sociedade atual,
denomina-se violência conjugal ou violência nas relações de intimidade, uma vez que é
perpetrada pelo namorado, companheiro ou marido atual ou passado (Magalhães 2010).
Assim, verifica-se que a violência causa menos danos no género masculino,
atingindo de forma marcante o género feminino. Este resultado tem como principais
motivos as significativas desigualdades e diferenças de poder entre ambos os géneros. A
violência gera-se devido aos estereótipos aceites cultural e socialmente e que têm como
base a questão dos desequilíbrios de poderes existentes entre homens e mulheres. O
desenvolvimento dos vários tipos de violência - sexual, física e psicológica surge desta
falta de equilíbrio, sendo no geral a mulher como principal vítima (Matos, 2006; Neves
& Nogueira, 2004).
A redefinição do papel da mulher na família e na sociedade, decorreu das
vicissitudes sociais que se manifestaram a seguir à industrialização, bem como ao
posterior aumento da população. A violência doméstica atualmente é concebida como
um tema proeminentemente humano. No que ao género se refere, os cientistas aplicam
uma linguagem imparcial para a vítima e para o agressor. Contrariamente, a taxa mais
elevada de vitimação deste crime mantém-se no género feminino. Deste modo, os
50
estudiosos das contingências feministas, preservam o ponto de vista de que se trata de
um acontecimento cuja direção é única e praticado apenas pelo género masculino. A
base provável destas questões assenta no estudo sociológico patriarcal em que a
explicação lógica surge do domínio masculino, pelo uso do controlo, do poder e da
violência nas relações de intimidade (Manual Alcipe, 2010).
51
6.1.3.2 Perspetiva didática familiar.
Têm com base as teorias didáticas como a troca, a interação simbólica, as
atribuições, a frustração-agressão, tendo maior destaque a teoria transgeracional da
violência. Esta teoria fundamenta-se no fato de que se uma criança é exposta a situações
de violência, e podendo ela mesma ser vítima, a probabilidade dessa criança ser ou
exercer violência no futuro é alta, podendo tornar-se em agressor ou vítima. Esta
criança, exposta a esta realidade, desenvolve a crença de que a violência existe porque
essa é uma forma de amar e de uma forma fácil, em adulto torna-se vítima da violência.
A probabilidade de os homens se tornarem violentos quando na infância são expostos a
assistir a comportamentos violentos é maior. Isto pode ser minimizado se o convívio
com homens sem este comportamento for incentivado (Manual Alcipe, 1998).
Para explicar a violência masculina destacam-se questões como o
desenvolvimento psicossocial e a transmissão transgeracional como fatores pertinentes,
desvalorizando-se aspetos de natureza global que se relacionam com o poder da
aprendizagem social do indivíduo ou o género. Consequentemente e perante a
experiência da vitimação durante a infância, potencia-se a criação de condições para a
violência no seio familiar ao longo das gerações (Perrot, 1994; Machado, Gonçalves &
Vila-Lobos, 2002).
6.1.3.3 Perspetiva psicológica/ intraindividual.
Os autores Loeber e Hay (1994) afirmam que esta teoria tem como objetivo a
identificação das características psicológicas tanto do agressor como da vítima.
Defendem ainda que na base dos comportamentos violentos existem défices que se
desenvolvem e manifestam precocemente.
Segundo Pagelow (1984), as causas que explicam o comportamento do agressor
são: reduzida tolerância à frustração e consumo excessivo de substâncias; pobres
competências sociais; baixa auto-estima; perturbação psicológica; situações de stress;
dificuldades de empatia e de controlo. Enquadrando a vítima, as características são:
estado de stress bem como o consumo excessivo de substâncias; perturbação
psicológica; sintomas depressivos (fadiga, pensamentos negativos, fraca concentração,
baixa auto-estima); auto culpabilização; maior tolerância ao locus de controlo externo;
baixos níveis de intimidade e de compatibilidade com o parceiro conjugal.
Esta perspetiva estuda os fatores que podem estar no início da violência, tendo
como centro a personalidade do agressor e da vítima. A personalidade agressiva e hostil,
a ansiedade e a depressão, em conjunto com o consumo de drogas e álcool podem ser
52
fatores favoráveis para a violência doméstica. O álcool e as drogas, potenciam a
violência, tornando-a mais frequente e grave. Tendo em consideração que os
comportamentos violentos se apreendem em sociedade e não estão associados ao
consumo de substâncias psicoativas. Embora se verifique na violência doméstica a
associação ao álcool, não existe uma ligação direta, ainda que o consumo do álcool seja
um hábito no homem com condutas violentas. Um indivíduo cujo comportamento é
violento, e consome drogas, ao ser aplicado um tratamento para as dependências,
continuará com a violência. Neste contexto, a responsabilidade pelo comportamento não
é do agressor, uma vez que este pretende demonstrar à vítima a sua frustração, e o
comportamento da vítima leva-o a agir de forma violenta. A violência conjugal é
estritamente privada (Manual Alcipe, 1998).
6.1.3.4 Perspetiva biológica e psicofisiológica.
Estas teorias explicam a violência conjugal com base na raiva e ira que o
agressor demonstra ou da reação ofensiva que não consegue controlar (Queirós, 1997;
Marques-Teixeira, 2001).
Esta explicação tem sido objeto de críticas, por se revelar determinista e
insuficiente, na medida em que cientificamente não está demonstrado que os níveis de
ira e raiva dos agressores de violência doméstica sejam superiores dos que não agridem
e nem que essa mesma ira e raiva conduzam necessariamente ao comportamento
violento. Portanto, o défice de controlo de ira/raiva que muitos dos agressores
apresentam é apenas direcionado para a agressão às mulheres no contexto doméstico.
Noutros contextos interrelacionais, estes indivíduos apresentam-se controlados e
integrados. Estas teorias são utilizadas em programas de autocontrolo, embora não
constituam uma base sólida para as causas da violência conjugal (Margolino, Gordis,
Oliver & Rainer, 1995; Ornduff, Kelsey & O’Leary, 1995).
53
Segundo Carmen, Reiker e Mills (1984) existe uma relação entre a vivência de
experiencias violentas na infância e posteriores comportamentos violentos na vida
adulta. Esta é também uma teoria que atualmente surge como defesa nas perspetivas da
aprendizagem social.
Segundo os autores Caligor, Diamond, Yeeomans e Kernberg (2009), os
indivíduos violentos apresentam uma organização psicológica borderline, associada a
tendências paranóicas, uma limitada capacidade de reflexão, enfraquecimento das
fronteiras do ego, tendência de pensamento concreto e desregulação afetiva.
No entanto, segundo Costa e Duarte (2000), salientam que ainda não foi definida
a presença de perturbações psicológicas ou psiquiátricas no agressor, assim sendo, não
existe uma relação de causa-efeito, pelo que o agressor é avaliado através de várias
características como é o caso da personalidade, eventual depressão, défices de
competências, pobreza, contexto cultural, stress, história de vida e consumo excessivo
de álcool ou drogas.
No caso do consumo excessivo de álcool ou drogas, Hermann (2000) também
suporta esta afirmação, uma vez que o consumo excessivo dessas substâncias ou o
desemprego podem ser facilitadores da violência. Normalmente, os agressores são
homens com mais de 25 anos com algumas características associadas: alcoolismo como
hábito; desemprego ou ocupação reduzida; baixa auto estima; experiência com maus
tratos; depressão; progressão da violência ao ponto de se juntar à violência psicológica;
precocidade, em que durante a juventude surgem algumas reações como que a predizer
o que irá acontecer futuramente.
É comum o agressor sentir-se culpado e face a este sentimento prometer à vítima
melhoras futuras. A modificação é difícil e ao renovar o sentimento de culpa, passa à
agressão e consome álcool (Costa, 2003).
Segundo a APAV s/d, nestes agressores, podem existir algumas características
comuns, como o serem casados, idades entre os 25-45 anos, usam armas, baixa auto
estima e consomem álcool ou outras substâncias ilícitas. São cuidadosos na sua maioria,
tentam causar lesões em zonas menos visíveis e que não necessitem de cuidados
médicos para esconder o abuso e culpam a vítima pelos seus atos de violência.
6.1.5 A vítima.
A APAV, s/d, afirma que a vítima pode ter qualquer idade, raça, religião, sexo,
educação, estado civil e emprego. Este é um fenómeno transversal a todas as classes
54
sociais, significa uma violação grave aos direitos humanos, afetando mais as mulheres
do que os homens. Ocorre principalmente na esfera privada tendo vários componentes
que vão desde a agressão física até à violência psicológica que por não produzir sinais
objetivos se torna menos visível.
As vítimas são na sua maioria mulheres com mais de 25 anos ou a parte mais
frágil da relação. Ainda que as crianças não sejam objeto direto de agressões físicas, são
também vítimas. Iniciam um processo de aprendizagem como uma forma de estar na
vida quando testemunham a violência entre os pais. Na fase adulta, para além desta
situação lhes causar problemas e sofrimento emocional, podem facilmente reproduzir o
modelo da violência (Machado & Gonçalves, 2003).
Portugal (2003), menciona as seguintes características comuns das vítimas de
violência: emocionalmente dependentes e deprimidas, conformadas, passiva, caladas,
envergonhadas e incapazes de reagir.
55
Deste total, 80% eram do sexo masculino e 23% com idades que se fixava entre
os 35 e os 54 anos, 30.6% detém uma ocupação profissional e 30% eram casados e
30,6% possuíam uma ocupação profissional.
Dos casos registados em 2016, 75.8% representam o tipo de vitimação
continuada. Recolhidos os dados, e referindo-se ao local do crime, a residência comum
é o local privilegiado, seguindo-se a residência da vítima e a via pública. Salienta-se que
41.6%º das situações a queixa/denúncia foi formalizada junto das entidades policiais.
6.1.7 Consequências.
A vítima de violência doméstica tende a desenvolver diversa sintomatologia
derivada do contexto em causa, como a seguir de descrimina:
-crenças erradas sobre si própria; confusão mental; disfunções cognitivas sob a forma de
flashbacks e pesadelos;
-dificuldades de atenção e concentração, distúrbios cognitivos e de memória; sentimento
de fracasso pessoal e da relação conjugal;
-conceito de amor que leva ao sacrifício e dependência do companheiro;
-memórias regressivas de acontecimentos traumáticos, comportamento depressivo ou de
grande evitamento; distúrbio de ansiedade, (incluindo a desorganização, a híper
vigilância, fobias, e ataques de ansiedade);
-crença em mitos relacionados com a violência doméstica como os papéis
desempenhados na relação conjugal, ou estereótipos ligados à unidade familiar;
submissão (Manita, 2008; APAV, 2010).
A violência psicológica destaca-se pela maior durabilidade dos seus efeitos na
violência conjugal. Aparece antes do início das agressões físicas, acarretando elevados
custos ao nível individual e social, bem como as consequências negativas sentidas pela
vítima. As mulheres vítimas de violência recebem tratamentos médicos frequentemente,
mas apresentam também maior taxa de absentismo. Os sintomas revelados são o stress
pós-traumático, a depressão, baixa autoestima, sintomas dissociativos, consumo de
substâncias e a ideação suicida (Paiva & Figueiredo, 2003).
A raiva, o medo, o mal-estar emocional e o isolamento, lideram os sintomas que
se podem desenvolver a curto e a longo prazo, os sintomas dissociativos, a depressão e
o consumo de substâncias. Naturalmente, as vítimas de violência doméstica e que
sofrem agressões físicas têm maior probabilidade de sofrer de abusos sexuais (Azeiteiro,
2007).
56
Sabendo que cada pessoa reage de forma diferente à violência exercida, uma
grande parte destas, ao serem vitimizadas, podem sentir-se vulneráveis e muito
confusas, tendo como resposta, a desorientação geral, o pânico, ou medo de morrer, o
sentimento de solidão, o estado de choque e a impressão de estar a viver um pesadelo.
Quanto mais violento for crime, maior será a intensidade e estado de perturbação da
vítima.
Após a vitimização, existe um conjunto de consequências que se manifesta quer
seja ao nível psicológico, social ou físico. Destaca-se aqui o fato de que neste contexto,
o sofrimento chega especificamente à vítima, mas também se alarga aos familiares,
amigos e testemunhas.
Nas consequências físicas existem resultados diretos das agressões que as
vítimas sofrem como hematomas, fraturas, bem como as respostas dadas pelo corpo face
ao stress. Embora estas reações possam manifestar-se separadamente e variar de
intensidade de pessoa para pessoa, são normais e comuns manifestações na vítima:
perda de energia; dores musculares; dores de cabeça e/ou enxaquecas; distúrbios ao
nível da menstruação; arrepios e/ou afrontamentos; problemas digestivos; tensão arterial
alta. As consequências psicológicas perante acontecimentos de vida anormais, levam as
pessoas a pensarem que estão a perder o equilíbrio ou à beira de uma loucura. Assim,
são comuns estas consequências: dificuldades de concentração, memória, dormir, tomar
decisões; tristeza; pesadelos; diminuição da autoconfiança; desconfiança face aos outros
(APAV; s/d).
Segundo os autores Costa e Duarte (2000), a violência psicológica envolve
comportamentos como a humilhação, o sarcasmo, as proibições, extração de
rendimentos do próprio, privação de apoio económico, impedimento de contato com os
filhos ou outros familiares, proibição de entrar em casa ou expulsão, difamação,
perseguições, destruição de bens, chantagem, ameaças incluindo a de morte, insultos
sendo a depressão e o suicídio as principais consequências.
57
a vergonha, o medo, são também apontados como condicionantes para a permanência na
relação violenta (APAV, 2010; Cutler, 1989).
Segundo Walker (2009), este é um fenómeno denominado por Learned
Helplessness.
Esta situação pode tomar proporções alarmantes quando existem filhos. No
entanto, a jurisprudência e os Gabinetes de Apoio à Vítima, experienciam que vários
são os casos em que a tentativa de rompimento da relação, representa maior risco e
conduz ao homicídio conjugal tentado (Manita, 2008).
Machado et al (2006), afirmam que a curto e a longo prazo, a violência conjugal
tem repercussões físicas e mentais graves na saúde. O risco de a mulher ser violentada
por um estranho é insignificante. Mas o risco de sofrer uma lesão física grave aumenta
quando a violência é perpetrada por alguém com quem se mantém uma relação afetiva.
Seja qual for o tipo de agressão tem sempre um impacto negativo na saúde e no bem-
estar, sendo que as agressões físicas que deixam marcas vincadas no corpo
diagnosticam-se imediatamente. Ao nível psicológico, as agressões não só têm
consequências graves como diminuem a qualidade de vida ao longo dos anos. No
imediato e a longo prazo, a agressão física, sexual e psicológica culmina com danos que
podem ser irreparáveis. As lesões no abdómen, tórax e ao nível da cabeça são
quantitativamente as mais recorrentes, percetíveis e de fácil distinção no ato de
violência conjugal. Variam quanto ao seu grau de gravidade, ainda que entre os
hematomas se possam detetar uns com aspeto recente e outros cujo aspeto remete para
“curado” embora a marca se mantenha para sempre. Os problemas que podem advir do
ato da violência sexual são vários sendo a gravidez não vigiada e indesejada, o risco de
parto prematuro, aborto, disfunção sexual doenças sexualmente transmissíveis como a
SIDA, hepatite B entre outras. Estes atos interligam-se e provocam profundas alterações
psicológicas, aumentando o risco de perda de interesse sexual, baixa auto estima,
depressão.
A baixa autoestima, na mulher, representa um fator de risco e uma consequência
da violência conjugal. Walker (1979) refere que a baixa autoestima é uma característica
comum nas mulheres vítimas de violência conjugal. A mesma defende que a mulher
desenvolve, como efeito das situações traumáticas, uma patologia definida por
“síndrome da mulher agredida” que é uma conjugação de baixa autoestima, medo,
depressão, culpa e passividade.
58
Estas experiências, tendo um significado pessoal, são também de difícil
visibilidade, e bastante subjetivos para além de só por si não servirem de prova. No que
à mente diz respeito, as consequências destes atos podem provocar distúrbios como a
ansiedade, tendência para consumo de drogas, álcool, tabaco, ataques de pânico até
mesmo chegar a depressão permanente e tentativa de suicídio. Vários estudos efetuados
à população portuguesa, confirmam que existe uma predominância de doença
psiquiátrica nas mulheres, relativamente aos homens neste contexto (Silva, et al, 2002).
Silva (1991) identificou a violência física nas mulheres, como um fator
fortemente associado à frequência de consulta de psiquiatria e, embora com menos
importância, à frequência de consulta de saúde geral.
