A Preparacao de Elenco Que Revolucionou A Interpre
A Preparacao de Elenco Que Revolucionou A Interpre
A Preparacao de Elenco Que Revolucionou A Interpre
DOI: https://doi.org/10.30749/2594-8261.v3n1p69-98
Ismael Queiroz*
called "FT Method") collaborates positively and unique, by form in most of the projects
in which the preparation is found, making them peculiar. With this, all the writing here
perceived can demystify negativities around the same Method and appearing as
legitimate great ally of professionals of the arts and not artists. In the case of the actors,
contributing to improve their ways of acting. Is congruent also for the expansion of the
FT Method and its greater appreciation under the arts of the scene as a whole,
surpassing the effectiveness already shown in successful films in the national cinema,
and now from experiences practices assumed by the writer. It was essential to present
a relation of the FT Method in new works, by another preparer, placing them as
reference and research material. It is pointed out that the use of the tool in the
interpretation of artists is increasingly important for the success of a film. One of the
purposes is to cause a greater reflection on the rupture with stereotyped thoughts in
the posture and relation of the "actor x character".
1 INTRODUÇÃO
1Foi diretor de teatro, dramaturgo e ensaísta brasileiro, uma das grandes figuras do teatro
contemporâneo internacional. (1931-2009)
2Foi um diretor de teatro polaco e figura central no teatro do século XX, principalmente no teatro
1938)
4 Filme dirigido por Héctor Babenco, em 1981.
5 Filme dirigido por Héctor Babenco, em 1991.
6 Filme dirigido por Alain Fresnot, em 2013.
7 Filme dirigido por Walter Salles, em 1998.
8 Filme dirigido por Fernando Meirelles e Kátia Lund, em 2002.
9 Filme dirigido por Sérgio Machado, em 2005.
10 Filmes dirigidos por José Padilha, em 2007 e 2010.
formados como atores. Através de sua preparação e exercícios, ela consegue extrair
de uma pessoa o necessário para passar a verdade de uma cena. Ao contrário do que
Stanislavski propõe em ³$3UHSDUDomRGR$WRU´11 QRFDStWXOR³)p&rQLFD´)iWLPDQmR
sugere ao participante do método que ele tenha apenas fé cênica nas situações que
um texto possa sugerir, mas que a verdade deixe de ser mera acreditação e sim uma
plena vivência. Dentre os filmes aqui citados existem muitos não atores, incluindo
SURWDJRQLVWDV FRPR DFRQWHFHX HP ³&LGDGH GH 'HXV´ FXMD PDLRULD GR HOHQFR QmR
tinha experiência, mas em contrapartida já estavam inseridos pessoalmente em um
ambiente semelhante ao contexto retratado nas cenas, com convivências em
situações similares e/ou conhecimento proveniente de pessoas próximas sobre uma
ocasião que lembra algo que o filme pretendia mostrar. Isto já deixa qualquer obra
com uma realidade mais aceitável e identificável, seja para qual público for, em relação
à realidade que o roteiro coloca e o cotidiano humano verídico.
No Brasil existem poucos profissionais na função de preparador de elenco
para cinema. Idem quanto a locais para formação de atores exclusivamente para esta
OLQJXDJHPD³VpWLPDDUWH´2SULPHLUROXJDUHLQVWLWXLomRFRPHVWHLQWXLWRpMXVWDPHQWH
um centro de formação profissional idealizado por Fátima Toledo, com ênfase em seu
Método, localizado em São Paulo.
É clara a repetição do uso de atores consagrados pela televisão na realização
de diversos filmes. Sem dúvidas a questão do talento é levada em consideração,
porém também há, além de uma estratégia mercadológica, um óbvio sinal da falta de
atores com enfoque na linguagem cinematográfica em si, como expôs Vincent Cassel:
A televisão aqui (Brasil) é tipo uma máfia. Quando tem alguém com
talento, a televisão vem, pega, paga bem. As pessoas são (ficam) assim
(presas). Viver só de cinema aqui é um pesadelo, eu acho. Tem poucos
atores que conseguem fazer isso. Mas são muito poucos, os outros tem que
fazer novela ou minissérie e eu acho que estraga a atuação, não de todos.
«1mRVHWHPWHPSRQD7YWHPTXHURGDUPXLWRUiSLGRWHPTXHVHPSUH
colocar uma super emoção. Nas novelas as pessoas sempre brigam, choram,
o que na verdade depois não se tem mais uma sensibilidade precisa, das
pequenas coisas. Não se tem em todos os lugares mil pessoas com talento,
então quando tem, vamos dizer ± por exemplo, vinte, trinta aqui no Rio, que
vão sempre trabalhar na televisão. Então é muito triste para o cinema, para o
cinema nacional. (CASSEL, 2016, não paginado)
11 /LYUR HVFULWR SRU 6WDQLVODYVNL SXEOLFDGR HP FRQVLGHUDGR SRU PXLWRV D ³EtEOLD´ GD DWXDomR
moderna.
