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José Almacinha
University of Porto
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All content following this page was uploaded by José Almacinha on 10 October 2017.
1 Introdução
No atual processo geral de globalização da economia mundial, a indústria dos países desenvolvidos tem
demonstrado uma tendência crescente para concentrar as suas atividades nas fases de conceção e
montagem de produtos, contratando no exterior a fabricação dos respetivos componentes, numa
estratégia de obtenção de custos de produção mais baixos.
Por outro lado, com o aumento do número de empresas que dependem, cada vez mais, de tecnologia
baseada em sistemas computorizados, para poderem dar resposta às necessidades crescentes de
produção de peças mais sofisticadas e a preços mais reduzidos, ficaram mais condicionadas as
oportunidades de interação humana com os desenhos de engenharia, no âmbito dos diferentes
processos de fabricação.
Uma consequência destas duas tendências, que se vêm desenvolvendo em paralelo, foi a demonstração
das limitações de alguns dos processos de especificação tradicionais, tornando-se clara a necessidade
urgente de aumentar o grau de detalhe e exatidão na especificação de requisitos para a fabricação de
produtos técnicos. Esta intenção prende-se com uma exigência de redução das ambiguidades e da
possibilidade de serem feitas interpretações subjetivas, nos estádios de fabricação e de verificação.
Para esse efeito, passou a haver uma necessidade de se poder modelar o conhecimento relevante
através da utilização de um método mais exato para expressar os requisitos funcionais das peças, de se
utilizar especificações completas e bem definidas e de se aplicar estratégias de verificação integradas,
*
Texto revisto e aumentado a partir do subcapítulo 14.3, com o mesmo título, da autoria de
J. Almacinha, J. Tavares e J. Fonseca, publicado no livro digital “Introdução à Engenharia Mecânica”,
a editar por A. Barbedo Magalhães et al. Porto: DEMec-FEUP. 2013.
**
Docente da Secção de Desenho Industrial do DEMec-FEUP, colaborador do ONS-INEGI e secretário
das Comissões técnicas portuguesas de normalização CT 1 e CT 9.
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de modo a facilitar a sua inclusão em sistemas 3D de CAD/CAM/CAQ (CMM) (“Computer aided
design”/”Computer aided manufacturing”/”Computer aided quality (coordinate measuring machines)”)
(Figura 1).
CAQ ( )
Figura 1 – O sistema de CAD/CAM/CAQ (CMM) funcionando em ciclo fechado para assegurar a garantia
da qualidade na produção [1]
2/23
A Especificação geométrica de produtos é um conceito internacionalmente aceite (ISO/TR 14638)
que cobre todos os diferentes requisitos – indicados num desenho técnico – da geometria de peças
industriais (ex.: tamanho, distância, raio, ângulo, forma, orientação, posição, batimento, rugosidade de
superfície, ondulação de superfície, defeitos de superfície, arestas, etc.) e todos os princípios de
verificação, instrumentos de medição e sua calibração, com eles relacionados. Este conceito pode ser
expresso, de um modo mais simples, como o conjunto de requisitos que especificam a macro e a
microgeometria de um produto (peça), associado com requisitos para a verificação e a calibração dos
respetivos instrumentos de medição [4].
A GPS (“Geometrical product specification”) é o domínio de trabalho do Comité técnico ISO/TC 213, cujo
objetivo principal é o desenvolvimento e a promoção de um sistema integrado para a especificação e
verificação da geometria das peças, que possa funcionar como uma ferramenta importante de
engenharia no desenvolvimento e fabricação de produtos.
Vistas do desenho
2ª camada (“layer”)
(ISO/TC 10)
Suporte do desenho
1ª camada (“layer”)
(ISO/TC 10)
Desenho de
engenharia
(desenho de peça)
Presentemente, as diferentes atividades produtivas desenvolvem-se num mercado global em que [3 e 4]:
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– há uma necessidade de compreensão, comunicação e aplicação das Normas, ao nível do mercado
global, com vista à eliminação das barreiras técnicas;
– a utilização de sistemas de CAD, CAM, PDM (“Product data management”), etc. é predominante;
– uma Metrologia de utilização cada vez mais sofisticada é aplicada na verificação funcional de
requisitos relevantes das peças (ex.: metrologia digital computorizada, baseada em máquinas de
medição de coordenadas), ampliando o âmbito da metrologia convencional, baseada em
instrumentos de medição.
