Filme Cidade de Deus
Filme Cidade de Deus
Filme Cidade de Deus
Enredo
Na cena de abertura, galinhas são preparadas para o almoço quando uma
escapa e é perseguida por um grupo armado pelas ruas da favela Cidade de
Deus. A galinha para entre a gangue e um jovem chamado Buscapé, que
acredita que a gangue quer matá-lo. Buscapé, o narrador, começa a contar a
história de sua infância, e o filme volta ao final dos anos 1960.[5][6]
Uma relativa paz chega à Cidade de Deus com Zé Pequeno no comando, que
evita chamar a atenção da polícia abordando e matando um dos Caixa Baixa,
que estava cometendo crimes na área. Zé planeja matar seu concorrente,
Cenoura, porém é impedido por Bené, que é amigo de Cenoura. A certa altura,
junto com Angélica, ele decide deixar sua vida criminal para trás e se mudar
para uma fazenda, assim ele faz uma grande festa de despedida. Zé, não
conseguindo achar uma garota que quisesse dançar com ele, humilha um
homem chamado Mané Galinha. Mais tarde, Bené é morto por um antigo
traficante, Neguinho, que estava tentando matar Zé. Bené era o único homem
que impedia Zé Pequeno de atacar os negócios de Cenoura. Sua morte deixa
Zé em perigo e Cenoura com medo.[6]
Elenco
Douglas Silva, Alice Braga e Seu Jorge (da esquerda à direita) interpretam os
papéis principais, Zé Pequeno / Dadinho, Angelica e Mané Galinha,
respectivamente.
Produção
Desenvolvimento
Pós-produção
Com o fim das filmagens em agosto de 2001, Cidade de Deus avançou seu
estágio de desenvolvimento para a pós-produção. Em um processo de
montagem liderado por Daniel Rezende que durou cerca de cinco meses.
Rezende, assim como o roteirista Bráulio Mantovani, era estreante em Cinema.
Havendo trabalhado editando campanhas publicitárias apenas. Rezende iniciou
o processo de edição ainda em estágio de filmagens. A cada cena filmada, o
material bruto era levado ao apartamento de Fernando Meirelles onde foi
montado o primeiro maquinário de pós-produção para o filme.[23] Ele compôs
seu workflow com grande influência da estrutura do roteiro, seguindo as
fragmentações divididas pelos anos 1960, 1970 e 1980, com um estilo de
montagem diferente.[41]
Para a primeira fase, nos anos 1960, foi utilizado uma linguagem clássica do
cinema. Rezende optou por uma montagem com cortes corretos
utilizando raccord, respeitando eixos e privilegiando a ação, com uma
continuidade plano a plano.[nota 1] Os poucos plano-sequências utilizados
enfatizam a situação dramática e o diálogo. Na segunda fase, nos anos 1970,
onde a criminalidade já não é a maior fonte de renda dando espaço às drogas
e ao tráfico, a técnica de corte raccord não é mais importante. "A liberdade dos
cortes causa um certo estranhamento no espectador, preparando-o para um
clima bem mais pesado que vai se aproximando" comenta Rezende.[41] Na
terceira fase, nos anos 1980 com a história de Mané Galinha e seu conflito com
Zé Pequeno, a montagem não levou em consideração nenhuma regra de
edição. Neste trecho, o filme tem uma carga explosiva de ação, e segundo o
montador, o uso da liberdade total nesta parte "causa estranhamento,
sensações de sufocamento e tensão ao espectador". Rezende exemplifica
estas condições de estranhamento com cenas que alguém fala, mas não
precisar mexer necessariamente os lábios, uma outra levanta em um take e
está totalmente acomodada no próximo. "O estranho é bem vindo" define
Rezende. Foi decidido usar estas técnicas, em virtude da decisão de Meirelles
e Katia Lund — em fazer o elenco não ler os diálogos definidos pelo roteirista
—, da qual possibilitou uma maior liberdade de improvisação visando tornar o
filme com uma tonalidade verdadeira. Porém, deixando dificuldades para o
montador.[41][43] De acordo com o músico Ed Côrtes, responsável pela trilha
de Cidade de Deus, a última fase do filme, foi usado músicas sombrias, com
flautas, batuque do samba bem lento, e alguns efeitos sonoros.[41]
O pôster do filme foi desenvolvido pelo designer gráfico especialista em cinema
Marcelo Pallotta, a partir de fotografias de Claudio Elizabetzky.[44] O projeto de
comunicação de um filme é comumente um trabalho de muitos envolvidos na
liderança. E o pôster deve conter um balanço de ideia não pesando tanto para
o lado artístico, bem como o comercial. Nesse contexto, as linhas criativas que
foram levadas em consideração para a divulgação do filme de Meirelles foram
estabelecidas após o designer junto à equipe assistir ao primeiro corte do filme.
