Ainda Te Amo
Ainda Te Amo
Ainda Te Amo
Still in my Heart
Kathryn Smith
Londres, 1819
Digitalização: Crysty
Revisão: Ana Ribeiro
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CH 382 – Ainda te amo... – Kathryn Smith
Querida leitora,
Este é o romance de maior carga emocional que Kathryn Smith escreveu até agora.
Não é apenas um lindo conto de um amor perdido e resgatado, como também a intensa
história do crescimento, interior de um homem que enfrenta seu vício, reconquista o auto-
respeito e o amor de uma mulher. E de uma mulher que aprende a confiar outra vez no
homem que um dia partiu seu coração e compreende que vale a pena arriscar tudo por
amor...
Leonice Pomponio Editora
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CH 382 – Ainda te amo... – Kathryn Smith
Capítulo I
E assim aconteceu...
Ele estava embriagado. Não tinha chegado a desmaiar nem a cair por cima das
mesas. Apenas a cabeça girava. Não pretendera beber demais. Um conhaque havia
levado a outro e a mais um e... Sentia as pernas pesadas e um relativo entorpecimento.
Não podia negar que se tratava de uma sensação agradável.
Apesar da bebedeira, não esqueceu o compromisso assumido naquele dia. Pedira
Eleanor em casamento e ela aceitara. Não haveria obstáculos à união, pois lorde
Burrough, pai de Eleanor, tinha sido amigo do seu. Providenciaria a licença e ela se
tornaria sua esposa. Logo ele poderia beijar aqueles lábios suaves, sentir o corpo
voluptuoso sob o seu e possuí-la. Ficava ansioso só ao pensar nisso. Talvez não
estivesse tão bêbado.
Tomou mais uma dose e decidiu que estava na hora de abandonar os amáveis
cavalheiros que não se cansavam de completar seu copo. Se ficasse bebendo a noite
toda, teria uma sensação de liberdade semelhante à que experimentava com Eleanor.
Com uma diferença: ela não o deixava com dor de cabeça na manhã seguinte.
As festas no campo eram sempre prazerosas. Com a imagem de Eleanor na mente,
atravessou os corredores escuros do solar e subiu a escada rumo a seu quarto.
Fechou a porta, tirou as botas e jogou o casaco no chão. Fez o mesmo com o colete
e a camisa. Despiu a calça e jogou-se na cama. Nu, sentiu a brisa suave daquela noite de
verão.
Fechou os olhos. Percebeu o mundo oscilar como se estivesse num barco
deslizando sobre ondas leves. Gostava do balanço dos navios, que o fazia adormecer
com tranqüilidade, sem pensamentos incoerentes, inseguranças ou sonhos. Apenas uma
doce escuridão.
Estava no limiar do sono quando teve a impressão de que o tocavam na coxa. Fez
um esforço para descerrar levemente as pálpebras. A visão distorcida de uma mulher com
longos cabelos loiros ergueu-se sobre ele.
— Eleanor.
O que ela viera fazer ali? Ficaria com a reputação arruinada se a encontrassem no
quarto com ele. Não seria recomendável que o casamento deles começasse com um
escândalo.
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Eleanor aumentara com o decorrer dos anos. Não tinha se casado. Teria se tornado uma
mulher amarga por sua causa? Ela se alegraria ao vê-lo? Ou só pensaria em castigá-lo?
E ele? Teria as mesmas reações do passado?
Nada lhe ocorria supor.
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Eleanor concordara com a festa por receio de o pai se aborrecer e morrer por isso.
Seria capaz de ir descalça a Londres apenas para poupá-lo. Não suportava a idéia de
perdê-lo, embora ele a sufocasse.
Era apavorante a idéia de ter vários solteiros convivendo com a família durante o
próximo mês. Todos saberiam dos motivos do convite.
Era horrível sentir-se como um animal à venda.
Eleanor assumira a responsabilidade de administrar a propriedade em vez de ter
aulas de dança. Tinha criado as irmãs como uma segunda mãe e cuidara do pai. Por que
ele imaginava que seria preciso um marido para cuidar dela?
Não negava que uma companhia seria agradável. Mas um marido?
Imaginava a espécie de candidatos a quem o pai mandara convites. Na certa, todos
com caráter semelhante ao de Brandon Ryland, que havia lhe roubado a vontade de viver,
isto é, de se casar.
— ...sua atenção.
— O que foi? — Eleanor espantou-se e fitou a irmã.
— Creio que estou falando com as paredes.
— Escutei o que disse, Arabella. O homem precisa da mulher para ser sua
companheira...
— E?
— Para dar-lhe filhos.
— E?
Oh, céus, havia mais?
— Eu...
Arabella aguardou com paciência, apesar do olhar pesaroso de Eleanor.
— Está bem. — Eleanor franziu o cenho. Algumas vezes sua irmã era cruel. — Eu
não estava escutando.
— Eu dizia — Arabella sorriu — que papai quer apenas vê-la feliz. Não a forçará a
aceitar quem não lhe agradar.
Eleanor admitia essa verdade. As quatro irmãs tiveram livre escolha no casamento,
e assim, certamente, seria com ela. O pai até lhe permitira recusar Brandon, que era um
dos favoritos dele.
— Eu sei, Arabella. Mas será muito desagradável. Não faltarão comentários
desabonadores.
— Tem razão. Por isso falei com papai para estender também os convites a jovens
casadoiras.
— O que disse a ele? — Eleanor não podia acreditar que existisse um complô conta
ela.
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Ele ficou no vestíbulo com Phoebe. Esta o fitou com curiosidade, tão bonita como as
demais Durbane. Lindas e ricas, todas haviam se casado.
Por que Eleanor não seguira o exemplo das irmãs? Brandon não chegou a encontrar
um assunto corriqueiro para conversar até a volta de Muriel. Ela teria vindo com uma
pistola ou uma espada? Nenhuma das duas coisas. Viera munida apenas de um sorriso
malicioso.
— Lorde Creed, poderia ter a bondade de acompanhar-me? Muriel pensava em
atraí-lo para a morte? Na certa, o levaria ao encontro do pai ou da irmã mais velha. Ou ao
tribunal dos Durbane, onde seria condenado ao esquartejamento.
Brandon seguiu a jovem e olhou ao redor. A casa pouco mudara naqueles dez anos.
Talvez as cortinas e algumas peças de mobília novas. O piso era de mármore italiano. Os
retratos pomposos dos ancestrais continuavam na parede.
Ainda era possível sentir o mesmo cheiro de cera de abelhas e de flores.
A mudança maior tinha se operado nele próprio. Provar isso a Eleanor certamente
seria mais difícil do que o Parlamento aceitar que a Inglaterra não dominasse o mundo.
— Espere aqui. — O tom autoritário de Muriel e seu sorriso diante de uma porta
fechada o fizeram imaginar um algoz com um machado.
Se quisesse fugir, Brandon concluiu que teria de ser naquele momento. Em vez
disso, retribuiu o sorriso com semblante malicioso. Já enfrentara alucinações e demônios
muito mais assustadores que as irmãs Durbane. Não se deixaria abater.
De qualquer forma, não podia correr por claudicar de uma perna.
Muriel entrou no aposento e tornou a fechar a porta, sem dar tempo a Brandon de
ver o que se passava no interior. Preparado para uma longa espera, ele se apoiou na
perna sadia e observou as pinturas na parede.
Alguns minutos depois, Muriel tornou a aparecer e com o cenho franzido. Brandon
não percebera que haviam sido seguidos por Phoebe que, felizmente, não portava
nenhum punhal.
— Milorde pode entrar — Muriel anunciou, sombria demais para alguém tão jovem.
Eleanor, na idade da irmã, era uma criatura mais doce e inocente. Naquela altura,
teria endurecido o coração e a fisionomia?
Brandon fez uma mesura cortês, endireitou os ombros e entrou, seguido pelas duas
irmãs. Achou curiosa a sensação de uma mosca sendo apanhada numa teia. Eleanor
encontrava-se na sala. Onde estaria Lydia? Até que ponto as irmãs teriam conhecimento
da estupidez que ele cometera? Lydia devia ter contado para Eleanor. O que saberiam as
outras duas? Na certa, não muita coisa. Havia sido voz corrente e aceita que sua
tendência para a embriaguez fora a responsável por tudo.
Já estívera naquela sala decorada em tons de azul, dourado e rosa e que ainda
conservava o mesmo tapete Aubusson. Tinha sido ali que ele vira Eleanor pela primeira
vez e entendera que se tratava da mulher de sua vida.
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minha chegada.
Brandon imaginou se o expulsariam antes de ele ter oportunidade de dar
explicações para a mulher que se tornara uma obsessão em sua vida. Não poderia,
porém, permitir que isso ocorresse.
Imploraria por perdão mesmo que fosse arrastado até a porta da rua. Não lhe
importavam as conseqüências.
— Poderiam deixar-nos a sós? — Eleanor pediu sem desviar os olhos de Brandon e
para surpresa das irmãs.
Os olhos de Eleanor não eram apenas a janela de sua alma, mas também um
espelho que refletia as emoções alheias. Felizmente, ela estava afastada e Brandon não
se via através daquela pequena lagoa azul.
— Nós não sairemos — Muriel retrucou, determinada.
— Temos de ir, se Eleanor assim o desejar. — A outra irmã, Arabella, se a memória
dele não falhava, pôs a mão no braço de Muriel.
Era uma pequena vitória.
Arabella tocou no ombro de Eleanor.
— Estaremos no corredor se precisar de nós.
— Obrigada, Belle — Eleanor disse, ainda encarando Brandon.
As três Durbane se afastaram e lançaram um olhar de advertência para Brandon.
Felizmente, Lydia não estava presente. A situação seria ainda mais constrangedora.
A porta foi fechada e Brandon sentiu a boca seca e o suor brotar da testa.
— Milorde não foi convidado para a festa.
— E-eu fu-fui — Brandon perdeu a eloqüência. Eleanor cruzou os braços na altura
do peito, sem perceber que a postura beligerante elevava o busto de maneira
encantadora.
— Prove.
Ele enfiou a mão no bolso do casaco, tirou o convite e lhe entregou.
Eleanor segurou o papel como se tivesse receio de queimar-se. E hesitou, antes de
ler o que estava escrito. Nem precisava certifica-se. Conhecia de cor os convites enviados
pelo pai. Ela amassou na mão o papel-pergaminho.
— Milorde jamais deveria ter aceitado.
Brandon não evitou um sorriso. Eleanor realmente achava que ele perderia a
oportunidade?
— Seria grosseiro recusar.
— No entanto foi uma crueldade ter vindo. É assim que retribui o fato de eu nunca
ter revelado a ninguém o patife que milorde é?
Eleanor queria fazê-lo crer que o havia protegido?
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— Se espera retribuição pelo seu silêncio, deveria falar com sua irmã. Não esperei
nem pedi por seu segredo. A única coisa que lhe devo são desculpas, e por isso estou
aqui.
— Desculpas? Depois de tantos anos? Eu não acreditaria nelas nem as desejo.
— E o que a senhorita me deve? Eleanor estreitou os olhos.
— Não lhe devo nada!
Havia poucos instantes, também Brandon acreditaria nisso, mas a emoção o fazia
pensar de outra forma.
— A senhorita me deve uma oportunidade para eu me explicar. Não me permitiu
falar. Apenas rompeu o compromisso.
— Explicar? — Eleanor fitou a porta e abaixou a voz. — Nada havia para ser
explicado. Sei o que milorde fez.
— Sabe o que sua irmã lhe contou. Eleanor deu um passo à frente e conteve a ira.
— Sei o que eu vi.
— O que milady viu?— Brandon não se lembrava de nada, exceto de ter acordado
ao lado de Lydia e que não haviam dormido como dois irmãos.
Eleanor corou, mas não afastou o olhar, com ódio e humilhada pelo que presenciara.
Brandon não supunha que Lydia não tivesse falado.
— Vi os dois juntos.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Antes, durante ou depois? — Brandon não conteve a ousadia da pergunta.
Eleanor corou até a raiz dos cabelos. Tratava-se de uma jovem recatada e não
acostumada a esse tipo de conversa. Era mesmo uma crueldade provocá-la, mas ele
precisava saber, pois a memória o traía.
— Os dois se encontravam sem roupas — ela falou em voz baixa e rouca — e
milorde estava por cima dela. Isso é o suficiente ou deseja que eu continue? Garanto-lhe
que me lembro de cada detalhe da cena.
Brandon engoliu em seco. A mágoa na voz de Eleanor machucou-o. E a acusação
do olhar penetrou fundo em sua alma. Teve a impressão de que lhe arrancavam o
coração. Poderia negar se fosse apenas a palavra de Lydia. Mas Eleanor vira tudo. E ele
teria de conviver com a certeza de que havia lhe causado um terrível sofrimento. Como
reparar um erro tão grave?
— Eleanor, eu sinto muito.
— Ah, acredito que sim — ela ironizou. — Não tenho idéia por que milorde veio até
aqui, mas isso pouco me importa. Todavia esteja certo de que falarei com meu pai e ele
dará um jeito na situação. — Estendeu o convite amassado para Brandon, que hesitou
antes de pegá-lo.
Eles se entreolharam e, como estavam próximos, Brandon viu o próprio reflexo nos
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olhos azuis.
— Até lá, lorde Creed, não se esqueça. Dei a explicação devida e não lhe devo mais
nada.
Ereta como uma rainha, Eleanor saiu da sala e deixou-o enlameado de vergonha.
Eleanor Durbane nada lhe devia. Mas ele certamente tinha um grande débito com
ela. Tão grande que nem mesmo fazia idéia de como começaria a amortizá-la.
Seguida pelas três irmãs, Eleanor subiu correndo a escada até o pavimento onde
estavam situadas as suítes do pai.
— O que foi que ele disse?
— O que pretende fazer?
— Eleanor, diga alguma coisa!
Chegaram ao patamar superior. A esquerda, estendia-se a escada que conduzia aos
aposentos da família. A direita, os degraus que levavam aos dos hóspedes.
Eleanor fitou Arabella de relance e teve de soltar a tensão do queixo para responder.
— Papai o convidou.
As três sufocaram um grito, horrorizadas. Eleanor estava confusa, machucada.
Impossível esquecer que fora traída. Pelo pai e por seu próprio coração, que havia
disparado ao ver Brandon.
Mas o que levara lorde Burrough a convidá-lo?
Claro que seu pai, assim como suas irmãs, não conheciam a verdade. Até aquele
dia, nem mesmo Brandon sabia o que ela havia presenciado. Não pretendia revelar nada,
mas o canalha insistira. Eleanor não costumava perder a paciência, porém Brandon
Ryland despertava nela os piores sentimentos.
Ele sempre tivera a capacidade de fazê-la agir de maneira inadequada. Até o
namoro deles a deixara zonza e ela havia aceitado o pedido de casamento apesar de
conhecê-lo fazia poucas semanas.
Por isso a dor fora imensa ao encontrá-lo com Lydia.
Será que ele tinha ficado maluco ao pretender desculpar-se depois de tantos anos?
A expressão de horror quando Eleanor havia lhe contado o que virá só podia
significar duas coisas. Ou naquela ocasião Brandon estava bêbado e de nada se
lembrava, ou pretendera mentir e tinha sido impedido de fazê-lo.
Embora achasse a segunda hipótese mais acertada, ela não deixou de considerar a
primeira a mais provável. Apesar de tudo, não gostava de fazer mau juízo das pessoas.
Porém Brandon Ryland teria de provar a verdade em qualquer outro lugar. Em no
máximo uma hora ele estaria fora daquela casa!
Eleanor tropeçou no tapete e quase caiu. Felizmente as irmãs tagarelavam sem
parar e não notaram. Ou ela precisaria de uma explicação para a topada. O que seria
difícil, sem revelar a verdade.
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ressentiam contra a irmã mais velha, que insistia em fazer o papel de mãe. Mas nunca lhe
haviam negado apoio nas poucas ocasiões que a imaginavam perdida. Como naquele
momento.
Por trás da madeira maciça de carvalho, escutaram a voz do pai pedir que
entrassem. Eleanor virou a maçaneta e adiantou-se, antes de perder a coragem.
Jeramiah Durbane estava reclinado na cama sobre uma montanha de travesseiros.
Aos quase setenta anos, tinha compleição robusta e penetrantes olhos azuis. Os cabelos
loiros eram quase brancos.
A doença do pai surpreendera a todos e, por ela, Eleanor havia concordado com a
realização da houseparty, uma festa idiota em que convidados se hospedariam na casa
durante muitos dias. Não desejara aborrecê-lo.
Naquele dia ele se encontrava bem-disposto e fitou as filhas com cautela.
— Bom Deus — murmurou. — Só existe uma coisa que as faria entrar aqui dessa
maneira. Devo estar morto... ou morrerei em seguida.
Eleanor não estava disposta a rir e escolheu as palavras com cuidado.
— Achei por bem informá-lo da presença de um convidado.
O pai não pareceu surpreso. Se ele era o responsável pelo convite, Lydia também se
surpreenderia.
Melhor assim.
— E de quem se trata?
A inocência fingida de lorde Burrough não a enganou. — O visconde de Creed.
— E mesmo?— A tentativa de aparentar espanto também falhou.
— Pare com isso, papai. Sei que o convidou. Estou sentindo odor de culpa.
O pai inalou o ar.
— É linimento, Ellie. Acredite, conheço o cheiro da culpa. Eleanor escutou uma
risadinha às suas costas. Devia ser Arabella.
— Por que fez isso, papai?
— Fui muito amigo do falecido visconde e é preciso ser leal às antigas amizades.
Asneira. E o que dizer da lealdade familiar?
— Não se aborreça, minha filha. — Ele sorriu. — Eu a valorizo muito mais que aos
outros.
— Pois então quero que o mande embora — Eleanor pediu com as faces coradas.
— Não posso.
— Por que não? Se o convidou, poderá desconvidá-lo.
— Não é tão simples assim, minha filha. Por outro lado, não vejo por que eu deveria
fazer uma descortesia dessas.
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Ela abriu a boca e tornou a fechá-la. Lorde Burrough a encarava com olhar
interrogativo. As irmãs a rodeavam como um manto protetor.
— Eleanor? — Muriel falou em tom esperançoso. — Existe alguma razão para que o
visconde de Creed não mereça uma nova oportunidade?
Como falar na traição de Brandon contra ela, contra Lydia, contra todos, sem revelar
a horrível verdade?
— Não — Eleanor respondeu em voz muito baixa. — Creio que não.
— Ótimo. — O pai deu um sorriso satisfeito. — O assunto está resolvido.
O bom humor dele acabou no momento em que viu a expressão de Eleanor.
— Não se preocupe. Tudo dará certo, Ellie. Verá que o visconde de Creed não nos
causará problemas. Procure conceder-lhe o benefício da duvida. Poderá encontrar dentro
de si a vontade de perdoá-lo.
Eleanor não conseguiu falar. O pai se pusera em campo oposto e ela não podia
revelar aquilo que o faria apoiá-la.
Eleanor duvidava de que Brandon tivesse mudado. Mesmo que, por algum milagre,
houvesse abandonado o hábito de beber em demasia, ele continuaria a ser a mesma
pessoa. Nada mudaria a infâmia que praticara nem o fato de ter cometido uma traição
contra ela.
Uma segunda chance para quê? Para repetir a desonra?
Ela jamais o perdoaria.
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Brandon aprontou-se para o jantar com a ajuda de seu criado de quarto. Começava
a suspeitar de que Eleanor fracassara na tentativa de expulsá-lo. Ou então ela ainda não
tinha falado com o pai. Apesar de o conde adorar a filha mais velha, talvez a doença o
tivesse impedido de recebê-la.
Mais tarde, Arabella pediu aos convidados que desculpassem Eleanor. Explicou que
a irmã não viria jantar por estar com dor de cabeça. Vários presentes fitaram Brandon
com olhar acusatório, mesmo sem saber o motivo verdadeiro pelo qual ele fora rejeitado
dez anos antes. O velho conde também não compareceu. Talvez houvesse piorado.
O que mais aborreceu Brandon foi a reação de Lydia ao encontrá-lo. Ela não
demonstrou estar ofendida como as outras irmãs. Pelo contrário. Mostrou-se encantada, o
que suscitou a desconfiança de muitos. O marido, em sua abençoada ignorância,
conversava animadamente com outros convidados.
Se Lydia esperava renovar os laços de amizade, logo se desencantaria. Brandon
não se sentia atraído pela dama, apesar do esforço que ela fazia para ser notada.
Brandon teve certeza de que Lydia procurava atrair sua atenção por ele demonstrar
interesse em Eleanor. Como aquela house party era um pretexto para encontrar um
marido para Eleanor, apesar de outras donzelas presentes, Lydia não descartava a
hipótese de Brandon ser um dos candidatos.
Ele não tomou nenhum gole do fino clarete. Temia experimentar a bebida e não ser
capaz de parar no primeiro copo. Pediu um copo de água ao criado e foi atendido de
imediato.
— Lorde Creed — uma voz suave chamou-o do outro lado da mesa. — Faz um
século que não nos vemos.
— Faz alguns anos, lady Brend. — Brandon encarou Lydia.
— Milorde está com ótima aparência.
Ele reconheceu de longe a lisonja mal-intencionada.
— Lorde Creed é solteiro — lorde Brend interferiu com jovialidade. — Não tem por
que se desgastar.
Vários convivas riram e Lydia sorriu com recato sem desviar os olhos de Brandon.
— E por pouco não se casou, não é?
Arabella e Muriel sufocaram um gemido de espanto à referência sobre o rompimento
do noivado por parte de Eleanor.
— Ora, Lydia, está pretendendo fazer graça? — Phoebe ironizou.
Com a brincadeira sem propósito. Lydia acabou prestando um bom serviço a
Brandon e à família. Os outros convidados ficariam com a ilusão de que as divergências
entre eles havia muito tinham sido esquecidas. Logo cessariam os comentários sobre a
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rosto, suspirou com resignação, inclinou-se para a frente, apoiou os antebraços nas coxas
e fitou o conde.
— Eleanor recusou-se a casar comigo por ter-me apanhado... em situação
comprometedora com outra mulher.
— Lydia. — O conde nem ao menos piscou. Brandon ficou boquiaberto pela
surpresa.
— Como milorde soube? Burrough suspirou.
— Conheço minhas filhas. Lydia insistiu em casar-se muito jovem e não houve como
dissuadi-la. Não demorou muito e ela começou a procurar alegrias fora de casa.
— Sei que não é desculpa, mas eu estava bêbado. Não me lembro do que houve.
— Tomo suas palavras como verdadeiras. — O conde demonstrou simpatia. — Sou
testemunha de que sempre foi honrado, apesar de beber em excesso.