– a documentação técnica de produtos (nela incluindo os desenhos técnicos) serve de base para a
interpretação de contratos e a documentação GPS pode ser vista como a base de um contrato
firme;
– há uma exigência crescente de peças com funções altamente sofisticadas, a preços cada vez mais
competitivos.
Segundo o Comité técnico ISO/TC 213 – “Dimensional and geometrical product specifications and
verification”, dados empíricos mostram que quase 80 % dos custos de um produto derivam de decisões
tomadas durante as fases de conceção e de produção inicial desse produto. Acresce a isso que os
custos médios resultantes das ambiguidades existentes nos desenhos de engenharia podem atingir
cerca de 20 % do volume de negócios da produção. Logo, definições incorretas e ambíguas dos
requisitos GPS são fatores de elevado risco económico para a indústria e estão na base de muitas
disputas entre empresas [4].
Nas secções seguintes deste texto, o primeiro de uma série de dois sobre o conceito de Especificação
técnica de produtos, começa-se por oferecer uma visão geral sobre a evolução da representação gráfica
em engenharia e, depois, apresentam-se alguns exemplos de aplicação de conceitos de Documentação
técnica nas diferentes atividades do processo de desenvolvimento de produtos. Uma introdução à nova
linguagem ISO de especificação geométrica de produtos será abordada numa segunda parte deste
trabalho a publicar proximamente.
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2 Visão geral sobre a evolução da representação gráfica em engenharia
a) Planta de templo caldeu (2130 a.C.) b) Duas vistas de um naos (santuário) egípcio, em madeira, c) Capitel jónico (séc. I a.C.)
desenhada numa placa de argila traçadas em papiros, Ghurab (cerca de 1500 a.C.) desenhado em pergaminho
A partir do séc. V a.C., os gregos desenvolveram estudos nos domínios da geometria e da ótica que
conduziram à realização de representações que começaram a incluir noções de perspetiva (projeção
central) e que estão na base da tradição pictórica ocidental. Por sua vez, as técnicas tradicionais de
representação e pintura sino-japonesas, baseadas em noções de projeção paralela, permaneceram
praticamente inalteradas até ao séc. XIX [8] (ver exemplos na figura 4). No entanto, até à parte final da
Idade média, subsistiram muitas dificuldades na representação rigorosa de objetos tridimensionais em
superfícies planas. Deve também assinalar-se que, do séc. XIII d.C. em diante, o papel começou a
generalizar-se como suporte de escrita e de desenho.
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Só no século XV é que se começaram a registar progressos significativos no desenvolvimento dos
métodos de representação gráfica [9]. Filippo Brunelleschi (1377-1446), em 1413, estabeleceu pela
primeira vez as leis geométricas da perspetiva linear, baseando-se em noções já conhecidas desde a
Grécia antiga. Leon Battista Alberti (1404-1472), em 1435, publicou “De Pictura”, o primeiro tratado
sobre perspetiva. Leonardo da Vinci (1452-1519) realizou alguns estudos experimentais que
contribuíram de forma significativa para o entendimento da perspetiva linear e produziu vários desenhos
arquitetónicos e de máquinas em perspetiva, em que o ponto de fuga se afasta cada vez mais do centro
da folha de desenho, o observador “sobe” em relação ao objeto e afasta-se deste, daí resultando
representações perspéticas que são “quase” axonometrias cavaleiras. Albrecht Dürer (1471-1528)
elaborou o tratado de geometria “Underweysung der Messung mit dem Zirckel und Richtscheyt” (Instrução
da medição com o compasso e a régua) que começou a ser publicado em 1525, em 4 livros, e contém
gravuras que ilustram bem a procura científico-empírica das regras que permitiriam uma representação
rigorosa de objetos 3D, em desenhos 2D em perspetiva [8, 10] (ver figura 5).