Pallotta tinha em mente que o filme não possuía um protagonista fixo que
levasse a história do início ao fim de forma efetiva. E esta produção conta com
um quadro de atores não famosos e até mesmo não profissionais. Portanto,
não seria interessante comercialmente destacar alguém desconhecido. Com
tais constatações, Pallota criou cerca de 25 variações do cartaz de Cidade de
Deus. Dentre eles, o escolhido: uma galinha em destaque, o nome do filme ao
centro, e ao fundo a gangue de garotos.[45] Meirelles comenta sobre o cartaz
com bastante entusiasmo ressaltando que o fato da galinha "protagonizar-lo"
se dá pelo achismo na época que a cena de abertura — é onde a ave aparece
—, iria marcar o filme. Com a imagem o diretor revela que pretendeu passar o
contexto de humor, apesar do tema central ser violento o enredo do filme
contém uma linguagem humorizada e pop. Meirelles sumariza o layout do
cartaz de Pallotta com: "tem o humor, tem o fator social, e vende muito bem o
filme".[46] O material criado foi distribuído para mais de 60 países. Contando
com a exposição dos cartazes criados nas locadoras na época de lançamento
no Brasil em homevideo.[44]
Lançamento
Exibição e bilheteria
Cidade de Deus estreou em maio de 2002 no Festival de Cannes.[49] A
aproximação da equipe com a Rede Globo ainda nas filmagens tornando
a Globo Filmes uma das coprodutoras, facilitou o arranjo de distribuição do
filme. O que também possibilitou o acesso a eficazes canais de divulgação. A
emissora uniu forças dando suporte de mídia na campanha de lançamento,
com crossmedia, referências em telenovelas, programas e telejornais. As
estratégias de lançamento ficaram a cargo de Bruno Wainer — diretor-
executivo da Lumière Brasil — e Daniel Filho da Globo Filmes, supervisionadas
pela O2 Filmes.[37]
O longa-metragem enfrentou um grande período de negociações para a
distribuição internacional. Em primeira análise, os resultados foram pareceream
"satisfatórios", uma vez que Fernando Meirelles havia entrado em contato com
parceiros internacionais — Wild Bunch e Miramax Filmes —, ainda na fase de
preparação do elenco em meados de 2000. Ao fim das questões contratuais
finalizadas no segundo semestre de 2001, Meirelles constatou, que, no entanto
não tinha feito bons contratos. Na época, quando o filme já estava pronto ele
aspirou ao máximo recuperar o que tinha investido do próprio bolso. E mesmo
sem experiência na área e sem advogados auxiliando com presença ativa
assinou acordos que julgou "contratos que até crianças fariam melhor". O
resultado final que reverberou por mais de uma década, foi uma divida de 4
milhões de reais com a distribuição do filme.[24][37]
Nos circuitos brasileiros, Cidade de Deus foi distribuído exclusivamente pela
Lumière. Wainer, executivo da Lumière, relatou que, desde quando a
distribuidora se tornou parceira da Videofilmes comercializando Central do
Brasil em 1998, estabeleceu-se um laço de confiança entre as duas
companhias. A partir disto, qualquer projeto em que Vídeofilmes estava
envolvida, tendia a ser um bom negócio para Lumière.[37] Lumière juntamente
com Globo Filmes conseguiu baixar a classificação etária do filme de 18 para
16 anos.[50]
Em 30 de agosto de 2002 o filme foi lançado no Brasil em noventa salas.
Porém, na segunda semana já havia 120 cópias em exibição, chegando a 180
cópias na sexta semana nas bilheterias. Na terceira semana em cartaz, com
duzentas cópias, Cidade de Deus alcançou a marca de 1 milhão de
espectadores nos cinemas brasileiros.[51] Segundo notas de Filme
B divulgadas em 2004, o público total foi de 3 307 746 espectadores.[37] Em 3
de janeiro de 2003 o filme foi lançado na Inglaterra, tornando-se a terceira
maior abertura de um filme em língua estrangeira no país, atrás apenas de O
Tigre e o Dragão e Le fabuleux destin d'Amélie Poulain, arrecadando 1,4
milhão de reais.[52][53] Em janeiro de 2003, Cidade de Deus foi lançado
nos cinemas norte-americanos, e obteve também uma grande recepção
positiva.[2] Durante janeiro o filme foi lançado em outros países da Europa,
como na Espanha em noventa cinemas, e França, em 150 salas.[54]
Análise da crítica
Cidade de Deus foi amplamente considerado um dos melhores filmes de 2002
pela imprensa brasileira e norte-americana; recebendo aclamação universal
pela crítica especializada e elogios favoráveis. No site Rotten Tomatoes, o filme
tem uma aprovação de 91%, chegando ao consenso de "Um olhar chocante e
perturbador, mas sempre atraente para a vida nas favelas do Rio de Janeiro".