Referindo-VHDR0pWRGR)7DFLQHDVWD'DQLHOD7KRPDVIDODTXH³(VWDUtDPRV
fazendo um cinema bem diIHUHQWHQmRIRVVHSRUVHXLQFUtYHO0pWRGR´&$5'262
2014, p. 241).
Sua preparação não tem como intuito e foco somente um ou dois atores
integrados em uma dada obra, é necessário que o coletivo seja trabalhado, pois em
um filme podem se tornar nítidas as diferenças de atuação daqueles que tiveram
contato com o Método e os que não tiveram. O espectador pode não perceber o que
é, mas reconhece certo estranhamento, pois os atores estão em nuances diferentes
de interpretação. Fátima Toledo prioriza a criação de uma unidade ao filme.
Independente que um ator tenha passado pelo processo de forma mais longa e outro
de forma mais curta, estar no método, de alguma forma, é um grande passo para fazer
a tal unidade se concretizar, portanto facilitando uma especial imersão para quem
assistir uma obra.
O Método FT é de considerável consistência e seriedade. Sua proposta
profunda de experiência permite que o ator (ou não ator) encontre uma maneira
própria e autêntica para viver um personagem. Baseia-se na premissa de não dar o
personagem ao ator, mas deixar o ator chegar ao personagem. Assim, o ator é ele
próprio vivendo situações dos personagens. Nesse sentido se faz o título intrigante do
livro redigido e co-HVFULWRSRU0DXUtFLR&DUGRVR³)iWLPD7ROHGR,QWHUSUHWDUD9Lda,
9LYHUR&LQHPD´12, que apresenta e descreve o referido Método.
7ROHGRDILUPD³2TXHR0pWRGRSURS}HpXPDDWHQomRKRQHVWDHGLUHWDFRP
RVGDGRVGDUHDOLGDGHRTXHVLJQLILFDPDQWHUXPDUHODomRIUDQFDFRPDSUySULDYLGD´
(CARDOSO, 2014, p.143)
Fátima abomina ter a emoção como instrumento de seu trabalho e técnica.
Embora os sentimentos e as emoções pareçam ser dois lados de uma mesma moeda,
eles são assuntos muito distintos e a compreensão de suas diferenças é essencial ao
método desenvolvido por ela e seu posterior sucesso.
As emoções nada mais são que reações rápidas para ameaças e/ou
recompensas. Em decorrência, deixam o corpo alterado e ajudam o humano em sua
12Livro em que Fátima Toledo narra o percurso de seleção e preparação do elenco de grandes
sucessos do cinema brasileiro. Transcrito por Maurício Cardoso.
Por outro lado, pode o contrário ocorrer. Como, por exemplo, o ator pensar
em algo ameaçador e desencadear uma reação de medo emocional, o que é uma
possibilidade concreta e prevalecer as emoções individuais, que são temporárias e
em resposta a eventos específicos. Assim, pode-se concluir que os sentimentos
evocados propositalmente podem persistir e se desenvolver com o tempo, reforçando
a escolha feita por Fátima, que considera um risco para o ator que prioriza o preceder
da emoção como suporte de uma possível verdade seguinte.
Como as emoções podem causar sentimentos subconscientes que, por sua vez,
desencadeiam outras emoções e assim por diante, a vida do ator pode se tornar um
ciclo interminável de emoções dolorosas e/ou confusas, que produzem sentimentos
negativos, que causam ainda mais emoções negativas, onde o ator não saberá o real
motivo delas, podendo afetar diretamente suas próximas interpretações cênicas, além
de sua vida pessoal. Os sentimentos dependem do temperamento de uma pessoa e
da aprendizagem de seu passado, variando muito de pessoa para pessoa e de
situação para situação.
As emoções e sentimentos desempenham um papel importante na maneira
como o ator experimenta e interage com o mundo, porque trata-se da força motriz por
trás da maioria de seus comportamentos pessoais, úteis e inúteis e transpõe isso em
ações durante o fazer de seu ofício.
Não é exagero dizer que existe um cinema com e sem Fátima Toledo, o que
a torna, bem como seu método, algo para um maior aprofundamento e valor, como
através de um artigo, para que haja maiores entendimentos, utilizações e reflexos da
tendência positiva de seu trabalho, sendo que com experimentações em outros e
novos elencos.
