Artigo Capacitacao Parental

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Capacitação parental para

comunicação funcional e manejo


de comportamentos disruptivos
em indivíduos com Transtorno
do Espectro Autista

MATERIAL
EXCLUSIVO
venda proibida
Capacitação parental para comunicação
funcional e manejo de comportamentos
disruptivos em indivíduos com
Transtorno do Espectro Autista

Leila Felippe Bagaiolo


Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil.
Grupo de Intervenção Comportamental (Gradual), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: leila.bagaiolo@grupogradual.com.br

Claudia Romano Pacífico


Universidade de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil.
Grupo de Intervenção Comportamental (Gradual), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: claudia.romano25@gmail.com

Ana Claudia Carvalho Moya


Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: anacmoya@gmail.com

Lucimara de Farias Mizael


Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: luci.farias@hotmail.com

Fiama Santos de Jesus


Grupo de Intervenção Comportamental (Gradual), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: fiama@grupogradual.com.br

Marina Zavitoski
Grupo de Intervenção Comportamental (Gradual), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: m.zavitoski@hotmail.com

Tatiana Sasaki
Grupo de Intervenção Comportamental (Gradual), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: tatiana.sasaki@grupogradual.com.br

Graccielle Rodrigues da Cunha Asevedo


Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil.
Grupo de Intervenção Comportamental (Gradual), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: gracci.rc@gmail.com

Recebido em: 27.04.2018


Aprovado em: 17.07.2018
Resumo
Os Transtornos do Espectro Autista (TEA) impactam precocemente áreas
importantes do desenvolvimento, como comunicação social e comporta-
mentos repetitivos e estereotipados. Os déficits e excessos comportamentais
desse quadro podem resultar em impacto familiar, com significativa sobre-
carga nos cuidadores em termos emocionais e econômicos. Nesse contexto,
a capacitação dos pais para melhor manejo e estimulação de indivíduos com
TEA se mostra como uma alternativa interessante para atuar tanto nos
sintomas desses indivíduos quanto na sobrecarga familiar. Este é um estudo
piloto de intervenção não controlado multicêntrico para capacitação de 21
cuidadores de indivíduos com TEA com comportamentos disruptivos e
déficits na comunicação. As intervenções foram realizadas em dois serviços
ambulatoriais de referência da cidade de São Paulo e os temas foram
embasados na Análise Aplicada do Comportamento (Applied Behavior
Analysis – ABA). Os resultados demonstraram uma redução significativa
nos comportamentos disruptivos dos indivíduos com TEA, medidos por meio
da Aberrant Behavior Checklist (ABC), e nos sintomas de depressão e an-
siedade dos cuidadores, medidos pelas escalas Hamilton de Depressão e
Ansiedade. Diante da limitação de recursos humanos e da dificuldade de
acesso a tratamentos baseados em evidência na rede pública, propostas de
intervenção em grupo podem ser uma alternativa viável para atingir uma
parcela maior da população.

Palavras-chave
Transtornos do espectro autista. Capacitação parental. Análise do compor-
tamento aplicada. Manejo de comportamentos disruptivos. Treino de comu-
nicação funcional.

INTRODUÇÃO
O quadro clínico relacionado ao Transtorno do Espectro Autista (TEA)
abrange déficits em dois domínios principais: comunicação social e comporta-
mentos repetitivos e estereotipados (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,
2014). Entre as dificuldades na comunicação social são descritos: isolamento
ou falta de interesse em estar com outras pessoas, déficits na atenção com­
partilhada e no simbolismo, diminuição/ausência de contato visual, inabilida-
de para estabelecer amizades e relacionamentos afetivos, dificuldade para
compreender comunicação não verbal. No domínio dos comportamentos res-
tritos e repetitivos é comum a identificação de comportamentos ligados à