[55] No Metacritic, recebeu 79 por cento de aprovação, baseado em 33
opiniões, e classificado como "geralmente favorável" pela nota e análise do
público.[56] O critico José Couto do jornal Folha de S.Paulo relatou que
"Cidade de Deus é um filme de vigor espantoso e de extrema competência
narrativa. Seus grandes trunfos são o roteiro engenhosamente construído e a
consistência da mise-en-scène".[57]
O crítico brasileiro Érico Borgo do site especializado Omelete escreve em sua
resenha que sente-se orgulhoso ao assistir uma obra de origem nacional "que
solta aos olhos do mundo todo". Borgo elogia principalmente a direção de
Meirelles e relata que "em certas passagens, é tão pop e inovadora quanto os
melhores exemplares hollywoodianos".[58] A recepção britânica foi bastante
positiva, The Guardian, um dos grandes jornais do país, classificou Cidade de
Deus como "o primeiro grande filme do ano". "Não caminhe para o cinema,
corra", disse Peter Bradshaw em sua resenha. A revista Sight and Sound, do
instituto British Film publicou uma reprodução do crítico brasileiro Ismail
Xavier de três páginas, com outras ótimas resenhas do critico Paul Julian
Smith.[53] Vicent Maraval, executivo da distribuidora Wild Bunch julgou que
esta grande recepção na Inglaterra dará "um grande empurrão" para as
estreias em outros países.[52] Em outras resenhas, Fernando Meirelles é
comparado aos cineastas estadunidenses Quentin Tarantino e Martin
Scorsese, este último sendo pelo jornal britânico The Independent. Meirelles foi
questionado pela Folha de S.Paulo sobre estas comparações e reage com
risadas. "Fico mais lisonjeado pelo Scorsese, mas acho um exagero sem
sentido. Minha cultura cinematográfica não chega nem na canela desses dois",
diz ele.[52]
Stephen Holden do The New York Times elogia particularmente a sequência da
festa de despedida de Bené (Phellipe Haagensen), no final da história, "como
uma das partes mais espetaculares do filme".[59] Em Los Angeles Times, o
crítico Kenneth Turan em sua resenha define o filme como "uma potente e
inesperada mistura de autenticidade e luxo visual" e "uma peça vigorosa de
realismo social que está inegavelmente amparada em algo verdadeiro". Turan
enaltece particularmente a montagem de Daniel Rezende como "eletrizante".
[60] Cidade de Deus não chegou a ter cópias dubladas nos cinemas, sendo
exibido apenas legendado. Sobre as legendas, o crítico Mike Clark do USA
Today diz que "mesmo fãs de filmes de ação avessos a ler legendas deveriam
dar uma chance a este filme".[61]
Home video
Cidade de Deus foi lançado em VHS e DVD no Brasil em 17 de junho de 2003
apenas para locação pela distribuidora Imagem Filmes.[62][63] Em formato
comercial, chegou as lojas em setembro de 2003 com comentários em áudio
do montador Daniel Rezende, do roteirista Bráulio Mantovani e do
diretor Fernando Meirelles, e com quase uma hora de extras, incluindo
filmagens feitas durante as oficinas de atores e cenas do filme removidas na
edição.[64] Em outubro do mesmo ano o filme foi lançado em edição especial
para colecionadores, em um box com DVD duplo; um continha o filme, outro
continha, além dos extras presentes no primeiro DVD, cenas extras, lista de
prêmios, galeria de cartazes, Cidade de Deus Remix, charge animada
e trailers.[65][66]
Em 14 de outubro de 2009 o filme foi lançado na França em formato Blu-
ray pela Warner Bros. Pictures France em conjunto da M6 Vídeo. Em território
francês o disco do filme estava disponível para venda apenas para região B,
[nota 2] e ainda continha extras que foram remasterizado para alta definição.