Marília Pêra13 SRQWXD ³4XDQGR YHMR XP ILOPH EUDVLOHLUR H SHUFHER JUDQGHV
interpretações, tocantes emoções e o respeito a pausas que são semelhantes às dos
VHUHVKXPDQRVVHLTXHDOLKiXPWUDEDOKRGH)iWLPD´&$5'262S
Para a qualidade de uma interpretação a partir da preparação, basicamente é
necessário apenas gente disponível para ver, ouvir, sentir e transmitir.
2 EFEITOS
>«@QmRDFKRTXHH[LVWDXPVyFDPLQKRSDUDDSUHSDUDomRGHDWRUHVGHXP
ILOPH>«@'HWRGDVDVHVFRODVGHLQWHUSUHWDomRDTXHHXVHPSUHPHVHQWL
mais próximo foi aquela desenvolvida por Sanford Meisner, um ator e diretor
que abandonou o Actors Studio para criar um modelo próprio de
interpretação. O método de Fátima não fica atrás em originalidade.
(CARDOSO, 2014, p. 131)
15Sobre a técnica teatral desenvolvida por Bertolt Brecht (1898-1956) que, entre outras coisas, faz uso
de uma exposição dialética, clara e inteligível e que procura obter da plateia uma atitude crítica em
relação aos fatos encenados, um distanciamento emocional.
Em Sobre Ratos e Café16 a preparação foi realizada com três atores do filme.
Uma menina/criança, uma mulher adulta e um homem. Todos faziam parte de um
mesmo núcleo familiar ficcional, o qual era conturbado. Trabalhar com crianças é
sempre algo delicado, mais ainda se tratando da seriedade da interpretação
naturalista para o ficcional. No começo do processo foi realizado uma conversa entre
para aquele curta-metragem, seja pela tal experiência que o mesmo já tinha, pela
duração do projeto, ou até possivelmente pela faixa etária do preparador, jovem se
comparado com a idade do ator. De novo, dependeu da disposição de quem estava
relacionado artisticamente. Estar neste projeto foi a certeza de que a preparação não
pode ser imposta e só ocorre, antes de tudo, por livre e espontânea vontade dos
atores.
6HJXQGR)iWLPD7ROHGR³$~QLFDFRLVDTXHLPSHGHRDWRUGHWUDEDOKDUpVXD
indisposição de estar verdadeiramente presente, despojando-se de ideias prontas e
FRORFDQGRVHXFRUSRHVHQVDo}HVDVHUYLoRGRILOPH´&$5'262S
2.3 Imersão
sensação parecida, uma espécie de alerta acontece no ser, devido suas memórias e
sensações ocultas. Pelo pouco tempo que se tinha para preparação, não foi possível
trabalhar mais para ver se ele (o Ator) ultrapassaria suas próprias barreiras ou não.
Assim, foi respeitado o patamar que ele gostaria de ir. Este escolheu o que foi
conveniente na preparação e nas suas percepções para aplicar durante as filmagens.
Ainda durante a preparação, em outra atividade, o ator entrou em um determinado
transe por subações que pareciam ir para além da associação de casal dado aos
personagens, ele tirou a roupa, mas não fez ação alguma e nem propôs nada a partir
disso para com sua parceira de cena.
De todo modo, pelo filme ter uma cena de estupro, aquilo foi obtido em análise
posterior pela preparação como algo não pré-determinado pelo ator, mas sim por ele
já estar dentro do enredo, linha dramática e de acontecimentos que o seu personagem
passaria, além de participar dos exercícios antes. Ou seja, uma ação não concreta da
dramaturgia que fariam nas filmagens, mas que remetesse. Embora o ator não
estivesse exatamente com disponibilidade total nos exercícios, esta sua atitude
incorporou um nível de acreditação na relação entre os envolvidos, nos espaços e a
postura de ator, como algo não tão previamente pensado, mas involuntário, porém
ressaltando que o mesmo conseguia separar seus limites conscientemente.
Atividades de preparação já diretas que envolvem o tema de uma obra podem fazer
com que se tenham outra imagem para além. No contexto citado, podendo significar
um entrelaçar adentro do que viria e estava no roteiro individual a ser seguido.
$UHDomRGDDWUL]TXHLQWHUSUHWRXD³(VSRVD´IRLGHFRPSUHHQVmRPDVHOD
não se deixou fazer o mesmo, não quis também tirar a roupa, pois entendeu que sua
personagem não teria um ato de concordância em relação ao ocorrido, leia-se: que
não seria permitido por sua vontade. Ao expor isto, o Ator se deu conta pessoalmente
e ficou envergonhado do que tinha feito, porém a atriz disse que compreendeu, ficou
feliz pelo ator ter percebido a situação constrangedora e mais pela sua consciência
de até onde deveria prosseguir depois de seu dado ato inicial. Julgou válida no
momento apenas para ele. Pois além disso, qualquer atitude sua maior (do ator),
poderia passar para ação abusiva ilegal, da qual o preparador a partir da primeira
suspeita já interromperia todo o processo, mesmo que a intenção do ator se desse de
PRGR³SURILVVLRQDO´VHQGRTXHQmRWHQGRFRPELQDomRFRQWUDSDUWLGDGHVXDSDUFHira
cênica, seria crime de modo injustificado.