A Associação Psiquiátrica Americana em 1994, mostrou vários sintomas que
resultam de relações stressantes: comportamentos impulsivos; diminuição da modulação
dos afetos; sentimentos de incapacidade, vergonha e desespero; perda de valores
anteriormente defendidos; sentimentos permanentes de destruição; doenças somáticas;
hostilidade; sentimentos de perigo constante; diminuição das relações com os outros;
retraimento social; mudanças de características da personalidade prévia (DGS, 2005).
6.2 A Depressão
A Organização Mundial de Saúde (2001) afirma que a depressão pode
relacionar-se com outros determinantes, nomeadamente o sexo, a idade e afeta os
indivíduos em qualquer faixa etária. Todavia, a maior ocorrência verifica-se em idades
intermédias, tendendo a aumentar na adolescência e princípio da vida adulta e com
maior relevância no sexo feminino. A depressão provoca grande sofrimento nos
indivíduos e nas famílias, e em situações mais graves pode levar a incapacidade na vida
profissional e laboral.
Segundo Almeida et al (2005), depressão é uma perturbação de humor e
representa a forma mais comum das perturbações afetivas. Pode atingir pessoa, homem
ou mulher em qualquer faixa etária, estatuto social/económico, ou nível educacional,
afetando e comprometendo, consequentemente, todas as áreas da vida como a família, o
casamento, o trabalho, as finanças e os relacionamentos. Caso não seja diagnosticada e
tratada após um primeiro episódio, pode tornar-se persistente ou crónica. Quando
acompanhada por outras doenças (perturbações mentais, acidentes vasculares cerebrais,
ansiedade, cancro, diabetes, abuso de substancias) o quadro pode agudizar-se, na
medida em que a sua interferência agrava a evolução e resultado destas comorbilidades.
59
6.2.1 A expressão.
Segundo Del Porto (2002), a depressão como expressão pode referir-se a uma
doença ou ter o sentido de um sintoma do qual fazem parte numerosos distúrbios
emocionais, não se limitando a qualquer um. Como sintoma, manifesta-se como reposta
a acontecimentos de stresse, em situações sociais desfavoráveis, na demência,
alcoolismo, esquizofrenia, doenças clinicas, nos transtornos de stresse pós-traumático.
Quanto à síndrome, a depressão além das alterações de humor como a apatia, a tristeza,
irritabilidade, falta de capacidade de sentir prazer, integra também alterações cognitivas,
vegetativas e psicomotoras, nomeadamente o apetite e o sono. Na condição de doença, a
depressão pode considerar-se de diversas maneiras, designadamente como distúrbio,
melancolia, transtorno depressivo maior, depressão associada ao transtorno bipolar tipo
I e II, depressão como elemento da ciclotimia. Atualmente, a depressão é caracterizada
como sendo uma perturbação de humor composto. Os indivíduos apresentam
comportamentos e manifestações fisiológicas, sinais e sintomas variados.
Os autores Grevet e Knijinik (2001), salientam que a depressão e no que
concerne aos seus sintomas, apresenta as seguintes alterações: cognitivas - alterações na
velocidade do raciocínio e do pensamento; neurovegetativas - alterações do sono, peso,
interesse sexual, cefaleia, peso na região das costas e fraqueza muscular; humor -
deprimido, tristeza; psicomotoras - atrasos, agitação. Podem ainda ser organizados em
ritmos circadianos, incluindo a regulação da temperatura e as alterações nos ritmos de
sono-vigília, e a sazonalidade quando em certos períodos do ano se identificam,
consideráveis aumentos dos episódios depressivos.
Ribeiro (1989) afirma que o desenvolvimento das sociedades modernas, e
também com a viragem do século, apresenta-se um panorama sombrio, que se
caracteriza por uma crescente diminuição da qualidade de vida das pessoas. Deste modo
as doenças da civilização tendem a aumentar, fundamentalmente devido aos
inadequados comportamentos por estes utilizados.
A saúde não é a mera ausência de doenças. Implica, pois, um estado de bem-
estar físico, mental e social dos indivíduos. Contudo, o pensamento ocidental, pendeu
pela divisão do corpo em duas partes: o fisiológico e o psicológico, e para cuidar de
cada uma destas partes, persiste a necessidade de existir especialistas para o efeito
(Canto e Simão, 2009).
Ao longo da história, o conceito da mente e do corpo, verifica alguns aspetos
que podem propiciar transformações nas pessoas, no que concerne à fragilidade
60
individual. Deste modo e com base num estudo de Castro e et al. (2006), incluem-se
situações como acontecimentos na infância, episódios recentes da vida, personalidade,
atitudes saudáveis, ou bem-estar psicológico. Com o decorrer do tempo, constata-se a
mudança na forma de pensar a mente /corpo, saúde e doença.
Assim, ao longo do tempo estas alterações emocionais, podem ser tão
significativas ao ponto de surgir dor e até mesmo a sua intensificação ou manutenção
(Frutuoso & Cruz, 2004).
A dor, podendo ser provocada por uma lesão nos tecidos do organismo é uma
experiência de natureza desagradável, sensitiva e emocional. Assim sendo, atenta a três
componentes importantes: sensitiva; a emocional - a tristeza, o medo, a raiva, a
depressão, a ansiedade) e a cognitiva- tomada de decisões, pensamento, memória. Estes
componentes em conjunto com a frequência, a intensidade da dor que podem estar na
proveniência do desconforto psicológico e físico (Frutuoso & Cruz, 2004).
Nesta sequência, a depressão e a ansiedade como dor que provém da
instabilidade emocional surge com frequência em indivíduos com doenças crónicas
interferindo no seu estado psicológico e na sua qualidade de vida (Menezes et al., 2008)
Segundo Canto e Simão (2009), as pessoas entendem a doença como um
constrangimento à sua integridade física e psicossocial tendo um olhar completo quanto
á sua relação com o corpo e com a mente.
Os registos estatísticos calculam que em todo o mundo, são atingidos pela
depressão mais de 350 milhões de indivíduos, tornando-se assim a principal causa de
incapacidade (OMS, 2012).
A nível mundial as estatísticas registam um elevado número de pessoas que ao
longo do ciclo de vida sofreram episódios depressivos. Estima-se então que 3,6% da
população sofre de perturbação de ansiedade e 4,4% da população sofre de perturbação
depressiva. Estes registos referem-se à série de perturbações de ansiedade e depressivas
como sendo as mais comuns, considerando que muitas pessoas experimentam ambas as
condições em simultâneo (comorbilidade). Globalmente, prevalece uma parte de cerca
de um terço cuja gravidade de casos sintomáticos tem um curso moderado a grave
(OMS, 2012).
No panorama europeu, sofrem de depressão cerca de 30,3 milhões de pessoas,
sendo frequentemente considerada como uma das perturbações mais constantes e afeta
uma em quatro mulheres e um em oito homens ao longo da sua vida. (Wittchen et
al.,2012).
61
Em Portugal a depressão considera-se como um grave problema mental e de
saúde pública. Dados da Organização Mundial de Saúde (2012), indicam que Portugal
tem uma prevalência anual elevada nas perturbações de ansiedade em adultos onde
cerca de 8% da população já passou por um período de depressão.
Almeida e Xavier (2009) afirmam que a depressão, representa 8% do total das
doenças mentais e uma prevalência de 16% ao longo do ciclo de vida, sendo
classificado como o terceiro problema de saúde mais frequente, no que às consultas dos
Cuidados de Saúde Primários diz respeito.
Em suma, hoje em dia, um dos principais desafios que se coloca ao nível da
saúde pública é a depressão, sendo a intervenção incontestável e urgente. Com base em
meta-análises e manifestações sistemáticas das amostras disponíveis, existe consenso
que no tratamento das perturbações depressivas, o papel da intervenção psicológica é
crucial (Nice, 2010).
Apresenta-se um quadro comparativo das perturbações psiquiátricas em Portugal
e outros países.
Quadro 3.
Comparação da prevalência anual das perturbações psiquiátricas nos adultos (exceto
perturbação psicóticas esquizofrénicas e delirantes), em Portugal, alguns outros países
da Europa e nos EUA (OMS, 2012).
País Pert. Pert. Pert. Pert. Todas
Depressivas Ansiedade Impulsividade Álcool
Portugal 7,9 16,5 3,5 1,6 22,9
Irlanda 9,6 14,6 3,4 3,5 23,1
Norte
Bélgica 6,2 6,9 1,0 1,2 12,0
França 8,5 12,0 1,4 0,7 18,4
Alemanha 3,6 6,2 0,3 1,1 9,1
Itália 3,8 5,8 0,3 0,1 8,2
Holanda 6,9 8,8 0,3 3,0 14,9
Espanha 4,9 5,9 1,3 0,3 9,2
Ucrânia 9,1 7,1 0,5 6,4 20,5
EUA 9,6 18,2 3,2 3,8 26,4
62
Esta perturbação, carateriza-se principalmente por perda de interesse nas
atividades diárias, tristeza e diminuição de energia. O conjunto destes fatores, ou cada
um em particular, potenciam a incapacidade e consequentemente implicam a utilização
dos serviços de saúde (Furegato, 2005).
As suas queixas frequentemente passam despercebidas aos profissionais não
sendo reconhecidas e o tratamento é direcionado para os aspetos físicos. A falta de
atualização dos conhecimentos bem como dos sintomas e sinais principais, culmina
numa deficiente identificação e tratamento da doença (Cândido & Furegato, 2008).
Existem pessoas deprimidas que ao procurarem ajuda, permanecem sem um
correto diagnóstico e sem um adequado tratamento. Isto repercute-se num grande
sofrimento, contínuo risco de suicídio, elevada morbilidade e mortalidade. Interfere na
vida profissional, pessoal, económica e social das pessoas atingidas, pois trata-se de
uma doença cujo grau de incapacidade é elevado (Thompson, 2010).
Apóstolo (2011) afirma que o termo depressão pode fazer representar-se por um
sintoma, uma síndrome, um estado afetivo ou várias doenças. Carateriza-se por um caso
patológico, no qual subsiste a perda de prazer ou interesse, distúrbios de apetite, sono,
cognitivo, atraso motor, sentimento de inutilidade ou culpa, diminuição de energia e
pensamentos de morte ou suicídio.
O sentimento de tristeza e solidão pode ocorrer em qualquer momento na vida
das pessoas - perda do emprego, morte de um ente querido, são fatores que facilitam o
sentimento de infelicidade ou solidão. Na maior parte das vezes, apenas se experimenta
um sentimento absolutamente normal e compreensível, não sendo um estado patológico
de depressão (Almeida, 2011).
Segundo Porto (1999) a depressão enquanto doença, pode ser considerada de
diversas formas. A literatura atualmente refere entre outros quadros, o transtorno
depressivo maior, distimia, melancolia, depressão integrante do transtorno bipolar tipo I
e II.
Pereira e Saraiva (2014) afirmam que a depressão é uma doença grave. Todavia,
o tratamento é possível, na medida em que quanto mais cedo a pessoa for acompanhada,
por intervenção de psicoterapia e ou medicamentoso especializado, melhor será a
perspetiva para uma cura total. É elevada a percentagem de indivíduos que expressam
alguns sintomas e que apresentam recaídas, A terapia de manutenção para prevenir as
recaídas deve ser seguida por um período de mais 6 meses após o retrocesso dos
sintomas da doença.
63
6.2.2 Sintomas.
Destacam-se como características específicas dos estados depressivos, o
sentimento de tristeza ou vazio, pese embora o fato de essa sensibilidade inerente não
ser mencionada. A redução do interesse pelo ambiente e perda de capacidade de
experimentar prazer nas atividades em geral, são fatores referidos com frequência neste
contexto. A sensação de perda de energia e de fadiga, são muitas vezes indicadas como
uma queixa de cansaço exagerado (Widlöcher, 1983).
Parker et al (1994) salientam que as alterações psicomotoras como a lentificação
e o atraso psicomotor bem como os sintomas psíquicos, fisiológicos e as manifestações
do comportamento são fatores a considerar no diagnóstico da depressão.
6.2.2.1 Psíquicos.
Como sintomas psíquicos, no humor depressivo, aparece a sensação de tristeza,
auto desvalorização e os sentimentos de culpa. É habitual a pessoa reportar-se ao
sentimento de que tudo lhe parece inútil, ou sem a efetiva importância. Admitem que
perderam irreversivelmente a capacidade de sentir alegria ou prazer na vida. No geral,
tudo lhes parece vazio e sem graça, o mundo é visto sem cor, sem traços de alegria (Del
Porto, 1999).
O humor pode ser irritadiço, entediado, em vez da tristeza principalmente nas
crianças e adolescentes. Algumas pessoas apresentam-se apáticos e constatam a falta de
sentimentos, emoções quer sejam positivas ou negativas (Gadum et al, 2002).
A pessoa deprimida pode julgar-se um peso para os amigos e familiares e a
morte e a ideação suicida são frequentemente mencionadas como sendo um fator
atenuante para os que a assistem durante esta situação Grinberg (2000).
Diminuição da capacidade de sentir prazer na maior parte das atividades, antes
consideradas como agradáveis. As pessoas deprimidas podem relatar que já não se
interessam pelos seus passatempos prediletos. Negligência frequente das atividades
sociais, parecendo então obrigações (Del Porto, 1999).
Sensação de perda de energia ou fadiga. Ainda que sem esforço físico a pessoa
pode relatar fadiga persistente e as tarefas mais leves parecem exigir esforço substancial
(Del Porto, 1999).
Decisões que antes pareciam quase automáticas agora requerem grandes
esforços. Diminuição da capacidade de pensar, de se concentrar ou de tomar decisões. O
tempo para a execução das tarefas são lenificadas, bem como o fluxo de pensamento.
Muitos profissionais podem ter dificuldade na elaboração de tarefa de rotina, sendo
64
apelidados e incompetentes. Nas crianças e adolescentes, o rendimento escolar é afetado
em consequência do desinteresse geral, da fadiga e défice de atenção (Teng & Demétrio
2005).
O suicídio é motivado por distorções cognitivas, como depreender que as
dificuldades são impedimentos absolutos e insuperáveis, alguma disposição para
sobrevalorizar as perdas e também a forte vontade de fazer cessar um estado emocional
profundamente doloroso. Os pensamentos de suicídio, podem diversificar entre a
vontade de apenas estar morto e a esquemas precisos de acabar com a vida. Assim, a
ideação suicida deve diligentemente ser analisados, dando oportunidade a pessoa para se
explicitar. Outras vezes, a morte é procurada como um modo de redimir a sua suposta
culpa (Trevisan, 2004).
6.2.2.2 Fisiológicos.
Alterações do sono, com predomínio da insónia, podendo ocorrer também
hipersónia. Perda ou aumento de apetite. Nas crianças, devido ao fastio podem não ter o
esperado ganho de peso em relação ao tempo correspondente ao período em causa. No
entanto existem algumas formas particulares de depressão que onde se verifica o
aumento de apetite principalmente por carbohidratos e doces. Salienta-se ainda a
diminuição do interesse sexual.
6.2.2.3 Manifestações do comportamento.
A sensação de peso ou manta de chumbo que carregam nos ombros é referida
com frequência por pessoas com quadro depressivo. O isolamento social, as crises de
choro, o comportamento suicida, o atraso psicomotor e lentificação generalizada, ou
agitação psicomotora são características inerentes às manifestações do comportamento
incluídas no âmbito da depressão. As dores vagas ou crónicas e as cefaleias são queixas
importantes e que podem de certa forma dissimular o quadro típico da depressão
estando a ansiedade e os lamentos de natureza hipocondríaca principalmente nas
pessoas idosas, aparecem aqui também associados (Parker et al.,1994).
Num quadro depressivo, as funções circadianas apresentam-se desorganizadas (o
ritmo da produção do cortisol, regulação da temperatura) sendo mais percetível as
modificações do sono. A diminuição do início do sono REM (Rapid Eyes Movements),
é cerca de dois terços das pessoas diagnosticadas (Akiskal, 1995).
Assim, os principais sintomas dos estados depressivos são:
- angústia e tristeza;
- fadiga, cansaço e perda de energia;
65
- sentimentos de inutilidade, de falta de confiança e de auto-estima;
- sentimentos de culpa e sentimento de incapacidade;
- falta ou excesso de apetite;
- perturbação do sono;
- falta ou alterações na concentração;
- preocupações recorrentes;
- desinteresse, apatia e tristeza;
- diminuição do desejo sexual;
- irritabilidade
- manifestação de sintomas físicos, como dores musculares, abdominais entre outros.