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indivíduos com Transtorno do Espectro Autista http://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p46-64
inflexibilidade e à adesão exagerada a rotinas, estereotipias motoras (balançar
para a frente e para trás, flappings, andar na ponta dos pés etc.) ou vocais
(gritos inadequados, barulhos ou sons contínuos), restrição de interesses e
assuntos, e hiper ou hiporresponsividade sensorial (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014).
A prevalência mundial estimada de TEA é de 0,72% a 0,76% e esse
transtorno está associado a grande impacto social (ELSABBAGH et al., 2012;
BAXTER et al., 2015). Ao considerar a estimativa conservadora do único es-
tudo de prevalência brasileiro, devem existir aproximadamente 40 mil crianças
e adolescentes com TEA no estado de São Paulo (PAULA et al., 2011). Os
custos humanos, sociais e financeiros decorrentes das necessidades da pessoa
com TEA são bastante elevados (BUESCHER et al., 2014).
Pesquisas apontam que pais de pessoas com TEA têm maior sobrecarga e
desafios ao longo da vida em comparação aos de crianças sem transtornos do
neurodesenvolvimento (HALL; GRAFF, 2011). As famílias necessitam de apoio
constante e enfrentam desafios como acesso e qualidade de informações e
diretrizes sobre o diagnóstico e tratamentos, incluindo treino de habilidades
e serviços coordenados de suporte médico e jurídico. Além disso, precisam de
habilidade para lidar com seu filho, com a variedade de tratamentos e, em
paralelo, coordenar a condição pessoal, como isolamento social, impacto fi-
nanceiro dos custos e situação emocional familiar (RUSSA; MATTHEWS;
OWEN-DESCHRYVER, 2015). Tais aspectos apontados em relação às dificulda-
des encontradas por pais em indivíduos com TEA tendem a gerar um impacto
negativo na saúde mental desses familiares (TEIXEIRA; MARINO; CARREIRO,
2015; HAYES; WATSON, 2013).
Tal sobrecarga e as consequentes condições desfavoráveis da família de
uma pessoa com TEA tornam imprescindível a capacitação dos cuidadores para
manejo de alguns comportamentos. Entre os modelos de treino parental consi-
derados eficazes, Russa, Matthews e Owen-Deschryver (2015) citam o Positive
Behavioral Interventions and Supports (PBIS), baseado nos princípios da Aná-
lise do Comportamento Aplicada, do inglês Applied Behavior Analysis (ABA).
A ABA é um dos domínios da ciência do comportamento relacionado a
pesquisas no campo aplicado, destinadas ao estudo de comportamentos so-
cialmente aceitos, com parâmetros de validade específicos da área (BAER;
WOLF; RISLEY, 1968). Em relação ao tratamento de indivíduos com TEA,
existem diversos estudos que comprovam a eficácia desse tipo de intervenção
baseada na ABA (WONG et al., 2014). Alguns resultados sugerem efeitos

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positivos relacionados ao funcionamento intelectual, ao desenvolvimento da
linguagem, à aquisição de habilidades da vida diária e ao funcionamento social
(VIRUÉS-ORTEGA, 2010). Vale ainda ressaltar que pesquisas estabelecem
efeitos promissores da intervenção ABA, até mesmo como recurso para a saú-
de pública e políticas sociais no que se refere ao autismo e aos transtornos do
neurodesenvolvimento (PIRES, 2011).
Segundo Maurice, Green e Foxx (2001), os parâmetros para a eficácia da
intervenção ABA incluem o início antes dos 3 anos de idade e a utilização de
procedimentos específicos para cada criança com programas de atividades
abrangentes, ou seja, que estimulem todas as áreas do desenvolvimento. Essas
áreas devem ser progressivas de acordo com as necessidades, aplicadas de
forma intensiva (20 a 40 horas semanais) e individuais, mas que, em paralelo,
também sejam estimuladas em vários outros ambientes e em diversas situações
(GUILHARDI; PACÍFICO; BAGAIOLO, 2009). Recomenda-se que os pais sejam
capacitados para que a pessoa com TEA tenha muitas oportunidades de pra-
ticar as habilidades e para favorecer o processo de generalização, possibilitan-
do, desse modo, que o treino parental atinja o status de formação de “cotera-
peutas”. Assim, o treinamento dos pais pode ser considerado um dos pilares
mais importantes da intervenção comportamental com TEA.
A capacitação proposta por Strauss et al. (2013) recomenda o desenvol-
vimento de protocolos que forneçam parâmetros para capacitação de pais em
relação ao conteúdo e às habilidades a serem ensinados a seus filhos. Esses
procedimentos devem ser realizados, aplicados e, principalmente, ter como
objetivo programado alcançar a generalização desses conteúdos e habilidades
(MAURICE; GREEN; FOXX, 2001; STRAUSS et al., 2013). Baer, Wolf e Risley
(1968) afirmam que a intervenção comportamental precisa incluir o proces-
so de generalização de habilidades, ou seja, estas devem ser mantidas em
vários ambientes e com várias pessoas. Desse modo, capacitar pais significa
planejar a generalização e contribuir de forma eficaz para a modificação de
comportamentos.
Por se tratar de uma intervenção intensiva, de longo prazo e individual,
os custos da intervenção baseada na ABA são elevados. Segundo Beaudoin,
Sébire e Couture (2014), o investimento abrangente em capacitação de pais,
em diversos aspectos e áreas do desenvolvimento, pode até ser uma alternativa.
Utilizando modelos específicos, de acordo com a variabilidade das dinâ-
micas familiares, ponderando entre a utilização dos modelos compreensivos
(treino de múltiplas habilidades) e a capacitação de algumas habilidades