Nota-VH R RFRUULGR QR ILOPH ³2 ÒOWLPR 7DQJR HP 3DULV 19´ RQGH D OLQKD GD
liberdade, libertinagem e consenso se ultrapassaram em pré-acordos e indicações
supostas entre demandas e acertos do diretor e ator, ocorrendo ações extras, graves,
de infortúnio sexual, das qual só a atriz envolvida não estava ciente da cena como um
todo. Isso demonstra o quanto também uma supervisão da preparação é importante
para designar linhas e separações pertinentes, de modo que se tenha domínio de até
que ponto a cena é moral e ética humanamente e a critério dos atores, antes dos
personagens.
9ROWDQGRSDUDDREUD,PHUVmR´UHLWHUD-se que durante todo desenvolvimento
do projeto, a atriz mostrou realizar a preparação de modo extremamente interiorizado.
Talvez uma escolha pessoal para a construção de seus personagens, porque suas
próprias ações nos ensaios e nas filmagens tinham um trajeto próprio de dramaturgia
para cada ação e a junção que fez disso com a preparação resultou em uma força
especial na cena.
)iWLPDFRPSOHPHQWD³1mRpSUHFLVRLQWHUIHULUQDYLGDRXKLVWyULDGHQLQJXpP
SDUD ID]HU D SHVVRD HQWUDU QD VLWXDomR H[LJLGD SHOD FHQD H SHOR SURMHWR GR ILOPH´
(CARDOSO, 2014, p.157)
troca afetiva, aquela ocasião sempre será única, mesmo que haja repetições para se
JUDYDU XPD FHQD &RP R DWRU GHVWD REUD R ³KRPHP GR FDVDO´ GXUDQWH R
desenvolvimento da preparação foi realizado variados exercícios e, na maioria deles,
ele se entregava enquanto ator isoladamente, mas não enquanto pessoa em um
RItFLR 6mR FRLVDV GLIHUHQWHV ( HUD REWLGR XP UHVXOWDGR IRUPDWDGR ³PDVFDUDGR´ R
que faz esconder a pessoa em sua essência. A atriz/diretora, que ao contrário do ator
não era atriz profissional, notou e tentava ajudar durante as passagens de jogos
cênicos entre eles. Até que chegou o dia das filmagens e ela percebia que a atuação
do ator convencia um público geral, mas ainda não se fazia suficiente, pois observava
que não havia uma verdade totalmente condizente.
Essa verdade é aquele ponto em que o telespectador percebe que há uma
coisa distinta na interpretação, que o prende, quase inexplicável. A atriz, por ser a
primeira vez dela na função, inicialmente se entregou, mas quando algum exercício
tocava em algo pessoal ou que a remetia alguma lembrança, ela pausava, bloqueava-
se para conectar com suas verdades, as mesmas que possivelmente tem agregação
em sua interpretação para uma ficção. Nesta situação, o preparador não pode e não
deve obrigar e nem insistir demasiadamente, apenas respeitar. No geral, ficou
factualmente provado que a eficácia da preparação só acontece se as pessoas
estiverem disponíveis antes do ator - antecedendo o personagem. Fátima diz:
³SUHSDUDGRUDSHQDVRULHQWDFRQGX]RDWRUD sua descoberta, mas a atuação é dele.
Se ele não traz nada de novo e genuíno é porque não pode oferecer, se traz é porque
GHVFREULXHVHUHYHORXHPFHQD´&$5'262S
2.5 Submergir
rapazes está com HIV. A preparação foi realizada na praia, local onde noventa por
cento das filmagens ocorreram. Os atores estavam entregues e em plena disposição.