As causas da depressão não são compreendidas na sua totalidade, na medida em
que representam eventualmente uma complexa combinação de fatores genéticos,
biológicos ambientais, e psicológicos. Alguns dos sintomas físicos ligados à esta
patologia, podem ser melhorados com a toma de fármacos (Del Porto (1999),
66
Quadro 4.
Principais doenças e agentes farmacológicos associados ao desencadeamento de
estados depressivos (Del Porto 1999).
Doenças Neurológicas Esclerose múltipla, Parkinson, epilepsia, apneia de sono,
tumores, doença cerebrovascular, demências.
67
próprio estivesse morto, transitando para pensamentos transitórios recorrentes de
tentativa de suicídio, incluindo também a elaboração de planos inerentes ao ato
(APA,2000).
Segundo Grinberg, (2000), perante os sentimentos persecutórios de culpa, a
morte é sistematicamente tida como a solução desacompanhada e considerada como
libertação de tais sentimentos. A situação de um suicida caracteriza-se pela presença de
uma crise a ser vivenciada e em que a pessoa se encontra num estado intolerável a
necessitar de uma decisão. Assim a pessoa sente-se ambivalente entre a vida e a morte,
sendo que recorre à tentativa de suicídio e no limite da sua resistência, como única
forma para exteriorizar os sentimentos de desamparo e desespero.
Bronisch (2003) afirma que os estudos epidemiológicos registam que em
sujeitos com depressão major, a ideação suicida representa 50 a 70 % de sujeitos
afetados.
Por outro lado, em indivíduos deprimidos a literatura destaca variações nas
percentagens de suicídios, indicando um total de 15% de pessoas com perturbações
afetivas, demonstrando uma prevalência elevada de suicídios (Schotte et al.,2006).
68
6.2.4.2 Perspetiva psicodinâmica.
Este conceito, teve origem nos trabalhos com pacientes com patologia
psiquiátrica de Sigmund Freud (1856-1939), que confiava que essas conceções seriam
os comportamentos do tipo padrão. Segundo esta perspetiva, o comportamento é
motivado e dirigido por uma sequência de forças internas. Estas procuram por um lado,
dissipar a tensão que existe entre as pulsões e os instintos e as necessidades internas e
por outro, as próprias exigências sociais (Myers, 2008).
69
formado principalmente de complexos e de material reprimido. Por outro lado, o
inconsciente coletivo tende essencialmente para a simbolização por imagens que
agregam sentimentos profundos e intimação universal - arquétipos. Desta forma, e
partindo do princípio que tanto os homens como os animais encerram atitudes inatas
(instintos), a probabilidade de existir material psíquico com semelhanças ao instinto é
valorizável (Martins, 2012).
70
consequência direta das relações definidas entre as situações do ambiente antecedentes
(contingências), as respostas do organismo e as situações do ambiente consequentes
(D'el Rey & Freedner, 2006).
Segundo Barlow (1999), as técnicas da teoria comportamental, trabalham
essencialmente a atenção por forma a estimular o individuo. Os pacientes que
apresentam passividade, insegurança e com difícil concentração provocada pela
depressão, beneficiam em maior duração com o tratamento pela abordagem
comportamental.
Associando as técnicas desta abordagem, o terapeuta reaviva a pessoa face os
pensamentos de vergonha e retraimento, causando um envolvimento com as atividades
construtivas de forma mais abrangente. Relativamente às causas da depressão, esta
abordagem contribui com a ausência de reforço positivo ou negativo e com o desamparo
aprendido, considerando que os reforços provocam alterações de humor, falta de
interesse e isolamento. Por outro lado, o desamparo aprendido pode causar carência
cognitiva, emocional e motivacional (Teodoro, 2010).
6.2.4.5 Perspetiva existencial.
Esta teoria tem origem na filosofia. As dúvidas dos diversos pensadores sobre a
natureza humana, causaram reflexões no que concerne aos conflitos existenciais,
nomeadamente no que se relaciona com busca da felicidade, a finitude humana, a
angústia diante da morte e o sentido da vida. Ora estes temas propiciam o estado de
melancolia, resultando em depressão. A busca do sentido existencial é um dos conflitos
mais relevantes na pessoa deprimida, e vai para além da filosofia, atravessa o campo da
psicologia, literatura e religiões (Lisso, 2009).
71
racional emotiva que acredita que as pessoas por darem um significado negativo em
determinada situação são negativamente afetadas; cognições negativas, defendendo que
o cultivo de pensamentos negativos pode causar depressão e contribuir para o
prolongamento do quadro depressivo. Assim, a depressão tem um envolvimento de
pensamentos negativos sobre si, do futuro e do mundo (Beck. et al., 1997).
Os conceitos negativos sobre si nesta perspetiva podem ficar latentes.
Dependendo das situações que a despoletem pode equivaler à perda vigente da
formação de um esquema na idade infantil. A depressão é marcada pela ideação
negativa da realidade, explicada através da relevância da informação substancial com a
representação negativa que tem para o individuo. Esta perspetiva preconiza que existe
na depressão esquemas idiossincráticos desarmoniosos que dominam o tratamento da
informação e que estando latentes permanecem por longo período, mas podem ser
ativados por estímulos constantes com o seu interior (Beck, 1997).
6.2.4.7 Perspetiva humanista.
Esta corrente surgiu nos anos 50, em reflexo às teorias Psicodinâmicas e
comportamentalista acima referenciadas. Percebe o homem como um ser autónomo e
ativo que procura de forma consciente o seu desenvolvimento e crescimento, com
tendência à auto realização. Esta abordagem psicológica, preconiza como principal
fonte de conhecimento o estudo biográfico, com o objetivo de expor a existência e a
vivência da pessoa, bem como esta entende essa experiência através da introspeção.
Procura, assim, compreender o indivíduo de forma holística, estando profundamente
relacionada com a teoria do conhecimento fenomenológica (Zimbardo & Gerrig, 2004).
Foi através da fenomenologia e também do existencialismo que a perspetiva
humanista ganhou força, na medida em que acredita na capacidade do homem de se
olhar e se perceber como um ser em construção e constante mudança, reconhecendo-se
como um ser em atualização e crescimento. Esta teoria pressupõe o reconhecimento do
crescimento e atualização da pessoa ao longo do ciclo de vida (Lima, 2008).
Os contributos para esta corrente, surgem com Abraham Maslow (1908-1970) e
Carl Rogers (1902- 1987), acreditando sobretudo nas potencialidades do homem e nas
suas capacidades, bem como na tendência para o crescimento e atualização. Baseado
neste pressuposto, Carl Rogers, desenvolveu a abordagem centrada na pessoa, tendo
como principal elemento a convicção de que todo o individuo está de forma inata
dotado ao crescimento, amadurecimento e desenvolvimento, na medida em que tem
72
competência para a dinâmica interna que proporciona a sua manutenção em equilíbrio
psicológico perante as situações (Moreira, 2010).
A natureza humana é basicamente o fator preponderante para os humanistas, e
incluem também as relações interpessoais, a espontaneidade e a criatividade. No que
respeita à depressão, admitem que esta surge no decorrer do conhecimento da separação
entre o eu real e o eu ideal que pode originar um sentimento de fracasso na medida em
que por vezes se torna difícil concretizar o que se idealizou. Neste contexto, Erich
Fromm (1900-1980) aludia aos conflitos experienciados pelos seres humanos em função
do impulso biológico e da pressão social. E para os superar, confiava que as pessoas
pudessem tornar-se mais afetuosas e criativas (Teodoro, 2010).
6.2.5 O tratamento.
Vários são os estudos que demonstram a eficácia da intervenção psicológica no
que concerne ao tratamento da depressão. A psicoterapia constitui um instrumento
importante no tratamento desta doença e consequentemente na redução dos encargos
com a mesma, na medida em que as evidências revelam que a eficácia se prolonga por
mais um ano após o seu término (Cuijipers, 2015).
Assim, a psicoterapia é eficiente no tratamento da depressão, principalmente, em
indivíduos com depressão subliminar, depressão crónica, mulheres com depressão pós
parto, pessoas com doenças físicas, idosos e adultos. (Cuijipers, et al., 2011)
A farmacoterapia é frequentemente o tratamento que surge em primeiro lugar
principalmente na depressão grave e moderada. Porem, 30% a 40% das pessoas
afetadas, não é sensível à medicação. Comparativamente, a psicoterapia demonstra uma
diminuição das taxas de abandono e melhores resultados no processo de
acompanhamento. Todavia, a combinação dos dois tratamentos quando justificado,
traduz-se em melhoria dos resultados do que aquando da utilização isolada quer da
farmacoterapia, quer da psicoterapia, constatando-se que os efeitos são simultâneos,
mas independentes (Oestergaard & Moldrup, 2011).
De acordo com Lazar, (2010), no tratamento da depressão, a psicoterapia
aumenta a qualidade de vida da pessoa e reduz o número de episódios depressivos.
73
PARTE III – ATIVIDADE DESENVOLVIDA AO LONGO DO ESTÁGIO
74
Iniciamos assim, a terceira parte deste relatório que inclui o trabalho realizado
durante o estágio, nomeadamente a observação, a intervenção o referencial teórico
utilizado e o seu processo terapêutico, bem como o quadro das observações e avaliações
realizadas ao longo deste período.
7. Observação
O estágio teve início com uma reunião de receção aos estagiários pelo núcleo de
psicologia, por forma a formalizar o contato com a equipa e com os orientadores.
Realizou-se a observação da organização da instituição, proporcionando assim o
conhecimento e funcionamento dos serviços e permitindo a adaptação. Seguiu-se a
apresentação dos estagiários nos locais de estágio onde o contato com os técnicos, os
espaços, bem como a forma de funcionamento propiciou um ajuste maior neste âmbito.
Esta observação foi fundamental, pois permitiu que no seu decorrer se desenvolvessem
em simultâneo conhecimento através de diversos contatos e contextos no serviço que
por consequência possibilitaram a adaptação aos locais de trabalho designados.
Todas as consultas de triagem foram assistidas com o consentimento do utente.
No decorrer da consulta, assumiu-se uma postura passiva, portanto sem interferência
para que o utente se sentisse o mais à vontade possível. No final, efetuavam-se reflexões
ao caso clínico e concretamente, sobre a prática de procedimentos de intervenção e a
sua evolução. Deste modo, foram observadas as primeiras consultas e algumas de
seguimento, o que favoreceu amplamente a aquisição de conhecimentos relativos às
patologias, mediante a perspetiva da sintomatologia associada e das condutas de
intervenção. Por outro lado, viabilizou a possibilidade de estar em contato com o evoluir
do estado psicológico dos utentes e de refletir sobre as hipóteses de diagnóstico e
prognostico.
A observação foi realizada em consultas com todo o tipo de população e
problemáticas, pois resultavam da necessidade e do pedido referenciado.
Nos casos urgentes encaminhados pelos médicos de família, verificou-se uma
especial atenção destes por parte do profissional no sentido de agilizar os procedimentos
e solucionar o caso com maior rapidez.
Na maior parte dos casos, constatou-se que quando o utente é encaminhado para
a consulta de psicologia, já tem um diagnóstico médico.
Ainda assim, e utilizando a anamnese, procedeu-se à análise do problema
apresentado e do fundamento da consulta. Esta fase ocorreu em simultâneo com a fase
75
de adaptação e posterior fase de intervenção e avaliação. As reuniões de supervisão para
apresentação de casos e discussão com o orientador do local de estágio constavam no
plano semanal, particularmente às sextas-feiras. O estágio teve a duração de oito meses
e totalizou a carga horária de 450 horas.
Ferreira e Mousquer (2004), explicam que a observação é um instrumento muito
importante em Psicologia Clínica na medida em que possibilita o fornecimento de
elementos que podem ajudar na sinalização de alguma patologia. Os elementos
normativos do comportamento também podem ser facilitados através da observação.
Uma variedade de fenómenos pode ser estudada, uma vez que a observação traz a
vantagem de possibilitar meios satisfatórios e diretos. Isto acontece no caso de
comportamentos não intencionais ou inconscientes, na análise de temas em que os
indivíduos não se sintam à vontade para dar respostas. Permite recolher dados sobre
atitudes comportamentais típicas e que de outra forma seria difícil, bem como verificar
se as respostas verbais estão de acordo com o pedido.
Em diferentes contextos e horários, a observação teve início no primeiro dia de
estágio e realizou-se durante todo o período, tendo sido mais frequente nos primeiros
três meses. No desenrolar das consultas foi utilizada a observação como ferramenta
importante principalmente para a linguagem não verbal.
A observação no local de estágio permitiu desenvolver e adquirir competências,
aptidões, atitudes e conhecimentos. Este período proporcionou um aperfeiçoamento das
várias competências para o desempenho da Psicologia Clínica e da Saúde. Foi positivo
na medida em que houve uma maior integração da formação teórica adquirida com a
prática em contexto real de trabalho.
8. Intervenção
A intervenção nos casos clínicos teve início após um período de observação de
acordo com a necessidade do serviço. A seleção dos casos clínicos foi feita pelo
orientador de estágio de modo variado e diversificado nos diagnósticos que surgiam,
favorecendo assim um contato vasto com faixas etárias e problemáticas.
Os modelos teóricos e de intervenção utilizados são adaptados ao nível dos
cuidados de saúde primários. No contexto da unidade de saúde o papel do Psicólogo
está intimamente ligado à prática da psicologia clínica, tendo como principais
intervenções: psicoterapia de apoio; exame psicológico: avaliação de personalidade,
avaliação cognitiva, avaliação da perturbação pós-stress-traumático; integração em
76
equipas multidisciplinares; dinamização e participação em ações de formação de
especialidade e orientação de estágios. No entanto, atuam atualmente três psicólogos
clínicos que seguem os modelos teóricos e de intervenção cognitivo-comportamental, e
psicanalítico. Contudo, foi acolhida a orientação teórica de cada estagiário, tendo sido
considerada de grande utilidade. Perante este princípio foi priorizado a utilizada a
referência da Abordagem Centrada na Pessoa, cujo fundamento se desenvolve ao longo
deste relatório.
No contexto dos Cuidados de Saúde Primários, o Psicólogo presta os seus
serviços na consulta de psicologia. No entanto, deve também responder a vários tipos de
problemas institucionais e humanos. Assim sendo, as competências do Psicólogo
ultrapassam a intervenção terapêutica individual e a avaliação clínica (Teixeira &
Trindade, 1994).
Todavia, em Portugal devido às especificidades dos cuidados de saúde primários
urge a necessidade de definir o papel do psicólogo no seio das equipas de Cuidados de
Saúde Primários e no próprio sistema da saúde (Trindade & Teixeira, 2000).
77
designadamente a educação, grupos e organizações. Posteriormente, foi adotado a
definição abordagem centrada na pessoa como adequada e mais totalizante.
Esta terapia tem como finalidade ajudar e apoiar a pessoa a desenvolver-se para
que seja capaz de encarar a situação atual e futuramente outros problemas que surjam de
um modo mais adequado e não somente para resolver uma situação específica (Hipólito,
1999).
A relação terapêutica que é criada, fundamenta-se numa originalidade refeita, da
concordância perdida entre a experiência completa do sujeito e a sua vivência do self
que compreende e subsiste, tornando-o livre para um aperfeiçoamento e uma maturação
natural (Santos, 2004).
Segundo Hipólito (1999) a intervenção tem tendência para a não diretividade.
Por conseguinte, aplica técnicas de reformulação e esclarecimento dos sentimentos, com
suporte numa atitude de empatia por parte do terapeuta para com a pessoa.
Os autores Paulino e Brites (2001) afirmam que a base desta abordagem recai na
relevância das técnicas utilizadas, e de forma gradual, salientar o que é mais importante,
reformulando os procedimentos de compreensão empática, em que o terapeuta acolhe os
sentimentos, atuando com uma postura segura e harmoniosa, confiando nas habilidades
da pessoa. Desta forma, a pessoa é capaz de melhorar as suas capacidades
reorganizando-se. Contudo, os procedimentos utilizados devem ser com o propósito de
valorizar a relação terapêutica bem como as suas potencialidades.
78
pode ser resumido num agregado de atitudes: a Compreensão Empática, o Olhar
Incondicional Positivo e a Congruência. Rogers (1956/2009) refere que a mudança
psicoterapêutica leva a menor conflito interior, à mudança de comportamento
compreendendo uma maior maturidade e uma maior integração (Mora 2012).