a) O princípio da demonstração de Brunelleschi b) Leonardo da Vinci: desenho perspético de catapulta c) Albrecht Dürer: construção da imagem de um
alaúde, em perspetiva (xilogravura, 1525)
No entanto, apenas no final do século XVIII, Gaspard Monge (1746-1818), baseado em conhecimentos e
técnicas pré-existentes, desenvolveu e sistematizou um método de projeção simultânea de um dado
objeto em dois planos de projeção ortogonais – o método diédrico ou método da dupla projeção –
que publicou no seu tratado de “Géométrie Descriptive”, editado em 1798/99, em resultado das Lições
dadas nas “Écoles Normales”, em Paris (1794/95), estabelecendo assim as bases do Desenho técnico
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moderno. Com este método, passou a ser possível representar, num suporte bidimensional, a forma e as
dimensões reais de qualquer objeto do espaço suscetível de definição rigorosa, bem como resolver
qualquer problema de carácter geométrico a ele relativo, por posterior rotação de um dos planos de
projeção sobre o outro (ver um exemplo desta técnica, na figura 6 a). A validade dos processos que
permitem passar os problemas da geometria no espaço para figuras planas, sem a necessidade da
realização de cálculos fastidiosos, é comprovada pela correspondência biunívoca entre as duas formas:
a figura plana deverá permitir reconstruir a figura no espaço.
Por outro lado, o antagonismo registado entre a França e a Grã-Bretanha, na primeira metade do século
XIX, levou a que o método de Monge não tivesse tido então grande penetração neste último país, tendo
sido dada preferência ao desenvolvimento de métodos de representação gráfica que permitissem aos
trabalhadores ingleses dispor de desenhos simples e fáceis de interpretar, que lhes assegurassem a
informação necessária para a construção, montagem e desmontagem dos sistemas mecânicos
produzidos nas fábricas, em plena época de Revolução industrial. Esta via levou ao desenvolvimento e à
sistematização das Representações axonométricas, cujas origens remontam à tradição pictórica
oriental sino-japonesa, que, desde o século XV, já vinham a ser utilizadas em desenhos, nos domínios
da arquitetura militar e da construção mecânica.
Neste âmbito, em 1822, W. Farish (1759-1837) publicou um trabalho intitulado “On isometrical Perspective”
com objetivos eminentemente práticos. J. L. Weisbach (1806-1871) foi o responsável pela generalização
do método de Farish à axonometria ortogonal em geral, através do artigo “Die monodimetrische und
axonometrische Projectionsmethode (Perspective)” publicado em 1844. A palavra Axonometria [do
grego, áxon (eixo) + métron (medida)] aparece pela primeira vez na obra “Lehrbuch der Axonometrie
oder der gesammten isometrischen, monodimetrischen und anisometrischen Projectionslehre” publicada
pelos irmãos M. H. e C. Th. Meyer, em 1852. Karl Pohlke (1810-1876) formulou, em 1853, o teorema
fundamental da axonometria oblíqua que foi, posteriormente, demonstrado e generalizado por
Hermann Schwarz (1843-1921), em 1864 [8] [ver exemplos destas técnicas nas figuras 6 b) e c)].
a) G. Monge (1794): Método diédrico – b) W. Farish (1822): Representação isométrica de c) M. e C. Meyer (1855-63): Representação
exemplo da dupla projeção ortogonal de um “Optical-grinding engine model” axonométrica oblíqua de um carretel
um segmento de recta com rebatimento
do plano vertical
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Uma vez que as representações axonométricas não permitem uma representação inequívoca de todos
os pormenores de um dado objeto espacial, a partir da segunda metade do século XIX, estas
representações deixaram de ser consideradas como fontes primárias da definição e da fabricação de
produtos. No entanto, atualmente, as representações axonométricas continuam a ser muito utilizadas
como representações perspéticas (imagens tridimensionais dos objetos), na fase de estudo conceptual
do processo de desenvolvimento de produtos, como meio fácil de comunicação técnica e como meio
auxiliar para a interpretação de desenhos de definição e de fabricação de produtos em representação
ortográfica (multivistas), em domínios tais como engenharia, arquitetura, design, etc.
a) Automóvel desportivo Lotus 23 (1962) b) Desenho de definição parcial de uma cambota (Chevalier, 1998) c) Complexo espacial MIR (1994)
O Desenho técnico moderno tem por base os conceitos desenvolvidos por Gaspar Monge, no seu
tratado de “Géométrie Descriptive”, que passaram a permitir resolver, graficamente e de modo
inequívoco, todos os problemas espaciais utilizando, em simultâneo, dois planos de projeção [12 e 13]
[figura 8 a)].