Capacitação parental para comunicação funcional Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento


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específicas mais centrais em determinada fase do desenvolvimento, o custo
pode ser minimizado.
Uma revisão sistemática incluindo estudos de 1990 a 2011 de interven-
ção para TEA indicou que a intervenção aplicada pelos pais é considerada
uma prática baseada em evidências (WONG et al., 2014). Os autores citam
o treinamento de pais como uma entre as 27 práticas comprovadas com efi-
cácia científica para o tratamento de TEA. Nesta revisão, verificou-se que as
principais habilidades treinadas pelos pais foram as de comunicação (inclui
comunicação funcional), de autocuidado, de brincar e de diminuição de
comportamentos disruptivos. Ainda, os pais foram capacitados a realizar
análise funcional e estratégias para a prevenção e manejo de comportamen-
tos disruptivos. É preconizado que a capacitação de pais seja realizada, por
exemplo, com a utilização de técnicas de ensino, tais como: videomodelação
(mostrar vídeos dos procedimentos sendo aplicados durante o treino dos
pais); role play (encenar situações reais para os pais treinarem a aplicação
dos procedimentos); instruções diretas por meio de aulas expositivas e ma-
teriais de estudo.
A eficácia da intervenção com pais, objetivando o ensino de manejo de
comportamentos disruptivos, também foi tema de um ensaio clínico randomi-
zado que ocorreu durante quatro anos de coleta (2010-2014), em seis centros
nos Estados Unidos (SCAHILL et al., 2012). A pesquisa dividiu os participantes
em dois grupos (Treinamento para Pais e Educação para Pais). O primeiro
recebeu instruções e exemplos (por modelação) de como diminuir o compor-
tamento disruptivo. O segundo recebeu apenas informações, sem a modelação.
Os resultados indicaram que o programa de Treinamento para Pais foi superior
ao de Educação para Pais para reduzir comportamentos disruptivos. A pesqui-
sa sugeriu que a capacitação (treinamento) é mais eficaz quando os pais rece-
bem um modelo ao vivo e informações diretas sobre como lidar com compor-
tamentos-alvo (SCAHILL et al., 2012).
Com base nos parâmetros de eficácia discutidos na literatura, o Grupo
Gradual, em parceria com o Teamm (Ambulatório de Cognição Social –
dr. Marcos T. Mercadante, do Departamento de Psiquiatria da Unifesp) e o
Protea (Programa Transtorno do Espectro Autista, do Serviço de Psiquiatria da
Infância e Adolescência do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), desenvolve, desde
2013, um modelo de capacitação de pais, com base em ABA, unindo pesquisa
e prestação de serviços a partir do ensino de diferentes habilidades: manejo

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http://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p46-64 Tatiana Sasaki, Graccielle Rodrigues da Cunha Asevedo
de comportamento e comunicação, atividades de vida diária (AVDs), brincar
e repertórios pré-acadêmicos. Durante os três primeiros anos, buscou-se cons-
tantemente delinear um modelo de capacitação de pais com algum grau de
controle experimental. Escalas pré e pós-testes foram introduzidas, bem como
foram redimensionados os registros de comportamentos-alvo ao longo dos
encontros e, por fim, em 2016, definiu-se como objetivo principal dos grupos
o ensino de comunicação funcional e o manejo de comportamentos disrup­
tivos, o que é uma demanda premente da população que frequenta esses
ambulatórios. Estudos apontam que ensinar a comunicação tem sido um dos
principais objetivos na capacitação de pais de indivíduos com TEA, já que este
é um dos principais déficits relacionados a esse diagnóstico (BEAUDOIN;
SÉBIRE; COUTURE, 2014).
Dentre os procedimentos que têm sido estudados pelas pesquisas em
Análise do Comportamento considerados eficazes para manejar comportamen-
tos disruptivos – por exemplo, extinção, exercícios físicos, treino de comuni-
cação funcional, interrupção e redirecionamento, time out, intervenção basea­
da no antecedente, reforço não contingente e reforço diferencial (WONG et al.,
2014) –, foram eleitos para ser utilizados na aplicação dos grupos aqueles que
têm um caráter não punitivo e que contemplem o foco no ensino de novas ha-
bilidades, e não apenas na minimização dos comportamentos disruptivos: refor-
ço diferencial de outras respostas (Differential Reinforcement of Behavior –
DRO) e treino de comunicação funcional.
Durante as aulas, nosso enfoque é apresentar aos pais o conceito de re-
forço diferencial, que consiste em ensinar respostas mais apropriadas, dispo-
nibilizando consequências reforçadoras positivas para comportamentos “apro-
priados”, ao mesmo tempo que é feita a extinção do comportamento
disruptivo (VISMARA; BOGIN; SULLIVAN, 2009). Assim como no treino de
Comunicação Funcional, o objetivo é substituir comportamentos disruptivos
por meio do reforçamento diferencial de habilidades de comunicação mais
produtivas do ponto de vista social. Para tanto, deve ser ensinada uma forma
de comunicação conhecida e mais fácil de ser instalada. No caso deste grupo,
a ênfase está no uso de pistas visuais.
Este estudo pretendeu analisar se os procedimentos de manejo de com-
portamentos disruptivos, juntamente com o treino de comunicação funcional,
empregados durante a aplicação dos grupos de capacitação de pais, demons-
traram ser eficazes para a minimização desses comportamentos que dificul-
tam a interação social do indivíduo com TEA, e se, concomitantemente,