Brandon não discutiria com Burrough que, felizmente, não perdera a confiança nele.
— Há quase dois anos, não sei o que é tomar um drinque.
Os meses que se seguiram ao acidente foram terríveis e o láudano tinha suas
atrações. Brandon resistira bravamente. No momento, tomava doses fracas por causa da
dor na perna, sem o risco de acabar em um buraco qualquer do Oriente com um
cachimbo na mão.
— Isso prova seu valor. Seu pai tinha alguns vícios, mas era um bom homem.
Aposto que meu jovem amigo se parece com ele.
Brandon, comovido, não soube o que responder.
— Não sei se Eleanor poderá perdoá-lo, mas tenho certeza de uma coisa. Se ela
não puder esquecer o que houve e os dois não fizerem as pazes, minha filha jamais
encontrará a felicidade. E tudo o que mais quero é ver Eleanor feliz.
Era exatamente esse o desejo de Brandon.
— Ou os dois se casam, ou se odeiam. Para mim, tanto faz. Contanto que minha
filha alcance a felicidade.
O conde era direto nas afirmativas.
— Por que milorde demorou esse tempo todo para tomar uma decisão?
O velho lorde sorriu.
— Eu tinha de esperar até meu jovem amigo ficar sóbrio.
Eleanor evitou Brandon o quanto pôde nos dois dias seguintes, sem dar a ele a
prometida oportunidade de provar sua mudança de comportamento.
Sentada sob uma cobertura no gramado dos fundos da propriedade do pai, ela
aguardava o almoço, que seria servido ao ar livre. Refletiu que a afronta talvez houvesse
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no rosto dela. Eleanor encolheu-se no assento para evitar tocá-lo e inalou o aroma. Pediu
a Deus para que sua reação se devesse à falta de companhia masculina, e não à
presença de Brandon.
Ele se endireitou e murmurou qualquer coisa relacionado a morangos. Eleanor
lembrou-se de ter usado creme de morango na pele naquela manhã e um perfume de
idêntica fragrância.
— Está reclamando do meu perfume, lorde Creed? — ela perguntou em voz baixa.
Os demais ocupantes da mesa prestavam atenção aos criados que passavam com
as bandejas lotadas de iguarias.
Brandon virou-se para Eleanor. Continuava sendo um homem atraente. Uma pena
que seu interior fosse exatamente o oposto.
— De maneira alguma. Milady sempre me recorda de morangos silvestres em um
dia de verão.
As palavras inocentes na voz de Brandon envolveram-na como uma onda de calor.
Como desprezar alguém que era tão insinuante? Seria uma fraqueza de sua parte ou o
exemplo do poder de sedução daquele homem?
Eleanor não soube a resposta. Tomou um gole de limonada para diminuir a quentura
que não a abandonava.
Brandon pouco falou durante a refeição. Limitou-se a responder às perguntas que
lhe eram dirigidas. Ocasionalmente, ele encostava o joelho no dela por baixo da mesa.
Eleanor receou que as batidas desordenadas de seu coração pudessem ser ouvidas na
Escócia. Admitiu estar muito nervosa por ignorar o motivo que levara Brandon a aceitar o
convite.
A sobremesa constituiu-se de morangos frescos e creme batido. Brandon levou à
boca uma colherada e Eleanor foi incapaz de afastar os olhos da maneira sensual como
ele passou a língua nos lábios.
Ela estremeceu.
Brandon retornou a colher para a tigela e sorriu com malícia para Eleanor.
— Morangos são os meus prediletos.
Ela não comeu a sobremesa e decidiu trocar o perfume por água de rosas. Valeria a
pena descobrir se as rosas eram as flores favoritas de Brandon.
Ah, não se deixaria abater. Ele pretendera apenas perturbá-la.
O almoço terminou e Eleanor, com dor de cabeça, levantou-se para retornar ao seu
quarto. Brandon ficou em pé e desequilibrou-se, apesar da bengala. Ela teve de ajudá-lo,
ou ele cairia.
Brandon apoiou-se na perna sadia enquanto estirava a outra, e uma contração labial
definiu a extensão da dor que ele sentia. Com um riso sarcástico, desvencilhou-se dela
sem agradecer e Eleanor concluiu que o orgulho devia ser tão doloroso quanto a perna
ferida.
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incomodar Brandon.
— Não posso.
Era humilhante admitir a própria fraqueza diante de uma platéia que o conhecia tão
bem. Era terrível confessar o receio de não resistir à tentação.
— Vinho do Porto, talvez — Faulkner insistiu. — Tem de beber alguma coisa.
Era provável que Faulkner estivesse procurando uma companhia, por não querer
embebedar-se sozinho. Brandon conhecia bem a triste situação e sentiu piedade do outro.
Mas não se arriscaria a voltar a um passado recente só para salvar um jovem tolo que
não imaginava o tamanho do buraco que o aguardava.
— O que acha de um gole de xerez?
Era evidente que Faulkner não desistiria com facilidade. Antes de Brandon fazer um
comentário grosseiro, a salvação veio de fonte inesperada.
— Tome um café, lorde Creed. — Eleanor ofereceu-lhe uma xícara. Era uma visão
angelical que usava um vestido de noite de cor creme com entremeios dourados. —
Lembro-me que milorde gostava de café. Preto com açúcar, não é?
Admirado, Brandon anuiu e aceitou a oferta. Não entendia como Eleanor ousara
ajudá-lo e ainda com alusão ao passado. Por que ela havia decidido intervir a seu favor,
mesmo tendo sido traída de maneira tão deplorável? Uma reação normal seria Eleanor se
regozijar com o constrangimento dele.
— Obrigado, lady Eleanor. Sinto-me lisonjeado por lembrar-se de um detalhe tão
insignificante. Para mim, era o remédio depois de uma noitada de orgia. As folias
desregradas foram esquecidas, mas não o café.
— Não há de quê. — O sorriso simpático foi um bálsamo para o coração de
Brandon. — Se milorde quiser mais, há um bule com café quente no aparador.
Eleanor afastou-se como se nada houvesse acontecido. Brandon perguntou a si
mesmo se a cena não teria sido fruto de sua imaginação. Ela viera em seu socorro? Ou
seria uma maneira sutil de demonstrar superioridade?
De qualquer maneira, estava muito agradecido. Faulkner serviu-se de uísque e na
certa não o procuraria mais para beber.
Em prosseguimento à festa, teriam um período de boa música, uma ceia leve e
algumas horas de carteado. Brandon resolveu ficar para escutar música. Seria descortês
sair antes. E, dependendo do estômago, enfrentaria a ceia. Mas iria para os seus
aposentos antes do início dos jogos. Bebia-se muito durante as jogatinas.
Eleanor sentou-se ao piano e Brandon teve a impressão de voltar no tempo. O rosto
dela era delicado como um camafeu. A maturidade lhe conferia um aspecto ainda mais
belo do que fora antes. Eleanor havia sido uma linda jovem e se transformara numa
mulher requintada.
A música executada com maestria foi ouvida em silêncio. Eleanor teria se refugiado
na música para vencer a solidão? Brandon recordou-se da última vez em que a ouvirá
tocar. Tinha sido naquela noite fatídica. Eleanor ficara com a fama de moça que rompia
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compromissos por não revelar a ninguém a insanidade cometida por ele. Ela o teria
amaldiçoado toda vez em que se sentava ao piano no salão vazio?
Brandon tivera o álcool como companhia. E Eleanor? Nem mesmo tinha contado
com as irmãs mais novas, que haviam se casado cedo.
O que não deixava de ser uma vantagem, pois ela ainda poderia fazer um bom
casamento. Mas pensar que o propósito de hospedar visitantes fora atrair candidatos à
mão de Eleanor deixou Brandon mal-humorado.
Mesmo sem nenhum direito à afeição dela, não lhe agradava a idéia de outro
homem na vida de Eleanor.
Lembrou-se de como Eleanor havia corado diante da afirmação de que ele teria
preferido a presença dela na cama a seu lado. E o fato deixou-o num dilema.
Brandon viera à casa dos Burrough para desculpar-se de atos passados. Mesmo
admitindo que não tinha aceitado o convite apenas para reparar os erros, não lhe ocorrera
que ainda nutrisse afeição por Eleanor. Na verdade, ele continuava a desejá-la.
Era uma tolice deixar-se levar por uma fantasia, mas, com certeza, não abandonaria
a idéia de reconciliação. Se conseguisse provar que mudara, talvez Eleanor lhe
concedesse uma chance. Brandon também ansiava por descobrir a verdadeira mulher em
que ela se transformara.
Pela primeira vez em muito tempo, ele sentiu a esperança de um futuro em sua vida.
Depois dos irmãos casados e com filhos, pensara no sobrinho que poderia herdar o título.
De repente, a idéia de passar o resto da vida como tio Brandon não lhe pareceu tão
convidativa.
E tudo por causa de Eleanor. Os anos de afastamento não haviam diminuído a
profundidade de seus sentimentos por ela.
Seu retorno àquela casa não fora um ensejo fortuito. Conseguir o perdão de Eleanor
e aplacar a própria consciência eram detalhes diante do que havia descoberto a respeito
de si mesmo. Via diante de si a mão do destino, que lhe concedia mais uma ocasião para
recuperar a felicidade que ele atirara no lixo havia muitos anos em uma noite de
embriaguez.
Na verdade, motivos não faltavam, mas também eram de menos. Teria de agradecer
à sua boa sorte.
Fora-lhe dada a oportunidade de descobrir se Eleanor continuava sendo a mulher de
sua vida e se ele era o homem que a merecia.
Qual o tolo que recuaria diante de um momento auspicioso como aquele?
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acariciasse as faces. Estava à sombra da estátua de Diana, a caçadora. Com uma das
mãos Eleanor tocava o pé de mármore e com a outra segurava a barra da saia, que
insistia em erguer-se.
A quietude do jardim acalmou-lhe a irritação. A água borbotava na fonte e as folhas
farfalhavam em um refrão tranqüilo. Escutava-se ao longe o zumbido dos insetos
noturnos. No ar, o perfume delicado dos jasmins. Seria uma noite perfeita se pudesse
esquecer os olhares dos familiares e dos conhecidos quando tinha interferido a favor de
Brandon. Eleanor reconheceu que sempre havia gostado de ajudar os desvalidos. E
Brandon lhe parecera perdido.
A opinião dos outros a preocupava e o olhar de censura das irmãs era difícil de
suportar. Até mesmo Arabella se mostrara inquieta, como se receasse algum desatino.
Talvez elas acreditassem que sua reputação estava em perigo com a volta de
Brandon. Nesse caso, sabiam muito pouco a respeito de Eleanor Durbane e nem tinham
autoridade para julgá-la. Somente Arabella era feliz no casamento. As outras havia muito
costumavam empreender fugas ocasionais do matrimônio e deveriam estar mais atentas
à fama delas. Era possível que também temessem por um desvario de Eleanor, causado
por muitos anos de celibato. Imaginariam que ela sairia correndo atrás de Brandon como
uma louca?
Sorriu diante de tantos pensamentos absurdos.
— Espero não estar interrompendo.
Eleanor assustou-se. Não percebera a aproximação. Havia quanto tempo ele a
observava?
Brandon chegou mais perto. A gravata branca refletia o luar e destacava-se no traje
escuro de noite. Era um homem muito atraente e irresistível quando sorria.
— Estou sozinha, lorde Creed. Nada há para ser interrompido.
Brandon apoiou-se na bengala.
— Eu me referi a perturbar seus pensamentos, Eleanor.
— Não se preocupe. Não eram importantes.— Jamais confessaria quem lhe
ocupava a mente. — Milorde, não me lembro de ter-lhe dado permissão para usar meu
nome de batismo. — Era urgente endurecer o coração, que ameaçava derreter diante de
Brandon.
Ele deu mais um passo e Eleanor sentiu a pressão da figura imponente.
— Minha querida jovem, essa permissão me foi concedida há dez anos e não pode
ser retirada.
Havia quanto tempo não a chamavam de "jovem"? Eleanor encarou-o.
— Se retirei minha promessa de casamento, posso retomar essa autorização
quando eu quiser.
Brandon deu risada, e ela sentiu um arrepio na espinha.
— Eu posso recusar-me a devolvê-la — ele caçoou.
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— Milorde está pretendendo dizer que fará o que lhe agradar, independentemente
da minha vontade?
— Sim, quando estivermos sozinhos.
— Então tomarei providências para não ficarmos a sós. Boa noite!
Brandon segurou-a pelo cotovelo, onde a luva terminava. A mão dele era quente e
firme na pele nua.
— Ellie, precisamos conversar.
Eleanor fechou os olhos. Seu nome na voz de Brandon tinha o poder de hipnotizá-la.
Se ao menos a visão daquela terrível noite pudesse ser apagada... Queria acreditar nele.
Seria capaz de aceitar até se Brandon dissesse que havia sido imaginação sua tê-lo visto
na cama com Lydia. A embriaguez seria mais um motivo para perdoá-lo.
— Não posso imaginar qual o assunto do seu interesse, Brandon. — Desde a
traição, nunca mais o chamara pelo nome de batismo.
— Podemos começar pelo fato de você não ter me revelado o motivo do
rompimento.
— Eu já lhe disse. — Eleanor arqueou as sobrancelhas. Os olhos castanhos ficaram
mais escuros.
— Seu conceito sobre mim é tão baixo a ponto de acreditar que eu cometeria um ato
desonroso desses em sã consciência?
— Eu poderia inferir que a sua apreciação a meu respeito é nula.
Brandon soltou-a e Eleanor sentiu falta do toque cálido.
— Eu sempre a tive no mais alto nível de julgamento.
— Tão alto que se deitou com minha irmã horas depois de ter-me pedido em
casamento. — As feridas do coração pareciam novamente abertas.
— Eu não sabia o que estava fazendo.
— É mesmo?
— Eleanor, já me disseram que outra pessoa tomava posse de meu corpo quando
eu bebia.
Talvez fosse verdade. A noite da festa dos Pennington em que Brandon se aliviara
na poncheira e lhe sorrira durante o ato obsceno havia sido um pesadelo. Ela pensara
mesmo tratar-se de outra pessoa.
— Ah, então foi outro homem que levou minha irmã para a cama. E tudo será
perdoado. — Eleanor nunca havia sido tão sarcástica. Ao mesmo tempo em que adoraria
esquecer tudo, tinha vontade de feri-lo fundo.
— Se seu perdão fosse fácil de conseguir, Eleanor, não valeria a pena o esforço. Se
eu estivesse de posse da minha razão naquela noite, saberia quem tinha vindo até a
minha cama.
Novamente a insinuação de que Brandon confundira Lydia com ela.
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— Milorde afirma que estava bêbado. Já ouvi contar sobre os efeitos do álcool em
um homem. — Eleanor não considerava verdadeira a perda da consciência por beber em
excesso.
Brandon mexeu os pés. A perna incomodava.
— Eleanor, só me lembro de poucos detalhes. Alguém entrando em meu quarto e eu
acordando com Lydia a meu lado.
Seria aquela a verdade?
— Lorde Creed, não sei se posso acreditar no que me diz. Sinto uma certa
ansiedade, o que me faz supor que há mais alguma coisa além disso. E se quer saber,
também não me importa descobrir do que se trata.
— Mais uma coisa. Recordo-me de ter pensado naquela noite que havia sido
Eleanor Durbane quem veio à minha procura.
Felizmente estava escuro e Brandon não podia ver o rubor no rosto de Eleanor.
— Sua opinião a meu respeito deve ser primorosa! Acreditar que eu ousaria seduzi-
lo!
— Melhor do que sua idéia de que eu facilmente a confundiria com outra. Como o
meu pedido havia sido aceito, achei que nós dois nos desejássemos. Minha suposição
estava errada?
— Não, não estava — Eleanor respondeu depois de hesitar. O orgulho tinha um
gosto amargo.
Brandon tocou-lhe o rosto com o nó dos dedos.
— Então, deve entender por que minha mente nublada pôde imaginá-la na minha
cama.
Ele não pedia seu perdão, mas seu entendimento. E se o entendesse, seria fácil
perdoá-lo. Mas como aceitar o sentimento de estar perdida? Era como havia se sentido
no passado quando ele a beijara. Naquele momento faria qualquer coisa por Brandon.
Atenderia a qualquer pedido seu.
— O que deseja de mim, Brandon?
— Não é bem desejar, mas necessitar.
— E qual a diferença?
— Desejar sugere uma urgência que pode ser saciada.
Ele procurava constrangê-la?
— A necessidade tem uma conotação diferente — Brandon prosseguiu.— Uma
pessoa apenas tem necessidade de coisas intrínsecas à sua sobrevivência. — Ele
encarou-a com olhar intenso.— Eleanor, necessito da sua compreensão a respeito do
que acontece comigo quando bebo. Isso independente da minha vontade. Creia que eu
faria qualquer coisa para desfazer o que houve. É vital que acredite em mim.
Eleanor sentiu a boca seca. Passou a língua nos lábios sem desviar o olhar.
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— Milorde não deveria dizer tais coisas. — Ela não sabia se poderia dar-lhe o que
ele precisava. — Abandonou realmente a bebida, Brandon? — Ouvira dizer exatamente
isso para as pessoas, mas era imprescindível ouvir a resposta dele enquanto estavam
sozinhos.
— Sim, Eleanor. Deixei de beber em definitivo.
— Foi difícil? — Para entender o que acontecia com Brandon, precisava de mais
informações.
— Bastante.
— Ainda tem vontade de tomar um drinque? A risada dele foi amarga e irônica.
— Deus é testemunha que sim.
Para Eleanor, talvez não fosse difícil de compreender. Havia épocas em que ela
desejava comer tortas de maçã e pensava que ficaria maluca se não as tivesse. Não
raras vezes comia uma torta inteira. Imaginou se o mesmo acontecia com Brandon em
relação à bebida. Talvez fosse, porém em escala mais perigosa.
No entanto todo raciocínio se tornava falho quanto Brandon Ryland estava tão
próximo e parecendo tão esperançoso.
— Por que eu? — A pergunta saiu de maneira intempestiva. — Por que milorde
necessita que eu acredite?
Com certeza, ele desapontara numerosas pessoas. Teria falado com todos da
mesma maneira?
Não seria preciso refletir muito sobre o assunto. Eleanor sabia que a resposta seria
negativa. Ela era a única com quem Brandon abria o coração e a quem fazia esse pedido.
— Não sei. Talvez pelo fato de o meu arrependimento de havê-la prejudicado seja o
maior de todos, apesar de outras coisas horríveis que fiz.
Eleanor sentiu um nó na garganta e as batidas frenéticas de seu coração.
— Mesmo a respeito do episódio da poncheira de lady Pennington?
Oh, Deus, como pudera fazer uma pergunta daquelas? Não tinha sido ela quem
ensinara às irmãs a importância de se comportar como uma dama, mesmo que os
pensamentos fossem indecorosos?
A risada de Brandon Ryland não poderia ter sido mais prazerosa.
Eleanor advertiu a si mesma para não entregar a ele a confiança tão depressa.
Brandon Ryland era perigoso para seu coração e sua mente.
— Mesmo a respeito do episódio da poncheira de lady Pennington — ele confirmou,
sério.
Eleanor estendeu a mão enluvada, e Brandon a segurou com a mesma elegância
com que usava a bengala.
— Todos merecem uma oportunidade de redimir o passado, Brandon. Este é um
mandamento cristão. Eu também tenho muito do que me arrepender. Tem a minha
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Capítulo III
Dar uma oportunidade para Brandon provar que sua índole havia se transformado
tomou boa parte dos dias de Eleanor. O que não a desgastou. Pelo contrário. Se não
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pensava na traição que sofrerá, ela adorava sua companhia. No entanto não conseguia
esquecer por muito tempo o que ele fizera.
Brandon havia se tornado mais sensato com a idade. Não se chocava com qualquer
coisa e não julgava nada com dureza. Participava das conversas quando falavam com ele
ou se tinha algo importante a declarar. Não iniciava tópicos por sua conta, embora falasse
de vários assuntos quando estavam a sós. O que aconteceu no dia seguinte e na metade
do outro.
Na verdade Brandon dava pouca importância aos outros, exceto ao pai de Eleanor.
E, com certeza, todos notavam que sua atenção estava centrada na anfitriã.
Por esse motivo a atitude de suas irmãs se modificara de modo ostensivo. Elas
tinham vindo para a casa do pai com criados e bagagens, como todas as famílias que
viajavam para longe. Cada uma trouxera sua criada particular, mas desde a chegada de
Brandon, passaram a chamar Eleanor com insistência. Não precisavam de sua ajuda, e
sim de respostas. Queriam saber se o visconde tornara a fazer-lhe a corte, o que ele tinha
dito ou não dito. O item de maior insistência era o comportamento de Eleanor. E não
deixava de ser elogioso achar que seria pedida em casamento logo após os primeiros
dias da reunião festiva.
Eleanor sempre replicava que Brandon merecia um voto de confiança. Arabella
achava que seria muito justo. Muriel, Phoebe e Lydia não se convenceram. Lydia, em
particular, foi categórica. Eleanor não deveria acreditar em Brandon.
— Homens não mudam — Lydia garantiu. — Aprendem a mentir melhor.
Eleanor sentiu pena da irmã acreditar nisso.
Naquele dia, Eleanor teria de levar comida e suprimentos para os desvalidos da
aldeia. Como a senhora de uma das propriedades mais ricas da área, tinha o dever de
prover aos necessitados.
Saiu pela manhã. Escutou com paciência as queixas da sra. Rudd sobre os ataques
de reumatismo e o relato feliz da srta. Jones a respeito do sr. Smith, um próspero
fazendeiro que a visitava com freqüência. Aquelas mulheres tinham grandes problemas e
certamente nem se importavam com a reputação de um visconde. A sra. Rudd, com
freqüentes crises reumáticas que a deixavam enrijecida, não tinha ninguém para cuidar
dela. A srta. Jones, de família muito pobre, ansiava por um bom casamento para ajudar
os pais.
A preocupação dos aldeões fez Eleanor pensar nos próprios dilemas. Tinha dinheiro
e conforto e seu futuro estava garantido, quer se casasse ou não. Sua inquietação maior
era com a saúde do pai, embora desconfiasse que um casamento adequado para ela
também traria a recuperação dele.
Voltou para casa decidida a não superestimar os conflitos afetivos. Cumpriria a
promessa feita a Brandon e lhe permitiria provar que derrotara o vício, sem esquecer que
ele era humano e, portanto, falível.
Todavia não tinha obrigação de perdoar. O que, de fato, também não era
significativo.