Durante a madrugada foram feitos Exercícios de Desestabilização para o elenco, em
outras palavras: em via do roteiro que eles já haviam se apropriado, um pouco antes
GDVILOPDJHQVHUDSURSRVWRDOJRTXHSDUHFLDVHUDSHQDVXPWUHLQR³SDVVDJHP´GH
uma cena. Então o preparador pedia para só um dos atores, em sigilo, mudar alguma
parte, ou palavra específica, assim automaticamente desestabilizaria o outro ator e
estes então deveriam jogar a partir daquela novidade ao enredo. Sobre este peculiar
exercício, Fátima Toledo diz:
2.6 Catarse
tempo para cá, não ignoram esta opção no todo. Passaram a adotar o uso daquilo que
QmRFKDPDPGH³SUHSDUDGRU´PDVGH³Foach´GRLQJOrVWUHLQDGRULQVWUXWRUTXHID]
um trabalho parecido como se entende o de preparador, porém com um foco mais
individualizado em cada ator / personagem, de acordo como reagem os
telespectadores ao decorrer e das probabilidade de mudanças pelo autor.
O diálogo televisivo é rápido, um bate-bola cotidiano onde as diversas tramas
se interligam, mas é ainda são bastante distantes do intimismo e do relacionamento
interpessoal seleto que só a linguagem cinematográfica é capaz de causar.
Geralmente quando a televisão decide por usar preparadores de elenco influentes no
cinema, as obras realizadas entram em um viés do qual se vê juntamente um projeto
em seu todo diferenciado ao colocado propriamente nas novelas, tendo certas
utilizações e decisões nitidamente cinematográficas, em planos, câmeras, lentes e
claro a intimidade de cada ator exposta mais delicadamente. Na maior parte das vezes
quando isso acontece, se dá em séries e/ou minisséries.
Assim os produtores e diretores têm noção suficiente de que o público vai
perceber uma linguagem artística e técnica mais próxima do cinema, para tanto se faz
necessário que a interpretação dos atores esteja além de um panorama cotidiano que
aproxima o personagem da telenovela. Ou seja, não creditando como um simulacro
de um amigo de quem o assiste, entretanto do público como parte intrínseca de quem
o acompanha, uma espécie de espião.
O ator no Brasil geralmente preza por uma atuação aonde seu trabalho seja
feito de modo que cada obra é uma, então que a diferenciação na atuação possa ser
percebida de uma forma igualmente única entre estas, uma experimentação.
Entretanto a probabilidade para que isso ocorra na televisão não é alta. Por conta da
rapidez e a prontidão constante da qual o ator fica submetido, além do desgaste físico
e emocional causado por uma obra como a telenovela, que varia de sete, oito, dez ou
mais meses de gravações / no ar, um tipo de gestação que somente no último capítulo
o público consegue fazer uma definição sobre quem era o personagem.
O gênero novela possui uma dramaturgia que em grande parte das ocasiões
não tem compromisso exato com a realidade. A interpretação dos atores pode ser
naturalista, porém, quando o texto tem questões supostamente não convencionais, a
dada interpretação tem o desafio de através disso ultrapassar um mero naturalismo
interpretativo. Com mais este ponto, o Método FT caracteriza-se como uma opção que
deve ser mais pautada, refletida, significada por aqueles que estão relacionados e na
responsabilidade da atuação para a televisão, seja pelos atores, como pelos diretores
artísticos e gerais. Reestruturar um Método que prioriza que o ator não represente,
mas viva, se aplica em uma avaliação de como isso seria feito por um longo tempo e
tendo oscilações da linha de ação e dramatúrgica do personagem, o que pode ser
arriscado e mais desgastante para o ator e sua pessoa.
Dito isto e que não são todos os atores profissionais que gostam ou aderem
ao Método, por propósitos e ideologias pessoais, a metodologia aplicada por Fátima
Toledo que prega ser usada na coletividade, para chegar na unidade, poderia ser um
PHLR DR WHU DGDSWDomR SHORV GLWRV ³Foaches´ preparadores de qualquer emissora
televisiva, como parte da parceria entre atores, sugerindo além do trabalho que já
seria realizado previamente. O Método FT agregaria todos as partes e com o provável
resultado de uma qualidade interpretativa maior, na conjuntura dessa busca por
avanços individuais de seu personagem e credibilidade junto da crítica popular e
especializada. Os trabalhos artísticos poderiam ter uma realidade e um diferencial de
grandeza à parte, em cada momento das cenas exigidas.
Tendo esses discorrimentos, é válido relacionar com a importante
diferenciação feita em um trecho da obra Le Comedién désincarné24, do francês Louis
Jouvet25: ³2¶DFWHXU¶VySRGHGHVHPSHQKDUFHUWRVSDSpLVGLVWRUFHRVRXWURVGHDFRUGR
FRPVXDSHUVRQDOLGDGH2µFRPpGLHQ¶SRGHGHVHPSHQKDUWRGRVRVSDSpLV´-289(7
1938 apud MARCADÉ, 2018, p. 49, tradução nossa)26.