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Sentido de Sentido de
visualização visualização
Sentido de
visualização
Projeções no
1º Diedro Sentido de
visualização
2º Diedro 1º Diedro
3º Diedro 4º Diedro
Projeções no
3º Diedro
a) Método de Monge, método diédrico ou da dupla projeção b) Método de projeção do 1º diedro (ISO 5456-2) c) Representação ortográfica no 1º diedro (ISO 5456-2)
Na década de 60, apareceram os primeiros sistemas comerciais de Conceção assistida por computador
(CAD – “Computer aided design”) [6] mas, até aos anos 80, os desenhos de engenharia executados por
meio de equipamento e instrumentos para traçado manual continuaram a ser predominantes na prática
industrial, sobretudo ao nível das pequenas e médias empresas (figura 9).
a) Sala de desenho da Saab, em Linköping, Suécia (anos 50) b) Exemplos de instrumentos para traçado manual c) Sala de desenho do LLNL, Livermore, California (anos 60)
A partir do início da década de 80, com a crescente utilização de computadores pessoais (PC), nos
meios universitários e industriais, começaram a surgir sistemas de Conceção e desenho assistidos
por computador (CADD – “Computer aided design and drafting”) de baixo custo e fácil utilização, que
de início vieram apenas substituir os estiradores e as máquinas de desenhar, passando a permitir a
elaboração de desenhos num espaço eletrónico bidimensional (2D) (figura 10). As suas principais
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vantagens centravam-se no aumento da rapidez de execução e revisão dos desenhos de engenharia e
na possibilidade de proceder ao seu armazenamento em formato eletrónico, com vista a tornar mais fácil
o intercâmbio da informação técnica [6, 7 e 14].
a) Laboratório de CAD para ensino (ADEM-ISEL) b) Desenho em CAD 2D de engenharia mecânica c) Sistemas de CAD em gabinete de projeto
Na segunda metade dos anos 80 e sobretudo na década de 90, a generalidade destes sistemas de CAD
passou também a englobar a modelação geométrica tridimensional (3D), paramétrica e baseada em
“features”, com a capacidade de resolver a representação de problemas espaciais de conceção,
diretamente no espaço 3D [7 e 14] (figura 11).
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verificação), permitindo que qualquer alteração realizada posteriormente seja atualizada em todas as
partes do sistema.
Neste novo contexto de trabalho, os desenhos de engenharia deixaram de ser considerados como
fontes primárias da definição nominal do produto ou como sendo as representações originais dos
produtos. Com efeito, o estabelecimento da geometria nominal de um produto através da utilização de
modelos de sólidos pode trazer vantagens que não seriam possíveis através da manutenção de uma
definição 2D estática do produto. À medida que a modelação de sólidos foi evoluindo, foram sendo
criados vários sistemas de análise com vista a apoiar e facilitar o trabalho do projetista, no âmbito da
conceção e fabricação de produtos. Atividades de modelação digital ou virtual (DMU − “digital mock-
up activities”), tais como a simulação do processo de montagem para a deteção precoce de
interferências, podem ser contempladas [figura 12 a)]. Os modelos digitais podem também ser utilizados
na simulação do processo de fabricação e na identificação de problemas de montagem num ambiente
de fabricação digital [15] [figura 12 b)].
a) Exemplo de um modelo de interferência (ISO 29845) b) Simulação digital do processo de fabricação (Mastercam X2)
Os modelos de sólidos servem ainda de base para a fabricação assistida por computador (CAM –
“computer-aided manufacturing”). As fresadoras e os tornos mecânicos comandados numericamente
podem importar modelos 3D matematicamente exatos para produzir protótipos ou ferramentas [15]
(figura 13).
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Além disso, os modelos de sólidos facilitam a produção de modelos de fabrico aditivo [16]. A partir da
modelação de sólidos, podem também obter-se representações fotorrealistas de objetos
(“photorealistic renderings”) que permitem a produção de materiais de marketing e para a embalagem do
produto, muito antes da existência do produto físico. Deste modo, publicações técnicas, catálogos com
ilustrações das peças e materiais de formação podem ser desenvolvidos em simultâneo com a conceção
do produto [15] (figura 14).