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Entrou em casa, foi para seus aposentos, lavou-se e trocou de roupa. Durante a
tarde faria companhia às irmãs e convidadas para um chá no salão. Os homens teriam
outras atividades.
Usando um vestido de musselina azul-escuro, Eleanor entrou no salão e foi recebida
com aplausos.
— Perdoem-me o atraso. — Sentou-se ao lado de Arabella. — Tive obrigações para
cumprir na aldeia.
— Acabamos de servir o chá, minha querida. — Lydia estendeu-lhe uma xícara. —
Lady Dumont estava nos informando sobre um livro delicioso recheado de escândalos
que ela descobriu.
A referida dama, uma senhora atraente de meia-idade, corou.
— Não creio que as donzelas deveriam escutar o texto. Embora não fosse a única
solteira naquela sala, Eleanor sentiu-se uma aberração da natureza. Trinta e dois anos e
ainda não se casara.
— Não se preocupe comigo, lady Dumont. Não sou nenhuma adolescente e também
gosto de histórias picantes. — Na verdade, havia lido apenas Tom Jones e dado uma
espiada em um livro de anatomia da biblioteca do pai. — Entretanto permitiremos que as
mais jovens e suas mães se retirem, se assim o desejarem.
As zelosas mães saíram com as filhas e Eleanor pediu para lady Dumont continuar.
A opulenta dama sorriu e tirou debaixo da poltrona um livro fino.
— O último volume das memórias de Fanny Carson — lady Dumont anunciou.
Eleanor sabia que Fanny Carson fazia parte do grupo social de Harriet Wilson, uma
famosa prostituta por entreter alguns dos mais poderosos homens da Inglaterra e do
continente. Da mesma maneira que Harriet, Fanny provavelmente oferecera suas
memórias a um editor e a peso de ouro.
Além disso, devia ter recebido dinheiro dos cavalheiros interessados em manter
ocultos seus deslizes.
Segundo lady Dumont, Fanny Carson revelava detalhes escabrosos de seus
amantes, ao contrário de Harriet, que mantivera um mínimo de decoro.
— Horace está nesse livro — lady Merrott comentou. — Estou ansiosa para saber o
que a sra. Carson disse a respeito de meu marido e se o achava tão intragável na cama
como eu.
Todas riram e até Eleanor, um tanto constrangida, teve de sorrir diante do senso de
humor de lady Merrott. Era de conhecimento geral que lorde Merrott não passava de um
bruto.
Lady Dumont folheou o livro e começou a leitura que, obviamente, já fizera antes.
Eleanor, apesar de sentir o rosto em chamas, riu com as outras. A sra. Carson não foi
generosa na descrição, e lady Merrott ajudou com comentários próprios.
A audaciosa leitura prosseguiu com um relato igualmente sarcástico sobre lorde
Pennington.
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— Milady deveria publicar suas memórias — lady Merrott disse para lady Dumont.
As outras deram risinhos maliciosos.
— Milady está sugerindo que tenho amantes?
Mais risadas sugeriram a Eleanor que nenhuma mulher na sala parecia chocada. A
impressão era que as senhoras casadas não se importavam em tornar públicas as
intimidades, por piores que elas fossem. Para ela, tal atitude era incompreensível.
— Se eu publicasse minhas memórias, suponho que deixaria um ou dois cavalheiros
de cabelos em pé.
— Creio que o número deve ser mais significativo — Lydia comentou, rindo.
— Pois nomeie mais algum — lady Dumont defendeu-se, satisfeita por sobressair,
mesmo que fosse por motivos desabonadores.
Eleanor considerou que a infidelidade não deveria ser motivo de jactância.
— Wynthrope Ryland — Lydia afirmou.
O irmão de Brandon?, Eleanor espantou-se. Ele era bem mais novo do que lady
Dumont.
— Wynthrope Ryland não se importaria muito se eu revelasse detalhes do nosso
caso.
— A mulher dele se importaria, e muito.
Eleanor não percebeu quem falara.
— Interferir em casamentos felizes nunca dá certo — lady Dumont falou com
surpreendente sinceridade. — Mas ainda temos um Ryland sem compromisso. E, diga-se
de passagem, valeria a experiência.
Eleanor teve vontade de sumir em um buraco no chão.
— Ele está no livro? — lady Fairchild indagou.
— Sim, e ocupa várias páginas — lady Dumont respondeu.
— E está presente na nossa festa — Phoebe interveio e fitou Eleanor de relance. —
Será melhor deixá-lo em paz.
— Merrott também está aqui e ninguém se importou em ouvir falar dele. — lady
Dumont olhou para Eleanor. — A menos que milady prefira que eu não leia.
Era evidente que lady Dumont mal continha a ansiedade de reler o capítulo sobre
Brandon. E, para ser sincera, Eleanor admitiu a vontade de escutar. Brandon lhe garantira
não ser um libertino. Por que, então, tinha se relacionado com prostitutas? Gostaria de
saber a opinião de Fanny Carson sobre ele como amante. Se fosse ruim, talvez parasse
de pensar nos poucos beijos trocados havia um século!
Também não daria o gosto de dizer a lady Dumont e às outras mulheres presentes
que não queria ouvir para não se aborrecer.
— Estou tão intrigada como todas.
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Desde o acidente, Brandon não montava por tanto tempo. Na verdade, evitava esse
tipo de exercício, receoso de que a perna não suportasse o esforço.
Apesar da rigidez e da dor, não se arrependeu de ter feito o passeio com seus
pares. Aproveitara a oportunidade para julgar os outros solteiros presentes ao encontro e
concluiu que nenhum deles poderia ser considerado um sério competidor. O que não
deixava de agradar a Brandon, que sempre gostara de Eleanor. Admitiu que atualmente a
desejava mais do que antes. Em poucos dias havia descoberto a verdade. A paixão
continuava presente. Aspirava a casar-se com Eleanor e faria qualquer sacrifício para
atingir a meta. Primeiro teria de remediar os desenganos. Depois, se tivesse sorte, ela o
aceitaria.
Reconheceu que não a merecia. Ele era um homem com mais cicatrizes internas de
que externas. Humilhara a si mesmo e à família um sem-número de vezes. Se não
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houvesse sido um bêbado, poderia ter salvado a vida do pai. Mas como não se podia
mudar o passado, seria mais sensato controlar o presente. Poderia usar os erros para
construir um futuro melhor, e já conseguira algumas vitórias. Algum dia talvez obtivesse o
perdão daqueles a quem havia prejudicado. E depois de muito tempo, talvez ele mesmo
se perdoasse.
Contara com o apoio da família e sentia-se fortalecido para reiniciar outra jornada.
Dessa vez com muito critério e sensatez.
Por andar devagar, foi o último a entrar na casa. Lorde Brend, marido de Lydia,
oferecera-se para acompanhá-lo, mas Brandon recusou a gentileza. Não se sentiria à
vontade para conversar com ele. Não era por acaso que alguns lordes pouco falavam
com Brend.
Ficar sozinho era agradável depois da tarde tumultuada. Assim, também poderia
esconder dos outros quanto o exercício o afetara. O orgulho masculino era uma coisa
terrível.
Devagar e apoiado na bengala, arrastou-se escada acima. O suor da testa, que
nada tinha a ver com a temperatura ambiente, era conseqüência da dor, que havia
aumentado. Talvez fosse mesmo chover.
Chegou aos seus aposentos andando com dificuldade, suado e de mau humor.
Charles, seu criado particular, esperava com um banho quente e roupas passadas. Que
Deus abençoasse o homem.
— Precisa da minha ajuda, milorde?
— Apenas tire as minhas botas, Charles. Eu darei um jeito sozinho com as roupas,
obrigado.
Depois do acidente, Brandon fora obrigado a esquecer o orgulho e a depender muito
de Charles. No momento, porém, queria apenas ficar sozinho.
Charles não discutiu. Puxou as botas sujas dos pés de Brandon e levou-as para
polir.
— Voltarei em uma hora, milorde — ele prometeu. Brandon sorriu quando o idoso
criado saiu. Charles tinha cuidados paternais com ele. O certo seria Brandon tomar conta
de tudo. Afinal, era o visconde.
Aquela responsabilidade fora uma das razões que o haviam levado a beber. Passara
a vida tentando ser o que se esperava dele. Quando bebia, as frustrações eram libertadas
e com o tempo aquilo se tornara uma idéia fixa. Libertar os demônios que o atormentavam
era o objetivo principal. Naquela altura, reconhecendo que nada mais se esperava dele,
tinha acabado por reconciliar-se consigo mesmo.
Brandon tirou as roupas e deixou-as sobre a cama. Charles cuidaria delas. Despido,
rodeou a cama, apoiado no colchão, e alcançou a banheira que estava próxima. Com
esforço, esgueirou-se para dentro e, no mesmo instante, a dor começou a ceder. Com
cuidado, deslizou o corpo para baixo.
A água quente operava milagres na perna machucada. Ficou imerso até o banho
esfriar e os dedos ficarem enrugados.
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do caso pela voz das damas presentes, na certa o tomaria como um libertino. E essa era
uma imperfeição que ele se vangloriava de não ter.
Eleanor o tomaria por mentiroso. Na realidade, Brandon sempre havia preferido
relacionamentos estáveis a casos fortuitos, embora os últimos tivessem se tornado
freqüentes durante os períodos de embriaguez. A relação com Fanny Carson se
prolongara por vários anos. Talvez por isso Fanny tinha decidido ser... bondosa com ele.
Bem, não deixaria que percebessem seu aborrecimento. Muitos homens na
Inglaterra haviam sido amantes de prostitutas. O que o perturbava era o efeito da notícia
em Eleanor. Não lhe importava a opinião das damas ou dos cavalheiros a seu respeito,
mas apenas a de Eleanor.
E no momento devia ser a pior possível.
Teria de falar com ela.
Conseguiria fazê-la entender?
O destino mais uma vez encarregara-se de mudar-lhe o trajeto.
Brandon acabava de entrar na biblioteca quando foi encontrado pelas irmãs de
Eleanor. Na certa, elas o vigiavam.
— Está procurando alguma coisa, lorde Creed?
Depois de fumar charuto, Brandon acompanhara os homens até a sala de estar.
Havia ficado na companhia dos convidados por meia hora e, depois, saíra à procura de
Eleanor.
— Ou alguém? — Muriel fingiu-se interessada em um dos livros das prateleiras.
— Espero que não seja Eleanor — Lydia falou com superioridade.
— Sinto desapontá-la — Brandon retrucou com frieza. — De fato, estou procurando
Eleanor.
— Milorde tornou a provocar aborrecimentos para nossa irmã? — Muriel foi a porta-
voz das irmãs.
— Não, pelo que eu saiba. — Ele fingiu-se de inocente.
— E o que me diz das memórias de Fanny Carson? — Phoebe indagou.
Brandon fitou-as e refletiu que as quatro lembravam anjos vingadores. Arabella era a
única que aparentava um certo grau de bondade.
— Não tive nada a ver com isso — ele se defendeu. — Não escrevi o livro nem
chamei a atenção de Eleanor sobre o mesmo.
— Milorde já esqueceu o sofrimento que causou à nossa irmã no passado? — Muriel
adiantou-se, belicosa.
— Isso é entre mim e ela.
— Todavia permanece o fato de que milorde tem por hábito fazer Eleanor sofrer —
Lydia argumentou.
— É verdade?
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A Eleanor não importavam os fatos como um todo e ela deu graças aos céus por
Brandon não imaginar o verdadeiro motivo de sua raiva. Não pretendia julgá-lo, nem
mesmo o considerava um vilão. Simplesmente estava com ciúme!
Não entendia como Brandon não se sentira humilhado, não se importando com que
a sociedade pensava dele. Era possível até que apostasse na volatilidade dos
escândalos. Em pouco tempo Fanny Carson e suas memórias seriam esquecidas.
Eleanor reconheceu ter-se aborrecido não por Brandon haver conhecido
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intimamente várias mulheres, mas por ela não ter sido incluída na extensa lista! Como a
pudica Eleanor Durbane poderia permitir-se um pensamento tão vergonhoso? E como
tinha coragem de admitir isso para si mesma?
Muito pior era ocupar a mente com tais pensamentos a respeito de um homem que a
traíra! Era imperdoável até mesmo a simpatia que começava a experimentar por ele. O
que, no entanto, era passível de explicação. No caso de Brandon, o consumo exagerado
de bebidas podia ser encarado como uma doença, e ela sentiria piedade por qualquer
outra pessoa nessa situação.
Na biblioteca do pai, lera muitas coisas a respeito do alcoolismo. Os médicos
modernos haviam feito estudos sobre o consumo de álcool na Inglaterra e os malefícios
dele advindos. A bebida em excesso não se restringia às classes populares. Pelo
contrário. Entre os cavalheiros, tomar drinques era considerada uma conduta aceitável.
Muitos acreditavam que a embriaguez causava uma espécie de febre no cérebro.
Não se poderia culpar ninguém por crimes cometidos em tal estado de confusão mental.
Talvez fosse verdade que Brandon não tivesse percebido a identidade de Lydia, que fora
à sua procura naquela noite.
Corou ao pensar na afirmativa de Brandon acerca do pobre desempenho sexual
masculino causado pela bebedeira. Ah, como ela gostaria que isso houvesse ocorrido
naquela noite. E acontecera o oposto. Lembrava-se muito bem da imagem
constrangedora. Durante muitos anos tinha sido acossada pela nítida visão de Lydia por
baixo de Brandon. E a raiva que sentira ameaçava voltar-se então para Lydia. O que era
um absurdo. Sua irmã não sabia do compromisso assumido por Brandon e ela.
Seria Lydia tão inocente? Na época, todos conheciam as intenções de Brandon. Por
que justamente não Lydia?
Bem, teria de tomar algumas providências. A primeira seria inteirar-se em
profundidade a respeito do alcoolismo.
Seu pai possuía vários volumes relacionados à matéria. Eleanor decidiu começar
com um trabalho de Thomas Trotter sobre embriaguez e seus efeitos no organismo
humano. Determinada a não perder tempo, voltou à biblioteca. O recinto estava vazio.
Brandon saíra.
Ela achou logo o que procurava. Carregando os estudos de Trotter, rumou para seus
aposentos e na porta foi detida por Arabella.
— Ellie, poderíamos conversar um pouco? — sua irmã pediu.
Arabella ainda estava em trajes de noite. Lá de baixo, ouviam-se risos e música.
Lydia, Muriel e Phoebe deviam estar entretendo os convidados.
— Claro. Vamos entrar?
— Importa-se se formos para o meu quarto? Preciso deitar-me.
— Belle, seu esforço não estará prejudicando o bebê?
— Estou bem. Sinto-me apenas cansada. Elas foram até os aposentos de Arabella.
— Henry está lá embaixo — Arabella comentou. — Eu o preveni de que nós duas
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Felizmente, não tinha se casado com Brandon na época ou teriam enfrentado graves
problemas com o vício dele. Eleanor não saberia compreendê-lo e o enlace se
transformaria num desastre.
Seria uma tolice alimentar esperanças de que Brandon houvesse mudado e que
poderiam ser felizes juntos?
Ah, era muito cansativo questionar os próprios sentimentos o tempo inteiro. Eleanor
era reservada e insegura. Não sabia o que decidir. Nem mesmo se a decisão tomada
seria correta.
Entrou em seus aposentos e encontrou acesa a lamparina da mesa-de-cabeceira.
Ainda era cedo para chamar a criada. Foi para a cama disposta a ler.
Não chegou a sentar-se. Havia um livro sobre o acolchoado.
Memórias de uma mulher bem-amada, de Fanny Carson.
Oh, Deus! De onde viera aquilo? Uma folha de papel aparecia por entre as páginas.
Eleanor abriu o livro e levantou a folha até a luz.
Leia tudo. Depois conversaremos. B.
Brandon estivera em seu quarto. Ele havia ousado invadir seu santuário e até
acendera a lamparina. Incapaz de sentir raiva, Eleanor ficou temerosa e excitada ao
mesmo tempo. Nenhum homem tinha entrado antes em seus aposentos.
Sentou-se na cama e aproximou o livro da luz.
Ignorou as partes lidas anteriormente por lady Dumont. Não precisava de mais
lembretes acerca da imponente masculinidade de Brandon.
Fanny Carson detalhava muitas qualidades masculinas de Brandon, mas também
esclarecia que o relacionamento deles havia sido exclusivo de ambas as partes e por
exigência de Brandon. Fiel e atencioso, ele a levava a parques e teatros, comprava-lhe
presentes e roupas. Era bondoso, compreensivo e tratava-a como uma dama, o que
Fanny Carson não experimentara antes. Eram amigos além de amantes.
As afirmativas de Fanny pioraram o estado de ânimo de Eleanor. Se Brandon havia
sido tão bondoso com a amante, como não seria com a esposa? A bondade e a
consideração teriam sido dela, Eleanor Durbane. Se ao menos ele pudesse ter escapado
ao vício na hora certa...
Uma transformação havia se operado. Eleanor o vira recusar bebidas, drinques e até
mesmo o vinho do jantar. Não tinha olhado para Lydia desde que chegara. Tudo havia
mudado. Brandon, ela, a situação. Se ao menos fosse possível interpretar os sentimentos
e as intenções dele! Brandon queria apenas desculpar-se ou desejava seu coração?
Ousaria esperar que os sentimentos dele não tivessem se extinguido?
Havia apenas uma maneira de descobrir. E enquanto ela não soubesse a verdade,
não valeria a pena arriscar.
Eleanor largou o livro de Fanny Carson e saiu do quarto. Apressou-se pelo corredor,
desceu a escada e entrou no salão de visitas. Não viu Brandon, mas Henry estava lá.
Evitou as irmãs e dirigiu-se ao cunhado.
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Se não estivesse tão nervosa, ela teria achado graça no tom conciliatório. Deu
alguns passos e parou diante de Brandon. Sentiu o aroma de sabonete e o calor do corpo
dele. Foi impossível não olhá-lo. Inspirou fundo à procura de coragem.
— Odeio saber que esteve com outras mulheres, mas não por considerá-lo um
patife. E sim por eu não ter sido uma delas.
Brandon arregalou os olhos.
— Isso não poderia ter ocorrido. Eu seria um crápula se tivesse me aproveitado de
uma donzela. Por mais que a desejasse, sempre a respeitei muito.
— Mas eu tive ciúme. Não suporto as mulheres que o conheceram tão intimamente.
Você fez a mim um pedido de casamento, e era eu quem deveria ter feito parte da sua
vida íntima.
— Eleanor, eu sempre a desejei. De todas as formas que um homem pode desejar
uma mulher.
Ela corou.
— Sei que não tenho o direito de sentir-me dessa maneira. Mas não perdi o
sentimento de posse a seu respeito, mesmo depois de rompermos o compromisso. Não
posso evitar a tolice de pensar que você ainda me pertence.
Brandon acariciou-lhe o rosto.
— Isso não é tolice. Desde que nos conhecemos, sentimos uma profunda e
recíproca atração. Peço-lhe apenas uma oportunidade para provar que sou digno da sua
pureza.
Eleanor não teve tempo de responder. Nem mesmo teria palavras para fazê-lo.
Brandon beijou-a.
Os lábios dele eram firmes e quentes. Como da última vez em que a havia beijado e
como se o tempo tivesse parado.
Eleanor jamais sentira nada tão doce como os beijos de Brandon. Quando mais
jovem, tinha pensado que suas reações fossem comuns. Imaginara que reagiria daquela
maneira diante de qualquer homem. Agora, porém, a verdade era uma só: somente
Brandon despertava-lhe aquelas emoções.
Agarrou-se nas lapelas do casaco e pressionou-se de encontro a ele. Brandon era
forte, sólido, musculoso. Depois de tantos anos de solidão, era uma sensação
maravilhosa ter alguém em quem se apoiar.
Também era delicioso não precisar fingir que não se importava mais com ele. Admitir
a realidade era como se libertar, ainda mais depois de ouvir que Brandon experimentava
os mesmos sentimentos por ela. Muito tempo fora perdido entre eles e havia vários
obstáculos a serem vencidos. Ambos teriam de aprender muitas coisas um a respeito do
outro antes de prosseguir na jornada.
Brandon sentiu a tensão de Eleanor e interrompeu o beijo. A respiração dele era
úmida e quente.
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Capítulo IV
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dela.
Eleanor certamente não imaginava o poder que exercia sobre Brandon. Ele a olhava
e sentia a alma leve. Ao vê-la sorrir, agradecia a Deus por conceder-lhe a graça de uma
nova oportunidade. Eleanor era sua salvação e sua recompensa. Faria o impossível para
conservá-la a seu lado.
Ela possuía todos os motivos para odiá-lo, mas o tratava com consideração e justiça.
Oferecia-lhe entendimento quando poderia desprezá-lo. E o mais importante era a forte
atração que existia entre eles. Pareciam duas metades da mesma laranja.
— Milorde aparenta satisfação — Arabella surpreendeu-o. Brandon ergueu o olhar e
considerou que o semblante pacífico bem poderia ser um disfarce para uma faca
escondida sob a blusa.
Ficou em pé com o auxílio da bengala.
— Perdão, milorde. Não queria causar-lhe transtorno. Brandon estendeu a perna.
Em dias quentes como aquele, incomodava menos.
— Transtorno nenhum, milady. Apenas um aspecto grotesco que pode ser
remediado com uma pequena caminhada.
— Eu poderia acompanhá-lo para me redimir? Ah, com certeza ela trazia uma arma
oculta!
— Será uma honra. — Brandon ofereceu-lhe o braço.
Eles andaram sem pressa pelo gramado. Arabella protegia-se do sol com uma
sombrinha de renda rosa que também fazia sombra para Brandon. Chegaram até a beira
da colina, de onde se avistava o vale inteiro, inclusive a propriedade Burrough.
Arabella soltou-se do braço de Brandon.
— Lorde Creed, desejo desculpar-me em meu nome e no de minhas irmãs. — O
olhar de Arabella não poderia ser mais sincero.
— Compreendo que pretendiam apenas proteger sua irmã.
— E muita bondade sua, milorde. — Arabella sorriu. — Mas os nossos métodos
deixam muito a desejar.
— Prudência não tem vez quando a família está envolvida.
— É um ponto de vista interessante. Não posso negar que milorde me agrada.
— Sinto-me honrado com a sua preferência, milady. Arabella ficou séria.
— Por favor, não faça minha irmã sofrer.
— Eu juro que farei o que estiver ao meu alcance para que isso não aconteça.
O sorriso de Arabella iluminou-lhe mais uma vez o rosto.
Voltaram para o local do piquenique, de braço dado e caminhando devagar.
Lady Dumont e lady Merrott observaram a chegada com grande interesse.