Em questão, compreende-VHTXHQmRpXP³DWRU´TXHDGDSWDRSHUVRQDJHP
ao seu perfil, mas ele que tem que se adaptar e quando isso acontece será
³comédien´ 2X Veja, ele imaginará e criará a partir de uma realidade extra, onde
possui consciência de que vai se desvincular totalmente no momento que não estiver
mais em cena. É de se observar que na França, local originário da nomeação
³Fomédien´HVWDSDODYUDQmRHTXivale somente para algo relacionado ao cômico, ator
24 Livro publicado em 1943, aonde Louis Jouvet realiza reflexões desnudas, seus modelos, suas
influências literárias e filosóficas, seus métodos de trabalho artísticos.
25 Foi um ator francês, diretor e diretor de teatro. (1887-1951)
26 Trabalho de conclusão de curso escrito e publicado SRUePLOLH0DUFDGpHPVREUH³'LIHUHQoDV
QDSUiWLFDGHDWXDomRHPFULDo}HVGHILFomRGHSHQGHQGRGDFHQDHGDWHOD´
de comédia e humor, porém se trata de uma definição mais complexa, indo a mais do
que pode soar aos brasileiros, de acordo com a etimologia da palavra e sonoridade
FDXVDGD 2 ³Fomédien´ p XP DWRU PDLV FRPpleto, segundo compreende-se da
H[SOLFDomRGDGDSRU/RXLV-RXYHW2³comédien´QmRYLYHHPFHUWRFRPRGLVPRGHVXD
LQWHUSUHWDomRQDWXUDOLVWDDSDUWLUGRSHUILODPHQWRGR³HX´
Pelas novelas, onde geralmente as obras são inéditas, isto faz com que a ideia
do S~EOLFR GH XPD ³DWXDomR UHSHWLGD´ DFRQWHoD PDLV IDFLOPHQWH 1D WHOHYLVmR
brasileira, que tem altos números de obras abertas, a segunda opção seria mais
YLiYHOGHHVWDUVHU³comédien´RSURFHVVRGHGHVFREHUWDHFULDWLYRSRGHWUDQVSDVVDU
as limitações de quais escolhas e pensamentos tidos sobre como se encontraria o
personagem, não o pré-determinando de acordo com possibilidades. Em outras
SDODYUDVHTXDOL]DUR³HXVRX´SURSRVWRSRU)iWLPDMXQWRGHWRGDVDVQRYLGDGHVTXH
venham a aparecer nas evoluções por capítulos futuros.
Isto é, se dados instintos vierem ao natural, preferenciar o incremento disso
é útil demais. Pois seria algo diretamente sincero da formação pessoal do ator que
estaria sendo agregado para seu personagem.
Seria incabível deixar de notar outra relevância no que se atrela entre
televisão e atores: a questão de que a beleza estética, subjetivas ± mas com padrões
instaurados pela indústria capitalista, influencia para as seleções dos elencos. Afinal,
se tratam majoritariamente de obras que dependem de suas relações comerciais. O
QRPH³FRPHUFLDO´TXHpRLQWHUYDORFRPRSDXVDGRTXHHVWiVHQGRH[LELGRQmRpj
toa, ali são oferecimentos daqueles que patrocinam os programas que são parte da
grade do canal e estão sob exibição. Internamente, nas emissoras, costuma-se
FKDPDUDVREUDVHWLSDJHQVGHHQWUHWHQLPHQWRGH³SURGXWRV´&RPLVVRRWDOHQWRGR
ator tem muita chance de ser levado em segundo plano e é capaz de ocorrer uma
comodidade por parte deste, na sua interpretação, o que é perigoso, afinal ele estará
ganhando (além dos ganhos externos publicitários, promocionais) e isso pode dar um
ideário de suficiência. Além disso, por rostos bonitos chamarem atenção, junto do
glamour que a fama causa ao público, há de se atentar ao fato dos avanços das redes
sociais que colaboram para a credibilidade do ator e que podem levantar suas
probabilidades de presença em elenco, de acordo com a quantidade que tenha de fãs,
seguidores. O que leva para mais um motivo da referida repetição de atores, fazendo
com o passar do tempo que seja mais do que uma normalizada repetição por
escalação do elenco, mas transformando-se em um acúmulo e falta de tempo
suficiente para o ator descansar sua imagem, assim como se reciclar enquanto artista,
tornando a estática de seu modo de atuação igualmente repetitiva.