a) Modelo obtido por fabrico aditivo (Mcor Matrix 3D Printer, Ireland) b) Representação fotorrealista (via programa HyperShot, da Bunkspeed)
Figura 14 – Produtos obtidos a partir de modelos 3D que podem ser utilizados em diferentes fases do
processo de desenvolvimento de produtos
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Tolerâncias geométricas ISO 1101
A título de exemplo, já em 2004, a Toyota Motorsport tinha anunciado que estava envolvida num projeto
de “menos desenho”, em que a conceção, a fabricação e a verificação de componentes do motor foram
levadas a cabo num ambiente digital [15]. Também de acordo com a mesma referência, o Boeing B-777
foi um dos primeiros, na indústria aeronáutica, a ter uma definição 100 % digital. Neste caso, sempre
que tal foi possível, os dados digitais foram utilizados para conduzir os processos de fabricação. A
montagem completa da aeronave foi simulada utilizando técnicas digitais. As indústrias aeroespacial e
de defesa estão a fazer uso do conceito de “definição digital de produtos” para constituir, detalhar e
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anotar vistas de modelos 3D para grupos de trabalho específicos, a jusante da fase de conceção
detalhada, tais como fabricação, planeamento, serviços do produto, aprovisionamento e
marketing/vendas [15].
Modelo em CAD 3D
Modelo virtual de um objeto
(não é um desenho)
Modelo em CAD 3D anotado (com cotas, tolerâncias,
etc.) utilizado diretamente na definição de produto
Figura 16 – Exemplo da definição de um produto acabado através de um modelo em CAD 3D anotado
(ISO 16792)
Finalmente, deve ser assinalado que, apesar do desenvolvimento registado, nas últimas décadas, em
termos dos meios computacionais para a representação gráfica, os desenhos executados à mão livre
(esboços), quer em representação ortográfica quer em representação perspética são e continuarão a
ser muito importantes, sobretudo na fase de estudo conceptual [17] (ver exemplos na figura 17).
a) Desenhos perspéticos e ortográficos de uma cadeira de rodas [18] b) Esboço relativo ao foguetão Saturno
V, desenvolvido por W. von Braun
(nov. 1964). Disponível em WWW:
<http://gentlemint.com/media/images/
2012/02/23/15eae5ae.jpg.505x650_q85.jpg>
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A aptidão para fazer esboços à mão livre, em folhas de papel, é uma competência muito importante em
termos da representação gráfica em engenharia, pois permite desenvolver as capacidades de
visualização espacial e de comunicação técnica – imaginar soluções construtivas, traduzindo-as em
desenhos ilustrativos ou explicando-as a outros. De notar que, atualmente, para além da utilização de
suportes em papel, os esboços podem também ser realizados, por exemplo, em tablets PC [6, 7 e 14].
O desenvolvimento do produto pode ser definido como o conjunto completo de atividades, dentro do
ciclo de vida do produto, que começa com uma necessidade e uma ideia de produto e termina com o
início da sua produção em série para o mercado.
Especificações
de conceção
Requisitos
do Proposta A
mercado nº 1 V Modelos
A geométricos,
Requisitos Especificação L desenhos de
Represen- Documentação
Soluções Proposta conjunto,
da de tações das I de base para a
listas de artigos,
requisitos funcionais formas nº 2 conceção
legislação … A
Ç
especificações,
notas de cálculo,
Proposta à esquemas, etc.
Requisitos
nº k O
da
empresa
Em cada uma destas atividades vão sendo elaborados diversos tipos de documentos técnicos [2], tais
como especificações, esquemas, modelos geométricos, desenhos, listas, folhas de cálculo, instruções,
planos, relatórios etc., com vista a permitir a comunicação e o entendimento entre todas as partes
envolvidas nas diferentes fases do processo de desenvolvimento do produto.
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Normalmente, neste processo começa-se por fazer uma análise que engloba a preparação de uma
especificação de requisitos (“requirement specification”) do produto (ver figuras 18 e 19), a partir da
compilação e avaliação dos requisitos relativos ao mercado, à legislação e à própria empresa.
Em seguida, tendo como ponto de partida a especificação de requisitos estabelecida, dá-se início ao
estudo conceptual (“conceptual design”) com a preparação e o estabelecimento de especificações de
conceção (“design specifications”) que servirão como uma base para posteriores desenvolvimentos.
Estas poderão indicar possíveis soluções funcionais e/ou representações das formas que irão servir de
base para uma ou mais propostas de conceção (“design proposals”) a avaliar.
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Nas soluções funcionais (“functional solutions”), as funções e relações entre partes são descritas como
soluções de princípio, normalmente sob a forma de texto (notas, etc.) e de esquemas (ver exemplos na
figura 20).