— Ah, minha querida — lady Dumont chamou a atenção de Arabella. —
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Receávamos que nunca mais trouxesse lorde Creed de volta para nós.
Brandon forçou um sorriso. Não entendia como Wynthrope fora capaz de ter um
caso amoroso com aquela mulher. Lady Dumont era tão sutil como um ninho de cobras.
Fisicamente poderia ser considerada uma bela mulher, mas sua personalidade arruinava
qualquer encanto.
— Não se desesperem, senhoras — Arabella disse. — O visconde voltou.
— Aceita uma maçã, lorde Creed?
Brandon fitou a fruta vermelha na mão de lady Dumont.
— Não, obrigado, milady. Tenho por hábito nunca aceitar frutas de uma bela mulher.
E um ensinamento bíblico.
Lady Dumont percebeu a ironia, mas riu assim mesmo.
— Milorde recusaria uma fruta oferecida por lady Eleanor? — lady Merrott perguntou
com olhar estreitado.
Eleanor, sentada com as outras irmãs, ergueu a cabeça ao escutar seu nome.
— Lady Eleanor — Brandon a fitou por cima dos ombros das outras senhoras —,
gostaria de tentar-me com uma maçã?
Eleanor fez um aceno de pouco caso.
— Eu não.
Brandon levou a mão ao peito, fingindo-se ofendido. — Vejam só. Lady Eleanor não
quer oferecer-me uma fruta.
— Pelo que me lembro, milorde — Eleanor falou —, eu teria mais sorte se o tentasse
com um pedaço de bolo.
Brandon riu, deliciado. Além de usar de elegância para devolver a tentativa de lady
Merrott em constrangê-la, Eleanor ainda se lembrara da fraqueza dos Ryland. Bolos.
— Lady Eleanor, eu me encontro em desvantagem. Milady lembrou-se do meu ponto
fraco.
— Milorde tem mais de um, não é verdade? — lady Dumont indagou com voz suave,
mas deixou clara a insinuação.
— Claro que sim, milady — Eleanor respondeu por Brandon. — Ele é homem.
Ontem à tarde, na hora do chá, a senhora e lady Merrott não escutaram as várias
imperfeições do sexo oposto?
Eleanor, com perspicácia, fizera as atenções se voltarem para as duas damas.
Brandon fitou a salvadora com um sorriso de gratidão e recebeu em troca um olhar
conspirador. Com o coração pulsando de alegria, considerou que o instinto de proteção
de Eleanor não era uma falha, mas sim uma qualidade quando dirigida a ele.
— Vamos jogar malha, Brandon! — lorde Burrough chamou-o, interrompendo a
conversa. — Precisamos de um parceiro.
Para um homem que se dizia enfermo, o pai de Eleanor tomava parte em um
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— Pode ter certeza de que todos já devem estar especulando. — Lydia parecia mais
aborrecida do que preocupada.
— Não se pode andar com lorde Creed sem despertar falatórios malévolos.
— A respeito dele ou de mim? — Eleanor irritou-se.
— Também dei uma volta com o visconde — Arabella interveio. — Serei crucificada
por isso?
— Ora, não seja tola. Fanny Carson afirma que ele é um conquistador — Lydia
retrucou.
— Se tivesse lido o que ela escreveu, Lydia, veria que não é nada disso — Eleanor
desmentiu-a.
— Eleanor! Por acaso leu o livro?
Eleanor pegou o volume de cima da mesa-de-cabeceira.
— Li o capítulo referente a Brandon e não encontrei nenhum indício de que ele fosse
dado a conquistas.
— O fato de ter lido essa sujeira mostra como o visconde já a corrompeu. — Lydia
não se dava por vencida.
Quanta hipocrisia!
— Não a vi achar que fosse uma sujeira durante a leitura de lady Dumont. Eu até a
ouvi pedir emprestado o livro.
Lydia endureceu a expressão e Eleanor preparou-se para uma disputa.
— Ellie — Arabella procurou desfazer os mal-entendidos —, nós apenas receamos
que faça algo de que venha a se arrepender.
— Por que eu haveria de lamentar o fato de ter dado a lorde Creed a oportunidade
de resgatar seus erros?
— Porque ele não mudou, querida — Lydia insistiu.
— Brandon não bebe mais. — Eleanor teve vontade de estapear Lydia pela
expressão de incredulidade.
— Isso é ele quem diz. Não se sabe o que faz às escondidas. Apesar de Eleanor
acreditar em Brandon, as palavras de Lydia a assustavam.
— Lydia, se tem provas de que lorde Creed mentiu, por favor, conte para nós.
Lydia deu de ombros e examinou as unhas.
— Nada tenho para contar.
— Então, pare de fazer especulações — Arabella pediu. — Se Eleanor confia em
lorde Creed, devemos respeitá-la.
Eleanor fitou Arabella com gratidão.
— Quando ela vier chorando, teremos de respeitar também?
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Lydia.
O que ela pretendia tão perto de Brandon? Lydia pôs a mão no braço dele. Brandon
levou o copo aos lábios e Lydia teve de retirar a mão. Ele fizera aquilo de propósito? O
que estaria bebendo?
Em outra época, Eleanor teria se afastado, acreditando que Brandon preferia
mulheres experientes e sensuais como Lydia. Mas o despeito empurrou-a para a frente.
Queria saber sobre o que os dois conversavam.
Brandon ergueu a cabeça ao vê-la aproximar-se.
O olhar dele foi de alívio e o sorriso tímido pareceu uma desculpa. Brandon a fitou
lentamente de alto a baixo e sua expressão transformou-se. Os olhos brilharam com
chama interior e idéia de posse. Um semblante predatório.
Eleanor chegou perto de Lydia.
— Lady Eleanor — Brandon não escondeu a admiração —, esta noite eu a vejo
excepcionalmente adorável.
Ela corou e resistiu à vontade de lançar à irmã um olhar triunfante.
— Eu lhe agradeço, lorde Creed. Espero não estar interrompendo nenhum assunto
importante, Lydia.
A irmã aparentava a mais completa inocência.
— Claro que não. Eu e lorde Creed estávamos apenas tagarelando.
— Então, não a incomodará se eu o roubar por um momento. — Eleanor passou seu
braço no de Brandon. — Lorde Creed manifestou interesse em ver a estufa de cultivo de
laranjas. Pensei em fazermos um passeio até lá antes do jantar.
Brandon não escondeu o olhar de surpresa diante da coragem de Eleanor e
apressou-se em aceitar o convite.
— Eu gostaria muito, lady Eleanor. — Ele deixou o copo com água sobre uma mesa
lateral.
— Não se demorem — Lydia avisou-os, — O jantar será servido logo.
Eleanor sorriu. A Lydia não importava se Eleanor perdesse o jantar. Estaria
preocupada com a reputação da irmã ou preferia que ela e Brandon não ficassem muito
tempo a sós?
Eleanor ignorou os motivos. Pretendia ficar um pouco sozinha com Brandon. Admitiu
o comportamento atrevido quando se tratava de Brandon, mas pretendia marcar o
território de sua propriedade.
De braços dados, deixaram a casa pelas portas francesas da sala de estar. Como
não pretendiam se demorar, Os convidados pouco teriam o que dizer. Afinal, todos
supunham que ela estivesse à procura de um marido.
Eleanor e Brandon andaram pelo jardim em silêncio e a tensão entre eles cresceu.
A estufa localizava-se na extremidade sul. Eleanor inspirou fundo ao abrir a porta. O
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Brandon não duvidava. Afinal, Lydia fora procurá-lo, apesar de saber que Eleanor
gostava dele. Teria de ficar atento para evitar que Lydia destruísse novamente e
esperança de felicidade para eles.
Posteriormente, falaria com Eleanor para explicar-lhe que o fantasma da bebida não
existia mais. Brandon preferia morrer a ceder outra vez ao vício. E não seria Eleanor
quem o conduziria de novo àquele comportamento destrutivo. Também teria de avisá-la,
com sutileza, para se precaver contra as intrigas de Lydia, embora não quisesse causar
dissabores entre as irmãs.
Eleanor estivera certa. Lydia era uma mulher amarga e infeliz. E por isso pretendia
atrapalhar a felicidade das outras. Já o fizera antes. Teria de ser impedida de repetir a
dose.
O charuto e o vinho do Porto que se seguiram ao jantar foram um sofrimento.
Brandon desejava um drinque para acalmar as pontadas na perna. Se tivesse feito os
exercícios necessários, não estaria naquelas condições. O desconforto era por sua culpa,
mas seu orgulho não lhe permitia afastar-se das atividades da festa.
Ele trouxera o láudano e, se o tomasse, provavelmente dormiria. Em geral deixava
para usar a droga quando o sofrimento e ele próprio se tornavam insuportáveis. E era o
que acontecia no momento. Locke o fitava sem cessar. Um provável candidato à sua
fúria. Teve de controlar-se pára não pular no pescoço do jovem. Se o fizesse, acabaria
por prejudicar a opinião de Eleanor a seu respeito. Acalmou-se um pouco ao lembrar que
ela não tinha o menor interesse pelos outros solteiros presentes à reunião do pai.
— Cavalheiros, peço que me desculpem. Preciso retirar-me.
Brandon empurrou a cadeira para trás. Levantou-se apoiado na bengala e na mesa.
Não houve como disfarçar a careta de dor. Sua perna doía demais. Teria de tomar um
cuidado extremo para não tropeçar.
Se ficasse mais um pouco na companhia dos cavalheiros, teria de tomar uma dose
de vinho para suportar a agonia da dor. Estava na hora de ir para a cama e entregar-se
ao sono induzido pelo láudano.
Lorde Burrough desejou-lhe boa-noite e um bom descanso, tendo em vista o baile
programado para o dia seguinte. Brandon sentiu-se enjoado só de pensar em dançar.
Seria preferível dormir sobre vidro quebrado. Mesmo assim, assegurou ao lorde que
estaria em forma para a grande festa.
— Não se preocupe, Creed — lorde Taylor falou. — Cuidaremos de lady Eleanor
durante a sua ausência.
Brandon arreganhou os dentes. Não se tratava de um sorriso e Taylor entendeu a
ameaça.
— Faça isso. Tenho certeza de que serão precisos muitos para suprir minha falta.
Brandon chegou a seus aposentos arquejando, suado e zonzo de tanta dor. Fechou
a porta, arrancou o casaco, jogou-o na cadeira e sentou-se na cama com um grito rouco.
O láudano estava na mesa-de-cabeceira. Tirou a rolha e tomou um gole. O gosto
nem lhe pareceu tão ruim. Estendeu-se sobre o acolchoado e esperou.
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mesmo a conhecia direito. Julgavam apenas sua aparência e a extensão de sua fortuna.
O pai veio em seu auxílio. Cansado, lorde Burrough decidiu retirar-se e Eleanor fez
menção de acompanhá-lo. Ele ainda não estava totalmente recuperado e ela preocupava-
se com sua saúde, apesar da desconfiança de que a grave enfermidade havia sido um
estratagema para persuadi-la a concordar com a festa.
Burrough entendeu que a filha queria ver-se livre dos rapazes bem-intencionados e
aceitou o braço oferecido.
Subiram a escada em silêncio. Entraram nos aposentos dele. Eleanor ajudou-o a
tirar o casaco, a desatar a gravata e removeu-lhe os sapatos. Burrough se deitou na
cama. A luz discreta suavizou a aparência das rugas.
— Quer que o ajude em mais alguma coisa, papai?
— Não, obrigado, filha. George virá em seguida. — George, seu criado, era filho
daquele que o servira anteriormente.
Eleanor sentou-se na beira da cama.
— Tem certeza que não precisa de nada? — Estou bem. Pode ir cuidar dos
hóspedes.
— Prefiro ficar aqui. O pai deu risada.
— Os solteiros não a deixam em paz, não é?
— Parecem galos querendo chamar a atenção de uma galinha. Eles não se
importam comigo. Querem apenas uma mulher rica.
— Assim acontece na maioria dos casamentos. E o que assegura a continuação da
sociedade.
As palavras do pai faziam sentido, apesar de impessoais.
— Não acha que eu deveria esperar mais de um marido?
— Sem dúvida, minha filha. E merece muito mais do que isso.
— O senhor e mamãe foram felizes, não é mesmo?
— Fomos. È nosso casamento foi arranjado.
—E mesmo? — Eleanor sempre pensara tratar-se de um enlace por amor.
— É verdade, minha filha. — Burrough segurou a mão dela. — Tivemos sorte em
descobrir que os nossos temperamentos combinavam. Não demorou muito e nos
apaixonamos. Quando isso aconteceu, sua mãe já estava grávida.
— De mim?
— Sim, minha querida. Em qualquer um dos casos, por amor ou por acordo,
casamento não é algo simples, Ellie. Entendimento, perdão e paciência são apenas três
das muitas virtudes que precisamos cultivar para atingir a felicidade. E confiança. Creio
que essa é a mais difícil, não é?
— Não estou entendendo.
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— Ellie, é preciso confiar no seu próprio valor. Não se culpe tanto e pense em si
mesma. Não tema tanto o futuro e aproveite o presente. A felicidade virá muito mais
depressa.
Não havia como negar. Eleanor se culpava por muitas coisas, inclusive pela
infelicidade das irmãs. Várias vezes refletira que Brandon havia escolhido Lydia porque a
irmã tinha mais qualidades do que ela. Naquele dia mesmo, Eleanor fizera perguntas a
Brandon sobre uma das suas amantes. Havia sido como se comparar a uma mulher
morta.
— Casamentos são parcerias — o pai continuou. — Existem épocas boas e ruins.
Há ocasiões em que ficamos com raiva do consorte e acreditamos que não
sobreviveremos aos empecilhos.
— E por que tentar? — Eleanor não acreditava que o verdadeiro amor poderia ser
tão difícil.
— O amor vale qualquer esforço, Ellie. É ele que nos faz ver o lado bom das coisas
e das pessoas. O amor é o que nos faz vencer as batalhas. Acha que eu e sua mãe
nunca discutíamos? Por vezes usávamos até de mentiras e desconfianças.
— Sempre pensei que a paz fosse perene.
Burrough tomou um gole de água que estava ao lado da cama.
— Uma vez sua mãe quase me abandonou. Levou você e Arabella para a casa dos
pais dela. Eu poderia tê-la impedido, mas o que sabia sobre educação de filhas?
Eleanor não se recordava do episódio. Visitavam muito os avós, mas não lhe
ocorreu a lembrança de nenhuma estadia mais demorada.
— Eu pedi perdão à sua mãe, lamentei tê-la aborrecido e jurei nunca mais cometer o
mesmo erro. Mantive a promessa, e ela acabou aprendendo a acreditar em mim
novamente.
Eleanor perguntou-se por que o pai lhe contava tudo isso.
— Ellie, eu vi a maneira como o seu olhar se cruzava com o de Creed.
Ah, então era por isso!
— E?
— Espero que aprenda a acreditar a confiar nele outra vez. Sei que Brandon
lamenta havê-la feito sofrer.
— Papai, o senhor não conhece os detalhes.
— Ele levou Lydia para a cama.
Como o pai soubera? Quem havia lhe contado?
— Quando penso neles juntos...
Burrough apertou-lhe a mão.
— O sofrimento ainda é grande, Ellie, eu sei. Com o tempo, isso passará. Quando
entender o sentimento que os une, será mais fácil esquecer e ser feliz. O importante é
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Capítulo V
Brandon pretendia anunciar suas intenções naquela noite, quando um baile daria
início à última metade da estadia dos convidados na propriedade. Passara uma quinzena
na companhia de Eleanor. Nesse pouco tempo havia conseguido que ela lhe desse uma
oportunidade e cumprisse o que prometera. Eleanor tinha entendido que ele mudara e
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milady está mais adorável do que nunca. — Ele se conteve nos elogios para não chamar
a atenção.
— Obrigada, lorde Creed. — Ela enrubesceu.
— Lady Eleanor — Locke aproximou-se e quebrou o encanto —, poderia conceder-
me a honra da primeira dança?
Eleanor não pareceu satisfeita com a intromissão e Brandon refreou a vontade de
arrebentar a bengala na cabeça de Locke.
— Agradecida, lorde Locke. Sem dúvida.
— E a segunda para mim, lady Eleanor? — Birch apressou-se em seguida.
— Certamente, lorde Birch.— Ela sorriu sem entusiasmo. Brandon suspirou,
tentando acalmar-se.
— Talvez fosse melhor eu pedir a honra para dançar a primeira valsa com milady.
O sorriso brilhante de Eleanor dissipou as dúvidas de Brandon quanto à preferência
dela.
— A primeira valsa é sua, lorde Creed.
Brandon fez uma mesura e afastou-se para não vê-la acompanhar Locke até a pista
de dança. Mesmo sabendo que uma anfitriã teria de dar atenção a todos os convidados,
não queria ver Eleanor abraçada por outro homem. Deu alguns passos e foi interceptado
por lady Dumont.
— Lorde Creed, é um prazer tê-lo conosco esta noite.
— Milady tinha alguma dúvida quanto à minha presença? Lady Dumont abanou-se,
coquete. Apesar do vestido rosa um tanto exagerado para a idade, não se poderia dizer
que estava ridícula.
— Ah, sim. Imaginávamos que a indisposição da última noite talvez o retivesse por
mais tempo em seus aposentos. — Ela o avaliou de alto a baixo com olhar significativo.
Depois do surgimento do livro de Fanny Carson, era como as mulheres presentes ao
evento o olhavam.
— Agradeço a sua preocupação, lady Dumont, mas já estou bem.
— Se a aflição o acometer novamente esta noite, por favor, avise-me. Terei o maior
prazer em ajudá-lo.
— Creio que não será necessário. De qualquer forma, eu agradeço.
— Um pena. — lady Dumont fitou-o com olhar malicioso. — Se mudar de idéia, sabe
onde me encontrar. Boa noite, milorde.
A dama se afastou e Brandon disse a si mesmo que teria de conversar com
Wynthrope a respeito dela. Embora Wyn tivesse um caráter excêntrico, não podia
entender como o irmão viera a relacionar-se com lady Dumont.
Brandon foi até o lado oposto da sala e reparou que a orquestra permanecia oculta
atrás de uma tela. Como a música parecia surgir do nada, ele supôs que a idéia fosse dar
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— Não precisa ficar com esse ar presumido. Você nunca me perguntou se eu gosto
de cavalos.
— Nem seria necessário. Sei que não gosta. Não se espante, Eleanor, conheço
muito mais acerca de você do que pode imaginar. Isso acontece por eu prestar atenção e
me interessar por tudo o que lhe diz respeito.
Pelo silêncio de Eleanor, Brandon pensou se ela estaria refletindo sobre tudo o que
ele descobrira.
Quando a dança terminou, Brandon conduziu-a de volta à companhia das irmãs,
requisitou a próxima valsa e afastou-se. Não queria parecer ansioso demais.
Depois da segunda valsa, Brandon levou Eleanor de novo ao convívio familiar e
manteve-se afastado durante o jantar. De longe, ela o fitava, certamente comparando-o
com os outros candidatos, o que era natural. Mesmo assim, ele estava convicto de ser o
alvo da preferência de Eleanor. Agradou-lhe perceber também que ela estreitava os olhos
toda vez em que o via conversando com outra mulher.
Mais tarde, Brandon notou que Eleanor saía para respirar ar puro no terraço e
seguiu-a. Não seria correto, mas ele não se importava com isso.
Encontrou-a encostada na balaustrada de granito, com o rosto erguido e os olhos
fechados. A luz de uma lanterna lateral iluminava-lhe as feições delicadas, e Brandon
admirou a beleza de Eleanor, que só aumentara com o passar dos anos.
— Não deveria estar aqui sozinha — ele admoestou-a ao se aproximar.
A perna começava a latejar e Brandon pediu a Deus um pouco mais de tempo com
dores suportáveis.
Eleanor descerrou as pálpebras e fitou-o por sobre o ombro.
— E você não deveria estar sozinho aqui fora comigo — ela declarou com um
sorriso.
Brandon também sorriu e apoiou-se na amurada ao lado de Eleanor.
— Você tem toda a razão. O que faremos a respeito? Ela suspirou.
— Suponho que um de nós deverá entrar.
Brandon acariciou-lhe o rosto. A pele de Eleanor era macia.
— Ou poderíamos ficar daqui. Ela pestanejou.
— Não deveríamos arriscar, Brandon. Alguém poderá ver-nos e...
— Não diga nada. — Ele fechou-lhe os lábios com a ponta do indicador. — Deixe-
me tocá-la.
Eleanor consentiu, embora receosa.
— Sua beleza me fascina. — Brandon passou a ponta dos dedos no lábio superior e
na face sedosa. — A dor na minha perna nada significa se comparada ao aperto que sinto
no coração toda vez em que a vejo.
Eleanor entreabriu a boca. Ele não resistiu à irresistível tentação do hálito quente e
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úmido e beijou-a. Os lábios dela eram doces e tinham sabor de vinho. Brandon
estremeceu.
Ah, como a desejava!
Ele reuniu coragem e afastou-se. Prometera que seria apenas um toque, e aquele
local era completamente inadequado para qualquer outro carinho.
Eles se fitaram, muito próximos um do outro, e um intenso calor envolveu-os. O olhar
brilhante de Eleanor se ocultava sob as pálpebras semicerradas. Interromper o beijo não
agradou a nenhum dos dois.
— Desculpe-me. Eu deveria ter mais controle — Brandon declarou.
Eleanor passou a língua nos lábios.
— Não se preocupe. Eu não me aborreci.
De dentro, escutaram uma nova valsa que se iniciava. Brandon disse a si mesmo
que depois daquela música, pensaria na perna.
— Dance comigo mais uma vez, Eleanor. — Ele apertou-lhe a mão.
Eleanor negou com um gesto de cabeça.
— Não posso.
— Por quê?
— Você sabe. O que as pessoas diriam?
— E isso lhe importa?
— Claro! — Ela desvencilhou a mão.
— Mentirosa. — Brandon inclinou-se e roçou os lábios no lóbulo da orelha de
Eleanor.
Ela estremeceu.
— O que foi que disse?
— Se você se importasse com a opinião dos outros, teria impedido minha presença
na sua casa.
— Tentei fazer com que papai o mandasse embora, mas não adiantou.
Brandon riu. Na certa, Eleanor não tentara com muito empenho.
— Vamos dançar e não se importe com o que possam dizer. Esta é a sua casa.
Você pode dançar com quem quiser.
Brandon tentou afastá-la da balaustrada. Em vão.
— Será nossa terceira música — ela argumentava — e você não dançou com mais
ninguém. Dará a impressão de que temos um compromisso.
Brandon encarou-a. Seria tão difícil entender?
— Não dancei com ninguém, pois pretendo declarar minhas intenções.