A atriz Bete Mendes argumenta:
>«@DEHOH]DpXPSDUkPHWURPXLWRSHULJRVR>«@WLYHGLILFXOGDGHVJUDYHVFRP
colegas que não sabiam sequer qual era o assunto da cena. Eu prefiro
contracenar com uma parede do que com uma pessoa se o olho dela está
vazio. É uma displicência com a profissão, que é honrada e bonita. Tem gente
TXHGL]µ$KpTXHRQWHPWLYHXPDIHVWD¶'LJRµ7HYH"(XWDPEpPJRVWDULD
GHWHUWLGR¶0(1'(6QmRSDJLQDGR
O comprometimento do ator com sua profissão pode ser visto como duvidoso,
pois todas as ilusões que a grande exposição para milhões de pessoas pode causar
afetam diretamente o comportamento dele. Uma preparação de elenco assertiva pode
ser uma ajuda crucial em cada projeto envolvido, entre os níveis ator x personagem.
Uma armadilha é feita ao ator que se encontra na televisão, porque
geralmente transcorre uma ilusão de que é um veículo midiático fácil de lidar, e não
é. Pela tal alta exposição de imagem, o talento individual pode ser coberto de: apenas
ser um rosto conhecido que venha a acarretar um protótipo de vendas, como um
Modelo; isto pode vir a acontecer de modo imperceptível pelo artista, porém há de se
ter uma preocupação o quanto antes, já que terá de se pôr e afirmar que não está ali
como ator apenas por ter um rosto bonito e consecutivamente vender a partir de sua
imagem. O artista ou celebridade, tem que procurar se esforçar e aperfeiçoar mais,
para que o trabalho e talento convençam antes de qualquer outro fator externo.
O ator passa a ter duas vidas, a dele enquanto ator em seu ofício e a do ator
como figura pública, isso faz com que a confusão entre as duas coisas seja mais
frequente e a preparação geral para viver qualquer papel não comece somente ao
saber o personagem, mas bem anteriormente, na própria formação dos atores. A
verdade deve ser trabalhada para a desconstrução e revelação de si. No Brasil
algumas instituições educacionais formadoras de atores, recentemente passaram a
adotar ao final de seus cursos uma banca, tendo como convidados avaliadores
profissionais conceituados nos cargos de produtores de elenco, pesquisadores de
casting de emissoras ou independentes, eles são os coordenadores pela organização
e seleção de atores e atrizes, como para uma obra na televisão. Essa banca recebe
o nome de ³6KRZFDVH´. Um dos locais em que a prática ocorre é na Faculdade CAL
de Artes Cênicas e na CAL ± Casa de Artes de Laranjeiras (Rio de Janeiro), em que
o showcase não se define apenas pela apresentação das contracenações entre
alunos (atores), fazer isto é só o final do processo.
O showcase faz parte de uma disciplina opcional da matriz curricular dos
cursos profissionais oferecidos, para o ator ficar mais adentro da linguagem estética
de interpretação para a televisão. Quanto mais se aproxima do período exato com a
banca a ser realizada, outra fase se desenvolve, prévia, a do trabalho de preparação
de atores, que auxilia as duplas ou os trios de atores para que sejam convincentes no
momento ao entrar na sala com a banca reunida, desde sua apresentação pessoal e
a relação com a cena mostrada. É trabalhado para que os atores, depois de terem a
cena que farão, não decorem o texto, mas tenham o entendimento da cena no todo,
e a forma que ele vai fazer tem de caber por um jeito que não demonstre estar em um
formato. O texto é o que menos importa. Verificar que o ator estar no universo vale
mais. Isto feito, um mesmo objetivo de cena pode acontecer das mais variadas formas
e não somente daquela óbvia que o texto possa sugerir. Muito dos personagens que
os atores fazem possuem a tendência de se encontrarem daquilo mais perto do que
DSDUHQWDPSDUDXPDPDVVDRTXHUHOHPEUDR³physique du rôle´SUySULRGRFLQHPD
Involuntariamente, as alusões dos exercícios utilizados nesse projeto de e as
questões textuais são muito similares as que Fátima Toledo usa. E ainda que no
showcase possam vir por outras influências (incluindo vindas do estrangeiro), pelo fato
de não ter registros anteriores, ao menos no Brasil, Fátima fica qualificada como a
primeira em utilizar a metodologia principal aplicada, em relação a textos e afins, para
colocá-los por último. Assim, por Toledo ainda possuir pessoas que indagam seu
Método, a execução de exercícios onde ela é, queira ou não, a pioneira no país, sendo
usados por outros treinadores de atores, como para o intuito de alunos serem
avaliados e contratados, em priori, pela maior emissora de televisão do país, quer
dizer por critério corroborado que suas escolhas nunca estiveram erradas.