Rogers (1956) refere que para que haja uma efetiva modificação da
personalidade, é imprescindível a existência de algumas particularidades necessárias e
suficientes que dessa forma concorrem e conduzem à alteração da personalidade e
consequentemente ao sucesso do processo terapêutico. Assim são variáveis
indispensáveis neste processo: que o cliente esteja incongruente, o terapeuta se encontre
congruente, que haja contato psicológico na relação; que o terapêuta vivencie
sentimentos de consideração positiva incondicional e de compreensão empática do
ponto de vista do referencial interno do cliente e que por sua vez este perceba que a
existência da consideração positiva incondicional e da compreensão que o terapeuta
observa e comunica. Existindo estas seis condições, surgem mudanças construtivas e
positivas no cliente. Estas mudanças, serão tanto mais importantes, quanto maior for o
grau de realização entre a incongruência do cliente e a comunicação do terapêuta. No
entanto a ausência de qualquer uma destas condições, comprometem a mudança.
Salienta-se a Tendência Atualizante como condição fundamental na terapia familiar
centrada no cliente.
Neste sentido, o terapeuta necessitará de confiar na tendência do cliente para o
seu próprio desenvolvimento, criando para tal um clima facilitador. O terapeuta terá de
disponibilizar condições necessárias para promover o aumento da capacidade de
desenvolvimento do cliente através da confiança.
Rogers (1978) salienta que a tendência atualizante é intrínseca a todos os seres
vivos, como parte integrante da tendência organísmica e biológica. A tendência do
organismo é a conservação em si mesmo cujo sentido da movimentação se dirige para a
maturidade e autorrealização, sendo eliminando apenas com a morte.
Nos seres humanos, esta aptidão não sendo exclusivamente biológica, inclui a
capacidade de auto regulação e de harmonização à vida (Fonseca, 1998).
A Não Diretividade transmite a confiança necessária ao indivíduo para a sua
evolução e melhoria da qualidade de vida. Esta condição valoriza as questões
sentimentais no presente, evidenciando o indivíduo em detrimento do problema em si e
das referências intelectuais. (Rogers, 1983).
79
No contexto terapêutico, a atitude de Não Diretividade do terapeuta, consiste no
respeito e confiança que este consegue estabelecer na perspetiva do cliente. Após a
estruturação destes elementos, coloca-se à disposição do outro para que este tenha
liberdade e seja capaz de se orientar nas suas escolhas e tomar decisões em
conformidade com o seu propósito pessoal (Nunes, 1997).
A Aceitação Positiva e Incondicional ocorre como consequência da Tendência
Atualizante e recai na confiança de que qualquer individuo está capacitado de potencial
interno. Carateriza-se pela forma de acolher o outro como ele é, sem críticas ou juízos
de valor (Gobbi et.al, 1998).
Existe neste conceito o cuidado que o profissional deve ter com a pessoa,
aceitando as suas experiencias, sentimentos de forma livre e respeitando a
especificidade e individualidade (Bacelar et al., 2012)
Considera-se a congruência como um processo de autenticidade e concordância
interno. A pessoa torna-se mais flexível por forma a aceitar as atitudes, vivências e
sentimentos. É necessário este processo de aceitação de si mesmo, pois só assim se pode
ajustar aos propósitos que pretende alcançar para si e ao mesmo tempo adquirindo
qualidades necessárias para aceitar o outro (Rogers, 1985).
Tendo em consideração o modelo teórico de referência acima explanado,
apresentamos o quadro das observações e avaliações realizadas durante o estágio.
80
Quadro 5.
Observações e avaliações realizadas.
81
PARTE IV – APRESENTAÇÃO DOS CASOS CLÍNICOS
82
Neste capítulo, apresentam-se os dois casos clínicos estudados e analisados,
mantendo o anonimato de toda a informação que possa identificar as pessoas em
questão. Foi dada informação de que este acompanhamento iria ser realizado por uma
estagiária da licenciatura em psicologia, bem como o período de tempo em que iria
decorrer – novembro de 2016 a junho de 2017. As sessões realizaram-se num gabinete
do Serviço de Psicologia do ACES com uma regularidade semanal e em concordância
com a pessoa.
O setting era adequado, no entanto o ruido exterior embora não fosse frequente,
tornava-se incomodativo e prejudicava o normal desenrolar da sessão. No total, foram
efetuadas 25 sessões com a duração de 50 minutos cada.
A Abordagem Centrada na Pessoa, foi o modelo teórico usado como referência
em todas as intervenções durante o estágio e que se reflete nos casos aqui trabalhados
detalhadamente.
A relação de ajuda centrada na pessoa, é relevante para que se realize um
acompanhamento psicológico adequado, resultando melhor caso esteja adaptada a um
processo de crescimento social ou individual. Trata-se, pois, de uma relação em que
uma das partes proporciona ao outro um melhor desempenho para os desafios da vida,
bem como a tendência para o amadurecimento e desenvolvimento (Rogers, 1977).
Segundo Nunes (1999) conceber uma relação de ajuda ou dispor-se a ajudar, é
diferente de indicar procedimentos ou conceder respostas. Então, uma relação de ajuda é
estabelecer condições que assegurem ao outro deslindar o caminho harmonioso e em
simultâneo com a sua individualidade ter criatividade e ser congruente para transpor os
obstáculos ou contratempos.
Reportando ao acima descrito, este caso é apresentado com a inicial do nome
fictício de A.
83
10.1 Dados bibliográficos.
A. nasceu em Portugal, tem 43 anos, divorciada. É a filha mais nova de uma
fratria
de 3 irmãs.
10.3 Observação.
A., apresentou-se com um ar limpo e cuidado. Dificuldade em fixar o olhar.
Mãos trémulas. Discurso fluído, mas ansioso.
Mostrou-se disponível para conversar acerca de aspetos da sua história familiar ainda
que sem pormenores. Bom nível de consciência e sem dificuldades de orientação
espácio-temporal.
Distinguiu objetiva e claramente o presente do futuro, e sem falhas ao nível da
memória. Não se verificaram variações ao nível da consciência, motricidade, memória e
atenção.
Frequentemente esfregava as mãos um contra a outra e recorreu ao choro.
Utilizou vocábulos obscenos quando se referia ao pai da filha. Fácil ruborização da face
seguido de choro.
84
Desconhece a existência de doenças graves no seio familiar. Não há história de
ideação suicida na família.
85
Três meses depois, repara que o companheiro muda de comportamento. Atitudes
agressivas repetem-se, discussões sem motivo e controlo excessivo. Passa então a ser
agredida pelo companheiro diariamente e várias vezes ao dia.
O controlo passou a ser de tal forma que ela ficou sem liberdade, pois ele ía
leva-la ao trabalho e busca-la ao final do dia. Quando falava com a mãe e ele dava conta
atirava com telefone para o chão. “Eu tinha vergonha de dizer à minha mãe o que se
estava a passar.” O seu telefone e os cartões do banco foram-lhe retirados. “Eu tinha
muito medo dele.” Ele puxava-me os cabelos e arrastava-me pelo chão.” Havia dias em
que A. não conseguia ir trabalhar pois tinha marcas no corpo e na face.
Ainda assim não tinha permissão para ir ao médico.” Ele saía de casa e deixava-
me trancada no quarto nem as necessidades podia fazer.” A., vivenciou momentos de
pavor e pânico. “Às vezes abeirava-me da janela… e gritava a pedir socorro.”
Entretanto engravidou e as agressões violentas continuaram. Quando iam às
consultas A. também não tinha permissão para falar. “Ele é que falava e nunca se
ausentava. Queria sempre entrar nos gabinetes. Era um sufoco.”
Após o nascimento da filha, A. com a ajuda do patrão decide ir pedir ajuda às
instituições. O processo evoluiu e certo dia a Instituição retira A. e os filhos da casa e
coloca-os numa casa de abrigo onde permaneceram. Foi um momento em que as
emoções e sentimentos se misturavam. “Eu só queria sair dali antes que ele chegasse.”
Não obstante, A. continuou a deslocar-se para ir trabalhar sob ameaças e perseguições.
Foi um período de grande esforço e sacrifício pois trabalhava longe e quando chegava à
casa de abrigo tinha tarefas atribuídas para realizar e tratar dos filhos. Ainda assim,
sentia que estava em segurança.
Um ano depois, A. consegue alugar uma casa e sai da casa de abrigo. Refere ter
medo que ele apareça lá e dorme com armários encostados às portas. Continua a ser
perseguida e maltratada na rua pelo ex companheiro ou por alguém a mando deste.
Quinzenalmente vai entregar a filha ao pai pois assim ficou estipulado pelo tribunal. A.,
relata que é desesperante, uma grande tortura, principalmente porque a filha não quer
estar com o pai. “Mas se ela não quer porque é que o tribunal obriga?” É com grande
desânimo que refere que fica com a sensação de ir entregar a filha para que esta sofra
ainda mais. “Nunca mais tenho sossego. Mas agora eu não tenho medo dele”. Tornou-se
uma pessoa desconfiada e insegura “ando na rua sempre a olhar para os lados para ver
se vem alguém atrás de mim.”
86
A. sente-se culpada por ter acreditado no ex companheiro e este ter-se revelado
diferente. Culpabiliza-se principalmente por ter permitido que os filhos assistissem a
atos tão violentos sem que conseguisse fazer nada para evitar. “Ele nem respeitava as
crianças que viviam e assistiam a tudo. Há dias em que se sente sem força e muito
desmotivada.” Estou farta de não puder andar na rua à vontade.
Mas quando olho para o sorriso da minha filha ganho outra vida. Os meus filhos
são tudo para mim e por eles faço tudo.”
Foi acompanhada em consultas de psicologia no Hospital, e refere que foi muito
bom. “Se não fosse assim eu não tinha aguentado tanto. Elas ajudaram-me muito.”
O emprego ajudou-a a manter-se ativa e motivada embora muitas vezes se
sentisse no limite e vencida pelo cansaço. Conta que foi com o esforço e trabalho que
conseguiu alugar a casa onde agora habita com os filhos.
Atualmente, A. enfrenta um processo judicial de guarda paternal. Demonstra
vontade na resolução célere desta situação pois impede-a de regressar à sua terra natal
com os seus filhos. Relata com amargura que as instituições parecem estar paradas e
não avançam com o processo, além de o ex companheiro estar constantemente a colocar
requerimentos e fazer queixas infundadas atrasando assim o desenrolar do processo. Os
filhos também já demonstraram vontade de se juntarem à família materna.
A. recorda com alegria os momentos que passava com a família na sua terra
natal e o modo de ser das pessoas. “É lá que está a minha gente, é lá que me sinto feliz
com a minha família e posso andar à vontade e os amigos.” Adianta que foi muito feliz
enquanto viveu na sua terra natal.
Sente-se desadaptada ao meio e fora do seu contexto social e familiar. Não tem
amigos, nem vida social. No entanto, tem mantido um relacionamento recente com uma
pessoa que trabalha no estrangeiro, mas que a tem apoiado muito. A filha gosta muito
dele e quando estão juntos sente que tem uma família de verdade.
Pediu ajuda porque quer “voltar a ser feliz. Eu era uma pessoa feliz, sorridente e
de bem com a vida”. Apesar de já ter sido acompanhada em psicologia, observou o fato
de a filha (que também é acompanhada em consultas de psicologia) se encontrar melhor
na atitude e comportamento em casa.
87
anamnese, mas também para a escuta e entendimento do pedido. Para facilitar e melhor
sintetizar, as sessões foram resumidas de forma agrupada em 5 sessões cada.
Antes de iniciar a sessão, foi cuidadosamente explicado à A., que toda a
informação partilhada não seria revelada por questões deontológicas e éticas. A duração
das sessões - 50 minutos semanalmente.
Foi igualmente explicado que após esta avaliação e apurados os resultados seria
informada dos mesmos a fim de compreender a sua problemática, bem como a avaliação
que no final do estágio seria feita e da necessidade de ser encaminhada para continuação
do acompanhamento psicológico caso se justificasse.
Salienta-se que A., era assídua e pontual nas consultas. Aconteceu apenas uma
vez em não conseguiu estar presente, tendo justificado e remarcado solicitando nova
consulta.
1ª a 5ª sessão
A., apresentou-se na consulta sozinha e tinha um aspeto limpo e cuidado. Como
acima referenciado, nesta consulta foram recolhidos dados para elaborar a anamnese e
adquirir mais informação com o objetivo de conhecer melhor a sua história de vida.
Colaborou e comunicou bastante, porém com alguma dificuldade em fixar o olhar.
Apresentava humor deprimido e choro fácil. Demonstrou grande necessidade de falar.
Verborreica e gestos enérgicos. Respondeu a todas as solicitações com à vontade, tendo
revelado particularidades que lhe provocam sofrimento.
Verificada a necessidade de A. em falar e para impulsionar o desenvolvimento
de uma relação terapêutica que se pretendeu boa e baseada na confiança, prosseguiu-se
com o incremento da escuta ativa e da compreensão empática.
Iniciou a sessão dizendo que quer ajuda “para voltar a ser feliz, eu era uma
pessoa sorridente de bem com a vida.” Desde 2007 que sofre de violência doméstica por
parte do seu companheiro. Este mostrou ser uma pessoa e após A ter vindo com o filho
para uma vida em comum, revelou ser uma pessoa má. A viveu situações de ameaças, e
impossibilidade de comunicar com a mãe e com outras pessoas. Foram-lhe retirados o
telemóvel e o cartão multibanco “às vezes estava a falar com a minha mãe, ele chegava
e tirava-me o telefone e desligava”. Não contava a ninguém porque tinha muito medo
do companheiro e temia pela vida do filho além de não querer preocupar os seus
familiares. Quando ela não fazia o que o companheiro pretendia, este vingava-se no
filho da A.
88
As agressões eram constantes e após ter engravidado da filha era pontapeada na
barriga. Ficava com marcas no corpo, olhos negros e se alguém perguntava, A
prontamente dizia que tinha caído. Não tinha liberdade para falar com ninguém, nem
sair.
O companheiro ia leva-la ao emprego e à saída ia busca-la. Nunca tentou reagir,
pois, sabia que iria piorar a situação. Vivia atormentada, com muito medo e sentia-se
também insegura.
Um dia, o patrão sabendo da situação, chamou-a e disse que queria ajuda-la.
Durante a hora do almoço A. foi à Segurança Social que de imediato entrou em contato
com a UMAR. A partir daí, as instituições tomaram conta da situação e providenciaram
a saída da A. com os dois filhos da casa para uma Instituição.
Entretanto, o Tribunal inicia um processo de paternidade que decide que a filha
de ambos deve visitar o pai de quinze em quinze dias. Porém, o pai maltrata a filha o
que provoca em A um grande sofrimento “
Na sequência desta informação colocada no processo do Tribunal, este decide
que o pai passa a visitar a filha quinzenalmente na presença de um técnico e apenas
durante duas horas. A. sofre cada vez que vai entregar a sua filha ao pai porque a
menina vai contrariada. Sente-se revoltada, e impotente porque pensa que se a filha não
quer ver o pai, o Tribunal não devia obrigar. Alem disso, sofre por ter de se cruzar com
o pai da filha. Relata que quando se aproxima para entregar a filha, é vítima de
agressões verbais e ameaças.
89
A., evita aproximar-se do pai da filha, para não ser enxovalhada “ele chama-me
nomes feios, mas graças a Deus eu não sou nada disso.” Era frequentemente
desrespeitada assim como a filha. Certo dia, e a pensar nos filhos, A pensou que era
capaz de tudo “eu era outra pessoa, não era eu… capaz de fazer alguma coisa (põe a
cabeça entre as mãos e chora).” Passou a usar uma navalha para se defender e ameaça-lo
“levei tempo a pensar… colocava a navalha na minha mala sempre que ia entregar a
minha filha.”
Tinha sentimentos de raiva e ódio em relação ao pai da filha e um dia ao
entregar a filha “ele aproximou-se e eu com a navalha na mão, disse-lhe se te aproxima
mais de mim, mato-te.” A., sentia-se desconfortável com a dualidade de personalidade,
esta não é a sua forma de estar “eu não sou assim… estava com medo que ele avançasse
e eu o golpeasse.”
Cada vez que ia entregar a filha, ficava com o coração “partidinho. Porque é a
minha filha e eu ia entrega-la a um homem que me fez tanto mal e a menina também.”
Tem medo que algo aconteça sem que consiga protegê-la. A situação é de tal forma que
a filha de A. arranja sempre algo para não ir à visita. “Vai contrariada, triste e com
medo. Até se queixa com dor de barriga.”
O fato de não receber do por parte do pai da filha a respetiva pensão de
alimentos estipulada pelo Tribunal deixa A., revoltada pois “ser pai é também sustentar
os filhos.”