Eleanor arregalou os olhos, e ele Brandon pensou em duas enormes águas-
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marinhas.
— Eu...
— Não diga nada, Eleanor. Apenas uma vez atire a respeitabilidade ao vento e
satisfaça a minha vontade. Faz muito tempo que não mexo os pés num salão de dança.
— Brandon empregava chantagem emocional apenas em última instância.
Eleanor poderia ter-se recusado, mas não o fez. Ela queria muito permanecer nos
braços de Brandon. Ele a conduziu até o centro do salão para dançar a terceira valsa. Na
manhã seguinte, todos saberiam que Brandon Ryland pretendia casar-se com Eleanor
Durbane e que ela consentiria.
Tarde da noite, após o término do baile, Eleanor estava deitada na cama, pensando
em Brandon e no que havia acontecido.
A brisa entrava pelas janelas e balançava as cortinas. Logo amanheceria.
Considerou-se satisfeita. As irmãs trataram Brandon com cortesia, embora o
tivessem feito apenas a seu pedido.
Brandon lhe dispensara a máxima atenção, e as três valsas fizeram todos, inclusive
ela, pressupor o que ele planejava. Torná-la sua esposa.
Era mesmo inacreditável, depois de tudo o que acontecera entre ambos havia dez
anos! Brandon ainda não havia feito o pedido oficial, mas Eleanor tinha certeza de que ele
o faria sem demora. A intenção não era fazê-la esperar só por havê-lo rejeitado naquela
época. Seria muita crueldade. A hesitação poderia ser o receio de ela não o aceitar mais
uma vez.
Brandon não entendera que os beijos e o comportamento mais livre de Eleanor eram
um indício de concordância?
Era evidente que ele a respeitava e por isso mesmo não a havia seduzido quando
ela era mais jovem. Mesmo sem nada ter dito, ele deixara claro que pretendia torná-la sua
esposa.
Porém Eleanor queria mais do que intenções. Tinha trinta e dois anos e estava
cansada de sentir-se frustrada e insatisfeita. De acordo com Fanny Carson, Brandon
sabia satisfazer uma mulher, e Eleanor pretendia ser a única mulher a usufruir as
atenções dele.
Acima de tudo, ela desejava fidelidade, mesmo sem a certeza de ser amor o que
sentia por Brandon. Se o amor estivera latente, desabrocharia com exuberância quando
se casassem. Apesar de sua incerteza, queria que ele a amasse. Não obstante seu
passado dissoluto, Brandon era um homem leal aos amigos e à família. Amava de
maneira intensa e perseguia os objetivos com tenacidade.
Eleanor lembrou-se do acidente que vitimara o pai dele. Brandon havia quebrado a
perna em vários lugares. O médico não dera esperanças de sobrevivência, mas ele se
recuperara depois de muito sofrimento e uma grave febre. Brandon tinha vontade férrea e,
se quisesse, poderia mover montanhas.
Eleanor pensou em ir até os aposentos dele, pois ninguém ficaria sabendo. Brandon
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estaria dormindo? Ou, acordado como ela, desejaria que o tempo na estufa houvesse se
prolongado? Se não fosse o jantar, teriam feito amor lá mesmo.
Uma batida suave na porta interrompeu-lhe os escandalosos pensamentos.
Tremendo de excitação, pois poderia ser Brandon, Eleanor saiu da cama e abriu a porta.
Era Lydia.
Trazia um xale amarrado nos ombros e um castiçal.
— Não precisa ficar tão desapontada, Ellie. — Lydia entrou. — Estava esperando
alguém?
— Claro que não. — Eleanor apenas tivera esperança de que fosse Brandon. — E
muito tarde. O que houve?
Sua irmã parecia tensa.
— Preciso falar-lhe. Eu já deveria ter desabafado há tempos. Eleanor achou melhor
fingir ignorância. De nada adiantaria Lydia saber que havia condenado a própria irmã à
infelicidade. Afinal, ela não soubera que Eleanor e Brandon tinham assumido um
compromisso. Seria possível que Lydia soubesse?
— Vamos nos sentar— Eleanor sugeriu, apontando a cama.
Pareciam ter voltado ao cenário da infância. As duas de camisola e Lydia pedindo
conselhos tarde da noite. Infelizmente, porém, não eram mais duas meninas.
— Prefiro ficar em pé. — Lydia, descalça, andava de um lado para outro sem parar.
— Lyddie, vai abrir um buraco no tapete. Fale, o que houve? Apesar da expressão
sombria e da postura tensa da irmã, Eleanor não pôde deixar de pensar se tudo não tinha
sido ensaiado. Seria possível que Lydia estivesse fingindo?
— E sobre lorde Creed — Lydia disse em voz baixa.
Eleanor estivera certa. Só não entendia a escolha do momento para confissões.
Afinal, Lydia mantivera silêncio por tantos anos... Talvez na época achasse mais
conveniente não falar, pois Eleanor e Brandon haviam rompido. Era possível que agora
duvidasse da sinceridade de Brandon e resolvera adverti-la. Ou podia ser que Lydia
estivesse com ciúme e não admitisse o retorno de Brandon para Eleanor.
— O que há com lorde Creed? — Eleanor demonstrou tranqüilidade.
— Ah, Eleanor! — Com aparência angustiada, Lydia caiu de joelhos diante da irmã.
— Eu sinto muito...
Eleanor arqueou as sobrancelhas. O espetáculo era constrangedor. Ou Lydia estava
realmente angustiada, ou se tratava de uma farsa bem representada.
Eleanor acariciou a cabeça da irmã, sem saber que atitude tomar.
— Sente o que, minha querida? — Ela esperara uma década pela confissão e
estava disposta a consegui-la.
— Tem de acreditar em mim! — Lydia ergueu o rosto contorcido pelo sofrimento. —
Eu não sabia do compromisso!
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Capítulo VI
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— Ou ela não suporta ver a felicidade dos outros porque a sua vida é infeliz. —
Eleanor abaixou os ombros.
— Também é uma hipótese. — Brandon procurou manter a neutralidade.
— Minha irmã procurou reatar o relacionamento? — Eleanor encarou-o, sombria.
Ele lhe prometera honestidade.
— Suspeita dela por ciúme?
— Não sei. — Eleanor suspirou. — Não quero desconfiar de Lydia. Mas o meu
coração me diz que você é confiável.
Ela não conhecera as durezas da vida, exceto a traição dele. E teria de aceitar a
deslealdade da irmã.
— Sinto muito, Eleanor.
— Por quê?
— Por minha participação nesse embate. Se naquela noite eu estivesse em meu
juízo perfeito, nada disso teria acontecido.
— Obrigada. — O sorriso de Eleanor foi triste. Depois de alguns instantes de
silêncio, ela recuou. Teria a interferência de Lydia destruído a oportunidade de eles serem
felizes?
— Eleanor, você me pediu para ser sincero, e agora eu lhe peço o mesmo.
— Claro.
Brandon aproximou-se.
— Ainda tenho uma chance de conquistá-la, Eleanor Durbane? Ou devo desistir e
voltar para Londres?
Um leve tom rosado substituiu a palidez de Eleanor. A alegria tomou o lugar do
medo. Por um instante, Brandon pensou que ela o rejeitaria.
— Não. Não volte para Londres. — A aceitação era visível em seu olhar.
Eleanor atirou-se nos braços de Brandon e escondeu o rosto no ombro dele, como
uma criança à procura de consolo. Brandon aconchegou-a e fechou os olhos em uma
prece de agradecimento.
— Estamos convivendo há apenas uma quinzena. Não será pouco tempo para nos
sentirmos tão ansiosos? — ela perguntou.
Por que Eleanor sempre questionava os fatos em vez de aceitá-los de maneira
simples?
— Eleanor, nós dois sentimos falta um do outro durante esse tempo todo. Eu sinto a
sua fragrância no ar que respiro. Nos meus sonhos, você é uma presença constante. Meu
coração nunca a esqueceu.
Ela fitou-o com o olhar brilhante pelas lágrimas que marejavam seus olhos.
Acariciou-lhe a face, e Brandon admitiu que nunca sentira tanta leveza.
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Ela desejava estar ao lado de Brandon e ansiava por suas carícias e beijos. Queria
seu companheirismo e partilhar a vida com ele. Se ainda não o amava, isso não
demoraria a acontecer. Nem podia imaginar outra mulher ao lado de Brandon para o resto
da vida, pois a raiva a consumiria.
Estava decidida a agir para que ele fosse seu e de ninguém mais. Sabia o que teria
de fazer e precisava apenas de um pouco de coragem. Teria de provar a Brandon que o
desejava e forçá-lo a admitir os sentimentos por ela. Aquele talvez fosse o sinal que ele
estava aguardando.
Ainda era cedo. O plano teria de aguardar até a noite. Eleanor deitou-se na cama e
fechou os olhos. Adormeceu, segura de que, antes do final da semana, estaria noiva de
Brandon Ryland.
— Ellie, podemos conversar? — Arabella parecia preocupada. O que não era usual.
Eleanor esperava que não se tratasse de mais um episódio da pseudo-sedução de
Lydia.
— Sem dúvida, minha querida.
Após o jantar, os convidados haviam se reunido no salão e as conversas se
sucediam animadas. A um canto, lady Dumont providenciava um jogo de cartas. Em
outro, lorde Merrott entretinha os homens com relatos de caçadas. Dois cavalheiros
jogavam xadrez. Algumas damas andavam de um lado para outro, tagarelando sobre
trivialidades. Locke tomava um drinque, solitário. Liam-se histórias para quem quisesse
escutar. Anedotas picantes provocavam gargalhadas.
Ninguém notou que Eleanor e Arabella se afastavam do ambiente festivo. Como
chovia, não puderam sair. Dirigiram-se à sala íntima que a mãe costumava ocupar. Era
um local onde não seriam interrompidos, a não ser que fosse por uma das irmãs.
— Do que se trata, Belle? — Eleanor perguntou depois de fechar a porta.
Arabella sentou-se em uma poltrona, torcendo as mãos.
— Eleanor, não pense que sou intrometida. — Arabella estava anormalmente
sombria.
— As irmãs têm esse direito. — Eleanor sorriu sem vontade.
Deus não haveria de permitir que Arabella confessasse ter dormido com Brandon!
— Belle, por favor, diga logo o que houve. — Eleanor não seria capaz de perdoar
mais uma traição.
— Tive uma conversa muito séria com Lydia ontem à noite.
— A respeito de lorde Creed?
— Sim. — Arabella surpreendeu-se. — Por quê?
— Ela falou também comigo.
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— Meu querido Brandon. Eu também não ficarei satisfeita enquanto não fizermos
amor.
Ele beijou-a. Eleanor entreabriu os lábios e gemeu. Com a língua ávida, Brandon
procurava desvendar-lhe os mistérios da boca. Ela sentia o coração tresloucado batendo
no peito e um tremor percorrer-lhe a espinha dorsal.
Brandon estendeu-se na cama. Eleanor, sobre ele e sem interromper o beijo,
deliciava-se com o calor das mãos de Brandon que atravessava o tecido fino da camisola
e do penhoar. Delicadamente, ele passou as mãos na frente de Eleanor e desamarrou a
fita de cetim que prendia o robe. Ela afastou o torso e permitiu que Brandon completasse
a tarefa, tirando-lhe a peça pelos ombros e braços.
Eleanor sentiu a brisa fria da noite nas costas. Brandon sentou-se na cama e puxou
a camisola para cima.
As incertezas de Eleanor se apagaram. Brandon a admirava como se ela fosse uma
deusa. Mesmo que seu corpo não fosse perfeito, nessa noite ele seria, pelo menos aos
olhos de Brandon Eyland.
— Muitas vezes imaginei este momento — Brandon confessou com voz rouca. —
Nem mesmo tenho certeza se tudo é real.
As palavras dele tocaram o coração de Eleanor. Devagar, ela tirou a fita dos
cabelos, que despencaram como uma cascata. Queria sentir neles as mãos de Brandon.
A apreciação dele trazia-lhe coragem.
— Toque em mim — Eleanor sussurrou. — Constate que não faço parte de nenhum
sonho.
Com extrema leveza, Brandon acariciou-lhe os braços e o pescoço. Segurou-lhe o
queixo e tornou a beijá-la. Com excessivo comedimento sob o ponto de vista de Eleanor.
Ela queria paixão e precisava que Brandon demonstrasse toda a força de seu desejo, pois
pretendia retribuir em igual medida. Desesperada, agarrou-se nos ombros dele e puxou-o
para mais perto. Brandon beijou-lhe o pescoço. A seguir, com os lábios e a língua,
percorreu uma trilha pelos ombros e colo. Eleanor sentia a respiração cada vez mais
difícil, à medida que os beijos se tornavam mais ousados.
Brandon tornou a beijar-lhe os lábios. Depois, outra vez o queixo, o pescoço e os
ombros. Eleanor acariciava-lhe as costas entre meneios felinos. Os carinhos dele a
fizeram pensar no paraíso. Sem nunca ter experimentado o amor físico, não ignorava o
que se passava entre um homem e uma mulher. Mas jamais imaginara o prazer das
sensações que ora a acometiam.
Estavam deitados lado a lado e Eleanor se perguntava o que teriam de fazer.
Conversar? Sair da cama? Ou ao menos se vestir? Brandon antecipou-se e evitou-lhe
uma decisão indevida. Abraçou-a. Eleanor aconchegou-se no corpo suado e teve certeza
de que nada melhor havia no mundo.
Olhando-a intensamente, ele afastou-lhe os cabelos do rosto. Eleanor imaginou
como estaria desgrenhada, mas refletiu que valera a pena. Com sono, deixou o problema
dos cabelos para depois. Aninhou-se com mais conforto e adormeceu.
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atitude de Lydia. O abraço foi frio e o sorriso não alcançou os olhos. Eleanor teve receio
da amizade entre elas ser rompida para sempre. Lydia, mesmo com todos os seus
motivos, jamais a perdoaria por ter aceitado a proposta de Brandon. Lydia aproximou-se
de Brandon com um brilho diferente no olhar, como se o desprezasse por ele haver
cometido um grande erro. Quase uma promessa de que o faria pagar por isso.
— Será ótimo contar com a sua presença na nossa família, — lorde Creed — Lydia
disse com voz baixa e rouca. A hostilidade não escondia um traço sensual.
Brandon, sem se perturbar, curvou-se sobre a mão de Lydia, que foi a única a não o
abraçar, e sorriu. Apenas o olhar foi cauteloso.
— Eu lhe agradeço a gentileza. Procurarei chamá-la de irmã.
Lydia cerrou os dentes. A última coisa que desejava era ser chamada de irmã por
Brandon.
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Brandon teve vontade de rir diante da expressão fingida de culpa. Lydia queria dar a
impressão de que lamentava o sofrimento causado a Eleanor.
Tudo seria diferente. Brandon estava sóbrio, mais maduro e não iria para a cama
com Lydia. Eleanor não encontraria motivos para não confiar nele.
— Nada mais será como antes.
— A sobriedade não modifica um homem, Brandon. Só o torna mais criativo.
Ele imaginou por que o marido de Lydia a deixara tão amargurada.
— Eu mudei em vários aspectos e Eleanor foi capaz de entender isso. Lamento que
milady não possa enxergar a verdade. — Brandon não lamentava nada, apenas sentia
piedade de Lydia.
— Quando milorde se cansar de Eleanor e quiser algo novo, não venha choramingar
junto à minha porta — ela falou com desprezo. — Pode estar certo, de que não será bem-
vindo.
Lydia confiava muito em seu poder de sedução.
— Nunca me cansarei de Eleanor. Mas se isso chegasse a acontecer, certamente
não seria à sua porta que eu iria choramingar.
— Eu lhe servi muito bem... naquele tempo.
Que transtorno! Algumas horas de embriaguez vividas dez anos antes nada
significavam para ele, mas muito para ela.
— Foi apenas uma noite da qual nem me lembro.
— Ora, não creio que tenha esquecido! — Lydia adiantou-se. — Milorde afirmou que
me amava!
Brandon não recuou. Não se sentia ameaçado por tanto fervor, mas também não se
sentia à vontade.
— Eu estava bêbado.— Era difícil ficar com raiva de uma criatura patética. —Sinto
muito pelo mal-entendido. Nunca nutri sentimentos desse tipo a seu respeito.
— Somente por Eleanor, não é?
— Sim.
— Milorde não serve para ela! — A petulância era a de uma criança. — Estamos
convictos disso.
O que também não era novidade. Mas seria preciso bem mais do que algumas
palavras para fazê-lo mudar de idéia.
— Então, tenho muita sorte por Eleanor não compartilhar essa crença.
— Milorde a fará sofrer!
— Não por minhas atitudes nem por minha vontade.
— Milorde nada poderá fazer a respeito. É a sua natureza. Lydia atingira um alvo.
Seria incapaz de fazer Eleanor feliz? Ele a faria sofrer de maneira irreparável? Não, não
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faria isso.
— Esta conversa está ficando cansativa — Brandon falou em voz de comando. —
Queira desculpar-me, milady, mas tenho coisas mais importantes a fazer do que escutar
suas acusações.
— Como correr para Eleanor, lorde Creed? — Lydia deu um sorriso zombeteiro.
Incomodou-o ela ter adivinhado as pretensões dele.
— Na verdade — Brandon disfarçou —, achei que antes seria interessante dar uma
palavrinha com seu marido.
Ele passou por Lydia e chegou à porta. Satisfeito, viu-a empalidecer. Embora fosse
cruel, o gesto era necessário para o seu orgulho.
— Tenha cuidado se pretende me aborrecer, milady. — Brandon se deteve e abriu a
porta. — Não se engane. Não hesitarei em tomar uma atitude em represália.
Brandon só conseguiu falar com Eleanor à noite, na sala de lady Burrough, e a
portas trancadas. Acenderam um abajur, sentaram-se no sofá e ele a abraçou pelos
ombros. Odiou estragar a alegria dela, mas não houve como evitar o relato.
— Tive uma discussão com Lydia hoje. Eleanor endireitou as costas.
— Sobre o quê?
Brandon relatou o ocorrido, palavra por palavra. Arriscou-se a despertar a má
vontade de Eleanor.
— Lydia é muito protetora. — Ela suspirou e sacudiu a cabeça.
Brandon evitou discordar com ironia.
— Ela está com ciúme.
— Pode ser. Lydia quer que o meu casamento seja horrível como o dela.
— Eleanor, eu me admiro pela sua bondade e compreensão. Ela sorriu.
— Lydia é minha irmã.
— Entendo, eu também tenho irmãos. Não me leve a mal, mas não confio nela.
Eleanor anuiu e acomodou-se nos braços de Brandon, Eles ficaram sentados em
silêncio, escutando a chuva cair. Vez por outra, um trovão distante.
— Estive pensando... — Eleanor murmurou um pouco mais tarde.
— Sobre o quê?
Ela acariciou-lhe a coxa.
— Sobre a última vez em que estivemos juntos e sozinhos. No quarto, desnudos e
na cama.
— Está pretendendo seduzir-me de novo?
Eleanor jogou a cabeça para trás e fitou-o com olhar brilhante.
— Eu seria bem-sucedida se tentasse?
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— Com certeza! — Brandon estava ansioso. — Mas aqui? Ela olhou em volta.
— Um bom local como outro qualquer.
Eleanor era linda, sedutora e... prática, o que agradava a Brandon ao extremo. Era
inteligente, divertida e sincera quanto aos desejos e sentimentos. Eleanor gostava dele e
o desejava. Mas ela o amava?
Por ora. fazer amor seria suficiente para Brandon, se bem que o objetivo maior fosse
atingir o coração de Eleanor e assim poder entregar o seu. O que não o impediu de
permitir que ela concretizasse o plano imediato. Eleanor beijou-o e eles se envolveram
nos arroubos de um amor tempestuoso ali mesmo, na sala de lady Burrough.
— Brandon, nunca imaginei que eu pudesse sentir tanto prazer — Eleanor disse
mais tarde, encostada nele. Acho que fomos feitos um para o outro.
O próprio Brandon já pensara nisso.
— Sem dúvida. Nós nos pertencemos.
— Acredito que vou gostar do nosso casamento — ela o informou.
Brandon riu e abraçou-a com energia.
— E eu tenho certeza de que adorarei o nosso casamento. Ele beijou-a e imaginou
que seu coração fosse arrebentar de alegria.
Nada poderia separá-los. Nada.
Capítulo VII
Uma pena Eleanor não ser como ele, que não se incomodava com a opinião dos
outros. Para ela, era diferente, pois comentários maliciosos poderiam ser um desastre
para a sua família.
Eleanor chegou aos aposentos de Brandon sem ser vista. Não bateu, como de
costume, para não alertar ninguém, abriu o trinco e entrou. Haviam planejado o encontro
antes. Brandon lhe mandara um aviso.
Um abajur estava aceso em cima da mesa-de-cabeceira e, como em todos os
quartos dos hóspedes, a decoração era neutra em tons de azul e branco. Da janela
avistava-se o jardim e o lago.
Sorrateira, Eleanor foi até a cama onde uma pessoa estava sob o acolchoado.
Brandon teria adormecido?
Franziu o cenho. O corpo na cama era pequeno demais para ser dele.
Pequeno, voluptuoso e loiro.
Eleanor estacou, petrificada. Havia uma mulher na cama de Brandon.
Não se tratava de uma desconhecida, mas sim de lady Dumont. A dama se
encontrava sem roupas e pareceu tão surpresa quanto Eleanor.
— Lady Eleanor! — Lady Dumont sentou-se e levantou os lençóis até o pescoço,
horrorizada. — O que está fazendo aqui?
Eleanor sentiu calor, depois um frio intenso e, em seguida, mais nada. Apenas um
vazio.
— Eu poderia lhe fazer a mesma pergunta, mas a resposta é óbvia demais.
— Assim suponho. — Lady Dumont arqueou as sobrancelhas. — Contudo o motivo
por que milady se encontra aqui não me parece tão evidente.
Eleanor estava com um nó na garganta.
— Eu precisava falar com lorde Creed.
Lady Dumont cobriu-se melhor e olhou ao redor do quarto.
— Ele não está. O que era incontestável, a menos que o patife estivesse escondido
embaixo da cama. Como Brandon ousara fazer isso de novo com ela?
— Percebe-se. Eu poderia esperar, mas o quarto está abafado demais. Boa noite.
Eleanor precisava sair depressa antes que as lágrimas começassem a deslizar.
Como Brandon pudera repetir a traição e ainda por cima com lady Dumont?
Ele não tinha o mínimo de autocontrole ou talvez houvesse substituído a volúpia do
álcool pelas mulheres. Eleanor viu duas taças de vinho pela metade ao lado da cama.
