HC 822947 2023 06 30
HC 822947 2023 06 30
HC 822947 2023 06 30
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 2 de 6
Superior Tribunal de Justiça
ACÓRDÃO
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 3 de 6
Superior Tribunal de Justiça
HABEAS CORPUS Nº 822.947 - GO (2023/0158060-0)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE : MARILIA GABRIELA GIL BRAMBILLA E OUTRO
ADVOGADOS : MARILIA GABRIELA GIL BRAMBILLA - DF019758
TIAGO PUGSLEY - DF025466
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
PACIENTE : EDSON LUIS DE PAULA PERES
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
RELATÓRIO
Após minuciosa análise dos elementos constantes nos autos, constata-se que o
paciente foi submetido a um processo penal em decorrência da prática do crime tipificado no art.
33, caput, da Lei 11.343/2006, que trata do tráfico ilícito de drogas. A sentença condenatória
impôs uma pena de 5 (cinco) anos de reclusão, além de 500 (quinhentos) dias-multa, em regime
inicial semiaberto.
Insatisfeita com a decisão proferida, a defesa do paciente decidiu interpor recurso
perante o tribunal de origem. No entanto, o referido tribunal negou provimento ao apelo
defensivo, mantendo integralmente a condenação, conforme se depreende da ementa destacada
nos autos.
Neste habeas corpus, a defesa apresenta suas razões, em síntese, sustentando
que se faz aplicável ao caso a previsão legal de diminuição da pena estabelecida no art. 33, § 4º,
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 4 de 6
Superior Tribunal de Justiça
da Lei 11.343/2006, referente ao tráfico privilegiado. Para embasar tal alegação, destaca-se a
falta de comprovação do envolvimento do acusado em atividades criminosas mais graves, bem
como a inexistência de elementos que demonstrem sua atuação em organização criminosa ou o
uso de violência.
Diante desse cenário, a defesa postula a redução da pena em dois terços na
terceira etapa da dosimetria, pleiteando que seja realizada uma nova análise do quantum punitivo
a ser aplicado ao paciente. Além disso, requer que o processo seja remetido ao juízo de primeira
instância para que se possa oportunizar a propositura de um Acordo de Não Persecução Penal
(ANPP), nos termos da legislação vigente.
Ouvida, a Subprocuradora-Geral da República manifestou-se pelo não
conhecimento do habeas corpus, nos termos a seguir (e-STJ, fls. 1249-1254).
É o relatório.
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 5 de 6
Superior Tribunal de Justiça
HABEAS CORPUS Nº 822.947 - GO (2023/0158060-0)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE : MARILIA GABRIELA GIL BRAMBILLA E OUTRO
ADVOGADOS : MARILIA GABRIELA GIL BRAMBILLA - DF019758
TIAGO PUGSLEY - DF025466
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
PACIENTE : EDSON LUIS DE PAULA PERES
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
EMENTA
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 7 de 6
Superior Tribunal de Justiça
VOTO
Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Junior,
julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC 180.365, Primeira Turma,
Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min.
Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -, pacificaram orientação no sentido de que não cabe
habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não
conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato
judicial impugnado.
Sob tal contexto, passo ao exame das alegações trazidas pela defesa, a fim de
verificar a ocorrência de manifesta ilegalidade que autorize a concessão da ordem, de ofício.
Ao examinar detalhadamente os elementos probatórios e os argumentos
apresentados pela defesa, o juízo concluiu que não estavam presentes os requisitos necessários
para reconhecer o benefício legal do tráfico privilegiado, como observado no trecho destacado
(e-STJ, fls. 174-175):
A análise dos elementos presentes nos autos revela que o paciente preenche
cumulativamente os requisitos necessários para a aplicação da benesse do tráfico privilegiado,
tais como ser primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar à atividade criminosa, como já
exposto, e não participar de organização criminosa.
Dessa forma, é importante ressaltar que a quantidade de drogas apreendida por si
só não pode ser utilizada como justificativa para afastar a concessão da benesse. O entendimento
consolidado do Superior Tribunal de Justiça é de que a quantidade ou a natureza da substância
entorpecente podem, em conjunto com outros elementos, fundamentar o afastamento da causa de
diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, desde que evidenciem a
efetiva dedicação do réu à atividade criminosa, o que não ficou demonstrado na espécie. Nesse
sentido:
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 14 de 6
Superior Tribunal de Justiça
quarenta e duas gramas e cento e trinta e quatro miligramas), além de 11 (onze) porções de
cocaína, também com tamanhos variados, somando a massa bruta de 267,849 g (duzentos e
sessenta e sete gramas e oitocentos e quarenta e nove miligramas).