Como fora indicado, o showcase equivale em uma avaliação feita por
produtores de elenco. Para muitos dos atores é inclusive um primeiro contato direto
com profissionais que podem chamá-los para atuarem em alguma obra audiovisual
efetiva. Assim, é válido comparar como um teste, audição, sendo que na maioria dos
participantes o nervosismo toma conta e a pessoa (ator) na hora de apresentar sua
cena acaba se deixado tomar por outras questões externas que, de alguma forma,
interferem na capacidade de sua interpretação, levando-a para uma não vivência em
cena, uma isolada leviana atuação, com talvez improvisações arriscadas. Em
justaposição, amiudadamente, se constata que a preparação para o showcase deve
ser considerada como um julgamento de competência, minimizando e eliminando um
possível pensamento do ator sobre personagens e trabalhos futuros, inexistentes.
Mas sim como uma oportunidade para que isso venha a ocorrer. Portanto dar maiores
créditos para as preparações realizadas antes é dar creditação para se viver nesta
³DXGLomR´WUDQVpondo um momento de magia na interpretação. A atriz hollywoodiana
Elle Fanning fez uma pertinente fala sobre audições:
Audição, para mim, é algo muito estranho. Eu faço pressão sobre mim mesmo
e sou uma espécie de perfeccionista e quero fazer o certo, imediatamente.
As audições para mim são tão bizarras, porque leva um tempo para você
encontrar esse personagem e para ele ser perfeito. E a pressão é que você
precisa ter esse personagem imediatamente. E eu nem conheço nenhum
desses estranhos que se encontram ali: O Diretor, o produtor, o câmera; que
estão esperando que eu faça esse tipo de truque de mágica para eles.
Normalmente o que você precisa fazer pode ser bastante intenso,
emocionalmente; você tem que tocar em todo esse sentimento para as
pessoas que YRFrDFDERXGHFRQKHFHU9RFrGL]µ2Oi¶(HQWmRYRFrFRPHoD
a chorar. Tipo, é um pouco estranho. (FANNING, 2017, não paginado,
tradução nossa).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
das indicações do diretor, na medida em que este último tem de ser responsável pela
melhor organização e construção geral e não um soberano do projeto com vigor de
alteração significante para a autonomia criativa do intérprete. Todavia, quanto à
estética para o ofício do ator, é preciso que seja direcionada. As preparações só
aumentam a estética que o ator já tem existente como bagagem, para que se tenham
bonitas, satisfatórias e reinventadas interpretações, atingindo assim a literalidade do
que se pode chamar por reais atuações e deixando o fluxo do diretor com os atores
acontecer de forma mais qualitativa possívHO1RILOPH³$3DL[mRGH-RDQDG¶$UF27´D
interpretação da protagonista, desta que é uma obra-prima do cinema, foi feita pela
excelente atriz (até então teatral) Renée Falconetti ± TXHLQWHUSUHWRX-RDQDG¶$UF8P
filme mudo, aonde numerosos indivíduos no mundo consideram o trabalho de atuação
da artista como a mais bela, potente e melhor interpretação da história do cinema. O
mais curioso é que este foi o primeiro e único filme feito por Renée. Em uma conversa
com Vinícius de Moraes ela disse:
REFERÊNCIAS
CARDOSO, Maurício. Fátima Toledo: interpretar a vida, viver o cinema. São Paulo:
LiberArs, 2014.
FANNING, Elle. Elle Fanning Talks About Auditions and Doubt. [Entrevista
concedida a] Scott Cardy. Mental Makeover, Hollywood, 2017. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=F2pyjhU9_j8. Acesso em: 12/06/2018.
+$03721'HEELH:KDW¶VWKHGLIIHUHQFHEHWZHHQIHHOLQJVDQGHPRtions?. The
best brain possible. [S.l], 12 jan. 2015. Disponível em:
https://www.thebestbrainpossible.com/whats-the-difference-between-feelings-and-
emotions/. Acesso em: 12/06/2018.
0(1'(6%HWH%HWH0HQGHVµ$PHOKRUFRLVDTXHH[LVWHpYLYHUH[SHULPHQWDU¶.
[Entrevista concedida a] Gustavo Leão. Revista Quem. [Rio de Janeiro], 14 maio
2012. Disponível em:
https://revistaquem.globo.com/Entrevista/noticia/2012/05/edicao-553-11042011-
melhor-coisa-que-existe-e-viver-experimentar.html. Acesso em: 20/06/2018.
MORAES, Vinicius de. Entrevista com mme. Falconetti, a grande intérprete de Joana
d'arc do cineasta Carl Dreyer, bem como o seu pronunciamento no debate sobre
cinema silencioso e cinema falado. A Manhã, Rio de janeiro, 9 jun.1942. Disponível
em: http://www.viniciusdemoraes.com.br/en/cine/entrevista-com-mme-falconetti-
grande-interprete-de-joana-darc-do-cineasta-carl-dreyer-bem-como. Acesso em:
20/06/2018.