Aquilo lembrava um pesadelo. Brandon Ryland estaria mentindo desde a chegada a
Burrough? Afirmara não ser um libertino e ter largado a bebida, mas as evidências eram
todas contrárias.
Eleanor não queria enxergar mais evidência nenhuma. A dor era insuportável.
Poderia jurar que lady Dumont a esfaqueara.
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— Por favor, diga ao visconde que estive aqui. — Eleanor virou-se para a porta.
Não dera três passos quando escutou as palavras de lady Dumont: — Milady está
apaixonada por ele.
A acusação colou-se na epiderme de Eleanor como óleo espesso. Ela se voltou
devagar.
Talvez lady Dumont pudesse informá-la por que um homem como Brandon nunca
estava satisfeito com apenas uma mulher.
— O que foi que disse?
Lady Dumont demonstrava consternação.
— Lady Eleanor, eu lhe devo um esclarecimento.
Até onde aquela mulher pretendia levar o ultraje? Ela se encontrava na cama de
Brandon, a mesma que abrigara o primeiro ato de amor deles. Uma verdadeira
profanação contra as expectativas e os sonhos de Eleanor. Ela jurou que mandaria
queimar aquela cama, quando Brandon fosse embora.
— Eu lhe asseguro, lady Dumont, que não me deve nada.
— Não é o que milady está pensando, eu...
Lady Dumont parecia mais jovem, com os cabelos soltos nos ombros. Por isso
Brandon a achava atraente. Ele gostava de loiras.
— Ora, é exatamente o que estou pensando. Queria desculpar-me, lady Dumont.
Seu amante retornará logo.
Eleanor tinha de ir embora com urgência.
— Por favor, deixe-me explicar. — Lady Dumont fez menção de sair da cama, mas
lembrou-se de que estava despida.
Eleanor ignorou-a e deixou o quarto. Sem importar-se com mais nada, nem com a
reputação, levantou a barra da camisola e correu até chegar à ala familiar. A dor no dedo
espalhava-se pelo pé e pela perna, abafando um pouco o sofrimento da alma.
Entrou em seus aposentos, um santuário creme e dourado para um coração partido.
Andou de um lado para outro para acalmar a fúria, apesar do pé machucado. Tinha receio
de deitar-se e nunca mais se levantar.
Como pudera ser tão estúpida e confiar cegamente naquele homem? Ele teria
bebido outra vez? E o que importava isso? Era uma rematada estupidez tentar descobrir
desculpas para o que acontecera.
Eleanor franziu os lábios. Teria Brandon confundido lady Dumont com ela? Seria
aquela uma nova desculpa conveniente para ter outra mulher na cama, quando deveria
estar com ela?
Eleanor se deteve. O fato era bizarro demais para ser verdadeiro. Por que Brandon
havia marcado um encontro com lady Dumont e com ela ao mesmo tempo? Por que lady
Dumont estava na cama sozinha? Ela lhe parecera constrangida e quisera inclusive se
explicar. Explicar o quê? O que estaria fazendo no leito de Brandon?
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Lady Dumont e Brandon estariam envolvidos em um affair e ela havia planejado uma
visita-surpresa? Não. Os boatos teriam se espalhado rapidamente. Lady Dumont estava
longe de ser discreta e seria a primeira a cochichar a novidade.
Nada daquilo fazia sentido. Brandon não era nenhum tolo e não teria marcado um
encontro com as duas, ainda mais no próprio quarto. Se fosse o caso, ele teria ido aos
aposentos da amante.
Como poderia casar-se com Brandon, em meio a tantas dúvidas? Devia haver
alguma explicação para o fato de lady Dumont estar no quarto de Brandon. Talvez ela
tivesse entrado por conta própria e com o propósito de seduzi-lo. Brandon provavelmente
nem sabia que lady Dumont se encontrava lá.
E onde estaria ele? Mandara-lhe um bilhete dizendo que a esperaria.
Eleanor não confiava em Brandon, ou, para ser sincera, não confiava em si mesma.
Não se considerava capaz de conservar o interesse dele, para quem seria fácil encontrar
outra melhor do que ela. Embora o tivesse perdoado pelo que havia acontecido com
Lydia, Eleanor acreditava que, naquela distante noite, uma parte do cérebro de Brandon
soubera de quem se tratava, pois nunca tentara seduzi-la, e com Lydia havia sido
simples.
Não confiava em Brandon e muito menos nos seus sentimentos. Ela havia lhe
entregado a virgindade por gostar dele. Homens não tinham esse problema. Brandon
afirmara não haver amor envolvido nos relacionamentos com Fanny Carson nem com sua
última amante.
Eleanor queria ser mais que uma amiga ou companheira de cama. Queria ser
amada. Ela e Brandon mereciam não apenas amor, mas também confiança, honra e
respeito.
Sair correndo do quarto dele e pensar o pior não era, porém, prova de respeito.
Como e por que lady Dumont entrara naqueles aposentos? Por quanto tempo estaria
lá?
Por mais leviana que fosse, lady Dumont não iria para a cama de um homem sem
ser chamada. Quem a tinha convidado? Não fazia sentido Brandon havê-la chamado e
não se encontrar lá.
A menos que Brandon tivesse planejado o encontro entre ela e lady Dumont para
testar a confiança da futura esposa. O que seria um absurdo. Ninguém em perfeitas
condições mentais faria algo tão ridículo.
E se ele houvesse mudado de opinião, não quisesse mais se casar com ela e
engendrasse um plano para romper o compromisso? Ah, que despropósito!
Teria de haver uma explicação racional para aquele impasse. Lady Dumont havia
tentado oferecer uma, mas Eleanor não se preocupara em ouvir. Recriminou-se. Se
tivesse ocultado as emoções como costumava fazer, haveria ao menos ouvido o que lady
Dumont tinha para lhe dizer.
O que lady Dumont estaria fazendo nos aposentos de Brandon?
105
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Havia muitas questões e respostas que não faziam sentido. As diversas teorias eram
afastadas por serem irrelevantes. O melhor seria falar com lady Dumont. Quando e se
Brandon voltasse, daria as explicações que faltavam.
Porém um desafio se impunha: acreditar ou não no que os dois diriam.
E como enfrentar lady Dumont sem deixá-la com a certeza de seu amor por
Brandon? Eleanor não podia permitir que tal coisa ocorresse. Era verdade que lady
Dumont parecera preocupada, mas sua fama era conhecida. Eleanor não acreditaria nela,
por mais que se esforçasse.
Brandon seria a única pessoa que poderia dizer-lhe a verdade. Mas então seria
tarde demais.
Na mansão às escuras, Brandon quase tropeçou por duas vezes. O que piorou seu
mau humor e a dor na perna. Se não houvesse nenhum recado de Eleanor em seus
aposentos, poderia imaginar que realmente ela fora atender a alguma emergência. Nesse
caso, falaria com Eleanor apenas no dia seguinte.
Não encontrou seu quarto vazio.
Lady Dumont, sentada na cama de camisola e penhoar, com os cabelos soltos nas
costas, seria uma visão sedutora para muitos homens, mas não para Brandon. Ele se
lembrou de Joana d'Arc a caminho da fogueira.
Brandon fechou a porta com cuidado, para evitar que os vissem juntos. Jamais
conseguiria explicar o fato a Eleanor. Ela imaginaria o pior, e com razão, diante da cena.
— Por favor, explique-me a sua presença nos meus aposentos e em trajes de
dormir. — Brandon não se preocupou com a cortesia, desnecessária naquelas
circunstâncias.
Lady Dumont fitou-o com remorso, expressão incomum para ela.
— Milorde me convidou.
— Como foi que disse? Eu me lembraria se o tivesse feito. Asseguro-lhe que tal
convite nem me passou pela cabeça.
— Eu também estranharia receber uma mensagem sua nesses termos, se milorde
não houvesse confessado ontem a uma pessoa sua afeição por mim.
Alguns anos antes, Brandon teria creditado à bebida um desabafo daquela natureza.
— Milady, eu a respeito bastante. — A mentira foi imperdoável. — E, mesmo que a
sua afirmação fosse verdadeira, eu jamais confessaria meus sentimentos para outras
pessoas. Tenho de perguntar-lhe quem foi que a enganou.
Lady Dumont desviou o olhar e cobriu-se melhor com o xale. Era uma modéstia que
não combinava com ela.
— Milorde deve pensar que sou uma idiota.
Por que as mulheres faziam chantagem sentimental? Por que simplesmente não
dizer sou uma idiota ou sinto-me uma idiota? Por que incluir o homem na equação?
Nenhuma resposta seria satisfatória. Se concordasse, seria uma crueldade. Se
discordasse, daria a lady Dumont liberdade para repetir o comportamento no futuro.
— Milady, acredito que houve um terrível engano. — O melhor seria teatralizar. —
Por favor, diga-me quem lhe revelou minha confissão imaginária.
— Lady Brend — lady Dumont respondeu depois de um longo tempo.
Brandon arrepiou-se. Deveria ter imaginado que Lydia estaria por trás dessa trama
ignominiosa. Nem se surpreenderia se Lydia também lhe houvesse mandado o recado em
nome de Eleanor.
Ele passou a mão no rosto. Aquele era um fato lastimoso e imperdoável. Mesmo que
Lydia agisse visando à felicidade de Eleanor, a mulher era diabólica.
— Milady tem a mensagem que supostamente lhe enviei?
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— Eleanor o ama.
— O quê? — A raiva misturou-se ao espanto. Lady Dumont levantou-se.
— Claro que lady Eleanor não confessou e nem precisava. Estava escrito em seu
olhar. Ela estava desconsolada.
Nem poderia ser diferente. Eleanor passara a considerá-lo o pior dos canalhas.
— Tentei explicar, porém ela não quis ouvir e saiu correndo por essa porta.
Pobrezinha. Sinto muito, lorde Creed. Se eu soubesse do seu relacionamento com lady
Eleanor, não teria aceitado o convite, independentemente das circunstâncias. Eu jamais
os faria sofrer de maneira premeditada. Brandon surpreendeu-se com a sinceridade de
lady Dumont.
— Obrigado, milady.
Ela foi até a porta.
— Vou para os meus aposentos. Embora não tenha pedido a minha opinião, se eu
fosse milorde, levaria as mensagens imediatamente para lady Eleanor.
— Eu o farei. Boa noite.
— Apesar do transtorno, milorde, tenho de lhe agradecer a consideração. Boa noite.
Lady Dumont saiu sem fazer ruído. No assunto, ela possuía experiência e embora
tivesse fama de libertina, agira com o maior decoro.
Brandon esperou um pouco antes de sair. Atravessou o corredor escuro com o
costumeiro cuidado e foi até a ala dos aposentos da família. Gostaria de mostrar os
bilhetes não apenas para Eleanor, mas também para lorde Burrough e para o marido de
Lydia.
Mas os dois homens teriam de esperar. Sua preocupação no momento era com
Eleanor. Qual seria a reação dela? Eleanor o absolveria da culpa? Era o que ele mais
esperava. Bateu na porta. Nenhum som veio de trás da madeira pesada. Eleanor estaria
dormindo? Ou teria ido desabafar sua dor em outro lugar? Poderia procurá-la a noite
inteira e talvez nem a encontrasse. Pensou na biblioteca, na sala íntima de lady Burrough,
na estufa. E eliminou as hipóteses. Eleanor não se esconderia em um local de encontro
previsível.
Não chegou a virar-se para ir embora. A porta foi aberta.
Brandon entrou com cautela. Suspeitou de uma emboscada: as cinco Durbâne
prontas para esquartejá-lo.
Uma lamparina solitária mal iluminava a jovem que o aguardava, como se o mundo
tivesse desabado.
— Achei que você viria — Eleanor falou com voz sumida. Brandon não sabia o que
fazer; Se a apertava nos braços ou se tentava dar as explicações necessárias. Também
poderia entregar-lhe os recados e deixar que ela concluísse a verdade.
— Não tenho nenhum caso com lady Dumont, — Brandon caminhou para a frente.
— Nunca tive.
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— Pode ter certeza de que não encontrará nenhuma outra mulher na nossa cama.
— Talvez não. E quando você for ao clube e não chegar na hora prevista? Ficarei
pensando que se encontra com outra mulher ou imaginarei que está bêbado?
Brandon sentiu um gosto amargo na boca. Deveria ter suposto a dificuldade em
esquecer o passado que, mais uma vez, o perseguia.
— Não sei, Eleanor.
— Mas eu sei. Gostaria de dizer que não duvidarei das suas palavras, porém não
posso. Haverá sempre o receio de que você possa encontrar outra diversão que o afaste
de mim.
— Você não confia em mim — Brandon declarou. Ou talvez não confiasse em si
mesma.
A incerteza no olhar de Eleanor era clara. O que estaria escondendo dele?
— Você merece alguém que lhe deposite confiança irrestrita.
— Eleanor, não há motivos para desconfiar de mim.
— Pois eu duvidei e estou certa de que isso se repetirá.
— Essa certeza é absurda.
— Você não pode passar o resto da vida tentando provar seu valor para mim.
Estava na hora de tentar uma nova tática. Teria de lembrá-la do motivo da
discussão. Não estava em foco a confiança, mas a conspiração contra eles.
— Eleanor, você está se afastando do ponto principal do caso.
— Do que se trata?
Chegara a hora de provar mais uma vez a honestidade que Brandon havia lhe
prometido.
— Lady Dumont e eu recebemos bilhetes escritos pela mesma pessoa, Uma mulher.
Desconfio que se trata de Lydia.
— Lydia?! — Eleanor empalideceu. — Oh, Brandon, não! Ninguém gostaria de ter
uma irmã em tão baixo conceito.
— Eleanor, quando assumimos o compromisso, Lydia ficou com muita raiva de mim.
Enciumada, inventou uma afeição minha por lady Dumont. Ela foi a responsável por todo
esse transtorno.
— Não é possível! Recuso-me a acreditar que minha própria irmã faria uma coisa
dessas. Outra pessoa deve ter escrito os bilhetes.
Brandon entregou-lhe as mensagens.
— Comprove por si mesma.
Com olhar aterrorizado, Eleanor fitou os pedaços de papel.
— Não será necessário. Nada poderá ser modificado. Eleanor tinha receio de
confirmar que a irmã conspirava contra ela. Preferia culpar a si própria.
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— Eleanor, isso mudará tudo. Nós não somos culpados de nada. Foi Lydia quem...
— Brandon, não quero que faça acusações contra minha irmã. Sei que Lydia não
agiu corretamente no passado, mas ela não faria nada tão desonesto depois de saber que
estávamos noivos.
Lydia seria perdoada se houvesse elaborado os planos antes do anúncio do
noivado?
— Quer dizer que você encontrou uma maneira de culpar a si mesma em vez de
acusar o bêbado e a rameira que lhe causaram tanto sofrimento?
Eleanor recuou, ofendida.
— Por favor, não use expressões tão vulgares para falar de minha irmã.
Brandon seria capaz de ir até o fim dó mundo para defender os irmãos. O que, no
entanto, não o impedia de reconhecer-lhes os erros.
— Desculpe-me. Admita, contudo, que todos os indícios nos levam até ela.
— Você pretende incutir em minha mente a desconfiança contra Lydia. Não era ela a
mulher que estava nos seus aposentos.
O ciúme de Eleanor mesclava-se à lealdade pela família. Ela poderia até admitir a
mentira de Lydia sobre a pretensa sedução ocorrida anos antes, mas não o envolvimento
com a farsa atual. Por quê?
— Ela sabia que você não acreditaria em outra mentira como a do passado.
Eleanor sacudiu a cabeça devagar.
— Lydia jamais faria isso comigo. Jamais!
Não havia como persuadir Eleanor. Ela se recusava a enxergar a verdade. Brandon
teve vontade de estrangular Lydia. Nem mesmo quis pensar na possibilidade de contar
com a amizade da cunhada depois de seu casamento.
Ora, talvez ele nem mesmo se casasse com Eleanor...
— Por favor, poderia ao menos ler o que está escrito? — Brandon estendeu-lhe
novamente os bilhetes. — Na certa conhece a caligrafia de Lydia.
Eleanor ergueu o queixo, teimosa.
— Não quero ver nada. Não sei quem fez isso e também não importa.
A paciência de Brandon estava se esgotando.
— Importa e muito! Alguém está tentando nos separar e parece que foi bem-
sucedido!
Eleanor sentou-se na arca aos pés da cama.
— Brandon, não adianta culpar quem fez isso. O fato é que descobri algumas coisas
a respeito de mim mesma e que não me agradaram. Eu gostaria de ser diferente, mas
não sou. Não posso lhe pedir para passar a vida ao lado de uma mulher que o interrogará
o tempo todo.
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De volta a Londres, não faltariam a ele diversões e incentivos para afastar da mente quem
o repudiara. Pela segunda vez.
Eleanor admitiu que jamais se casaria com Brandon. Mesmo em detrimento do que
pudesse acontecer, ele não tornaria a procurá-la. Não se arriscaria a uma terceira
rejeição. No que estava muito certo.
Se pretendesse mudar sua vida, Eleanor teria de aceitar a corte de algum dos
solteiros presentes em sua casa. Pelo menos não teria expectativas. Não lhe importaria
se ele bebesse ou tivesse amantes. Quanto menos tempo ficassem juntos, melhor. Ela
acabaria como Phoebe, Muriel ou a pobre Lydia.
Fitou os papéis amassados em cima da penteadeira. Embora Brandon suspeitasse
terem sido escritos por Lydia, Eleanor poderia provar a inocência da irmã. Bastava olhar a
caligrafia.
O que também poderia evidenciar a culpa de Lydia.
Virou-se para a janela. A carruagem sumia ao longe em uma nuvem de poeira.
Não podia acreditar que Lydia pretendesse causar-lhe aborrecimentos. Haviam
sofrido juntas pela morte da mãe e fariam qualquer coisa uma pela outra, exceto um dano
intencional.
Brandon estava enganado. Outra pessoa mandara as mensagens. Talvez a própria
lady Dumont. Ou lady Merrott. Ou um dos cavalheiros dispostos a fazer uma brincadeira.
Aliás, sem nenhuma graça.
Era de pouca significância saber quem enviara os bilhetes. O essencial fora ela ter
ferido Brandon profundamente e ter mentido para si mesma. Havia sido terrível admitir
que duvidava dele e de si mesma. Pelo menos descobrira isso antes de casar-se. Viver
sem Brandon seria um inferno, mas seria pior ficar ao lado dele e aos poucos merecer
seu desprezo.
Deus Todo-Poderoso, não permita que eu esteja grávida!
Seria terrível ter de casar-se por esse motivo e criar um filho em uma casa onde não
haveria lugar para o amor. Brandon enfrentara problema similar com um dos irmãos e não
haveria de querer tal desgosto para seu próprio herdeiro.
Eleanor até suspeitava de que houvesse amor entre eles. Mas o sentimento
acabaria se não existisse confiança. Seria melhor lamentar a falta de Brandon do que
começar a odiá-lo.
Houve nova batida na porta. Eleanor revirou os olhos.
— Estou cansada, Arabella.
— Sou eu, lady Dumont. — A voz veio abafada do outro lado.
Eleanor sentiu o coração dar um salto. Não a mandou embora como fizera com
Arabella. Queria ouvir o que lady Dumont teria para lhe dizer, mesmo sabendo que isso
em nada mudaria a situação.
— Entre.
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A porta foi aberta e lady Dumont entrou, tímida como uma camareira, sem olhá-la
diretamente. Embora estivesse muito bem-arrumada e penteada, e apesar de o sol ainda
não ter surgido, aparentava exaustão. Como se não houvesse dormido.
Eleanor ainda estava de camisola e com os cabelos soltos.
— Bom dia, lady Dumont. A que devo o prazer da sua visita? — A pergunta foi
irônica. As duas sabiam do que se tratava.
— Vim explicar o que milady não quis escutar a noite passada.
— Não há nada para dizer.
— Perdão, lady Eleanor, mas creio que não poderei me calar tendo em vista a
partida inesperada de lorde Creed.
Eleanor limitou-se a arquear as sobrancelhas.
— Lorde Creed e eu nunca tivemos nenhum affair.
— Sei disso.
Lady Dumont pareceu surpresa, o que não a impediu de prosseguir:
— Fui aos aposentos de lorde Creed por ter sido levada a crer que se tratava da
vontade dele. Disseram-me que lorde Creed havia confessado interesse por mim. Depois
recebi um convite para ir até lá. Imaginei que o bilhete havia sido escrito por ele.
— Ele afirma que não foi. Lady Dumont corou.
— Lorde Creed recebeu um recado pedindo a presença dele na cabana do
jardineiro. E o bilhete foi escrito pela mesma pessoa que me enviou o convite.
Eleanor entendeu, pela expressão de lady Dumont, que a dama fora comunicada de
quem se tratava.
— Não fui eu quem escreveu os dois recados, lady Dumont.
— Não. O choque de ver-me na cama do visconde deixou isso bem claro. Acredito
que a pessoa que escreveu os bilhetes seja a mesma que me revelou o suposto interesse
de lorde Creed.
— Posso perguntar de quem se trata? — Mesmo que de nada adiantasse, Eleanor
gostaria de saber quem se empenhava tanto em prejudicá-la.
Lady Dumont demonstrou grande constrangimento.
— De sua irmã, Lydia.
Eleanor fechou os olhos, imersa em profunda dor.
Oh, Deus! Brandon estava certo!
Ou ele teria pedido a lady Dumont para tecer a trama de intrigas contra Lydia?
Não. Eleanor entendeu que não havia mais motivos para fingimentos. A cortina fora
descerrada. Lydia não era nenhuma vítima inocente.
— Agradeço-lhe a franqueza, lady Dumont. Posso contar com a sua discrição no
assunto?
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Capítulo VIII
Londres, escura, fria e úmida, não parecia apresentar mais os atrativos anteriores.
Brandon ordenou ao cocheiro que o deixasse no St. James e fosse embora. Pretendia
voltar para casa sozinho.
A perna rígida não o ajudou muito na subida dos degraus da entrada. Um porteiro
saudou-o.
— Boa noite, lorde Creed. Quer me dar o casaco é o chapéu?
Brandon desfez-se do sobretudo, da cartola e murmurou um agradecimento. O
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interior do clube era aconchegante e cálido. O cheiro de Carne e charuto impregnava o ar.
No salão principal, as conversas desenvolviam-se com animação. Mesmo sem estar
lotado, havia muitas mesas ocupadas por cavalheiros que bebiam e tagarelavam. Alguns
jantavam, outros tomavam café. Em um recinto anexo sobressaíam o carteado e as
apostas.
Um lugar excelente para chafurdar na autocomiseração. Ou para entregar-se à raiva.