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indivíduos com Transtorno do Espectro Autista http://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p46-64
houve melhora nos indicadores de problemas emocionais e de comportamen-
tos dos cuidadores.

MÉTODO
É um estudo piloto de intervenção não controlado multicêntrico para
capacitação de cuidadores de indivíduos com TEA que apresentam comporta-
mentos disruptivos e déficits na comunicação.

Considerações éticas
Todos os participantes assinaram o Termo Livre e Esclarecido (TCLE) e
o projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética com o parecer númro
742.331.

Participantes
A amostra do estudo foi de conveniência. Os participantes foram os cui-
dadores dos pacientes do Protea/Teamm, e o recrutamento da amostra se deu
por meio de anúncios nas redes sociais. Os participantes foram selecionados
por critérios de inclusão e exclusão.

Critérios de inclusão
– Cuidador de indivíduos com diagnóstico de TEA
– Não realizar acompanhamento com terapia ABA
– Demonstrar habilidade de se comunicar com gestos
– Emitir no máximo dez palavras
– Identificar dez figuras e fotos

Critérios de exclusão
– Realizar comunicação diária por meio do sistema Picture Exchange
Communication System (Pecs)
– Falar frases completas

Local
O curso ocorreu às segundas-feiras no Teamm (Ambulatório de Cognição
Social Marcos T. Mercadante – Departamento de Psiquiatria da Unifesp) e às
sextas-feiras no Protea (IPq-HCFMUSP).

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Instrumentos
Os instrumentos utilizados foram:
• Questionário pré-grupo: foi produzido um questionário on-line, envia-
do para pais interessados no curso, como forma de selecionar os par-
ticipantes que estavam dentro do critério de inclusão.
• Escala ABC: foi utilizada a folha de registro da escala ABC aplicada
nos pais. A escala apresenta 58 itens divididos em subescalas (cinco
divisões), sendo elas: I. irritabilidade, agitação e choro (15 itens);
II. letargia e esquiva social (16 itens); III. comportamento estereoti­
pado (sete itens); IV. hiperatividade (16 itens); V. fala inapropriada
(quatro itens) (LOSAPIO et al., 2011).
• A Escala Hamilton avalia pacientes previamente diagnosticados com
depressão, investigando o nível da gravidade dos sintomas e não a sua
existência. A escala utilizada é a versão reduzida que possui 17 itens,
com perguntas que verificam o nível de retardo motor, apatia, ansie-
dade, pensamentos suicidas, desamparo e alterações no padrão de
sono (FREIRE et al., 2014).
• Questionário pós: foi produzido um questionário on-line, enviado para
todos os participantes do grupo de capacitação de pais, no qual eles
poderiam expor sua opinião sobre o curso e proporcionar feedbacks.

Materiais
Foram confeccionadas para o curso as seguintes folhas de registros:
• Questionário de Hipótese Funcional, com oito perguntas referentes ao
comportamento elegido, situações que antecederam tal comportamen-
to e que foram posteriores ao comportamento.
• Folha de Registro de Frequência de Comportamentos Disruptivos. Essa
folha elenca sete comportamentos principais que podem ser apresen-
tados pelos participantes, tais como: chorar, gritar, atirar objetos, agre-
dir a si mesmo, agredir o outro, comportamento repetitivo, jogar-se no
chão, entre outros.
• Folha de Frequência de Comunicação, apresentando diferentes tipos
de comunicação. Assim como outra folha de registro, será utilizada
pelo cuidador em um ambiente de observação diária por 15 minutos.
A barra indicará a quantidade e qual comunicação ocorreu no período
observado.