Entretanto, A. refere que quando começou a relacionar-se com outra pessoa, o
pai da filha fez tudo para ficar com a menina, incluindo as idas ao tribunal testemunhar
que não vivia em união de fato e assim sendo a componente financeira apenas
sobrevinha do seu trabalho. “Ele queria era ficar com a menina para ser eu a pagar-lhe a
pensão de alimentos.”
Alude que o pai do seu filho mais velho se encontra noutra cidade e a filha mais
nova tem este pai mau que não é capaz de dar um abraço à menina. Assim, A. tenta
preencher as lacunas deixadas pelos progenitores, minorando o sofrimento emocional
dos filhos. “Eu trabalho para não faltar nada aos meus filhos, sou arrumada e ainda lhes
dou mimos e carinho.”
Relata que ao ser vítima de violência doméstica, e aquando da relação com o pai
da filha, muitas vezes foi obrigada a vivenciar situações com as quais não concordava,
mas não tinha força para contrariar. O medo a vergonha e a insegurança, eram
sentimentos constantes na vida de A.
90
Apesar de tudo, o nascimento da filha, foi um acontecimento que trouxe muita
alegria para A. “…fiquei muito feliz e foi a melhor coisa que me aconteceu.” Porém,
aos três anos a filha, não andava, não falava e não tinha dentes. Assustada, “corri tudo a
pedir ajuda. Pensei, que a minha filha ia ficar assim para toda a vida.”
Atualmente, a filha encontra-se melhor e “faz a vida dela normal” o que deixa A.
muito feliz. Sente-se vitoriosa por ter conseguido vencer esta batalha que julgava
intransponível.
Quando o tempo está bom e na altura das festividades, lembra-se sempre da terra
natal. A alegria volta quando ouve as pessoas da sua terra ou as amigas a falar. “Lá toda
a gente parece que se conhece. Gosto da alegria e da euforia… aqui as pessoas são mais
fechadas.” É nestes momentos que A. se lembra que era uma pessoa diferente, sem
sofrimento.
Arrepende-se de não ter aceitado ficar na UMAR do Norte. Pesou o fato de ter
de se deslocar todos os sábados com a menina que era ainda muito pequena para fazer
viagens tão longas e entrega-la ao pai. Este sentimento é relevante pois caso A. assim
tivesse optado, estaria mais apoiada pela família. Chora ao lembrar-se do homem com o
qual se envolveu e que lhe roubou a felicidade “ele é um monstro, não tem outro
nome.”.
A receava que o pai da filha a fizesse desaparecer, pois “ele por dinheiro era
capaz de fazer tudo.”
91
Sente que a filha pode ficar desprotegida e exposta às manifestações do pai que
se revelou ser uma pessoa que “parece que tem prazer em maltratar os outros…
continua a perseguir-me. Quando não é ele, paga a alguém para me perseguir.”
Refere que apesar de estar a viver sozinha com os filhos continua a ser
perseguida e várias vezes foi fazer queixa à polícia. Pensa que o pai da filha jamais irá
descansar “enquanto não me matar.
Ele é infeliz e não quer que os outros sejam felizes.” Para A., isto causa
instabilidade emocional, ao ponto de sonhar e ter pesadelos. “Sonho que ele me está a
fazer mal, a tapar-me a cara com a almofada, a apertar-me a garganta.” Tem lembranças
que a deixam profundamente triste e às vezes parecem ser tão reais que só fica
descansada quando acorda e verifica que está tudo bem.
Lembra-se em simultâneo de vivenciar uma grande instabilidade familiar
durante a sua infância. Na fase adulta, relata a sua relação com o pai do filho e a
estabilidade emocional e financeira. Após o divórcio, incentivou o filho a manter uma
relação estável com o pai, embora este pouco o procurasse. Atualmente o filho apenas a
reconhece como sendo ela a desempenhar o papel de mãe e pai.
A., sente-se impotente face às instituições que parecem estar paradas sem
resolver a sua situação. Não consegue refazer a sua vida emocional e viver livremente
“parece que roubei alguma coisa a alguém. O pai da minha filha não me deixa em paz.”
Manifesta uma grande vontade de ir para a sua terra de origem.
92
Existem momentos em que A. pensa em fazer desaparecer o pai da filha para que
ambas pudessem viver livremente “se eu pudesse fazia-o desaparecer para eu e a minha
filha vivermos sossegadas, livres e em paz.” Desta forma, era mais fácil e podiam ir
visitar a mãe de A. e estar no seio de pessoas que a acarinham. Pensa que a sua filha
também se sente muito bem naquele ambiente onde não falta a segurança e o apoio.
93
O fato de aguardar o desenrolar da questão do tribunal, condiciona-a e deixa-a
impotente para realizar qualquer ato relativo à sua vida pessoal e também com a filha
menor.
Para uma melhor compreensão da dinâmica familiar de A. apresentamos o
genograma.
10.7 Genograma.
1944 1948
74
70
Alberto Madalena
1944 1948
74
70
A lberto Madalena
10 1
s
1 Drogado / V iciado em drogas
Figura 1. Genograma de A.
94
semanal. Consideramos ter sido positivo para a estabilidade emocional de A. na medida
em que a própria ao expor livremente as suas angústias, preocupações, frustrações ou
tristezas, se sentia compreendida e acolhida na sua dor. Relativamente às problemáticas
que lhe estão associadas, ponderamos que se refletem em estados ansiosos, depressão e
status pós-traumático.
Porém, A. demonstra uma grande vontade de sair o mais rapidamente possível
desta circunstância que a tem desgastado física e emocionalmente.
No decorrer deste acompanhamento psicológico, foram aplicadas como
referência as atitudes da Abordagem Centrada na Pessoa, na realização das entrevistas,
em que procuramos que as seis condições necessárias e suficientes estivessem presentes,
com especial destaque para o olhar incondicional positivo e a compreensão empática.
Rogers (2009) realça que deste processo resulta uma profunda prova de cada
pessoa, entenda assim o paciente que a faculdade de escolher a via de uma aparência
exterior de ilusão ou assumir os riscos e considerar a realidade e vivendo em
conformidade.
A compensação das necessidades básicas do organismo bem como o equilíbrio
de outras mais complexas é a expressão máxima da Tendência Atualizante na
Abordagem Centrada na Pessoa. Assim, o primado desta teoria, possibilita por um lado
conceber a confirmação do self e o processamento de novos insights, bem como a
perspetiva do cuidar do organismo, culminando assim na concordância entre o
sentimento das vivencias reais e as suas representações (Capelo 2000).
Ainda segundo o mesmo autor, não havendo concordância, a hipótese de a
pessoa entrar em incongruência é relevante, dando origem a uma desordem entre o
simbólico e a realidade. O comportamento advém desta situação, pode ser inconstante e
prejudicar a personalidade individual. Assim, esta a teoria de Rogers, tem como pedra
angular, a capacidade que a pessoa tem para se auto realizar nas suas competências,
optando por escolhas adaptadas e de forma autêntica (Capelo, 2000).
A Não Diretividade, tem como objetivo a utilização do tempo pela pessoa da
forma que esta entenda. É nesse tempo que a partilha das vulnerabilidades se efetua,
sem retraimento, através de uma comunicação livre (Rogers, 1989).
Este conceito é o ponto de partida da conceção rogeriana para a Abordagem
Centrada na Pessoa que confia que o indivíduo traz à nascença vastos recursos para a
auto compreensão dos comportamentos, atitudes e modificação o seu pensamento. Em
95
suma, entende-se que desta forma, se crê que a pessoa pode fazer as suas opções,
apropriar-se de novas informações – insight e encontrar o equilíbrio (Raskin, 1998).
Atendendo ao estado da A. no momento, foi mantida uma atitude de
autenticidade e aceitação com respeito pela partilha da sua realidade, o que
proporcionou o início de um processo de desenvolvimento com liberdade para a
adaptação à sua vida.
Traçamos como objetivo para este acompanhamento psicológico, o aumento da
motivação, a aceitação da sua história real e a diminuição do estado de ansiedade,
progredindo assim para a realização pessoal e estabilidade emocional.
Na sequência das sessões e da relação de ajuda, verificamos que A. vivenciava
progressivamente uma alteração de self não obstante as dificuldades, percebemos no seu
estado uma reorganização do self, pela relevância de se tornar autónoma e vontade de
mudar a sua situação. Pese embora o fato de ainda se encontrar em sofrimento, A. sente-
se mais tranquila e inicia gradualmente a tomar decisões adequadas e coerentes consigo
mesma. Notamos uma maior motivação para prosseguir com a sua nova relação
amorosa e encontrar estratégias para visitar os familiares.
Tendo por principio o respeito pela pessoa presente, ao seu ritmo e com especial
atenção ao aqui e agora, e à relação, foi de forma calma e serena que este processo
terapêutico se desenrolou considerando a aceitação da partilha durante as sessões.
Desta forma e sem perturbar o seu próprio processo, quanto à liberdade e
responsabilidade confiamos que a Tendência Atualizante conduzisse A. paulatinamente
a aceitar as suas experiências e por consequência, dar um novo significado à sua vida.
Observamos que a progressão se efetuou ao nível da tomada de consciência das
aptidões, facilitando o seu desenvolvimento e acedendo aos processos de simbolização.
Ainda assim, pensamos que A. beneficiaria se estivesse inserida no seu contexto
social e com o apoio familiar, na medida em isto iria refletir-se no seu estado de
consciência e no processo de descoberta de si mesma o que iria induzir
consideravelmente o seu comportamento.
Por outro lado, as situações vivenciadas principalmente na idade adulta, aliado
ao acompanhamento psicológico anterior que não teve continuidade, impossibilitaram
uma evolução mais saudável, dando lugar a uma personalidade deprimida e ansiosa, da
qual se percebe o sentimento de culpa, insatisfação, inadequação e frustração na sua
conduta enquanto mãe, esposa e amiga.
96
A prevalência de sintomas de depressão, ansiedade e stress pós-traumático, nas
mulheres vítimas de violência doméstica é maior, quando comparada a mulheres não
sujeitas a esta situação, embora não se registe diferenças do grau de ocorrência daqueles
sintomas entre as mulheres vítimas de violência física e psicológica e as mulheres
vítimas apenas de violência psicológica (Blasco-Ros, SánchezLorente, & Martinez,
2010).
No decorrer das sessões, diligenciaram-se esforços utilizando a compreensão
empática, no sentido de tornar evidente os recursos que A. dispõe para promover o
desenvolvimento da sua autoconfiança, autonomia, bem como a conceção de insights
essenciais à organização do seu projeto de vida e à sua evolução pessoal. Por último,
concluímos que apesar dos retrocessos durante o processo, ficamos convictos da auto-
organização e desenvolvimento da A. Contudo entendemos que o acompanhamento
psicológico é indispensável, tendo em consideração todo o processo traumático que tem
vindo a experienciar, mas principalmente nesta fase difícil da sua vida.
Salienta-se que foi pertinente este acompanhamento psicológico pela
aprendizagem, ainda que a inexperiência e o receio de não ser capaz de estabelecer a
relação de ajuda e assim afetar todo o processo fosse uma preocupação constante.
As reuniões de supervisão no local de estágio para discussão de casos, bem
como as aulas de seminário de estágio na Universidade Autónoma de Lisboa,
revelaram-se de suma importância como auxílio e suporte com indicações valiosas para
a prossecução e concretização dos objetivos desta tarefa, que no geral acreditamos ter
ajudado A.
97
Na relação com o pai da filha, este revelou-se muito cedo que não era a mesma
pessoa, mas A permaneceu até a situação se tornar insuportável. Ponderamos a hipótese
de haver uma dependência das relações uma vez que é nesta dinâmica e contexto que
apesar de tudo se sente confortável e segura.
Considerou-se importante a apresentação deste caso na medida em que nos
permitiu não só a prática no acompanhamento psicológico, mas por se perceber ser uma
importante preparação à prática de acompanhamento psicológico, permitindo assim
aprofundar conhecimentos ao nível das consequências psicológicas da violência
domestica.
As dificuldades sentidas no desenrolar deste processo prenderam-se com a
utilização de estratégias para a especificidade desta vasta problemática, bem como o
assegurar de uma aliança terapêutica. A colaboração do orientador de estágio, facilitou
este processo, confiando no trabalho e contribuindo com o seu apoio.
10.10 Conclusão.
No final, observamos que A. melhorou o seu comportamento relativamente ao
medo que sentia quando estava na rua e também quanto à sensação de estar a ser
perseguida. Passou a ter mais gosto e a investir nela própria.
Constatamos que A. se sentiu compreendida e acolhida no seu sofrimento, na
medida em verbalizou os seus sentimentos de forma espontânea.
Ao longo das sessões, falou livremente dos aspetos pessoais que a inquietavam.
Foi sem dúvida um grande desafio e simultaneamente um momento de aprendizagem.
Além do caso acima explorado o estágio visava também a apresentação de um
caso de avaliação psicológica.
98
próprio comportamento e passar de um locus de controlo externo para interno, uma vez
que culpabiliza os familiares pelos acontecimentos de vida.
Pretende-se facilitar e potenciar os recursos pessoais, promovendo o bem-estar
psicológico face a si mesmo e ao seu contexto familiar.
A avaliação psicológica realizada, visa a obtenção de informações precisas
através de provas de desempenho intelectual e de funcionamento da personalidade.
Estes elementos, permitem-nos uma compreensão global do funcionamento da M que
nos encaminha para uma análise mais consciente e clara da pressuposta problemática,
considerando também a relação terapêutica e os seus desenvolvimentos.
A avaliação psicológica desenrolou-se durante quatro sessões. A primeira sessão
serviu para esclarecer o motivo que levou ao pedido desta avaliação assim como os
procedimentos intrínsecos ao próprio processo. Então, foi claramente explicada a
confidencialidade de toda a informação concedida. Consequentemente realizou-se a
entrevista psicológica para conhecimento da sua história bem como o motivo do pedido.
Na segunda sessão, aplicou-se o teste de Rorschach e na terceira realizou-se o
teste SCL 90-R.
Segundo Simões (1994), uma das especialidades do psicólogo, é a avaliação
psicológica. Assim, o conhecimento teórico e técnico próprio, é essencial neste campo,
na medida em que se refere a um processo de integração e de aquisição de informações
importante. Face às particularidades do avaliado, a utilização de variados instrumentos,
técnicas, métodos e fontes de recolha de informação, devem ser observadas.
A avaliação psicológica deve ser entendida como um processo de exploração
complementar. Vários são os instrumentos e de grande preciosidade que possibilitam o
acesso à particularidades e recursos da pessoa, a recolha de valiosos dados que ajudam a
esclarecer um diagnóstico e tratamento, no entanto não sendo definitivos, podem ser
contestados. Este processo é limitado no tempo e realizado por etapas, sendo que a
primeira concerne o consentimento informado, seguido da identificação, esclarecimento
da natureza do pedido ou problema (Ruiloba, 1998).
Após a entrevista inicial, procede-se à formulação de hipóteses que deram
origem ao problema, devendo conter referências dos ambientes, internos e situacionais.
Designam-se então as dimensões a avaliar e apuramento dos instrumentos e métodos a
utilizar. Na sequência dos objetivos previamente estabelecidos no processo inicial,
recolhem-se os dados, e efetua-se a respetiva cotação e finalmente, a sua análise
compreensiva (Simões, 1994).
99
11.1 Identificação.
M tem 47 anos de idade, vive com o marido e dois filhos. Tem como
habilitações
académicas o décimo segundo ano de escolaridade. Trabalha numa loja de instrumentos
musicais. O marido trabalha numa instituição pública como motorista.
11.2 História clínica.
M é uma mulher adulta, apresentou-se de forma asseada e com roupa alinhada.
Manifestou no primeiro contato alguma desconfiança e pouco à vontade. Estava triste,
cabisbaixa. Estabeleceu pouco contato visual no primeiro momento, tendo melhorado
ao longo da sessão. Manteve as mãos fechadas, palma com palma. No final da sessão
mostrou-se satisfeita e estabeleceu contato.
11.3 Motivo do pedido.
M apresentou-se na consulta por mal-estar, cefaleias, insónias e um pedido
pessoal
“preciso de ajuda. Sozinha não consigo.” Diz que se sente nervosa por várias situações
da sua vida, sendo que a principal neste momento, é a questão financeira. É a primeira
vez que vem ao psicólogo, embora já tivesse sentido essa necessidade em fases
anteriores.
11.4 Síntese da 1ª sessão.
M apresentou-se na consulta com ar triste e cabisbaixo. Aspeto limpo e cuidado,
no entanto, pouco investida.
A mãe de M tem um feitio distante e é frontal. Não tem memória de vê-la
doente. O pai é mais reservado e teve problemas cardíacos quando margarida tinha 20
anos.