A quantidade de drogas apreendida, embora significativa, não pode ser
considerada isoladamente como prova de dedicação do paciente ao tráfico de entorpecentes, logo
faz jus a minorante o acusado.
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 16 de 6
Superior Tribunal de Justiça
III - Na legislação vigente atualmente que permanece em vigor não existe a
obrigatoriedade do Ministério Público notificar o investigado em caso de
recusa em se propor o acordo de não persecução penal.
IV - Irretocável, portanto, o julgamento feito pelo eg. Tribunal a quo, no
sentido de que o Juízo de 1º grau deve decidir acerca do recebimento da
denúncia, sem que exija do Ministério Público a comprovação de que
intimou o acusado (ora agravante), até porque não existe condição de
procedibilidade não prevista em lei.
V - Caso seja recebida a denúncia, será o acusado citado, oportunidade em
que poderá, por ocasião da resposta a acusação, questionar o não
oferecimento de acordo de não persecução penal por parte de Ministério
Público e requerer ao Juiz que remeta os autos ao órgão superior do
Ministério Público, nos termos do art. 28, caput e 28-A, § 14, ambos do
CPP. Precedentes.
VI - Embora seja assegurado o pedido de revisão por parte da defesa do
investigado, impende frisar que o Juízo de 1º grau analisará as razões
invocadas, considerando a legislação em vigor atualmente (art. 28, caput do
CPP), e poderá, fundamentadamente, negar o envio dos autos à instância
revisora, em caso de manifesta inadmissibilidade do ANPP, por não
estarem presentes, por exemplo, seus requisitos objetivos, pois o simples
requerimento do acusado não impõe a remessa automática do processo.
Precedentes.
VII - Imperioso destacar que o objeto de agravo regimental interposto pelo
Ministério Público Federal, com idênticos objetos e fundamentos resta
esvaziado e, portanto, prejudicado.
Agravo regimental desprovido. Julgo, outrossim, prejudicado o agravo
regimental do Ministério Público Federal".
(AgRg no REsp n. 1.948.350/RS, relator Ministro Jesuíno Rissato
(Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em
9/11/2021, DJe de 17/11/2021. - sem destaque no original)
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 18 de 6
Superior Tribunal de Justiça
propósito:
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 19 de 6
Superior Tribunal de Justiça
alternativa para a resolução de casos penais, proporcionando uma solução negociada.
O que está destacado é que o réu deveria ter sido denunciado e processado com
base no crime de tráfico privilegiado - ou seja, considerando a aplicação da minorante prevista no
§ 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 -, situação em que o limite de apenamento se enquadraria no
art. 28-A do CPP, abrindo espaço para a celebração do ANPP. No entanto, na instância original,
por responsabilidade da acusação, esse aspecto não foi devidamente considerado na denúncia. É
importante ressaltar que esse equívoco da acusação não pode prejudicar o réu, que foi vítima (e
não causador) de excesso de acusação.
Nesse contexto, enfatizo que não se está reconhecendo um direito subjetivo do
réu à proposta do ANPP, mas sim realizando uma interpretação adequada do art. 28-A do CPP.
Essa é uma condição jurídica inerente ao próprio ANPP quando presente os requisitos para sua
proposição, que deve ser devidamente considerada.
À vista disso, verifiquei que não houve ou trânsito em jugado em consulta ao sítio
do tribunal de origem, o que afasta o entendimento de que, caso a condenação tenha alcançado
trânsito em julgado, a persecução penal estaria encerrada, tornando inviável a apresentação de
proposta de acordo visando evitar a persecução penal, conforme estabelecido pelo art. 28-A do
Código de Processo Penal, me reportando ao seguinte julgado:
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 20 de 6
Superior Tribunal de Justiça
momento adequado.
4. O Tribunal de segundo grau não estava vinculado à conclusão da 2.
ª Câmara de Coordenação e Revisão, no sentido de que o recurso interposto
contra a decisão da própria Câmara, supriria aquele que deveria ter sido
dirigido diretamente contra a recusa do Órgão Ministerial em primeiro grau,
nos termos do art. 28, § 14, do Código de Processo Penal. E, por essa
razão também não estava vinculado à deliberação do referido Órgão, no
sentido de que fossem os autos encaminhados à Procuradoria Regional da
República.