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• Fotos de itens de interesse da criança.
• Fotos da rotina da criança.
• Materiais (EVA, fitas de cetim, plástico).

Procedimento
Foram realizadas divulgações sobre o grupo nas redes sociais Facebook e
WhatsApp, informando e-mail de contato para os interessados, data de início
e local. Os interessados receberam por e-mail um questionário dividido em três
seções: dados pessoais, tratamentos atuais e repertórios comportamentais e
comportamentos difíceis. A partir desse questionário, foram selecionados os
participantes seguindo os critérios de inclusão e exclusão. Os pacientes dos
dois serviços envolvidos que preencheram os critérios de inclusão e exclusão
foram convidados a participar do grupo.
No primeiro dia de curso foi entregue o TCLE, a folha de frequência de
comportamentos disruptivos e explicado como preenchê-la. As pesquisadoras
também aplicaram as escalas ABC e Hamilton. A escala ABC foi aplicada em
três momentos no curso: no primeiro encontro, no sexto e no 12º dia. Todos os
tópicos foram explicados para os pais e as pesquisadoras leram todas as pergun-
tas para eles. A escala Hamilton foi aplicada no primeiro e no último encontro.
Para capacitar os pais, foram utilizadas aulas expositivas teóricas com
recurso visual e exemplos práticos, modelagem (ensino por aproximação su-
cessiva), modelação (ensino por observação e imitação), exercício de registro
e análise de registro, supervisão com análise de vídeos dos pais e role play.
O curso, realizado em três encontros, auxiliou na produção dos materiais:
um quadro de rotina, um cardápio de preferências e um quadro de acordos.
Nesses encontros foram fornecidos: EVA, plástico para plastificação, figuras de
objetos e outras imagens de preferência gerais, velcro autocolante, papel sul-
fite. No primeiro dia da produção de materiais, foi produzido o quadro de
rotina. Havia sido pedido para que os cuidadores trouxessem figuras/fotos dos
filhos fazendo atividades de rotina, mas caso não fosse possível, seriam forne-
cidas figuras de ações do cotidiano gerais. O mesmo ocorreu com as imagens
do cardápio, priorizando as figuras do cotidiano da criança. No Quadro 1 é
possível observar todo o cronograma e o conteúdo apresentados nos 12 en-
contros realizados com cuidadores. Após o último encontro, foi enviado por
e-mail um questionário para os participantes, no qual eles podiam opinar sobre
pontos de melhoria para os próximos grupos, aspectos positivos e negativos.

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Análise estatística
Visando traçar o perfil epidemiológico dos participantes, foram realizadas
análises estatísticas descritivas de acordo com as características das variáveis
de interesse. Variáveis categóricas foram sumarizadas com base na frequência
de respostas em cada uma de suas categorias. Variáveis contínuas foram su-
marizadas a partir de medidas de tendência central (média e/ou mediana) e
de dispersão (desvio padrão). As variáveis de desfecho e da linha de base
(entre os que aderiram, ou seja, aqueles que entregaram 80% das folhas de
registro e 80% de presença, e os que não aderiram) foram analisadas com
teste T de amostras emparelhadas e de amostras independentes, respectiva-
mente, com nível de significância de 0,05.

Quadro 1 Cronograma e conteúdo apresentados aos cuidadores durante o curso de


capacitação de pais

Atividade entregue
Encontros Atividade no grupo
aos pais

1 – Aplicação da Hamilton – Folha de frequência


– Aplicação da ABC do comportamento
– Elencar o comportamento difícil disruptivo
– Explicação sobre o preenchimento da folha de – Hipótese funcional
frequência
– Explicação sobre o questionário de hipótese
funcional

2 – Aula sobre hipótese funcional – Folha de frequência


– Esclarecimento de dúvidas sobre o do comportamento
comportamento escolhido e preenchimento das disruptivo
folhas de frequência

3 – Aula de hipótese funcional II – Folha de frequência


– Devolutiva do preenchimento da folha da do comportamento
hipótese funcional (dez questionários) disruptivo
– Dúvidas de análise de registro

4 – Aula de manejo comportamental – Folha de frequência


– Dúvidas e debate sobre esse tema do comportamento
disruptivo

5 – Aula de integração sensorial com a terapeuta – Folha de frequência


ocupacional do comportamento
– Dúvidas e debate sobre esse tema disruptivo

(continua)

Capacitação parental para comunicação funcional Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento


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Quadro 1 Cronograma e conteúdo apresentados aos cuidadores durante o curso de
capacitação de pais  (continuação)