“O meu pai, apesar de tudo, nunca me tratou diferente das minhas irmãs. Sempre esteve
presente na minha vida.”
M é a irmã do meio de uma fratria de 5 irmãs. A sua gravidez não foi planeada e
ao nascer, os pais ficaram “dececionados. O meu pai recebeu-me muito mal, pois já
tinham duas meninas e estava à espera de um rapaz. A minha mãe tem um feitio mais
distante. Olhou para mim e eu era diferente das minhas irmãs - mais gordinha.
Durante a infância brincava sozinha, pois sempre se sentiu posta de parte. As
irmãs mais velhas tinham idades mais próximas assim como as mais novas e M
“sobrava sempre.”
100
Quando tinha 3-4 anos, os pais contam que foram passar férias em França. O pai
coloca-a num sítio enquanto ajudava a mãe a tirar as malas do comboio. Quando
chegaram, “eu estava muito assustada e chorava muito.”
Na adolescência, ficava sempre em casa. “Não saia com as irmãs mais velhas
porque não tinha idade, nem ia a rua com as mais novas porque era muito grande e
gordinha e era uma vergonha.”
Como estava sempre sozinha, isolada, “imaginava histórias, escrevinhava e
falava sozinha.” Na escola não tinha amigos na escola nem pertencia a nenhum grupo.
Teve uma educação muito tradicional. Estudo até do 12º ano. Chumbou 2 anos e quando
terminou o secundário, as irmãs mais novas também se candidataram à faculdade.
Sentiu que o seu tempo tinha passado e era difícil os pais suportarem três filhas
ao mesmo tempo na faculdade.
Entrou então para o mundo laboral. Trabalhou numa loja de instrumentos
musicais. Com o primeiro ordenado, tirou a carta de condução.
Começou a namorar aos vinte anos com um rapaz que conhecera durante uma
festa na terra dos pais e com quem casou passado pouco tempo.
Após o casamento foi viver para a terra natal dos pais, onde na infância e
juventude passavam as suas férias. Contraiu um empréstimo para abrir uma papelaria.
Trabalhava na papelaria e cuidava dos filhos. O marido era camionista e tinha
horários complexos. Durante quatro anos tudo correu bem. Entretanto, M adoece e num
curto espaço de tempo, é operada à barriga e ao pulso. Quase que em simultâneo, o
marido perde o emprego, concorre para a Câmara Municipal e é admitido. Vem viver
para a casa dos sogros, deixando M e os filhos na terra natal.
Neste momento, perdeu a papelaria e encontra-se a pagar a dívida do
empréstimo e dos fornecedores.
Iniciou a sessão expressando que “venho cá para pedir ajuda, porque nos últimos
anos as coisas têm-se complicado a todos os níveis e eu não consigo resolver nada.” O
agregado familiar, os seus pais, o seu emprego… “tudo. Sinto que já não tenho forças
para carregar com isto tudo e faço as coisas do dia a dia por fazer. “Entre outros fatores
a sua maior preocupação prendia-se com a situação financeira e com o filho de 10 anos.
Sente-se desmotivada e agora “só faço as coisas por causa dos meus filhos.”
101
11.5 Descrição da história clínica.
M, é a terceira filha de uma fratria de cinco irmãs. Nasceu de uma gravidez de termo,
mas era diferente das irmãs. “Eu nasci gordinha e sempre fui mais gordinha. O meu pai
esperava um rapaz.”
Estudou até finalizar o ensino secundário e depois resolveu ir trabalhar. As
irmãs têm uma vida boa porque estudaram mais e são licenciadas. A sua atividade
profissional emprego, mantem-na isolada, pois é a única funcionária e o movimento é
pouco. Em criança, lembra-se de estar sempre sozinha. Quando tinha 8 anos, em Paris, o
pai deixou-a sozinha enquanto levantava a mala do comboio e sentiu-se aterrorizada.
Não brincava com as irmãs mais velhas, pois “sentia-me pequena” e nem com as irmãs
mais novas porque “sentia-me já crescida.
Estava sempre no meu canto, falava e brincava sozinha. M tinha 18 anos,
quando o pai foi operado ao coração e nessa fase, teve que assegurar o transporte da
mãe e das irmãs para o hospital e para casa, pois era a única que tinha carta de
condução.
Quando se casou, M foi residir em Castelo Branco com o marido. Trabalho em
empregos precários e mais tarde, tornou-se proprietária de uma papelaria que tinha
bastante movimento.
Aos 44 anos foi operada ao braço e à barriga, altura em que a situação financeira
de deteriora, devido ao fato de se ter de ficar de baixa para recuperar da intervenção
cirúrgica. Esta situação teve como consequência o não cumprimento dos prazos de
pagamento aos fornecedores e despesas foram-se acumulando. O marido na altura era
camionista e ganhava pouco. Mantém uma relação conflituosa com o marido. Refere-se
ao marido como “duro, pouco carinhoso e gosta de beber.”
Mudaram de casa há cerca de um ano e inicialmente foram residir para a casa
dos seus pais, mas a sua mãe não reagiu bem. Desta forma, M apesar das condições
financeiras serem desfavoráveis, procurou casa para residir com o marido e com os seus
filhos. Sente-se triste e abandonada pela família.
11.6 Resultado dos instrumentos de avaliação utilizados
Face à sintomatologia apresentada e para melhor compreendermos este caso,
para além da entrevista psicológica e da observação, optamos por aplicar provas
psicológicas que nos pareceram mais adequadas para uma análise objetiva: o teste
projetivo de Rorschach que com a utilização dos diversos recursos pode indicar se a
pessoa é capaz de executar com competência e inteligência as suas tarefas e como se
102
pode lidar com novas tarefas, tendo em consideração a forma e a sua capacidade de dar
respostas rápidas, bem elaboradas e de forma tranquila. Foi aplicado neste caso clínico,
pois as suas possibilidades interpretativas abrem caminho para a compreensão
minuciosa do ser humano, nas suas motivações mais profundas, permitindo um
conhecimento dom passado da pessoa e do seu comportamento futuro.
Aplicamos o teste de avaliação de sintomas, SCL-90 R - porque avalia um
grande número de padrões da personalidade e perturbações emocionais, tendo em conta
que o objetivo se resume à pesquisa de problemas psicológicos e de sintomas
psicopatológicos de desajustamento fundamental.
Todavia, pensamos que os testes não constituem por si só um fator indispensável
para a compreensão geral do comportamento da pessoa, nem para o seu diagnóstico.
Entendemos que uma verdadeira recolha e análise da história clínica manifestam-se
como elementos cruciais para a conceção do funcionamento geral da pessoa e sua
problemática.
11.6.1 Teste de Rorschach (Rorschach, 1921).
Este teste foi criado em 1921 por Hermann Rorschach. É um teste psicológico
projetivo, composto por 10 pranchas de manchas de tintas impressas em cartões (5 a
preto e branco e cinco a cores). É dada indicação ao sujeito para descrever o que vê nas
pranchas e mostra-se uma a uma. Desta forma, é dado um significado a este estímulo,
bem como a atribuição de sentido que é gerada a partir da mancha de tinta. A pessoa ao
dar a resposta do que vê na mancha de tinta, fala de si próprio e na forma como projeta
um significado verdadeiro sobre a sua vida. Posteriormente, o profissional incentiva a
pessoa através de cada mancha de tinta a ajudá-lo a rever o que ela viu nas suas
respostas originais de forma mais específica em cada figura, com base nas respostas
anteriores (Meyer et al. 2011).
O Rorschach é um teste projetivo. Os testes projetivos contribuem de forma
determinante para o diagnóstico e também para indicações de psicopatologia, pois
permite que a investigação individual seja holística e dinâmica. Enquanto instrumento
de observação, engloba qualidades psíquicas particulares que instituem no indivíduo
uma ação/reação em determinado espaço e tempo relacional e situacional. (Marques,
1999).
Chabert (2003) explica que este teste projetivo constituído por dez pranchas de
tinta cujas diferenças se evidenciam pela sua natureza unitária, específica inteira e
compacta, assim como obediência no que a uma forma bilateral diz respeito.
103
Para aceder à natureza e às qualidades do funcionamento mental através de
fatores como a relação do objeto, a natureza da angústia, a representação de si, os
mecanismos de defesa, utilizamos o teste projetivo de Rorschach. Este teste facilita a
perceção em função das preocupações da pessoa na atualidade, por efeito das
características indeterminadas do próprio material.
A aplicação do teste projetivo de Rorschach teve a duração de 15 minutos.
Margarida apresentou um discurso fluente e organizado. Manteve uma atitude
colaborante, no entanto manifestou desagrado pelas pranchas.
Seguidamente, serão apresentados os resultados referentes ao teste de
Rorschach.
Alves et al. (2001) afirma que o teste de Rorschach, enquanto instrumento de
observação, engloba qualidades psíquicas particulares que instituem no indivíduo uma
ação/reação em determinado espaço e tempo relacional e situacional.
Chabert (2003), explica que este teste projetivo constituído por dez pranchas de
tinta que se diferenciam pela sua natureza unitária, específica, inteira e compacto assim
como pela obediência no que a uma configuração bilateral diz respeito.
Foi aplicado neste caso clínico, o teste Rorschach (Rorschach, 1921) pois as suas
possibilidades interpretativas abrem caminho para a compreensão minuciosa do ser
humano nas suas motivações profundas. Desta forma, a aplicação do teste Rorschach,
permitiu um conhecimento do passado da pessoa e do seu comportamento no futuro.
A aplicação do teste projetivo de Rorschach teve a duração de 15 minutos. M
apresentou um discurso fluente e organizado. Manteve uma atitude colaborante, no
entanto manifestou desagrado pelas pranchas.
Seguidamente serão apresentadas as respostas de M a cada uma das pranchas,
bem como o seu comportamento perante cada uma, o tempo que demorou a dar a
resposta e a cotação respetiva.
11.6.2 Análise dos Traços Salientes.
Modo de Apreensão (G) - A M, apreende a realidade de forma global G% =
40%, acima dos valores normativos. D% = 56% abaixo da normalidade.
Determinantes (F) - A M, utilizou o pensamento formal de boa qualidade
atendendo que o F+% (76%), está acima dos valores normativos. O F% (68%) encontra-
se dentro dos valores normativos.
TRI – Tipo de Ressonância Íntima ou Tipo de Vivência – O TRI (2K> 1C) é do
tipo introversivo misto. Revela que a M tende a investir mais no mundo interno, na
104
fantasia e mais criativa. Porém, sendo menos prática, também gosta de estar sozinha e
tende a ter mais dificuldades nas relações sociais. A forma de funcionamento da M em
superfície e em profundidade, seguem em modos opostos tendo em conta que o TRI e a
forma complementar- FC, têm direções contrárias, indicando presença de angústia.
RC - Existe reação à cor e verifica-se presença de angustia, atendendo a que o
IA (40%) se encontra acima dos valores normativos.
Conteúdos A% e H% - O A% (24%) está baixo dos valores normativos,
indicando um funcionamento de imaturidade, inadequado para a idade da M face às suas
preocupações essenciais. Revela uma identidade instável e uma elevada preocupação
com os conteúdos relacionais. O H% (32%) está acima dos valores normativos.
Após a recolha dos dados e conveniente tratamento de acordo com os
parâmetros e fundamentos de cotação do protocolo e análise do psicograma e da medida
que nos serviu de base para a interpretação das respostas analisadas, concluímos que
quanto ao funcionamento psíquico, a M, revela boa capacidade percetiva e associativa,
na medida em produziu um número de respostas (25), dentro da normalidade, o que
poderá indicar um sinal de inteligência.
No que se refere ao eixo cognitivo, revela integridade e investimento na
realidade. As respostas em G% (40%), acima dos valores normativos, indicam a sua
capacidade de apreender de forma global, procurando uma unidade de controlo sobre a
realidade exterior, não tendendo para a particularidade. Os valores D%=56%, abaixo da
normalidade, indicam a baixa capacidade de análise dos detalhes do ponto de percetivo,
uma oposição no que ao mundo exterior e ao “eu” se refere, mostrando desinteresse pela
realidade e pelo concreto. Tendo em consideração os valores do F% = 68% dentro da
normalidade, pode dizer-se que não existe perda da forma e de racionalização.
O F+% 76%, acima da normalidade, mostra-nos que a M. e no que à resolução
dos conflitos diz respeito, gera angústia, uma vez que não é eficaz no uso de
mecanismos de defesa.
No eixo da socialização, M, tem dificuldade em identificar-se com o outro.
Indica-nos um baixo grau de socialização, afastando-se do mundo relacional. Considera-
se a existência de uma certa acomodação e dificuldade relacional interpessoal e com o
outro.
No que concerne aos movimentos de identificação, M é uma pessoa que tende a
afastar-se do mundo relacional humano, apresentando assim baixo grau de socialização.
O H% = 28% acima da normalidade, pode indicar-nos que M se vê como uma pessoa
105
real e inteira, tendo em conta que os valores de H=32% estão acima da normalidade.
Tendo obtido baixo índice de socialização, e uma vez que as respostas às banalidades
(3) estão abaixo da normalidade, M é no geral, uma pessoa que se afasta do mundo
social.
Obteve assim um baixo grau de socialização. No eixo efetivo, a M pode
considerar-se uma pessoa intraversiva, valorizando mais os aspetos internos, e menos
virada para os estímulos que recebe do exterior.
A vida real não é coerente com a sua personalidade e por consequência isto pode
gerar conflitos intrapsíquicos. Quanto à reatividade às cores pastel, existe alterações na
produtividade e nos afetos mais organizados, o RC %=40%, dentro da normalidade. É
uma pessoa afetiva, não controla de forma excessiva a emergência dos objetos parciais
ligados às preocupações corporais arcaicas, sendo o IA%=20%, acima dos valores
normativos.
Em síntese, M apresenta traços de personalidade de caráter introspetivo, com
alguns conflitos intrapsíquicos, ansiedade e dificuldade de socialização.
Porém, destaca-se o fato de os resultados apresentados não pretenderem definir,
mas exclusivamente sugerir um perfil de personalidade do analisado.
11.7 S.C.L. 90-R – Symptom Checklist (Derogatis, Rickels & Rock, 1976).
A adaptação Portuguesa deste Inventário foi realizada por Baptista em 1993
(Martins, 2011).
Constituído por 90 itens, o S.C.L. 90-R é um inventário cujo objetivo é a
autoavaliação de sintomas de desarmonização emocional. A cotação e interpretação
efetua-se aos 90 itens, em 9 dimensões de sintomas a saber: Somatização, Obsessões-
Compulsões, Sensibilidade Interpessoal, Depressão, Ansiedade, Hostilidade, Ansiedade
Fóbica, Ideação Paranóide e Psicoticismo, permitindo alcançar os três índices globais:
Índice Geral de Sintomas, Número de Sintomas Positivos e Índice de Sintomas
Positivos. Utiliza-se para aplicar a adolescentes a partir dos 13 anos de idade e a
adultos. As respostas do S.C.L. 90-R correspondem a uma escala de tipo Likert de 5
pontos (0- Nunca; 1- Pouco; 2 – Moderadamente; 3- Bastante; 4-Extremamente), na
qual o indivíduo revela o nível de angústia que sente relativamente aos diferentes itens.
Regista-se os valores adquiridos na folha de perfil, a partir da qual se realiza a
interpretação dos resultados. Seguidamente somam-se os valores de cada dimensão e o
resultado é dividido pelo número de itens que constituem cada dimensão. Por último,
106
transportam-se os valores obtidos em cada um dos itens, perfazendo assim o total
(Derogatis, Rickels & Rock, 1976).
A informação obtida através deste teste é de caráter específico, atentando ao fato
de o sujeito estar envolvido de forma direta nos procedimentos de avaliação. Contudo,
registam-se como pontos menos positivos o excessivo tempo de aplicação que se torna
indispensável, embora não seja utilizado na cotação, e a sua enorme extensão
(Derogatis, Rickels & Rock, 1976).
Em termos psicométricos, considera-se como propriedades a boa consistência
interna, cujos níveis são calculados através do alfa de Cronbach com variação entre 0.84
(Sensibilidade Interpessoal) e 0.90 (depressão) (Degoratis & Lazarus, 1994, citado por
Soares, 2007).
O método de teste-reteste, que permitiu calcular a estabilidade temporal no
espaço de uma semana, registou valores de correlação que se diferenciam entre 0,80
(Hostilidade) e 0,90 (Ansiedade). O estudo psicométrico efetuado alcançou elevados
valores de consistência interna, o Alfa de Cronbach, diversificou entre 0.74 e 0.97 e,
quanto à consistência teste-reteste os coeficientes alfas registados foram de 0.78 e de
0.90 (Degoratis & Lazarus, 1994, citado por Martins, 2011).