De si mesmo, de Eleanor, de Lydia e de qualquer pessoa que tivesse alguma ligação com
sua ruína.
Brandon não parava de criticar-se pela estupidez de imaginar que Eleanor
acreditaria em sua recuperação e de achar que poderia conquistá-la.
Que absurdo! Eleanor dissera que ele merecia coisa melhor e afirmara não acreditar
que tivesse mudado! Era uma contradição.
O mais patético havia sido julgar que era digno de Eleanor. Seria até cômico se não
fosse trágico. Ela fora procurá-lo na cama e depois o desprezara. Muitos homens teriam
se aproveitado da situação para, em seguida, rejeitar a mulher. Com ele tinha sido o
inverso.
O pior de tudo era constatar que, depois de todo o sofrimento que Eleanor lhe
infligira, ele ainda a desejava e sentia sua falta. Por um breve espaço de tempo ela o
fizera supor que a reabilitação era definitiva e que o futuro seria prazeroso. Por um
momento, abençoado e desastroso, chegara a importar-se com a opinião de alguém a
seu respeito.
Reconheceu lorde Mitchley, um velho amigo de seu pai. Aproximou-se da mesa que
ele ocupava, pois seria descortesia não ir cumprimentá-lo.
— Boa noite, Creed. — O olhar de Mitchley estava embaçado e o rosto, vermelho. —
Aceita um conhaque?
— E por que não?
Ninguém estranhou quando Brandon ocupou a única poltrona vaga à mesa. Um
cálice de conhaque, inocente e tentador, foi deixado diante dele.
Brandon estava ciente do erro e também de que não faria diferença. Todos
supunham que ele voltaria aos velhos hábitos. Ninguém, inclusive seus irmãos e Eleanor,
acreditava que havia mudado. Wyn expressara sua dúvida antes de Brandon partir para
Burrough, talvez suspeitando que a viagem não teria um final feliz.
Brandon não se importava com o que pensavam dele, mas gostaria que lhe dessem
uma chance de auto-afirmação. Eleanor lhe prometera uma oportunidade e não tinha
cumprido a promessa.
Segurou o cálice, hesitou e depois o levou aos lábios. Estremeceu quando a bebida
desceu pela garganta.
Deus misericordioso, como era bom!
Bebeu tudo e os companheiros riram, aprovando.
— Milorde bebe como se quisesse afogar as mágoas — um deles comentou.
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— Posso entender que exista alguma razão idiota para achar que o casamento não
daria certo. Só não entendo por que não se pode tentar!
De novo? Eleanor levantou as mãos para não arrancar os cabelos.
— Eu duvidei de Brandon! Acreditei que me traía! Nunca poderei confiar nele.
Arabella revirou os olhos.
— Pelo amor de Deus, Eleanor! Quantas vezes duvidei de Henry!
— É mesmo?
— Eleanor, não seja tola! Claro que sim! Duvidar é um sentimento humano. Eu fico
horas a imaginar se Henry pensará em procurar alguma mulher mais graciosa quando eu
estiver gorda, de sete ou oito meses.— Arabella acariciou o ventre arredondado, que
mostrava os primeiros sinais de gravidez. — Henry diz que sou uma tola, e tento acreditar
nele, mas, logo em seguida, me perco em dúvidas.
Não parecia possível que Arabella sentisse insegurança no casamento. Ela e Henry
eram... perfeitos um para o outro.
— E como se pode enfrentar isso, Belle?
— Minha querida irmã, é simples. Os homens têm receios semelhantes! Eles
imaginam que podem ficar calvos ou gordos e que as esposas encontrarão um amante
mais jovem. Pensam que poderemos deixar de amá-los, assim como nós pensamos
deles. Por isso a confiança é fundamental.
— O problema é que não confio em Brandon.
— Nada disso, Ellie. Se desconfiasse de verdade, nunca lhe teria dado a
oportunidade de provar a recuperação dele.
— Eu pensei que lhe tivesse dado, mas não dei. Arabella suspirou, exasperada.
— Ellie, não percebe que está agindo de maneira irracional?
Eleanor brincou com a renda da manga.
— De início, talvez. Assim que o choque passou, comecei a pensar com clareza.
— Está vendo? — Arabella sorriu com confiança. — Qualquer uma ficaria chocada
com o que viu. Se eu tivesse encontrado uma mulher na cama de Henry, teria feito um
escândalo até esclarecer tudo!
Eleanor compreendeu que fora mais fácil se refugiar no desalento e na culpa.
— Eu não deveria ter duvidado dele.
— Ellie, a dúvida foi a respeito de si mesma, e não de Brandon! Agora o está
punindo porque tem medo de deixar a segurança da casa de nosso pai e assumir a
própria vida.
— Não é isso! Ou era? Reagira daquela maneira por medo? Brandon não se
importava com a opinião dos outros. Ela, sim.
Seria possível que temesse ser julgada como tola por ter dado a Brandon uma nova
oportunidade, enquanto ele era condenado pela maioria da sociedade?
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Não. Eleanor recusava-se a pensar que ela fosse uma pessoa tão fútil.
— Ellie, durante anos a sua existência foi restrita aos cuidados da família. E nesse
tempo teceu um casulo à sua volta que não lhe permitia enxergar o mundo. Diga-me, o
que de pior poderia acontecer se resolvesse casar-se com Brandon?
Ele morrer. Mas ainda havia algo mais terrível.
— Brandon poderia encontrar alguém para me substituir.
Seria possível que ela o amasse?
— O inverso também seria possível — Arabella ponderou. Para Eleanor, o amor era
eterno!
— Eu jamais o trocaria por outro!
—Ellie, a possibilidade existe nos dois casos. Por que acha que você não o trairia?
Como Arabella ousava perguntar um absurdo daqueles? Seria esse o péssimo
conceito que ela fazia da própria irmã?
— Eu seria incapaz de fazer uma coisa dessas! — Eleanor jamais desrespeitaria o
marido, mesmo num casamento infeliz.
Arabella acariciou o estômago.
— Lydia já disse a mesma coisa.
— Como assim? — Eleanor sentiu um frio repentino percorrer-lhe a espinha.
— Lydia confessou uma vez que jamais trairia os votos matrimoniais.
Eleanor sentiu muito raiva pela comparação. A própria Lydia admitira o envolvimento
com Brandon, mas Eleanor nada dissera às irmãs.
— Não sou como Lydia.
— Sei disso, é Brandon também não é o mesmo homem que conhecemos há dez
anos. Como saber o que acontecerá na próxima década? E, mesmo assim, Ellie, vejo-a
disposta a atirar pela janela a chance de ser feliz. E por quê? Por receio.
— Eu...
Eleanor não encontrou palavras para uma resposta. Arabella estava certa. O que
seria melhor? Alguns anos de felicidade ao lado de Brandon ou uma vida vazia como
vivera até aquele momento? Poderia ser ainda pior. Casar-se com um homem que, em
nenhuma hipótese, resistiria a um confronto com Brandon.
Foi quando a resposta apareceu com surpreendente clareza e Eleanor admirou-se
pela demora de sua compreensão.
Estava na hora de abandonar a vida de eremita e agarrar com unhas e dentes a
oportunidade de contar com uma existência maravilhosa. Poderia ser esposa, mãe, dona
de seu nariz, e faria tudo o que as mulheres casadas podiam fazer. Freqüentaria as
reuniões sociais e construiria uma roda de amigos. Londres sempre a fascinara.
Passaria as noites nos braços de Brandon e os dias procurando agradá-lo.
Envelheceria ao lado dele.
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Brandon sentiu os olhos queimando como areia do deserto. A garganta estava seca
e a língua, grossa. A dor de cabeça era lancinante.
Sóbrio, experimentou enjôo ao movimentar-se na cama e fechou os olhos para não
ver o colchão se deslocando. Tudo girava.
Mexeu os pés. Felizmente não quebrara a outra perna naquela crise de embriaguez.
Deitado de botas, calça e camisa, não se lembrava como havia tirado o colete e a
gravata antes de perder os sentidos. Ah, precisava de um drinque para voltar ao normal.
De pálpebras cerradas, tateou em vão à procura da garrafa que sempre deixava ao
lado da cama. Encontrou apenas o tapete.
Droga!
Teria de chamar um criado e pedir outra garrafa de conhaque. Fazia tempo que não
se sentia tão mal e demoraria ainda mais para chegar outra vez ao caminho da
sobriedade.
Ergueu a mão para puxar a corda e abriu os olhos. A luz forte aumentou a dor e
Brandon teve a impressão de que a cabeça se partiria ao meio. As cortinas tinham sido
descerradas. Junto à janela; de braços cruzados sob o busto, uma sombra com um halo
angelical sobre os cabelos.
— Olá, Brandon. Eleanor!
Ele sentiu o coração disparado e o estômago revolto. O orgulho exigia que ficasse
em pé e a expulsasse do quarto. Não fez nada disso. Continuou deitado, rezando pela
morte. Seria a melhor solução, pois tinha sido descoberto.
Eleanor tentava matá-lo. Bela e delicada, arrancara seu coração e o pisoteara. E se
encontrava no quarto dele!
— O que está fazendo aqui? — Brandon não conseguiu franzir o cenho.
Ela se aproximou e foi possível distinguir o desapontamento em seu rosto bonito.
— Essa não é pergunta que se faça a uma noiva.
— Volte para a janela! Não tenho nenhuma noiva.
Eleanor chegou mais perto.
— Não? Por acaso está me renegando?
— Esse é um costume seu de agir, não meu. — Brandon ergueu a cabeça, que
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Eleanor voltou aos aposentos de Brandon. Deitado na cama e com a pele fria ele
transpirava em meio a violentos tremores. Sem saber se deveria cobri-lo, odiou sentir-se
inútil. Era horrível vê-lo sofrer e não poder ajudar.
Brandon estava com a cabeça largada no travesseiro, tinha mechas de cabelos
escuros colados na testa e olheiras profundas. A barba por fazer sombreava-lhe as faces.
Pouco se parecia com o Brandon que saíra de Burrough havia pouco mais de uma
semana.
Por que ele fizera tudo aquilo consigo mesmo e por sua causa? Seria tão difícil
entender que ela não valia a saúde perdida?
— Eleanor...
Ela correu para a beira da cama.
— Brandon?
Ele não a reconheceu. Jogava a cabeça de um lado para outro, com semblante
carregado de pavor.
— Eleanor — Brandon repetiu em voz baixa e rouca — não confia em mim... não
acredita que mudei.
Lágrimas vieram aos olhos de Eleanor, que se culpava por tudo! Curvou-se e
afastou-lhe uma madeixa da testa.
— Eu confio, Brandon. De verdade.
Confiava nele em relação a outras mulheres, mas admitiu que seria capaz de recear
o retorno do vício quando houvesse uma crise entre ambos.
Certamente iria demorar um pouco para Brandon acreditar em Eleanor. Ela o havia
rejeitado, ferido seu orgulho, então teria de provar ser leal e sincera. Era possível que
Brandon não mais quisesse desposá-la, o que, nas atuais circunstâncias, era o que
menos importava. No momento, o principal seria ajudá-lo a suportar a provação.
Uma coisa era certa: Eleanor não estava disposta a abandoná-lo quando Brandon
melhorasse. Não iria embora, mesmo que ele a mandasse de volta para Burrough.
Brandon continuou a falar, e Eleanor nada entendeu. Ela se limitou a limpar-lhe a
testa com o lenço e aguardou, aflita.
Finalmente o dr. Griggs chegou. Bondoso e simpático, logo deixou Eleanor à
vontade ao explicar que estava a par dos sintomas de Brandon e que também atendera o
falecido visconde no passado.
— Vá descansar — ele recomendou. — Tome um bom café da manhã e ocupe-se
com tarefas mais agradáveis. Eu prometo cuidar bem de lorde Creed.
Eleanor entendeu que o dr. Griggs era bastante qualificado para tomar conta de
Brandon. Pediu ao médico para chamá-la antes de ir embora ou caso houvesse uma
intercorrência. Desculpou-se e foi para o quarto que as criadas haviam preparado para
ela. Chamou sua criada particular e pediu água quente.
Um olhar no espelho confirmou a suspeita de que estava com péssimo aspecto. E o
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— Fique com ele e procure fazer com que tome água. Quando Charles voltar,
trataremos de dar um banho em Brandon.
— Eu me sinto tão inútil... — ela murmurou.
Os irmãos a seguraram pelos ombros e Eleanor sentiu-se confortada.
— Lady Eleanor, um grande trabalho nos espera — North afirmou. — Posso lhe
garantir que não será fácil.
— Do que se trata?
— Teremos de convencê-lo a permanecer sóbrio.
— Eu já lhe disse para sair da minha casa! — Brandon falou ao acordar e ver
Eleanor em seu quarto.
O cheiro convidativo dos ovos quentes, do café recém-coado e das torradas frescas
não lhe diminuiu o mau humor.
— Várias vezes, na verdade. — Eleanor pôs a bandeja na cama, sem se incomodar
com a carranca dele.
— E por que ainda não foi embora?
Ela abriu um guardanapo alvo e cobriu o peito de Brandon.
— Resolvi ignorar o seu pedido.
— Não preciso ser mimado!
Eleanor arrumou a bandeja e deixou tudo à mão de Brandon.
Havia quatro dias estava em Creed House cuidando dele, sem se importar com seu
mau humor e palavras ásperas.
Por que Eleanor não ia embora?
Era provável que ela agüentasse os desaforos por se achar culpada pela triste
situação que presenciava. E como boa samaritana, acreditava no dever de ajudá-lo.
Dois dias antes, ainda trêmulo e fraco, Brandon pedira a um criado que procurasse
uma bebida. Nada havia sido encontrado. Mandara vasculhar os estoques secretos, com
resultado idêntico. Na certa, Eleanor tinha contado com a ajuda de Wynthrope e North
para se livrar de tudo.
Droga!
Os dois também não o largavam fazia quatro dias e, mesmo sem o criticarem, era
possível constatar o desapontamento deles. Felizmente Devlin estava no campo com
Blythe e o filho deles. Era um a menos para olhá-lo com desaprovação.
Nem mesmo se sentia agradecido por Eleanor tê-lo livrado da tentação. Um gole
apenas seria suficiente para acabar com os tremores, e, se ficasse bêbado, não teria
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— Brandon... Brandon não queria que Eleanor se sentisse culpada por não estar
preparada para dar-lhe o que ele desejava. Qualquer outra coisa seria insultuosa, por
melhores que fossem as intenções dela. Eleanor não viera por amor, mas por caridade e
obrigação. Nenhum homem com orgulho suportaria tal coisa..
— Por favor, vá embora. Se quer mesmo ajudar, deixe-me em paz.
O pesar no semblante de Eleanor o constrangeu. Assim mesmo era preferível a tê-la
a poucos passos e saber que emocionalmente ela se encontrava a quilômetros de
distância. Eleanor não entendia que a sua presença naquela casa o prejudicava?
Ela endireitou as costas e deixou os braços penderem dos lados. A luta interior era
certa, embora não visível.
— Se precisar de mim, estarei lá embaixo, no salão verde.
— Não precisarei!
Brandon observou-a sair e conservou diante dos olhos a imagem de seu rosto infeliz.
Empurrou para o lado a bandeja com a refeição intacta. Largou-se de costas nos
travesseiros. Deus deveria perdoá-lo por ser tão mentiroso.
Precisava muito de Eleanor. Ela viria se a chamasse?
Capítulo IX
Perdão, lady Eleanor, a sra. Carson a espera no grande hall. Eleanor, que escrevia
para Arabella sentada junto à secretária do salão verde, ergueu a cabeça, surpresa.
— Tem certeza de que ela quer ver a mim?
O mordomo anuiu.
— Ela pediu para falar com milady;
Eleanor guardou a pena, os papéis e fechou o tinteiro.
— Então será melhor mandá-la entrar. Jeffers não escondeu o desagrado.
— Não pretendo ser desrespeitoso, milady, mas a sra. Carson é uma mulher de má
fama.
— Eu sei e isso me deixa ainda mais curiosa acerca do motivo da visita.
Eleanor sabia que sua permanência na casa de Brandon contrariava as regras do
decoro. O que, no entanto, não a rebaixava ato nível de Fanny Carson. E não pelo fato de
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olhos verdes:
— Sra. Carson, a isso eu chamaria de impertinência.
— Pode chamar-me de Fanny.
— Está certo. — Eleanor surpreendeu-se com a própria concordância.
— Posso chamá-la de Eleanor?
Eleanor não viu inconveniente, pois era pouco provável que as duas voltassem a se
encontrar. Depois de Brandon estar curado, ela voltaria para o campo e jamais retornaria
a Londres. Ora, mas não deveria pensar no futuro.
— Claro.
A criada trouxe o chá, que Eleanor apressou-se a servir. Fanny tomou a bebida pura,
sem uma gota de leite, e aceitou um pedaço de bolo gelado.
— Bem, Eleanor, resolvido o assunto de nomes, como está Brandon?
Sem dúvida, Londres inteira sabia que lorde Creed tivera uma recaída. Na certa, ele
não bebia com discrição. Vangloriava-se na frente de tudo e de todos.
— Está bem melhor e se recupera a olhos vistos. Gostaria de visitá-lo? — Eleanor
achou que ficara louca por fazer tal convite à antiga amante dele.
Contudo não havia motivos para preocupação. Brandon não pensaria em reatar o
romance enquanto Eleanor estivesse naquela casa. Além do mais, tivera provas de que
ele não se interessava por mais ninguém, a não ser por ela.
Por que não tinha enxergado isso antes?
Fanny recusou com um gesto de mão.
— Não, obrigada. Não creio que ele possa alegrar-se em ver-me depois da
publicação do livro. Estimo minhas melhoras a Brandon. Quando ele se levantar, talvez eu
venha fazer-lhe uma visita.
Todos tratavam o problema de Brandon como algo corriqueiro. Para Eleanor, o
acontecimento era pavoroso. Chegara a temer pela vida dele e ninguém parecia se
importar com isso!
— Eu disse algo que a irritou, Eleanor?
— Claro que não. Apenas não consigo entender por que todos tratam o estado de
Brandon com tanta naturalidade.
— Porque nós já vimos o espetáculo várias vezes. Eleanor sentiu ciúme de Fanny
não por ela ter sido amante de Brandon, mas por conhecer tão bem o passado dele.
— Eu nunca presenciei nada igual. — Eleanor lembrou-se do ponche na festa dos
Pennington e teve vontade de rir.
O que estaria acontecendo com ela?
— Talvez seja melhor que nunca tenha visto.
— Por que diz isso?
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que me faz supor que você talvez tenha algo a ver com a última recaída. Brandon jurou
no túmulo do pai que faria o impossível para não beber mais e ele quebrou o juramento
por sua causa. Isso me fez imaginar o tamanho do poder que exerce sobre ele. Se abusar
desse domínio, esteja certa de que a farei pagar por isso. Tenha um bom dia.
Imóvel e arfante, Eleanor observou a mulher sair. Fanny Carson a ameaçara! Por
outro lado, as palavras soavam como um cumprimento, pois Fanny havia dito que Eleanor
exercia grande influência sobre Brandon. Fanny estaria com inveja? Como seria possível
invejar a mulher responsável por uma quebra de juramento feito em memória do pai?
Pior de que culpada, Eleanor sentia-se péssima. Permitira que seus medos a
guiassem e suas inseguranças ferissem Brandon. Admitiu seu comportamento covarde e
rezou para ainda poder contar com a possibilidade de reparar os erros. Viera à casa de
Brandon por inúmeros motivos, entre os quais não estava incluída uma promessa. E
tivera receio de admitir isso para si mesma.
Uma batida na porta chamou-lhe a atenção.
— Perdão, lady Eleanor, mas lorde Creed pede a sua presença — a sra. Stubbins
veio avisá-la.
Eleanor subiu a escada e estreitou os lábios. Haveria de encontrar uma maneira de
fazer Brandon entender que precisava dela.
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— Pensa em casar-se com lady Eleanor? — North fitou-o com olhar intimidativo.
— Sim, penso. — Não havia por que mentir aos irmãos.
—: Então, por que não disse nada a ela?
— Porque Eleanor já recusou o meu pedido duas vezes.
— Mas agora que o bom nome dela foi arruinado... Bem, entendo que não vai querer
a concordância de lady Eleanor por falta de opção, não é?
— E. Nunca saberei se ela se casou comigo porque me ama ou porque não havia
outra solução.
—- Sempre se pode perguntar — Wynthrope sugeriu, tirando um pêlo imaginário da
manga. — Esqueça, é simples demais.
Brandon atirou um travesseiro no irmão e Wynthrope desviou-se a tempo.
— Eleanor jamais admitiria isso, idiota! Além do mais, ela não me deu indicação de
que deseja se casar comigo. Estava muito ocupada em culpar-se pela minha embriaguez.
— Mulheres... — Wynthrope sacudiu a cabeça. — Elas se culpam por coisas idiotas.
Na verdade, ninguém saiu direto da casa do pai dela, foi ao clube e bebeu o que
encontrou pela frente. Espere! — Ele estalou os dedos. —Foi exatamente o que
aconteceu.
— Saia daqui!
Wynthrope deu de ombros. Brandon não estava em condições de expulsar o irmão
mais novo do quarto.
— Eu só disse a verdade, Brandon.
Se Brandon pudesse, teria dado um soco no rosto de Wyn.
— Terá de dizer a Eleanor que ela não é culpada — North, a voz da razão, afirmou,
— Eu sei — Brandon teve de concordar.
— E terá de se casar com ela antes que a sociedade a rejeite.
— E que diferença fará? — Wynthrope fez pouco caso. — Casar-se com ela não vai
melhorar a posição social de lady Eleanor.
— Eu me casarei porque ela me ama e quer ficar ao meu lado. Eleanor não aceitará
menos de que isso. — Por isso Brandon tinha medo de perguntar.
— Brandon Ryland, tem certeza de que a ama? — North indagou.
O vazio no estômago era amor ou fome? A dor interior era amor ou conseqüência da
embriaguez? A obsessão por Eleanor seria amor?
— Na certa ele ama ela — Wynthrope comentou.
— Ele não disse nada. — North franziu o cenho.
— Por isso mesmo. Está demorando demais para responder.
Brandon olhava de um para outro. Eles falavam como se estivessem sozinhos.
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— Não sei por que isso significa que ele a ama. Wynthrope espalmou as mãos para
os lados.
— Porque ele está tentando encontrar uma prova de que não a ama e não
consegue.
Brandon e Wynthrope discutiam bastante, mas Brandon se admirava como o irmão o
conhecia.
— Vamos embora. — North pegou o irmão pelo braço. — Brandon precisa
descansar.