(pierreprovot.files.wordpress.com)
Proceedings of the 2005 ASEE Annual Conf. & Exposition Esquema cinemático Conceção de base
a) Esboço contendo um número de componentes b) Caixa redutora de 2 velocidades de uma
identificáveis e outros detalhes ceifeira-debulhadora
Nas representações das formas (“shape representations”), a forma física é normalmente apresentada
por desenhos conceptuais ou modelos geométricos, tais como modelos de estilo (“styling models”) (ver
exemplos na figura 21).
Resna Annual Conference – 2010 (web.resna.org) Designer Stephen Harper, 1980’s (www.aronline.co.uk)
a) Desenho conceptual de uma cadeira de rodas motorizada b) Modelo de estilo de um Austin Maestro Cabriolet
O estudo conceptual é um processo iterativo que consiste numa série de estádios generativos
(geradores de formas) e de avaliação que convergem progressivamente para uma solução conceptual
preferencial (ver figura 18). Em cada iteração, os conceitos (componente, subsistema ou produto
global) são definidos com um detalhe crescente, o que permite efetuar a sua avaliação cada vez com
mais rigor. Assim, por exemplo, um conceito que começa por um esboço (“sketch”) grosseiro [ver exemplo,
na figura 20 a)] poderá ser desenvolvido, através de várias iterações, possivelmente até a um desenho
de disposição (“layout drawing”) à escala e a um modelo ou maqueta à escala 1:1 (“mock-up”) [19].
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À medida que esta fase se desenvolve, a confiança na capacidade do(s) conceito(s) para satisfazer a
especificação de requisitos do produto (“product requirement specification”) previamente estabelecida
e, eventualmente, para produzir uma solução válida vai aumentando. O nível de detalhe da engenharia
aplicada a um conceito, antes de este ser “adotado”, deverá ser suficiente para permitir uma avaliação
rigorosa e realista do mesmo. Como este processo é muitas vezes moroso, poderá haver uma tendência
para o abreviar em demasia, o que corresponderá à adoção de um conceito sem este ter sido
completamente avaliado. Esta tendência deve ser combatida, pois aumenta a probabilidade de vir a ser
“adotado” um conceito fraco ou imperfeito. As implicações daí decorrentes, em termos do aumento de
custos e da redução da qualidade do desempenho do produto, sobrepõem-se às poupanças em tempo e
trabalho conseguidas na fase de estudo conceptual. A título de exemplo, a referência [19] assinala que,
numa análise efetuada a projetos japoneses e europeus comparáveis, os japoneses dedicaram 66 % do
esforço total de projeto ao estudo conceptual e 10 % à reformulação da conceção, enquanto os valores
equivalentes para os projetos europeus foram, respetivamente, de 7 % e de 50 %.
O resultado da avaliação das diferentes propostas de conceção, desenvolvidas durante a fase de estudo
conceptual, servirá de ponto de partida para a elaboração da documentação de base para a
conceção, tendo em conta critérios de caráter técnico e económico. Não há, assim, um final bem
definido para a fase de estudo conceptual, uma vez que o conceito aprovado vai continuar a ser
gradualmente definido, com um detalhe cada vez maior, ao longo de uma nova fase designada de
conceção de base (o anteprojeto), rumo à fase de conceção detalhada.
Nesta fase, a geometria nominal de um produto – uma peça, um dispositivo mecânico ou uma máquina
– é modelada por meio de sistemas de CAD 3D, podendo, em seguida, ser gerados os correspondentes
desenhos 2D (ver exemplos, na figura 23).
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Modelo em CAD 3D
Na conceção de base dos produtos, deve ser adotado um conjunto de procedimentos que podem vir a
ter um impacte muito significativo na satisfação das necessidades do mercado e nos custos de produção
associados. As dimensões lineares principais, caraterizadoras de produtos pertencentes a uma dada
gama de fabricação, devem ser selecionadas e escalonadas de acordo com uma das séries de
números normais (séries Renard) (ISO 3, ISO 17 e ISO 497). As dimensões lineares e angulares dos
vários elementos geométricos constituintes das peças cuja produção e/ou verificação dependam
diretamente de ferramentas de corte e/ou de instrumentos de verificação (ver exemplos na figura 24)
devem também ser escolhidas de entre valores de séries de números preferenciais. Na conceção de
base de sistemas mecânicos devem ser utilizados elementos de ligação e órgãos mecânicos de
transmissão de movimento normalizados, tendo também em conta as dimensões requeridas para os
seus alojamentos nos restantes componentes não normalizados.