A avaliação psicológica precedeu às sessões de observação, permitindo desta
forma a compreensão do caso e a o modo de aplicação dos instrumentos de avaliação,
análise e em conjunto com outros elementos de avaliação interpretar os resultados. É
através da observação que podemos entender como se aborda a questão da
confidencialidade do material fornecido pela pessoa, assim como gerir o tempo da
sessão.
Conforme referido anteriormente, a aplicação deste teste aponta para padrões de
sintomatologia clínica. No caso de M, foi relevante o uso deste instrumento na medida
em nos permitiu perceber, avaliar a intensidade dos sintomas e queixas apresentadas
através dos resultados obtidos.
11.7.1 Valores em escala.
Na avaliação do teste SCL-90-R, M apresenta os seguintes valores, consoante as
escalas de: somatização (t=36); obsessão compulsão (t=24); sensibilidade interpessoal
(t=30); depressão (t=45); ansiedade (t=30); hostilidade (t=11); ansiedade fóbica (t=11);
ideação paranoide (t=18); psicotismo (t=32).
Através dos resultados desta prova de avaliação, verificamos que os valores mais
elevados se registam nas escalas de depressão, sensibilidade interpessoal, psicotismo,
107
ansiedade e somatização. De salientar que M estava a ser medicada com
antidepressivos, mas durante as consultas, manteve-se sempre participativa e atenta.
Segundo os autores Cameirão e Meireles (2005), os antidepressivos provocam
alterações bioquímicas no organismo e consequentemente um estado pré mórbido. No
entanto, comprova-se que a psicoterapia tem um contributo benéfico coadjuvado com a
farmacoterapia, concorrendo nas várias fases das perturbações que afetam a pessoa na
esfera pessoal, psicológica e física.
Estes resultados remetem-nos para a possibilidade de existir um sofrimento
significativo, posto que o valor em referência obtido para cada uma das dimensões deve
situar-se em ≥ 2,5 (Cyr, McKenna-Foley & Peacock, 2010).
Esta avaliação leva-nos a concluir que existe uma cogitação no pensamento de
M.
108
11.9 Genograma.
1938
1940
80
78
Fernando
Lurdes
1938
1940
80
78
Fernando
Lurdes
1998 2008
20 10
1998 2008
20 10
Bernardo Rodrigo
Símbolos de
Genograma
Masculino Feminino
11 1
1 A lcolismo
Figura 2. Genograma de M
109
O pai, mais reservado esteve sempre mais próximo da M. “O meu pai, apesar de
tudo, nunca me tratou diferente das minhas irmãs. Sempre esteve presente na minha
vida”
Mantem uma relação distante com a mãe. A M tem memórias de estar sempre
sozinha e isolada brincava e falava sozinha - “imaginava histórias, escrevinhava e falava
sozinha.”
Verifica-se que emocionalmente, M demonstra baixa auto estima e tristeza.
Revela necessidade de agradar aos outros e ao mesmo tempo ser reconhecida pelo que
faz.
Da observação clínica, sentimos que a M é uma mulher adulta, cuja motivação se
submete ao estado emocional e afetivo e também do investimento do núcleo familiar. O
reconhecimento é importante na medida em que na ausência deste, a M fica sem
vontade de investir nas relações, desmotiva-se e procura o isolamento.
O resultado das provas de avaliação psicológica utilizadas, indicam-nos que a M
é uma pessoa que apresenta baixo grau de socialização, tende a afastar-se do mundo
relacional.
Apresenta traços de personalidade de caráter introversivo, com alguns conflitos
intrapsíquicos, depressão, ansiedade e dificuldade de socialização. Revelam ainda a
possibilidade de existir um sofrimento significativo.
Em resumo, e no seguimento das sessões de avaliação, M demostrou ser uma
pessoa amistosa, mas muito carente.
Aceitou com facilidade e entusiasmo o proposto, manifestando sempre
momentos de ansiedade, agitando a folha e movimentando a esferográfica, não
procurava o contato ocular e ruborizava a face ao mesmo tempo que respondia às
questões.
Consideramos que esta se devia a dificuldades em lidar com a sua situação,
necessitando de incentivo diante do seu constrangimento. Esta situação foi ultrapassada
com estímulos e elogios à sua atividade e colaboração neste processo.
110
A mãe era muito distante, o pai esteve sempre mais presente na sua vida. A sua
relação fraternal não era boa na medida em que sendo a filha do meio, não saía com as
mais velhas, porque era criança, nem se enquadrava nas brincadeiras das mais novas,
porque era muito grande.
Assim M isolava-se e estava sempre a inventar histórias e a escrevinhar.
Na escola, não tinha amigos, nem pertencia a nenhum grupo. Apenas ia às aulas
e voltava para casa.
Quando entrou para o mundo laboral, trabalhou numa loja de instrumentos
musicais, onde permanecia sozinha.
Após o casamento, foi viver para a terra natal dos pais, onde o marido trabalhava
como camionista. Os horários eram muito difíceis o que o obrigava a estar ausente por
longos períodos. A sua relação com o marido é conflituosa.
Em suma, ao longo do seu percurso de vida, observamos que a M se manteve
solitária, mas com grande dependência da moldura familiar. Apresenta um locus de
controlo externo, uma vez que culpabiliza os seus familiares pelo seu fracasso e em
situações de maior dificuldade opta pela fuga em vez de arranjar soluções. e protege-se
na medida em que faz as coisas sempre a pensar no que vai receber em troca.
Atualmente, demonstra tristeza, isolamento, desmotivação e sem vontade para fazer
nada.
Consideramos que a M, tende a isolar-se, e perante situações mais difíceis,
coloca a culpa no outro visto não encontrar soluções. Evita confrontos na medida em
que se sente incapaz de resolver as questões. Encontra no pai e no filho mais novo o
apoio que necessita.
Desta forma, concluímos que M vivencia um quadro de depressão e ansiedade,
beneficiando de psicoterapia de apoio potenciando assim as suas qualidades humanas
rumo ao crescimento, progresso e mudança.
Abordando o processo de desenvolvimento da pessoa importa, pois, salientar a
relevância dos pais principalmente durante a infância e a forma como esta experiencia e
sente os sentimentos de apreço e amor das pessoas significativas tanto para si como para
os pais. Estas relações que se estabelecem na fase da infância com o ambiente e em
simultâneo com o seu funcionamento biológico presente, favorecem a emergência da
imagem gradual de si (Nunes, 1997).
111
12. Reflexão Crítica
Ao longo dos vários anos que compõem uma licenciatura e posteriormente, o
mestrado, somos continuamente preparados para uma realidade que depende muito da
nossa dedicação, empenho e não menos importante, a contínua formação.
Ao deparar-me com o serviço clínico de um ACES, constatei que de facto, existe
uma aliança entre e os diversos conhecimentos transmitidos e adquiridos com a prática
clínica.
No entanto, as dificuldades surgem quando estamos justamente a
trabalhar/intervir diretamente com as pessoas e também, aquando do manuseamento dos
instrumentos de avaliação que à partida deveríamos estar capacitados a aplicar.
Todavia, este procedimento que no início nos pareceu complicado, ao longo das
aplicações, tornou-se mais fácil conciliar e seguir as metodologias que constituem a
avaliação.
Com a concretização do estágio curricular, foi-me facultada em simultâneo a
oportunidade de enriquecer a minha aprendizagem ao nível profissional e especialmente
ao nível pessoal.
Profissionalmente permitiu-me alargar o contacto com diversas problemáticas e
interagir com outros profissionais no contexto dos Cuidados de Saúde Primários.
Pessoalmente destaca-se o sentimento relacionado com um grande crescimento
interior, uma maior capacidade de estar em compreensão e empatizar com o outro e
consequentemente uma responsabilidade acrescida perante a especificidade das
situações apresentadas.
Considero que algumas vezes o sentimento de uma enorme insegurança esteve
presente motivado pela pressão a que estávamos expostos na qualidade de estudantes.
Esta fase exigiu-me uma maior paixão e dedicação pelo desempenho profissional. As
dificuldades sentidas foram ultrapassadas, devido à boa comunicação existente naquele
contexto.
Houve também espaço para sentir alguma angústia face à tomada de decisões e
discussão de situações na sua particularidade.
No entanto, a disponibilidade profissional e a experiência ajudaram a dissipar
este estado. A contínua tensão e ansiedade, associadas ao desejo de vencer foram no
final ultrapassado.
112
Concluo com um provérbio português que fez parte da minha base educacional
“o saber não ocupa lugar”. Assim, e pensando em novos desafios, sou e serei
efetivamente uma aprendiza no que à área da psicologia diz respeito.
Contudo, acredito que esta postura não irá desviar a confiabilidade, nem a
competência ao meu profissionalismo, pois pretendo manter a humildade profissional na
certeza de que desta forma existirá espaço para reflexão sobretudo na forma como
comunico e atuo enquanto profissional.
113
Mas, foi deveras desafiante considerando a responsabilidade que temos a cabo, o
trabalho que nos compete fazer e os desafios que surgem diariamente, aos quais
devemos responder.
Lembro-me da primeira triagem que assisti, no dia 2 de novembro de 2016, e do
quão nervosa e entusiasmada estava. Na altura, senti que ainda não estava
psicologicamente preparada para dar uma consulta de acompanhamento, e que ainda
não sabia quando me iria sentir.
As maiores dificuldades foram sentidas na condução da entrevista psicológica, e
o modo de intervenção.
A novidade perante as situações, o não saber fazer e o medo de errar foram
sentimentos constantes principalmente no início do estágio.
Por isso foi tão importante assistir às consultas de triagem. Foram muito úteis
para futuramente, conseguir ganhar maior segurança, e à-vontade com os pacientes.
A realização de sessões de avaliação psicológica foi extremamente benéfica no
sentido em que permitiram estar em contato com situações que fazem parte do
quotidiano profissional nesta área.
Ao nível da minha primeira consulta de intervenção, recordo-me de ser
desafiante e assustadora ao mesmo tempo. Tratava-se de uma senhora de 64 anos, cuja
problemática se relacionava com a morte do marido. Tratou-se de um caso que me
exigiu alguma capacidade de compreensão emocional no sentido de suportar a tristeza
daquela mulher, bem como alguma revisão de literatura acerca da temática do luto.
Com o auxílio das supervisões foi-me possível desenvolver uma maior
aprendizagem na área do apoio psicológico, baseada no modelo da Abordagem
Centrada na Pessoa, para esta causa em particular.
Na sequência das reuniões mensais (Pedopsiquiatria, CPCJ), observei uma nova
abordagem pedagógica aos casos clínicos e desenvolvi maior sentido crítico acerca da
minha forma de intervir.
As formações tiveram como ponto fulcral, a partilha de conhecimentos no
âmbito da psicologia e em ligação com outras áreas, numa perspetiva transversal e
multidisciplinar.
As aulas de seminário de estágio na Universidade Autónoma de Lisboa com a
professora Mónica Pires, revelaram-se fundamentais para aumentar a minha confiança
na intervenção psicológica.
114
Através da apresentação semanal de casos, discussão de novas formas de
intervenção, consegui ganhar maior consciência reflexiva sobre os casos.
Através da prática delineada, tomou-se consciência da forma de intervir no
sentido de corrigir os erros e melhorar o desempenho no acompanhamento e avaliação
psicológica.
Aprendeu-se a desenvolver uma postura humilde perante a intervenção, e de
procura de conhecimento. Tomou-se consciência que a motivação, o retorno ao emissor
sobre o resultado das ações, são fatores fundamentais a ter em conta durante o
tratamento terapêutico.
Na essência, este estágio foi uma experiência de aprendizagem, e conhecimento
que culminou com o sentimento de ter conseguido atingir os objetivos traçados e em
certas situações ficar surpreendida com a forma como este processo se desenrolou.
Concluo que se tratou de uma fase estrutural para o meu crescimento pessoal e
profissional, e que viabilizou a abertura de novas escolhas para a minha entrada no
mercado de trabalho. Neste momento, existe naturalmente um sentimento de entusiasmo
perante o que futuramente será uma constante na minha vida enquanto profissional
habilitada.
14. Conclusão
Este estágio foi muito importante na medida em que tornou possível conhecer os
Cuidados de Saúde Primários, onde se realiza a prestação de serviços no âmbito da
psicologia bem como a sua abrangência e problemáticas.
Assim, observamos que a psicologia neste âmbito representa a possibilidade de
desempenhar diversas tarefas, relacionar-se com profissionais de outras áreas e
instituições e em simultâneo, lidar com múltiplas problemáticas. Esta dinâmica
constituiu em si, aspetos de enriquecimento pessoal e profissional.
Na prática e em contexto real de trabalho na área da psicologia, importa também
perceber qual o verdadeiro papel do psicólogo na organização e principalmente no que
concerne às equipas multidisciplinares, bem como as ligações com outros serviços ou
instituições.
Ao trabalhar em equipas multidisciplinares, constata-se que a qualidade de vida
dos utentes melhora com a intervenção do psicólogo, uma vez que este sinaliza e
promove outras necessidades que aos olhos da equipa médica poderia ser desacautelada.
115
As reuniões com a Equipa de Pedopsiquiatria permitiram o contato direto com
outros profissionais ligados à saúde mental. A inclusão de discussão de casos revelar o
importante papel do psicólogo e da sua intervenção junto dos utentes e das famílias.
As reuniões nas escolas, permitiram entrar num espaço onde os adolescentes
abundam e é necessário reunir estratégias para dar resposta adequada às problemáticas
neste contexto, bem como incluir outros profissionais para em conjunto tornar possível
a promoção de hábitos saudáveis e sensibilizar para a prevenção doenças.
Os casos apresentados nas reuniões com a CPCJ incluíam situações de famílias
destruturadas, onde a dificuldade em recolher dados para melhor entendimento da
situação se tornava evidente. Todavia, foi inegável o esforço conjunto para cuidar da
pessoa que se apresentava e cuja necessidade se fazia sentir nas diversas vertentes.
As reuniões de supervisão contribuíram para cimentar conhecimentos e
sobretudo como apoio. Foram momentos muito encorajadores, de ensino e partilha de
conhecimento. Dessa forma, mantinha-se a motivação para continuar a executar cada
vez melhor a tarefa que estava sob a nossa responsabilidade.
Salienta-se aqui, o apoio dado nas aulas da Faculdade que por um lado nos
transmitiam conhecimento, por outro, serviram como relação ajuda, no sentido em que o
confronto entre a teoria e a realidade bem como as dinâmicas relacionais por vezes
constituíam barreiras a ultrapassar.
Houve espaço para a formação, que constitui parte integrante deste processo e
que ao longo da vida profissional se manterá como forma de atualizar conhecimentos e
progressão contínua.
A aplicação dos conhecimentos da abordagem centrada na pessoa, foi uma
referência constante o que de certo modo facilitou o prosseguimento do estágio e que ao
longo das sessões se notava um maior e melhor entendimento por parte das pessoas
envolvidas.
Constato a síntese final das sessões foram entendidas como um momento
harmonia e conciliação em que por diversas vezes foi verbalizado “tão bom ser ouvido e
compreendido. Obrigada.”
Assim, consideramos que ao estar com a pessoa e indo ao encontro das suas
necessidades e atendendo ao setting, o apoio psicológico foi sentido e também
reconhecido.
Os momentos de empatia com as pessoas existiram e apesar de haver diferenças
nos objetivos, observaram-se benefícios ao nível da proximidade e acolhimento.
116
O papel do psicólogo enquanto facilitador pautou-se para a não observância de
atitudes, julgamentos, mas tendo em conta a disponibilidade e a singularidade de cada
pessoa presente. Desta base relacional e tomando-a como uma aprendizagem, resulta a
aquisição de outros conhecimentos e experiências (Hipólito, 2011).
A relação de ajuda criou-se através dos momentos de partilha sucedendo então a
promoção do desenvolvimento e o crescimento na medida em que se manifestou um
funcionamento melhor para vida atual e também para situações futuras (Rogers &
Wood, 2014).
Por fim, salienta-se o sentimento de enorme gratidão pela opção e consequente
percurso que permitiu uma melhor sensibilidade para lidar com a variedade de situações
que surgem ao longo da vida, no quotidiano profissional e no contexto dos Cuidados de
Saúde Primários em particular.
REFERÊNCIAS
Alberdi, I. (2005). Cómo reconocer y cómo erradicar la violencia contra las mujeres. In
Programa de Prevención de la obra social la Caixa. Violencia: Tolerancia cero
(pp. 9-87). Barcelona: Fundación la Caixa.