Atividade entregue
Encontros Atividade no grupo
aos pais

6 – Aula de comunicação funcional: quadro de rotina – Folha de frequência


e comunicação funcional do comportamento
– Aplicação da ABC disruptivo
–  Feedback do preenchimento das folhas de
frequências

7 – Produção de material – quadro de rotina, cardápio – Folha de frequência


de pistas visuais do comportamento
– Aula (exemplos de quadro de rotina) disruptivo
– Explicação sobre folha de frequência de – Folha de frequência
comunicação de comunicação

8 – Produção de material – quadro de rotina, cardápio – Folha de frequência


de pistas visuais do comportamento
– Aula sobre comunicação funcional disruptivo
– Dúvidas e questionamentos sobre a folha de – Folha de frequência
frequência de comunicação de comunicação

9 – Produção de material – quadro de rotina, cardápio – Folha de frequência


de pistas visuais do comportamento
– Aula de comunicação funcional disruptivo
– Dúvidas e questionamentos sobre a folha de – Folha de frequência
frequência de comunicação de comunicação

10 – Supervisão – discussão dos casos, mostrando os – Folha de frequência


dados das folhas de frequência de do comportamento
comportamento disruptivo, assim como disruptivo
frequência de comunicação – Folha de frequência
de comunicação

11 – Supervisão – discussão dos casos, mostrando os – Folha de frequência


dados das folhas de frequência de do comportamento
comportamento disruptivo, assim como disruptivo
frequência de comunicação – Folha de frequência
de comunicação

12 – Aplicação da Hamilton e ABC


– Finalização e confraternização
Fonte: Elaborado pelas autoras.

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RESULTADO
A amostra acumulativa do grupo apresenta um total de 72 participantes.
As características demográficas dos participantes estão descritas na Tabela 1.

Tabela 1 Frequência dos cuidadores, média de idade dos pacientes da capacitação


de pais e distribuição dos participantes por ambulatórios

Dados dos participantes – Frequência (%)

Mãe 67 (93%)

Cuidador Pai 4 (5%)

Avó 1 (1%)

Dados dos filhos (%)

Masculino 61 (84,72%)
Sexo
Feminino 11 (15,27%)

Idades dos filhos

Média (Desvio padrão) 7,72 (4,83)


Mínimo 2 anos
Máximo 30 anos

Centros de capacitação

Teamm 43 (59%)

Protea 29 (40%)
Fonte: Elaborada pelas autoras.

Os cuidadores que aderiram ao grupo apresentavam uma pontuação na


escala Hamilton significativamente menor do que os que não aderiram. Não
houve diferença significativa nas pontuações da ABC dos dois grupos (Tabela 2).

Tabela 2 Adesão dos participantes do curso de capacitação de pais

Aderiu Não aderiu Participantes que


P
Média (DP) Média (DP) aderiram

ABC 61,47 (27,21) 61,84 (23,00) ,957 21

Hamilton 11,27 (5,06) 15,33 (6,68) ,029 15


Fonte: Elaborada pelas autoras.

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indivíduos com Transtorno do Espectro Autista http://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p46-64
Ocorreu diminuição estatisticamente significativa na pontuação das esca-
las ABC e Hamilton ao final do tratamento para os participantes que aderiram
(Tabela 3).

Tabela 3 Nível de significância apresentado nas escalas

Participantes que
Pré Pós P
aderiram

ABC 61,47 (27,21) 46,52 (21,81) ,002 21

Hamilton 11,26 (5,06) 7,80 (4,41) ,037 15


Fonte: Elaborada pelas autoras.

DISCUSSÃO
Este estudo piloto avaliou o impacto de uma capacitação parental com
foco em manejo de comportamentos disruptivos em cuidadores de indivíduos
com TEA. Dos 72 cuidadores que iniciaram o grupo, 21 completaram todas as
avaliações. De forma geral, os principais achados do estudo demonstraram
melhora nos problemas comportamentais nos indivíduos com TEA e, também,
em alterações emocionais e comportamentais nos cuidadores.
O manejo comportamental no TEA é especialmente complexo e, como já
ressaltado, orientações adequadas para familiares sobre como lidar com o
indivíduo com TEA, principalmente em relação aos comportamentos disrupti-
vos e à comunicação, são fundamentais (BEARSS et al., 2015). Os comporta-
mentos disruptivos são fatores complicadores do manejo e tratamento dos TEA
e, em alguns casos, misturam-se com os sintomas cardinais do autismo. A
avaliação funcional cuidadosa desses comportamentos pode identificar funções
relacionadas a esquivas de demandas, busca de atenção social e desregulações
sensoriais e, por meio de um treino de comunicação emergencial, é possível
muitas vezes prevenir e redirecionar tais comportamentos mais difíceis no dia
a dia do indivíduo e da respectiva família (DURAND; MERGES, 2001; CARR;
DURAND, 1985; WACKER et al., 2013).
Um diagnóstico de TEA tem grande impacto sobre as famílias, com dados
que apontam que o nível de estresse é maior até do que em outros transtornos
mentais, como Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH),
Transtorno Opositor-Desafiador (TOD), depressão, entre outros (HAYES;
WATSON, 2013). Bearss et al. (2015) e Da Paz e Wallander (2017) mencionam
em artigos que comportamentos disruptivos que causam prejuízos na vida