— Peça perdão — Wynthrope avisou perto da porta. — Nada melhor para um
mulher entender que está apaixonado do que se atirar aos pés dela.
Brandon deu risada quando North puxou o irmão para o corredor.
Implorar o perdão de Eleanor daria resultado? E se implorasse por seu coração?
Puxou a corda da sineta, e a sra. Stubbins entrou em seguida. Brandon pediu-lhe
que chamasse Eleanor. Depois do que fizera, seria improvável que ela atendesse ao
pedido. Não demorou muito e Eleanor apareceu.
— Mandou me chamar? — O tom não poderia ser mais frio e seco.
Brandon não a culpava. Ele agira como um idiota.
— Entre, por favor. — Brandon sentou-se na cama, sem puxar as cobertas para
cima.
Eleanor veio para dentro do quarto e fitou de relance o torso nu.
— Wynthrope e North estiveram aqui — Brandon informou-a.
— Ah, é? Eu também tive uma visita.
Se fosse homem, Brandon decidiria por um assassinato.
— Quem era?
— Fanny Carson. Ela desejou-lhe melhoras.
— Fanny? — O espanto foi genuíno. — Veio ver você?
— Ela queria conhecer a mulher que o manteve obsessivo durante tantos anos.
Brandon sentiu a boca seca e jurou que estrangularia Fanny dá próxima vez em que
a encontrasse. Já não causara rebuliço suficiente com aquele maldito livro?
— Foi muita bondade dela. — Assim que acabou de falar, Brandon convenceu-se de
que dissera uma grande idiotice.
No entanto Eleanor deu risada.
— Eu também me surpreendi bastante. Fanny Carson não é o que eu imaginava.
Brandon cruzou os braços atrás da cabeça e expôs ainda mais o peito musculoso.
Seria um bom expediente explorar a atração que exercia sobre Eleanor.
— Ficou desapontada?
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apreciasse o visual. Voltou a usar o perfume de morango de que ele parecia gostar.
Fazia questão apenas da opinião de Brandon e por ele desprezara todos os
princípios da sociedade. Havia lido um livro proibido para jovens solteiras. Tivera um caso
ilícito com Brandon na casa de seu pai. Indiferente ao decoro, seguira-o até Londres sem
dama de companhia, suscitando boatos e especulações. E, de maneira surpreendente,
nem mesmo se incomodava com o que os outros pensavam a seu respeito. E pela
primeira vez em sua vida, também não se preocupava com os familiares. Claro que não
lhe agradaria vê-los sofrer pelas atitudes intempestivas que resolvera tomar. O mais
importante para Eleanor no momento era convencer Brandon de que haviam sido feitos
um para o outro.
Durante uma semana ficara ao lado dele, ajudara-o na recuperação e entendera
várias coisas. Vê-lo bêbado não a perturbava tanto como antes e despertava sua
compaixão. Brandon enfrentava uma doença de difícil cura e teria de batalhar contra essa
enfermidade até o fim de seus dias. Eleanor estava convencida de que ele possuía forças
para lutar contra o vício. A recaída havia sido causada pela autocomiseração, e o
rompimento do compromisso desencadeará o processo.
Juntos, eles haveriam de superar as dificuldades e ela estava disposta a fazer o
impossível para passar o resto da vida ao lado de Brandon. Eleanor o ajudaria a superar a
compulsão para a bebida e não se importaria se ele fosse considerado um pária em
alguns círculos sociais. A questão primordial era saber se Brandon a amava e se o amor
dele seria suficiente para desculpá-la pela tolice que cometera.
Eleanor perguntou a si mesma se teria coragem de pedir-lhe perdão e de implorar
por seu amor.
Pôs os brincos de diamante e evitou a gargantilha do conjunto. Brandon gostava de
apreciar e beijar seu pescoço.
Eleanor ficou em pé diante do espelho. O penteado estava perfeito e a pele brilhava,
graças aos cremes e às poções de Mary. O vestido de cetim azul-claro realçava sua
silhueta sob todos os ângulos. O decote generoso, mas não vulgar, revelava as curvas
superiores do busto. Ela pretendia dificultar as intenções de Brandon em continuar
evitando contato físico e estava disposta a seduzi-lo mais uma vez.
Mas antes teria de lhe confessar seus sentimentos, pois o orgulho de Brandon o
impediria de tomar a iniciativa de falar. Ele tinha sido rejeitado duas vezes e superara tudo
para pedir perdão, o que dera a Eleanor a dimensão do afeto que Brandon lhe dedicava.
— Milady está linda! — Mary extasiou-se.
— Graças às suas habilidades — Eleanor agradeceu com um sorriso sincero.
Eleanor chegou à sala de estar onde a família Ryland estava reunida. Devlin e
Blythe haviam chegado do campo com o filho, que era bem desenvolvido para a pouca
idade. Na certa seria alto como os pais. Devlin e Blythe lembravam a Eleanor um rei
guerreiro e sua esposa, eternamente apaixonados.
North e Otávia também vieram, assim como Wynthrope e Moira. As duas estavam
grávidas; Otávia, em estado mais adiantado. Moira mal cabia em si de alegria pela
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gestação recém-iniciada.
Eleanor felicitou-se pelo apuro no trajar, pois as três mulheres estavam ricamente
trajadas com vestidos de seda e cetim. Blythe usava verde, Otávia vestia dourado, e
Moira, roxo. As jóias que as adornavam eram valiosas e de extremo bom gosto.
Os homens se levantaram quando Eleanor entrou na sala.
— Perdoem-me — ela disse. — Espero não ter me atrasado. Não pretendia deixá-
los esperando.
— De maneira alguma — North respondeu, e os quatro se curvaram em uma
reverência.
Eleanor sentiu ansiedade ao olhar para Brandon. O sorriso dele foi significativo, e ela
sentiu a boca seca.
— Lady Eleanor — Brandon curvou a cabeça —, uma mulher tão linda não precisa
desculpar-se.
— Quanta bondade, lorde Creed. — Eleanor foi tão formal quanto ele.
— Permita que eu lhe apresente os membros da minha família que milady ainda não
conhece.
Depois das apresentações, Eleanor sentiu-se como parte da família e as mulheres a
aceitaram de imediato. Blythe era a mais expansiva, e Moira, a mais reservada. As três se
mostraram bondosas e simpáticas, o que fez Eleanor descontrair-se em minutos.
Ela sentiu mais afinidade com Moira, o que lhe pareceu interessante, pois Brandon e
Wynthrope davam a impressão de se entender melhor que os demais.
A babá trouxe o filho de Devlin e Blythe para se despedir. Os adultos se alvoroçaram
com o menino e Blythe sorriu, radiante. Brandon pediu para segurar o sobrinho. Apoiado
com uma das mãos na bengala, ele mostrava muito jeito com crianças.
Eleanor sentiu um aperto na garganta. Homens atraentes e viris não deveriam
segurar bebês no colo diante de mulheres solteiras e sensíveis.
— Meu rapaz — Brandon disse para o bebê, que agitava os bracinhos roliços —, o
que acha de ser meu único herdeiro?
— Milorde poderá ter seus próprios filhos.— Eleanor não conteve as palavras e
arrependeu-se de ter falado.
Brandon fitou-a com olhar brilhante e ela estremeceu.
— Tem razão, lady Eleanor. Eu poderei — ele afirmou em voz baixa e significativa.
Todos conversavam, animados, e não perceberam, ou fingiram não perceber, a
energia mútua que os atraía.
Eleanor disse a si mesma que teria de seduzir Brandon ou forçá-lo a admitir seus
sentimentos por ela. Nada menos do que isso lhe serviria, pois desejava-o demais.
Brandon entregou o sobrinho para North, que o passou a Wynthrope. Os homens
seguraram a criança antes das mulheres, o que devia ser uma tradição dos Ryland.
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Depois foi a vez de Otávia e Moira. Finalmente deixaram o garotinho nas mãos de
Eleanor.
Ela adorava crianças e quando tomou o menino nos braços, notou que os outros se
entreolhavam como num pacto coletivo de aprovação.
Aidan era um bebê lindo e encarava Eleanor com grandes olhos castanhos sem
demonstrar receio, enquanto não parava de dar pontapés no ar.
— Talvez algum dia poderá ter um filho seu — Brandon cochichou em seu ouvido.
Ela sentiu um arrepio na espinha e fitou-o.
— Talvez — Eleanor pronunciou a palavra com voz cheia de intenções.
— Por termos tantos irmãos, achei que crianças não nos entusiasmassem.
— Pois aposto que ainda gostaremos mais delas quando forem as nossas. —
Eleanor olhou para o menino, que sorria.
— Pressinto que será uma boa mãe, Eleanor — Brandon afirmou, convicto.
— Obrigada. Espero ter melhores resultados com os meus filhos do que, tive com as
minhas irmãs.
Eleanor sempre se perguntava se não lhe caberia parte de culpa pelos problemas de
Phoebe, Muriel e Lydia. Se tivesse agido de forma diferente, talvez as irmãs fossem mais
felizes.
Mesmo assim, supôs que nada mais poderia ser feito por Lydia, que fora
responsável pela própria desdita e procurava a felicidade em locais errados. Eleanor
demoraria a perdoá-la, embora seu amor pela irmã continuasse o mesmo.
— Tenho certeza de que sempre dará amor e apoio aos filhos.
Os dois se entreolharam e Eleanor sentiu um nó na garganta. Não havia como
duvidar do sentimento explícito na expressão de Brandon. Prometera a si mesma seduzi-
lo naquela noite e era ela quem estava sendo atraída para a teia da sedução.
— Posso dizer o mesmo a seu respeito, milorde.
— Então será uma perda de tempo se permanecermos sem filhos. — O sorriso
maroto de Brandon era irresistível.
— É verdade — Eleanor sussurrou com o coração disparado.
Brandon franziu o cenho. Seria amor e uma vontade imensa de ter filhos dele que
via nos olhos de Eleanor?
— Eleanor... — ele começou, mas foi interrompido por Devlin.
— Está na hora de levar este pequeno camarada para a cama. — O caçula dos
Ryland pegou o bebê dos braços de Eleanor com muito orgulho.
O bebê ficava minúsculo perto do pai. Aliás, tudo diminuía de tamanho ao lado de
Devlin Ryland.
Eleanor sorriu ao vê-los se afastarem. Brandon recuou e ela tornou a prometer que
da próxima vez ele não escaparia.
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Por um instante, Brandon pensou que Eleanor o deixaria ir, mas ela se aproximou e.
encostou-se nele.
Brandon sentiu a fragrância refrescante dos cabelos dourados, e Eleanor
estremeceu mesmo sem ele a tocar.
Brandon não duvidou de que ela o desejasse e não teve forças para resistir.
Encostou os lábios na testa de Eleanor e experimentou a sensação de uma pétala
aveludada. Beijou-lhe os lábios com ardor. Ela deu um gemido gutural, e Brandon beijou-a
no pescoço.
Ele jogou a bengala no chão e abraçou Eleanor com desespero.
Ela não se moveu nem fugiu, e Brandon tornou a beijar-lhe os lábios. Eleanor gemeu
de novo e agarrou-se na lapela do paletó dele, que a apertou ainda mais de encontro a si.
Brandon nem mesmo se importou com a maneira desajeitada de se abaixar e deitar-se no
tapete levando Eleanor por cima dele.
— No futuro, precisamos tomar cuidado para que esta situação não se repita. —
Brandon cobriu-lhe as pernas com a saia.
Ah, como gostaria de segurá-la nos braços e não soltá-la nunca mais! Ah, como
gostaria de prometer qualquer coisa para ela não partir!
E daria tudo para ser um homem que cumpria as promessas!
— Sim. — Eleanor sentou-se sem o encarar e endireitou o corpete com mãos
trêmulas. — Tem razão. Teremos de ser mais cuidadosos.
Brandon engoliu em seco.
— Não posso ficar ao seu lado sem reagir dessa maneira, Eleanor.
— Eu sei. — Ela o fitou sem o menor constrangimento. — O mesmo acontece
comigo — Levantou-se.
— Sinto muito — Brandon falou em voz baixa. Eleanor sorriu, com tristeza.
— Eu também. Boa noite, Brandon. Endireitou os ombros, ergueu o queixo e saiu.
Quanto aquela noite significara para a dignidade dela?,
Brandon perguntou-se. Recriminou a si mesmo por havê-la tocado e pela fraqueza
de não resistir.
Se ele fosse um homem dotado de força de vontade, Eleanor teria se tornado sua
esposa havia mais de uma década.
Capítulo X
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Os Ryland almoçavam ao ar livre num dos últimos dias do verão. O sol aquecia a
atmosfera na medida certa para afastar o frio excessivo. Eleanor acreditava que a
temperatura baixa era excelente para aliviar o calor que sentia ao recordar-se da noite
anterior.
Comendo uvas, ela observava Brandon, cuja aparência tranqüila em nada lembrava
o ardor de um homem que se deixara levar pelo desejo.
— Ele vai se recuperar — Blythe comentou. — Mas será preciso um pouco de
paciência.
Ensimesmada, Eleanor levou alguns segundos para perceber que as cunhadas de
Brandon conversavam a seu lado. — Paciência até ele destruir a reputação dela? —
Otávia comentou com pouco caso.
— Assumir o risco foi uma decisão minha — Eleanor entrou na conversa.
Não queria que a tomassem por alguma tola, e a experiência delas seria útil para a
sua forma de agir com Brandon. As três haviam acompanhado durante muitos anos os
desacertos dele e poderiam orientá-la. Felizmente os homens se encontravam afastados.
— Nós a entendemos perfeitamente. — Moira sorriu. — Sabemos que está
apaixonada por ele. Caso contrário, não estaria aqui.
Seria assim tão óbvio? Na certa Eleanor se mostrava horrorizada, pois Blythe
segurou-lhe a mão com carinho.
— Não se preocupe. Cada uma de nós convive com um Ryland e compreendemos a
situação.
— Penso ter estragado tudo — Eleanor confessou, com voz embargada.
— De modo algum. — Otávia sacudiu a cabeça. — Brandon a evita por acreditar que
assim a favorece.
Ele teria dito alguma coisa para ás cunhadas?
— Como é que sabe disso? — Eleanor prendeu a respiração.
— North fez o mesmo comigo — Otávia afirmou com ar brincalhão.
— Devlin também — Blythe apoiou a cunhada. Moira ergueu a mão delicada.
— Wynthrope também.
As três mulheres sorriram por causa da expressão de espanto de Eleanor.
— E o que deverei fazer? Blythe tomou um gole de chá.
— Terá de fazê-lo entender que essa atitude negativa prejudicará os dois.
— E uma tarefa muito fácil — Otávia comentou —, quando se conhece os caminhos
certos.
Eleanor esperou a conclusão do comentário que não veio.
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partida.
— Presunçoso arrogante. — Eleanor revirou os olhos. — Como se alguma vez eu
lhe tivesse dado esperança de que me casaria com ele!
Arabella franziu o nariz.
— A mim também não agrada. Pode ser de boa família, mas o resto...
— Como está papai? — Eleanor mudou de assunto.
— Muito bem. — Arabella tomou um pouco de limonada. — A sua decisão de vir
atrás de lorde Creed operou milagres na saúde dele quando, para ser franca,
esperávamos um efeito contrário.
Eleanor sorriu.
— Afinal papai sempre desejou que eu e Brandon ficássemos juntos.
Arabella não pareceu totalmente convencida. Apesar de querer a felicidade da irmã,
angustiava-se com os falatórios que poderiam manchar o bom nome de Eleanor e achava
estranho o pai não pensar da mesma maneira.
Na verdade, lorde Burrough confiava mais em Eleanor do que ela em si mesma.
— Como está Lydia?—Eleanor perguntou sem entusiasmo. Arabella abaixou o olhar.
— Lydia ficou muito aborrecida. Exigiu que papai viesse para cá e teve um ataque
de nervos quando ele se recusou a lhe satisfazer a vontade. Na manhã seguinte, ela
arrumou as coisas e foi embora.
Eleanor entristeceu-se com a idéia de que Lydia e ela nunca mais seriam amigas.
Lydia era infeliz e não se conformaria com o fato de Eleanor ter conseguido o que ela
mesma perseguira e perdera. Eleanor não podia imaginar por que a inveja de Lydia se
voltava contra ela, e não contra Arabella, que era feliz no casamento. Provavelmente por
acreditar que Brandon seria o remédio para os seus males.
— Eleanor, não arrisque a sua felicidade por causa de Lydia — Arabella foi
categórica, o que não era usual.
— Não farei isso, Belle. — Eleanor sorriu com tristeza. — Prometo.
Elas continuaram a tagarelar, animadas. Mais adiante, os homens jogavam uma
espécie de bocha. Brandon se divertia em provocar os irmãos e todos davam boas
risadas.
Eleanor desejou participar da alegria de Brandon. Queria vê-lo sorrir para ela,
descontraído e feliz graças à sua presença.
Brandon pareceu sentir o olhar fixo de Eleanor e fitou-a com súbita seriedade.
Eleanor sorriu, acenou, e ele hesitou antes de corresponder ao gesto.
Eleanor se lembrou de Moira haver garantido que Brandon a amava e que todos
sabiam disso, menos ela. Reconheceu ter cometido a tolice de rejeitar Brandon em duas
ocasiões. Não o faria uma terceira vez.
Estava na hora de assumir o controle da situação.
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barulho da bengala, chegou aos seus aposentos com uma terrível vontade de tomar um
bom drinque.
Não estava cansado, mas não podia ficar parado escutando Eleanor fazer planos
para quando saísse daquela casa. Malfalada ou não, ela estava disposta a aproveitar a
vida, e ele teria de reiniciar a supervisão de suas propriedades, além de enfrentar com o
costumeiro desinteresse as jovens caçadoras de marido.
Brandon admitiu que sua vida tinha sentido somente ao lado de Eleanor, quando se
sentia completo e feliz. Sem ela, passaria pela vida sem viver.
Tirou o casaco, a gravata e, disposto a ler, sentou-se na poltrona perto da janela. As
páginas pareciam estar em branco. Brandon nada viu nelas, pensando em Eleanor.
Bateram na porta. Ah, Devlin de novo para ver como ele estava passando.
— Entre. Eleanor entrou.
— Não deveria ter vindo até aqui. — Brandon nem mesmo se levantou.
— Eu sei. — Ela fechou a porta. — Precisamos conversar. Brandon suspirou, fechou
o livro e largou-o na mesa lateral.
— Algum assunto em especial? — Ele se esforçou para demonstrar frieza.
— Vários e um em particular. Quero desculpar-me.
— Por quê?
Apenas Deus poderia dizer do que ela se imaginava culpada dessa vez.
— Por não lhe dar o crédito da confiança. Sinto muito pelo que eu disse naquela
noite na casa de meu pai.
— E não era verdade? Todos encontram dificuldade em acreditar em Brandon
Ryland. Até mesmo eu.
— Sinto por descumprir a promessa que lhe fiz. Por idiotice e por medo, eu o fiz
sofrer. E por isso peço-lhe perdão.
Eleanor pedia perdão, mas ela o amaria?
— Não há por que se desculpar. Não é crime não desejar casar-se com alguém.
— Não é nada disso. — Ela inclinou-se para a frente e tocou na perna aleijada.
O calor da mão de Eleanor se irradiou pelos tecidos e ossos danificados, e Brandon
teve a impressão de um processo curativo.
— Sinto muito que a situação o tenha levado a beber — ela declarou, constrangida.
— Não se culpe, a decisão foi minha.
— Mas eu o ajudei a tomá-la.
Eleanor endireitou-se. A perna de Brandon ficou fria e recomeçou a doer.
— Tudo o que fiz foi por minha livre e espontânea vontade. Eleanor, não assuma o
ônus pelo que os outros fazem. Acredite, é um fardo muito difícil de carregar.
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— Sirva-se, Otávia.
North sorriu diante da gulodice da esposa e concluiu que se tratava de um traço
familiar a atração por mulheres loucas pela comida.
— Segure o menino. — Brandon entregou Aidan para North. — Está mais do que na
hora de praticar um pouco.
Era também uma maneira de enfatizar que North era tão parte da família como
Devlin ou Wynthrope.
— Brandon — North segurou Aidan —, eu lhe dou quatro meses para ser incluído na
lista de futuro pai.
Brandon sorriu, consciente de que seria menos tempo do que isso. A menstruação
de Eleanor estava atrasada. Quando o filho ou filha deles nascesse, seria declarada uma
criança prematura.
Imaginava-se como pai, e Eleanor, como mãe. Apesar dos dois serem responsáveis
por suas famílias, um filho era uma emoção totalmente diferente. Uma criatura que seria
metade ele, metade Eleanor. Poderia haver algo mais surpreendente?
Nunca ocorrera a Brandon casar-se e muito menos assumir a idéia de paternidade.
Havia ido para Burrough com o intuito de conseguir o perdão de Eleanor, sem muita
esperança de conquistar-lhe o coração. Se tivesse sido paciente em vez de fugir como
fizera, tudo teria transcorrido com menos traumas.
Aquele seria um recomeço para ambos. Não seria fácil afastar dúvidas e temores,
mas os dois juntos haveriam de superar os obstáculos.
— Está na hora — Brandon falou depois de consultar o relógio. — Eleanor e as
irmãs já devem estar na igreja.
Tinha sido terrível permitir que Eleanor ficasse na casa de Arabella nos últimos dias,
mas também indispensável para salvar as aparências. O noivado mitigaria os falatórios
pelo fato de Eleanor ter permanecido desacompanhada em Creed House. Além disso, o
visconde e a viscondessa de Creed encontrariam muitas portas abertas. Brandon tinha
bons amigos e contava com uma família maravilhosa. O passado infame tivera uma
vantagem: saber quais eram as verdadeiras amizades.
Três carruagens seguiram para a igreja. Moira levou um pedaço de bacon
embrulhado em um guardanapo. Wynthrope sorriu, encantado, e Brandon sacudiu a
cabeça com satisfação.
Embora muitas vezes discordasse de Wynthrope, não podia negar que o irmão era
um bom marido e seria um bom pai. Além de sempre ter sido um excelente amigo.
Os convidados resumiam-se aos familiares e amigos mais íntimos. A sociedade em
geral fora excluída para evitar maiores comentários. Era voz corrente que Brandon se
casava com Eleanor por havê-la infelicitado e muitos contariam os dias até completar
nove meses. A antecipação do nascimento da criança seria o próximo escândalo.
Brandon não se incomodava com boatos. Além dos irmãos, havia apenas uma
pessoa a quem pretendia dar satisfações. E ela se encontrava a seu lado, segurando sua
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CH 382 – Ainda te amo... – Kathryn Smith
FIM
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