Até dezembro de 2011, Cidade de Deus já havia sido lançado neste formato
em países como Canadá, Holanda, Reino Unido e Estados Unidos.[carece de
fontes] Imagem Filmes, a detentora brasileira dos direitos de distribuição
em home-video não se manifestou abertamente sobre o lançamento em alta
definição.[67]
Esnobe no Oscar 2003 e reformulação do prêmio
Segundo uma pesquisa divulgada por Waldemar Dalenogare Neto em abril de
2019, Cidade de Deus foi esnobado no Óscar 2003 após alguns dos membros
utilizarem uma brecha no regulamento para dar nota baixa ao filme. Um
número minoritário de membros da comissão de filme estrangeiro se retirou da
sessão interna da academia onde estava sendo exibido o filme, antes do final,
e imediatamente a nota da produção caiu de 10 para 6. Na época, isso era
permitido pelo regulamento interno, e foi a primeira vez aconteceu o
esvaziamento de uma sessão. Um dos pontos apontados na pesquisa, é o
perfil da época dos membros que faziam parte da comissão, composto por
homens de perfil conservador, e que não gostava de cenas de sexo e violência
nos filmes, a não ser que tenha uma justificativa de acordo com o ponto de
vista deles. Devido a reação negativa, a Miramax desistiu de fazer campanha
para o filme e adiou para o ano seguinte. Quando Cidade de Deus recebeu
quatro indicações no Oscar 2004, a reação negativa voltou-se para o Oscar de
melhor filme estrangeiro. Em 2005 a academia encomendou um estudo para
evitar tais injustiças, o que levou a criação da short list (pré-lista), para
diversificar a seleção. Posteriormente, devido a uma nova polêmica no perfil do
comitê nos anos 2010, foram adicionados mais membros.[68]
Estrutura narrativa
Cidade de Deus apresenta uma história não-linear estruturada em torno de
fragmentos divididos em três décadas onde o filme é ambientado. Apesar do
livro de Paulo Lins conter também uma narrativa não totalmente linear,
Fernando Meirelles encontrou problemas com o grande leque de histórias e
personagens. "Se você fica cortando de um para o outro o tempo todo, o
personagem nunca esquenta. Tivemos que abandonar alguns pelo caminho e
mais tarde voltar para recuperá-los, colocando-os de volta no filme. São idas e
vindas que ajudam o espectador a acompanhar e se envolver com a trama"
conta Meirelles à Revista Trópico. Segundo o diretor, esta técnica foi adotada
ao filme com a intenção diametralmente oposta da de Quentin
Tarantino em Pulp Fiction. Tarantino, segundo Meirelles, inverte o rolo dos
filmes procurando um resultado de "confusão estimulante" ao espectador,
criando uma espécie de jogo com a audiência. Já Cidade de Deus, o diretor
julga a não-linearização como um modo de explicar o filme, sendo didático.[20]
O filme é desenvolvido em três fases, cada uma com características distintas
sendo consideradas por Meirelles como "se fossem três filmes diferentes".
Dando uma sensação de transformação e evolução do crime ao espectador.
[69] A primeira fase se passa nos anos 1960, e têm como transição para
segunda fase nos anos 1960 com a morte de Cabeleira (Jonathan Haagensen)
que marca o fim do Trio Ternura; o desenvolvimento da segunda fase tem seu
fim com a decisão de Mané Galinha (Seu Jorge) enfrentar Zé Pequeno
(Leandro Firmino), onde se inicia a terceira e última fase no longa, que se
passa nos anos 1970. Toda esta cronologia é narrada e explicada por Buscapé
(Alexandre Rodrigues) que compõe a hierarquia da história, com outros
personagens importantes, sendo o central da história, Zé Pequeno.[70]
Temas e análises
"Eu acreditava que conhecia o apartheid social que existe no Brasil até ler o
livro. Percebi que nós, da classe média, não somos capazes de enxergar o que
está na nossa cara. Estado, leis, cidadania, polícia, educação, perspectiva e
futuro são temáticas abstratas, mera fumaça quando vistos do outro lado do
abismo. Cidade de Deus não fala apenas de uma questão brasileira e sim de
uma questão global. De sociedades que se desenvolvem na periferia do mundo
civilizado. Da riqueza opulenta do primeiro mundo, que não consegue mais
enxergar o terceiro ou quarto mundo, do outro lado ou no fundo do abismo".
— Fernando Meirelles[71]
Cidade de Deus aborda temas com referências no cotidiano e na contradição
social brasileira, sobretudo, na problematização da favela como um lugar de
extrema violência, motivada pelos pontos de venda de drogas e a sucessão de
líderes do tráfico.[72][73] O filme tem seu andamento desencadeado por
decisões dos personagens que são dividas em partes e não seguem uma
ordem cronológica. Estes determinantes são apresentados no filme pelos ritos
de passagem estabelecidos para os personagens com participações
importantes na trama,[73] sempre usando técnicas e estéticas da televisão e da
publicidade.[74]
Estes ritos que definem fases e evoluções de personagens foram bastante
utilizado em Cidade de Deus. Um desses casos acontece com Mané Galinha
no desenvolvimento de uma sequência de cenas que termina em um assalto ao
banco, onde a morte de um inocente passa ser "exceção à regra". Contudo, a
morte de um destes inocentes desencadeia na queda de Galinha. Outra cena
onde é explorado esta técnica é quando Marreco e Alicate estão escondidos da
polícia em cima de um arvore. A câmera é usada de forma a passar toda
agonia e inquietação do Alicate (Jefechander Suplino) que está em transe e
decide abandonar a vida do crime.[73]