117
Aliaga, P., Ahumada, S., Marfull, M. (2003). Violencia Hacia La Mujer: Un Problema
de Todos. Universidade do Chile. Revista Chilena de Obstetricia Y Ginecología.
Vol. 68. Nº. 1. Santiago.
Almeida, J., & Xavier, M (Coords.) (2009). Estudo Epidemiológico Nacional de Saúde
Mental. Relatório. Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Nova de
Lisboa;
Almeida, L. S., Gomes, C. A., Ribeiro, I. D. S., Dantas, J., Sampaio, M., Alves, M., &
Gomes, F. (2005). Sucesso e insucesso no ensino básico: relevância de variáveis
sócio-familiares e escolares em alunos do 5º ano.
Alves, I. C. B., Alchieri, J. C. & Marques, K. (2001). Panorama geral do ensino das
técnicas de exame psicológico no Brasil. Em I Congresso de Psicologia Clínica -
Programas e Resumos. Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 10-11.
http://www.apa.org./ practice/pu/jun17/primary.htm.
118
APA (2000) American Psychiatry Association. Diagnostic and statistical of mental
manual disorders. Fourth edition. Text revision. Washington-DC: American
Psychiatric Association.
APAV (2010). Manual Títono. Para o Atendimento de Pessoas Idosas Vítimas de Crime
e de Violência, Lisboa.
https://apav.pt/apav_v3/images/pdf/Estatisticas_APAV_Relatorio_Anual_2013.
Bacelar, A., Rocha, Joana Simielli Xavier; Flor, Maira de Souza (2012). Abordagem
centrada na pessoa e políticas públicas de saúde brasileiras do século XXI: uma
aproximação possível. Rev. NUFEN, São Paulo, v. 4, n. 1, jun. Disponível em
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-
25912012000100011&lng=pt&nrm=iso.
Barlow, David H. (1999). Manual Clínico dos Transtornos Psicológicos. Porto Alegre:
Artmed.
119
Barros, T. M. (2002). Psicologia e Saúde: Intervenção em hospital geral. Aletheia.
Beck, A. T., Rush, A. J., Shaw, B. F., & Gary, E. (1997). Terapia cognitiva da
Beck, J. S. (1997). Terapia cognitiva: Teoria e prática. Porto Alegre: Artes Médicas.
Blanco, A., & Leon, J. (1994). Health psychology in Spain. European Review of
Applied Psychology, 44 (3), 185-193.
Blasco-Ros, C., Sánchez-Lorente, S., & Martinez, M. (2010). Recovery from depressive
symptoms, state anxiety and post-traumatic stress disorder in women exposed to
physical and psychological, but not to psychological intimate partner violence
alone: A longitudinal study. BMC Psychiatric, 10(1), 1-12.
http://dx.doi.org/10.11.2017/1471-244X-10-98.
Brito, S. (2008). A Psicologia clínica - Procura de uma identidade. Psilogos, 5(1), 63-
68.
Caligor, E.; Diamond, D.; Yeomans, F.E. & Kernberg, O.F. (2009). The interpretive
process in the psychoanalytic psychotherapy of borderline personality
pathology. Journal of the American Psychoanalytic Association, 57, 271-301;
120
Cândido, S., Furegato, F; (2008), Transtornos depressivos: um material didático para a
educação a distância, Escola Anna Nery.
Carmen E. Rieker, P.P., & Mills, T. (1984). Victims of violence and psychiatric
illness. American Journal of Psychiatry, 141, 378-383.
http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid=censos2011_apresentacao&xpid=CEN
SOS.
hhttp://cite.gov.pt.asstscite/downloads/Relat_Lei10_2013.pd
121
Contra as Mulheres e a Violência Doméstica.
Costa, José Martins Barra, (2003), Sexo, Nexo e Crime: Teoria e investigação da
delinquência sexual. Lisboa: Edições Colibri.
Cuijpers, P., Clignet, F., van Meijel, B., van Straten, A., Li, J., & Andersson, G. (2011).
Psychological treatment of depression in inpatients: A systematic review and
meta-analysis. Clinical Psychology Review, 31,353-360.
Cunha, Jurema Alcides (2000). Psicodiagnóstico-V. 5 ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.
678 p.
Cyr, J. J., McKenna-Foley, J. M., & Peacock, E. (2010). Factor Structure of the SCL-
90-R: Is There One? Journal of Personality Assessment, pp. 571- 578.
122
Decreto-Lei n.º 122/97. de 20 de maio.
D'el Rey, G. J. F., & Freedner, J. J. (2006). Depressão em Pacientes com Fobia
Social. Psicologia Argumento, 24(46),71-76.
Derogatis LR, Rickels K, Rock AF (1976) The SCL-90 and the MMPI: a step in the
validation of a new self-report scale. British Journal of Psychiatry; 128: 280-9.
Diniz, M. (2008). No princípio não foi o verbo e outros textos de psicologia. Lisboa:
Edições Colibri.
Doron, R., Parot, F. (1998) orgs. Psicologia Clínica. Dicionário de Psicologia. Vol. I.
São Paulo: Ática, pp. 144-145.
123
Falcke, D., Oliveira, D., Rosa, L. & Bentancur, M. (2009). Violência conjugal: um
fenómeno interacional. Contextos Clínicos, 2 (2), 81-90.
https://doi.org/10.4013/ctc.2009.22.02.
Fennel, V. (1997). Depressão. Em Hawton, K.; Salkovskis, P.M.; Kirk, J. e Clark, D.M.
Terapia cognitivo-comportamental para problemas psiquiátricos – um guia
prático. São Paulo (SP). Martins Fontes.
Flury, M., Nyberg, E. & Riecher-Rössler, A. (2010). Domestic violence against women:
definitions, epidemiology, risk factors, and consequences. Swiss Med.
Franco, A., Sousa, E., & Teixeira, J. A. C. (1992). O psicólogo nos centros de saúde:
dos conteúdos semânticos aos problemas de identidade. Análise Psicológica, 10
(2), 205-211.
Gabbard G.O. & Westen D. (2003). Rethinking therapeutic action. Int. J. Psycho-
Analysis, 84: 823-841.
124
Gandum, J., Seabra, S., Lima, A., Polverente, M., & Cardoso, A. (2002). Avaliação da
depressão por endogamia com sucessivas gerações de autofecundação de
abobrinha'Pira Moita'. Horticultura Brasileira, 20(2).
Gleitman, H., Fridlund, A.J., & Reisberg, D. (2009) Psicologia. 8ª ed.Lisboa. Fundação
Calouste Gulbenkian.
Gobbi, L., Missel & Sinara, T. (1998). Abordagem centrada na pessoa: vocabulário e
Hermann, L. (2000). Violência doméstica: A dor que a lei esqueceu. Considerações sobre
Hilgard, E., Atkinson, R.C. (1976). Introdução à psicologia. São Paulo: Companhia
não publicada.
Hines, D.A., Brown, J. & Dunning, E. (2007), characteristics of callers to the domestic
abuse helpline for men, in journal of family violence, 22, 63-72.
125
Inmujeres (2003): Ley del instituto nacional de las mujeres: poder ejecutivo: secretaria
de gobernación. [página da internet]. Mexico: Instituto nacional de las mujeres;
em: 26. maio.2017]. Disponivel em
http:// cedoc.inmujeres.gob.mx/documentos_download/100199.pdf.
Jens. A B. (2004). Psychologie der Persönlichkeit (3. Aufl.). Berlin: Springer. ISBN 978-
3-540-71684-6.
Leal, I. (2008). A Entrevista Psicológica: técnica, teoria e clínica. Fim de Século: Lisboa.
Licínio, J. et al. (2007). Biologia da depressão. Porto Alegre: Ed. Artmed, 2007.
Lipsky, S., & Caetano, R. (2009). Definitions, surveillance systems, and the
prevalence and incidence of intimate partner violence in the United States. In.
Lisboa, M., Carmo, I., Vicente, L., Nóvoa, António, Barros, Pedro P.; Silva, Sofia
Marques da; Roque, Ana; Amândio, Sofia (2006). Prevenir ou Remediar – Os
Custos Sociais e Económicos da Violência Contra as Mulheres. Lisboa: Colibri.
Loeber, R., & Hay, D. F. (1994). Developmental approaches to aggression and conduct
problems. In M. Rutter & D. F. Hay (Ed.), Developmental trough life: A
handbook for clinicians. Boston: Blackwell Scientific.
126
Machado, C., Gonçalves, M., & Vila-Lobos, A. J. (2002). Crianças expostas a múltiplas
formas de violência. In C. Machado & R. A. Gonçalves (Ed.), Violência e
vítimas de crimes, II: Crianças. Coimbra: Quarteto Editora.
Machado, C., Matos, M. & Moreira, A. I. (2003). Violência nas relações amorosas:
Comportamentos e atitudes na população universitária. Psychologica, 33, 69-
83.
Margolino, G., Gordis, E. B., Oliver, P. H., & Raine, A. (1995). A physiologically based
typology of batterers: Promising but preliminary. Journal of Family Psychology,
9(3), 253.
127
Martins, A. (2012). O universo: teorias sobre sua origem e evolução. São Paulo: Editora
Moderna.
Matarazzo, J. D. (1980). Behavioral health and behavioral medicine: Frontiers for a new
http://dx.doi.org/10.1037/0003-066X.35.9.807.
Matos, B. (2006). Dos maus tratos a cônjuge à violência doméstica: um passo à frente na
tutela da vítima. Revista do Ministério Público, 107, pp.
Menezes, R. L. D., & Bachion, M. M. (2008). Study of intrinsic risk factors for falls in
institutionalized elderly people. Ciencia & saude coletiva, 13(4), 1209-1218.
Meyer, G. J., Viglione, D. J., MIhura, J. L., Erard, R. E., & Erdberg, P.
(2011). Rorschach Perfomance Assessment System: Administration, coding,
interpretation, and technical manual. Toledo, Ohio: Rorschach Performance
Assessment System.
128
Miyazaki, M.C.O.S., Domingos, N.A.M., & Caballo, V.E. (2001). Psicologia da Saúde:
intervenções em hospitais públicos. In: B. Rangé (org.). Psicoterapias Cognitivo-
Comportamentais: um diálogo com a psiquiatria, (pp.463-474). Porto Alegre:
Artmed.
Monteiro, M. & Ribeiro dos Santos, M. (1999). Psicologia. Porto: Porto Editora;
Neves, Sofia, Cunha, Carla, Grangeia, Helena, & Correia, A. (2015). Grupos de reflexão
e ação: uma intervenção psicoterapêutica feminista com mulheres vítimas de
violência na intimidade. Ex aequo, (31):13-28.
129
Oestergaard S., Moldrup, C. (2011) Optimal duration of combined psychotherapy and
pharmacotherapy for patients with moderate and severe depression: A
metaanalysis. J Affect Disord. 2011;131(1-3):24– 36.
OMS (2001). Relatório Mundial da Saúde: Saúde mental: nova concepção, nova
esperança. Recuperado em 10 de jul. 2017:
http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/i006020.pdf
OMS (2002). Relatório sobre a Saúde no Mundo 2001. Saúde mental: nova conceção,
nova esperança.
Ornduff, S. R., Kelsey, R. M., & O’Leary, K. D. (1995). What do we know about
typologies of batterers? Journal of Family Psychology, 9(3), 249.
Papadopoulos, L., & Bor, R. (1998). Psychological counselling in primary health care: a
review. In Petruska Clarkson (Ed.), Counselling psychology: Integrating theory,
research and supervised practice (pp. 119-133). London and New York:
Routledge.
Parker, G., Hadzi-Pavlovic, D., Sengoz, A., Boyce, P., Mitchell, P., Wilhelm, K., &
Brodaty, H. (1994). A brief self-report depression measure assessing mood state
and social impairment. Journal of affective disorders, 30(2), 133-142.
Paulino, L., & Brites, R. (2001). O paradigma rogeriano da pessoa como centro: na
perspectiva da liberdade pessoal, 7. Revista: A pessoa como centro.
130
Pereira, A., Matos, M., & Machado, C. (2006). Violência sexual na conjugalidade: um
estudo exploratório sobre as narrativas da vítima. Psychological, 41, 119-150.
Pereira, S.G., & Saraiva, C.B. (2014). Perturbações depressivas. In C.B.Saraiva & J.
Cerejeira (Coords.). Psiquiatria fundamental. Lisboa: Lidel-Edições Técnicas,
Ldª.
Pérez Sánchez, L., & Beltrán Llera, J. (2006). Dos décadas de inteligencias múltiples:
implicaciones para la psicología de la educación. Papeles del psicólogo, 27(3).
Perrot, R. (1994). Working with men who abuse women and children. In L. Lupton & T.
Gillespie (Ed.), Working with violence. London: McMillan.
Pinto, A. (2002). Uma leitura comentada de dois artigos de J. Ferreira Marques sobre a
Ribeiro, J P, & Leal, I. (1996). Psicologia clínica da saúde. Análise Psicológica, XIV (4),
67-77.
131
Ribeiro, J P, & Leal, l. (1996). Psicologia clínica da saúde. Análise Psicológica, XIV (4),
67-77.
Rogers, C. (1977). Definições das noções teóricas. Em Carl Rogers & Marian Kinget
(Eds.), Psicoterapia e relações humanas, pp. 157-179, vol. I. Belo Horizonte:
Interlivros.
Rogers, C. (1989). Sobre o Poder Pessoal, 3ª. Edição, S. Paulo, Martins Fontes Editora.
Rogers, C. (2004). Terapia centrada no cliente. (S. V. Longa, Trad.) Lisboa: Ediual.
(Obra original publicada em 1951).
Rogers, C. (2009). Tornar-se pessoa. (E. Letras, Trad.) Lisboa: Padrões Culturais. (Obra
original publicada em 1961).
132
Rosmaninho, T. (2005). Violência doméstica manual para os média: informar para
mudar (cord.).
Schotte, C. K.W., Bossche, B.V.D., Doncker, D., Claes, S., & Cosyns, P. (2006). A
biopsychossocial model as a guide for psychoeducation and treatment of
depression. Depression and Anxiety, 23, 312-324.
Silva, L. (1991). A defesa tem a palavra. 3ª ed., Rio de Janeiro, Aide Editora.
133
Tavares, F. (2008). Das lágrimas à esperança: O Processo de Fortalecimento das
mulheres em situação de violência doméstica. 235 f. Dissertação (Mestrado em
Serviço Social) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, 2008.
Teixeira, J. A. C., & Trindade, I. (1994). Psicologia da saúde nos cuidados primários.
Análise Psicológica, 12 (2/3), 345-348.
Teixeira, J.A. Carvalho. (2007). A psicologia e o Centro de Saúde do século XXI. Análise
Psicológica.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=14132478&lng=pt&nr=is
o>.
134
Trindade, I. & Teixeira, J. (2000). Aconselhamento psicológico em contextos de saúde e
doença – Intervenção privilegiada em psicologia da saúde. Análise Psicológica,
1 (18), 3-14.
Trindade, I. & Teixeira, J. (2007). Psicologia nos Cuidados de Saúde Primários. Lisboa:
Climepsi Editores (2ª edição).
Yllo, K. A. (1993). «Trougth a feminist lens: gender, power and violence», in R. J. Gelles
e D. R. Loseke (eds.), Current Controversies on Family Violence: Sage.
Newbury Park, pp. 31-46. Publishing Company.
Walker, L. (1979). The battered woman. New York: Harper and Row.
Whitaker, D. J., et. al. (2007) «Differences in frequency of violence and reported injury
between relationships with reciprocal and nonreciprocal intimate partner
violence», in American Journal of Public Health, vol. 97 (Maio), n. º 5, pp. 941–
947.
Wilson, M.& Daly, M. (1992). The Man Who Mistook his Wife for Chattel. In Barkow, J.,
Cosmides, L. & Tooby, J. (no prelo). The Adapted Mind (pp. 289-322). New
York: Oxford University Press.
Wittchen, H., Kessler, C., Beesdo, K., Krause P, Höfler M., Hoyer J. (2012). Generalized
anxiety and depression in primary care: Prevalence, recognition, and
management. Journal of Clinical Psychiatry 2002; 63(Suppl 8): 24-34.
135
Wynter, E. (2001). La violencia desde una perspectiva de género. Rev Enfermeras 2001;
37(1-2):23-6.
Zuleta, F. (2006), From Pain to Violence- the Traumatic Roots of Destructiveness 2nd
Edition by Felicity de Zuleta (ISBN: 9780470019368) from Amazon's Book
Store. Everyday low prices and free delivery on eligible orders.
136