5. A manifestação do Órgão de primeiro grau, ao se recusar a oferecer o
acordo, no sentido de que autos poderiam ser encaminhados ao Parquet,
em segundo grau, para que se manifestasse sobre o cabimento do referido
acordo, teve caráter meramente opinativo, cuja implementação também
dependia de decisão do Tribunal a acolhendo.
6. Situação em que o cabimento da remessa dos autos ao Órgão Ministerial,
agora com atuação em segundo grau, estava sujeita a nova análise por parte
do Tribunal Regional, o qual não estava adstrito aos fundamentos lançados
em sua decisão anterior, ainda que já transitada em julgado, que
encaminhara os autos ao Parquet, em primeiro grau, e que havia sido
integralmente cumprida.
7. Os fundamentos da decisão não transitam em julgado, mas tão-somente
o seu dispositivo, nos termos do art. 504 do Código de Processo Civil,
aplicável por força do art. 3.º, do Código de Processo Penal.
8. A Corte Regional ao entender que não era caso de encaminhar os autos
ao Órgão Ministerial em segundo grau, sob o fundamento de que não era
mais possível o oferecimento do acordo de não persecução penal, porque já
havia sido recebida a denúncia quando entrou em vigor o art. 28-A do
Código de Processo Penal, inclusive com sentença condenatória e a
acórdão que a confirmou, não incorreu em ofensa à preclusão ou praticou
reformatio in pejus.
9. O acórdão confirmatório da condenação transitou em julgado, pois não
houve a interposição de nenhum recurso contra eles. A questão de ordem
interposta, e que deu origem ao presente recurso especial, não tinha o
condão de obstar a fluência dos prazos recursais contra o acórdão
proferido na apelação, por ausência de previsão legal nesse sentido. Tanto
era de conhecimento da Defesa tal fato que, quando ela interpôs a questão
de ordem, expressamente requereu "a suspensão do prazo dos possíveis
recursos extraordinários até a análise da questão ora apresentada".
10. O Tribunal de origem, contudo, ao rejeitar a questão de ordem, nada
disse acerca da suspensão dos prazos recursais contra o acórdão da
apelação. Os embargos de declaração defensivos não alegaram omissão em
relação ao tema, sobre o qual também silenciou o recurso especial. Sendo
assim, o prazo para a interposição de recursos de natureza extraordinária,
contra o julgamento da apelação, fluiu normalmente, a partir da intimação
da Defensoria do conteúdo do referido acórdão, e transcorreram in albis.
11. Se houve o trânsito em julgado da condenação, está concluída a
persecução penal, sendo descabido falar em proposta para de acordo para
que não ocorra a persecução penal, na forma do art. 28-A do Código de
Processo Penal.
12. Recurso especial desprovido."
(REsp n. 1.970.966/PR, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma,
julgado em 27/9/2022, DJe de 3/10/2022.)
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 21 de 6
Superior Tribunal de Justiça
Essa compreensão é aplicável ao caso em análise, visto que o juízo criminal não
reconheceu, sequer na primeira fase da dosimetria, valoração negativa quanto à natureza e à
quantidade de drogas (e-STJ, fl. 179).
Ressalto, ainda, que o paciente confessou formalmente em juízo a prática do
delito, corroborando sua cooperação com o processo penal e fortalecendo a sua postura
colaborativa perante a justiça (e-STJ, fl. 174.)
Em vista disso, preenchidos os requisitos legais para o reconhecimento do tráfico
privilegiado, a utilização do ANPP pode ser considerada, visando a uma solução mais justa e
adequada para o caso concreto.
Assim sendo, deixo de fixar a pena.
DISPOSITIVO.
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 23 de 6
Superior Tribunal de Justiça
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA
Relator
Exmo. Sr. Ministro RIBEIRO DANTAS
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MESSOD AZULAY NETO
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. ELIZETA MARIA DE PAIVA RAMOS
Secretário
Me. MARCELO PEREIRA CRUVINEL
AUTUAÇÃO
IMPETRANTE : MARILIA GABRIELA GIL BRAMBILLA E OUTRO
ADVOGADOS : MARILIA GABRIELA GIL BRAMBILLA - DF019758
TIAGO PUGSLEY - DF025466
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
PACIENTE : EDSON LUIS DE PAULA PERES
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes de Tráfico Ilícito e
Uso Indevido de Drogas - Tráfico de Drogas e Condutas Afins
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, não conheceu do pedido e concedeu "Habeas Corpus" de
ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."
Os Srs. Ministros Messod Azulay Neto, João Batista Moreira (Desembargador
convocado do TRF1) e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Joel Ilan Paciornik.
Documento: 2321639 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 30/06/2023 Página 24 de 6