φ16 H7
Calibre lado “NÃO PASSA”
lado “NÃO PASSA” lado “PASSA” achatado
lado “PASSA”
Mandril
Calibre tampão
Controlo dimensional do 40 H7
a) Superfície furada; furo com um
b) Superfície mandrilada.
Os modelos de sólidos, definidores da geometria nominal dos produtos, facilitam a sua visualização mas
contêm também dados geométricos que podem ser utilizados em diversos sistemas de análise ao nível
da engenharia, tais como o dimensionamento por elementos finitos, a análise térmica e das tensões, a
geometria de massas, a verificação de eventuais interferências, etc. Após a realização destes trabalhos
de análise, os dados da geometria nominal são utilizados na conceção detalhada dos produtos, na
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elaboração de materiais de marketing e na produção de protótipos físicos através de meios de fabrico
aditivo (“aditive manufacturing”) [14], num ambiente de engenharia simultânea (ver figura 25).
Estes documentos no âmbito da definição de produto acabado, fabricação, verificação, instalação, etc.
fazem parte das saídas (“outputs”) do processo de desenvolvimento do produto e incluem, entre
outros, dados que demonstram a comparação entre as entradas (“inputs”) e as saídas do processo;
especificações de produto, incluindo critérios de aceitação; especificações do processo; especificações
de materiais; especificações de ensaio; requisitos de formação; informação dos clientes e dos
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consumidores, requisitos de compra e relatórios de ensaios de qualificação, que permitem comunicar a
definição do produto, ao longo do seu ciclo de vida (ver exemplos, na figura 27).
Figura 27 – Exemplos de desenhos de engenharia que fazem parte das saídas do processo de
desenvolvimento do produto (NP ISO 29845)
Convém que as saídas do processo de desenvolvimento do produto sejam revistas por confronto com a
especificação de requisitos, de modo a proporcionar evidência objetiva de que as saídas foram, eficaz e
eficientemente, ao encontro dos requisitos do processo e do produto.
4 Considerações finais
Com a utilização generalizada dos sistemas de CAD 3D, os modelos virtuais de sólidos tornaram-se
responsáveis pela definição da geometria nominal dos produtos, que passou a ser uma função
secundária (e redundante) dos desenhos de engenharia. No entanto, os desenhos 2D gerados a partir
de modelos 3D são, atualmente, e continuarão a ser, num futuro previsível, muito utilizados, a nível
industrial, atendendo aos limites da integração das fases de conceção, fabricação e verificação
registados em muitas empresas.
Finalmente, deve ser assinalado que, apesar do contexto tecnológico descrito neste trabalho, a aptidão
para fazer desenhos à mão livre, em folhas de papel, é uma competência muito importante em termos
da representação gráfica em engenharia, pois permite desenvolver as capacidades de visualização
espacial e de comunicação técnica – imaginar soluções construtivas, traduzindo-as em desenhos
ilustrativos ou explicando-as a outros.
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5 Referências
[1] − HAMBURG-PIEKAR, D.S. – Calibração de Peças Padrão em Máquinas de Medir por
Coordenadas. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina. 2006. 152 p. Dissertação
de Mestrado [Em linha]. [Consult. 2 out. 2013] Disponível em WWW: <https://repositorio.ufsc.br/
bitstream/handle/123456789/88352/228125.pdf?sequence=1>.
[2] − ALMACINHA, J. A. – O Sistema Normativo para Uma Especificação Técnica de Produtos
Adequada ao Mercado Global no Domínio da Construção Mecânica. Rev. Tecnometal. Porto:
AIMMAP. 2005, 159, p. 5-13 [Em linha]. [Consult. 22 out. 2012] Disponível em WWW:
<http://sigarra.up.pt/feup/pt/publs_pesquisa.FormView?P_ID=13397>.
[3] − Business Plan of ISO/TC 10 – Technical product documentation. Versão 3. ISO, 2007-04-25, 19
p. [Em linha]. [Consult. 22 out. 2012] Disponível em WWW: <http://isotc.iso.org/livelink/livelink/
fetch/2000/2122/687806/ISO_TC_010__Technical_product_documentation_.pdf?nodeid=984765
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