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58 São Paulo, v. 18, n. 2, p. 46-64, jul./dez. 2018 Lucimara de Farias Mizael, Fiama Santos de Jesus, Marina Zavitoski,
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cotidiana e nas tarefas diárias dos indivíduos com TEA aumentam a probabi-
lidade de gerar sintomas ansiosos e depressivos nos cuidadores. Neste estudo,
os resultados apontam para uma melhora desses sintomas nos cuidadores que
participaram do grupo de capacitação parental. São necessários mais estudos
para identificar se a melhora dos cuidadores é resultado da melhora dos com-
portamentos disruptivos nos indivíduos com TEA e/ou de outros fatores, como
o suporte oferecido pelo grupo.
É importante ressaltar a dificuldade de comparecimento aos 12 encontros,
pois, do total de 72 participantes, somente 21 deles estiveram presentes em
todos. Foram elencados possíveis impeditivos e dificultadores para a presença
nesses encontros, como a ausência de suporte familiar para ajudar nos cuida-
dos com os indivíduos com TEA, a dificuldade de executar e compreender as
orientações para instalação de novas habilidades, as dificuldades financeiras
ou de transporte, a gravidade dos sintomas comportamentais nos pacientes e,
também, a gravidade dos sintomas depressivos e ansiosos nos cuidadores.
Embora as taxas de abandono encontradas neste estudo sejam altas quan-
do comparadas às taxas encontradas em ensaios clínicos (COOPER; CONKLIN,
2015), elas são semelhantes a taxas encontradas em outros estudos que inves-
tigam o abandono ao tratamento em situações de “mundo real” (ZAYFERT,
2005). Entretanto, taxas de abandono elevadas implicam limitações nas ava-
liações estatísticas e na generalização dos dados, sendo uma limitação deste
estudo. As possíveis explicações levantadas para a taxa de abandono encon-
trada são eventos corriqueiros na prática clínica. Os próximos passos podem
fornecer informações importantes para entender que perfil de pacientes tem
melhor aderência ao tratamento, otimizando recursos em centros de atendi-
mento públicos.
Os dados encontrados neste trabalho e em trabalhos anteriores dessa
equipe de pesquisadores (BAGAIOLO; PACÍFICO, 2018) possibilitam pensar
em futuras intervenções e novas propostas de pesquisas tanto para melhorar
a eficácia e o alcance quanto para aprimorar pontos não abordados na pesqui-
sa atual. A possibilidade de avaliação direta do repertório inicial dos indivíduos
com TEA pelos pesquisadores é muito desejável. Além disso, os próximos es-
tudos devem incluir uma avaliação cuidadosa, por meio de questionários pré-
-intervenção, de possíveis fatores relacionados à participação, tais como: con-
dição socioeconômica, distância entre os centros dos encontros e a região de
moradia dos familiares e suporte psicossocial destes.
Outro aspecto importante é em relação às práticas nas clínicas brasileiras
e ao tratamento baseado em evidências para indivíduos com TEA. A ausência

Capacitação parental para comunicação funcional Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento


e manejo de comportamentos disruptivos em São Paulo, v. 18, n. 2, p. 46-64, jul./dez. 2018 59
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de profissionais capacitados em análise do comportamento e o alto custo das
intervenções tornam o acesso a esse tipo de tratamento na rede pública bas-
tante restrito. Com isso, a utilização de grupos de capacitação de pais amplia
a acessibilidade e a possibilidade de multiplicação desse conhecimento. Outros
esforços de capacitação parental vêm sendo desenvolvidos, como um ensaio
clínico randomizado multicêntrico, cujo objetivo principal é desenvolver o
treino parental por meio do procedimento de videomodelação para o ensino
das habilidades, pré-requisitos fundamentais de contato visual e atenção com-
partilhada. A intervenção baseada em ABA com o uso desse procedimento
minimizou custos e foi uma possibilidade de uso em grande escala, por não
necessitar do ensino ao vivo (BAGAIOLO et al., 2017).
As limitações deste estudo incluem a ausência de um grupo controle e a
ausência de uma avaliação direta dos indivíduos com TEA. O fato de os cui-
dadores, examinadores cegos para a intervenção, terem participado do grupo,
representa um passo importante para a verificação da eficácia desta interven-
ção. Entretanto, a escassez de tratamentos embasados em evidência nos ser-
viços públicos disponíveis no Brasil, a gravidade dos quadros e o caráter assis-
tencial dos serviços envolvidos justificaram até o momento que esses
tratamentos fossem oferecidos a todos os interessados. Os próximos passos
podem incluir estudos randomizados controlados, mas acreditamos que mes-
mo na ausência destes, os dados atuais já representam um avanço na literatu-
ra nacional disponível.
Por fim, é importante ressaltar que continuar este trabalho é de extrema
relevância para o cenário brasileiro. Por meio dos procedimentos apresentados
para a capacitação de pais, é notável que essas ferramentas sejam replicadas
por outras pessoas e em outros cenários, o que pode acarretar maior número
de indivíduos sendo atendidos e, consequentemente, um aumento em nossa
prestação de serviço baseada em evidências.

Parental training for functional communication


and management of disruptive behavior in
individuals with Autism Spectrum Disorders

Abstract
The Autism Spectrum Disorder (ASD) affects some important developmental
areas early in life, such as social communication, which may result in

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60 São Paulo, v. 18, n. 2, p. 46-64, jul./dez. 2018 Lucimara de Farias Mizael, Fiama Santos de Jesus, Marina Zavitoski,
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repetitive and stereotyped behaviors. The impact of the disorder on families
exert significant burden on caregivers both emotionally and economically.
In this respect, parental training for better handling and stimulation of ASD
individuals is an interesting alternative for dealing with the symptoms of
these individuals as well with family burden. This is a non-controlled,
multicenter intervention pilot study to train twenty one caregivers of ASD
individuals displaying disruptive behavior and deficit of communication.
The interventions were carried out in two outpatient reference centers in
the city of São Paulo and the topics were based on Applied Behavior Analysis
(ABA). Results showed a significant reduction in the disruptive behavior of
ASD individuals measured by the Aberrant Behavior Checklist (ABC) as well
as in their depression and anxiety symptoms assessed by the Depression and
Anxiety Hamilton scales. Considering the limitation of human resources
and the difficulty in accessing evidence-based treatments in the public
health system, proposals for group interventions may be a viable alternative
for reaching a higher share of the population.

Keywords
Autism Spectrum Disorders. Parental training. Applied behavior analysis.
Disruptive behavior management. Functional communication training.

Capacitación parental para comunicación


funcional y manejo de comportamientos
disruptivos en indivíduos com trastorno del
espectro autista
Resumen
El Trastorno del Espectro Autista (TEA) impacta precozmente en áreas
importantes del desarrollo como comunicación social y comportamientos
repetitivos y estereotípicos. El impacto familiar de estos cuadros produce
un gran peso en los cuidadores tanto en aspectos emocionales como econó-
micos. En este contexto, la capacitación de los padres para mejor conduc-
ción y estimulación de individuos con TEA parece ser una alternativa inte-
resante para lidiar con los síntomas de estos individuos, así como con la
sobrecarga familiar. Este es un estudio de intervención piloto no controlado
multicéntrico para la capacitación de veintiuno cuidadores de individuos
con TEA que presentan comportamientos disruptivos y déficits de comuni-
cación. La intervención se realizó en dos servicios ambulatorios de referen-
cia de la ciudad de São Paulo y los tópicos de los encuentros eran basadas
en el Análisis Aplicado de la Conducta (ABA, sigla em inglés). Los resultados

Capacitação parental para comunicação funcional Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento


e manejo de comportamentos disruptivos em São Paulo, v. 18, n. 2, p. 46-64, jul./dez. 2018 61
indivíduos com Transtorno do Espectro Autista http://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p46-64
demostraron una reducción significativa en los comportamientos disrupti-
vos de los individuos con TEA, medidos a través de la Aberrant Behavior
Checklist (ABC), y en los síntomas de depresión y ansiedad de los cuida­
dores, medidos por las escalas Hamilton de Depresión y Ansiedad. Como
resultado de las limitaciones de recursos humanos y de la dificultad de
acceso a tratamientos basados en evidencia en la red de salud pública, la
intervención en grupo puede ser una alternativa viable para alcanzar una
porción mayor de la población.

Palabras clave
Trastornos del espectro autista. Capacitación parental. Análisis del compor-
tamiento aplicado. Manejo de comportamientos disruptivos. Entrenamiento
de comunicación funcional.

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